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CLARICE LISPECTOR
1. INTRODUÇÃO
Além disso, Paz (2006) compreende que a solidão muita das vezes está
relacionada à sociedade autoritária, massificada; que quer impor suas “verdades” e
projetos fazendo com que os seres ajam em conjunto em prol de um bem comum,
desconsiderando o que o povo pensa de si mesmo; imposições sociais advindas de
quem detém o poder, transformando o homem em um ser perdido e só.
Com base nessa discussão, mediante as faces que essa condição humana
possui, de forma didática, resumimos que ela pode brotar de uma opção própria, em
que o indivíduo por si só, decide se afastar do convívio social; de uma situação
forçada, que ocorre quando o homem tem que lidar com a homogeneidade social
(sendo obrigado a negar sua individualidade), quando há desleixe do estado para
com a população ou quando é preciso se isolar por conta de uma pandemia. Temos
também a solidão provocada pela falta de afetividade amorosa, e a que está
relacionada a doenças emocionais.
A partir desse panorama geral sobre a solidão, voltamos o nosso olhar para o
conto Tentação. Em Tentação, Clarice Lispector não expõe explicitamente a
temática solidão, nem dá a sua personagem o direito de fala para expor os seus
conflitos. Acessamos a solidão que atravessa a vida da garota ruiva por causa da
forma como o cenário está descrito e por causa da linguagem metafórica e figurativa
que revela-se bastante introspectiva e intimista, explorando o psicológico da
personagem e seu drama íntimo.
Contudo, uma coisa é certa afirmar: “nos distinguimos uns dos outros pela
maneira como lidamos com a solidão [...] dependendo do modo como interpretamos
a origem de nossa existência” (LESSA, 2016, p. 23).
O cenário reflete o estado de espírito que vive a menina, ela sente desejo de
se encontrar, de se amparar e de se sentir completa.
Tentação faz parte da coletânea de contos que estão agrupados no livro
intitulado como: Felicidade clandestina, publicado em 1971. Inicialmente foi
publicado em A legião estrangeira 1964
O texto se constitui a partir da voz de um narrador onisciente que conta a história de
uma menina ruiva que está sentada nos degraus de sua casa em um dia de muito
sol. Essa menina se sente diferente dos demais, pois residia em um mundo de
morenos, só ela era ruiva. Mas de repente ela se depara com um cachorro que tem
a mesma cor de seus cabelos, nesse momento, ambos se olham e conseguem
encontrar-se/completar-se no outro.
Tendo como temática solidão, o conto retrata esse sentimento como uma condição
inerente do homem. A condição da menina ruiva é de um sujeito solitário, e essa
condição está ligada a sua diferença. O conto, reflete bem essa condição. Os
elementos, a discrição do espaço, o psicológico da personagem simbolizam
claramente essa situação.
Todo o cenário se constitue solitário. Começando pela descrição inicial.
Rua vazia, ninguém na rua, apenas uma pessoa inutilmente esperando um bonde.
Ao usar o termo inutilmente, podemos concluir que o fato de ter uma pessoa próxima
da menina não lhe tirava a sensação de estar só. presença da pessoa era inútil, a
solidão sentida quando se está acompanhada. Mesmo com a presença daquela
pessoa, a menina se sentia só o vazio tomava conta do seu eu.
A menina estava com soluço.
A cor vermelha, cabeça flamejante, pedras vibravam de calor – ambas a colocações
figuram sentidos denotativo e conotativos, referem-se a fenômenos comuns, estado
resultante do sol que te, mas remete-se a cor vermelha. A cor vermelha representa
guerra, conflito, sangue. Cor viva, fogo. Dicionário de símbolos.
Elementos que simbolizam solidão (pedra, vazio,
“E como se não bastasse seu olhar submisso e paciente, o soluço a interrompia de
momento a momento, abalando o queixo que se apoiava conformado na mão.” A
imagem da menina reflete a imagem da estátua do pensador. A menina estava
mergulhada em seus pensamentos, o soluço, que aqui representa a
“Os pêlos de ambos eram curtos, vermelhos. Que foi que se disseram? Não se
sabe. Sabe-se apenas que se comunicaram rapidamente, pois não havia tempo.
Sabe-se também que sem falar eles se pediam. Pediam-se com urgência, com
encabulamento, surpreendidos”.
O fato de o cão ser semelhante a ela, a faz sentir-se alguém. A menina não
suportava ser diferente dos demais, não suportava ser única no mundo. Lhe falta a
compreensão de que todo ser humano é um,
O basset ruivo afinal despregou-se da menina e saiu sonâmbulo. Ela ficou espantada, com o
acontecimento nas mãos, numa mudez que nem pai nem mãe compreenderiam. Acompanhou-o com olhos
pretos que mal acreditavam, debruçada sobre a bolsa e os joelhos, até vê-lo dobrar a outra esquina.
Mas ele foi mais forte que ela. Nem uma só vez olhou para trás
Por um instante sua solidão foi rompida, mas não demorou muito para ela
reacender-se. A menina volta ao estado anterior ao ver indo embora o basset, ela
ALGUMAS CONSIDERAÇÕES
6 REFERÊNCIAS