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Sobre a gratidão: definições, aplicações e promoção do desenvolvimento humano

Dezembro/2017
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Sobre a gratidão: definições, aplicações e promoção do


desenvolvimento humano
Carla Magna Gonçalves dos Anjos Ianaguivara – carlaptc@gmail.com
MBA em Desenvolvimento Humano e Psicologia Positiva
Instituto de Pós-Graduação - IPOG
Goiânia, Goiás, 04 de outubro de 2017

Resumo
Este trabalho pretende apresentar a gratidão enquanto emoção, virtude e disposição
estudada pela Psicologia Positiva e seus impactos no bem estar e saúde. Para tal, buscou-se
por diferentes autores e pesquisadores que consideraram a gratidão como foco de seus
estudos. O interesse maior deste trabalho foi de apresentar a gratidão como fenônemo
altamente favorável à condição humana, com a hipótese inicial de que seja responsável por
benefícios relacionados à felicidade e satisfação na vida. Foram levantadas definições,
condições para sua ocorrência, vantagens para as interações sociais e para o
desenvolvimento humano. Apresentaram-se formas sugeridas na literatura para sua
aplicação direta no cotidiano, metodologias consideradas simples mas já consagradas pelos
principais teóricos sobre gratidão. Realizou-se também levantamento de instrumentos
validados e estudos empíricos recentes publicados na plataforma da APA (American
Psychology Association) que investigaram a gratidão principalmente em contextos de saúde.
Todo estudo realizado leva à conclusão da grande vantagem da aplicação da gratidão ao
longo da vida, como forma de reconhecer os benefícios recebidos, o valor daquele que os
oferece e com impactos positivos diretos nessa relação. Os diferentes estudos apontaram
forte relação com redução de estresse e sintomas de depressão, bem como aumento do bem-
estar e satisfação com a vida. Portanto, confirma-se a ideia do grande valor da gratidão para
o aumento da sensação de bem-estar, felicidade e saúde de forma geral.

Palavras-chave: Gratidão, Psicologia Positiva, Bem estar, Saúde

Relatos presentes na literatura científica sobre a prática da gratidão como fator


relacionado à promoção do bem estar promoveram a idealização deste trabalho. Seria
realmente a gratidão um mecanismo que favoreça a experiência de emoções positivas e
estimule a saúde física, mental e emocional? A partir desse questionamento, buscou-se
identificar os principais estudos relacionados à gratidão, apresentando definições, formas de
aplicação e resultados empíricos de sua expressão na vida diária.

A Psicologia Positiva, enquanto movimento científico que se interessa pelo estudo


sobre a felicidade humana, sentimentos e emoções positivas que impactam no bem-estar das
pessoas, instituições e comportamentos positivos, potencialidades, forças e virtudes, etc., tem
sido campo de inúmeros estudos para importantes mudanças no olhar cientifico da Psicologia
e outros campos do saber.

ISSN 2179-5568 – Revista Especialize On-line IPOG - Goiânia - Ano 8, Edição nº 14 Vol. 01 dezembro/2017
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Ao final do século 20, quando assumia a presidência da APA (American Psychology


Association) Martin Seligman juntamente com Mihaly Csikszentmihaly estruturaram essa
nova área de estudo na Psicologia, desafiada a ser uma força positiva que descobrisse e
promovesse os aspectos relacionados ao que chamou de ‘boa vida’, vinculada ao bem-estar e
à felicidade (SHELTON, 2010).
Como objetivos principais da Psicologia Positiva, Seligman propôs que fossem
retomadas as missões da Psicologia, um pouco esquecidas no pós-guerra, quando então os
esforços primordiais eram de tratamento das doenças mentais, heranças emocionais e sociais
da época. As três missões eram: a) curar as doenças mentais, b) tornar mais feliz a vida das
pessoas, c) identificar e cultivar os talentos humanos. Complementando os esforços de
amenizar as dores e sofrimentos, Seligman alertou sobre a importância de cultivar o que há de
melhor no seu humano. (KAMEI, 2014)
Dessa forma, caminhando paralelamente aos estudos sobre sofrimento e adoecimento,
pela chamada Psicologia tradicional, a Psicologia Positiva foi estruturada e idealizada por
Seligman e Csikszentmihalyi em 2000 como:

O campo da psicologia positiva no nível subjetivo abrange as valorizadas


experiências subjetivas: bem-estar, contentamento e satisfação (no passado);
esperança e otimismo (para o futuro) e flow e felicidade (no presente). No nível
individual, consiste nos traços individuais positivos: a capacidade para amar e
vocação, coragem, habilidades interpessoais, sensibilidade, estética, perseverança,
perdão, originalidade, visão de futuro, espiritualidade, altos talentos, e sabedoria. E
no nível grupal, trata das virtudes em direção a uma melhor cidadania:
responsabilidade, educação, altruísmo, civilidade, moderação, tolerância e trabalho
ético. (apud KAMEI, 2014:32)

A partir das diretrizes iniciais dos autores, a Psicologia Positiva foi estruturada sobre
os três estruturantes pilares: 1) as experiências subjetivas positivas, por exemplo, o bem-estar,
o prazer, a auto realização, a felicidade; 2) as características individuais positivas, tais como
os talentos, os valores, as virtudes, os traços fortes; 3) as instituições positivas, como a
família, a escola, a comunidade, entre outras. (PALUDO; KOLLER, 2007)
Nesse novo cenário que se abriu com novas e diferentes possibilidades de estudo,
alguns trabalhos já anteriormente explorados sobre gratidão puderam contribuir para os
avanços e descobertas da Psicologia Positiva.
O professor e pesquisador Robert Emmons já realizava diferentes pesquisas sobre a
gratidão ainda nos anos de 1980. Segundo ele, até pouco tempo, a gratidão foi ignorada por
psicólogos científicos por ser uma emoção aparentemente simples ou óbvia, mas acreditou
que poderia ser melhor investigada. Em seus primeiros estudos já conseguiu identificar o
grande valor dessa emoção:

...embora essa emoção parecesse simplista até mesmo para mim, quando comecei
minha pesquisa, logo descobri que a gratidão é um fenômeno mais profundo e
complexo que desempenha um papel crucial na felicidade humana. É, literalmente,
uma das poucas coisas que podem mudar de forma mensurável a vida das pessoas.
(EMMONS, 2009:12)

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Identificando o grande valor da gratidão para a felicidade humana, este artigo propõe-
se a explorar definições, práticas e pesquisas relacionadas a essa emoção como forma de
também contribuir para sua compreensão e disseminação tanto no campo científico como
colaborar para sua aplicação no dia a dia das pessoas.

