Você está na página 1de 202

Departamento de Educação da Faculdade de Ciências

Universidade de Lisboa

A PROMOÇÃO DO PENSAMENTO ATRAVÉS DA


DISCUSSÃO DOS NOVOS AVANÇOS NA ÁREA DA
BIOTECNOLOGIA E DA GENÉTICA

PEDRO GUILHERME ROCHA DOS REIS

Mestrado em Educação

1997
ii
Departamento de Educação da Faculdade de Ciências

Universidade de Lisboa

A PROMOÇÃO DO PENSAMENTO ATRAVÉS DA


DISCUSSÃO DOS NOVOS AVANÇOS NA ÁREA DA
BIOTECNOLOGIA E DA GENÉTICA

PEDRO GUILHERME ROCHA DOS REIS


Licenciado em Ensino da Biologia

Universidade de Lisboa

Tese Apresentada para Obtenção do Grau de Mestre em Educação

na Especialidade de Didáctica das Ciências

Professora Orientadora: Mariana Pereira

Este estudo foi subsidiado pelo Instituto de Inovação Educacional

1997

iii
iv
AGRADECIMENTOS

Uma palavra de agradecimento a todos os que me auxiliaram nesta viagem

por “Novos Mundos”. Uma viagem marcada, muitas vezes, pela aventura, por

descobertas, por recompensas, por “Cabos da Boa Esperança”; outras vezes, por

dificuldades, por obstáculos, por “Cabos das Tormentas”.

À minha orientadora, Professora Mariana Pereira, que me guiou nesta

viagem, assinalando escolhos, ventos e correntes.

Aos meus Pais a quem tudo devo e que me incutiram o gosto pela

descoberta.

À Rute, pelo apoio precioso nesta “viagem”, eliminando escolhos e lendo e

revendo as várias versões deste “Diário de Bordo”.

A todos os professores e alunos que participaram empenhadamente e

entusiasticamente nesta aventura.

Ao Conselho Directivo da Escola Secundária Marquês de Pombal, por toda

a disponibilidade manifestada.

Às Professoras Isabel Neves e Graça Fialho pelos comentários pertinentes

a alguns “Instrumentos de Viagem”.

Ao Instituto de Inovação Educacional pelo seu apoio financeiro (projecto no

âmbito da medida 2 do SIQE — contrato nº 6/95).

v
vi
ÍNDICE

ÍNDICE DE QUADROS xi

CAPÍTULO 1 CONTEXTUALIZAÇÃO DO ESTUDO 1

CAPÍTULO 2 QUADRO DE REFERÊNCIA TEÓRICO 5

2.1 O ENSINO DAS CIÊNCIAS E A EDUCAÇÃO PARA A CIDADANIA 6

2.2 ENSINAR A PENSAR 14

2.2.1 Será Necessário Ensinar a Pensar? 15

2.2.1.1 Posição de Smith 15

2.2.1.2 Posição de de Bono 18

2.3 ACTIVIDADES DE DISCUSSÃO NA SALA DE AULA —


IMPORTÂNCIA DA INTERACÇÃO NA CONSTRUÇÃO DO
CONHECIMENTO 23

2.3.1 Actividades de Discussão na Sala de Aula — Definição,


Potencialidades e Dificuldades 23

2.3.2 A Discussão de Assuntos Controversos 26

2.3.3 A Interacção na Construção do Conhecimento 32

2.3.3.1 A construção social da inteligência 33

2.3.3.2 A aprendizagem cooperativa 37

CAPÍTULO 3 METODOLOGIA 43

vii
3.1 OBJECTO DE ESTUDO 43

3.2 ABORDAGEM SELECCIONADA 44

3.3 AMOSTRA 48

3.4 INSTRUMENTOS 50

3.4.1 As Actividade de Discussão 50

3.4.1.1 Actividade 1 54

3.4.1.2 Actividade 2 57

3.4.1.3 Actividade 3 59

3.4.1.4 Actividade 4 61

3.4.1.5 Actividade 5 67

3.4.2 Observação das Actividades 68

3.4.3 Entrevistas aos Professores 69

3.4.4 Questionário para Avaliação das Actividades pelos Alunos 70

3.4.5 Questionário para Levantamento das Opiniões dos Alunos


sobre Biotecnologia 71

3.5 MÉTODO DE INVESTIGAÇÃO: OS SEIS CHAPÉUS DO


RACIOCÍNIO 72

3.5.1 Raciocínio à Chapéu Branco 75

3.5.2 Raciocínio à Chapéu Vermelho 75

3.5.3 Raciocínio à Chapéu Amarelo 76

3.5.4 Raciocínio à Chapéu Preto 76

3.5.5 Raciocínio à Chapéu Verde 77

3.5.6 Raciocínio à Chapéu Azul 77

3.6 TÓPICOS SELECCIONADOS: CONTROVÉRSIAS EM TORNO DA


BIOTECNOLOGIA 78

3.7 FASES DO ESTUDO 81

viii
CAPÍTULO 4 RESULTADOS 85

4.1 APRESENTAÇÃO DOS RESULTADOS 86

4.1.1 Dados de observação 86

4.1.1.1 Chapéu branco (factos e informações sobre a


implementação das actividades) 86

4.1.1.2 Chapéu vermelho (emoções e sentimentos


manifestados ou evidenciados pelo professor ou pelos
alunos relativamente às actividades) 87

4.1.1.3 Chapéu amarelo (reacções positivas às actividades) 87

4.1.1.4 Chapéu preto (reacções negativas às actividades) 88

4.1.1.5 Chapéu verde (comentários ou comportamentos que


sugiram alterações capazes de melhorar as actividades) 88

4.1.1.6 Chapéu azul (avaliação geral da forma como


decorreram as actividades) 89

4.1.2 Dados dos Questionários de Avaliação das Actividades


pelos Alunos 89

4.1.2.1 Chapéu vermelho (sentimentos, emoções, palpites,


intuições) 90

4.1.2.2 Chapéu amarelo (aspectos positivos, vantagens,


benefícios) 93

4.1.2.3 Chapéu preto (aspectos negativos, fraquezas,


problemas) 96

4.1.2.4 Chapéu verde (sugestões, novas ideias,


alternativas) 99

4.1.2.5 Chapéu azul (avaliação global) 101

4.1.3 Dados das Entrevistas aos professores 104

4.1.3.1 Chapéu vermelho (sentimentos, emoções, palpites,


intuições) 104

ix
4.1.3.2 Chapéu amarelo (aspectos positivos, vantagens,
benefícios) 107

4.1.3.3 Chapéu preto (aspectos negativos, fraquezas,


problemas) 111

4.1.3.4 Chapéu verde (sugestões, novas ideias,


alternativas) 111

4.1.3.5 Chapéu azul (avaliação global) 113

4.1.4 Dados dos Questionários de Opinião sobre Biotecnologia 116

4.1.4.1 Crescimento científico e tecnológico e bem estar


social 116

4.1.4.2 Engenharia genética - potencialidades e perigos 117

4.1.4.3 Análise do património genético - potencialidades e


perigos 120

4.1.4.4 Os cidadãos e a Biotecnologia 123

4.1.4.5 Controlo da investigação na área da Biotecnologia 125

4.2 ANÁLISE DOS RESULTADOS 126

CAPÍTULO 5 CONSIDERAÇÕES FINAIS, EXTENSÃO E


DESENVOLVIMENTO 135

ANEXOS 141

REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS 177

x
ÍNDICE DE QUADROS

Quadro 1 - Síntese da Sequência das Actividades 52

Quadro 2 - Síntese do Estudo 82

Quadro 3 - Crescimento Científico e Tecnológico e Bem Estar Social 117

Quadro 4 - Sentimentos Relativamente à Engenharia Genética 118

Quadro 5 - Engenharia Genética e Melhoramento dos Seres Vivos 119

Quadro 6 - Utilização do Diagnóstico Genético 120

Quadro 7 - Diagnóstico Genético e Aborto Terapêutico 121

Quadro 8 - Diagnóstico Genético e Eugenia 122

Quadro 9 - Conhecimento das Potencialidades e dos Limites da


Biotecnologia 123

Quadro 10 - Tomada de Decisões na Área da Biotecnologia 124

Quadro 11 - Controlo da Investigação na Área da Biotecnologia 125

xi
xii
CAPÍTULO 1
CONTEXTUALIZAÇÃO DO ESTUDO

Vivemos numa época marcada por uma evolução vertiginosa da Ciência e

da Tecnologia e pelos aspectos positivos e negativos a elas associados. O

conceito de ciência como disciplina neutral, autónoma, desinteressada e desligada

da sociedade e de questões morais e sociais, tem sido progressivamente

ultrapassado desde os anos 30 e 40 (Santos, 1987; Miguéns, Serra, Simões e

Roldão, 1996). Actualmente, são evidentes as influências e a importância da

ciência e das suas aplicações tecnológicas na sociedade em geral e na vida de

cada um de nós em particular: são inegáveis tanto os seus contributos para o

desenvolvimento económico e social e para o bem estar dos cidadãos como os

seus efeitos negativos traduzidos em problemas ambientais, económicos, sociais,

culturais e éticos. A resolução destes problemas e a consequente melhoria das

condições de vida dependerão, necessariamente, da intervenção da Ciência e do

envolvimento activo e informado de toda a população. Qualquer Sociedade

democrática dependerá de cidadãos capazes de construírem opiniões

fundamentadas, de participarem em discussões, debates e processos de tomada

de decisão (Millar, 1997). Assim, torna-se vital uma educação científica, alargada a

toda a população, relevante para a vida dos cidadãos e que tenha em conta os

seus interesses e as suas diferenças (De Boer, 1991). Uma educação científica: (1)

na qual a pesquisa de informação, a argumentação, a reflexão, a tomada de

decisões e o debate, centrados em assuntos controversos, se sobreponha à

1
transmissão e à memorização acrítica de informação; e (2) que seja baseada tanto

na construção de conhecimentos como na promoção de capacidades de

pensamento e de atitudes e valores susceptíveis de assegurar, aos cidadãos do

futuro, um papel activo, construtivo e responsável na evolução da sociedade.

Em Portugal, apesar da reforma educativa, iniciada no final dos anos 80, ter

subjacente uma filosofia educativa e curricular que realça os aspectos formativos e

de desenvolvimento pessoal e social e a interacção Ciên-

cia-Tecnologia-Sociedade, tal facto teve um impacto limitado nas práticas de sala

de aula (Miguéns, Serra, Simões e Roldão, 1996). Segundo Valente (1995), o

grande desafio que se coloca ao ensino das Ciências em Portugal consiste na


passagem de uma cultura de ciência sem responsabilidade e sem paixão pelos

problemas da Sociedade para uma cultura de ciência destinada a responder às

necessidades pessoais e sociais do Homem.

No entanto, têm existido dificuldades na passagem da retórica curricular

para a prática pedagógica: importa passar das ideias à acção. Para tal, torna-se

necessário, simultaneamente, desenvolver materiais e metodologias capazes de

promoverem os objectivos atrás descritos e divulgá-los e discuti-los em contexto de

formação inicial e contínua de professores. O presente estudo procura responder a

esta necessidade através da construção, aplicação e avaliação de um conjunto de

actividades de discussão e de reflexão em grupo sobre assuntos controversos na

área da Genética e da Biotecnologia. Posteriormente, desejam-se utilizar os

conhecimentos construídos neste estudo na formação inicial e contínua de

professores — áreas de intervenção do autor deste trabalho.

Esta investigação pretende identificar indícios de eventuais potencialidades

do tema e da metodologia destas actividades no aumento da literacia científica e

na educação para a cidadania baseadas na construção e compreensão de

conhecimentos relevantes para a vida e na promoção do pensamento dos alunos.

Assim, são investigadas:

2
1. as potencialidades do tema proposto: “Os novos avanços na área da

Biotecnologia e da Genética e das suas inter-relações com a Sociedade”;

2. as potencialidades da utilização da discussão em grupo como

metodologia; e

3. as potencialidades da utilização d’“Os Seis Chapéus do Raciocínio” (de

Bono, 1985, 1995) como método de tomada de decisões, capaz de

reduzir a confusão no raciocínio e de ajudar os alunos a efectuarem

escolhas pessoais através da análise das situações, da clarificação dos

seus valores e da avaliação das consequências das suas opções.

Dado que se pretendia avaliar um material didáctico, destinado à


aprendizagem em contexto natural, considerou-se importante efectuar este estudo

em contexto escolar real. Os professores e os alunos, como parte interessada no

processo de ensino-aprendizagem, não funcionaram apenas como objectos de

estudo, tendo sido convidados a contribuirem com as suas opiniões e avaliações

relativamente às actividades realizadas.

O facto deste estudo ter recorrido ao ambiente natural de sala de aula como

fonte directa de dados e de se centrar mais no processo do que nos produtos

justificou uma abordagem essencialmente qualitativa. Como instrumentos de

investigação foram utilizados questionários dirigidos aos alunos e efectuadas

observações directas das aulas e entrevistas semi-estruturadas aos professores

participantes. Tanto as respostas dos alunos ao questionário de avaliação das

actividades como as transcrições das entrevistas aos professores foram

submetidas a uma análise de conteúdo que utilizou vários níveis de categorias.

O segundo capítulo deste trabalho contém o referencial teórico que serviu

de base à discussão dos resultados da investigação. O terceiro capítulo, centrado

na metodologia, inclui as opções metodológicas da investigação, o objecto de

estudo, a caracterização da amostra seleccionada, a descrição dos instrumentos e

da metodologia utilizados e as fases da investigação. No quarto capítulo são

3
apresentados e analisados os diferentes dados recolhidos. Finalmente, no quinto

capítulo, tecem-se algumas considerações finais e sugerem-se possíveis

extensões e desenvolvimentos para o presente estudo.

4
CAPÍTULO 2
QUADRO DE REFERÊNCIA TEÓRICO

Atendendo a que o presente estudo pretende identificar indícios das

potencialidades de um conjunto de actividades de discussão e de reflexão em

grupo, sobre assuntos controversos na área da Genética e da Biotecnologia, no

aumento da literacia científica e na educação para a cidadania através da

construção e compreensão de conhecimentos relevantes para a vida e da

promoção do pensamento dos alunos, o seu referencial teórico é constituído pelos

seguintes aspectos:

• A relação entre o ensino das Ciências e a educação para a cidadania;

• As opiniões opostas de dois autores sobre a possibilidade e a necessidade

de ensinar a pensar; e

• A discussão de assuntos controversos como método pedagógico —

importância da interacção na construção do conhecimento.

A revisão da literatura sobre cada um destes aspectos, e que a seguir se

apresenta, serviu de base à discussão dos resultados do estudo.

5
2.1 O Ensino das Ciências e a Educação para a Cidadania

A real liberdade humana só existe, só se concretiza na vida do


dia-a-dia, enquanto cada pessoa normal pensa, exprime-se e
decide por si, medindo reflectidamente os riscos das opções e
decisões, assumindo as próprias responsabilidades face aos
outros membros da comunidade, seguindo os ditames da própria
consciência moral, adequadamente esclarecida e afinada pelos
grandes valores éticos da humanidade.

Domingues (1996, p. 72)

O conceito de cidadania pode ser definido como o vínculo entre um

indivíduo e o Estado; a matriz de onde decorrem os direitos de um indivíduo face

ao Estado (inclusivé o de participar constitutivamente na formação da vontade

soberana deste último) e as suas obrigações perante ele (Enciclopédia

Luso-Brasileira de Cultura). A educação para a cidadania, ou seja, a preparação

intelectual e afectiva dos jovens para o desempenho consciente dos seus papéis

numa sociedade democrática através do aprofundamento de valores, atitudes e

práticas constitui um dos objectivos gerais, tanto do ensino básico como do ensino

secundário, consagrados na Lei de Bases do Sistema Educativo (Lemos Pires,

1987). Este mesmo objectivo é realçado pelos programas das disciplinas de

Ciências da Natureza (5º e 6º anos) e de Ciências Naturais (7º e 8º anos) que

apontam a escola como um espaço privilegiado na preparação dos alunos para um

mundo necessariamente muito diferente do actual (Ministério da Educação, 1991 a,

b). A promoção de valores como a responsabilidade, a sensibilidade, a ponderação

e o espírito de independência é considerada, pelos autores de programas da área

de Ciências, tão importante como a aquisição de conhecimentos. Consideram que

"estes valores, devem integrar a personalidade dos alunos em formação,

possibilitando-lhes a capacidade de viver num mundo interdependente,

caracterizado pela diversidade e evolução rápida e constante", conforme vem

6
referido nos Programas de Biologia do 12º ano e de Ciências da Terra e da Vida

dos 10º e 11º anos (Ministério da Educação, 1991 c, d). Estes programas referem,

assim, como grandes objectivos do ensino em Ciências Naturais:

• O desenvolvimento do aluno como indivíduo autónomo e criativo, vivendo

numa Sociedade científica e tecnológica;

• A aquisição de um saber fazer e da capacidade de pensar por si próprio;

• O desenvolvimento da capacidade de ouvir os outros e de fundamentar as

suas opiniões;

• A aplicação de conhecimentos no desenvolvimento de atitudes morais e

sociais com vista à integração do aluno na realidade envolvente;


• A avaliação das possibilidades que os conhecimentos das Ciências

Naturais oferecem como factores de desenvolvimento das pessoas e das

Sociedades; e

• A estimulação duma visão mais humana da Ciência, fomentando a

compreensão das relações entre Ciência/Tecnologia/Sociedade e de como elas

interactuam.

A educação para a cidadania tem constituído, desde o século XVIII, uma das

principais justificações para o ensino em geral e para o ensino das Ciências em

particular. Já o Marquês de Condorcet (1743-94), matemático e político do período

da Revolução Francesa, encarava a Ciência como parte integrante dum corpo de

conhecimentos básicos indispensável à independência intelectual de qualquer

cidadão e ao desempenho de um papel activo na Sociedade (Cross & Price, 1992).

Uma posição semelhante foi defendida por John Dewey, o qual encarava a Ciência

como um elemento de libertação dos indivíduos, relativamente a um tempo e

espaço particulares, e de abertura e iluminação de horizontes intelectuais (Dewey,

1916). Bernal (1946) escreveu que a educação científica deve proporcionar a

compreensão do papel da Ciência na Sociedade de forma a que a grande maioria

dos cidadãos não envolvidos em investigação científica possa colaborar

7
inteligentemente com os cientistas e estar apta a avaliar, a criticar, os efeitos da

Ciência na Sociedade. Esta mesma opinião é defendida por autores

contemporâneos como Cross e Price (1991, 1992, 1996) e Hurd (1993, 1994).

Boateng (citado em Burkimsher, 1993) identifica três elementos necessários

à cidadania: sentimento de pertença, capacidade de obter acesso e capacidade de

participar. Destes três elementos, relacionados e interdependentes, o primeiro está

relacionado com a partilha de um conjunto de valores, o segundo e o terceiro estão

relacionados com atitudes, conhecimentos e capacidades que tornam possível a

cidadania. Burkimsher vê a escola como o principal recurso na educação para a

cidadania: “simplesmente pelo facto de pertencerem à escola, os seus membros


podem adquirir conhecimento, compreensão e capacidades, e têm a oportunidade

de desenvolver valores e atitudes (...). O exercício de direitos, responsabilidades e

deveres é demonstrado e praticado na escola” (p. 8). Defende a utilidade de

actividades como a discussão de assuntos controversos, a participação em

trabalhos de grupo e a avaliação das aulas e das disciplinas na preparação para a

vida em Sociedade. Considera o trabalho de grupo em que os alunos colaboram

com um objectivo comum como o ponto fulcral da educação para a cidadania: “A

variação da dimensão e composição do grupo permite aos alunos aprenderem a

trabalhar com pessoas diferentes” (p. 11). Realça, ainda, a importância e a

necessidade da educação para a cidadania resultar de aprendizagens, activas e

vivenciais, que proporcionem contextos para a aquisição de conhecimentos e de

capacidades como as que se encontram envolvidas em: auto-avaliação,

estabelecimento de relações, trabalho com outros, organização, comunicação,

recolha e análise de informação, tomada de decisão, expressão de opiniões,

debate e resolução de conflitos.

Actualmente, a literacia científica é considerada indispensável a uma

cidadania moderna e democrática; a participação democrática e a compreensão de

questões sociais, económicas e tecnológicas requerem uma cultura científica

8
partilhada pela vasta maioria da população (AAAS, 1989; European Commission &

Calouste Gulbenkian Foundation, 1995; ERT, 1995). A revisão da literatura

efectuada para esta investigação permitiu constatar a existência de várias

definições para o termo “literacia científica”:

• Segundo Klopfer (1985), a literacia científica deverá englobar: a) o

conhecimento de factos, conceitos, princípios e teorias significativas; b) a

capacidade de aplicar conhecimentos relevantes sobre Ciência a situa-

ções do dia-a-dia; c) a capacidade de utilizar os processos do inquérito

científico; d) a compreensão de ideias gerais sobre as características da

Ciência e as interacções Ciência-Tecnologia-Sociedade; e e) a posse de


atitudes e interesses esclarecidos relacionados com a Ciência.

• O documento Science for all americans: Project 2061, produzido pela

American Association for the Advancement of Science em 1989, aponta

como objectivos a alcançar tendo em vista a literacia científica: a) a

familiarização com o mundo natural e o reconhecimento da sua diversi-

dade e unicidade; b) a compreensão de conceitos e de princípios “chave”

da Ciência; c) a tomada de consciência da dependência entre Ciência,

Matemática e Tecnologia; d) o conhecimento da Ciência, da Matemática e

da Tecnologia como empreendimentos humanos com aspectos positivos

e limitações; e) a capacidade de efectuar formas de pensamento

científico; e f) a utilização de conhecimentos científicos e de formas de

pensamento para fins sociais. Este documento reforça a integração do

conhecimento, a diminuição da ênfase em informação detalhada e uma

maior ênfase em ideias e em capacidades de pensamento.

• Mariano Gago (1990) entende literacia científica como o desenvolvimento

de hábitos culturais capazes de permitirem, ao longo da vida, a recriação

de capacidades de compreensão e aprendizagem de conhecimentos

9
científicos básicos, bem como a sua articulação com outros domínios

culturais.

• Em 1993, Sutman define um indivíduo cientificamente literado como

aquele capaz de continuar a aprender Ciências, a desenvolver processos

científicos e a comunicar aos outros os resultados da sua aprendizagem

(Sutman, 1996).

• Shamos (1995) propõe uma definição de literacia científica que implica: a)

o conhecimento do funcionamento da Ciência e da Tecnologia; b) o

conhecimento público do que é a Ciência, mesmo que se conheça pouco

de Ciência; c) a compreensão pública do que se pode esperar da Ciência;


e d) o conhecimento de como a opinião pública relativa à Ciência poderá

ser ouvida de forma mais eficaz.

• Para Miguéns, Serra, Simões e Roldão (1996), “a literacia científica inclui

as capacidades de observar e reflectir sobre acontecimentos ou

problemas, compreender o que está em causa e usar esses

conhecimentos e capacidades de forma racional para uma tomada de

decisão informada e consciente (p. 25).

Segundo Shamos, o facto do termo “literacia científica” nunca ter sido

claramente definido em termos operacionais poderá estar na base do relativo

insucesso dos educadores em alcançarem tão almejado objectivo: “Actualmente, o

objectivo da “literacia científica” tornou-se praticamente sinónimo de ensino das

Ciências apesar da sua definição se manter vaga e de se desconhecerem os

métodos de o alcançar” (p. 158). No entanto, Bisanz, Bisanz, Korpan e Zimmerman

(1996) identificam três elementos comuns às diferentes definições de literacia

científica: a) a familiaridade com factos, conceitos e processos científicos; b) o

conhecimento de métodos e de procedimentos de investigação científica; e c) a

compreensão do papel da Ciência e da Tecnologia na Sociedade.

10
A vida de qualquer cidadão, na Sociedade em que vivemos, corre o risco de

se assemelhar a uma viagem num comboio de alta velocidade que apenas permite

aos viajantes rápidos vislumbres da paisagem; a evolução/mutação extremamente

rápida da Sociedade actual, associada à iliteracia científica, impossibilita uma

focagem/reflexão aprofundada, da maioria dos cidadãos, sobre as opções actuais

na área da Tecnologia. Porter (1986) afirma que “a Ciência torna possível a

mudança — todos necessitamos de estar preparados para julgar se queremos essa

mudança”. A resolução dos problemas resultantes dos avanços científicos e

tecnológicos não deverá ser deixada apenas aos médicos, aos cientistas ou a

qualquer outro grupo limitado; uma Sociedade na qual o poder de tomada de


decisões sobre questões científicas e tecnológicas seja privilégio de especialistas

não pode ser considerada democrática. O conceito de cidadão passivo governado

por representantes eleitos deverá ser progressivamente substituído por um

conceito de cidadão activo predisposto a participar em processos de decisão sobre

opções de desenvolvimento (Chito e Caixinhas, 1993). A Constituição Portuguesa

(Assembleia da República Portuguesa, 1996), através dos artigos 48º, 52º e 66º

que consagram, respectivamente, a participação na vida pública, o direito de

petição e de acção popular e o direito a um ambiente e qualidade de vida, prevê a

participação directa dos cidadãos. Toda a Sociedade deverá estar envolvida na

definição de políticas que controlem as profundas implicações do rápido progresso

científico e tecnológico. No entanto, este envolvimento implica uma população que

não se sinta socialmente impotente ou insignificante e que esteja informada, tanto

sobre os conteúdos científicos como sobre os conteúdos metacientíficos capazes

de fornecerem uma ideia mais real da Ciência e da sua relação com a Sociedade.

Torna-se necessário que a população esteja apta a avaliar as potencialidades e as

limitações da Ciência/Tecnologia e a compreender a dificuldade que os sistemas

legal e ético têm em acompanhar/avaliar/controlar o progresso científico e

tecnológico.

11
A escola tem um papel importante a desempenhar na preparação dos

cidadãos para um papel activo e responsável na evolução da Sociedade. Os

professores devem munir os alunos com as ferramentas necessárias à avaliação

das consequências e à correcção dos eventuais problemas resultantes do

crescimento científico e tecnológico — ferramentas como conhecimentos

científicos; conhecimentos metacientíficos sobre a natureza, as potencialidades e

os limites da Ciência; e capacidades de pensamento crítico, de tomada de

decisões, de resolução de problemas e de pensamento criativo.

Vários autores citados por Aikenhead (1994) (como Aikenhead, 1986,

Bybee, 1985, Eijkelhof, 1990, Solomon e Aikenhead, 1994) — protagonistas do


designado movimento CTS (Ciência, Tecnologia e Sociedade) — têm a convicção

de que um ensino das Ciências baseado no conhecimento/análise/discussão das

relações entre Ciência, Tecnologia e Sociedade tem a potencialidade de: a)

aumentar a literacia científica dos cidadãos; b) fomentar o interesse dos alunos na

Ciência e na Tecnologia; c) fomentar o interesse dos alunos pelas interacções

entre Ciência, Tecnologia e Sociedade; e d) ajudar os alunos a melhorar as suas

capacidades de pensamento crítico, raciocínio lógico, resolução criativa de

problemas e, especialmente, tomada de decisão, relativamente ao ensino das

Ciências. O movimento CTS também é apoiado pelas ideias de Ziman (1984).

Segundo este autor, a compreensão da Ciência — e, consequentemente, a

literacia científica — só se alcança através da análise das suas diferentes

dimensões: histórica, filosófica, psicológica e sociológica. Se se pretende que os

alunos adquiram uma imagem real da Ciência torna-se importante que tomem

contacto com a influência e a interacção destas dimensões na construção do

conhecimento científico. Assim, a escola deve transmitir tanto conteúdos científicos

como metacientíficos, principalmente os conteúdos que abordam a sociologia da

Ciência nas suas dimensões interna (relações no interior da comunidade

académica) e externa (relações Ciência/Tecnologia/Sociedade). Este autor

12
considera, ainda, que a educação CTS permite desenvolver competências sócio-

afectivas normalmente excluídas dos programas de Ciências. Ziman (1980)

identifica diferentes formas de estudar a Ciência num contexto social, das quais

destaca: a) o estudo da relevância social das aplicações da Ciência; b) a

preparação profissional dos alunos através da análise dos aspectos sociais dos

seus empregos futuros; c) a abordagem interdisciplinar; d) a abordagem histórica

da evolução da Ciência; e) a abordagem filosófica da definição de Ciência; f) a

abordagem sociológica da construção da Ciência; e g) a abordagem através de

temas problemáticos que ilustrem o papel social da Ciência e o seu funcionamento

sob influências internas e externas. Este autor salienta o facto destas abordagens
não se excluirem mutuamente e poderem ser implementadas segundo práticas

pedagógicas distintas.

Aikenhead (1994), numa revisão da investigação realizada no âmbito do

movimento CTS, faz referência a um conjunto de estudos reveladores das

vantagens deste tipo de abordagem relativamente a um ensino das Ciências

tradicional:

• Yager, Blunck, Binadja, McComas & Penick (1988), num projecto de

quatro anos envolvendo 300 professores do 4º ao 9º ano, verificaram que

os alunos sujeitos a abordagens CTS ficam mais aptos a aplicar

informação a novas situações, a actuar independentemente e a tomar

decisões.

• Wiesenmayer e Rubba (1990), numa investigação sobre o impacto de

módulos de biologia segundo uma perspectiva CTS em alunos

americanos, detectaram benefícios em termos de: a) conhecimentos

sobre interacções entre Ciência, Tecnologia e Sociedade; b)

conhecimentos e capacidades necessárias à investigação de temas CTS;

e c) conhecimentos sobre acções de cidadania.

13
• Kelly (1991), ao comparar aulas tradicionais de Ciências com as aulas de

um curso de química (Chemical Education for Public Understanding

Project) centrado em questões sociais e destinado a alunos entre 11 e 15

anos, detecta vantagens significativas destas na compreensão do risco

de poluição química, da natureza da Ciência, de processos da Ciência e

de conceitos científicos.

Aikenhead refere, também, resultados positivos de abordagens CTS na

aplicação de conceitos científicos a novas situações (Varela, 1992), na resolução

de problemas (Pedersen, 1992), na estimulação da criatividade (Penick, 1992), na

análise de argumentos (Thomas, 1985) e na promoção da responsabilidade social


dos alunos (Ramsay, 1993; Rubba, 1987). No entanto, este autor considera que os

alunos só beneficiam com o estudo das Ciências segundo uma abordagem CTS

quando: a) a orientação do professor relativamente ao ensino das Ciências está

em sintonia com a abordagem CTS utilizada; b) o ensino CTS está

significativamente integrado na disciplina de Ciências; e c) existem materiais

adequados disponíveis.

2.2 Ensinar a Pensar

Nos últimos anos generalizou-se a noção de que as capacidades de

pensamento dos alunos são inadequadas às exigências da nossa Sociedade.

Professores de todos os níveis de ensino acusam, por vezes, os seus alunos de

pensarem deficientemente. Simultaneamente, tem-se apelado a uma instrução

adequada e explícita do pensamento e de atitudes e valores como forma de

resolver este problema. Em resposta a este apelo foram propostos vários

programas e vários instrumentos com o objectivo explícito de ensinar a pensar:

14
cresce a ideia de uma escola menos centrada na transmissão de informação e

mais preocupada com o desenvolvimento do aluno. No entanto, as opiniões quanto

à necessidade de tais programas, aos métodos utilizados e aos resultados da sua

aplicação variam consideravelmente. As opiniões divergem, logo à partida, na

definição de pensamento e na possibilidade de se ensinar a pensar: Existirão tipos

de pensamento diferentes? Será o pensamento constituído por processos distintos,

resultantes de funções mentais ou actividades cerebrais distintas passíveis de

serem melhoradas/desenvolvidas?

As opiniões de Smith e de de Bono, que a seguir se apresentam, constituem

bons exemplos de posições diferentes relativamente à possibilidade de se


desenvolver o pensamento através da utilização de métodos orientadores da

atenção para determinados tipos de raciocínio e da criação e treino de padrões

mentais de rotina mais eficazes do que os naturais.

2.2.1 Será necessário ensinar a pensar?

2.2.1.1 Posição de Smith

Para Smith (1990) o pensamento é complexo, multifacetado e maior do que

a soma de eventuais partes constituintes; logo, é impossível separá-lo em parcelas

(como, por exemplo, a memória, a compreensão, a aprendizagem ou o raciocínio)

ou em etapas com sentido. Segundo este autor, o termo pensar deveria ser

relegado para a mesma categoria do termo coisa que é útil mas genérico e

impreciso. Smith, numa lista, por ele considerada breve e incompleta, enumera 76

verbos relacionados com pensamento: na sua opinião, a ideia comum de que estas

palavras correspondem a funções mentais ou actividades cerebrais distintas é

responsável pelo aparecimento de teorias complexas sobre o pensamento e o seu

ensino explícito. No entanto, acredita que todos estes termos são apenas palavras

15
sem correspondência com processos cerebrais ou capacidades específicas: “a sua

relevância é semântica, não psicológica” (p. 25).

Segundo Smith, todo e qualquer indivíduo nasce capaz de pensar e de

aprender, logo “ninguém tem que aprender a pensar” (p. 194) e “tudo aquilo que o

cérebro faz é do domínio do pensamento, mesmo aquelas coisas que são feitas

inconscientemente, habitualmente ou instintivamente” (p. 26). O pensamento de

todos os dias — por ele denominado pensamento comum — é continuamente

complexo e extremamente capaz, não constituindo uma actividade mental

ocasional e intencional mas algo sempre a acontecer e de que, frequentemente,

não se tem consciência. Tomam-se decisões, resolvem-se problemas e


raciocina-se constantemente; contudo, só se toma consciência de tais actividades

quando se depara com uma dificuldade específica.

Para este autor, o pensamento de qualquer indivíduo é prioritariamente

determinado por factores motivacionais e de personalidade e não por capacidades

intelectuais específicas. Para Smith, “pensar não consta de uma série de

capacidades adquiridas, é antes uma questão de experiência, de compreensão das

exigências e das convenções relativas a questões específicas” (p. 58). Assim,

qualquer pensamento deficiente resulta principalmente da nossa experiência, de

valores ou de disposições particulares e não da ausência de algo essencial na

nossa capacidade de pensar. Smith vê a experiência como o envolvimento numa

actividade e não como uma repetição projectada de aspectos de um todo. “O

pensamento não é uma série abstracta de regras que podem ser aplicadas em

qualquer situação. Em vez disso, pensar é sempre acerca de qualquer coisa, e tem

sempre uma finalidade. Se não compreendemos aquilo sobre o que estamos a

tentar pensar, então parecemos não saber pensar” (p. 164). Este autor acredita

que não existem capacidades gerais de tomada de decisão, de resolução de

problemas ou de raciocínio. Na sua opinião, decidir, resolver problemas ou

raciocinar dependem das circunstâncias, ou seja, da experiência relativamente a

16
cada questão ou situação; não existem técnicas aplicáveis a todas as situações.

Para Smith, a qualidade do pensamento depende da “ampla compreensão do

sujeito que pensa sobre as questões que estão a ser pensadas, a disposição para

pensar sobre estas questões e a autoridade para o fazer” (p. 193). Assim, o

pensamento depende mais da experiência do que da instrução e é mais uma

questão de preferência do que de capacidade. Sem experiência não existe

familiaridade com o assunto em questão, nem a consequente confiança que

determina a disposição e a autoridade para pensar sobre o assunto. A disposição

ou a falta de disposição para pensar sobre determinado assunto depende do

interesse que temos nele e do facto de o sentirmos ou não dentro do âmbito das
nossas competências. O direito de pensar e de exprimir pensamentos individuais

não é reconhecido/sentido por todos de igual maneira; depende das pessoas à

nossa volta, da forma como nos tratam e do nosso consequente autoconceito.

Logo, “o desenvolvimento da forma como pensamos é afectado pelo modo como

vemos o comportamento das pessoas à nossa volta, e pelo papel que vemos

ser-nos reservado nas suas actividades” (p. 194). Tornamo-nos sujeitos pensantes

quando temos oportunidade e razão para pensar; quando estamos rodeados de

pessoas que pensam; e quando promovem o nosso pensamento admitindo e

estimulando a nossa participação em argumentações, desafios e debates

baseados no respeito, e não no poder ou na exploração. Segundo Smith, só se

consegue promover o pensamento num ambiente de interesse e de respeito. O

interesse garante o envolvimento no pensamento e na aprendizagem: quando não

existe interesse, quando os assuntos são aborrecidos, pensamos noutros

assuntos, ou seja, distraímo-nos. O facto de estarmos interessados não garante a

eficácia do pensamento mas motiva-nos para nos juntarmos e aprendermos com

pessoas envolvidas em actividades que nos interessam. O respeito pelas opiniões

e pelos sentimentos dos alunos revela-se decisivo no reconhecimento do direito de

pensar e de exprimir pensamentos individuais.

