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SEDUC-CE

Temas Educacionais e Pedagógicos. 1 História do pensamento pedagógico brasileiro. ..................... 1


1.1 Teoria da educação, diferentes correntes do pensamento pedagógico brasileiro. ........................ 5
1.2 Projeto político pedagógico. ........................................................................................................ 21
2 A didática e o processo de ensino e aprendizagem. 2.1 Organização do processo didático:
planejamento, estratégias e metodologias, avaliação. ........................................................................... 34
2.2 A sala de aula como espaço de aprendizagem e interação. ........................................................ 49
2.3 A didática como fundamento epistemológico do fazer docente. .................................................. 56
3 Principais teorias da aprendizagem. 3.1 Inatismo, comportamentalismo, behaviorismo,
interacionismo, cognitivismo. 3.2 As bases empíricas, metodológicas e epistemológicas das diversas
teorias de aprendizagem. ...................................................................................................................... 64
3.3 Contribuições de Piaget, Vygotsky e Wallon para a psicologia e pedagogia. .............................. 72
3.4 Teoria das inteligências múltiplas de Gardner. ............................................................................ 77
3.5 Psicologia do desenvolvimento: aspectos históricos e biopsicossociais. ..................................... 86
3.6 Temas contemporâneos: bullying, o papel da escola, a escolha da profissão, transtornos
alimentares na adolescência, família, escolhas sexuais. ..................................................................... 110
4 Teorias do currículo. 4.1 Acesso, permanência e sucesso do aluno na escola. ........................... 151
4.2 Gestão da aprendizagem. 4.3 Planejamento e gestão educacional. ......................................... 156
4.4 Avaliação institucional, de desempenho e de aprendizagem. ................................................... 164
4.5 O Professor: formação e profissão. ........................................................................................... 198
4.6 A pesquisa na prática docente. ................................................................................................. 201
4.7 A dimensão ética da profissão. ................................................................................................. 213
5 Aspectos legais e políticos da organização da educação brasileira. ............................................ 222
6 Políticas educacionais para a educação básica. .......................................................................... 238
6.1 Ensino Médio. 6.1.1 Diretrizes, Parâmetros Curriculares, currículo e avaliação. 6.1.2
Interdisciplinaridade e contextualização no Ensino Médio. 6.1.3 Ensino Médio Integrado: fundamentação
legal e curricular. ................................................................................................................................. 250
6.2 Educação Inclusiva. .................................................................................................................. 294
6.3 Educação, trabalho, formação profissional e as transformações do Ensino Médio. 6.4 Protagonismo
Juvenil e Cidadania. ............................................................................................................................ 304

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Temas Educacionais e Pedagógicos. 1 História do pensamento pedagógico
brasileiro.

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Pensamento Pedagógico Brasileiro1

O Brasil, no início do século XIX, ao cabo de três séculos de colonização era um país de contrastes,
de situações extremas: de um lado o litoral e de outro o sertão, riqueza e pobreza, cultura popular
sincrética e ortodoxia filosófica e religiosa, de uma devassidão de costumes e de uma rigidez impecável
de comportamento, valores cristãos e de escravidão, mandonismo rural e massa servil, economia
exportadora e produção de autoconsumo, prevalecendo ainda a contradição de um país dividido em
múltiplas dicotomias. E uma delas, a educação.
Lembremos que a nação brasileira, conforme Monarcha era inculta, patriarca, conservadora,
oligárquica e acima de tudo, estava atrasada e doente. Na verdade, esta foi a cara do Brasil na Primeira
República, que sucede o período de escravidão, da abolição e do tempo monárquico pós-independência.
Neste atravessamento, os livres-pensadores da época, com suas visões incertas de mundo, livres da
religião e cheios de métodos-científicos veem no novo regime – A República, como derradeira abolição
dos privilégios de classe, cor, raça e religião. Todavia não representou a alforria para a maioria ao
ingresso na vida, no mercado de trabalho e em especial na educação. Isto porque não houve
esclarecimento e conquista das massas humanas, sob os princípios das luzes e virtudes que por sinal
foram a euforia da aurora da Primeira República, mas que, infelizmente esquecida e apagadas as luzes
e as virtudes postas de lado, em favor da “[...] depravação dos costumes, à predominância dos vícios
oligárquicos [...], à transformação da liberdade em licenciosidade, à instrução popular reduzida ao ler e
escrever de poucos”. Na verdade milhares de excluídos da alfabetização.
E o Estado-República? Após treze anos, o governo nada fez para ensinar o povo a ler e escrever. De
repente o governo acorda e se depara com a possível ruína da nação, das elites e do povo, pois o ímpeto
modernizador republicano se perderá. Sem povo não existe nação e não temos povo no Brasil, porque
não temos educação nacional organizada.
A intervenção ou medicação para esta crise foi indicada em 1927, na 1ª Conferência Nacional de
Educação, no qual profissionais especialmente do campo da saúde e do ensino por meio do lema norte-
americano: sanitation over all, visam a higienização do povo através do saneamento do meio físico, social
e moral eliminando a “doença endêmica multiforme e a ignorância do povo”.
O povo é inculto e está doente! Acreditem, a educação e a saúde são o elixir com direito a bula que
deverá higienizar e educar o povo. Tomando, lendo e seguindo a risca a bula o povo terá acesso à riqueza,
ao progresso, ao civismo, ao respeito e moralidade tão desejados ao povo ou do povo para alguém?
Conforme Bomeny, “O grande problema do Brasil, o analfabetismo de praticamente 80% de sua
população, aparece como uma condenação ao projeto republicano.” Essa citação apresenta um quadro,
não tão confiável em termos de dados conforme Bomeny, mas delata a instabilidade educacional e política
da nação no inicio do século XX. Para corrigir tal distorção, houve um empenho nacional pela
alfabetização em massa. “O remédio parecia milagroso: alfabetizando a população, corrigiam-se de
pronto todas as mazelas que afetavam a sociedade brasileira em sua expressiva maioria”. Na verdade,
vigorou o princípio da ciência positivista com caráter liberal, como direção essencial para instaurar o
progresso, a inovação no país. Um destes movimentos foi chamado de Escola Nova, tendo como base
Anísio Texeira e organizado por intelectuais inspirados nas ideias político-filosóficas de igualdade entre
os homens e do direito de todos à educação. “O movimento via na educação integral vinculada a um
sistema estatal de ensino público, livre e aberto, como sendo capaz de modernizar o homem brasileiro, e
de transformar essa espécie de “Jeca Tatu” em um sujeito laborioso, disciplinado, saudável e produtivo”.
Devemos considerar que esta força intelectual, desejava pela educação, salvar o Brasil do estrago
causado por uma política educacional elitista, responsável pelos índices de analfabetismo, bem como

1
Texto adaptado de MÜLLER, C. A. baseado no livro de GADOTTI, M. Pensamento Pedagógico Brasileiro.

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pela doença que se alastrou sobre a nação. Nesta perspectiva, os ideais para a renovação da educação
foram influenciados em grande parte pela calorosa “conversão” de Anísio Teixeira no movimento
educacional norte-americano (pragmatismo), pelo qual o aprendizado ocorre pela capacidade de
observação, experimentação do aluno tendo como orientador, ou facilitador o professor treinado para este
fim.
O movimento reformador queria ver contemplado as suas demandas político-pedagógicas por meio de
um sistema nacional de educação, bem como definir um programa educacional para o país. Houve muitas
discussões e participações de segmentos. A Igreja acaba participando da discussão na tentativa de
garantir seus interesses e territórios enquanto formadora de mentes e de condutas. Já, os educadores
reformistas que elaboraram em 1932 o Manifesto da Educação Nova, defendendo a democratização da
educação - escola pública gratuita e laica.
Em contrapartida, outro movimento buscava estabelecer a proposta de Fernando Azevedo, que tem
como base a distinção clara entre educação para elite, enquanto civilizadora e, a educação para a massa,
enquanto força instintiva e afetiva. As discussões se estenderam, e os pioneiros são acusados de
partidários de ideais contrários aos interesses da nação. O interessante é que este grupo objetivava ser
reconhecido como base para uma sociedade capitalista, liberal e de livre-mercado.
Todavia, no pós 1930, alguns interesses educacionais da nação foram reclamados na Reforma de
Capanema, e houve a retomada das campanhas sanitaristas, que viabilizaram as Reformas no Ensino
Secundário tendo como base as orientações humanistas de caráter elitista; criação do Sistema de Ensino
Profissional (Senai, Sesi, Senac, Sesc) direcionado ao povo visando formar mão-de-obra qualificada e,
Reforma Universitária objetivando um padrão nacional de organização. Em suma, criados para incorporar
a massa inculta ao mercado de trabalho e este efeito permanece até hoje.

Por uma prática libertadora

No atravessamento de ideais, Germano, diz que a vida política do Brasil sempre esteve enlaçada pelas
Forças Armadas e em especial pelo exército, principalmente a partir da segunda metade do século XIX,
com a Guerra do Paraguai, a qual revelou conflitos entre o Exército e o Poder Imperial. Esses laços se
estenderam à abolição da escravatura em 1888; na instauração da República em 1889; cooperou para o
fim da República em 1930; auxiliou no estabelecimento da ditadura de Vargas, período conhecido como
Estado Novo; destituiu o mesmo Vargas em 1945, bem como, esteve presente no suicídio de Vargas; e,
instaurou o golpe de Estado de 1964.
O Estado Novo constitui-se, de acordo com Germano, na consolidação do domínio burguês no Brasil
e este movimento efetiva uma acentuada intervenção do Estado na economia, na modernização, na
educação, entre outros, fazendo com que os militares abandonem as posições reformistas e busquem
neste momento, o fortalecimento das “Forças Armadas, na segurança interna e na defesa externa”. Esse
deslocamento dos militares preanuncia um aspecto importante do pós 64: a ideologia da Segurança
Nacional. Ou seja, é o momento do antiliberalismo e do anticomunismo.
Devido a crise econômica e política, o inicio dos anos 60 foi crítico para as elites brasileiras. Conforme
Germano, a instabilidade e insustentabilidade do Estado em criar condições favoráveis para um
crescimento econômico e de garantir a seletividade de classe e a reprodução da dominação política da
burguesia, em 1964 é deflagrado através da participação da elite, de multinacionais, do Governo dos
Estados Unidos, e das Forças Armadas como executiva, o golpe, chamado pelos militares de Revolução
de 64. A ditadura foi consolidada enquanto processo pelos chamados Atos Institucionais - AI, por meio
dos quais, os direitos civis são aluídos. Nessa brutal repressão, milhares de pessoas tornaram-se
expatriados políticos, torturadas, mortas em nome da Segurança Nacional.
O regime militar, deste período, realizou a Reforma Universitária, através da Lei 5.540/68, e a Reforma
do Ensino de 1° e 2° Graus, Lei 5.692/71. Nessas propostas, o homem deverá ser adestrado para a
Segurança Nacional.
Em um cenário de intensos discursos e ações, surgem ideais em favor de reformas estruturais na
sociedade brasileira. Em um primeiro momento, Paulo Freire traz a possibilidade de compreendermos
que pela educação, enquanto prática libertadora será possível ampliar a participação das massas e
conduzi-las à sua organização crescente, conforme Gadotti citando Freire:
[...] as elites (intelectuais) são assistencionalistas e não têm receio de recorrer à repressão e ao
autoritarismo quando se sentem ameaçadas. Por outro lado, as classes médias estão em busca
de ascensão social e se apoiam nas elites. Desta forma, a solução para transformar a sociedade
opressora está nas mãos das massas populares, “conscientes e organizadas”.
Nessa perspectiva, a pedagogia do oprimido3, enquanto processo, buscaria a superação de uma
cultura colonial para uma sociedade aberta. Esse movimento deveria buscar a conscientização do sujeito

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articulado com uma práxis desafiadora e transformadora da realidade. Para tanto, torna-se imprescindível
estabelecer um diálogo crítico horizontal (oposta ao eletismo) como condição para favorecer e sustentar
o amor, a humildade, a esperança, fé e confiança nas relações entre os sujeitos para descobrirem-se
como sujeitos históricos no processo.
Em linhas gerais, Paulo Freire, conforme Gadotti caracteriza duas concepções opostas de educação:
a concepção bancária literalmente burguesa, pois, o educador é o que sabe e julga e os alunos meros
objetos. Em contrapartida, a concepção problematizadora funda-se justamente na relação dialógico-
dialética entre educador e educando – ambos aprendem juntos, ambos se emancipam.
Ser fiel a Paulo Freire significa, antes de mais nada, reinventá-lo e reinventar-se como ele. Nisto, aliás,
consiste a superação (aufhebung) na dialética: não é nem a cópia e nem a negação do passado, do
caminho já percorrido pelos outros. É a sua transformação e, ao mesmo tempo, a conservação do que há
de fundamental e original nele, e a elaboração de uma síntese qualitativa.
Em outro movimento, de acordo com Gadotti, o educador e antropólogo Brandão nos apresenta a
educação popular como alternativa à educação dominante e à conquista de novas formas de organização
de classes. Esse deslocamento aconteceria através de uma educação como processo de humanização
ao longo da vida e de maneira variada.
Então, o processo de ensino-aprendizagem não é algo imposto e sim um ato de conhecimento e de
transformação social, pois, o aprender se daria a partir do conhecimento que o aluno traz consigo, ou
seja, um saber popular e para o educador é estar comprometido politicamente e, ser solidário e
responsável por buscar a direção justa para que possam em conjunto construir uma consciência cidadã
até que o “povo assume de uma vez o leme e a direção do barco”.
Nesta perspectiva, a educação popular, será um processo que busca na organização e na persistência,
a participação na formação, o “fortalecimento e instrumentalização das práticas e dos movimentos
populares, com o objetivo de apoiar a passagem do saber popular ao saber orgânico, ou seja, do saber
da comunidade ao saber de classe na comunidade”.
Em uma sociedade, conforme Gadotti, que se fundamenta nos princípios da eficiência e do lucro, as
pessoas acabam dissipando sua identidade e viram função alienada que segue às cegas as regras da
moral, da ciência, da religião etc., que são articuladas pelo poder mágico do discurso vigente.
Nesse contexto, Rubem Alves propõe a educação como um espaço possível de desinstalação. Ou
seja, procura construir uma educação, uma escola, enquanto espaço de prazer e da fala. Este é o enfoque
principal de Alves, citado por Gadotti, a linguagem, a fala ao lado do corpo.
O educador fala com o corpo. É no corpo de cada educador e de cada educando que estão escritas
as suas histórias. Daí a necessidade de lê-lo e relê-lo constantemente. O corpo é o primeiro livro que
devemos descobrir; por isso, é preciso reaprender a linguagem do amor, das coisas belas e das coisas
boas, para que o corpo se levante e se disponha a lutar.
Mostra a importância da formação do educador comprometido consigo mesmo e com o aluno, capaz
de superar a burocratização e a uniformização a que são submetidos. Inquietando-se com o papel da
saber e com a crescente desumanização das relações humanas.
Nas palavras de Gadotti, é valorizar o prazer, o sentimento, a arte e a paixão na educação e na vida
humana. O melhor método? O método do amor é melhor do que o racional para educar, aprender e
ensinar.
E por que não nos deixarmos envolver pela paixão de conhecer o mundo? Eis a proposta de prática
pedagógica de Madalena Freire, na qual é possível o exercício do diálogo desde a primeira educação
articulando conhecer e viver, envolvidos pela paixão.
O trabalho de Madalena Freire, conforme Gadotti busca superar a dicotomia entre o cognitivo e o
afetivo para que a educação seja um processo prazeroso. Nas palavras de Madalena Freire: o ato de
conhecer é tão vital como comer ou dormir, e eu não podemos comer ou dormir por alguém. A escola em
geral tem esta prática, a de que o conhecimento pode ser doado, impedindo que a criança e, também, os
professores o construam. Só assim a busca do conhecimento não é preparação para nada, e sim VIDA,
aqui e agora. E é vida que precisa ser resgatada pela escola.
A partir do vivido da criança, o educador pode planejar e organizar as atividades escolares sem perder
a direção pedagógica e o seu papel organizativo. As atividades se configuram a partir dos interesses das
crianças, da sua vivência, para que o processo de construção do conhecimento e do afetivo, por exemplo,
a alfabetização e a construção de um sistema de representação (leitura e escrita), fluam naturalmente na
vida da criança para que quando adulto, a vida possa fluir sem artifícios.
É procurando compreender as atividades espontâneas das crianças que vou, pouco a pouco, captando
os seus interesses, os mais diversos. As propostas de trabalho que não apenas faço às crianças, mas
que também com elas discuto, expressam, e não poderia deixar de ser assim, aqueles interesses.

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Não é de estranhar, pois, que as crianças se encontrem nas suas atividades e as percebam como algo
delas, ao mesmo tempo em que vão entendendo o meu papel de organizadora e não de “dona” de suas
atividades.
Creio que cabe aos professores o exercício proposto por Freire, de se permitirem entender a
espontaneidade dos nossos alunos (crianças, jovens, adultos), enquanto condição possível para
desestabilizar uma pedagogia atrelada desde muito tempo à autoridade, para reprodução
homogeneizadora e, como “campo de vigilância sobre o tempo, o espaço, o movimento, os gestos, para
produzir corpos submissos, exercitados e dóceis”.
Na verdade, o movimento proposto e quando articulado às práticas pedagógicas é dar sentido não
somente para as atividades, mas também às relações que se constituem no espaço pedagógico. Esse
deslocamento chama para uma nova postura não somente ao professor, mas também ao aluno.
Ao professor, Gadotti citando Chauí cabe algumas perguntas: qual há de ser a função do educador
atual? Como romper com essa violência chamada modernização? Como não cair nas armadilhas do
conhecer para não pensar, adquirir e reproduzir para não criar, consumir em lugar de realizar o trabalho
de reflexão?

Ampliando ideais, emancipando ideias.

Refletindo sobre os discursos, os ideais e práticas do ontem e do hoje, salvo importantes exceções,
percebe-se a constância não somente na nossa história política, mas também à educação voltada, nas
palavras de Germano, para manobras do alto, estabelecendo a continuidade, as restaurações, as
intervenções e exclusões das massas populares por meio do autoritarismo.
Não é para menos que a insígnia, conforme Gadotti, da tradição brasileira é a influência de oligarquias
que “compartilham” interesses para conservar o controle do poder.
Hoje, esses conceitos e práticas se estendem e respingam na educação com um novo figurino, uma
nova e boa maquiagem em nome do moderno. Todavia, modernizar ainda significa, de acordo com
Gadotti citando Florestan Fernandes, reajustar as economias periféricas às estruturas e aos dinamismos
das economias centrais e é claro, ao bom andamento dos negócios.
Nesta perspectiva, uma coisa é certa: de um passado muito presente o pensamento pedagógico
brasileiro busca uma práxis, conforme Germano, de resistência à dominação de classe, ao domínio
estrangeiro, ao imperialismo e à transplantação cultural, configurando-se como um instrumento de luta
em favor da identidade nacional, mediante a valorização e o fortalecimento das raízes culturais do povo
brasileiro em busca da construção de um futuro melhor, diferente do passado/presente.
Todavia devemos considerar de acordo com Gadotti, para o qual a crise do modelo de educação
voltada para a rigidez e inflexibilidade não é apenas interna à escola e sim de acordo com os autores
Schwartzman e Brock, que o problema da educação no Brasil, em um primeiro momento, estava
erroneamente pautado na falta de escolas, às crianças que não iam para a escola, e à carência de verbas.
Neste sentido, foi considerada, a necessidade de construir escolas, melhores salários ao corpo docente
e claro, convencer os pais a enviarem seus filhos à escola.
Passados alguns bons anos, nos deparamos com os reais problemas: a má qualidade das escolas, a
famosa repetência e acrescento aqui a qualidade das aprendizagens. Como após tantas reformas,
investimentos, e elaborações de políticas e ações à educação, persistem ainda as elevadas taxas de
evasão e repetência e muitas outras dificuldades?
Creio que muitas escolas hoje estão afastadas não de uma concepção democrática e libertadora. Isto
porque, na grande maioria dos PPP das escolas, estas propostas, conceitos se fazem presentes na
escrita. Mas, no planejamento, na prática, no exercício diário da intervenção pedagógica em sala de aula,
esta práxis não se faz presente.
Tristemente, encontramos influência de uma pedagogia, conforme Gadotti, do bom senso, e do
silêncio, desconectada da vida dos educadores e dos alunos. “Uma vida opaca e conciliadora, e na qual
é preciso ser falso, esconder interesses, montar estratégias, ser “esperto” e “levar vantagem.
Entretanto, se o Brasil precisa de mais e melhor educação, conforme previsto no Programa de Governo
de Dilma Rousseff é porque a qualidade do ensino é um dos pilares que sustenta a proposta por meio da
valorização do professor. Valoração, renovação, ação. Eis o sentido, das formações e\ou capacitações
que deverão propiciar ao professor a redescoberta da sua função e tarefa - assumidas em juramento.
Fazer com que o professor saia de um monólogo e busque entender as relações recíprocas existentes
entre domínio do saber e o domínio do saber fazer. Ou seja, tomar consciência do seu verdadeiro
exercício, como dinamizador do processo de ensino-aprendizagem e organizador da intervenção
pedagógica. Esse processo de reflexão em formação pode tornar consciente os modelos teóricos e
epistemológicos que se evidenciam na sua prática, para então refletir sobre o saber e o saber fazer. Essa

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situação levará o professor a rever o que propôs e se dispor a novas possibilidades, modificando sua
proposta, dispondo-se a repensá-la, ou manter a mesma proposição.
Neste sentido, penso que a questão pontual para uma melhor educação seja a possibilidade do
professor estabelecer relações entre teoria e prática, assumindo seu papel no processo de ensino-
aprendizagem e a importância deste trabalho ser em conjunto entre professor x aluno, professor x
professor. É buscar dar sentido ao que somos ao que fazemos e por que fazemos.
Na verdade as colocações apresentadas nos mostram o esforço para permitir um processo de ensino-
aprendizagem voltado à constituição de sentidos, ou seja, produzir significado mostrando ao aluno o que
aquele conteúdo tem a ver com a vida dele e por que é importante e como aplicá-lo em uma situação real.
Chamar os professores, conforme Mello, para uma reflexão sobre a própria prática pedagógica: o que se
faz e com quais objetivos se faz. Torna-se muito importante ter um parâmetro de como estamos para
saber o que precisamos mudar. Ninguém muda se não tem consciência do que precisa mudar. Já
sabemos o que mudar?
Penso que se este movimento estiver, conforme Gadotti, a construir um caminho próprio, libertando-
se de um pensamento transplantado, buscando realmente a superação e transformação das
dependências enraizadas nos modelos, nos paradigmas e das teorias elaboradas em outros contextos,
em especial aqueles de países hegemônicos, estaremos sim, caminhando para um comprometimento
real para a transformação social.
Um processo, uma luta contra si mesmo à tomada de consciência e contínua; o engajamento, por uma
real mudança.

1.1 Teoria da educação, diferentes correntes do pensamento pedagógico


brasileiro.

O pensamento pedagógico moderno: iluminista, positivista, socialista, escolanovista,


fenomenológico-existencialista, antiautoritário, crítico2.

O Pensamento Moderno.

Nos séculos XVI e XVII, surge uma classe social contra o modo de produção feudal. Modificou e
concentrou novos meios de produção, iniciando um sistema de cooperação, começando um trabalho em
série que se estruturou no século XX. Assim, a produção não se apresentava mais isoladamente,
passando a constituir um esforço coletivo.
Essa sociedade buscou o domínio sobre a natureza, desenvolvendo técnicas, artes, estudos, como a
matemática, astronomia, ciências físicas, geografia, medicina e biologia.
Giordano Bruno (1548­1600) desenvolveu a astronomia; Galileu Galilei (1564­1642) construiu um
telescópio, descobriu os satélites de Júpiter e a lei da gravidade; William Harvey (1578­1657) teorizou a
circulação do sangue; Francis Bacon (1561­1626) criou uma nova organização para as ciências, propondo
a diferença entre a fé e a razão, não se envolvendo nas divergências religiosas que deixam em dúvida a
compreensão da realidade – criou o método indutivo de investigação que foi uma de suas obras que se
opôs ao método de Aristóteles de dedução. Bacon é considerado o precursor do método científico
moderno. René Descartes (1596- 1650), escritor do Discurso do Método, mostra os caminhos para o
estudo e a pesquisa, que além de criticar o ensino humanista, propôs a matemática como ciência perfeita.
Descartes confirmou o dualismo da filosofia, quando se referiu à relação entre o pensamento e o ser.
Convicto do potencial da razão humana, criou um método novo, o de conhecimento do mundo substituindo
a fé pela razão e pela ciência. Torna-se assim o pai do racionalismo. Procurou conciliar a religião e a
ciência, mas sofreu influência da burguesia no século XVII, considerada, ao lado das ideias progressistas
da França, o medo das classes populares.
Descartes apresentou, pelo Discurso do Método, quatro princípios:

- Não considerar como verdadeiro o que não se conhecesse, ou seja, evitar a precipitação não
conceituando o que não se apresentasse claro ou se apresentasse com dúvida.
- Dividir cada dificuldade encontrada em número de parcelas possíveis e necessárias para melhor
resolvê-Ias.

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UNINOVE. História do Pensamento Pedagógico.

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- Conduzir ordenadamente os pensamentos, pelas coisas mais simples e fáceis, e pouco a pouco
chegar até o conhecimento das mais complicadas.
- Numerar tudo e revisar, para ter a certeza de nada omitir.

Descartes, precursor da filosofia moderna, escreveu sua principal obra em francês, uma das línguas
populares à época, possibilitando acessibilidade de um maior número de pessoas. O latim medieval se
representava como o representante da religião, da filosofia, da diplomacia e da literatura. Já o comércio
se utilizava das línguas como o italiano, o espanhol, o holandês, o francês, o inglês e o alemão.
No século XVI, ocorreu uma grande revolução linguística, exigindo dos educadores o bilinguismo, ou
seja o latim e o vernáculo. A Igreja percebeu a importância desse conflito, exigindo, através do Concílio
de Trento (1562), que as pregações ocorressem em vernáculo, ou seja, na língua popular da região em
que se estivesse.
Após o Discurso do Método, João Amos Comênio (1592-1670) escreveu a Didática Magna (1657),
como método pedagógico. Ensinar palavras, como sombras das coisas, Comênio dizia que a escola
deveria ensinar o conhecimento das coisas. O pensamento pedagógico moderno caracterizava-se pelo
realismo.
John Locke (1632-1704) perguntava-se de que serviria o latim para a sociedade, que trabalha nas
fábricas. Ensinar mecânica e cálculo era mais importante. Mas as classes dirigentes continuavam
aprendendo latim e grego: um bom cidadão deveria recitar versos de Horácio ou Ovídio aos ouvidos
apaixonados de sua namorada. As humanidades continuavam fazendo parte da educação da nobreza e
do clero. Locke, em seu Ensaio sobre o entendimento humano, combateu o inatismo, antepondo a ideia
da experiência sensorial, ou seja, nada existe em nossa mente que não tenha sua origem nos sentidos.
A pedagogia realista é contra o formalismo humanista, pregando a superioridade do domínio do mundo
exterior sobre o domínio do mundo interior, a supremacia das coisas sobre as palavras. Desenvolveu a
paixão pela razão (Descartes) e o estudo da natureza (Bacon). De humanista, a educação torna-se
científica. O conhecimento só possuía valor quando preparava para a vida e para a ação.
O surto das ciências naturais, da física, da química, da biologia, despertou interesse pelos estudos
científicos e abandonou os estudos de autores clássicos e das línguas da cultura greco-Iatina. Até a moral
e a política deveriam ser modeladas pelas ciências da natureza. A educação não era mais considerada
um meio para aperfeiçoar o homem. A educação e a ciência eram consideradas um fim em si mesmo.
O cristianismo afirmava que era preciso saber para amar. Ao contrário, dizia Bacon, saber é poder,
sobretudo poder sobre a natureza. Dividia as ciências em da memória ou histórica, da imaginação ou
poética, e da razão ou filosófica.
Locke colabora com a educação da seguinte forma: a criança, ao nascer, era, segundo ele, uma tábula
rasa, um papel em branco sobre o qual o professor podia escrever de tudo.
Comênio, considerado o grande educador e pedagogo moderno e um dos maiores reformadores
sociais de sua época, foi o primeiro a propor um sistema articulado de ensino, reconhecendo o igual direito
de todos ao saber. Para ele, a educação deveria ser permanente, isto é, acontecer durante toda a vida.
Afirmava que a educação nunca termina porque nós sempre estamos sendo homens e, portanto, estamos
sempre nos formando.
Comênio é defensor de que a organização do sistema educacional deveria compreender 24 anos,
correspondendo a quatro tipos de escolas: a escola Materna, dos 0 aos 6 anos; a escola Elementar ou
Vernácula, dos 6 aos 12 anos; a escola Latina ou Ginásio, dos 12 aos 18; e a
Academia ou Universidade, dos 18 aos 24 anos. Em cada família deveria existir uma escola Materna;
em cada município ou aldeia, uma escola Primária; em cada cidade, um Ginásio; e em cada capital, uma
Universidade.
O ensino deveria ser unificado, todas as escolas deveriam ser articuladas. Seriam assim distribuídas:
a escola Materna cultivaria os sentidos e ensinaria a criança a falar; a escola Elementar desenvolveria a
língua materna, a leitura e a escrita, incentivando a imaginação e a memória, além do canto, das ciências
sociais e da aritmética. A escola Latina se destinaria, sobretudo, ao estudo das ciências. Para os estudos
universitários, recomendava trabalhos práticos e viagens.
Aí se formariam os guias espirituais e os funcionários. À academia só deveriam ter acesso os mais
capazes.
Como se vê, apesar dos avanços, a educação das classes populares e a democratização do ensino
ainda não se colocava como questão central. Aceitava-se facilmente a divisão entre o trabalho intelectual
e o trabalho manual, resultado da própria divisão social. Para as classes dominantes, o ideal era a
formação do galant homme, que almejava a conquista de uma posição nas cortes. Daí teve-se na época
um enorme desenvolvimento das academias cavalheirescas.

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Os grandes educadores da ocasião eram na verdade clérigos ou preceptores de príncipes e nobres.
Essa educação nobre procurava desenvolver a curiosidade, a instrução atraente e diversificada, por meio,
de historietas e fábulas, com finalidade moral e religiosa. Ser honesto, sábio, ter bom gosto e espírito
nobre e galanteador. Assim a educação da classe dominante seria composta pelo clero e pela nobreza.
Já no século XVII surge a luta das camadas populares pelo acesso à escola. Instigada pelos novos
intelectuais iluministas e por novas ordens religiosas, a classe trabalhadora, em formação, podia e devia
ter um papel na mudança social. O acesso à formação tornou-se essencial para articular seus interesses
e elaborar sua própria cultura de resistência.
Entre os protestantes, os metodistas, por exemplo, impulsionaram as escolas dominicais, que, embora
pretendessem utilizar a escola como veículo de formação religiosa, possibilitavam o acesso de crianças
pobres e necessitadas ao saber. Alguns principados alemães providenciaram uma legislação específica
da escola, além de se criar bibliotecas públicas ainda no século XVII.
No século seguinte surgem as bibliotecas circulantes. Ao contrário da ordem dos jesuítas, surgiram
várias ordens religiosas católicas que se dedicavam à educação popular: a congregação dos oratorianos,
fundada por Filipe Néri (1515­1595) ; a Sociedade dos Irmãos das Escolas Cristãs, fundada por Jean
Baptiste de La Salle (1651- 1719). Muitas dessas escolas ofereciam ensino inteiramente gratuito e na
forma de internato. Tratava-se, contudo, de uma educação filantrópica e assistencialista.
Esses dois modelos de educação, o primeiro real e público, e o segundo religioso e privado, foram
exportados para as colônias: para a América britânica, o modelo das escolas dominicais protestantes;
para a América espanhola e portuguesa, as escolas católicas.

O Pensamento Iluminista

Entre 1453 e 1789, determina-se o período da Idade Moderna, com o predomínio do sistema
absolutista, concentrando o poder nas mãos do clero e da nobreza.
A Revolução Francesa acabou com essa situação. Ela já fazia parte do discurso dos grandes
pensadores daquela época, denominados de iluministas. Voltados para a racionalidade e o combate a
favor das liberdades, contra o pensamento da Igreja e a prepotência dos governantes. Esses pensadores
eram também chamados de enciclopedistas, pelas ideias liberais publicada sob a supervisão de Diderot
e D'Alembert com o nome de Enciclopédia.
Entre os iluministas, destaca-se Jean-Jacques Rousseau (1712-1778), precursor de uma nova era na
história da educação. Constituiu-se no marco que separa a velha da nova escola. Entre suas obras,
citamos: Sobre a Desigualdade entre os Homens, O contrato social e Emílio. Rousseau resgata a relação
entre a educação e a política, e centraliza o tema da infância na educação.
A criança não seria mais considerada um adulto em miniatura, mas viveria em um mundo próprio
necessário de compreensão; o educador deve fazer-se educando de seu educando; a criança nasce boa,
o adulto é que perverte a criança.
No século XVIII as camadas populares reivindicam a educação pública, e pela primeira vez o Estado
instituiu a obrigatoriedade escolar, como na Prússia, em 1717. Na Alemanha, cresce a intervenção do
Estado na educação, com as Escolas Normais, e planos que se voltam para a grande revolução
pedagógica nacional francesa do final do século.
Nunca se havia discutido tanto a formação do cidadão por meio das escolas como durante os seis
anos da Revolução Francesa. A escola pública é o resultado dessa revolução burguesa. Os teóricos
iluministas buscavam uma educação inspirada nos princípios da democracia, laica e gratuita. Com ela a
ideia da unificação do ensino público acontece em todos os graus, mas ainda era elitista, pois só os com
maior capacidade podiam prosseguir até a universidade.
O iluminismo busca libertar a repressão dos monarcas e o despotismo do clero. O movimento pela
liberdade individual iniciado no período anterior busca refúgio no ideal de vida do bom selvagem, livre de
todos os condicionamentos sociais. É lógico que essa liberdade só podia ser praticada por poucos,
aqueles que eram, livres do trabalho material, e que tinham sua sobrevivência garantida por um regime
econômico de exploração do trabalho.
O estado natural do homem é demonstrado pelo espaço que Rousseau dedicou para uma sociedade
existente entre os homens primitivos, exemplificando os índios das Américas. Sua obra Emílio mostra o
personagem de mesmo nome, educado sem contato com outros homens e com nenhuma religião, apenas
no convívio com a natureza. Sem contato com ninguém, Emílio fica apenas nas mãos de um preceptor
ideal, Rousseau.
A educação não deveria apenas instruir, mas permitir que a natureza acontecesse na criança, sem
reprimi-la buscar modelos. Na teoria da bondade natural do homem é que se baseia Rousseau,

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sustentando que só os instintos e os interesses naturais deveriam direcionar. Direcionava-se para uma
educação racionalista e negativa, ou seja, de restrição da experiência.
Rousseau foi precursor da escola nova, iniciada no século XIX, teve grande êxito na primeira metade
do século XX, sendo ainda hoje muito presente. Suas filosofias tiveram muita influência sobre os
educadores da época, como Pestalozzi, Herbart e Froebel.
Rousseau dividiu a educação em três momentos: a infância (natureza até 12 anos) ; maturidade (força,
razão e paixões, dos 12 aos 20 anos devendo ter o desenvolvimento científico maior para a vida social) ;
a sabedoria e o casamento (dos 20 aos 25anos).
No século XVIII, Rousseau realiza a transição do controle da educação da Igreja para o Estado, e
nessa época desenvolveu-se o esforço da burguesia em estabelecer o controle civil (não religioso) da
educação por meio da instituição do ensino público nacional, assim o controle da Igreja sobre a educação
e os governos civis foi aos poucos decaindo com o crescente poder da sociedade econômica.
A Revolução Francesa baseou-se também nas exigências populares de um sistema educacional. A
Assembleia Constituinte de 1789 elaborou vários projetos de reforma escolar e de educação nacional. O
mais importante é o projeto de Condorcet (1743-1794) propondo o ensino universal para eliminar a
desigualdade.
Contudo, a educação proposta não era exatamente a mesma para todos, pois admitia-se a
desigualdade natural entre os homens. Condorcet reconheceu que as mudanças políticas precisavam ser
acompanhadas de reformas educacionais. Foi partidário da autonomia do ensino, ou seja, cada indivíduo
deveria conduzir-se por si mesmo. Demonstrou ser defensor da educação feminina para que as futuras
mães pudessem educar seus filhos, pois considerava as mulheres mestras naturais.
As ideias revolucionárias tiveram grande influência no pensamento pedagógico de outros países,
principalmente na Alemanha e na Inglaterra, criando seus sistemas nacionais de educação, e na América
do Norte a participação do Estado na educação era significativa.
A Revolução Francesa tentou plantar no educando a consciência de classe, centro do conteúdo
programático, pois a burguesia tinha clareza do que queria da educação, pois trabalhadores com
formação de cidadãos seriam mais participativos de uma nova sociedade liberal e democrática. Os
pedagogos revolucionários foram os primeiros políticos da educação. Alguns, como Lepelletier
(1760-1793), pretenderam que nenhuma criança recebesse outra formação que não a revolucionária, por
meio de internatos obrigatórios, gratuitos e mantidos pelas classes dirigentes. Essa ideia, porém, não
obteve êxito. Seu autor morreu na guilhotina. No final, a própria revolução recusou o programa
educacional de universalização da educação criado por ela mesma.
Froebel (1782-1852) foi o idealizador dos jardins da infância, pois considerava que o desenvolvimento
da criança dependia de uma atividade espontânea (o jogo), uma atividade construtiva (o trabalho manual)
e um estudo da natureza. Valorizava a expressão corporal, o gesto, o desenho, o brinquedo, o canto e a
linguagem. Para ele a auto atividade representava a base e o método de toda a instrução. Como Herbart,
valorizava os interesses naturais da criança. Via a linguagem como a primeira forma de expressão social
e o brinquedo como uma forma de auto expressão.
Depois de Froebel, os jardins da infância se multiplicaram até fora da Europa, atingindo até os Estados
Unidos. Suas ideias ultrapassaram a educação infantil. Os fabricantes de brinquedos, jogos, livros,
material recreativo e jornais para crianças foram influenciados pelas ideias de Froebel. Inspirou-se nele
John Dewey, um dos fundadores do pensamento escolanovista.
O iluminismo educacional representou o fundamento da pedagogia burguesa, que até hoje insiste
predominantemente na transmissão de conteúdos e na formação social individualista. A burguesia
percebeu a necessidade de oferecer instrução, mínima para a massa trabalhadora. Por isso, a educação
se dirigiu para a formação do cidadão disciplinado. O surgimento dos sistemas nacionais de educação,
no século XIX, foi o resultado e a expressão da importância que a burguesia, como classe ascendente,
emprestou à educação.
Além de Rousseau, outro grande teórico destaca-se nesse período: é o alemão Emanuel Kant
(1724-1804). Descartes defendia que todo conhecimento era inato e Locke que todo saber era adquirido
pela experiência. Kant supera essa contradição, ou seja, mesmo negando a teoria platônico cartesiana
das ideias inatas, mostrou que algumas coisas eram inatas como à noção de espaço e de tempo, que
não existem como realidades fora da mente, mas apenas como formas para pensar as coisas
apresentadas pelos sentidos. Por outro lado, sustentou que o conhecimento do mundo exterior provém
de experiência sensível das coisas.
Admirador de Rousseau, Kant acreditava que o homem é o que a educação faz dele através da
disciplina, da didática, da formação moral e da cultura.
Para Kant, espaço, tempo, causalidade e outras relações não eram realidades exteriores. Essa
afirmação foi acentuada por outros filósofos alemães, entre eles, Fichte (1762-1814) e Hegel (1770-1831),

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que acabaram negando a existência de qualquer objeto fora da mente, pois é o idealismo subjetivo e
absoluto que mais tarde será rebatido por Karl Marx.
O que a moderna ciência da educação, na definição de seus conceitos básicos, chama de aculturação,
socialização e personalização, representa algumas das descobertas de Kant. Para ele, o educando
necessita realizar esses atos, pois é o sujeito que tem de cultivar-se, civilizar-se, para assim corresponder
à natureza. Assim, o verdadeiro objetivo do homem é que desenvolva inteiramente, por si mesmo, tudo o
que está acima da ordem mecânica de sua existência animal e não participe de nenhuma outra felicidade
e perfeição que não tenha sido criada por ele mesmo, livre do instinto, por meio de sua própria razão.
A nova classe mostrou, ao apagar das luzes da Revolução de 1789, que não estava de todo em seu
projeto a igualdade dos homens na sociedade e na educação. Uns acabaram recebendo mais educação
do que outros. Aos trabalhadores, diria Adam Smith (1723-1790), economista político burguês, que será
preciso ministrar a educação apenas em conta-gotas. A educação popular deveria fazer com que os
pobres aceitassem de bom grado a pobreza. Anunciava-se o princípio fundamental de educação
burguesa, sendo uma educação distinta para cada classe, pois a classe dirigente teria a instrução para
governar, e a classe trabalhadora, a educação para o trabalho. Essa concepção dualista da educação
deverá ser sistematizada no século XIX pelo pensamento pedagógico positivista.

O Pensamento Positivista

A concepção da educação burguesa no século XVIII foi consolidada pelo pensamento positivista. No
iluminismo e na sociedade burguesa duas forças opostas se fizeram presentes no final do século XVIII.
O movimento popular e socialista, e o movimento elitista burguês. Eles chegam ao século XIX
denominados de marxismo de Karl Marx, e de positivismo de Augusto Comte.
Comte estudou na escola politécnica de Paris, recebendo influência de alguns intelectuais, como
Joseph Louis Lagrange, matemático e o astrônomo Pierre Simon de La Place.
Secretário de Saint-Simon, seguiu a orientação para o estudo das ciências sociais e as ideias de que
os fenômenos sociais como os físicos podem ser reduzidos a leis, e de que todo conhecimento científico
e filosófico deve ter por finalidade o aperfeiçoamento moral e político da humanidade.
Comte tem como sua principal obra o Curso de Filosofia Positiva, composta de seis volumes,
publicadas entre 1830 e 1842. Separado de sua primeira mulher, conheceu Clotilde de Vaux, cuja morte
ocorreria no ano seguinte. Com ela viveu em perfeita comunhão espiritual.
Depois da perda de Clotilde, Comte transformou-a na sua musa inspiradora para uma nova religião,
cujas ideias se encontram na obra Política Positiva, ou Tratado de Sociologia instituindo a religião da
humanidade (1851-1854). A segunda parte de sua vida teve como objetivo transformar a filosofia em
religião, assim como a primeira parte tentou transformar a ciência em filosofia.
Para Augusto Comte, a derrota do iluminismo e dos ideais revolucionários deveu-se à ausência de
concepções científicas. Para ele, a política tinha de ser uma ciência exata. Já Marx buscava as razões do
fracasso na própria revolução burguesa, que era contraditória, ou seja, proclamava a liberdade e a
igualdade, mas não as realizaria enquanto não mudasse o sistema econômico que instaurava a
desigualdade na base da sociedade.
Uma verdadeira ciência, para Comte, analisa todos os fenômenos, tanto humanos, como os de fatos,
sendo, portanto, uma ciência positiva. Tanto nas ciências da natureza quanto nas ciências humanas, o
afastar qualquer preconceito ou pressuposto ideológico seria coerente. A ciência precisava ser neutra.
Leis naturais e harmônicas regem a sociedade. O positivismo é a doutrina que consolida a ordem pública,
desenvolvendo nas pessoas uma sábia resignação ao seu estado de fato. Nada de doutrinas críticas,
destrutivas, subversivas e revolucionárias como as do iluminismo da Revolução Francesa ou as do
socialismo, ou seja, só uma doutrina positiva serviria de base da formação científica da sociedade.
Comte combateu o espírito religioso, mas acabou propondo a instituição do que chamou religião da
humanidade para substituir a Igreja.
Segundo ele, a humanidade passou por três etapas sucessivas: o estado teológico, durante o qual o
homem explicava a natureza por agentes sobrenaturais; o estado metafísico, no qual tudo se justificava
por meio de noções abstratas como essência, substância, causalidade, etc.; e o estado positivo, o atual,
em que se buscam as leis científicas.
Da Lei dos Três Estados, Comte formalizou o sistema educacional, afirmando que em cada homem as
fases históricas se reproduziriam, que cada indivíduo repetiria as fases da humanidade.
Na primeira fase, a da infância, a aprendizagem não teria um caráter formal, transformaria
gradativamente o fetichismo natural iniciando uma concepção abstrata do mundo. Na segunda, a da
adolescência e da juventude, o homem adentraria no estudo sistemático das ciências.

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Aos poucos, o homem na idade madura chegaria ao estado positivo, passando do estado metafísico.
Não mais abraçaria a religião de um Deus abstrato, e ratificaria a religião do Grande
Ser, a Humanidade. A educação formaria, portanto, a solidariedade humana.
Na realidade, a Lei dos Três Estados, de Comte, acabava esbarrando com a evolução dos educandos.
Estes, de modo algum, seguiam uma previsão tão positiva. De fato, as crianças não imaginavam forças
divinas para explicar o mundo e nem os jovens se mostravam muito preocupados com as abstrações
metafísicas, ou seja, elas não explicam a evolução da história.
Seguindo Comte, Herbert Spencer (1820-1903) deixou a concepção religiosa do mestre e valorizou o
princípio da formação científica na educação. Buscou conhecimentos que realmente contavam para os
indivíduos se desenvolverem, e concluiu que os conhecimentos adquiridos na escola necessitavam, ante
de tudo, possibilitar uma vida melhor, com relação à saúde, ao trabalho, à família, para a sociedade em
geral.
Essa tendência cientificista na educação continuava o movimento sensorialista dois séculos antes.
Mas, na prática, a introdução das ciências no currículo escolar ocorreu muito vagarosamente, resistindo
à dominação da filosofia, da teologia e das línguas clássicas.
A tendência cientificista ganhou força com o desenvolvimento da sociologia em geral e da sociologia
da educação. Afinal, o positivismo negava a metodologia das ciências sociais em relação às ciências
naturais, identificando-as, e essa identificação será posteriormente criticada pelo marxismo.
Um dos principais expoentes na sociologia da educação positivista foi Émilie Durkheim (1858-1917),
que considerava a educação como imagem e reflexo da sociedade.
A educação é um fato fundamentalmente social, e a pedagogia seria a teoria dessa prática social.
Durkheim é o verdadeiro mestre da sociologia positivista moderna. Em Regras do Método Sociológico,
afirma que a primeira regra é considerar os fatos sociais como coisas. A sociedade se compara a um
animal, ou seja, possui um sistema de órgãos em que cada um desempenha um papel específico. Alguns
deles seriam naturalmente mais privilegiados do que outros, e esse privilégio, por ser natural, representa
um fenômeno normal, como em todo organismo vivo, predominando a lei da sobrevivência dos mais
capacitados (evolucionismo) e a luta pela vida, em nada modificável.
Esse conjunto de ideias pedagógicas e sociais revela o caráter conservador e reacionário do
positivismo na educação.
O positivismo é a doutrina que visa à substituição da manipulação do real pela visão científica, e que
acabou estabelecendo uma nova fé, a fé na ciência, que vinculou a imaginação científica à pura
observação experimental. Seu lema sempre foi a ordem e o progresso, acreditando que para progredir
seria preciso ordem, e que a pior ordem é sempre melhor do que qualquer desordem. Portanto, o
positivismo tornou-se uma ideologia da ordem social.
Para os pensadores positivistas, a libertação social e política passava pelo desenvolvimento da ciência
e da tecnologia, sob o controle das elites.
O positivismo nasceu como filosofia, mas, ao dar uma resposta ao social, afirmou-se como ideologia.
A expressão do positivismo no Brasil inspirou a Velha República e o golpe militar de 1964. Nessa ideologia
da ordem, o país não seria mais governado pelas paixões políticas, mas pela racionalidade dos cientistas
desinteressados e eficientes, os tecnocratas.
A tecnocracia, principalmente pós 64, nos oferece um exemplo prático do ideal social positivista,
preocupado apenas com a manutenção dos fatos sociais, e entre eles, a existência concreta das classes.
Isso serviu muito às elites brasileiras, quando sentiram seus privilégios ameaçados pela organização
crescente da classe trabalhadora. Daí terem recorrido aos dirigentes militares, que são as elites ordeiras,
vislumbradas por Comte.
A teoria educacional de Durkheim opõe-se à de Rousseau. Este afirmava que o homem nasce bom e
a sociedade o perverte; Durkheim declarava que o homem nasce egoísta e só a sociedade pode torná­Io
solidário. Por isso, a educação, se definia como ação exercida pelas gerações adultas sobre as gerações
que não se encontravam ainda preparadas para a vida social.
O pensamento positivista, na pedagogia, gerou o pragmatismo que só considerava válida a formação
utilizada na vida presente. Entre esses pensadores, temos Alfred North Whitehead (1861-1947), para
quem a educação é a arte de utilizar os conhecimentos, Bertrand Russel (1872- 1970) e Ludwig
Wittgenstein (1889-1951). Esses últimos estavam preocupados com a formação do espírito científico e
com o desenvolvimento da lógica. Apesar do pouco entusiasmo que os educadores progressistas
brasileiros demonstraram pelo pensamento pedagógico positivista, ele trouxe muitas contribuições para
o avanço da educação, principalmente pela crítica que exerceu sobre o pensamento humanista cristão.
No Brasil, o positivismo influenciou o primeiro projeto de formação do educador, no final do século
passado. O valor dado à ciência no processo pedagógico justificaria maior atenção ao pensamento
positivista. É inegável sua contribuição ao estudo científico da educação.

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O Pensamento Socialista

A educação socialista formou-se do movimento popular pela democratização do ensino. Esse


movimento compartilhou da presença de intelectuais comprometidos com essa causa e com a
transformação social. O conceito socialista de educação se opõe ao da burguesia.
Na educação socialista essas ideias não são recentes, mas por não atender aos interesses
dominantes, têm sido relegadas a um plano inferior.
A república de Platão já seria a manifestação do comunismo utópico, pois ligava a educação à política.
Thomas Morus (1478-1535) fez decididamente a crítica da sociedade egoísta e propôs em seu livro Utopia
o fim da propriedade, a redução da jornada de trabalho para seis horas diárias, a educação laica e a
co-educação.
O francês Graco Babeuf (1760-1796) educou seus filhos formulando princípios da pedagogia socialista,
entre eles uma escola pública e única para todos, manisfestando-se, no seu Manifesto dos Plebeus,
contra a educação dominante e opressora aos interesses do povo, relacionando ao seu estado de miséria.
A primeira educação pública socialista foi anunciada por Marx (1818-1883) e Engels (1820-1895) e
desenvolvida por Vladimir Ilich Lênin (1870-1924). Marx e Engels nunca realizaram uma análise
sistemática da escola e da educação, pois suas ideias encontram-se vinculadas ao longo de vários
trabalhos. A problemática educativa foi colocada de modo ocasional e fragmentada, mas sempre no
contexto da crítica das relações sociais e das linhas para a sua modificação. No seu Manifesto do Partido
Comunista, defendem uma educação pública e gratuita para todas as crianças, baseados nos seguintes
princípios: a eliminação do trabalho de crianças na fábrica, a associação entre educação e produção
material, a educação politécnica abrangendo três aspectos: mental, físico e técnico, adequados à idade
das crianças, jovens e adultos, e da inseparabilidade da educação da política, portanto, da totalidade do
social e da articulação entre o tempo livre e o tempo de trabalho, isto é, o trabalho, o estudo e o lazer.
Marx defende o trabalho infantil, mas que este trabalho deva ser regulamentado, de maneira que em
nada se pareça com a exploração infantil capitalista. Ele sustenta, por razões fisiológicas, que as crianças
e os jovens de qualquer sexo devem dividir-se em três classes, tendo cada uma delas um tratamento
específico: de 9 a 12 anos, com jornada de trabalho de duas horas por dia, de 13 a 15 anos, com jornada
de trabalho de quatro horas por dia; e de 15 a 17 anos, com jornada de trabalho de seis horas por dia.
Já Mikhail Bakunin (1814-1876) propõe a luta contra o elitismo educacional da burguesia, que é imoral,
e Francisco Ferrer Guardia (1859-1909), seguidor de Bakunin, defendia uma educação racional, laica,
integral e científica, baseada nos seguintes princípios: da ciência e da razão, do desenvolvimento
harmônico da inteligência e da vontade, do moral e do físico, do exemplo e da solidariedade, e da
adaptação dos métodos à idade dos educandos. Ferrer é considerado um dos educadores mais
importantes do pensamento pedagógico antiautoritário.
Lênin atribuiu grande importância à educação no processo de transformação social. Como um dos
revolucionários a assumir o controle de um governo, pôde experimentar na prática a implantação das
ideias socialistas na educação. Acreditando que a educação deveria desempenhar um importante papel
na construção de uma nova sociedade, afirmando que mesmo a educação burguesa que tanto criticava
era melhor que a ignorância. A educação pública deveria ser política, pois o trabalho no terreno do ensino
é a mesma luta para derrotar a burguesia, e ainda declaramos publicamente que a escola à margem da
vida, à margem da política, é falsa e hipócrita.
Exceto a Rússia, na Europa não existe nenhum país tão bárbaro, no qual as massas populares tenham
sido espoliadas do ensino, da cultura, e do saber, por isso, no decreto de 26 de dezembro de 1919,
obrigava todos os analfabetos de 8 a 50 anos de idade a aprender a ler e a escrever em sua língua.
Nas notas escritas entre abril e maio de 1917, para a revisão do programa do partido, Lênin defendeu
a anulação da obrigatoriedade de um idioma do Estado, o ensino geral e politécnico, gratuito e obrigatório
até os 16 anos, a distribuição gratuita de alimentos, roupas e material escolar, a transmissão da instrução
pública aos organismos democráticos da administração autônoma local, a abstenção do poder central de
toda a intervenção no estabelecimento de programas escolares e na seleção do pessoal docente, a
eleição direta dos professores pela própria população e o direito desta de destituir os indesejáveis, a
proibição dos patrões de utilizar o trabalho das crianças até os 16 anos, a limitação da jornada de trabalho
dos jovens de 16 a 20 anos a quatro horas, a proibição de que os jovens trabalhassem à noite em
empresas insalubres ou nas minas.
Pistrak, um dos primeiros educadores da Revolução Russa, seguindo a filosofia de Lênin, dizia não
existir prática revolucionária sem teoria revolucionária, e ainda que sem a teoria pedagógica
revolucionária não existe a prática pedagógica revolucionária. Atribuía ao professor um papel de militante
ativo; dos alunos esperava­se que trabalhassem coletivamente e se organizassem autonomamente.
Auto-organização e trabalho coletivo para superar o autoritarismo professoral da escola burguesa.

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Para que houvesse essa auto-organização, Pistrak procurava mostrar a importância da aprendizagem
para a vida do educando e a necessidade dela para a prática de uma determinada ação. O professor
seria um conselheiro. Só a assembleia dos alunos podia estabelecer punições. Os mandatos de
representação dos alunos seriam curtos para possibilitar alternância.
Os métodos escolares seriam ativos e vinculados ao trabalho manual, seja no trabalho agrícola, seja
no trabalho industrial; o aluno tinha de se sentir participativo do progresso da produção, segundo sua
capacidade física e mental. O aluno não iria à fábrica para trabalhar, mas para compreender a totalidade
do trabalho. Na fábrica, dizia Pistrak, eclode toda a problemática do nosso tempo.
A sua visão educacional coincidiu com o período de ascensão das massas na Revolução Russa, a
qual exigia a formação de homens vinculados ao presente, inalienados, mais preocupados em criar o
futuro do que em cultuar o passado, e cuja busca do bem comum superasse o individualismo e o egoísmo.
Deve-se a Pistrak o projeto da revolução soviética no plano da educação, especialmente no nível do
ensino primário e secundário. Enfatizou a necessidade de criar uma nova instituição escolar na sua
estrutura e no seu espírito, suprimindo a contradição entre a necessidade de criar um novo tipo de homens
e as formas da educação tradicional. Isso implicava uma profunda mudança na instituição escolar, e
preferiu então optar pela criação da nova instituição no lugar da transformação da velha estrutura.

A Educação da Escola Nova

A Escola Nova é o movimento de renovação da educação, depois da escola pública burguesa, de


maior significado. A fundamentação do ato pedagógico na ação, na atividade da criança, já se estruturava
desde a escola alegre de Vitorino de Feltre (1378-1446), que seguia a pedagogia romântica e naturalista
de Rousseau; mas só no começo do século XX que teve consequências importantes sobre os sistemas
educacionais e a forma de pensar dos professores.
O escolanovismo se expandiu no mundo, resultando uma renovação que valorizou a auto- formação e
a espontaneidade da criança. A Escola Nova propõe uma educação instigadora de mudança social e, ao
mesmo tempo, uma transformação da sociedade, e a sociologia da educação e a psicologia educacional
também contribuíram para essa renovação.
Um dos pioneiros da Escola Nova foi Adolphe Ferrieri (1879-1960), educador, escritor e conferencista
suíço. Ferrieri lecionou no Instituto Jean-Jacques Rousseau, de Genebra, e foi talvez o mais convicto
divulgador da escola ativa e da educação nova na Europa. Suas ideias se basearam em concepções
biológicas, transformando-se depois numa filosofia espiritualista. Considerava que o impulso espiritual é
a raiz da vida, e que o dever da educação seria conservar ou aumentar esse impulso. Para ele, o ideal
da escola ativa é a atividade espontânea, pessoal e produtiva.
Em 1899 fundou o Bureau Internacional das Escolas Novas, em Genebra, e devido à criação de
inúmeras escolas novas com tendências diferentes, em 1919 o Bureau aprovou trinta itens considerados
básicos para a nova pedagogia, e para uma escola se enquadrar no movimento, deveria cumprir pelo
menos dois terços das exigências, ou seja, a Educação Nova seria integral, intelectual, moral e física,
ativa, prática, com trabalhos manuais obrigatórios, individualizada, autônoma, campestre em regime de
internato e coeducação.
Ferrieri coordenou a articulação internacional da Escola Nova e, conseguiu sintetizar correntes
pedagógicas distintas em suas manifestações, porém unidas na preocupação de colocar a criança no
centro das perspectivas educativas. Criticava a escola tradicional, afirmando que ela substituiu a alegria
de viver pela inquietude, o regozijo pela gravidade, o movimento espontâneo pela imobilidade, as risadas
pelo silêncio.
John Dewey (1859-1952), educador norte-americano, foi o primeiro a formular o novo ideal
pedagógico, afirmando que o ensino deveria dar-se pela ação e não pela instrução. Para ele, a educação
continuamente reconstruía a experiência concreta, ativa, produtiva, de cada um.
A educação de Dewey era essencialmente pragmática e instrumentalista, buscando a convivência
democrática sem, porém, pôr em questão a sociedade de classes. A experiência concreta da vida se
apresentava sempre diante de problemas que a educação poderia ajudar a resolver, recorrendo a uma
escala de cinco estágios do ato de pensar, que ocorrem diante de algum problema, e, portanto, o
problema nos faria pensar.
São eles: uma necessidade sentida, a análise da dificuldade, as alternativas de solução do problema,
a experimentação de várias soluções, até que o teste mental aprove uma delas, e a ação como a prova
final para a solução proposta, que deve ser verificada de maneira científica.
Conforme tal visão, a educação era essencialmente um processo e não um produto, um processo de
reconstrução e reconstituição da experiência, um processo de melhoria permanente da eficiência
individual. O objetivo da educação se encontraria no próprio processo, e o fim dela estaria nela. A

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educação se confundiria com o próprio processo de viver. Aumentar o rendimento da criança, seguindo
os próprios interesses vitais dela.
Essa rentabilidade serviria aos interesses da nova sociedade burguesa, ou seja, a escola deveria
preparar os jovens para o trabalho, para a atividade prática e para o exercício da competição.
Nesse sentido, a Escola Nova acompanhou o desenvolvimento e o progresso capitalistas, representou
uma exigência desse desenvolvimento, propôs a construção de um homem novo dentro do projeto
burguês de sociedade, porém poucos foram os pedagogos escolanovistas que ultrapassaram o
pensamento burguês para evidenciar a exploração do trabalho e a dominação política, próprias da
sociedade de classes.
Só o aluno poderia ser autor de sua própria experiência, daí o paidocentrismo, ou seja, o aluno como
centro na Escola Nova. Essa atitude necessitava de métodos ativos e criativos também centrados no
aluno. Assim, os métodos de ensino significaram o maior avanço da Escola Nova.
Muitas foram as contribuições neste sentido, por exemplo, o método dos projetos, de Willian Heard
Kilpatrick (1871-1965), é centrado numa atividade prática dos alunos, cujos projetos poderiam ser
manuais, como uma construção; de descoberta, como uma excursão; de competição, como um jogo; de
comunicação, como a narração de um conto, etc. Esse projeto passaria por algumas etapas, como
designar o fim, preparar o projeto, executá-Io apreciando o seu resultado.
Discípulo de Dewey, Kilpatrick preocupava-se, com a formação do homem para a democracia e para
uma sociedade em constante mutação. Para ele, a educação baseia-se na vida para torná-Ia melhor, ou
seja, a educação é a reconstrução da vida em etapas cada vez mais elaboradas. E a base da educação
está na atividade, ou melhor, na auto atividade decidida.
A pedagogia norte-americana recorreu ao método de projetos sistematizados para globalizar o ensino
a partir de atividades manuais. Classificavam-se os projetos em quatro grupos: de produção, de consumo,
de resolução, ou de aperfeiçoamento de alguma técnica.
Para Kilpatrick, as características de um bom projeto didático eram: um plano de trabalho, de
preferência manual, uma atividade motivada por meio de uma intenção consequente, um trabalho manual,
tendo em vista a diversidade globalizada de ensino, e um ambiente natural.
Outra contribuição da Escola Nova é o método dos centros de interesse do belga Ovide Decroly
(1871-1932). Esses centros seria para ele a família, o universo, o mundo vegetal, o mundo animal, etc.
Educar a partir das necessidades infantis. Os centros de interesse desenvolviam a observação, a
associação e a expressão, e diferenciavam-se do método dos projetos porque os primeiros não possuem
um fim nem implicam a realização de alguma coisa, pois as necessidades fundamentais da criança são:
alimentares, proteger-se contra a intempérie e os perigos, e agir através de uma atividade social,
recreativa e cultural.
Teve grande importância também a experiência da médica italiana Maria Montessori (1870-1952), que
passou para as crianças normais seu método de recuperação de crianças deficientes. Na Casa Dei
Bambini (casa de crianças), para a pré-escola, construiu uma enorme quantidade de jogos e materiais
pedagógicos que, com algumas variações, são ainda hoje utilizados em milhares de pré-escolas.
Pela primeira vez na história da educação, construiu-se um ambiente escolar com objetos pequenos
para que a criança tivesse pleno domínio deles, como mesas, cadeiras, estantes, etc. Com materiais
concretos, Montessori conseguia fazer com que as crianças, pelo tato, pela pressão, pudessem distinguir
as cores, as formas dos objetos, os espaços, os ruídos, a solidez, etc. Explorou técnicas completamente
novas, como a lição do silêncio que ensinava a dominar a fala, e a lição da obscuridade para educar as
percepções auditivas.
Foram de grande importância para a Escola Nova o suíço Édouard Claparece (1873-1940), Jean
Piaget (1896-1980), o pedagogo francês Roger Cousinet (1881-1973), Burrhus Frederick Skinner
(1904-1990), Paulo Freire (1921-2005), e tantos outros.
A influência da pedagogia escolanovista tem sido enorme. Muitas são as escolas que revelam a
mesma filosofia educacional: as "classes nouvelles" francesas que deram origem, na década de 60, no
Brasil, aos ginásios vocacionais, às escolas ativas, às escolas experimentais, aos colégios de aplicação
das universidades, às escolas piloto, às escolas livres, às escolas comunitárias, aos lares escolas, às
escolas individualistas, às escolas do trabalho, às escolas não diretivas e outras.
Os métodos, centro de interesses da Escola Nova, se aperfeiçoaram e levaram para a sala de aula o
rádio, o cinema, a televisão, o dvd, o computador e as máquinas de ensinar, inovações que atingem, de
múltiplas maneiras, nossos educadores, muitos deles adaptando-se diante de tantos meios e técnicas
propostas. Por isso, hoje, cada vez mais os educadores insistem na necessidade de buscar a análise de
sua prática, a discussão do cotidiano da escola, sem o que de nada adiantam tantas inovações, planos e
técnicas, por mais modernos e atraentes que sejam.

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Pensamento Existencialista

A partir do século XX, as grandes correntes filosóficas dividiram a pedagogia em duas grandes
correntes: a da essência e a da existência. Essa oposição parte de concepções antropológicas
pedagógicas também distintas.
A pedagogia da essência inicia-se com Platão e foi desenvolvida pelo cristianismo, pois Platão
distinguiu no homem o que pertence ao mundo das sombras, como o corpo, o desejo, e os sentidos do
que pertence ao mundo das ideias, ou seja, o espírito na sua forma pensante. A pedagogia da essência
investiga tudo o que é experimentado pelo homem e concebe a educação como ação no indivíduo
definindo a sua essência, e o cristianismo manteve, transformou e desenvolveu essa concepção.
Realçou a oposição entre duas esferas da realidade: verdadeira e eterna por um lado, aparente e
temporal por outro, o movimento reformista protestante que recolocou a ideia de que o homem pode ser
tudo, e que a individualidade é uma das formas preciosa de realização da essência humana. Daí surge,
indícios de renovação do pensamento pedagógico, inspirando-se nos direitos e nas necessidades das
crianças. No século XVI, Vives já tinha criado os alicerces de uma teoria psicológica do ensino. Erguia-se,
assim, uma verdadeira revolução contra a pedagogia tradicional.
Já se defendia o direito do homem viver de acordo com suas crenças, iniciando o conflito entre a
pedagogia da essência e a pedagogia fundada na existência. O indivíduo não se repete, sendo uma
pessoa única, condenada a ser ela mesma, devendo recomeçar perpetuamente uma luta dramática, já
que aspira algo de mais elevado do que ela própria. Já Stirner atacara a pedagogia da essência,
procurando mostrar que o seu erro está em impor aos indivíduos um ideal ultrapassado e uma religião a
serviço da sociedade e do Estado.
Nietzsche criticava as tendências democráticas do ensino e as tentativas de ligar a escola às
necessidades econômicas e sociais do país, e ao analisar a genealogia da moral, ele tentava provar que
o ideal e as normas morais são obras dos homens fracos.
Em resumo, a pedagogia da essência propõe um programa para levar a criança a conhecer
sistematicamente as etapas do desenvolvimento da humanidade, e a pedagogia da existência, a
organização e a satisfação das necessidades atuais da criança por meio do conhecimento e da ação.
Durkheim desenvolveu a concepção positivista de educação, que buscava existencializar a pedagogia
da essência. Ele criticava as concepções de educação baseadas no ideal de homem. A educação devia
se moldar às necessidades da sociedade em que está inserida. A existencialização da pedagogia da
essência se desdobrou em duas vertentes: uma priorizando as necessidades da criança e a outra a do
grupo social.
A educação nova, como expressão de pedagogia moderna, veio como uma esperança para as dúvidas
levantadas pela pedagogia da existência, mas introduziu novas dúvidas em relação à formação social das
novas gerações, pois é na pedagogia moderna que a contradição essência/ existência se apresenta com
mais nitidez. Com base nesse conflito consolidaram-se duas tendências: uma tentando ligar a pedagogia
da existência ao ideal e a outra unindo a pedagogia da essência à vida concreta. Suchodolski sustentava
que a pedagogia deve ser simultaneamente da existência e da essência e que esta síntese exige
condições que a sociedade burguesa não apresenta. Segundo ele, o mais importante é que cada homem
tenha garantias e condições existenciais para construir sua própria essência.
A filosofia existencialista provocou um grande movimento de renovação da educação. A tarefa da
educação, para a filosofia existencial, consiste em afirmar a existência concreta da criança, aqui e agora.
A existência do ser humano não é igual à de outra coisa qualquer. Ela está sempre sendo, se formando,
não é estática. O homem precisa decidir­se, comprometer­se, escolher; e encontrar­se com o outro.
Com isso, muitas necessidades novas foram incorporadas à pedagogia contemporânea, o desafio, a
decisão, o compromisso, o diálogo, a dúvida, as próprias do chamado humanismo moderno.
Entre os filósofos existencialistas que tiveram forte influência na educação, destacamos: Martin Buber
(1878-1966), Maurice Merleauponty (1908-1961), Emmanuel Mounier (1905-1950), Jean Paulo Sartre
(1905-1980), Georges Gusdorf (1912), Paul Ricoeur (1913) e Claude Pantillon (1938-1980).

Fenomenologia

A fenomenologia contribuiu muito para recolocar na educação a preocupação antropológica.


"Fenômeno" é o que se mostra, o que se manifesta. A fenomenologia estuda o que aparece e o que está
escondido nas aparências, uma vez que aquilo que aparece, nem sempre é real. Contudo, a aparência
também faz parte do ser. O método fenomenológico procura descrever e interpretar os fenômenos, os
processos e as coisas pelo que eles são, sem preconceitos. Mais do que um método, é uma atitude.
Husserl diz que a atitude de "ir à coisa mesma" sem premeditações, sem ser conduzido por técnicas de

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manipulação das coisas. Mas isto não significa a recusa de toda pré-compreensão. Toda
pré-compreensão de um fenômeno, toda interpretação é continuamente orientada pela maneira de se
colocar a questão elaborada pelo sujeito a partir de um conceito. O único pressuposto não estranho à
atitude fenomenológica é aquele em que toda compreensão é uma relação vital do intérprete com a coisa
mesma. Daí a complementaridade necessária entre fenomenologia e conceito. A fenomenologia
desenvolveu particularmente a interpretação de textos.
O pensamento pedagógico existencialista e fenomenológico foi muito influenciado pelos filósofos
franceses Jean Paul Sartre e Paul Ricoeur.
Sartre dirigiu os grupos existencialistas e fundou a revista literária e política Les Temps Modernes, fez
extensas viagens e travou polêmicas em diversas áreas, dedicando-se também às atividades políticas de
esquerda.
Segundo Sartre, o homem é absoluto, não havendo nada de espiritual acima dele. Por determinadas
condições biológicas, a sua existência precede a essência, o que significa que a criatura humana chega
ao mundo apenas biologicamente, e só depois, através da convivência, adquire uma essência humana
determinada.
O homem sofre a influência não só da ideia que tem de si, mas também de como pretende ser. Esses
impulsos orientam-no para um determinado tipo de existência, pois um indivíduo não pode ser outra coisa
senão aquilo em que se constitui. Como não há nada superior a ele, sua marcha se depara com o nada.
Depois da Segunda Guerra Mundial, Sartre quis compreender melhor o mundo, passando a adotar
uma atitude prática. Desde então se manifestou em seu pensamento uma abertura para o social. Ele
mudou seu conceito de liberdade, aderindo ao marxismo. Seu projeto definitivo era agora lutar pelo
socialismo.
Paul Ricoeur nasceu em Valença. Não se pode situar Ricoeur apenas no movimento fenomenológico,
apesar de que parte considerável de sua obra refere-se à compreensão do método e dos temas da
fenomenologia de Husserl, Heidegger, Jaspers, Sartre e Merleau-Ponty. Os pensamentos desenvolvidos
por Ricoeur surgiram de um diálogo crítico com esses filósofos. É fundamental notar seu encontro com o
pensamento de Gabriel MareeI e sua íntima relação com o grupo personalista da revista Esprit dirigida
por Emmanuel Mounier.
O pensamento de Ricoeur tem características afirmativas frente ao negativismo de alguns
existencialistas. Tal atitude se refere à afirmação e à reconciliação do homem por inteiro com seu mundo.
A reconstituição dessa unidade se efetua à base do reconhecimento da transcendência, do mistério. O
que não significa entregar-se a uma filosofia irracionalista e obscura. O mistério não é incompatível com
a clareza e sim torna possível a clareza profunda. O emprego do método fenomenológico é a tal ponto
indispensável, que só mediante o mesmo pode chegar-se à compreensão dos fenômenos estudados.
Para Ricoeur, estes fenômenos são humanos, enquanto o humano esteja ligado ao mundo e suspenso
no transcendente. Desses fenômenos Ricoeur tem- se ocupado, em especial da voluntariedade do
problema do mal.

O Pensamento Antiautoritária

A escola nova e o pensamento pedagógico existencial culminaram com a educação antiautoritária,


pois os liberais e os marxistas afirmavam que a liberdade deveria ser o princípio e o objetivo da educação.
Freud (1856­1939) foi um de seus inspiradores; mesmo não sendo um pedagogo, teve grande
influência na educação. O pai da psicanálise, ao descobrir o fenômeno da transferência (relação
professor-aluno), e mostrando a prática repressiva da sociedade e da escola em relação à sexualidade,
influenciou a mentalidade dos educadores.
Freud defendia que muitos desajustes dos adultos tivessem suas origens nos conflitos e nas
frustrações infantis. Essa ênfase foi uma das mais discutidas no início da psicanálise.
A educação, segundo Freud, representa um modelar as crianças de acordo com os valores dos que
vão morrer, sendo o agente transmissor do princípio da realidade e do prazer. Dessa forma, a educação
obriga a criança a renunciar às tendências naturais, acomodando o desenvolvimento do seu ego às
exigências morais e culturais do superego. A psicanálise sugere uma prática educativa não-repressiva e
respeitadora da criança.
Baseado em Freud, o educador francês Mendel desenvolveu numerosos estudos sobre a autoridade
e seus mecanismos de imposição, principalmente a paterna. Propôs a abertura da escola para a política
e, desde cedo, a tomada de poder pelos jovens nas instituições, a fim de superar o autoritarismo
institucional.
Guardia, fundador da escola moderna, racionalista e libertária, foi o mais destacado crítico da escola
tradicional, apoiando-se no pensamento iluminista.

