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Milton Santos - Modo de Produção Tecnico-Científico e Diferenciação Espacial PDF
Milton Santos - Modo de Produção Tecnico-Científico e Diferenciação Espacial PDF
E DIFERENCIAO ESPACIAL
MILTON SANTOS *
lrio da Geografia. Como juntar esses dois termos ambguos numa tentativa
de interpretao geogrfica do mundo atual?
Da mesma lo rma que OIivier BUC HES ENSCH UTZ (1987) lamenta que
os arquelogos raramente se preocupem com os problemas tecnolgicos (Ieia-
se processos tcnicos) dos traos materiais deixados pelas atividades huma-
nas, no abordando de frente ess as questes, Franoi s SIGA UD (1981 ), tam-
bm se interroga a respeito da razo pela qual "os gegrafos evitam to siste-
maticamente o estudo das tcnicas, que esto no centro das relaes socie-
dade-meio". Dir-se- que h alguma injustia nessa crtica, alis reiterada em
1991 (SIGAUD, 1991), j que o tema das tcnicas aparece em autores como
SORRE (1950), GOUROU (1973), GEORGE (1974), WAGNER (1974), FEL
(1978), J. E. SANCHEZ (1991) e outros. Mas raro que o fenmeno tcnico
haja merecido um esforo de generalizao, uma preocupao sistemtica
de trat-lo como um dado explicativo capaz de servir elaborao de uma
teoria ou epistemologia da geografia. A to buscada filosofia das tcnicas
muito teria a ganhar. E a reconstruo da teoria social receberia uma nova
verso.
A prpria idia de meio geogrfico inseparvel da noo de sistema
tcnico. Podemos admitir que a histria do meio geogrfico pode ser grossei-
ramente dividida em trs etapas: o meio natural, o meio tcnico, o meio tcni-
co-c ientfico- informaciona I.
Quando tudo era meio natural, o homem escolhia da natureza aquelas
suas partes ou aspectos considerados fundamentais ao exerccio da vida,
valorizando, diferentemente, segundo os lugares e as culturas, essas condi-
es naturais que constituam a base material da existncia do grupo.
Desde o final do sculo XVIII vemos comear a mecanizao do territ-
rio: o espao se adensa com a presena das tcnicas da mquina. Podemos
dizer, junto com SORRE (1948) e Andr SIEGFRIED (1955), que esse o
momento da criao de um meio tcnico, que se superpe, em muitos luga-
res, ao meio natural, buscando substitu-lo. J hoje no mais de meio tcni-
co que se trata, quando nos referimos s manifestaes geogrficas decor-
rentes dos novos progressos. Estamos diante da produo de algo novo, a
que estamos chamando de meio tcnico-cientfico-informacional.
Da mesma forma como participam da criao de novos processos
vitais e da produo de novas espcies (animais e vegetais), a cincia e a
tecnologia, junto com a informao, esto na prpria base da produo. da
utilizao e do funcionamento do espao e tendem a constituir o seu
substrato.
Cri a-se um verdadei ro tecn ocosm o (P RAD ES, 1992: 177), uma situ a-
o em que a natureza natural tende a recuar, s vezes brutalmente. Segun-
do GELLNER (1989), "a natureza deixou de ser uma parte significativa do
nosso meio ambiente". A idia de um meio artificial, avanada por LABRIOLA
em 1896 (em seu estudo intitulado Del materialismo strico) faz-se uma evi-
dncia. A tcnica, produzindo um espao cada vez mais denso, no dizer de
Modo de produo tcnico-cientfico e diferenciao espacial 11
zam de todos os territrios. Mas o espao reticular o de sua eleio. Eis por
que os territrios nacionais se transformam num espao nacional da econo-
mia internacional e os sistemas de engenharia mais modernos criados em
cada pas so mais bem utilizados por firmas transnacionais que pela prpria
sociedade nacional.
Da a freqente meno a um espao sem fronteiras (J. ELLUL, 1967:
17; Y. MASUDA, 1962: 90), e a um "capitalismo sem fronteiras" (P.
CICCOLELLA, 1993), em que as empresas multinacionais "curto-circuitam"
os Estados (R. PETRELLA, 1989) e so os negcios e no os governos que
governam. Acreditar, todavia, que o Estado se tornou desnecessrio um
equvoco. A emergncia de organizaes e firmas multinacionais reala o
papel do Estado, tornado mais indispensvel do que antes (A. GIDDENS,
1964: 135; H. SILVER, 1992; G. BOISMENU, 1993: 13; GROUPE de
LlSBONNE, 1994).
Nessa mesma corrente ps-modernista se inclui tambm a negao da
idia de regio. fato que o fenmeno mudou fundamentalmente de signifi-
cado, mas no se pode declarar que ele deixou de existir.
Na definio atual das regies, longe estamos daquela solidariedade
orgnica que fora o prprio cerne da definio do fenmeno regional. O que
temos hoje diante de ns so solidariedades organizacionais. As regies exis-
tem porque sobre elas se impem arranjos organizacionais, criadores de uma
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