17
2.2.1.2 Posição de de Bono

De Bono (1995), considera o pensamento como “uma capacidade que pode

ser aprendida, praticada e apreciada” (p. 303). Define pensar como “a capacidade

operativa com a qual a inteligência actua sobre a experiência” (p. 14). Vê a

inteligência como um potencial e o pensar como a capacidade de utilizar este

potencial. Logo, para utilizar plenamente este potencial, precisamos de

desenvolver as capacidades do pensamento. Segundo este autor, existem dois

estádios no pensamento: percepção e análise (de Bono, 1976, 1985). O

pensamento pouco eficaz resulta fundamentalmente de erros de percepção que


impedem uma análise baseada em toda a informação relevante onde, por vezes,

são negligenciados aspectos decisivos de uma situação. O maior inimigo do

pensamento é a complexidade porque conduz à confusão e aos erros de

percepção. Quando pensamos, tentamos fazer demasiado ao mesmo tempo:

emoções, informação, lógica, expectativas, valores e criatividade misturam-se

dificultando o nosso pensamento. Assim, a qualidade do pensamento poderá ser

melhorada através da utilização de instrumentos e de estruturas orientadoras da

atenção para determinados tipos de raciocínio e da criação e treino de padrões

mentais de rotina mais eficazes do que os naturais (de Bono, 1976, 1985, 1995). A

prática explícita, formal e deliberada destes instrumentos, em situações e assuntos

da vida real não contemplados pelas disciplinas convencionais, permite a

aquisição do que de Bono denomina “operacia”, ou seja, capacidades de “fazer”.

Para este autor, a operacia alcança-se através do treino do pensamento em

aspectos como: diferentes pontos de vista, prioridades, objectivos, alternativas,

consequências, cálculos, decisões, resolução de conflitos, criatividade e muitos

outros aspectos que ele considera não serem, normalmente, abrangidos pelo tipo

de pensamento usado na análise de informação. De Bono, partindo do pressuposto

que o raciocínio mais eficaz é executado de forma compartimentada, defende um

18
ensino explícito do pensamento centrado na prática/aplicação de instrumentos

simples capazes de orientarem a atenção para vários tipos de raciocínio, ajudando

a reduzir a confusão no raciocínio e a disciplinar o pensamento.

O Programa de Pensamento CoRT (Cognitive Research Trust) e o método

“Os Seis Chapéus do Raciocínio” são algumas das criações de de Bono,

conhecidas e utilizadas por escolas e empresas de todo o mundo. Ambas se

baseiam no treino de instrumentos simples destinados a aumentar a eficácia do

pensamento através da orientação da atenção para vários tipos de raciocínio. São

várias as instituições criadas por de Bono com a finalidade de preparar formadores

para a aplicação dos seus métodos.


O Programa CoRT, dividido em seis secções de dez lições cada, envolve

grupos de quatro ou cinco alunos na resolução de problemas ou na exploração de

ideias através da utilização dos instrumentos ou técnicas de pensamento

propostos. Este programa possui quatro níveis de objectivos (de Bono, 1983, p.

117):

1. Criar uma área curricular destinada ao desenvolvimento explícito das

capacidades de pensamento.

2. Desenvolver nos alunos a ideia de que o pensamento é uma capacidade

passível de ser melhorada através da atenção, da aprendizagem e da

prática.

3. Desenvolver nos alunos uma auto-imagem de pensadores.

4. Criar condições para que os alunos adquiram um conjunto de

instrumentos de pensamento transferíveis, passíveis de serem aplicados

a outras situações.

O método “Os Seis Chapéus do Raciocínio” (de Bono, 1985, 1995) foi

concebido, também, como um instrumento de orientação da atenção, para vários

tipos de raciocínio, que ajuda a reduzir a confusão no raciocínio e a disciplinar o

pensamento. Este método parte do pressuposto que o raciocínio mais eficaz é

19
executado por sectores, ou seja, de forma compartimentada. A sua designação foi

inspirada na associação inglesa entre chapéu e raciocínio, no facto dos chapéus

poderem definir o papel que um indivíduo desempenha num momento específico e,

ainda, no facto de se colocarem e retirarem facilmente. Os seis chapéus têm cores

diferentes, correspondentes a diferentes tipos de raciocínio, e podem ser utilizados

isoladamente ou segundo uma sequência pré-determinada. A utilização isolada e

ocasional dos chapéus permite a realização de um tipo particular de raciocínio ou

sugere uma alteração de pensamento. A utilização de uma sequência de chapéus

pré-determinada permite uma exploração mais rápida e eficaz de um assunto

revelando-se útil quando existe uma discussão ou um desentendimento sobre uma


questão.

De Bono (1995) defende a aplicação de cada método, ou instrumento, a

muitos temas como forma de desenvolver a capacidade das pessoas os utilizarem.

Aponta a motivação como o ponto chave dos seus métodos, razão pela qual as

actividades propostas são divertidas e especulativas. Considera, ainda, que a

melhor forma de assegurar a transferência para qualquer situação, dos

instrumentos de pensamento propostos, consiste no seu treino fora das disciplinas

tradicionais e dos seus conteúdos específicos.

Actualmente, são muitos os países que utilizam o Programa CoRT nas suas

escolas e muitas as empresas que o adaptam para a formação dos seus

funcionários. Contudo, tanto Resnick (1990) como MacLure (1991) referem que,

apesar das opiniões favoráveis dos professores e dos alunos envolvidos neste

programa, não existem estudos conclusivos sobre os seus alegados efeitos

positivos. Segundo estes investigadores, as avaliações realizadas têm sido

marcadas por resultados contraditórios e por limitações metodológicas.

Algumas investigações citadas por de Bono (1976) sugerem que o

Programa CoRT conduz a um aumento do número de ideias produzidas pelos

alunos. No entanto, estas investigações, baseadas na contagem das ideias

20
produzidas por alunos sujeitos ao programa e por grupos de controlo, apresentam

problemas relativamente às dimensões das amostras e à equivalência dos grupos

utilizados (Edwards, 1991a).

Os resultados de um estudo realizado por Tripp (1979) parecem indicar que

o programa CoRT ajuda crianças com dificuldades de aprendizagem a produzirem

ideias, proporcionando-lhes confiança para pensar. Todavia, o próprio autor

sugere que estas melhorias poderão resultar de interacções e de aprendizagens

efectuadas entre os alunos durante as discussões e não da aprendizagem de

capacidades de pensamento.

Uma das avaliações mais pormenorizadas do programa CoRT envolveu


alunos e professores de dez escolas primárias inglesas durante dois anos (Hunter-

Grundin, 1985). Neste estudo, alguns especialistas do CoRT foram incumbidos de

formar os professores participantes e de seleccionarem um conjunto de 22 lições

do programa que foi, posteriormente, aplicado aos alunos durante um ano. Como

instrumentos de avaliação foram utilizados: um teste de compreensão de leitura,

um teste de cálculo mental, um teste de raciocínio lógico, um teste de criatividade

sobre as utilizações possíveis de um tijolo ou de um pau-de-fósforo, duas

composições escritas (usadas como pré e pós-teste), gravações das discussões

em grupo e entrevistas a alunos, professores e pais. Os resultados dos testes não

evidenciaram qualquer melhoria na rapidez ou na qualidade do pensamento dos

grupos experimentais. A análise qualitativa dos dados revelou: a) um entusiasmo

inicial dos professores participantes, seguido de um desencanto progressivo no

decorrer do estudo; b) uma avaliação positiva do programa pelos alunos; e c)

poucas evidências de transferência de aprendizagem observadas por professores

e pais.

Mais recentemente, Edwards e Baldauf (1987) e Edwards (1991b) foram

responsáveis por uma série de investigações pormenorizadas sobre os efeitos do

Programa CoRT em alunos do 7º ano com idades rondando os 12 anos. Estas

21
investigações implicaram a aplicação das dez lições da primeira secção do

programa (CoRT-1 — secção destinada ao desenvolvimento de sete capacidades

específicas de pensamento), cada uma das quais com uma duração aproximada de

45 minutos. No primeiro estudo (Edwards e Baldauf, 1987), 67 alunos completaram

a secção CoRT-1 em quatro semanas e realizaram vários testes estandartizados

antes e depois do programa. Foram também efectuadas entrevistas aos alunos e

aos seus pais. O segundo estudo (Edwards, 1991b) envolveu 202 alunos de duas

escolas: um grupo experimental constituído por 115 alunos divididos por quatro

turmas (duas em cada escola) e um grupo de controlo de 87 alunos distribuídos

por três turmas (uma numa escola e duas na outra). Neste caso, o CoRT-1 foi
aplicado em cinco semanas e os alunos foram testados antes e após

(imediatamente após e quatro semanas depois) a realização do programa. Ambas

as investigações revelaram atitudes positivas dos alunos relativamente ao

programa e ao seu efeito na capacidade de pensar e melhorias estatisticamente

significativas na aptidão escolar — medida pelo teste School Ability Test de

Otis-Lennon — e na flexibilidade e na originalidade de pensamento — medidas

pelo Teste de Pensamento Criativo de Torrance.

No que respeita à investigação das alegadas potencialidades do método

“Os Seis Chapéus do Raciocínio” não foi possível localizar qualquer referência. No

entanto, as semelhanças entre este método e os instrumentos do Programa CoRT,

em termos dos seus objectivos e da sua aplicação, são grandes e evidentes.

22
2.3 Actividades de Discussão na Sala de Aula — Importância da
Interacção na Construção do Conhecimento

2.3.1 Actividades de discussão na sala de aula — definição, potencialidades e

dificuldades

A discussão como método de ensino-aprendizagem consiste num processo

em que um pequeno grupo se junta para comunicar entre si — falando, ouvindo ou

através de processos não verbais — com a finalidade de alcançar objectivos de

ensino-aprendizagem (Gall in International Encyclopedia of Education, 1985). O

facto da discussão decorrer em grupos, podendo envolver duas a dez pessoas,

implica que a aprendizagem de cada aluno seja afectada pelo comportamento e

pelas influências dos restantes membros. A escolha da discussão como veículo de

aprendizagem reflecte, de forma explícita ou implícita, concepções sobre a

natureza do conhecimento, a evolução da compreensão e a importância da

autonomia intelectual e da colaboração social, bem como valores políticos

relacionados com a construção de uma Sociedade democrática (Cowie & Rudduck

in Handbook of Educational Ideas and Practices, 1990). Segundo Barbosa (1995),

numa época em que grande parte do tempo dos jovens é passado diante da

televisão e/ou do computador, a grande vantagem da escola poderá encontrar-se

nas interacções e no convívio que permite. Essa vantagem comparativa poderá ser

rentabilizada se for aproveitada para “provocar confronto de ideias e de

sentimentos, troca de pontos de vista e resolução de problemas em comum”

(Barbosa, p. 7). Para esta autora, a comunicação entre os alunos, o intercâmbio de

conhecimento e a reflexão entre grupos constituem o terreno de eleição da

aprendizagem. Bridges (1979) aponta como condições necessárias ao

envolvimento em actividades de discussão a existência de mais de um ponto de

23
vista, a predisposição dos participantes para analisar os diferentes pontos de vista

e a intenção de aprofundar conhecimentos e compreensão sobre o assunto em

discussão. Para Stenhouse (1970), as potencialidades da discussão resultam do

facto de permitirem aos intervenientes discernir a partir da interacção de diferentes

perspectivas e da análise crítica dos vários testemunhos. Solomon (1991)

considera que os métodos de aprendizagem centrados na discussão requerem

uma participação real e genuína dos alunos, a qual envolve a partilha de

experiências pessoais e de dúvidas e incertezas sobre novos conhecimentos,

apoiada num ambiente de confiança. Segundo esta autora, são estas

características que tornam este tipo de actividade de tal forma significativo e


memorável que, mesmo passadas duas ou mais semanas, os alunos são capazes

de relatar opiniões complexas discutidas em grupo (Solomon, 1991, 1992). Estas

afirmações baseiam-se num estudo efectuado com alunos de 17 anos que

frequentavam cursos de Ciência, Tecnologia e Sociedade em 14 escolas Inglesas

(Solomon, 1992). Foram analisados dados resultantes de interacção social

(gravações audio) obtidos durante a discussão, em pequeno-grupo, de assuntos

controversos apresentados aos alunos através de programas de televisão. No final,

verificou-se que a utilização repetida de actividades de discussão em

pequeno-grupo contribui positivamente para os processos de argumentação e de

reflexão e constitui uma experiência agradável e significativa em termos de

aprendizagem.

Cowie e Rudduck (1990) referindo-se às actividades de discussão

realizadas no ensino secundário, distribuem-nas por três grandes categorias:

discussão de assuntos controversos, resolução de problemas e representação de

papéis (role playing). Todas elas têm em comum o facto de promoverem

aprendizagens através da expressão e exploração de ideias, opiniões e vivências,

num ambiente de cooperação onde a discussão não é encarada como “combate

verbal”; não se trata de ganhar uma argumentação, mas de mobilizar os recursos

24
de todo o grupo com o objectivo de aumentar o conhecimento e a compreensão de

um dado assunto ou de resolver um problema. No entanto, apesar de todos os

dados de investigação que evidenciam as potencialidades da discussão na

aquisição de conhecimentos, na modificação de atitudes, no desenvolvimento

moral, na resolução de problemas e no desenvolvimento de capacidades de

comunicação, este tipo de actividade não tem sido incorporado facilmente na

prática lectiva (Gall em The International Encyclopedia of Education, 1985; Van

Rooy, 1993). São vários os factores que preocupam os professores: a limitação

imposta pelo tempo disponível e pelas rubricas programáticas, a dificuldade em

definir e seleccionar os critérios de avaliação, a dimensão média das turmas, a


inadequação dos espaços, a falta de confiança e de preparação para a

organização/gestão de discussões, a perda parcial da autoridade e do controlo

sobre o processo de ensino-aprendizagem e alguns preconceitos sobre o que é

considerado trabalho na sala de aula. A impossibilidade de preverem

antecipadamente o ritmo/evolução da actividade e a eventual falta de controlo e de

disciplina durante a discussão ameaçam os professores; normalmente, estes

acreditam que a sua eficiência é julgada pela capacidade de manterem um

ambiente de ensino calmo e ordeiro. Segundo Rudduck (1979, 1986) e Lusk e

Weinberg (1994), são também vários os problemas sentidos ou evidenciados pelos

alunos durante a realização de actividades de discussão: a excessiva dependência

relativamente ao professor, o controlo da discussão por poucos alunos, a

relutância em valorizar as opiniões dos colegas, o individualismo, a

competitividade extrema e impeditiva de um ambiente de cooperação e de partilha,

a interpretação das opiniões divergentes dos colegas como ataques pessoais, a

defesa acérrima e intransigente de opiniões com a consequente divisão do grupo

em facções e a polarização das opiniões entre rapazes e raparigas. É difícil

realizar-se uma actividade de discussão numa escola onde os alunos têm medo de

falar livremente, não são tolerantes relativamente a opiniões diferentes das suas,

25
não são sensíveis à razão, à evidência e aos argumentos, e onde os professores

não valorizam as opiniões dos alunos (Bridges, 1979). Muitos destes problemas só

serão ultrapassados quando esta metodologia deixar de ser estranha para todos

os envolvidos (professores e alunos). Rudduck (1986) refere sentir dificuldade em

transmitir os princípios duma aprendizagem centrada na discussão aos alunos

habituados às regras de um ensino expositivo; alunos que têm interiorizada uma

concepção de ensino pouco activa, muitas vezes limitada à recepção passiva de

informação debitada pelo professor, poderão resistir e funcionar como forças de

bloqueio a metodologias novas e desconcertantes que não tenham sido

previamente bem explicadas e fundamentadas. Segundo esta autora, novos


métodos e concepções de ensino-aprendizagem, que impliquem cortes profundos

com hábitos e valores enraízados, só serão possíveis se professores e alunos

exorcisarem o espírito de práticas anteriores. “Os alunos e os professores devem

aprender a não ter receio de (...) desafiar as asserções dos outros, e de verem, por

sua vez, as suas próprias ideias postas em causa. O oposto é a tirania e a

estultificação” (Smith, 1990, p. 72).

2.3.2 A discussão de assuntos controversos

“Um assunto é definido como controverso se as pessoas se encontram

divididas sobre ele e se envolve juízos de valor que impossibilitam a sua resolução

apenas através da análise das evidências ou da experiência” (Rudduck, 1986). Um

assunto controverso não pode ser resolvido apenas recorrendo a factos, dados

empíricos ou vivências na medida em que envolve tanto factos como questões de

valor. Gardner (1983) acrescenta que um assunto só poderá ser classificado de

controverso se for considerado importante por um número considerável de

pessoas. Estas definições, apesar de discutíveis, visto não englobarem,

nomeadamente, questões científicas ou matemáticas polémicas mas meramente

26
factuais, como as apontadas por Dearden (1981) (por exemplo, o comportamento

corpuscular ou ondulatório da luz), são consideradas por Wellington (1986) como

um bom critério para a selecção de assuntos controversos dignos de serem

incluídos no currículo escolar.

São várias as razões que levam diversos autores a defenderem a inclusão

de actividades de discussão de assuntos controversos nos currículos. O confronto

destes temas constitui um processo conducente à formulação e à

avaliação/reformulação de opiniões e de crenças, constituindo um elemento

essencial na educação moral e na educação para a cidadania (Harrison, 1993). A

discussão de assuntos controversos ajuda os alunos a compreenderem as


situações sociais, os actos humanos e as questões de valores controversas por

eles levantadas. Para Dearden (1981), uma abordagem completa de qualquer

disciplina passa pela referência aos seus elementos controversos. A título de

exemplo, aponta a não inclusão destes elementos nos currículos de Ciências como

responsável pela transmissão de ideias distorcidas sobre a Ciência,

frequentemente descrita como não controversa, neutra, desinteressada, altruísta.

No entanto, estas actividades justificam-se tanto pelos conteúdos como pelas

capacidades que promovem. A pesquisa de informação, a detecção de

incoerências, a avaliação da idoneidade das fontes, a comunicação de informação

recolhida e/ou de pontos de vista, a fundamentação de opiniões, o poder de

argumentação e o trabalho cooperativo constituem exemplos de capacidades que

podem ser desenvolvidas através da discussão de assuntos controversos

(Stradling, Noctor e Bains, 1984). Rudduck (1986) acredita que a exploração activa

desta metodologia pode ajudar a desenvolver o pensamento crítico e a

independência intelectual. Com esta finalidade, defende que os alunos devem ser

ajudados a encarar a controvérsia convictos do seu direito de formular opiniões e

de tomar decisões e não na expectativa de que qualquer autoridade possa decidir

e resolver em seu lugar. No entanto, professores e alunos tendem a acreditar em

27
“respostas certas” e a perpetuar uma imagem do especialista como detentor do

saber, de factos e de certezas, e não como utilizador do conhecimento na

exploração da dúvida e da incerteza. Para Rudduck, esta imagem, associada a

currículos extensos e pouco flexíveis e à dificuldade dos alunos transitarem de um

“raciocínio dualista” — segundo o qual existe sempre uma resposta certa ou errada

para qualquer pergunta — para um “raciocínio relativista contextual” — que admite

a validade de interpretações diferentes de uma mesma realidade — têm dificultado

a promoção do pensamento crítico e da independência intelectual. Considera,

mesmo, que os alunos aos 14 anos já desenvolveram “uma incapacidade treinada”

para pensarem independentemente. Neste contexto, qualquer tentativa de


alteração da mentalidade dos alunos só será possível através de uma alteração da

mentalidade dos professores que se reflicta numa mudança das práticas e do

papel do professor na sala de aula. Assim, importa refletir sobre a estratégia a

adoptar e o papel a desempenhar de forma a promover, através da discussão de

assuntos controversos, o desenvolvimento da independência de pensamento.

As implicações éticas e morais dos avanços tecnológicos e científicos na

área da Biotecnologia constituem temas óptimos para discussões alargadas a toda

a turma. Frequentemente, a Ciência é apresentada aos alunos como a solução dos

problemas mundiais; algo destituído de dúvidas e de problemas. O ensino das

Ciências raramente conduz os alunos à exploração das limitações da Ciência ou a

uma análise crítica das suas implicações sociais, económicas e éticas. Através da

discussão de assuntos controversos podemos proporcionar aos alunos uma

imagem mais realista da Ciência. Stenhouse (1970) propõe uma estratégia,

centrada na discussão de assuntos controversos, na qual o professor assume o

papel de dinamizador e garante uma posição de neutralidade, não revelando

opiniões pessoais que possam ser assumidas pelos alunos como “correctas”.

Segundo este autor, um dinamizador de discussões com sucesso: a) lança

perguntas e coloca problemas; b) pede ou efectua esclarecimentos; c) mantém o

28
ritmo e o interesse da discussão; d) ajuda os grupos a utilizarem e a potenciarem

as ideias uns dos outros; e) ajuda os grupos a definirem prioridades durante a

discussão; f) faz pontos da situação; e g) promove a reflexão e a auto-crítica

através de perguntas precisas. Com o objectivo de ajudar os professores a

melhorarem o seu desempenho como dinamizadores, sugere a gravação das

discussões e a sua posterior análise. Para tal, aponta um conjunto de tópicos

desde a causa, a frequência e a forma de possíveis interrupções do discurso dos

alunos até à equidade no seu tratamento.

Existem outras abordagens dos assuntos controversos, como as propostas

por Rudduck (1986) e por Henderson e Knutton (1990), que se caracterizam não
só pela defesa da discussão e da neutralidade do professor/dinamizador mas

também pela importância que atribuem à disponibilidade de informação.

Consideram que a adequação da discussão, como metodologia de exploração de

assuntos controversos, resulta do facto de permitir uma maior compreensão dos

temas através da exploração combinada de diferentes perspectivas construídas a

partir do exame crítico da informação disponível. Henderson (1987) refere existirem

evidências de que os alunos consideram estes debates extremamente estimulantes

e úteis. Henderson e Knutton acreditam, também, que a discussão em grupo de

assuntos controversos em Ciências permite desenvolver competências como a

construção de hipóteses, a previsão, a recolha e a análise de dados, a

fundamentação de opiniões, a comunicação e a cooperação. Estes autores

atribuem um papel crucial à informação; sem ela os alunos limitam-se a discutir as

suas perspectivas, frequentemente limitadas. Segundo Rudduck, a disponibilidade

de informação adequada e diversificada impede simples “explorações conjuntas de

ignorância”, ajudando os alunos a considerarem, explorarem e aprofundarem

perspectivas e vivências de outros membros da Sociedade expressas, por

exemplo, em programas de televisão, entrevistas, colóquios, trechos de livros,

jornais, revistas, fotografias, reproduções de quadros, poemas e dados estatísticos.

29
Henderson e Knutton referem que a informação escrita pode constituir um

obstáculo para os alunos com dificuldades de leitura. No entanto, defendem que as

competências de leitura se desenvolvem e se aperfeiçoam com o envolvimento dos

alunos nos temas em discussão. Nas abordagens dos autores referidos a

neutralidade do professor é considerada fundamental; um professor que reconhece

aos seus alunos o direito de formarem as suas próprias opiniões deve optar pela

neutralidade durante as discussões. A actuação do professor como um árbitro que

assegura a exploração adequada do tema e a equidade durante a discussão

constitui uma forma de acentuar o seu empenho na educação e não nos seus

pontos de vista. Algumas investigações realizadas por Rudduck (1986) revelam


que este comportamento do professor o torna mais compreensivo aos olhos dos

alunos; muitas vezes, estes consideram, pela primeira vez, que o professor lhes dá

tempo para pensar e ouve as suas opiniões. Tanto para Rudduck como para

Henderson e Knutton:

1. os valores fundamentais da educação devem constituir os princípios de

todo o processo que propõem;

2. o ensino deve renunciar à autoridade do professor como “especialista”

capaz de resolver questões de valores;

3. a estratégia de ensino deve manter a autoridade do professor na sala de

aula segundo regras justificadas pela necessidade de um ambiente de

responsabilidade, sensibilidade e rigor sempre que se deseja promover a

compreensão dos alunos;

4. o professor deve tomar precauções de forma a evitar a utilização da sua

autoridade na doutrinação das suas ideias nos alunos;

5. o processo deve ajudar os alunos a compreenderem como pessoas

diferentes podem aprender construtivamente em conjunto através da discussão e

da partilha e que as opiniões minoritárias também merecem ser examinadas

criticamente, em vez de ignoradas ou ridicularizadas;

30
6. as finalidades do processo devem ser a compreensão da origem e das

implicações das suas opiniões, a preparação para a reconsideração com base em

novas informações ou vivências e a promoção da responsabilidade pelas suas

opções.

Outras abordagens semelhantes para a discussão e a tomada de decisões

sobre assuntos controversos — mais concretamente sobre dilemas éticos na área

da Biologia — são sugeridas por Barman e Cooney (1986) e DeDecker (1986,

1987). Estes autores defendem o envolvimento activo dos alunos em assuntos que

requerem a resolução de problemas morais como forma de promover a progressão

do raciocínio moral. Segundo eles, este tipo de interacção obriga os indivíduos a


repensarem as suas posições sobre determinado assunto moral e pode levar à

modificação do raciocínio original através da descoberta de eventuais

inconsistências lógicas. Ambas as propostas pretendem: a) apresentar

informações objectivas e precisas sobre determinados temas; b) proporcionar

oportunidades para os alunos discutirem livremente as questões éticas associadas

a esses temas; e c) fornecer aos alunos um modelo de tomada de decisões que os

ajude a efectuar escolhas pessoais através da clarificação dos seus valores e da

avaliação das consequências das suas opções. Ambas as propostas implicam uma

estratégia faseada que visa: a) a motivação e a sensibilização dos alunos para o

assunto em análise; b) a identificação dos valores individuais dos alunos; c) a

partilha e análise em grupo dos valores individuais na tentativa de se alcançar

consenso; e d) a aplicação dos valores num processo de tomada de decisões com

base num procedimento que envolve a definição do problema, a definição de linhas

de acção possíveis, a explicitação de prós e contras de cada uma, a selecção da

linha de acção cujas vantagens ultrapassam as desvantagens, a indicação do grau

de confiança de cada aluno na linha de acção seleccionada e a análise das suas

consequências. A actuação do professor é considerada decisiva nas duas

estratégias; o professor não deverá criticar as respostas dos alunos na medida em

31
que se pretende uma exploração livre, sem temores, dos sentimentos dos

participantes. DeDecker salienta, ainda, a importância dos alunos compreenderem

que os seus valores e as suas decisões podem modificar-se ao longo das suas

vidas de acordo com as suas vivências; as decisões tomadas durante estas

actividades não constituem compromissos para toda a vida.

Nos programas de Ciências Naturais existem temas de grande actualidade e

interesse, geradores de reflexão e de debate, capazes de contribuirem, de forma

inigualável, para a aquisição e desenvolvimento dos objectivos atrás referidos

(Ministério da Educação, 1991, a, b, c, d). Temas como a Genética e a

Biotecnologia revelam-se extremamente úteis na construção e desenvolvimento de


um novo estilo de ensino pautado pela reflexão e pela avaliação crítica do impacto

dos vários conteúdos científicos na Sociedade.

2.3.3 A interacção na construção do conhecimento

São numerosos os professores e os investigadores que têm realçado, desde

há vários anos, a importância do trabalho de grupo e das interacções aluno-aluno

na sala de aula. Gartner, Kohler e Riessman (1971) e Allen (1976), por exemplo,

referem a importância do “ensino mútuo” em crianças com dificuldades: o facto de

poderem actuar como tutoras de outras crianças revela-se extremamente

gratificante e benéfico em termos sócio-afectivos. Mais recentemente, vários

psicólogos sociais, nomeadamente os seguidores de Carl Rogers, demonstraram o

valor das interacções em grupo na terapia e, especialmente, no desenvolvimento

da personalidade. No entanto, até alguns anos atrás e salvo raras excepções, o

interesse pelo trabalho de grupo centrava-se nas suas potencialidades como

prática educativa promotora do desenvolvimento sócio-afectivo individual

(Perret-Clermont, 1992): era dada pouca atenção ao eventual papel do trabalho de

grupo e da interacção social no desenvolvimento cognitivo. Geralmente, tanto o

32
trabalho intelectual como o desenvolvimento cognitivo eram vistos como

actividades e processos individuais, motivados ou apoiados por factores sociais

e/ou afectivos, mas com uma estrutura e uma dinâmica independentes destes.

A partir da década de 70, várias investigações na área da Psicologia em

geral, e da Psicologia Social em particular, centraram-se no estudo das eventuais

potencialidades da interacção entre pares no desenvolvimento cognitivo dos

indivíduos. Deste conjunto, assumem especial relevo os trabalhos sobre a

construção social da inteligência (Doise, Mugny e Perret-Clermon, 1975, 1976;

Gilly, Fraisse e Roux, 1988; Perret-Clermont e Nicolet, 1988; Perret-Clermont,

Perret e Bell, 1991; César, 1994) e os trabalhos sobre as potencialidades da


aprendizagem cooperativa (Aronson, Blaney, Stephan, Sikes e Snapp, 1978;

Sharan e Hertz-Lazarowitz, 1980; Damon e Phelps, 1989; Johnson e Johnson,

1989; Slavin ,1980, 1984, 1990).

2.3.3.1 A construção social da inteligência

Para Doise, Mugny e Perret-Clermont os factores psicossociais

desempenham um papel decisivo no desenvolvimento sócio-cognitivo, na

apropriação dos saberes e na aquisição e desenvolvimento de competências. Para

estes investigadores, que estiveram na origem da psicologia social da transmissão

do conhecimento, a chave deste progresso reside na ocorrência de conflitos

sócio-cognitivos entre os elementos do grupo de trabalho, ou seja, no confronto

interpessoal e intrapessoal de ideias diferentes (Doise, Mugny e Perret-Clermont,

1975; Mugny e Doise, 1978; Perret-Clermont, 1979). A existência de perspectivas

diferentes entre os participantes traduz-se no aparecimento de respostas

diferentes, o que desencadeia um desequilíbrio duplo: um desequilíbrio

interpessoal momentâneo pelo facto das respostas apresentadas serem diferentes

e um desequilíbrio intrapessoal pela tomada de consciência individual da

33
existência de outras respostas, o que suscita dúvidas sobre a sua própria resposta.

Para ultrapassarem este impasse as crianças têm que, simultaneamente, analisar

os pontos de vista discordantes — o que implica a existência de noções mínimas

sobre a problemática em questão — e gerir as relações interpessoais dentro do

grupo com o objectivo de chegarem a acordo. O conceito de conflito

sócio-cognitivo resulta duma concepção epistemológica construtivista e

interaccionista do desenvolvimento (Perret-Clermont, 1976/78; Doise e Mugny,

1981): implica que o sujeito construa os seus instrumentos cognitivos a partir da

acumulação e interiorização de experiências e progrida intelectualmente através

de interacções com os objectos e com outros indivíduos.


Os primeiros trabalhos destes autores foram realizados em situação

laboratorial e utilizavam como instrumentos provas piagetianas. Durante estas

experiências, as crianças eram convidadas a realizar individualmente uma tarefa

supostamente difícil para o seu nível etário, mas não inacessível. Geralmente, esta

tarefa — pré-teste — era realizada numa divisão próxima da sala de aula com a

presença do experimentador e de um anotador. O desempenho nesta tarefa inicial

fornecia informação relativa ao desenvolvimento cognitivo de cada criança e ao

domínio de determinadas operações intelectuais em jogo. Posteriormente, as

mesmas crianças eram agrupadas em conjuntos de duas ou três com o objectivo

de realizarem colectivamente uma nova tarefa envolvendo o mesmo tipo de

dificuldades cognitivas. Finalmente, vários dias depois, era aplicada novamente a

tarefa individual inicial — como pós-teste — a cada uma das crianças. A

comparação do pré e do pós-teste permite verificar o progresso resultante da

actividade conjunta. No entanto, as circunstâncias experimentais em que estes

estudos foram realizados — amostras muito reduzidas, utilização quase exclusiva

de tarefas piagetianas, crianças muito novas — tornam difícil a generalização e a

aplicação prática dos seus resultados a situações de sala de aula (Gilly, 1985;

Sánchez, 1989). Assim, numa fase posterior, com o reconhecimento da

34
necessidade de se contextualizarem mais as investigações e de se recorrer a

actividades relacionadas com as temáticas abordadas pelos currículos escolares,

foram realizadas investigações em contexto real de sala de aula.

Os estudos realizados em contexto laboratorial permitiram verificar a

importância dos processos interaccionais e do conflito sócio-cognitivo no

desenvolvimento de estratégias de resolução de tarefas bem determinadas —

conservação de quantidades e representação de relações espaciais (Doise, Mugny

e Perret-Clermont, 1975; Doise e Mugny, 1981; Perret-Clermont e

Schubauer-Leoni, 1981; Perret-Clermont e Mugny, 1985; Perret-Clermont e Nicolet,

1988). Estes trabalhos revelaram progressos significativos por parte de crianças


que tinham tido a oportunidade de interagir com colegas quando comparadas com

crianças de grupos de controlo. Variações sistemáticas na composição do grupo

experimental permitiram verificar que o número de participantes envolvidos na

actividade colectiva — dois ou três — não determina directamente o progresso

cognitivo e que este não pode ser explicado apenas pela imitação da resposta de

um colega (Perret-Clermont, Perret e Bell, 1991). De facto, uma comparação

pormenorizada dos diferentes argumentos apresentados durante a actividade

colectiva de discussão com os argumentos utilizados nos pós-testes individuais

permitiu constatar que estes últimos não se limitam a uma mera imitação dos

primeiros. Os argumentos apresentados no pós-teste pelas crianças que

progrediram para o estádio de conservação eram diferentes e cognitivamente

superiores aos apresentados pelos seus colegas durante o trabalho de grupo.

Estas crianças não se limitaram a repetir uma resposta rígida ou a imitar um

colega; produziram um raciocínio novo e defenderam-no com argumentos

(Perret-Clermont, Perret e Bell). Nestes mesmos estudos, a interacção revelou-se

um factor de progresso, tanto para as crianças que interagiram com colegas

cognitivamente mais competentes como para as que interagiram com colegas com

um desenvolvimento cognitivo não superior ao seu. No entanto, na opinião destes

35
investigadores, o progresso cognitivo só é possível através do confronto de pelo

menos duas respostas diferentes, ou seja, através do conflito sócio-cognitivo

(Perret-Clermont, Perret e Bell). Segundo os resultados obtidos, tanto o confronto

com uma resposta incorrecta como o confronto de duas respostas incorrectas

podem constituir fonte de progresso.

Uma posição ligeiramente diferente é defendida por Lumpe e Staver (1995)

no seguimento duma investigação sobre o desenvolvimento de conceitos

científicos relacionados com a fotossíntese em contexto de sala de aula. Na sua

opinião, tanto a interacção discordante como a interacção concordante entre pares

facilitam o desenvolvimento de conceitos. A investigação envolveu 28 alunos de


Biologia do ensino secundário, dos quais 21 foram distribuídos por grupos

heterogéneos de três elementos e 7 trabalharam individualmente. Tantos as

tríades como os alunos em trabalho individual realizaram as mesmas actividades

práticas e responderam às mesmas perguntas. Todas as interacções

professor-aluno e aluno-aluno (entre os que trabalhavam em grupo) foram

gravadas em audio. As concepções dos alunos foram avaliadas antes, durante e

após a realização das actividades através de um teste com perguntas de resposta

aberta. A análise qualitativa e quantitativa dos dados revelou que os alunos em

trabalho de grupo desenvolviam mais conceitos científicos correctos que os alunos

em trabalho individual. Segundo um estudo de caso efectuado com os dados

provenientes de um dos grupos, o desenvolvimento de conceitos parece aumentar

em consequência da interacção entre pares — tanto discordante como

concordante.

Outros estudos realizados em contexto real de sala de aula, com actividades

adaptadas às temáticas curriculares, revelaram vantagens — em termos de

desempenho — do trabalho em díades relativamente ao trabalho individual.

Algumas destas investigações evidenciaram a importância de factores de tipo

psico-social no desempenho dos adolescentes; o contexto em que se realiza a

36
tarefa, o tipo de tarefa ou de estratégia que se propõe influenciam

significativamente os resultados dos alunos (Carraher, Carraher e Schliemann,

1989; César, 1994; Perret-Clermont e Nicolet, 1988). Verificou-se que as respostas

dadas pelos sujeitos em contexto escolar diferiam das respostas dadas noutros

contextos. Sempre que os alunos viam as actividades propostas como uma tarefa

escolar organizavam-se de forma a que o elemento com estatuto escolar mais

elevado as realizasse o mais rápida e eficazmente possível. Parece que o seu

único objectivo consistia em despacharem-se depressa. No entanto, quando estes

mesmos adolescentes eram convidados a resolver tarefas pouco habituais,

capazes de espicaçarem a sua curiosidade, os confrontos sócio-cognitivos entre


todos os elementos do grupo aumentavam significativamente. Assim, torna-se

necessário construir actividades mais lúdicas que sejam, simultaneamente, pouco

habituais em contexto de sala de aula e capazes de envolverem os conteúdos e as

competências abordados nesse contexto. Este tipo de actividades, realizadas em

díade, revela-se mais eficaz em termos de desempenho e de progresso cognitivo

do que as tarefas tradicionais (César, 1994; Perret-Clermont e Nicolet, 1988).

Perret-Clermont (1992) considera que o desafio educacional consiste em conceber

actividades capazes de motivar os alunos e em encontrar formas de organizar o

trabalho escolar que estimulem o confronto sócio-cognitivo.