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Ferrer, em Paris, aproximou-se das ideias de libertação e racionalismo pedagógico, que em toda a
Europa se contrapunham à educação tradicional, reacionária e clerical. Foi um revolucionário que
acreditava no valor da educação como remédio absoluto para os males da sociedade. Considerava-se
um professor que amava as crianças e queria prepará-Ias para, com liberdade de pensamento e ação,
enfrentar uma nova era. Na Espanha conservadora, ele defendia a co-educação, não fazendo distinção
entre sexos ou classes sociais. Argumentava que dessa forma ajudaria a nova geração a criar uma
sociedade mais justa. Para materializar sua pedagogia racional e científica, necessitava de um corpo
docente adequado. Daí a criação de uma escola de professor, a Escola Normal Racionalista, definida a
seguir pelo próprio Ferrer, como a escola emancipadora do século XX.
A principal obra do pedagogo espanhol é La Escuela Moderna. Para ele, a ignorância e o erro estão
na base das diferenças e dos antagonismos de classe. Para emancipar um indivíduo, seria necessária,
desde a infância, a vontade de conhecer a origem da injustiça social para que, com seu conhecimento,
possa combatê-Ia. A razão natural e a ciência dariam lugar à liberdade, à fraternidade e à solidariedade
entre os homens. Porém, a única via para resolver os problemas da sociedade seria a revolução. A
educação, para contribuir na revolução, deveria formar homens livres que saberiam como agir na
sociedade. Para isso, a escola deveria abolir todo instrumento de coerção e repressão. A tarefa da
educação seria preparar os futuros revolucionários; a ação política e social seria mediatizada pela ação
pedagógica. Existiriam uma disciplina artificial, baseada num autoritarismo cego, e uma disciplina natural,
que não se utiliza de sanções arbitrárias. A rebeldia seria a única reação possível à injustiça. A escola
não poderia provocar rebeldia, mas sim preparar homens rebeldes, que pudessem participar do
patrimônio universal.
A Escola Normal Racionalista foi fechada pelo governo conservador da Espanha. O ex- bibliotecário
da escola lançou uma bomba contra o carro do rei da Espanha. Por isso Ferrer foi condenado à morte
em 1909, após uma solicitação da Igreja Católica.
Outra escola livre foi a de Summerhill, na Inglaterra, preconizada por Alexander S. Neill (1883-1973),
representando a perspectiva liberal, não progressista, mas igualmente baseada no princípio da afirmação
da liberdade sobre a autoridade.
Neill, escocês, trabalhou inicialmente em escolas públicas como professor e diretor, fundou a Escola
Internacional Hellerau, na Alemanha, e a Escola Experimental, o internato Summerhill, em 1921, que
dirigiu até sua morte.
Com base na doutrina de Rousseau, integrou as teses de Freud e Reich, propondo a realização do
postulado de uma educação sem violência. Afinal, para Rousseau e também na opinião do educador
escocês, o homem recém-nascido é bom em essência. Se ele puder crescer em plena liberdade, se
transformará em um homem feliz e, consequentemente, bom. A obra de Neill começou a ser divulgada
no Brasil a partir de 1963 pela Editora Ibrasa, que lançou os livros Liberdade Sem Medo, Liberdade sem
Excesso, Liberdade no Lar, Liberdade na Escola, Amor e Juventude, e muitos outros títulos.
Partilhavam dessas mesmas ideias outros pensadores, como: Carl R. Rogers (1902-1987) Cèlestin
Freinet (18961966), e Henry Wallon (1879-1962).
Confiavam na natureza da criança, no autogoverno, na auto regulação do ensino- aprendizagem, pois
a dinâmica interna da liberdade é capaz por si mesma de conduzir a vida e a experiência até as mais
ricas e variadas formas de vivência, e a missão do professor era de estimular o pensamento e não injetar
doutrinas.
O objetivo da educação é que a criança viva a sua vida e não a do adulto, que trabalhe alegre e
positivamente, anulando o subconsciente adquirido da família. A escola deve desafiar o poder, o ódio e a
moral.
A criança deve fazer tudo o que quiser. Mas o querer tem que ser regulado pelas decisões tomadas
coletivamente em assembleias, quando são estabelecidos horários, normas, conteúdos, etc. Desenvolver
um sistema formal a respeito dos objetivos e métodos da educação. O princípio básico é a liberdade
interior, individual. As crianças devem ser livres internamente, livres do medo, da hipocrisia, do ódio e da
intolerância.

O Pensamento Crítica

Os métodos tradicionais da educação foram criticados pelo escolanovismo, aliado ao marxismo e ao


positivismo enquanto pensamento antiautoritário, já os existencialistas e fenomenologistas,
perguntavam-se o que estava errado na educação para formar homens que se odiavam tanto. O otimismo
pedagógico do começo do século XX não resistiu a tanta violência.
A partir da segunda metade deste século, a crítica à educação e à escola se acentuou, substituindo o
otimismo por uma crítica radical. Entre os maiores críticos encontramos Louis Althusser, e os sociólogos,

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também franceses, Pierre Bourdieu e Jean Claude Passeron. Suas ideias tiveram grande influência no
pensamento pedagógico brasileiro da década de 70, demonstrando o quanto a educação reproduz a
sociedade, daí serem frequentemente chamados crítico-reprodutivistas. Esses autores formularam as
teorias da escola enquanto aparelho ideológico do Estado, a da escola enquanto violência simbólica e da
escola dualista.
Althusser sustentou que a função própria da escola capitalista consistiria na reprodução da sociedade
e que toda ação pedagógica seria uma imposição arbitrária da cultura das classes dominantes, Bourdieu
e Passeron sustentaram que a escola constituía-se no instrumento mais acabado do capitalismo para
reproduzir as relações de produção e a ideologia do sistema, e Baudelot e Establet, analisando a escola
capitalista na França, demonstraram a existência de duas grandes redes escolares, que corresponderiam
às suas classes fundamentais da sociedade: a burguesia e o proletariado. Assim, embora o sistema
educativo liberal burguês afirme que é democrático, reproduziu através da escola a divisão social do
trabalho, perpetuou a injustiça e difundiu os ideais burgueses de vida, como a competição e o
individualismo.

O primeiro livro de que Althusser participou, Pour Marx, é obra coletiva. Nele, como em Lire Le Capital,
propôs uma nova interpretação da obra de Marx, destacando que só a partir de 1848 o autor adotou uma
concepção materialista e dialética. Voltou-se em seguida para o pensamento leninista; mostrando como
o líder da revolução soviética, conduziu sua concepção de luta de classes no plano filosófico. Seu último
livro, Resposta a John Lewis, é o de um pensador para quem a filosofia não existe desligada da prática
política, pois a sua filosofia é a luta de classes na teoria.
Uma análise do marxismo exigiria, segundo Althusser, um rigoroso exame dos conceitos nas obras de
Marx. Ele distingue a filosofia (o materialismo dialético) e a ciência (o materialismo histórico). A teoria
materialista do conhecimento, ao contrário da teoria positivista, não esconderia a relação entre teoria e
método. Os positivistas reduziriam a ciência ao rigor metodológico. Ao contrário, os marxistas
condicionaram o rigor metodológico das ciências à teoria, isto é, os fins ao objetivo, à sua concepção do
mundo.
Segundo Althusser, a dupla escola família substituiu o binômio igreja família como aparelho ideológico
dominante. Afinal, é a escola que tem, durante muitos anos, uma audiência obrigatória. Bourdieu e
Passeron desenvolveram a teoria da reprodução baseada no conceito de violência simbólica. Para eles,
toda ação pedagógica é objetivamente uma violência simbólica enquanto imposição, por um poder
arbitrário. A arbitrariedade é a cultura dominante. O "poder arbitrário" é baseado na divisão da sociedade
em classes. A ação pedagógica tende à reprodução cultural e social simultaneamente.
Este poder necessita camuflar sua arbitrariedade de duas formas: a autoridade pedagógica e a
autonomia relativa da escola. A autoridade pedagógica dissimula o poder arbitrário, apresentando-o como
relação puramente psicológica. Ela implica o trabalho pedagógico como processo de inculcação, criando
nas crianças da classe dominada um habitus (sistema de princípios da arbitrariedade cultural,
interiorizados e duráveis).
A ação pedagógica da escola seria precedida pela ação pedagógica primária, no aparelho ideológico
que é a família. Dadas as diferenças em formação e informação que a criança recebe, conforme sua
posição na hierarquia social, ela traz um determinado capital cultural para a escola.
Já que na escola a cultura burguesa constitui a norma, para as crianças das classes dominantes a
escola pode significar continuidade, enquanto para os filhos da classe dominada a aprendizagem se torna
uma verdadeira conquista. O sistema de ensino institucionaliza a autoridade pedagógica, ocultando desta
forma seu caráter arbitrário.

Baudelot e Establet empreenderam um estudo profundo do sistema escolar francês, destruindo a


representação ideológica da escola única. Segundo eles, na França, os dados estatísticos mostram que
25% dos alunos deixam a escola ao atingir a idade do ensino obrigatório e mais 50% abandonam o curso
nos quatro anos seguintes. Os restantes 25% percorrem o sistema de ensino nobre e frequentam as
universidades e grandes escolas. São, na sua grande maioria, os filhos de pais de profissões liberais,
industriais, quadros médios e superiores. Os autores mostram que os filhos das classes dominantes, em
média, têm melhores notas e são os que menos repetem o ano.
Esses autores chegaram à conclusão de que existem, na verdade, duas redes escolares: a secundária
superior (SS), praticamente reservada aos 25% de filhos da classe dominante, e a primária profissional
(PP) para os 75% que constituem as classes dominadas.
O crescimento das possibilidades de escolarização de todas as classes sociais não mudou a
distribuição de probabilidade para alcançar os níveis mais elevados do ensino, de acordo com as
diferentes classes sociais.

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Na rede PP, o conteúdo é dominado pelas noções adquiridas no ensino primário, sempre revistas e
repetidas. Na rede SS, os conteúdos são uma preparação para o ensino superior. Na rede SS cultiva-se
a abstração, enquanto o ensino na rede PP permanece ligado ao concreto. Essa divisão de conteúdos
corresponde à oposição entre teoria e prática, na ideologia burguesa do conhecimento.
Os conteúdos culturais também variam de uma rede para outra. Na rede SS se consome a cultura
própria da classe dominante, na rede PP os alunos recebem a mesma cultura, mas de forma degradada,
empobrecida, vulgarizada, o que dá à ideologia SS o caráter de dominante. Na rede PP, o objetivo é que
os alunos se submetam à ideologia dominante, enquanto a rede SS prepara os futuros agentes e
intérpretes dessa ideologia.
Diante desse quadro, a ideologia escolar vê-se obrigada a dar uma explicação. A preferida é a da
diferença entre os dons naturais. Esse postulado ideológico encontra seu auge na determinação do
quociente de inteligência (QI) de cada aluno, cuja distribuição milagrosamente coincide com a distribuição
por classes sociais.
A linguagem desempenha um papel importante na divisão e discriminação. São os alunos das classes
populares que têm maiores problemas na leitura e escrita, logo na primeira série. A escola reforça apenas
a linguagem burguesa, a norma culta, desconsiderando as práticas linguísticas das crianças pobres.
Referências

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CAPRILES, René. O Nascimento da Pedagogia Socialista. São Paulo: Scipione, 1989
FURTER, Pierre. Educação e Reflexão. Petrópolis: Vozes, 1970.
GADOTTI, Moacir. História do Pensamento Pedagógico. Série Educação. São Paulo: Ática, 2004.
LUZURIAGA, Lorenzo. História da Educação e da Pedagogia. São Paulo: Nacional, 1987.
MANACORDA, Mario Aligliero. História da Educação: da Antiguidade aos Nossos Dias. São Paulo: Cortez, 1989. MARROU, Henri Irene. História da Educação
na Antiguidade. São Paulo: Zahar, 1998
MARZ, Fritz. Os Grandes Educadores. São Paulo: EPU, 1987.
NILSEN NETO, Henrique. Filosofia da Educação. São Paulo: Melhoramentos, 1998.
ROSA, Maria da Glória. A História da Educação Através dos Textos. Cultrix. São Paulo. 1971
SAMPAIO, Rosa Maria Whitaker Ferreira. A História da Evolução da Pedagogia. Belo Horizonte: Interlivros, 1989.
SCHWARTZ, Bertrand. A Educação Amanhã. Petrópolis: Vozes, 1976
SKINNER, Burrhus Frederic. O Mito da Liberdade. São Paulo: Summus, 1983.
SNYDERS, G BENJAMIN, Walter. A Criança, o Brinquedo e a Educação. São Paulo, 1984.
SUNNY, Gustavo. Filosofias Pedagógicas. Porto Alegre: Melhoramentos, 1992.
TEIXEIRA, Anísio. Pequena Introdução à Filosofia da Educação. Rio de Janeiro: Nacional, 1978.
TORRES, Rosa Maria. Revolução e Educação Popular. São Paulo: Papirus, 1992.
TRATENBERG, Maurício. Educação e Sociedade. São Paulo: Cortez, 1985.

Questões

01. Entre os iluministas, destaca-se Jean-Jacques Rousseau (1712-1778). Rousseau resgata a


relação:
(A) das novas mentalidades educacionais ocorridas na idade antiga.
(B) dos meios de comunicação entre professores e pedagogos.
(C) dos currículos existentes na Europa, principalmente na Inglaterra.
(D) das instituições educacionais existentes na América do Norte.
(E) entre a educação e a política, e centraliza, o tema da infância na educação

02. Para Augusto Comte, a derrota do iluminismo e dos ideais revolucionários deveu-se à ausência
de concepções científicas. Para ele, a política tinha de:
A) se envolver com pressupostos socialistas.
B) negar a existência do positivismo.
C) ser uma ciência exata.
D) ser voltada para os anseios da sociedade popular.
E) manter os burgueses administrando a industrialização.

03. O positivismo é a doutrina que visa à substituição da manipulação do real pela visão científica, e
que acabou estabelecendo uma nova fé, a fé na ciência, que vinculou a imaginação científica à pura
observação experimental. Seu lema sempre foi:
(A) não deixar para amanhã o que se pode fazer hoje.
(B) defender os fracos e oprimidos.
(C) estabelecer a segurança da população.
(D) a ordem e o progresso.
(E) ajudar quem cedo madruga.

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04. A república de Platão já seria a manifestação do comunismo utópico, pois ligava a educação à
política. Thomas Morus (1478-1535) fez decididamente a crítica da sociedade egoísta e propôs em seu
livro Utopia:
(A) o fim da propriedade, a redução da jornada de trabalho para seis horas diárias, a educação laica
e a co-educação.
(B) um novo currículo educacional para as escolas socialista, porém seguindo a filosofia burguesa.
(C) Uma nova escola patrocinada pela burguesia em parceria com o Estado.
(D) Que toda a educação socialista tivesse embasamento na educação britânica.
(E) que todos os professores fossem concursados pelo Estado.

05. O escolanovismo se expandiu no mundo, resultando uma renovação que valorizou a auto-
formação e a espontaneidade da criança. A Escola Nova propõe uma educação instigadora de
mudança social e, ao mesmo tempo, uma transformação da sociedade. O que também contribuiu para
essa renovação?
(A) O Estado e a sociologia da educação.
(B) A sociologia da educação e a psicologia educacional.
(C) A psicologia educacional e a pedagogia socialista.
(D) A pedagogia socialista e o clero.
(E) O clero e o Estado.

06. Desenvolveu a concepção positivista de educação, que buscava existencializar a pedagogia da


essência. Ele criticava as concepções de educação baseadas no ideal de homem. Nos referimos a:
(A) Durkheim
(B) Saint Simon
(C) Mounier
(D) Husserl
(E) Gusdorf

07. A fenomenologia contribuiu muito para recolocar na educação a preocupação antropológica.


"Fenômeno" é o que se mostra, o que se manifesta. A fenomenologia estuda o que aparece e o que
está escondido nas aparências:
(A) que sempre é verdade, independente do conceito.
(B) que nunca é verdade, independente do conceito.
(C) que é relacionado a um tipo de pedagogia.
(D) que não tem nada haver com a pedagogia
(E) uma vez que aquilo que aparece nem sempre é real.

08. Guardia, fundador da escola moderna, racionalista e libertária, foi o mais destacado crítico da
escola tradicional, apoiando-se no(na):
(A) clero.
(B) pensamento iluminista.
(C) Estado.
(D) Constituição norte-americana.
(E) Conselho Federal de Educação.

09. A Escola Normal Racionalista foi fechada pelo governo conservador da Espanha. O ex-
bibliotecário da escola lançou uma bomba contra o carro do rei da Espanha. Por isso Ferrer foi:
(A) banido do sistema educacional, tendo que se exilar na América do Norte.
(B) condecorado com a Cruz de Malta da Educação espanhola.
(C) preso por 10 anos, e liberto por bom comportamento.
(D) processado, julgado e inocentado por falta de provas.
(E) condenado à morte em 1909, após uma solicitação da Igreja Católica.

10. O crescimento das possibilidades de escolarização de todas as classes sociais não mudou a
distribuição de probabilidade para alcançar os níveis mais elevados do ensino, de acordo com as
diferentes:
(A) políticas externas e internas da educação.
(B) instituições educacionais da Europa.
(C) classes sociais.

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(D) filosofias da igreja católica.
(E) possibilidades de conteúdos propostos pela burguesia.

Respostas

1. Resposta: E
Entre os iluministas, destaca-se Jean-Jacques Rousseau (1712-1778). Rousseau resgata a relação:
entre a educação e a política, e centraliza, o tema da infância na educação.

02. Resposta Correta: C


Para Augusto Comte, a derrota do iluminismo e dos ideais revolucionários deveu-se à ausência de
concepções científicas. Para ele, a política tinha de ser uma ciência exata.

03. Resposta Correta: D


O positivismo é a doutrina que visa à substituição da manipulação do real pela visão científica, e que
acabou estabelecendo uma nova fé, a fé na ciência, que vinculou a imaginação científica à pura
observação experimental. Seu lema sempre foi a ordem e o progresso.

04. Resposta Correta: A


A república de Platão já seria a manifestação do comunismo utópico, pois ligava a educação à política.
Thomas Morus (1478-1535) fez decididamente a crítica da sociedade egoísta e propôs em seu livroUtopia
o fim da propriedade, a redução da jornada de trabalho para seis horas diárias, a educação laica e a
co-educação.

05. Resposta Correta: B


O escolanovismo se expandiu no mundo, resultando uma renovação que valorizou a auto-formação e
a espontaneidade da criança. A Escola Nova propõe uma educação instigadora de mudança social e, ao
mesmo tempo, uma transformação da sociedade.

06. Resposta Correta: A


Desenvolveu a concepção positivista de educação, que buscava existencializar a pedagogia da
essência. Ele criticava as concepções de educação baseadas no ideal de homem.

07. Resposta Correta: E


A fenomenologia contribuiu muito para recolocar na educação a preocupação antropológica.
"Fenômeno" é o que se mostra, o que se manifesta. A fenomenologia estuda o que aparece e o que está
escondido nas aparências uma vez que aquilo que aparece nem sempre é real.

08. Resposta Correta: B


Guardia, fundador da escola moderna, racionalista e libertária, foi o mais destacado crítico da escola
tradicional, apoiando-se no: pensamento iluminista.

09. Resposta Correta: E


A Escola Normal Racionalista foi fechada pelo governo conservador da Espanha. O ex-bibliotecário da
escola lançou uma bomba contra o carro do rei da Espanha. Por isso Ferrer foi condenado à morte em
1909, após uma solicitação da Igreja Católica.

10. Resposta Correta: C


O crescimento das possibilidades de escolarização de todas as classes sociais não mudou a
distribuição de probabilidade para alcançar os níveis mais elevados do ensino, de acordo com as
diferentes possibilidades de conteúdos propostos pela burguesia.

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1.2 Projeto político pedagógico.

Projeto Político-Pedagógico

Desde a promulgação da Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional (LDB), em 1996, toda escola
precisa ter um projeto político-pedagógico (o PPP, ou simplesmente Projeto Pedagógico).
No sentido etimológico, o termo projeto vem do latim projectu, particípio passado do verbo projicere,
que significa lançar para diante. Plano, intento, desígnio. Empresa, empreendimento. Redação provisória
de lei. Plano geral de edificação.
Segundo Veiga3, ao construirmos os projetos de nossas escolas, planejamos o que temos intenção de
fazer, de realizar. Lançamo-nos para diante, com base no que temos, buscando o possível. É antever um
futuro diferente do presente.

Nas palavras de Gadotti4:


Todo projeto supõe rupturas com o presente e promessas para o futuro. Projetar significa tentar
quebrar um estado confortável para arriscar-se, atravessar um período de instabilidade e buscar uma
nova estabilidade em função da promessa que cada projeto contém de estado melhor do que o presente.
Um projeto educativo pode ser tomado com a promessa frente a determinadas rupturas. As promessas
tornam visíveis os campos de ação possível, comprometendo seus atores e autores.

Nessa perspectiva, o Projeto Político-Pedagógico vai além de um simples agrupamento de planos


de ensino e de atividades diversas. O projeto não é algo que é construído e em seguida arquivado ou
encaminhado às autoridades educacionais como prova do cumprimento de tarefas burocráticas. Ele é
construído e vivenciado em todos os momentos, por todos os envolvidos com o processo educativo da
escola.
O projeto busca um rumo, uma direção. É uma ação intencional, com um sentido explícito, com um
compromisso definido coletivamente. Por isso, todo projeto pedagógico da escola é, também, um projeto
político por estar intimamente articulado ao compromisso sociopolítico com os interesses reais e coletivos
da população majoritária. É político no sentido de compromisso com a formação do cidadão para um tipo
de sociedade.

“A dimensão política se cumpre na medida em que ela se realiza enquanto prática especificamente
pedagógica”.

Na dimensão pedagógica reside a possibilidade da efetivação da intencionalidade da escola, que é


a formação do cidadão participativo, responsável, compromissado, crítico e criativo. Pedagógico, no
sentido de definir as ações educativas e as características necessárias às escolas de cumprirem seus
propósitos e sua intencionalidade.
Político e pedagógico têm assim uma significação indissociável. Neste sentido é que se deve
considerar o projeto político-pedagógico como um processo permanente de reflexão e discussão dos
problemas da escola, na busca de alternativas viáveis a efetivação de sua intencionalidade, que “não é
descritiva ou constatativa, mas é constitutiva”.
Por outro lado, propicia a vivência democrática necessária para a participação de todos os membros
da comunidade escolar e o exercício da cidadania. Pode parecer complicado, mas trata-se de uma relação
recíproca entre a dimensão política e a dimensão pedagógica da escola.

O Projeto Político-Pedagógico, ao se constituir em processo democrático de decisões, preocupa-


se em instaurar uma forma de organização do trabalho pedagógico que supere os conflitos,
buscando eliminar as relações competitivas, corporativas e autoritárias, rompendo com a rotina
do mando impessoal e racionalizado da burocracia que permeia as relações no interior da escola,
diminuindo os efeitos fragmentários da divisão do trabalho que reforça as diferenças e hierarquiza
os poderes de decisão.

3
VEIGA, Ilma Passos Alencastro. (org) Projeto político-pedagógico da escola: uma construção possível. 14ª edição Papirus, 2002.
4
GADOTTI, Moacir. "Pressupostos do projeto pedagógico". In: MEC, Anais da Conferência Nacional de Educação para Todos. Brasília, 1994.

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Desse modo, o projeto político-pedagógico tem a ver com a organização do trabalho pedagógico em
dois níveis: como organização da escola num todo e como organização da sala de aula, incluindo sua
relação com o contexto social imediato, procurando preservar a visão de totalidade.
Nesta caminhada será importante ressaltar que o projeto político-pedagógico busca a organização do
trabalho pedagógico da escola na sua globalidade.
A principal possibilidade de construção do projeto político-pedagógico passa pela relativa autonomia
da escola, de sua capacidade de delinear sua própria identidade. Isto significa resgatar a escola como
espaço público, lugar de debate, do diálogo, fundado na reflexão coletiva.
Portanto, é preciso entender que o projeto político-pedagógico da escola dará indicações necessárias
à organização do trabalho pedagógico, que inclui o trabalho do professor na dinâmica interna da sala de
aula.
Buscar uma nova organização para a escola constitui uma ousadia para os educadores, pais, alunos
e funcionários. E para enfrentarmos essa ousadia, necessitamos de um referencial que fundamente a
construção do projeto político-pedagógico.
A questão é, pois, saber a qual referencial temos que recorrer para a compreensão de nossa prática
pedagógica. Nesse sentido, temos que nos alicerçar nos pressupostos de uma teoria pedagógica crítica
viável, que parta da prática social e esteja compromissada em solucionar os problemas da educação e
do ensino de nossa escola.
Uma teoria que subsidie o projeto político-pedagógico e, por sua vez, a prática pedagógica que ali se
processa deve estar ligada aos interesses da maioria da população. Faz-se necessário, também, o
domínio das bases teórico-metodológicas indispensáveis à concretização das concepções assumidas
coletivamente. Mais do que isso, afirma Freitas5 que:

As novas formas têm que ser pensadas em um contexto de luta, de correlações de força – às vezes
favoráveis, às vezes desfavoráveis. Terão que nascer no próprio “chão da escola”, com apoio dos
professores e pesquisadores. Não poderão ser inventadas por alguém, longe da escola e da luta da
escola.

Se a escola nutre-se da vivência cotidiana de cada um de seus membros, coparticipantes de sua


organização do trabalho pedagógico à administração central, seja o Ministério da Educação, a Secretaria
de Educação Estadual ou Municipal, não compete a eles definir um modelo pronto e acabado, mas sim
estimular inovações e coordenar as ações pedagógicas planejadas e organizadas pela própria escola.
Em outras palavras, as escolas necessitam receber assistência técnica e financeira decidida em
conjunto com as instâncias superiores do sistema de ensino.
Isso pode exigir, também, mudanças na própria lógica de organização das instâncias superiores,
implicando uma mudança substancial na sua prática. Para que a construção do projeto político-
pedagógico seja possível não é necessário convencer os professores, a equipe escolar e os funcionários
a trabalhar mais, ou mobilizá-los de forma espontânea, mas propiciar situações que lhes permitam
aprender a pensar e a realizar o fazer pedagógico de forma coerente.
A escola não tem mais possibilidade de ser dirigida de cima para baixo e na ótica do poder centralizador
que dita as normas e exerce o controle técnico burocrático. A luta da escola é para a descentralização
em busca de sua autonomia e qualidade.
O projeto político-pedagógico não visa simplesmente a um rearranjo formal da escola, mas a uma
qualidade em todo o processo vivido. Vale acrescentar, ainda, que a organização do trabalho pedagógico
da escola tem a ver com a organização da sociedade. A escola nessa perspectiva é vista como uma
instituição social, inserida na sociedade capitalista, que reflete no seu interior as determinações e
contradições dessa sociedade.
Está hoje inserido num cenário marcado pela diversidade. Cada escola é resultado de um processo
de desenvolvimento de suas próprias contradições. Não existem duas escolas iguais. Diante disso,
desaparece aquela arrogante pretensão de saber de antemão quais serão os resultados do projeto. A
arrogância do dono da verdade dá lugar à criatividade e ao diálogo. A pluralidade de projetos pedagógicos
faz parte da história da educação da nossa época. Por isso, não deve existir um padrão único que oriente
a escolha do projeto das escolas.
Não se entende, portanto, uma escola sem autonomia para estabelecer o seu projeto e autonomia
para executá-lo e avaliá-lo. A autonomia e a gestão democrática da escola fazem parte da própria
natureza do ato pedagógico. A gestão democrática da escola é, portanto uma exigência de seu projeto
político-pedagógico.
5
FREITAS Luiz Carlos. "Organização do trabalho pedagógico". Palestra proferida no 11 Seminário Internacional de Alfabetização e Educação. Novo Hamburgo,
agosto de 1991.

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Ela exige, em primeiro lugar, uma mudança de mentalidade de todos os membros da comunidade
escolar. Mudança que implica deixar de lado o velho preconceito de que a escola pública é apenas um
aparelho burocrático do Estado e não uma conquista da comunidade.

A gestão democrática da escola implica que a comunidade, os usuários da escola, sejam os seus
dirigentes e gestores e não apenas os seus fiscalizadores ou meros receptores dos serviços
educacionais. Os pais, alunos, professores e funcionários assumem sua parte na responsabilidade pelo
projeto da escola.

Há pelo menos duas razões, que justificam a implantação de um processo de gestão democrática na
escola pública:
1º: a escola deve formar para a cidadania e, para isso, ela deve dar o exemplo.
2º: porque a gestão democrática pode melhorar o que é específico da escola, isto é, o seu ensino.

A participação na gestão da escola proporcionará um melhor conhecimento do funcionamento da


escola e de todos os seus atores. Proporcionará um contato permanente entre professores e alunos, o
que leva ao conhecimento mútuo e, em consequência, aproximará também as necessidades dos alunos
dos conteúdos ensinados pelos professores.
O aluno aprende apenas quando ele se torna sujeito da sua própria aprendizagem. E para ele tornar-
se sujeito da sua aprendizagem ele precisa participar das decisões que dizem respeito ao projeto da
escola que faz parte também do projeto de sua vida.

A autonomia e a participação - pressupostos do projeto político-pedagógico da escola, não se limitam


à mera declaração de princípios consignados em alguns documentos. Sua presença precisa ser sentida
no conselho de escola ou colegiado, mas também na escolha do livro didático, no planejamento do ensino,
na organização de eventos culturais, de atividades cívicas, esportivas, recreativas. Não basta apenas
assistir reuniões.
A gestão democrática deve estar impregnada por certa atmosfera que se respira na escola, na
circulação das informações, na divisão do trabalho, no estabelecimento do calendário escolar, na
distribuição das aulas, no processo de elaboração ou de criação de novos cursos ou de novas disciplinas,
na formação de grupos de trabalho, na capacitação dos recursos humanos, etc.

Então não se esqueça:


1- O projeto político pedagógico da escola pode ser entendido como um processo de mudança e
definição de um rumo, que estabelece princípios, diretrizes e propostas de ação para melhor organizar,
sistematizar e significar as atividades desenvolvidas pela escola como um todo. Sua dimensão política
pedagógica pressupõe uma construção participativa que envolve ativamente os diversos segmentos
escolares e a própria comunidade onde a escola se insere.
2- Quando a atuação ocorre em um planejamento participativo, as pessoas ressignificam suas
experiências, refletem suas práticas, resgatam, reafirmam e atualizam valores. Explicitam seus sonhos e
utopias, demonstram seus saberes, suas visões de mundo, de educação e o conhecimento, dão sentido
aos seus projetos individuais e coletivos, reafirmam suas identidades estabelecem novas relações de
convivência e indicam um horizonte de novos caminhos, possibilidades e propostas de ação. Este
movimento visa promover a transformação necessária e desejada pelo coletivo escolar e comunitário e a
assunção de uma intencionalidade política na organização do trabalho pedagógico escolar.
3- Para que o projeto seja impregnado por uma intencionalidade significadora, é necessário que as
partes envolvidas na prática educativa de uma escola estejam profundamente integradas na constituição
e que haja vivencia dessa intencionalidade. A comunidade escolar então tem que estar envolvida na
construção e explicitação dessa mesma intencionalidade.

Processos e Princípios de Construção


A Lei de Diretrizes e Bases da Educação - LDB 9394/96, no artigo 12, define claramente a incumbência
da escola de elaborar o seu projeto pedagógico.
Além disso, explicita uma compreensão de escola para além da sala de aula e dos muros da escola,
no sentido desta estar inserida em um contexto social e que procure atender às exigências não só dos
alunos, mas de toda a sociedade.
Ainda coloca, nos artigos 13 e 14, como tarefa de professores, supervisores e orientadores a
responsabilidade de participar da elaboração desse projeto.

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A construção do projeto político-pedagógico numa perspectiva emancipatória se constitui num
processo de vivência democrática à medida que todos os segmentos que compõem a comunidade escolar
e acadêmica dele devam participar, comprometidos com a integridade do seu planejamento, de modo
que todos assumem o compromisso com a totalidade do trabalho educativo.
Segundo Veiga6, a abordagem do projeto político-pedagógico, como organização do trabalho da escola
como um todo, está fundada nos princípios que deverão nortear a escola democrática, pública e gratuita:

Igualdade: de condições para acesso e permanência na escola. Saviani7 alerta-nos para o fato de que
há uma desigualdade no ponto de partida, mas a igualdade no ponto de chegada deve ser garantida pela
mediação da escola. O autor destaca: Portanto, só é possível considerar o processo educativo em seu
conjunto sob a condição de se distinguir a democracia com a possibilidade no ponto de partida e
democracia como realidade no ponto de chegada. Igualdade de oportunidades requer, portanto, mais que
a expansão quantitativa de ofertas; requer ampliação do atendimento com simultânea manutenção de
qualidade.

Qualidade: que não pode ser privilégio de minorias econômicas e sociais. O desafio que se coloca ao
projeto político-pedagógico da escola é o de propiciar uma qualidade para todos. A qualidade que se
busca implica duas dimensões indissociáveis: a formal ou técnica e a política. Uma não está
subordinada a outra; cada uma delas tem perspectivas próprias.

Formal ou Técnica - enfatiza os instrumentos e os métodos, a técnica. A qualidade formal não está
afeita, necessariamente, a conteúdos determinados. Demo8 afirma que a qualidade formal: “(...) significa
a habilidade de manejar meios, instrumentos, formas, técnicas, procedimentos diante dos desafios do
desenvolvimento”.

Política - a qualidade política é condição imprescindível da participação. Está voltada para os fins,
valores e conteúdos. Quer dizer “a competência humana do sujeito em termos de se fazer e de fazer
história, diante dos fins históricos da sociedade humana”.
Nesta perspectiva, o autor chama atenção para o fato de que a qualidade centra-se no desafio de
manejar os instrumentos adequados para fazer a história humana. A qualidade formal está relacionada
com a qualidade política e esta depende da competência dos meios.
A escola de qualidade tem obrigação de evitar de todas as maneiras possíveis a repetência e a evasão.
Tem que garantir a meta qualitativa do desempenho satisfatório de todos. Qualidade para todos, portanto,
vai além da meta quantitativa de acesso global, no sentido de que as crianças, em idade escolar, entrem
na escola. É preciso garantir a permanência dos que nela ingressarem. Em síntese, qualidade “implica
consciência crítica e capacidade de ação, saber e mudar”.
O projeto político-pedagógico, ao mesmo tempo em que exige dos educadores, funcionários, alunos e
pais a definição clara do tipo de escola que intentam, requer a definição de fins. Assim, todos deverão
definir o tipo de sociedade e o tipo de cidadão que pretendem formar. As ações especificas para a
obtenção desses fins são meios. Essa distinção clara entre fins e meios é essencial para a construção do
projeto político-pedagógico.

Gestão Democrática: é um princípio consagrado pela Constituição vigente e abrange as dimensões


pedagógica, administrativa e financeira. Ela exige uma ruptura histórica na prática administrativa da
escola, com o enfrentamento das questões de exclusão e reprovação e da não permanência do aluno na
sala de aula, o que vem provocando a marginalização das classes populares. Esse compromisso implica
a construção coletiva de um projeto político-pedagógico ligado à educação das classes populares.
A gestão democrática exige a compreensão em profundidade dos problemas postos pela prática
pedagógica. Ela visa romper com a separação entre concepção e execução, entre o pensar e o fazer,
entre teoria e prática. Busca resgatar o controle do processo e do produto do trabalho pelos educadores.
Implica principalmente o repensar da estrutura de poder da escola, tendo em vista sua socialização. A
socialização do poder propicia a prática da participação coletiva, que atenua o individualismo; da
reciprocidade, que elimina a exploração; da solidariedade, que supera a opressão; da autonomia, que
anula a dependência de órgãos intermediários que elaboram políticas educacionais das quais a escola é
mera executora.

6
VEIGA, Ilma Passos Alencastro. (org) Projeto político-pedagógico da escola: uma construção possível. 12ª edição Papirus, 2002.
7
SAVIANI, Dermeval. "Para além da curvatura da 'vara". In: Revista Ande no 3. São Paulo, 1982.
8
DEMO Pedro. Educação e qualidade. Campinas, Papirus,1994.

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A busca da gestão democrática inclui, necessariamente, a ampla participação dos representantes dos
diferentes segmentos da escola nas decisões/ações administrativo-pedagógicas ali desenvolvidas. Nas
palavras de Marques9: A participação ampla assegura a transparência das decisões, fortalece as
pressões para que sejam elas legítimas, garante o controle sobre os acordos estabelecidos e, sobretudo,
contribui para que sejam contempladas questões que de outra forma não entrariam em cogitação.
Neste sentido, fica claro entender que a gestão democrática, no interior da escola, não é um princípio
fácil de ser consolidado, pois trata-se da participação crítica na construção do projeto político-pedagógico
e na sua gestão.

Liberdade: o princípio da liberdade está sempre associado à ideia de autonomia. O que é necessário,
portanto, como ponto de partida, é o resgate do sentido dos conceitos de autonomia e liberdade. A
autonomia e a liberdade fazem parte da própria natureza do ato pedagógico. O significado de autonomia
remete-nos para regras e orientações criadas pelos próprios sujeitos da ação educativa, sem imposições
externas.

Para Rios10, a escola tem uma autonomia relativa e a liberdade é algo que se experimenta em
situação e esta é uma articulação de limites e possibilidades. Para a autora, a liberdade é uma experiência
de educadores e constrói-se na vivência coletiva, interpessoal. Portanto, “somos livres com os outros,
não, apesar dos outros”. Se pensamos na liberdade na escola, devemos pensá-la na relação entre
administradores, professores, funcionários e alunos que aí assumem sua parte de responsabilidade na
construção do projeto político-pedagógico e na relação destes com o contexto social mais amplo.
A liberdade deve ser considerada, também, como liberdade para aprender, ensinar, pesquisar e
divulgar a arte e o saber direcionados para uma intencionalidade definida coletivamente.

Valorização do magistério: é um princípio central na discussão do projeto político-pedagógico. A


qualidade do ensino ministrado na escola e seu sucesso na tarefa de formar cidadãos capazes de
participar da vida socioeconômica, política e cultural do país relacionam-se estreitamente a formação
(inicial e continuada), condições de trabalho (recursos didáticos, recursos físicos e materiais, dedicação
integral à escola, redução do número de alunos na sala de aula etc.), remuneração, elementos esses
indispensáveis à profissionalização do magistério.
O reforço à valorização dos profissionais da educação, garantindo-lhes o direito ao aperfeiçoamento
profissional permanente, significa “valorizar a experiência e o conhecimento que os professores têm a
partir de sua prática pedagógica”.

A formação continuada é um direito de todos os profissionais que trabalham na escola, uma vez que
não só ela possibilita a progressão funcional baseada na titulação, na qualificação e na competência dos
profissionais, mas também propicia, fundamentalmente, o desenvolvimento profissional dos professores
articulado com as escolas e seus projetos.
A formação continuada deve estar centrada na escola e fazer parte do projeto político-pedagógico.
Assim, compete à escola:
- proceder ao levantamento de necessidades de formação continuada de seus profissionais;
- elaborar seu programa de formação, contando com a participação e o apoio dos órgãos centrais, no
sentido de fortalecer seu papel na concepção, na execução e na avaliação do referido programa.
Daí, passarem a fazer parte dos programas de formação continuada, questões como cidadania, gestão
democrática, avaliação, metodologia de pesquisa e ensino, novas tecnologias de ensino, entre outras.
Inicialmente, convém alertar para o fato de que essa tomada de consciência, dos princípios do projeto
político-pedagógico, não pode ter o sentido espontaneísta de se cruzar os braços diante da atual
organização da escola, que inibe a participação de educadores, funcionários e alunos no processo de
gestão.
É preciso ter consciência de que a dominação no interior da escola efetiva-se por meio das relações
de poder que se expressam nas práticas autoritárias e conservadoras dos diferentes profissionais,
distribuídos hierarquicamente, bem como por meio das formas de controle existentes no interior da
organização escolar. Por outro lado, a escola é local de desenvolvimento da consciência crítica da
realidade.

9
MARQUES, Mário Osório. "Projeto pedagógico: A marca da escola". In: Revista Educação e Contexto. Projeto pedagógico e identidade da escola no 18. ljuí,
Unijuí, abr./jun. 1990.
10
RIOS, Terezinha. "Significado e pressupostos do projeto pedagógico". In: Série Ideias. São Paulo, FDE,1982.

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Estratégia de Planejamento
Definição de marco/referência: é necessário definir o conjunto de ideias, de opções e teorias que
orientará a prática da escola. Para tanto, é preciso analisar em que contexto a escola está inserida. Para
assim definir e explicitar com que tipo de sociedade a escola se compromete, que tipo de pessoas ela
buscará formar e qual a sua intencionalidade político, social, cultural e educativa. Esta assunção permite
clarear os critérios de ação para planejar como se deseja a escola no que se refere à dimensão
pedagógica, comunitária e administrativa.
É um momento que requer estudos, reflexões teóricas, análise do contexto, trabalho individual, em
grupo, debates, elaboração escrita. Devem ser criadas estratégias para que todos os segmentos
envolvidos com a construção do projeto político-pedagógico possam refletir, se posicionar acerca do
contexto em que a escola se insere. É necessário partir da realidade local, para compreendê-la numa
dimensão mais ampla. Então se deve analisar e discutir como vivem as pessoas da comunidade, de onde
vieram quais grupos étnicos a compõem, qual o trabalho que realizam como são as relações deste
trabalho, como é a vida no período da infância, juventude, idade adulta e a melhor idade (idoso) nesta
comunidade, quais são as formas de organização desta comunidade, etc.
A partir da reflexão sobre estes elementos pode-se discutir a relação que eles têm no tempo histórico,
no sentido de perceber mudanças ocorridas na forma de vida das pessoas e da comunidade. Analisar o
que tem de comum e tentar fazer relação com outros espaços, com a sociedade como um todo. Discutir
como se vê a sociedade brasileira, quais são os valores que estão presentes, como estes são
manifestados, se as pessoas estão satisfeitas com esta sociedade e o seu modo de organização.

Para delimitar o marco doutrinal do projeto político-pedagógico propõe-se discutir: que tipo de
sociedade nós queremos construir, com que valores, o que significa ser sujeito nesta sociedade,
como a escola pode colaborar com a formação deste sujeito durante a sua vida.

Para definirmos o marco operativo sugere-se que analisemos a concepção e os princípios para
o papel que a escola pode desempenhar na sociedade.

Propomos a partir da leitura de textos, da compreensão de cada um, discutir com todos os segmentos
como queremos que seja nossa escola, que tipo de educação precisamos desenvolver para ajudar a
construir a sociedade que idealizamos como entendemos que ser a proposta pedagógica da escola, como
devem ser as relações entre direção, equipe pedagógica, professores, alunos, pais, comunidade, como
a escola pode envolver a comunidade e se fazer presente nela, analisando qual a importância desta
relação para os sujeitos que dela participam.

Diagnóstico: é o segundo passo da construção do projeto e se constitui num momento importante


que permite uma radiografia da situação em que a escola se encontra na organização e desenvolvimento
do seu trabalho pedagógico acima de tudo, tendo por base, o marco referencial, fazer comparações e
estabelecer necessidades para se chegar à intencionalidade do projeto.

O documento produzido sobre o marco referencial deve ser lido por todos. Com base neste documento
deve-se elaborar um roteiro de discussão para comparar todos os elementos que aparecem no
documento com a prática social vivida, ou seja, discutir como de fato se dá a relação entre escola e a
comunidade, como ela trabalha com os conhecimentos que os alunos trazem da sua prática social, como
os conteúdos são escolhidos, como os professores planejam o seu trabalho pedagógico da escola, como
e quando se avalia o trabalho na sala de aula e o trabalho pedagógico da escola, quem participa desta
avaliação, como a escola tem definido a sua opção teórica no trabalho pedagógico, como se dão as
relações e a participação de alunos, professores, coordenadores, diretores, pais, funcionários e
comunidade na organização do trabalho pedagógico escolar.
Estes dados precisam ser sistematizados e discutidos por todos da equipe que elabora o projeto. Com
a finalização do diagnóstico da escola e de sua relação com a comunidade pode-se definir um plano de
ação e as grandes estratégias que devem ser perseguidas para atingir a intencionalidade assumida no
marco referencial.

Propostas de Ação: este é o momento em que se procura pensar estratégias, linhas de ação, normas,
ações concretas permanentes e temporárias para responder às necessidades apontadas a partir do
diagnóstico tendo por referência sempre à intencionalidade assumida. Assim, cada problema constatado,
cada necessidade apontada é preciso definir uma proposta de ação.

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Esta proposta de ação pode ser pensada a partir de grandes metas. Para cada meta pode-se definir
ações permanentes, ações de curto, médio e longo prazo, normas e estratégias para atingir a meta
definida. Além disso, é preciso justificar cada meta, traçar seus objetivos, sua metodologia, os recursos
necessários, os responsáveis pela execução, o cronograma e como será feita a avaliação.
Com base nesses três momentos que devem estar dialeticamente articulados elabora-se o projeto
político-pedagógico, o qual precisa também de forma coletiva ser executado, avaliado e (re)planejado.

Etapas
Devemos analisar e compreender a organização do trabalho pedagógico, no sentido de se gestar uma
nova organização que reduza os efeitos de sua divisão do trabalho, de sua fragmentação e do controle
hierárquico.
Nessa perspectiva, a construção do projeto político-pedagógico é um instrumento de luta, é uma forma
de contrapor-se à fragmentação do trabalho pedagógico e sua rotinização, à dependência e aos efeitos
negativos do poder autoritário e centralizador dos órgãos da administração central.
As etapas de elaboração de um projeto pedagógico podem assim ser definidas:

Cronograma de trabalho e definição da divisão de tarefas: definição da periodicidade e das tarefas


para a elaboração do projeto pedagógico. Definir um prazo faz com que haja organização e compromisso
com o trabalho de elaboração.

É importante reiterar que, quando se busca uma nova organização do trabalho pedagógico, está se
considerando que as relações de trabalho, no interior da escola deverão estar calçadas nas atitudes de
solidariedade, de reciprocidade e de participação coletiva, em contraposição à organização regida pelos
princípios da divisão do trabalho da fragmentação e do controle hierárquico.
É nesse movimento que se verifica o confronto de interesses no interior da escola. Por isso todo esforço
de se gestar uma nova organização deve levar em conta as condições concretas presentes na escola.
Há uma correlação de forças e é nesse embate que se originam os conflitos, as tensões, as rupturas,
propiciando a construção de novas formas de relações de trabalho, com espaços abertos à reflexão
coletiva que favoreçam o diálogo, a comunicação horizontal entre os diferentes segmentos envolvidos
com o processo educativo, a descentralização do poder.

Histórico da instituição: sua criação, ato normativo, origem de seu nome, etc.

Abrangência da ação educativa referente:


- Nível de ensino e suas etapas;
- Modalidades de educação que irá atender;
- Aos profissionais, considerando: à área, o trabalho da equipe pedagógica e administrativa;
- À comunidade externa: entorno social.

Objetivos: gerais, observando os objetivos definidos pela instituição.

Princípios legais e norteadores da ação: a instituição deve observar ainda os planos e Políticas
(federal, estadual ou municipal) de Educação. A partir da identificação dos princípios registrados nas
legislações em vigor, deve explicitar o sentido que os mesmos adquirem em seu contexto de ação.

Currículo: identificar o paradigma curricular em concordância com sua opção do método, da teoria
que orienta sua prática. Implica, necessariamente, a interação entre sujeitos que têm um mesmo objetivo
e a opção por um referencial teórico que o sustente. Na organização curricular é preciso considerar alguns
pontos básicos:

1º - é o de que o currículo não é um instrumento neutro. O currículo passa ideologia, e a escola precisa
identificar e desvelar os componentes ideológicos do conhecimento escolar que a classe dominante utiliza
para a manutenção de privilégios. A determinação do conhecimento escolar, portanto, implica uma análise
interpretativa e crítica, tanto da cultura dominante, quanto da cultura popular. O currículo expressa uma
cultura.
2º - é o de que o currículo não pode ser separado do contexto social, uma vez que ele é historicamente
situado e culturalmente determinado.
3º - diz respeito ao tipo de organização curricular que a escola deve adotar. Em geral, nossas
instituições têm sido orientadas para a organização hierárquica e fragmentada do conhecimento escolar.

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4º - refere-se a questão do controle social, já que o currículo formal (conteúdos curriculares,
metodologia e recursos de ensino, avaliação e relação pedagógica) implica controle. Por outro lado, o
controle social é instrumentalizado pelo currículo oculto, entendido este como as “mensagens transmitidas
pela sala de aula e pelo ambiente escolar”.

Assim, toda a gama de visões do mundo, as normas e os valores dominantes são passados aos alunos
no ambiente escolar, no material didático e mais especificamente por intermédio dos livros didáticos, na
relação pedagógica, nas rotinas escolares. Os resultados do currículo oculto “estimulam a conformidade
a ideais nacionais e convenções sociais ao mesmo tempo que mantêm desigualdades socioeconômicas
e culturais”.
Orientar a organização curricular para fins emancipatórios implica, inicialmente desvelar as visões
simplificadas de sociedade, concebida como um todo homogêneo, e de ser humano como alguém que
tende a aceitar papéis necessários à sua adaptação ao contexto em que vive. Controle social na visão
crítica, é uma contribuição e uma ajuda para a contestação e a resistência à ideologia veiculada por
intermédio dos currículos escolares.

Ensino, aprendizagem e avaliação: orientações didáticas e metodológicas quanto à educação


infantil, ensino fundamental, ensino médio, educação especial, educação de jovens e adultos, educação
profissional. Mecanismos de acompanhamento pedagógico, de recuperação paralela, de avaliação:
indicadores de aprendizagem, diretrizes, procedimentos e instrumentos de recuperação e avaliação.

Programa de formação continuada: concepção, objetivos, eixos, política e estratégia.

Formas de relacionamento com a comunidade: concepção de educação comunitária, princípios,


objetivos e estratégias.

Organização do tempo e do espaço escolar: cronograma de atividades.


- diárias, semanais, bimestrais, semestrais, anuais.
- estudo, planejamento, enriquecimento curricular, ação comunitária.
- normas de utilização de espaços comuns da instituição.

O tempo é um dos elementos constitutivos da organização do trabalho pedagógico. O calendário


escolar ordena o tempo: determina o início e o fim do ano, prevendo os dias letivos, as férias, os períodos
escolares em que o ano se divide, os feriados cívicos e religiosos, as datas reservadas à avaliação, os
períodos para reuniões técnicas, cursos etc.
O horário escolar, que fixa o número de horas por semana e que varia em razão das disciplinas
constantes na grade curricular, estipula também o número de aulas por professor. Tal como afirma
Enguita11.
(...) As matérias tornam-se equivalentes porque ocupam o mesmo número de horas por semana e, são
vistas como tendo menor prestígio se ocupam menos tempo que as demais.

A organização do tempo do conhecimento escolar é marcada pela segmentação do dia letivo, e o


currículo é, consequentemente, organizado em períodos fixos de tempo para disciplinas supostamente
separadas. O controle hierárquico utiliza o tempo que muitas vezes é desperdiçado e controlado pela
administração e pelo professor.
Em resumo, quanto mais compartimentado for o tempo, mais hierarquizadas e ritualizadas serão as
relações sociais, reduzindo, também, as possibilidades de se institucionalizar o currículo integração que
conduz a um ensino em extensão.
Para alterar a qualidade do trabalho pedagógico torna-se necessário que a escola reformule seu
tempo, estabelecendo períodos de estudo e reflexão de equipes de educadores fortalecendo a escola
como instância de educação continuada.
É preciso tempo para que os educadores aprofundem seu conhecimento sobre os alunos e sobre o
que estão aprendendo. É preciso tempo para acompanhar e avaliar o projeto político-pedagógico em
ação. É preciso tempo para os estudantes se organizarem e criarem seus espaços para além da sala de
aula.

11
ENGUITA, Mariano F. A face oculta da escola: Educação e trabalho no capitalismo. Porto Alegre, Artes Médicas, 1989.

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1484041 E-book gerado especialmente para MAURICIO PEREIRA BARROS
Acompanhamento e avaliação do projeto pedagógico: parâmetros, mecanismos de avaliação
interna e externa, responsáveis, cronograma.
Esses são alguns elementos que devem ser abordados no projeto pedagógico.
Geralmente encontram-se documentos com a seguinte organização: apresentação, dados de
identificação, organograma, histórico, filosofia, pressupostos teóricos e metodológicos, objetivos,
organização curricular, processo de avaliação da aprendizagem, avaliação institucional, processo de
formação continuada, organização e utilização do espaço físico, projetos/programas, referências, anexos,
apêndices, dentre outros:

Finalidades
Segundo Veiga12, a escola persegue finalidades. É importante ressaltar que os educadores precisam
ter clareza das finalidades de sua escola. Para tanto há necessidade de se refletir sobre a ação educativa
que a escola desenvolve com base nas finalidades e nos objetivos que ela define. As finalidades da escola
referem-se aos efeitos intencionalmente pretendidos e almejados.
Alves13 afirma que há necessidade de saber se a escola dispõe de alguma autonomia na determinação
das finalidades e, consequentemente, seu desdobramento em objetivos específicos. O autor enfatiza que:
interessará reter se as finalidades são impostas por entidades exteriores ou se são definidas no interior
do território social e se são definidas por consenso ou por conflito ou até se é matéria ambígua, imprecisa
ou marginal.
Essa colocação está sustentada na ideia de que a escola deve assumir, como uma de suas principais
tarefas, o trabalho de refletir sobre sua intencionalidade educativa. Nesse sentido, ela procura alicerçar o
conceito de autonomia, enfatizando a responsabilidade de todos, sem deixar de lado os outros níveis da
esfera administrativa educacional.
A ideia de autonomia está ligada à concepção emancipadora da educação. Para ser autônoma, a
escola não pode depender dos órgãos centrais e intermediários que definem a política da qual ela não
passa de executora. Ela concebe seu projeto político-pedagógico e tem autonomia para executá-lo e
avaliá-lo ao assumir uma nova atitude de liderança, no sentido de refletir sobre as finalidades
sociopolíticas e culturais da escola.

Estrutura Organizacional
A escola, de forma geral, dispõe de dois tipos básicos de estruturas: administrativas e pedagógicas.

Administrativas - asseguram praticamente, a locação e a gestão de recursos humanos, físicos e


financeiros. Fazem parte, ainda, das estruturas administrativas todos os elementos que têm uma forma
material como, por exemplo, a arquitetura do edifício escolar e a maneira como ele se apresenta do ponto
de vista de sua imagem: equipamentos e materiais didáticos, mobiliário, distribuição das dependências
escolares e espaços livres, cores, limpeza e saneamento básico (água, esgoto, lixo e energia elétrica).

Pedagógicas - que, teoricamente, determinam a ação das administrativas, “organizam as funções


educativas para que a escola atinja de forma eficiente e eficaz as suas finalidades”. As estruturas
pedagógicas referem-se, fundamentalmente, às interações políticas, às questões de ensino e de
aprendizagem e às de currículo. Nas estruturas pedagógicas incluem-se todos os setores necessários ao
desenvolvimento do trabalho pedagógico.

A análise da estrutura organizacional da escola visa identificar quais estruturas são valorizadas e por
quem, verificando as relações funcionais entre elas. É preciso ficar claro que a escola é uma organização
orientada por finalidades, controlada e permeada pelas questões do poder. A análise e a compreensão
da estrutura organizacional da escola significam indagar sobre suas características, seus polos de poder,
seus conflitos.
Avaliar a estrutura organizacional significa questionar os pressupostos que embasam a estrutura
burocrática da escola que inviabiliza a formação de cidadãos aptos a criar ou a modificar a realidade
social. Para realizar um ensino de qualidade e cumprir suas finalidades, as escolas têm que romper com
a atual forma de organização burocrática que regula o trabalho pedagógico – pela conformidade às regras
fixadas, pela obediência a leis e diretrizes emanadas do poder central e pela cisão entre os que pensam
e executam, que conduz a fragmentação e ao consequente controle hierárquico que enfatiza três
aspectos inter-relacionados: o tempo, a ordem e a disciplina.

12
VEIGA, Ilma Passos Alencastro. (org) Projeto político-pedagógico da escola: uma construção possível. 12ª edição Papirus, 2002.
13
ALVES José Matias. Organização, gestão e projeto educativo das escolas. Porto Edições Asa, 1992.

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1484041 E-book gerado especialmente para MAURICIO PEREIRA BARROS
Nessa trajetória, ao analisar a estrutura organizacional, ao avaliar os pressupostos teóricos, ao situar
os obstáculos e vislumbrar as possibilidades, os educadores vão desvelando a realidade escolar,
estabelecendo relações, definindo finalidades comuns e configurando novas formas de organizar as
estruturas administrativas e pedagógicas para a melhoria do trabalho de toda a escola na direção do que
se pretende.
Assim, considerando o contexto, os limites, os recursos disponíveis (humanos, materiais e financeiros)
e a realidade escolar, cada instituição educativa assume sua marca, tecendo, no coletivo, seu projeto
político-pedagógico, propiciando consequentemente a construção de uma nova forma de organização.

Processo de Decisão
Na organização formal de nossa escola, o fluxo das tarefas das ações e principalmente das decisões
é orientado por procedimentos formalizados, prevalecendo as relações hierárquicas de mando e
submissão, de poder autoritário e centralizador.
Uma estrutura administrativa da escola adequada à realização de objetivos educacionais, de acordo
com os interesses da população, deve prever mecanismos que estimulem a participação de todos no
processo de decisão.
Isto requer uma revisão das atribuições especificas e gerais, bem como da distribuição do poder e da
descentralização do processo de decisão. Para que isso seja possível há necessidade de se instalarem
mecanismos institucionais visando à participação política de todos os envolvidos com o processo
educativo da escola.

Contudo, a participação da coordenação pedagógica nesse processo é fundamental, pois o


trabalho é garantir a satisfação do bom atendimento em prol de toda a instituição.

Avaliação
Acompanhar as atividades e avaliá-las levam-nos a reflexão com base em dados concretos sobre
como a escola organiza-se para colocar em ação seu projeto político-pedagógico. A avaliação do projeto
político-pedagógico, numa visão crítica, parte da necessidade de se conhecer a realidade escolar, busca
explicar e compreender ceticamente as causas da existência de problemas bem como suas relações,
suas mudanças e se esforça para propor ações alternativas (criação coletiva). Esse caráter criador é
conferido pela autocrítica.
Avaliadores que conjugam as ideias de uma visão global, analisam o projeto político-pedagógico, não
como algo estanque desvinculado dos aspectos políticos e sociais. Não rejeitam as contradições e os
conflitos. A avaliação tem um compromisso mais amplo do que a mera eficiência e eficácia das propostas
conservadoras. Portanto, acompanhar e avaliar o projeto político-pedagógico é avaliar os resultados da
própria organização do trabalho pedagógico.
Considerando a avaliação dessa forma é possível salientar dois pontos importantes. Primeiro, a
avaliação é um ato dinâmico que qualifica e oferece subsídios ao projeto político-pedagógico. Segundo,
ela imprime uma direção às ações dos educadores e dos educandos.
O processo de avaliação envolve três momentos: a descrição e a problematização da realidade
escolar, a compreensão crítica da realidade descrita e problematizada e a proposição de alternativas de
ação, momento de criação coletiva.
A avaliação, do ponto de vista crítico, não pode ser instrumento de exclusão dos alunos provenientes
das classes trabalhadoras. Portanto, deve ser democrática, deve favorecer o desenvolvimento da
capacidade do aluno de apropriar-se de conhecimentos científicos, sociais e tecnológicos produzidos
historicamente e deve ser resultante de um processo coletivo de avaliação diagnóstica.

Questões

01. (SEDUC-RO - Professor – História – FUNCAB) Quanto ao Projeto Político-Pedagógico, é


INCORRETO afirmar que ele:
(A) deve ser democrático.
(B) precisa ser construído coletivamente.
(C) confere identidade à escola.
(D) explicita a intencionalidade da escola.
(E) mostra-se abrangente e imutável.

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02. (ABIN - Oficial Técnico de Inteligência – Área de Pedagogia CESPE) Julgue o item a seguir,
relativo a projeto político-pedagógico, que, nas instituições, pode ser considerado processo de
permanente reflexão e discussão a respeito dos problemas da organização, com o propósito de propor
soluções que viabilizem a efetivação dos objetivos almejados.

Os pressupostos que norteiam o projeto político-pedagógico estão desvinculados da proposta de


gestão democrática.
( ) Certo ( ) Errado

03. (Prefeitura de Palmas/TO - Professor - Língua Espanhola – FDC) “O projeto político-pedagógico


antecipa um futuro diferente do presente. Não é algo que é construído e arquivado como prova do
cumprimento de tarefas burocráticas.” (Ilma Passos)

Segundo a autora, o projeto político-pedagógico, comprometido com uma educação democrática e de


qualidade, caracteriza- se fundamentalmente como:
(A) atividades articuladas, com temas selecionados semestralmente.
(B) planejamento global, com conteúdos selecionados por série.
(C) ação intencional, com compromisso definido coletivamente.
(D) plano anual, com objetivos definidos pelos professores.
(E) instrumento técnico, com definição metodológica.

04. (IFRN - Professor - Didática) A construção do projeto político-pedagógico da escola exige a


definição de princípios, objetivos, estratégias e, acima de tudo, um trabalho coletivo para a sua
operacionalização. Numa perspectiva crítica e democrática, o projeto político-pedagógico da escola
proporciona:
I - melhoria da organização pedagógica, administrativa e financeira da escola, bem como o
estabelecimento de novas relações pessoais e interpessoais na instituição;
II - redimensionamento da prática pedagógica dos professores e formação continuada do quadro
docente.
III - planejamento a curto prazo para definir aplicação de medidas emergenciais na escola, de modo a
superar certas dificuldades, detectar outras e propor novas ações.
IV - a superação de práticas pedagógicas fragmentadas e a garantia total de um ensino de qualidade.

Assinale a opção em que todas as afirmativas estão corretas:


(A) I, II e III.
(B) I e IV.
(C) I, II e IV.
(D) I e II

05. (Pref. Maceió/AL - Professor - Área 1º ao 5º ano - COPEVE/UFAL/2017) Não se constrói um


Projeto Político Pedagógico sem norte, sem rumo. Por isso, todo projeto pedagógico da escola é também
político (GADOTTI e ROMÃO, 1997). Dadas as afirmativas,
I. O Projeto Político Pedagógico deve ter como marco fundamental a participação democrática, o ser
multicultural, mantendo o convívio com base em hierarquias fixas.
II. O Projeto Político Pedagógico deve registrar, orientar, estabelecer ações, metas e estratégias que
tenham como objetivo o disciplinamento dos corpos e das mentes.
III. O Projeto Político Pedagógico de uma escola é fruto de uma ação cotidiana e que precisa tomar
decisões para o bem de toda comunidade escolar.

Verifica-se que está(ão) correta(s)


(A) I, apenas.
(B) III, apenas.
(C) I e II, apenas.
(D) II e III, apenas.
(E) I, II e III.

06. (Pref. São Luís/MA - Professor de Nível Superior – CESPE/2017) A partir da participação da
comunidade escolar e da reflexão a respeito da composição escolar, a organização da escola, desde os
tempos e espaços do currículo até o relacionamento com a comunidade, é estabelecida

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(A) no plano de aula anual.
(B) no plano de curso.
(C) no conselho de classe.
(D) na reunião de pais.
(E) no projeto político-pedagógico.

07. (Pref. Lagoa da Prata/MG - Especialista Educacional – FGR) “A construção do Projeto Político-
Pedagógico (PPP) é um processo dinâmico e permanente, pois continuamente novos atores se
incorporam ao grupo, trazendo novas experiências, capacidades e necessidades, assim como novo
interesses e talentos, exigindo que novas frentes de trabalho se abram.

É um eterno diagnosticar, planejar, repensar, começar e recomeçar, analisar e avaliar.”


(VEIGA, Ilma Passos Alencastro (org.). Escola: espaço do projeto político pedagógico. Campinas, SP: Papirus, 1998, pág. 183)

Tendo como referência a construção do PPP, marque V para as alternativas VERDADEIRAS e F para
as FALSAS.
( ) Eliminação das relações verticalizadas entre a escola e os dirigentes educacionais.
( ) Realização de trabalho padronizado, repetitivo e mecânico, desconsiderando as diferenças entre
os agentes educativos.
( ) O currículo se restringe ao cumprimento das atividades do livro didático, que passa a ser utilizado
como um fim e não um meio.
( ) A elaboração do PPP possibilita aos profissionais da educação e aos alunos a vivência do processo
democrático.

A sequência CORRETA, de cima para baixo é:


(A) V, F, F, V.
(B) F, F, F, V.
(C) V, F, V, V.
(D) F, V, V, F.

08. (IFBA - Professor - FUNRIO) O projeto educacional é, respectivamente, político e pedagógico,


porque
(A) perpetua valores da cultura da sociedade a que atende e impõe as opções pedagógicas da unidade
de ensino
(B) reproduz os valores sociais e culturais e propõe opções educativas que levam à construção de
ideais pedagógicos.
(C) favorece a formação dos sujeitos para um tipo de sociedade que se deseja e define as ações para
que a escola cumpra suas intenções educativas.
(D) responde às demandas da sociedade e organiza as estratégias pedagógicas traçadas pela direção
e coordenação pedagógica da escola.
(E) repete as estruturas sociais e especifica o trabalho pedagógico em linhas científicas, acadêmicas
e educativas.

09. (DEPEN - Pedagogo - CESPE) São funções do projeto político-pedagógico: diagnóstico e análise
da realidade, definição de objetivos e eixos norteadores, determinação de atividades e responsabilidades
a serem assumidas, além da avaliação dos processos e resultados previstos.
( ) Certo ( ) Errado

10. (SEEAL - Pedagogo - CESPE) Para evitar prejuízo à autonomia escolar, não deve haver
articulação do projeto político pedagógico das escolas com o sistema nacional de avaliação.
( ) Certo ( ) Errado

Gabarito

01.E / 02.Errado / 03.C / 04.D / 05.B / 06.E / 07.A / 08.C / 09.Certo / 10.Errado

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Comentários

01. Alternativa: E
O PPP deve ser democrático, construído de forma coletiva, conferindo a identidade da escola junto à
comunidade, explicitando a intencionalidade da escola, de forma abrangente.
“O projeto pedagógico da escola é, por isso mesmo, sempre um processo inconcluso, uma etapa em
direção a uma finalidade que permanece como horizonte da escola”. (Gadotti14). Por isso, a questão com
palavra imutável está incorreta.

02. Alternativa: Errado


A gestão democrática exige a compreensão em profundidade dos problemas postos pela prática
pedagógica. Ela visa romper com a separação entre concepção e execução, entre o pensar e o fazer,
entre teoria e prática. Busca resgatar o controle do processo e do produto do trabalho pelos educadores.
Neste sentido, fica claro entender que a gestão democrática, no interior da escola, não é um princípio
fácil de ser consolidado, pois trata-se da participação crítica na construção do projeto político-pedagógico
e na sua gestão.

03. Alternativa: C
O Projeto Político-Pedagógico vai além de um simples agrupamento de planos de ensino e de
atividades diversas. O projeto não é algo que é construído e em seguida arquivado ou encaminhado às
autoridades educacionais como prova do cumprimento de tarefas burocráticas. Ele é construído e
vivenciado em todos os momentos, por todos os envolvidos com o processo educativo da escola.
O projeto busca um rumo, uma direção. É uma ação intencional, com um sentido explícito, com um
compromisso definido coletivamente. Por isso, todo projeto pedagógico da escola é, também, um projeto
político por estar intimamente articulado ao compromisso sociopolítico com os interesses reais e coletivos
da população majoritária. É político no sentido de compromisso com a formação do cidadão para um tipo
de sociedade.

04. Alternativa: D
Os processos e princípios do PPP são: Igualdade de condições para acesso e permanência na escola;
Qualidade que não pode ser privilégio de minorias econômicas e sociais; Gestão Democrática: é um
princípio consagrado pela Constituição vigente e abrange as dimensões pedagógica, administrativa e
financeira (que valida a alternativa I); Liberdade: o princípio da liberdade está sempre associado à ideia
de autonomia; Valorização do magistério (que valida a alternativa II).
Já as alternativas III e IV, tornam-se inválidas devido às palavras grifadas:
III - planejamento a curto prazo para definir aplicação de medidas emergenciais na escola, de modo a
superar certas dificuldades, detectar outras e propor novas ações.
IV - a superação de práticas pedagógicas fragmentadas e a garantia total de um ensino de qualidade.

05. Alternativa: B
Grifo nas palavras que deixam as afirmativas I e II incorretas:
I. O Projeto Político Pedagógico deve ter como marco fundamental a participação democrática, o ser
multicultural, mantendo o convívio com base em hierarquias fixas.
II. O Projeto Político Pedagógico deve registrar, orientar, estabelecer ações, metas e estratégias que
tenham como objetivo o disciplinamento dos corpos e das mentes.

06. Alternativa: E
O Projeto Político-Pedagógico vai além de um simples agrupamento de planos de ensino e de
atividades diversas. O projeto não é algo que é construído e em seguida arquivado ou encaminhado às
autoridades educacionais como prova do cumprimento de tarefas burocráticas. Ele é construído e
vivenciado em todos os momentos, por todos os envolvidos com o processo educativo da escola.

07. Alternativa: A
Grifo nas palavras que deixam as afirmativas II e III Falsas:
Realização de trabalho padronizado, repetitivo e mecânico, desconsiderando as diferenças entre os
agentes educativos.

14
GADOTTI, Moacir. "Pressupostos do projeto pedagógico". In: MEC, Anais da Conferência Nacional de Educação para Todos. Brasília, 28/8 a 2/9/94.

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O currículo se restringe ao cumprimento das atividades do livro didático, que passa a ser utilizado
como um fim e não um meio.

08. Alternativa: C
“A dimensão política se cumpre na medida em que ela se realiza enquanto prática especificamente
pedagógica”.
Na dimensão pedagógica reside a possibilidade da efetivação da intencionalidade da escola, que é a
formação do cidadão participativo, responsável, compromissado, crítico e criativo. Pedagógico, no sentido
de definir as ações educativas e as características necessárias às escolas de cumprirem seus propósitos
e sua intencionalidade.

09. Alternativa: Certo


O Projeto Político-Pedagógico, ao se constituir em processo democrático de decisões, preocupa-se
em instaurar uma forma de organização do trabalho pedagógico que supere os conflitos, buscando
eliminar as relações competitivas, corporativas e autoritárias, rompendo com a rotina do mando impessoal
e racionalizado da burocracia que permeia as relações no interior da escola, diminuindo os efeitos
fragmentários da divisão do trabalho que reforça as diferenças e hierarquiza os poderes de decisão.

10. Alternativa: Errado


Avaliadores que conjugam as ideias de uma visão global, analisam o projeto político-pedagógico, não
como algo estanque desvinculado dos aspectos políticos e sociais. Não rejeitam as contradições e os
conflitos. A avaliação tem um compromisso mais amplo do que a mera eficiência e eficácia das propostas
conservadoras. Portanto, acompanhar e avaliar o projeto político-pedagógico é avaliar os resultados da
própria organização do trabalho pedagógico.

2 A didática e o processo de ensino e aprendizagem. 2.1 Organização do


processo didático: planejamento, estratégias e metodologias, avaliação.

A Didática e o processo de formação e prática do profissional da Educação

Como arte a Didática não objetiva apenas o conhecimento por conhecimento, mas procura aplicar os
seus próprios princípios com a finalidade de desenvolver no indivíduo as habilidades cognoscitivas,
tornando-os críticos e reflexivos, desenvolvendo assim um pensamento independente.

Processos Didáticos Básicos, Ensino e Aprendizagem


Anteriormente convém ressaltar o conceito atual de didática segundo a análise etimológica, o contexto
histórico em que prevaleceram determinados conceitos, a problemática educacional e sua relevância para
o ensino.
Etimologicamente a palavra ‘didática’ significa ‘expor claramente’, ‘demonstrar’, ‘ensinar’, ‘instruir’. Em
primeira instância, este sentido mais originário corresponde aproximadamente a tudo aquilo que é ‘próprio
para o ensino’.
Levando em consideração o seu significado etimológico percebemos que a didática está intimamente
ligada ao processo de ensino-aprendizagem, e a tudo que se refere ao ato de ensinar e aprender.
A Didática foi concebida como base de uma reforma educacional importante pela primeira vez no
século XVII, com João Amós Comenius, em sua obra Didática Magna. Nesta época, ele havia observado
que a educação se dava de maneira muito espontânea, permeada de puro praticismo, não havia
sistematização, organização ou planejamento. Com o objetivo de organizar e sistematizar a educação,
Comenius escreveu a Didática Magna, que pretendia estabelecer os fundamentos da ‘arte universal de
ensinar tudo a todos’, privilegiando sobretudo o professor, o método e o conteúdo.
A didática então surge como objeto de estudo no processo de ensino/aprendizagem, pois este está
inserido em todas as práticas educacionais, em todos os níveis de ensino, e cada prática educacional
evidencia uma intenção, ideologia, objetivos e meios para serem atingidos. Desta forma ocorre o processo
de ensino aprendizagem, que em momento algum é neutro, apolítico ou isolado de sua realidade político
social.
Assim, a Didática é o principal ramo de estudo da pedagogia, pois ela situa-se num conjunto de
conhecimentos pedagógicos, investiga os fundamentos, as condições e os modos de realização da

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instrução e do ensino, portanto é considerada a ciência de ensinar. Nesse contexto, o professor tem como
papel principal garantir uma relação didática entre ENSINO x APRENDIZAGEM.
Segundo Libâneo15, o professor tem o dever de planejar, dirigir e controlar esse processo de ensino,
bem como estimular as atividades e competências próprias do aluno para a sua aprendizagem. A
condição para o processo de ensino requer uma clara e segura compreensão do processo de
aprendizagem, ou seja, deseja entender como as pessoas aprendem e quais as condições que
influenciam para esse aprendizado. Assim, ressalta que podemos distinguir a aprendizagem em dois
tipos: aprendizagem casual e a aprendizagem organizada.