1. O fenômeno da gratidão
Expressões culturais e religiosas mostram que a prática da gratidão percorreu
diferentes culturas ao longo dos séculos. Colonos americanos expressavam a gratidão por
meio de rituais oriundos de costumes e orações europeias. Nos anos de 1620, americanos
nativos e peregrinos celebravam a colheita através da partilha de refeição em conjunto. Em
1630 celebrou-se o primeiro Dia da Ação de Graças, data altamente valorizada pela cultura
americana (SHELTON,2010). A prática e incentivo da gratidão são compreendidas como uma
das estratégias dos colonizadores americanos em meio às grandes dificuldades encontradas à
época como as condições de vida na nova terra, clima desfavorável, etc. Esse constante
exercício aos poucos foi apropriado à cultura americana evoluindo para um tema duradouro
no país.
Shelton ainda afirma ser difícil conceber uma sociedade em que a gratidão e suas
consequências não desempenhem importantes papéis sociais. “Para que uma sociedade
floresça, as atitudes acalentadas, como ajudar os necessitados e mostrar preocupação pelos
outros, precisam ser encorajadas” (SHELTON, 2010:19, tradução nossa). Não somente nos
Estados Unidos, em diferentes sociedades a gratidão pode representar importante papel na
sobrevivência e evolução de um povo.
Para Emmons (2009), é impossível imaginar um mundo em que os indivíduos não
sejam regularmente gratos uns aos outros. Em relacionamentos de reciprocidade, a gratidão
pode ser considerada um dos alicerces da sociedade civil e humana. Nesse sentido, Georg
Simmel (apud EMMONS, 2009) sociólogo suíço do início do século XX a considerou como
uma memória moral da humanidade.
O fenômeno tem sido explorado ao longo dos anos através de preceitos religiosos,
assim como pela Filosofia e Teologia. Através dos anos e em diferentes culturas, a expressão
da gratidão é considerada como um dos aspectos básicos e desejáveis da personalidade
humana e da vida social, manifestação indispensável de virtude e excelência de caráter.
Peterson e Seligman (2004) salientam que a gratidão enquanto disposição humana sempre foi
valorizada no pensamento judaico, cristão, muçulmano, budista e hindu. Transversal às
religiões e correntes teóricas, identificam-se diferentes abordagens sobre sua importância para
o bem-estar individual, nos relacionamentos e em toda a sociedade. Seja direcionada a um ser
maior que abençoa, como a qualquer outro que oferece um benefício mesmo sem ser
solicitado, expressar gratidão pode contribuir para uma amplificação daquela sensação de
bem-feitoria.
É possível perceber estreita relação entre a gratidão e a espiritualidade e religiosidade,
sendo identificada como uma das palavras mais comuns nas orações e descrições das
religiões. (McCULLOUGH; KILPATRICK; EMMONS; LARSON; 2001). Emmons
apresenta diferentes orações em que a gratidão é destaque e afirma:

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Embora a gratidão esteja mais presente nas tradições monoteístas, não há religião na
Terra que não acredite que o agradecimento é importante. Ele é universalmente
endossado. Em muitas tradições espirituais as orações de gratidão são consideradas a
forma mais poderosa de oração, porque, por meio delas, as pessoas reconhecem a
fonte suprema de tudo que são e sempre serão. (EMMONS, 2009: 248)

No campo da Filosofia, que por vezes se propõe a investigar e questionar entre outras
tantas questões, a natureza do homem e de fatos relacionados a este, por meio de análise,
reflexão e crítica, encontram-se muitas contribuições para a compreensão da gratidão. Cícero
afirmava que ela não apenas seria a maior das virtudes, mas também mãe de todas as outras
(PETERSON; SELIGMAN, 2004).
De forma análoga, Smith (apud McCULLOUGH et al 2001) também se referia à
gratidão como “a memória moral da humanidade”. Percebe-se a relação estreita entre a
gratidão enquanto atitude ou emoção com a conduta moral, virtuosa apreciada e estudada na
filosofia e contribuinte para uma melhor interação tanto interpessoal quanto intrapessoal.
Sob o olhar filosófico e considerando os fortes componentes afetivos da gratidão, em
séculos anteriores, o filósofo Thomas Brown a definiu como “a deliciosa emoção de amor por
quem foi bondoso conosco, sentimento esse que, em si, é uma parte importante do benefício
conferido” (apud EMMONS, 2009:17).
Ainda neste contexto em que as virtudes são tomadas como forças que agem ou que
podem agir, expressões daquilo que constituem o valor da pessoa, sua excelência própria,
Comte-Sponville (1995) considera a gratidão como um segundo prazer, que prolonga o
primeiro, uma alegria repetida. Ao celebrar o presente recebido, vive-se novo momento de
graça e satisfação:

O que a gratidão dá? Ela dá a si mesma: como um eco de alegria, dizia eu, pelo que
ela é amor, pelo que ela é partilha, pelo que ela é dom. É prazer somado ao prazer,
felicidade somada à felicidade, gratidão somada à generosidade. (...) A gratidão é
dom, a gratidão é partilha, a gratidão é amor, é uma alegria que acompanha a ideia
de sua causa (COMTE-SPONVILLE, 1995:146).