2.3.3.2 A aprendizagem cooperativa

O movimento da aprendizagem cooperativa surgiu como parte integrante de

um processo com o objectivo duplo de facilitar relações positivas entre etnias e de

aumentar o desempenho académico e as competências sociais dos alunos das

escolas secundárias (Aronson, Stephan, Sikes, Blaney e Snapp, 1978; Sharan e

Hertz-Lazarowitz, 1980; Slavin, 1980). Desde então, os métodos de aprendizagem

cooperativa foram adoptados por professores de todos os níveis de ensino

37
(Lazarowitz, Hertz-Lazarowitz e Baird, 1994). Estes métodos, em contexto de sala

de aula, envolvem a realização conjunta de tarefas por grupos de alunos com

constituição heterogénea relativamente ao desempenho académico, género, etnia,

idade, atitude relativamente ao assunto em estudo e capacidade de liderança dos

seus elementos (Lazarowitz, Hertz-Lazarowitz e Baird, 1994; Watson e Marshall,

1995). Geralmente, as tarefas propostas são estruturadas de forma a

proporcionarem atribuições específicas e contribuições individuais de cada

membro do grupo. No entanto, cada membro é responsável não só pela sua

aprendizagem individual mas também por ajudar os seus colegas a aprender.

Pretende-se que os alunos progridam cognitiva e socialmente através da


clarificação dos seus conhecimentos e da partilha das suas ideias num ambiente

de interacção dentro do grupo (Deutsch, 1949). De todos os métodos cooperativos

mais utilizados destacam-se:

1. O Jigsaw (Aronson, 1978), utilizado com material narrativo, durante o qual

cada membro do grupo fica responsável pela aprendizagem de uma parte

específica de determinado tópico juntamente com representantes dos restantes

grupos. Posteriormente, cada um dos “peritos” apresenta a sua parte do tópico ao

seu grupo de origem. A avaliação final é individual e abrange todas as partes do

tópico em estudo.

2. As investigações em grupo (Sharan e Sharan, 1984), centradas no

desenvolvimento de competências de pensamento como a análise e a avaliação,

através da realização de projectos colectivos. Neste método não existe divisão de

tarefas dentro do grupo; todos os membros trabalham em conjunto. Segundo

Phelps e Damon (1989) a colaboração entre pares constitui uma estratégia útil no

ensino de conceitos cognitivamente complexos.

3. A utilização de grupos constituídos por alunos com diferentes níveis de

desempenho no estudo de assuntos previamente apresentados pelo professor.

Conjuntos de 4 ou 5 alunos procuram que cada um dos seus elementos atinja o

38
maior nível de desempenho possível. De seguida, cada aluno é testado

individualmente. Não existe divisão de tarefas e a avaliação do grupo é feita com

base no progresso alcançado por cada um dos seus membros relativamente a

registos anteriores.

Os métodos cooperativos podem ser particularmente interessantes para as

aulas de Ciências: o seu teor prático/experimental, com as consequentes

limitações de material, e o facto da Ciência ser actualmente entendida como um

empreendimento colectivo fazem com que as aulas em grupo sejam frequentes

(Johnson, Johnson, Scott e Ramolae, 1985). Ao longo dos anos, várias

investigações revelaram alguma eficácia da aprendizagem cooperativa no aumento


do desempenho académico e no desenvolvimento de competências cognitivas e

sociais. No entanto, a heterogeneidade dos grupos nem sempre se tem revelado

decisiva na obtenção destes resultados.

Num estudo realizado por Humphreys, Johnson e Johnson (1982), o

desempenho dos alunos em aprendizagem cooperativa revelou-se

significativamente superior ao dos restantes. Esta investigação envolveu

professores de Ciências na aplicação de três métodos de aprendizagem —

cooperativo, competitivo e individual — a um grupo de alunos do 9º ano (n=44).

Tingle e Good (1990) utilizaram grupos heterogéneos de alunos do ensino

secundário (n=178) para investigarem o efeito do trabalho cooperativo sobre a

capacidade de resolução de problemas nas aulas de Química. Apesar de não

terem detectado diferenças significativas entre as capacidades desenvolvidas com

essa metodologia e as resultantes do trabalho individual, verificaram que o método

cooperativo, além de ter sido bastante apreciado tanto por professores como por

alunos, tinha desenvolvido capacidades de organização e gestão de trabalho.

Também Lazarowitz, Hertz-Lazarowitz e Baird (1994) obtiveram resultados

significativamente diferentes entre os métodos de aprendizagem cooperativa e

individual. A investigação implicou a aplicação das duas metodologias no ensino

39
de uma unidade temática de Ciências da Terra sobre as vantagens e as

desvantagens da produção de energia artificial. Várias turmas do ensino

secundário (11º e 12º anos, n=120) foram distribuídas aleatoriamente por dois

grupos: 73 alunos estudaram cooperativamente em conjuntos de 5 elementos

segundo o método Jigsaw (grupo experimental); 47 alunos estudaram

individualmente (grupo de controlo). Todas as turmas tiveram 4 horas de aula nas

quais utilizaram os mesmos jogos e actividades (filmes, observações, projectos e

actividades experimentais). No entanto, a forma como os jogos e as actividades

foram utilizadas pelos dois grupos variou consideravelmente. A utilização do

método Jigsaw pelo grupo experimental implicou que cada membro apresentasse
aos colegas do seu conjunto as leituras, investigações e aprendizagens

previamente efectuadas pelo conjunto de “peritos”. Durante esta apresentação, os

alunos eram convidados a discutirem e a clarificarem conceitos dentro do grupo e

com o professor. Quando os alunos se sentiam convenientemente preparados

eram avaliados individualmente. A utilização do método individual implicou a

realização dos jogos e das actividades divididas em unidades e sob a forma de

tarefas individuais. O papel do professor consistiu em apoiar e encorajar o trabalho

individual. Cabia ao aluno decidir a altura em que queria ser avaliado relativamente

a cada unidade. No final verificou-se que os alunos do grupo experimental tiveram

desempenhos académicos significativamente superiores aos do grupo de controlo.

Os alunos que trabalharam cooperativamente também obtiveram valores

significativamente superiores de auto-estima, número de amigos criados e

envolvimento na turma.

Apesar da heterogeneidade dos grupos constituir um elemento de quase

todos os métodos de aprendizagem cooperativa (Slavin, 1980), os resultados de

investigação não são unânimes no reconhecimento das potencialidades deste tipo

de agrupamento (Watson e Marshall, 1995). Okebukola e Ogunniyi (1984), num

estudo que envolveu 1025 alunos de Ciências, efectuaram comparações entre o

40
desempenho dos alunos em grupos de aprendizagem heterogéneos e em grupos

homogéneos constituídos por alunos com níveis de competência altos, médios e

baixos. Os melhores desempenhos ocorreram dentro dos grupos homogéneos com

nível de competência alto seguidos, sequencialmente, pelos grupos heterogéneos,

homogéneos com nível de competência médio e homogéneos com nível de

competência baixo. Hooper e Hannafin (1988) verificaram que a utilização de

grupos heterogéneos era benéfica em alunos com níveis de competência baixo e

prejudicial em alunos com níveis de competência alto. Noutro estudo, os mesmos

autores constataram que o nível de interacção mais baixo ocorre entre os alunos

dos grupos homogéneos com nível de competência baixo (Hooper e Hannafin,


1991). Tal facto apoia as afirmações de Webb e Lewis (1988, citado em Watson e

Marshall, 1995) que atribuem a eficácia da aprendizagem cooperativa ao tipo e à

frequência da interacção entre os elementos do grupo. Mais recentemente, Watson

e Marshall (1995) obtiveram resultados de investigação um pouco diferentes num

estudo realizado com 109 alunos universitários que frequentavam uma cadeira de

Ciências da Vida. Estes alunos, após terem sido ordenados de acordo com o

resultado obtido num pré-teste, foram distribuídos por grupos de 3 ou 4 elementos.

Formaram-se: a) grupos heterogéneos constituídos por um aluno com desempenho

alto, outro com desempenho baixo e os restantes com desempenho médio; e b)

grupos homogéneos de desempenho alto, médio e baixo. Tanto o método de

aprendizagem cooperativa (baseado no jigsaw) como os materiais utilizados por

cada grupo eram iguais. Embora não se tenham registado diferenças significativas

no desempenho entre os grupos, a quantidade de interacções foi

significativamente superior nos grupos heterogéneos.

Apesar da falta de unanimidade entre os investigadores relativamente à

importância (1) do conflito sócio-cognitivo — entendido como confronto de ideias

diferentes — no desenvolvimento cognitivo e (2) da heterogeneidade dos grupos

na rentabilização dos trabalhos cooperativos, os resultados de investigação

41
parecem apoiar a importância do trabalho de grupo e da interacção social no

desenvolvimento cognitivo e sócio-afectivo dos indivíduos. No entanto, como

trabalho de grupo não é sinónimo de interacção, torna-se necessário orientá-lo

com instruções claras, geri-lo com regras de trabalho bem definidas e centrá-lo em

actividades motivadoras da acção e estimuladoras da interacção.

42
CAPÍTULO 3
METODOLOGIA

A metodologia foi definida com base nos objectivos do estudo, tendo-se

recorrido a ferramentas metodológicas capazes de proporcionarem a observação e

o registo dos aspectos em análise. Assim, foram observadas, registadas e

analisadas as reacções e as opiniões dos professores e dos alunos relativamente

às actividades de discussão propostas e às eventuais vantagens e desvantagens

do tema e do método utilizados. O facto deste estudo recorrer ao ambiente natural

de sala de aula como fonte directa de dados e de se centrar mais no processo do

que nos produtos sugere, segundo Ludke e André (1986), uma abordagem

essencialmente qualitativa.

3.1 Objecto de Estudo

O presente trabalho pretende identificar indícios das potencialidades de um

conjunto de actividades de discussão em grupo, centradas nas vantagens e

desvantagens dos novos avanços na área da Genética e da Biotecnologia, na

educação para uma cidadania moderna e democrática baseada na compreensão

de questões sociais, económicas e tecnológicas da Sociedade actual e na

promoção do pensamento. Considerando o método “Os Seis Chapéus do

Raciocínio” proposto por de Bono (1985, 1995) e descrito em 3.5, propõe-se a

43
alunos e a professores pensar e discutir sobre: a) alguns dos grandes dilemas

bioéticos da Sociedade actual; b) a eventual utilidade da discussão de tais temas;

e c) as potencialidades da utilização de tal método em actividades deste tipo. Este

trabalho consiste, assim, numa tarefa de pensamento sobre o pensamento de

alguns alunos e respectivos professores.

Na concepção das actividades seleccionaram-se conteúdos relacionados

com unidades curriculares. A realização das actividades de uma forma diferente

das tradicionalmente propostas pelos professores baseou-se nas opiniões e nos

resultados de investigação, focados no capítulo anterior, que realçam o papel

positivo do trabalho de grupo, da interacção entre pares e da discussão de temas


controversos no desenvolvimento cognitivo e sócio-afectivo. O teor controverso

dos temas e a metodologia utilizada procuram, respectivamente, suscitar e

rentabilizar a discussão.

3.2 Abordagem Seleccionada

Muitas das investigações em educação revelam pouco sobre a

aprendizagem em contexto natural. Na maior parte destas investigações, os alunos

funcionam apenas como objectos de estudo, não tendo qualquer outra

possibilidade de contribuir para os resultados finais construídos pelo investigador.

Por vezes, são ignoradas as opiniões de professores e alunos sobre as actividades

realizadas ou a metodologia utilizada. No entanto, torna-se importante que

professores e alunos, como parte interessada no processo de

ensino-aprendizagem, contribuam com as suas opiniões e avaliações para a

investigação em educação e, consequentemente, para o desenvolvimento de

novas metodologias. A transformação do sistema de ensino só tem sentido quando

resulta de uma reflexão conjunta, dos vários intervenientes, em contexto escolar.

44
Considerou-se importante efectuar este estudo em contexto escolar real:

parte-se do princípio que a sala de aula constitui o local por excelência para

avaliação de qualquer material didáctico. Utilizou-se uma metodologia

interpretativa que parte das reais opiniões dos professores e dos alunos com o

objectivo de perceber a forma como eles reagem a determinadas experiências e

como as interpretam. Pretende-se construir conhecimento relativamente às

potencialidades das actividades de discussão propostas na construção e

compreensão de conhecimentos e na promoção do pensamento de um grupo

específico de alunos. Assim, esta investigação fornecerá mais linhas de acção do

que teorias de longo alcance e mais informações contextualizadas do que


generalizações. A eventual aplicação/generalização dos resultados obtidos a

outras situações ficará a cargo dos leitores (Merriam, 1988).

Recorreu-se a diferentes fontes de informação e a múltiplos métodos de

recolha de dados, tendo em vista um processo de triangulação que, segundo

vários autores (Denzin, 1970; Cohen & Manion, 1980; Goetz & LeCompte, 1984;

Merriam, 1988; Yin, 1989; Morse, 1994), constitui uma forma de assegurar uma

elevada validade interna. A combinação de informações resultantes de fontes e

métodos distintos contribui para uma representação mais rica da situação em

estudo. “As falhas de um método são frequentemente os pontos fortes de outro, e

pela combinação de métodos, os observadores podem alcançar o melhor de cada

um e ultrapassar as respectivas deficiências” (Denzin, 1970, p. 308). Com o

objectivo de assegurar uma boa fidelidade, entre as considerações finais e as

opiniões reais dos alunos e dos professores participantes, apresentam-se diversas

citações.

Como instrumentos de investigação conceberam-se e utilizaram-se

questionários dirigidos aos alunos e efectuaram-se observações directas das aulas

e entrevistas semi-estruturadas aos professores participantes. Todas as

entrevistas foram realizadas pelo investigador e gravadas em audio. Este registo

45
permitiu o acesso posterior à totalidade do discurso e não apenas a notas

parcelares manuscritas. A transcrição integral das entrevistas feita pelo

investigador foi sujeita a análise de conteúdo visando uma análise qualitativa mais

pormenorizada.

Recorreu-se à entrevista com o intuito de perceber a perspectiva dos

professores participantes quanto às potencialidades do tema e da metodologia das

actividades desenvolvidas. O seu objectivo principal consistiu na recolha de

opiniões na linguagem do próprio sujeito permitindo ao investigador o

desenvolvimento intuitivo de uma ideia sobre a avaliação que os sujeitos fazem

das actividades executadas durante as aulas. A entrevista semi-estruturada


caracteriza-se pela utilização de um guião suficientemente flexível para permitir ao

entrevistador a recolha de dados relativos a dimensões inesperadas do tópico em

estudo (Bogdan & Biklen, 1994). Com o guião utilizado neste estudo (Anexo 1)

procurou-se garantir que os diversos entrevistados respondessem às mesmas

questões sem, no entanto, exigir uma ordem rígida nas questões. Logo, a sua

grande utilidade resultou do facto de optimizar o tempo disponível permitindo

recolher dados que, apesar de provenientes de vários sujeitos, foram susceptíveis

de uma comparação relativamente fácil.

Os questionários constituem um registo em primeira mão das opiniões

individuais dos vários alunos participantes no estudo evitando-se, assim,

interpretações ou distorções efectuadas pelo investigador. Neste estudo foram

utilizados dois questionários: um, com questões de resposta aberta, destinado a

captar toda a riqueza e pormenor das opiniões dos alunos relativamente à

metodologia e ao tema das actividades realizadas (Anexo 2); outro, constituído por

itens de resposta fechada, destinado a quantificar eventuais variações de opinião

resultantes das actividades de discussão (Anexo 3). Neste último, os alunos

utilizaram uma escala — “concordo totalmente”, “concordo”, “não tenho a certeza”,

“discordo” e “discordo totalmente” — para indicarem a sua opinião relativamente a

46
um conjunto de afirmações. Este questionário foi aplicado antes e depois da

realização das actividades de discussão, tornando possível uma análise

comparativa das respostas e a consequente detecção de eventuais diferenças

entre as mesmas.

A observação proporciona acesso directo aos acontecimentos e às

interacções sociais que constituem o foco da investigação. Permitiu, assim, captar

aspectos como o ambiente de sala de aula e os comportamentos e os comentários

de alunos e professores durante a realização das actividades. Concebeu-se um

guião de observação (Anexo 4) para efectuar uma exploração mais eficaz da

observação e uma comparação mais facilitada dos dados obtidos. Durante o


estudo, o investigador assumiu o papel de observador directo não participante, não

intervindo nas interacções que se estabeleciam na sala de aula. Com este tipo de

observação procurou-se, simultaneamente, chegar perto da “perspectiva dos

sujeitos” e reduzir ao mínimo a influência do investigador nas interacções

estabelecidas durante as actividades de discussão.

Tanto as transcrições das entrevistas aos professores, como as respostas

dos alunos ao questionário de avaliação das actividades, foram submetidas a uma

análise de conteúdo com três níveis de categorias. Numa primeira fase, os dados

foram agrupados de acordo com cinco “Chapéus do Raciocínio”: Vermelho —

sentimentos e emoções; Amarelo — aspectos positivos; Preto — aspectos

negativos; Verde — sugestão de alterações; e Azul — avaliações globais. Numa

segunda fase, os comentários de professores e alunos, correspondentes a cada

um dos “chapéus”, foram divididos por duas sub-categorias consoante diziam

respeito ao tema ou à metodologia. Numa fase final, a leitura repetida do teor dos

comentários incluídos em cada uma das sub-categorias levou à criação de novas

sub-categorias de análise ainda mais específicas. A análise das respostas aos

questionários de avaliação das actividades foi completada com o cálculo da

47
percentagem de respostas por categoria, visando conhecer a percentagem de

alunos que efectuou cada um dos comentários.

Conforme estipulado previamente com o investigador, no início do estudo

cada professor: a) informou os seus alunos acerca dos objectivos e finalidades da

investigação; b) explicou a presença do investigador; e c) solicitou a cooperação e

o envolvimento de toda a turma, realçando a importância de estudos deste tipo na

melhoria das actividades didácticas. Todos os professores tiveram o cuidado de

não revelar opiniões pessoais relativamente a eventuais potencialidades tanto do

tema como da metodologia, de forma a não influenciarem as opiniões dos alunos.

3.3 Amostra

O estudo foi realizado em contexto real de sala de aula numa Escola

Secundária de Lisboa. As principais razões que levaram à selecção desta escola

foram as características da sua população estudantil: fundamentalmente, o seu

fraco desempenho académico e a sua falta de interesse relativamente às


actividades escolares. Outras razões secundárias da selecção desta escola foram:

a) o facto do Conselho Directivo e de alguns docentes apoiarem a realização de

estudos passíveis de contribuirem para o sucesso escolar dos alunos; e b) a

facilidade de acesso resultante da sua localização geográfica.

A escola seleccionada para o estudo funciona nas instalações actuais desde

1962. Apesar de estar bem equipada, o número de estudantes tem diminuído

acentuadamente desde a década de 70. Tal facto deve-se, provavelmente, à

construção de várias escolas na zona associada ao decréscimo da natalidade e ao

envelhecimento da população residente na freguesia.

Segundo dados recolhidos pelo Conselho Directivo, no ano lectivo de

1995/96, os seus alunos eram oriundos de várias freguesias de Lisboa e de outros

48
concelhos da periferia: pode-se mesmo afirmar que a escola “sobrevivia” graças

aos excedentes das escolas dos concelhos de Oeiras, Sintra, Loures, Cascais e

Amadora. Estes mesmos dados revelavam origens culturais bastante diversificadas

— 14% de Caboverdianos, 3% de Angolanos e 3% de alunos originários dos

restantes países de língua oficial portuguesa e de países da União Europeia — e

níveis sócio-culturais baixos patentes nas habilitações académicas das suas mães

— 13,5% não tinha a 4ª Classe ou não sabia ler nem escrever; 42,3% tinha apenas

o diploma da 4ª Classe; 10,0% possuía o 6º Ano; 17,2% possuía o 9º Ano de

escolaridade; e apenas 16,6% tinha estudado além do 9º ano. No ano lectivo de

1995/96, a percentagem de alunos reprovados nos 10º, 11º e 12º anos foi,
respectivamente de 41,2%, 16,0% e 17,0%. Nesse mesmo período, a percentagem

de alunos excluídos por faltas ou que anularam a matrícula foi de 19,9% no 10º

ano e de 4,8% no 11º ano (não existindo dados referentes ao 12º ano).

O corpo docente da escola era constituído por 142 professores do quadro e

por 82 professores provisórios. Alguns, em conversas informais, referiram que os

alunos não possuíam capacidades de pensamento, eram indisciplinados e

completamente desmotivados. Nesta escola, os problemas de indisciplina e os

conflitos entre alunos são frequentes: no ano lectivo de 1995/96 realizaram-se 15

conselhos disciplinares.

A selecção das turmas baseou-se em dois critérios:

1. Os professores manifestarem disponibilidade e vontade em participar no

estudo.

2. Os alunos frequentarem disciplinas do ensino secundário cujos

programas, na opinião dos seus professores, fossem compatíveis com o

tema das actividades de discussão.

Assim, a amostra foi constituída por 5 professores e 7 turmas — 3 de

Filosofia do 10º ano, 3 de Filosofia do 11º ano e 1 de Comunicação do 12º ano —

dos cursos gerais dos agrupamentos Científico-Natural e Humanidades e dos

49
cursos tecnológicos de Electrotecnia, Informática, Mecânica e Comunicação.

Destas turmas, 6 tinham tido disciplinas de Ciências Naturais até ao 8º ano de

escolaridade e apenas 1 possuía formação nesta área superior à proporcionada

pela escolaridade básica.

Apesar dos novos avanços na área da Genética e da Biotecnologia fazerem

parte do programa de Ciências da Terra e da Vida do 11º ano, o único professor

que lecciona esta disciplina na escola manifestou não ter disponibilidade para

participar.

Os docentes envolvidos eram o António e o José — professores do quadro

com, respectivamente, 16 e 5 anos de serviço — a Filomena — professora


provisória com 5 anos de serviço — e a Clara e a Aida — duas professoras

estagiárias em início de carreira. O António era professor das turmas 11º 1 e 11º 3;

o José da 10º 2; a Filomena da 12º 1; a Clara das 10º 1 e 11º 2; e a Aida da 10º 3.

Na opinião destes professores, o fraco desempenho académico da maioria dos

seus alunos deve-se à falta de conhecimentos e de métodos de estudo, a

dificuldades de aprendizagem e de organização do pensamento e,

fundamentalmente, à falta de motivação relativamente às actividades escolares.

Tanto as designações das turmas (dentro de cada ano de escolaridade) como os

nomes dos professores foram alterados propositadamente. A garantia do

anonimato procurou facilitar uma maior abertura e autenticidade dos participantes.

3.4 Instrumentos

3.4.1 As actividades de discussão

As actividades de discussão em grupo foram concebidas pelo investigador,

durante os anos lectivos de 1993/94 e 1994/95, com vários objectivos:

50
1. Motivar a participação e o envolvimento dos alunos em actividades

escolares centradas em conteúdos de várias disciplinas do ensino

secundário;

2. Criar um ambiente de interacção na sala de aula capaz de promover:

a) a construção de conhecimentos científicos e meta-científicos sobre os

novos avanços na área da Biotecnologia e da Genética;

b) o desenvolvimento de competências cognitivas, tais como a recolha e

análise de informação, a formulação de juízos de valor, a argumentação,

a análise e a avaliação de argumentos, a tomada de decisões, a

organização e gestão de trabalho e de pensamento;


c) o desenvolvimento de competências sócio-afectivas, como a

cooperação, a auto-estima, o envolvimento na turma e nas actividades

escolares e a tolerância relativamente aos colegas e às suas diferentes

opiniões.

Considera-se que a actualidade, o interesse e a controvérsia do tema em

questão encerram a potencialidade de motivar os alunos e de desencadear

reflexão e debate. Temas como a Genética e a Biotecnologia revelam-se úteis num

novo estilo de ensino/aprendizagem centrado na interacção na sala de aula e

pautado pela reflexão e pela avaliação crítica das relações entre Ciência,

Tecnologia e Sociedade.

De um total de 20 actividades com temas diferentes, o conjunto dos

professores envolvidos no estudo seleccionou apenas 5 de acordo com critérios

pessoais relacionados com o seu eventual potencial em motivar os alunos e com a

relevância das mesmas para as disciplinas que leccionam. Cada actividade

implicava dois tempos lectivos: o primeiro ocupado com a discussão do tema pelos

diferentes grupos e o segundo destinado a uma discussão geral, de toda a turma,

gerida pelo professor. As 5 actividades foram integradas numa sequência

previamente definida de 11 aulas (Quadro 1) que incluía uma sessão inicial para a

51
introdução ao tema Ciência/Tecnologia/Sociedade, a distribuição de textos

informativos sobre cada um dos temas a discutir (Anexo 5), a apresentação dos

objectivos e da metodologia a utilizar e a formação dos grupos de alunos.

Quadro 1

Síntese da Sequência das Actividades


1ª Aula Introdução: Ciência/Tecnologia/Sociedade.
Textos informativos.
Objectivos e metodologia.
Formação dos grupos.
2ª e 3ª 1ª Actividade.
Aulas Rastreio genético para efeitos de contratação de pessoal e de aquisição
de seguros de vida.
4ª e 5ª 2ª Actividade.
Aulas Afirmação de Francis Crick sobre eugenia.
6ª e 7ª 3ª Actividade.
Aulas Rastreio genético da fibrose quística.
8ª e 9ª 4ª Actividade.
Aulas Diferentes aplicações da engenharia genética.
10ª e 11ª 5ª Actividade.
Aulas Engenharia genética: previsão do futuro da espécie humana.

Previamente, foi definido que, durante as actividades, os professores não

deveriam revelar opiniões pessoais relativamente a eventuais potencialidades

tanto do tema como da metodologia. Os textos distribuídos forneciam informação

científica sobre cada um dos temas em análise e deveriam ser lidos

individualmente, em casa, pelos alunos. As actividades previstas podiam ser

realizadas intercaladamente com outras actividades de temáticas diferentes desde

que a conclusão de toda a sequência não excedesse um mês.

A discussão dos temas decorreu de acordo com o método “Os Seis

Chapéus do Raciocínio” proposto por de Bono (1985, 1995). O assunto de cada

uma das actividades foi discutido de acordo com uma sequência de “chapéus de

52
raciocínio” pré-determinada e adequada à exploração da situação em causa. Cada

chapéu podia ser utilizado durante um período máximo de 5 minutos. A sequência

de “chapéus” variou consoante o teor da tarefa proposta. Esta metodologia surge

como um instrumento de orientação da atenção para vários tipos de raciocínio,

ajudando a reduzir a confusão e a disciplinar o pensamento. A utilização d’“Os Seis

Chapéus do Raciocínio”, além de constituir uma forma de rentabilizar/potenciar a

discussão em grupo, pretende fornecer aos alunos um modelo de tomada de

decisões capaz de os ajudar a efectuar escolhas pessoais através da análise das

situações, da clarificação dos seus valores e da avaliação das consequências das

suas opções.
Os alunos foram associados em grupos de 4 a 5 elementos, visando

estimular a interacção através do aumento das probabilidades de diversificação

dos pontos de vista e valores pessoais. Tal como acontece noutros contextos

diferentes do contexto escolar, os grupos foram formados pelos próprios alunos,

sendo notória uma heterogeneidade relativamente ao género e à etnia.

O papel do professor durante a realização das actividades consistiu em: a)

motivar e sensibilizar para o assunto em análise; b) dinamizar as sessões de

discussão alargadas a toda a turma; e c) envolver toda a turma no esclarecimento

de dúvidas apresentadas pelos grupos. Durante as sessões em pequeno grupo o

professor procurou manter o ritmo e o interesse da discussão sem revelar as suas

opiniões pessoais sobre o assunto. Apenas no final da sessão de discussão

alargada a toda a turma, o professor podia apresentar as suas opiniões caso

fossem solicitadas ou consideradas pertinentes. Com este comportamento,

pretendia-se não influenciar a evolução da discussão, evitando que as opiniões do

professor podessem ser interpretadas como as “opiniões correctas” ou as

“respostas pretendidas”.

53
3.4.1.1 Actividade 1

Tema

A actividade 1 (Anexo 6) centra-se nas questões éticas resultantes da

análise do genoma humano e da eventual utilização das técnicas de rastreio

genético para efeitos de contratação de pessoal e de aquisição de seguros de

vida. Nesta actividade discute-se uma notícia publicada no jornal “Público”

segundo a qual “os testes genéticos realizados para efeitos de contratação de

pessoas e de seguros de vida e saúde deverão ser banidos em quase toda a

Europa dentro de alguns anos, nos termos de um tratado em preparação no âmbito


do Conselho da Europa”. Desde 1986 que se procede ao mapeamento e à

descodificação dos 50.000 a 100.000 genes existentes nos 46 cromossomas

humanos (genoma humano) através de um empreendimento internacional

gigantesco — Projecto Genoma Humano. Este projecto permitirá: a) identificar os

genes responsáveis por doenças humanas ou os genes que contribuem para o seu

aparecimento; b) diagnosticar a ocorrência de determinada enfermidade genética,

ou a simples predisposição, antes do nascimento ou antes do aparecimento de

sintomas; c) produzir proteínas humanas desconhecidas que possuam valor

médico; e d) conhecer melhor as bases bioquímicas de aspectos fisiológicos e

comportamentais da biologia humana (Brum, McKane & Karp, 1994). Contudo,

apesar dos seus benefícios inegáveis, este projecto suscita sérias preocupações

éticas relacionadas, principalmente, com a possível invasão da nossa privacidade

— através da revelação do património genético individual — e com a eventual

alteração futura dos genes humanos com objectivos pouco claros (Archer, 1992,

1996; Barbour, 1992; Brum, McKane & Karp, 1994; Grisolía, 1992; Draper, 1992,

1995; Nolan, 1995; Penslar, 1995).

Um dos primeiros resultados do Projecto Genoma Humano consistiu na

identificação e na clonagem dos genes responsáveis por várias doenças

54
hereditárias. Este resultado permite diagnosticar a ocorrência de determinada

enfermidade genética, ou a simples predisposição, antes da implantação do

embrião (diagnóstico pré-implantatório), antes do nascimento (diagnóstico

pré-natal) ou após o nascimento de um indivíduo (diagnóstico pré-sintomático). O

diagnóstico pré-sintomático permite prever, com várias dezenas de anos de

avanço, a manifestação de doenças que, por exemplo, só se revelam depois dos

40 ou 50 anos de idade. Os seus maiores problemas resultam da detecção da

presença ou da possibilidade de doenças para as quais não existe cura. Nestas

circunstâncias, algumas pessoas manifestam-se claramente contra a sua

utilização. Frequentemente os eventuais portadores de alterações genéticas, que


só se manifestam tardiamente, optam pela não realização dos testes. Actualmente

este tipo de diagnóstico permite deslocar o foco da medicina e dos serviços de

saúde do diagnóstico das doenças actuais dos indivíduos para a detecção da

predisposição de as desenvolver. Assim, corre-se o risco das pessoas que não

apresentam qualquer sintoma de doença poderem ser classificadas de deficientes

e discriminadas por companhias de seguros de vida. Potenciais empregadores

poderão recusar empregos a estes indivíduos por não quererem arriscar eventuais

despesas médicas nem quererem gastar tempo e dinheiro a treinar um empregado

com uma esperança de vida limitada. Actualmente, nos Estados Unidos, algumas

indústrias só admitem trabalhadores cujos testes genéticos não tenham detectado

susceptibilidades a determinadas substâncias químicas. O que antigamente era

considerado doença de trabalho resultante de más condições de trabalho passou a

ser considerado como susceptibilidade genética do trabalhador a substâncias

químicas (Draper, 1992; Kitcher, 1996). Assim, diminuem-se os dias de atestado

médico e os respectivos encargos sociais e aumenta-se a produtividade das

empresas. No entanto, corre-se o risco do alargamento da aplicação destes testes

a trabalhadores já efectivos que, no caso de resultados positivos, poderiam ter que

optar entre o despedimento ou o não recebimento de indemnização em caso de

55
doença. Todos estes problemas se agravam quando a análise genética não

consegue prever, com certeza absoluta, se determinado indivíduo irá desenvolver

determinada doença, o que acontece com doenças multifactoriais como o cancro,

as doenças cardíacas e a esquizofrenia, resultantes de uma intrincada interacção

entre genes e factores ambientais.

Sequência de Chapéus Utilizada

A sequência proposta para a reflexão e discussão do tema é constituída

pelos seguintes chapéus:

1. Chapéu vermelho - Para descobrir os sentimentos existentes sobre o


assunto;

2. Chapéu amarelo - Para identificar aspectos positivos da medida descrita

no artigo em discussão;

3. Chapéu preto - Para avaliar os pontos negativos da medida descrita; e

4. Chapéu azul - Para resumir e obter conclusões.

A utilização inicial do chapéu vermelho permite ao aluno avançar com um

palpite ou uma intuição sem necessidade de a apoiar ou justificar. Segundo de

Bono (1995), o raciocínio deve ser iniciado com o chapéu vermelho sempre que se

prevê a existência de um sentimento forte relativamente a um assunto de forma a

expor esses sentimentos.

Também se segue o conselho de de Bono (1995) relativamente à utilização

do chapéu amarelo antes do chapéu preto numa situação de avaliação. Na opinião

deste autor, é difícil ser-se positivo depois de se ter sido negativo.

56
3.4.1.2 Actividade 2

Tema

A actividade 2 (Anexo 6) centra-se nas questões éticas resultantes da

eventual utilização de técnicas genéticas na selecção de características em seres

humanos. Nesta actividade discute-se uma afirmação de Francis Crick, Prémio

Nobel da Medicina pela descoberta da estrutura da molécula do ADN, segundo a

qual “nenhum recém-nascido deveria ser reconhecido como ser humano antes de

ser aprovado em testes de dotação genética; os reprovados deveriam perder o

direito à vida” (Clarke, 1989).


As técnicas de diagnóstico genético ou de terapia génica podem ser

utilizadas, não só no diagnóstico ou no tratamento de genes causadores de

doenças graves mas também na selecção de características consideradas

desejáveis. Actualmente, a amniocentese, seguida da interrupção da gravidez, é

utilizada na selecção do sexo das crianças em países como a Índia e a China. A

fertilização in vitro permite a selecção e a implantação de embriões de determinado

sexo. A engenharia genética de melhoramento, através da introdução de

determinados genes em células, poderá acentuar características consideradas

desejáveis, tais como memória, estatura e resistência a substâncias tóxicas. Em

cada um destes casos, os pais poderão seleccionar as características dos seus

filhos, o que poderá ter consequências sociais desastrosas: algumas Sociedades

poderão pretender ter mais filhos do que filhas. A selecção de características

desejáveis poderá ainda ter como objectivo o melhoramento da Sociedade, ou seja,

a sua eugenia. Apesar de desacreditada por uma aplicação abusiva e criminosa

durante a Segunda Guerra Mundial, a eugenia deve ser submetida a uma

verdadeira análise crítica. Por enquanto, utiliza-se a eugenia na selecção artificial

de características favorecendo a reprodução dos indivíduos portadores de “genes

favoráveis” (a eugenia positiva; por exemplo, a criação do banco de esperma dos

57
Prémios Nobel dos EUA), ou afastando da reprodução os que possuem “genes

desfavoráveis” (a eugenia negativa; por exemplo, o aborto voluntário em caso de

doença do feto) (Buican, 1986). No entanto, futuramente, poderá proceder-se à

modificação deliberada do genoma humano por engenharia genética de

melhoramento. Apesar do melhoramento da espécie humana ser cientificamente

desejável, provocaria uma diminuição do polimorfismo genético — única garantia

de sobrevivência da nossa espécie em caso de alterações ambientais (Buican,

1986). Archer (1996) considera que os riscos da introdução de um gene estranho

serão, certamente, maiores do que os riscos resultantes duma “reposição da

normalidade” pela introdução de um gene por terapia génica. Este autor refere que
“a adição de um gene não planeado poderia desequilibrar o organismo e causar

mais inconvenientes do que benefícios” (p. 239). A diversidade humana poderia,

ainda, ser reduzida a um estereótipo transitório e perecível de beleza, inteligência

ou de saúde (Barbour, 1992; Buican, 1986). Quem teria a competência de

determinar os “defeitos” a serem corrigidos e as características a serem impostas

às futuras gerações?

Sequência de Chapéus Utilizada

A sequência de chapéus proposta para a reflexão e discussão do tema é

idêntica à utilizada na actividade anterior:

1. Chapéu vermelho - Para descobrir os sentimentos existentes sobre o

assunto;

2. Chapéu amarelo - Para identificar aspectos positivos da eventual

aplicação do teor da afirmação em discussão;

3. Chapéu preto - Para avaliar as fraquezas e os perigos da afirmação; e

4. Chapéu azul - Para resumir e obter conclusões.

Também nesta actividade se utilizam: a) o chapéu vermelho no início da

discussão; e b) o chapéu amarelo antes do chapéu preto para avaliação da

58
afirmação. As razões justificativas são idênticas às apresentadas para a actividade

1.