A) Aprendizagem casual: É quase sempre espontânea, surge naturalmente da interação entre as


pessoas com o ambiente em que vivem, ou seja, através da convivência social, observação de objetos e
acontecimentos.

B) Aprendizagem organizada: É aquela que tem por finalidade específica aprender determinados
conhecimentos, habilidades e normas de convivência social. Este tipo de aprendizagem é transmitido pela
escola, que é uma organização intencional, planejada e sistemática, as finalidades e condições da
aprendizagem escolar é tarefa específica do ensino.

Esses tipos de aprendizagem têm grande relevância na assimilação ativa dos indivíduos, favorecendo
um conhecimento a partir das circunstâncias vivenciadas pelo mesmo.
O processo de assimilação de determinados conhecimentos, habilidades, percepção e reflexão é
desenvolvido por meios atitudinais, motivacionais e intelectuais do aluno, sendo o professor o principal
orientador desse processo de assimilação ativa, é através disso que se pode adquirir um melhor
entendimento, favorecendo um desenvolvimento cognitivo.
Através do ensino podemos compreender o ato de aprender que é o ato no qual assimilamos
mentalmente os fatos e as relações da natureza e da sociedade. Esse processo de assimilação de
conhecimentos é resultado da reflexão proporcionada pela percepção prático-sensorial e pelas ações
mentais que caracterizam o pensamento. Entendida como fundamental no processo de ensino a
assimilação ativa desenvolve no indivíduo a capacidade de lógica e raciocínio, facilitando o processo de
aprendizagem do aluno.
O nível cognitivo refere-se à aprendizagem de determinados conhecimentos e operações mentais,
caracterizada pela apreensão consciente, compreensão e generalização das propriedades e relações
essenciais da realidade, bem como pela aquisição de modos de ação e aplicação referentes a essas
propriedades e relações. De acordo com esse contexto podemos despertar uma aprendizagem
autônoma, seja no meio escolar ou no ambiente em que estamos.
Pelo meio cognitivo, os indivíduos aprendem tanto pelo contato com as coisas no ambiente, como
pelas palavras que designam das coisas e dos fenômenos do ambiente. Portanto as palavras são
importantes condições de aprendizagem, pois através delas são formados conceitos pelos quais podemos
pensar.
O ensino é o principal meio de progresso intelectual dos alunos, através dele é possível adquirir
conhecimentos e habilidades individuais e coletivas. Por meio do ensino, o professor transmite os
conteúdos de forma que os alunos assimilem esse conhecimento, auxiliando no desenvolvimento
intelectual, reflexivo e crítico.
Por meio do processo de ensino o professor pode alcançar seu objetivo de aprendizagem, essa
atividade de ensino está ligada à vida social mais ampla, chamada de prática social, portanto o papel
fundamental do ensino é mediar à relação entre indivíduos, escola e sociedade.

O Caráter Educativo do Processo de Ensino e o Ensino Crítico


No desempenho da profissão docente, o professor deve ter em mente a formação da personalidade
dos alunos, não apenas no aspecto intelectual, como também nos aspectos morais, afetivos e físicos.
Como resultado do trabalho escolar, os alunos vão formando o senso de observação, a capacidade de
exame objetivo e crítico de fatos e fenômenos da natureza e das relações sociais, habilidades de
expressão verbal e escrita.
O processo de ensino deve estimular o desejo e o gosto pelo estudo, mostrando assim a importância
do conhecimento para a vida e o trabalho, nesse processo o professor deve criar situações que estimule
o indivíduo a pensar, analisar e relacionar os aspectos estudados com a realidade que vive. Essa
realização consciente das tarefas de ensino e aprendizagem é uma fonte de convicções, princípios e

15
LIBÂNEO, José Carlos. A Didática e as exigências do processo de escolarização: formação cultural e científica e demandas das práticas socioculturais.

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ações que irão relacionar as práticas educativas dos alunos, propondo situações reais que façam com
que os indivíduos reflitam e analisem de acordo com sua realidade.
Entretanto, o caráter educativo está relacionado aos objetivos do ensino crítico e é realizado dentro do
processo de ensino. É através desse processo que acontece a formação da consciência crítica dos
indivíduos, fazendo-os pensar independentemente, por isso o ensino crítico, chamado assim por implicar
diretamente nos objetivos sócio-políticos e pedagógicos, também os conteúdos, métodos escolhidos e
organizados mediante determinada postura frente ao contexto das relações sociais vigentes da prática
social.
É através desse ensino crítico que os processos mentais são desenvolvidos, formando assim uma
atitude intelectual. Nesse contexto os conteúdos deixam de serem apenas matérias, e passam então a
ser transmitidos pelo professor aos seus alunos formando assim um pensamento independente, para que
esses indivíduos busquem resolver os problemas postos pela sociedade de uma maneira criativa e
reflexiva.

As contribuições da Didática na formação do profissional da Educação


Como vimos anteriormente à didática estuda o processo de ensino no seu conjunto, no qual os
objetivos, conteúdos fazem parte, de modo a criar condições que garantam uma aprendizagem
significativa dos alunos. Nessa perspectiva, a didática torna-se o principal ramo de estudos da pedagogia,
pois é necessário dominar bem todas as teorias para que haja uma boa prática educativa, assim o
educador dispõe de recursos teóricos para organizar e articular o processo de ensino e aprendizagem.
Segundo Libâneo16, o trabalho docente também chamado de atividade pedagógica tem como objetivos
primordiais:

A) Assegurar aos alunos o domínio mais seguro e duradouro possível dos conhecimentos científicos;
B) Criar as condições e os meios para que os alunos desenvolvam capacidades e habilidades
intelectuais de modo que dominem métodos de estudo e de trabalho intelectual visando a sua autonomia
no processo de aprendizagem e independência de pensamento;
C) Orientar as tarefas de ensino para objetivo educativo de formação da personalidade, isto é, ajudar
os alunos a escolherem um caminho na vida, a terem atitudes e convicções que norteiem suas opções
diante dos problemas e situações da vida real.

Além dos objetivos da disciplina e dos conteúdos, é fundamental que o professor tenha clareza das
finalidades que ele tem em mente, a atividade docente tem a ver diretamente com “para que educar”, pois
a educação se realiza numa sociedade que é formada por grupos sociais que tem uma visão diferente
das finalidades educativas.
Nota-se que a problemática que permeia a educação em torno da didática, consiste na dificuldade de
mediar conhecimento prático e teórico, na medida em que muitos educadores apresentam uma
concepção fragmentada e ambígua desta interação, chegando ao ponto de dissociá-las. Essa separação
entre teoria e prática impossibilita os profissionais da educação de articular a teoria em proveito da prática,
pois uma subsidia a outra. Como resultado dessa separação a prática educativa tende a reduzir-se ao
extremo do praticismo. Nesse sentido a didática visa contribuir para a superação dessa dificuldade
proporcionando ao profissional da educação embasamento teórico-prático.
Os profissionais da educação precisam ter um pleno “domínio das bases teóricas científicas e
tecnológicas, e sua articulação com as exigências concretas do ensino”, pois é através desse domínio
que ele poderá estar revendo, analisando e aprimorando sua prática educativa.
A prática educativa não pode ocorrer de maneira espontânea, sem planejamento, metas e
instrumentos, ela deve estabelecer objetivos, os quais devem ser atingidos utilizando-se da didática, que
certamente facilitará o caminho a ser trilhado segundo meios viáveis e de acordo com cada realidade
educacional, em proveito da ideia de homem que se deseja formar, de acordo com a sociedade em que
este homem está inserido, pois “a didática não se limita só ao fazer, só ação prática, mas também se
vincula as demais instâncias e aspectos da educação formal”.

Dessa forma, o trabalho do professor é reflexo de uma AÇÃO x REFLEXÃO x AÇÃO, ou seja, é papel
do professor planejar a aula (AÇÃO), criar condições favoráveis de estudo dentro da sala de aula,
estimulando a curiosidade e a criatividade dos alunos (REFLEXÃO), reelaborar as aulas após observadas
as necessidades dos educandos (NOVA AÇÃO).

16
LIBÂNEO, José Carlos. Didática. São Paulo: Cortez, 1994.

. 36
1484041 E-book gerado especialmente para MAURICIO PEREIRA BARROS
Entretanto é necessário que haja uma interação mútua entre docentes e discentes, pois não há ensino
se os alunos não desenvolverem suas capacidades e habilidades mentais, ou seja, o professor dirige as
atividades de aprendizagem dos alunos a fim de que estes se tornem sujeitos ativos da própria
aprendizagem. Portanto, podemos dizer que o processo didático se baseia no conjunto de atividades do
professor e dos alunos, sob a direção do professor, apenas como mediador, para que haja uma
assimilação ativa de conhecimentos e desenvolvimento das habilidades dos alunos.
Assim, é necessário para o planejamento de ensino que o professor compreenda as relações entre
educação escolar, os objetivos pedagógicos e tenha um domínio seguro dos conteúdos ao qual ele
leciona, sendo assim capaz de conhecer os programas oficiais e adequá-los ás necessidades reais da
escola e de seus alunos.
Um professor que aspira ter uma boa didática necessita aprender a cada dia como lidar com a
subjetividade do aluno, sua linguagem, suas percepções e sua prática de ensino. Sem essas condições
o professor será incapaz de elaborar problemas, desafios, perguntas relacionadas com os conteúdos,
pois essas são as condições para que haja uma aprendizagem significativa. No entanto para que o
professor atinja efetivamente seus objetivos, é preciso que ele saiba realizar vários processos didáticos
coordenados entre si, tais como o planejamento, a direção do ensino da aprendizagem e da avaliação.
Portanto é a didática que fundamenta a ação docente, é através da didática que a teoria e a prática se
consolidam de forma viável e eficaz, pois ela se ocupa do processo de ensino nas várias dimensões, não
se restringindo apenas a educação escolar, mas investiga e orienta a formação do educador na sua
totalidade.

Formação de profissionais da educação: visão crítica e perspectiva de mudança


Há cerca de 20 anos, por iniciativa de movimentos de educadores e, em paralelo, no âmbito do
Ministério da Educação, iniciava-se um debate nacional sobre a formação de pedagogos e professores,
com base na crítica da legislação vigente e na realidade constatada nas instituições formadoras. O marco
histórico de detonação do movimento pela reformulação dos cursos de formação do educador foi a I
Conferência Brasileira de Educação realizada em São Paulo em 1980, abrindo-se o debate nacional sobre
o curso de pedagogia e os cursos de licenciatura. A trajetória desse movimento destaca-se pela
densidade das discussões e pelo êxito na mobilização dos educadores, mas o resultado prático foi
modesto, não se tendo chegado até hoje a uma solução razoável para os problemas da formação dos
educadores, nem no âmbito oficial nem no âmbito das instituições universitárias.
A discussão sobre a identidade do curso de pedagogia, que remonta aos pareceres de Valnir Chagas17
na condição de membro do antigo Conselho Federal de Educação, é retomada nos encontros do Comitê
Nacional Pró-formação do Educador, mais tarde transformada em Associação Nacional pela Formação
dos Profissionais da Educação, e é bastante recorrente para pesquisadores da área. Estes já apontavam,
em meados dos anos 80, a necessidade de se superar a fragmentação das habilitações no espaço
escolar, propondo a superação das habilitações e especializações pela valorização do pedagogo escolar:

(...) a posição que temos assumido é a de que a escola pública necessita de um profissional
denominado pedagogo, pois entendemos que o fazer pedagógico, que ultrapassa a sala de aula e a
determina, configura-se como essencial na busca de novas formas de organizar a escola para que esta
seja efetivamente democrática. A tentativa que temos feito é a de avançar da defesa corporativista dos
especialistas para a necessidade política do pedagogo, no processo de democratização da escolaridade.

O curso de pedagogia – sem entrar agora no mérito de sua função, isto é, de formar professores ou
especialistas ou ambos – pouco se alterou em relação à Resolução no 252/69. Experiências alternativas
foram tentadas em algumas instituições e o antigo CFE expediu alguns pareceres sobre “currículos
experimentais”, mas nenhum deles, a rigor, apresenta algo realmente inovador. Possíveis “novidades” no
chamado “curso de pedagogia” seriam, por exemplo, a atribuição, ao lado de outras, da formação em
nível superior de professores para as séries iniciais do Ensino Fundamental, supressão das habilitações
(administração escolar, orientação educacional, supervisão escolar etc.) e alterações na denominação de
algumas disciplinas. Alterações geralmente inócuas, pois na maior parte dos casos foi mantida a prática
da grade curricular e os mesmos conteúdos das antigas disciplinas, por exemplo, Organização do trabalho
pedagógico manteve o conteúdo da anterior Administração escolar.
Em relação aos cursos de licenciatura, também não houve nenhuma mudança substantiva desde a
Resolução no 292/62 do CFE, que dispunha sobre as matérias pedagógicas para a licenciatura. O que
se tentou foram diferentes formas de organização do percurso da formação, umas mantendo o 3+1 já

17
CHAGAS, Valnir. Formação do magistério: Novo sistema. São Paulo: Atlas, 1976.

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presente em 1939, outras distribuindo as disciplinas pedagógicas ao longo do curso específico. Quanto
ao local da formação pedagógica, em alguns lugares ela foi mantida nas faculdades de educação, em
outros, foi deslocada, total ou parcialmente, aos institutos/departamentos/cursos.
Atualmente, a atuação do Ministério da Educação e do CNE na regulamentação da LDB no 9.394/96
tem provocado a mobilização dos educadores de todos os níveis de ensino para rediscutir a formação de
profissionais da educação. A nosso ver, não bastam iniciativas de formulação de reformas curriculares,
princípios norteadores de formação, novas competências profissionais, novos eixos curriculares, base
comum nacional etc. Faz-se necessária e urgente a definição explícita de uma estrutura organizacional
para um sistema nacional de formação de profissionais da educação, incluindo a definição dos locais
institucionais do processo formativo. Na verdade, reivindicamos o ordenamento legal e funcional de todo
o conteúdo do Título VI da Lei de Diretrizes e Bases.

O disposto nos artigos 61 caput e incisos e, 62 caput, da LDB é o seguinte:

Art. 61. Consideram-se profissionais da educação escolar básica os que, nela estando em efetivo
exercício e tendo sido formados em cursos reconhecidos, são:
I – professores habilitados em nível médio ou superior para a docência na educação infantil e nos
ensinos fundamental e médio;
II – trabalhadores em educação portadores de diploma de pedagogia, com habilitação em
administração, planejamento, supervisão, inspeção e orientação educacional, bem como com títulos de
mestrado ou doutorado nas mesmas áreas;
III – trabalhadores em educação, portadores de diploma de curso técnico ou superior em área
pedagógica ou afim.
IV - profissionais com notório saber reconhecido pelos respectivos sistemas de ensino, para ministrar
conteúdos de áreas afins à sua formação ou experiência profissional, atestados por titulação específica
ou prática de ensino em unidades educacionais da rede pública ou privada ou das corporações privadas
em que tenham atuado, exclusivamente para atender ao inciso V do caput do art. 36; (Incluído pela lei
nº 13.415, de 2017)
V - profissionais graduados que tenham feito complementação pedagógica, conforme disposto pelo
Conselho Nacional de Educação. (Incluído pela lei nº 13.415, de 2017)
(...)

Art. 62 A formação de docentes para atuar na educação básica far-se-á em nível superior, em curso
de licenciatura plena, admitida, como formação mínima para o exercício do magistério na educação
infantil e nos cinco primeiros anos do ensino fundamental, a oferecida em nível médio, na modalidade
normal. (Redação dada pela lei nº 13.415, de 2017)

A proposta básica é a de que a formação dos profissionais da educação para atuação na educação
básica far-se-á, predominantemente, nas atuais faculdades de educação, que oferecerão curso de
pedagogia, cursos de formação de professores para toda a educação básica, programa especial de
formação pedagógica, programas de educação continuada e de pós-graduação. As faculdades de
educação terão sob sua responsabilidade a formulação e a coordenação de políticas e planos de
formação de professores, em articulação com as pró-reitorias ou vice-reitorias de graduação das
universidades ou órgãos similares nas demais Instituições de Ensino Superior, com os
institutos/faculdades/departamentos das áreas específicas e com as redes pública e privada de ensino.
O curso de pedagogia destinar-se-á à formação de profissionais interessados em estudos do campo
teórico-investigativo da educação e no exercício técnico-profissional como pedagogos no sistema de
ensino, nas escolas e em outras instituições educacionais, inclusive as não-escolares.
Os cursos de formação de professores e os programas mencionados, abrangendo todos os níveis da
educação básica, serão realizados num Centro de Formação, Pesquisa e Desenvolvimento Profissional
de Professores – CFPD, que integrará a estrutura organizacional das faculdades de educação e destinar-
se-á à formação de professores para a educação básica, da educação infantil ao Ensino Médio.
Distinguindo o curso de pedagogia (stricto sensu) e o curso de formação de professores para as séries
iniciais do Ensino Fundamental.

Formação teórico-prática articulada na formação inicial e contínua


As investigações recentes sobre formação de professores apontam como questão essencial o fato de
que os professores desempenham uma atividade teórico-prática. É difícil pensar na possibilidade de
educar fora de uma situação concreta e de uma realidade definida. A profissão de professor precisa

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combinar sistematicamente elementos teóricos com situações práticas reais. Por essa razão, ao se
pensar um currículo de formação, a ênfase na prática como atividade formadora aparece, à primeira vista,
como exercício formativo para o futuro professor. Entretanto, em termos mais amplos, é um dos aspectos
centrais na formação do professor, em razão do que traz consequências decisivas para a formação
profissional.
Atualmente, em boa parte dos cursos de licenciatura, a aproximação do futuro professor à realidade
escolar acontece após ele ter passado pela formação “teórica”, tanto na disciplina especifica como nas
disciplinas pedagógicas. O caminho deve ser outro. Desde o ingresso dos alunos no curso, é preciso
integrar os conteúdos das disciplinas em situações da prática que coloquem problemas aos futuros
professores e lhes possibilitem experimentar soluções. Isso significa ter a prática, ao longo do curso,
como referente direto para contrastar seus estudos e formar seus próprios conhecimentos e convicções
a respeito. Ou seja, os alunos precisam conhecer o mais cedo possível os sujeitos e as situações com
que irão trabalhar. Significa tomar a prática profissional como instância permanente e sistemática na
aprendizagem do futuro professor e como referência para a organização curricular.
Significa, também, a articulação entre formação inicial e formação continuada. Por um lado, a formação
inicial estaria estreitamente vinculada aos contextos de trabalho, possibilitando pensar as disciplinas com
base no que pede a prática; cai por terra aquela ideia de que o estágio é aplicação da teoria. Por outro, a
formação continuada, a par de ser feita na escola a partir dos saberes e experiências dos professores
adquiridos na situação de trabalho, articula-se com a formação inicial, indo os professores à universidade
para uma reflexão mais apurada sobre a prática. Em ambos os casos, estamos diante de modalidades
de formação em que há interação entre as práticas formativas e os contextos de trabalho. Com isso,
institui-se uma concepção de formação centrada na ideia de escola como unidade básica da mudança
educativa, em que as escolas são consideradas “espaços institucionais para a inovação e a melhoria e,
simultaneamente, como contextos privilegiados para a formação contínua de professores” (Escudero e
Botia18).

A favor de um curso específico de pedagogia


Conforme vimos considerando, as faculdades de educação sediariam, de forma articulada, o curso de
pedagogia e a formação inicial e continuada de professores. O que é esse curso de pedagogia? Trata-se
de curso para a realização da investigação em estudos pedagógicos, tomando a pedagogia como campo
teórico e como campo de atuação profissional. Como campo teórico, destina-se à formação de
profissionais que desejem aprimorar a reflexão e a pesquisa sobre a educação e o ensino da pedagogia,
propriamente dita. Como campo de atuação profissional, destina-se à preparação de pesquisadores,
planejadores, especialistas em avaliação, gestores do sistema e da escola, coordenadores pedagógicos
ou de ensino, comunicadores especializados para atividades escolares e extraescolares, animadores
culturais, de especialistas em educação a distância, de educadores de adultos no campo da formação
continuada etc.
A ampliação do campo educacional e, por consequência, da atuação pedagógica é uma realidade
constatada por muitos autores.
O curso de pedagogia proposto tem correlatos em praticamente todos os países do mundo, embora
em alguns lugares, especialmente na Europa, receba a designação de “ciências da educação”. Poder-se-
ia perguntar: por que não chamar esse curso de ciências da educação e não de pedagogia? Libâneo19
aponta, em publicação recente, quatro posições a respeito desse assunto e sobre a denominação
“ciências da educação” escreve:

(..) tal denominação (...) é criticada por provocar dispersão no estudo da problemática educativa,
levando a uma postura pluridisciplinar ao invés de interdisciplinar. Ou seja, a autonomia dada a cada uma
das ciências da educação levaria a enfoques parciais da realidade educativa, comprometendo a unidade
temática e abrindo espaço para os vários reducionismos (sociológico, psicológico, econômico...), como
aliás a experiência brasileira tem confirmado.

Assim, assume-se que a pedagogia se apoia nas ciências da educação, mas não perde com isso sua
autonomia epistemológica e não se reduz ao campo conceitual de uma ou outra, nem ao conjunto dessas
ciências.
A pluridimensionalidade do fenômeno educativo não elimina sua unicidade, que permite “estabelecer
um corpo cientifico que tem o fenômeno educativo em seu conjunto como objeto de estudo, com a

18
ESCUDERO, Juan M. e BOTIA, Bolívar. "Inovação e formação centrada na escola. Uma perspectiva da realidade espanhola". In: AMIGUINHO, Abílio e
CANÁRIO, Rui (orgs.). Escolas e mudança: O papel dos Centros de Formação. Lisboa: Educa, 1994.
19
LIBÂNEO, José C. Pedagogia e pedagogos, para quê? São Paulo: Cortez, 1998.

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finalidade expressa de dar coerência à multiplicidade de ações parcializadas”. Nessa concepção, a
pedagogia promove a síntese integradora dos diferentes processos analíticos que correspondem a cada
uma das ciências da educação em seu objeto específico de estudo.
Também Pimenta20 discute detidamente a questão recorrendo a vários autores, argumentando pela
necessidade de a pedagogia postular sua especificidade epistemológica, de modo a não se conformar
com uma mera posição de campo aplicado de outras ciências que também estudam a educação. Com
base nisso, firma sua posição de que a pedagogia tem sua significação epistemológica assumindo-se
como ciência da prática social da educação.
Diferentemente das demais ciências da educação, a pedagogia é ciência da prática. Ela não se
constrói como discurso sobre a educação, mas a partir da prática dos educadores tomada como referência
para a construção de saberes, no confronto com os saberes teóricos. (...) O objeto/problema da pedagogia
é a educação enquanto prática social. Daí seu caráter específico que a diferencia das demais (ciências
da educação), que é o de uma ciência prática – parte da prática e a ela se dirige. A problemática educativa
e sua superação constituem o ponto central de referência para a investigação.
Defendemos, pois, a criação do curso de pedagogia, um curso que oferece formação teórica, científica
e técnica para interessados no aprofundamento da teoria e da pesquisa pedagógica e no exercício de
atividades pedagógicas específicas (planejamento de políticas educacionais, gestão do sistema de ensino
e das escolas, assistência pedagógico-didática a professores e alunos, avaliação educacional, pedagogia
empresarial, animação cultural, produção e comunicação nas mídias etc.).

A existência desse curso tem como suporte algumas premissas:

A) O fenômeno educativo sujeita-se à pluralidade de abordagens, à medida que a educação é objeto


de várias ciências que o abordam de seu enfoque específico. O estudo da educação tem um caráter de
multirreferencialidade – abarca tanto modalidades educativas escolares quanto extraescolares, como os
movimentos sociais, a educação ambiental, educação comunitária, educação de grupos sociais
marginalizados e de minorias sociais. Não é que se descarte o fato de que a educação escolar seja, ainda
hoje, a forma histórica predominante de prática educativa. Mas, mesmo em benefício de uma educação
escolar mais aberta e mais articulada com outras instâncias educativas fora de seu marco próprio, a ideia
é a de que o educativo não se restrinja ao escolar, uma vez que abrange as relações mais amplas entre
o indivíduo e o meio humano, social, físico, ecológico, cultural, econômico.

B) Se, por um lado, a compreensão ampliada da educação fortalece as ciências da educação pelo fato
de a pedagogia não ser a única área científica que tem a educação como objeto de estudo, por outro, não
descaracteriza a especificidade da pedagogia como uma das ciências da educação. Com efeito, cada
uma das chamadas ciências da educação (sociologia da educação, psicologia da educação, linguística
aplicada à educação, economia da educação etc.) aborda o fenômeno educativo da perspectiva de seus
próprios conceitos e métodos de investigação, ao passo que a pedagogia se distingue por estudar o
fenômeno educativo em sua totalidade, inclusive para integrar os enfoques parciais daquelas ciências em
função de uma aproximação global e intencionalmente dirigida aos problemas educativos.

C) Um currículo de pedagogia, além de contemplar como objeto de investigação a pluralidade das


práticas educativas, concentra sua temática investigativa nos saberes pedagógicos, com a contribuição
das ciências da educação, na forma de inter-relação entre os saberes científicos. Ou seja, assume-se o
entendimento de pedagogia como ciência da prática social da educação para daí se definirem saberes
pedagógicos. A integração de conhecimentos pela inter-relação entre saberes decorre não apenas da
pluralidade que caracteriza o fenômeno educativo, mas também de uma tendência irrefreável das ciências
no mundo contemporâneo buscarem a integração entre os saberes, sem perder de vista a especificidade
disciplinar.

O currículo terá uma forte orientação para a pesquisa, seja como prática acadêmica, seja como atitude.
Ressaltem-se, aí, os vínculos entre o ensino e a pesquisa, a pesquisa como forma básica de construção
do saber, em confronto, em questionamento, com os saberes já estabelecidos e como instrumento para
desenvolvimento das competências do pensar. Tal concepção de pedagogia deveria transpassar toda a
formação pedagógica nos cursos de formação de professores, da educação infantil ao Ensino Médio.

20
PIMENTA, Selma G. O pedagogo na escola pública. São Paulo: Loyola, 1988.

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A defesa de um local institucional específico para formar professores
A atividade docente vem se modificando em decorrência de transformações nas concepções de escola
e nas formas de construção do saber, resultando na necessidade de se repensar a intervenção
pedagógico-didática na prática escolar. Um dos aspectos cruciais dessas transformações, os quais têm
se evidenciado em avaliações educacionais como o Saresp, é o investimento na qualidade da formação
dos docentes e no aperfeiçoamento das condições de trabalho nas escolas, para que estas favoreçam a
construção coletiva de projetos pedagógicos capazes de alterar os quadros de reprovação, retenção e da
qualidade social e humana dos resultados da escolarização.
Tem sido unânime a insatisfação de gestores, pesquisadores e professores com as formas
convencionais de se formar professores em nosso país. Realizados em dois níveis de ensino – Médio e
Superior –, os atuais cursos não dão conta de preparar o professor com a qualidade que se exige hoje
desse profissional. No nível médio, realiza-se a formação dos professores das quatro séries iniciais do
Ensino Fundamental e, em alguns casos, a formação dos professores para a educação infantil. Às vezes
esses profissionais são formados no nível superior (nos atualmente chamados cursos de pedagogia). Os
professores para as séries seguintes do Ensino Fundamental e para o Ensino Médio são formados no
nível superior, recorrendo ao velho esquema dos cursos de bacharelado e licenciatura. Conforme
mencionamos anteriormente, essas modalidades de formação já demonstraram historicamente seu
esgotamento (em nosso país e em vários outros). Dentro desse quadro, o aprimoramento do processo de
formação de professores requer muita ousadia e criatividade para que se construam novos e mais
promissores modelos educacionais necessários à urgente e fundamental tarefa de melhoria da qualidade
do ensino no país.
A LDB no 9.394/96, em seu art. 62, estabelece como regra que a formação dos docentes para a
educação fundamental e para a educação infantil far-se-á em nível superior. A elevação da formação
docente em nível superior, reivindicação antiga dos educadores em nosso país e já consolidada em
grande parte dos países desenvolvidos, fica assim contemplada. No mesmo art. 62, no entanto, admite-
se como formação mínima para as séries iniciais e para a educação infantil, “a oferecida em nível médio,
na modalidade Normal”, Redação dada pela lei nº 13.415, de 2017.

Que professor queremos formar?


Na sociedade contemporânea, as rápidas transformações no mundo do trabalho, o avanço tecnológico
configurando a sociedade virtual e os meios de informação e comunicação incidem com bastante força
na escola, aumentando os desafios para torná-la uma conquista democrática efetiva. Não é tarefa simples
nem para poucos. Transformar as escolas em suas práticas e culturas tradicionais e burocráticas – as
quais, por meio da retenção e da evasão, acentuam a exclusão social – em escolas que eduquem as
crianças e os jovens, propiciando-lhes um desenvolvimento cultural, científico e tecnológico que lhes
assegure condições para fazerem frente às exigências do mundo contemporâneo, exige esforço do
coletivo da escola – professores, funcionários, diretores e pais de alunos –, dos sindicatos, dos
governantes e de outros grupos sociais organizados.
Não se ignora que esse desafio precisa ser prioritariamente enfrentado no campo das políticas
públicas. Todavia, não é menos certo que os professores são profissionais essenciais na construção
dessa nova escola. Entendendo que a democratização do ensino passa pela sua formação, sua
valorização profissional, suas condições de trabalho, pesquisas e experiências inovadoras têm apontado
para a importância do investimento no desenvolvimento profissional dos professores. O desenvolvimento
profissional envolve formação inicial e contínua articuladas a um processo de valorização identitária e
profissional dos professores.
Identidade que é epistemológica, ou seja, que reconhece a docência como um campo de
conhecimentos específicos configurados em quatro grandes conjuntos, a saber: conteúdos das diversas
áreas do saber e do ensino, ou seja, das ciências humanas e naturais, da cultura e das artes; conteúdos
didático-pedagógicos (diretamente relacionados ao campo da prática profissional); conteúdos
relacionados a saberes pedagógicos mais amplos (do campo teórico da prática educacional) e conteúdos
ligados à explicitação do sentido da existência humana (individual, sensibilidade pessoal e social). E
identidade que é profissional. Ou seja, a docência constituiu um campo específico de intervenção
profissional na prática social – não é qualquer um que pode ser professor.
Uma visão progressista de desenvolvimento profissional exclui uma concepção de formação baseada
na racionalidade técnica (em que os professores são considerados mero executores de decisões alheias)
e assume a perspectiva de considerá-los em sua capacidade de decidir e de rever suas práticas e as
teorias que as informam, pelo confronto de suas ações cotidianas com as produções teóricas, pela
pesquisa da prática e a produção de novos conhecimentos para a teoria e a prática de ensinar. Considera,
assim, que as transformações das práticas docentes só se efetivam na medida em que o professor amplia

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sua consciência sobre a própria prática, a da sala de aula e a da escola como um todo, o que pressupõe
conhecimentos teóricos e críticos sobre a realidade.
Dessa forma, os professores contribuem para a criação, o desenvolvimento e a transformação nos
processos de gestão, nos currículos, na dinâmica organizacional, nos projetos educacionais e em outras
formas de trabalho pedagógico. Por esse raciocínio, reformas gestadas nas instituições, sem tomar os
professores como parceiros/autores, não transformam a escola na direção da qualidade social. Em
consequência, valorizar o trabalho docente significa dotar os professores de perspectivas de análise que
os ajudem a compreender os contextos históricos, sociais, culturais, organizacionais nos quais se dá sua
atividade docente.
Nas últimas décadas assistimos a uma ampliação das oportunidades de acesso à escola, em que
pesem as diferenças entre as regiões. Poder-se-ia concluir que o país tem uma escola que realizou a
inclusão social de todos? Não nos parece, pois a essa ampliação quantitativa, em grande parte resultante
da reivindicação dos educadores e da população, não correspondeu a melhoria das condições de
trabalho, de jornada, de organização e funcionamento, de formação e valorização do professor, fatores
essenciais para a qualidade do ensino. Sem isso, a escola quantitativamente ampliada permanece
excludente. Ao desenvolver um ensino aligeirado, impossibilita a inserção social de crianças e jovens de
classes sociais mais pobres em igualdade de condições com aqueles dos segmentos economicamente
favorecidos, acentuando a exclusão social.
Uma escola que inclua, ou seja, que eduque todas as crianças e jovens, com qualidade, superando os
efeitos perversos das retenções e evasões, propiciando-lhes um desenvolvimento cultural que lhes
assegure condições para fazerem frente às exigências do mundo contemporâneo, precisa de condições
para que, com base na análise e na valorização das práticas existentes que já apontam para formas de
inclusão, se criem novas práticas: de aula, de gestão, de trabalho dos professores e dos alunos, formas
coletivas, currículos interdisciplinares, uma escola rica de material e de experiências, como espaço de
formação contínua, e tantas outras. Por sua vez, os professores contribuem com seus saberes
específicos, seus valores, suas competências, nessa complexa empreitada, para o que se requer
condições salariais e de trabalho, formação inicial de qualidade e espaços de formação contínua.
Dada a natureza do trabalho docente, que é ensinar como contribuição ao processo de humanização
dos alunos historicamente situados, espera-se dos processos de formação que desenvolvam
conhecimentos e habilidades, competências, atitudes e valores que possibilitem aos professores ir
construindo seus saberes-fazeres docentes a partir das necessidades e desafios que o ensino como
prática social lhes coloca no cotidiano. Espera-se, pois, que mobilizem os conhecimentos da teoria da
educação e do ensino, das áreas do conhecimento necessárias à compreensão do ensino como realidade
social, e que desenvolvam neles a capacidade de investigar a própria atividade (a experiência) para, a
partir dela, constituírem e transformarem os seus saberes-fazeres docentes, num processo contínuo de
construção de suas identidades como professores.
Em síntese, dizemos que o professor é um profissional do humano que: ajuda o desenvolvimento
pessoal/intersubjetivo do aluno; um facilitador do acesso do aluno ao conhecimento (informador
informado); um ser de cultura que domina de forma profunda sua área de especialidade (científica e
pedagógica/educacional) e seus aportes para compreender o mundo; um analista crítico da sociedade,
portanto, que nela intervém com sua atividade profissional; um membro de uma comunidade de
profissionais, portanto, científica (que produz conhecimento sobre sua área) e social.
Esse profissional deve ser formado nas universidades, que é o lugar da produção social do
conhecimento, da circulação da produção cultural em diferentes áreas do saber e do permanente
exercício da crítica histórico-social.

A Organização da Aula e Seus Componentes Didáticos do Processo Educacional


A aula é a forma predominante pela qual é organizado o processo de ensino e aprendizagem. É o meio
pelo qual o professor transmite aos seus alunos conhecimentos adquiridos no seu processo de formação,
experiências de vida, conteúdos específicos para a superação de dificuldades e meios para a construção
de seu próprio conhecimento, nesse sentido sendo protagonista de sua formação humana e escolar.
É ainda o espaço de interação entre o professor e o indivíduo em formação constituindo um espaço
de troca mútua. A aula é o ambiente propício para se pensar, criar, desenvolver e aprimorar
conhecimentos, habilidades, atitudes e conceitos, é também onde surgem os questionamentos,
indagações e respostas, em uma busca ativa pelo esclarecimento e entendimento acerca desses
questionamentos e investigações.
Por intermédio de um conjunto de métodos, o educador busca melhor transmitir os conteúdos,
ensinamentos e conhecimentos de uma disciplina, utilizando-se dos recursos disponíveis e das
habilidades que possui para infundir no aluno o desejo pelo saber.

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Deve-se ainda compreender a aula como um conjunto de meios e condições por meio das quais o
professor orienta, guia e fornece estímulos ao processo de ensino em função da atividade própria dos
alunos, ou seja, da assimilação e desenvolvimento de habilidades naturais do aluno na aprendizagem
educacional. Sendo a aula um lugar privilegiado da vida pedagógica refere-se às dimensões do processo
didático preparado pelo professor e por seus alunos.
Aula é toda situação didática na qual se põem objetivos, conhecimentos, problemas, desafios com fins
instrutivos e formativos, que incitam as crianças e jovens a aprender. Cada aula é única, pois ela possui
seus próprios objetivos e métodos que devem ir de acordo com a necessidade observada no educando.
A aula é norteada por uma série de componentes, que vão conduzir o processo didático facilitando
tanto o desenvolvimento das atividades educacionais pelo educador como a compreensão e
entendimento pelos indivíduos em formação; ela deve, pois, ter uma estruturação e organização, afim de
que sejam alcançados os objetivos do ensino.
Ao preparar uma aula o professor deve estar atento às quais interesses e necessidades almeja
atender, o que pretende com a aula, quais seus objetivos e o que é de caráter urgente naquele momento.
A organização e estruturação didática da aula têm por finalidade proporcionar um trabalho mais
significativo e bem elaborado para a transmissão dos conteúdos. O estabelecimento desses caminhos
proporciona ao professor um maior controle do processo e aos alunos uma orientação mais eficaz, que
vá de acordo com previsto.
As indicações das etapas para o desenvolvimento da aula, não significa que todas elas devam seguir
um cronograma rígido, pois isso depende dos objetivos, conteúdos da disciplina, recursos disponíveis e
das características dos alunos e de cada aluno e situações didáticas especificas.
Dentro da organização da aula destacaremos agora seus Componentes Didáticos, que são também
abordados em alguns trabalhos como elementos estruturantes do ensino didático. São eles: os objetivos
(gerais e específicos), os conteúdos, os métodos, os meios e as avaliações.

Objetivos
São metas que se deseja alcançar, para isso usa-se de diversos meios para se chegar ao esperado.
Os objetivos educacionais expressam propósitos definidos, pois o professor quando vai ministrar a aula
já vai com os objetivos definidos. Eles têm por finalidade, preparar o docente para determinar o que se
requer com o processo de ensino, isto é prepará-lo para estabelecer quais as metas a serem alcançadas,
eles constituem uma ação intencional e sistemática.
Os objetivos são exigências que requerem do professor um posicionamento reflexivo, que o leve a
questionamentos sobre a sua própria prática, sobre os conteúdos os materiais e os métodos pelos quais
as práticas educativas se concretizam. Ao elaborar um plano de aula, por exemplo, o professor deve levar
em conta muitos questionamentos acerca dos objetivos que aspira, como O que? Para que? Como? E
Para quem ensinar? É isso só irá melhorar didaticamente as suas ações no planejamento da aula.
Não há prática educativa sem objetivos; uma vez que estes integram o ponto de partida, as premissas
gerais para o processo pedagógico. Os objetivos são um guia para orientar a prática educativa sem os
quais não haveria uma lógica para orientar o processo educativo.
Para que o processo de ensino-aprendizagem aconteça de modo mais organizado faz-se necessário,
classificar os objetivos de acordo com os seus propósitos e abrangência, se são mais amplos,
denominados objetivos gerais e se são destinados a determinados fins com relação aos alunos,
chamados de objetivos específicos.

Objetivos Gerais: exprimem propósitos mais amplos acerca do papel da escola e do ensino diante
das exigências postas pela realidade social e diante do desenvolvimento da personalidade dos alunos.
Por isso ele também afirma que os objetivos educacionais transcendem o espaço da sala de aula atuando
na capacitação do indivíduo para as lutas sociais de transformação da sociedade, e isso fica claro, uma
vez que os objetivos têm por fim formar cidadãos que venham a atender os anseios da coletividade.

Objetivos Específicos: compreendem as intencionalidades específicas para a disciplina, os caminhos


traçados para que se possa alcançar o maior entendimento, desenvolvimento de habilidades por parte
dos alunos que só se concretizam no decorrer do processo de transmissão e assimilação dos estudos
propostos pelas disciplinas de ensino e aprendizagem. Expressam as expectativas do professor sobre o
que deseja obter dos alunos no decorrer do processo de ensino. Têm sempre um caráter pedagógico,
porque explicitam a direção a ser estabelecida ao trabalho escolar, em torno de um programa de
formação.

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Conteúdos
Os conteúdos de ensino são constituídos por um conjunto de conhecimentos. É a forma pela qual, o
professor expõe os saberes de uma disciplina para ser trabalhado por ele e pelos seus alunos. Esses
saberes são advindos do conjunto social formado pela cultura, a ciência, a técnica e a arte. Constituem
ainda o elemento de mediação no processo de ensino, pois permitem ao discente através da assimilação
o conhecimento histórico, cientifico, cultural acerca do mundo e possibilitam ainda a construção de
convicções e conceitos.
O professor, na sala de aula, utiliza-se dos conteúdos da matéria para ajudar os alunos a
desenvolverem competências e habilidades de observar a realidade, perceber as propriedades e
características do objeto de estudo, estabelecer relações entre um conhecimento e outro, adquirir
métodos de raciocínio, capacidade de pensar por si próprios, fazer comparações entre fatos e
acontecimentos, formar conceitos para lidar com eles no dia-a-dia de modo que sejam instrumentos
mentais para aplicá-los em situações da vida prática. Neste contexto pretende-se que os conteúdos
aplicados pelo professor tenham como fundamento não só a transmissão das informações de uma
disciplina, mas que esses conteúdos apresentem relação com a realidade dos discentes e que sirvam
para que os mesmos possam enfrentar os desafios impostos pela vida cotidiana. Estes devem também
proporcionar o desenvolvimento das capacidades intelectuais e cognitivas do aluno, que o levem ao
desenvolvimento crítico e reflexivo acerca da sociedade que integram.
Os conteúdos de ensino devem ser vistos como uma relação entre os seus componentes, matéria,
ensino e o conhecimento que cada aluno já traz consigo. Pois não basta apenas a seleção e organização
lógica dos conteúdos para transmiti-los. Antes os conteúdos devem incluir elementos da vivência prática
dos alunos para torná-los mais significativos, mais vivos, mais vitais, de modo que eles possam assimilá-
los de forma ativa e consciente. Ao proferir estas palavras, o autor aponta para um elemento de
fundamental importância na preparação da aula, a contextualização dos conteúdos.

A) Contextualização dos conteúdos


A contextualização consiste em trazer para dentro da sala de aula questões presentes no dia a dia do
aluno e que vão contribuir para melhorar o processo de ensino e aprendizagem do mesmo. Valorizando
desta forma o contexto social em que ele está inserido e proporcionando a reflexão sobre o meio em que
se encontra, levando-o a agir como construtor e transformador deste. Então, pois, ao selecionar e
organizar os conteúdos de ensino de uma aula o professor deve levar em consideração a realidade
vivenciada pelos alunos.

B) A relação professor-aluno no processo de ensino e aprendizagem


O professor no processo de ensino é o mediador entre o indivíduo em formação e os conhecimentos
prévios de uma matéria. Tem como função planejar, orientar a direção dos conteúdos, visando à
assimilação constante pelos alunos e o desenvolvimento de suas capacidades e habilidades. É uma ação
conjunta em que o educador é o promotor, que faz questionamentos, propõem problemas, instiga, faz
desafios nas atividades e o educando é o receptor ativo e atuante, que através de suas ações responde
ao proposto produzindo assim conhecimentos. O papel do professor é levar o aluno a desenvolver sua
autonomia de pensamento.

Métodos de Ensino
Métodos de ensino são as formas que o professor organiza as suas atividades de ensino e de seus
alunos com a finalidade de atingir objetivos do trabalho docente em relação aos conteúdos específicos
que serão aplicados. Os métodos de ensino regulam as formas de interação entre ensino e aprendizagem,
professor e os alunos, na qual os resultados obtidos é assimilação consciente de conhecimentos e
desenvolvimento das capacidades cognoscitivas e operativas dos alunos.
Segundo Libâneo a escolha e organização os métodos de ensino devem corresponder à necessária
unidade objetivos-conteúdos-métodos e formas de organização do ensino e as condições concretas das
situações didáticas. Os métodos de ensino dependem das ações imediatas em sala de aula, dos
conteúdos específicos, de métodos peculiares de cada disciplina e assimilação, além disso, esses
métodos implica o conhecimento das características dos alunos quanto à capacidade de assimilação de
conteúdos conforme a idade e o nível de desenvolvimento mental e físico e suas características
socioculturais e individuais.
A relação objetivo-conteúdo-método procuram mostrar que essas unidades constituem a linhagem
fundamental de compreensão do processo didático: os objetivos, explicitando os propósitos pedagógicos
intencionais e planejados de instrução e educação dos alunos, para a participação na vida social; os
conteúdos, constituindo a base informativa concreta para alcançar os objetivos e determinar os métodos;

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os métodos, formando a totalidade dos passos, formas didáticas e meios organizativos do ensino que
viabilizam a assimilação dos conteúdos, e assim, o atingimento dos objetivos.
No trabalho docente, os professores selecionam e organizam seus métodos e procedimentos didáticos
de acordo com cada matéria. Dessa forma destacamos os principais métodos de ensino utilizado pelo
professor em sala de aula: método de exposição pelo professor, método de trabalho independente,
método de elaboração conjunta, método de trabalho em grupo. Nestes métodos, os conhecimentos,
habilidades e tarefas são apresentados, explicadas e demonstradas pelo professor, além dos trabalhos
planejados individuais, a elaboração conjunta de atividades entre professores e alunos visando à
obtenção de novos conhecimentos e os trabalhos em grupo. Dessa maneira designamos todos os meios
e recursos matérias utilizados pelo professor e pelos alunos para organização e condução metódica do
processo de ensino e aprendizagem.

Avaliação Escolar
A avaliação escolar é uma tarefa didática necessária para o trabalho docente, que deve ser
acompanhado passo a passo no processo de ensino e aprendizagem. Através da mesma, os resultados
vão sendo obtidos no decorrer do trabalho em conjunto entre professores e alunos, a fim de constatar
progressos, dificuldades e orientá-los em seus trabalhos para as correções necessárias.
A avaliação escolar é uma tarefa complexa que não se resume à realização de provas e atribuição de
notas, ela cumpre funções pedagógico-didáticas, de diagnóstico e de controle em relação ao rendimento
escolar.
A função pedagógico-didática refere-se ao papel da avaliação no cumprimento dos objetivos gerais e
específicos da educação escolar. Ao comprovar os resultados do processo de ensino, evidencia ou não
o atendimento das finalidades sociais do ensino, de preparação dos alunos para enfrentar as exigências
da sociedade e inseri-los ao meio social. Ao mesmo tempo, favorece uma atitude mais responsável do
aluno em relação ao estudo, assumindo-o como um dever social. Já a função de diagnóstico permite
identificar progressos e dificuldades dos alunos e a atuação do professor que, por sua vez, determinam
modificações do processo de ensino para melhor cumprir as exigências dos objetivos. A função do
controle se refere aos meios e a frequência das verificações e de qualificação dos resultados escolares,
possibilitando o diagnóstico das situações didáticas.
No entanto, a avaliação durante a pratica escolar tem sido bastante criticada sobre tudo por reduzir-se
à sua função de controle, mediante a qual se faz uma classificação quantitativa dos alunos relativa às
notas que obtiveram nas provas. Os professores não têm conseguido usar os procedimentos de avaliação
que sem dúvida, implicam o levantamento de dados por meio de testes, trabalhos escritos etc. Em relação
aos objetivos, funções e papel da avaliação na melhoria das atividades escolares e educativas, tem-se
verificado na pratica escolar alguns equívocos.
O mais comum é tomar a avaliação unicamente como o ato de aplicar provas, atribuir notas e classificar
os alunos. O professor reduz a avaliação à cobrança daquilo que o aluno memorizou e usa a nota somente
como instrumento de controle. Tal ideia é descabida, primeiro porque a atribuição de notas visa apenas
o controle formal, com objetivo classificatório e não educativo; segundo porque o que importa é o veredito
do professor sobre o grau de adequação e conformidade do aluno ao conteúdo que transmite. Outro
equívoco é utilizar a avaliação como recompensa aos bons alunos e punição para os desinteressados,
além disso, os professores confiam demais em seu olho clínico, dispensam verificações parciais no
decorrer das aulas e aqueles que rejeitam as medidas quantitativas de aprendizagem em favor de dados
qualitativos.
O entendimento correto da avaliação consiste em considerar a relação mútua entre os aspectos
quantitativos e qualitativos. A escola cumpre uma função determinada socialmente, a de introduzir as
crianças, jovens e adultos no mundo da cultura e do trabalho, tal objetivo não surge espontaneamente na
experiência das crianças, jovens e adultos, mas supõe as perspectivas traçadas pela sociedade e controle
por parte do professor. Por outro lado, a relação pedagógica requer a independência entre influências
externas e condições internas do aluno, pois nesse contexto o professor deve organizar o ensino
objetivando o desenvolvimento autônomo e independente do aluno.

Centro de Formação, Pesquisa e Desenvolvimento Profissional de Professores (CFPD): uma


proposta

Tendo argumentado sobre a especificidade da pedagogia e da formação de pedagogos stricto sensu,


não identificados com professores, e explicitado a importância da formação destes, ampliada para o
conceito de desenvolvimento profissional, passamos a propor a nossa visão da formação de professores.
Um ponto de vista radical sobre essa questão leva ao enfrentamento do desafio da definição dos locais

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institucionais para a formação desses profissionais e de orientações explícitas sobre a organização
curricular, assegurando um suporte legal de marcos institucionais e curriculares nacionais. Dessa forma,
acreditamos que são necessárias decisões por parte das instâncias normativas do sistema educacional
que considerem o tratamento global da questão, revendo os locais institucionais de formação – de modo
a superar os evidentes (e consensuais) problemas e impasses que têm marcado a formação de
professores tanto nas faculdades de educação como nos institutos/ departamentos/cursos das
universidades – e estabelecendo orientações mais específicas para a organização curricular dos cursos,
contemplando a formação pedagógica e a específica no âmbito dos saberes disciplinares.
Por isso, sugerimos que a Faculdade (Centro) de Educação incorpore em sua estrutura, ao lado do
curso de pedagogia, o Centro de Formação, Pesquisa e Desenvolvimento Profissional de Professores –
CFPD – que terá quatro objetivos:

A) formação e preparação profissional de professores para atuar na educação básica: educação


infantil, Ensino Fundamental e Ensino Médio;
B) desenvolver, em colaboração com outras instituições (Estado, sindicatos etc.), a formação contínua
e o desenvolvimento profissional dos professores;
C) realizar pesquisas na área de formação e desenvolvimento profissional de professores;
D) preparação profissional de professores que atuam no Ensino Superior.

Esses objetivos configuram um projeto pedagógico próprio para a formação e o desenvolvimento


profissional de professores.

Por que em um centro específico e nas faculdades de educação?


A inserção na estrutura das faculdades (centros) de educação do CFPD pretende ser uma virada de
rumo na formação de professores. É preciso uma mudança radical nas formas institucionais e curriculares
de formação de professores, superando o atual esquema do bacharelado e da licenciatura, que não
responde mais às necessidades prementes de qualificação profissional para um tempo novo. Centrar a
formação de professores numa instituição modelar como têm sido as faculdades de educação e atribuir-
lhe a responsabilidade de concatenar, no âmbito das universidades, as políticas e planos de formação de
professores, em estreita articulação com os institutos, faculdades ou departamentos das áreas
especificas, pode ser garantia não apenas de melhoria da qualidade de formação, mas da
profissionalidade do professorado, de modo que se configurem sua identidade e seu estatuto profissional.
As faculdades de educação têm sido, ao longo destas décadas, local da produção do conhecimento
sobre educação e ensino que, na maioria das vezes, tem sido ignorado pelos
institutos/departamentos/cursos específicos. No entanto, os problemas encontrados nas atuais
faculdades de educação e que exigem destas uma reformulação, referem-se, a nosso ver, de um lado, à
ambiguidade nelas presente quanto ao tratamento das “ciências da educação” dissociadas das questões
referentes à profissionalidade docente e, de outro, à ambiguidade dos cursos de pedagogia que, ao se
restringirem à formação dos professores das séries iniciais do Ensino Fundamental ou à formação
técnico-burocrática dos “especialistas”, conforme tratamos no item anterior, perderam sua especificidade
de produção do conhecimento na área educacional.
Há que se considerar, ainda, a desigualdade de importância entre os saberes constitutivos da docência
na formação dos professores, privilegiando aqueles relacionados às competências didático-pedagógicas
do ensino (metodologias e práticas de ensinar), considerados de modo fragmentado e dissociados das
áreas específicas e apenas disciplinares e os relacionados aos saberes pedagógicos mais amplos. Estes,
via de regra, desarticulados daqueles. Por sua vez, os institutos/departamentos/cursos, via de regra,
desenvolvem os conteúdos específicos das áreas, ignorando a docência como atividade profissional de
seus egressos e, portanto, ignorando os conhecimentos pedagógicos/educacionais necessários à
mediação profissional dos especialistas em atividades de ensinar.
Considerem-se, também, as enormes dificuldades que ambos, faculdades de educação e institutos,
encontram para valorizar e efetivar a pesquisa sobre ensino e docência nas respectivas instituições, por
tratarem de área tradicionalmente menos prestigiada na comunidade científica nacional e internacional.
Já há um consenso em algumas universidades, faculdades de educação, institutos, comunidades
científicas e nas áreas de ensino e entidades de educadores, de que a formação de professores precisa
se constituir em um projeto pedagógico próprio, articulado entre diferentes instâncias de formação de
professor. O que favoreceria, inclusive, a valorização dessa área na comunidade científica, em termos de
verbas para projetos, pesquisas, experiências inovadoras e até articulação entre as instâncias de
formação inicial e os locais sociais de exercício da profissão docente.

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Um centro específico de formação, pesquisa e desenvolvimento profissional de professores
possibilitaria a superação da hoje dicotômica visão da docência. O exercício profissional em um dado
nível do ensino configura uma dimensão de uma totalidade que é a docência. Em qualquer nível (e local:
escolar e não-escolar) em que ocorra, à docência configura uma visão de conjunto, de totalidade (à
semelhança do médico que, em qualquer campo de ação que atue, é médico!) e um processo contínuo.
Os atuais cursos de formação não lidam com essa categoria. Os professores que atuam nas séries finais
do Ensino Fundamental ignoram a problemática e as questões essenciais da docência nos demais
segmentos, o que traz problemas insuperáveis nos resultados do ensino e do processo formativo, pois
seus profissionais operam à docência como um conjunto de “gavetas fragmentadas e justapostas”,
negando a característica de complexidade do fenômeno ensino.

Em que o CFPD avança na discussão sobre a formação de professores:

A institucionalização do CFPD possibilita a incorporação dos princípios que os educadores construíram


ao longo dos últimos anos (explicitados nas pesquisas, nas experiências, na vivência profissional, nos
movimentos de educadores pela formação profissional e em diversos fóruns de debates):
A) introduz o conceito de desenvolvimento profissional, superando uma visão dicotômica da formação
inicial e da formação contínua;
B) toma a pesquisa como componente essencial da/na formação. Incorpora as recentes contribuições
da formação do professor/pesquisador baseadas na epistemologia da prática, propondo percursos de
formação teórico/práticos, nos quais a pesquisa é tanto formação do docente como este também se forma
como pesquisador;
C) a formação é especialmente voltada para a profissionalidade docente e para a construção da
identidade do professor. Experiências bem-sucedidas (especialmente as realizadas em alguns cursos de
pedagogia) mostram que os cursos que se voltaram para tematizar a formação e o exercício da docência
como objeto de formação e pesquisa podem se constituir em espaços mais férteis na produção de
conhecimento e mais compromissados com a prática social da docência;
D) investe em sólida formação teórica nos quatro campos que constituem os saberes da docência;
E) considera a prática social concreta da educação como objeto de reflexão/formação;
F) considera a visão de totalidade do processo escolar/educacional;
G) constitui um projeto pedagógico coletivo e interdisciplinar para a formação, desenvolvendo em
igualdade de importância os quatro campos dos saberes da docência (conteúdos formativos, conforme o
Documento Norteador);
H) eleva a formação de todos os professores ao Ensino Superior;
I) valoriza a atividade intelectual, crítica e reflexiva da docência como elemento de melhoria da
qualidade da formação profissional dos professores;
J) apresenta currículo e percursos de formação abertos, permitindo um vai-e-vem entre as várias
instituições da universidade que desenvolvem conteúdos formativos para a docência.
L) O CFPD assegurará ainda:
M) um sólido curso de graduação em que estará presente a unidade ensino/pesquisa/extensão,
elevando o estatuto da formação de professores e assegurando a valorização profissional, situando todos
os professores no mesmo nível de formação e salários;
N) a ampliação da responsabilidade das faculdades de educação e o reconhecimento da importância
do seu papel na formação de professores, assim como a redefinição das responsabilidades dos
institutos/faculdades/departamentos das áreas do conhecimento, na formação dos professores dentro de
um projeto mais explícito de formação profissional do professorado;
O) a eleição da prática como elemento integrante de todo o percurso de formação, constituindo um
princípio epistemológico da formação (e não um apêndice);
P) a incorporação de contribuições de experiências bem-sucedidas de formação em nosso país.

A formação de professores para qualquer um dos níveis de ensino no CFPD estará assentada na
compreensão de que a escolaridade constitui um processo contínuo e uma totalidade, superando a atual
fragmentação. Além disso, possibilitará que os graduados complementem e ampliem sua formação para
atuar em diferentes níveis de ensino.
Com base em diagnósticos de necessidades e demandas, o CFPD oferecerá programas para
atendimento específico, por exemplo, na formação inicial para professores leigos, para a população
indígena; desenvolvimento profissional de professores que já atuam nos sistemas escolares e outros.
Tais programas poderão ser objeto de convênios com Secretarias de Educação, sindicatos etc. Por seu
potencial formativo, integrarão o projeto pedagógico de formação inicial do CFPD.

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Referência:
SANTOS, E. P. dos; BATISTA, I. C.; M. L. da S.; SILVA, M. de F. F. da. O processo didático educativo: Uma análise reflexiva sobre o processo de ensino
e a aprendizagem. Disponível em:
http://meuartigo.brasilescola.uol.com.br/pedagogia/processo-didatico-educativo-analise-reflexiva-sobre-processo-ensino-aprendizagem.htm
LIBANEO, José Carlos; PIMENTA, Selma Garrido. Formação de profissionais da educação: visão crítica e perspectiva de mudança. Educ. Soc., Campinas,
v. 20, n. 68, p. 239-277, Dec. 1999.

Questões

01. (Prefeitura de Alto Piquiri/ PR - Educador Infantil – KLC). A Didática é um ramo de estudo da
Pedagogia que:
(A) investiga a natureza das finalidades da educação numa sociedade.
(B) busca em outras ciências os conhecimentos que esclarecem o fenômeno educativo.
(C) estuda a dinâmica das relações sociais e o processo do desenvolvimento humano.
(D) investiga os fundamentos, condições e modos de realização da instrução e do ensino.
(E) nenhuma alternativa está correta

02. (Prefeitura de Nova Friburgo/RJ– Professor- EXATUS-PR/2015) Em relação à Didática, é


incorreto afirmar que:
(A) contribui para transformar a prática pedagógica da escola, ao desenvolver a compreensão
articulada entre os conteúdos a serem ensinados e as práticas sociais.
(B) não compete refletir acerca dos objetivos sócio-políticos e pedagógicos, ao selecionar os conteúdos
e métodos de ensino.
(C) realiza-se por meio de ação consciente, intencional e planejada, no processo de formação humana,
estabelecendo-se objetivos e critérios socialmente determinados.
(D) sua finalidade é converter objetivos sócio-políticos e pedagógicos em objetivos de ensino,
selecionar conteúdos e métodos em função desses objetivos.

03. (UFPE - Pedagogo – COVEST-COPSET). Das alternativas abaixo, assinale a compatível com a
didática.
(A) Didática relaciona-se com o estudo dos elementos substantivos ou nucleares do currículo.
(B) Didática é reconhecida como um espaço próprio no domínio científico da educação.
(C) Didática é caracterizada como um todo, organizada em função de propósitos e de saberes
educativos.
(D) Didática é ligada ao estudo dos processos e práticas pedagógicas institucionalizadas.
(E) Didática está associada ao conteúdo, ao programa dos processos de formação.

04. (SEDUC/CE - Professor Pleno I – CESPE). Com relação às características e às propriedades


relativas à didática e à formação dos professores, assinale a opção correta.
(A) A relação entre o professor, o aluno e o ensino de conceitos científicos constitui uma tríade na qual
convergem apenas estudos teóricos de diferentes domínios do conhecimento.
(B) Didática é a articulação entre teoria e prática na formação do professor.
(C) A formação do professor de biologia é complexa e envolve inúmeras disciplinas que, pela
especificidade de cada uma delas, não devem se complementar.
(D) Um dos princípios gerais da didática é o foco em conteúdos e atividades de ensino que tenham
sentido essencialmente pedagógicos.
(E) Uma formação global e integral de professores de biologia requer especialização do professor em
determinada disciplina do curso.

Respostas

01. D. / 02. B. / 03. A. / 04. B.

01. D.
A didática então surge como objeto de estudo no processo de ensino/aprendizagem, pois este está
inserido em todas as práticas educacionais, em todos os níveis de ensino, e cada prática educacional
evidencia uma intenção, ideologia, objetivos e meios para serem atingidos. Desta forma ocorre o processo
de ensino aprendizagem, que em momento algum é neutro, apolítico ou isolado de sua realidade político
social.

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02. B.
Como foi visto, para Libâneo a Didática não compete refletir acerca dos objetivos sócio-políticos e
pedagógicos, ao selecionar os conteúdos e métodos de ensino, é através desse processo que acontece
a formação da consciência crítica dos indivíduos, fazendo-os pensar independentemente.

03. A.
O currículo terá uma forte orientação para a pesquisa, seja como prática acadêmica, seja como atitude.
Um currículo de pedagogia, além de contemplar como objeto de investigação a pluralidade das práticas
educativas, concentra sua temática investigativa nos saberes pedagógicos, com a contribuição das
ciências da educação, na forma de inter-relação entre os saberes científicos. Ou seja, assume-se o
entendimento de pedagogia como ciência da prática social da educação para daí se definirem saberes
pedagógicos.

04. B.
A didática que fundamenta a ação docente, é através da didática que a teoria e a prática se consolidam
de forma viável e eficaz, pois ela se ocupa do processo de ensino nas várias dimensões, não se
restringindo apenas a educação escolar, mas investiga e orienta a formação do educador na sua
totalidade.

2.2 A sala de aula como espaço de aprendizagem e interação

As relações interativas em sala de aula

As Relações Interativas em Sala de Aula: o papel dos professores e dos alunos21


Para Zabala as relações de que se estabelecem entre os professores, os alunos e os conteúdos de
aprendizagem constituem a chave de todo o ensino e definem os diferentes papéis dos professores e dos
alunos. A concepção tradicional atribui ao professor o papel de transmissor de conhecimentos e
controlador dos resultados obtidos.
Ao aluno cabe interiorizar o conhecimento que lhe é apresentado. A aprendizagem consiste na
reprodução da informação. Esta maneira de entender a aprendizagem configura uma determinada forma
que relacionar-se em classe. Na concepção construtivista ensinar envolve estabelecer uma série de
relações que devem conduzir à elaboração, por parte do aprendiz, de representações pessoais sobre o
conteúdo.
Trata-se de um ensino adaptativo, isto é, um ensino com capacidade para se adaptar às diversas
necessidades das pessoas que o protagonizam. Portanto, os professores podem assumir desde uma
posição de intermediário entre o aluno e a cultura, a atenção para a diversidade dos alunos e de situações
à posição de desafiar, dirigir, propor, comparar. Tudo isso sugere uma interação direta entre alunos e
professores, favorecendo a possibilidade de observar e de intervir de forma diferenciada e contingente
nas necessidades dos alunos/as. Do conjunto de relações necessárias para facilitar a aprendizagem se
deduz uma série de funções dos professores, que Zabala caracteriza da seguinte maneira:

a) Planejar a atuação docente de uma maneira suficientemente flexível para permitir adaptação às
necessidades dos alunos em todo o processo de ensino/aprendizagem. Por um lado, uma proposta de
intervenção suficientemente elaborada; e por outro, com uma aplicação extremamente plástica e livre de
rigidez, mas que nunca pode ser o resultado da improvisação.
b) Contar com as contribuições e os conhecimentos dos alunos, tanto no início das atividades como
durante sua realização.
c) Ajudá-los a encontrar sentido no que estão fazendo para que conheçam o que têm que fazer, sintam
que podem fazê-lo e que é interessante fazê-lo.
d) Estabelecer metas ao alcance dos alunos para que possam ser superadas com o esforço e a ajuda
necessários.
e) Oferecer ajudas adequadas, no processo de construção do aluno, para os progressos que
experimenta e para enfrentar os obstáculos com os quais se depara.

21
Texto adaptado de CARDOSO, M. A. baseado na obra de ZABALA, Antoni. A prática educativa: como ensinar.

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f) Promover atividade mental autoestruturante que permita estabelecer o máximo de relações com
novo conteúdo, atribuindo-lhe significado no maior grau possível e fomentando os processos de meta-
cognição que lhe permitam assegurar o controle pessoal sobre os próprios conhecimentos e processos
durante a aprendizagem.
g) Estabelecer um ambiente e determinadas relações presididos pelo respeito mútuo e pelo sentimento
de confiança, que promovam a autoestima e o autoconceito.
h) Promover canais de comunicação que regulem os processos de negociação, participação e
construção.
i) Potencializar progressivamente a autonomia dos alunos na definição de objetivos, no planejamento
das ações que os conduzirão aos objetivos e em sua realização e controle, possibilitando que aprendam
a aprender.
j) Avaliar os alunos conforme suas capacidades e seus esforços, levando em conta o ponto pessoal
de partida e o processo através do qual adquirem conhecimentos e incentivando a autoavaliação das
competências como meio para favorecer as estratégias de controle e regulação da própria atividade.

Concluindo, Zabala afirma que os princípios da concepção construtivista do ensino e da aprendizagem


escolar proporcionam alguns parâmetros que permitem orientar a ação didática e que, de maneira
específica ajuda a caracterizar as interações educativas que estrutura a vida de uma classe,
estabelecendo as bases de um ensino que possa ajudar os alunos a se formarem como pessoas no
contexto da instituição escolar.
A criação de ambientes interativos em sala de aula exige um contexto de ensino-aprendizagem criativo,
aberto e dinâmico, permitindo que o aluno tenha um papel interativo e responsável na sua aprendizagem.
Desse modo, se faz necessário uma plataforma de trabalho correspondente. O uso de pedagogias
interativas que levem o aluno a desenvolver processos cognitivos e sociais de aprendizagem, contribuem
para excelentes resultados de aproveitamentos na escola, sendo que os alunos se sentem mais
motivados.
Infelizmente o uso de tecnologias nas escolas não acontece na prática, e a culpa disso não é
exclusivamente à falta de dinheiro, preparação de professores ou equipamentos, mas principalmente a
cultura predominante em nosso país, de que o conhecimento não pode ir de encontro a novos métodos
de ensino, ficando engessado.
É válido destacar que a iniciativa que levou ao desenvolvimento da Peer Instruction foi uma técnica
implantada em sala de aula, onde foi explorada a interação com cada aluno durante as preleções. Esse
método vale-se de apresentações curtas através de pontos-chaves, acompanhadas de um conceito que
já traz a resposta. Aqui, o aluno traz a resposta e a justificativa para tal, de modo que o professor analisa-
as e mostra os pontos que precisam ser superados. A isso damos o nome de classrrom feedback systems.
O grande desafio encontrado nas salas de aula é o uso de tecnologias de baixo custo, valendo-se de
smartphones, tablets, que podem ser utilizados por qualquer aluno com facilidade, proporcionando um
ambiente interativo em sala de aula.
O ensino-aprendizagem que geralmente é utilizado na sala de aula é aquele em que o professor
pergunta e o aluno responde, caso tenha interesse, devendo para isso levantar o braço. Seria
ultrapassado ou ineficaz? Alguns defendem que não é tão eficaz pelo fato dos alunos mais tímidos não
conseguirem interagir e até mesmo com a participação de todos os alunos fica difícil ficaria difícil a
administração da sala e o tempo despendido para passar todo o plano de aula. Contudo, os alunos podem
tirar suas dúvidas com o professor em momentos de intervalo.

Como isso acontece na prática? Baseado na obra: O Construtivismo na sala de aula:22

Professor: Júlio, responda: por que os judeus foram expulsos da Espanha?


Júlio: Porque não se deixaram fotografar.
Professor: Como? De onde você tirou isso?
Júlio: É o que está no livro.
Professor: Está, é? Onde?
Júlio: Aqui, olhe: "porque não se retrataram".

É provável que, como professores, se tivéssemos em nossas mãos a lâmpada de Aladim, três desejos
não pareceriam suficientes para tentar resolver os problemas que enfrentamos em nossa tarefa cotidiana.
No entanto, se nos concedessem apenas três oportunidades, é provável que um dos nossos desejos

22
C. Coll, E. Martín, T. Mauri, M. Miras, J. Onrubia, I. Solé, A. Zabala. 6ª edição, editora: Ática, 2006, págs: 57-58.

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fosse que a mente de nossos alunos estivesse em branco, como uma lousa limpa na qual poderíamos ir
escrevendo o que queremos que aprendam. Supondo que este desejo nos fosse concedido, o pobre
gênio da lâmpada teria um bom trabalho para ir apagando as lousas de nossos alunos até deixá-las
completamente limpas.

As mentes de nossos alunos estão bem longe de parecerem lousas limpas, e a concepção
construtivista assume este fato como um elemento central na explicação dos processos de aprendizagem
e ensino na sala de aula. Do ponto de vista desta concepção, aprender qualquer um dos conteúdos
escolares pressupõe atribuir um sentido e construir os significados implicados em tal conteúdo.
Pois bem, essa construção não é efetuada a partir do zero, nem mesmo nos momentos iniciais da
escolaridade. O aluno constrói pessoalmente um significado (ou o reconstrói do ponto de vista social) com
base nos significados que pôde construir previamente.
Justamente graças a esta base é possível continuar aprendendo, continuar construindo novos
significados.
Esta ideia não é propriamente original. Desde Sócrates até os dias de hoje, ela foi questionada por
poucas teorias ou explicações. Entretanto, nem todas explicam do mesmo modo em que consiste esta
base, quais são as suas características, que papel desempenha na aprendizagem posterior e, sobretudo,
como podemos ou devemos ensinar coisas novas ao aluno a partir desta base (a não ser que decidamos,
em um exercício de ilusão, que o gênio da lâmpada tornou o nosso desejo realidade).

A natureza ativa e construtiva do conhecimento23


Sempre que nós, professores e professoras, nos propomos ensinar determinados conteúdos escolares
aos alunos e alunas de nossa classe, colocamos em funcionamento, quase sem pretender, uma série
complexa de ideias sobre o que significa aprender na escola e sobre como se pode ajudar os estudantes
nesse processo.
Essas ideias, que viemos forjando ao longo de nossa atividade educacional, graças à experiência e à
reflexão, constituem nossa concepção de aprendizagem e ensino. Esta, que é nossa própria teoria, atua
como referência-chave para a tomada de decisões sobre o quê, quando e como ensinar e avaliar. No
entanto, nem todos os profissionais de uma mesma escola compartilham as mesmas ideias, e por isso,
quando é preciso tomar uma decisão de equipe (por exemplo: quando é melhor começar a ler? com que
método? que livro didático pode ser mais útil para trabalhar Matemática na 5ª série da Educação Primária?
etc.), costumam misturar-se argumentos contraditórios, que é melhor compreender e avaliar do que
censurar ou simplesmente rejeitar.
O propósito geral é conseguir interpretar melhor as ideias que professores e alunos têm sobre o
processo de aprendizagem escolar e identificar sua limitação ou não. A seguir, analisaremos algumas
das concepções mais habituais entre os docentes sobre esse tema. Em particular, exporemos a ideia que
têm do aluno e aluna que aprendem, da concepção de aprendizagem e como concebem o papel do ensino
nesse processo. Esta proposta será o parâmetro para aprofundar a concepção que, a nosso ver, seja
mais potente entre todas; e, enfim, mais especificamente, tentaremos expor o que implica para o aluno e
a aluna aprender diferentes tipos de conteúdos escolares: conceitos, procedimentos e atitudes.