Em suas reflexões sobre diversas virtudes, o autor esclarece que a genuína gratidão é
expressada não com o intuito do benefício próprio de quem a pratica ou mesmo como
obrigação em retribuir, mas sim como retribuição espontânea:

Digamos apenas que a gratidão é levada a agir, por sua vez, em favor de quem a
suscita, não decerto para trocar um obséquio por outro (não seria mais gratidão, e
sim troca), mas porque o amor quer dar alegria a quem o alegra, com o que a
gratidão nutre a generosidade, quase sempre, que nutre a gratidão. (COMTE-
SPONVILLE, 1995:148)

Neste estudo pode-se perceber, portanto, relação estreita da chamada virtude da


gratidão com outras virtudes como a generosidade, humildade e amor. Essa relação positiva
com outras instâncias favorecem o contexto profícuo de retroalimentação das virtudes que
pode impactar em importantes resultados satisfatórios para as relações humanas.
Adam Smith (apud McCULLOUGH et al 2001) em sua obra “A teoria dos
sentimentos morais” apresentou o que se pode considerar o primeiro enfoque psicológico
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concedido à gratidão, propondo que ela seja uma das emoções sociais básicas em pé de
igualdade a emoções como ressentimento e carinho, um dos motivadores primários do
comportamento benevolente através da figura do benfeitor. Na relação estabelecida entre
benfeitor e beneficiário, a gratidão leva à experiência de emoções prazerosas que prolongam
aquele momento de alegria e satisfação.

2. Definindo a gratidão
No campo da Psicologia, Robert Emmons chegou a afirmar que a gratidão é um
fenômeno que desafia uma classificação fácil. Pode ser concebida como “uma emoção, uma
atitude, uma virtude moral, um hábito, um traço de personalidade, ou uma resposta de
enfrentamento” (EMMONS; MCCULLOUGH, 2003:377, tradução nossa). Percebe-se,
portanto, a amplitude de possibilidades de compreensão do que propusesse chamar de
fenômeno da gratidão.
A palavra gratidão é derivada da raiz latina gratia, que significa graça, graciosidade ou
gratidão. Todos os derivados desta raiz latina "têm a ver com bondade, generosidade, dons, a
beleza de dar e receber, ou receber algo para nada" (PRUYSER, 1976:69; apud PETERSON
& SELIGMAN, 2004:554, tradução nossa). A essa interpretação, Emmons complementa: “a
gratidão é agradável. Dá prazer. Também é motivadora. Quando nos sentimos gratos, somos
levados a partilhar a bondade que recebemos com outros” (EMMONS, 2009:14).
O dicionário britânico Oxford English Dictionary apresenta gratidão como a
“qualidade ou condição de ser grato; o reconhecimento de uma tendência à bondade”
(EMMONS, 2009). Combinação entre manifestação do altruísmo e reconhecimento daquele
que o recebe, portanto, somente possível na relação estabelecida, naturalmente alimentada
pela expressão da gratidão.
Compreendendo entre as forças de caráter sob o olhar da Psicologia Positiva, Peterson
& Seligman introduzem o capítulo sobre gratidão conceituando-a como “sentimento de
agradecimento e alegria em resposta a um presente recebido, sendo o bem um benefício
tangível de outrem em específico ou um momento de felicidade pacífica evocado por beleza
natural” (PETERSON; SELIGMAN, 2004:554, tradução nossa). Os autores discriminam o
que chamam de gratidão pessoal da gratidão transpessoal, sendo a primeira direcionada para
uma outra pessoa em específico que ofereceu o benefício e a segunda voltada para Deus, a um
poder maior, ao cosmos.
Ao realizarem levantamento bibliográfico a respeito da gratidão enquanto afeto moral,
McCullough et al (2001) afirmam que ela seja tanto uma resposta a um comportamento moral
quanto um motivador ao comportamento moral. Em um círculo virtuoso, seria causa e efeito
no processo.

Pessoas (beneficiários) respondem com gratidão quando outras pessoas (benfeitores)


se comportam de forma a promover seu bem-estar. Beneficiários também agem de
forma a promover o bem-estar dos outros (benfeitores) quando eles mesmos estejam
agradecidos (McCULLOUGH; KILPATRICK, EMMONS, LARSON, 2001:250,
tradução nossa).

Considerando a gratidão como uma disposição, McCullough, Emmons & Tsang a


definem como uma “tendência generalizada para reconhecer e responder com emoção grata

