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Trauma Raquimedular

Igor Kunze Rodrigues


Neurocirurgia
HGCR
Introdução
 Incidência das fraturas da coluna vertebral tem aumentado nas últimas
décadas
 Distribuição das fraturas ao longo da coluna vertebral:
- não é homogênea
- relacionada c/ # anatômicas e funcionais dos # segmentos da coluna
vertebral
 Fraturas coluna tóraco- lombar: > freqüentes (89% Fx esqueleto axial)

Distribuição percentual das fraturas


nas diferentes vértebras.
(Fonte Rehn, 1968)
Lesão Medula Espinhal (LME):
 ~15-20% Fx coluna vertebral
 Incidência:
- EUA: 32 a 52 casos novos anuais / milhão de habitantes
- Brasil: 40 casos novos anuais / milhão de habitantes
 Epidemiologia:
- sexo: masculino (4H:1M)
- faixa etária: 15 e 40 anos
 Custo: US $ 300 milhões / ano (1)
 Localização: 2/3 no segmento cervical (2)

Obs: A localização anatômica da lesão está diretamente relacionada ao mecanismo de


trauma

1. Dickson, R A.  Spinal Surgery – Science and practice.(Thoracolumbar injuries) Butterworths, London, 1990, p.307 - 323.
2. Willen, J ; Anderson, J; Toomoka, K; et al. The natural history of burst fractures at the thoracolumbar junctions. J Spinal Disord,
3:39 - 46, 1990.
Causas
 Acidente automobilístico
 Quedas de altura
 Mergulho em água rasa
 Ferimento por arma de fogo

Considerações:
 Conhecimento dados epidemiológicos:
- importante para a elaboração de medidas e ações preventivas 
↓ incidência Fx + prevenção seqüelas decorrentes de lesão da medula
- campanhas preventivas e de esclarecimento junto à população
- estimular Liga do Trauma a essa iniciativa
Anatomia
 Coluna Vertebral: 33 a 34
vértebras (7 VC, 12 VT, 5 VL,
5 VS, 4-5 VCo)
 Canal vertebral: parede
posterior do corpo vertebral +
parede anterior do arco
vertebral
 Canal Raquídeo: superposição
dos vários canais vertebrais

- aloja e protege a medula


espinhal
Medula Espinhal
I- MORFOLOGIA EXTERNA
1. Limites:
1.1- Superior
1.2- Inferior
2. Dilatações:
2.1- Intumescência cervical
2.2- Intumescência lombar
3. Cone Medular
4. Fio Terminal
5. Cauda Eqüina
6. Sulcos:
6.1- fisssura mediana anterior
6.2- sulco mediano posterior
6.3- sulco lateral anterior
6.4- sulco lateral posterior
6.5-sulco interrmédio
7. Funículos:
7.1- anterior
7.2- lateral
7.3- posterior
7.1.1- fascículo grácil
7.1.2- fascículo cuneiforme
II- ENVOLTÓRIOS MEDULARES (MENÍNGES):
1. Conceito
2. Tipos
2.1- Dura-máter
2.1.1- saco dural
2.1.2- filamento DM espinhal
2.1.3- ligamento coccígeo
2.2- Aracnóide
2.2.1- trabéculas aracnoídeas
2.3- Pia-máter:
2.3.1- ligamentos triangulares
2.3.2- ligamentos denteados
3. Espaços entre as menínges
3.1- epidural (extradural)
3.2- subdural
3.3- subaracnoídeo
III- NERVOS ESPINHAIS
1. Conceito
2. Formação
2.1- raiz dorsal
2.1.1- gânglio sensitivo
2.2- raiz ventral
2.3- tronco do nervo
2.4- ramo dorsal
2.5- ramo ventral
3. Distribuição em pares
3.1- cervicais: 8
3.2- torácicos: 12
3.3- lombares: 5
3.4- sacrais: 5
3.5- coccígeo: 1
TOPOGRAFIA VÉRTEBRO-MEDULAR
1. Conceito de segmento medular
2. Crescimento da coluna em relação ao da medula espinhal
3. Interpretação da topografia vértebro-medular
3.1- entre C2 e T10: segmentos cervical/torácico + 2
3.2- entre T11 e T12: segmentos lombares (L1-L5)
3.3- em L1: segmentos sacrais (S1-S5) + coccígeo
3.4- em L2: final da medula

 Cada raiz nervosa recebe informações sensitivas de áreas da


pele denominada dermátomo e similarmente cada raiz inerva
um grupo de músculos denominado miótomo.
Relação anatômica dos segmentos da
medula espinhal e vértebras
 