Algumas concepções da aprendizagem e do ensino escolar mais habituais entre os docentes


A maioria dos docentes estaria de acordo em afirmar que aqueles que aprendem são os alunos e
alunas de nossas classes.
Entretanto, longe dessa primeira aproximação geral, a explicação que daríamos dessa afirmação seria
muito diferente, como também o seria nossa prática em aula. Como frisamos anteriormente, no intuito de
analisar as características das concepções de aprendizagem e ensino escolar mais difundidas entre os
professores, vamos apresentá-las a seguir:

1. A aprendizagem escolar consiste em conhecer as respostas corretas para as perguntas formuladas


pelos professores. O ensino proporciona aos alunos o reforço necessário para obter essas respostas.
2. A aprendizagem escolar consiste em adquirir os conhecimentos relevantes de uma cultura. Nesse
caso, o ensino proporciona aos alunos a informação de que necessitam.
3. A aprendizagem escolar consiste em construir conhecimentos. Os alunos e as alunas elaboram,
mediante sua atividade pessoal, os conhecimentos culturais. Por tudo isso, o ensino consiste em prestar
aos alunos a ajuda necessária para que possam ir construindo-os.

23
C. Coll, E. Martín, T. Mauri, M. Miras, J. Onrubia, I. Solé, A. Zabala. 6ª edição, editora: Ática, 2006, págs: 79-83.

. 51
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Embora a primeira postura apresente características muito diferentes das duas restantes e mantenha
com elas escassos pontos de contato, a segunda e a terceira concepções podem ser relacionadas entre
si, pois ambas ocupam-se de como os alunos adquirem conhecimentos, porém divergem na explicação
desse processo.

Conhecer as respostas corretas


Os professores (pelo menos em algumas situações que podemos conhecer no papel de alunos) não
costumam explicar a lição.
Há ocasiões em que nem mesmo a leem ou comentam em voz alta, dedicando a maior parte do tempo
a formular perguntas aos alunos com a finalidade de comprovar se eles dispõem ou não do repertório
adequado de respostas. Sua tarefa principal é reforçar positivamente as respostas corretas e sancionar
as errôneas.
A cada aula, antes de terminar, os professores assinalam a parte do texto que será objeto de perguntas
na próxima aula. Na outra aula, depois que alunos e alunas dedicaram os momentos iniciais a repassar
em silêncio e individualmente a lição, pede-se que alguns deles, seguindo as normas estabelecidas,
respondam todas aquelas perguntas que o professor ou a professora desejem formular lhes, normalmente
em voz alta, diante de toda a classe. Esse sistema de ensino permite que os professores identifiquem,
quase imediatamente, o acerto ou o erro nas respostas dos alunos, adjudicando-lhes, também de modo
imediato, um prêmio ou um castigo.
Geralmente, estes últimos adotam a forma de uma nota boa ou ruim, que é anotada na lista
correspondente, ao lado do nome do aluno ou da aluna, sem que ninguém possa remediar isso. Quem
não lembra da caderneta onde o professor ou professora anotava rigorosamente as qualificações
resultantes das respostas dos alunos?
Quem não ficou expectante diante da possibilidade de que o dedo do professor se detivesse justo no
momento de chamá-la entre os "escolhidos" para expor a lição do dia?
Nessa concepção, a aprendizagem é vista como aquisição de respostas adequadas graças a um
processo mecânico de reforços positivos ou negativos. Os professores acreditam que a conduta que
desejam dos alunos (a resposta correta) pode ser determinada externamente mediante o uso do prêmio
ou do castigo, ou seja, por meio de notas. Nesse sentido, os alunos são considerados receptores passivos
de reforços.
Os professores entendem que sua tarefa consiste em suscitar e ir aumentando o número correto de
respostas no repertório individual do aluno, e também em avaliar o que e quanto ele responde mais
corretamente do que ontem. Nesse processo, dificilmente é discutida a relevância do conteúdo escolar
ou das perguntas do professor, e a resposta correta é aquela que reproduz fielmente o texto objeto de
estudo.
Em geral, nesse caso, os professores não costumam identificar sua função com a de educar, mas com
a de um especialista que conhece a fundo a matéria objeto de estudo e que exerce, pela autoridade
outorgada por esse fato, um bom controle da conduta dos alunos da classe. Tudo isso faz com que exista
um interesse relativo, entre os docentes, em conhecer o que o aluno e a aluna fazem 'para conseguir dar
as respostas adequadas. Não são consideradas relevantes perguntas como: Por que respondem
corretamente? Isto se deve a algum processo complexo de elaboração da informação do texto? É possível
influenciá-lo? O que diferencia alunos e alunas que o conseguem daqueles que quase nunca o
conseguem? Desse ponto de vista profissional, importante é diferenciar entre os que conseguem ou não
ser bem-sucedidos nesse processo, pois a expectativa dos professores é que os alunos e alunas que não
o conseguirem agora, provavelmente nunca o conseguirão. Nesse caso, se forem acumulando notas
ruins, a atuação habitual dos professores consiste em recomendar-lhes que estudem mais, porém não
explicarão como podem fazê-lo. Se os alunos não conseguem responder adequadamente, continuarão
aplicando-lhes sanções na esperança de que algum dia reajam positivamente. Notas ruins, ficar sem sair
na hora do recreio, expulsão da sala de aula, copiar cem vezes a resposta correta são exemplos de tudo
isso. E quando isso falha, a sanção torna-se mais rigorosa. Ou seja, atua-se aumentando o número de
notas ruins pessoais, de recreios perdidos, a quantidade de dias de expulsão ou o número de vezes que
a resposta correta deve ser copiada. Finalmente, se os alunos continuam sem reagir, um mau resultado
é augurado diretamente: "Você sabe o que faz, mas se continuar assim não vai passar de ano". E sem
qualquer indicação, exceto a de que estudem mais, exigem que continuem tentando (investindo mais
esforço, mais tempo) ou que pensem em abandonar os estudos, caso isso seja possível.

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O que permite aos alunos aprender determinadas atitudes?24
Saberes pessoais dos alunos
1. Estar familiarizado com certas normas e possuir tendências de comportamento que se manifestam
em situações específicas, perante objetos e pessoas concretas que sirvam de base às novas normas e
atitudes objeto de aprendizagem.
2. Poder recordar, entre todos os que estão na memória, avaliações, juízos ou sentimentos que
merecem determinadas coisas, pessoas, objetos e situações mais relevantes e especialmente
relacionados com a nova norma ou atitude.
3. Mostrar-se disposto a expressar a outros suas ideias ou opiniões, por meio da palavra, do gesto ou
de qualquer outro modo possível, como medida para obter algum grau de consciência sobre elas e
conseguir que outros também as conheçam. A consciência pública e privada de uma atitude constitui um
elemento importante para a aprendizagem de outras novas, porque torna possível, de acordo com as
possibilidades de desenvolvimento e aprendizagem dos alunos, que eles reflitam sobre os próprios
comportamentos e ideias, analisem suas relações e implicações mútuas e avaliem o grau de coerência
ou discrepância entre, por exemplo, sua atitude e outras informações novas sobre a realidade, as atitudes
ou opiniões de pessoas queridas e significativas e também entre a própria atitude e a ação ou
comportamento próprio.
4. Poder elaborar o significado da nova norma ou atitude, ligando-a ao próprio comportamento e
opinião, e internalizá-la. Para isso pode ser necessário:
a. Formar para si uma ideia ou representação da norma ou atitude objeto de aprendizagem. Nesse
sentido, são atividades importantes: colocar-se no ponto de vista do outro para conseguir interpretar suas
ideias, tomando consciência do conflito ou da contradição entre tendências de atitude; observar o
comportamento daqueles que nos inspiram afeto, respeito ou admiração; formular perguntas para
conseguir familiarizar-se com determinadas normas e atitudes e compreender sua origem e significado.
Também pode ser útil participar de atividades para rever, redefinir, anular ou substituir uma
determinada norma ou defender ou não uma atitude, argumentando com os valores em que se sustenta,
e aos quais se concede ou não importância pessoal. Tudo isso de acordo com o nível de desenvolvimento
pessoal.
b. Comportar-se de acordo com determinados padrões e normas ou modelos de atitudes, com a
intenção, inicialmente, e responder às demandas feitas pelas pessoas pelas quais sentimos afeto,
admiração ou respeito e, finalmente, com a ideia de demonstrar coerência entre a atitude e a norma que
mantemos e os valores aos quais concedemos importância pessoal. Ir elaborando, na medida do possível,
critérios pessoais de comportamento ético para poder dar maior relevância a determinadas normas e
atitudes em situações concretas e progredir na consecução da autonomia pessoal e moral.
5. Poder aceitar tudo o que implica a mudança de atitude com confiança e segurança em si. O fato de
poder ou não mostrar uma atitude determinada não depende apenas de conhecer os argumentos que a
sustentam, mas da possibilidade de relacioná-la com determinados afetos, emoções e motivos que, as
vezes, nos impedem de mudar. Toda inovação pessoal implica certo grau de temor e pressupõe a
aceitação de algum tipo de risco.
A mudança de atitude na escola é possível se o aluno e a aluna contam com o apoio de um coletivo
(como o grupo da classe) que avalia positivamente essa modificação de atitudes e aceita o desafio da
mudança constituindo-se como referencial e suporte graças à qualidade das relações geradas no mesmo.
Isto é, os alunos estarão em melhores condições de aprender atitudes se a escolha e o grupo de classe
permitem a discussão dos argumentos que as apoiam, regulam as exigências de mudança mediante a
participação a cooperação e a responsabilidade de todos os seus membros aceitam o conflito como algo
necessário e não necessariamente negativo e enfocam os problemas sem dramatismos exagerados nem
culpas desmoralizadoras.

Intervenção dos professores na construção de atitudes dos alunos


1. O grupo escolar deve ter claramente estabelecidos (e compartilhar as normas que os regulam) os
critérios de valor pelos quais é regido. A qualidade da interação que se estabelece na escola e no grupo,
tomando como base os valores estabelecidos, atuará como referencial de ajustamento da própria ação
pessoal e da atividade compartilhada. Isto é, alguém se dispõe a comportar-se de uma determinada
maneira ou a acatar uma norma se considerar que há consenso a respeito entre os membros do grupo,
fundamentalmente entre aqueles que aprecia ou aos quais atribui valor ou autoridade.
2. Os professores devem facilitar o conhecimento e a análise das normas existentes no centro escolar
e no grupo de classe pura que os alunos possam compreendê-las e respeitá-las. Também devem ficar

24
C. Coll, E. Martín, T. Mauri, M. Miras, J. Onrubia, I. Solé, A. Zabala. 6ª edição, editora: Ática, 2006, págs: 117-121.

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claramente estabelecidas as formas de participação para que os alunos as conheçam e contribuam para
melhorá-las, para trocá-las por outras ou anulá-las, se for o caso. É importante regular o cumprimento e
o desenvolvimento das normas e acordos estabelecidos.
3. É função dos professores ajudar os alunos a relacionarem significativamente as normas a
determinadas atitudes que se pretende que desenvolvam em situações concretas (no laboratório, no
trabalho em grupo, nos espaços comuns da escola, em uma saída, em uma exposição dos professores
etc.). Nesse sentido, pode ser útil apresentar as normas e atitudes vinculando-as a situações concretas
e familiares para os alunos, a fim de que possam apreender claramente os argumentos que as sustentam
e alguns dos comportamentos que as exemplificam em realidades concretas.
4. Facilitar a participação e o intercâmbio entre alunos e alunas para debater opiniões e ideias sobre
os diferentes aspectos que dizem respeito à sua atividade na escola (a relevância ou não de estudar e
aprender determinados conteúdos, os objetivos da escola e da sociedade, os costumes próprios do grupo
escolar como microcultura, a regulamentação, gestão e funcionamento do grupo, o uso de comuns, as
notas e avaliações etc.).
5. Uma determinada organização das atividades de aprendizagem de conteúdos na escola facilita a
aprendizagem de determinadas atitudes muito importantes, tais como a cooperação, a solidariedade, a
equidade e a fraternidade. No entanto, se quisermos que o aluno aprenda essas atitudes e outras, não
menos significativas do ponto de vista humano, não podemos deixar de planejar expressamente sua
aprendizagem (informar sobre suas características, exemplificar, debater, atribuir-lhes significado
identificando as em situações cotidianas e reais para os alunos, mostrar modelos de comportamento que
as incluem e permitir que sejam exercidas e praticadas na escola).
6. Procurar modelos das atitudes que se pretende que os alunos e alunas aprendam na escola e
oferecer o apoio e o tempo necessário para que possam ensaiar, testar e imitar. Animar, exigir e apoiar
os alunos que tentam mudar, tentando fazer com que eles aceitem o apoio dos demais do grupo e avaliem
as críticas que recebem, o trabalho realizado e os sucessos alcançados. Os professores devem estar
preparados para apoiar os alunos naqueles momentos em que podem sentir insegurança ou em que
manifestem resistência à mudança.
A aprendizagem de atitudes se apoia, como demonstramos na elaboração de representações
conceituais e no domínio de determinados procedimentos (estratégias de memória, estratégias de relação
com os outros etc.). Por sua vez, as atitudes estão na base do desenvolvimento pessoal de estratégias
de direção, orientação e manutenção da própria atividade de aprendizagem. Por exemplo, atitudes como
o rigor ou a curiosidade baseiam-se no exercício experiente de certos procedimentos e, por sua vez,
ajudam os alunos a perseverar na consecução da qualidade da atividade. Da mesma forma, o respeito
pela diversidade (atitude) permite que as pessoas continuem interessadas em conhecer as características
de outros (conceitos) até conseguir apreciá-los em toda a sua identidade, sem necessidade de
comparações desqualificadoras e reciprocamente. Poder chegar a conhecer, apreciar e avaliar outras
pessoas por aquilo que elas são implica também conhecer-se e apreciar-se, em suma, confiar nas
próprias capacidades e autoestima.

Questões

01. (Prefeitura de Juatuba/MG - Professor de Educação Básica I – CONSULPLAN). “A concepção


construtivista do ensino e da aprendizagem e a natureza dos diferentes conteúdos estabelecem
determinados parâmetros nas atuações e relações que acontecem em aula, envolvendo um conjunto de
relações interativas necessárias para facilitar a aprendizagem.” NÃO é uma função dos professores,
segundo tal concepção:
(A) Contar com as contribuições e os conhecimentos dos alunos, tanto no início das atividades quanto
durante sua avaliação.
(B) Planejar a atuação de uma maneira suficientemente flexível, para permitir adaptação às
necessidades dos alunos em todo o processo educativo.
(C) Avaliar os alunos através de fórmulas em que o controle da avaliação recaia em situações e
momentos alheios aos processos individuais de aprendizagem e imprescindíveis para promover a
capacidade de aprender a aprender.
(D) Promover atividade mental autoestruturante, que permita estabelecer o máximo de relações com
o novo conteúdo, atribuindo‐lhes significado no maior grau possível e fomentando os processos de
metacognição que lhes permitam assegurar o controle pessoal sobre os próprios conhecimentos e
processos durante a aprendizagem.

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02. (Prefeitura de São José dos Campos/SP - Assistente em Gestão Municipal – VUNESP). Uso
das novas tecnologias em sala de aula
Em um mundo tecnológico, integrar novas tecnologias à sala de aula ainda é pouco frequente e um
desafio para docentes. Em muitos casos, a formação não considera essas tecnologias, e se restringe ao
teórico, ou seja, o professor precisa buscar esse conhecimento em outros espaços. Isso nem sempre
funciona, pois frequentar cursos de poucas horas nem sempre garante ao professor segurança e domínio
dessas tecnologias.
Muitos educadores já perceberam o potencial dessas ferramentas e procuram levar novidades para a
sala de aula, seja com uma atividade prática no computador, com videogame, tablets e até mesmo com
o celular.
O fato é que o uso dessas tecnologias pode aproximar alunos e professores, além de ser útil na
exploração dos conteúdos de forma mais interativa. O aluno passa de mero receptor, que só observa e
nem sempre compreende, para um sujeito mais ativo e participativo.
A tecnologia também auxilia o professor na busca por conteúdos a serem trabalhados. O Google, por
exemplo, criou um espaço próprio para a educação, o Google Play for Education – cuja versão em
português ainda está sem data de lançamento. O programa faz uma peneira por disciplina e série para
sugerir aplicativos educacionais específicos para tablets. O professor pode, por exemplo, criar um grupo
da sala em que todos os alunos poderão acessar o aplicativo, facilitando a participação.
A ideia não é abandonar o quadro negro, mas hoje, com todos os avanços, existe a necessidade de
adequação, de abertura para o novo, a fim de tornar as aulas mais atraentes, participativas e eficientes.
(Disponível em http://www.gazetadopovo.com.br. Acesso em 24.10.2014. Adaptado)

De acordo com o autor do texto, o uso das tecnologias em sala de aula pode contribuir para:
(A) distanciar professores e alunos, dada a atração que os conteúdos digitais exercem sobre os
adolescentes.
(B) diminuir o rendimento dos alunos, em face da intensa interação deles com os conteúdos digitais.
(C) tornar as aulas mais interativas, com o aluno desempenhando um papel mais ativo na exploração
dos conteúdos.
(D) tumultuar as aulas, diante da dificuldade para disciplinar o uso de aparelhos como tablets e
celulares em sala de aula.
(E) tornar os alunos mais dispersivos, apenas espectadores de ferramentas com as quais não sabem
interagir.

03. Grande parte dos professores não costumam identificar sua função com a de educar, mas com a
de um especialista que conhece a fundo a matéria objeto de estudo e que exerce, pela autoridade
outorgada por esse fato, um bom controle da conduta dos alunos da classe.
( ) Certo ( ) Errado

Gabarito

01. C / 02. C / 03. Certo

Respostas
01. C.
Do conjunto de relações necessárias para facilitar a aprendizagem se deduz uma série de funções dos
professores, que Zabala caracteriza da seguinte maneira:
- Avaliar os alunos conforme suas capacidades e seus esforços, levando em conta o ponto pessoal de
partida e o processo através do qual adquirem conhecimentos e incentivando a autoavaliação das
competências como meio para favorecer as estratégias de controle e regulação da própria atividade.

02. C.
O grande desafio encontrado nas salas de aula é o uso de tecnologias de baixo custo, valendo-se de
smartphones, tablets, que podem ser utilizados por qualquer aluno com facilidade, proporcionando um
ambiente interativo em sala de aula.

03. Certo.
Em geral, os professores não costumam identificar sua função com a de educar, mas com a de um
especialista que conhece a fundo a matéria objeto de estudo e que exerce, pela autoridade outorgada por
esse fato, um bom controle da conduta dos alunos da classe.

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2.3 A didática como fundamento epistemológico do fazer docente.

Didática

Libâneo25 pontua que os alunos costumam comentar entre si: “gosto desse professor porque ele tem
didática”. Outros dizem: “com essa professora a gente tem mais facilidade de aprender”. Provavelmente,
o que os alunos estão querendo dizer é que esses professores têm um modo acertado de dar aula, que
ensinam bem, que com eles, de fato, aprendem.

Então, o que é ter didática?


A didática pode ajudar os alunos a melhorar seu aproveitamento escolar?

O que um professor precisa conhecer de didática para que possa levar bem o seu trabalho em sala de
aula?
Considerando as mudanças que estão ocorrendo nas formas de aprender e ensinar, principalmente
pela forte influência dos meios de informação e comunicação, o que mudar na prática dos professores?
É certo que a maioria do professorado tem como principal objetivo do seu trabalho conseguir que seus
alunos aprendam da melhor forma possível. Por mais limitações que um professor possa ter (falta de
tempo para preparar aulas, falta de material de consulta, insuficiente domínio da matéria, pouca variação
nos métodos de ensino, desânimo por causa da desvalorização profissional, etc.), quando entra em
classe, ele tem consciência de sua responsabilidade em proporcionar aos alunos um bom ensino.

Apesar disso, saberá ele fazer um bom ensino, de modo que os alunos aprendam melhor?
É possível melhorar seu desempenho como professor?
Qual é o sentido de “mediação docente” nas aulas?

Os Estilos de Professor
Há diversos tipos de professores. Os mais tradicionais contentam-se em transmitir a matéria que está
no livro didático, por meio de aula expositiva. É o estilo professor-transmissor de conteúdo. Suas aulas
são sempre iguais, o método de ensino é quase o mesmo para todas as matérias, independentemente
da idade e das características individuais e sociais dos alunos. Pode até ser que essas práticas de passar
a matéria, dar exercícios e depois cobrar o conteúdo na prova, tenham algum resultado positivo. Mesmo
porque alguns alunos aprendem “apesar do professor”.
O mais comum, no entanto, é o aluno memorizar o que o professor fala, decorar a matéria e mecanizar
fórmulas, definições etc. A aprendizagem que decorre desse tipo ensino (vamos chamá-la de mecânica,
repetitiva) serve para responder questões de uma prova, sair-se bem no vestibular ou num concurso, mas
ela não é duradoura, ela não ajuda o aluno a formar esquemas mentais próprios. O aluno que aprende
mecanicamente, na maior parte dos casos, não desenvolve raciocínio próprio, não forma generalizações
conceituais, não é capaz de fazer relações entre um conceito e outro, não sabe aplicar uma relação geral
para casos particulares.

O professor transmissor de conteúdo não favorece uma aprendizagem sólida porque o


conteúdo que ele passa não se transforma em meio de atividade subjetiva do aluno. Ou seja, o
aluno não dá conta de explicar uma ideia, uma definição, com suas próprias palavras, não saber
aplicar o conhecimento em situações novas ou diferentes, nem na sala de aula nem fora dela. A
participação do aluno é pouco solicitada, e quando o professor faz uma pergunta, ele próprio
imediatamente a responde.
É possível que entre os professores que se utilizam desses procedimentos de ensino haja
alguns que levem os alunos a aprender os conceitos de forma mais sólida, que saibam lidar de
forma autônoma com os conceitos. Mas não é o caso da maioria. O que se vê nas instituições de
ensino superior é um ensino meramente expositivo, empírico, repetitivo, memorístico.

25
LIBÂNEO, J. C. Didática. São Paulo: Cortez, 2010.
LIBÂNEO, J. C. A didática e a aprendizagem do pensar e do aprender: a teoria histórico-cultural da atividade e a contribuição de Vasili Davydov. In: Revista
Brasileira de Educação, Rio de Janeiro, n. 27, 2004.

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Os alunos desses professores não aprendem solidamente, ou seja, não sabem lidar de forma
independente com os conhecimentos, não “interiorizam” os conceitos, o modo de pensar,
raciocinar e atuar, próprios da matéria que está sendo ensinada e, assim, os conceitos não se
transformam em instrumentos mentais para atuar com a realidade.

O estilo professor-facilitador aplica-se a professores que se julgam mais atualizados nas metodologias
de ensino, eles tentam variar mais os métodos e procedimentos. Alguns deles preocupam-se, realmente,
com certas características individuais e sociais dos alunos, procuram saber os conhecimentos prévios ou
as experiências dos alunos, tentam estabelecer diálogo ou investir mais no bom relacionamento com os
alunos. Outros tentam inovar organizando trabalhos em grupo ou estudo dirigido, utilizando recursos
audiovisuais, dando tarefas que requerem algum tipo de pesquisa.
Há, também, em algumas áreas de conhecimento, professores que entendem que a melhor forma de
aprender é colocar os alunos no laboratório na crença de que, fazendo experiências, lidando com
materiais, assimilam melhor a matéria. Essas formas de trabalho didático, sem dúvida, trazem mais
vantagens do que aquelas do ensino tradicional. Entretanto, quase sempre esses professores acabam
voltando às práticas tradicionais, por exemplo, não sabem utilizar a atividade própria do aluno para eles
próprios formando conceitos.
Com efeito, ao avaliar a aprendizagem dos alunos pedem respostas memorizadas e a repetição de
definições ou fórmulas. Mesmo utilizando técnicas ativas e respeitando mais o aluno, as mudanças
metodológicas ficam apenas na forma, mantendo empobrecidos os resultados da aprendizagem, ou aluno
não forma conceitos, não aprende a pensar com autonomia, não interioriza ações mentais. Ou seja, sua
atividade mental continua pouco reflexiva.
Poderíamos mencionar outros estilos de professor: o professor-técnico (preocupado pelo lado
operacional, prático da sua matéria, seu objetivo é saber-fazer, não fazer-pensar-fazer); o professor-
laboratório (acha que única forma eficaz de aprender é a pesquisa ou a demonstração experimental); o
professor-comunicador (o típico professor de cursinhos que só sabe trabalhar o conteúdo fazendo
graça, não dando conta de colocar o próprio conteúdo no campo de interesses e motivos do aluno).

Em resumo, muitos professores não sabem como ajudar o aluno a, através de formas de
mobilização de sua atividade mental, elaborar de forma consciente e independente o
conhecimento para que possa ser utilizado nas várias situações da vida prática. As atividades que
organizam não levam os alunos a adquirir conceitos e métodos de pensamento, habilidades e
capacidades mentais, para poderem lidar de forma independente e criativa com os conhecimentos
e a realidade, tornando esses conceitos e métodos meios de sua atividade.

Sugerimos para quem deseja um ensino eficaz, tendo em vista aprendizagens mais sólidas dos alunos,
a metáfora do professor-mediador. Quais são as características do professor mediador? O que caracteriza
uma didática baseada no princípio da mediação? Numa formulação sintética, boa didática significa um
tipo de trabalho na sala de aula em que o professor atua como mediador da relação cognitiva do aluno
com a matéria. Há uma condução eficaz da aula quando o professor assegura, pelo seu trabalho, o
encontro bem sucedido entre o aluno e a matéria de estudo. Em outras palavras, o ensino satisfatório
é aquele em que o professor põe em prática e dirige as condições e os modos que asseguram um
processo de conhecimento pelo aluno.

Vejamos isso mais detalhadamente.

Uma pedagogia que valoriza os conteúdos e as ações mentais correspondentes ao modo de


constituição desses conteúdos
Uma boa didática, na perspectiva da mediação, é aquela que promove e amplia o desenvolvimento
das capacidades intelectuais dos alunos por meio dos conteúdos. Conforme a teoria histórico-cultural,
formulada inicialmente pelo psicólogo e pedagogo russo Lev Vygotsky, o objetivo do ensino é o
desenvolvimento das capacidades mentais e da subjetividade dos alunos através da assimilação
consciente e ativa dos conteúdos, em cujo processo se leva em conta os motivos dos alunos. O ensino é
meio pelo qual os alunos se apropriam das capacidades humanas formadas historicamente e objetivadas
na cultura material e espiritual. Essa apropriação se dá pela aprendizagem de conteúdos, habilidades,
atitudes, formadas pela humanidade ao longo da história. Conforme as próprias palavras de Vygotsky:

A internalização de formas culturais de comportamento envolve a reconstrução da atividade


psicológica tendo como base as operações com signos. (...) A internalização das atividades

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socialmente enraizadas e historicamente desenvolvidas constitui o aspecto característico da
psicologia humana.

Esse processo de interiorização ou apropriação tem as seguintes características:


a) O desenvolvimento mental dos alunos depende da transmissão-apropriação de conhecimentos,
habilidades, valores, que vão sendo constituídos na história da humanidade;
b) O papel do ensino é propiciar aos alunos os meios de domínio dos conceitos, isto é, dos modos
próprios de pensar e de atuar da matéria ensinada, de modo a formar capacidades intelectuais com base
nos procedimentos lógicos e investigativos da ciência ensinada;
c) A ação de ensinar, mais do que “passar conteúdo”, consiste em intervir no processo mental de
formação de conceitos por parte dos alunos, com base na matéria ensinada;
d) As relações intersubjetivas na sala de aula implicam, necessariamente, a compreensão dos motivos
dos alunos, isto é, seus objetivos e suas razões para se envolverem nas atividades de aprendizagem.
e) A aprendizagem se consolida melhor se forem criadas situações de interlocução, cooperação,
diálogo, entre professor e alunos e entre os alunos, em que os alunos tenham chance de formular e opera
com conceitos.

Na mesma linha teórica, Davydov afirma que o papel do ensino é desenvolver nos alunos as
capacidades intelectuais necessárias para assimilar e utilizar com êxito os conhecimentos. Ele escreve:
Os pedagogos começam a compreender que a tarefa da escola contemporânea não consiste em dar
às crianças uma soma de fatos conhecidos, mas em ensiná-las a orientar-se independentemente na
informação científica e em qualquer outra. Isto significa que a escola deve ensinar os alunos a pensar,
quer dizer, desenvolver ativamente neles os fundamentos do pensamento contemporâneo para o qual é
necessário organizar um ensino que impulsione o desenvolvimento. Chamemos esse ensino de
desenvolvimental.
Conforme Davydov, para que o ensino esteja voltado para o desenvolvimento das capacidades
intelectuais dos alunos, é preciso que o professor conheça quais são os métodos de investigação
utilizados pelo cientista (em relação à matéria que ensina), pois é nesses métodos que encontrará as
capacidades intelectuais a serem formadas pelos estudantes enquanto estudam a matéria. Em outras
palavras, para aprender a pensar e a agir com base nos conteúdos de uma matéria de ensino é preciso
que os alunos dominem aquelas ações mentais associadas a esses conteúdos, as quais são encontradas
nos procedimentos lógicos e investigativos próprios da ciência que dá origem a esses conteúdos. Conclui-
se, daí, que a um professor não basta dominar o conteúdo, é preciso que saiba mais três coisas:

a) qual é o processo de pesquisa pelo qual se chegou a esse conteúdo, ou seja, a epistemologia da
ciência que ensina;
b) por quais métodos e procedimentos ensinará seus alunos a se apropriarem dos conteúdos da
ciência ensinada e, especialmente, das ações mentais ligadas a esses conteúdos;
c) quais são as características individuais e socioculturais dos alunos e os motivos que os impulsionam,
de modo a saber ligar os conteúdos com esses motivos.

Para M. Castells, a tarefa das escolas e dos processos educativos é o de desenvolver em quem está
aprendendo a capacidade de aprender, em razão de exigências postas pelo volume crescente de dados
acessíveis na sociedade e nas redes informacionais, da necessidade de lidar com um mundo diferente e,
também, de educar a juventude em valores e ajudá-la a construir personalidades flexíveis e eticamente
ancoradas. Também E. Morin expressa com muita convicção a exigência de se desenvolver uma
inteligência geral que saiba discernir o contexto, o global, o multidimensional, a interação complexa dos
elementos. Escreve esse autor:

(...) o desenvolvimento de aptidões gerais da mente permite melhor desenvolvimento das


competências particulares ou especializadas. Quanto mais poderosa é a inteligência geral, maior é sua
faculdade de tratar problemas especiais. A compreensão dos dados particulares também necessita da
ativação da inteligência geral, que opera e organiza a mobilização dos conhecimentos de conjunto em
cada caso particular. (...) Dessa maneira, há correlação entre a mobilização dos conhecimentos de
conjunto e a ativação da inteligência geral.

Em síntese, esses estudos destacam, nos processos do ensinar a aprender e a pensar em um campo
de conhecimento, o papel ativo dos sujeitos na aprendizagem e, especialmente, a necessidade dos
sujeitos desenvolverem habilidades de pensamento, competências cognitivas, como meio para

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compreender e atuar no mundo da profissão, da política, da cultura. Esses meios da atividade aprender
são aprendidos pelo estudante quando desenvolve as ações mentais conexas aos conteúdos, isto é, o
modo próprio de pensar, pesquisar e agir que corresponde à ciência, arte ou tecnologia ensinadas.

A Didática e o Trabalho dos Professores


A didática é uma disciplina que estuda o processo de ensino no qual os objetivos, os
conteúdos, os métodos e as formas de organização da aula se combinam entre si, de modo a criar
as condições e os modos de garantir aos alunos uma aprendizagem significativa. Ela ajuda o
professor na direção e orientação das tarefas do ensino e da aprendizagem, fornecendo-lhe mais
segurança profissional.

Em que consiste o processo de ensino e aprendizagem? O princípio básico que define esse processo
é o seguinte: o núcleo da atividade docente é a relação ativa do aluno com a matéria de estudo, sob a
direção do professor. O processo de ensino consiste de uma combinação adequada entre o papel de
direção do professor e a atividade independente, autônoma e criativa do aluno.
O papel do professor, portanto é o de planejar, selecionar e organizar os conteúdos, programar tarefas,
criar condições de estudo dentro da classe, incentivar os alunos para o estudo, ou seja, o professor dirige
as atividades de aprendizagem dos alunos a fim de que estes se tornem sujeitos ativos da própria
aprendizagem. Não há ensino verdadeiro se os alunos não desenvolvem suas capacidades e habilidades
mentais, se não assimilam pessoal e ativamente os conhecimentos ou se não dão conta de aplicá-los,
seja nos exercícios e verificações feitos em classe, seja na prática da vida.
Podemos dizer, então, que o processo didático é o conjunto de atividades do professor e dos alunos
sob a direção do professor, visando à assimilação ativa pelos alunos dos conhecimentos, habilidades e
hábitos, atitudes, desenvolvendo suas capacidades e habilidades intelectuais. Nessa concepção de
didática, os conteúdos escolares e o desenvolvimento mental se relacionam reciprocamente, pois o
progresso intelectual dos alunos e o desenvolvimento de suas capacidades mentais se verificam no
decorrer da assimilação ativa dos conteúdos. Portanto, o ensino e a aprendizagem (estudo) se movem
em torno dos conteúdos escolares visando o desenvolvimento do pensamento.
Mas, qual é a dinâmica do processo de ensino? Como se garante o vínculo entre o ensino (professor)
e a aprendizagem efetiva decorrente do encontro cognitivo e afetivo entre o aluno e a matéria?
A pesquisa mais atual sobre a didática utiliza a palavra “mediação” para expressar o papel do professor
no ensino, isto é, mediar a relação entre o aluno e o objeto de conhecimento. Na verdade, trata-se de
uma dupla mediação: primeiro, tem-se a mediação cognitiva, que liga o aluno ao objeto de conhecimento;
segundo, tem-se a mediação didática, que assegura as condições e os meios pelos quais o aluno se
relaciona com o conhecimento. Sendo assim, a especificidade de toda didática está em propiciar as
condições ótimas de transformação das relações que o aprendiz mantém com o saber. Escreve D´Ávila:
A relação com o saber é, portanto, duplamente mediatizada: uma mediação de ordem cognitiva (onde
o desejo desejado é reconhecido pelo outro) e outra de natureza didática que torna o saber desejável ao
sujeito. É aqui que as condições pedagógicas e didáticas ganham contornos, no sentido de garantir as
possibilidades de acesso ao saber por parte do aprendiz educando.
A força impulsionadora do processo de ensino é um adequado ajuste entre os
objetivos/conteúdos/métodos organizados pelo professor e o nível de conhecimentos, experiências e
motivos do aluno. O movimento permanente que ocorre a cada aula consiste em que, por um lado, o
professor propõe problemas, desafios, perguntas, relacionados com conteúdos significativos, instigantes
e acessíveis; por outro lado, os alunos, ao assimilar consciente e ativamente a matéria, mobilizam seus
motivos, sua atividade mental e desenvolvem suas capacidades e habilidades. Portanto, um bom
planejamento de ensino depende da análise e organização dos conteúdos junto com a análise e
consideração dos motivos dos alunos.
Essa forma de compreender o ensino é muito diferente do que simplesmente passar a matéria ao
aluno. É diferente, também, de dar atividades aos alunos para que fiquem “ocupados” ou aprendam
fazendo. O processo de ensino é um constante vai-e-vem entre conteúdos e problemas que são
colocados e as características de desenvolvimento e aprendizagem dos alunos. É isto que caracteriza a
dinâmica da situação didática, numa perspectiva histórico-cultural.
Insistimos bastante na exigência didática de partir do nível de conhecimentos já alcançado, da
capacidade atual de assimilação e do desenvolvimento mental do aluno, dos motivos do aluno. Ou seja,
não existe o aluno em geral, mas um aluno vivendo numa sociedade determinada, que faz parte de um
grupo social e cultural determinado, sendo que essas circunstâncias interferem na sua capacidade de
aprender, nos seus valores e atitudes, na sua linguagem e suas motivações. Ou seja, a subjetividade (os
motivos) e a experiência sociocultural concreta dos alunos são o ponto de partida para a orientação da

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aprendizagem. Um professor que aspira ter uma boa didática necessita aprender a cada dia como lidar
com a subjetividade dos alunos, seus motivos, sua linguagem, suas percepções, sua prática de vida. Sem
essa disposição, será incapaz de colocar problemas, desafios, perguntas, relacionados com os
conteúdos, condição para se conseguir uma aprendizagem significativa.
Essas considerações mostram o traço mais marcante de uma didática crítico-social na perspectiva
histórico-cultural: o trabalho docente como mediação entre a cultura elaborada, convertida em saber
escolar, e o aluno que, para além de um sujeito psicológico, é um sujeito portador da prática social viva.
O modo adequado de realizar a mediação didática, pelo trabalho dos professores, é o provimento aos
alunos dos meios de aquisição de conceitos científicos e de desenvolvimento das capacidades cognitivas
e operativas, dois elementos da aprendizagem escolar interligados e indissociáveis.

O ensino e o desenvolvimento do pensamento – O ensino para o desenvolvimento humano


A teoria do ensino desenvolvimental de Vasíli Davydov, baseada na teoria histórico-cultural de
Vygotsky, sustenta tese de que o bom ensino é o que promove o desenvolvimento mental, isto é, as
capacidades e habilidades de pensamento. Segundo Vygotsky, a aprendizagem e o ensino são formas
universais de desenvolvimento mental. Para Davydov, a atividade de aprendizagem está assentada no
conhecimento teórico-científico, ou seja, no desenvolvimento do pensamento teórico e nas ações mentais
que lhe correspondem.
É importante esclarecer que, na teoria histórico-cultural elaborada entre outros por Vygotsky, Leontiev
e Davídov, pensamento teórico ou conceito não tem o sentido de “estudar teoria”, de lidar com o conteúdo
só na teoria. Na teoria histórico-cultural, conceito não se refere apenas às características e propriedades
dos fenômenos em estudo, mas a uma ação mental peculiar pela qual se efetua uma reflexão sobre um
objeto que, ao mesmo tempo, é um meio de reconstrução mental desse objeto pelo pensamento.
Nesse sentido, pensar teoricamente é desenvolver processos mentais pelos quais chegamos aos
conceitos e os transformamos em ferramentas para fazer generalizações conceituais e aplicá-las a
problemas específicos. Como escreve Seth Chaiklin, conceito significa um conjunto de procedimentos
para deduzir relações particulares de uma relação abstrata.
O ensino, portanto, propicia a apropriação da cultura e da ciência, e o desenvolvimento do
pensamento, por meio da formação e operação com conceitos. São dois processos articulados entre si,
formando uma unidade: Podemos expressar essa ideia de duas maneiras:
- à medida que o aluno forma conceitos científicos, incorpora processos de pensamento e vice-versa.
- enquanto forma o pensamento teórico-científico, o aluno desenvolve ações mentais mediante a
solução de problemas que suscitam sua atividade mental.

Com isso, o aluno assimila o conhecimento teórico e as capacidades e habilidades relacionadas a esse
conhecimento.
Sendo assim, o papel da escola é ajudar os alunos a desenvolver suas capacidades mentais, ao
mesmo tempo em que se apropriam dos conteúdos. Nesse sentido, a metodologia de ensino, mais do
que o conjunto dos procedimentos e técnicas de ensino, consiste em instrumentos de mediação
para ajudar o aluno a pensar com os instrumentos conceituais e os processos de investigação da
ciência que se ensina. Por exemplo, a boa pedagogia da física é aquela que consegue traduzir
didaticamente o modo próprio de pensar, investigar e atuar da própria física. Boa pedagogia da
geografia é aquela cujo aluno sai das aulas pensando, raciocinando, investigando e atuando como
o modo próprio de pensar, raciocinar, investigar e atuar da geografia.
Trata-se, assim, de fazer a junção entre o conteúdo e o desenvolvimento das capacidades de pensar.
A ideia central contida nessa teoria é simples: ensinar é colocar o aluno numa atividade de aprendizagem.
A atividade de aprendizagem é a própria aprendizagem, ou seja, com base nos conteúdos, aprender
habilidades, desenvolver capacidades e competências para que os alunos aprendam por si mesmos.
É essa ideia que Davydov defende: a atividade de aprender consiste em encontrar soluções gerais
para problemas específicos, é apreender os conceitos mais gerais que dão suporte a um conteúdo, para
aplicá-los a situações concretas. Esse modo de ver o ensino significa dizer que o ensino mais compatível
com o mundo da ciência, da tecnologia, dos meios de comunicação, é aquele que contribui para que o
aluno aprenda a raciocinar com a própria cabeça, que forme conceitos e categorias de pensamento
decorrentes da ciência que está aprendendo, para lidar praticamente com a realidade. Os conceitos,
nessa maneira de ver, são ferramentas mentais para lidar praticamente com problemas, situações,
dilemas práticos, etc.
Explicitando essa ideia numa formulação mais completa, podemos dizer: o modo de lidar
pedagogicamente com algo, depende do modo de lidar epistemologicamente com algo, considerando as
condições do aluno e o contexto sociocultural em que ele vive (vale dizer, as condições da realidade

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econômica, social, etc.). Trata-se, portanto, de unir no ensino a lógica do processo de investigação com
os produtos da investigação. Ou seja, o acesso aos conteúdos, a aquisição de conceitos científicos,
precisa percorrer o processo de investigação, os modos de pensar e investigar da ciência ensinada. Não
basta aprender o que aconteceu na história, é preciso pensar historicamente. Pensar matematicamente
sobre matemática, biologicamente sobre biologia, linguisticamente sobre português.
Essa forma de entender a atividade de ensino das disciplinas específicas requer do professor não
apenas o domínio do conteúdo, mas, também, dos procedimentos investigativos da matéria que está
ensinando e das formas de pensamento, habilidades de pensamento que propiciem uma reflexão sobre
a metodologia investigativa do conteúdo que se está aprendendo. Ensinar, portanto, é adquirir meios do
pensar, através dos conteúdos. Em outras palavras, é desenvolver nos alunos o pensamento teórico, que
é o processo através do qual se revela a essência e o desenvolvimento dos objetos de conhecimento e
com isso a aquisição de métodos e estratégias cognoscitivas gerais de cada ciência, em função de
analisar e resolver problemas. Escreve a esse respeito Rubtsov:

A aquisição de um método teórico geral visando à resolução de uma série de problemas


concretos e práticos, concentrando-se naquilo que eles têm em comum e não na resolução
específica de um entre eles, constitui-se numa das características mais importantes da
aprendizagem. Propor um problema de aprendizagem a um escolar é confrontá-lo com uma
situação cuja solução, em todas as suas variantes concretas, pede uma aplicação do método
teórico geral.
(...) Podemos definir o processo de resolução de um problema como o da aquisição das formas
de ação características dos conteúdos teóricos. O termo “forma de ação geral”, também chamado
de forma de ação universal, designa aquilo que é obtido como resultado ou modo de
funcionamento essencial para trazer soluções para os problemas de aprendizagem; mais do que
soluções, é este resultado particular que constitui o objeto desses problemas.

Nesses termos, o papel da didática é: a) ajudar os alunos a pensar teoricamente (a partir da formação
de conceitos); b) ajudar o aluno a dominar o modo de pensar, atuar e investigar a ciência ensinada; c)
levar em conta a atividade psicológica do aluno (motivos) e seu contexto sociocultural e institucional.
Para chegar à consecução desses objetivos, o professor precisa saber como trabalhar a matéria no
sentido da formação e operação com conceitos. Para isso, no trabalho com os conteúdos, podem ser
seguidos três momentos:

1º) Análise do conteúdo da matéria para identificar um princípio geral, ou seja, uma relação
mais geral, um conceito nuclear, do qual se parte para ser aplicado a manifestações particulares
desse conteúdo.
2º) Realizar por meio da conversação dirigida, do diálogo com os alunos, da colocação
problemas ou casos, tarefas que possibilitem deduções do geral para o particular, ou seja,
aplicação do princípio geral (relação geral, conceito nuclear) a problemas particulares.
3º) Conseguir com que o aluno domine os procedimentos lógicos do pensamento (ligados à
matéria) que têm caráter generalizante. Ao captar a essência, isto é, o princípio interno explicativo
do objeto e suas relações internas, o aluno se apropria dos métodos e estratégias cognitivas dos
modos de atividades anteriores desenvolvidas pelos cientistas; o aluno reproduz em sua mente o
percurso investigativo de apreensão teórica do objeto realizado pela prática científica e social.

Todos esses momentos devem estar conectados com os motivos e objetivos subjetivos do aluno,
ampliados com as necessidades sociais de estudar e aprender interpostos pelo professor, na sua
condição de educador.

O caminho didático: sugestões para elaboração de planos de ensino


Ao assumir o ensino de uma matéria, os professores geralmente partem de um conteúdo já
estabelecido num projeto pedagógico-curricular. O procedimento da análise de conteúdo indicado na
didática desenvolvimental pode levar a uma organização do conteúdo muito diferente da existente na
instituição, ou seja, os temas podem ser os mesmos, mas a sequência e a lógica de estruturação podem
ser outras.
Os procedimentos a serem utilizados em relação à formulação de conteúdos, objetivos e metodologia
podem ser os seguintes:
a) Identificar, o núcleo conceitual da matéria (essência, princípio geral básico) e as relações
gerais básicas que a definem e lhe dão unidade. Este núcleo conceitual contém a generalização

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esperada para que o aluno a interiorize, de modo a poder deduzir relações particulares da relação
básica identificada.
b) Construir a rede de conceitos básicos que dão suporte a esse núcleo conceitual, com as
devidas relações e articulações (mapa conceitual).
c) Estudo da gênese e dos processos investigativos do conteúdo, de modo a extrair ações
mentais, habilidades cognitivas gerais a formar no estudo da matéria.
d) Formulação de tarefas de aprendizagem, com base em situações-problema, que possibilitem
a formação de habilidades cognitivas gerais e específicas em relação à matéria.
e) Prever formas de avaliação para verificar se o aluno desenvolveu ou está desenvolvendo a
capacidade de utilizar os conceitos como ferramentas mentais.

A Didática e as Diretrizes Curriculares para a Educação Básica

A estrutura didática da Educação Básica instituída pela Lei n°. 9.394 de 20 de dezembro de 1996
envolve escolas de diferentes níveis: Educação Infantil, Ensino Fundamental e Ensino Médio, além de
modalidades específicas de ensino, como a Educação de Jovens e Adultos, a Educação Profissional e a
Educação Especial.
Conforme o artigo 22 desta lei: “A educação básica tem por finalidades desenvolver o educando,
assegurar-lhe a formação comum indispensável para o exercício da cidadania e fornecer-lhe meios para
progredir no trabalho e em estudos posteriores”. Essas finalidades devem ser analisadas de acordo com
os pressupostos filosóficos e políticos contidos na Constituição Brasileira vigente. Portanto, todas as
atividades de ensino-aprendizagem devem obrigatoriamente convergir para as finalidades
constitucionalmente estabelecidas.
A Educação Infantil é o primeiro nível da Educação Básica e tem como finalidade o desenvolvimento
integral da criança até seis anos, considerando os aspectos físico, psicológico, intelectual e social e
completando a ação da família e da comunidade. Segundo o artigo 30 da LDB, é oferecida em dois níveis:
“I - creches, ou entidades equivalentes, para crianças de até três anos de idade; II - pré-escolas, para as
crianças de 4 (quatro) a 5 (cinco) anos de idade.”.

O Ensino Fundamental, segundo artigo 32 da LDB, obrigatório, com duração de 9 (nove) anos, gratuito
na escola pública, iniciando-se aos 6 (seis) anos de idade, terá por objetivo a formação básica do cidadão,
mediante:
I - o desenvolvimento da capacidade de aprender, tendo como meios básicos o pleno domínio da
leitura, da escrita e do cálculo;
II - a compreensão do ambiente natural e social, do sistema político, da tecnologia, das artes e dos
valores em que se fundamenta a sociedade;
III - o desenvolvimento da capacidade de aprendizagem, tendo em vista a aquisição de conhecimentos
e habilidades e a formação de atitudes e valores;
IV - o fortalecimento dos vínculos de família, dos laços de solidariedade humana e de tolerância
recíproca em que se assenta a vida social.
§ 1º É facultado aos sistemas de ensino desdobrar o ensino fundamental em ciclos.
§ 2º Os estabelecimentos que utilizam progressão regular por série podem adotar no ensino
fundamental o regime de progressão continuada, sem prejuízo da avaliação do processo de ensino-
aprendizagem, observadas as normas do respectivo sistema de ensino.
§ 3º O ensino fundamental regular será ministrado em língua portuguesa, assegurada às comunidades
indígenas a utilização de suas línguas maternas e processos próprios de aprendizagem.
§ 4º O ensino fundamental será presencial, sendo o ensino a distância utilizado como complementação
da aprendizagem ou em situações emergenciais.
§ 5° O currículo do ensino fundamental incluirá, obrigatoriamente, conteúdo que trate dos direitos das
crianças e dos adolescentes, tendo como diretriz a Lei no 8.069, de 13 de julho de 1990, que institui o
Estatuto da Criança e do Adolescente, observada a produção e distribuição de material didático
adequado.
§ 6º O estudo sobre os símbolos nacionais será incluído como tema transversal nos currículos do
ensino fundamental.

O Ensino Médio, conforme o artigo 35 da LDB, é a etapa final da Educação Básica, com duração
mínima de três anos. Tem como finalidades:
I - a consolidação e o aprofundamento dos conhecimentos adquiridos no ensino fundamental,
possibilitando o prosseguimento de estudos;

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II - a preparação básica para o trabalho e a cidadania do educando, para continuar aprendendo, de
modo a ser capaz de se adaptar com flexibilidade a novas condições de ocupação ou aperfeiçoamento
posteriores;
III - o aprimoramento do educando como pessoa humana, incluindo a formação ética e o
desenvolvimento da autonomia intelectual e do pensamento crítico;
IV - a compreensão dos fundamentos científico-tecnológicos dos processos produtivos, relacionando
a teoria com a prática, no ensino de cada disciplina.

A Educação de Jovens e de Adultos – EJA é a modalidade de ensino prevista nos artigos 37 e 38 da


LDB para jovens e adultos concluírem o Ensino Fundamental ou Médio.
A Educação Profissional não se coloca como um nível de ensino, mas tipo de formação que se integra
ao trabalho, à ciência e à tecnologia e conduz ao permanente desenvolvimento de aptidões para a vida
produtiva. Está regulamentada nos artigos 39, 40 e 41 da LDB.

A Educação Especial, de acordo com o artigo 58 da LDB, é uma modalidade de educação oferecida
preferentemente na rede regular de ensino, para educandos com deficiência, transtornos globais do
desenvolvimento e altas habilidades ou superdotação.

Questões

01. (SEDUC-PI - Professor – Informática – NUCEPE) A Didática constitui disciplina essencial nos
processos de formação de professores, notadamente articulando o saber, o saber-ser e o saber-fazer. No
contexto dessa análise, pode-se afirmar CORRETAMENTE, acerca da concepção tradicional de Didática
que:
(A) refere-se a um conjunto de procedimentos universais relativos à docência;
(B) afirma a neutralidade científica do método, a preocupação com os meios desvinculados dos fins e
do contexto;
(C) caracteriza-se por transcender métodos e técnicas de ensino, buscando articular escola/sociedade;
(D) compreende uma doutrina da instrução, revelando-se como um conjunto de normas prescritivas
centradas no método;
(E) caracteriza-se por estabelecer métodos e técnicas de educação desvinculados dos princípios
educacionais.

02. (SEE-AL - Todos os Cargos – CESPE) Com relação à didática e à sua prática histórico-social,
julgue o item a seguir.
O enfoque tecnicista da didática busca estratégia objetiva, racional e neutra do processo de ensino-
aprendizagem, em contraposição ao enfoque humanista.
( ) Certo ( ) Errado

03. (Prefeitura de Nova Friburgo- RJ- Professor- EXATUS-PR) Em relação à Didática, é incorreto
afirmar que
(A) contribui para transformar a prática pedagógica da escola, ao desenvolver a compreensão
articulada entre os conteúdos a serem ensinados e as práticas sociais.
(B) não compete refletir acerca dos objetivos sócio-políticos e pedagógicos, ao selecionar os conteúdos
e métodos de ensino.
(C) realiza-se por meio de ação consciente, intencional e planejada, no processo de formação humana,
estabelecendo-se objetivos e critérios socialmente determinados.
(D) sua finalidade é converter objetivos sócio-políticos e pedagógicos em objetivos de ensino,
selecionar conteúdos e métodos em função desses objetivos.

Gabarito

01. D / 02. Certa. / 03. B

01. Resposta: D.
Conjunto de regras e normas prescritivas visando a orientação técnica do ensino e do estudo. Alicerce
de uma tradição didática centrada no método e em regras de bem conduzir a aula e o estudo – ação
desvinculada da realidade brasileira.

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02. Resposta: Certa.
"Entre os anos 1960 e 1980 a didática assumiu o enfoque teórico numa dimensão denominada
tecnicista, e deixou o enfoque humanista centrado no processo interpessoal, para uma dimensão técnica
do processo ensino-aprendizagem.
A era industrial fez-se presente na escola, e a didática era vista como uma estratégia objetiva, racional
e neutra do processo. O referencial principal do ensino era a fábrica, e sobre ela se construíram as
práticas educativas e as conceptualizações referentes à educação."

03. Resposta: B.
Ao contrário do apresentado na alternativa compete refletir acerca dos objetivos sócio-políticos e
pedagógicos.

3 Principais teorias da aprendizagem. 3.1 Inatismo, comportamentalismo,


behaviorismo, interacionismo, cognitivismo. 3.2 As bases empíricas,
metodológicas e epistemológicas das diversas teorias de aprendizagem.

Teorias da Aprendizagem

A Aprendizagem na Concepção Histórico Cultural26


A aprendizagem é um dos principais objetivos de toda prática pedagógica, e a compreensão ampla do
que se entende por aprender é fundamental na construção de uma proposta de educação, também mais
aberta e dinâmica, definindo, por consequência, práticas pedagógicas transformadoras.
À medida que a sociedade se torna cada vez mais dependente do conhecimento, é necessário
questionar e mudar certos pressupostos que fundamentam a educação atual. A aprendizagem é uma
atividade contínua, iniciando-se nos primeiros minutos da vida e estendendo-se ao longo dela.
Isto significa expandir o conceito de aprendizagem: ele não deve estar restrito ao período escolar e
pode ocorrer, tanto na infância, quanto na vida adulta. A escola é um – entre muitos outros – ambientes
em que será possível adquirir conhecimento. Para tanto, educadores precisam incorporar os mais
recentes resultados das pesquisas sobre aprendizagem e assumir a função de propiciar oportunidades
para o aluno gerar e não somente consumir conhecimento, desenvolvendo capacidades internas para
poder continuar a aprender ao longo da vida.
A construção de uma pessoa mais autônoma, no processo de aprender, torna-a mais autônoma no
processo de viver – de definir os rumos de sua vida. Mas, para que isso não se transforme em uma ação
individualista, é fundamental transformar a prática pedagógica em uma prática mediadora, comprometida,
coerente, ao mesmo tempo consciente e competente.
A ação educativa – evidenciada a partir de suas práticas – permite aos alunos avançar em saltos na
aprendizagem e no desenvolvimento. E a ação sobre o que o adulto consegue fazer, com a ajuda do
outro, para que consiga fazê-lo sozinho. Entretanto, é princípio de toda instituição de ensino
(principalmente da escola) garantir a aprendizagem a todos, visto que todos são capazes de aprender.
Dentro de uma concepção de aprendizagem como construção de conhecimento, estudos na linha
histórico-cultural, como os de Vygotsky e de seus precursores Oliveira, Fontana; Meier e Garcia têm sido
foco de muitos estudos, vários dos quais têm implicações diretas na área da educação, trazendo
contribuições indiscutíveis para o processo ensino-aprendizagem.
Os autores afirmam que o ser humano não é moldado por outros seres humanos, mas modifica-se
com os outros, trocando experiências, interagindo com o meio social em que vive. Todo esse processo
de transformação ocorre vinculado ao processo de mediação social.
As considerações propostas por Vygotsky revelam que a mediação possibilita a constituição de
processos mentais superiores. Uma atividade é mediada quando é socialmente significativa, e a fonte de
mediação pode ser um instrumento que regula a ação do indivíduo sobre objetos externos; um sistema
de símbolos, que medeia processos psicológicos do próprio ser humano; ou a interação com outros seres
humanos.
Vygotsky deu especial atenção ao estudo de signos como mediadores, entendidos como algo que
representa ideias, situações ou objetos; o signo tem função de auxiliar a memória humana, utilizado para
lembrar, registrar ou acumular informações. Durante o desenvolvimento cultural da criança, o signo e o

26
LEITE, C. A. R.; LEITE, E. C. R.; PRANDI, L. R. A aprendizagem na concepção histórico cultural. Akrópolis Umuarama, v. 17, n. 4, p. 203-210, out. / dez. 2009.

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instrumento, ambos caracterizados por sua função mediadora, se inter-relacionam conforme o homem
interage com o mundo.
A teoria sobre a aprendizagem sócio histórica e a produção do conhecimento esteve, desde a origem,
intimamente ligada ao fato de o homem ser social e histórico e, ao mesmo tempo, de ser produto e
produtor de sua história e de sua cultura “pela” e na interação social. Tal abordagem abre a possibilidade
de redimensionamento da teoria e da prática do estudo das relações entre a escolarização, atividade
mental e desenvolvimento da criança, ao assumir a natureza mediada da cognição: a ação do sujeito
sobre o objeto é mediada socialmente, pelo outro e pelos signos. Daí a relevância e a motivação para o
presente estudo.
Desse modo, ancorada numa pesquisa bibliográfica com enfoque na perspectiva histórico-cultural do
desenvolvimento humano, que considera o processo de conceitualização como uma prática social
dialógica “mediada pela palavra”, e pedagógica “mediada pelo outro”, o presente artigo tem como objetivo
estudar aspectos práticos da teoria de histórico-cultural, visando aos desdobramentos que essa teoria
tem no cotidiano do processo ensino-aprendizagem.

Principais teorias de aprendizagem


As principais interpretações das questões relativas à natureza da aprendizagem remetem a um
passado histórico da filosofia e da psicologia. Diversas correntes de pensamento se desenvolveram,
definindo paradigmas educacionais como o empirismo, o inatismo ou nativismo, os associacionistas, os
teóricos de campo e os teóricos do processamento da informação ou psicologia cognitiva.
A corrente do empirismo tem como princípio fundamental considerar que o ser humano, ao nascer, é
como uma "tábula rasa" e tudo deve aprender, desde as capacidades sensoriais mais elementares aos
comportamentos adaptativos, mas complexos Gaonac´h e Golder27. A mente é considerada inerte, e as
ideias vão sendo gravadas a partir das percepções. Baseado neste pressuposto, a inteligência é
concebida como uma faculdade capaz de armazenar e acumular conhecimento.
O inatismo ou nativismo argumenta que a maioria dos traços característicos de um indivíduo é fixado
desde o nascimento e que a hereditariedade permite explicar uma grande parte das diferenças individuais
físicas e psicológicas Gaonac´h e Golder28. As formas de conhecimento estão pré-determinadas no sujeito
que aprende.
Para os associacionistas, o principal pressuposto consiste em explicar que o comportamento
complexo é a combinação de uma série de condutas simples. Como precursores desta corrente são de
pensamento pode-se citar Edward L. Thorndike e B.F. Skinner, Pettenger e Gooding29 e suas respectivas
teorias do comportamento reflexo ou estímulo-resposta.
Para Thorndike apud Pettenger e Gooding, o padrão básico da aprendizagem é uma resposta
mecanicista às forças externas. Um estímulo provoca uma resposta. Se a resposta é recompensada, é
aprendida.
Já para Skinner, a ênfase é dada à questão do controle do comportamento pelos reforços que ocorrem
com a resposta ou após a mesma com o propósito de atingir metas específicas ou definir comportamentos
manifestos.
As grandes escolas da corrente dos Teóricos de Campo, são representadas, na Gestalt pelos alemães
Wertheimer, Koffka e Köhler, e na Fenomenologia, por Combs e Snygg, Pettenger e Gooding30. Nestas
escolas prevalece a concepção de que as pessoas são capazes de pensar, perceber e de responder a
uma dada situação, de acordo com as suas percepções e interpretações desta situação. Diferentemente
das primeiras, em que o comportamento é sequencial, do mais simples ao mais complexo, nesta corrente,
o todo ou total é mais que a soma das partes.
Na Gestalt, o paradigma de aprendizagem é a solução de problemas e ocorre do total para as partes.
Consiste também na organização dos padrões de percepção. Segundo Fialho31, na Gestalt há duas
maneiras de se aprender a resolver problemas: pelo aprendizado conduzido ou pelo aprendizado pelo
entendimento. Isto significa que conforme a organização da situação de aprendizagem, dirigida
(instrucionista) ou autodirigida (ativa), o indivíduo aprende, entretanto, deve-se promover situações de
aprendizagem que sejam suficientemente ricas para que o aprendiz possa fazer escolhas e estabelecer
relações entre os elementos de uma situação. Escolher entre as quais para ele, aprendiz, conduza a uma
estruturação eficaz de suas percepções e significados.

27
GAONAC’H, Daniel; GOLDER, Caroline. Profession Enseignant: Manual de Psycolgie.pour Fenseignement. Paris: Hachette Education, 1995.
28
GAONAC’H, Daniel; GOLDER, Caroline. Profession Enseignant: Manual de Psycolgie.pour Fenseignement. Paris: Hachette Education, 1995.
29
PETTENGER, Owene, GOODING, C. Thomas. Teorias da aprendizagem na prática Educacional. São Paulo: EPU, 1977.
30
PETTENGER, Owene, GOODING, C. Thomas. Teorias da aprendizagem na prática Educacional. São Paulo: EPU, 1977.
31
FIALHO, Francisco Antonio Pereira. Sistemas de Educação à Distância. UFSC. Programa de Pós-Graduação em Engenharia de Produção. Florianópolis,
1998. Notas de aula.

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Os teóricos do Processamento da Informação ou Psicologia Cognitiva, de origem mais recente,
reúnem diversas abordagens. Estes teóricos estudam a mente e a inteligência em termos de
representações mentais e processos subjacentes ao comportamento observável. Consideram o
conhecimento como sistema de tratamento da informação. Segundo Misukami32, uma abordagem
cognitivista implica em estudar cientificamente a aprendizagem como um produto resultante do ambiente,
das pessoas ou de fatores externos a ela. Como as pessoas lidam com estímulos ambientais, organizam
dados, sentem e resolvem problemas, adquirem conceitos e empregam símbolos constituem, pois, o
centro da investigação. Em essência, na psicologia cognitiva, as atividades mentais são o motor dos
comportamentos.
Opondo-se à concepção behavorista, os teóricos cognitivos preocupam-se em desvendar a "caixa
preta" da mente humana. A noção de representação é central nestas pesquisas. A representação é
definida como toda e qualquer construção mental efetuada a um dado momento e em um certo contexto.
Portanto, memória, percepção, aprendizagem, resolução de problemas, raciocínio e compreensão,
esquemas e arquiteturas mentais são alguns dos principais objetos de investigação da área, cujas
aplicações vêm sendo utilizadas na construção de modelos explícitos em formas de programas de
computador (softwares), gráficos, arquiteturas ou outras esquematizações do processamento mental, em
especial nos sistemas de Inteligência Artificial.
Os princípios construtivistas fornecem um conjunto de diretrizes a fim de auxiliar projetistas e
professores na criação de meios ambientes colaboracionistas direcionados ao ensino, que apoiem
experiências autênticas, atraentes e reflexivas. Os estudantes podem trabalhar juntos na construção do
entendimento e do significado através de práticas relevantes.
O construtivismo é uma filosofia de aprendizagem que descreve o que significa saber alguma coisa, o
que é a realidade. As concepções tradicionais de aprendizagem admitem que o conhecimento é um
objeto, algo que pode ser transmitido do professor para o aluno.
O construtivismo propõe que o aluno participe ativamente do próprio aprendizado, mediante a
experimentação, a pesquisa em grupo, o estimulo a dúvida e o desenvolvimento do raciocínio, entre
outros procedimentos. A partir de sua ação, vai estabelecendo as propriedades dos objetos e construindo
as características do mundo.

A abordagem construtivista de Jean Piaget


As respostas às questões sobre a natureza da aprendizagem de Piaget são dadas à luz de sua
epistemologia genética, na qual o conhecimento se constrói pouco a pouco, à medida em que as
estruturas mentais e cognitivas se organizam, de acordo com os estágios de desenvolvimento da
inteligência.
A inteligência é antes de tudo adaptação. Esta característica se refere ao equilíbrio entre o organismo
e o meio ambiente, que resulta de uma interação entre assimilação e acomodação.
A assimilação e a acomodação são, pois, os motores da aprendizagem. A adaptação intelectual
ocorre quando há o equilíbrio de ambas.
Segundo discorre Ulbritch33, a aquisição do conhecimento cognitivo ocorre sempre que um novo dado
é assimilado à estrutura mental existente que, ao fazer esta acomodação modifica-se, permitindo um
processo contínuo de renovação interna. Na organização cognitiva, são assimiladas o que as
assimilações passadas preparam, para assimilar, sem que haja ruptura entre o novo e o velho.
Pela assimilação, justificam-se as mudanças quantitativas do indivíduo, seu crescimento intelectual
mediante a incorporação de elementos do meio a si próprio.
Pela acomodação, as mudanças qualitativas de desenvolvimento modificam os esquemas existentes
em função das características da nova situação; juntas justificam a adaptação intelectual e o
desenvolvimento das estruturas cognitivas.
No sistema cognitivo do sujeito esses processos estão normalmente em equilíbrio. A perturbação
desse equilíbrio gera um conflito ou uma lacuna diante do objeto ou evento, o que dispara mecanismos
de equilibração. A partir de tais perturbações produzem-se construções compensatórias que buscam novo
equilíbrio, melhor do que o anterior.
Assim, pode-se distinguir quatro estágios de desenvolvimento lógico:

Sensório Motor (0-2 anos)


Tratando-se da fase inicial do desenvolvimento da vida, este nível é caracterizado como pré-verbal
constituída pela organização reflexiva e pela a inteligência prática. Neste estágio a criança baseia-se em

32
MISUKAMI, Maria da Graça Nicoletti. Ensino: as Abordagens do Processo. Temas Básicos de Educação e Ensino. São Paulo: EPU, 1986.
33
ULBRICHT, Vânia Ribas. Modelagem de um Ambiente Hipermfdia de Construção do Conhecimento em Geometria Descritiva^ Florianópolis, 1997. Tese
(Doutorado em Engenharia de Produção). Coordenadoria de Pós-graduação, UFSC. p.20-25.

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esquemas motores para resolver seus problemas, que são essencialmente práticos. Além disso, o
indivíduo vive o momento presente sendo incapaz de referir-se ao futuro, ou evocar o passado.
Durante esta fase os bebês começam a desenvolver símbolos mentais e utilizar palavras, um processo
conhecido como simbolização. O bebê relaciona tudo ao seu próprio corpo como se fosse o centro do
mundo

Pré-operatório (2-7 anos)


Este período é o que mais teve atenção de Piaget. É caracterizado pela explosão linguística e a
utilização de símbolos. Dada a esta capacidade da linguagem, os esquemas de ação são interiorizados
(esquemas representativos ou simbólicos). Nota-se ainda a ausência de esquemas conceituais, assim
como o predomínio da tendência lúdica. Prevalece nesta fase a transdução, modelo primitivo de
raciocínio, que se orienta de particular para particular.
A partir dos quatro anos o tipo dominante de raciocínio é o denominado intuição, fundamentado na
percepção e que desconhece a reversibilidade e a conservação.
A criança ainda é incapaz de lidar como dilemas morais, embora possua senso do que é bom ou mal.
O indivíduo apresenta um comportamento egocêntrico, tendo um papel limitado e a impossibilidade
assumir o papel de outras pessoas, é rígido (não flexível) que tem como ponto de referência a própria
criança. Ainda é latente a incapacidade de analisar vários aspectos de uma dada situação.
Uma consequência deste egocentrismo é a incapacidade da criança de colocar seu próprio ponto de
vista como igual aos demais. Desconhecendo a opinião alheia, o indivíduo não sente necessidade de
justificar seus raciocínios perante outros.

Operatório concreto (7-11 anos)


Recebe este nome, já que a criança age sobre o mundo concreto, real e visível. Surge o declínio do
egocentrismo, sendo substituído pelo pensamento operatório (envolvendo vasta gama de informações
externas à criança). O indivíduo pode, desde já, ver as coisas a partir da perspectiva dos outros.
Surge os processos de pensamento lógico, limitados, sendo capazes de serializar, ordenar e
agrupar coisas em classes, com base em características comuns. Assim como a capacidade de
conservação e reversibilidade através da observação real (o pensamento da criança ainda é de natureza
concreta).
O pensamento operatório é denominado concreto, pois a criança somente pensa corretamente se os
exemplos ou materiais que ela utiliza para apoiar o pensamento existem mesmo e podem ser observados.
Ela ainda não consegue pensar abstratamente, tendo como base proposições e enunciados. Com o
desenvolvimento destas habilidades notamos aparecimento de esquemas conceituais.
As crianças começam a desenvolver um senso moral, juntamente com um código de valores.

Operatório formal (12 anos em diante)


Característica essencial a distinção entre o real e o possível.
A criança se torna capaz de raciocinar logicamente, mesmo se o conteúdo do seu raciocínio é falso.
Logo, surge a determinação da realidade tendo como base o caráter hipotético-dedutivo, representando
a última aquisição mental quando o adolescente se liberta do concreto. Assim o jovem obtém a
capacidade de pensar abstratamente e compreender o conceito de probabilidade.
Aparecimento da reversibilidade e sua explicação mediante inversão ou negação e comparada à
reciprocidade de relações.

A abordagem sócio construtiva do desenvolvimento cognitivo de Lev Vygotsky


As inquietações de Vygotsky sobre o desenvolvimento da aprendizagem e a construção do
conhecimento perpassavam pela produção da cultura, como resultado das relações humanas. Por conta
disso, ele procurou entender o desenvolvimento intelectual a partir das relações histórico-sociais, ou seja,
buscou demonstrar que o conhecimento é socialmente construído pelas e nas relações humanas.
Baseado nas teses do materialismo histórico, Vygotsky destacou que as origens das formas superiores
de comportamento consciente deveriam ser buscadas nas relações sociais que o sujeito mantém com o
mundo exterior, na atividade prática. Para descobrir as fontes dos comportamentos especificamente
humanos, era preciso libertar-se dos limites do organismo e empreender estudos que pudessem explicar
como os processos maturacionais entrelaçam-se aos processos culturalmente determinados para
produzir as funções psicológicas superiores típicas do homem.
Dessa feita, a convivência social é fundamental para transformar o homem de ser biológico a ser
humano social, e a aprendizagem que advém das relações sociais ajuda a construir os conhecimentos
que dão suporte ao desenvolvimento.

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Para Vygotsky, o homem possui natureza social, uma vez que nasce em um ambiente carregado de
valores culturais: na ausência do outro, o homem não se faz homem. Partindo desse pressuposto, o autor
criou uma teoria de desenvolvimento da inteligência, na qual afirma que o conhecimento é sempre
intermediado.
Nessa perspectiva, a criança nasce apenas com funções psicológicas elementares e, a partir do
aprendizado da cultura, essas funções se transformam em funções psicológicas superiores. Entretanto,
essa evolução não se dá de forma imediata e direta, as informações recebidas do meio social são
intermediadas, de forma explícita ou não, pelas pessoas que interagem com as crianças. É essa
intermediação que dá às informações um caráter valorativo e significados sociais e históricos.
As concepções de Vygotsky sobre o funcionamento do cérebro humano fundamentam-se em sua ideia
de que as funções psicológicas superiores são construídas ao longo da história social do homem. Na sua
relação com o mundo, mediada pelos instrumentos e símbolos desenvolvidos culturalmente, o ser
humano cria as formas de ação que o distinguem de outros animais.
Vale dizer que essas informações não são interiorizadas com o mesmo teor com que são recebidas,
ou seja, elas sofrem uma reelaboração interna, uma linguagem específica em cada pessoa. Em outras
palavras, cada processo de construção de conhecimentos e desenvolvimento mental possui
características individuais e particulares.
Nesse sentido, significados socioculturais, historicamente produzidos, são internalizados pelo homem
de forma individual e, por isso, ganham um sentido pessoal; “a palavra, a língua, a cultura relaciona-se
com a realidade, com a própria vida e com os motivos de cada indivíduo”. No processo de internalização,
o que é interpessoal, inicialmente, transforma-se em intrapessoal.
O nível de desenvolvimento real pode ser entendido como referente àquelas conquistas que já estão
consolidadas na criança, àquelas funções ou capacidades que ela já aprendeu e domina, pois já consegue
utilizar sozinha, sem assistência de alguém mais experiente da cultura (pai, mãe, professor, criança mais
velha etc.). Este nível indica, assim, os processos mentais da criança que já se estabeleceram; ciclos de
desenvolvimento que já se completaram.
No entendimento de Vygotsky, a zona de desenvolvimento potencial ou mediador é toda atividade
e/ou conhecimento que a criança ainda não domina, mas que se espera que ela seja capaz de saber e/ou
realizar, independentemente de sua etnia, religião ou cultura. É justamente por isso que as relações entre
desenvolvimento e aprendizagem ocupam lugar de destaque em sua obra.
A zona de desenvolvimento proximal é a distância entre o que a criança já pode realizar sozinha e
aquilo que ela somente é capaz de desenvolver com o auxílio de alguém. Na zona de desenvolvimento
proximal, o aspecto fundamental é a realização de atividade com o auxílio de um mediador. Por isso,
segundo Vygotsky, essa é a zona cooperativa do conhecimento. O mediador ajuda a criança a concretizar
o desenvolvimento que está próximo, ou seja, ajuda a transformar o desenvolvimento potencial em
desenvolvimento real.
Fialho34 destaca que, para Vygotsky, o desenvolvimento humano compreende um processo dialético,
caracterizado pela periodicidade, irregularidade no desenvolvimento das diferentes funções, metamorfose
ou transformação qualitativa de uma forma em outra, entrelaçando fatores internos e externos e
processos adaptativos.

