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As ideias geradas nos séculos XVIII e XIX deram origem ao liberalismo e acabou
criando expectativas de solução para os grandes problemas envolvendo a sociedade e seus
dramas mais profundos. Por conta disso durante muito tempo acreditou-se que removendo
a ignorância e os sistemas de governos despóticos “as conquistas do progresso seriam
canalizadas no rumo imaginado pelos utopistas, porque a instrução, o saber e a técnica
levariam necessariamente à felicidade coletiva” (CÂNDIDO, 2011, p.172).
Uma outra mudança está na postura do rico diante dos pobres que alguns anos
atrás afirmava que por vontade divina é que a pobreza existia e que os menos favorecidos
eram inferiores, não possuíam as mesmas necessidades dos abastados, que não se
cansavam e só morreriam de fome se fossem preguiçosos. “Existe em relação ao pobre
uma nova atitude, que vai do sentimento de culpa até o medo” (CÂNDIDO, 2011, p. 173).
Do mesmo modo os negros e maltrapilhos não estampam as páginas do jornal com tanta
frequência e não são objetos de piada, pois de certa forma, houve uma progressão nas
conquistas por meio do temor.
Um outro fato diz respeito a postura dos políticos e empresários que não mais se
declaram conservadores e sim de centro, pois ser conservador não possui atualmente,
nenhum mérito. As consciências estão sendo despertadas para enxergar o outro e firmada
a convicção de que a desigualdade é algo insuportável, mas quando a convicção vem
acompanhada de uma falta de disposição para mudar, os direitos humanos encontram um
problema.
Então surge a questão: o que determina quais são os direitos de cada indivíduo e
porque uns podem ter determinados direitos e outros não? Porque se há uma seletividade
nos direitos significa que não há igualdade.
Para entender melhor isso , Cândido apropria-se de dois termos, utilizados pelo
grande sociólogo francês, Padre Louis-Joseph Lebret, que fundou o movimento
Economia e Humanismo - “bens compressíveis” e “bens incompressíveis”. Os bens
incompressíveis são aqueles indispensáveis para a sobrevivência humana e que não
podem ser negados. Em contrapartida os bens compressíveis são aqueles aos quais
denominamos supérfluos e que só se destinam a uma classe específica da sociedade, a
saber, os ricos que acreditam que os pobres não necessitam desses bens.
Ele então passa a defender a ideia de que não há um ser humano sequer que viva
sem alguma espécie de ficção, pois ninguém é capaz de ficar um dia sem momentos de
entrega ao que ele chama de “universo fabulado” (CÂNDIDO, 2011,p.177) . Se
ninguém passa o dia todo sem mergulhar no universo da ficção e da poesia, a literatura
“parece corresponder a uma necessidade universal, que precisa ser satisfeita e cuja
satisfação constitui um direito” (CÂNDIDO, 2011, p. 177). A literatura é então, para os
indivíduos, “o sonho acordado da civilização” (CÂNDIDO, 2011, p. 177), e da mesma
forma que não é possível haver equilíbrio psíquico se não sonhamos durante o sono,
“talvez não haja equilíbrio social sem a literatura” (CÂNDIDO, 2011, p. 177).
Se fosse possível abstrair o sentido e pensar nas palavras como tijolos de uma
construção, eu diria que esses tijolos representam um modo de organizar a
matéria, e que enquanto organização eles exercem papel ordenador sobre a
nossa mente. Quer percebamos claramente ou não, o caráter de coisa
organizada da obra literária torna-se um fator que nos deixa mais capazes de
ordenar a nossa própria mente e sentimentos; e em consequência, mais capazes
de organizar a visão que temos do mundo (CÂNDIDO, 2011, p. 179).