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aos papéis da benevolência de outras pessoas nas experiências positivas e resultados que se
obtém” (2002, apud JANS-BEKEN, LATASTER, LEONTJEVAS & JACOBS, 2015).
Também como traço de personalidade, a gratidão é expressa como um agradecimento
duradouro que é mantido através das situações e ao longo do tempo (PETERSON;
SELIGMAN, 2004). Portanto, a prática contínua e consistente da gratidão sustenta a
concepção de seja característica da pessoa, podendo ser considerada ponto forte em sua
relação consigo mesmo e com as demais pessoas.
Neste contexto, Fitzgerald (1998, apud PETERSON; SELIGMAN, 2004) identifica
três componentes da gratidão, que são: a) o senso de apreço por alguém, b) um senso de boa
vontade em relação a outra pessoa ou coisa e c) uma disposição a agir que resulta da
apreciação e da boa vontade. A partir dessas considerações, nota-se a gratidão como forma de
perceber que gera sensações positivas e resulta em ações que podem promover novos
resultados satisfatórios.
Emmons destaca que a gratidão envolve duas etapas. O primeiro é o reconhecimento
de que existe bondade na vida, apesar das dificuldades e problemas encontrados. “Quando
olhamos para a vida como um todo, a gratidão nos encoraja a identificar alguma quantidade
de bondade em nossa vida” (EMMONS, 2010).
Como segundo componente, Emmons apresenta o reconhecimento de que a origem da
bondade relacionada à gratidão encontra-se fora de nós. “O objeto da gratidão é o outro; você
pode ser grato aos outros, a Deus, aos animais, mas nunca a si próprio”. (EMMONS,
2009:15). Dessa forma, ela se diferencia de outras emoções como orgulho ou culpa, que
podem ser voltadas para nós mesmos. O autor conclui que a gratidão vai além de um
sentimento, por exigir uma disposição por reconhecer: “a) que fomos beneficiários da
bondade de alguém, b) que o benfeitor proporcionou intencionalmente o benefício, muitas
vezes incorrendo em um custo pessoal e c) que, para o beneficiário, o benefício tem valor”
(EMMONS, 2009:15)
Essa análise permite perceber a relação da gratidão com diferentes aspectos como o
reconhecimento do valor do outro e a humildade em perceber que não obteríamos os mesmos
resultados sem a participação de uma segunda pessoa.
Por fim, Emmons ainda destaca outros importantes aspectos da gratidão:
primeiramente o que chamou de “prêmio imerecido”, ou seja, ao ser grato, reconhece-se
muitas vezes que não houve merecimento ou que a bondade ocorreu independentemente de
suas ações ou mesmo apesar delas.
Já Ortony (apud McCULLOUGH et al, 2001) propôs três aspectos em que a gratidão
seja mais provável de ocorrer: 1) quando a ação do benfeitor é julgada como louvável. 2)
quando a ação do benfeitor difere do padrão de comportamento esperado, e 3) quando o
resultado do comportamento do benfeitor é julgado como pessoalmente favorável. Observa-se
a condição de análise à ação daquele que concede a benefício, o reconhecimento daquele que
recebe de que seu benfeitor manifestou grande e notável feito.
Outro destaque encontrado na revisão da literatura é que a gratidão pode ocorrer
também em momentos infelizes, como reação ao mal também imerecido. Apesar da dor,
desapontamento ou sofrimento, é possível exercitar a gratidão:

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É sua presença nos tempos difíceis que nos permite concluir que a gratidão não é
apenas uma forma de ‘pensamento positivo’, ou técnica de ‘felicidade-ologia’, mas
um reconhecimento profundo e contínuo de que a bondade existe, mesmo durante o
pior que a vida oferece. Esse aspecto da gratidão é um dos mais intrigantes para
mim. (EMMONS, 2009:20).

Além de ser percebida enquanto emoção positiva, Watkins, Woodward, Stone e Kolts
(2003) propõem existir um traço de gratidão para a personalidade, que pode ser
confiavelmente medido e está altamente associado ao bem-estar subjetivo. Dessa forma, a
abordam como característica disposicional, considerando que as pessoas gratas possuem
como características: a) não se sentem privados na vida, possuindo um senso de abundância;
2) ficam agradecidos com a contribuição os outros em seu bem-estar; 3) possuem a tendência
em apreciar simples prazeres da vida, sendo mais propensos a vivenciar sentimentos de
gratidão com mais frequência em sua rotina e 4) percebem a importância em vivenciar e
expressar a gratidão.
Em linhas gerais, pode-se compreender a gratidão como percepção da bondade nas
experiências vividas ao longo da vida e o reconhecimento dessa benevolência em fontes
externas a nós. Seja enquanto emoção positiva, afeto moral ou traço de personalidade, a
interação com diversas origens de benevolência e generosidade geram resultados positivos
como aumento do bem-estar e da satisfação com a vida.

3. Os benefícios da gratidão
Shelton (2010) aponta que um dos benefícios do estudo sobre a gratidão é perceber
seus efeitos positivos, pois diferentes estudos confirmam as inúmeras vantagens do estímulo
de sua prática. De forma geral e unânime, pesquisas revelam constantemente que pessoas
gratas são pessoas felizes. Em pesquisa realizada com adolescentes e adultos pelo Instituto em
1998, 90% dos respondentes indicaram que expressar a gratidão os ajudava a se sentirem
“extremamente felizes” ou “muito feliz” (EMMONS; McCULLOUGH, 2003).
Afirma-se que a felicidade é potenciada pela gratidão, pois diferentes estudos
encontraram relações entre a gratidão e a capacidade de apreciar o bem. Como consequência,
pessoas felizes sentem-se também mais autoconfiantes, criativas e são mais afortunadas. Ao
focarem-se no que lhes foi dado por terceiros sentem-se acarinhadas e amadas (ALVES,
2010).
Na intenção de se verificar os benefícios da gratidão para a saúde física, emocional e
social, Robert Emmons (2010) realizou estudos empíricos com mais de mil pessoas, com
idades entre oito e oitenta anos através de exercícios considerados simples e básicos.
Relacionados à saúde física, os resultados encontrados pelo autor apontam para
sistemas imunológicos mais resistentes, maior tolerância à dor, pressão arterial mais baixa,
maior cuidado com a própria saúde e maior qualidade de sono.
Quanto à saúde emocional, seus estudos revelam níveis mais elevados de emoções
positivas, de otimismo e felicidade, maior estado de ânimo e vivacidade, mais momentos de
alegria e prazer.
Por fim, relativo às relações interpessoais, suas pesquisas relevam maior extroversão,
menor sentimento de solidão e isolamento e aumento na sensação de utilidade, prática de
generosidade e compaixão. Com esses últimos resultados, Emmons (2010) destaca o

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componente social da gratidão, percebendo-a como “uma emoção que fortalece o


relacionamento, porque exige que vejamos como fomos apoiados e afirmados por outras
pessoas” (tradução nossa).
Inspirada nos estudos de Emmons e propondo o exercício da gratidão como um dos
caminhos para a felicidade, a psicóloga e pesquisadora sobre felicidade, Sonja Lyubomirsky,
enfatiza o valor dessa emoção:
...é saborear, dar o devido valor às coisas, é superação, orientar-se para o presente. A
gratidão é um antídoto contra as emoções negativas, algo que neutraliza a inveja, a
avareza, a hostilidade, o aborrecimento e a irritação. (LYUBOMIRSKY, 2008:73)