A abordagem de Henri Wallon


A gênese da inteligência para Wallon é genética e organicamente social, ou seja, "o ser humano é
organicamente social e sua estrutura orgânica supõe a intervenção da cultura para se atualizar" Dantas35.
Nesse sentido, a teoria do desenvolvimento cognitivo de Wallon é centrada na psicogênese da pessoa
completa.
O estudo de Wallon é evidenciado na criança contextualizada, onde o ritmo no qual se sucedem as
etapas do desenvolvimento é descontínuo, marcado por rupturas, retrocessos e reviravoltas, provocando
em cada etapa profundas mudanças nas anteriores.
Nesse sentido, a passagem dos estágios de desenvolvimento não se dá linearmente, por ampliação,
mas por reformulação, instalando-se no momento da passagem de uma etapa a outra, crises que afetam
a conduta da criança. Conflitos se instalam nesse processo e são de origem exógena quando resultantes
dos desencontros entre as ações da criança e o ambiente exterior, estruturado pelos adultos e pela cultura
e endógenos e quando gerados pelos efeitos da maturação nervosa, Galvão36. Esses conflitos são
propulsores do desenvolvimento.
34
FIALHO, Francisco Antonio Pereira. Sistemas de Educação à Distância. UFSC. Programa de Pós-Graduação em Engenharia de Produção. Florianópolis,
1998. Notas de aula.
35
DANTAS, Heloysa. Do ato motor ao ato mental: a gênese da inteligência segundo Wallon. In: TAILLE,Yves de la e et all. Piaget, Vigotsky, Waalon. Teorias
Psicogenéticas em Discussão. São Paulo: Summus, 1992.
36
GALVÃO, Izabel. Henri Wallon. Uma concepção dialética do desenvolvimento infantil. Petrópolis: Vozes,1995.

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Estágio impulsivo-emocional (1°ano de vida): nesta fase predominam nas crianças as relações
emocionais com o ambiente. Trata-se de uma fase de construção do sujeito, em que a atividade cognitiva
se acha indiferenciada da atividade afetiva. Nesta fase vão sendo desenvolvidas as condições sensório-
motoras (olhar, pegar, andar) que permitirão, ao longo do segundo ano de vida, intensificar a exploração
sistemática do ambiente.

Estágio sensório-motor (um a três anos, aproximadamente): ocorre neste período uma intensa
exploração do mundo físico, em que predominam as relações cognitivas com o meio. A criança
desenvolve a inteligência prática e a capacidade de simbolizar. No final do segundo ano, a fala e a conduta
representativa (função simbólica) confirmam uma nova relação com o real, que emancipará a inteligência
do quadro perceptivo mais imediato. Ou seja, ao falarmos a palavra "bola", a criança reconhecerá
imediatamente do que se trata, sem que precisemos mostrar o objeto a ela. Dizemos então que ela já
adquiriu a capacidade de simbolizar, sem a necessidade de visualizar o objeto ou a situação a qual
estamos nos referindo.
Personalismo (três aos seis anos, aproximadamente): nesta fase ocorre a construção da consciência
de si, através das interações sociais, dirigindo o interesse da criança para as pessoas, predominando
assim as relações afetivas. Há uma mistura afetiva e pessoal, que refaz, no plano do pensamento, a
indiferenciação inicial entre inteligência e afetividade.

Estágio categorial (seis anos): a criança dirige seu interesse para o conhecimento e a conquista do
mundo exterior, em função do progresso intelectual que conseguiu conquistar até então. Desta forma, ela
imprime às suas relações com o meio uma maior visibilidade do aspecto cognitivo.
Para Wallon, o mérito da Educação é desenvolver o máximo as potencialidades de cada indivíduo. É
nesse mesmo indivíduo que devem ser buscadas as possibilidades de superação, compensação e
equilíbrio funcionais.

Questões

01. (Prefeitura de São Luís/MA - Cargos de Magistério I e II - CESPE/2017) Na perspectiva de Jean


Piaget, em uma situação que envolva o cometimento de erro pelo aluno no processo de aprendizagem,
o professor deve:
(A) Corrigir o aluno, dando-lhe, imediatamente, a resposta correta.
(B) Punir o aluno, pois essa é a melhor forma de eliminar o erro.
(C) Levar o aluno a refletir sobre por que errou, dando-lhe a oportunidade de reconstruir a compreensão
do conhecimento.
(D) Ignorar o erro, pois, ao longo do tempo, o aluno descobrirá, sozinho, a compreensão correta do
conteúdo.
(E) Fazer o aluno repetir a resposta certa quantas vezes forem necessárias para que ele consiga
decorá-la.

02. (Prefeitura de São Luís/MA - Cargos de Magistério I e II - CESPE/2017) Assinale a opção que
apresenta o processo de resolução dos conflitos cognitivos que, para Jean Piaget, representa a
construção da aprendizagem.
(A) Reforço positivo.
(B) Zona de desenvolvimento proximal.
(C) Estágios do desenvolvimento sensório-motor, pré-operatório, operatório concreto e formal.
(D) Aprendizagem condicionada.
(E) Assimilação, acomodação e equilibração.

03. (SEDF - Monitor de Gestão Educacional - CESPE/2017) Teóricos como Piaget e Vygotsky
evidenciaram que a criança se desenvolve na interação com o meio histórico-cultural em que vive.
Considerando essa informação e tendo em vista que a criança precisa do outro, da natureza e da inter-
relação possível entre esses elementos, julgue o próximo item.
Brincar é imprescindível na infância, pois é nessa ação que a criança elabora sua forma de estar no
mundo, vivencia o lúdico e desenvolve sua potência de criação. Essa experiência proporciona
aprendizagem e desenvolvimento.
( ) Certo ( ) Errado

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04. (Prefeitura de Lauro Muller/SC - Professor de Pedagogia - Instituto Excelência/2017) Sobre
os pensadores da educação, assinale a alternativa CORRETA sobre a teoria de Vygotsky:
(A) Sua teoria mostra que o indivíduo só recebe um determinado conhecimento se estiver preparado
para recebê-lo. Não existe um novo conhecimento sem que o organismo tenha já um conhecimento
anterior para poder assimilá-lo e transformá-lo. O que implica os dois polos da atividade inteligente:
assimilação e acomodação. É assimilação à medida que incorpora a seus quadros todo o dado da
experiência; é acomodação à medida que a estrutura se modifica em função do meio, de suas variações.
(B) Construiu sua teoria tendo por base o desenvolvimento do indivíduo como resultado de um
processo sócio histórico, enfatizando o papel da linguagem e da aprendizagem nesse desenvolvimento,
sendo essa teoria considerada histórico-social. Sua questão central é a aquisição de conhecimentos pela
interação do sujeito com o meio.
(C) O comportamento é construído numa interação entre o meio e o indivíduo. Esta teoria
epistemológica é caracterizada como interacionista.
(D) Nenhuma das alternativas.

05. (DPU - Técnico em Assuntos Educacionais - CESPE/2016) Acerca das teorias psicológicas que
fundamentam a aprendizagem humana, julgue o item a seguir.
Jean Piaget, que estudou o desenvolvimento da mente relacionando-o à adaptação biológica, dividiu
em fases ou estágios o desenvolvimento cognitivo da criança e denominou como estágio pré-conceitual
o momento em que a criança reconhece um objeto sem, contudo, o diferenciar dos demais da mesma
categoria.
( ) Certo ( ) Errado

06. (DPU - Técnico em Assuntos Educacionais - CESPE/2016) Acerca das teorias psicológicas que
fundamentam a aprendizagem humana, julgue o item a seguir.
Gestalt e behaviorismo, duas das teorias psicológicas que estudam os processos de aprendizagem
humana, se diferenciam fundamentalmente pela convicção da primeira de que a aprendizagem se dá por
tentativa e erro.
( ) Certo ( ) Errado

07. (IF/SP - Professor - Educação Física) Leia as afirmativas a seguir, extraídas do livro “Piaget,
Vygostky e Wallon: teorias psicogenéticas em discussão" (LA TAILLE, Y.; DANTAS, H.; OLIVEIRA, M.
K.,1992).
I “A linguagem humana, sistema simbólico fundamental na mediação entre sujeito e objeto de
conhecimento, tem duas funções básicas: a de intercâmbio social e a de pensamento generalizante."
II “Vê-se portanto que não se trata de traçar uma fronteira entre o social e o não social, mas sim de, a
partir de uma característica importante das relações possíveis entre pessoas de nível operatório - que
representa o grau mínimo de socialização do pensamento -, comparar graus anteriores de socialização."
III “No antagonismo entre motor e mental, ao longo do processo de fortalecimento deste último, por
ocasião da aquisição crescente do domínio dos signos culturais, a motricidade em sua dimensão cinética
tende a se reduzir, a se virtualizar em ato mental."

Assinale a alternativa que apresenta, na ordem correta, os teóricos a que cada uma das afirmativas
faz referência.
(A) I - Vygotsky; II- Piaget; III- Wallon.
(B) I - Piaget; II- Wallon; III- Vygotsky.
(C) I - Wallon; II- Vygotsky; III- Piaget.
(D) I- Vygotsky; II- Wallon; III- Piaget.
(E) I - Piaget; II - Vygotsky; III- Wallon.

08. (Prefeitura de Martinópolis/SP - Professor PEB I – Ensino Infantil - Big Advice/2017) A


concepção de construção de conhecimentos pelas crianças em situações de interação social foi
pesquisada, com diferentes enfoques e abordagens, por vários autores, dentre eles: Jean Piaget, Lev
Semionovitch Vygotsky e Henry Wallon. Nas últimas décadas, esses conhecimentos que apresentam
tanto convergências como divergências, têm influenciado marcadamente o campo da educação. Sob o
nome de ____ reúnem-se as ideias que preconizam tanto a ação do sujeito, como o papel significativo da
interação social no processo de aprendizagem e desenvolvimento da criança.

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Assinale a alternativa que preenche corretamente a lacuna:
(A) Construtivista.
(B) Cognitivista.
(C) Comportamental.
(D) Humanista.
(E) Tecnicista.

Respostas

01. C. / 02. E. / 03. Certo. / 04. B. / 05. Errado. / 06. Errado. / 07. A / 08. A.

01. C.
O pensamento é a base da aprendizagem, que se acontece através da interação entre sujeito e objeto
modificando estruturas mentais já existentes. O professor deve criar situações desafiadoras que
estimulem o aluno a “aprender a aprender”.

02. E.
A assimilação é o processo cognitivo pelo qual uma pessoa integra um novo dado perceptual, motor
ou conceitual às estruturas cognitivas prévias, ou seja, quando a criança tem novas experiências tenta
adaptar esses novos estímulos às estruturas cognitivas que já possui. A acomodação acontece quando
a criança não consegue assimilar um novo estímulo, ou seja, não existe uma estrutura cognitiva que
assimile a nova informação em função das particularidades desse novo estímulo. Diante deste impasse,
restam apenas duas saídas: criar um novo esquema ou modificar um esquema existente. Ambas as ações
resultam em uma mudança na estrutura cognitiva. Ocorrida a acomodação, a criança pode tentar
assimilar o estímulo novamente, e uma vez modificada a estrutura cognitiva, o estímulo é prontamente
assimilado. A equilibração, de uma maneira geral, trata de um ponto de equilíbrio entre a assimilação e a
acomodação, e assim, é considerada como um mecanismo autorregulado, necessária para assegurar à
criança uma interação eficiente dela com o meio-ambiente.

03. Certo.
É através da experiência das brincadeiras que a criança se desenvolve e aprende, vivencia o lúdico e
favorece sua potencialidade.

04. B.
O desenvolvimento da aprendizagem e a construção do conhecimento perpassavam pela produção
da cultura, como resultado das relações humanas. Por conta disso, Vygotsky procurou entender o
desenvolvimento intelectual a partir das relações histórico-sociais, ou seja, buscou demonstrar que o
conhecimento é socialmente construído pelas e nas relações humanas.

05. Errado.
Pré-operatório (2-7 anos). Este período é o que mais teve atenção de Piaget. É caracterizado pela
explosão linguística e a utilização de símbolos. Dada a esta capacidade da linguagem, os esquemas de
ação são interiorizados (esquemas representativos ou simbólicos). Nota-se ainda a ausência de
esquemas conceituais, assim como o predomínio da tendência lúdica. Prevalece nesta fase a transdução,
modelo primitivo de raciocínio, que se orienta de particular para particular.

06. Errado.
Relação behaviorismo X Gestalt. Enquanto o behaviorismo tem como objeto de estudo a relação
individual (estimulo-resposta), a Gestalt é contra essa abordagem, visto que considera que o
comportamento quando estudado de forma isolada pode ter seu significado ou entendimento real
alterado. O comportamento deveria e deve ser estudado de forma onde todos os aspectos são analisados
de forma geral, considerando todas as condições que possam alterar o estimulo.

07. A
Palavras chave:
Vygotsky: Linguagem
Piaget: Nível operatório
Walon: Motricidade

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08. A.
O construtivismo propõe que o aluno participe ativamente do próprio aprendizado, mediante a
experimentação, a pesquisa em grupo, o estimulo a dúvida e o desenvolvimento do raciocínio, entre
outros procedimentos. A partir de sua ação, vai estabelecendo as propriedades dos objetos e construindo
as características do mundo.

3.3 Contribuições de Piaget, Vygotsky e Wallon para a psicologia e pedagogia.

37
ABORDAGENS VYGOTSKIANA, WALLONIANA E PIAGETIANA

A perspectiva vygotskiana
Na abordagem da Psicologia Sócio Histórica, algumas categorias são centrais. Para efeitos da análise
do episódio selecionado, duas delas se destacam e, por essa razão, serão brevemente apresentadas. A
primeira delas é a de mediação, entendida como "uma instância que relaciona objetos, processos ou
situações entre si ou, ainda, como um conceito que designa um elemento que viabiliza a realização de
outro e que, embora distinto dele, garante a sua efetivação, dando-lhe concretude". Adotar a categoria
teóricometodológica da mediação implica não aceitar dicotomias e, sobretudo, tentar se aproximar das
determinações que, dialeticamente, constituem o sujeito. É por meio da mediação que se explica e se
compreende como o homem, membro da espécie humana, só se torna humano nas relações sociais que
mantém com seus semelhantes e com sua cultura. Nesse sentido, a escola, por meio de seus professores,
exerce uma mediação central na constituição dos sujeitos-alunos, uma vez que é com seu auxílio que
eles conquistam novos saberes, apropriam-se de sua "humanidade" e constroem, paulatinamente, formas
próprias de pensar, sentir e agir.
Uma segunda categoria importante a ser aqui discutida é a relação desenvolvimento-aprendizagem.
Tendo Piaget como interlocutor, Vygotski postula que o ensino, quando adequadamente organizado, leva
à aprendizagem, e essa última, por sua vez, impulsiona ciclos de desenvolvimento que até então estavam
em estado embrionário: novas funções psicológicas superiores passam assim a existir. Esse novo
desenvolvimento, mais adiantado, abre novas possibilidades de aprendizagem que, se vierem a ocorrer,
impulsionarão mais uma vez o desenvolvimento, permitindo novas aprendizagens e, assim,
sucessivamente. Nesse sentido, aprendizagem e desenvolvimento constituem uma unidade, visto um ser
constitutivo do outro, ou seja, um não é sem o outro. Nas palavras do autor:
[...] a característica essencial da aprendizagem é que engendra a área de desenvolvimento proximal,
ou seja, que faz nascer estimula e ativa na criança um grupo de processos internos de desenvolvimento
no âmbito das inter-relações com outros, que, na continuação, são absorvidos pelo curso interior de
desenvolvimento e se convertem em aquisições internas da criança.

A partir dessa visão, Vygotski defende a presença de dois níveis de desenvolvimento: o primeiro,
denominado "nível de desenvolvimento real" (NDR), refere-se a tudo aquilo que o sujeito é capaz de
realizar por si só, sozinho, sem contar com a ajuda de ninguém. Já o segundo, ou nível de
desenvolvimento proximal (NDP), explicita que há situações em que o sujeito só consegue
fazer/pensar/sentir algo se contar com o auxílio de alguém mais experiente. Entre o que o sujeito
consegue fazer por si mesmo e o que só o faz mediante a ajuda do Outro está a Zona de Desenvolvimento
Proximal (ZDP), um conceito metafórico, que indica uma compreensão particular de ensino: ao se
fornecer assistência na ZDP, leva-se o aluno a realizar sozinho aquilo que antes só o fazia com o amparo
de alguém. Vygotski expõe assim seu pensamento:

[...] a aprendizagem não é, em si mesma, desenvolvimento; mas uma correta organização da


aprendizagem da criança conduz ao desenvolvimento mental, ativa todo um grupo de processos de
desenvolvimento, e esta ativação não poderia produzir-se sem a aprendizagem.

37
DAVIS, Claudia Leme Ferreira; ALMEIDA, Laurinda Ramalho de; RIBEIRO, Marilda Pierro de Oliveira; RACHMAN, Vivian Carla Bohm. Abordagens
vygotskiana, walloniana e piagetiana: diferentes olhares para a sala de aula. Psicologia da Educação, São Paulo, 34, 1º sem. de 2012, pp. 63-83. Adaptado.
https://revistas.pucsp.br/index.php/psicoeduca/article/view/28043/19749. Acesso em abril de 2017.

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Análise do episódio a partir da perspectiva vygotskiana
Tentando empregar as categorias acima, na tentativa de construir uma pedagogia com base sócio
histórica, é possível dizer que uma forma de promover a aprendizagem é envolver os alunos em uma
atividade colaborativa. Trata-se, pois, de agrupar crianças com distintos níveis de experiência, habilidades
e conhecimentos, para trabalharem juntas, buscando alcançar um mesmo objetivo, discutindo quais são
as melhores formas de se chegar a ele e assumindo o risco de colocar suas hipóteses à prova. É
interessante notar que escolas organizadas em moldes tradicionais oferecem poucas ocasiões de se viver
experiências desse tipo, nas quais os alunos podem, com o professor e com os colegas, elaborar
compreensões comuns mais sofisticadas. Em escolas como a observada, os professores tendem a
dominar a sala de aula, reduzindo drasticamente a participação dos alunos em sala. É o caso desse
episódio.
Outro aspecto interessante de uma pedagogia com base sócio histórica é ancorar o ensino nas
experiências e habilidades prévias dos alunos, partindo do NDR e encaminhando-se para o NDP,
cabendo ao docente auxiliar os educandos durante esse percurso, atuando na ZDP. Nessa ótica, cabe
salientar que um bom ensino é aquele em que o professor identifica o que os alunos já dominam - suas
experiências, habilidades e pontos de vista - articulando-o com os conhecimentos, habilidades ou ponto
de vista científico. Na escola tradicional, em contrapartida, os professores muitas vezes se dedicam a
ensinar regras, conceitos abstratos e descrições conceituais, quando na verdade, seria mais proveitoso
auxiliar as crianças oferecendo-lhes experiências nas quais pudessem compreender como esses foram
elaborados e como podem ser empregadas no cotidiano. Isso requer contextualização.
Três níveis de contextualização podem ser utilizados pelos professores. O primeiro requer que se
ativem os conhecimentos/experiências/habilidades prévias dos alunos, algo bastante individualizado e
pessoal. O segundo nível envolve conectar aquilo que é conhecido de cada criança às experiências
concretas do conjunto das crianças, ampliando os contextos em que o conhecido pode ser
situado/empregado/reconhecido. O terceiro nível indica ser preciso conectar o conhecido ao que 'precisa-
ser-aprendido', envolvendo os estudantes na busca de conexões vitais entre eles. O conhecido - agora
amplamente contextualizado e pleno de concretude - articula-se com o novo, mediante a ajuda do
professor, através de um processo ativo de análise e interpretação, totalmente diverso da simples
associação. Atuando em conformidade com esse aspecto, o professor evita que os alunos aprendam
apenas abstrações dissociadas do real e sem vínculos com suas experiências.
Nesse sentido, Donovan, Bransford e Pellegrino elucidam que, quando a compreensão inicial dos
alunos sobre determinado assunto (conceitos cotidianos) não é articulada às informações que lhes são
apresentadas (conceitos científicos), eles podem não compreender o que lhes foi ensinado ou dominam
relativamente o assunto apenas para efeitos de testes e avaliações. De fato, quando isso acontece, eles
tornam a pautar seu pensamento em hipóteses e conceitos cotidianos, tão logo deixem a sala de aula.
Não aprenderam o que era esperado.
Adicionalmente, como a aula é planejada levando em conta diferentes NDR, o planejamento do ensino
requer atividades diversificadas, a serem realizadas concomitantemente, pelos diferentes grupos de
alunos. Com isso, soluciona-se um fenômeno muito frequente nas salas de aula organizada nos moldes
tradicionais: planejar uma única aula e/ou atividade para alunos com diferentes conhecimentos e
experiências, algo que, se benéfico para alguns alunos, exclui do ensino tanto os menos e os mais
experientes. Ao planejar uma aula sem considerar os conhecimentos prévios dos educandos, tampouco
suas particularidades, a prática pedagógica homogeneíza-se, tratando como iguais crianças que na
verdade são diferentes. O resultado é que uns não acompanham a aula e outros nela se aborrecem. Essa
parece ser a situação de Pedro, o menino que aparece, no episódio, com o braço levantado.
Outro aspecto a ser salientado diz respeito à importância de desenvolver o domínio da linguagem ao
longo das aulas, algo que a professora observada parece desconhecer. Para ela, a participação dos
alunos no momento em que está expondo um dado conteúdo desconcentra e atrapalha: não traz nenhum
benefício à classe. De fato, a literatura aponta que os docentes seguem fielmente a tradição pedagógica,
na qual a aula é entendida como mera repetição de algo já elaborado - e tido como pronto ou definitivo -
e não de algo a ser construído coletivamente.
Assim, a professora explica e pede aos alunos que façam sozinhos, sem interação com os colegas,
um exercício de consolidação. As crianças tentam, sem saber ao certo o que aprenderam e, menos ainda,
como empregar esse suposto conhecimento na tarefa. O mundo real, aparentemente excluído da sala de
aula, precisa ser recuperado e uma excelente forma de fazer isso é escutar o que as crianças têm a dizer,
pois, sem isso, não há como aquilatar o que conhecem e o que ignoram; não se contextualiza aos novos
conceitos; não se criam condições para confrontar pontos de vistas, discutir ideias, organizar e expressar
o próprio pensamento.

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De fato, ao oferecer oportunidades para o desenvolvimento da linguagem, o docente contribui,
concomitantemente, para a organização do pensamento do aluno. O diálogo ocupa posição tão central
na visão de Vygotski, que esse autor chega a definir o ato de pensar como diálogo (interno) com si mesmo
(ou seja, com as ideias de vários Outros que já foram apropriadas ou aprendidas). Cabe, pois, criar um
clima de entusiasmo diante do aprender, encorajando os alunos a se envolverem coletivamente na tarefa,
aprendendo uns com os outros e todos com a professora, a resolver problemas reais, progressivamente
mais complexos e abstratos. A conversa auxilia o pensamento, torna-o cada vez mais flexível (pois se é
forçado a perceber que há muitos e diversificados pontos de vista acerca de um único evento), ensina
que é preciso ouvir quando se quer ser ouvido, que é preciso argumentar e defender boas ideias. Em
uma conversa rica em torno de um conteúdo interessante, há uma intensa negociação de sentidos e
significados, algo que estimula, ao mesmo tempo, o desenvolvimento afetivo, cognitivo e social. Não se
trata de tumultuar a sala de aula e, sim, de desenvolver habilidades comunicativas, algo que envolve
pensamento e análise, nunca repetição. Com isso, inegavelmente se sai do NDR e se alcança o NDP.
Em síntese, o episódio analisado mostra que a professora não aproveita as oportunidades de promover
o desenvolvimento linguístico de seus alunos, ficando presa a um procedimento rígido de dar aula, no
qual só o docente fala e os alunos escutam. Se ocasiões para discutir as relações estabelecidas pelas
crianças entre o velho e o novo forem escassas, os alunos não terão como se expressar e a professora
não poderá, consequentemente, intervir em seus modos de pensar, sentir e agir, elucidando dúvidas,
aprofundando ideias e tornando-as cada vez mais complexas. Pode-se concluir, então, que uma
pedagogia inspirada na abordagem sócio histórica envolve:

a) atividades diversificadas, para contemplar os diferentes níveis de experiências e conhecimentos dos


alunos;
b) interação entre pares, para favorecer a troca e, portanto, a inclusão de todos nas atividades
pedagógicas, além da colaboração e da negociação dos sentidos dos conceitos em jogo, uma vez que
as crianças aprendem umas com as outras, sempre mediante a orientação do professor;
c) oportunidades para o corpo discente trabalhar coletivamente, enquanto o professor exerce uma rica
mediação, levando o grupo-classe a explicitar o que faz, como faz e por que o faz;
d) diálogo constante (entre alunos e dos alunos com o professor), pois, quando isso se passa, laços
mais sólidos de amizade e níveis mais elevados de afinidade se desenvolvem entre os alunos, permitindo
que mais crianças discutam e negociem seu entendimento sobre os conteúdos trabalhados;
e) mediação rica, variada e entusiasmada do docente, no sentido de incentivar seus alunos a gostar
do que estão aprendendo, apontando e criando, constantemente, oportunidades para ouvir os demais, a
respeitar as opiniões dos outros, a argumentar, a reconhecer os "erros" e a enfrentar conflitos de ideias,
sem transformá-las em conflitos entre pessoas.

Tudo isso faz com que "escolas e salas de aulas se aproximem mais de seus alunos, tornando o ensino
uma atividade colaborativa interpessoal", algo extremamente valorizado pela abordagem vygotskiana e,
tal como vemos, por uma pedagogia de base sócio histórica.

A perspectiva piagetiana
Como em relação aos autores anteriores, serão expostas a seguir, algumas ideias centrais do
pensamento piagetiano, de modo a apresentar a fundamentação na qual se baseará a análise do episódio
de sala de aula já descrito anteriormente, meta desse artigo. Inicialmente será discutido como Piaget
concebe o processo de aprendizagem e a relação aprendizagem/desenvolvimento, bem como a relação
sujeito e objeto de conhecimento. Em seguida, as ideias de Piaget que têm implicações mais diretas para
a prática pedagógica serão comentadas.

Apesar de ser muitas vezes identificado como um autor que elaborou uma teoria do desenvolvimento
cognitivo sem dar relevância aos processos de aprendizagem, Piaget concebe esses processos como
intimamente relacionados, pois dialogam o tempo todo. Esse autor, adotando uma perspectiva
epistemológica construtivista e interacionista, apresenta concepções sobre os processos de
aprendizagem e desenvolvimento que não poderiam se assemelhar nem à postura empirista, nem à
postura apriorista. Para ele, o desenvolvimento cognitivo não se reduz à aprendizagem - entendida como
ação dos estímulos ou dos acontecimentos sobre o ser humano -, mas também não é visto como a
atualização de estruturas já presentes no indivíduo ao nascer.
Ao contrário, ele entende que é por meio da interação com o meio que o sujeito constrói suas estruturas
mentais e seu conhecimento: no contato com eventos físicos e/ou sociais, o sujeito os transforma para
poder apreendê-los - mecanismo de assimilação - e, simultaneamente, esses mesmos eventos exercem

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pressões sobre os instrumentos de assimilação do indivíduo, transformando-os. É por meio desse jogo
de mecanismos, necessariamente complementares e dissociados entre si, que o indivíduo desenvolve
continuamente seus esquemas e estruturas cognitivas. Essa construção contínua é explicada pela
equilibração, processo interno que incita o sujeito a transformar suas estruturas mentais tendo em vista
sua otimização, ou seja, tendo em vista patamares cada vez mais complexos de compreensão da
realidade física, social e cultural que o rodeia.
No intuito de melhor precisar o papel das contribuições advindas da experiência e daquelas advindas
dos fatores internos de organização e integração dessas mesmas experiências aos esquemas ou
estruturas já construídas, o autor distingue duas "formas" de aprendizagem: uma em sentido estrito e
outra em sentido amplo. A primeira refere-se às aquisições que se dão com base nas experiências vividas
pelo indivíduo e por ele elaboradas num plano inicial da apreensão dos objetos ou das situações. Já a
segunda engloba - em sentido amplo - as aprendizagens em sentido estrito, assim como outros processos
não derivados da experiência com os objetos, processos entendidos como mecanismos internos de
reorganização das aquisições prévias (devidos à experiência ou não), que levam à evolução dos
conhecimentos e, solidariamente, à evolução dos patamares de compreensão do indivíduo. A ideia de
aprendizagem em sentido amplo confunde-se, então, com a de desenvolvimento cognitivo.
Nessa perspectiva, o processo de aprendizagem, que em tese seria desencadeado no contexto
escolar, pode ser entendido como uma das variantes da aprendizagem em sentido estrito, que alimenta
e é realimentada, dialoga com o desenvolvimento e é necessariamente complementada por mecanismos
internos, o principal deles sendo a equilibração, mecanismo interno de autorregulação, presente em todos
os organismos.
Assim, para Piaget, a aprendizagem em sentido estrito não é condição suficiente para engendrar o
desenvolvimento, mas é condição necessária. Daí a importância que tem a aprendizagem em sua teoria
e, não por acaso, o autor esteve, em sua vida, constantemente ligado aos órgãos internacionais
encarregados de pensar a educação. Muito embora, comparativamente ao conjunto de sua obra, os textos
voltados à educação sejam em número pequeno, em muitos deles Piaget falou aos professores, que
podem neles encontrar uma referência na qual se inspirar para desenvolverem uma práxis favorecedora
da aprendizagem e do desenvolvimento das crianças e dos jovens.
Outro aspecto da teoria de Piaget contido na ideia de autorregulação, mas que se faz importante
destacar para efeitos da análise a que se procederá mais à frente, é a de que a construção dos
conhecimentos é "automotivada". Essa tese foi muito bem traduzida por De La Taille, ao enunciar uma
das principais teses piagetianas: a de que a inteligência é uma adaptação do indivíduo aos desafios
colocados pelo meio físico e social. Esse autor esclarece que, diante da impossibilidade de resolver um
problema, o sujeito é capaz de modificar seus pontos de vista, remanejar ou criar ideias, elaborar
hipóteses e testá-las, de modo a superar o conflito gerado pela incapacidade de resolver tal problema.
A implicação clara dessa asserção para o processo de ensino e aprendizagem que ocorre na escola,
talvez hoje tão repetida, mas nem sempre bem compreendida, é a de que para motivar o aluno a aprender
é preciso colocar-lhe problemas e desafios. Mas se conhecer é um "ato de interpretação", ou seja, se o
indivíduo assimila os dados do real aos seus sistemas de significação, é preciso estar atento às
manifestações dos alunos para constatar se, de fato, os supostos desafios colocados pelo professor
constituem situações que desencadeiam ações construtivas dos alunos, voltadas aos conteúdos a serem
aprendidos. Deve-se insistir, então, que não basta colocar questões ou problemas que supostamente, na
visão do professor, constituem desafios aos alunos: é necessário que eles efetivamente os percebam
como desafios. A seguir, essas colocações fundamentais do autor, apresentadas em textos que têm
implicações mais diretas para a educação, serão resgatadas.
Para Piaget, o objetivo da educação é formar o pensamento do aluno, é formar indivíduos autônomos
do ponto de vista intelectual e moral. Nesse sentido, mais do que buscar a acumulação de conteúdos, a
escola deveria se preocupar em ensinar o aluno a pensar, a construir suas verdades, a demonstrá-las, a
defender seus pontos de vista, a fazer perguntas e pesquisas por conta própria. Em síntese, deveria
formar o aluno de modo que ele aprendesse a construir conhecimentos tanto no domínio intelectual
quanto moral. Caberia ao professor entender a perspectiva de seus alunos para propor-lhes questões,
problemas e desafios a serem resolvidos. Caberia, também, cuidar para que sua autoridade não se
transformasse em impedimento para a conquista da autonomia por parte do aluno.
Privilegiar, na prática pedagógica, somente um tipo de relação interpessoal - aquela que ocorre entre
o professor e aluno - dificultaria a formação do ponto de vista próprio dos educandos, já que a tendência
seria a de aceitar as verdades enunciadas pelo professor. Com base nessa asserção, Piaget defende que
seria mais proveitoso privilegiar, no processo pedagógico, as relações entre colegas, o trabalho em grupo,
o autogoverno, ou seja, implementar formas de trabalhar em sala de aula em que os estudantes possam
tomar decisões e se responsabilizar por aspectos de sua vida escolar. A aprendizagem de condutas

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cooperativas e do trabalho em grupo fomentaria, no entender de Piaget, discussões entre indivíduos
"iguais", considerando seus níveis de conhecimento e lugar ocupado no contexto de sala de aula. Por
conseguinte, favoreceria verdadeiras trocas entre eles, a coordenação de pontos de vista e a conquista
da autonomia.

Análise do episódio a partir da perspectiva piagetiana


No episódio em foco alguns aspectos da situação tornam-se muito salientes. As carteiras dos alunos
enfileiradas, a mesa da professora à frente, sobre um tablado. A professora não interrompe sua fala para
ouvir o aluno; tem convicção que as intervenções do grupo atrapalham suas explicações; pressupõe que
o que os educandos têm a dizer não se relacionam com o conteúdo que está ministrando. Explica que
sua expectativa é a de que todos os alunos a acompanhem e desenvolve a aula a partir de seu próprio
ponto de vista. A dinâmica proposta é centrada em um único tipo de interação social: a do professor com
os alunos.
Em tese, a aula centrada na figura do professor e na sua perspectiva, que é aquela de quem domina
o conteúdo, dificultaria a atividade construtiva dos estudantes e o exercício da reflexão. Sem poder
elaborar sobre o que está sendo dito, provavelmente os alunos apenas memorizarão as lições, para
poderem reproduzi-las em momento oportuno, quando forem induzidos a isso, como, por exemplo, nas
provas. É cabível, portanto, questionar o quanto tais conhecimentos se tornarão condição para a
construção de novas estruturas ou ampliarão a capacidade de aprender; indagar quanto do que é
aprendido em tais circunstâncias funciona como condição de assimilação para qualquer outro
conhecimento; ou ainda inquirir se, ao tentar dar conta do conteúdo, a professora percebe as possíveis
consequências educacionais de seu fazer. Em síntese, quais são as metas educacionais almejadas?
Na perspectiva de Piaget, a prática pedagógica em questão parece estar mais a serviço da acumulação
de conteúdos do que da formação de indivíduos que sabem pensar e que, no futuro, estariam aptos para
agir de forma autônoma e crítica. De fato, ao não ouvir o que os alunos têm a dizer sobre o assunto em
pauta, é quase impossível ao professor ir ao encontro de seus pontos de vista, identificar seus
conhecimentos prévios, perceber como apreendem aquilo que foi falado. Se o conhecimento é um ato de
interpretação, se a compreensão de algo depende do patamar de desenvolvimento cognitivo do indivíduo
- ou, na linguagem piagetiana, de seus instrumentos de assimilação - não ouvir a manifestação dos
educandos torna impossível ao professor apresentar objetos de conhecimento que possam ser por eles
assimilados. Não é de se admirar que muitas vezes os alunos apresentem dispersão e desinteresse pela
aula, como bem exemplifica a atitude de Pedro, descrita no episódio em análise.
Para dar conta de responder às perguntas que desencadearam esta análise é preciso ainda indicar
caminhos na direção do aprimoramento da prática pedagógica da professora focalizada. Entende-se ser
necessário que ela vá ao encontro do ponto de vista dos alunos, preocupe-se em compreender como
apreendem e como aprendem o que lhes é ensinado. Ouvir o que os educandos têm a dizer não implica
defender um ensino individualizado, como pode parecer, talvez, à primeira vista. Entretanto, é preciso
pensar em estratégias que permitam um acompanhamento mais próximo do aluno pelo professor, que
possibilitem aos estudantes tomar iniciativas, expor suas questões, manifestar seus interesses e
compartilhar opiniões. Adicionalmente, é fundamental considerar as diferenças relativas aos níveis de
compreensão e de construção dos conhecimentos escolares, para que se possam elaborar
planejamentos a elas adequados. Afinal, há hoje clareza da diversidade presente na escola e da tão
almejada meta da inclusão.
Os caminhos que a teoria, em princípio, oferece aos docentes apontam para estratégias de cunho
variado; empregadas em diferentes momentos do planejamento diário e adaptadas aos diferentes
conteúdos; que impliquem momentos de trabalho em duplas, trios, pequenos grupos ou mesmo tarefas
individuais; em que as fontes de consulta disponíveis envolvam, sem sombra de dúvida a professora, mas
também materiais didáticos e os próprios colegas, que, cooperativamente, trabalham em prol do
desenvolvimento de cada um e do grupo classe. Nesse sentido, vale esclarecer que não há nada a opor,
por exemplo, à maneira expositiva de lecionar, tal como Ruth faz no episódio em pauta, desde que o faça
de modo interessante, permitindo a participação dos alunos, procurando suscitar-lhes a atividade
construtiva.

Perspectiva de Wallon
A abordagem de Henri Wallon
A gênese da inteligência para Wallon é genética e organicamente social, ou seja, "o ser humano é
organicamente social e sua estrutura orgânica supõe a intervenção da cultura para se atualizar".
Nesse sentido, a teoria do desenvolvimento cognitivo de Wallon é centrada na psicogênese da pessoa
completa.

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Para Galvão, o estudo de Wallon é centrado na criança contextualizada, onde o ritmo no qual se
sucedem as etapas do desenvolvimento é descontínuo, marcado por rupturas, retrocessos e reviravoltas,
provocando em cada etapa profundas mudanças nas anteriores.
Nesse sentido, a passagem dos estágios de desenvolvimento não se dá linearmente, por ampliação,
mas por reformulação, instalando-se no momento da passagem de uma etapa a outra, crises que afetam
a conduta da criança.
Conflitos se instalam nesse processo e são de origem exógena quando resultantes dos desencontros
entre as ações da criança e o ambiente exterior, estruturado pelos adultos e pela cultura e endógenos e
quando gerados pelos efeitos da maturação nervosa. Esses conflitos são propulsores do
desenvolvimento.
Os cinco estágios de desenvolvimento do ser humano apresentados por Galvão sucedem-se em fases
com predominância afetiva e cognitiva:
Impulsivo-emocional, que ocorre no primeiro ano de vida. A predominância da afetividade orienta as
primeiras reações do bebê às pessoas, às quais intermediam sua relação com o mundo físico;
Sensório-motor e projetivo, que vai até os três anos. A aquisição da marcha e da prensão, dão à
criança maior autonomia na manipulação de objetos e na exploração dos espaços. Também, nesse
estágio, ocorre o desenvolvimento da função simbólica e da linguagem. O termo projetivo refere-se ao
fato da ação do pensamento precisar dos gestos para se exteriorizar. O ato mental "projeta-se" em atos
motores. Como diz Dantas, para Wallon, o ato mental se desenvolve a partir do ato motor;
- Personalismo, ocorre dos três aos seis anos. Nesse estágio desenvolve-se a construção da
consciência de si mediante as interações sociais, reorientando o interesse das crianças pelas pessoas;
- Categorial. Os progressos intelectuais dirigem o interesse da criança para as coisas, para o
conhecimento e conquista do mundo exterior;
- Predominância funcional. Ocorre nova definição dos contornos da personalidade, desestruturados
devido às modificações corporais resultantes da ação hormonal. Questões pessoais, morais e existenciais
são trazidas à tona.

O referido autor ressalta ainda que na sucessão de estágios há uma alternância entre as formas de
atividades e de interesses da criança, denominada de "alternância funcional", onde cada fase
predominante (de dominância, afetividade, cognição), incorpora as conquistas realizadas pela outra fase,
construindo-se reciprocamente, num permanente processo de integração e diferenciação.

3.4 Teoria das inteligências múltiplas de Gardner.

O Educador Celso Antunes38 explica os conceitos de inteligência múltipla segundo Howard Gardner.
As pesquisas de Gardner representam verdadeiro símbolo educacional contemporâneo, ao sinalizar que
o que se descobre sobre a mente humana, constitui não apenas saber acadêmico, mas instrumento de
ação pedagógica imprescindível

Howard Gardner possui um currículo indiscutível. Professor de Educação e Diretor do Projeto Zero, no
Harvard Graduate Scholl of Education e professor adjunto de Neurologia na Boston University Scholl of
Medicine, é autor de inúmeros livros e criador de uma teoria educacional conhecida e aplicada no mundo
inteiro. Além da notoriedade pública e reconhecimento como um dos mais influentes educadores deste
século, em 1981 recebeu o Mac Arthur Prize Fellowship e, em 1990, tornou-se o primeiro norte-americano
a ser condecorado com o Louisville Grawemeyr Award in Educatio, prêmios que por sua expressão e
grandeza já sintetizam o admirável perfil de suas pesquisas e de suas obras.
Ninguém melhor que Gardner, entretanto, para falar sobre ele mesmo. Em seu livro lançado no Brasil
no ano 2000 pela Editora Objetiva (Inteligência - Um conceito reformulado) descreve-se ao falar sobre
seus pensamentos. "Nada em minha juventude diria que eu viria ser um estudioso (e um teórico) da
inteligência.

Quando criança, eu era bom aluno e me saia bem em testes, portanto a questão da inteligência era
relativamente simples para mim. Na verdade, em outra vida, talvez eu passasse a defender a visão

38
Disponível em: http://revistaeducacao.uol.com.br/formacao-docente/0/artigo233099-1.asp

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clássica da inteligência, como tantos de meus contemporâneos brancos do sexo masculino que já estão
envelhecendo. Típico garoto judeu que detestava ver sangue, eu (e muitos outros em meu mundo)
pretendia ser advogado. Só em 1965, ao terminar a minha graduação no Harvard College, resolvi fazer
pós-graduação em psicologia. A princípio, como outros adolescentes, eu estava fascinado com as
questões da psicologia que intrigam o leigo: emoções, personalidade, psicopatologia. Meus heróis em
Sigmund Freud e meu professor, o psicanalista Erik Erikson, que havia sido analisado pela filha de Freud,
Anna. No entanto, depois de ter conhecido Jerome Bruner, um pioneiro na pesquisa da cognição e do
desenvolvimento humano, e de ter lido as obras de Bruner e de seu mestre, o psicólogo suíço Jean Piaget,
resolvi fazer pós graduação em psicologia do desenvolvimento cognitivo."

As pesquisas de Gardner representam verdadeiro símbolo educacional contemporâneo, ao sinalizar


que o que se descobre sobre a mente humana, constitui não apenas saber acadêmico, mas instrumento
de ação pedagógica imprescindível. Mostrou de forma coerente que todos os seres humanos possuem
diferentes tipos de mente e que pais e professores podem tornar possível uma educação personalizada,
destacando que na imensa diversidade que existe em cada um, deve solidificar-se a certeza de que
nenhum ser humano é perfeito em tudo, mas todos, absolutamente todos, possuem potencial de
grandezas diversas, forças pessoais que devidamente reconhecidas coloca uma nova linha educacional
a serviço do integral desenvolvimento humano e da extrema grandeza da singularidade de sua mente

O que é Inteligência

Inteligência é a faculdade de entender, compreender, conhecer. Inteligência é também juízo,


discernimento, capacidade de se adaptar, de conviver. Constitui potencial biopsicológico não
especificamente humano, mas que em seres humanos assume dimensão inefável. É, para Gardner, uma
capacidade para resolver problemas e serve também para criar ideias ou produtos considerados válidos.
As criaturas humanas possuem nível elevado de inteligência e por isso são criativas, revelam capacidade
de compreender e de inventar e ao acolher uma informação, atribuir-lhe significado e produzir respostas
pertinente.
É a inteligência que permite dar sentido as coisas que vemos e a vida que temos e que nos leva a
conversa interior, resgates de "arquivos" da memória, capacidade de raciocínio, criação de objetivos e
invenção de saídas quando parece não existir indícios de sua existência. Inteligência é saber pensar,
possuir vontade para fazê-lo, criar e usar símbolos e graças a eles realizar conquistas extraordinárias,
fazendo surgir o mito, a linguagem, a arte e a ciência. Somos quem somos porque lembramo-nos das
coisas que nos são próprias e nos emocionamos, e a inteligência faz com que cada ser humano seja um
ser único e compreenda plenamente o significado dessa individualidade.

O Que Sabemos e o que ainda não sabemos sobre a Inteligência Humana

A certeza de que trabalhando as inteligências múltiplas em sala de aula se está desenvolvendo linha
de ação coerente com os saberes antropológicos, sociológicos e neuroanatômicos sobre a inteligência
humana se apoia em algumas evidências indiscutíveis. Entre estas, cabe destacar.
Como as inteligências constituem potencial biopsicológico de emprego imediato no dia a dia e recurso
essencial para ajudar-nos a resolver problemas, adaptar-se as circunstâncias, criar e aprender, quem
busca trabalhá-las em sala de aula necessita perceber que o conhecimento não é uma "coisa" que vem
de fora ou se capta do meio, mas um processo interativo de construção e reconstrução interior e assim
não pode ser "transferido" de um indivíduo para outro. Levando-se em conta essa assertiva descobre-se
que o conhecimento é autoconstruído e as inteligências são educáveis, isto é sensíveis a progressiva
evolução, desde que adequadamente trabalhadas. A escola pode ser, portanto, um espaço fomentador
de novas maneiras de pensar.
Ainda que possam existir debates acadêmicos sobre a quantidade de inteligências que o ser humano
possui, a classificação mais aceita é a de Howard Gardner que descreve em cada pessoa a existência de
oito ou nove inteligências (Howard Gardner fala-nos em oito inteligências efetivamente comprovadas e
uma nona (inteligência existencial) que ainda depende de maior aprofundamento e revisão para se
acrescentar as oito conhecidas) claramente diferenciadas.

O potencial humano quanto as inteligências é extremamente diversificado e essa diversidade deve-


se a conjunção de fatores genéticos e estímulos ambientais desenvolvidos dentro e fora da escola. Uma
pessoa sem distúrbios ou disfunções cerebrais é portador de todas as inteligências ainda que seja
diversificado o potencial desta ou daquela;

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A ocorrência de disfunções cerebrais adquiridas ou não, pode afetar uma ou mais inteligências, sem
que isso implique em um comprometimento integral. Em outras palavras, é possível neste ou naquele
indivíduo a existência de um dificuldade ou distúrbio de aprendizagem que afete uma ou mais
inteligências, sem que isso impeça o desenvolvimento potencial das demais.
Cada uma das inteligências pode ser identificada através de diferentes manifestações e estas, apenas
para efeitos didáticos, poderiam ser consideradas sub-inteligências. Desta forma a inteligência linguística
por exemplo pode se manifestar através da escrita, da oralidade ou da sensibilidade e emoções
despertadas pela intensidade com que se capta mensagens verbais ou escritas;
O valor maior ou menor que a sociedade empresta a esta ou àquela inteligência subordina-se à
cultura inerente e ao tempo e local em que se vive. Em alguns espaços geográficos, por exemplo, a
capacidade musical se sobrepõe à linguística e em outros atribui-se valor maior a capacidade matemática
que a administração de situações emocionais próprias ou em terceiros;
Ainda que qualquer faixa etária mostre-se sensível ao estímulo das inteligências, existem idades em
que as mesmas respondem mais favoravelmente aos incentivos. Para a maior parte das inteligências a
fase da vida mais sensível ao progresso estende-se dos dois aos quinze anos de idade. O cérebro
humano é órgão que se compromete pelo desuso e portanto as diferentes inteligências necessitam de
estímulos diversificados desde a vida pré-natal até idades bastante avançadas;

Ao se pesquisar a inteligência humana e a evolução desse conceito, desde quando a neurologia pode
beneficiar-se de estudos do cérebro em pessoas vivas, alguns poucos críticos enfatizaram que falar-se
em Inteligências Múltiplas seria simplesmente "fragmentar-se a idéia de Inteligência", criando-se um
modismo. Nada mais errado que supor que a identificação de inteligências diferentes "fragmenta" ou
apenas classifica aspectos particularizados de um todo. A localização cerebral de áreas específicas para
operar saberes específicos - como a área de Broca e de Wernicke para a linguagem - mostra que não
existe uma inteligência global que se busca dividir, mas núcleos cerebrais distintos que operam
competências específicas, ainda que o cérebro humano funcione mais ou menos como uma orquestra e
áreas diferentes se envolvem para a apresentação de um resultado aparentemente único. O fato de se
ouvir, por exemplo, o destaque do piano em uma melodia não significa que reconhecê-lo implica em
"fragmentar" a orquestra.
Não existe uma única abordagem pedagógica para o trabalho com as inteligências múltiplas em sala
de aula e, portanto, não existem "receitas" definitivas sobre como estimulá-las.

Concluindo algumas das evidências destacadas por Gardner, seria lícito reafirmar que trabalhar com
inteligências múltiplas não se afigura como um método de ensino cujo emprego supõe uma mudança
radical na forma como antes se trabalhava. Ao contrário, estimular com atividades, jogos e estratégias as
diferentes inteligências de nossos alunos é possível, não é complicado, não envolve custos ou despesas
materiais significativas e pode ser desenvolvido para qualquer faixa etária e nível de escolaridade e em
qualquer disciplina do currículo escolar.

Mitos e Fantasias

A teoria das Inteligências Múltiplas alcançou larga popularidade em quase todo mundo e, dessa forma,
as idéias que enfatizavam seu emprego em sala de aula assumiram inevitáveis desvios. Em uma obra
recente Gardner faz uma análise desses mitos, entre os quais destacamos alguns:
Uma variedade de testes necessitam ser desenvolvidos para que possamos avaliar o potencial de
cada uma das oito ou nove inteligências humanas.
É um erro supor que possa se avaliar inteligências por testes, quantificando esse potencial. Uma
avaliação coerente da inteligência espacial, por exemplo, deve permitir que o aluno explore uma área e
perceba se consegue se orientar de maneira confiável, transferindo essa aprendizagem para áreas
desconhecidas. Os estímulos, dessa forma, devem conduzir a um progressivo aperfeiçoamento que um
criterioso diagnóstico, acompanhado de relatórios da ação do aluno (e não testes padronizados) revelará.
Uma inteligência é mais ou menos como uma disciplina escolar e, dessa forma, a Língua Portuguesa
por exemplo deveria explorar competências linguísticas, a Matemática exploraria competências lógico-
matemáticas e assim por diante.
Nada mais errado que acreditar nesse mito. A inteligência é uma nova forma de construção de
habilidades, baseada em capacidade e potenciais biológicos e psicológicos e não pode ser confundida
com disciplinas escolares, que são organizações de saberes aglutinados por pessoas. Em qualquer
disciplina é possível trabalhar-se uma ou várias inteligências.

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Uma inteligência é a mesma coisa que um estilo de aprendizagem ou um método de ensino.

Um estilo de aprendizagem é uma abordagem que se aplica da mesma maneira em diferentes


conteúdos; um método de ensino é uma sequência de operações com vistas a determinados resultados
e, dessa forma, o trabalho com estímulos às inteligências permite adaptar-se a diferentes estilos de
aprendizagem e sua aplicação não constitui método de ensino que para ser implantado pressupõe a
substituição do método utilizado. Gardner enfatiza que não existe "receita" pedagógica única e forma
universal de trabalhar-se as múltiplas inteligências.

A teoria das Inteligências Múltiplas é incompatível com a existência de uma inteligência geral.

A teoria das Inteligências Múltiplas não questiona a existência de uma inteligência geral mas sim seu
campo de conhecimento, admitindo que mesmo pessoas aparentemente bem dotadas em uma
inteligência pouco serão capazes de realizar se não forem expostas a matérias que exijam essa
inteligência. Quanto mais "inteligente" e diversificado for o ambiente e quanto mais incisivas as
intervenções de mediadores, mais capazes se tornarão as pessoas e menos importante será sua herança
genética.
Sintetizando, seria possível afirmar que a Teoria das Inteligências Múltiplas endossa três proposições
essenciais:
Não somos todos iguais. Todo indivíduo, entretanto, é portador de forças cognitivas específicas que
o diversifica e o singulariza.
Não temos com igual intensidade todos os tipos de inteligência pois temos mentes diferentes. Nesse
sentido, toda avaliação que busca comparar ou nivelar seres humanos apresenta-se eivada de
preconceitos.
A educação funciona de modo mais eficaz se essas diferenças forem levadas em consideração, se
forças pessoais forem reconhecidas e se pais e professores empenharem-se em desenvolver projetos
para efetivamente conhecer e estimular mentes, descobrindo em que são efetivamente capazes. Uma
boa avaliação, portanto, deveria ser "o mais direta possível", orientando o aprender para fazer e
verificando como ocorreu essa construção.
A essas proposições julgamos interessante acrescentar que um estímulo às inteligências somente
ganha sentido se promovido através de um projeto, se estabelecido a partir de objetivos e trabalhados
com pertinácia e com competência. Não se estimula inteligências acidentalmente ou com ações
esporádicas.

A Teoria das Inteligências Múltiplas

Em 1983, Howard Gardner, psicólogo da Universidade de Harvard concluiu o manuscrito " As


Estruturas da Mente" ( Artmed, 1994 ) que buscava ultrapassar a noção comum de inteligência, como
um potencial que cada ser humano possuía em maior ou menor extensão e que este potencial pudesse
ser medido por instrumentos verbais padronizados como teste de Q.I. Baseando-se no conceito de que
inteligência é a capacidade de resolver problemas ou de criar produtos que sejam valorizados dentro de
um ou mais cenários culturais e tomando como referência científica evidências biológicas e antropológicas
introduziu oito critérios distintos para uma inteligência e propôs sete competência humanas, mais tarde
elevadas para oito ou eventualmente nove .
A teoria de Gardner mudou de forma significativa o conceito de escola e de aula e abriu novas luzes
sobre as competências humanas, mostrando que o sistema tradicional de avaliação baseado na
capacidade de dominar conceitos escolares específicos necessitava de imperiosa renovação e que não
mais havia sentido em se conceber este aluno mais inteligente que outro apenas porque dominava com
maior ou menor facilidade as explanações de seu professor ou os conceitos do livro didático.
Hoje, pouco mais de vinte anos após a publicação dos pensamentos de Gardner, a idéia das
inteligências múltiplas evoluiu do campo das especulações e constitui uma nova maneira de ensinar e,
sobretudo, uma outra forma de conceber a capacidade dos alunos e a aula centrada em sua
individualidade. A despeito disso tudo, entretanto, ainda existe algumas dificuldades em se situar com
clareza a diferença que Gardner propôs para sua "teoria" e a "prática" da mesma.
"Teoria" e "prática" parecem ser palavras muito amigas e que gostam de andar juntas. Mas, enquanto
a palavra "teoria" recebe o desdém e desprezo, como algo que valha apenas no papel mas não possui
validade efetiva, a palavra "prática" ao contrário, recebe quase sempre o aplauso, revelando caráter de
autenticidade e funcionando para valer. "Teoria" significa um conjunto de idéias científicas sistematizadas

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e pode muitas vezes assegurar indiscutível validade prática. É, por exemplo, o que acontece com a Teoria
das Inteligências Múltiplas.
Os argumentos propostos por Gardner para mostrar a multiplicidade das inteligências parecem ser
indiscutíveis. A lesão ou disfunção parcial do cérebro humano implica na perda de ações relativas a ou
as inteligências especifica a essa área atingida e não a todas, assim como a manifestação da genialidade
humana, destaca que alguns mostram exponencial inteligência linguística, como é o caso de
Sheakespeare por exemplo, mas outros se projetaram por sua inteligência musical como Mozart,
matemática como ocorreu com Einsten, corporal nitidamente presente em Garrincha, Pelé e outros e
ainda muitas outras.

Ao lançar sua teoria, Gardner falava em sete inteligências, mas estudos e pesquisas posteriores
elevaram esse número para nove, admitindo que tal diversidade pode ainda vir a ser ampliada quando
ainda mais profundamente se conhecer a mente humana. Em linhas gerais, portanto, todas as pessoas
sem disfunções cerebrais agudas apresentam em diferentes níveis de grandeza, as inteligências:

- Espacial, expressa pela capacidade de relacionar o espaço próprio com o espaço do entorno,
percebendo e administrando distâncias e pontos de referências, bem como revelando a capacidade em
perceber visuo-espacialmente diferentes objetos, eventualmente transformando-os ou combinando-os em
novas posições. Extremamente nítida em grandes arquitetos, manifesta-se também em pessoas que
revelam facilidade em imaginar e percorrer referências espaciais, como alguns motoristas de praça de
grandes cidades. Instiga a capacidade em pensar de maneira tridimensional e permite que a pessoa
possua imagens externas e internas dos objetos através do espaço e decodifique com facilidade as
informações gráficas. Crianças com elevado nível de inteligência espacial percebem com facilidade a
mudança de algo em um cômodo de sua casa, detectando alterações mesmo sutis em ambientes que
conhecem. Parecem "pensar" através de imagens visuais e muitas vezes destacam-se em atividades
artísticas ou jogos que envolvem montagens. Não poucas são fascinadas por máquinas e possuem
elevada habilidade manual, mas não se interessam muito por atividades rotineiras, refugiando-se em
aventuras imaginárias.

- Cinestésico-corporal, identificada à capacidade em controlar e utilizar o corpo, ou uma parte do


mesmo em atividades motoras complexas e em situações específicas, assim como manipular objetos de
formas criativa e diferenciada. Marcante em pessoas que dançam muito bem, praticam a mímica com
precisão ou são hábeis em modalidades esportivas diversas. Facilita a sintonização de diferentes
habilidades físicas. Crianças com elevada inteligência espacial apresentam capacidade incomum em
controlar o corpo e expressar-se por mímicas e caretas, precisando a toda hora mover-se, retorcer-se
usando sensações corporais para processarem informações, aprendendo bem menos por ouvir e muito
mais por fazer.

- Lógico-matemática, ligada a competência em compreender os elementos da linguagem lógico-


matemática, permitindo ordenar símbolos numéricos e algébricos assim como quantidades, espaço e
tempo. Presente na Engenharia, na Física e na Matemática, também se manifesta na contabilidade,
programadores de computação e outras profissões que recorrem a lógica e os números. Crianças que
apresentam uma elevada inteligência lógico-matemática adoram separar, classificar e organizar objetos
e brinquedos, aprendem a calcular rapidamente e são excelentes em jogos que envolvem lógica e
estratégia e no manejo e compreensão dos desafios ligados a computação.

- Naturalista, associada a sensibilidade de percepção e compreensão dos elementos naturais e da


interdependência entre a vida animal e vegetal e os ecossistemas e a leitura coerente e racional da
natureza em todo seu esplendor. Marcante no naturalista, botânico, jardineiro e paisagista tem em Darwin
seu expoente mais extraordinário. Induz a observações de padrões na natureza, identificando e
classificando sistemas naturais. As crianças com elevada inteligência naturalista interessam-se muito por
animais e pela vida rural, sabendo quase que intuitivamente separar, organizar e classificar e ilustrar tudo
que diz respeito a plantas e sobretudo a animais.

- Linguística, voltada a capacidade em adquirir, compreender e dominar as expressões da linguagem


colocando em ação a semântica e a beleza na construção da sintaxe. Manifesta em escritores,
romancista, jornalistas, palestrantes e poetas, mostra-se expressiva também em pessoas que cultuam a
palavra e a construção de idéias verbais ou escritas. Consiste na capacidade de pensar com palavras e
de usar a linguagem para expressar e avaliar significados complexos. Crianças com expressiva

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capacidade linguística surpreendem pelo vocabulário que conhecem e utilizam, adoram ler, escrever e
contar histórias, mostrando interesse por rima, trocadilhos, charadas e jogos com palavras.

- Sonora ou Musical expressa na capacidade em combinar e compor a música, encadeando sons em


uma sequência lógica e rítmica e estruturando melodias. É a inteligência que se manifesta com mais
extraordinário esplendor em maestros, compositores e muitos outros. Destaca pessoas com extrema
sensibilidade para a entoação, ritmo, melodia e o tom. Crianças com expressiva inteligência sonora
mostram-se sensíveis a sons e seus ambientes, recordando com facilidade de ritmos e melodias. As que
sentem-se cercadas por ambiente musical, motivam-se com instrumentos e incorporam a música como
elemento comum as suas vidas. Muitas entre elas acumulam coleção de CDs e parece que os fones de
ouvido fazem parte da estrutura orgânica de seus rostos.

- Intrapessoal é a inteligência de quem expressa grande facilidade para estabelecer relações afetivas
com o próprio eu, construindo uma percepção apurada de si mesmo, fazendo despontar a autoestima e
aprofundando o autoconhecimento de sentimentos, temperamentos e intenções. Presente de forma mais
acentuada em psicanalistas, mostra-se bem caracterizada em assistentes sociais, alguns professores e
outras profissões. Crianças com inteligência intrapessoal elevada desde cedo demonstram saber "quem
realmente são", não se preocupando muito sobre o que pensam a seu respeito. Valorizam a privacidade
e ainda que não gostem muito de misturarem-se a multidão, costumam ser admiradas pelos colegas.

- Interpessoal muito nítida em pessoas que revelam extrema capacidade em compreender a natureza
humana em outras pessoas, procedendo uma verdadeira "leitura do outro" quanto seus aspectos
emocionais, assim como a destacada facilidade para relações interpessoais e a compreensão da
dinâmica dos grupos sociais. Crianças com fortes habilidades nessa inteligência relacionam-se muito bem
com outras pessoas, fazem amizade com extrema facilidade e como apresentam elevada sensibilidade
para compreender sentimentos de terceiros não raramente são escolhidas para liderar grupos, organizar
campanhas comunitárias

- Existencial, ligada a capacidade de se situar sobre os limites mais extremos do cosmos e também
em relação a elementos da condição humana como o significado da vida, o sentido da morte, o destino
final do mundo físico e ainda outras reflexões de natureza filosófica ou metafísica. Marcante em pessoas
com forte espiritualidade é a inteligência dos filósofos, sacerdotes, xamãs, gurus e ainda outros.

De maneira geral é possível crer que todas as pessoas sem problemas mentais específicos possuam
todas as nove inteligências com algumas bem mais acentuadas e desenvolvidas que as outras. Trabalhos
específicos desenvolvidos em sala de aula contribuem de forma efetiva para "acordar" todas as
inteligências nos alunos, ampliando sua criatividade e desenvolvendo-o de forma coerente e holística.

Inteligências, Talentos e Aptidões

Já ouvimos não poucas vezes educadores indagarem se o conceito de Inteligências Múltiplas não
caracteriza "roupagem nova" para o que antes se conhecia como aptidão ou mesmo como talento. Não
existe necessariamente um erro em denominar de aptidão esta ou aquela inteligência, mas enquanto a
idéia de "aptidão" mais se aproxima de "habilidade" ou de "capacidade", a inteligência como antes se
observou constitui potencial biopsicológico inerente à espécie e sua validade se expressa pela
capacidade de resolver problemas ou de criar algo novo. A "aptidão", "performance" ou mesmo o "talento"
parece-nos mais claramente associada a idéia de que simbolizam estados avançados desta ou daquela
inteligência. O potencial é inerente à evolução, mas a habilidade é conquista educacional com ou sem a
intervenção de mediadores. Podemos afirmar, por exemplo, que ao driblar seus adversários e dessa
forma livrar-se do problema de uma marcação cerrada o atleta está explorando sua inteligência corporal,
mas driblará melhor, com mais aguda performance porquê usou essa inteligência com talento ou com
maior habilidade. Ao se assistir o drible de dois atletas não podemos negar a clara evidência de uma
inteligência cinestésico-corporal em ação, mas ao constatar que este dribla melhor que aquele, podemos
inferir que isso ocorre porque possui maior habilidade, talvez porquê tenha treinado mais intensamente e
que essa mesma habilidade poderá ser alcançado por seu colega se se empenhar cada vez mais, desde
é claro que seu potencial seja similar.
Muito além da simplicidade do exemplo exposto e desejando propor elementos teóricos (de natureza
neurológica, sociológica e antropológica) mais sólidos para caracterizar uma inteligência e, desta forma,

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isolá-la de palavras que podem gerar alguma confusão, Gardner estabeleceu oito fundamentos que
caracterizariam os elementos para aceitarmos uma inteligência.
Esses fundamentos se aplicam as nove inteligência até esta data aferida, mesmo considerando que
cada inteligência possa manifestar-se através de diferentes aptidões. Os fundamentos sugeridos por
Gardner são:

Isolamento de uma ou outra inteligência por lesão cerebral.

Uma inteligência pode ser danificada por uma disfunção ou lesão cerebral específica a área do cérebro
em que a mesma encontra-se alojada. Uma pessoa, por exemplo, que sofra uma lesão da área de Broca
ou de Wernick (lobo frontal esquerdo) apresenta claras deficiências linguísticas e apresentar problemas
para ler, escrever e falar;

A existência de savant

A palavra savant é usada com frequência para determinadas pessoas de exponencial talento em uma
ou outra aptidão desta ou daquela inteligência, mesmo com sérios comprometimentos em suas ações
relativas a outras inteligências. Existem não poucos autistas com sérios problemas linguísticos ou
interpessoais, mas com fortíssima inteligência lógico-matemática ou mesmo musical. Os savants revelam
inteligência - ou parte da mesma - superior, enquanto suas outras inteligências operam em baixo nível.

Momentos definitos de sua manifestação ao longo da vida

Cada atividade desta ou daquela inteligência parece apresentar um ciclo desenvolvimental nítido, onde
se destaca a faixa etária em que surge, o momento de maior índice de desenvolvimento e um padrão
próprio e específico de declínio com o envelhecimento. Ainda que a manifestação desse ciclo possa variar
de inteligência para inteligência, tende a ser o mesmo em todas as pessoas, independente de sua cultura
ou de seu ambiente geográfico.

A presença das inteligências na história evolutiva da humanidade

Ao que tudo indica desde quanto nossa espécie definiu-se como "homo sapiens" já se percebia
claramente a existência de diferentes inteligências, marcando pessoas especiais neste ou naquele grupo.
Em outras palavras, desde antes da invenção da escrita já era possível detectar em um grupo cultural a
existência de pessoas com maior projeção em cada uma das oito ou nove inteligências.

A sensibilidade da inteligência a uma avaliação

Todas as inteligências humanas podem ser percebidas em suas manifestações, apresentando-se


como pouco expressivas em alguns, moderadas em outros e elevadas em terceiros. Embora inexiste um
"teste" padrão para quantificar esta ou aquela inteligência, todas as culturas sabem manifestar seu apreço
por inteligências elevadas nas manifestações conhecidas. Em outras palavras, qualquer cultura, mesmo
as ágrafas, reconhecem a existência de gênios linguísticos, gênios lógico-matemáticos, gênios musicais
e assim por diante.

Análise de desempenho específico

Gardner demonstra que, ao examinar estudos psicológicos específicos, é possível identificar


inteligências operando de maneira quase que isolada uma das outras. Esse fundamentos nos mostra que
raramente percebe-se "gênios absolutos" isto é, pessoas excepcionais em todas as inteligências,
prevalecendo potencialidades magníficas em matemática, na construção de textos, na composição
musical e assim por diante.

A possibilidade de uma codificação através de um sistema simbólico.

Cada inteligência possui símbolos próprios universais e assim como as linguagens faladas e escritas
caracterizam a símbolo estrutural da inteligência linguística, os sinais aritméticos, geométricos e os
números externam os símbolos lógico-matemáticos. Da mesma forma as notas musicais externam
símbolos da composição sonora, existem linguagens gráficas espaciais usadas por engenheiros e

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arquitetos, a ação corporal na dança e nos esportes é de validade internacional como o é o riso, o choro
e outras manifestações espaciais das emoções inerente as inteligências pessoais.

Operações centrais especifica de cada inteligência

Da mesma forma como cada uma das inteligências conhecidas usam sistemas simbólicos específicos,
existe também um conjunto de operações centrais que servem para acionar atividades inerentes a esta
ou aquela inteligência. O excelente desempenho cinestésico-corporal, por exemplo inclui a necessidade
do domínio de certas rotinas motoras específicas, tal como a construção de um belo texto também envolve
procedimentos centrais específicos à inteligência linguística.

Inteligências Múltiplas e a Sala de Aula

Constitui mérito indiscutível na obra de Gardner a praticidade de sua teoria e, portanto, o uso em sala
de aula, independente do nível de ensino com o qual se trabalha e o conteúdo que se busca ministrar. A
idéia essencial da teoria é assumir que todo aluno pode expressar saberes através de diferentes
linguagens e que, devidamente estimulado, pode explorar sua potencialidade de forma diversificada. O
texto abaixo, apenas como exemplo, procura mostrar a extrema diversidade dessa aplicação e, nesse
sentido, enfatiza uma das inúmeras perspectivas de aplicação da teoria das Inteligências Múltiplas em
sala de aula.
" Faça de conta que em frente à sala, o professor acabou de fazer uma análise do tema "Capitanias
Hereditárias". Se preferir, ao invés deste, o tema tratado foi a "Como extrair-se raiz quadrada", "O
funcionamento do pâncreas", "O quadro climato-botânico da Região Sudeste", ou outro tema qualquer.
No exemplo que se dará, o tema é pouco importante e o que modela a ação do professor será seu
procedimento, ministrando aula desta ou daquela disciplina, para este ou para aquele nível.

Ao concluir sua exposição e esclarecer dúvidas interpretativas, solicita uma síntese sobre o que falou,
através da qual, alunos organizados em pequenos grupos, deverão se expressar. Alguns poderão fazer
uso de uma linguagem textual e, dessa forma, apresentarão sua síntese com palavras e, portanto, com
frases significativas, textos elucidativos, manchetes marcantes, reportagens realistas. Na execução desse
trabalho, a atividade centrada na expressão verbal, imporá ao aluno um uso consistente de sua
inteligência linguística. Mas, enquanto esse grupo busca a melhor forma de expressão verbal, um outro
por exemplo, pode estar pesquisando o tema para expressar o conteúdo do mesmo, possível de ser
exemplificado por equações, médias, grandezas, gráficos e proporções.

Enquanto o primeiro grupo "mergulhou" no tema, mas buscou resposta linguística; o segundo grupo
não fez pesquisas menos intensas e conclusivas, mas expressou suas respostas por uma visão lógico-
matemática. O tema é o mesmo, mas áreas cerebrais diferentes foras usadas por grupos diferentes. Da
mesma forma, o mesmo tema poderá suscitar a um terceiro grupo uma resposta visuoespacial e, assim,
buscará sua expressão através de mapas e de gráficos, de frisas do tempo e de colagens, de mapa
conceituais ou outras manifestações da linguagem pictográfica. Observe que, nesse exemplo, três grupos
diferentes, centrados em um mesmo tema, buscaram seu aprofundamento e sua integral significação
explorando diferentes inteligências.
Mas, será que esse tema ou conteúdo - seja ele qual for - não poderá, por exemplo, ser pesquisado
através de uma visão sonora ou musical e, por essa via, propondo-se como letra de uma samba, valsa
ou trovas populares? Será que os alunos empenhados nessa busca o estarão estudando menos
profundamente? Será, por exemplo, que além da linguagem linguística ou verbal, lógico-matemática,
espacial ou sonora não seria o mesmo tema um excelente desafio para se propor discussões que
envolvessem a linguagem corporal cinestésico, naturalista, inter ou intrapessoal?
Observe que qualquer conteúdo, de qualquer disciplina, pode ser analisando segundo a visão doentia
e exclusivista de uma única inteligência, mas pode também, com alunos se revezando em funções que
com o tempo de alternam, ser trabalhado de forma interdisciplinar, valendo-se de outras linguagens e,
por esse caminho, explorando outras inteligências. Percebe-se pelo exposto que usar as inteligências
múltiplas em classes populares é tão simples quanto agir com bom senso.

Mas, cuidado. Existe o bom senso de ontem e o bom senso de agora. O bom senso egoísta e
exclusivista de antigamente que buscava normatizar a humanidade, valorizando apenas uma de suas
muitas linguagens e, dessa forma, excluindo todos quantos na mesma não eram excelentes e o bom

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senso de agora que, ao admitir o aluno como singularidade holística, permite a expressão de seu saber
através de diferentes formas, exercitando diferentes inteligências."
Concluindo a síntese sobre a aplicabilidade dos fundamentos das idéias de Gardner no contexto da
realidade de nossas salas de aula, apresentamos o quando-síntese abaixo.