Fisiologia
1. Trato espino-talâmico ventral – impulsos relacionados ao tato
protopático
2. Trato espino-talâmico lateral - impulsos de dor / temperatura
3. Fascículos grácil e cuneiforme – impulsos proprioceptivos
provenientes de músculos, tendões e articulações, impulsos de
localização e discriminação táteis, e sensações vibratórias como as
produzidas pelo cabo do diapasão colocado sobre um osso recoberto
de pele
4. Trato cortico-espinhal lateral e trato cortico-espinhal ventral –
as vias piramidais transmitem o impulso motor para os motoneurônios
do corno anterior
Tratos da medula espinhal.
1- Fascículo grácil e cuneiforme.
2-Trato cortiço-espinhal lateral.
3- Trato espino-cerebelar dorsal.
4- Trato espino-talâmico lateral.
5-Trato espino-cerebelar ventral.
6- Trato espino-talâmico ventral.
Fisiopatologia
 Lesão primária da medula – fase aguda (até 8 h do trauma)
 Transferência de energia cinética
 Rompimento dos axônios
 Lesão de células nervosas
 Ruptura dos vasos sangüíneos

hemorragia petequial (1° min)  necrose subst. cinzenta (1ª h)  edema


+ hemorragia ↓ fluxo sangüíneo  extensão lesão p/ sbst. branca (4-8 h)
 migração células inflamatórias + proliferação células da glia 
tecido cicatricial + cistos na ME
Fratura da coluna vertebral Aspecto macroscópico da medula
associada à lesão da espinhal de ratos após trauma por
medula espinhal contusão. Observar o edema e
a hemorragia
 Lesão secundária
alt. canal vertebral / hemorragia / edema / ↓ PA ↓ fluxo sangüíneo p/ ME
 lesão adicional
 Separação axônios: processo gradual (após alguns dias); relacionado à
lesão membrana celular e não da separação física imediata do axônio
 Isquemia do SNC:
influxo Ca+2 + reações metabólicas (falha mitocôndrias + ativação das
fosfolipases, proteases e adenosina trifosfatase)  formação radicais
livres  peroxidação lipídica  perda energia e colapso da membrana
celular
 Metilprednisolona até 8 horas pós TRM  inibir peroxidação lipídica (3)

3. Haher, TR ; Felmy, WT ; Baruch, H et al. The contribution of the three columns of the spine
to rotational stability: A biomechanical model. Spine, 14:663, 1989.
Avaliação clínica
1. Avaliação do paciente no local do acidente - reconhecimento de lesões e
prevenção de lesões adicionais no transporte
 Considerar a presença de lesão da coluna vertebral e a manutenção
da imobilização até definição diagnóstica
2. Anamnese
Presença TCE, intoxicação alcoólica, lesões múltiplas, traumas faciais e
acima da clavícula  probabilidade ocorrência FX coluna vertebral
3. Exame físico (ATLS)
- sem lesão neurológica: dor local (± irradiação membros) + incapacidade funcional
+ espasmo mm.
- com lesão medular: respiração diafragmática, perda da resposta ao estímulo
doloroso, incapacidade de realizar movimentos voluntários nos membros,
alterações do controle dos esfíncteres, priapismo e presença de reflexos
patológicos
4. Exame neurológico
- Perda de resposta aos estímulos dolorosos abaixo da lesão
- Incapacidade de realizar movimentos voluntários nos membros
- Alterações no controle de esfíncteres
- Choque neurogênico:
 queda de PA
 bradicardia
 Função motora
- Avaliação: flexores do cotovelo (C5), flexores do punho (C6), extensores
do cotovelo (C7), flexores do dedo (C8), abdutores (T1), flexores do
quadril (L2), flexores do joelho (L3), dorsiflexores do tornozelo (L4),
extensor longo dos dedos (L5), flexores plantares do tornozelo (S1)
- Graduação: paralisia (0); contração muscular palpável ou visível (1);
movimento ativo, mas que não vence a força da gravidade (2);
movimento ativo que vence a força da gravidade (3); movimento ativo
que vence alguma resistência (4) e movimento ativo normal (5)

 Sensibilidade
- Avaliação: mamilos (T4), processo xifóide (T7), umbigo (T10), região
inguinal (T12 - L1) e região perineal (S2-3-4)

 Reflexos tendinosos profundos e reflexo bulbo-cavernoso


- Avaliação: bicipital (C5), estiloradial (C6), tricipital (C7), patelar (L4) e
aquileu (S1)
IMPORTANTE DEFINIR CLINICAMENTE
 Nível da lesão neurológica

Segmento mais caudal da medula espinhal que


apresenta as funções sensitiva e motora normais em
ambos os lados.
 Nível sensitivo

Segmento mais caudal da medula espinhal que


apresenta sensibilidade normal.
Classificação das lesões
traumáticas de coluna
CONCEITOS BÁSICOS:
 Lesão medular completa – quando existe ausência

de sensibilidade e função motora nos segmentos


sacrais baixos
 Lesão medular incompleta – quando é observada

preservação parcial das funções motoras abaixo do


nível da lesão
 Tetraplegia - perda da função motora e sensitiva

nos segmentos cervicais


 Paraplegia - perda da função motora e sensitiva

nos segmentos torácicos, lombares ou sacrais


SÍNDROMES MEDULARES
 Síndrome da medula central

Ocorre principalmente na região cervical e


apresenta comprometimento mais acentuado
dos membros superiores que dos inferiores.
 Síndrome da medula anterior

Ocorre preservação da propriocepção e perda


da função motora e sensibilidade dolorosa.
 Síndrome de Brown-Séquard
Ocorre na hemissecção medular e ocasiona
perda da função motora e proprioceptiva
do lado da lesão e perda da sensibilidade
a dor e a temperatura do lado oposto.
 Síndrome da medula posterior

Ocorre perda da sensibilidade profunda.