Entre os benefícios da prática da gratidão, Lyubomirsky (2008) declara que pesquisas


revelam que pessoas gratas com regularidade são mais felizes, energizadas, esperançosas,
sentindo emoções positivas com maior frequência. Em relação à personalidade, a autora
afirma que essas pessoas tendem a ser mais prestativas, simpáticas, mais espiritualizadas e
religiosas, mais clementes e menos materialistas do que aquelas menos predispostas à prática
frequente da gratidão. Por sim, ela atesta existir uma relação inversamente proporcional entre
depressão, ansiedade e sentimento de solidão e o exercício da gratidão.
Para os pesquisadores Watkins et al (2003), as pessoas gratas são mais felizes e
pensamentos gratos melhoram o humor. Apesar de ainda haver poucas pesquisas, a gratidão
pode ser apontada como um importante componente da vida feliz. Revelam que felicidade e
gratidão operam em um círculo virtuoso em que uma realça a outra, como uma espiral
ascendente onde os afetos positivos têm sido propostos para promover benefícios para o
indivíduo que tende a sentir futuros benefícios.
Em estudo mais recente, Emmons destaca que pessoas gratas apresentam níveis mais
elevados de emoções positivas como entusiasmo, amor, felicidade e otimismo e podem lidar
melhor com o estresse diário, mostrar maior resiliência diante do estresse induzido por
trauma, recuperar-se mais rapidamente de doenças e desfrutar de uma saúde física mais
robusta, estando protegidas de transtornos psiquiátricosm. (EMMONS; STERN, 2013).
Os autores garantem em seus estudos puderam comprovar que em exercício diário de
gratidão com adultos jovens obtiveram níveis mais elevados de estados positivos de alerta,
entusiasmo, determinação, atenção e energia. Participantes de pesquisa com condição de
gratidão diária eram mais propensos a relatar ter ajudado alguém com um problema pessoal
ou ter oferecido apoio emocional a outro, em relação aos aborrecimentos ou condição de
comparação social. Outros benefícios estenderam-se à esfera física, incluindo o sono mais
longo, melhoras na qualidade do sono e mais tempo gasto exercitando para aqueles que
mantêm diários de gratidão.
“A gratidão pode tornar sua vida mais satisfatória. Quando sentimos gratidão, nos
beneficiamos da lembrança agradável de um acontecimento positivo em nossa vida.”
(SELIGMAN, 2011:41)

As ferramentas e técnicas da ciência moderna têm sido usadas para ampliar a


compreensão da natureza da gratidão a porque ela é importante para o florescimento
humano de forma geral. Da infância à idade mais avançada, estudos acumulam
evidências do vasto leque de benefícios psicológicos, físicos e de relacionais
associados à gratidão. (EMMONS,2013:2)

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Esses resultados mostram que além das melhorias na saúde física e emocional, o
exercício da gratidão mostra benefícios tanto para a convivência com outras pessoas como na
atitude em relação a elas. “Sentir gratidão motiva as pessoas beneficiadas a retribuir seus
benfeitores e estender a generosidade a terceiros, assim como expressões de gratidão também
reforçam benfeitores pela sua generosidade”. (ABREU, 2016:275)
Confirmando esta constatação, Fredrickson revela que “a gratidão abre seu coração e
leva à compulsão por retribuir – dar algo em troca, seja para quem ajudou ou para outra
pessoa qualquer”. (FREDRICKSON, 2009;49), afirmando nitidamente o impacto positivo
tanto na emoção vivenciada quanto nos relacionamentos interpessoais.
Em recente trabalho científico, Jans-Beken et al (2015) relacionam diferentes estudos
empíricos que retratam associações positivas da disposição em ser grato com o bem-estar
subjetivo, a felicidade, a transcendência espiritual, a religiosidade e a espiritualidade,
otimismo, além de associações negativas com a depressão e agressão.
Emmons e Stern (2013) enfatizam sobre a importância da gratidão para a saúde de
forma geral, afirmando ser “um dos elos mais fortes para a saúde mental e satisfação com a
vida de qualquer traço de personalidade – mais do que até otimismo, esperança ou
compaixão.” (EMMONS; STERN, 2013:848, tradução nossa).
Buscando manter um enfoque mais científico ao exercício da gratidão, Lyubomirsky
(2008) apresenta oito razões pelas quais recomenda a sua prática como caminho para uma
vida mais feliz:
1) Pensar de forma agradecida, incentiva a saborear as experiências positivas da vida,
extraindo o máximo de satisfação e divertimento possíveis das circunstâncias
atuais.
2) Expressar gratidão favorece o auto merecimento e a autoestima, por levar o
beneficiário a compreender o quanto as pessoas fizeram por ele.
3) A gratidão ajuda as pessoas a lidar com o estresse e o trauma, por ser um método
de superação adaptativa no qual a pessoa reinterpreta as experiências vividas.
4) A expressão da gratidão encoraja o comportamento moral, pois a tendência
encontrada nos estudos é de que pessoas agradecidas ajudam mais as outras e
apresentam-se menos materialistas.
5) A gratidão pode ajudar a criar laços sociais, fortalecer as relações existentes e a
alimentar novas.
6) A manifestação da gratidão tende a inibir comparações com outras pessoas, pois o
beneficiário tende a observar e reconhecer mais o que tem.
7) A prática da gratidão é incompatível com emoções negativas e pode diminui-las
8) A gratidão ajuda a frustrar a adaptação hedônica, a capacidade de o indivíduo
ajustar-se com rapidez a circunstâncias ou acontecimentos novos da vida.
Portanto, através dos diferentes estudos encontrados, pode-se consolidar a relevância
da gratidão como fonte geradora de bem estar e saúde em seus diferentes espectros.