INTELIGÊNCIAS ALGUMAS ATIVIDADES MATERIAIS DE ENSINO AÇÃO DOCENTE


Atividades artísticas,
apresentações visuais,
Colagens, gráficos, frisas Explorar o uso de linguagens
metáforas, visualização e
do tempo, mapas, massa alternativas, solicitar a
mapas conceituais.
ESPACIAL de modelagem, argila, transferência de textos para
Concursos fotográficos,
lápis de cor, recursos desenhos, gráficos, quadros-
metáforas por meio de
táteis. Coleção de fotos. síntese
imagens, símbolos gráficos
diversos.
Solicitar o uso de movimentos
Instrumentos de do corpo para expressar
Teatro, dança, mímica, montagem, tampinhas, conhecimentos de disciplinas
CINESTÉSICA- exercícios de relaxamento, blocos, equipamentos descritivas. Exercícios sobre
CORPORAL atividades diversas que esportivos, recursos consciência física. Propostas
envolvam o uso do corpo manipuláveis, peças sobre cozinhar, costurar,
LEGO. Mapas corporais. jardinagem, realidades
virtuais.
Calculadoras, ábacos,
Desafios, problemas,
jogos matemáticos,
enigmas, atividades Empenhar-se em desenvolver
desafios que explorem a
cientificas de a capacidade de expressar
grandeza, proporções,
experimentação, desafios pensamentos através de
LÓGICO- perspectivas. Uso de
numéricos, pensamentos gráficos, busca de
MATEMÁTICA escalas diversas.
críticos. Concursos sobre proporções, médias,
Computador e, quando
resolução de problemas grandezas e outros
possível, computador fora
lógicos, criação de códigos, elementos lógicos
de uso para desmontagem
linguagens de computação.
e análise.
Excursões, atividades
Proposição de desafios que
diversas ao ar livre,
envolvam conhecimento de
experiências de
Aquários, terrários, hortas animais e plantas,
classificação animais e
coletivas, pequenos transposição de temas para
NATURALISTA vegetais, pesquisas sobre o
museus ou coleções um enfoque naturalista,
mundo animal e organização
naturalistas. organização de diários de
de ecossistemas.
campo e registros de
Caminhadas naturalistas,
atividades ao ar livre
etc.
Aprendizagem rítmica,
apresentação de corais
abordando temas escolares, Sugestão para a criação de
Gravador, coleção de
seleção e criação de paródias, organização de
fitas, instrumentos
músicas envolvendo os grupos para apresentação de
SONORA musicais, coleção de CDs.
conteúdos disciplinares. temas escolares com ritmos
Aparelhos de reprodução
Dramatizações e Concertos. diversos e uso de fundo
sonora.
Visitas a apresentações musical
musicais. Vinculação de
conceitos à música.
Explanações, debates, Livros diversos, Estímulos para pesquisas
organização de telejornais dicionários de vários tipos, bibliográficas, exploração de
ou jornais impressos ou coleção de jornais e diferentes habilidades
LINGÜISTICA
murais, jogos de palavras e revistas, portfólios sobre operatórias como sintetizar,
atividades que explorem a temas, concurso de analisar, relatar, descrever e
narração, leitura ou redação. redação, trovas e outros outras, desafios sobre

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Organização de grupos para interpretação de textos,
debates sobre filmes concursos de manchetes,
assistidos, clubes literários, trovas e poemas para
concursos linguísticos. expressar diferentes
conteúdos
Orientação individual,
exploração de pesquisas Recursos diversos para Exploração de atividades que
sobre a autoestima, autoavaliação, envolvam a significação dos
aceitação de produções organização de portfólios, fatos apreendidos no uso
INTRAPESSOAL
individualizadas, diários, materiais diário, ajuda para a
oportunidade de opções diversificados sobre contextualização do
para manifestações projetos, orientação apreendido no cotidiano
diferenciadas do pessoal de pesquisas. vivido.
conhecimento adquirido.
Trabalhos em grupo,
organização de micro
Jogos coletivos, relação
cooperativas e projetos de
de atividades sociais,
apoio comunitário, Estímulo a cooperação,
arquivo de projetos de
INTERPESSOAL organização de campanhas proposta de campanhas
ação comunitária, fontes
filantrópicas, reuniões diversas.
de apoio a ações
sociais. Propostas para
coletivas.
atividades compartilhadas,
exercícios de simulações.

3.5 Psicologia do desenvolvimento: aspectos históricos e biopsicossociais.

Psicologia do Desenvolvimento39

No século XXI psicólogos do desenvolvimento enfrentam novos desafios uma vez que as novas
concepções de atuação profissional que enfatizam a prevenção e a promoção de saúde fazem com que
profissionais de várias áreas busquem na psicologia do desenvolvimento subsídios teóricos e
metodológicos para sua prática profissional. O que está em questão é o desenvolvimento harmônico do
indivíduo, que integra não apenas um aspecto, mas todas as dimensões do desenvolvimento humano
sejam elas: biológicas, cognitivas, afetivas ou sociais.

A delimitação conceitual do campo da Psicologia do Desenvolvimento


O desenvolvimento humano envolve o estudo de variáveis afetivas, cognitivas, sociais e biológicas em
todo ciclo da vida. Desta forma faz interface com diversas áreas do conhecimento como: a biologia,
antropologia, sociologia, educação, medicina entre outras.
Tradicionalmente o estudo do desenvolvimento humano focou o estudo da criança e do adolescente,
ainda hoje muitos dos manuais de psicologia do desenvolvimento abordam apenas esta etapa da vida
dos indivíduos.
O interesse pelos anos iniciais de vida dos indivíduos tem origem na história do estudo científico do
desenvolvimento humano, que se inicia com a preocupação com os cuidados e com a educação das
crianças, e com o próprio conceito de infância como um período particular do desenvolvimento.
No entanto, este enfoque vem mudando nas últimas décadas, e hoje há um consenso de que a
psicologia do desenvolvimento humano deve focar o desenvolvimento dos indivíduos ao longo de todo o
ciclo vital. Ao ampliar o escopo de estudo do desenvolvimento humano, para além da infância e
adolescência, a psicologia do desenvolvimento acaba por fazer interface também com outras áreas da
psicologia. Só para citar algumas áreas temos: a psicologia social, personalidade, educacional, cognitiva.
Assim surge a necessidade de se delimitar esse campo de atuação, definindo o que há de específico
na psicologia do desenvolvimento humano. A necessidade de se integrar ao estudo do desenvolvimento
humano uma perspectiva interdisciplinar, que adote uma metodologia de pesquisa própria, faz com que
39
Texto adaptado de Márcia Elia da Mota, disponível em http://pepsic.bvsalud.org/

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alguns autores sugiram que o estudo desenvolvimento humano constitua um campo de atuação
independente da Psicologia, que tem sido chamado de “Ciência do Desenvolvimento Humano”.
Pesquisadores do desenvolvimento humano concordam que um dos objetos de estudo do psicólogo
do desenvolvimento é o estudo das mudanças que ocorrem na vida dos indivíduos. Papalia e Olds, por
exemplo, definem desenvolvimento como “o estudo científico de como as pessoas mudam ou como elas
ficam iguais, desde a concepção até a morte”.
A definição destes autores salienta o fato de que psicólogos do desenvolvimento estudam as
mudanças, mas não nos oferece nenhuma informação sobre questões fundamentais ao estudo do
desenvolvimento humano. O que muda? Como muda? E quando muda? Estas são perguntas frequentes
nas pesquisas sobre o desenvolvimento, e são frequentemente abordadas de forma distintas pelas
diferentes abordagens teóricas que descrevem o desenvolvimento humano.
Dizer que ao longo do tempo mudanças ocorrem na vida dos indivíduos não nos esclarece estas
questões. O tempo é apenas uma escala, não é uma variável psicológica. Portanto, é preciso entender
como as condições internas e externas ao indivíduo afetam e promovem essas mudanças. As mudanças
no desenvolvimento são adaptativas, sistemáticas e organizadas, e refletem essas situações internas e
externas ao indivíduo que tem que se adaptar a um mundo em que as mudanças são constantes.
Variáveis internas podem ser entendidas como aquelas ligadas à maturação orgânica do indivíduo, as
bases genéticas do desenvolvimento.
Recentemente, os processos inatos que promovem o desenvolvimento humano voltam a ser discutidos
por teóricos do desenvolvimento humano.
As variáveis externas são aquelas ligadas à influência do ambiente no desenvolvimento. As
abordagens sistêmicas de investigação do desenvolvimento humano há muito chamam atenção para a
importância de se entender as diversas interações que ocorrem nos múltiplos contextos em que o
desenvolvimento se dá. Incluindo-se nesta discussão uma análise do momento histórico em que o
indivíduo se desenvolve.
Biaggio argumenta que a especificidade da psicologia do desenvolvimento humano está em estudar
as variáveis externas e internas aos indivíduos que levam as mudanças no comportamento em períodos
de transição rápida (infância, adolescência e envelhecimento). Teorias contemporâneas do
desenvolvimento aceitam que as mudanças são mais marcadas em períodos de transição rápida, mas
mudanças ocorrem ao longo de toda a vida do indivíduo, não só nestes períodos. Portanto, é preciso se
ampliar o escopo do entendimento do que é o estudo do desenvolvimento humano.
Para que se leve a termo estas considerações, as pesquisas em desenvolvimento humano utilizam
metodologia específica, entre elas a mais comumente usada são os estudos longitudinais. A “International
Society for the Study of Behavioral Development” lançou em 2005 uma edição especial intitulada
“Longitudinal Research on Human Development: Approachs, Issues and New Directions”. Nesta edição
se discute as contribuições e limitações dos estudos longitudinais para a produção do conhecimento na
psicologia do desenvolvimento.
Cillessen ressalta que estudos longitudinais se aplicam as várias áreas do conhecimento não apenas
a Psicologia do Desenvolvimento. Também não se aplicam apenas a estudos de longo prazo e com
muitos indivíduos, mas na psicologia do desenvolvimento adquirem uma importância fundamental, pois
permitem que se acompanhe o desenvolvimento dos indivíduos ao longo do tempo, ao mesmo tempo em
que, controlam-se as múltiplas variáveis que afetam o desenvolvimento.
Os teóricos que trabalham na abordagem do Curso da Vida, chamam atenção para algumas das
limitações deste tipo de abordagem, que estudam apenas uma coorte de cada vez, não permitindo
inferências sobre o comportamento entre gerações. Apontam para a necessidade de incluir outras coortes
históricas em estudos sobre o desenvolvimento humano, ressaltando a necessidade de estudos
longitudinais de coorte, mais amplos que os estudos longitudinais tradicionais.
Além da Teoria do Curso da Vida, teóricos de diversas abordagens chamam a atenção para a
necessidade de se considerar as questões metodológicas específicas ao estudo do desenvolvimento e
as limitações das metodologias tradicionais Assim, pelas questões acima citadas, consideramos que uma
melhor definição de Psicologia do Desenvolvimento seria “O estudo, através de metodologia
específica e levando em consideração o contexto sócio histórico, das múltiplas variáveis, sejam
elas cognitivas, afetivas, biológicas ou sociais, internas ou externas ao indivíduo que afetam o
desenvolvimento humano ao longo da vida”.
Através da identificação dos fatores que afetam o desenvolvimento humano podemos pensar sobre
trabalhos de intervenção mais eficazes, que levem a um desenvolvimento harmônico do indivíduo. Sendo
assim, os conhecimentos gerados por essa área da psicologia trazem grandes contribuições para os
trabalhos de prevenção e promoção de saúde. Aqui a concepção de saúde adquire uma perspectiva mais
ampla e engloba os diversos contextos que fazem parte da vida dos indivíduos (escola, trabalho, família).

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1484041 E-book gerado especialmente para MAURICIO PEREIRA BARROS
O desenvolvimento humano40 se realiza em períodos que se distinguem entre si pelo predomínio de
estratégias e possibilidades específicas de ação, interação e aprendizagem.
Os períodos de desenvolvimento são, normalmente, referidos como infância, adolescência, maturidade
e velhice. É mais adequado, porém, pensarmos o processo de desenvolvimento humano em termos das
transformações sucessivas que o caracterizam, transformações que são marcadas pela evolução
biológica (que é constante para todos os seres humanos) e pela vivência cultural.

Plasticidade Cerebral
O cérebro humano apresenta uma grande plasticidade. Plasticidade é a possibilidade de formação de
conexões entre neurônios a partir das sinapses. A plasticidade se mantém pela vida toda, embora sua
amplitude varie segundo o período de formação humana. Assim é que, quanto mais novo o ser humano,
maior plasticidade apresenta. Certas conexões se fazem com uma rapidez muito grande na criança
pequena. É isto que possibilita o desenvolvimento da linguagem oral, a aprendizagem de uma ou mais
línguas maternas simultaneamente, o domínio de um instrumento musical, o desenvolvimento dos
movimentos complexos e a perícia de alguns deles, como aqueles envolvidos no ato de desenhar, de
correr, de nadar...
Consequentemente a infância é o período de maior plasticidade e isto atende, naturalmente, ao
processo intenso de crescimento e desenvolvimento que ocorre neste período. Assim, a plasticidade
atende às necessidades da espécie.
Que possibilidades concretas são estas de formação de conexões? O cérebro humano dispõe de
cerca de 100 bilhões de neurônios, sendo que cada um pode chegar a estabelecer cerca de 1000
sinapses, em certas circunstâncias ainda mais. Desta forma, as possibilidades são de trilhões de
conexões, o que significa que a capacidade de aprender de cada um de nós é absolutamente muito
ampla.
Enquanto espécie, o ser humano apresenta, desde o nascimento, uma plasticidade muito grande no
cérebro, podendo desenvolver várias formas de comportamento, aprender várias línguas, utilizar
diferentes recursos e estratégias para se inserir no meio, agir sobre ele, avaliar, tomar decisões, defender-
se, criar condições de sobrevivência ao longo de sua vida.
A plasticidade cerebral também permite que áreas do cérebro destinadas a uma função específica
possam assumir outras funções, como, por exemplo, o córtex visual no caso das crianças que nascem
cegas. Como esta parte do cérebro não será “chamada a funcionar”, pois o aparelho da visão apresenta
impedimentos (então não manda informação a partir da percepção visual para o cérebro), ela poderá
assumir outras funções.
Plasticidade cerebral é, também, a possibilidade de realizar a “interdisciplinaridade” do cérebro: áreas
desenvolvidas por meio de um tipo de atividade podem ser “aproveitadas” para aprender outros
conhecimentos ou desenvolver áreas relativas a outro tipo de atividade. Por exemplo, áreas
desenvolvidas pela música, como a de ritmo, são “aproveitadas” no ato da leitura da escrita ou a de
divisão do tempo na aprendizagem de matemática.

A ação da criança depende da maturação orgânica e das possibilidades que o meio lhe oferece: ela
não poderá realizar uma ação para a qual não tenha o substrato orgânico, assim como não fará muitas
delas, mesmo que biologicamente apta, se a organização do seu meio físico e social não propiciar sua
realização ou se os adultos não a ensinarem.
O ser humano aprende somente as formas de ação que existirem em seu meio, assim como ele
aprende somente a língua ou as línguas que aí forem faladas. As estratégias de ação e os padrões de
interação entre as pessoas são definidos pelas práticas culturais.
Isto significa que a cultura é constitutiva dos processos de desenvolvimento e de aprendizagem.
A criança se constitui enquanto membro do grupo por meio da formação de sua identidade cultural,
que possibilita a convivência e sua permanência no grupo. Simultaneamente ela constitui sua
personalidade que a caracterizará como indivíduo único.
Os comportamentos e ações privilegiados em cada cultura são, então, determinantes no processo de
desenvolvimento da criança.
A vida no coletivo sempre envolve a cultura: as brincadeiras, o faz de conta, as festas, os rituais, as
celebrações são todas situações em que a criança se constitui como ser de cultura.

40
http://portal.mec.gov.br/seb/arquivos/pdf/Ensfund/indag1.pdf

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Desenvolvimento cultural
O desenvolvimento tecnológico e o processo de globalização da informação por meio da imagem
modificaram os processos de desenvolvimento cultural por introduzirem novas formas de mediação. As
novas gerações desenvolvem-se com diferenças importantes em relação às gerações precedentes, por
meio, por exemplo, da interação com a informática, com as imagens presentes por meio urbano (várias
formas de propaganda, como cartazes, outdoors móveis). O mesmo acontece com crianças nas zonas
rurais com o advento da eletricidade e da TV, ou com crianças indígenas que passaram a experienciar o
processo de escolarização e, também, em vários casos a presença de novos instrumentos culturais como
o rádio, a TV, câmeras de vídeo, fotografia, entre outros.
O desenvolvimento do cérebro é função da cultura e dos objetos culturais existentes em um
determinado período histórico. Novos instrumentos culturais levam a novos caminhos de
desenvolvimento. O computador é um bom exemplo: modificou as formas de lidar com informações,
provocando mudanças nos caminhos da memória. A presença de novos elementos imagéticos e
cinestésicos repercute no desenvolvimento de funções psicológicas como a atenção e a imaginação.
Considerando, então, que o cérebro se desenvolve do diálogo entre a biologia da espécie e a cultura,
verifica-se que, na escola, o currículo é um fator que interfere no desenvolvimento da pessoa.
Os “conteúdos” escolhidos para o currículo irão, sem dúvida, ter um papel importante na formação. As
atividades para conduzirem às aprendizagens, precisam estar adequadas às estratégias de
desenvolvimento próprias de cada idade. Em outras palavras, a realização do currículo precisa mobilizar
algumas funções centrais do desenvolvimento humano, como a função simbólica, a percepção, a
memória, a atenção e a imaginação.

Linguagem e Imagens mentais: Percepção, Memória e Imaginação Desenvolvimento da Função


Simbólica
A partir da sua ação e interação com o mundo (a natureza, as pessoas, os objetos) e das práticas
culturais, a criança constitui o que chamamos de função simbólica, ou seja, a possibilidade de representar,
mentalmente, por símbolos o que ela experiencia, sensivelmente, no real.
O desenvolvimento da função simbólica no ser humano é de extrema importância, uma vez que é por
meio do exercício desta função que o ser humano pode construir significados e acumular conhecimentos.
Todo ensino na escola, de qualquer área do conhecimento, implica na utilização da função simbólica.
As atividades que concorrem para a formação da função simbólica variam conforme o período de
desenvolvimento. Por exemplo, o desenho e a brincadeira de faz-de-conta são atividades simbólicas
próprias da criança pequena, que antecedem a escrita: na verdade, elas criam as condições internas para
que a criança aprenda a ler e a escrever.
A linguagem escrita, a matemática, a química, a física, o sistema de notação da dança, da música são
manifestações da função simbólica. As aprendizagens escolares são apropriações de conhecimentos
formais, ou seja, conhecimentos organizados em sistemas. Sistematizar é estabelecer conceitos, ordená-
los em níveis de complexidade com regras internas que regulam a relação entre os elementos que os
compõem. Todo conhecimento formal é representado, simbolicamente, pela linguagem de cada sistema.

Por exemplo:
a) a2 = b2 + c2
b) 15 + 36 = 51
c) O gato correu atrás do cachorro.
O cachorro correu atrás do gato

Em b e c temos uma regra importante que é o valor posicional: a posição dos elementos simbólicos
determina o significado (1 e 5) 15 é diferente de 51. O mesmo se aplica ao gato que corre atrás do
cachorro, em que se explicita a ação inversa do cachorro que corre atrás do gato.
A função simbólica é a atividade mais básica das ações que acontecem na escola, tanto do educador
como do educando. Quando os elementos do currículo não mobilizam adequadamente o exercício desta
função, a aprendizagem não se efetua.
Nesta dimensão do simbólico, as artes destacam-se, pois são elas as formas mais complexas de
atividade simbólica humana. Anteriores aos conhecimentos formais, elas propiciaram a estruturação dos
movimentos e das imagens de forma que eles pudessem evoluir culturalmente para sistemas de registros.

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Percepção
A percepção é realizada pelos cinco sentidos externos. O ser humano desenvolve estes sentidos
desde que não haja impedimentos nos órgãos dos sentidos ou nas estruturas cerebrais que processam
a percepção de cada um deles. Quando isto acontece, um sentido “compensa” o outro: a pessoa
desenvolve mais o tato quando não enxerga, desenvolve mais a visão quando não ouve. Nestes casos,
também, o ser humano pode desenvolver os dois subsentidos externos que são a vibração e o calor.
Isso revela que os sentidos funcionam com interdependência, o que tem uma relevância fundamental
para os professores, pois o ensino deve mobilizar várias dimensões da percepção para que o aluno possa
“guardar” conteúdos na memória de longa duração.
Há maior empenho em perceber algo quando há algum interesse neste “algo”. Por exemplo, quando
alguém ouve uma música de um cantor de quem gosta muito, fica atento e evoca a melodia ou a letra.
Se for uma canção nova e se reconhece a voz do cantor, mobiliza os processos mentais da memória
auditiva a partir da percepção auditiva, ou seja, seleciona a canção, destacando-a das outras informações
sonoras e/ou ruídos presentes no ambiente.
Por outro lado, a percepção pode criar um interesse novo. Ao ser introduzida a um conhecimento novo,
uma pessoa pode se interessar ou não por ele, dependendo das estratégias utilizadas por quem o
introduz. Assim, em sala de aula, não é somente o conteúdo que motiva, mas, sobretudo, como o
professor trabalha com o conteúdo, seja ele da escrita, artes ou ciências.
A percepção visual é o processamento de atributos do objeto como cor, forma e tamanho. Ela acontece
em regiões do córtex cerebral e há fortes indicações de que estas regiões sejam as mesmas ou estejam
muito próximas daquelas que “guardariam” a memória dos objetos. Desta forma, percepção e memória
estão muito próximas nas aprendizagens escolares.

Memória
Toda aprendizagem envolve a memória. Todo ser humano tem memória e utiliza seus conteúdos a
todo o momento. São três os movimentos da memória: o de arquivar, o de evocar e o de esquecer. Ao
entrar em contato com algo novo, o ser humano pode criar novas memórias, ou seja, arquiva este
conhecimento, experiência ou ideia em sua memória de longa duração. As impressões gravadas na
memória de longa duração, a partir das experiências vividas, podem ser “evocadas”, trazidas à
consciência. Outras experiências, informações, vivências, imagens e ideias são esquecidas.
Sabemos que estes movimentos têm uma participação do sistema límbico no qual se originam nossas
emoções. A memória é modulada pela emoção. Isto quer dizer que os estados emocionais podem
“interferir”, facilitando ou reforçando a formação de novas memórias, assim como podem, também,
enfraquecer ou dificultar a formação de uma nova memória.
Quanto ao tempo, os tipos de memória são muito importantes para o educador, pois as aprendizagens
escolares dependem da formação de novas memórias de longa duração. Muitas vezes, no entanto, os
conteúdos ficam no nível da curta duração e desaparecem rapidamente. O desafio da pedagogia é
formular metodologias de ensino que transformem esta primeira ação da memória (curta duração) em
memórias de longa duração. É importante mencionar aqui que temos, também, a possibilidade de formar
uma memória ultrarrápida que desaparece após a sua utilização, como quando, por exemplo, gravamos
um número de telefone para discá-lo e, logo em seguida, já o esquecemos.
Quanto à natureza, temos vários tipos de memória. Temos a memória implícita, a memória explícita e
a operacional. A memória explícita pode ser semântica ou episódica.
Para as aprendizagens escolares, precisam ser mobilizadas a memória explicita semântica e a
memória operacional.
Para a formação de novas memórias dos conteúdos escolares ao aluno precisa, desde o início da
escolarização, ser ensinado o que fazer e como para aprender os conhecimentos envolvidos nas
aprendizagens escolares. O aluno precisa ser capaz de “refazer” o processo da aprendizagem. Refazer
implica tanto em recapitular o conteúdo ensinado, como em retomar as atividades (humanas) que o
levaram a “guardar” o conteúdo na memória de longa duração.

Memória explícita semântica


Também chamada de declarativa, a memória explícita semântica inclui as memórias que podem ser
explicitadas pela linguagem. Este tipo de memória engloba aquilo que pode ser lembrado por meio das
imagens, símbolos ou sistemas simbólicos. A capacidade da memória declarativa está ligada à
organização de informações em padrão.
Pesquisas demonstram que o ser humano se lembra “mais facilmente” daquilo que está organizado
segundo regras. Isto implica na existência de padrões internos. Todas as linguagens são organizadas por
padrões: a linguagem das ciências, das várias áreas do conhecimento, a linguagem escrita, a matemática,

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a cartográfica, a linguagem da dança, da música. Toda atividade artística também depende de utilização
de elementos que se organizam em padrões, que têm regras próprias em cada forma de arte.
Na escrita, os padrões aparecem nas cinco dimensões da linguagem, embora apareçam, mais
fortemente, na sintaxe. Por isto, a sintaxe é o elemento forte, o instrumentador da língua escrita. A palavra
solta é um símbolo, a palavra na construção sintática surge como estrutura. Na linguagem oral humana,
o eixo forte do padrão é o verbo. Há maior resiliência no cérebro para os símbolos que representam a
ação humana, uma vez que o movimento é o grande recurso na espécie para o desenvolvimento cultural
e tecnológico, além de ser a matéria bruta primeira da comunicação entre humanos e de expressão das
emoções.
As pessoas tendem a memorizar, mais facilmente, aquilo em que elas conseguem aplicar padrões.
Para as aprendizagens escolares isto é fundamental: o ensino bem sucedido é aquele que
“instrumentaliza” a pessoa para construir, aplicar, reconhecer e “manipular” padrões.

Memória operacional
Como o próprio nome diz, a memória operacional se ocupa das operações, ou seja, um sistema de
ações organizadas, segundo a natureza do comportamento. Por exemplo, está na memória operacional
o comportamento de andar, de dirigir, de dançar. São comportamentos que se efetuam, muito
rapidamente, para os quais não há “tempo” para comandos do cérebro. São comportamentos que têm
uma ordem de movimentos a ser seguida e esta ordem já está “fixada” na memória.
Na memória operacional estão as conjugações verbais, isto é, os tempos futuro, presente e passado
do verbo. Assim, a organização da ação no tempo se realiza com a participação deste tipo de memória.
Este fato tem implicações para as aprendizagens escolares. Com estas descobertas somos levados a
rever o ensino da sintaxe em português: a gramática é necessária para o aluno, pois fornece estrutura
para a apropriação e organização da linguagem escrita e a organização das informações em todas as
matérias.

Imaginação - A Capacidade Imaginativa na Espécie Humana


Se considerarmos a evolução de nossa espécie, veremos que ela é pautada pela invenção, ou seja,
pela criação de objetos, de sistemas, de linguagens, tecnologia, teorias, ciência, arte, códigos etc. Toda
produção cultural é resultante de um processo cumulativo de invenções, pequenas e grandes, que dão
base para as invenções futuras.
A comunicação, atividade primordial da espécie, ganha a cada geração novos processos, novas
tecnologias. O ser humano dedica grande parte de sua criatividade a ampliar e desenvolver meios de
comunicação e meios de transporte que facilitem os processos comunicativos e que tornem mais ágeis
os deslocamentos das pessoas.
A possibilidade de criar depende, na nossa espécie, da imaginação, função psicológica pela qual nós
somos capazes de unir elementos percebidos e experiências em novas redes de conexão. O
funcionamento da imaginação e seu desenvolvimento, embora relacionados às outras funções
psicológicas superiores, têm uma grande autonomia e se manifestam tanto na ação como no ato de
aprender.
Desta forma, podemos dizer que para as aprendizagens escolares a imaginação desempenha um
papel central e deve ser considerada no planejamento, na alocação de tempo das atividades dentro e
fora da sala de aula, nas situações comuns do cotidiano escolar. Os alunos devem, também, ser
acompanhados avaliativamente na evolução de sua imaginação.

A ligação entre imaginação e memória


Vygotsky trata da diferença entre reprodução e criação: ambas atividades têm apoio na memória, mas
diferem pelo alcance temporal. Reproduzir algo, mentalmente, se apoia na experiência sensível anterior.
Por exemplo, construo uma imagem mental da casa onde moravam meus avós, pelos elementos
gravados na memória, mas crio uma imagem mental da casa dos avós de uma personagem em um
romance a partir dos elementos oferecidos pelo autor. Ou seja, no segundo caso uso a imaginação para
criar este espaço utilizando, com certeza, elementos percebidos, anteriormente, mas que se combinam
entre si, de acordo com a relação dialógica estabelecida com o texto no ato da leitura, diferentemente, do
primeiro caso em que busco a fidedignidade da imagem mental, tendo a casa concreta como referencial.

Vygotsky coloca que a primeira experiência se apoia na análise do passado. Ela é uma reprodução do
que se viveu, enquanto que no segundo é uma realização do presente projetada no futuro. A criação
literária dá esta possibilidade de partilhamento na criação, pois possibilita ao leitor a superação do texto

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1484041 E-book gerado especialmente para MAURICIO PEREIRA BARROS
para a criação das imagens de cada personagem, que é constituída pelos dados oferecidos de sua
personalidade, de suas ações, de suas formas de pensamento, criação de imagens do contexto.
A imaginação na realidade não se “desprega” da memória, mas recria com os elementos da memória.
Imaginar implica, portanto, em se liberar das conexões que estão feitas dos elementos percebidos, para
“reutilizar” estes elementos em outras configurações.
Temos aí duas implicações importantes: primeiramente, que a imaginação não é dada na espécie, é
construída. Segundo, que ela é parte integrante do processo de aprendizagem, porque aprender significa,
exatamente, ser capaz de estabelecer conexões entre informações, construindo significado. Podemos ver
que, neste segundo caso, a imaginação é base para o estabelecimento destas novas redes, uma vez que
ela é a função psicológica que estabelece relações significativas entre elementos que não estavam
conectados entre si. A imaginação cria condições de aprendizagem.
Temos assim que a relação entre imaginação e memória tem sentido duplo: a base para o
funcionamento da imaginação são os elementos que estão contidos na memória e o próprio
funcionamento da imaginação desenvolve a memória (por meio do processo imaginativo, novas
mediações semióticas são realizadas, dando à pessoa uma maior complexidade aos sistemas contidos
na memória de longa duração).

Porque a imaginação é importante na aprendizagem?

1. Ela está na origem da construção do conhecimento que vamos ensinar.


O conhecimento científico e o conhecimento estético foram produzidos a partir do exercício da
imaginação humana nos vários períodos históricos.

2. Ela está na origem do conhecimento que será construído pelo aluno.


A imaginação motiva. Muitos educadores concordarão que a motivação é um fator importante para o
educando aprender. Motivar implica em mobilização para, interesse em, envolvimento com o objeto de
aprendizagem.
Esta disponibilidade para aprender envolve, do ponto de vista psicológico, a imaginação.

Por exemplo, podemos motivar o aluno para um fenômeno científico que será estudado com o
concurso da mobilização da imaginação: como será que a energia elétrica surge na represa? Como será
que a luz chega à lâmpada?
Que será que acontece com a semente debaixo da terra? Como será que o computador guarda tanta
informação? Porque o rio muda de cor?
Levantar hipóteses para qualquer destas questões implica em ter liberdade de pensamento. Isto é, a
capacidade imaginativa no ser humano tem como base a liberação da experiência sensível imediata,
desta forma a pessoa pode lidar, livremente, com o acervo mental que detém de imagens, informações,
sensações colhidas nas várias experiências de vida, juntamente com as emoções e sentimentos que as
acompanharam.
O desenvolvimento humano e a aprendizagem, na escola, envolvem, precisamente, esta dialética de
receber informações por meio dos sentidos e ter a possibilidade de ir além delas pelas funções mentais.

O desenvolvimento humano na teoria de Piaget


De acordo com a publicação de Marcia Regina Terra41 o estudo do desenvolvimento do ser humano
constitui uma área do conhecimento da Psicologia em que concentram-se no esforço de compreender o
homem em todos os seus aspectos, englobando fases desde o nascimento até o seu mais completo grau
de maturidade e estabilidade. Tal esforço, conforme mostra a linha evolutiva da Psicologia, tem culminado
na elaboração de várias teorias que procuram reconstituir, a partir de diferentes metodologias e pontos
de vistas, as condições de produção da representação do mundo e de suas vinculações com as visões
de mundo e de homem dominantes em cada momento histórico da sociedade.
Assim, dentre essas tantas teorias tem-se a de Jean Piaget, que, como as demais, busca compreender
o desenvolvimento do ser humano. No entanto, ela se destaca de outras pelo seu caráter inovador quando
introduz uma 'terceira visão' representada pela linha interacionista que constitui uma tentativa de
integrar as posições dicotômicas de duas tendências teóricas que permeiam a Psicologia em geral
- o materialismo mecanicista e o idealismo - ambas marcadas pelo antagonismo inconciliável de
seus postulados que separam de forma estanque o físico e o psíquico.

41
http://www.unicamp.br/iel/site/alunos/publicacoes/

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Um outro ponto importante a ser considerado, segundo estudiosos, é o de que o modelo piagetiano
prima pelo rigor científico de sua produção, ampla e consistente ao longo de 70 anos, que trouxe
contribuições práticas importantes, principalmente, ao campo da Educação - muito embora, curiosamente
aliás, a intenção de Piaget não tenha propriamente incluído a ideia de formular uma teoria específica de
aprendizagem.
Tendo em vista o objetivo da teoria piagetiana que de acordo com Coll e Gillièron é "compreender
como o sujeito se constitui enquanto sujeito cognitivo, elaborador de conhecimentos válidos" cabe
algumas considerações sobre o método piagetiano sobre o desenvolvimento humano.

1. A visão interacionista de Piaget: a relação de interdependência entre o homem e o objeto do


conhecimento
Introduzindo uma terceira visão teórica representada pela linha interacionista, as ideias de Piaget
contrapõem-se, conforme mencionamos mais acima, às visões de duas correntes antagônicas e
inconciliáveis que permeiam a Psicologia em geral: o objetivismo e o subjetivismo. Ambas as correntes
são derivadas de duas grandes vertentes da Filosofia (o idealismo e o materialismo mecanicista) que, por
sua vez, são herdadas do dualismo radical de Descartes que propôs a separação estanque entre corpo
e alma, id est, entre físico e psíquico, ou seja, para ele havia uma ruptura radical entre o corpo e a alma
que eram distintos e independentes entre si.
Assim sendo, a Psicologia objetivista, privilegia o dado externo, afirmando que todo conhecimento
provém da experiência; e a Psicologia subjetivista, em contraste, calcada no substrato psíquico, entende
que todo conhecimento é anterior à experiência, reconhecendo, portanto, a primazia do sujeito sobre o
objeto.
Desta forma as duas teorias distintas entre si privilegiam cada uma a sua proposta ora o subjetivismo,
as experiências internas, as vivências e tudo que é inerente ao indivíduo e ora o objetivismo com tudo
que é externo ao indivíduo não havendo assim um meio termo entre ambas.
Sendo assim, considerando insuficientes essas duas posições para explicar o processo evolutivo da
filogenia humana, Piaget formula o conceito de epigênese, argumentando que "o conhecimento não
procede nem da experiência única dos objetos nem de uma programação inata pré-formada no sujeito,
mas de construções sucessivas com elaborações constantes de estruturas novas".
Quer dizer, o processo evolutivo da filogenia humana tem uma origem biológica que é ativada pela
ação e interação do organismo com o meio ambiente - físico e social - que o rodeia, significando entender
com isso que as formas primitivas da mente, biologicamente constituídas, são reorganizadas pela psique
socializada, ou seja, existe uma relação de interdependência entre o sujeito conhecedor e o objeto a
conhecer.
Esse processo, por sua vez, se efetua através de um mecanismo auto regulatório que consiste
no processo de equilibração progressiva do organismo com o meio em que o indivíduo está
inserido.
Deste modo considera-se que as experiências internas, inatas do indivíduo em relação direta
com o meio externo é o que produz o conhecimento, ou seja, o social em conjunto com o individual
é que forma a estrutura completa do ser humano e, a cada novo contato com o meio existem
reorganizações para que se atinja novamente o estado de equilíbrio o indivíduo com o meio que o
cerca.

Psicologia Objetivista Psicologia Subjetivista Interacionismo


Materialismo mecanicista Idealismo Piaget
Privilegia o psiquismo, para
Privilegia o dado externo,
ela o conhecimento é
assim todo o conhecimento É um “meio termo” entre o
anterior à experiência, ou
vem da experiências do objetivismo e o subjetivismo.
seja, é o indivíduo que “age”
indivíduo.
sobre o objeto.
É o meio ambiente e objetos Nessa visão o processo evolutivo
que cercam o indivíduo bem As vivências inatas e humano tem uma origem biológica
como suas experiências inerentes ao ser humano que que é ativada pela ação e interação
externas que possibilitam o possibilitam o conhecimento. do organismo com o meio ambiente -
conhecimento físico e social - que o rodeia.

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2. O processo de equilibração: a busca pelo pensamento lógico
Pode-se dizer que o "sujeito epistêmico" protagoniza o papel central do modelo piagetiano, pois a
grande preocupação da teoria é desvendar os mecanismos processuais do pensamento do homem,
desde o início da sua vida até a idade adulta.
Nesse sentido, a compreensão dos mecanismos de constituição do conhecimento, na concepção de
Piaget, equivale à compreensão dos mecanismos envolvidos na formação do pensamento lógico,
matemático. Como lembra La Taille, "(...) a lógica representa para Piaget a forma final do equilíbrio das
ações. Ela é um sistema de operações, isto é, de ações que se tornaram reversíveis e passíveis de serem
compostas entre si'".
Com base nisso Piaget sustenta que a gênese do conhecimento está no próprio sujeito, ou seja, o
pensamento lógico não é inato ou tampouco externo ao organismo mas é fundamentalmente construído
na interação homem-objeto, assim o desenvolvimento da filogenia humana se dá através de um
mecanismo auto regulatório que tem como base condições biológicas (que são inatas) e que são ativadas
pela ação e interação do organismo com o meio ambiente tanto físico quanto social.
Está implícito nessa ótica de Piaget que o homem é possuidor de uma estrutura biológica que o
possibilita desenvolver o mental, no entanto, esse fato por si só não assegura o desencadeamento de
fatores que propiciarão o seu desenvolvimento, haja vista que este só acontecerá a partir da interação do
sujeito com o objeto a conhecer. Por sua vez, a relação com o objeto, embora essencial, da mesma forma
também não é uma condição suficiente ao desenvolvimento cognitivo humano, uma vez que para tanto é
preciso, ainda, o exercício do raciocínio. Por assim dizer, a elaboração do pensamento lógico demanda
um processo interno de reflexão. Tais aspectos deixam à mostra que, ao tentar descrever a origem da
constituição do pensamento lógico, Piaget focaliza o processo interno dessa construção.
Simplificando ao máximo, o desenvolvimento humano, no modelo piagetiano, é explicado segundo o
pressuposto de que existe uma conjuntura de relações interdependentes entre o sujeito conhecedor e o
objeto a conhecer. Esses fatores que são complementares envolvem mecanismos bastante complexos e
intrincados que englobam o entrelaçamento de fatores que são complementares, tais como: o processo
de maturação do organismo, a experiência com objetos, a vivência social e, sobretudo, a equilibração do
organismo ao meio.
O conceito de equilibração torna-se especialmente marcante na teoria de Piaget pois ele representa o
fundamento que explica todo o processo do desenvolvimento humano. Trata-se de um fenômeno que
tem, em sua essência, um caráter universal, já que é de igual ocorrência para todos os indivíduos da
espécie humana mas que pode sofrer variações em função de conteúdos culturais e do meio em que o
indivíduo está inserido. Nessa linha de raciocínio, o trabalho de Piaget leva em conta a atuação de dois
elementos básicos ao desenvolvimento humano: os fatores invariantes e os fatores variantes.

(a) Os fatores invariantes: Piaget postula que, ao nascer, o indivíduo recebe como herança uma série
de estruturas biológicas - sensoriais e neurológicas - que permanecem constantes ao longo da sua vida.
São essas estruturas biológicas que irão predispor o surgimento de certas estruturas mentais. Em vista
disso, na linha piagetiana, considera-se que o indivíduo carrega consigo duas marcas inatas que são a
tendência natural à organização e à adaptação, significando entender, portanto, que, em última instância,
o 'motor' do comportamento do homem é inerente ao ser.
(b) Os fatores variantes: são representados pelo conceito de esquema que constitui a unidade básica
de pensamento e ação estrutural do modelo piagetiano, sendo um elemento que se transforma no
processo de interação com o meio, visando à adaptação do indivíduo ao real que o circunda. Com isso,
a teoria psicogenética deixa à mostra que a inteligência não é herdada, mas sim que ela é construída no
processo interativo entre o homem e o meio ambiente (físico e social) em que ele estiver inserido.
Em síntese, pode-se dizer que, para Piaget, o equilíbrio é o norte que o organismo almeja mas que
paradoxalmente nunca alcança, haja vista que no processo de interação podem ocorrer desajustes do
meio ambiente que rompem com o estado de equilíbrio do organismo, eliciando esforços para que a
adaptação se restabeleça. Essa busca do organismo por novas formas de adaptação envolvem dois
mecanismos que apesar de distintos são indissociáveis e que se complementam: a assimilação e a
acomodação.
A assimilação consiste na tentativa do indivíduo em solucionar uma determinada situação a
partir da estrutura cognitiva que ele possui naquele momento específico da sua existência.
Representa um processo contínuo na medida em que o indivíduo está em constante atividade de
interpretação da realidade que o rodeia e, consequentemente, tendo que se adaptar a ela. Como o
processo de assimilação representa sempre uma tentativa de integração de aspectos experienciais aos
esquemas previamente estruturados, ao entrar em contato com o objeto do conhecimento o indivíduo

. 94
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busca retirar dele as informações que lhe interessam deixando outras que não lhe são tão importantes,
visando sempre a restabelecer a equilibração do organismo.
A acomodação, por sua vez, consiste na capacidade de modificação da estrutura mental antiga
para dar conta de dominar um novo objeto do conhecimento. Quer dizer, a acomodação representa
"o momento da ação do objeto sobre o sujeito" emergindo, portanto, como o elemento
complementar das interações sujeito-objeto.
Em síntese, toda experiência é assimilada a uma estrutura de ideias já existentes (esquemas)
podendo provocar uma transformação nesses esquemas, ou seja, gerando um processo
de acomodação.
Como observa Rappaport, os processos de assimilação e acomodação são complementares e acham-
se presentes durante toda a vida do indivíduo e permitem um estado de adaptação intelectual (...) É muito
difícil, se não impossível, imaginar uma situação em que possa ocorrer assimilação sem acomodação,
pois dificilmente um objeto é igual a outro já conhecido, ou uma situação é exatamente igual a outra.
Vê-se nessa ideia de "equilibração" de Piaget a marca da sua formação como biólogo que o levou a
traçar um paralelo entre a evolução biológica da espécie e as construções cognitivas. Tal processo pode
ser representado pelo seguinte processo:

Dessa perspectiva, o processo de equilibração pode ser definido como um mecanismo de organização
de estruturas cognitivas em um sistema coerente que visa a levar o indivíduo a construção de uma forma
de adaptação à realidade. Haja vista que o "objeto nunca se deixa compreender totalmente", o conceito
de equilibração sugere algo móvel e dinâmico, na medida em que a constituição do conhecimento coloca
o indivíduo frente a conflitos cognitivos constantes que movimentam o organismo no sentido de resolvê-
los.
Em última instância, a concepção do desenvolvimento humano, na linha piagetiana, deixa ver que é
no contato com o mundo que a matéria bruta do conhecimento é 'arrecadada', pois que é no processo de
construções sucessivas resultantes da relação sujeito-objeto que o indivíduo vai formar o pensamento
lógico.
É bom considerar, ainda, que, na medida em que toda experiência leva em graus diferentes a um
processo de assimilação e acomodação, trata-se de entender que o mundo das ideias, da cognição, é
um mundo inferencial. Para avançar no desenvolvimento é preciso que o ambiente promova condições
para transformações cognitivas, id est, é necessário que se estabeleça um conflito cognitivo que demande
um esforço do indivíduo para superá-lo a fim de que o equilíbrio do organismo seja restabelecido, e assim
sucessivamente.
No entanto, esse processo de transformação vai depender sempre de como o indivíduo vai elaborar
e assimilar as suas interações com o meio, isso porque o estado conquistado na equilibração do
organismo reflete as elaborações possibilitadas pelos níveis de desenvolvimento cognitivo que o
organismo detém nos diversos estágios da sua vida.
Deste modo, por toda a vida do indivíduo ele passa por processos de assimilação e acomodação
buscando atingir o estado de equilibração, porém a conquista desse estado está diretamente relacionada
com os níveis de desenvolvimento do indivíduo nos diversos estágios de sua vida.

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A esse respeito, para Piaget, os modos de relacionamento com a realidade são divididos em 4 períodos
distintos, no processo evolutivo da espécie humana que são caracterizados "por aquilo que o indivíduo
consegue fazer melhor" no decorrer das diversas faixas etárias ao longo do seu processo de
desenvolvimento. São eles:

- 1º período: Sensório-motor (0 a 2 anos)


- 2º período: Pré-operatório (2 a 7 anos)
- 3º período: Operações concretas (7 a 11 ou 12 anos)
- 4º período: Operações formais (11 ou 12 anos em diante)

Cada uma dessas fases é caracterizada por formas diferentes de organização mental que possibilitam
as diferentes maneiras do indivíduo relacionar-se com a realidade que o rodeia. De uma forma geral,
todos os indivíduos passam por esses períodos na mesma sequência, porém o início e o término de cada
uma delas pode sofrer variações em função das características da estrutura biológica de cada indivíduo
e da riqueza (ou não) dos estímulos proporcionados pelo meio ambiente em que ele estiver inserido. Por
isso mesmo é que esta forma de divisão nessas faixas etárias é uma referência, e não uma norma rígida.

3. Os Estágios Cognitivos Segundo Piaget42


Piaget, quando descreve a aprendizagem, tem um enfoque diferente do que normalmente se atribui à
esta palavra. Piaget separa o processo cognitivo inteligente em duas palavras: aprendizagem e
desenvolvimento. Para Piaget, segundo Macedo, a aprendizagem refere-se à aquisição de uma resposta
particular, aprendida em função da experiência, obtida de forma sistemática ou não. Enquanto que o
desenvolvimento seria uma aprendizagem de fato, sendo este o responsável pela formação dos
conhecimentos.

Sensório-motor
Para Piaget o universo que circunda a criança é conquistado mediante a percepção e os movimentos
(como a sucção, o movimento dos olhos, por exemplo).
Neste estágio, a partir de reflexos neurológicos básicos, o bebê começa a construir esquemas de ação
para assimilar mentalmente o meio, é nesse período que a criança começa a discriminar ainda que de
forma pouco desenvolvida o meio que o cerca.
Segundo Lopes, as noções de espaço e tempo são construídas pela ação, configurando assim, uma
inteligência essencialmente prática, ou seja, é no contato direto com o objeto que o bebe começa a
construir a noção de espaço e de tempo de forma que ainda não há, neste período, uma construção
simbólica desenvolvida.
Considerando que esse período é marcado pela construção prática das noções de objeto, espaço,
causalidade e é assim que os esquemas vão "pouco a pouco, diferenciando-se e integrando-se, no
mesmo tempo em que o sujeito vai se separando dos objetos podendo, por isso mesmo, interagir com
eles de forma mais complexa." Nitzke diz que o contato com o meio é direto e imediato, sem
representação ou pensamento.

Exemplos: O bebê pega o que está em sua mão; "mama" o que é posto em sua boca; "vê" o que está
diante de si. Aprimorando esses esquemas, é capaz de ver um objeto, pegá-lo e levá-lo a boca.

Pré-operatório
Para Piaget, o que marca a passagem do período sensório-motor para o pré-operatório é o
aparecimento da função simbólica ou semiótica, ou seja, é a emergência da linguagem. Assim, conforme
demonstram as pesquisas psicogenéticas, a emergência da linguagem acarreta modificações importantes
em aspectos cognitivos, afetivos e sociais da criança, uma vez que ela possibilita as interações
interindividuais e fornece, principalmente, a capacidade de trabalhar com representações para atribuir
significados à realidade. Tanto é assim, que a aceleração do alcance do pensamento neste estágio do
desenvolvimento, é atribuída, em grande parte, às possibilidades de contatos interindividuais fornecidos
pela linguagem.
É nesta fase que surge, na criança, a capacidade de substituir um objeto ou acontecimento por uma
representação, e esta substituição é possível, conforme Piaget, graças à função simbólica. Assim este
estágio é também muito conhecido como o estágio da Inteligência Simbólica.

42
Tafner, M. A construção do conhecimento segundo PIAGET. s/d. Em http://www.cerebromente.org.br/

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Contudo, Macedo lembra que a atividade sensório-motor não está esquecida ou abandonada, mas
refinada e mais sofisticada, pois verifica-se que ocorre uma crescente melhoria na sua aprendizagem,
permitindo que a mesma explore melhor o ambiente, fazendo uso de mais e mais sofisticados movimentos
e percepções intuitivas.

A criança deste estágio:


- É egocêntrica, centrada em si mesma, e não consegue se colocar, abstratamente, no lugar do outro.
- Não aceita a ideia do acaso e tudo deve ter uma explicação (é fase dos "por quês").
- Já pode agir por simulação, "como se".
- Possui percepção global sem discriminar detalhes.
- Deixa se levar pela aparência sem relacionar fatos.

Exemplos: Mostram-se para a criança, duas bolinhas de massa iguais e dá-se a uma delas a forma de
salsicha. A criança nega que a quantidade de massa continue igual, pois as formas são diferentes. Não
relaciona as situações.

Operatório-concreto
Conforme Nitzke, neste estágio a criança desenvolve noções de tempo, espaço, velocidade, ordem,
casualidade,..., sendo então capaz de relacionar diferentes aspectos e abstrair dados da realidade.
Apesar de não se limitar mais a uma representação imediata, depende do mundo concreto para abstrair.
Um importante conceito desta fase é o desenvolvimento da reversibilidade, ou seja, a capacidade da
representação de uma ação no sentido inverso de uma anterior, anulando a transformação observada.

Exemplos: Despeja-se a água de dois copos em outros, de formatos diferentes, para que a criança
diga se as quantidades continuam iguais. A resposta é afirmativa uma vez que a criança já diferencia
aspectos e é capaz de "refazer" a ação.

Operatório-formal
De acordo com a tese piagetiana, ao atingir esta fase, o indivíduo adquire a sua forma final de
equilíbrio, ou seja, ele consegue alcançar o padrão intelectual que persistirá durante a idade adulta. Isso
não quer dizer que ocorra uma estagnação das funções cognitivas, a partir do ápice adquirido na
adolescência, como enfatiza Rappaport, "esta será a forma predominante de raciocínio utilizada pelo
adulto. Seu desenvolvimento posterior consistirá numa ampliação de conhecimentos tanto em extensão
como em profundidade, mas não na aquisição de novos modos de funcionamento mental".
A representação agora permite à criança uma abstração total, não se limitando mais à representação
imediata e nem às relações previamente existentes.
Agora a criança é capaz de pensar logicamente, formular hipóteses e buscar soluções, sem depender
mais só da observação da realidade. Em outras palavras, as estruturas cognitivas da criança alcançam
seu nível mais elevado de desenvolvimento e tornam-se aptas a aplicar o raciocínio lógico a todas as
classes de problemas.

Exemplos: Se lhe pedem para analisar um provérbio como "de grão em grão, a galinha enche o papo",
a criança trabalha com a lógica da ideia (metáfora) e não com a imagem de uma galinha comendo grãos.

4. As consequências do modelo piagetiano para a ação pedagógica


Conforme mencionado anteriormente, a teoria psicogenética de Piaget não tinha como objetivo
principal propor uma teoria de aprendizagem. A esse respeito, Coll faz a seguinte observação: "ao que
se sabe, ele nunca participou diretamente nem coordenou uma pesquisa com objetivos pedagógicos".
Não obstante esse fato, de forma contraditória aos interesses previstos, portanto, o modelo piagetiano,
curiosamente, veio a se tornar uma das mais importantes diretrizes no campo da aprendizagem escolar,
por exemplo, nos USA, na Europa e no Brasil, inclusive.
De acordo com Coll as tentativas de aplicação da teoria genética no campo da aprendizagem são
numerosas e variadas, no entanto os resultados práticos obtidos com tais aplicações não podem ser
considerados tão frutíferos. Uma das razões da difícil penetração da teoria genética no âmbito da escola
deve-se, principalmente, segundo o autor, "ao difícil entendimento do seu conteúdo conceitual como pelos
método de análise formalizante que utiliza e pelo estilo às vezes 'hermético' que caracteriza as
publicações de Piaget". O autor ressalta, também, que a aplicação educacional da teoria genética tem
como fatores complicadores, entre outros:

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a) as dificuldades de ordem técnica, metodológicas e teóricas no uso de provas operatórias como
instrumento de diagnóstico psicopedagógico, exigindo um alto grau de especialização e de prudência
profissional, a fim de se evitar os riscos de sérios erros;
b) a predominância no "como" ensinar coloca o objetivo do "o quê" ensinar em segundo plano,
contrapondo-se, dessa forma, ao caráter fundamental de transmissão do saber acumulado culturalmente
que é uma função da instituição escolar, por ser esta de caráter preeminentemente político-metodológico
e não técnico como tradicionalmente se procurou incutir nas ideias da sociedade;
c) a parte social da escola fica prejudicada uma vez que o raciocínio por trás da argumentação de que
a criança vai atingir o estágio operatório secundariza a noção do desenvolvimento do pensamento crítico;
d) a ideia básica do construtivismo postulando que a atividade de organização e planificação da
aquisição de conhecimentos estão à cargo do aluno acaba por não dar conta de explicar o caráter da
intervenção por parte do professor;
e) a ideia de que o indivíduo apropria os conteúdos em conformidade com o desenvolvimento das suas
estruturas cognitivas estabelece o desafio da descoberta do "grau ótimo de desequilíbrio", ou seja, o
objeto a conhecer não deve estar nem além nem aquém da capacidade do aprendiz conhecedor.
Por outro lado, como contribuições contundentes da teoria psicogenética podem ser citados, por
exemplo:
a) a possibilidade de estabelecer objetivos educacionais uma vez que a teoria fornece parâmetros
importantes sobre o 'processo de pensamento da criança' relacionados aos estádios do desenvolvimento;
b) em oposição às visões de teorias behavioristas que consideravam o erro como interferências
negativas no processo de aprendizagem, dentro da concepção cognitivista da teoria psicogenética, os
erros passam a ser entendidos como estratégias usadas pelo aluno na sua tentativa de aprendizagem de
novos conhecimentos (PCN);
c) uma outra contribuição importante do enfoque psicogenético foi lançar luz à questão dos diferentes
estilos individuais de aprendizagem; (PCN); entre outros.

Em resumo, conforme aponta Coll, as relações entre teoria psicogenética x educação, apesar dos
complicadores decorrentes da "dicotomia entre os aspectos estruturais e os aspectos funcionais da
explicação genética" e da tendência dos projetos privilegiarem, em grande parte, um reducionismo
psicologizante em detrimento ao social, pode-se considerar assim que a teoria psicogenética trouxe
contribuições importantes ao campo da aprendizagem escolar.

Origens do pensamento e da língua e o significado das palavras e a formação de conceitos de


acordo com Vygotsky43
Assim como no reino animal, para o ser humano pensamento e linguagem têm origens diferentes.
Inicialmente o pensamento não é verbal e a linguagem não é intelectual.
Convém ressaltar porém que o desenvolvimento da linguagem e do pensamento se cruzam, assim
com cerca dos dois anos de idade as curvas de desenvolvimento do pensamento e da linguagem, até
então separadas, encontram-se para, a partir daí, dar início a uma nova forma de comportamento. É a
partir deste ponto que o pensamento começa a se tornar verbal e a linguagem racional. Inicialmente a
criança aparenta usar linguagem apenas para interação superficial em seu convívio, mas, a partir de certo
ponto, esta linguagem penetra no subconsciente para se constituir na estrutura do pensamento da
criança. Sendo assim se torna possível à criança utilizar a linguagem de forma racional, atribuindo-lhe
significados.
A partir do momento que a criança descobre que tudo tem um nome, cada novo objeto que surge
representa um problema que a criança resolve atribuindo-lhe um nome. Quando lhe falta a palavra para
nomear este novo objeto, a criança recorre ao adulto. Esses significados básicos de palavras assim
adquiridos funcionarão como embriões para a formação de novos e mais complexos conceitos.

Pensamento, linguagem e desenvolvimento intelectual


De acordo com Vygotsky, todas as atividades cognitivas básicas do indivíduo ocorrem de acordo com
sua história social e acabam se constituindo no produto do desenvolvimento histórico-social de sua
comunidade. Portanto, as habilidades cognitivas e as formas de estruturar o pensamento do indivíduo
não são determinadas por fatores congênitos. São, isto sim, resultado das atividades praticadas de acordo
com os hábitos sociais da cultura em que o indivíduo se desenvolve. Consequentemente, a história da
sociedade na qual a criança se desenvolve e a história pessoal desta criança são fatores cruciais que vão
determinar sua forma de pensar. Neste processo de desenvolvimento cognitivo, a linguagem tem papel

43
Texto adaptado disponível em http://www.ebooksbrasil.org/eLibris/vigo.html

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crucial na determinação de como a criança vai aprender a pensar, uma vez que formas avançadas de
pensamento são transmitidas à criança através de palavras.
Para Vygotsky, um claro entendimento das relações entre pensamento e língua é necessário para que
se entenda o processo de desenvolvimento intelectual. Linguagem não é apenas uma expressão do
conhecimento adquirido pela criança. Existe uma inter-relação fundamental entre pensamento e
linguagem, um proporcionando recursos ao outro. Desta forma a linguagem tem um papel essencial na
formação do pensamento e do caráter do indivíduo.

Zona de desenvolvimento próximo (ou proximal)


Um dos princípios básicos da teoria de Vygotsky é o conceito de "zona de desenvolvimento próximo".
Zona de desenvolvimento próximo representa a diferença entre a capacidade da criança de resolver
problemas por si própria e a capacidade de resolvê-los com ajuda de alguém. Em outras palavras,
teríamos uma "zona de desenvolvimento autossuficiente" que abrange todas as funções e atividades que
a criança consegue desempenhar por seus próprios meios, sem ajuda externa. Zona de desenvolvimento
próximo, por sua vez, abrange todas as funções e atividades que a criança ou o aluno consegue
desempenhar apenas se houver ajuda de alguém. Esta pessoa que intervém para orientar a criança pode
(pais, professor, responsável, instrutor de língua estrangeira) quanto um colega que já tenha desenvolvido
a habilidade requerida.
Uma analogia interessante nos vem à mente quando pensamos em zona de desenvolvimento próximo.
Em mecânica, quando regula-se o ponto de um motor a explosão, este deve ser ajustado ligeiramente à
frente do momento de máxima compressão dentro do cilindro, para maximizar a potência e o
desempenho.
A ideia de zona de desenvolvimento próximo é de grande relevância em todas as áreas educacionais.
Uma implicação importante é a de que o aprendizado humano é de natureza social e é parte de um
processo em que a criança desenvolve seu intelecto dentro da intelectualidade daqueles que a cercam.
De acordo com Vygotsky, uma característica essencial do aprendizado é que ele desperta vários
processos de desenvolvimento internamente, os quais funcionam apenas quando a criança interage em
seu ambiente de convívio.

Teoria Vygotskiana44
Vygotsky trabalha com teses dentro de suas obras nas quais são possíveis descrever como: à relação
indivíduo/ sociedade em que afirma que as características humanas não estão presentes desde o
nascimento, nem são simplesmente resultados das pressões do meio externo, elas são resultados das
relações homem e sociedade, pois quando o homem transforma o meio na busca de atender suas
necessidades básicas, ele transforma-se a si mesmo. A criança nasce apenas com as funções
psicológicas elementares e a partir do aprendizado da cultura, estas funções transformam-se em funções
psicológicas superiores, sendo estas o controle consciente do comportamento, a ação intencional e a
liberdade do indivíduo em relação às características do momento e do espaço presente. O
desenvolvimento do psiquismo humano é sempre mediado pelo outro que indica, delimita e atribui
significados à realidade, dessa forma, membros imaturos da espécie humana vão aos poucos se
apropriando dos modos de funcionamento psicológicos, comportamento e cultura. Neste caso podemos
citar a importância da inclusão de fato, onde as crianças com alguma deficiência interajam com crianças
que estejam com desenvolvimento além, realizando a troca de saberes e experiências, onde ambos
passam a aprender junto.
Vygotsky defende a educação inclusiva e acessibilidade para todos. Devido ao processo criativo que
envolve o domínio da natureza, o emprego de ferramentas e instrumentos, o homem pode ter uma ação
indireta, planejada tendo ou não deficiência, assim, pessoas com deficiência auditiva, visuais, e outras
podem ter um alto nível de desenvolvimento, a escola deve permitir que dominem depois superem seus
saberes do cotidiano. As crianças cegas podem alcançar o mesmo desenvolvimento de uma criança
normal, só que de modo diferente, por outra via, é muito importante para o pedagogo conhecer essa
peculiaridade, é a lei da compensação, não é o limite biológico que determina o não desenvolvimento do
surdo, cego, mas sim a sociedade que vem criando estes limites para que os deficientes não se
desenvolvam totalmente.
A segunda tese refere-se à origem cultural das funções psíquicas que se originam nas relações do
indivíduo e seu contexto social e cultural, isso mostra que a cultura é parte constitutiva da natureza
humana, pois o desenvolvimento mental humano não é passivo, nem tão pouco independente do
desenvolvimento histórico e das formas sociais da vida. O desenvolvimento mental da criança é um

44
COELHO, L.; PISONI, S. Vygotsky: sua teoria e a influência na educação. Revista e-Ped- FACOS/ CNEC Osório. Vol 02/2012.

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processo continuo de aquisições, desenvolvimento intelectual e linguístico relacionado à fala interior e
pensamento e impondo estruturas superiores, ao saber de novos conceitos evita-se que a criança tenha
que reestruturar todos os conceitos que já possui. Vygotsky tinha como objetivo constatar como as
funções psicológicas, tais como memória, a atenção, a percepção e o pensamento aparecem primeiro na
forma primária para, posteriormente, aparecerem em formas superiores, assim é possível perceber a
importante distinção realizada entre as funções elementares (comuns aos animais e aos humanos) e as
funções psicológicas superiores (especificamente vinculada aos humanos).
A terceira tese refere-se a base biológica do funcionamento psicológico o cérebro é o órgão principal
da atividade mental, sendo entendido como um sistema aberto, cuja estrutura e funcionamento são
moldados ao longo da história, podendo mudar sem que ajam transformações físicas no órgão.
A quarta tese faz referência à característica mediação presente em toda a vida humana em que
usamos técnicas e signos para fazermos mediação entre seres humanos e estes com o mundo. A
linguagem é um signo mediador por excelência por isso Vygotsky a confere um papel de destaque no
processo de pensamento. Sendo esta uma capacidade exclusiva da humanidade. Através da fala
podemos organizar as atividades práticas e das funções psicológicas. As pesquisas de Vygotsky foram
realizadas com a criança na fase em que começa a desenvolver a fala, pois se acreditava que a
verdadeira essência do comportamento se dá a partir da mesma. É na atividade pratica, ou seja, na
coletividade que a pessoa se aproveita da linguagem e dos objetos físicos disponíveis em sua cultura,
promovendo assim seu desenvolvimento, dando ênfase aos conhecimentos histórico-cultural,
conhecimentos produzidos e já existentes em seu cotidiano.

O desenvolvimento e a aprendizagem
Vygotsky dá um lugar de destaque para as relações de desenvolvimento e aprendizagem dentro de
suas obras. Para ele a criança inicia seu aprendizado muito antes de chegar à escola, mas o aprendizado
escolar vai introduzir elementos novos no seu desenvolvimento. A aprendizagem é um processo contínuo
e a educação é caracterizada por saltos qualitativos de um nível de aprendizagem a outro, daí a
importância das relações sociais, desse modo dois tipos de desenvolvimento foram identificados: o
desenvolvimento real que se refere àquelas conquistas que já são consolidadas na criança, aquelas
capacidades ou funções que realiza sozinha sem auxílio de outro indivíduo, habitualmente costuma-se
avaliar a criança somente neste nível, ou seja, somente o que ela já é capaz de realizar e o
desenvolvimento potencial que se refere àquilo que a criança pode realizar com auxílio de outro indivíduo.
Neste caso as experiências são muito importantes, pois ele aprende através do diálogo, colaboração,
imitação... A distância entre os dois níveis de desenvolvimentos chamamos de zona de desenvolvimento
potencial ou proximal, o período que a criança fica utilizando um ‘apoio’ até que seja capaz de realizar
determinada atividade sozinha. Por isso Vygotsky afirma que “aquilo que é zona de desenvolvimento
proximal hoje será o nível de desenvolvimento real amanhã – ou seja, aquilo que uma criança pode fazer
com assistência hoje, ela será capaz de fazer sozinha amanhã”. O conceito de zona de desenvolvimento
proximal é muito importante para pesquisar o desenvolvimento e o plano educacional infantil, porque este
permite avaliar o desenvolvimento individual. Aqui é possível elaborar estratégias pedagógicas para que
a criança possa evoluir no aprendizado uma vez que esta é a zona cooperativa do conhecimento, assim,
o mediador ajuda a criança a concretizar o desenvolvimento que está próximo, ou seja, ajuda a
transformar o desenvolvimento potencial em desenvolvimento real.
O desenvolvimento e a aprendizagem estão inter-relacionados desde o momento do nascimento, o
meio físico ou social influenciam no aprendizado das crianças de modo que chegam as escolas com uma
série de conhecimentos adquiridos, na escola a criança desenvolverá outro tipo de conhecimento.
Assim se divide o conhecimento em dois grupos: aqueles adquiridos da experiência pessoal, concreta
e cotidiana em que são chamados de ‘conceitos cotidianos ou espontâneos’ em que são caracterizados
por observações, manipulações e vivências diretas da criança já os ‘conceitos científicos’ adquiridos em
sala de aula se relacionam àqueles não diretamente acessíveis à observação ou ação imediata da
criança. A escola tem papel fundamental na formação dos conceitos científicos, proporcionando à criança
um conhecimento sistemático de algo que não está associado a sua vivência direta principalmente na
fase de amadurecimento.
O brinquedo é um mundo imaginário onde a criança pode realizar seus desejos, o ato de brincar é uma
importante fonte de promoção de desenvolvimento, sendo muito valorizado na zona proximal, neste caso
em especial as brincadeiras de ‘faz de conta’. Sendo estas atividades utilizadas, em geral, na Educação
Infantil fase que as crianças aprendem a falar (após os três anos de idade), e são capazes de envolver-
se numa situação imaginária. Através do imaginário a criança estabelece regras do cotidiano real.
Mesmo havendo uma significativa distância entre o comportamento na vida real e o comportamento
no brinquedo, a atuação no mundo imaginário e o estabelecimento de regras a serem seguidas criam

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uma zona de desenvolvimento proximal, na medida em que impulsionam conceitos e processos em
desenvolvimento.

Vygotsky e a educação
A escola se torna importante a partir do momento que dentro dela o ensino é sistematizado sendo
atividades diferenciadas das extraescolares e lá a criança aprende a ler, escrever, obtém domínio de
cálculos, entre outras, assim expande seus conhecimentos. Também não é pelo simples fato da criança
frequentar a escola que ela estará aprendendo, isso dependerá de todo o contexto seja questão política,
econômica ou métodos de ensino. Conforme foi visto até aqui, aulas onde o aluno fica ouvindo e
memorizando conteúdos não basta para se dizer que o aprendizado ocorreu de fato, o aprendizado exige
muito mais. O trabalho pedagógico deve estar associado à capacidade de avanços no desenvolvimento
da criança, valorizando o desenvolvimento potencial e a zona de desenvolvimento proximal. A escola
deve estar atenta ao aluno, valorizar seus conhecimentos prévios, trabalhar a partir deles, estimular as
potencialidades dando a possibilidade de este aluno superar suas capacidades e ir além ao seu
desenvolvimento e aprendizado. Para que o professor possa fazer um bom trabalho ele precisa conhecer
seu aluno, suas descobertas, hipóteses, crenças, opiniões desenvolvendo diálogo criando situações onde
o aluno possa expor aquilo que sabe. Assim os registros, as observações são fundamentais tanto para o
planejamento e objetivos quanto para a avaliação.

Infância e Adolescência

Infância
Memória dos bebês45
Você consegue se lembrar de alguma coisa que aconteceu antes dos seus 2 anos de idade?
Provavelmente não. Os cientistas do desenvolvimento propuseram várias explicações para esse
fenômeno comum. Uma explicação, sustentada por Piaget e outros, é que eventos dessa época não são
armazenados na memória, porque o cérebro ainda não está suficientemente desenvolvido. Freud, por
outro lado, acreditava que as primeiras lembranças estão armazenadas, porém reprimidas, porque são
emocionalmente perturbadoras. Outros pesquisadores sugerem que as crianças só conseguem
armazenar eventos na memória quando podem falar sobre eles.
Pesquisas mais recentes que utilizam o condicionamento operante com tarefas não verbais e
apropriadas para a idade sugerem que o processamento da memória nos bebês pode não ser
fundamentalmente diferente do que acontece com crianças mais velhas e adultos, salvo que o tempo de
retenção dos bebês é mais curto. Esses estudos constataram-que os bebês repetirão uma ação dias ou
semanas mais tarde - se eles foram periodicamente lembrados da situação em que a aprenderam.
Em uma série de experimentos realizados por Carolyn Rovee-Collier e associados, os bebês foram
submetidos a condicionamento operante para mexer a perna e ativar um móbile preso a um dos
tornozelos por uma fita. Bebês de 2 a 6 meses, aos quais foram apresentados os mesmos móbiles dias
ou semanas depois, repetiam os chutes, mesmo quando seu tornozelo não mais estava preso ao móbile.
Quando os bebês viram esses móbiles, deram mais chutes do que antes do condicionamento, mostrando
que o reconhecimento dos móbiles acionava a lembrança de sua experiência inicial com esses objetos.
Em uma tarefa semelhante, crianças de 9 a 12 meses foram condicionadas a pressionar uma alavanca
para fazer um trem de brinquedo percorrer um circuito. A extensão de tempo que uma resposta
condicionada podia ser retida aumentou com a idade, de dois dias para crianças de 2 meses a 13
semanas para crianças de 18 meses.
A memória de bebês novos sobre um comportamento parece estar associada especificamente ao
indicativo original. Bebês entre 2 e 6 meses repetiam o comportamento aprendido somente quando viam
o móbile ou o trem original. Entretanto, crianças entre 9 e 12 meses experimentavam o comportamento
em um trem diferente se não mais que duas semanas se passassem desde o treinamento.
Um contexto familiar pode melhorar a evocação quando a lembrança de alguma coisa enfraqueceu.
Crianças de 3, 9 e 12 meses inicialmente podiam reconhecer o móbile ou o trem num ambiente diferente
daquele onde foram treinadas, mas não depois de passado muito tempo. Lembretes não verbais
periódicos por meio de uma breve exposição ao estímulo original podem manter uma lembrança desde a
primeira infância até entre 1 e 2 anos de idade.
Pelo menos um importante pesquisador da memória refuta a alegação de que as memórias
condicionadas sejam qualitativamente as mesmas das crianças mais velhas e dos adultos. De uma
perspectiva evolucionista do desenvolvimento, as habilidades se desenvolvem à medida que podem

45
PAPALIA, D. E.; FELDMAN, R. D. Desenvolvimento Humano, 12ª edição, 2013, editor: AMGH.

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realizar funções úteis na adaptação ao ambiente. O conhecimento procedural e perceptual demonstrado
logo cedo pelos bebês ao chutar um móbile para ativá-lo não é a mesma coisa que a memória explícita
de uma criança mais velha ou de um adulto sobre eventos específicos. A primeira infância é uma fase de
grandes transformações, e é improvável que a retenção de experiências específicas seja útil por muito
tempo. Essa pode ser uma das razões de os adultos não se lembrarem de eventos que aconteceram
quando eram bebês. Mais adiante discutiremos pesquisas sobre o cérebro que lançam alguma luz sobre
o desenvolvimento da memória na primeira infância. 46

Abordagem psicométrica: testes de desenvolvimento e de inteligência


Embora não haja um consenso científico claro sobre a definição de comportamento inteligente, a
maioria dos profissionais concorda que o comportamento inteligente é orientado para uma meta e é
adaptativo: direcionado para se adaptar às circunstâncias e condições de vida. A inteligência permite às
pessoas adquirir, lembrar e utilizar conhecimento; entender conceitos e relações; e resolver os problemas
do dia a dia.
A natureza precisa da inteligência tem sido debatida por muitos anos, e também a melhor maneira de
medi-la. O movimento moderno para testar a inteligência teve início no começo do século XX, quando
administradores de escolas em Paris pediram ao psicólogo A1fred Binet que elaborasse um modo de
identificar crianças que não pudessem acompanhar o trabalho escolar e precisassem de instruções
especiais. O teste desenvolvido por Binet e seu colega Theodore Simon foi o precursor dos testes
psicométricos que avaliam a inteligência por números.
O objetivo da aplicação de testes psicométricos é medir quantitativamente os fatores que
supostamente constituem a inteligência (tais como compreensão e raciocínio) e, a partir dos resultados
dessa medida, prever o desempenho futuro (como o desempenho escolar). Os testes de 01 (quociente
de inteligência) consistem em perguntas ou tarefas que devem mostrar quanto das habilidades medidas
a pessoa possui, comparando seu desempenho com normas estabeleci das para um grupo extenso que
compôs a amostra de padronização. Para crianças em idade escolar, as pontuações no teste de
inteligência podem servir para prever o desempenho na escola com razoável precisão e confiabilidade.
Testar bebês e crianças pequenas já é outra questão. Como os bebês não podem nos dizer o que sabem
e como pensam, a maneira mais óbvia de aferir sua inteligência é avaliando o que sabem fazer. Mas se
eles não pegarem um chocalho, é difícil saber se não o fizeram porque não sabiam como, não estavam
com vontade, não perceberam o que se esperava deles ou simplesmente perderam o interesse.