3.4.1.3 Actividade 3

Tema

A actividade 3 (Anexo 6) centra-se nas questões éticas resultantes da

análise do genoma humano e da eventual utilização das técnicas de rastreio

genético no diagnóstico de determinada enfermidade genética, ou no cálculo das

probabilidades dos descendentes serem portadores dessa doença. Nesta


actividade os participantes são convidados a reflectirem e a discutirem o que

fariam caso descobrissem que possuiam, bem como a pessoa com quem

desejavam casar e ter filhos, uma alteração genética responsável pela fibrose

quística, o que implicaria uma probabilidade de 25% de terem filhos doentes.

Actualmente, existem testes capazes de diagnosticar várias doenças

genéticas como a fenilcetonuria, a fibrose quística e a doença de Huntington

(Brum, McKane & Karp, 1994). Os testes de diagnóstico genético da fibrose

quística permitem detectar 90% dos genes causadores desta doença hereditária

autossómica recessiva. Trata-se de uma doença que altera o transporte de cloro e,

consequentemente, o transporte de água dentro do organismo. Estas alterações

traduzem-se num espessamento das mucosidades e na sua acumulação nas vias

respiratórias, originando doenças pulmonares crónicas, incluindo infecções

potencialmente fatais (Solomon, Berg, Martin & Villee, 1993). Até há poucos anos,

os portadores dos dois genes autossómicos recessivos morriam por volta dos cinco

anos de idade; actualmente, a utilização de antibióticos e de certas terapias de

descongestionamento das vias respiratórias permite-lhes alcançar a vida adulta.

Estes testes de diagnóstico genético, apesar de serem considerados

verdadeiros "milagres" da medicina moderna, levantam várias questões éticas de

59
difícil resposta. No caso dos diagnósticos pré-implantatório ou pré-natal, por vezes,

os resultados positivos podem conduzir a terapias correctivas (fenilcetonuria, por

exemplo). Mas sempre que é detectada uma doença genética grave e incurável o

casal enfrenta a decisão difícil de um eventual aborto. Alguns decidem interromper

a gravidez por considerarem que, caso fosse levada a bom termo, se traduziria em

sofrimento para toda a família. Outros opõem-se terminantemente por motivos

religiosos ou motivos pessoais como, por exemplo, a esperança da futura

descoberta de cura. Outros, ainda, não são capazes de resistir ao mito do “filho

perfeito”, subtilmente difundido por uma Sociedade com todas as vantagens em

diminuir os recursos destinados à assistência a deficientes, acabando por aceitar,


sem ponderação, a interrupção voluntária da gravidez (Nunes, 1996). A

progressiva utilização dos diagnósticos pré-implantatório e pré-natal conduzirá,

forçosamente, à alteração da atitude da Sociedade relativamente ao deficiente. Os

poucos deficientes que escapem à interrupção voluntária da gravidez correrão o

risco de serem discriminados (Chadwick, 1992). Teme-se, inclusivamente, que o

próprio estado possa vir a limitar o acesso destes deficientes à segurança social,

obrigando os pais a sustentarem sozinhos o encargo pelo qual optaram

voluntariamente.

Sequência de Chapéus Utilizada

A sequência proposta para a reflexão e discussão do tema é constituída

pelos seguintes chapéus:

1. Chapéu vermelho - Para descobrir os sentimentos existentes sobre o

assunto;

2. Chapéu branco - Para recolher informação sobre o assunto;

3. Chapéu verde - Para desenvolver as alternativas mais capazes;

4. Chapéu amarelo - Para identificar aspectos positivos de cada opção;

5. Chapéu preto - Para avaliar as fraquezas e os perigos de cada opção;

60
6. Chapéu azul - Para resumir e obter conclusões; e

7. Chapéu vermelho - Para descobrir os sentimentos perante a opção final.

As diferenças existentes entre esta sequência e as anteriores resultam do

facto das situações serem diferentes: nas actividades 1 e 2 reage-se a uma ideia;

nesta actividade procuram-se ideias alternativas. A utilização do chapéu branco

pretende envolver os alunos na recolha de informações sobre a doença em causa.

Para tal, os alunos podem recorrer a textos previamente distribuídos pelo

professor. A inclusão do chapéu verde destina-se a alargar o leque das opções ou

alternativas com base nas informações já recolhidas. De seguida, cada uma das

alternativas é avaliada pelos chapéus amarelo e preto. As razões que levam à


utilização do chapéu vermelho no início da actividade e à utilização do chapéu

amarelo antes do preto são idênticas às apontadas para as actividades 1 e 2.

3.4.1.4 Actividade 4

Tema

A actividade 4 (Anexo 6) centra-se nas questões éticas suscitadas pelas

diferentes aplicações da engenharia genética. Nesta actividade os participantes

são convidados a sugerirem possíveis aplicações desta Tecnologia na medicina,

na pecuária, na agricultura e nas indústrias alimentar e química e a discutirem os

aspectos positivos e negativos de cada uma dessas hipotéticas aplicações.

Sabe-se que os genes existentes nos cromossomas condicionam as

características de qualquer ser vivo. Estes genes são segmentos de ADN (ácido

desoxirribonucleico) responsáveis pela síntese de uma proteína ou cadeia

polipeptídica (Archer, 1996). Por sua vez, as proteínas dominam a estrutura e o

funcionamento dos organismos. Qualquer alteração na composição química de um

gene (mutação) provoca, geralmente, uma alteração na proteína respectiva que

poderá estar na base de determinada doença genética (Archer, 1996).

61
Actualmente, através da engenharia genética é possível introduzir e tornar

funcional, num ser vivo, um gene proveniente de outro ser vivo de uma espécie

diferente (Archer, 1992). Esta técnica permite criar microrganismos capazes de

sintetizarem proteínas com interesse comercial e alterar características de plantas

e de animais.

A introdução e consequente multiplicação de genes humanos em bactérias

ou leveduras permitiu, por exemplo, a produção em massa de insulina humana

desde 1982 e a produção da vacina da hepatite e da hormona de crescimento

desde 1986 (Barbour, 1992). Desta forma, obtêm-se estes produtos em

quantidades ilimitadas e, portanto, a custos mais reduzidos.


Actualmente, investiga-se activamente a produção de microrganismos, de

plantas e de animais com características particulares através de engenharia

genética. Booth (1996), Nossal & Coppel (1989), Spinney (1996) e Wheale &

McNally (1988) apresentam as seguintes potencialidades da investigação na área

da engenharia genética:

• O aumento da tolerância das plantas a altos teores de salinidade e a

temperaturas extremas de forma a permitir o seu desenvolvimento em novos

habitats;

• A obtenção de plantas resistentes a determinado herbicida que permitam a

eliminação das ervas daninhas sem afectar as colheitas;

• A introdução do gene da proteína tripsina — tóxico para os insectos e

inofensivo para as plantas e os seres humanos — em plantas com o objectivo de

as tornar resistentes a pragas;

• O aumento do teor nutritivo dos alimentos através da indução de

alterações na sua variedade de aminoácidos essenciais;

• A introdução de genes nas plantas responsáveis pela fixação do azoto

atmosférico — genes esses existentes em determinadas bactérias — com o

objectivo de diminuir a utilização de fertilizantes e aumentar as colheitas;

62
• A incorporação de genes de peixes de águas frias em tomate fresco de

forma a torná-lo mais resistente ao apodrecimento e à geada;

• A aceleração da taxa de crescimento de animais e a produção de mais

músculo e menos gordura por alteração genética;

• A produção de galinhas resistentes à salmonela com a finalidade de evitar

intoxicações alimentares;

• A introdução em vacas de genes responsáveis pela produção do leite

humano para ultrapassar o problema dos recém-nascidos que não toleram leite de

vaca; e

• A incorporação de vírus, alterados geneticamente, em plantas com o


objectivo de se produzirem frutos capazes de imunizarem os seus consumidores

contra doenças como a hepatite B.

Actualmente já é possível dispor de seres vivos e produtos derivados

alterados geneticamente. Archer (1996), Barbour (1992), Brum, McKane & Karp

(1994) e Booth (1996) apontam como exemplos:

• bactérias em morangos alteradas de forma a não funcionarem como

núcleos para a formação de cristais de gelo;

• microrganismos que facilitam a produção de combustíveis líquidos através

da fermentação de madeira e de palha;

• bactérias que aceleram a degradação de derrames de petróleo;

• tomate mais resistente ao apodrecimento devido à incorporação de um

gene retardador da acção de enzimas que destroem a pectina;

• micorganismos possuidores de enzimas muito activas capazes de

converter detritos celulósicos em produtos alimentares; e

• ratos portadores de genes humanos responsáveis por doenças destinados

ao desenvolvimento de medicamentos.

Apesar dos seus benefícios inegáveis, estas modificações genéticas

levantam sérias preocupações éticas relacionadas com eventuais impactos

63
negativos sobre o ambiente, a saúde pública e a Sociedade e os seus valores:

Quais são as consequências da libertação no ambiente de organismos

geneticamente alterados? Que critérios deverão ser adoptados de forma a evitar

desequilíbrios ambientais graves? Quais são os impactos destas inovações

tecnológicas sobre, por exemplo, os agricultores e o Terceiro Mundo? Será

moralmente aceitável a manipulação genética dos seres vivos?

Actualmente, sabe-se que o equilíbrio de qualquer ecossistema envolve

uma rede extremamente complexa e delicada de inter-relações entre os seres

vivos que o constituem e entre eles e o meio físico. A introdução no ambiente de

um ser vivo com alterações genéticas poderia provocar um desequilíbrio de


consequências catastróficas: se a alteração genética tivesse como consequências

uma total resistência aos seus predadores clássicos e/ou o aumento da taxa de

crescimento, a sua proliferação incontrolada seria um facto. Em 1975, na

Conferência de Asilomar, definiram-se normas rigorosas de confinamento, com o

objectivo de evitarem a libertação acidental de organismos manipulados

geneticamente e potencialmente perigosos (Berg, Baltimore, Brenner, Roblin III &

Singer, 1993). No entanto, o facto de não se ter registado qualquer acidente de

saúde nos diferentes laboratórios envolvidos neste tipo de investigação levou ao

abrandamento destas normas em 1979 (Barbour, 1992). A partir dos anos oitenta,

o debate centra-se na libertação deliberada de organismos modificados

geneticamente e na eventual transferência das suas alterações a outras espécies.

Teme-se, por exemplo, que a resistência induzida de uma espécie vegetal aos

herbicidas possa passar para as ervas daninhas, originando uma praga difícil de

controlar (Barbour, 1992). Foram publicadas recomendações internacionais

(OCDE, 1986) e legislações específicas nacionais sobre esta matéria. Em Portugal,

foi transposta uma Directiva da Comunidade Europeia, através do Decreto-Lei nº

126/93 de 20 de Abril (Ministério do Ambiente e Recursos Naturais, 1993) e

regulamentada pela Portaria nº 602/94 de 13 de Julho (Ministérios da Saúde e do

64
Ambiente e Recursos Naturais, 1994) que obriga os estados membros a criarem

uma autoridade nacional responsável pela avaliação/controlo das condições em

que decorrem os diferentes projectos de investigação nacionais. Estas funções

foram atribuídas à Direcção-Geral da Qualidade do Ambiente pertencente ao

Ministério do Ambiente e Recursos Naturais. Segundo Archer (1996), a decisão de

libertar organismos geneticamente modificados para o ambiente terá,

forçosamente, que passar por uma análise caso-a-caso, acompanhada pela

realização sequencial de testes de risco em laboratório, em estufa, numa área

limitada e, finalmente, em campo aberto.

Outras preocupações éticas despoletadas pela alteração genética de seres


vivos centram-se no impacto destas inovações tecnológicas sobre, por exemplo, os

agricultores e os “países em desenvolvimento”. A possibilidade das empresas

patentearem seres vivos alterados geneticamente, aliada ao facto de apenas um

reduzido número de grandes empresas conseguir dispôr dos recursos necessários

à investigação nesta área, terá como consequências a redução da competição

económica e o consequente aumento da especulação. O patenteamento de

sequências de informação genética levará à cobrança de licenças e de direitos de

utilização sempre que, de futuro, estes conhecimentos venham a ser utilizados. Os

pequenos agricultores e criadores de gado dificilmente poderão ter acesso a estas

inovações tecnológicas, o que diminuirá a competitividade das suas explorações

face às grandes empresas. Até que ponto será lícito as grandes empresas

patentearem seres vivos, passando a lucrar com bens anteriormente ao dispôr de

toda a humanidade? Os “países em desenvolvimento” serão grandemente

afectados em todo este processo pois dificilmente terão acesso aos frutos desta

Tecnologia de ponta. Os custos elevados e o facto da investigação nesta área se

destinar, maioritariamente, à obtenção de lucros fáceis através da resolução dos

problemas dos países com grande poder económico não o permitirão. “Todos os

avanços tecnológicos são objecto de um cuidado proteccionismo que impede os

65
países em desenvolvimento de usufruírem das grandes aquisições da Ciência”

(Pintassilgo, 1996, p. 129). Buttel (citado em Barbour, 1992) refere que a produção

de morangos resistentes à geada recebeu mais atenção do que os melhoramentos

em qualquer cultura de subsistência dos “países em desenvolvimento”. Então,

como se poderá aceitar a afirmação de que a alteração genética de plantas e de

animais poderá resolver o problema da fome no mundo? Será que este problema

não poderia já ter sido resolvido através de uma distribuição e de uma utilização

racional dos alimentos? Pintassilgo considera um imperativo ético “contribuir para

a total transparência da Ciência nos domínios que afectam as Biotecnologias,

criando uma maior circulação da informação e uma total reciprocidade de


benefícios entre países desenvolvidos e em desenvolvimento” (p. 129).

Outra questão ética centra-se no papel das espécies animais em todo este

processo. Será lícita a transferência de genes entre animais diferentes? Será lícito

introduzir em animais genes responsáveis por doenças humanas? É inegável que

muitos dos avanços na área da medicina só foram possíveis graças à

experimentação em animais. No entanto, a constatação de que a experimentação é

indispensável ao progresso médico não significa que, de um ponto de vista ético,

seja pacífica a aceitação de tal prática (Osswald, 1996). Singer (1993) defende que

tanto as relações entre os seres humanos como as relações entre o homem e os

animais se devem basear no princípio moral da igualdade. Considera que o facto

dos animais não pertencerem à nossa espécie não nos dá o direito de explorá-los

nem de fazê-los sofrer voluntária e deliberadamente. Por sua vez, Osswald afirma

que a experimentação em animais é inteiramente aceitável, do ponto de vista ético,

desde que se tratem os animais com respeito, não se façam experiências inúteis

ou supérfluas e se evite o sofrimento ou a dor através de anestesia ou analgesia.

66
Sequência de Chapéus Utilizada

A sequência proposta para a reflexão e discussão do tema da actividade 4 é

constituída pelos seguintes chapéus:

1. Chapéu branco - Para recolher informação sobre o assunto;

2. Chapéu verde - Para obter o maior número de aplicações da engenharia

genática;

3. Chapéu amarelo - Para identificar aspectos positivos de cada uma das

aplicações sugeridas;

4. Chapéu preto - Para avaliar as fraquezas e os perigos de cada uma das

aplicações sugeridas; e
5. Chapéu vermelho - Para recolher os sentimentos finais sobre o assunto.

A utilização do chapéu branco pretende envolver os alunos na recolha de

informações sobre a Tecnologia em questão. Mais uma vez, os alunos podem

recorrer a textos previamente distribuídos pelo professor. A inclusão do chapéu

verde pretende envolver os alunos na proposta criativa de aplicações da

engenharia genética na medicina, na pecuária, na agricultura e nas indústrias

alimentar e química. Este chapéu proporciona aos alunos liberdade de pensamento

em qualquer direcção. Posteriormente, cada uma das aplicações sugeridas é

avaliada através da utilização dos chapéus amarelo e preto. Desta vez, o chapéu

vermelho não se incluiu pelo facto da actividade proposta não despoletar

imediatamente sentimentos fortes. Também aqui, se utiliza o chapéu amarelo antes

do preto, de acordo com a sugestão de de Bono já referida.

3.4.1.5 Actividade 5

Tema

A actividade 5 (Anexo 6) convida os alunos a tentarem prever como será o

futuro da espécie humana atendendo a todas as inovações tecnológicas na área

67
da Biotecnologia genética, e respectivas implicações éticas, discutidas nas

actividades anteriores. Permite a abordagem de todas as questões discutidas

anteriormente e pretende funcionar como síntese das diferentes sessões.

Sequência de Chapéus Utilizada

A sequência proposta para a abordagem da actividade 5 era constituída

pelos seguintes chapéus:

1. Chapéu vermelho - Para descobrir os sentimentos existentes sobre o

assunto;

2. Chapéu branco - Para recolher informação sobre o assunto;


3. Chapéu verde - Para desenvolver o maior número de previsões; e

4. Chapéu vermelho - Para descobrir os sentimentos relativamente ao

cenário final previsto.

Visto a actividade poder desencadear sentimentos bastantes fortes nos

alunos, utiliza-se o chapéu vermelho tanto no início como no final da mesma. A

utilização do chapéu branco pretende envolver os alunos numa síntese da

informação discutida durante todo o conjunto de sessões. A inclusão do chapéu

verde destina-se a despoletar a criatividade dos alunos no intuito de preverem o

futuro da espécie humana, com base em toda a informação resumida

anteriormente.

3.4.2 Observação das actividades

A observação procurou detectar e registar eventuais reacções dos

professores e dos alunos às actividades. Foi utilizado um instrumento de registo,

estruturado de acordo com ”Os Seis Chapéus do Raciocínio” (Anexo 4), no qual o

investigador anotou observações efectuadas na perspectiva de cada um dos

68
chapéus:

1. Chapéu branco - Factos e informações sobre a implementação das

actividades (por exemplo, número de alunos por grupo, distribuição dos grupos

pela sala).

2. Chapéu vermelho - Emoções e sentimentos manifestados ou

evidenciados pelo professor ou pelos alunos relativamente às actividades.

3. Chapéu amarelo - Reacções positivas às actividades.

4. Chapéu preto - Reacções negativas às actividades.

5. Chapéu verde - Comentários ou comportamentos que sugiram alterações

capazes de melhorar as actividades.


6. Chapéu azul - Avaliação geral da forma como decorre a actividade

realizada.

Foram observadas três sessões por turma: a primeira, na qual era

apresentada a metodologia e os objectivos das actividades; a segunda, em que os

vários grupos discutiram o primeiro tema; e uma outra, seleccionada de acordo

com a disponibilidade do investigador e os horários das turmas. Enquanto a

primeira observação procurou detectar eventuais desvios, relativamente à forma

previamente acordada, na apresentação dos objectivos e da metodologia das

sessões, a segunda e a terceira observações destinaram-se a detectar e a registar

as reacções dos professores e dos alunos às actividades de discussão.

3.4.3 Entrevistas aos professores

Após a conclusão de toda a sequência de actividades foram realizadas

entrevistas semi-estruturadas a cada um dos professores envolvidos na

investigação. Numa sala da escola, o investigador convidou, individualmente, cada

professor a pronunciar-se sobre o tema e a metodologia das actividades, através

69
da utilização sequencial de cinco chapéus do raciocínio (Anexo 1):

1. Chapéu vermelho - Emoções e sentimentos relativamente ao tema e à

metodologia utilizada.

2. Chapéu amarelo - Aspectos positivos e vantagens do tema e do método

das actividades de discussão.

3. Chapéu preto - Aspectos negativos, desvantagens e problemas do tema e

do método das actividades de discussão.

4. Chapéu verde - Sugestões para a melhoria das actividades.

5. Chapéu azul - Avaliação global das actividades realizadas.

O chapéu branco não foi utilizado na medida em que se pretendiam


conhecer os sentimentos e as opiniões dos professores e não informações

objectivas.

Cada uma das entrevistas foi registada em audio e, posteriormente,

transcrita com o objectivo de se proceder a análise de conteúdo.

3.4.4 Questionário para avaliação das actividades pelos alunos

No final da primeira e da quarta actividades de discussão foi solicitado a

cada um dos alunos participantes que efectuasse por escrito uma avaliação da

actividade de discussão. Para tal, foi entregue a cada aluno uma ficha, para

avaliação do tema e da metodologia das actividades através da utilização

sequencial de 5 “Chapéus do Raciocínio” (Anexo 2):

1. Chapéu vermelho - Sentimentos relativamente ao tema e à metodologia

das actividades.

2. Chapéu amarelo - Aspectos positivos.

3. Chapéu preto - Aspectos negativos.

4. Chapéu verde - Sugestão de alterações tendentes a melhorar as

actividades.

70
5. Chapéu azul - Avaliação global.

Também aqui não foi utilizado o chapéu branco pelo facto de se

pretenderem conhecer os sentimentos e as opiniões dos alunos e não informações

objectivas sobre as actividades de discussão.

3.4.5 Questionário para levantamento das opiniões dos alunos sobre

Biotecnologia

Este questionário pretendia verificar o impacto das actividades de discussão

nas opiniões dos alunos sobre Biotecnologia. Com o objectivo de detectar


eventuais variações de opinião, foi aplicado o mesmo questionário no início e no

final do estudo. O questionário era constituído por 22 afirmações diferentes sobre

relações entre Ciência, Tecnologia e Sociedade, relativamente às quais os alunos

deveriam indicar a sua opinião utilizando uma escala com cinco opções que

variava entre “concordo totalmente” e “discordo totalmente” (Anexo 3). Foram

vários os temas abordados:

“Crescimento científico e tecnológico e bem estar social” - 2 afirmações;

“A engenharia genética - potencialidades e perigos” - 6 afirmações;

“Análise do património genético - potencialidades e perigos” - 6 afirmações;

“Os cidadãos e a Biotecnologia” - 5 afirmações; e

“Controlo da investigação na área da Biotecnologia” - 3 afirmações.

O questionário foi validado por dois professores da Faculdade de Ciências

— um do Departamento de Educação, licenciado em Biologia e doutorado em

Educação; outro do Departamento de Biologia Vegetal, licenciado em Biologia e

doutorado em Genética — e pela aplicação, num estudo piloto, efectuado com uma

turma do 10º ano de escolaridade que não participou no estudo.

71
3.5 Método de Investigação: Os Seis Chapéus do Raciocínio

O método “Os Seis Chapéus do Raciocínio”, proposto por de Bono (1985,

1995), foi utilizado tanto nas actividades de discussão como na construção dos

instrumentos de recolha e análise de dados. Nas actividades de discussão, além

de constituir uma forma de rentabilizar/potenciar a discussão em grupo, pretendeu

fornecer aos alunos um método de tomada de decisões capaz de os ajudar a

efectuar escolhas pessoais através da análise das situações, da clarificação dos

seus valores e da avaliação das consequências das suas opções. A organização

dos questionários de avaliação das actividades pelos alunos, do guião de

entrevista aos professores e do guião de observação para o investigador através

d’“Os Seis Chapéus do Raciocínio” teve como principal objectivo facilitar a análise

de conteúdo, assegurando a abordagem dos mesmos aspectos por alunos,

professores e investigador.

Como foi referido no Capítulo 2, de Bono idealizou “Os Seis Chapéus do

Raciocínio” como um instrumento de orientação da atenção para vários tipos de

raciocínio, que ajuda a reduzir a confusão no raciocínio e a disciplinar o

pensamento. Este método parte do pressuposto que o raciocínio mais eficaz é

executado por sectores, ou seja, de forma compartimentada. A sua designação foi

inspirada na associação inglesa entre chapéu e raciocínio, no facto dos chapéus

poderem definir o papel que um indivíduo desempenha num momento específico e,

ainda, no facto de se colocarem e retirarem facilmente. Assim, os chapéus têm

cores diferentes, correspondentes a diferentes tipos de raciocínio:

Chapéu branco: Factos, números e informação. Que informações temos?

Que informações precisamos obter?

Chapéu vermelho: Emoções, sentimentos, palpites e intuições. Que

sentimos acerca desta questão?

72
Chapéu preto: Precaução. Verdade, avaliação, encaixe dos factos. Aponta

as fraquezas, os problemas, os perigos de uma ideia. Isto encaixa-se nos factos?

Resulta? É seguro? É praticável?

Chapéu amarelo: Vantagens, benefícios, poupanças. Porquê fazer? Quais

são os benefícios? Qual é a vantagem de o fazer?

Chapéu verde: Exploração, sugestões, novas ideias. Ideias construtivas.

Alternativas à acção. Transferência. Que podemos fazer aqui? Há outras ideias

diferentes?

Chapéu azul: Raciocinar sobre o pensamento. Controlo do processo do

raciocínio. Como avaliamos o ponto em que nos encontramos? Estabelecer o novo


passo do raciocínio. Estabelecer o programa do raciocínio.

Os seis chapéus podem ser utilizados isoladamente ou segundo uma

sequência pré-determinada — “colocando” os chapéus um após o outro — o que

funciona como um guião do raciocínio (de Bono, 1985, 1995). A colocação isolada

e ocasional dos chapéus permite a realização de um tipo particular de raciocínio ou

sugere uma troca de pensamento. A utilização de uma sequência de chapéus

pré-determinada permite uma exploração mais rápida e eficaz de um assunto e

revela-se útil quando existe uma discussão ou um desentendimento sobre uma

questão. Apesar desta sequência poder variar conforme as circunstâncias e ser

estabelecida livremente pelos intervenientes, de Bono fornece algumas

orientações para a sua definição:

1. Cada chapéu pode ser utilizado mais do que uma vez numa sequência.

2. Deverá ser definido um tempo máximo para utilização dos chapéus.

3. O chapéu amarelo deve ser utilizado antes do preto pois dificilmente se é

positivo depois de se ter sido negativo.

4. O chapéu preto pode ser utilizado tanto para o levantamento das

fraquezas de uma ideia — seguido do chapéu verde na tentativa de

ultrapassar essas fraquezas — como para a avaliação final de uma ideia.

73
5. Sempre que exista um sentimento forte relativamente a um assunto, o

raciocínio deve ser iniciado com o chapéu vermelho de forma a expor

esses sentimentos.

6. Se não houver grandes impressões, deve começar-se com o chapéu

branco com o objectivo de reunir informação. Seguidamente, utiliza-se o

chapéu verde para gerar alternativas. Finalmente, alternam-se os

chapéus amarelo e preto para avaliar cada alternativa.

De Bono propõe, ainda, algumas sequências (curtas e longas) passíveis de

serem utilizadas em situações específicas. Como sequências curtas sugere:

• na avaliação rápida de uma ideia - amarelo/preto/vermelho;


• para gerar ideias - branco/verde;

• para melhorar uma ideia existente: preto/verde; e

• para resumir e apontar alternativas: azul/verde;

Como exemplo de uma sequência mais longa, destinada a procurar uma

ideia, propõe:

1. Branco: levantamento da informação disponível.

2. Verde: proposta de alternativas.

3. Amarelo: avaliação dos benefícios e da praticabilidade de cada

alternativa.

4. Preto: avaliação dos perigos e fraquezas de cada alternativa.

5. Verde: melhoramento das alternativas mais capazes e selecção final.

6. Azul: resumo e avaliação do percurso efectuado.

7. Preto: avaliação final da alternativa seleccionada.

8. Vermelho: levantamento dos sentimentos relativamente ao resultado final.

74
3.5.1 Raciocínio à chapéu branco

Pense numa folha de papel em branco. Pense numa folha de


impressora. O chapéu branco significa informação neutra.
de Bono (1995, p. 80)

O raciocínio à chapéu branco constitui uma focagem directa em informação

que possa ser verificada. Envolve a formulação de várias perguntas:

1. Que informação possuímos? Para levantamento de factos, números,

listas, estatísticas, conhecimento ou experiência pessoal.

2. Que informações faltam? Na eventualidade de ser necessária

informação para: a) optar entre duas explicações possíveis; b)

seleccionar a melhor acção a empreender; c) saber se determinado

material satisfaz as necessidades.

3. Como obter a informação de que necessitamos? Para definição de

metodologias de pesquisa.

3.5.2 Raciocínio à chapéu vermelho

Pense em fogo e em quente. O chapéu vermelho é para as


emoções, impressões, palpites e intuições.”
de Bono (1995, p. 83)

O chapéu vermelho explora e expõe os sentimentos. Para de Bono, as

emoções, os sentimentos e a intuição desempenham um papel central no

pensamento: “O alvo de pensar é dispor o mundo (na nossa mente) de modo a

podermos aplicar eficazmente a emoção. No fim, é a emoção que faz as opções e

toma as decisões.” (1995, p. 27). No entanto, considera que os sentimentos, por

vezes, afectam o pensamento impedindo um raciocínio objectivo; quando são

utilizados no início, a percepção fica limitada e a opção de acção pode ser

inadequada. Apesar disto, não defende a sua exclusão no ensino do pensar mas a

sua utilização de uma forma adequada ao pensamento, ou seja, após as

75
alternativas terem sido examinadas. Nesta altura, devem os sentimentos e as

emoções tomar a opção final. “O alvo do raciocínio é dispor as questões para que

quando finalmente fizermos a escolha emocional, esta tenha uma melhor base” (de

Bono, 1995, p. 270).

3.5.3 Raciocínio à chapéu amarelo

Pense no brilho do sol e no optimismo. O chapéu amarelo está


cheio de esperança.
de Bono (1995, p. 88)

O chapéu amarelo é um chapéu lógico que se concentra nos benefícios ou

efeitos positivos de um plano de acção, de uma solução para um problema, de uma

escolha ou de uma decisão. Implica a previsão de consequências futuras sobre

outras pessoas e o ambiente. Logo, preocupa-se com valores. Envolve a

formulação de várias perguntas: Pode fazer-se isto? Vale a pena ser feito? Quem

sai beneficiado? Como surgem os benefícios? Quais são as vantagens? Quais são

os valores benéficos em jogo? Quem é afectado por estes valores?

Se a utilização do chapéu amarelo não conduzir à identificação de

benefícios suficientes, deveremos abandonar a ideia. Se os benefícios são

manifestos, a questão ainda terá de ser avaliada usando o chapéu preto.

3.5.4 Raciocínio à chapéu preto

Pense num juiz severo. Pense em alguém que assinala


fortemente um erro cometido.
de Bono (1995, p. 86)

O chapéu preto é um chapéu lógico que se centra nos aspectos negativos.

Pretende impedir erros e conduzir à melhoria das ideias através da detecção de

eventuais problemas ou perigos. À semelhança do chapéu amarelo, implica a


previsão de consequências futuras sobre outras pessoas e o ambiente. Logo,

76
também se preocupa com valores. O chapéu preto coloca uma série de perguntas:

É verdade? Isto encaixa-se nos nossos objectivos, nos nosso valores e no que

consideramos ser correcto? Isto resulta? Qual é o seu valor? Quais são os perigos

e os problemas que podem surgir? Isto justifica-se? A estas questões é necessário

responder com razões, com provas, e não com sentimentos ou pressentimentos.

3.5.5 Raciocínio à chapéu verde

Pense na relva, em árvores, em vegetação e crescimento.


Pense na energia do crescimento e da fertilidade. Pense em
rebentos e em ramos.
de Bono (1995, p. 92)

O chapéu verde centra-se na criatividade, permitindo dar saltos em frente

através da hipótese, especulação e provocação. Preocupa-se com propostas,

sugestões, novas ideias, novas alternativas, novas soluções, novas invenções,

novas possibilidades. Caracteriza-se pela acção e energia.

Ao contrário do pensamento à chapéu amarelo e à chapéu preto, o

pensamento à chapéu verde não implica a apresentação de razões lógicas em

defesa de sugestões ou de ideias. Apenas propõe um leque variado de opções que

será posteriormente examinado através da utilização dos chapéus amarelo e preto.

3.5.6 Raciocínio à chapéu azul

Pense no céu azul. O céu abarca tudo. Se estivéssemos no céu,


poderíamos olhar para tudo cá em baixo. Com o pensamento à
chapéu azul, estamos acima do pensamento; estamos a olhar
para o pensamento; (...) estamos a pensar no raciocínio.
de Bono (1995, pp. 94-95)

O chapéu azul proporciona uma visão global de todo o processo de

raciocínio. Permite controlar e dirigir o processo de raciocínio. Segundo de Bono, o

77
chapéu azul cobre quatro pontos:

1. Ponto de partida/focagem: Qual é o nosso problema? Em que nos

estamos a concentrar? Onde estamos no nosso raciocínio? Que

estamos a tentar fazer neste momento? Estamos a desviar-nos do rumo

traçado ou a conseguir algum resultado?

2. Definição dos passos seguintes; definição do processo/programa de

raciocínio/reflexão que poderá consistir numa sequência de chapéus:

Que fazer a seguir?

3. Ponto da situação, resumo e/ou clarificação de pontos de vista: Onde

nos encontramos? Até onde chegámos? Podemos fazer uma súmula?


Que fazer a seguir?

4. Controlo e monitorização: Cada um dos chapéus está a ser utilizado de

forma correcta? Esse tipo de raciocínio corresponde a este chapéu?

Esse chapéu deveria ser utilizado neste momento? Até que ponto não

nos estamos a desviar do rumo definido previamente?

3.6 Tópicos Seleccionados: Controvérsias em torno da


Biotecnologia

Todas as actividades de discussão abordam aspectos científicos e éticos da

Biotecnologia. A selecção destes temas baseou-se em duas ordens de razão:

1- As implicações éticas e morais dos avanços tecnológicos e científicos na

área da Biotecnologia constituem um tema óptimo para discussões alargadas a

toda a turma. A grande actualidade e interesse deste tema contribuem, de forma

inigualável, para a criação de um ambiente de reflexão e de debate na sala de aula

capaz de promover o desenvolvimento cognitivo e sócio-afectivo dos alunos.

78
2- A cidadania moderna e democrática requer uma cultura científica que

habilite todos os cidadãos para uma colaboração inteligente com os cientistas e

para uma avaliação crítica dos efeitos da Ciência e da Tecnologia na Sociedade.

Torna-se imprescindível que a população esteja apta a avaliar as potencialidades e

os perigos dos novos avanços da Ciência e da Tecnologia de modo a poder

participar num processo decisório que a todos diz respeito.

Vivemos numa Sociedade polémica, marcada por desenvolvimentos

científicos e tecnológicos controversos e caracterizada por tensões sociais:

tensões entre direitos individuais e objectivos sociais, prioridades políticas e

valores ambientais, interesses económicos e preocupações relativamente à saúde


(Nelkin, 1992). Entre as tecnologias mais polémicas, a Biotecnologia assume um

relevo especial. Pode ser definida de uma forma ampla como “a aplicação de

organismos, sistemas e processos biológicos à indústria” (Royal Society, 1980).

Estes organismos biológicos são, normalmente, bactérias, leveduras, fungos e

algas. As suas aplicações vão desde o fabrico de queijo, cerveja, pão e vinho, até

ao tratamento de esgotos, controlo de poluição, agricultura e produção de

combustíveis alternativos e medicamentos.

Segundo Henderson e Knutton (1990), a Biotecnologia não constitui um

ramo recente da Tecnologia: a origem do fabrico de pão, cerveja e vinho perde-se

na história. Apesar disto, referem que o início da Biotecnologia moderna é

associada, normalmente, à utilização de microrganismos na produção de glicerol,

acetona, butanol e ácido cítrico para fins militares durante a Primeira Guerra

Mundial e à descoberta e produção industrial da penicilina durante os anos

quarenta do nosso século. No entanto, para estes autores, a grande revolução

nesta área ocorreu nos anos 80 com o desenvolvimento da tecnologia de

recombinação do ADN que permite a combinação de sequências genéticas

provenientes de seres vivos diferentes. No passado, seleccionavam-se

gradualmente as características desejáveis em plantas e em animais através de

79
cruzamentos cuidadosamente definidos ao longo de muitas gerações. Actualmente,

a alteração directa do material genético de uma espécie permite uma modificação

rápida e radical das suas características. As técnicas de recombinação de material

genético e o conhecimento crescente das funções de genes de vários seres vivos,

incluindo o homem, provocam simultaneamente esperança e temor (Buican, 1986;

Barbour, 1992): esperança na possibilidade de inúmeras aplicações na agricultura

e na pecuária e na eventual cura de centenas de doenças de origem genética;

temor de eventuais desastres ambientais provocados pela proliferação

incontrolada de seres vivos alterados geneticamente ou de uma hipotética

manipulação abusiva do património genético do Homem por ditadores e por


oligarquias sem escrúpulos. Dilemas morais profundos e fascinantes acompanham

estas proezas da Biotecnologia, particularmente as que envolvem a manipulação

do genoma humano. Segundo Boone (1995), estes dilemas resultam da natureza

completamente inovadora das opções que a Tecnologia genética proporciona.

“Muitos têm argumentado que os avanços técnicos ultrapassaram a nossa

capacidade de lidar eticamente com eles. De facto, nenhuma tradição ética parece

ser suficiente para compreender tanto a peculiaridade do dilema genético como a

multiplicidade de questões morais que ele apresenta” (Boone, 1995, p. 514).