4. A prática da gratidão
Sabendo, portanto, dos benefícios resultantes da prática da gratidão, recorre-se às
maneiras de exercitá-la. Sonja Lyubomirsky explica que índices de felicidade são

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influenciados por três grandes grupos de fatores, em diferentes proporções: 50% fatores
genéticos, como traços de personalidade e de humor, 10% pelas circunstâncias da vida como
situação financeira, status e estado civil, e 40% por atitudes intencionais, ou seja, formas de
pensar e agir em que a pessoa decide adotar. Nesse último grupo, o exercício da gratidão
poderá então ser estimulado, transformando-se num elemento indispensável para a promoção
da felicidade (LYUBOMIRSKY, 2008).
Em pesquisa aos diferentes autores, a prática da gratidão é proposta através de
metodologia considerada simples e facilmente aplicáveis. Salvas algumas adaptações, as
técnicas propostas são: o diário da gratidão e a visita da gratidão.

Diário da gratidão
Pode-se considerar que o diário da gratidão seja uma unanimidade como
recomendação de prática da gratidão entre os autores pesquisados.
Seligman recomenda a utilização do diário da gratidão como uma reflexão sobre o que
correu bem, chamado também de “três bênçãos”. A sugestão é que seja registrado seja em um
caderno ou no computador, as três coisas que deram certo no dia e porque deram certo.
Enquanto professor universitário, Seligman sugere periodicamente a técnica a seus alunos,
que relatam grandes resultados.
Robert Emmons também apresenta a técnica de registrar diariamente os motivos de
agradecimento. Como concebe a gratidão uma forma de admitir que haja fontes de bondade
na vida, o autor afirma que escrevendo diariamente há uma ampliação e exaltação dessas
fontes de bondade.
A técnica, porém, requer que ocorra o registro, não apenas pensar sobre o que deu
certo. Segundo Emmons, o ato de anotar traduz os pensamentos em palavras, auxiliando na
organização as ideias. Pesquisas revelam que traduzir pensamentos em linguagem concreta
traz mais vantagens do que apenas pensar (EMMONS, 2009).
Shelton (2010) propõe a técnica como um exame de consciência, promovendo a
percepção sobre as bênçãos recebidas e promovendo o agradecimento. Como um passo a
passo para a essa prática, o autor sugere: uma pausa no dia, rever tudo o que nos ocorreu,
saborear as boas sensações resultantes dos episódios positivos ocorridos e por fim o que
chama de resposta, que seria a identificação de uma forma de retribuir o que recebeu ou
passa-la adiante.
Como proposta de prática da gratidão com objetivo de melhores resultados
emocionais, Robert Emmons publicou em 2013 o livro Gratitude Works! (sem tradução para
o português), o que chamou de desafio de vinte e um dias de gratidão como propósito de
prosperidade emocional. O material explora práticas baseadas em seus estudos, fornecendo
um guia passo a passo para cultivar gratidão como um modo de vida.
Em seus estudos sobre a utilização do diário da gratidão, Lyubomirsky (2008) aplicou
a técnica de forma orientada em dois grupos, um deles com a instrução de registrar as
chamadas “bênçãos” três vezes por semana e ao outro grupo foi prescrito o registro em
somente um dia da semana. Ao final de seis semanas, curiosamente, somente os participantes
do segundo grupo apresentaram níveis mais altos de satisfação e felicidade em comparação ao
grupo de controle (pessoas que não praticaram nenhum exercício). A suposição da
pesquisadora para esse resultado inusitado é de aqueles que eram demandados uma frequência

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maior de registros sentiram-se entediados ao passo que aqueles que faziam o exercício
semanalmente provavelmente continuaram o percebendo como novo e importante.
Nesse sentido, Emmons (2009) recomenda que essa prática não seja repetida como
mais uma tarefa diária, mas com a intenção de reflexão, podendo receber variações em sua
forma visando manter a novidade e o interesse por sua realização.
Ao abordar a técnica como prática mental para a positividade, Achor afirma que essa
reflexão diária sobre elementos positivos potenciais treina o cérebro “a perceber e focar
melhor nas possibilidades de crescimento pessoal e profissional e a aproveitar oportunidades
de concretizar essas possibilidades” (ACHOR, 2012:109). Assim, segundo o autor, quanto
mais a prática é utilizada, mais eficientes as pessoas se mostram em perceber os episódios
positivos e consequentemente mais coisas boas elas identificam.
Percebida como uma variação do diário, encontra-se também a recomendação do pote
da gratidão, em que as bênçãos diárias são escritas e guardadas em um recipiente para que
após o final de um período, seja de um ano, final de atividades escolares ou período
terapêutico, os registros são retomados como forma de retomar as experiências e emoções
positivas.

Visita da gratidão
Seligman enfatiza a importância do exercício da gratidão como forma de tornar a vida
mais agradável e através de sua expressão aos outros há a promoção do relacionamento com
as pessoas. Dessa forma, o autor propõe como prática o que chamou de visita da gratidão,
considerando como oportunidade de experimentar e expressar a gratidão “de uma forma
atenciosa e intencional” (SELIGMAN, 2011:41).
O exercício envolve a escrita cuidadosa de uma carta à pessoa que gerou gratidão,
expondo de forma bem específica o que ela fez e como conseguiu afetar de forma positiva a
vida de quem escreve. Após a conclusão da carta, propõe-se que seja feito contato com a
pessoa com agendamento de uma visita para sua leitura. Nessa oportunidade, lê-se a carta de
forma tranquila, sem interrupções, observando as reações da pessoa que a recebe.
Contrariamente à percepção de Seligman, Lyubomirsky (2008) realizou diferentes
estudos relacionados à gratidão e aplicando a visita da gratidão concluiu que apenas
escrevendo a carta de agradecimento e não a enviar já seria suficiente para resultados
substanciais de felicidade.
Porém, a proposta de Seligman (2011) dá destaque ao encontro entre as partes
envolvidas, com um momento de discussão a respeito dos acontecimentos e com isso maior
promoção do relacionamento estabelecido. Como intuito de aperfeiçoar as relações
interpessoais, provavelmente a atividade na forma completa proposta pelo autor pode ser um
excelente exercício de promoção do bem-estar.