Testes de desenvolvimento infantil


Embora seja praticamente impossível medir a inteligência de um bebê, é possível testar seu
desenvolvimento. Os testes de desenvolvimento comparam o desempenho do bebê numa série de tarefas
com normas estabelecidas baseadas na observação do que um grande número de bebês e crianças
pequenas sabe fazer em determinadas idades.
As Escalas Bayley de Desenvolvimento Infantil (Bayley, 1969, 1993,2005) constituem um teste de
desenvolvimento amplamente utilizado e elaborado para avaliar crianças entre 1 mês e 3 anos e meio.
Pontuações na Bayley-IIl indicam os pontos fortes e fracos e as competências de uma criança em cada
uma tías cinco áreas do desenvolvimento: cognitivo, linguagem, motor, socioemocional e comportamento
adaptativo. Uma escala opcional de classificação do comportamento pode ser preenchida pelo
examinador, em parte com base nas informações dadas pelo cuidador. Pontuações separadas, chamadas
Cle quocientes de desenvolvimento (ODs), são calculadas para cada escala. Os ODs são muito úteis
para detectar, logo no início, perturbações emocionais e déficits sensoriais, neurológicos e ambientais, e
podem ajudar pais e profissionais a planejar o atendimento das necessidades da criança.

Intervenção Precoce
A intervenção precoce é um processo sistemático de planejamento e fornecimento de serviços
terapêuticos e educacionais para famílias que precisam de ajuda para satisfazer as necessidades de
desenvolvimento de bebês e crianças em idade pré-escolar.

Fundamentos do desenvolvimento psicossocial


Embora os bebês apresentem os mesmos padrões de desenvolvimento, cada um deles, desde o início,
exibe uma personalidade distinta: a combinação relativamente coerente de emoções, temperamento,
pensamento e comportamento é que torna cada pessoa única. De maneira geral, bebês podem ser
alegres; outros se irritam com facilidade. Há crianças que gostam de brincar com as demais; outras

46
ROVEE-COLLIER, C.; HARTSHORN, k. & DIRUBBO, M. Long-term maintenance of infant memory. Developmental Psychobiology.

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1484041 E-book gerado especialmente para MAURICIO PEREIRA BARROS
preferem brincar sozinhas. Esses modos característicos de sentir, pensar e agir, que refletem influências
tanto inatas quanto ambientais, afetam a maneira como a criança responde aos outros e se adapta ao
seu mundo. Da primeira infância em diante, o desenvolvimento da personalidade se entrelaça com as
relações sociais; e essa combinação chama-se desenvolvimento psicossocial.
Ao explorarmos o desenvolvimento psicossocial, primeiro focalizaremos as emoções, os blocos de
construção da personalidade; em seguida, o temperamento ou disposição; e depois as primeiras
experiências sociais da criança na família. Finalmente, discutiremos como os pais moldam as diferenças
comportamentais entre meninos e meninas.

Emoções
Emoções, como tristeza, alegria e medo, são reações subjetivas à experiência e que estão associadas
a mudanças fisiológicas e comportamentais. O medo, por exemplo, é acompanhado de aceleração dos
batimentos cardíacos e, geralmente, de ações de autoproteção. O padrão característico de reações
emocionais de uma pessoa começa a se desenvolver durante a primeira infância e constitui um elemento
básico da personalidade. As pessoas diferem na frequência e na intensidade com que sentem uma
determinada emoção, nos tipos de eventos que podem produzi-la, nas manifestações físicas que
demonstram e no modo como agem em consequência disso. A cultura também influencia o modo como
as pessoas se sentem em relação a uma situação e a maneira como expressam suas emoções.
Algumas culturas asiáticas, que enfatizam a harmonia social, desencorajam expressões de raiva, mas
dão muita importância à vergonha. O oposto geralmente é verdadeiro na cultura norte-americana, que
enfatiza a autoexpressão, a autoafirmação e a autoestima.

Quando aparecem as emoções?


O desenvolvimento emocional é um processo ordenado; emoções complexas desdobram-se de outras
mais simples. De acordo com um dos modelos, o bebê revela sinais de contentamento, interesse e aflição
logo após o nascimento. Trata--se de respostas difusas, reflexas, a maior parte fisiológicas, à estimulação
sensorial ou a processos internos. Aproximadamente nos próximos seis meses, esses estados
emocionais iniciais se diferenciam em verdadeiras emoções: alegria, surpresa, tristeza, repugnância, e
depois raiva e medo - reações a eventos que têm significado para o bebê. Conforme será discutido mais
adiante, a emergência dessas emoções básicas, ou primárias, está relacionada à maturação neurológica.
As emoções autoconscientes, como o constrangimento, a empatia e a inveja, surgem somente depois
que a criança desenvolveu a auto consciência: compreensão cognitiva de que ela tem uma identidade
reconhecível, separada e diferente do resto de seu mundo. Essa consciência da própria identidade parece
emergir entre 15 e 24 meses. A autoconsciência é necessária para que a criança possa estar consciente
de ser o foco da atenção, identificar-se com o que outras "identidades" estão sentindo, ou desejar o que
outra pessoa tem.
Por volta dos 3 anos, tendo adquirido autoconsciência e mais algum conhecimento sobre os padrões,
regras e metas aceitas de sua sociedade, a criança torna-se mais capacitada para avaliar seus próprios
pensamentos, planos, desejos e comportamento com relação àquilo que é considerado socialmente
apropriado. Só então ela pode demonstrar emoções auto avaliadoras como orgulho, culpa e vergonha.

Crescimento do cérebro e desenvolvimento emocional


O desenvolvimento do cérebro após o nascimento está intimamente ligado a mudanças na vida
emocional: as experiências emocionais são afetadas pelo desenvolvimento do cérebro e podem causar
efeitos duradouros na estrutura cerebral.
Quatro importantes mudanças na organização do cérebro correspondem aproximadamente a
mudanças no processamento emocional. Durante os três primeiros meses, começa a diferenciação das
emoções básicas à medida que o córtex cerebral torna-se funcional e faz emergir as percepções
cognitivas. Diminuem o sono REM e o comportamento reflexo, incluindo o sorriso neonatal espontâneo.
A segunda mudança ocorre por volta dos 9 ou 10 meses, quando os lobos frontais começam a interagir
com o sistema límbico, uma das regiões do cérebro associada às reações emocionais. Ao mesmo tempo,
estruturas límbicas como o hipocampo tornam-se maiores e mais semelhantes à estrutura adulta.
Conexões entre o córtex frontal e o hipotálamo e o sistema límbico, que processam a informação
sensorial, podem facilitar a relação entre as esferas cognitiva e emocional. À medida que essas conexões
tornam-se mais densas e mais elaboradas, o bebê poderá ao mesmo tempo experimentar e interpretar
emoções.
A terceira mudança ocorre durante o segundo ano, quando o bebê desenvolve a autoconsciência, as
emoções autoconscientes e maior capacidade para regular suas emoções e atividades. Essas mudanças,

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1484041 E-book gerado especialmente para MAURICIO PEREIRA BARROS
que coincidem com maior mobilidade física e com o comportamento exploratório, podem estar
relacionadas à mielinização dos lobos frontais.
A quarta mudança ocorre por volta dos 3 anos, quando alterações hormonais no sistema nervoso
autônomo (involuntário) coincidem com a emergência das emoções avaliadoras. Subjacente ao
desenvolvimento de emoções como a vergonha pode estar um afastamento da dominância por parte do
sistema simpático, a parte do sistema autônomo que prepara o corpo para a ação, enquanto amadurece
o sistema parassimpático, a parte do sistema autônomo envolvida na excreção e na excitação sexual.

Desenvolvimento da autonomia
À medida que a criança amadurece - fisicamente, cognitivamente e emocionalmente - ela é levada a
buscar sua independência em relação aos vários adultos aos quais está apegada. "Eu fazer!" é a frase
típica da criança quando começa a usar seus músculos e sua mente para tentar fazer tudo sozinha - não
somente andar, mas alimentar-se, vestir-se e explorar o mundo.
Erikson identificou o período entre 18 meses e 3 anos como o segundo estágio no desenvolvimento
da personalidade, autonomia versus vergonha e dúvida, marcado pela passagem do controle externo
para o autocontrole. Tendo atravessado a primeira infância com um senso de confiança básica no mundo
e uma autoconsciência florescente, a criança pequena começa a substituir o julgamento dos cuidadores
pelo seu próprio. A "virtude" que emerge durante esse estágio é a vontade. O treinamento do controle
das necessidades fisiológicas é um passo importante em direção à autonomia e ao autocontrole; o mesmo
acontece com a linguagem.
À medida que a criança torna-se mais apta a expressar seus desejos, ela passa a ter mais poder.
Como a liberdade sem limites não é segura nem saudável, disse Erikson, vergonha e dúvida ocupam um
lugar necessário. As crianças pequenas precisam que os adultos estabeleçam limites apropriados; assim,
a vergonha e a dúvida ajudam-nas a reconhecer a necessidade desses limites.
Nos Estados Unidos, os "terríveis dois anos" assinalam um desejo de autonomia. Crianças pequenas
precisam testar as noções de que são indivíduos, têm algum controle sobre seu mundo e possuem novos
e emocionantes poderes. São levadas a experimentar suas novas ideias, exercitar suas próprias
preferências e tomar suas próprias decisões. Esse desejo se manifesta na forma de negativismo, a
tendência a gritar "Não!" só para resistir à autoridade. Quase todas as crianças ocidentais exibem algum
grau de negativismo; geralmente começa antes dos 2 anos de idade, com tendência a atingir o máximo
aos 3 anos e meio ou 4 anos e declina por volta dos 6 anos. Cuidadores que consideram as expressões
de autoafirmação da criança como um esforço normal e saudável por independência contribuem para seu
senso de competência e evitam excesso de conflitos.
Surpreendentemente, os "terríveis dois anos" não são universais. Em alguns países em
desenvolvimento, a transição da primeira para a segunda infância é relativamente suave e harmoniosa.

As raízes do desenvolvimento moral: socialização e internalização


Socialização é o processo pelo qual a criança desenvolve hábitos, habilidades, valores e motivações
que as tornam membros responsáveis e produtivos de uma sociedade. A aquiescência às expectativas
parentais pode ser vista como um primeiro passo em direção à submissão aos padrões sociais. A
socialização depende da internalização desses padrões. Crianças bem- sucedidas na socialização não
mais obedecem a regras ou comandos apenas para obter recompensas ou evitar punições; elas fazem
dos padrões da sociedade seus próprios padrões

Contato com outras crianças


Embora os pais exerçam uma grande influência sobre a vida dos filhos, o relacionamento com as
outras crianças - seja dentro de casa ou fora - também é importante já a partir da primeira infância.

Irmãos
O relacionamento entre irmãos desempenha um papel distinto na socialização. Conflitos entre irmãos
podem tornar-se um veículo para a compreensão de relações sociais. Lições e habilidades aprendidas
nas interações com os irmãos são passadas para os relacionamentos fora de casa
É comum os bebês se apegarem a seus irmãos e irmãs mais velhos. Embora a rivalidade possa estar
presente, a afeição também estará. Quanto mais o apego dos irmãos aos pais for um apego seguro,
melhor será o relacionamento entre eles
No entanto, à medida que os bebês tornam-se mais independentes e autoconfiantes, inevitavelmente
entram em conflito com os irmãos - pelo menos na cultura norte-americana. O conflito entre irmãos
aumenta dramaticamente depois que a criança mais nova atinge os 18 meses. Durante os próximos
meses, os irmãos mais novos começam a ter uma participação mais intensa nas interações familiares e

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1484041 E-book gerado especialmente para MAURICIO PEREIRA BARROS
se envolvem com maior frequência nas disputas em família. À medida que isso acontece, eles tornam-se
mais conscientes das intenções e dos sentimentos dos outros. Começam a reconhecer o tipo de
comportamento que vai transtornar ou irritar os irmãos mais velhos e quais os comportamentos
considerados "feios" ou "bons".
À medida que se desenvolve a compreensão cognitiva e social, o conflito entre irmãos tende a se
tornar mais construtivo, e o irmão mais novo participa de tentativas de reconciliação. O conflito construtivo
entre irmãos ajuda as crianças a reconhecerem as necessidades, os desejos e os pontos de vista uns
dos outros, e também ajuda a aprender como brigar, discordar e chegar a um acordo no contexto de um
relacionamento seguro e estável.

Sociabilidade com outras crianças


Bebês e - mais ainda - crianças pequenas mostram interesse em pessoas de fora do círculo familiar,
principalmente pessoas de seu tamanho. Nos primeiros meses, eles olham, sorriem e arrulham para
outros bebês. Dos 6 aos 12 meses, cada vez mais querem tocá-los, além de sorrir e balbuciar para eles.
Por volta de I ano, quando os principais itens de sua agenda são aprender a andar e a manipular objetos,
os bebês prestam menos atenção às outras pessoas. Essa fase, porém, é curta. A partir de
aproximadamente I ano e meio até quase 3 anos de idade, a criança demonstra cada vez mais interesse
no que as outras crianças fazem e uma compreensão cada vez maior de como lidar com elas.
Crianças pequenas aprendem imitando umas às outras. Brincadeiras como a de seguir o líder ajudam
a estabelecer um vínculo com as outras crianças, preparando-as para brincadeiras mais complexas
durante os anos pré-escolares. A imitação das ações uns dos outros resulta em uma comunicação verbal
mais frequente (algo como "Entre na casinha", "Não faça isso!" ou "Olhe pra mim"), que ajuda os pares a
coordenar atividades conjuntas. A atividade cooperativa desenvolve-se durante o segundo e o terceiro
ano à medida que cresce a compreensão social. Assim como acontece com os irmãos, o conflito também
pode ter um propósito: ajuda a criança a aprender a negociar e a resolver disputas.
Evidentemente, algumas crianças são mais sociáveis que outras, refletindo traços de temperamento
como o seu humor habitual, disposição para aceitar pessoas desconhecidas e capacidade para se
adaptar à mudança. A sociabilidade também é influenciada pela experiência. Bebês que passam algum
tempo com outros bebês, como nas creches, tornam-se sociáveis mais cedo do que aqueles que passam
quase todo o tempo em casa.

Adolescentes47
A busca da identidade A busca da identidade - que Erikson definiu como uma concepção coerente do
self, constituída de metas, valores e crenças com os quais a pessoa está solidamente comprometida -
entra em foco durante os anos da adolescência. O desenvolvimento cognitivo dos adolescentes lhes
possibilita construir uma "teoria do self". Como Erikson enfatizou, o esforço de um adolescente para
compreender o self não é "uma espécie de enfermidade do amadurecimento". Ele faz parte de um
processo saudável e vital fundamentado nas realizações das etapas anteriores - na confiança, autonomia,
iniciativa e produtividade - e lança os alicerces para lidar com os desafios da idade adulta.
Entretanto, uma crise de identidade raramente é totalmente resolvida na adolescência; questões
relativas à identidade surgem repetidamente durante toda a vida adulta.

Erikson: identidade x confusão de identidade


A principal tarefa da adolescência, dizia Erikson, é confrontar a crise de identidade versus confusão
de identidade, ou confusão de identidade versus confusão de papel, de modo a tornar-se um adulto
singular com uma percepção coerente do self e com um papel valorizado na sociedade. O conceito da
crise de identidade baseou-se em parte na experiência pessoal de Erikson. Criado na Alemanha como o
filho bastardo de uma mulher judia dinamarquesa que havia se separado do seu primeiro marido, Erikson
jamais conheceu o pai biológico. Embora tenha sido adotado aos 9 anos de idade pelo segundo marido
de sua mãe, um pediatra judeu alemão, ele se sentia confuso a respeito de quem era. Debateu-se durante
algum tempo antes de encontrar sua vocação. Quando viajou para os Estados Unidos, precisou redefinir
sua identidade como imigrante.
A identidade, segundo Erikson, forma-se quando os jovens resolvem três questões importantes: a
escolha de uma ocupação, a adoção de valores sob os quais viver e o desenvolvimento de uma identidade
sexual satisfatória.
Durante a terceira infância, as crianças adquirem as habilidades necessárias para obter sucesso em
suas respectivas culturas. Quando adolescentes, elas precisam encontrar maneiras de usar essas

47
PAPALIA, D. E.; FELDMAN, R. D. Desenvolvimento Humano, 12ª edição, 2013, editor: AMGH.

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habilidades. Quando os jovens têm problemas para fixar-se em uma identidade ocupacional- ou quando
suas oportunidades são artificialmente limitadas -, eles correm risco de apresentar comportamento com
consequências negativas sérias, tal como atividades criminosas.
De acordo com Erikson, a moratória psicossocial, um período de adiamento que a adolescência
proporciona, permite que os jovens busquem compromissos aos quais possam ser fiéis. Os adolescentes
que resolvem essa crise de identidade satisfatoriamente desenvolvem a virtude da fidelidade: lealdade
constante, fé ou um sentimento de integração com uma pessoa amada ou com amigos e companheiros.
Fidelidade também pode ser uma identificação com um conjunto de valores, uma ideologia, uma religião,
um movimento político, uma busca criativa ou um grupo étnico.
A fidelidade é uma extensão da confiança. Na primeira infância, é importante que a confiança nos
outros supere a desconfiança; na adolescência, torna-se importante que a própria pessoa seja confiável.
Os adolescentes estendem sua confiança a mentores e aos entes queridos. Ao compartilhar pensamentos
e sentimentos, o adolescente esclarece uma possível identidade ao vê-la refletida nos olhos do ser
amado. Entretanto, essas intimidades do adolescente diferem da intimidade madura, que envolve maior
compromisso, sacrifício e conciliação.
Erikson via como o principal perigo desse estágio a confusão de identidade ou de papel que pode
atrasar consideravelmente a maturidade psicológica. (Ele não resolveu sua crise de identidade até os 20
e poucos anos.) Algum grau de confusão de identidade é normal. De acordo com Erikson, ela é
responsável pela natureza aparentemente caótica de grande parte do comportamento dos adolescentes
e pela penosa auto consciência deles. Grupos fechados e intolerância com as diferenças, ambos marcas
registradas do cenário social adolescente, são defesas contra a confusão de identidade.
A teoria de Erikson descreve o desenvolvimento da identidade masculina como norma. De acordo com
ele, um homem não é capaz de estabelecer uma intimidade real até ter adquirido uma identidade estável,
enquanto as mulheres se definem através do casamento e da maternidade (algo que talvez fosse mais
verdadeiro na época em que Erikson desenvolveu sua teoria do que na atualidade). Desse modo, as
mulheres (ao contrário dos homens) desenvolvem a identidade por meio da intimidade, não antes dela.
Conforme veremos, essa orientação masculina da teoria de Erikson foi alvo de críticas. Ainda assim, seu
conceito de crise de identidade inspirou muitas pesquisas valiosas.

Fatores étnicos na formação da identidade


Para muitos jovens de grupos minoritários, a raça ou a etnia é fundamental na formação da identidade.
Um estudo de 940 adolescentes, estudantes universitários e adultos afro-americanos encontrou
evidência de todos os quatro estados de identidade em cada faixa etária. Apenas 27 dos adolescentes
estavam no grupo de identidade realizada, comparado com 47 dos estudantes universitários e 56 dos
adultos. Em vez disso, os adolescentes eram mais propensos a estar na moratória, ainda explorando o
que significa ser afro-americano. Vinte e cinco por cento dos adolescentes estavam em execução, com
sentimentos sobre a identidade afro-americana baseados em sua educação familiar. Os três grupos
(realização, moratória e execução) relataram mais consideração positiva por serem afro americanos do
que os 6 de adolescentes que eram difusos (nem comprometidos nem em processo de exploração).
Aqueles de qualquer idade que estavam no estado realizado eram mais propensos a ver a raça como
central em sua identidade. E, alcançar este estágio de formação da identidade racial tem aplicações
práticas. Embora o efeito seja mais forte para os homens do que para as mulheres, aumentos na
identidade racial do período de um ano foram relacionados com uma diminuição no risco de sintomas
depressivos, mesmo quando fatores como auto estima são controlados.
Outro modelo focaliza-se em três aspectos da identidade racial/étnica: conexão com o próprio grupo
racial/étnico, consciência de racismo e realização incorporada, a crença de que a realização acadêmica
é uma parte da identidade do grupo. Um estudo longitudinal de jovens de grupos rninoritários de baixa
renda revelou que os três aspectos da identidade parecem estabilizar-se e até aumentar ligeiramente na
metade da adolescência. Portanto, a identidade racial/étnica pode atenuar as tendências a uma queda
nas notas e na ligação com a escola durante a transição do ensino fundamental para o ensino médio. Por
outro lado, a percepção de discriminação durante a transição para a adolescência pode interferir na
formação da identidade positiva e levar a problemas de conduta ou a depressão. Como exemplo, as
percepções de discriminação em adolescentes sino-americanos estão associadas com sintomas
depressivos, alienação e queda no desempenho acadêmico. Os fatores de proteção são pais carinhosos
e envolvidos, amigos pró-sociais e desempenho acadêmico forte.
Um estudo longitudinal de 3 anos com 420 adolescentes norte-americanos de ascendência africana,
latina e europeia examinou duas dimensões da identidade étnica: estima do grupo (sentir-se bem em
relação à própria etnia) e exploração do significado da etnia na vida da pessoa. A estima do grupo
aumentou durante a adolescência, especialmente para afro-americanos e latinos, para os quais ela era

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mais baixa de início. A exploração do significado da etnia aumentou apenas na metade da adolescência,
talvez refletindo a transição de escolas fundamentais de bairros relativamente homogêneos para escolas
secundárias de etnia mais diversa. As interações com os membros de outros grupos étnicos podem
estimular a curiosidade dos jovens sobre sua própria identidade étnica. A pesquisa verificou que as
meninas parecem passar pelo processo de formação de identidade mais cedo que os meninos. Por
exemplo, um estudo com mais de 300 adolescentes mostrou que durante um período de quatro anos
meninas latinas passaram por exploração, resolução e afirmação de sentimentos positivos em relação a
suas identidades étnicas, enquanto os meninos apresentaram aumentos apenas na afirmação. Este
achado é importante porque o aumento na exploração - que os meninos não demonstraram - era o único
fator ligado a aumento na autoestima.
O termo socialização cultural refere-se a práticas que ensinam as crianças sobre sua herança racial
ou étnica, promovem costumes e tradições culturais e alimentam o orgulho racial/ étnico e cultural. Os
adolescentes que passaram por socialização cultural tendem a ter identidade étnica mais forte e mais
positiva do que aqueles que não a experimentaram.

Sexualidade
Ver-se como um ser sexual, reconhecer a própria orientação sexual, chegar a um acordo com as
primeiras manifestações da sexualidade e formar uniões afetivas ou sexuais, tudo isto faz parte da
aquisição da identidade sexual. A consciência da sexualidade é um aspecto importante da formação da
identidade que afeta profundamente a auto imagem e os relacionamentos. Embora este processo seja
impulsionado biologicamente, sua expressão é, em parte, definida culturalmente.
Durante o século XX, uma mudança importante nas atitudes e no comportamento sexual nos Estados
Unidos e em outros países industrializados trouxe uma aceitação mais generalizada do sexo antes do
casamento da homossexualidade e de outras formas de atividade sexual anteriormente desaprovadas.
Com o acesso difundido à internet, o sexo casual com conhecidos virtuais que se conectam por meio das
salas de bate-papo online ou de sites de encontro de solteiros tornou-se mais comum.
Telefones celulares, e-mail e mensagens instantâneas facilitam que adolescentes solitários arranjem
esses contatos com pessoas anônimas, sem a supervisão dos adultos.

Velhice48
O envelhecimento econômico de uma população que está envelhecendo depende da proporção de
pessoas saudáveis e fisicamente capazes dessa população. A tendência é encorajadora. Alguns
problemas que eram considerados inevitáveis agora são entendidos como resultantes do estilo de vida
ou doenças, e não do envelhecimento.
O envelhecimento primário é um processo gradual e inevitável de deterioração física que começa cedo
na vida e continua ao longo dos anos, não importa o que as pessoas façam para evita-lo. Assim, o
envelhecimento secundário é uma consequência inevitável de ficar velho. O envelhecimento secundário
resulta de doenças, abusos e maus hábitos, fatores que em geral podem ser comparadas ao conhecido
debate natureza experiência.
Uma classificação mais significativa é a idade funcional, que é a capacidade de uma pessoa interagir
em um ambiente físico e social em comparação com outros da mesma idade cronológica. Podemos
encontrar casos de pessoas com 90 anos de idade que estão mais jovens do que umas com 60 anos, por
estarem bem de saúde.
A senescência é um período marcado por declínios no funcionamento físico associados ao
envelhecimento.
As teorias de programação genética sustentam que o corpo da pessoa envelhece de acordo com o
relógio evolutivo normal inato dos genes. Estudos sobre gêmeos constataram que as diferenças genéticas
são responsáveis por aproximadamente um quarto da variância no tempo de vida adulto humano. Essa
influência genética é mínima antes dos 60, mas aumenta depois dessa idade.
Algumas mudanças físicas costumam estar associadas ao envelhecimento, sendo óbvias para um
observador causal, embora afetem mais algumas pessoas do que outras. A pele mais velha tende a se
tornar mais pálida e menos elástica; e assim como a gordura e os músculos encolhem, a pele fica
enrugada. São comuns varizes nas pernas. O cabelo fica mais fino, grisalho e depois branco, e os pelos
do corpo tornam-se mais ralos.
O envelhecimento no cérebro varia muito de uma pessoa para outra. O cérebro pode reorganizar os
circuitos neuronais para responder ao desafio do envelhecimento neurobiológico.

48
PAPALIA, D. E.; FELDMAN, R. D. Desenvolvimento Humano, 12ª edição, 2013, editor: AMGH.

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Há uma diminuição na quantidade ou densidade do neurotransmissor dopamina devido à perda de
sinapses. Os receptores de dopamina são importantes na medida em que ajudam a regular a atenção.
Nem todas as manifestações no cérebro são destrutivas. Os pesquisadores descobriram que cérebros
mais velhos podem criar novas células nervosas a partir de células-tronco – algo impensado no passado.

Principais problemas comportamentais e mentais


Muitos idosos com problemas comportamentais e mentais tendem a não procurar ajuda. Alguns desses
problemas são intoxicação medicamentosa, delírio, transtornos metabólicos, baixo funcionamento da
tireoide, pequenos ferimentos da cabeça, alcoolismo e depressão.
A depressão está associada a outros problemas de saúde. Pelo fato de a depressão estar associada
a outros problemas de saúde, um diagnóstico preciso, prevenção e tratamento adequado podem ajudar
pessoas idosas a viverem mais tempo e permanecerem mais ativas. A depressão pode ser tratada com
drogas, psicoterapia, antidepressivos.
O Mal de Alzheimer é uma das mais comuns e mais temidas doenças terminais entre as pessoas
idosas. Gradualmente, rouba dos pacientes a inteligência, a consciência e até mesmo a habilidade de
controlar as funções de seu corpo, e finalmente os mata. Os sintomas clássicos do mal de Alzheimer são
a diminuição da capacidade de memória, deterioração da linguagem e deficiências no processamento
espacial e visual. O principal sintoma é incapacidade de lembrar acontecimento recente ou absorver
novas informações.
A memória episódica é particularmente vulnerável aos efeitos do envelhecimento; efeitos que são
agrados à medida que as tarefas da memória tornam-se mais complexas ou exigentes, ou requerem a
livre recordação de informações, em oposição ao reconhecimento de material previamente visto.

Questões

01. (Prefeitura de Quixadá/CE - Psicólogo – ACEP). Sobre as fases do desenvolvimento humano e


os fatores psicológicos do desenvolvimento, assinale a alternativa CORRETA.
(A) Freud abordou a construção das estruturas mentais do pensamento pautadas na epistemologia
genética.
(B) A interação e a socialização, segundo Piaget, são mecanismos importantes que favorecem a
autorregulação do ser humano.
(C) No Construtivismo, o período da criança entre 02 a 07 anos caracteriza-se como estágio pré-
operacional.
(D) Vygotsky associou o desenvolvimento da inteligência da criança aos processos de assimilação e
acomodação.

02. (IFB - Psicólogo – FUNIVERSA). Durante o processo de ensino e de aprendizagem, o lúdico


contribui para a construção de várias funções no desenvolvimento psicológico da criança. Em relação ao
papel do lúdico no desenvolvimento infantil, especialmente na educação infantil e no ensino fundamental,
assinale a alternativa correta.
(A) Atividades lúdicas são desaconselháveis dentro da sala de aula, pois promovem a indisciplina e o
descontrole da organização do trabalho pedagógico.
(B) São prejudiciais ao desenvolvimento mental da criança atividades que promovem fantasia e fuga
da realidade durante as brincadeiras.
(C) Para estimular, condicionar e controlar processos psicológicos complexos, as atividades lúdicas
adequadas são exclusivamente as que usam brinquedos pedagógicos.
(D) Atividades lúdicas devem fazer parte dos processos de ensino e de aprendizagem para
favorecerem a mediação simbólica entre a realidade e o desenvolvimento da subjetividade da criança.
(E) As brincadeiras de imitação, por não interferirem nos desenvolvimentos afetivo, cognitivo e
psicanalítico, são as mais importantes para a aprendizagem da criança, pois determinam como ela irá se
adaptar aos limites do mundo e dos papéis sociais das suas relações parentais.

03. (FUNTELPA - Psicólogo - IDECAN). Sobre o desenvolvimento psicológico, Vygotsky afirma que
“A internalização de formas culturais de comportamento envolve a reconstrução da atividade
psicológica...” Tal afirmativa denota que:
(A) O uso de signos externos é também radicalmente reconstruído.
(B) Os processos psicológicos permanecem tal como aparecem nos animais.
(C) As mudanças nas operações linguísticas são tímidas.
(D) A fala egocêntrica se fortalece fazendo surgir a fala externa.

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(E) Deixam de ser internalizadas as atividades sociais e históricas.

04. (Prefeitura de Fortaleza/CE- Psicólogo- Prefeitura de Fortaleza/CE-2016) Ao se falar de zona


de desenvolvimento proximal, está-se referindo à teoria de desenvolvimento de:
(A) Henri Wallon.
(B) Lev Vygotsky.
(C) Carl Gustav Jung.
(D) Jean Piaget.

05. (CEFET/RJ - Psicólogo - CESGRANRIO) A posição de Vygotsky sobre a relação entre


desenvolvimento e aprendizagem é que o
(A) desenvolvimento é dependente da maturação e condiciona o aprendizado.
(B) desenvolvimento é definido como a substituição de respostas inatas a partir do aprendizado.
(C) aprendizado e o desenvolvimento são coincidentes e contemporâneos.
(D) aprendizado alavanca o desenvolvimento devido ao estabelecimento das relações sociais.
(E) processo de desenvolvimento da criança é independente do aprendizado.

06. (MPE/ES- Agente Técnico - VUNESP) Para Jean Piaget, o processo de assimilação
(A) é um mecanismo automático e determinado biologicamente, no qual o indivíduo é relativamente
passivo.
(B) envolve a eliminação de esquemas anteriores do indivíduo decorrente da aquisição de novas
informações.
(C) equivale ao processo de adaptação, porque este implica, necessariamente, revisão de
conceitos diante de novas situações.
(D) está diretamente relacionado ao processo de linguagem e, consequentemente, à socialização.
(E) corresponde a uma integração de novas informações a estruturas prévias do indivíduo.

Gabarito

01.C / 02.D / 03.A / 04.B / 05.D / 06.E

Comentários

01. C.
Para Piaget, os modos de relacionamento com a realidade são divididos em 4 períodos distintos, no
processo evolutivo da espécie humana que são caracterizados "por aquilo que o indivíduo consegue fazer
melhor" no decorrer das diversas faixas etárias ao longo do seu processo de desenvolvimento. São eles:
- 1º período: Sensório-motor (0 a 2 anos)
- 2º período: Pré-operatório (2 a 7 anos)
- 3º período: Operações concretas (7 a 11 ou 12 anos)
- 4º período: Operações formais (11 ou 12 anos em diante)

02. D.
O brinquedo é um mundo imaginário onde a criança pode realizar seus desejos, o ato de brincar é uma
importante fonte de promoção de desenvolvimento, sendo muito valorizado na zona proximal, neste caso
em especial as brincadeiras de ‘faz de conta’. Sendo estas atividades utilizadas, em geral, na Educação
Infantil fase que as crianças aprendem a falar (após os três anos de idade), e são capazes de envolver-
se numa situação imaginária. Através do imaginário a criança estabelece regras do cotidiano real.

03. A.
A teoria vygotskyana é instrumental, histórica e cultural. É instrumental, por se referir à natureza
mediada das funções psicológicas superiores. Diferentemente dos animais, que mantém relação direta
com a natureza, o processo de hominização surge com o trabalho, que inaugura a mediação com o uso
de signos e instrumentos, permitindo a modificação do psiquismo humano e da realidade externa,
respectivamente. Em um movimento dialético, os seres humanos criam novos cenários, que determinam
novos atores, novos papéis.

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1484041 E-book gerado especialmente para MAURICIO PEREIRA BARROS
04. B.
Um dos princípios básicos da teoria de Vygotsky é o conceito de "zona de desenvolvimento próximo".
Zona de desenvolvimento próximo representa a diferença entre a capacidade da criança de resolver
problemas por si própria e a capacidade de resolvê-los com ajuda de alguém.

05. D.
(A) INCORRETA – O aprendizado se dá através da relação do sujeito com o meio e impulsiona o
desenvolvimento.
(B) INCORRETA – Para Vygotsky o desenvolvimento se estabelece a partir da aprendizagem e pelas
relações sociais, esse é o eixo fundamental de sua teoria.
(C) INCORRETA - a aprendizagem ocorre antes do desenvolvimento portanto, não são coincidentes.
(D) CORRETA - é pela mediação (relação social) que ocorre a aprendizagem e,
consequentemente, o desenvolvimento
(E) INCORRETA - O desenvolvimento só é possível através da aprendizagem

06. E.
Assimilação: refere-se ao processo de receber as informações e incorporar às estruturas cognitivas já
existentes do sujeito. Acomodação: refere-se ao processo de mudança nos esquemas existentes para
incluir esse novo conhecimento. A equilibração é a tendência em mantar as estruturas cognitivas em
equilíbrio e é o aspecto que vai determinar a mudança da assimilação para a acomodação.

3.6 Temas contemporâneos: bullying, o papel da escola, a escolha da profissão,


transtornos alimentares na adolescência, família, escolhas sexuais.

Bullying

Bullying49 é um termo da língua inglesa (bully = “valentão”) que se refere a todas as formas de
atitudes agressivas, verbais ou físicas, intencionais e repetitivas, que ocorrem sem motivação
evidente e são exercidas por um ou mais indivíduos, causando dor e angústia, com o objetivo de
intimidar ou agredir outra pessoa sem ter a possibilidade ou capacidade de se defender, sendo
realizadas dentro de uma relação desigual de forças ou poder.

O bullying se divide em duas categorias:


a) bullying direto, que é a forma mais comum entre os agressores masculinos e
b) bullying indireto, sendo essa a forma mais comum entre mulheres e crianças, tendo como
característica o isolamento social da vítima. Em geral, a vítima teme o(a) agressor(a) em razão das
ameaças ou mesmo a concretização da violência, física ou sexual, ou a perda dos meios de subsistência.

O bullying é um problema mundial, podendo ocorrer em praticamente qualquer contexto no qual as


pessoas interajam, tais como escola, faculdade/universidade, família, mas pode ocorrer também no local
de trabalho e entre vizinhos. Há uma tendência de as escolas não admitirem a ocorrência do bullying
entre seus alunos; ou desconhecem o problema ou se negam a enfrentá-lo. Esse tipo de agressão
geralmente ocorre em áreas onde a presença ou supervisão de pessoas adultas é mínima ou inexistente.
Estão inclusos no bullying os apelidos pejorativos criados para humilhar os colegas.
As pessoas que testemunham o bullying, na grande maioria, alunos, convivem com a violência e se
silenciam em razão de temerem se tornar as “próximas vítimas” do agressor. No espaço escolar, quando
não ocorre uma efetiva intervenção contra o bullying, o ambiente fica contaminado e os alunos, sem
exceção, são afetados negativamente, experimentando sentimentos de medo e ansiedade.
As crianças ou adolescentes que sofrem bullying podem se tornar adultos com sentimentos negativos
e baixa autoestima. Tendem a adquirir sérios problemas de relacionamento, podendo, inclusive, contrair
comportamento agressivo. Em casos extremos, a vítima poderá tentar ou cometer suicídio.
O(s) autor(es) das agressões geralmente são pessoas que têm pouca empatia, pertencentes às
famílias desestruturadas, em que o relacionamento afetivo entre seus membros tende a ser escasso ou
precário. Por outro lado, o alvo dos agressores geralmente são pessoas pouco sociáveis, com baixa

49
CAMARGO, O."Bullying"; Brasil Escola. Disponível em http://brasilescola.uol.com.br.

. 110
1484041 E-book gerado especialmente para MAURICIO PEREIRA BARROS
capacidade de reação ou de fazer cessar os atos prejudiciais contra si e possuem forte sentimento de
insegurança, o que os impede de solicitar ajuda.
No Brasil, uma pesquisa realizada com alunos de escolas públicas e particulares revelou que as
humilhações típicas do bullying são comuns em alunos da 5ª e 6ª séries. As três cidades brasileiras com
maior incidência dessa prática são: Brasília, Belo Horizonte e Curitiba.
Os atos de bullying ferem princípios constitucionais – respeito à dignidade da pessoa humana – e
ferem o Código Civil, que determina que todo ato ilícito que cause danos a outrem gera o dever de
indenizar. O responsável pelo ato de bullying pode também ser enquadrado no Código de Defesa do
Consumidor, tendo em vista que as escolas prestam serviço aos consumidores e são responsáveis por
atos de bullying que ocorram dentro do estabelecimento de ensino/trabalho.

O bullying e os direitos da criança e do adolescente


O Estatuto da Criança e do Adolescente positivou diversas garantias e medidas protetivas com
o propósito de afiançar um desenvolvimento sadio aos infanto-juvenis. O comportamento
discriminatório e agressivo dos bullies atenta acintosamente contra o respeito e a dignidade de
suas vítimas ferindo os direitos estatutários transcritos abaixo: Estatuto.

Art. 5º Nenhuma criança ou adolescente será objeto de qualquer forma de negligência, discriminação,
exploração, violência, crueldade e opressão, punido na forma da lei qualquer atentado, por ação ou
omissão, aos seus direitos fundamentais.

Art. 15. A criança e o adolescente têm direito à liberdade, ao respeito e à dignidade como pessoas
humanas em processo de desenvolvimento e como sujeitos de direitos civis, humanos e sociais
garantidos na Constituição e nas leis. [...].

Art. 17. O direito ao respeito consiste na inviolabilidade da integridade física, psíquica e moral da
criança e do adolescente, abrangendo a preservação da imagem, da identidade, da autonomia, dos
valores, ideias e crenças, dos espaços e objetos pessoais.

Art. 18. É dever de todos velar pela dignidade da criança e do adolescente, pondo-os a salvo de
qualquer tratamento desumano, violento, aterrorizante, vexatório ou constrangedor.

A violação de quaisquer desses direitos afeta a dignidade do infanto-juvenil, incidindo, portanto, em


dano moral. Sendo assim, as vítimas de bullying poderão contender judicialmente pelo devido
ressarcimento, conforme orienta Mattia: O atentado ao direito à integridade moral gera a configuração de
dano moral, que, no caso, será pleiteado pela criança ou adolescente através de seu representante legal.
A indenização por dano moral não mais suscita dúvidas, é a consagração do dano moral direto, em face
dos termos do princípio constitucional previsto no art. 5º, X, que dispõe: “São invioláveis a intimidade, a
vida privada, a honra e a imagem das pessoas, assegurando o direito à indenização pelo dano material
ou moral decorrente de sua violação.”
Mas, antes que o dano moral ao infanto-juvenil efetivamente ocorra, temos o dever de comunicar essa
iminência ao Conselho Tutelar que é o órgão - administrativo, municipal, permanente e autônomo -
encarregado pela sociedade de zelar pelo cumprimento dos direitos da criança e do adolescente. O artigo
13 do Estatuto trata dessa obrigatoriedade de comunicação à autoridade competente no caso de
conhecimento de maus tratos perpetrados contra crianças e adolescentes. Aqueles que não o fizerem
incorrerão na pena prevista no art. 245: Estatuto.

Art. 13. Os casos de suspeita ou confirmação de castigo físico, de tratamento cruel ou degradante e
de maus-tratos contra criança ou adolescente serão obrigatoriamente comunicados ao Conselho Tutelar
da respectiva localidade, sem prejuízo de outras providências legais.

Quanto ao contexto em que está inserido o artigo 13 no Estatuto, Rossato, Lépore e Cunha pontuam
que vale ressaltar que apesar de alocado em meio a dispositivos que versam sobre o direito à saúde e
obrigações dos profissionais dessa área, o dever de comunicação de maus tratos também se estende a
outros profissionais, a exemplo de professores, responsáveis por estabelecimentos de ensino, dentre
outros, conforme explicita a redação do art. 245 do Estatuto, que considera infração administrativa o
descumprimento dessa determinação legal. Mesmo porque, em se tratando de responsáveis por escolas
de ensino fundamental – etapa de ensino onde, conforme pesquisa da PLAN BRASIL, se verificou a maior
incidência de bullying - a lei foi específica ao tratar do assunto:

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“Art. 56. Os dirigentes de estabelecimentos de ensino fundamental comunicarão ao Conselho Tutelar
os casos de:
I - maus-tratos envolvendo seus alunos; [...].”
II - reiteração de faltas injustificadas e de evasão escolar, esgotados os recursos escolares;
III - elevados níveis de repetência.

Na cartilha lançada pelo Conselho Nacional de Justiça encontramos a seguinte orientação dada aos
responsáveis pelos estabelecimentos de ensino nos casos de bullying: A escola é corresponsável nos
casos de bullying, pois é lá onde os comportamentos agressivos e transgressores se evidenciam
ou se agravam na maioria das vezes. A direção da escola (como autoridade máxima da instituição)
deve acionar os pais, os Conselhos Tutelares, os órgãos de proteção à criança e ao adolescente
etc. Caso não o faça poderá ser responsabilizada por omissão. Em situações que envolvam atos
infracionais (ou ilícitos) a escola também tem o dever de fazer a ocorrência policial. Dessa forma,
os fatos podem ser devidamente apurados pelas autoridades competentes e os culpados
responsabilizados. Tais procedimentos evitam a impunidade e inibem o crescimento da violência e da
criminalidade infanto-juvenil.
No entanto, a intervenção deve ser ponderada, na medida em que, se, por um lado, deve fazer cessar
a humilhação, por outro, deve estimular na vítima do bullying a capacidade de autodefesa, evitando uma
superproteção prejudicial.” Considerando o caráter multidisciplinar do tema em questão e a necessidade
das escolas estarem preparadas para lidar com a questão, Calhau diz que atualmente um grande número
de escolas mantém em seus quadros pedagogos e psicólogos, que, em sendo chamados para ajudar,
poderão contribuir muito com a solução dos problemas. A orientação deve nortear a ação desses
profissionais. Chamar a polícia e o Ministério Público, a meu ver, somente nos casos mais graves.
A solução, dentro do possível, deve ser conseguida compartilhando o problema com o grupo de alunos,
tendo em vista que os alunos tendem a voltar a praticar os atos de bullying assim que se colocarem sem
supervisão. Sobre a atuação das escolas cabe, também, se necessário, reprimir atos de indisciplina
praticados por alunos e aplicar as penalidades pedagógicas nos casos previstos no regimento escolar ou
interno. Entretanto, deve esgotar todos os recursos sociopedagógicos a ela inerente, inclusive ter uma
equipe especializada de profissionais, como psicopedagogos e profissionais afins, para atuar de forma
preventiva nos distúrbios ou problemas de aprendizagem. Porém, sendo inócua a tentativa de resolver o
problema diretamente com os alunos e esgotadas todas as possibilidades pertinentes ao caso concreto
“é o caso de acionar o Conselho Tutelar e o Ministério Público.
Finalmente, gostaríamos de destacar que, antes que seja necessário o acionamento das autoridades
competentes, a prevenção sempre será o melhor a ser feito pelos estabelecimentos de ensino.

Questões

01. (IFB - Cargos de nível Superior - CESPE) A formação das crianças e dos jovens ocorre por meio
de sua participação na rede de relações que constitui a dinâmica social. Na convivência com pessoas,
seja com adultos, seja com seus pares, a criança e o jovem se apropriam dos conhecimentos e
desenvolvem hábitos e atitudes de convívio social, como a cooperação e o respeito humano. Daí a
importância do grupo como elemento formador.
Tendo o texto acima como referência inicial, julgue os itens que se seguem, relacionados com a sala
de aula como espaço de aprendizagem e interação.

O bullying pode-se caracterizar mesmo que o comportamento aversivo seja apenas verbal.
( ) Certo ( ) Errado

02. (IF-RR - Pedagogo - FUNCAB) O Bullying, praticado em muitos espaços escolares, como também
em espaços sociais diversos, tem revelado o quanto alguns atos carregam formas preconceituosas de
ver e se relacionar com o outro. De uma maneira geral o Bullying é um ato de:
(A) valorização da diversidade.
(B) brincadeira.
(C) homofobia.
(D) violência.
(E) racialismo.

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03. (IFB - Psicólogo - FUNIVERSA) A prática da violência no ambiente escolar não é um fenômeno
recente. Apesar de parecer mais frequente, precisa ser percebida como um reflexo das interações sociais
mais amplas que envolvem a família, a escola e a sociedade como um todo. Entre as várias formas de
violência que acontecem no seio da escola, o bullying tem-se destacado. Acerca dessa forma de violência,
assinale a alternativa incorreta.
(A) O bullying envolve atitudes agressivas, repetidas e intencionais.
(B) Pode abranger agressão de natureza física, psicológica ou sexual.
(C) Aparecem, entre as ações típicas, xingamentos, elogios, intimidação, humilhação e discriminação.
(D) Identificam-se agressores, vítimas e espectadores como participantes do bullying.
(E) Acontece sem uma motivação aparente em uma relação desigual de força.

Respostas

01. Certo. Bullying50 é um termo da língua inglesa (bully = “valentão”) que se refere a todas as formas
de atitudes agressivas, verbais ou físicas, intencionais e repetitivas, que ocorrem sem motivação evidente
e são exercidas por um ou mais indivíduos, causando dor e angústia, com o objetivo de intimidar ou
agredir outra pessoa sem ter a possibilidade ou capacidade de se defender, sendo realizadas dentro de
uma relação desigual de forças ou poder.

02. D. Bullying é um ato agressivo, físico ou mental, que prejudica o próximo. Pode ocorrer na escola,
no trabalho ou outro local em que o trabalho coletivo ocorra.

03.C. Elogios não fazem parte da prática de bullying.

O Papel da Escola

Sabe-se que a escola não é responsável sozinha pelas transformações sociais, porém é nela que
acontece a intervenção pedagógica, resultando no processo de ensino e aprendizagem. É preciso então,
que ela tenha consciência da sua importância para desenvolver no educando a formação crítica e dar
condições para que ele possa participar das decisões da sua comunidade local ou mundial.

A escola, enquanto instituição social, é um dos espaços privilegiados de formação e


informação, em que a aprendizagem dos conteúdos deve estar em consonância com as questões
sociais que marcam cada momento histórico. Ou seja, deve estar relacionada ao cotidiano dos
alunos, desde o aspecto local ao global.

Diante disso, a escola deve deixar de ser uma agência transmissora de informações e transformar-se
num lugar onde a informação seja produzida e o conhecimento seja significante. O educando afirma sua
identidade através do conhecimento e competências adquiridos na escola.
Segundo Libâneo51 a formação de atitudes e valores, perpassando as atividades de ensino, adquire,
portanto, um peso substantivo na educação escolar, por que se a escola silencia valores, abre espaço
para os valores dominantes no âmbito social.
Dessa forma, a escola, diante das transformações que ocorrem no mundo, não pode deixar de
recolocar valores humanos fundamentais como o reconhecimento da diversidade e das diferenças, da
justiça, assim como o respeito à vida como suporte de convicções.
A escola não é a que detém o saber, mas é a responsável por preparar o aluno para as exigências
postas pela sociedade. Ela não deve resumir-se ao papel de repassar conteúdos que não estejam
norteados com a realidade do aluno, como num processo “bancário”, ou seja, o acúmulo de conhecimento
que o educando não sabe mobilizar quando sai da escola, frente as suas aspirações pessoais.

A escola brasileira, hoje, encontra-se voltada para conteúdos que vão ajudar o aluno a ingressar
numa universidade ou no campo de trabalho, pois os professores precisam cumprir um programa
preestabelecido pela instituição como um fim, e não como um meio para a aquisição do
conhecimento ou a informação da cidadania do aluno.

50
Texto adaptado de CAMARGO, O.
51
Idem

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Charlot52 afirma “a escola ideal é aquela que faz sentido para todos e na qual o saber é fonte de prazer”,
assim, a escola que se deseja é a que promova saberes que o aluno entenda.
Um recurso importante que provoca interesse no aluno, hoje é o computador. O que se pode perceber
são alunos querendo aulas diferentes utilizando esse recurso, porém com o objetivo de conversar com
pessoas pela internet, e não para pesquisar. A escola precisa conscientizar o aluno que pode usar esse
recurso nas aulas, mas deve orientá-los para a pesquisa.
De acordo com os PCNs53 é importante a contextualização no currículo como forma de facilitar a
aplicação da experiência escolar para a compreensão de experiência pessoal em níveis sistemáticos e
abstratos e o aproveitamento de experiência pessoal para facilitar a concretização dos conhecimentos
que a escola trabalha. A contextualização, nesse sentido é utilizada como um recurso pedagógico para a
constituição do conhecimento; é um processo continuo de habilidades intelectuais superiores.
A aprendizagem contextualizada em relação ao conteúdo busca desenvolver o pensamento mais
elevado, não apenas a aquisição de fatos independentes da vida real. No processo, a aprendizagem é
sócio interativa, envolve os valores, as relações de poder e o significado do conteúdo entre os alunos
envolvidos. No contexto, propõe-se não apenas trazer o real para a sala de aula, mas criar condições
para que os alunos revejam os eventos da vida real numa outra perspectiva.

De acordo com o Art. 9º do referido Parecer, na observância da Contextualização, as escolas terão


presente que:
a) Na situação de ensino e aprendizagem, o conhecimento é transposto da situação em que foi criado,
inventado ou produzido, e por causa desta transposição didática deve ser relacionado com a prática ou a
experiência do aluno a fim de adquirir significado;
b) A relação entre teoria e prática requer concretização dos conteúdos curriculares em situações mais
próximas e familiares do aluno, nas quais se incluem as do trabalho e do exercício da cidadania;
c) A aplicação de conhecimentos constituídos na escola às situações da vida cotidiana e da experiência
espontânea permite seu entendimento, crítica e revisão.

Diante desse relato, a escola deve trabalhar de forma que adapte os conteúdos à realidade e à
diversidade de cultural, e que a teoria e a prática estejam em consonância com as situações vividas pelos
alunos. É fundamental que ela ofereça condições e liberdade ao professor para que ele possa desenvolver
um bom trabalho frente ao aluno, visando a sua aprendizagem como cidadão e como ser capaz de realizar
tarefas em sociedade, uma vez que a aprendizagem é um processo continuo e inacabado e não um fim
com o objetivo de formar apenas profissionais para o campo de trabalho.
Hoje, ainda se observa que a responsabilidade de formar e informar incide sobre o professor. Quando
ele realiza uma estratégia diferente para repassar os conteúdos, outros segmentos da escola questionam
se o tempo é suficiente para atingir toda a programação. No entanto o compromisso da escola deve ser
com o conhecimento do aluno, como ele se dá, e não com a transmissão de conteúdos programados
previamente sem a análise das necessidades do educando.
O professor precisa de liberdade e autonomia para lidar com os conteúdos que vão provocar a
inquietação do aluno. Para isso, a escola deve contribuir oferecendo-lhe condições para atuar, apoiando-
o nas suas ideias com o mesmo objetivo de formar pessoas que podem mudar toda uma nação. Muito
mais que ensinar conteúdos, a escola tem a responsabilidade de contribuir para a construção da cidadania
e o respeito às diversidades.

Orientação Vocacional e Profissional

A decisão54 em relação a qual atividade seguir começa geralmente no fim do ensino médio, com a
proximidade do Vestibular.
Na escolha da profissão a ser escolhida ter autoconhecimento é essencial. É indispensável definir os
traços da sua personalidade, suas aptidões, habilidades e gostos pessoais que definirão os caminhos a
serem trilhados. Este processo pode ser feito pelo próprio adolescente com auxílio da família e amigos,
mas a ajuda profissional pode facilitar a escolha. A orientação vocacional ou profissional pode ser feita
por psicólogos, e até mesmo com o auxílio do orientador educacional.
A escolha de qual profissão seguir deve ser feita a partir do autorreflexão. Primeiro é preciso conhecer
a si mesmo. Saber quais seus pontos fortes e fracos, as habilidades, as pretensões e os desejos para o

52
CHARLOT, Bernard. Fala mestre. In: NOVA ESCOLA, nº 196, p.15-18, outubro, 2006.
53
PARÂMETROS CURRICULARES NACIONAIS: Ensino Médio. Ministério da Educação. Secretaria de Educação Média e Tecnológica. Brasília, 1999.
54
GONÇALVES, J. Orientação Vocacional. Brasil Escola.

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futuro. Em seguida procurar saber quais são as áreas que mais despertam a atenção ou com as quais se
tem mais facilidade.

Autoconhecimento é determinante para a escolha da profissão, pois é onde descubro quais são
minhas reais habilidades, competências, interesses, descubro qual é a minha real personalidade.

Diferença entre orientação vocacional e orientação profissional:

Orientação Vocacional Orientação Profissional


A orientação vocacional pretende ajudar a pessoa
No processo de orientação profissional busca-se
a conhecer o seu perfil e, assim, perceber quais
auxiliar o indivíduo na descoberta de seus
são suas áreas de interesse, o que vai bem além
conhecimentos e de suas habilidades, assim como
dos testes. Porém, apresentar apenas essa
conhecer as fontes de treinamento para aprimorar
informação deixa o jovem perdido em um mar de
as suas competências profissionais.
opções. Aí que entra a orientação profissional.

A escolha da profissão - Professor


A escolha profissional55 é umas das mais importantes dentre as tantas que realizamos em nosso
cotidiano, em nosso viver.
Várias e diversas são as razões que motivam a escolha de uma profissão, dentre elas podemos
salientar: a possibilidade de destaque social, a influência familiar, a questão salarial, as perspectivas do
mercado, entre outras.
No contexto sociocultural atual o ser professor/professora não é uma carreira profissional atrativa
devido a múltiplos fatores, destacadamente o fator econômico, isto é, a questão salarial não é atrativa.
No entanto, observamos que os cursos de licenciaturas, ofertados no ensino superior, são procurados
(obviamente, não como outrora) e cursados.
Considerando a observação exposta acima, passível de constatação, buscamos inquirir o que motiva
jovens estudantes a optarem por ser professor, bem como se a escola é refletida ou meramente, uma
aleatória.
A construção de respostas frente à problematização está na perspectiva da ressignificação da ação
docente, pois é no íntimo de cada um, na sua história de vida, que residem as razões da suas escolhas
e sendo a profissão docente de grande relevância social, optar por ser professor deve ser uma escolha
consciente e tomada a partir de algumas reflexões. Segundo Gadotti, "escolher a profissão de professor
não é escolher uma profissão qualquer", pois muitos são os desafios e responsabilidades desta profissão.
Este texto é organizado em três partes, sendo elas: "Educação e ser professor: breve conceituação e
apreciação", "Uma importante decisão: escolha profissional" e "Ser professor: motivação, expectativas e
análise reflexiva".

Educação e Ser Professor


Ao pensarmos em educação é correto afirmar que ela existe em todos os lugares e em todos os
momentos da vida do ser humano. Estamos sempre aprendendo e ensinando desde o momento em que
nascemos. "Da família à comunidade, a educação existe difusa em todos os mundos sociais, entre as
incontáveis práticas dos mistérios do aprender". Educamo-nos sempre. Ensinamos e aprendemos em
todos os espaços que frequentamos. "A educação é a prática mais humana, considerando-se a
profundidade e a amplitude de sua influência na existência dos homens".
No entanto, existe um lugar onde ensinar e aprender é razão primordial. Um lugar que é o espaço
próprio da educação formal, apesar de todas as outras maneiras possíveis para concretizar o ato
educativo: a escola! Este estudo é dedicado a esta especificidade educativa, isto é, a educação escolar.
Objetivando conceituar este importante fenômeno da vida humana, recorremos à sua origem que,
segundo Garcia relaciona-se aos verbos latinos educãre (alimentar, criar), significando "algo que se dá a
alguém", com o sentido de algo externo que se acrescenta ao indivíduo e educere com a ideia de "conduzir
para fora", "fazer sair", "tirar de", que sugere a liberação das forças que estão latentes e que dependem
de estimulação para virem à tona. Origem esta que nos apresenta uma grande contradição: em uma
mesma raiz, sentidos diferentes, expressando diferentes concepções de educação. Uma compreendida
como a transmissão de conhecimentos e valores socioculturais às novas gerações, algo externo. Outra
entendida como processo de desenvolvimento das potencialidades dos indivíduos, algo interno, que se
extrai. Diferentes modelos epistemológicos de educação.

55
ECCO, I. POR QUE SER PROFESSOR? 2010.

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1484041 E-book gerado especialmente para MAURICIO PEREIRA BARROS
Em cada uma das definições epistemológicos de educação explicitados anteriormente, decorrem
concepções e práticas de educação escolar específicas. Na concepção em que o centro do processo é o
professor, obedecendo ao modelo tradicional de educação, o professor fala, o aluno escuta, o professor
decide o que fazer, o aluno executa, o professor ensina o aluno aprende. "Segundo a epistemologia deste
professor, o indivíduo, ao nascer, nada tem em termos de conhecimento: é uma folha de papel em
branco." E de onde vem o conhecimento, então? Do meio social. A ação deste professor não é neutra. O
empirismo sustenta suas crenças.
Já nas concepções em que o centro do processo é o aluno, o professor é um facilitador, um auxiliar e
deve interferir o mínimo possível. Pode, no máximo, auxiliar a aprendizagem, já que o aluno possui um
saber que ele precisa apenas trazer à consciência. Para os aprioristas que sustentam as crenças deste
professor, o indivíduo nasce com o conhecimento já programado na sua herança genética. Aqui, o
professor renuncia "àquilo que seria a característica fundamental da ação docente: a intervenção na
aprendizagem do aluno." E como avaliar neste modelo epistemológico? O aluno avalia se aprendeu ou
não.
Porém, nas concepções em que o diálogo é princípio, professor e aluno ensinam e aprendem em
comunhão construindo o conhecimento. A relação em uma destas salas de aula é horizontal, o professor
considera o saber do aluno e propicia um ambiente favorável para expandir este conhecimento. O aluno,
por sua vez, sente-se importante e capaz de transformar a realidade. "O resultado desta sala de aula é a
construção e a descoberta do novo". O construtivismo sustenta as crenças deste professor.
A partir do construtivismo conceitua-se educação como um processo pelo qual se busca o
melhoramento, a excelência do viver. A excelência da família, da escola, da sociedade, do mundo. Logo,
é processo contínuo de construção e reconstrução concretizando-se com humanos. Nisso consiste
importância e sua função social, isto é, da responsabilidade de formar mentes e ações, sociedades e
mundos.
A responsabilidade e a importância do professor neste cenário são de grande proporção, pois este se
torna, agente da mudança social e deve primeiramente conscientizar-se de sua função como formador
de opinião, de personalidade, de caráter. E jamais minimizar sua prática à mera transmissão de
conhecimentos e técnicas prontas.
O reencantamento da educação requer a união entre sensibilidade social e eficiência pedagógica.
Portanto, o compromisso ético, político do (a) educador (a) deve manifestar-se primordialmente na
excelência pedagógica e na colaboração um clima esperançador no próprio contexto escolar.
Estando consciente de que pode influenciar no contexto social e sabendo que a transmissão de
conhecimentos já não é suficiente, cabem ao educador muitos e complexos desafios.
Em nossa concepção, fundamentada no construtivismo, ser professor vai além de transmitir
conhecimentos com técnicas prontas. O professor torna-se educador, pois assume a tarefa de educar e
não somente preparar seus alunos para algo. "Podemos aprender a ler, escrever sozinhos, podemos
aprender geografia e a contar sozinhos, porém não aprendemos a ser humano sem a relação e o convívio
com outros humanos que tenham aprendido essa difícil tarefa."
Assim, o professor deve ser um constante pesquisador e incentivar seus alunos a serem
pesquisadores, também, além de ensiná-los a filtrar as informações e os conhecimentos constatados
nesta pesquisa. A criticidade é uma qualidade indispensável ao educador responsável. Aceitar tudo como
lhe é apresentado é uma característica desta sociedade desigual e desumanizada presente na atualidade.
O professor-educador deve agir como problematizador, instigador, orientador e precisa estar
consciente de que a aprendizagem só acontece num clima de liberdade e questionamento e ela só é
efetiva se tem um sentido pessoal. O importante é aprender a aprender e ser professor é criar as
circunstâncias favoráveis para tal.
Portanto, escolher a profissão docente não é escolher uma profissão qualquer. E esta decisão deve
acontecer em um contexto de reflexão e responsabilidade. O que comumente motiva a escolha
profissional? Existe reflexão? É realmente uma "escolha"?

Escolha Profissional
Escolher! Ação comum em nossa vida. Escolhemos roupas, escolhemos comida, escolhemos filmes,
músicas. Porém, em certo momento precisamos fazer uma escolha que se difere destas tantas do
cotidiano pela importância. É a escolha profissional.
Este é um momento indiscutivelmente importante na vida de qualquer pessoa. É um momento de fazer
projetos sobre o que se pretende ser, o que se pretende fazer, decidir a vida que se quer levar. Pois
passamos no trabalho grande porcentagem da nossa existência. Daí a importância de se fazer uma
escolha consciente e responsável. E se levarmos em consideração que esta é uma decisão que não
tomamos sozinhos e que não afetará somente a nossa vida constata-se a amplitude desta escolha.

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Diante de tais fatos, almejando conhecer o que motiva a escolha da profissão docente faz-se
necessária também uma reflexão sobre os fatores que comumente motivam a escolha profissional como
um todo, pois, muitos e variados são os fatores que influenciam na decisão da carreira. Embora na
realidade sempre atuem juntos Soares, para fins puramente didáticos, divide os fatores determinantes na
escolha profissional em: fatores políticos, fatores econômicos, fatores sociais, fatores educacionais,
fatores familiares e fatores psicológicos.

a) Fatores políticos:
É de certa forma fácil identificar o viés da política predominante na educação e na preparação do jovem
para a "escolha" do trabalho, observando as tendências pedagógicas. Nas tendências liberais o jovem é
levado a acreditar que a escolha profissional é algo só seu que sua escolha não interfere em nada na
sociedade. Já nas tendências progressistas o jovem é conscientizado sobre a importância da sua escolha
no contexto social. Cada governo, segundo sua política, seu interesse, opta por uma estratégia
educacional e de preparar para a escolha profissional. Exemplo: "Com o regime militar elevou-se o
número de alunos em todos os níveis desde a pré - escola até as pós - graduações, mas o funil
educacional manteve-se um sério problema e a má qualidade de ensino agravou-se". Nesse período era
preciso mostrar ao exterior um povo escolarizado e não necessariamente educado. A regra era formar
muitos técnicos e nenhum filósofo.

b) Fatores econômicos:
Em relação à escolha profissional é perfeitamente perceptível a influência das condições econômicas
na decisão do jovem. Aquela pessoa que se obrigou a procurar emprego desde muito cedo por
necessidade financeira, a não ser que conte com muita sorte, certamente não escolheu o que fazer.
Precisou aceitar o que o mercado de trabalho ofereceu. E assim trabalhar em algo e fazer carreira
somente pelo fato de sustentar-se. Estes, em muitos casos nem pensam em cursar uma universidade
devido aos custos que isto implica.
Para os "sortudos" que trabalham de dia e conseguem frequentar a universidade à noite, a realidade
não é muito mais fácil, já que provavelmente o valor do curso influenciou na decisão. Para estes, o fator
econômico está também no fato de não conseguirem aproveitar tudo que poderiam da aula, pois
trabalharam o dia inteiro e já estão cansados. Muito melhor seria poder somente estudar, até porque seu
trabalho difere bastante do que vê em aula.

c) Fatores sociais:
Os fatores sociais estão basicamente relacionados à classe social na qual o indivíduo pertence e que
na maioria das vezes determina se ele poderá ou não fazer curso superior. Observando os contextos
sociais próximos infelizmente podemos perceber que as profissões são divididas por classe social e que
dificilmente esta realidade se altera. Cursar medicina não é uma realidade comum em comunidades
pobres onde os jovens não dispõem do dinheiro e nem do tempo necessário para realizar esta atividade
e precisam trabalhar para se sustentar e estudar a noite quando os cursos oferecidos são outros.
A convivência social também é determinante na nossa escolha, pois somos fruto da sociedade onde
vivemos. "É impossível se pensar o homem como algo separado de seu meio social." As profissões que
são valorizadas pela sociedade em que vivemos certamente estarão em nossa lista de possibilidades.
Pois a profissão, também, é vista como uma forma de ascensão social importante.

d) Fatores educacionais:
Os fatores educacionais referem-se ao fato de o sistema educacional como um todo influenciar na
escolha profissional. Desde que ingressamos na escola estamos sendo influenciados pelas pessoas e
suas profissões. As meninas da educação infantil já decidiram: vão ser professoras! Os meninos também:
bombeiros!
A estrutura da educação no país exerce influência sobre a escolha profissional. A escola em si, a
maneira como se organiza, seus métodos e objetivos influenciam. Os professores e sua maneira de
conduzir a aula despertam interesses e também repulsas à sua especialidade.
A escolha profissional não tem sido abordada na escola com a objetividade e o respeito que merece.
Na maioria das vezes, esta importante orientação é trabalhada em dois ou três períodos nas séries finais
do Ensino Fundamental e Ensino Médio, ou seja, às vésperas da escolha. O que causa aflição e
desespero, tornando este momento ainda mais desesperador. Isto é feito por meio de testes vocacionais
e rápidas palestras, quando deveria ser uma construção de toda a vida escolar do aluno.

e) Fatores familiares:

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Como sabemos, a família é parte importante na vida de qualquer indivíduo e no momento da escolha
profissional este grupo exerce grande influência, seja positiva ou negativamente. Todo o pai tem projetos
para o seu filho e estes estão presentes na maneira como acompanha seu desenvolvimento, mesmo sem
querer, a família exerce papel decisivo na hora da escolha da carreira.

f) Fatores psicológicos:
Os fatores psicológicos dizem respeito ao conhecimento que o jovem tem sobre si mesmo. Sobre sua
história de vida, sobre suas preferências, suas aptidões. Fatores que passam despercebidos pela escola
e que deveriam ser mais estimulados pela família.
Para uma escolha profissional consciente e reflexiva o jovem deve primeiramente conhecer-se. Isto
possibilitará que saiba com mais precisão em que profissão terá maior realização e possibilidade de
sucesso. Para tanto, pode-se lembrar de situações em que esteve em contato com profissões diferentes
e quais suas reações a cada uma delas.
A escolha profissional é uma temática complexa que não é determinada por um ou dois fatores. Na
verdade, ao escolher a profissão estamos evidenciando uma bagagem que acumulamos durante toda a
nossa vida e esta decisão não é nada fácil. Fica claro que a escolha profissional é um processo dinâmico,
permeado por fatores subjetivos, emocionais e pessoais. Fazer uma boa escolha requer conhecimento e
reflexão sobre si mesmo, sobre as profissões, sobre o mundo a nossa volta. A melhor escolha é a
realizada de forma mais consciente, considerando-se o que se quer e pode, considerando-se, ainda, as
condições sociais, econômicas e políticas em que se vive. Porém, algo é certo e definitivo: escolhida a
profissão é preciso ser competente no que se faz.
Um profissional competente é o profissional capaz de refletir sobre sua profissão de modo a produzir
conhecimento, tornando sua atividade algo cada vez mais estimulante e gratificante, impedindo a
massificação e a burocratização de seu trabalho. Isto levará consequentemente a lutar por um mundo
melhor. Em se tratando da profissão docente esta reflexão e ressignificação faz-se necessária quase que
diariamente, pois não lidamos com objetos e sim com seres humanos. E nossa visão do mundo e da vida
é concretizada com pessoas. Por isso, escolher ser professor não é uma escolha qualquer. Deve ser
tomada em um contexto de reflexão e consciência. Na prática, será que isso acontece? O que motiva a
escolha da profissão docente? Quais fatores influenciam nesta decisão?
Em um contexto social e cultural onde ser professor não é uma carreira muito atrativa devido a vários
fatores, observamos que os cursos de licenciaturas assim mesmo são procurados. Muitas pessoas ainda
objetivam dedicar-se ao educar profissionalmente. Por quê?

Motivação, Expectativas e Análise Reflexiva


Em concordância com o decorrer deste texto, ser professor é algo importante e significativo
socialmente. Escolher esta profissão deve ser uma decisão tomada de forma reflexiva e consciente
porque muitos são os desafios desta carreira.
Alves afirma que o principal motivo para ser professor é "Amar as crianças e querer tê-las como
companheiras." Maringoni acredita que "Ser Revolucionário. Resgatar o ideal de transformar o mundo por
meio das pessoas e, assim fazer com que as gerações aprendam a respeitar o ser humano e o planeta
em que vivemos" é o principal motivo para escolher a profissão de professor".
Para Chauí o motivo essencial é que "Ser professor é no mínimo uma obrigação política. Não podemos
aceitar uma população de excluídos da educação e da cultura. Nossa profissão só tem sentido se
despertar a consciência social por meio do conhecimento e promover o exercício da razão como forma
de libertação".
Perrenoud motiva a escolha desta profissão com esta afirmação: "Transmitir conhecimento é uma
honra, um dever".
Segundo Freire a dimensão política da profissão é o maior motivo para escolhê-la: "A certeza de que
faz parte de sua tarefa docente não apenas ensinar conteúdos, mas também ensinar a pensar certo".
Assaré aponta os motivos para ser professor em forma de poesia: "Com muita certeza digo. Ele é seu
grande amigo. Quem vive sem professor. Vaga nas trevas sem luz".
Raí pensa que ser professor "É uma das profissões mais bonitas. Só recuperamos nosso país se todas
as crianças e jovens tiverem a oportunidade de aprender com professores envolvidos de verdade com a
educação".
Gardner acredita que um motivo importante para ser professor é a oportunidade de "aprimorar-se a
cada dia mais e mais a cada dia".
Nowil aponta o motivo essencial para se professor em sua opinião: "O mundo depende dos mestres
para despertar nos alunos a compreensão que pode gerar a verdadeira paz e justiça entre os homens".

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Por fim, os motivos para escolher a profissão docente resumem-se nas seguintes categorias: amor,
identificação, compromisso, responsabilidade social, querer formar cidadãos melhores para um mundo
melhor.

Questões

01. (IF-PA- Psicólogo- FUNRIO/2016) Um dos fatores de grande relevância na escolha de uma
ocupação profissional diz respeito a
(A) capacidade de reação.
(B) critérios financeiros.
(C) adaptação a valores.
(D) diferenças de apropriação.
(E) diferenças individuais.

02. (SEDUC-AM-Pedagogo- CESPE) Julgue o item subsequente, no que se refere às funções do


supervisor escolar.
Compete ao supervisor escolar coordenar a orientação vocacional do educando, incorporando-a ao
processo educativo global.
( ) Certo ( ) Errado

Gabarito

01. E / 02. Errado

Respostas

01. E.
Muitos e variados são os fatores que influenciam na decisão da carreira. Embora na realidade sempre
atuem juntos Soares, para fins puramente didáticos, divide os fatores determinantes na escolha
profissional em: fatores políticos, fatores econômicos, fatores sociais, fatores educacionais, fatores
familiares e fatores psicológicos, sendo assim são as diferenças individuais os fatores de maior
relevância.

02. Errado.
A orientação vocacional ou profissional pode ser feita por psicólogos, e até mesmo com o auxílio do
orientador educacional.

Transtornos Alimentares

Os transtornos alimentares56 são qualquer tipo de alteração relacionada à alimentação de alguma


pessoa, essa alteração pode ser devida a fatores metabólicos, fisiológicos, econômicos e psicológicos.
Este tipo de transtorno teve um aumento significativo na população após o início da globalização, sendo
estudado vários fatores que podem influenciar na vida dessas pessoas que se tornam vítima do distúrbio
alimentar. Um dos fatores principais são os socioculturais que atualmente tem uma grande valorização à
magreza, estabelecendo um “padrão de beleza” que é impossível de ser atingido pela maioria, isso leva
a sociedade rejeita e discrimina pessoas consideradas obesas. Por causa desse culto a busca pela
magreza se torna constante em pessoas que ver o “corpo ideal” como o principal incentivo para o seu
sucesso, atratividade e autoestima elevada.
O mais belo precioso e resplandecente de todos os objetivos de consumo é o CORPO. A sua
redescoberta, após uma era milenária de puritanismo, sob o signo da libertação física e sexual, a sua
onipresença (em especial o corpo feminino...) na publicidade, na moda e na cultura das massas – o culto
higiênico, dietético e terapêutico com que se rodeia, a obsessão pela juventude, elegância, virilidade/
feminilidade, cuidados, regimes, praticas sacrificiais que com ele se conectam, o Mito do Prazer que o
circunda – tudo hoje testemunha que o corpo se tornou objeto de salvação. (BAUDRILLARD, MARLE)
As pessoas mais atingidas são adolescentes principalmente do sexo feminino, pois são mais
vulneráveis a insatisfação com a aparência física, o que define a chamada distorção da imagem corporal,
e também a fatores emocional envolvendo a convivência com os familiares, colega, trabalho e o principal

56
https://bit.ly/2uZOIkL

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a mídia. A mídia tem um papel fundamental no desencadeamento desse distúrbio, por ter um acesso
imediato da exposição de imagens de corpos magros idealizados. As famílias que são muitas
perfeccionistas e superprotetoras, sempre têm uma preocupação maior com o peso dos filhos, e isso
muitas vezes pode ocasiona o surgimento dessa doença.
Os portadores dessas síndromes podem apresentar outros transtornos psiquiátricos associados,
especialmente a transtornos de ansiedade, do controle de impulsos, da personalidade, abuso de
substancias e do humor. Os transtornos alimentares podem levar a pessoa à morte, as complicações
decorrentes estão associadas ao tempo de evolução da doença, a velocidade da perda de peso, a
suscetibilidade individual e aos métodos compensatórios utilizados. Essa perda excessiva de peso pode
ocasiona uma desnutrição e desidratação. Também tem alterações ósseas mesmo em adolescentes,
como o hipogonadismo que contribui para o “envelhecimento ósseo”, a osteopenia e até mesmo
osteoporose que favorece para a ocorrência de fraturas patológicas. Além disso, a mineração óssea fica
muito abaixo do normal, por causa da falta da ingestão de cálcio, proteínas e vitaminas D, isso leva a uma
diminuição no crescimento linear desse jovem. Podem ocasiona várias doenças, como obesidade,
ortorexia e sendo os principais transtornos alimentares a bulimia nervosa e anorexia nervosa.