Torna-se evidente que as aplicações da Tecnologia Genética na medicina,

na agricultura e na indústria têm inúmeras implicações sociais e éticas. As suas

influências tornam-se imprevisíveis e incalculáveis nos sistemas ecológicos e nas

próximas gerações de todos os seres vivos, incluindo o Homem. Muitas das

decisões a serem tomadas nesta área dizem respeito às gerações futuras. Assim,

torna-se vital que toda a população seja informada sobre os novos avanços na

área da Biotecnologia, especialmente no campo da Tecnologia Genética, de modo

a poder participar num processo decisório que a todos diz respeito. É neste

contexto que surge o apelo a uma nova bioética, capaz de auxiliar a Sociedade em

tão difíceis decisões: “Perante os novos poderes que a Ciência dá ao Homem

80
sobre a vida e sobre si próprio, é importante que ele segure as rédeas do

progresso e tome as decisões éticas que lhe tornem possível plasmar um futuro

autenticamente humano” (Archer, 1996, p. 32).

3.7 Fases do estudo

Este estudo compreendeu três fases (Quadro 2):

Uma primeira fase, de concepção das actividades de discussão, implicou a

selecção dos temas e a sua apresentação de uma forma simultaneamente

controversa e motivadora, capaz de desencadear discussão entre os alunos.

Numa segunda fase, de preparação do estudo, procedeu-se à selecção da

escola e das turmas e à realização de reuniões preparatórias, com os professores

envolvidos, para selecção das actividades a utilizar e para análise e discussão

pormenorizada dos restantes instrumentos de investigação e dos aspectos

científicos e éticos dos temas das diferentes actividades. De um total de 20

actividades analisadas, seleccionaram-se 5 de acordo com o seu eventual

potencial em motivar os alunos e com a relevância das mesmas para as disciplinas

leccionadas. Pretendeu-se que o número de actividades a utilizar no estudo fosse

compatível com a calendarização estabelecida pelos professores no início do ano

lectivo para cada uma das rubricas programáticas. Nestas sessões também foram

analisados e discutidos os aspectos científicos e éticos dos temas das diferentes

actividades.

Finalmente, na fase de concretização do estudo, foram utilizados os

instrumentos de investigação previamente seleccionados, analisados e discutidos.

Esta terceira fase foi iniciada com a primeira aplicação do questionário para

levantamento das opiniões dos alunos sobre Biotecnologia (aproximadamente 15

minutos), à qual se seguiu: a) a introdução ao tema Ciência/Tecnologia/Sociedade;

81
b) a apresentação dos objectivos e da metodologia das actividades de discussão;

c) a entrega de textos informativos sobre a metodologia e os temas das referidas

actividades; e d) a formação dos grupos de alunos. Seguidamente, cada um dos

professores coordenou as cinco actividades de discussão nas suas respectivas

turmas.

No final da primeira e da quarta actividades de discussão foi entregue a

cada um dos alunos participantes o questionário para avaliação das actividades.

Este questionário foi preenchido em casa e entregue ao professor no início da aula

seguinte.

Quadro 2

Síntese do Estudo
1ª Fase Concepção das actividades

Preparação do estudo:
2ª Fase Selecção da escola e das turmas.
Reuniões preparatórias com os professores participantes.

Realização do estudo:
Questionário de opinião sobre Biotecnologia.
Actividades de discussão na sala de aula.
3ª Fase
Observação de sessões.
Questionários de avaliação das actividades 1 e 4.
Questionário de opinião sobre Biotecnologia.
Entrevistas aos professores participantes.

O investigador observou três sessões por turma: a primeira, na qual foi

apresentada a metodologia e os objectivos das actividades; a segunda, em que se

discutiu a primeira actividade; e uma outra, seleccionada de acordo com a

disponibilidade do investigador e os horários das turmas.

Após a conclusão de toda a sequência de actividades foi aplicado, pela

segunda vez, o questionário para levantamento das opiniões dos alunos sobre

82
Biotecnologia e foram realizadas entrevistas semi-estruturadas a cada um dos

professores envolvidos na investigação.

83
84
CAPÍTULO 4
RESULTADOS

Neste capítulo são apresentados e analisados os dados resultantes da

aplicação dos questionários dirigidos aos alunos e da realização de observações

directas das aulas e de entrevistas semi-estruturadas aos professores

participantes. A análise destes dados foi efectuada de acordo com a metodologia

descrita no capítulo 3.

A realização das actividades durou aproximadamente um mês e ocupou 11

tempos lectivos de cada turma participante. Três dos professores participantes

realizaram a sequência das actividades de forma ininterrupta. Duas das

professoras, dada a sua situação de estagiárias, tiveram que intercalar estas

actividades com aulas de temática e metodologia diferentes. No entanto, a

sequência integral foi realizada em menos de um mês. De um total de 167 alunos,

118 cumpriram todas as etapas do estudo.

85
4.1 Apresentação dos Resultados

4.1.1 Dados de observação

O guião de observação foi estruturado de acordo com “Os Seis Chapéus do

Raciocínio”, tendo as observações sido efectuadas e registadas na perspectiva de

cada um dos chapéus.

4.1.1.1 Aplicação do chapéu branco (factos e informações sobre a implementação

das actividades)

As diferentes sessões do estudo decorreram nas salas de aula destinadas a

cada turma. Cada grupo de 4 a 5 elementos, formado pelos próprios alunos,

juntou-se à volta de uma ou de duas mesas. Na maioria das turmas, a

heterogeneidade dos grupos relativamente ao sexo e à etnia era evidente, embora

em duas turmas os elementos masculinos fossem dominantes.

Durante as sessões observadas, os professores cumpriram todas as

instruções relativas tanto à sua actuação na sala de aula como à metodologia das

actividades. Na primeira sessão, os professores limitaram-se: a) a informar os seus

alunos acerca dos objectivos e finalidades da investigação; b) a explicar a

presença do investigador; c) a solicitar a cooperação e o envolvimento de toda a

turma, realçando a importância de estudos deste tipo na melhoria das actividades

lectivas; d) a entregar e a analisar os textos informativos sobre a metodologia e os

temas a discutir; e e) a introduzir o tema Ciência/Tecnologia/Sociedade. Durante

todas as sessões observadas, os professores tiveram o cuidado de não revelar

opiniões pessoais relativamente a eventuais potencialidades tanto do tema como

da metodologia.

86
4.1.1.2 Aplicação do chapéu vermelho (emoções e sentimentos manifestados ou

evidenciados pelo professor ou pelos alunos relativamente às actividades)

A maioria das sessões observadas foi marcada, inicialmente, por um clima

de estranheza motivado pelas actividades propostas e pela presença do

investigador. Alguns alunos demonstraram mesmo, explícita ou implicitamente,

desinteresse e aborrecimento por “mais uma actividade escolar”. No entanto, a

leitura das folhas informativas distribuídas e a discussão do primeiro tema

despoletaram um clima de entusiasmo, de interesse e de motivação. Foram

frequentes as discussões acesas em que se entrecruzaram: a) o entusiasmo, a


curiosidade, a admiração, a esperança, a preocupação e a desconfiança

relativamente aos tema abordados; b) o divertimento e alguma confusão na

utilização d’“Os Seis Chapéus do Raciocínio”; e c) a dificuldade em limitar a

discussão ao tema em causa. A intolerância relativamente às afirmações dos

colegas e a defesa acérrima e intransigente de opiniões foram sentimentos

evidentes em alguns grupos.

Relativamente aos professores, os sentimentos evidenciados permitem

dividi-los em dois grupos. O primeiro, constituído pelo José, pela Aida e pelo

António, bastante entusiasmado e interessado nas actividades de discussão,

revelou facilidade na gestão deste tipo de aula. O segundo, constituído pela

Filomena e pela Clara, menos motivado, manifestou inexperiência e insegurança

na dinamização de aulas de debate.

4.1.1.3 Aplicação do chapéu amarelo (reacções positivas às actividades)

A motivação e o interesse revelado pelos alunos durante as actividades de

discussão, associados à quantidade e à qualidade das interacções estabelecidas,

constituem os aspectos positivos mais evidentes das actividades. Frequentemente,

87
o tema proposto motivou discussões complexas envolvendo outros assuntos

importantes como a eutanásia, o aborto e a discriminação. Por vezes, o

envolvimento no debate era tal que os alunos ignoravam o toque de saída,

continuando a discutir com os seus colegas e com o professor. Era notória a

satisfação com que os diferentes participantes apresentavam, ouviam e discutiam

opiniões. Também era evidente o ar de satisfação e de divertimento com que

alguns alunos utilizavam “Os Seis Chapéus do Raciocínio”.

4.1.1.4 Aplicação do chapéu preto (reacções negativas às actividades)

A observação não permitiu detectar comentários ou comportamentos que,

no conjunto, possam ser reveladores de aspectos negativos das actividades de

discussão. Contudo, foram evidentes alguns comportamentos negativos durante a

realização das referidas actividades: a falta de tolerância relativamente às opiniões

dos colegas, a relutância em valorizar opiniões diferentes, a interpretação de

opiniões divergentes como ataques pessoais, a defesa acérrima e intransigente de

opiniões com a consequente divisão do grupo em facções e alguma

confusão/indisciplina durante o debate de ideias.

Alguns alunos manifestaram, ainda, algum aborrecimento pelo facto de

terem que orientar a sua discussão pela sequência de “chapéus” indicada. Pura e

simplesmente, pretendiam apresentar conclusões ou planos de acção sem uma

explicitação das respectivas vantagens e desvantagens.

4.1.1.5 Aplicação do chapéu verde (comentários ou comportamentos que sugiram

alterações capazes de melhorar as actividades)

As dificuldades manifestadas por alguns professores no esclarecimento de

dúvidas sobre os temas em discussão e na motivação dos alunos para a realização

88
das actividades sugerem que a realização de uma sessão inicial dinamizada por

especialistas em Biotecnologia poderá ser vantajosa na transmissão de

informação, no esclarecimento de dúvidas e na motivação dos alunos.

Tendo em conta todo o interesse despoletado pelas actividades de

discussão em grupo, seria interessante aplicar esta metodologia a outros temas

actuais e controversos.

4.1.1.6 Aplicação do chapéu azul (avaliação geral da forma como decorreram as

actividades)

A avaliação global das actividades de discussão baseada nas observações

efectuadas é positiva. As potencialidades do tema para a motivação dos alunos e

para a estimulação do debate foram evidentes. A interacção estabelecida

revelou-se positiva no aprofundamento e no melhoramento das relações entre os

participantes, no desenvolvimento de capacidades de argumentação e de análise

de informação e na compreensão das relações entre Ciência, Tecnologia e

Sociedade.

4.1.2 Dados dos questionários de avaliação das actividades pelos alunos

As opiniões apresentadas resultam da análise de conteúdo das respostas

dos alunos aos questionários de avaliação das actividades de discussão (Anexo

2). Esta análise foi efectuada de acordo com a metodologia descrita no capítulo 3.

Entre parênteses são apresentadas as percentagens de alunos que efectuaram

cada um dos comentários referidos.

89
4.1.2.1 Aplicação do chapéu vermelho (sentimentos, emoções, palpites, intuições)

Para muitos alunos (44,1%) “As vantagens/desvantagens dos novos

avanços na área da Genética e da Biotecnologia” constituem um tema interessante

e motivador. Este interesse reside, fundamentalmente, no facto do tema ser pouco

conhecido (9,3%) e na sua actualidade (7,6%), controvérsia (3,4%) e relevância

para a vida dos cidadãos (17,0%).

“Acho interessante a discussão desta matéria, uma vez que


pouco se sabe acerca da biotecnologia.” (12º-1)
“Esta actividade suscita grandes motivos de interesse visto que
ela é-nos totalmente desconhecida.” (12º-1)
“Sentimentos positivos porque trabalhámos assuntos
desconhecidos/diferentes e aprendemos novas “coisas” sobre
biotecnologia.” (10º-3)
“Foi interessante podermos falar destes temas que infelizmente
não são abordados frequentemente.” (11º-2)
“Gostei de falar sobre estes assuntos pois são interessantes e
ao mesmo tempo foi bom saber coisas que eu nunca imaginaria que
fizessem actualmente. Senti enorme alegria em falar nisto.” (11º-2)
“Penso que esta actividade é muito interessante pois ficamos a
saber coisas que não sabíamos e que são muito importantes para a
sociedade.” (10º-1)
“Esta actividade é bastante esclarecedora e compensadora
visto que é um tema actual.” (12º-1)
“Eu acho esta actividade bastante interessante sobretudo pela
controvérsia do tema.” (11º-2)
“Os temas são polémicos e despertam interesse e curiosidade.”
(12º-1)
“Apreciei bastante esta actividade devido à controvérsia do
tema, além de que este tema é relativamente importante à minha vida
doravante.” (11º-2)
“Esta actividade é interessante porque tem a ver com o
dia-a-dia.” (10º-2)
“Esta actividade desperta em mim sentimentos de interesse e
grande curiosidade pois a biotecnologia e os assuntos que tratámos
nas aulas são assuntos que dizem respeito a todos nós.” (11º-3)

90
“Pessoalmente, eu gostei e achei interessantes estas aulas
visto serem sobre algo que não conhecemos muito e que nos diz
respeito.” (12º-1)
“Os meus sentimentos são principalmente de grande interesse
e vontade de aprender coisas novas que me possam ser úteis no
futuro.” (11º-3)

Outros alunos (8,5%), apesar de considerarem o tema interessante,

sentiram-se, simultaneamente, esperançados com as potencialidades da

Biotecnologia e receosos de eventuais aplicações menos correctas destes

conhecimentos:

“Os meus sentimentos são de curiosidade e receio ao mesmo


tempo.”(10º-3)
“A biotecnologia provoca medo e esperança.” (11º-3)
“Esta actividade é interessante e preocupante e acho que todas
as pessoas deviam estar bem informadas sobre o assunto.” (10º-2)
“A biotecnologia é um avanço útil mas também preocupante.
Graças a ele podemos ter melhoramentos quer na vida humana quer
na vida animal mas provocando várias vezes danos a estes.” (11º-2)
“Esta actividade por um lado pode melhorar as condições de
vida de muita gente, mas se não for bem controlada pode alterar a
vida para um aspecto negativo.” (10º-2)
“Medo, receio e preocupação em relação a este tema pois pode
provocar catástrofes com resultados imprevisíveis, mesmo sendo
utilizada por pessoas com as melhores intenções.” (10º-3)

Quanto à metodologia utilizada — discussão em grupo de acordo com o

método “Os Seis Chapéus do Raciocínio” — os sentimentos dos alunos variaram

entre o interesse, a satisfação e a monotonia. A análise dos comentários dos

alunos permite concluir que os sentimentos mais generalizados foram o interesse

(11,9%) e a satisfação (17,0%):

“Gostei desta actividade. Acho que nos deu hipótese de discutir


por fases um aspecto, e isso foi importante; não só chegarmos a uma

91
conclusão, como também discutirmos todos os passos para lá chegar.”
(11º-2)
“Esta actividade é agradável porque nos obriga a pensar e a
desenvolver tipos de raciocínio ao confrontarem-nos com problemas
do quotidiano sem estarmos sob pressão, pois os problemas não se
passam connosco.” (10º-3)
“Achei este tipo de actividade interessante. Eu, pelo menos,
consegui entender melhor o problema em questão.” (11º-2)
“É uma actividade que é bastante interessante ao nível da
comunicação. Também nos ajuda imenso a saber analisar e a tentar
encontrar soluções para os problemas em discussão.” (11º-2)
“Gostei, acho que correu bem e é uma boa maneira de se
conseguir analisar bastantes aspectos sobre um dado tema.” (11º-2)
“Foi muito benéfica porque aprendemos a trabalhar melhor em
grupo e deu-nos muitas informações.” (10º-3)
“Esta actividade é bastante produtiva porque todos nós
podemos discutir e enumerar os nossos sentimentos. Sinto-me
elucidado em relação a este assunto.” (10º-3)
“É um trabalho interessante onde cada um de nós pode
exprimir as suas ideias.” (11º-2)
“Foi interessante, pois além de darmos a nossa opinião
pudemos debater as opiniões dos outros também.” (11º-2)
“É uma actividade em que podemos expôr as nossas ideias e
onde trabalhamos em grupo. Acho uma boa actividade.” (11º-2)
“Penso que esta actividade faz pensar melhor sobre o assunto
(...). Achei interessante a maneira como discutimos o assunto.” (12º-1)

Mas nem todos os sentimentos foram positivos. Na opinião de alguns

alunos, a utilização de uma sequência demasiado estruturada de “chapéus”

revelou-se algo monótona e limitativa da discussão e do aprofundamento do tema

(4,2%):

“Relativamente à metodologia acho cansativa, pouco atractiva.


Os temas são de interesse geral mas desenvolvidos e explorados de
uma forma um pouco básica pois as discussões em grupo são
positivas mas a forma como a actividade está feita não conduz tanto a
essa discussão.” (12º-1)

92
“Apesar de ser maçudo seguir por etapas a actividade de
reflexão, acho importante pensarmos sobre os problemas da
sociedade. A discussão em grupo por etapas, fecha campos no
aprofundamento do problema, a novas ideias e visões, tornando o
problema mais objectivo apesar da subjectividade que o engloba.”
(12º-1)

4.1.2.2 Aplicação do chapéu amarelo (aspectos positivos, vantagens, benefícios)

Para os alunos, os aspectos positivos do tema das actividades são,

precisamente, aqueles que o tornam interessante e motivador, ou seja, o facto de

ser pouco conhecido (5,9%) associado à sua actualidade (3,4%), controvérsia


(0,8%) e relevância para a vida dos cidadãos e para o futuro da humanidade

(10,2%). Vários alunos valorizaram bastante os conhecimentos adquiridos (53,4%)

e o esclarecimento de dúvidas (9,3%) sobre um tema que praticamente

desconheciam. Na sua opinião:

“Esta actividade sobre biotecnologia é bastante educativa


porque nós estávamos um bocado “às escuras” sobre este assunto.”
(12º-1)
“Os benefícios desta actividade foram termos aprendido coisas
sobre a biotecnologia, conseguirmos reflectir sobre coisas em que
nunca tinha pensado e convivermos uns com os outros.” (10º-3)
“Surgiram novas ideias, foram esclarecidas muitas dúvidas.”
(12º-1)
“Fiquei esclarecida em relação a assuntos que desconhecia.”
(11º-3)
“O aspecto que me favoreceu foi a informação que me trouxe a
discussão deste caso. Não possuía qualquer informação e
desconhecia a existência de problemas como este.” (12º-1)
“Os benefício são: uma divulgação dos vários assuntos da
biotecnologia, um enriquecimento da nossa cultura geral e o pôr a
sociedade estudantil a par dos assuntos da biotecnologia.” (10º-3)

93
A relevância da discussão e do conhecimento das implicações dos novos

avanços na área da Genética e da Biotecnologia ficou bem evidente em algumas

afirmações:

“É bom ter conhecimentos destas coisas, uma vez que


futuramente podemos ter que tomar uma posição sobre estes
assuntos.” (10º-3)
“As vantagens são um maior aprofundamento acerca de algo
que é muito pouco falado mas que poderá ser muito importante para o
nosso futuro.” (12º-1)
“Foi bom ficarmos conscientes do que se passa na sociedade
actual e, principalmente, saber qual a opinião dos nossos colegas
sobre isso. É como que uma preparação para o futuro, no caso de
sermos confrontados com alguma destas situações.” (11º-2)

Relativamente aos aspectos positivos da metodologia, os alunos realçaram

o facto de estimular/organizar o raciocínio e de facilitar o desenvolvimento

cognitivo e sócio-afectivo através da reflexão, do debate de ideias e da discussão

de opiniões diferentes. A maior parte dos comentários centraram-se nas

potencialidades do trabalho de grupo e da interacção no desenvolvimento cognitivo

e sócio-afectivo. Segundo vários alunos (49,8%), o debate e a discussão em grupo


facilitam a resolução de problemas e a compreensão e o aprofundamento de

conteúdos, através da confrontação de diferentes conhecimentos, ideias e

opiniões:

“É uma oportunidade de conhecer novos pontos de vista e


novas abordagens para todos os problemas que nos surjam. Penso
que a melhor maneira de resolver problemas ou de chegar a uma
conclusão ou opinião sobre algo é falando e discutindo.” (11º-1)
“A discussão permite que as pessoas aprofundem
conhecimentos e troquem opiniões, enriquecendo assim os
conhecimentos de cada um.” (10º-3)
“Ouvimos opiniões diferentes, novas ideias que nos fazem ver
aquilo que não vemos.” (11º-1)

94
“Fazer um trabalho com várias opiniões leva a um
melhoramento desse trabalho.” (10º-1)
“Com o debate/discussão em grupo, aparecem-nos ideias mais
correctas do que as nossas, em relação ao assunto em causa.” (10º-3)
“Um debate é sempre positivo, do ponto de vista de troca de
ideias e de esclarecimento do assunto.” (12º-1)
“Os debates fornecem um maior conhecimento sobre o tema
discutido.” (11º-2)
“Ao debatermos ideias podemos ficar mais informados.” (11º-2)
“Podem-se tirar conclusões e novas ideias a partir dessa
discussão.” (10º-1)
“Os debates foram muito enriquecedores para todos nós.” (11º-
1)
“Todos nós ficámos a saber um pouco mais e a reflectir sobre
coisas e opiniões que antes nem sequer nos passavam pela cabeça.”
(11º-3)
“Conhecemos as opiniões de colegas e professores.” (10º-3)
“Esta actividade ajudou-me a descobrir a minha opinião e
sentimentos perante determinados problemas do quotidiano e
esclareceu-me determinadas dúvidas.” (11º-1)
“Para além de desenvolvermos as nossas próprias ideias
(debatendo os aspectos positivos e negativos de vários assuntos) é
sempre bom a comunicação que se estabelece na sala.” (11º-2)

Realçaram, também, a importância do trabalho de grupo e da interacção no

desenvolvimento sócio-afectivo (6,8%):

“É um óptimo meio de nos relacionarmos uns com os outros,


até de nos conhecermos melhor, e de saber quais são as ideias de
cada um através das opiniões.” (11º-2)
“Leva-nos a ganhar mais confiança em nós próprios para com a
disciplina.” (10º-3)
“Maior relacionamento entre os alunos.” (11º-2)
“Conseguimos tirar conclusões pensando em conjunto e
respeitando as opiniões contrárias.” (10º-3)
“É possível que uma actividade destas dê a entender às
pessoas que elas devem pensar nas outras, que neste mundo há
lugar para todos, que as pessoas não podem ser invejosas.” (10º-3)

95
“Os benefícios desta actividades foram termos aprendido
coisas sobre a biotecnologia, conseguirmos reflectir sobre coisas em
que nunca tinha pensado e convivermos uns com os outros.” (10º-3)

Consideraram, ainda, que “Os Seis Chapéus do Raciocínio” constituem um

método eficiente de estimulação e de orientação/organização do pensamento

(7,6%), passível de ser aplicado na análise de assuntos e de situações e na

resolução de problemas:

“A divisão do raciocínio em partes, fez com que se analisassem


melhor e mais profundamente as situações.” (11º-1)
“Através deste método podemos ver todos os aspectos dos
problemas. Assim, vemos mais facilmente as coisas e
compreendemos melhor as ideias dos outros.” (11º-1)
“No início não percebi muito bem o que eram os chapéus e
achei muito estranho. Agora já percebo e penso que os chapéus
servem para organizarmos melhor o nosso pensamento e a escrita.”
(11º-3)
“Deu para desenvolver o meu raciocínio e para aumentar a
minha cultura.” (11º-1)
“Contribuiram para esclarecer os respectivos assuntos tratados.
Serviu para conhecer melhor as minhas ideias e as ideias dos outros.
Desenvolve a capacidade de raciocínio.” (11º-1)
“Também nos ensina a aprender e a resolver problemas com
que nos deparamos.” (11º-1)
“Eu acho que se deveriam fazer mais actividades deste género
porque desenvolvem o nosso raciocínio e ajudam-nos a compreender
melhor a matéria.” (10º-1)

4.1.2.3 Aplicação do chapéu preto (aspectos negativos, fraquezas, problemas)

Relativamente ao tema das actividades, não foram apontados pontos

negativos. Quanto à metodologia, apenas um reduzido número de alunos não

concordou com a compartimentação do raciocínio (2,5%) imposta pelos “chapéus”

96
ou considerou que a pouca flexibilidade da metodologia, resultante da utilização de

sequências rígidas de “chapéus”, a torna algo monótona (2,5%):

“(...) a própria divisão do raciocínio é um aspecto negativo, pois


é muito difícil abstrairmo-nos de certos aspectos, gerando uma grande
confusão.” (10º-1)
“Não concordo com a metodologia utilizada. Penso que se
podia fazer uma reflexão dos mesmos temas, mas não tão dispersa,
isto é, não se deveria dividir o raciocínio em partes, mas sim reflectir
tendo em conta essas partes, relacionando-as umas com as outras.”
(11º-1)
“Como a exploração dos temas é feita de uma forma linear e
objectiva de mais, torna-se cansativo e perde um pouco o entusiasmo
ao longo do percurso estipulado.” (12º-1)
“Um perigo a salientar é a possibilidade do aluno perder o
interesse pela actividade devido à sua forma esquemática e
objectiva.”(12º-1)
“Penso que a metodologia pouco flexível tornou um trabalho
que poderia ser envolvente numa monotonia.” (12º-1)

Para os restantes alunos não existiu qualquer aspecto negativo na utilização

da metodologia. No entanto, dois deles consideraram que a reduzida experiência

na utilização d’“Os Seis Chapéus do Raciocínio” provocou alguma confusão. Por

vezes, sentiram dificuldade em seguir o programa de raciocínio indicado pela

sequência de “chapéus”.

Outros aspectos negativos referidos não estão directamente relacionados

nem com o tema nem com a metodologia mas sim com a pouca prática na

realização de actividades de discussão: alguma confusão/indisciplina durante o

debate de ideias (15,3%), a falta de tolerância relativamente às opiniões dos

colegas (2,5%) e a defesa acérrima e intransigente de opiniões com a consequente

divisão do grupo em facções (7,6%). São várias as afirmações reveladoras destes

97
problemas durante as actividades de discussão:

“Na minha opinião, o único problema é que nos debates há


confusão a mais, falam todos ao mesmo tempo acabando por não se
chegar a conclusão nenhuma.” (12º-1)
“Por vezes há intervenções que são feitas no momento errado
fazendo com que se gere uma confusão de ideias que tornam esse
debate pouco esclarecedor.” (12º-1)
“Os aspectos negativos desta discussão foram os momentos
em que todos queriam dar a sua opinião e não se percebia nada.”
(11º-1)
“Apenas não gostei do barulho que a turma fez durante o
debate do problema.” (11º-1)
“O único aspecto negativo que vejo é a possibilidade de haver
discussões e por vezes desentendimentos entre os alunos.” (11º-2)
“A actividade realizada leva muitas vezes a grandes exaltações
por parte dos alunos.” (11º-2)
“Pode gerar-se confusão.” (11º-2)
“Se trabalhamos em grupo, cada um tem a sua opinião mas às
vezes a nossa opinião é “atropelada” pelas outras opiniões (mas isso
é da falta de organização do próprio grupo de trabalho).” (11º-3)
“(...) desentendimentos entre membros do grupo.” (10º-3)
“Podem originar-se problemas dentro da turma se as pessoas
não aceitarem as ideias dos colegas.” (12º-1)
“Por vezes chegamos a conclusões com que nem todos
concordam e quando se leva a actividade para questões mais
polémicas gera-se a confusão.” (12º-1)
“Não vale a pena realizar esta actividade quando existem
pessoas que não sabem respeitar as opiniões dos outros.” (12º-1)
“Acho que houve um confronto de ideias demasiado violento.”
(11º-1)
“A exaltação que surge nos debates é desgastante.” (11º-2)
“Algumas pessoas não compreenderem os outros e até não
aceitam as opiniões dos outros.” (11º-3)
“A falta de controlo da disciplina (comportamento) no trabalho
de grupo.” (10º-1)

98
4.1.2.4 Aplicação do chapéu verde (sugestões, novas ideias, alternativas)

Quanto ao tema discutido, os alunos não sugeriram qualquer alteração.

Quase todos o consideraram muito interessante e bem adequado a este tipo de

actividade. Alguns alunos gostariam mesmo que o tema fosse mais discutido e

aprofundado (10,2%):

“Era giro aprofundar mais este tema, a Biotecnologia, pois é


dos temas mais importantes do nosso século, é dos temas que mais
polémica tem tido.” (11º-1)
“Penso que este assunto é bastante importante para os alunos,
pois somos nós que no futuro nos vamos debater com este problema.
Mas pode ser que nesse futuro já seja demasiado tarde, por isso era
bom que este assunto assumisse um papel de relevo ao nível
escolar.” (11º-2)
“Haver mais actividades, aprofundar mais o assunto, haver
mais casos para discutir, discutir mais vezes casos destes na aula.”
(10º-3)
“Penso que deveriamos fazer um menor número de debates
mas aprofundarmos melhor esses mesmos debates.” (11º-1)

Quanto a temas alternativos, não houve qualquer sugestão concreta. No

entanto, alguns alunos (5,9%) sugeriram a discussão de outros temas que sejam

também, simultaneamente, reais e relevantes para a Sociedade actual.

Relativamente à metodologia, as sugestões apresentadas incidiram na

realização de um maior número de actividades de discussão e na forma como a

informação foi fornecida. Vários alunos consideraram que as actividades de

discussão em grupo, tal como foram realizadas e atendendo às suas

potencialidades, deveriam ser utilizadas com maior frequência (11,0%) e,

eventualmente, por todas as turmas da escola (5,9%):

“Deveriam ser realizadas mais actividades deste tipo; ajuda-nos


a analisar melhor as coisas.” (11º-2)

99
“Devia-se fazer mais actividades deste tipo porque despertam a
nossa inteligência.” (10º-3)
“Deviamos realizar mais vezes estas actividades para
continuarmos a melhorar a nossa capacidade de pensar.” (10º-3)
“Fazer mais vezes este tipo de trabalho em grupo.” (11º-2)
“Acho que se deveriam fazer mais actividades como esta não
só com alunos da turma como também a nível escolar.” (11º-2)
“Mais debates, um maior tempo de duração. Debates a nível de
turmas.” (11º-1)
“Fazer mais actividades deste tipo.” (11º-3)
“O debate com outras escolas, alunos, professores, etc.” (10º-
3)
“Ter actividades destas entre turmas.” (11º-1)
“Fazer mais actividades deste género.” (11º-3)

No entanto, sugeriram alterações na forma de apresentação e na

quantidade da informação fornecida. Segundo alguns alunos, deveriam ter sido

apresentados documentários em vídeo (20,3%), artigos de revistas (0,8%),

testemunhos reais de pessoas afectadas positiva ou negativamente pela

Biotecnologia (3,4%) e realizadas palestras por especialistas nesta temática (6,8%)

e visitas a laboratórios (5,9%). Foram várias as sugestões apresentadas:

“Realizar mais vezes este tipo de actividades, ver alguns filmes,


fazer visitas a laboratórios de biotecnologia.” (10º-3)
“Mostrarem-nos em vídeo uma pessoa a quem já tenha
acontecido algum destes casos, para nos dizer o que sentiu, como
reagiu e o que pensa acerca de tudo isto.” (11º-3)
“Mais textos de apoio à discussão.” (11º-2)
“A vinda de técnicos especializados às escolas a fim de
assegurar a melhor compreensão por parte dos alunos.” (12º-1)
“Eu acho que deveria haver um debate com alguém que fosse
experiente nesta matéria.” (12º-1)
“Mais informação.” (11º-3)
“Penso que a passagem de documentários alusivos ou a
presença de uma pessoa conhecedora, poderiam ser algumas das
ideias de melhoramento desta actividade.” (12º-1)

100
“Poderíamos ver filmes como complemento dos trabalhos
realizados.” (12º-1)
“Visitas a laboratórios de biotecnologia para que os alunos
vejam de perto o que realmente é a biotecnologia.” (10º-3)
“Deviam existir intervenções do exterior, por exemplo, a
presença de pessoas relacionadas directamente com o problema,
tanto no aspecto técnico como humano.” (11º-1)
“A oportunidade de dar aos alunos mais informação sobre a
biotecnologia através de revistas que contenham artigos/histórias
sobre o assunto e maior discussão sobre problemas actuais que
envolvam biotecnologia.” (11º-3)

Um número reduzido de alunos (2,5%) sugeriu, ainda, a utilização de outra


metodologia diferente d’“Os Seis Chapéus do Raciocínio” nas actividades de

discussão. Consideraram que o eventual excesso de estruturação e o grande

número de etapas desta metodologia afectam negativamente a motivação e a

qualidade do raciocínio:

“Se o aluno tivesse a liberdade de divagar intelectualmente


acabaria por criar novas perspectivas, conclusões mais repletas de
informação e mais elaboradas com variados pontos de vista, ao
contrário do que acontece quando se segue uma metodologia
precisa.” (12º-1)
“Maior liberalização no debate e maior flexibilidade nas
discussões durante o mesmo para se poder desenvolver o raciocínio.”
(11º-2)
“Uma metodologia menos rígida em que se propusessem
formas de acção por parte dos alunos e um menor número de etapas
tornariam este trabalho mais motivante.” (12º-1)

4.1.2.5 Chapéu azul (avaliação global)

As avaliações globais foram positivas. Muitas salientaram o aspecto

formativo das actividades de discussão na aquisição e compreensão de

conhecimentos relevantes para a vida e na estruturação e desenvolvimento do

101
pensamento. Na opinião de vários alunos (27,1%), a motivação despoletada pelo

carácter inovador e controverso das actividades funcionou como um catalizador do

aprofundamento de conhecimentos sobre Biotecnologia e das suas relações com a

Sociedade. Consideraram, ainda, que a metodologia utilizada desenvolveu

capacidades de pensamento (10,2%). O reduzido número de aspectos negativos

salientados na avaliação global diz respeito à própria metodologia (3,4%), à

actuação do professor (0,8%) e ao clima de indisciplina durante algumas

discussões (4,2%). Como eles próprios escreveram:

“Foi bom, aprendeu-se sobre tudo o que foi falado tendo


também aprendido com as opiniões dos meus colegas. Saímos das
aulas mais preparados para ver o mundo.” (11º-1)
“A actividade foi muito boa, para aprendermos mais coisas.
Esclarecemos os pensamentos de outras pessoas, juntamente com os
nossos. Resumindo e concluindo: foi uma boa actividade, aprendemos
alguma coisa e aprendemos a pensar.” (10º-1)
“Penso que se saldou positivamente; acho que todos
partilhámos ideias, sentimentos e experiências e, assim, conseguiu-se
ver mais do que um lado das coisas. Podemos não ter conseguido
chegar a uma conclusão geral, mas acho que todos devemos ter a
nossa opinião e discutir com outras pessoas, de modo a conseguir
novas visões sobre certas coisas que são polémicas e onde não há
opiniões concensuais.” (11º-1)
“No global, foi uma actividade bem pensada e foi bem
realizada, com o senão da escassez de informação sobre esta
matéria. Eu, pessoalmente, gostei porque este tipo de coisas dá
sempre lugar a discussões saudáveis e que se tornam bastante
interessantes.” (12º-1)
“Acho que esta actividade contribuiu de uma forma positiva
para desenvolver o meu raciocínio e para ter ideias melhor formadas
acerca dos assuntos tratados.” (11º-1)
“Penso que a actividade realizada foi muito produtiva, dado o
tema tratado. Por outro lado, a metodologia utilizada gerou uma certa
confusão, pois é muito difícil dividir o raciocínio em partes. Aliás,
penso que o próprio acto de raciocinar é uma forma de relacionar
todos os aspectos do problema, e não de dividi-los.” (11º-1)
“Este tipo de actividades é importante e interessante. Ajuda na
compreensão desses assuntos. Além disso, com um certo apoio ajuda

102
a turma a raciocinar melhor e de uma maneira mais organizada.” (10º-
3)
“A actividade realizada é muito positiva pois só nos trouxe
benefícios. O trabalhar em grupo faz-nos pensar e raciocinar sobre
temas desconhecidos ou de que não tinhamos ideias concretas.
Pessoalmente, gostei muito.” (10º-3)
“A minha avaliação global é positiva. O trabalho estava muito
bem elaborado obrigando-nos a pensar. Foi um trabalho muito
interessante.” (11º-1)
“De uma forma geral este projecto é bastante positivo, pelo
conhecimento que fornece, as dúvidas que esclarece, as novas ideias
que expõe e o interesse que causa. Mas como em todas as
actividades tem também aspectos negativos, que não têm a ver com o
tema e os assuntos em si, mas com os pormenores de procedimento.”
(12º-1)
“Acho que é uma boa maneira de trabalhar um certo tema,
faz-nos pensar particular e geralmente no assunto. Deixa-nos, por
vezes, trazer a situação para nós mesmos, como se fossemos as
personagens. No geral, a minha opinião é bastante positiva.” (11º-2)
“Acho que interessa e motiva bastante a turma que se mostra
muito atenta nestas actividades.” (11º-2)
“Para mim, que não sou muito interessada pela disciplina de
Filosofia, até gostei. Os trabalhos realizados em grupo são sempre
mais agradáveis. Enfim, gostei de realizar esta actividade e espero
que haja outras.” (11º-2)
“Eu gosto de fazer debates e até acho gratificante e
esclarecedor, mas há sempre confusão a mais.” (12º-1)
“Foi uma actividade fora do normal sobre um assunto que não é
muito conhecido. No final acabamos por ficar a saber mais e
formamos opiniões individuais e em conjunto sobre a matéria.” (11º-3)
“Esta actividade foi bastante útil para haver um maior
conhecimento sobre esta ciência que cada vez ganha uma maior
importância no dia-a-dia e que será essencial para o futuro da
humanidade.” (10º-2)
“Devem continuar a fazer-se este tipo de actividade;
elucida-nos bastante e ajuda-nos. Precisamos de estar o mais
informados possível sobre este tema. Para mim quanto mais o tema
for polémico mais interessante é, e para mim este tema da
Biotecnologia é muito polémico, e tem muito que se lhe diga.” (11º-3)
“Esta actividade é bastante interessante e gratificante, visto ser
um tema que toca a todos. A actividade de reflexão e discussão é algo
que ensina bastante sobretudo quando o tema é bom.” (11º-2)

103
“Quanto ao maior ruído provocado na aula, tudo poderá ficar
resolvido com alguma disciplina.” (11º-2)
“Sobre a actividade realizada tenho a dizer que não só eu como
muitas pessoas não a percebemos assim muito bem. Muitos não
estavam atentos, faltou mais atenção por parte da professora aos
alunos, por vezes todos falavam ao mesmo tempo e a professora não
“puxa”, não cativa os alunos que têm algo importante a dizer, é triste
mas é a verdade pura. Mas esta actividade é muito interessante.” (10º-
1)
“A actividade em alguns grupos é melhor do que em outros,
mas acho que em todos tem sido positivo.” (10º-1)
“Eu tive muito prazer em fazer este trabalho pois aprendi muito
e quero continuar a fazer trabalhos destes.” (10º-3)
“Estas actividades levam-nos a puxar pela cabeça e
prepararem-nos para um futuro próximo.” (10º-3)

4.1.3 Dados das entrevistas aos professores

As opiniões apresentadas resultam da análise de conteúdo das entrevistas

semi-estruturadas a cada um dos professores envolvidos na investigação.