Além do diário e da visita da gratidão amplamente divulgados pelos pesquisadores de


Psicologia Positiva, em seu livro “Agradeça e seja feliz”, Robert Emmons complementa as
sugestões de práticas:
a) Lembrar-se das coisas ruins – apesar de o foco ser os acontecimentos agradáveis, o
autor revela que não há porque não registrar também os ruins. Essa lembrança
também seria favorável ao cultivo da gratidão, pois nos remete às conquistas e

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superações realizadas. O exercício nos permite “capitalizar as ferramentas mentais


naturais e os processos humanos normais” (EMMONS, 2009: 243), mostrando-se
uma estratégia eficaz para o desenvolvimento da gratidão.
b) Inventário moral diário – a prática envolve refletir sobre três perguntas: o que
recebi de _______? O que dei para _____? Que problemas e dificuldades eu causei
a _________? Com a sugestão de incorporar técnicas de meditação budistas,
auxiliando para a observação de si mesmo, refletindo sobre os relacionamentos e
atividades do dia.
c) Oração de gratidão – incorporá-la à prática da oração, pois estão estreitamente
relacionadas e interdependentes.
d) Começar pelo básico – agradecer por estar vivo, não estar doente, estar respirando
e vivendo. Bênçãos físicas estão sempre presentes nos diários da gratidão e
remetem a apreciar o aspecto mais humano e o milagre da vida. “Durante milênios,
poetas, filósofos e médicos louvaram a natureza milagrosa e bela do corpo.”
(EMMONS, 2009: 250).
e) Usar lembretes visuais – a sugestão é para que sirvam como alertas frequentes,
combatendo os principais obstáculos à gratidão que são o esquecimento e a falta de
consciência atenta. Através de pequenas frases afixadas à vista, é possível lembrar
e aumentar o nível de consciência.
f) Fazer um voto de praticar a gratidão – definir e anunciar o voto relacionado à
gratidão, como um compromisso consigo mesmo que exercitá-la com frequência.
g) Prestar atenção à própria linguagem – considerando que a linguagem, as principais
palavras e expressões revelam o conteúdo do pensamento, sugere-se que além de
observar o próprio discurso, que a pessoa passe a utilizar frases para si mesmo,
como um monólogo de gratidão para levar a atenção às contribuições positivas
recebidas dos outros.
h) Simular a gratidão – acredita que é possível que forçando um gesto de
agradecimento, o sentimento de gratidão virá. Seria como um treinamento para que
a prática ou habilidade de agradecer se instale.
i) Pensar lateralmente – a sugestão é utilizar a criatividade para inovar nas formas de
praticar a gratidão, sendo grato, por exemplo, a quem nos faz mal ou àqueles que
nós mesmos beneficiamos.
Todas alternativas a princípio simples, podem contribuir para a promoção da gratidão,
pois como Emmons postula: “a gratidão é incompleta enquanto não se manifesta por meio de
uma ação externa” (EMMONS, 2009: 262). A simplicidade de sua expressão possibilita que
seja utilizada intencionalmente por qualquer pessoa que se comprometa a desenvolvê-la.
Dessa forma, é possível sugerir que a busca pela felicidade, bem estar e saúde de forma geral
pode ser recomendada e promovida.

5. Medidas de gratidão e estudos empíricos mais recentes


Além das formas sugeridas para a prática da gratidão, encontram-se na literatura
alguns instrumentos desenvolvidos para sua mensuração, visando prioritariamente a aplicação

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em estudos científicos sobre essa emoção. Apesar de que a pesquisa com a gratidão ocorra
muitas vezes de forma qualitativa, envolvendo auto relato e análise de discurso, instrumentos
de medida podem e são utilizados em pesquisas quantitativas, com o intuito de analisar
correlação ou relação causal com outras medidas.

Questionário da gratidão (Gratitude Questionnaire) – GQ6


McCullough, Emmons e Tsang (2002) desenvolveram o instrumento chamado
Questionário da Gratidão considerando quatro instâncias: intensidade, frequência, extensão e
densidade. O instrumento apresenta seis frases relacionadas à gratidão sendo respondidas
através de escala da Likert de sete pontos, variando de discordo totalmente a concordo
totalmente.

Teste de gratidão, ressentimento e apreciação (Gratitude Resentment, and Appreciation Test)


– GRAT
Outro instrumento foi proposto por Watkins et al (2003), a partir da identificação de
três características distintas no indivíduo grato: a falta de um sentimento de privação, a
tendência para apreciar os prazeres simples, e a tendência de apreciar as contribuições dos
outros para o próprio bem-estar e expressar essa gratidão. Possui 44 itens com escala Likert
de cinco pontos, variando entre discordo totalmente a concordo totalmente.

