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Esta fusão em Junqueiro, cujo lado mais visível é o de ímpio, pela violência e
pelo relevo dos traços caricaturais, encontrará a sua explicação em dois braseiros
históricos: um, nacional, outro, europeu. A Europa atravessa um período
iconoclasta, a que Portugal não escapa. Mas essa influência estranha é traduzida
para uma realidade outra, que é a nossa, e, como tal, com os seus problemas
específicos, com a sua cor local. Junqueiro, enamorado por uma Europa de
transformação radical, que acena com novas verdades e novas esperanças,
embarca no comboio da moda, com todo o histerismo de um forasteiro. Mas este
forasteiro não consegue disfarçar as suas raízes. Numa geografia europeia,
Junqueiro bate com um coração português. No fundo, Junqueiro revolta-se mais
contra o rosto social da Igreja, do que propriamente contra a essência doutrinal da
Igreja. Porquê?
A esta segunda obra polémica surgiu Pátria, em 1896, onze anos depois e
vinte e dois após a primeira. Surge na sequência do Ultimatum inglês. É um ataque
Ficha de Trabalho Nº16 – Prof. Teresa Paula Alves
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LC3B – Interpretar textos de carácter informativo-reflexivo, argumentativo e literário.
LC3D – Interpretar e produzir linguagem não verbal adequada a contextos diversificados, de
carácter restrito ou universal.
à dinastia de Bragança, na figura de D. Carlos: "O estado é o rei. Cidadão há um
único: D. Carlos. Os deveres são nossos, os direitos, dele. Estrangula-me as ideias,
arromba-me a gaveta, ou corta-me o pescoço, conforme o queira. A justiça é um
relógio que ele atrasa, adianta ou faz parar, segundo lhe dá na vontade. Decreta a
lei e nomeia o juiz. O parlamento é o seu capricho".
Estas três obras não devem ser encaradas como três temáticas diferentes,
mas uma só, a Nação, escalpelizada em suas gradações sociais, ou, se se quiser, o
rosto de um povo historicamente degradado por forças políticas e religiosas,
consentidas e aceites por uma população conformada, e passiva. A análise de cada
uma das três obras obriga a encontrar nelas uma unidade. O que inequivocamente
é reforçado em "Anotações", anexas à Pátria, em jeito de balanço. Embora
extensas, não podemos, pela sua pertinência, deixar de transcrever parte dessas
anotações:
"Um exército que importa em 6.000 contos, não valendo 60 réis [...]";
"Dois partidos monárquicos, sem ideias, sem planos, sem convicções [...]";
Outra questão, que não podemos deixar de referir, na perspectiva que vimos
construindo, é a das influências. Pondo de lado o problema do epigonismo,
geralmente ingenuamente ou abusivamente desfocado na aplicação do seu
conceito, encaremos Junqueiro historicamente. A sua obra, de matrizes estéticas
diversas, nacionais e estrangeiras, já estudadas, e algumas por ele declaradas,
constitui um espelho da encruzilhada finissecular que viveu. Andar à cata de
influências, em Junqueiro, com o objectivo de saber o que sobra para o Mestre, é
desvirtuar totalmente o Junqueiro histórico, o verdadeiro Junqueiro que deve ser
procurado, se quisermos ter uma perspectiva axiológica.