4.1.3.1 Aplicação do chapéu vermelho (sentimentos, emoções, palpites, intuições)

Os sentimentos dos professores relativamente ao tema das actividades —

as vantagens/desvantagens dos novos avanços na área da Genética e da

Biotecnologia — foram bastante positivos. No seu conjunto, classificaram-no de

actual, pertinente, polémico, interessante, entusiasmante, enriquecedor, motivador

e adequado aos programas que leccionavam. No entanto, tanto a Clara como a

Filomena, apesar de referirem vários destes adjectivos, sentiram alguma

insegurança na abordagem do tema, motivada pelo facto de não se considerarem

preparadas para responderem a todas as questões dos alunos.

O António salientou a utilidade, a pertinência e a dimensão humanizante do

104
tema. Como ele próprio afirmou:

“Senti que estava a fazer uma coisa que me interessava. Tive


uma sensação de grande regozijo interior e de utilidade; senti que
estas actividades estavam a ser úteis para os alunos e também para
mim. Aqueles conteúdos são fundamentais, ... são necessários na
vida humana, na nossa existência enquanto seres que procuramos um
caminho.
A qualidade destes temas é importante na medida em que, pelo
menos nós, saímos com algo que nos torna mais pessoas, que nos
humaniza. Durante a realização das actividades, o sentimento de
humanização foi muito profundo. Toda a informação que
analisámos, os diálogos que tivemos, a reflexão, permitiram-me
crescer.
Achei extremamente interessante e bastante actual. (...) Foi a
primeira vez que abordei com alguém esta temática extremamente
enriquecedora.”

O José realçou o clima de entusiasmo, de interesse e de motivação

despoletado pelo tema das actividades:

“Tocámos num ponto importante, central, que é o Homem, a


Sociedade e o Futuro. O que os entusiasmou.
Foi motivador. Foi um dos grandes momentos em que vi os
meus alunos motivados. Nunca chegavam atrasados às aulas.
Estavam constantemente a fazer-me perguntas. Durante aquele tempo
eles integraram-se plenamente na matéria e nas actividades. Foi
espectacular.
Senti estas aulas como tempo ganho, útil. São temas que
acabam por puxar muitos assuntos que têm a ver com Filosofia, com a
Ciência. Foi um período produtivo. (...) Fiz da aula uma mesa redonda,
foi engraçado. Houve qualidade na discussão dos assuntos.
Tornou-se uma aula viva, interessante.”

Quanto à metodologia utilizada — discussão em grupo de acordo com o

método “Os Seis Chapéus do Raciocínio” — os sentimentos dos professores

variaram entre o interesse, a motivação, a confusão e alguma dificuldade. O

105
sentimento mais generalizado foi de interesse:

“Achei a metodologia muito interessante. É de intriga. Sinto-me


interessada e motivada para utilizar novamente a metodologia com
qualquer tipo de assunto: análise de textos, ... tudo o que envolva
conflitos, diferença de opiniões...” (Aida)
“Achei a metodologia interessante. Os alunos não têm hábitos
de trabalho, não têm método, logo esta metodologia é uma forma de
criar-lhes o interesse e de os orientar.” (António)
“A metodologia veio engrandecer a nossa relação, a nossa
aula.” (José)

Na opinião do José e do António esta metodologia apresenta, ainda, a

vantagem de explorar os sentimentos e as emoções, não se limitando a uma mera

discussão de factos:

“A partir do momento em que realizámos estas actividades,


pude ver que a exploração das emoções e dos sentimentos é também
importante. Temos tendência a ter em conta apenas factos.” (José)
“A escola não é só estudo planificado por disciplina, é também
um conjunto de emoções, de sentimentos, que o indíviduo deve
considerar.” (António)

Mas nem todos os sentimentos foram positivos. A Filomena, apesar de ter

gostado da metodologia, considerou-a demasiado estruturada, demasiado rígida.

Na sua opinião, o facto de se obedecer a uma sequência rígida de chapéus pode

desencadear reacções de rejeição:

“Acho que por vezes os chapéus eram um bocado rígidos. Às


vezes os alunos ficavam um bocado fartos com a rigidez da
metodologia. O método dos chapéus, que eu desconhecia, é original e
tem o aspecto positivo de organizar o pensamento. No entanto,
quando as coisas são muito rígidas, uma pessoa tem sempre a
tentação de sair. O facto de ser rígido poderá não dar gozo.”

106
No entanto, pensa que esta rigidez também pode ser útil para os alunos pois

“os seus métodos de pensar e de reflectir costumam ser desorganizados”. A Clara

e a Filomena sentiram alguma dificuldade em limitar a discussão ao tema em

causa; os alunos acabavam por discutir muitos outros temas relacionados. A

Filomena pensa que tais sentimentos resultam da falta de prática na dinamização

de aulas de debate e do maior grau de dificulade deste tipo de estratégia: “Estas

aulas de debate são mais difíceis, não tenho muita prática deste tipo de aula”.

Vários professores referiram, ainda, alguns sentimentos manifestados pelos

alunos em relação à metodologia. Enquanto que os alunos do José “acharam

piada”, os alunos da Filomena “aborreciam-se de estarem a utilizar os “chapéus”;


queriam logo passar à discussão”. A Clara notou alguma dificuldade inicial na

distinção das funções dos diferentes “chapéus” que desapareceu com o decorrer

das actividades. Sentiu, ainda, que o número de actividades realizadas foi

demasiado, tendo notado alguma saturação nos alunos nas duas últimas sessões.

Segundo a Aida, os alunos não conseguiram perceber o espírito das actividades,

limitando-se, muitas vezes, a defenderem acerrimamente os seus pontos de vista.

Por vezes, surgiram mesmo alguns atritos motivados pela divergência de opiniões.

4.1.3.2 Aplicação do chapéu amarelo (aspectos positivos, vantagens, benefícios)

Como aspectos positivos do tema das actividades, os professores foram

unânimes no reconhecimento da sua relevância, para a vida dos cidadãos e para o

futuro da humanidade, e das suas potencialidades: a) na motivação de alunos e

professores; b) na promoção da interacção na sala de aula; e c) no

desenvolvimento cognitivo e sócio-afectivo dos alunos. Na opinião do José, “o

ponto central das actividades foi o tema. Outro tema provavelmente não teria

resultado tão bem..., teríamos tido dificuldade em implementar a metodologia...”.

107
A relevância da discussão e do conhecimento das vantagens/desvantagens

dos novos avanços na área da Genética e da Biotecnologia ficou bem evidente em

várias afirmações:

“São temas que nos interessam como pessoas que vivemos em


Sociedade, em comum. Alguns destes temas poderão até influenciar a
nossa vida. Devemos tomar conhecimento destes temas para
estarmos informados de modo a podermos agir de forma eficaz.”
(Aida)
“Centrámos a nossa discussão no Futuro. Qual poderá ser o
nosso futuro? (...) É importante que os alunos tenham opiniões
fundamentadas.” (José)
“É um tema que não é abordado usualmente e que no fundo é
muito importante no futuro e para o qual não estamos preparados.
Nem há muitas informações sobre isso. No entanto, é algo que mexe
com a nossa ética e a nossa moral; é algo que evolui cada vez mais e
para o qual devemos estar preparados.” (Filomena)

Outras potencialidades atribuídas ao tema foram a motivação dos alunos e a

estimulação da interacção na sala de aula. Os professores entrevistados

consideraram que temas polémicos e actuais, como a Genética e a Biotecnologia,

são geradores de reflexão e de debate. Pensam, também, que a interacção


estabelecida facilitou a troca de informação e o esclarecimento de dúvidas e se

traduziu numa melhoria significativa do ambiente da sala de aula. Como eles

próprios referiram:

“Os temas são muito motivadores apesar de, à partida, os


alunos acharem que aquilo era muito maçudo. Logo as palavras
Engenharia Genética e Biotecnologia...; achavam que era muito
técnico... (...) Mas eles gostaram imenso. Agora, volta na volta,
aparecem-me com recortes de jornais ou com comentários sobre
notícias que viram no telejornal.” (Filomena)
“Alunos que nunca tinham intervido, participaram activamente.”
(José)
“O facto dos temas serem apresentados em dilemas faz com
que os alunos se interroguem, se empenhem na procura de soluções.

108
Acabamos por pensar que é algo que está a acontecer connosco. E se
acontecesse comigo? Qual seria a minha reacção? Os alunos acabam
por pensar como adultos, a sério; não brincam. Levam o assunto a
sério.” (José)
“O tema despertou nos alunos uma série de interrogações
sobre coisas que eles julgavam conhecer e dominar. Foi um ponto de
partida para um debate extremamente frutificante para alunos e
professores com base em toda a informação disponível. Eles
interrogam-se sobre estas matérias e estão muito receptivos e abertos
a este tipo de matérias.” (António)
“Durante as aulas criou-se um ambiente de diálogo que
favoreceu a discussão de dúvidas muitas vezes apenas relacionadas
indirectamente com o tema. Entre os alunos começou a haver mais
relação e troca de informações. Houve uma melhoria na relação e na
qualidade da relação entre os próprios alunos. Houve também um
aproximar do professor. (...) A relação entre mim e eles melhorou.”
(António)
“O ambiente mais activo e participativo melhorou o ambiente na
sala de aula; aproximou mais os alunos de mim e aproximou-os muito
mais uns dos outros.” (Clara)
“Estas actividades tiveram um aspecto formativo quer para mim
quer para os alunos. Aprendemos sobre estes temas. Muitas vezes
não sabemos o que querem dizer muitos dos termos e conceitos que,
frequentemente, ouvimos nos órgãos de comunicação social.” (Aida)
“Nota-se que através do trabalho do grupo os alunos se
interrogam sobre diversas coisas de diferente natureza que
anteriormente não tinham questionado.” (António)

Na opinião de alguns dos professores entrevistados, a discussão destes

temas levou a uma alteração da imagem que os alunos tinham da Filosofia:

“Os alunos não se sentiram obrigados a encafuar matéria na


cabeça; havia uma série de coisas que lhes interessavam para a sua
vida. (...) Deixaram de encarar a Filosofia como algo muito abstrato,
matéria que se tem que memorizar. (...) A Filosofia tem uma linguagem
que por vezes nos distancia dos alunos.” (António)
“Muitas vezes pensamos a Filosofia num campo mais abstracto.
Neste momento posso dizer que a Filosofia desceu à Terra, ao
Indivíduo e engrandeceu os meus alunos. Os meus alunos não
ficaram com a noção de que a Filosofia é um conjunto de temas pouco
relacionados com a vida sobre os quais se especula.” (José)

109
Outro aspecto positivo do tema, apontado pela Clara, foi a sua boa

adequação aos programas de Filosofia, mais especificamente às unidades

relativas às consequências do desenvolvimento da Ciência e aos valores éticos.

Relativamente aos aspectos positivos da metodologia, todos os professores

realçaram o facto de orientar/organizar o raciocínio dos alunos. Consideram que

“Os Seis Chapéus do Raciocínio”, além de rentabilizarem e de potenciarem a

discussão em grupo, constituem um método eficiente de orientação e de

organização do pensamento, passível de ser aplicado a várias situações. Na sua

opinião, esta metodologia:

“Obriga-os a organizarem-se, a dirigirem o raciocínio de acordo


com uma metodologia, um método. O raciocínio dos alunos, se não for
orientado, é muitas vezes anárquico. É um raciocínio que não leva a
lado nenhum.” (António)
“Dava uma boa indicação aos alunos sobre o percurso a seguir
e penso que se verificou depois, ao longo de algumas sessões, uma
certa evolução na forma de raciocinar. Para já, eles tinham mais
prática no assunto e depois penso que foi positiva a aplicação desta
organização mental a outras actividades. Não apliquei propriamente
os chapéus, mas a simples referência aos chapéus permitiu-me
explicar mais facilmente o objectivo de algumas actividades.” (Clara)
“É muito importante porque os ajuda a organizar o seu
pensamento. Como é por fases, ajuda-os a ter consciência da fase em
que estão. Tiram partido da análise mais consciente de uma situação.”
(Aida)
“É original e tem o aspecto positivo de organizar o
pensamento.” (Filomena)
“Faz com que os alunos possam ser mais disciplinados em
termos da organização do pensamento. Faz com que se concentrem
mais e digam aquilo que sentiram e pensaram. Rentabiliza o trabalho.
Esta metodologia veio ajudar-nos bastante.
Houve uma maior participação dos alunos. Mesmo os mais
tímidos foram capazes de colaborarem, de darem opiniões e de
dizerem o que tinham sentido.
A discussão dos temas sem a metodologia seria algo
dispersivo. Não haveria uma sequência, uma estrutura ordenada. No
fundo há uma atenção centrada. Sem esta metodologia os alunos
acabam por se perder. Não vejo vantagem nas actividades sem a

110
metodologia. O tema motiva mas não garante um resultado final.”
(José)

4.1.3.3 Aplicação do chapéu preto (aspectos negativos, fraquezas, problemas)

Relativamente ao tema das actividades, não foram apontados pontos

negativos. Todos os professores realçaram, mais uma vez, os aspectos positivos

do mesmo.

Quanto à metodologia, o único ponto negativo foi apontado pela Filomena.

Considera que a pouca flexibilidade da metodologia — a utilização de sequências

rígidas de “chapéus” — pode desencadear reacções de rejeição por parte dos

alunos. Curiosamente, também foram os seus alunos (12º 1) que mais referiram

este ponto.

Na opinião dos restantes professores não existiu qualquer aspecto negativo

na utilização da metodologia. No entanto, tanto o António como a Aida

mostraram-se preocupados com a sua eventual utilização sistemática, realçando a

necessidade dos professores diversificarem estratégias.

4.1.3.4 Aplicação do chapéu verde (sugestões, novas ideias, alternativas)

Quanto ao tema discutido, os professores entrevistados não sugeriram

qualquer alteração. Todos o consideraram muito interessante e bem adequado a

este tipo de actividade.

Relativamente à metodologia, as sugestões apresentadas incidiram na sua

eventual aplicação a outras áreas disciplinares, na utilização de um menor número

de actividades e na forma como a informação foi fornecida aos alunos. O José

considera que esta metodologia, dadas as suas potencialidades, deveria ser

111
utilizada pelos diferentes grupos disciplinares:

“Considero que se deveria implementar a utilização desta


metodologia em todas as áreas disciplinares. Acho que seria
interessante que logo no início do ano escolar se preparassem e
estruturassem as aulas de forma a poder-se utilizar mais vezes esta
metodologia porque é rentável tanto para o professor como para o
aluno. Torna-se o resultado mais objectivo. Vêem-se resultados. Não
se perde informação. Tem-se em conta todos os aspectos. Penso que
no grupo disciplinar devíamos pensar seriamente em utilizar este tipo
de actividades.”

Tanto a Aida como a Clara sugerem a redução do número de actividades ou

a sua discussão de uma forma mais espaçada, de modo a não saturar os alunos.

Por sua vez, Filomena sugere alterações na forma de apresentação da informação

preliminar. Considera, ainda, que não se deveriam ter imposto “Os Seis Chapéus

do Raciocínio” como método de discussão para todas as actividades. Na sua

opinião:

“Os alunos achavam engraçado que houvesse uma maior


informação por parte de alguém que percebesse bem do assunto.
Sugeriram imagens, vídeos... Até para os motivar, eu acho que seria
importante, que no início de uma unidade destas, alguém dentro do
assunto desse uma aula de introdução e de motivação.
Os textos de introdução entregues aos alunos
desmotivaram-nos um pouco. Teria sido bom começar antes com um
vídeo ou com um seminário sobre o assunto; era capaz de os ter
motivado mais, tenho a certeza absoluta.”
“Seria interessante averiguar as metodologias seguidas pelos
alunos se não tivessem que utilizar os chapéus. Fazerem primeiro
como eles sentem. Em vez de começar logo com os chapéus, seria
interessante deixá-los organizar a discussão como entendessem e
depois, numa segunda fase, utilizar os chapéus e deixá-los comparar
os métodos utilizados.” (Filomena)

112
4.1.3.5 Aplicação do chapéu azul (avaliação global)

As avaliações globais foram positivas. De uma maneira geral, salientaram o

aspecto formativo das actividades na aquisição e compreensão de conhecimentos

e na estruturação do pensamento.

A Aida considera que as actividades realizadas permitiram o

aprofundamento, a estruturação e a organização de conhecimentos sobre

Biotecnologia e Genética e das suas relações com a Sociedade. Na sua opinião, a

metodologia utilizada ajuda, tanto professores como alunos, a estruturarem o

pensamento.
O António destaca a importância da interacção no desenvolvimento

sócio-afectivo e cognitivo de professores e alunos:

“Sentimo-nos mais realizados quando nos manifestamos,


quando nos podemos pronunciar. Nós professores precisamos muito
disto. Hoje em dia ninguém diz nada a ninguém. Guarda-se o
conhecimento, ninguém partilha informações. Esta partilha, este
diálogo, é essencial para nos humanizarmos cada vez mais.
Considero que a minha participação neste estudo me
enriqueceu e enriqueceu a escola. Foi algo muito profundo. Fomos
muito ao fundo de certas questões que normalmente não são
questionadas.
A organização das actividades desta forma foi benéfica tanto
para mim como para os alunos. Estruturei e organizei conhecimentos
adormecidos. Depois, despertei para uma série de coisas que têm a
ver não só com os conhecimentos que adquiri mas também com a
minha reflexão. A reflexão para mim é muito importante. Entrámos
num campo científico que eu desejava aprofundar, mas os
interlocutores informados são muito poucos. Foi fácil discutir e
aprender.”

O António referiu, ainda, a importância da utilização d’“Os Seis Chapéus do

113
Raciocínio” nas escolas:

“Acho que este método é importante porque nas escolas não se


transmite organização e método de estudo. Esquecemos muitas vezes
que o estudante precisa de ter um método.”

Para a Clara, a apreciação global variou consoante a turma:

“Na turma do 11º ano foi bastante positivo. Permitiu enquadrar,


bastante bem, conteúdos programáticos. Em termos de raciocínio foi
bastante positivo para alguns alunos. Passei a notar uma maior
organização de pensamento e de redacção em alguns alunos.
Na turma de 10º ano os resultados foram afectados pela
indisciplina e pelo desinteresse da turma. Houve dias que correram
bem, outros que correram mal. Acabei por desistir desta metodologia
na última aula.”

No entanto, considerou que as actividades foram proveitosas tanto para ela

como para os seus alunos:

“Os alunos aprenderam sobre o tema; principalmente sobre


eugenia que foi o tema que teve maior receptividade. No geral foi
positivo para eles e para mim em termos de estratégia e de tema, ...
de como agarrar o tema. Aprendi bastante em termos de
conhecimento e inclusivamente em termos de metodologia: pude
organizar um bocadinho melhor algumas estratégias; organizar mais o
raciocínio.”

A avaliação global feita pela Filomena foi, segundo as suas próprias

palavras, “muito positiva”. Considerou muito interessantes tanto o tema como as

discussões propostas. No entanto, pensa que a metodologia, apesar de ter “o

aspecto positivo de organizar o pensamento”, pode desmotivar os alunos pela sua

rigidez.

114
O José, na sua avaliação global, salientou as potencialidades das

actividades na alteração da imagem da disciplina de Filosofia, na motivação dos

seus alunos e na organização do pensamento:

“Muitas vezes pensamos a Filosofia num campo mais abstracto.


Neste momento posso dizer que a Filosofia desceu à Terra, ao
Indivíduo e engrandeceu os meus alunos. Os meus alunos não
ficaram com a noção de que a Filosofia é um conjunto de temas,
pouco relacionados com a vida, sobre os quais se especula.
Agora, nos corredores, na sala de aula, no bar, os alunos
costumam perguntar-me quando é que vamos discutir mais
actividades.
Muitas vezes tocava para a saída e os alunos permaneciam
sentados. E esse hábito manteve-se mesmo depois das actividades
terem acabado. Pela primeira vez os alunos escreveram relatórios, e
com vontade!
O professor sai da aula com a certeza de que a aula foi bem
conseguida.
Os alunos estavam de tal maneira motivados que era frequente
colocarem-me dúvidas (sobre os assuntos em discussão) nos
corredores, no bar...”

Na opinião do José, o professor desempenha um papel decisivo na

motivação dos seus alunos:

“A atitude do professor foi rica. Acabei por saber estar numa


sala de aula. Acabei por dar aulas com uma atitude, e da forma, que
eu considero que é importante; estar na aula sem a limitação do
tempo.
É frustrante ver que os alunos muitas vezes não estão a ouvir,
não estão na sala de aula. A motivação e a atenção dependem muito
da forma e da atitude do professor na sala de aula. Acho que a atitude
do professor também deve mudar. Quando as coisas não interessam
aos alunos...”

Finalmente, referiu a importância da metodologia utilizada na organização

do pensamento:

“Creio que a metodologia disciplina o pensamento e que pode

115
ser transferida para outras situações. Passou-se do caos à ordem.
Ordenou-se o pensamento. Foi um período produtivo.”

4.1.4 Dados dos questionários de opinião sobre Biotecnologia

A aplicação do questionário de opinião (Anexo 3) destinou-se a avaliar o

impacto das actividades de discussão nas opiniões dos alunos sobre

Biotecnologia. Com o objectivo de detectar eventuais variações de opinião, foi

aplicado o mesmo questionário no início e no final do estudo. O questionário era

constituído por 22 afirmações diferentes sobre relações entre Ciência, Tecnologia

e Sociedade, relativamente às quais os alunos deviam indicar a sua opinião

utilizando uma escala com cinco opções que variava entre “concordo totalmente” e

“discordo totalmente” (Anexo 3).

As opiniões dos alunos em função dos sub-temas discutidos estão

apresentadas em número e percentagem de respostas por opção, antes e depois

da realização das actividades de discussão (Quadros 3 a 11). Também foram

registadas as diferenças de opinião detectadas entre o primeiro e o segundo

questionário. Cada quadro centra-se em determinadas afirmações,


correspondentes a um dos sub-temas discutidos. Uma análise global das respostas

dos alunos permite constatar algumas alterações significativas de opinião depois

da realização das actividades de discussão.

4.1.4.1 Crescimento científico e tecnológico e bem estar social

Na opinião dos alunos participantes no estudo, existe uma associação entre

o bem estar social e o crescimento científico e tecnológico, em geral, e o

desenvolvimento da tecnologia genética, em particular (Quadro 3, afirmações 1 e

10). Esta associação, que já era nítida no início do estudo, foi reforçada pela

diminuição considerável do elevado número de indecisos — afirmação 1 — e pela

116
modificação de opiniões — afirmação 10 — após a realização das actividades de

discussão. No entanto, é de salientar o número elevado de alunos —

aproximadamente um terço — que mantém dúvidas quanto à capacidade da

tecnologia genética melhorar as condições de vida da população.

Quadro 3

Crescimento Científico e Tecnológico e Bem Estar Social


Afirmações CT C ÑC D DT

1 O crescimento Antes 7 60 40 10 1
científico e (5,9%) (50,9%) (33,9%) (8,5%) (0,8%)
tecnológico produz
bem estar social
Depois 15 71 23 9 0
(12,7%) (60,2%) (19,5%) (7,6%) (0,0%)

Diferença 8 11 17 1 1
(6,8%) (9,3%) (14,4%) (0,8%) (0,8%)

10 A tecnologia genética Antes 6 48 43 19 2 (1,7%)


melhora as condições (5,1%) (40,7%) (36,4%) (16,1%)
de vida da população
Depois 5 60 40 12 1 (0,8%)
(4,2%) (50,9%) (33,9%) (10,2%)

Diferença 1 12 3 7 1
(0,8%) (10,2%) (2,5%) (5,9%) (0,8%)

Nota: C T- Concordo totalmente; C- Concordo; Ñ C- Não tenho a certeza;


D- Discordo; D T- Discordo totalmente.

4.1.4.2 Engenharia genética - potencialidades e perigos

Quanto às potencialidades e aos perigos da engenharia genética, as

opiniões dos alunos são curiosas (Quadro 4, afirmações 7, 9 e 14). Embora uma

percentagem considerável se manifeste indecisa, reconhece-se que, apesar dos

alunos se terem revelado receosos e preocupados com as suas aplicações, a

esperança nas suas potencialidades é tal que muitos defenderam a sua utilização

no melhoramento dos seres vivos.

O medo relativamente às aplicações da engenharia genética parece

evidente. Para muitos alunos, o perigo de uma eventual manipulação do código

117
genético é comparável ao das armas nucleares. A discussão deste assunto veio

reforçar ainda mais este sentimento (Quadro 4, afirmações 7 e 9). No entanto,

simultaneamente, as actividades de discussão permitiram um aumento significativo

do sentimento de esperança nas aplicações da engenharia genética (Quadro 4,

afirmação 14) que resultou de uma diminuição do número de indecisos. Verifica-se,

inclusivamente, que no final do estudo o conjunto dos alunos manifesta mais

esperança do que medo.

Quadro 4

Sentimentos Relativamente à Engenharia Genética


Afirmações CT C ÑC D DT

7 A engenharia genética Antes 11 37 34 28 8


provoca medo (9,3%) (31,4%) (28,8%) (23,7%) (6,8%)

Depois 17 48 33 16 4
(14,4%) (40,7%) (28,0%) (13,6%) (3,4%)

Diferença 6 11 1 12 4
(5,1%) (9,3%) (0,8%) (10,2%) (3,4%)

9 A possibilidade de Antes 27 40 33 15 3
manipulação do código (22,9%) (33,9%) (28,0%) (12,7%) (2,5%)
genético é tão perigosa
quanto as armas
nucleares Depois 41 40 29 7 1
(34,8%) (33,9%) (24,6%) (5,9%) (0,8%)

Diferença 14 0 4 8 2
(11,9%) (0,0%) (3,4%) (6,8%) (1,7%)

14 A engenharia genética Antes 21 64 29 4 0


provoca esperança (17,8%) (54,2%) (24,6%) (3,4%) (0,0%)

Depois 18 86 10 3 1
(15,3%) (72,9%) (8,5%) (2,5%) (0,8%)

Diferença 3 22 19 1 1
(2,5%) (18,6%) (16,1%) (0,8%) (0,8%)

Nota: C T- Concordo totalmente; C- Concordo; Ñ C- Não tenho a certeza;


D- Discordo; D T- Discordo totalmente.

Provavelmente, é a esperança nas potencialidades da engenharia genética

que leva bastantes alunos a concordarem com a sua utilização no melhoramento

de espécies vegetais e animais, incluindo a espécie humana (Quadro 5,

118
afirmações 4, 8 e 16). Verifica-se, mesmo, que o número de opiniões concordantes

é sempre superior ao de opiniões discordantes. Contudo, o número de indecisos

quanto a um eventual melhoramento de espécies vegetais e animais, incluindo a

espécie humana, foi bastante elevado tanto antes como depois das actividades de

discussão. Com a discussão destes assuntos, as opiniões dos alunos relativas ao

eventual melhoramento das espécies vegetais e humana não sofreram alterações

consideráveis. No entanto, relativamente ao melhoramento genético das espécies

animais, verificou-se uma diminuição do número de opiniões desfavoráveis e um

aumento do número de indecisos.

Quadro 5

Engenharia Genética e Melhoramento dos Seres Vivos


Afirmações CT C ÑC D DT

4 A engenharia genética Antes 18 37 27 16 20


deve ser utilizada no (15,3%) (31,4%) (22,9%) (13,6%) (17,0%)
melhoramento da
espécie humana
Depois 17 38 32 16 15
(14,4%) (32,2%) (27,1%) (13,6%) (12,7%)

Diferença 1 1 5 0 5
(0,8%) (0,8%) (4,2%) (0,0%) (4,2%)

8 A engenharia genética Antes 9 36 30 31 12


deve ser utilizada no (7,6%) (30,5%) (25,4%) (26,3%) (10,2%)
melhoramento de
espécies animais
Depois 15 36 44 17 6
(12,7%) (30,5%) (37,3%) (14,4%) (5,1%)

Diferença 6 0 14 14 6
(5,1%) (0,0%) (11,9%) (11,9%) (5,1%)

16 A engenharia genética Antes 16 42 35 17 8


deve ser utilizada no (13,6%) (35,6%) (29,7%) (14,4%) (6,8%)
melhoramento de
espécies vegetais
Depois 16 45 34 19 4
(13,6%) (38,1%) (28,8%) (16,1%) (3,4%)

Diferença 0 3 1 2 4
(0,0%) (2,5%) (0,8%) (1,7%) (3,4%)

Nota: C T- Concordo totalmente; C- Concordo; Ñ C- Não tenho a certeza;


D- Discordo; D T- Discordo totalmente.

119
4.1.4.3 Análise do património genético - potencialidades e perigos

As opiniões dos alunos quanto à realização de análises ao património

genético variaram consoante a utilização sugerida para a informação assim obtida.

A grande maioria concorda que qualquer pessoa deveria fazer exames genéticos

para averiguar a possibilidade de ser portadora de genes responsáveis por

doenças (Quadro 6, afirmação 22).

Quadro 6

Utilização do Diagnóstico Genético


Afirmações CT C ÑC D DT

18 As companhias de Antes 4 14 50 26 34
seguros têm o direito (3,4%) (11,9%) (42,4%) (22,0%) (28,8%)
de conhecer o
património genético
das pessoas que
pretendam seguros de
vida, de forma a
poderem recusar os Depois 4 13 24 30 47
candidatos cuja (3,4%) (11,0%) (20,3%) (25,4%) (39,8%)
probabilidade de virem
a desenvolver doenças
de origem genética
seja elevada

Diferença 0 1 26 4 13
(0,0%) (0,8%) (22,0%) (3,4%) (11,0%)

22 Qualquer pessoa deve Antes 56 47 13 2 0


fazer exames (47,5%) (39,8%) (11,0%) (1,7%) (0,0%)
genéticos para
averiguar a
possibilidade de ser
portadora de genes Depois 48 47 16 4 3
responsáveis por (40,7%) (39,8%) (13,0%) (3,4%) (2,5%)
doenças

Diferença 8 0 3 2 3
(6,8%) (0,0%) (2,5%) (1,7%) (2,5%)

Nota: C T- Concordo totalmente; C- Concordo; Ñ C- Não tenho a certeza;


D- Discordo; D T- Discordo totalmente.

No entanto, a maioria dos alunos discorda da eventual utilização de análises

genéticas por companhias de seguros ou empregadores, sempre que essa

utilização vise recusar seguros de vida ou emprego a indivíduos que revelem

120
probabilidades elevadas de virem a desenvolver doenças de origem genética

(Quadro 6, afirmação 18). Relativamente a esta última afirmação, é interessante

verificar como a discussão deste tópico nas aulas levou à diminuição considerável

do elevado número de indecisos; no final do estudo, mais de metade destes alunos

opunha-se à utilização de diagnósticos genéticos por companhias de seguros ou

empregadores.

No caso de se detectarem deformações ou mutações genéticas no feto, a

maioria dos alunos considerou que os pais devem optar pelo aborto terapêutico

(Quadro 7, afirmação 3). Muitos consideraram mesmo que perante um feto no qual

se detecte uma doença genética grave, e se os pais optarem por ter esse filho, o
Estado deve obrigá-los a suportar sozinhos as despesas médicas resultantes

(Quadro 7, afirmação 19).

Quadro 7

Diagnóstico Genético e Aborto Terapêutico


Afirmações CT C ÑC D DT

3 Os pais devem optar Antes 46 27 20 18 7


pelo aborto terapêutico (39,0%) (22,9%) (17,0%) (15,3%) (5,9%)
sempre que saibam,
através de testes de
diagnóstico pré-natal,
que o feto apresenta Depois 27 37 24 24 6
alguma deformação ou (22,9%) (31,4%) (20,3%) (20,3%) (5,1%)
mutação genética

Diferença 19 10 4 6 1
(16,1%) (8,5%) (3,4%) (5,1%) (0,8%)

19 Perante um feto em Antes 18 37 27 16 20


que se detectou uma (15,3%) (31,4%) (22,9%) (13,6%) (17,0%)
doença genética grave,
e se os pais optarem
por ter esse filho, o
Estado deve obrigá-los Depois 17 38 32 16 15
a suportar sózinhos as (14,4%) (32,2%) (27,1%) (13,6%) (12,7%)
despesas médicas
resultantes

Diferença 1 1 5 0 5
(0,8%) (0,8%) (4,2%) (0,0%) (4,2%)

Nota: C T- Concordo totalmente; C- Concordo; Ñ C- Não tenho a certeza;


D- Discordo; D T- Discordo totalmente.

121
Contudo, depois da discussão do tema, houve uma diminuição nítida do

número de opiniões totalmente favoráveis ao aborto terapêutico e um aumento dos

que concordavam apenas, dos indecisos e dos que discordavam.

Quanto à afirmação 19 (Quadro 7), as actividades de discussão apenas

fizeram aumentar ligeiramente o número de indecisos, em detrimento das opiniões

contrárias à imposição estatal dos pais suportarem sozinhos os encargos médicos

resultantes do nascimento de um filho cuja doença genética fosse conhecida antes

do nascimento.

Em relação à eventual eliminação à nascença dos seres humanos não

aprovados em testes de dotação genética, a maioria dos alunos opôs-se


terminantemente (Quadro 8, afirmação 5). No entanto, após a discussão geral do

tema, o número de indecisões e de opiniões favoráveis aumentou.

Quadro 8

Diagnóstico Genético e Eugenia


Afirmações CT C ÑC D DT

5 Nenhum recém- Antes 0 1 5 25 87


nascido deveria ser (0,0%) (0,8%) (4,2%) (21,2%) (73,7%)
reconhecido como ser
humano antes de ser
aprovado em testes de
dotação genética; os Depois 3 4 13 24 74
reprovados deveriam (2,5%) (3,4%) (11,0%) (20,3%) (62,7%)
perder o direito à vida

Diferença 3 3 8 1 13
(2,5%) (2,5%) (6,8%) (0,8%) (11,0%)

20 Os indivíduos que Antes 15 20 39 23 21


apresentam doenças (12,7%) (17,0%) (33,1%) (19,5%) (17,8%)
genéticas causadoras
de deficiência mental
ou de deformações
devem ser impedidos
de transmitir essas Depois 10 17 34 33 24
características aos (8,5%) (14,4%) (28,8%) (28,0%) (20,3%)
seus descendentes,
ou seja, devem ser
impedidos de ter filhos

Diferença 5 3 5 10 3
(4,2%) (2,5%) (4,2%) (8,5%) (2,5%)

Nota: C T- Concordo totalmente; C- Concordo; Ñ C- Não tenho a certeza;


D- Discordo; D T- Discordo totalmente.

122
Muitos alunos opuseram-se a que os indivíduos portadores de doenças

genéticas responsáveis por deficiência mental ou deformações fossem impedidos

de ter filhos, mesmo havendo possibilidade dessas características serem

transmitidas aos descendentes (Quadro 8, afirmação 20). No entanto, o número de

indecisos foi elevado. Depois da realização das actividades de discussão este

número manteve-se elevado, apesar do número de opiniões contrárias ter sido

reforçado.

4.1.4.4 Os cidadãos e a Biotecnologia

Na opinião dos alunos, toda a população deveria estar informada sobre os

limites e as potencialidades da Biotecnologia (Quadro 9, afirmação 11).

Consideraram que a escola deve desempenhar um papel relevante na informação

e esclarecimento da população, proporcionando espaços de debate sobre o

impacto da Biotecnologia na Sociedade (Quadro 9, afirmação 17). As actividades

de discussão pouco reforçaram estas opiniões.