 Síndrome da cauda eqüina
Lesão isolada dos nervos espinhais da cauda
eqüina.
O quadro clínico depende da raiz atingida,
podendo ser observado:
- paresia de membros inferiores
- arreflexia
- distúrbio da sensibilidade
- incontinência vesical e fecal
Avaliação clínica
Avaliação da ASIA (American Spine Injury Association)
 Exame da Sensibilidade: avaliação da sensibilidade tátil e dolorosa nos
28 dermátomos de ambos os lados:
- Achado clínico: (0) ausente, (1) alterada, (2) normal e (NT) não testada
- Esfíncter anal externo: lesão completa X incompleta (sensibilidade
presente ou ausente)
 Exame da Função Motora: avaliação de 10 pares de miótomos:
- Graduação: (0) paralisia, (1) contração palpável ou visível, (2)
movimento ativo eliminado pela força da gravidade, (3) movimento
ativo que vence a força da gravidade, (4) movimento ativo contra
alguma resistência, (5) normal e NT (não testada).
- Avaliação: flexores do cotovelo (C5), flexores do punho (C6), extensores
do cotovelo (C7), flexores do dedo (C8), abdutores (T1), flexores do
quadril (L2), flexores do joelho (L3), dorsiflexores do tornozelo (L4),
extensor longo dos dedos (L5), flexores plantares do tornozelo (S1)
Avaliação da ASIA
(American Spine Injury Association)
Avaliação da deficiência (Escala de Frankel)
A- Lesão completa: não existe função motora ou sensitiva nos
segmentos sacrais S4 - S5.
B- Lesão incompleta: preservação da sensibilidade e perda da
força motora abaixo do nível neurológico estendendo - se até os
segmentos sacrais S4 - S5.
C- Lesão incompleta - função motora é preservada abaixo do
nível neurológico, e a maioria dos músculos chaves abaixo do
nível neurológico possui grau menor ou igual a 3.
D- Lesão incompleta - função motora é preservada abaixo do
nível neurológico e a maioria dos músculos chaves abaixo do
nível neurológico possui grau maior ou igual a 3.
E- Normal – sensibilidade e força motora normais.
Avaliação radiológica
 Rx AP/ Perfil
 Radiografia dinâmica

contra-indicada em paciente com déficit


neurológico ou inconsciente
 Ressonância magnética de coluna

auxilia o diagnóstico do TRM e sempre que


possível deve ser utilizada na fase inicial do
diagnóstico.
Instabilidade clínica e radiológica
White and Panjabi:
 ”Estabilidade vertebral é a capacidade da coluna vertebral ser
submetida a cargas fisiológicas de deslocamento de modo a não
lesionar ou irritar a medula espinhal e nervos espinhais e além
disso prevenir deformidade incapacitante ou dor devido a
alterações estruturais.”
 Instabilidade refere-se ao excessivo deslocamento da coluna
vertebral que resulta em déficit neurológico, deformidade ou
dor.
Colunas de Denis:
 Instabilidade = comprometimento de pelo menos 2 das 3
colunas de Denis
Colunas de Denis
  CUIDADO


Tratamento Clínico
 Precoce – no momento do atendimento
 ABC (ATLS)

 Metilprednisolona(4) até 8h após o trauma

- Dose de ataque - 30mg/kg


- Dose de manutenção – 5,4mg/kg/h contínuo em 23h
- Ação: reduzir a peroxidação lipídica e preservar a
integridade das estruturas neuronais, atuando em
nível da lesão secundária devido à isquemia e ação
dos radicais livres.

4. NASCIS I e II (National Spinal Cord Injury Study), realizados em 1990 e 1992


Métodos conservadores de tratamento das fraturas da coluna vertebral.
Colar cervical (A), gesso Minerva (B), tração com halo craniano (C),
halo-gesso (D) e colete de gesso (E).
Tratamento Cirúrgico
Indicações do tratamento cirúrgico:
 Instabilidade do segmento vertebral e lesão neurológica
Objetivos do tratamento definitivo
- Preservar a anatomia e função da medula espinhal
- Restaurar o alinhamento da coluna vertebral
- Estabilizar o segmento lesado
- Prevenir as complicações gerais e locais
- Restabelecer de forma precoce as atividades do paciente
Fixação segmento vertebral c/ implantes especiais (placas, parafusos, hastes) e artrodese
vertebral
 Na impossibilidade do tratamento definitivo:
Tração de coluna – Mantém a redução da fratura e o realinhamento do canal vertebral.

Obs: Não existe até o momento nenhum tratamento cirúrgico capaz de restaurar as
funções da medula espinhal lesada e o objetivo do tratamento cirúrgico das fraturas
da coluna vertebral é apenas o realinhamento do segmento vertebral fratura e
restauração da estabilidade do segmento vertebral , de modo a evitar lesões
adicionais.
OBRIGADO

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