Em estudo realizado para desenvolver o instrumento GQ6, McCullough et al (2002)


identificaram fortes correlações da gratidão com emoções positivas, atitudes pró sociais (em
favor dos outros) e espiritualidade/religiosidade. Outras relações encontradas no estudo foram
que pessoas gratas possuem maior satisfação com a vida e menor relação com ansiedade,
depressão e raiva. Demonstram também maior tendência a atitudes favoráveis às outras
pessoas, como empatia, perdão, ajuda. De forma geral, são menos propensas a objetivos
materialistas e tendem a ter pensamentos mais espiritualizados. As pessoas dispostas a
agradecer eram consistentemente mais extrovertidas, mais agradáveis e menos neuróticas do
que o grupo de controle.
Emmons (2013) relata que em diferentes estudos empíricos a gratidão tem sido
encontrada positivamente associada com aspectos positivos como empatia, perdão e
disposição a ajudar ao próximo. O autor declara que quando pessoas relatam sentir gratidão
ou agradecimento em seu cotidiano, elas também sentem mais amor, perdão, alegria e
entusiasmo. Além desses sentimentos, há também relatos de pessoas que convivem com essas
que afirmam aplicar a gratidão de que elas são vistas como mais apoiadoras, extrovertidas,
otimistas a confiáveis.
Em pesquisa a artigos científicos com a palavra chave “gratitude” no portal da APA
(American Psychology Association) em abril de 2017 foram encontrados 168 estudos que
envolveram a gratidão em seus estudos, seja de forma individualizada como também em
correlação com outras emoções positivas.
Estudo recente (VIESLEMEYER, HOLGUIN, MEZULIS, 2017) investigou o papel
da resiliência e gratidão na relação entre exposição ao trauma, estresse pós-traumático e
crescimento pós-traumático após episódio específico de tiroteio em um campus universitário.
Empregados, docentes e estudantes que estiveram presentes naquele dia, foram

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acompanhados durantes os quatro meses seguintes e revelaram que tanto a resiliência quanto
a gratidão podem ser conceituadas como mecanismos de proteção, promovendo resultados
positivos após o trauma. Entre as conclusões da pesquisa, destaca-se relevância de se
considerar uma abordagem variada para amortecer os efeitos do trauma preventivamente
cultivando principalmente a resiliência e aumentando a gratidão.
Outro recente estudo (SHAO; GAO, CAO; 2016) investigou os possíveis benefícios de
intervenção psicológica baseada na gratidão e mindfulness para efeitos positivos e negativos
em pacientes com câncer cervical, que se submeteram a instrumentos de auto relato de afeto
positivo e negativo, ruminação e reavaliação antes e após a intervenção de 4 semanas. Os
resultados obtidos apontaram efeitos benéficos para a implementação desta breve intervenção
psicológica em oncologia.
Pesquisa de Sirois & Wood (2017) proposta como estudo inicial das associações
longitudinais de gratidão ao bem-estar psicológico no contexto de doença crônica, revela
evidências importantes sobre a relevância da gratidão para as populações clínicas relacionadas
à saúde. Examinando as associações longitudinais entre gratidão e depressão em duas
amostras de doenças crônicas, artrite e doença inflamatória intestinal, a gratidão foi
negativamente associada aos sintomas depressivos tanto durante o tratamento quanto após
seis meses da primeira aplicação da pesquisa. Os resultados contribuem para o entendimento
de que a utilização da gratidão contribui para amenizar os sintomas depressivos.
Ainda no contexto da saúde, Otto, Szczesny, Soriano, Laurenceau & Siegel (2016)
realizaram estudo com mulheres portadoras de câncer de mama com uma intervenção de
gratidão online de 6 semanas e grupo de controle. Os resultados apontaram que aquelas
pacientes que viveram a experiência de intervenção de gratidão experimentaram uma
diminuição significativa de medo constante de morte, em comparação com a condição de
controle, ou seja, aqueles que não realizaram a intervenção de gratidão.
O trabalho de Kryniska, Lester, Lyke, Corveleyn (2015) visou testar um modelo de
efeitos causais entre gratidão, religiosidade, razões de vida, enfrentamento e apoio social
como preditores de ideação suicida, ameaças de suicídio e tentativas de suicídio após controle
de depressão e eventos estressantes da vida. Os resultados encontrados mostram que tanto a
gratidão como a religiosidade, juntamente com o apoio social, as habilidades de
enfrentamento e as razões para viver, correlacionaram negativamente com a ideação suicida
anterior.
A pesquisa de Cheng, Tsui, Lam (2015) investigou se dirigir a atenção de profissionais
de saúde aos eventos gratos no trabalho poderia reduzir o estresse e os sintomas depressivos.
Foi realizado um estudo duplo-cego, randomizado e controlado, em cinco hospitais públicos
com seguimento até três meses pós-tratamento, com a participação de cento e dois praticantes
distribuídos aleatoriamente em três condições: gratidão, aborrecimento e tratamento nulo. Os
resultados apontam que essa prática de gratidão foi eficaz para reduzir o estresse e os
sintomas depressivos entre aqueles profissionais.
Esses exemplos mostram o recente interesse da investigação e aplicação da gratidão no
campo da saúde, como alternativa viável e democrática que promova melhorias significativas
e possivelmente possa ser excelente recurso tanto preventivo quanto curativo para diferentes
doenças.

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6. Conclusão
Na revisão da literatura a respeito da gratidão é possível identificar diferentes contextos
históricos e científicos em que ela é analisada e admirada. Seja como afeto moral, emoção
positiva ou com disposição para perceber ou agir, percebe-se o reconhecimento do benefício
recebido, bem como do valor daquele que o ofereceu.
Seus benefícios para a saúde emocional, física e social revelam o grande valor da
gratidão, principalmente por levar à felicidade, seja de forma direta como o aumento do bem-
estar, seja através da redução de sintomas como ansiedade e depressão.
Tendo em vista que a maioria dos estudos encontrados ainda é de literatura estrangeira,
sugere-se a realização de estudos brasileiros tanto na validação dos instrumentos já elaborados
para aplicação em estudos empíricos, quanto no aumento da produção de textos para estudo e
aplicação da gratidão.
Este trabalho pretende enfatizar, portanto, sobre pesquisas e práticas da gratidão como
forma de promover melhorias na qualidade de vida das pessoas. Como demonstrado nos
estudos, mostra-se uma atitude que pode ser promovida e desenvolvida, que quando manifesta
promove a retroalimentação de emoções positivas. Enfim, uma espiral positiva ascendente
que seguramente contribuirá para avanços no campo da saúde, relacionamentos e
desenvolvimento humano.

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