Quadro 9
Conhecimento das Potencialidades e dos Limites da Biotecnologia
Afirmações CT C ÑC D DT

11 Toda a população deve Antes 83 31 2 2 0


estar informada sobre os (70,3%) (26,3%) (1,7%) (1,7%) (0,0%)
limites e as
potencialidades da
Biotecnologia
Depois 82 34 2 0 0
(69,5%) (28,8%) (1,7%) (0,0%) (0,0%)

Diferença 1 3 0 2 0
(0,8%) (2,5%) (0,0%) (1,7%) (0,0%)

17 A escola deve Antes 65 44 8 1 0


proporcionar espaços de (55,1%) (37,3%) (6,8%) (0,8%) (0,0%)
discussão sobre o
impacto da Biotecnologia
na Sociedade
Depois 62 53 2 0 1
(52,5%) (45,0%) (1,7%) (0,0%) (0,8%)

Diferença 3 9 6 1 1
(2,5%) (7,6%) (5,1%) (0,8%) (0,8%)

Nota: C T- Concordo totalmente; C- Concordo; Ñ C- Não tenho a certeza;


D- Discordo; D T- Discordo totalmente.

123
Embora a maioria dos alunos tenha considerado que toda a população deve

ser consultada relativamente às decisões a tomar na área da investigação e,

particularmente, da Tecnologia Genética (Quadro 10, afirmação 15), muitos não

tinham a certeza da possibilidade e do dever dos cidadãos influenciarem, ou não,

estas decisões (Quadro 10, afirmações 6 e 21). A realização das actividades de

discussão centradas nas potencialidades e nos perigos da Biotecnologia parece ter

reforçado a opinião de que o cidadão pode e deve intervir na tomada de decisões

nesta área, embora o número de indecisos se tenha mantido elevado.

Quadro 10
Tomada de Decisões na Área da Biotecnologia
Afirmações CT C ÑC D DT

6 Cada um de nós pode Antes 20 36 54 7 1


influenciar as decisões (17,0%) (30,5%) (45,8%) (5,9%) (0,8%)
que os órgãos de
poder tomam na área
da Biotecnologia Depois 23 45 39 9 4
(19,5%) (38,1%) (33,1%) (7,6%) (3,4%)

Diferença 3 9 15 2 3
(2,5%) (7,6%) (12,7%) (1,7%) (2,5%)

15 Toda a população Antes 38 53 20 5 2


deve ser consultada (32,2%) (44,9%) (17,0%) (4,2%) (1,7%)
relativamente às
decisões a tomar na
área da investigação e, Depois 39 53 19 7 0
particularmente, da (33,1%) (44,9%) (16,1%) (5,9%) (0,0%)
Tecnologia genética

Diferença 1 0 1 2 2
(0,8%) (0,0%) (0,8%) (1,7%) (1,7%)

21 Cada um de nós deve Antes 14 51 43 8 2


influenciar as decisões (11,9%) (43,2%) (36,4%) (6,8%) (1,7%)
que os órgãos de
poder tomam na área
da Biotecnologia Depois 25 47 36 9 1
(21,2%) (39,8%) (30,5%) (7,6%) (0,8%)

Diferença 11 4 7 1 1
(9,3%) (3,4%) (5,9%) (0,8%) (0,8%)

Nota: C T- Concordo totalmente; C- Concordo; Ñ C- Não tenho a certeza;


D- Discordo; D T- Discordo totalmente.

124
4.1.4.5 Controlo da investigação na área da Biotecnologia

Relativamente ao controlo da investigação científica na área da

Biotecnologia, as reacções foram interessantes. A maioria dos alunos, apesar de

considerar que a limitação à liberdade de investigação compromete eventuais

descobertas úteis à humanidade, discorda da liberdade de investigação nesta área

(Quadro 11, afirmações 13 e 2). Considera mesmo que a Assembleia da República

deve criar legislação adequada ao controlo da investigação científica na área da

Biotecnologia (Quadro 11, afirmação 12).

Quadro 11

Controlo da Investigação na Área da Biotecnologia


Afirmações CT C ÑC D DT

2 A investigação Antes 8 28 22 40 20
científica, na área da (6,8%) (23,7%) (18,6%) (33,9%) (17,0%)
Biotecnologia, não
deve estar sujeita a
qualquer
tipo de restrição ou de
controlo; deve existir Depois 5 20 25 41 27
total liberdade de (4,2%) (17,0%) (21,2%) (34,8%) (22,9%)
investigação

Diferença 3 8 3 1 7
(2,5%) (6,8%) (2,5%) (0,8%) (5,9%)

12 A Assembleia da Antes 39 59 14 6 0
República deve criar (33,1%) (50,0%) (11,9%) (5,1%) (0,0%)
legislação que controle
a investigação
científica na área da Depois 54 50 9 4 1
Biotecnologia (45,8%) (42,4%) (7,6%) (3,4%) (0,8%)

Diferença 15 9 5 2 1
(12,7%) (7,6%) (4,2%) (1,7%) (0,8%)

13 A limitação à liberdade Antes 22 51 32 12 1


de investigação (18,6%) (43,2%) (27,1%) (10,2%) (0,8%)
compromete eventuais
descobertas úteis à
humanidade Depois 7 64 39 7 1
(5,9%) (54,2%) (33,1%) (5,9%) (0,8%)

Diferença 15 13 7 5 0
(12,7%) (11,0%) (5,9%) (4,2%) (0,0%)

Nota: C T- Concordo totalmente; C- Concordo; Ñ C- Não tenho a certeza;


D- Discordo; D T- Discordo totalmente.

125
Após a realização das actividades de discussão, verificou-se um aumento

do número de alunos que concorda totalmente com a publicação de legislação

restritiva pela Assembleia da República e um ligeiro aumento do número de

indecisos relativamente às vantagens/desvantagens da limitação da investigação.

4.2 Análise dos Resultados

Este estudo evidencia o papel positivo da discussão em grupo de temas

controversos, na mesma linha de opiniões e resultados de investigação referidos

no segundo capítulo. O conjunto dos resultados obtidos permite afirmar que as

actividades de discussão em grupo, centradas nas vantagens e desvantagens dos

novos avanços na área da Genética e da Biotecnologia, permitiram alcançar vários

dos objectivos propostos:

1. Estimular a participação e o envolvimento dos alunos nas actividades

escolares propostas;

2. Criar um ambiente de interacção na sala de aula que poderá promover:

a) a construção de conhecimentos sobre os novos avanços na área da

Biotecnologia e da Genética e as suas inter-relações com a Sociedade;

b) o desenvolvimento de competências cognitivas; e

c) o desenvolvimento de competências sócio-afectivas.

As potencialidades do tema para a motivação dos alunos e para a

estimulação do debate foram claras: a sua actualidade, interesse, controvérsia e

relevância para a vida dos cidadãos motivaram os alunos e desencadearam

reflexão e debate. A motivação e o interesse revelados pelos alunos, associados à

quantidade e à qualidade das interacções estabelecidas, constituem os aspectos

positivos mais evidentes das actividades de discussão. A interacção estabelecida

126
revelou-se positiva no aprofundamento e na melhoria das relações entre os

participantes, na promoção de capacidades de análise de informação e de

argumentação e na construção de conhecimentos e esclarecimento de dúvidas

sobre os novos avanços na área da Biotecnologia e da Genética e as suas

inter-relações com a Sociedade.

Os resultados obtidos contrariam a opinião, comum entre os professores da

escola, de que os alunos não têm capacidades de pensamento: a qualidade das

interacções estabelecidas durante as sessões de discussão revelaram

capacidades de raciocínio consideráveis. Este facto vê-se apoiado pela afirmação

de Smith (1990), segundo a qual o pensamento de qualquer indivíduo é


prioritariamente determinado por factores motivacionais desencadeados pelo tema

e pela metodologia e não por capacidades intelectuais específicas. Provavelmente,

a qualidade do pensamento em ocasiões específicas não está relacionada apenas

com o facto de terem sido correctamente ensinadas as capacidades adequadas,

dependendo principalmente de questões motivacionais, ou seja, da disposição

para pensar. Assim, qualquer pensamento deficiente poderá resultar,

principalmente, de disposições particulares e não da ausência de algo essencial

na capacidade de pensar, sendo mais uma questão de preferência do que de

capacidade. Neste caso, o interesse, apesar de não ter sido sinónimo de eficácia,

garantiu o envolvimento no pensamento e estimulou a interacção e a

aprendizagem com outros indivíduos.

O comportamento e a atitude dos professores durante as actividades,

solicitando e valorizando as opiniões dos alunos, tentando criar um ambiente de

respeito e de tolerância, parecem ter sido decisivos na promoção do pensamento.

Provavelmente, e tal como defende Smith (1990), o direito de pensar e de exprimir

pensamentos individuais não é reconhecido/sentido por todos de igual maneira;

depende das pessoas à nossa volta, da forma como nos tratam e do nosso

consequente autoconceito. Logo, o desenvolvimento da forma como pensamos

127
talvez seja mais afectado pelo comportamento das pessoas à nossa volta, e pelo

papel que vemos ser-nos reservado nas suas actividades, do que pela instrução de

capacidades. Talvez nos tornemos sujeitos pensantes quando temos oportunidade

e razão para pensar; quando estamos rodeados de pessoas que pensam; e

quando promovem o nosso pensamento admitindo e estimulando a nossa

participação em argumentações, desafios e debates baseados no respeito. Tal

como defende Bridges (1979), dificilmente poderá realizar-se uma actividade de

discussão numa escola onde os alunos têm medo de falar livremente e onde os

professores não valorizam e não respeitam as suas opiniões. Neste estudo, o

respeito pelas opiniões e pelos sentimentos dos alunos revelou-se decisivo no


reconhecimento do direito de pensarem e de exprimirem pensamentos individuais.

Apesar disto, também parecem existir evidências de que a qualidade do

pensamento poderá ser melhorada através da utilização d’“Os Seis Chapéus do

Raciocínio”, um método orientador da atenção para determinados tipos de

raciocínio. Vários alunos e professores, opinam que este método é eficaz na

orientação e na organização do pensamento, sugerindo a sua aplicação na análise

de assuntos e de situações e na resolução de problemas. Consideraram que o

raciocínio executado por sectores, ou seja, de forma compartimentada, é mais

eficaz pois diminui a confusão e impede que sejam negligenciados aspectos

decisivos. Estas opiniões coincidem com as de de Bono (1976, 1985, 1995) que vê

a complexidade como o maior inimigo do pensamento por conduzir à confusão e a

erros de percepção.

Relativamente aos aspectos positivos do conjunto da metodologia —

discussão em grupo orientada pel’“Os Seis Chapéus do Raciocínio” — os alunos

realçaram o facto de estimular/organizar o pensamento e de facilitar o

desenvolvimento cognitivo e sócio-afectivo através da reflexão, do debate de

ideias e da discussão de opiniões diferentes. Segundo os alunos, o debate e a

discussão em grupo facilitaram a resolução de problemas e a compreensão e o

128
aprofundamento de conteúdos através da interacção de diferentes conhecimentos,

ideias e opiniões. Estas opiniões coincidem com a de Stenhouse (1970) que realça

as potencialidades da discussão no desenvolvimento cognitivo através da

interacção de diferentes perspectivas e da análise crítica dos diferentes

testemunhos. Contudo, dificilmente se poderá distinguir até que ponto os eventuais

“raciocínios mais eficazes” terão resultado da aprendizagem de capacidades de

pensamento ou de interacções e de aprendizagens efectuadas entre os alunos

durante as discussões. Ao certo, pode afirmar-se que a maior parte dos alunos e

dos professores revelou opiniões positivas relativamente a’“Os Seis Chapéus do

Raciocínio” e ao seu efeito na capacidade de pensar.


Tal como Solomon (1991, 1992), constatou-se que a utilização repetida de

actividades de discussão em pequeno grupo não só contribuiu positivamente para

os processos de argumentação e de reflexão como também constituiu uma

experiência agradável e significativa em termos de aprendizagem. No entanto,

também se identificaram alguns dos problemas sentidos por Rudduck (1979, 1986)

e Lusk e Weinberg (1994) durante a realização de actividades de discussão.

Problemas como a falta de tolerância relativamente às opiniões dos colegas, a

relutância em valorizar outras opiniões, a interpretação de opiniões divergentes

como ataques pessoais, a defesa acérrima e intransigente de opiniões, com a

consequente divisão do grupo em facções, e alguma confusão durante o debate de

ideias que foram referidos tanto por alunos como por professores. Dois dos

professores sentiram falta de confiança e de preparação para a

organização/gestão de discussões, provavelmente, por falta de prática na

realização de actividades de discussão. Curiosamente, foram os seus alunos que

emitiram a quase totalidade dos comentários negativos relativos às actividades de

discussão.

Este estudo revelou, ainda, a importância da disponibilização de informação

adequada e diversificada sobre o tema em discussão, capaz de ajudar os alunos e

129
os professores a considerarem, explorarem e aprofundarem diferentes

perspectivas e vivências. A apresentação de documentários em videograma ou a

realização de seminários, centrados nas potencialidades e nos perigos dos novos

avanços na área da Biotecnologia e da Genética, que incluam testemunhos reais

de cientistas e de cidadãos comuns, poderão estimular a interacção e fornecer

informação relevante.

Neste estudo foi nítido o papel decisivo do confronto inter e intrapessoal de

ideias — conflito sócio-cognitivo — no desenvolvimento cognitivo, social e afectivo

e na apropriação de saberes. A existência de perspectivas diferentes entre os

participantes traduziu-se no aparecimento de respostas diferentes, o que


desencadeou um desequilíbrio duplo: um desequilíbrio interpessoal momentâneo,

pelo facto das respostas apresentadas serem diferentes, e um desequilíbrio

intrapessoal pela tomada de consciência individual da existência de outras

respostas, o que suscitou dúvidas sobre a sua própria resposta. Para

ultrapassarem este impasse os alunos tiveram que, simultaneamente, analisar os

pontos de vista discordantes — com base na informação disponível sobre a

problemática em questão — e gerir as relações interpessoais dentro do grupo. Na

opinião de alunos e de professores, este confronto de ideias facilitou a troca de

informações, o esclarecimento de dúvidas, a construção de conhecimento sobre os

temas em discussão e a modificação do raciocínio original através da descoberta

de eventuais inconsistências lógicas. Permitiu, também, a discussão das questões

éticas associadas a estes temas e a consequente avaliação/reformulação de

opiniões e de crenças. O clima de diálogo e de compreensão estabelecido durante

as sessões de discussão traduziu-se numa melhoria significativa das relações

entre os diferentes intervenientes — alunos e professores — e,

consequentemente, do ambiente da sala de aula. Todos estes resultados realçam

a importância da discussão em grupo onde o desconhecimento e o teor

controverso do tema, associados a uma metodologia pouco usual, parecem ter sido

130
os principais responsáveis pela quantidade e qualidade da interacção

estabelecida.

Deste modo, este estudo apoia as opiniões de Doise, Mugny e

Perret-Clermont (1975), Mugny e Doise (1978) e Perret-Clermont (1979)

relativamente à importância do conflito sócio-cognitivo no desenvolvimento

cognitivo e sócio-afectivo dos alunos e realça as potencialidades de actividades

pouco habituais na estimulação destes conflitos. À semelhança de outras

investigações (Carraher, Carraher e Schliemann, 1989; César, 1994; Perret-

Clermont e Nicolet, 1988), este trabalho evidenciou a importância de factores de

tipo psico-social no desempenho dos alunos; a quantidade e a qualidade da


interacção social despoletada pelo tema e pela discussão em grupo poderá

explicar alguns dos resultados obtidos. A invulgaridade tanto do tema como da

metodologia motivou os alunos e estimulou o conflito sócio-cognitivo. Alunos que

se destacavam por não participarem minimamente nas actividades escolares

envolveram-se activamente nos debates.

Outro aspecto significativo das actividades de discussão parece ter sido a

sua contribuição na educação para a cidadania e na promoção da literacia

científica. Como se pode constatar pelas variações de opinião dos alunos,

detectadas durante o estudo, as actividades de discussão realizadas reforçaram o

seguinte:

1. A associação entre bem estar social e o crescimento científico e

tecnológico, em geral, e o desenvolvimento da tecnologia genética, em

particular.

2. O medo de uma eventual manipulação do código genético.

3. A esperança nas aplicações da engenharia genética.

4. As opiniões favoráveis ao melhoramento genético das espécies animais.

131
5. A indecisão relativamente à utilização da engenharia genética no

melhoramento de espécies animais, em geral, e da espécie humana, em

particular.

6. As opiniões discordantes da utilização de diagnósticos genéticos por

companhias de seguros ou empregadores.

7. A opinião de que todo o cidadão pode e deve intervir na tomada de

decisões na área da Biotecnologia.

8. A necessidade da Assembleia da República publicar legislação que

imponha restrições à investigação científica.

Pode afirmar-se que a discussão das potencialidades e dos perigos de


algumas inovações na área da Biotecnologia contribuiu para a construção de uma

imagem mais humana da Ciência e da Tecnologia, baseada na compreensão das

suas interacções com a Sociedade e na avaliação das possibilidades como

factores de desenvolvimento. Uma imagem caracterizada, simultaneamente, pelo

bem estar social e pela controvérsia resultantes das aplicações da Biotecnologia.

Constatam-se, também, algumas potencialidades destas actividades no

desenvolvimento da literacia científica tal como é definida pela American

Association for the Advancement of Science (1989) ou por Shamos (1995). Estas

potencialidades foram evidenciadas por alguns progressos:

1. Na tomada de consciência da dependência entre Ciência e Tecnologia;

no conhecimento da Ciência e da Tecnologia como empreendimentos

humanos com aspectos positivos e limitações; e na utilização de

conhecimentos científicos e de formas de pensamento para fins sociais

(American Association for the Advancement of Science, 1989).

2. No conhecimento do funcionamento da Ciência e da Tecnologia; no

conhecimento público do que é a Ciência, mesmo que se conheça pouco

de Ciência; na compreensão pública do que se pode esperar da Ciência;

132
e no conhecimento de como a opinião pública relativa à Ciência poderá

ser ouvida de forma mais eficaz (Shamos, 1995).

O conhecimento, a análise e a discussão das relações entre Ciência,

Tecnologia e Sociedade parecem ter-se revelado úteis no aumento da literacia

científica, na promoção do interesse dos alunos por questões científicas e

tecnológicas e respectivas interacções com a Sociedade e na promoção do

pensamento, tal como defendem os autores do designado movimento CTS —

Ciência, Tecnologia e Sociedade (Aikenhead, 1994).

133
134
CAPÍTULO 5
CONSIDERAÇÕES FINAIS, EXTENSÃO E
DESENVOLVIMENTO

Este estudo permitiu captar algumas observações informais dignas de

destaque: o potencial motivador das actividades utilizadas; a quantidade e a

qualidade das interacções estabelecidas; o interesse e o envolvimento de

professores e alunos no trabalho desenvolvido; e a preocupação dos professores

em motivarem os alunos e em solucionarem os problemas de insucesso com que

deparam diariamente.

As actividades realizadas revelaram-se extremamente motivadoras e

eficazes na estimulação de interacções sociais na sala de aula. Foi evidente o

aspecto formativo das actividades de discussão na construção e compreensão de

conhecimentos relevantes para a vida — sobre os novos avanços na área da

Biotecnologia e da Genética e as suas inter-relações com a Sociedade — e na

estruturação e desenvolvimento do pensamento. A chave deste progresso residiu

no conflito sócio-cognitivo estabelecido entre os diferentes elementos dos grupos

de trabalho, ou seja, no confronto interpessoal e intrapessoal de ideias. A análise

conjunta dos diversos pontos de vista facilitou a troca de informações, o

esclarecimento de dúvidas, a construção de conhecimento sobre os temas em

discussão e a modificação do raciocínio original através da descoberta de

eventuais inconsistências lógicas. Permitiu, também, a discussão das questões

135
éticas associadas a esses temas e a consequente avaliação/reformulação de

opiniões e de crenças. Estes resultados sugerem novas questões, passíveis de

aprofundamento em investigações futuras. Assim, seria interessante avaliar, de

forma aprofundada, o impacto destas actividades de discussão no

desenvolvimento de competências cognitivas e no desenvolvimento moral dos

alunos.

O catalisador de todo este processo foi o teor controverso do tema

associado à possibilidade de ser discutido na sala de aula por alunos e

professores, num clima de respeito pelos valores individuais e de valorização das

diferentes opiniões. Constatou-se o enorme potencial da discussão de assuntos


controversos na motivação dos alunos e na estimulação do pensamento e da

interacção social: um potencial digno de ser explorado na sala de aula. Portanto,

parece poder afirmar-se que o pensamento de qualquer indivíduo é

prioritariamente determinado por factores motivacionais e não por capacidades

intelectuais específicas. Para os alunos envolvidos neste estudo, a disposição, ou

a falta de disposição, para pensar sobre determinado assunto foi função do

interesse do mesmo, da metodologia proposta e do comportamento das pessoas à

sua volta — o reconhecimento do nosso direito a pensar e a exprimir pensamentos

individuais.

A eficácia d’“Os Seis Chapéus do Raciocínio” na orientação e na

organização do pensamento, diminuindo a confusão e impedindo a negligência de

aspectos decisivos, foi salientada por muitos dos participantes. A qualidade do

pensamento parece poder ser melhorada através da utilização de instrumentos e

de estruturas orientadoras da atenção para determinados tipos de raciocínio. No

entanto, dificilmente se poderá distinguir se esta eficácia terá resultado d’“Os Seis

Chapéus do Raciocínio” ou das interacções e das aprendizagens efectuadas entre

os alunos durante as discussões. Futuramente, seria interessante responder a esta

questão através da comparação da eficácia das actividades de discussão,

136
realizadas com e sem “Os Seis Chapéus do Raciocínio”, na promoção de

competências de pensamento. Por enquanto, ao certo, este estudo revelou

opiniões positivas de muitos dos participantes, tanto em relação à metodologia

como ao seu efeito na capacidade de pensar.

Outro resultado visível das actividades de discussão foi, sem dúvida, o

aprofundamento e o melhoramento das relações entre os participantes. O clima de

respeito estabelecido, o desempenho do professor assegurando a exploração

adequada do tema e a equidade durante a discussão e o papel de destaque

atribuído aos alunos na gestão das relações interpessoais dentro do grupo,

constituiram factores decisivos no aperfeiçoamento das relações entre os


intervenientes.

Todos estas evidências realçam a importância da discussão de assuntos

controversos e da interacção social no desenvolvimento cognitivo e sócio-afectivo

dos indivíduos.

Este estudo revelou, também, o papel decisivo da disponibilização de

informação relevante e diversificada sobre o assunto em discussão na estimulação

da interacção e na exploração e aprofundamento de diferentes perspectivas e

vivências. A apresentação de documentários em videograma ou a realização de

seminários, com testemunhos reais, parecem ser as fontes de informação

preferidas pelos alunos.

Esta investigação salientou, ainda, a relevância de factores de tipo

psico-social no desempenho dos alunos: o tema e a metodologia das actividades

influenciaram significativamente os resultados. A controvérsia do tema e a

invulgaridade da metodologia revelaram-se decisivas, não só na motivação de

alunos tradicionalmente desmotivados e desinteressados mas também na

estimulação de confrontos sócio-cognitivos. Portanto, este trabalho realça a

importância da construção de actividades pouco habituais em contexto de sala de

aula e capazes de envolverem os conteúdos e as competências abordados nesse

137
mesmo contexto. Provavelmente, e tal como defende Perret-Clermont (1992), o

desafio educacional consiste em conceber actividades capazes de,

simultaneamente, motivar os alunos e estimular o confronto sócio-cognitivo.

Estas actividades revelaram potencialidades importantes no

desenvolvimento da literacia científica e na educação para uma cidadania moderna

e democrática, baseada na compreensão de questões sociais, económicas e

tecnológicas da Sociedade actual e na promoção do pensamento. A discussão das

potencialidades e dos perigos de algumas inovações na área da Biotecnologia

contribuiu para a construção de uma imagem mais real da Ciência e da Tecnologia,

baseada na compreensão das suas interacções com a Sociedade e na avaliação


das possibilidades como factores de desenvolvimento. Esta imagem é

caracterizada, simultaneamente, pelo bem estar social e pela controvérsia

resultantes das aplicações da Biotecnologia. Seria interessante verificar se esta

imagem ainda se mantem quando os alunos acabarem a sua escolaridade.

Os resultados deste estudo são aplicáveis ao nível da formação inicial e

contínua de professores de Ciências, constituindo fontes estimulantes de reflexão

sobre algumas teorias normalmente discutidas nessas situações. A realização e a

discussão de actividades deste tipo, em contextos de formação inicial e contínua

de professores, poderá levar à sua maior utilização na sala de aula. A reflexão

sobre a estratégia a adoptar e o papel a desempenhar durante a discussão de

assuntos controversos poderá eliminar algumas das inseguranças sentidas pelos

professores na dinamização de aulas de debate.

As actividades construídas para a presente investigação têm, ainda, a

vantagem de poderem ser utilizadas, na prática pedagógica, por professores de

diferentes áreas disciplinares. De facto, é possível desenvolver outras actividades

de discussão de assuntos controversos adequadas aos conteúdos programáticos

de várias disciplinas. Assim, justificam-se trabalhos futuros que identifiquem, nos

138
diferentes programas, assuntos controversos motivadores e estimuladores da

interacção social na sala de aula.

Este estudo, à semelhança de uma investigação recente realizada por Lobo

(Lobo e Gomes, 1997), mostrou que os alunos valorizam bastante as actividades e os

professores que lhes permitem participar activamente nas aulas, através da

discussão/debate de problemas actuais que consideram relevantes para a sua vida.

Futuramente, seria interessante identificar que características dos professores

estimulam a interacção e a aprendizagem na sala de aula.

Temas como os novos avanços na Genética e na Biotecnologia revelam-se

extremamente úteis a um estilo de ensino/aprendizagem inovador, centrado nas


interacções sociais na sala de aula e pautado pela reflexão e pela avaliação crítica

das relações entre Ciência, Tecnologia e Sociedade. A sua discussão contribui

para a educação de indivíduos capazes de enfrentarem e ultrapassarem os pequenos

e os grandes desafios das suas existências individuais e colectivas, num clima de

interacção e cooperação efectivas. Constata-se não ser fácil implementar este tipo de

metodologia; no entanto, o caminho faz-se caminhando e é discutindo, de uma forma

reflexiva e responsável, que professores e alunos aprenderão a rentabilizar a

discussão como método de exploração e de potenciação de ideias e opiniões.

139
140
ANEXOS

141
142
ANEXO 1

Guião para entrevista semi-estruturada aos professores

143
144
GUIÃO PARA ENTREVISTA SEMI-ESTRUTURADA

Dia: ___/___/___ Hora: ____ Local: _______________

1- Chapéu Vermelho: Sentimentos, emoções, palpites e intuições relativamente ao tema


e à metodologia das actividades.
__________________________________________________________________
__________________________________________________________________
__________________________________________________________________
2- Chapéu Amarelo: Aspectos positivos, vantagens e benefícios do tema e da
metodologia das actividades de discussão realizadas.
__________________________________________________________________
__________________________________________________________________
__________________________________________________________________
3- Chapéu Preto: Aspectos negativos, fraquezas e problemas do tema e da metodologia
das actividades de discussão realizadas.
__________________________________________________________________
__________________________________________________________________
__________________________________________________________________
4- Chapéu Verde: Sugestões, novas ideias e alternativas capazes de melhorarem as
actividades realizadas.
__________________________________________________________________
__________________________________________________________________
__________________________________________________________________
5- Chapéu Azul: Avaliação geral das actividades de discussão realizadas.

__________________________________________________________________

__________________________________________________________________

__________________________________________________________________

145
146
ANEXO 2

Questionário para avaliação das actividades de discussão pelos alunos

147
148
AVALIAÇÃO DA ACTIVIDADE

NOME ___________________________________ TURMA ____ ANO ____

Com esta documento pretende-se avaliar a actividade de discussão e reflexão. Assim,


utilizando os seis chapéus do raciocínio, apresente as suas opiniões sobre a actividade
realizada (tema e metodologia utilizada).

Exemplo:

1- Chapéu Branco: Factos e informação.


Realização de uma actividade de reflexão e discussão em grupo, sobre
Biotecnologia._______________________________________________________

2- Chapéu Vermelho: Emoções, sentimentos. Quais são os seus sentimentos


relativamente a esta actividade?
__________________________________________________________________
__________________________________________________________________
__________________________________________________________________
__________________________________________________________________
__________________________________________________________________
__________________________________________________________________

3- Chapéu Amarelo: Vantagens, benefícios. Quais são os aspectos positivos da


actividade realizada?
__________________________________________________________________
__________________________________________________________________
__________________________________________________________________
__________________________________________________________________

149
4- Chapéu Preto: Fraquezas, problemas, perigos. Quais são os aspectos
negativos da actividade realizada?
__________________________________________________________________
__________________________________________________________________
__________________________________________________________________
__________________________________________________________________
__________________________________________________________________
__________________________________________________________________

5- Chapéu Verde: Sugestões, novas ideias, ideias construtivas. Sugira formas de


melhorar a actividade realizada.
__________________________________________________________________
__________________________________________________________________
__________________________________________________________________
__________________________________________________________________
__________________________________________________________________
__________________________________________________________________

6- Chapéu Azul: Avaliação, raciocinar sobre o pensamento. Tendo em conta tudo


o que atrás referiu, efectue uma avaliação global da actividade realizada.
__________________________________________________________________
__________________________________________________________________
__________________________________________________________________
__________________________________________________________________
__________________________________________________________________
__________________________________________________________________
__________________________________________________________________
__________________________________________________________________

150
ANEXO 3

Questionário para levantamento das opiniões dos alunos sobre Biotecnologia

151
152
Opiniões sobre Biotecnologia

NOME: ____________________________________ TURMA: _____ ANO: _____

INSTRUÇÕES: Este instrumento é constituído por várias afirmações sobre biotecnologia.


Após teres escrito o teu nome, turma e ano, utiliza a seguinte escala para registares, com
um X, a tua opinião sincera relativamente a cada uma das afirmações.

ESCALA: CT = Concordo totalmente


C = Concordo
NC = Não tenho a certeza
D = Discordo
DT = Discordo totalmente

CT C NC D DT

1- O crescimento científico e tecnológico produz bem


estar social.

2- A investigação científica, na área da biotecnologia,


não deve estar sujeita a qualquer tipo de restrição ou de
controlo; deve existir total liberdade de investigação.

3- Os pais devem optar pelo aborto terapêutico sempre


que saibam, através de testes de diagnóstico pré-natal,
que o feto apresenta alguma deformação ou mutação
genética.

4- A engenharia genética deve ser utilizada no


melhoramento da espécie humana.

5- Nenhum recém-nascido deveria ser reconhecido


como ser humano antes de ser aprovado em testes de
dotação genética (análise do património genético); os
reprovados deveriam perder o direito à vida.

6- Cada um de nós pode influenciar as decisões que os


órgãos de poder tomam na área da biotecnologia.

7- A engenharia genética provoca medo.

8- A engenharia genética deve ser utilizada no


melhoramento de espécies animais.

9- A possibilidade de manipulação do código genético é


tão perigosa quanto as armas nucleares.

10- A tecnologia genética melhora as condições de vida


da população.

153
CT C NC D DT

11- Toda a população deve estar informada sobre os


limites e as potencialidades da biotecnologia.

12- A Assembleia da República deve criar legislação


que controle a investigação científica na área da
biotecnologia.

13- A limitação à liberdade de investigação


compromete eventuais descobertas úteis à humanidade

14- A engenharia genética provoca esperança.

15- Toda a população deve ser consultada


relativamente às decisões a tomar na área da
investigação e, particularmente, da tecnologia genética.

16- A engenharia genética deve ser utilizada no


melhoramento de espécies vegetais.

17- A Escola deve proporcionar espaços de discussão


sobre o impacto da biotecnologia na Sociedade.

18- As companhias de seguros têm o direito de


conhecer o património genético das pessoas que
pretendam seguros de vida, de forma a poderem
recusar os candidatos cuja probabilidade de virem a
desenvolver doenças de origem genética seja elevada.

19- Perante um feto em que se detectou uma doença


genética grave, e se os pais optarem por ter esse filho,
o Estado deve obrigá-los a suportar sozinhos as
despesas médicas resultantes.

20- Os indivíduos que apresentam doenças genéticas


causadoras de deficiência mental ou de deformações
devem ser impedidos de transmitir essas características
aos seus descendentes ou seja, devem ser impedidos
de ter filhos.

21- Cada um de nós deve influenciar as decisões que


os órgãos de poder tomam na área da biotecnologia.

22- Qualquer pessoa deve fazer exames genéticos para


averiguar a possibilidade de ser portadora de genes
responsáveis por doenças.

154
ANEXO 4

Guião de observação das actividades de discussão

155
156
INSTRUMENTO DE REGISTO DE OBSERVAÇÕES

Dia: ___/___/___ Hora: ____ Local: _______________

1- Chapéu Branco: Factos e informações sobre a implementação das actividades.


__________________________________________________________________
__________________________________________________________________
__________________________________________________________________
__________________________________________________________________
__________________________________________________________________
__________________________________________________________________
__________________________________________________________________

2- Chapéu Vermelho: Emoções e sentimentos relativamente às actividades.


__________________________________________________________________
__________________________________________________________________
__________________________________________________________________
__________________________________________________________________
__________________________________________________________________
__________________________________________________________________
__________________________________________________________________

3- Chapéu Amarelo: Afirmações ou comportamentos que evidenciem aspectos positivos


das actividades realizadas.
__________________________________________________________________
__________________________________________________________________
__________________________________________________________________
__________________________________________________________________
__________________________________________________________________
__________________________________________________________________
__________________________________________________________________

157
4- Chapéu Preto: Afirmações ou comportamentos que evidenciem fraquezas, problemas
ou aspectos negativos das actividades realizadas.
__________________________________________________________________
__________________________________________________________________
__________________________________________________________________
__________________________________________________________________
__________________________________________________________________
__________________________________________________________________
__________________________________________________________________

5- Chapéu Verde: Afirmações ou comportamentos que sugiram novas ideias capazes de


melhorar as actividades realizadas.
__________________________________________________________________
__________________________________________________________________
__________________________________________________________________
__________________________________________________________________
__________________________________________________________________
__________________________________________________________________
__________________________________________________________________

6- Chapéu Azul: Avaliação geral da forma como decorre a actividade realizada.


__________________________________________________________________
__________________________________________________________________
__________________________________________________________________
__________________________________________________________________
__________________________________________________________________
__________________________________________________________________
__________________________________________________________________

158
ANEXO 5

Material informativo distribuído pelos alunos

(informações relativas à metodologia e aos temas em discussão)

159
160
ACTIVIDADES DE REFLEXÃO E DISCUSSÃO SOBRE TEMAS DE
BIOTECNOLOGIA

METODOLOGIA

As actividades de reflexão e discussão sobre temas de Biotecnologia serão


realizadas de acordo com o método “Os Seis Chapéus do Raciocínio” proposto por
Edward de Bono (1995). As cores diferentes dos chapéus correspondem a
diferentes tipos de raciocínio:
Chapéu Branco: Factos, números e informação. Que informações temos?
Que informações precisamos obter?
Chapéu Vermelho: Emoções, sentimentos, palpites e intuições. Que
pensamos desta questão?
Chapéu Amarelo: Vantagens, benefícios, poupanças. Porquê fazer? Quais
são os benefícios? Qual a é vantagem de o fazer?
Chapéu Preto: Precaução. Verdade, avaliação, encaixe dos factos. Aponta
as fraquezas, os problemas, os perigos de uma ideia. Isto encaixa-se nos factos?
Resulta? É seguro? É praticável?
Chapéu Verde: Exploração, sugestões, novas ideias. Ideias construtivas.
Alternativas à acção. Transferência. Que podemos fazer aqui? Há outras ideias
diferentes?
Chapéu Azul: Raciocinar sobre o pensamento. Controlo do processo do
raciocínio. Avaliação do ponto em que nos encontramos. Estabelecer o novo passo
do raciocínio. Estabelecer o programa do raciocínio.
As actividades a executar durante as aulas decorrerão segundo uma
sequência de chapéus pré-determinada que os alunos colocarão um após o outro
(guião do raciocínio).

161
GENÉTICA E BIOTECNOLOGIA

É graças ao conhecimento que o homem muda o mundo, e que se


transformará a si próprio. No futuro, o homem não será o mesmo. O que seremos
amanhã, é hoje que o forjamos, por meio dos avanços da ciência e da técnica;
avanços esses que possuem duas faces — uma certamente útil, a outra um tanto
ou quanto inquietante.
Decorreram quarenta anos desde a descoberta de estrutura do ADN (ácido
desoxirribonucleico — material genético) por Watson e Crick. Desde então, a sua
descoberta tem sido o catalizador de toda uma revolução na nossa compreensão
de como os genes operam.
Actualmente, a Genética e a Biotecnologia têm um impacto enorme na vida
de todas as pessoas. As suas aplicações na medicina, na agricultura e na indústria
têm inúmeras implicações sociais, sendo imprevisíveis e incalculáveis as suas
influências nos sistemas ecológicos e nas próximas gerações de todos os seres
vivos, incluindo o Homem. A Biotecnologia confere aos cientistas o poder de
alterarem as células vivas como bem entenderem.
Muitas das decisões a serem tomadas nesta área dizem respeito às
gerações futuras. Torna-se, portanto, vital que o conhecimento, a discussão e a
compreensão deste assunto constituam parte integrante do currículo de todos os
alunos.

