Escolar Documentos
Profissional Documentos
Cultura Documentos
No século XIX esse gênero entra em nossa literatura através de José de Alencar, o
primeiro cronista de qualidade. Mas é com Machado de Assis que a crônica
começa a ganhar status literário, merecendo o respeito da crítica. E muitas de suas
características básicas passam a ser sedimentadas.
Portanto, veiculada no jornal, consegue ser ao mesmo tempo passageira (pois sua
base, a notícia, também o é) e despreocupada, leve, já que não vai em direção de
altos temas filosóficos, sociológicos ou metafísicos. É, nos dizeres do crítico Antonio
Candido, um gênero “ao rés do chão”, pois se hoje entretém o leitor, na semana
seguinte servirá para embrulhar sapato ou peixe. Ainda assim, ou talvez por causa
dessa preocupação, algumas crônicas tenham capacidade de tocar fundo o seu
leitor. São justamente as muito bem elaboradas que furam o círculo jornalístico,
ultrapassam a efemeridade e acabam por se tornar literárias, eternas. É nesse
quadro que se encaixa a produção sempre antológica de Rubem Braga, o cronista
por essência.
Para o autor, qualquer tema parece inspirá-lo, de simples luvas esquecidas atrás de
uns livros até uma pescaria. Mas, apesar dessa miríade temática, seus textos,
todos dotados de um tom que mistura melancolia, saudosismo, simpatia e empatia,
giram geralmente ao redor de um único assunto, ou variações dele: o bem perdido.
Rubem Braga fala sempre, por meio de sua dicção coloquial, bem fluente, de uma
felicidade, de um bem-estar, ou de uma sensação, uma impressão boa (daí alguns
críticos enxergarem nele resquícios simbolistas ou mesmo impressionistas) que
perdemos, que está em nosso passado, seja real ou imaginário, seja pessoal ou
coletivo. Ao falar de seu bem perdido, parece tocar no coração do leitor e atiçar-lhe
o saudosismo, ou pelo menos estimular um desejo de fuga de um cotidiano tão
massacrante e desumano.
Nesse aspecto, pode-se entender que a abordagem da infância, principalmente da
relação que a criança tem com passarinhos, é uma evasão para o bem perdido da
meninice.
É tocante também a paixão que o escritor tem pela casa. Como ele próprio disse, a
casa é uma antecipação do túmulo. Talvez daí venha o apego a esse ambiente, que
é valorizado em seu aconchego, como um retorno àquela confortável e talvez
imaginária residência de nossa infância, em que nos sentíamos protegidos.
Mas o seu tema predileto está ligado à relação com as mulheres, que lhe
proporciona grandes sensações que, mesmo depois de passadas, procura eternizar
pela linguagem literária, muitas vezes poética de suas crônicas. Aqui está o bem
perdido que quer recuperar através da escritura.
http://www.dominiopublico.gov.br/download/video/me003927.mp4
https://www.youtube.com/watch?v=6WYHuZ5EZJk