ENGENHARIA GENÉTICA

A designação “engenharia genética” aplica-se a quatro operações


diferentes:
1- Preparação da transferência do material genético (gene) para a célula
que se pretende alterar. Normalmente, o meio de transporte (vector) destes genes
é um vírus. A introdução do gene no património genético do vírus resulta na
formação de uma quimera molecular (um “novo” vírus).

162
2- Transferência da quimera molecular (vírus + “gene estranho”) para a
célula receptora.
3- Expressão (activação) do gene introduzido na célula receptora.
4- Transformação completa do indivíduo por integração do gene estranho no
óvulo fecundado (apenas no caso dos seres pluricelulares).
Esta última operação pode provocar alterações consideráveis do património
genético. Por exemplo, a injecção, num óvulo fecundado de qualquer animal, de
um gene capaz de desencadear a produção de hormonas de crescimento, permite
obter animais de tamanho superior à média.
A engenharia genética provoca, ao mesmo tempo, medo e esperança: o
medo de uma manipulação abusiva, num futuro imprevisível, do património
genético do homem por ditadores e por oligarquias sem escrúpulos. Outro receio,
este mais próximo, está relacionado com a criação eventual, resultante de
manipulações perigosas, voluntárias ou não, dos novos germes de doenças contra
as quais a espécie humana não tem defesas naturais ou de “novos” seres vivos
que se multipliquem de forma incontrolada e devastadora nos ecossistemas do
nosso planeta.
A esperança, a longo prazo, está ligada à possibilidade de melhorar certas
carências do homem, ao passo que a um prazo mais curto trata-se de curar mais
de 2000 doenças de origem genética. Se algumas destas doenças podem ser
tratadas, a cura só pode vir da possibilidade de corrigir a estrutura do ADN
responsável pela doença, ou injectando um gene adequado nas células
deficientes. Além disso, a engenharia genética pode encontrar aplicações muito
férteis na agricultura e na zootecnia. Durante séculos, os agricultores têm-se
debatido com doenças e pestes das plantas, solos inférteis e a necessidade de
produzir cada vez mais para satisfazerem as necessidades alimentares de uma
população mundial cada vez maior. A engenharia genética, através da inclusão de
genes responsáveis pela produção de determinadas enzimas, oferece uma nova
esperança ao tornar possível a produção de plantas resistentes quer a ambientes
adversos, quer à acção nefasta de insectos, bactérias e fungos. A produtividade
também pode ser aumentada através da selecção artificial das dimensões de
raízes, sementes e frutos. Além disso, o teor nutritivo dos alimentos pode ser

163
aumentado através da indução de alterações na sua variedade de aminoácidos
essenciais. Encontramo-nos, portanto, à beira de uma revolução genética agrícola.
No entanto, sabe-se que a quantidade de cereais produzida actualmente é
suficiente para alimentar todos os habitantes do nosso planeta, e que a fome
resulta de uma distribuição e de uma utilização deficientes dos alimentos.
Nos últimos anos, os progressos na biotecnologia permitiram a criação,
através de engenharia genética, de estirpes especiais de bactérias ou fungos
portadoras de genes específicos de outros organismos completamente diferentes,
tais como seres humanos. Estes micróbios produzem compostos úteis, como a
insulina humana, as hormonas de crescimento humanas e o agente antiviral
(provavelmente anticancerígeno) denominado interferon, ou compostos
extremamente perigosos como a toxina do botulismo.

EUGENIA

Um primo de Charles Darwin, chamado Francis Galton, também cientista de


renome, fundou uma teoria acerca da eugenia, propondo o melhoramento da
espécie humana segundo os métodos praticados na selecção artificial das plantas
cultivadas e dos animais domésticos.
A eugenia encara a selecção artificial de duas maneiras: favorecendo a
reprodução dos indivíduos portadores dos genes favoráveis (a eugenia positiva;
por exemplo, a criação do banco de esperma dos Prémios Nobel dos EUA), ou
afastando da reprodução os que possuem genes desfavoráveis (a eugenia
negativa; por exemplo, o aborto voluntário em caso de doença do feto).
Desacreditada por uma aplicação abusiva e criminosa feita pelos nazis, a eugenia,
actualizada com eventuais manipulações genéticas, deve ser submetida, com as
suas sombras e claridades, a uma verdadeira análise crítica.

DIAGNÓSTICO DE ALTERAÇÕES GENÉTICAS

164
Uma das consequências da investigação dos genes responsáveis por
doenças humanas tem sido o desenvolvimento de técnicas de diagnóstico de
alterações genéticas. É hoje possível detectar estas anomalias antes ou depois do
nascimento através de, respectivamente, amniocentese ou de uma simples análise
ao sangue. Estas técnicas têm sido saudadas como "milagres" da medicina
moderna. Considere-se, por exemplo, a quantidade de pessoas que, sendo
portadoras dos alelos recessivos da Fenilcetonuria, têm sido salvas de atrasos
mentais graves. Esta doença, resultante da acumulação de um derivado da
fenilalanina (aminoácido) nas células do cérebro, pode ser diagnosticada
facilmente após o nascimento e evitada através de uma dieta. No entanto, estes
avanços recentes, têm levantado sérios problemas éticos e psicológicos.
Torna-se evidente que os testes de diagnóstico baseados em análises ao
ADN levantam novas questões de difícil resposta. Os maiores problemas resultam
do facto destes testes detectarem a presença ou a possibilidade de doenças para
as quais não existe cura. Nestas circunstâncias existem pessoas que se inclinam
para a sua não utilização.
Actualmente, a análise do património genético permite que o foco da
medicina e dos serviços de saúde se torne a detecção de tendências para
desenvolver determinadas doenças em vez do diagnóstico das doenças actuais
dos indivíduos. Assim, corre-se o risco de que pessoas que não apresentam
qualquer sintoma de doença possam ser classificadas de deficientes e
discriminadas por companhias de seguros de vida. Potenciais empregadores
poderão recusar empregos a estes indivíduos por não quererem arriscar eventuais
despesas médicas nem quererem gastar tempo e dinheiro a treinar um empregado
com uma esperança de vida limitada. Todos estes problemas agravam-se quando
a análise genética não consegue prever com certeza absoluta se determinado
indivíduo irá desenvolver determinada doença, o que acontece com doenças
multifactoriais, como o cancro, as doenças cardíacas, a esquizofrenia, que
resultam de uma intricada interacção entre genes e factores ambientais.
Exemplos de alterações genéticas passíveis de serem diagnosticadas:
Fibrose Quística - Esta doença hereditária provoca alterações no transporte
de cloro e, portanto, no transporte de água dentro do organismo, alterações essas

165
que se traduzem num espessamento das secreções humanas. Este espessamento
dificulta a eliminação do mucus das vias respiratórias. A sua acumulação provoca
doenças pulmonares crónicas, incluindo infecções potencialmente fatais. Até há
poucos anos, os portadores dos dois genes autossómicos recessivos morriam por
volta dos 5 anos de idade; actualmente, a utilização de antibióticos e de certas
terapias de descongestionamento das vias respiratórias permite-lhes alcançar a
vida adulta. Actualmente, existem testes de diagnóstico genético capazes de
detectarem 90% dos genes anormais causadores desta doença.

Doença de Huntington - Esta doença hereditária traduz-se numa


degeneração neurológica progressiva que só se manifesta entre os 35 e os 50

anos de idade. Nessa altura, os portadores desta alteração genética começam a

apresentar movimentos musculares involuntários, perda de memória, depressão e

comportamento irracional. A doença progride, irremediavelmente, até à loucura,

perda de controlo motor e, finalmente, morte. Apresenta uma incidência de 1 em

cada 2500 seres humanos. Actualmente, existem testes de diagnóstico genético

capazes de indicarem se uma pessoa apresenta, ou não, grandes possibilidades

de desenvolver a doença.

166
167
168
ANEXO 6

Actividades de discussão utilizadas no estudo

169
170
ACTIVIDADE 1: Discussão e reflexão em grupo
TEMA: Rastreio Genético
DURAÇÃO: 2 x 50 Minutos
Introdução + Formação de grupos: 15 min.;
Leitura da ficha: 5 min.;
Cada chapéu: 5 min. máx.;
Apresentação de conclusões e discussão: 50 min.

“Os testes genéticos realizados para efeitos de contratação de pessoas e de


seguros de vida e saúde deverão ser banidos em quase toda a Europa dentro de
alguns anos, nos termos de um tratado em preparação no âmbito do Conselho da
Europa.” (Público, 13/8/94)
Apresente uma opinião fundamentada sobre a medida descrita neste artigo.

Sequência de chapéus a utilizar durante a reflexão e a discussão do


tema:
1º- Chapéu vermelho - Para descobrir os sentimentos existentes sobre o
assunto.
2º- Chapéu amarelo - Para identificar aspectos positivos de tal medida.
3º- Chapéu preto - Para avaliar os pontos negativos da medida descrita.
4º- Chapéu azul - Para resumir e obter conclusões.

171
ACTIVIDADE 2: Discussão e reflexão em grupo
TEMA: Eugenia
DURAÇÃO: 2 x 50 Minutos
Introdução + Formação de grupos: 15 min.;
Leitura da ficha: 5 min.;
Cada chapéu: 5 min. máx.;
Apresentação de conclusões e discussão: 50 min.

"Nenhum recém-nascido deveria ser reconhecido como ser humano antes


de ser aprovado em testes de dotação genética; os reprovados deveriam perder o
direito à vida." Apresente uma opinião fundamentada sobre esta afirmação de
Francis Crick, Prémio Nobel da Medicina pela descoberta do A.D.N..

Sequência de chapéus a utilizar durante a reflexão e a discussão do


tema:
1º- Chapéu vermelho - Para descobrir os sentimentos existentes sobre o
assunto.
2º- Chapéu amarelo - Para identificar aspectos positivos.
3º- Chapéu preto - Para avaliar as fraquezas e os perigos de cada escolha.
4º- Chapéu azul - Para resumir e obter conclusões.

172
ACTIVIDADE 3: Discussão e reflexão em grupo
TEMA: Rastreio Genético
DURAÇÃO: 2 x 50 Minutos
Introdução + Formação de grupos: 15 min.;
Leitura da ficha: 5 min.;
Cada chapéu: 5 min. máx.;
Apresentação de conclusões e discussão: 50 min.

Suponha que descobre que possui, bem como a pessoa com quem deseja
casar e ter filhos, uma alteração genética responsável pela fibrose quística. Logo,
a probabilidade de terem filhos doentes seria de 25%. O que faria?

Sequência de chapéus a utilizar durante a reflexão e a discussão do


tema:
1º- Chapéu vermelho - Para descobrir os sentimentos existentes sobre o
assunto.
2º- Chapéu branco - Para recolher a informação sobre o assunto.
3º- Chapéu verde - Para desenvolver as alternativas mais capazes.
4º- Chapéu amarelo - Para identificar aspectos positivos de cada escolha.
5º- Chapéu preto - Para avaliar as fraquezas e os perigos de cada escolha.
6º- Chapéu azul - Para resumir e obter conclusões.
7º- Chapéu vermelho - Para descobrir os sentimentos no resultado final.

173
ACTIVIDADE 4: Discussão e reflexão em grupo
TEMA: Engenharia Genética
DURAÇÃO: 2 x 50 Minutos
Introdução + Formação de grupos: 15 min.;
Leitura da ficha: 5 min.;
Cada chapéu: 5 min. máx.;
Apresentação de conclusões e discussão: 50 min.

Considerando que a engenharia genética torna possível a produção de


proteínas de animais ou de plantas (enzimas e hormonas, por exemplo) em
grandes quantidades, procure encontrar possíveis aplicações desta tecnologia na
medicina, na pecuária, na agricultura e nas indústrias alimentar e química.
Apresente aspectos positivos e aspectos negativos de cada uma dessas
hipotéticas aplicações.

Sequência de chapéus a utilizar durante a reflexão e a discussão do


tema:
1º- Chapéu branco - Para recolher a informação sobre o assunto.
2º- Chapéu verde - Para obter o maior número de aplicações da tecnologia
referida.
3º- Chapéu amarelo - Para identificar aspectos positivos de cada uma das
aplicações sugeridas.
4º- Chapéu preto - Para avaliar as fraquezas e os perigos de cada uma das
aplicações sugeridas.
5º- Chapéu vermelho - Para recolher os sentimentos finais sobre o assunto.

174
ACTIVIDADE 5: Discussão e reflexão em grupo
TEMA: Engenharia Genética
DURAÇÃO: 2 x 50 Minutos
Introdução + Formação de grupos: 15 min.;
Leitura da ficha: 5 min.;
Cada chapéu: 5 min. máx.;
Apresentação de conclusões e discussão: 50 min.

Tendo em conta todas as inovações tecnológicas na área da biotecnologia


genética, tente prever como será o futuro da espécie humana.

Sequência de chapéus a utilizar durante a reflexão e a discussão do


tema:
1º- Chapéu vermelho - Para descobrir os sentimentos existentes sobre o
assunto.
2º- Chapéu branco - Para recolher a informação sobre o assunto.
3º- Chapéu verde - Para desenvolver o maior número de previsões.
4º- Chapéu vermelho - Para descobrir os sentimentos no resultado final.

175
176
REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS

Aikenhead, G. S. (1986). The content of STS education. STS Research Network


Missive, 2, 18-23.

Aikenhead, G. S. (1994). A review of research into the outcomes of STS teaching.


In K. Boersma, K. Kortland, & J. Van Trommel (Ed.), Proceedings of the 7th
IOSTE Symposium (pp. 13-24). Enschede, Netherlands: National Institute for
Curriculum.

Allen, V. L. (1976). Children as teachers. London: Academic Press.

AAAS, American Association for the Advancement of Science (1989). Science for
all Americans: project 2061. Washington, DC: Autor.

Archer, L. (1992). Questões éticas e sociais da análise do genoma humano. Acta


Médica Portuguesa, 5, pp. 139-145.

Archer, L. (1996). Bioética geral: fundamentos biológicos. In L. Archer, J. Biscaia, &


W. Osswald, Bioética (pp. 17-33). Lisboa: Editorial Verbo.

Archer, L., Biscaia, J., & Osswald, W. (Coord.) (1996). Bioética. Lisboa: Editorial
Verbo.

Aronson, E. (1978). The jigsaw classroom. Beverly Hills, CA: Sage.

Aronson, E., Blaney, N., Stephen, C., Sikes, J., & Snapp, M. (1978). The jigsaw
classroom. Beverly Hills, CA: Sage.

Assembleia da República Portuguesa (1996). Constituição da República


Portuguesa. Porto: Legis Editora.

177
Barbosa, L. (1995). Trabalho e dinâmica dos pequenos grupos: ideias para
professores e formadores. Porto: Edições Afrontamento.

Barbour, I. G. (1992). Ethics in an age of technology, The Gifford Lectures 1989-


1991. London: SCM Press.

Barman, C. R., & Cooney, T. M. (1986). Science they care about. The Science
Teacher, 53, 23.

Barman, C. R., & Hendrix, J. R. (1983). Exploring bioethical issues: an instructional


model. The American Biology Teacher, 45, 24-31.

Berg, P., Baltimore, D., Brenner, S., Roblin III, R. O., & Singer, M. F. (1993).
Summary statement of the Asilomar conference on recombinant DNA
molecules. In R. E. Bulger, E. Heitman, & S. J. Reiser (Ed.), The ethical
dimensions of the biological sciences (pp. 263-269). Cambridge: Cambridge
University Press.

Bernal, J. D. (1946). Science teaching in general education. School Science


Review, 27, 150-158.

Bisanz, G. L., Bisanz, J., Korpan, C. A., & Zimmerman, C. (1996; August).
Assessing scientific literacy: questions students ask when evaluating news
reports about scientific research. Comunicação apresentada no 8th IOSTE
Symposium, Edmonton, Alberta, Canadá.

Bogdan, R., & Biklen, S. (1994). Investigação qualitativa em educação: uma


introdução à teoria e aos métodos. Porto: Porto editora.

Boone, C. K. (1995). Bad axioms in genetic enginnering. In J. H. Howell, & W. F.


Sale (Ed.), Life choices: a hastings center introduction to bioethics (pp. 514-
524). Washington, D. C.: Georgetown University Press

Booth, N. (1996, 27 de Janeiro). Manipulação genética ‘à la carte’. Expresso, 6.

Bridges, D. (1979). Education, democracy and discussion. Windsor: NFER


Publishing Company.

178
Brum, G., McKane, L., & Karp, G. (1994). Biology: Exploring Life. New York: John
Wiley, & Sons, Inc.

Buican, D. (1986). A Genética e a Evolução. Mem Martins: Publicações Europa-


América.

Burkimsher, M. (1993). Creating a climate for citizenship education in schools. In J.


Edwards, & K. Fogelman (Ed.), Developing citizenship in the curriculum (pp.
7-15). London: David Fulton.

Carraher, T., Carraher, D., & Schliemann, A. (1989). Na vida dez, na escola zero.
São Paulo: Cortez editora.

César, M. (1994). O papel da interacção entre pares na resolução de tarefas


matemáticas: trabalho em díade vs. trabalho individual em contexto escolar.
Tese de doutoramento não publicada, Universidade de Lisboa,
Departamento de Educação da Faculdade de Ciências, Lisboa.

Chadwick, R. F. (1992). Ethics, reproduction and genetic control. Londres:


Routledge.

Chito, B., & Caixinhas, R. (1993). A participação do público no processo de


avaliação do impacto ambiental. Revista Crítica de Ciências Sociais, 36, 27-
40.

Clarke, R. (1989). O homem mutante. Venda Nova: Bertrand Editora.

Cohen, L., & Manion, L. (1980). Research methods in education. London: Croom
Helm.

Cowie, H., & Rudduck, J. (1990). Learning through discussion. In N. Entwistle (Ed.),
Handbook of educational ideas and practices (pp. 803-812). Londres:
Routledge.

Cross, R. T., & Price, R. F. (1991). Towards teaching science for social
responsibility: an examination of flaws in science, technology and society.
Research in Science Education, 21, 47-54.

179
Cross, R. T., & Price, R. F. (1992). Teaching science for social responsibility.
Sydney: St Louis Press.

Cross, R. T., & Price, R. F. (1996). Science teachers’ social conscience and the
role of controversial issues in the teaching of science. Journal of Research in
Science Teaching, 33, 319-333.

Damon, W., & Phelps, E. (1989). Critical distinctions among three approaches to
peer education. International Journal of Educational Research, 13, 9-19.

De Boer, G. (1991). A History of ideas in science education-implications for practice.


New York: Columbia University, Teachers College Press.

de Bono, E (1976). Teaching thinking. Londres: Penguin Books.

de Bono, E (1983). The cognitive research trust (CoRT) thinking skills program. In
W. Maxwell, Thinking: the expanding frontier (pp. 125-128). Philadelphia,
PA.: The Franklin Institute Press.

de Bono, E (1985). Six thinking hats. London: Penguin Books.

de Bono, E. (1995). Ensine os seus filhos a pensar. Lisboa: Difusão Cultural.

Dearden, R. F. (1981). Controversial issues and the curriculum. Journal of


Curriculum Studies, 13, 37-44.

DeDecker, P. F. (1986). Biology and ethics: their role in education for the 80s and
beyond. The American Biology Teacher, 48, 285-292.

DeDecker, P. F. (1987). Teaching bioethical decision making in high school: a


lesson plan. The American Biology Teacher, 49, 428-432.

Denzin, N. K. (1970). The research act: a theoretical introduction to sociological


methods. Chicago, IL: Aldine.

Denzin, N. K., & Lincoln, Y. S. (Ed.) (1994). Handbook of qualitative research.


London: Sage Publications.

180
Deutsch, M. (1949). A theory of cooperation and competition. Human Relations, 2,
129-152.

Dewey, J. (1916). Democracy & education: an introduction to the philosophy of


education. New York: Macmillan.

Doise, W., & Mugny, G. (1981). Le dévelopment social de l’intelligence. Paris:


InterÉditions.

Doise, W., Mugny, G. & Perret-Clermont, A.-N. (1975). Social interaction and the
development of cognitive operations. European Journal of Social
Psychology, 5, 367-383.

Doise, W., Mugny, G. & Perret-Clermont, A.-N. (1976). Social interaction and
cognitive development: further evidence. European Journal of Social
Psychology, 6, 245-247.

Domingues, B. (1996). Dimensão pessoal da bioética: informação verdadeira,


liberdade e influências. In L. Archer, J. Biscaia, & W. Osswald, Bioética (pp.
70-77). Lisboa: Editorial Verbo.

Draper, E. (1992). Genetic testing in the workplace: competing paradigms of


technological advance. In D. Nelkin (Ed.), Controversy: politics of technical
decisions (pp. 147-176). London: Sage Publications.

Draper, E. (1995). Genetic secrets: social issues of medical screening in a genetic


age. In J. H. Howell & W. F. Sale (Ed.), Life choices: a hastings center
introduction to bioethics (pp. 506-513). Washington, DC: Georgetown
University Press.

Edwards, J. (1991a). The direct teaching of thinking skills. In G. Evans, Learning


and teaching cognitive skills (pp. 87-106). Victoria: Australian Council for
Educational Research.

Edwards, J. (1991b). Research work on the CoRT method. In S. MacLure & P.


Davies (Ed.), Learning to think: thinking to learn: the proceedings of the 1989

181
OECD conference organized by the centre for educational research and
innovation (pp. 19-30). Oxford: Pergamon Press.

Edwards, J., & Baldauf, R. B. Jr. (1987). The effects of the CoRT-1 thinking skills
program on students. In D. N. Perkins, J. Lockhead & J. Bishop (Eds.),
Thinking: the second international conference (pp. 453-473). Hillsdale, N. J.:
Lawrence Erlbaum.

Edwards, J., & Fogelman, K. (1993). Developing citizenship in the curriculum.


London: David Fulton.

Enciclopédia Luso-Brasileira de Cultura (1967). Volume 5. Lisboa: Editorial Verbo.

Entwistle, N. (Ed.) (1990). Handbook of educational ideas and practices. Londres:


Routledge.

ERT, Mesa Redonda dos Industriais Europeus (1995). Uma educação europeia: a
caminho de uma sociedade que aprende. Bruxelas: Autor.

European Commission, & Calouste Gulbenkian Foundation (1995). A white paper


on science education in europe (Preliminary draft for discussion). Lisbon:
Instituto de Prospectiva.

Evans, G. (Ed.) (1991). Learning and teaching cognitive skills. Victoria: Australian
Council for Educational Research.

Gall, M. D. (1985). Discussion methods of teaching. In T. Husen, & T. N.


Postlethwaite (Ed.), The international encyclopedia of education: research
and studies (pp. 1423-1427). Oxford: Pergamon.

Gardner, P. (1983). Another look at controversial issues and the curriculum. Journal
of Curriculum Studies, 16, 179-185.

Gartner, A., Kohler, M. C. & Riessman, F. (1971). Children teach children: learning
by teaching. New York: Harper and Row.

Gilly, M. (1985). Préface. In G. Mugny, Psychologie sociale du développment


cognitif. Bern: Peter Lang.

182
Gilly, M., Fraisse, J., & Roux, J.-P. (1988). Résolution de problèmes en dyades et
progrès cognitifs chez des enfant de 11 à 13 ans: dynamiques interactives et
socio-cognitives. In A.-N. Perret-Clermont e M. Nicolet (Eds.), Interagir et
connaître - enjeux et régulations sociales dans le développment cognitif (pp.
73-92). Fribourg: Del Val.

Goetz, J., & LeCompte, M. (1984). Ethnography and qualitative design in


educational research. New York: Academic Press.

Grisolía, S. (1992). Ethical and social aspects of the human genome project. Impact
of science on society, 161, 37-43.

Harrison, J. (1993). Citizenship and core and foundation subjects: science. In J.


Edwards & K. Fogelman (Eds.), Developing citizenship in the curriculum (pp.
47-50). London: David Fulton.

Henderson, J. (Ed.) (1987). Teaching strategies in biotechnology. Report of the


TRIST 13-18 project, University of Sheffield, Division of Education (USDE),
Publication 11.

Henderson, J., & Knutton, S. (1990). Biotechnology in schools: a handbook for


teachers. Buckingham: Open University Press.

Hooper, S., & Hannafin, M. (1988). Cooperative CBI: the effects of heterogeneous
versus homogeneous grouping on the learning of progressively complex
concepts. Journal of Educational Computing Research, 4, 413-424.

Hooper, S., & Hannafin, M. (1991). The effects of group composition on


achievement, interaction, and learning efficiency during computer-based
cooperative instruction. Educational Technology, Research and
Development, 39, 27-40.

Humphreys, B., Johnson, R. T., & Johnson, D. W. (1982). Effects of cooperative,


competitive and individualistic learning on students’ achievement in science
class. Journal of Research in Science Teaching, 19, 351-356.

183
Hunter-Grundin, E. (1985). Teaching thinking: an evaluation of Edward de Bono’s
classroom materials. London: Schools Council.

Hurd, P. D. (1993). Comment on science education research: a crisis of confidence.


Journal of Research in Science Teaching, 30, 1009-1011.

Hurd, P. D. (1994). New minds for a new age: prologue to modernizing the science
curriculum. Science Education, 78, 103-116.

Johnson, R., & Johnson, D. (1989). Cooperation and competition: theory and
research. Edina, MN: Interaction.

Johnson, R., Johnson, D., Scott, L., & Ramolae, B. (1985). Effects of single-sex and
mixed-sex cooperative interaction on science achievement and attitudes and
cross-handicap and cross-sex relationships. Journal of Research in Science
Teaching, 22, 207-220.

Kitcher, P. (1996). The lives to come: the genetic revolution and human possibilities.
London: Penguin Books.

Klopfer, L. E. (1985). Scientific literacy. In T. Husen, & T. N. Postlethwaite (Eds.),


The international encyclopedia of education: research and studies (pp. 4478-
4479). Oxford: Pergamon.

Lazarowitz, R., Hertz-Lazarowitz, R., & Baird, J. H. (1994). Learning science in a


cooperative setting: academic achievement and affective outcomes. Journal
of Research in Science Teaching, 31, 1121-1131.

Lemos Pires, E. (1987). Lei de Bases do Sistema Educativo: apresentação e


comentários. Porto: Asa.

Lobo, A. S., & Gomes, C. A. (1997). Diálogos sobre o vivido: Se os alunos


mandassem... Educação, Sociedade e Cultura, 7, 157-186.

Ludke, M., & André, M. (1986). Pesquisa em educação: abordagens qualitativas.


São Paulo: EPU.

184
Lumpe, A. T., & Staver, J. R. (1995). Peer collaboration and concept development:
learning about photosynthesis. Journal of Research in Science Teaching, 32,
71-98.

Lusk, A. B., & Weinberg, A. S. (1994). Discussing controversial topics in the


classroom: creating a context for learning. Teaching Sociology, 22, 301-308.

MacLure, S. (1991). Introduction: an overview. In S. MacLure & P. Davies, Learning


to think: thinking to learn: the proceedings of the 1989 OECD conference
organized by the centre for educational research and innovation (pp. ix-
xxviii). Oxford: Pergamon Press.

MacLure, S., & Davies, P. (Ed.) (1991). Learning to think: thinking to learn: the
proceedings of the 1989 OECD conference organized by the centre for
educational research and innovation. Oxford: Pergamon Press.

Mariano Gago, J. (1990). Manifesto para a ciência em Portugal. Lisboa: Gradiva.

Merriam, S. B. (1988). Case study research in education: a qualitative approach.


San Francisco: Jossey - Bass.

Miguéns, M., Serra, P., Simões, H., & Roldão, M. C. (1996). Dimensões formativas
de disciplinas do ensino básico: ciências da natureza. Lisboa: Instituto de
Inovação Educacional.

Millar, R. (1997). Science education for democracy: what can the school curriculum
achieve? In R. Levinson & J. Thomas (Eds.), Science today: problem or
crisis? (pp. 87-101). London: Routledge.

Ministério do Ambiente e Recursos Naturais (1993). Decreto-Lei nº 126/93 de 20


de Abril. Diário da República, I Série A, 92, 1922-1926.

Ministério da Educação (1991a). Programa de ciências da natureza (5º e 6º anos).


Lisboa: Autor.

Ministério da Educação (1991b). Programa de ciências naturais (7º e 8º anos).


Lisboa: Autor.

185
Ministério da Educação (1991c). Programa de ciências da terra e da vida (10º e 11º
anos). Lisboa: Autor.

Ministério da Educação (1991d). Programa de biologia (12º ano). Lisboa: Autor.

Ministérios da Saúde e do Ambiente e Recursos Naturais (1994). Portaria nº


602/94 de 13 de Julho. Diário da República, I Série B, 160, 3779-3784.

Morse, J. M. (1994). Designing funded qualitative research. In N. K. Denzin & Y. S.


Lincoln (Eds.), Handbook of qualitative research (pp. 220-235). London:
Sage Publications.

Mugny, G., & Doise, W. (1978). Socio-cognitive conflict and structure of individual
and collective performances. European Journal of Social Psychology, 8, 181-
182.

Nelkin, D. (Ed.) (1992). Controversy: politics of technical decisions. London: Sage


Publications.

Nolan, K. (1995). First fruits: genetic screening. In J. H. Howell & W. F. Sale (Eds.),
Life choices: a hastings center introduction to bioethics (pp. 495-505).
Washington, DC: Georgetown University Press.

Nossal, G. J. V., & Coppel, R. (1989). Reshaping life: key issues in genetic
engineering. Cambridge: Cambridge University Press.

Nunes, R. (1996). O diagnóstico pré-implantatório. In L. Archer, J. Biscaia, & W.


Osswald, Bioética (pp. 183-189). Lisboa: Editorial Verbo.

OCDE (1986). Recombinant DNA safety considerations. Paris: Autor.

Okebukola, P. A. O., & Ogunniyi, M. B. (1984). Cooperative, competitive and


individualistic laboratory interaction patterns: effects on students’
performance and acquisition of practical skills. Journal of Research in
Science Teaching, 21, 875-884.

Osswald, W. (1996). A experimentação no animal. In L. Archer, J. Biscaia, & W.


Osswald, Bioética (pp. 329-333). Lisboa: Editorial Verbo.

186
Penslar, R. L. (Ed.) (1995). Research ethics: cases and materials. Bloomington:
Indiana University Press.

Perret-Clermont, A.-N. (1976/78). Desenvolvimento da inteligência e interacção


social. Lisboa: Instituto Piaget. (Tradução da tese de doutoramento
defendida em 1976 na Universidade de Genebra).

Perret-Clermont, A.-N. (1979). La construction de l’intelligence dans l’interaction


sociale. Bern: Peter Lang.

Perret-Clermont, A.-N. (1992). Approaches in the social psychology of learning and


group work. In P. Stringer, Confronting social issues, Vol. 2 (pp. 97-122).
London: Academic Press.

Perret-Clermont, A.-N., & Mugny, G. (1985). En guise de conclusion: effets


sociologiques et processus didactique. In G. Mugny (Ed.), Psychologie
sociale du développment cognitif (pp. 251-261). Bern: Peter Lang.

Perret-Clermont, A.-N., & Nicolet, M. (1988). Interagir et connaître - enjeux et


régulations sociales dans le développment cognitif. Fribourg: Del Val.

Perret-Clermont, A.-N., Perret, J.-F. & Bell, N. (1991). The social construction of
meaning and cognitive activity in elementary school children. In L. B.
Resnick, J. M. Levine & S. D. Teasley (Eds.), Perspectives on socially shared
cognition (pp. 41-62). Washington, D.C.: American Psychological
Association.

Perret-Clermont, A.-N., & Schubauer-Leoni, M.-L. (1981). Conflict and cooperation


as opportunities for learning. In P. Robinson (Ed.), Communication in
development (pp. 203-233). London: Academic Press.

Phelps, E., & Damon, W. (1989). Problem solving with equals: peer collaboration as
a context for learning mathematics and spatial concepts. Journal of
Educational Psychology, 81, 639-646.

Pintassilgo, M. L. (1996). A bioética e os países em desenvolvimento. In L. Archer,


J. Biscaia, & W. Osswald, Bioética (pp. 122-130). Lisboa: Editorial Verbo.

187
Porter, G. (1986). What is science for? New Scientist, 112, 32-34.

Resnick, L. (1990). Instruction and the cultivation of thinking. In N. Entwistle,


Handbook of educational ideas and practices (pp. 694-707). London:
Routledge.

Royal Society (1980). Biotechnology. A report of Joint Working Party. Advisory


Council for Applied Research and Development. London: HMSO.

Rudduck, J. (Ed.)(1979). Learning to teach through discussion. University of East


Anglia: CARE Publications.

Rudduck, J. (1986). A strategy for handling controversial issues in the secondary


school. In J. J. Wellington, Controversial issues in the curriculum (pp. 6-18).
Oxford: Basil Blackwell.

Sánchez, M. C. (1989). Interacción entre iguales y desarrollo cognitivo. Tese de


doutoramento não publicada, Universidade de Salamanca, Departamento de
Psicologia da Faculdade de Filosofia e Ciências da Educação, Salamanca.

Santos, B. S. (1987). Um discurso sobre as ciências. Porto: Edições Afrontamento.

Shamos, M. H. (1995). The myth of scientific literacy. New Brunswick, NJ: Rutgers
University Press.

Sharan, S., & Hertz-Lazarowitz, R. (1980). A group investigation method of


cooperative learning in the classroom. In S. Sharan, P. Hare, C. Webb, & R.
Hertz-Lazarowitz, Cooperation in education (pp. 14-46). Provo, UT: Brigham
Young University Press.

Sharan, S., & Sharan, Y. (1984). Cooperative learning in the classroom: research in
desegregated schools. Hillsdale, NJ: Erlbaum.

Singer, P. (1993). Practical ethics. Cambridge: Cambridge University Press.

Slavin, R. E. (1980). Cooperative learning. Review of Education Research, 50, 315-


342.

188
Slavin, R. E. (1984). Students motivating students to excel: cooperative incentives,
cooperative tasks and student achievement. The Elementary School Journal,
85, 53-63.

Slavin, R. E. (1990). Cooperative learning: theory, research and practice.


Englewood Cliffs, NJ: Prentice-Hall.

Smith, F. (1990). Pensar. Lisboa: Instituto Piaget.

Solomon, J. (1991). Group discussions in the classroom. School Science Review,


72, 29-34.

Solomon, J. (1992). The classroom discussion of science-based social issues


presented on television: knowledge, attitudes and values. International
Journal of Science Education, 14, 431-444.

Solomon, E. P., Berg, L. R., Martin, D. W., & Villee, C. (1993). Biology (3ª ed.).
Orlando: Saunders College Publishing.

Spinney, L. (1996, 18 de Maio). Vacinas para comer no prato. Expresso, 6.

Stenhouse, L. (1970). The humanities project: an introduction. London: Heinemann.

Stradling, R., Noctor, M., & Bains, B. (1984). Teaching controversial issues.
London: Arnold.

Sutman, F. X. (1996). Science literacy: a functional definition. Journal of Research


in Science Teaching, 33, 459-460.

Tingle, J. B., & Good, R. (1990). Effects of cooperative grouping on stoichiometric


problem solving in high school chemistry. Journal of Research in Science
Teaching, 27, 671-683.

Tripp, D. H. (1979). The use of the CoRT thinking project with exceptional children:
some outcomes of the UK evaluation. The Exceptional Child, 26, 71-81.

Valente, O. (1995). O ensino das ciências e a formação pessoal e social dos


jovens. In M. Miguéns, A. Bárrios, C. Miranda, H. Simões, F. Morgado, F.
Cid, R. Pires, P. Serra, F. Rebola & A. Teixeira (Eds.), Educação em

189
ciências da natureza: actas do V Encontro Nacional de Docentes (pp. 15-20).
Portalegre: Escola Superior de Educação de Portalegre.

Van Rooy; W. (1993). Teaching controversial issues in the secondary school


science classroom. Research in Science Education, 23, 317-326.

Watson, S. B., & Marshall, J. E. (1995). Effects of cooperative incentives and


heterogeneous arrangement on achievement and interaction of cooperative
learning groups in a college life science course. Journal of Research in
Science Teaching, 32, 291-299.

Wellington, J. J. (1986). Controversial issues in the curriculum. Oxford: Basil


Blackwell.

Wheale, P., & McNally, R. (1988). Genetic enginnering: catastrophe or utopia?


Hemel Hampstead, England: Harvester.

Yin, R. (1989). Case study research: design and methods. London: Sage
Publications.

Ziman, J. (1980). Teaching and learning about science and society. Cambridge:
Cambridge University Press.

Ziman, J. (1984). An introduction to science studies: the philosophical and social


aspects of science and technology. Cambridge: Cambridge University Press.

190

Você também pode gostar