ANOREXIA NERVOSA

Caracteriza pela intensa perda de peso à custa de uma restrição alimentar auto imposta, com ou sem
comportamento bulímicos, em busca desenfreada pela magreza. A anorexia nervosa ocasiona a distorção
da imagem corporal, por sempre que se olha no espelho afirma que está gorda, mesmo sendo percebida
por todos a sua intensa magreza. Essa aparência esquelética é a principal evidencia que pode ser
percebida pelos familiares de que essa pessoa possa estar com anorexia. Tem um quadro de restrição
alimentar, sendo que muitas vezes passam dias sem comer apenas bebendo água, é frequente o aumento
compulsivo de atividades físicas, provocam vômitos após a ingestão de algum alimento e a utilização de
substancias, como diuréticos, laxativos e anorexígenos.
Com essa preocupação excessiva com o peso leva essas pessoas a ter um grande interesse por tudo
sobre os alimentos, para saber quais são mais calóricos e sempre busca maneira de ingeri-los em uma
quantidade mínima. Um dos principais hábitos de pessoa com essa doença é esconder alimentos nos
armários, banheiros, roupas e em caixas, para que possam comer sem que as pessoas que convive com
ela possa ver, mas sempre depois de ingeri-los provoca o vômito. Com isso a perda de peso é vista como
uma conquista notável e como sinal de extraordinária disciplina, mas com o ganho de peso é percebido
como um inaceitável fracasso do autocontrole. Esse aumento de peso ocasiona a baixa autoestima e um
controle mais rígido e perfeccionista, essa preocupação com o peso podem apresentar distúrbios
emocionais como depressão.
A falta da ingestão de alimentos provoca a falta excessiva de nutrientes, levando a desenvolver
desnutrição energética proteica e a desregulação dos hormônios, ocasionando a amenorreia que é três
períodos menstruais consecutivos. Outros sintomas dessa doença são fraqueza, humor irritável,
desidratação, queda de cabelos, nem fome e distúrbios gastrointestinais.
A mortalidade varia de 5% a 20%, sendo a arritmia cardíaca uma das principais causas da morte súbita
nos pacientes anoréticos, além das alterações metabólicas e eletrolíticas. São indicativos de mortalidade:
duração da doença, perda intensa de pesa, ausência de suporte da familiar, comportamento compulsivo
e recorrências múltiplas. (NÓBREGA, Fernando)

Fatores de risco

Alguns fatores de risco podem levar pessoas a desenvolveram um quadro de anorexia. Confira:
- Mulheres têm mais chances de desenvolver a doença do que homens, apesar de o número de
homens de todas as idades com anorexia ter aumentado nos últimos anos. Uma hipótese para justificar
isso é que a mídia e a publicidade estejam influenciando no padrão ideal de beleza masculina cada vez
com mais frequência e intensidade, mostrando que a pressão social sobre a questão da beleza e do corpo
magro não faz mais tanta distinção de gênero.
- Anorexia é um distúrbio muito comum entre adolescentes, principalmente por conta da pressão social
existente nessa fase da vida e todas as mudanças que ocorrem no corpo e na mente. Entretanto, pessoas
de todas as idades podem desenvolver o problema, sendo considerado raro somente em indivíduos acima
dos 40
- Estudos mostram que alguns genes possam estar diretamente relacionados ao desenvolvimento da
anorexia

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- Histórico familiar, ou seja, ter um parente que apresenta ou apresentou algum distúrbio alimentar
pode aumentar as chances de desenvolver anorexia também
- O ato de perder ou ganhar peso pode desencadear em reações das mais variadas, desde elogios até
críticas. Elas podem, por isso, levar uma pessoa a recorrer a dietas cada vez mais extremas e ao
surgimento da anorexia
- Grandes mudanças na vida e na rotina podem acarretar no desenvolvimento de distúrbios
alimentares, entre eles a anorexia. Exemplos: mudança de escola, casa ou trabalho, morte de um ente
querido e términos de relacionamento
- Pessoas ligadas ao esporte e ao mundo artístico, são mais propensas a desenvolver anorexia
também, pois trabalham com a própria imagem e sofrem julgamentos por um número maior de pessoas
- A mídia e a sociedade são grandes responsáveis pela anorexia. A televisão e revistas de moda, bem
como os estereótipos sociais de beleza, despertam nas pessoas a sensação de que só serão felizes e
populares se seguirem um determinado padrão – alimentado diariamente pelos meios de comunicação e
reproduzido em todos os círculos sociais.

O tratamento da anorexia nervosa deve ser realizado por uma equipe multidisciplinar. Em primeiro
lugar tem que ter o restabelecimento do peso e de alguns hábitos alimentares adequados, a médio e
longo prazo modificar as alterações psíquicas. O nutricionista tem como objetivo avaliação e o
monitoramento nutricional, que inclui dietoterapia, aconselhamento e uso de suplementos nutricionais
específicos, para obter um equilíbrio entre os nutrientes que estão em falta no organismo e a educação
nutricional com a orientação para praticas alimentares adequadas. O principal objetivo a ser alcançado é
o peso ideal para a idade do paciente, para isso deve usar um guia alimentar e um planejamento de
refeições são essenciais para fornecer escolhas alimentares adequadas, com uma dieta balanceada, que
atenda às necessidades nutricionais do paciente.

BULIMIA NERVOSA

Caracteriza por períodos de compulsão alimentar, onde tem a ingestão excessiva de alimentos em um
curto espaço de tempo com sensação de perda de controle, chamados de episódios bulímicos, que pela
tentativa de não ganhar peso é acompanhado de métodos compensatórios, como vômitos auto induzido,
uso de laxantes, anorexígenos e diuréticos. Como a anorexia nervosa, tem algumas profissões que
determina o maior risco de desenvolver bulimia, como atletas, jóqueis, artistas e profissionais da moda,
em que o controle de peso é mais exigente. “Cerca de 30% de pacientes que buscam tratamento para
este transtorno apresentam história anterior de anorexia nervosa.” (NÓBREGA, Fernando, p.501).
Os episódios bulímicos está associado a fome exagerada e também para atender estado emocionais
ou estressantes, com isso ingerem alimentos bastantes calóricos e que seja de fácil preparo, como pizza,
chocolate, sanduiche, bolos e vários outros. Esse descontrole é sempre acompanhado posteriormente
por sentimento de culpa, angústia e vergonha.
Pessoas com bulimia nervosa se diferencia do anoréxico por ter comportamento que busca apenas
não ganhar peso sem o desejo excessivo de emagrecer, sendo que na maioria das vezes os bulímicos
têm o peso normal, e também por não tem uma distorção da imagem corporal tão intensa quanto os
anoréxicos. Com isso é mais difícil de diagnosticar essa doença, nem mesmo a família desconfia de que
pode estar acontecendo algo de errado com os hábitos alimentares dessa adolescente.
Apesar de uma aparecia saudável, pessoas com bulimia nervosa podem diagnostica uma serie de
complicações orgânicas. O mais comum são as inflamações no tubo digestivo provocadas pelo esforço
repetido de vomitar, outras doenças provocadas são alterações nos dentes por causa do pH ácido que
vem do estômago quando esta vomitando e também alterações da função intestinal, com presença de
diarreia e má absorção de agua e sai minerais, levando a desencadear desidratação e nas meninas têm
a menstruação irregular. O uso de excessivo de diuréticos, além de provocar edema, favorece infecções
urinarias e pode levar à insuficiência renal.
Essas complicações podem desenvolver deficiências de vitaminas e sais minerais, como cálcio,
potássio e magnésio, que são essenciais para o organismo e também podem surgir complicações
cardiovasculares.

Fatores de risco

- Fatores genéticos, psicológicos, traumáticos, familiares, sociais ou culturais podem contribuir para
seu desenvolvimento. A bulimia provavelmente ocorre devido a mais de um fator.

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- A bulimia afeta muito mais mulheres do que homens e é mais comum em mulheres adolescentes e
em jovens adultas.
- A genética também pode ser um fator de risco para a bulimia. Estudos mostram que ter um parente
com bulimia pode favorecer o desenvolvimento da doença. No entanto, ainda não está certo se é um
fator genético que predispõe à bulimia ou o comportamento familiar que favorece a doença.

O tratamento da bulimia, se assemelha ao de anorexia nervosa, deve ser realizado por uma equipe
multidisciplinar, com a atendimento psiquiátrico, psicológico e nutricional. Mas devem priorizar três
aspectos fundamentais: a regulação de hábitos alimentares, diminuição das possibilidades de compulsão
e de período de jejum. A conduta nutricional visa interromper o ciclo vicioso de episódios de ingestão
excessiva de alimentos e comportamentos compensatórios inadequados e a trata outras doenças que se
desenvolveu por causa do quadro clinico, como diabete, depressão e uso excessivo de medicamentos.
Melhorar os hábitos alimentares como se alimenta a cada três horas sem ingerir nada entre os intervalos
das refeições, evitando dietas e além de exercícios excessivos, tem uma alimentação equilibrada com a
ingestão de gorduras e fibras para promover a saciedade. E estabelecer estratégicas de controle, evitando
exposição aos riscos, como fazer compras de alimentos muitos calóricos quando não estiver com fome.
A internação hospitalar é raramente necessária, sendo indicadas apenas em casos que tenha sintomas
purgativos persistente, como alterações hemodinâmicas, convulsões e hipocalemia. E o tratamento com
psiquiátrica é indicado quando houver um elevado risco de suicídio.

OBESIDADE

É definida como um distúrbio do metabolismo energético, doença crônica, complexa de etiologia


multifatorial. Sendo que seu desenvolvimento ocorre pela associação de fatores genéticos e
comportamentais.

O que é?

Denomina-se obesidade uma enfermidade caracterizada pelo acúmulo excessivo de gordura corporal,
associada a problemas de saúde, ou seja, que traz prejuízos à saúde do indivíduo.

Como se desenvolve ou se adquire?

Nas diversas etapas do seu desenvolvimento, o organismo humano é o resultado de diferentes


interações entre o seu patrimônio genético (herdado de seus pais e familiares), o ambiente
socioeconômico, cultural e educativo e o seu ambiente individual e familiar. Assim, uma determinada
pessoa apresenta diversas características peculiares que a distinguem, especialmente em sua saúde e
nutrição.
A obesidade é o resultado de diversas dessas interações, nas quais chamam a atenção os aspectos
genéticos, ambientais e comportamentais. Assim, filhos com ambos os pais obesos apresentam alto risco
de obesidade, bem como determinadas mudanças sociais estimulam o aumento de peso em todo um
grupo de pessoas. Recentemente, vem se acrescentando uma série de conhecimentos científicos
referentes aos diversos mecanismos pelos quais se ganha peso, demonstrando cada vez mais que essa
situação se associa, na maioria das vezes, com diversos fatores.
Independente da importância dessas diversas causas, o ganho de peso está sempre associado a um
aumento da ingesta alimentar e a uma redução do gasto energético correspondente a essa ingesta. O
aumento da ingesta pode ser decorrente da quantidade de alimentos ingeridos ou de modificações de
sua qualidade, resultando numa ingesta calórica total aumentada. O gasto energético, por sua vez, pode
estar associado a características genéticas ou ser dependente de uma série de fatores clínicos e
endócrinos, incluindo doenças nas quais a obesidade é decorrente de distúrbios hormonais.

O que se sente?

O excesso de gordura corporal não provoca sinais e sintomas diretos, salvo quando atinge valores
extremos. Independente da severidade, o paciente apresenta importantes limitações estéticas,
acentuadas pelo padrão atual de beleza, que exige um peso corporal até menor do que o aceitável como
normal.
Pacientes obesos apresentam limitações de movimento, tendem a ser contaminados com fungos e
outras infecções de pele em suas dobras de gordura, com diversas complicações, podendo ser algumas

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vezes graves. Além disso, sobrecarregam sua coluna e membros inferiores, apresentando a longo prazo
degenerações (artroses) de articulações da coluna, quadril, joelhos e tornozelos, além de doença varicosa
superficial e profunda (varizes) com úlceras de repetição e erisipela.
A obesidade é fator de risco para uma série de doenças ou distúrbios que podem ser:

Doenças Distúrbios
· Hipertensão arterial · Distúrbios lipídicos
· Doenças cardiovasculares · Hipercolesterolemia
· Doenças cerebrovasculares · Diminuição de HDL ("colesterol bom")
· Diabetes Mellitus tipo II · Aumento da insulina
· Câncer · Intolerância à glicose
· Osteoartrite · Distúrbios menstruais/Infertilidade
· Coledocolitíase · Apnéia do sono

Assim, pacientes obesos apresentam severo risco para uma série de doenças e distúrbios, o que faz
com que tenham uma diminuição muito importante da sua expectativa de vida, principalmente quando
são portadores de obesidade mórbida (ver a seguir).

Como o médico faz o diagnóstico?

A forma mais amplamente recomendada para avaliação do peso corporal em adultos é o IMC (índice
de massa corporal), recomendado inclusive pela Organização Mundial da Saúde. Esse índice é calculado
dividindo-se o peso do paciente em quilogramas (Kg) pela sua altura em metros elevada ao quadrado
(quadrado de sua altura). O valor assim obtido estabelece o diagnóstico da obesidade e caracteriza
também os riscos associados conforme apresentado a seguir:

IMC ( kg/m2) Grau de Risco Tipo de obesidade


18 a 24,9 Peso saudável Ausente
25 a 29,9 Moderado Sobrepeso (Pré-Obesidade)
30 a 34,9 Alto Obesidade Grau I
35 a 39,9 Muito Alto Obesidade Grau II
40 ou mais Extremo Obesidade Grau III ("Mórbida")

Conforme pode ser observado, o peso normal, no indivíduo adulto, com mais de 20 anos de idade,
varia conforme sua altura, o que faz com que possamos também estabelecer os limites inferiores e
superiores de peso corporal para as diversas alturas conforme a seguinte tabela:

Altura (cm) Peso Inferior (kg) Peso Superior (kg)


145 38 52
150 41 56
155 44 60
160 47 64
165 50 68
170 53 72
175 56 77
180 59 81
185 62 85
190 65 91

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A obesidade apresenta ainda algumas características que são importantes para a repercussão de seus
riscos, dependendo do segmento corporal no qual há predominância da deposição gordurosa, sendo
classificada em:

Obesidade Difusa ou Generalizada


Obesidade Androide ou Troncular (ou Centrípeta), na qual o paciente apresenta uma forma corporal
tendendo a maçã. Está associada com maior deposição de gordura visceral e se relaciona intensamente
com alto risco de doenças metabólicas e cardiovasculares (Síndrome Plurimetabólica)
Obesidade Ginecoide, na qual a deposição de gordura predomina ao nível do quadril, fazendo com
que o paciente apresente uma forma corporal semelhante a uma pera. Está associada a um risco maior
de artrose e varizes.

Essa classificação, por definir alguns riscos, é muito importante e por esse motivo fez com que se
criasse um índice denominado Relação Cintura-Quadril, que é obtido pela divisão da circunferência da
cintura abdominal pela circunferência do quadril do paciente. De uma forma geral se aceita que existem
riscos metabólicos quando a Relação Cintura-Quadril seja maior do que 0,9 no homem e 0,8 na mulher.
A simples medida da circunferência abdominal também já é considerado um indicador do risco de
complicações da obesidade, sendo definida de acordo com o sexo do paciente:

Risco Aumentado Risco Muito Aumentado


Homem 94 cm 102 cm
Mulher 80 cm 88 cm

A gordura corporal pode ser estimada também a partir da medida de pregas cutâneas, principalmente
ao nível do cotovelo, ou a partir de equipamentos como a Bioimpedância, a Tomografia Computadorizada,
o Ultrassom e a Ressonância Magnética. Essas técnicas são úteis apenas em alguns casos, nos quais
se pretende determinar com mais detalhe a constituição corporal.
Na criança e no adolescente, os critérios diagnósticos dependem da comparação do peso do paciente
com curvas padronizadas, em que estão expressos os valores normais de peso e altura para a idade
exata do paciente.
De acordo com suas causas, a obesidade pode ainda ser classificada conforme a tabela a seguir.
Classificação da Obesidade de Acordo com suas Causas:

Obesidade por Distúrbio Nutricional


Dietas ricas em gorduras
Dietas de lancheiras

Obesidade por Inatividade Física


Sedentarismo
Incapacidade obrigatória
Idade avançada

Obesidade Secundária a Alterações Endócrinas


Síndromes hipotalâmicas
Síndrome de Cushing
Hipotireoidismo
Ovários Policísticos
Pseudohipaparatireoidismo
Hipogonadismo
Déficit de hormônio de crescimento
Aumento de insulina e tumores pancreáticos produtores de insulina

Obesidades Secundárias
Sedentarismo
Drogas: psicotrópicos, corticoides, antidepressivos tricíclicos, lítio, fenotiazinas, ciproheptadina,
medroxiprogesterona

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Cirurgia hipotalâmica

Obesidades de Causa Genética


Autossômica recessiva
Ligada ao cromossomo X
Cromossômicas (Prader-Willi)
Síndrome de Lawrence-Moon-Biedl

Cabe salientar ainda que a avaliação médica do paciente obeso deve incluir uma história e um exame
clínico detalhados e, de acordo com essa avaliação, o médico irá investigar ou não as diversas causas
do distúrbio. Assim, serão necessários exames específicos para cada uma das situações. Se o paciente
apresentar "apenas" obesidade, o médico deverá proceder a uma avaliação laboratorial mínima, incluindo
hemograma, creatinina, glicemia de jejum, ácido úrico, colesterol total e HDL, triglicerídeos e exame
comum de urina.
Na eventual presença de hipertensão arterial ou suspeita de doença cardiovascular associada,
poderão ser realizados também exames específicos (Rx de tórax, eletrocardiograma, ecocardiograma,
teste ergométrico) que serão úteis principalmente pela perspectiva futura de recomendação de exercício
para o paciente.
A partir dessa abordagem inicial, poderá ser identificada também uma situação na qual o excesso de
peso apresenta importante componente comportamental, podendo ser necessária a avaliação e o
tratamento psiquiátrico.
A partir das diversas considerações acima apresentadas, julgamos importante salientar que um
paciente obeso, antes de iniciar qualquer medida de tratamento, deve realizar uma consulta médica no
sentido de esclarecer todos os detalhes referentes ao seu diagnóstico e as diversas repercussões do seu
distúrbio.

Como se trata?

O tratamento da obesidade envolve necessariamente a reeducação alimentar, o aumento da atividade


física e, eventualmente, o uso de algumas medicações auxiliares. Dependendo da situação de cada
paciente, pode estar indicado o tratamento comportamental envolvendo o psiquiatra. Nos casos de
obesidade secundária a outras doenças, o tratamento deve inicialmente ser dirigido para a causa do
distúrbio.

Reeducação Alimentar

Independente do tratamento proposto, a reeducação alimentar é fundamental, uma vez que, através
dela, reduziremos a ingesta calórica total e o ganho calórico decorrente. Esse procedimento pode
necessitar de suporte emocional ou social, através de tratamentos específicos (psicoterapia individual,
em grupo ou familiar). Nessa situação, são amplamente conhecidos grupos de reforço emocional que
auxiliam as pessoas na perda de peso.
Independente desse suporte, porém, a orientação dietética é fundamental.
Dentre as diversas formas de orientação dietética, a mais aceita cientificamente é a dieta hipocalórica
balanceada, na qual o paciente receberá uma dieta calculada com quantidades calóricas dependentes de
sua atividade física, sendo os alimentos distribuídos em 5 a 6 refeições por dia, com aproximadamente
50 a 60% de carboidratos, 25 a 30% de gorduras e 15 a 20% de proteínas.
Não são recomendadas dietas muito restritas (com menos de 800 calorias, por exemplo), uma vez que
essas apresentam riscos metabólicos graves, como alterações metabólicas, acidose e arritmias
cardíacas.
Dietas somente com alguns alimentos (dieta do abacaxi, por exemplo) ou somente com líquidos (dieta
da água) também não são recomendadas, por apresentarem vários problemas. Dietas com excesso de
gordura e proteína também são bastante discutíveis, uma vez que pioram as alterações de gordura do
paciente além de aumentarem a deposição de gordura no fígado e outros órgãos.

Exercício

É importante considerar que atividade física é qualquer movimento corporal produzido por músculos
esqueléticos que resulta em gasto energético e que exercício é uma atividade física planejada e
estruturada com o propósito de melhorar ou manter o condicionamento físico.

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1484041 E-book gerado especialmente para MAURICIO PEREIRA BARROS
O exercício apresenta uma série de benefícios para o paciente obeso, melhorando o rendimento
do tratamento com dieta. Entre os diversos efeitos se incluem:

-a diminuição do apetite,
-o aumento da ação da insulina,
-a melhora do perfil de gorduras,
-a melhora da sensação de bem-estar e autoestima.

O paciente deve ser orientado a realizar exercícios regulares, pelo menos de 30 a 40 minutos, ao
menos 4 vezes por semana, inicialmente leves e a seguir moderados. Esta atividade, em algumas
situações, pode requerer profissional e ambiente especializado, sendo que, na maioria das vezes, a
simples recomendação de caminhadas rotineiras já provoca grandes benefícios, estando incluída no que
se denomina "mudança do estilo de vida" do paciente.

Questões

01. (BANPARÁ-Médico do Trabalho-INAZ do Pará/2014) Caracteriza-se por uma ingestão


descontrolada e compulsiva de alimentos, geralmente seguida por uma purgação:
(A) Bulimia Nervosa.
(B) Anorexia.
(C) Compulsão Alimentar Restritiva.
(D) Dunkorexia.
(E) Compulsão Alimentar Simples.

02.(UFGD-Médico Psiquiatra-INSTITUTO AOCP/2014) Em relação à anorexia, assinale a


alternativa correta
(A) É caracterizada por compulsão alimentar, como ingerir mais alimentos do que a maioria das
pessoas em circunstâncias similares e em um período semelhante de tempo, com uma forte sensação de
perda de controle.
(B) Refere-se a um excesso da adiposidade corporal.
(C) É caracterizada por um comportamento obstinado e proposital direcionado a perder peso, baixo,
peso, preocupação com o peso corporal e alimentação, padrões peculiares de manejo dos alimentos,
medo intenso de aumento de peso, alterações da imagem corporal e amenorreia.
(D) Sentem seus corpos grotescos e desagradáveis e que os outros os veem com hostilidade e
desprezo. Esse sentimento está fortemente associado à autoconsciência e ao comprometimento do
desempenho social.
(E) O aumento da atividade física é recomendado com frequência como parte de um regime de redução
de peso, associado com uma dieta rica em colágeno e glútem.

03. (TJ-PE - Analista Judiciário - Medicina – Psiquiátrica – FCC/2012) Com relação à Anorexia
Nervosa (AN), é correto afirmar:
(A) A prevalência gira em torno de 5 a 10% da população com uma predominância do sexo feminino.
(B) As principais comorbidades associadas a esse quadro são o transtorno bipolar e quadros
psicóticos.
(C) Os principais transtornos de personalidade associam-se aos subtipos de AN, havendo uma maior
prevalência de transtorno de personalidade bor- derline no subtipo restrito e de personalidade anancástico
e evitativo no subtipo purgativo.
(D) Alguns dos fatores de má evolução da doença podem incluir baixo peso no início do tratamento,
presença de comorbidades psiquiátricas, uso de métodos purgativos, caos familiar e demora na busca
por tratamento.
(E) O tratamento envolve equipe multidisciplinar, sendo o principal o uso de medicações que
aumentem o apetite como a olanzapina e a mirtazapina.

Gabarito

01. A / 02. C / 03.C

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Conceito de Família57

De acordo com Caio Mário, família em sentido genérico e biológico é o conjunto de pessoas que
descendem de tronco ancestral comum; em senso estrito, a família se restringe ao grupo formado pelos
pais e filhos; e em sentido universal é considerada a célula social por excelência.
No que concerne à família, Silvio Rodrigues num conceito mais amplo, diz ser a formação por todas
aquelas pessoas ligadas por vínculo de sangue, ou seja, todas aquelas pessoas provindas de um tronco
ancestral comum, o que inclui, dentro da órbita da família, todos os parentes consanguíneos. Num sentido
mais estrito, constitui a família o conjunto de pessoas compreendido pelos pais e sua prole.
Já Maria Helena Diniz discorre sobre família no sentido amplo como todos os indivíduos que estiverem
ligados pelo vínculo da consanguinidade ou da afinidade, chegando a incluir estranhos. No sentido restrito
é o conjunto de pessoas unidas pelos laços do matrimônio e da filiação, ou seja, unicamente os cônjuges
e a prole.
Cezar Fiúza, considera família de modo lato sensu, como sendo “uma reunião de pessoas
descendentes de um tronco ancestral comum, incluídas aí também as pessoas ligadas pelo casamento
ou pela união estável, juntamente com seus parentes sucessíveis, ainda que não descendentes”, como
também define em modo stricto sensu dizendo que: “família é uma reunião de pai, mãe e filhos, ou apenas
um dos pais com seus filhos”.
Segundo Paulo Nader, Família consiste em "uma instituição social, composta por mais de uma pessoa
física, que se irmanam no propósito de desenvolver, entre si, a solidariedade nos planos assistencial e da
convivência ou simplesmente descendem uma da outra ou de um tronco comum".
Sintetizando a conceituação desse instituto, Silvio Venosa, assevera que a Família em um conceito
amplo, "é o conjunto de pessoas unidas por vínculo jurídico de natureza familiar", em conceito restrito,
"compreende somente o núcleo formado por pais e filhos que vivem sob o pátrio poder".
Washington de Barros Monteiro ainda menciona que, enquanto a família num sentido restrito, abrange
tão somente o casal e a prole, num sentido mais largo, cinge a todas as pessoas ligadas pelo vínculo da
consanguinidade, cujo alcance é mais dilatado, ou mais circunscrito.
Finalizando Carlos Roberto Gonçalves traz família de uma forma abrangente como “todas as pessoas
ligadas por vínculo de sangue e que procedem, portanto, de um tronco ancestral comum, bem como
unidas pela afinidade e pela adoção”. E também de uma forma mais específica como, “parentes
consanguíneos em linha reta e aos colaterais até o quarto grau”.
Dessa forma, a partir do conceito, pode-se perceber que família é, unidade básica da sociedade
formada por indivíduos com ancestrais em comum ou ligados por laços afetivos. Podendo também
ser considerada como, um conjunto invisível de exigências funcionais que organiza a interação
dos membros da mesma, considerando-a, igualmente, como um sistema, que opera através de
padrões transacionais.

Os Tipos de Família
Por muito tempo, a organização familiar fora comandada pelo modelo matriarcal, ou seja, modelo que
surgiu do vínculo sanguíneo, biológico e instintivo da mãe para com o filho. Nesse modelo a mãe, a figura
da mulher no lar, destacava por sua autoridade. Após a fase utilização de tal modelo, criou-se um novo
sistema de costumes, ou seja, o das famílias patriarcais, tendo como característica principal a
inquestionável e arbitrária autoridade do pai. O homem destacou nas atividades do campo, da batalha e
da caça, e tornou figura principal.
A família num sentido sociológico recoloca-se em estágios de comprovação fática prevalecendo na
ocorrência de indução de fenômenos sociais e políticos de aceitação.
Para Mac Lennan, Morgan, Spencer, Engels, D’aguano, Westermarck, Gabriel Tarde, Bachofen, em
embasamentos de monumentos históricos estabelece observância aos “primitivos atuais”, ou seja, as
tribos indígenas, para a reconstituição das origens.
Em um período evolutivo como um todo, a mulher este reservada a um lar, fato este, que a família
ocidental viveu longo período sob forma “patriarcal”.
Como ressalta Caio Mário em que atualmente Cícero alude à figura valetudinária o tônus emocional
com plena autoridade de um patriarcal não se condicionando a idade avançada e a quase cegueira.
Em Roma, a família era organizada em função do princípio da autoridade abrangendo a eles
subordinados. O pater era ao mesmo tempo chefe político, sacerdote e juiz, comandava como um todo,
impondo-lhes pena corporal. A mulher vivia subordinada a esta autoridade, em nenhum momento

57
Texto baseado na obra de MOTA, T. S.; ROCHA, R. F.; MOTA, G. B. C. Família – Considerações gerais e historicidade no âmbito jurídico. 2011.

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adquirindo autonomia, se passando a função de filho e de esposa sem direitos próprios. Só a esta
autoridade pater que lhe adquiria bens, domínio sobre o patrimônio familiar.
Com o passar do tempo houve alterações a este rigor conhecendo-se o casamento, a instigação ao
patrimônio independente para os filhos em relação aos militares contraídos como soldado.
Daí podemos falar em poder familiar, como já falamos que no poder familiar não é mais absoluto no
sentido do poder que conferia aos pais sobre domínio dos filhos, mas sim focado no poder afetivo,
cabendo aos pais a corresponsabilidade e parceria nos direitos e deveres dos filhos e a missão de
equilibrá-los.
Neste contexto, diante da promulgação da nossa Carta Magna, foram devolvidos parâmetros ao
reconhecimento da família como base da sociedade fundando princípios, efeitos e as obrigações,
incumbindo a responsabilidade de proteção da família ao Estado.
Portanto o artigo 226 da Carta Magna identifica formas de entidades familiares diversificadas como a
união estável, sendo reconhecida a união entre homem e mulher com características de duradoura,
ininterrupta e com objetivo de constituir família, devendo a lei facilitar sua conversão em casamento, a
família monoparental, como comunidade formada por qualquer dos pais e seus descendentes e o
casamento, a união mais comum, feita em contrato solene.
Segundo Dimitre Soares “as relações de família são, portanto, amplamente afetadas pelas
transformações da globalização, que abre espaço para as manifestações plurais de comportamento”.
Ainda fala da necessidade do ordenamento jurídico se adequar a interpretação das relações de família,
visando a desordem nos “parâmetros tradicionais de organização familiar”.
Com relação as modificações do conceito de família e das diversas formas de constituição de família
com o passar dos anos, Soares ainda fala que:
“O mundo contemporâneo requer a adequação do fenômeno de internacionalização de Direitos
Humanos às normas de direito interno. Assim, novos temas como a igualdade de gênero, a
democratização de uniões livres, a reconstrução do parâmetro parental, a socioafetividade, a inseminação
artificial ou as uniões homoafetivas incrementam o debate que descamba, necessariamente, na
concepção tradicional dos modelos familiares, passando a ser necessário que se repense os critérios de
igualdade e de cidadania aplicáveis a estes e inúmeros outros casos.”
A partir daí, pode-se concluir que existem novas espécies de família como substituta, alternativa,
moderna, extensa e ampliada, sócioafetiva entre outras.

Quadro – tipos de Famílias

- Família Natural
A família natural é tida como a mais comum, pois é aquela que possui laços sanguíneos, constituída
por pais e filhos, provinda do modelo de família através do casamento ou da união estável.

- Família Monoparental
Família constituída por um de seus genitores e filho, ou seja, por mãe e filho, ou pai e filho,
decorrente de produção independente, separação dos cônjuges, morte, abandono, podendo ser
biologicamente constituída e por adoção. Reconhecida como entidade familiar na Carta Magna, artigo
226, §4º: “comunidade formada por qualquer dos pais e seus descendentes”.

- União Estável
União estável é entidade familiar, que constitui união entre homem e mulher, fora do casamento,
sendo esta duradoura, pública, com fins de constituir família, e possuem fidelidade recíproca.

- Casamento
Casamento é a terceira e última entidade familiar trazida pelo Constituição Federal de 1988,
considerando a mais antiga, mais conhecida e aceita pela sociedade, e a mais formal.
Conforme Silvio Rodrigues:
“Casamento é o contrato de direito de família que tem por fim promover a união do homem e da
mulher, de conformidade com a lei, a fim de regularem suas relações sexuais, cuidarem da prole
comum e se prestarem mútua assistência.”
Conceito muito comum em relação a nossa legislação civil. Carlos Roberto Gonçalves diz ser
contrato de direito de família que regula a união entre marido e mulher.

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- Família Substituta
A família substituta é favorável da família moderna, assim nas palavras de Marlusse Pestana Daher,
que prossegue: “É aquela que se propõe trazer para dentro dos umbrais da própria casa, uma criança
ou adolescente que por qualquer circunstância foi desprovido da família natural, para que faça parte
integrante dela, nela se desenvolva e seja”.
Pode-se constatar nestas palavras a apropriada natureza da Colocação em Família Substituta,
porquanto expõe que é na solidariedade que incide todo o alicerce deste instituto. A necessidade de
um, sendo satisfeita pela possibilidade de ajuda do outro.
A colocação em família substituta pode ocorrer de três formas: guarda, tutela e adoção.

- Família Alternativa
Dividida em famílias homossexuais e família comunitárias, sendo nesta o papel dos pais e da escola
descentralizado como ocorre nas famílias tradicionais, sendo todos os adultos responsáveis pela
educação e criação das crianças e adolescentes; a primeira se trata de um casal do mesmo sexo que
vivem juntos tendo filhos adotados ou biológicos de um dos parceiros ou de ambos.

- Família Moderna
E o modelo de família em que o pai perde o autoritarismo, e mãe deixa de cuidar única e
exclusivamente da casa e dos filhos e passa a competir com o homem, sendo assim todos que
compõem a família passam a ter influência dentro dos lares, expondo suas opiniões, participando
efetivamente, com base no respeito, no amor, na afetividade, no carinho, na atenção.

- Família Extensa e Ampliada


O artigo 25, parágrafo único, da Lei 12.010/09, que trata da reforma do Estatuto da Criança e do
Adolescente, introduz família extensa ou ampliada como sendo espécie da família natural, distinta da
família substituta, in verbis: “Entende-se por família extensa ou ampliada aquela que se estende para
além da unidade pais e filhos ou da unidade do casal, formada por parentes próximos com os quais a
criança ou o adolescente convive e mantém vínculos de afinidade e afetividade”.

- Família Sócioafetiva
Consolida-se a família sócioafetiva como um novo elemento no Direito Brasileiro contemporâneo,
transpondo os limites fixados pela Constituição Federal de 1988, porém incorporados dos seus
princípios. Quando declarada a convivência familiar e comunitária, a não discriminação de filhos, a
corresponsabilidade dos pais quanto ao exercício do poder familiar e o núcleo monoparental
reconhecido como entidade familiar está concretizada a chamada família sócioafetiva. Os vínculos de
afeto se sobrepõem à verdade biológica, convocando assim, os pais a uma "paternidade responsável".

Função social da família, da escola e interdependência dos sistemas família e escola58


Educação e escola têm uma relação estreita, apesar de esta não configurar uma relação de
dependência, pois há uma distinção entre a educação escolar e a educação que ocorre fora da escola.
De acordo com Guzzo, o sentido etimológico da palavra educar significa promover, assegurar o
desenvolvimento de capacidades físicas, intelectuais e morais, sendo que, de forma geral, tal tarefa tem
sido de responsabilidade dos pais.
De acordo com Bock, Furtado e Teixeira, o grupo familiar tem uma função social determinada a partir
das necessidades sociais, sendo que entre suas funções está, principalmente, o dever de garantir o
provimento das crianças para que possam exercer futuramente atividades produtivas, bem como o dever
de educá-las para que "tenham uma moral e valores compatíveis com a cultura em que vivem". Nesse
mesmo sentido, Oliveira resume a função da família dizendo que "a educação moral, ou seja, a
transmissão de costumes e valores de determinada época torna-se, nesta perspectiva, seu principal
objetivo"
A responsabilidade familiar junto às crianças em termos de modelo que a criança terá e do
desempenho de seus papéis sociais é tradicionalmente chamada de educação primária, uma vez
que tem como tarefa principal orientar o desenvolvimento e aquisição de comportamentos
considerados adequados, em termos dos padrões sociais vigentes em determinada cultura.
A escola é a instituição que tem como função a socialização do saber sistematizado, ou seja,
do conhecimento elaborado e da cultura erudita. De acordo com Saviani, a escola se relaciona

58
Oliveira, C. B. E. de; Marinho-Araújo, C. M. A relação família-escola: intersecções e desafios. Estud. Psicol.: Campinas vol. 2010.

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com a ciência e não com o senso comum, e existe para proporcionar a aquisição de instrumentos
que possibilitam o acesso ao saber elaborado (ciência) e aos rudimentos (bases) desse saber. A
contribuição da escola para o desenvolvimento do sujeito é específica à aquisição do saber
culturalmente organizado e às áreas distintas de conhecimento. No que diz respeito à família, "um
dos seus papéis principais é a socialização da criança, isto é, sua inclusão no mundo cultural
mediante o ensino da língua materna, dos símbolos e regras de convivência em grupo, englobando
a educação geral e parte da formal, em colaboração com a escola".
Escola e família têm suas especificidades e suas complementariedades. Embora não se possa supô-
las como instituições completamente independentes, não se pode perder de vista suas fronteiras
institucionais, ou seja, o domínio do objeto que as sustenta como instituições.
Esses dois sistemas têm objetivos distintos, mas que se interpenetram, uma vez que "compartilham a
tarefa de preparar as crianças e os jovens para a inserção crítica, participativa e produtiva na sociedade".
A divergência entre escola e família está na tarefa de ensinar, sendo que a primeira tem a função de
favorecer a aprendizagem dos conhecimentos construídos socialmente em determinado momento
histórico, de ampliar as possibilidades de convivência social e, ainda, de legitimar uma ordem social,
enquanto a segunda tem a tarefa de promover a socialização das crianças, incluindo o aprendizado de
padrões comportamentais, atitudes e valores aceitos pela sociedade.
Desta forma entende-se que, apesar de escola e família serem agências socializadoras distintas, as
mesmas apresentam aspectos comuns e divergentes: compartilham a tarefa de preparar os sujeitos para
a vida socioeconômica e cultural, mas divergem nos objetivos que têm nas tarefas de ensinar.

Relação família-escola
Tendo como pano de fundo a divisão de responsabilidades no que concerne à educação e socialização
de crianças e jovens e a relação que se estabelece entre as instituições familiares e escolares, pesquisas
e levantamentos acerca desta relação passam a ser objeto de estudo de diversas áreas do conhecimento,
como a psicologia, a sociologia, a educação, entre outras.
Considerando as várias perspectivas e abordagens relativas ao tema, os trabalhos e pesquisas sobre
a temática da relação família-escola podem ser organizados em dois grandes grupos, denominados
enfoque sociológico e enfoque psicológico.
No enfoque sociológico a relação família-escola é vista em função de determinantes ambientais e
culturais. A relação entre educação e classe social mostra um certo conflito entre as finalidades
socializadoras da escola (valores coletivos) e a educação doméstica (valores individuais), ou seja, entre
a organização da família e os objetivos da escola. As famílias que não se enquadram no suposto modelo
desejado pela escola são consideradas as grandes responsáveis pelas disparidades escolares. Seguindo
este enfoque, faz-se necessário, para o bom funcionamento da escola, que as famílias adotem as
mesmas estratégias de socialização por elas utilizadas.
Assim, a representação de modelo familiar certo/correto ganha projeção e se naturaliza, tendo a
própria escola como disseminadora da ideia de que algumas famílias operam de modo diverso do seu
objetivo. Em função dessa divergência, as estratégias de socialização das famílias passam a ser a
preocupação da escola, de forma que esta amplia seus âmbitos de ação, tentando assumir ou tentando
substituir a família em sua ampla missão socializadora. Para Oliveira, há uma intenção que passa muitas
vezes despercebida nessa tentativa de aproximação e colaboração, que é a de promover uma educação
para as famílias tidas como "desestruturadas". O ambiente escolar exerce um poder de orientação sobre
os pais para que estes possam educar melhor os filhos e estes, por sua vez, possam frequentar a escola.
Enquanto no enfoque sociológico a família é responsabilizada pela formação social e moral do
indivíduo, no enfoque psicológico ela é responsabilizada pela formação psicológica. A ideia de que a
família é a referência de vida da criança - o locus afetivo e condição sine qua non de seu desenvolvimento
posterior - será utilizada para manter certa ligação entre o rendimento escolar do aluno e sua dinâmica
familiar, colocando, mais uma vez, a família no lugar de desqualificada.
Nesse enfoque, as razões de ordem emocional e afetiva ganham um colorido permanente quanto ao
entendimento da relação família-escola e da ocorrência do fracasso escolar. Ganha status natural a
crença de que uma "boa" dinâmica familiar é responsável pelo "bom" desempenho do aluno. As
descrições centradas no plano afetivo ganham a atenção dos professores que, com algum conhecimento
de psicologia, levam esse discurso para dentro da sala de aula e passam, em um processo naturalizado
por todos, a avaliar e analisar o comportamento dos alunos.
Posto desta forma, nota-se que o enfoque sociológico aborda os determinantes ambientais e culturais
presentes na relação família-escola, destacando que cabe à escola cumprir as exigências sociais,
enquanto o enfoque psicológico considera os determinantes psicológicos presentes na estrutura familiar
como os grandes responsáveis pelo desencontro entre objetivos e valores nas duas instituições. Assim,

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em uma espécie de complementaridade, encontra-se um velado enfrentamento da escola com a família,
aparentemente diluído nos grandes projetos de participação e de parceria entre esses dois sistemas,
podendo-se afirmar que em ambos os enfoques destacam-se dois aspectos principais:

1) a incapacidade da família para a tarefa de educar os filhos e


2) a entrada da escola para subsidiar essa tarefa, principalmente quando se trata do campo moral.

A partir destas colocações, vê-se que a relação família-escola está permeada por um movimento de
culpabilização e não de responsabilização compartilhada, além de estar marcada pela existência de uma
forte atenção da escola dirigida à instrumentalização dos pais para a ação educacional, por se acreditar
que a participação da família é condição necessária para o sucesso escolar.
A quem caberia a responsabilidade de construir essa relação? No relato de muitos professores há a
afirmação de que, apesar de abrirem as portas da escola à participação dos pais, esses são
desinteressados em relação à educação dos filhos, na medida em que atribuem à escola toda a
responsabilidade pela educação. Esta argumentação dos professores "visa, apenas, culpar a vítima e é
uma visão pessimista das relações escola/pais", a partir da qual não se consegue dar passos positivos
para ultrapassar os obstáculos à relação família-escola.
Ao contrário dos professores que acreditam que os pais é que devem ir à escola mostrando-se
interessados pelo desenvolvimento de seus filhos e pela relação entre família e escola, Tancredi e Reali,
acreditam que a construção da parceria entre escola e família é função inicial dos professores, pois eles
são elementos-chave no processo de aprendizagem. Dada a formação profissional específica que têm,
as tentativas de aproximação e de melhoria das relações estabelecidas com as famílias devem partir,
preferencialmente, da escola, pois "transferir essa função à família somente reforça sentimentos de
ansiedade, vergonha e incapacidade aos pais, uma vez que não são eles os especialistas em educação".
Todavia, apesar desse discurso em que se fala que a escola é que deve ir às famílias, os modelos de
envolvimento entre as famílias e a escola focalizam principalmente os pais e se referem pouco às ações
dos professores e da escola na promoção da relação família-escola, como mostram os modelos propostos
por Joyce Epstein, Don Davies e Owen Heleen.

Para exemplificar, o modelo de Joyce Epstein defende a existência de cinco tipos de envolvimento:

a) os pais ajudarem os filhos em casa, que diz respeito à função dos pais em atender as necessidades
básicas dos filhos e em organizar a rotina familiar diária;
b) os professores comunicarem-se com os pais, que se refere à função da escola de informar os pais
acerca do regulamento interno da escola, dos programas escolares e dos progressos e dificuldades dos
filhos;
c) envolvimento dos pais na escola, apoiando voluntariamente a organização de festas e alunos com
dificuldades de aprendizagem;
d) envolvimento dos pais em atividades de aprendizagem, em casa, participando da realização de
trabalhos, projetos e deveres de casa;
e) envolvimento dos pais na direção das escolas, influenciando e participando da tomada de decisões,
se possível.

O aspecto mais comum entre os três modelos59 refere-se ao fato de que em todos a ação dos pais é
priorizada, seja diante de questões pedagógicas (ensino tutorial em casa ou na escola, trabalho voluntário
dos pais na escola e na sala de aula, apoio na realização de tarefas, trabalhos e atividades de
aprendizagem) ou de questões políticas (pais com poder deliberativo na escola, participando e
influenciando a tomada de decisões). Os modelos pouco se referem às ações da escola e dos professores
no sentido de promover a relação família-escola; tais ações são referidas somente nas ocasiões em que
cabe à escola informar aos pais acerca do regulamento interno da escola, dos programas escolares e de
progressos e dificuldades dos filhos.
Ao listar as "16 maneiras de envolver os pais na escola", Marques fez uma adaptação do trabalho de
Joyce Epstein e elaborou uma lista de procedimentos que podem favorecer a aproximação das famílias.
Entretanto, tal lista menciona, exclusivamente, ações a serem desencadeadas pelos pais no contexto
familiar, sem haver menção à interação família-escola.
Além de tais ações se referirem apenas a atitudes a serem adotadas pelos pais, fica explícita, entre as
maneiras listadas, a crença existente acerca da necessidade de orientar e ensinar aos pais sobre como

59
Modelos de Joyce Epstein, Don Davies e Owen Heleen.

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ensinar seus filhos: "explicar aos pais certas técnicas de ensino" ou "propor aos pais que treinem os filhos,
ajudando-os a fazer exercícios de leitura, matemática, etc."
Tais atitudes decorrem da noção da escola de que o envolvimento dos pais aparece relacionado à
participação e colaboração nas atividades propostas pela escola e no interesse pelo desempenho de seus
filhos. As expectativas quanto à participação dos pais envolvem o acompanhamento da tarefa de casa ou
a formação do aluno em termos de disciplina, respeito e comportamento adequado.
Junto a diretores e professores percebe-se, também, a pouca tendência da escola para buscar uma
parceria. É interessante observar a colocação acerca do posicionamento contraditório dos diretores e
professores que, por um lado, "acusaram os pais de falta de compreensão ou aceitação dos problemas
das crianças, e o pouco retorno de seus esforços para ajudá-los", mas, por outro lado, sentem-se
invadidos pela presença dos pais, pois consideram que os pais não sabem participar com uma relação
de colaboração, mas sim de cobrança, uma vez que não entendem do processo de ensino-aprendizagem.
À família são impostos limites para entrar em questões próprias da escola, como no campo
pedagógico. Mas o mesmo parece não acontecer com a escola em relação à sua entrada na família, pois
aquela acredita estar autorizada a penetrar nos problemas domésticos e a lidar com eles, além de se
considerar apta a estabelecer os parâmetros para a participação e o envolvimento da família.

Questões

01. (UFC- Assistente Social- INSTITUTO AOCP) A família monoparental é aquela


(A) composta pela união de um homem e uma mulher.
(B) composta por um homem e uma mulher oriundos ou não de outra relação.
(C) composta pela mulher mãe e seus filhos.
(D) composta pelo homem pai e seus filhos.
(E) formado por qualquer dos pais e seus descendentes.

02. (IF-PR- Assistente de Alunos- CETRO) Além da relação parentalidade/ filiação, outras relações
de parentesco compõem uma família. A família composta pelos avós, tios, primos, irmãos, cunhados,
estando ou não dentro do mesmo domicílio, refere-se à
(A) família natural.
(B) família acolhedora.
(C) família extensa.
(D) família de apoio.
(E) família acolhedora.

03. (SEE-MG- Professor de Educação Básica- FCC) Para estimular a participação das famílias no
ambiente escolar, a escola deve
(A) acolher as famílias para que todas sintam-se bem naquele ambiente e possam expor sua opinião
e desenvolver reuniões para compartilhar o trabalho realizado na escola apresentando sugestões de
como os pais podem dar suporte para seus filhos.
(B) planejar o acolhimento dos pais no início do ano e nas datas comemorativas e propiciar
atendimentos em uma reunião semestral de pais para explicitar os problemas disciplinares ou dificuldades
de aprendizagem dos alunos.
(C) realizar reuniões com as famílias no início e no final do ano letivo para informar as regras da escola
e avaliar os avanços dos alunos, além de realizar o atendimento individual dos pais cujos filhos
apresentam problemas na escola.
(D) estabelecer regras claras de convivência no espaço escolar apontando possibilidades e limites da
participação dos pais na unidade e desenvolver um sistema de comunicação eficiente para que os pais
estejam bem informados sobre os acontecimentos da escola.

Gabarito
01. E / 02. C / 03. A

Respostas
01. E.
Família constituída por um de seus genitores e filho, ou seja, por mãe e filho, ou pai e filho, decorrente
de produção independente, separação dos cônjuges, morte, abandono, podendo ser biologicamente
constituída e por adoção. Reconhecida como entidade familiar na Carta Magna, artigo 226, §4º:
“comunidade formada por qualquer dos pais e seus descendentes”.

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02. C.
“Entende-se por família extensa ou ampliada aquela que se estende para além da unidade pais e filhos
ou da unidade do casal, formada por parentes próximos com os quais a criança ou o adolescente convive
e mantém vínculos de afinidade e afetividade”.

03. A.
A escola deve favorecer e estimular a participação da família no ambiente escolar acolhendo-a e
fazendo que os familiares se sintam bem naquele ambiente desejando retornar a ele frequentemente e
participar da vida escolar dos filhos.

Sexualidade

A sexualidade tem grande importância no desenvolvimento e na vida psíquica das pessoas, pois
independentemente da potencialidade reprodutiva, relaciona-se com a busca do prazer, necessidade
fundamental dos seres humanos. Nesse sentido, a sexualidade é entendida como algo inerente, que se
manifesta desde o momento do nascimento até a morte, de formas diferentes a cada etapa do
desenvolvimento. Além disso, sendo a sexualidade construída ao longo da vida, encontra-se
necessariamente marcada pela história, cultura, ciência, assim como pelos afetos e sentimentos,
expressando-se então com singularidade em cada sujeito. Indissociavelmente ligado a valores, o estudo
da sexualidade reúne contribuições de diversas áreas, como Antropologia, História, Economia,
Sociologia, Biologia, Medicina, Psicologia e outras mais. Se, por um lado, sexo é expressão biológica
que define um conjunto de características anatômicas e funcionais (genitais e extragenitais), a
sexualidade é, de forma bem mais ampla, expressão cultural. Cada sociedade cria conjuntos de
regras que constituem parâmetros fundamentais para o comportamento sexual de cada indivíduo.
Nesse sentido, a proposta de Orientação Sexual considera a sexualidade nas suas dimensões
biológica, psíquica e sociocultural.

Sexualidade na infância e na adolescência60

Os contatos de uma mãe com seu filho despertam nele as primeiras vivências de prazer. Essas
primeiras experiências sensuais de vida e de prazer não são essencialmente biológicas, mas constituirão
o acervo psíquico do indivíduo, serão o embrião da vida mental no bebê. A sexualidade infantil se
desenvolve desde os primeiros dias de vida e segue se manifestando de forma diferente em cada
momento da infância. A sua vivência saudável é fundamental na medida em que é um dos aspectos
essenciais de desenvolvimento global dos seres humanos.
A sexualidade, assim como a inteligência, será construída a partir das possibilidades individuais e de
sua interação com o meio e a cultura. Os adultos reagem, de uma forma ou de outra, aos primeiros
movimentos exploratórios que a criança faz em seu corpo e aos jogos sexuais com outras crianças. As
crianças recebem então, desde muito cedo, uma qualificação ou “julgamento” do mundo adulto em que
está imersa, permeado de valores e crenças que são atribuídos à sua busca de prazer, o que comporá a
sua vida psíquica.
Nessa exploração do próprio corpo, na observação do corpo de outros, e a partir das relações
familiares é que a criança se descobre num corpo sexuado de menino ou menina. Preocupa-se então
mais intensamente com as diferenças entre os sexos, não só as anatômicas, mas também com todas as
expressões que caracterizam o homem e a mulher. A construção do que é pertencer a um ou outro sexo
se dá pelo tratamento diferenciado para meninos e meninas, inclusive nas expressões diretamente
ligadas à sexualidade e pelos padrões socialmente estabelecidos de feminino e masculino. Esses padrões
são oriundos das representações sociais e culturais construídas a partir das diferenças biológicas dos
sexos e transmitidas pela educação, o que atualmente recebe a denominação de relações de gênero.
Essas representações absorvidas são referências fundamentais para a constituição da identidade da
criança.

As formulações conceituais sobre sexualidade infantil datam do começo deste século e ainda hoje não
são conhecidas ou aceitas por parte dos profissionais que se ocupam de crianças, inclusive educadores.
Para alguns, as crianças são seres “puros” e “inocentes” que não têm sexualidade a expressar, e as
manifestações da sexualidade infantil possuem a conotação de algo feio, sujo, pecaminoso, cuja
existência se deve à má influência de adultos. Entre outros educadores, no entanto, já se encontram

60
BRASIL. Secretaria de Educação Fundamental. Parâmetros Curriculares Nacionais: Orientação Sexual. Portal MEC.

. 133
1484041 E-book gerado especialmente para MAURICIO PEREIRA BARROS
bastante difundidas as noções da existência e da importância da sexualidade para o desenvolvimento de
crianças e jovens.
Em relação à puberdade, as mudanças físicas incluem alterações hormonais que, muitas vezes,
provocam estados de excitação incontroláveis, ocorre intensificação da atividade masturbatória e instala-
se a função genital. É a fase das descobertas e experimentações em relação à atração e às fantasias
sexuais. A experimentação dos vínculos tem relação com a rapidez e a intensidade da formação e da
separação de pares amorosos entre os adolescentes.

É uma questão bastante atual e presente no cotidiano de todos os profissionais da educação a postura
a ser adotada, dentro das escolas, em face das manifestações da sexualidade dos alunos.

Como dito anteriormente, sexo também é coisa de criança61. Tendo sempre em mente que cada
criança é uma criança, vamos pensar o desenvolvimento sexual da criança.
Tomando por base os modos de viver e expressar a dimensão humana, temos seis períodos distintos
– primeira infância, fase pré-escolar, segunda infância, adolescência, maturidade e terceira idade. Aqui
vamos nos ater apenas aos três primeiros: primeira infância (0 a 2 anos), fase pré-escolar (2 a 6 anos) e
segunda infância (6 a 10 anos).

- Primeira infância (0 a 2 anos):

“A educação sexual começa a partir das atitudes dos pais, no momento em que decidem ter filhos”.
As primeiras atitudes dos pais podem proporcionar ou um ambiente afetivo e amoroso, ou um ambiente
ríspido e tumultuado. Esse ambiente será a primeira influência no desenvolvimento da criança. É “nos
primeiros anos de vida que se estabelecem as bases do comportamento erótico do adulto e se inicia a
formação de uma sexualidade saudável”.
Neste período (0 a 2 anos) a criança começa a explorar seu mundo através de seu corpo, de suas
sensações. Será através do gosto, do cheiro, do toque, do olhar e do ouvir que a criança vai experimentar
o prazer. Essa relação com seu corpo e com os sentidos formará suas atitudes sexuais mais tarde.
A relação que essa criança tem com seus cuidadores também será definidor das suas atitudes
relacionais. Esse primeiro vínculo é um primeiro passo. Ele será fortalecido, ou não, no seu
desenvolvimento.
É nessa fase que começamos a amar e sermos amados. A nossa capacidade de amar e de se
relacionar está diretamente ligada a esse aprendizado na infância.

- Fase pré-escolar (2 a 6 anos):

Essa fase tem quatro momentos importantes:

1. Formação da Identidade de gênero:

A identidade de gênero é a condição de pertencer a um sexo. Nesta fase a criança começa a definir-
se como menino ou menina. Os pais e educadores(as) devem, neste momento, favorecer o processo de
identificação da criança, através da brincadeira. Mostrar as diferenças e semelhanças entre ser menino
e ser menina (evitar ao máximo estereótipos!). Reforçar a visão de sexo da criança, sem nunca
desvalorizar o sexo oposto. A questão não é superioridade/inferioridade, mas sim diferenças.

2. Assimilação do papel sexual (social):

O papel sexual diz respeito ao comportamento que a criança terá diante sua identidade de gênero.
Importante evitar a manutenção de preconceitos de comportamentos tipicamente masculinos e/ou
femininos.

3. Aprendizagem e controle dos esfíncteres

É a primeira oportunidade da criança de aprender e exercer o autocontrole, através do treinamento do


controle dos esfíncteres.

61
Colunista Portal Educação, 2013 em http://www.portaleducacao.com.br.

. 134
1484041 E-book gerado especialmente para MAURICIO PEREIRA BARROS
Segundo as considerações de Figueirêdo Netto, a aprendizagem do controle dos esfíncteres, no que
se refere ao desenvolvimento da sexualidade, tem fundamental importância, pois:
a) “As áreas genitais se encontram na mesma zona do corpo que intervém na excreção. Os músculos
que participam deste ato são exatamente os mesmos que posteriormente atuarão na resposta sexual.
b) O ato de reter e expulsar os excrementos (urina e fezes) produz prazer sensual, pela tensão e alívio
ou relaxamento, que acompanham estes comportamentos.
c) O controle voluntário desses músculos, assim como as sensações prazerosas deles resultantes,
são associados à sexualidade”.
Para não adiantar nem atrasar esse processo da criança é preciso ter em mente que ele(a) poderá ter
este tipo de controle entre os dois e três anos de idade. Adiantar ou atrasar esse momento pode ser
prejudicial ao desenvolvimento da criança. Importante, ainda, salientar que pais e educadores devem
evitar relacionar questões negativas (como sujo, feio, associar a castigos e chantagens), no decorrer do
treinamento do controle dos esfíncteres.

4. Interesses e curiosidades sexuais:

É a conhecida fase dos porquês. Além das perguntas, as crianças querem ver e saber. Com tantas
perguntas, é um bom momento para ensinar às crianças os nomes corretos das partes de seu corpo.
Como parte de seu desenvolvimento a masturbação aparece como curiosidade natural da criança de
seu corpo e suas sensações. É um jogo exploratório de sensações. Não tem a mesma conotação da
masturbação na adolescência e no adulto. Assim, é um bom momento para ensinar às crianças sobre a
intimidade. O público e o privado. Não precisa problematizar a situação, apenas orientar. A repressão é
indesejada.
Além de se tocarem, as crianças exploram também os outros. É a fase da conhecida “brincadeira de
médico”. Se a brincadeira for entre crianças da mesma idade não há razão para se preocupar, é
conhecimento não abuso.
Nessa fase o pensamento é mágico e fantasioso, por isso devem ser evitadas conversas como a da
“cegonha” e da “sementinha”. As respostas devem ser claras e objetivas o suficiente para satisfazer a
curiosidade da criança. Ela quer saber do fato, a maldade está na cabeça do(a) adulto(a). Outro cuidado
com as histórias fantasiosas é que elas podem gerar fantasias negativas, temores e culpas.
Desnecessário.

- Segunda Infância (6 a 10 anos):

Período no qual a sexualidade entra em latência. Ou seja, entra em adormecimento para ser mais bem
elaborada. É um momento de sensualidade, pois as crianças estão aptas a experimentar as sensações.
Por isso, há muitos jogos sexuais nesta fase. O lúdico aparece na imitação de modelos. É um momento
em que pais e educadores(as) devem tomar cuidado com o que falam e com o que fazem. A criança está
em constante observação. Assim, é um bom momento para transmitir informações e valores (confiança,
respeito, amor, honestidade, responsabilidade), as crianças estão prestando atenção.
É nesse período que se fortalece a identidade de gênero e prepara a criança para o próximo período,
a puberdade.

O que são jogos sexuais?

Definição: são brincadeiras que ajudam a satisfazer a curiosidade sexual.


Alguns tipos:
- Cócegas;
- Pegar nos próprios genitais e nos dos / das coleguinhas;
- Brincadeiras de médico;
- Brincadeiras de papai e mamãe.

Atenção: essas brincadeiras devem ser feitas com crianças da mesma idade.
Ainda sobre os jogos sexuais, Suplicy afirma que “os professores constataram que em geral os jogos
sexuais são realizados na hora do recreio. As crianças escolherem um lugar protegido, fora da vista do
adulto; não tiram a roupa e brincam de médico e de papai-e-mamãe. Se esses jogos forem observados,
mas não atrapalharem nenhuma atividade, não precisam ser interrompidos, pois fazem parte do
desenvolvimento sexual da criança. O professor só deve estar atento para que não haja coação nessas
brincadeiras”.

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Sexualidade e escola: um espaço de intervenção62

Desde a antiguidade a sexualidade vem gerando polêmicas, mexendo com a sensação e fantasia das
pessoas, associada a coisas feias, inconvenientes e impróprias. Apesar da revolução sexual, da
globalização e dos meios de comunicação terem contribuído para uma modificação nas atitudes morais
e nas questões ligadas ao sexo e sexualidade, esse assunto ainda assim continua sendo um tabu.
O estudo da sexualidade envolve o crescimento global do indivíduo, tanto intelectual, físico, afetivo-
emocional e sexual propriamente dito. A maioria dos pais acham constrangedor conversar sobre sexo
com seus filhos, ora pela educação recebida de seus pais, ora pela repressão ou por não saberem como
abordar o tema. Assim, os filhos na maioria da vezes, ficam sem respostas para suas dúvidas, gerando
conflitos ou acidentes inesperados por terem informações errôneas ao consultar variadas fontes
impróprias.
A maior parte dos adolescentes passam seu tempo na escola onde começam a se sociabilizar,
aflorando sua sexualidade devido ao desenvolvimento corporal gerado pelos hormônios. A escola é o
ambiente onde a interação com o mundo ao redor e com as pessoas que o cercam acontece. Depois do
ambiente familiar é a escola que complementa a educação dada pela família onde são abordados temas
mais complexos que no dia-a-dia não são ensinados e aprendidos, tendo esta uma imensa
responsabilidade na formação afetiva e emocional de seus alunos. E quanto ao assunto sexo e
sexualidade? Qual o papel da escola frente a esse tema? A escola não deve nem vai tomar o lugar da
família, mas cabe a ela possibilitar uma aprendizagem correta, já que essa instituição visa o crescimento
do indivíduo como um todo.
A educação sexual acontece no seio familiar. É uma experiência pessoal contida de valores e condutas
transmitidos pelos pais e por pessoas que o cercam desde bebê. Já a Orientação Sexual é dada pela
escola onde são feitas discussões e reflexões à respeito do tema de uma maneira formal e sistematizada
que constitui em uma proposta objetiva de intervenção por parte dos educadores.
O que nos cabe é refletir acerca da importância da Orientação Sexual na Escola para a construção da
cidadania, de uma sociedade livre de falso moralismo e mais feliz. O trabalho de Orientação Sexual tem
como objetivo principal as mudanças nos padrões de comportamento, levando-se em conta três aspectos
fundamentais: a transmissão de informações de maneira verdadeira; a eliminação do preconceito e a
atuação na área afetivo-emocional. Para se fazer um bom trabalho de Orientação Sexual dentro da escola
é importante dar atenção a alguns passos:
a) apresentar um projeto para a instituição com o objetivo do trabalho;
b) fazer uma reunião com os pais e professores para esclarecer quaisquer dúvidas que possam surgir
ao longo do trabalho e explicar o papel de ambos junto à escola neste projeto;
c) observar a demanda da escola para que se atinja a expectativa desta;
d) a partir das séries estabelecidas para o trabalho entrar em contato com elas para explicar como este
será administrado;
e) colher, por meio de “bilhetinhos sigilosos,” dúvidas e curiosidades de cada aluno garantindo-lhes
total sigilo;
f) após levantar as dúvidas e curiosidades fazer uma estruturação do programa a ser cumprido em
diferentes séries (conteúdo, horário, encontros, local), para uma maior eficácia;
g) estabelecer um contrato (regras sugeridas pelo grupo);
h) garantir a ética do trabalho tanto para os alunos como para os professores;
i) garantir a liberdade de opinião e o respeito do grupo pelas dúvidas de seus colegas, sem monopólio
da verdade de ambas as partes.
O primeiro conteúdo indispensável neste trabalho é a diferenciação de sexo e sexualidade e também
de Educação Sexual e Orientação Sexual, que são muito confundidos na maioria das vezes. O
educador de Orientação Sexual deve ser uma pessoa aberta, livre de mitos e preconceitos referentes à
sexualidade para melhor ministrar a turma sem causar problemas com a instituição, pais, alunos e
professores, podendo abordar os assuntos através de aulas expositivas, dinâmica de grupo, folhetos
explicativos, filmes e outros materiais referentes ao tema. O trabalho não envolve nota ou reprovação.
Para finalizar seguem dois lembretes essenciais: é necessário ressaltar a importância dos pais nesse
processo para que estes não se acomodem, julgando a escola responsável pelo processo da educação
sexual de seus filhos; não cabe ao professor de Orientação Sexual virar conselheiro ou confidente dos
alunos. Deve, se necessário, encaminhar para um profissional especializado.

62
BERALDO, F. N.de M. Sexualidade e escola: um espaço de intervenção. Psicol. Esc. Educ. (Impr.) vol.7 no.1 Campinas, 2003.

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Os jovens e a sexualidade63

Para realizar uma prática adequada de Orientação Sexual com jovens, é necessário que o profissional
conheça o público beneficiário de sua ação, ou seja, de quem e com quem falamos na condição de
educadores.

Segundo o Estatuto da Criança e do Adolescente – ECA (Lei 8.069, de 13 de julho de 1.990 – Art. 2º)
“considera-se criança, [...], a pessoa até doze anos de idade incompletos, e adolescente aquela entre
doze e dezoito anos de idade” (Brasil, 1990).

Muitos autores que se preocupam com a temática da infância e juventude afirmam que não é possível
definir o período que compreende a infância e a adolescência apenas pela faixa etária. Quando podemos
afirmar que uma criança deixou de sê-lo e passou a ser adolescente? Quais comportamentos são
considerados infantis, juvenis e/ou adultos? Estes são questionamentos complexos.
Em todos os questionamentos que formulamos a respeito dos seres humanos, devemos sempre
conceber o homem enquanto ser integral, biopsicossocial. Desta forma, precisamos considerar as
dimensões biológica, psicológica e social das pessoas, compreendendo que estas não são separadas,
mas integradas na existência humana.
Em relação à dimensão biológica, percebemos que uma criança começa a deixar de sê-lo quando ela
vivencia o período do desenvolvimento humano chamado de puberdade. Para esta discussão, tomaremos
como referência o trabalho de Gewandsznajder.
Na puberdade, o corpo do menino ou da menina passa por um processo de transformação, deixando
de ser um corpo infantil para se tornar um corpo adulto, ou seja, pronto para reprodução.
A faixa etária que corresponde a este período é variável. Em geral, a puberdade ocorre nos garotos
entre 11 e 13 anos e nas garotas entre 10 e 12 anos. É necessário saber que estas idades não são fixas,
podendo variar de pessoa para pessoa.
Tanto em garotos quanto em garotas ocorre o chamado “estirão”, ou seja, um crescimento do corpo
acentuado em um curto período de tempo. O “estirão” costuma iniciar mais cedo nas meninas que nos
meninos, razão pela qual as meninas por volta dos 12 anos de idade são frequentemente mais altas que
os meninos. Também tanto em garotos quanto em garotas ocorre o aparecimento de pêlos pubianos e
axilares. A pele se torna mais oleosa e o corpo, através do suor, passa a ter um cheiro característico de
pessoa adulta, diferenciando-se da criança.

Nos garotos ocorre o aparecimento da barba, e a laringe se alarga provocando a tendência da voz se
tornar mais grave. Também ocorre o aumento da massa muscular, com consequente ampliação da força
física, e o aumento do pênis e testículos.
Nas garotas ocorre o aumento dos seios, quadris, nádegas e coxas, dando ao corpo o aspecto de
mulher em fase adulta. A partir da puberdade a garota passa a menstruar, característica que sinaliza que
seu organismo está pronto para gerar filhos.
É preciso deixar claro que puberdade não é sinônimo de adolescência. Puberdade compreende as
transformações corporais que tornam o corpo humano adequado para a reprodução, deixando de ser um
corpo infantil para tornar-se um corpo adulto. A adolescência compreende um período mais extenso e
significativo que a puberdade, sendo esta etapa constituinte daquela.
O termo adolescência vem do termo latino adolescere, que significa “crescer, engrossar, tornar maior”.
Em relação à dimensão psicológica, segundo Canosa Gonçalves et. al. e Tavares, as crianças que se
tornam adolescentes também passam por transformações. A principal delas é em relação à própria
identidade. Neste momento, o adolescente necessita se reconhecer num corpo transformado, que não é
mais o corpo infantil que ele tinha, e que agora é um corpo adulto, visivelmente modificado.
Outro passo importante é a consolidação de si próprio enquanto pessoa “independente”, sob o ponto
de vista da determinação de suas escolhas pessoais e da responsabilidade que elas trazem. É neste
momento que pode haver uma divergência, e até um questionamento, com as regras determinadas pela
família e pela sociedade.
Na adolescência é comum ocorrer uma identificação muito intensa do jovem com seu grupo de “iguais”,
em geral outros jovens. Não é raro este grupo (galera, turma, etc.) compartilhar um determinado modo de
conversar, de se vestir, enfim, de se comportar. Esta identificação com o grupo é importante na construção
da própria identidade (pessoal, sexual, social) do adolescente.

63
BRANCO, M. A. O.; PINTO, M. J. C.; VIANNA, a. M. S. A. Orientação Sexual com Jovens: Construindo um Exercício Responsável da Sexualidade. Simpósio
Internacional de Educação Sexual da UEM, 2009.

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Em geral, nesta fase do desenvolvimento ocorrem as primeiras manifestações da sexualidade adulta,
ou seja, o primeiro beijo, o “ficar”, o namoro, as primeiras experiências eróticas. Trata-se de uma busca
pelo outro para um relacionamento afetivo-sexual. “A adolescência é uma fase de descobertas, de
desafios e a sexualidade humana talvez seja, para a maioria dos jovens, o aspecto mais interessante
desta jornada”.
Em relação à dimensão social, precisamos considerar que a adolescência enquanto processo de
desenvolvimento humano não é universal, ou seja, não é igual para todos os jovens. Cada um vivenciará
a sua adolescência de acordo com suas condições de vida, o seu lugar de moradia, a dinâmica de sua
família de origem, as características de acesso à escola ou aos serviços de saúde, as modalidades de
lazer a que tem acesso, dentre outros condicionantes. Todas as transformações vivenciadas pelo jovem
são construídas mediante as relações sociais que eles estabelecem. Não existe um “padrão”. Cada
indivíduo, a partir de sua realidade social, vivenciará sua juventude de forma particular.
Não devemos pensar a juventude como crise, mas como um processo do ciclo vital do jovem. Isto quer
dizer que devemos compreender o jovem não enquanto um “problema” ou um “fardo”. Deve ser
compreendido sempre a partir da sua pessoa em condição peculiar de desenvolvimento inserida num
determinado contexto sociocultural.
Outro fator importante a ser abordado é o prolongamento da juventude. Atualmente vivenciamos uma
clara dificuldade em delimitar o término deste período. Não é raro encontrarmos pessoas que pretendem
terminar seus estudos, incluindo até cursos de mestrado e doutorado, antes de decidirem morar sozinhos
ou casaram-se, e então deixar de morar com seus pais.
Partindo da premissa de todas estas transformações contemporâneas, é interessante tomarmos a
definição do Conselho Nacional da Juventude no que diz respeito a estender até os 29 anos a faixa etária
das pessoas que são consideradas jovens.
São estes jovens que constituem o público beneficiário da prática de Orientação Sexual, no enfoque
deste trabalho.

Orientação Sexual X Educação Sexual

Os autores que se preocupam atualmente com a temática da Orientação Sexual formulam


questionamentos a respeito do termo que deve ser utilizado para definir tais práticas. Quando falamos
em Orientação Sexual e em Educação Sexual, utilizamos a mesma definição para as duas expressões?
De acordo com Ribeiro falamos em Educação Sexual quando nos referimos aos “processos culturais
contínuos [...] que direcionam os indivíduos para diferentes atitudes e comportamentos ligados à
manifestação de sua sexualidade”. Nesta definição, podemos pensar que a educação sexual tem seu
início no nascimento de cada indivíduo, sendo que o processo educacional acontece através da relação
deste indivíduo com seu meio social. Então, as “atitudes e comportamentos ligados à manifestação da
sexualidade” são construídos por cada pessoa em contato com a sociedade, ou seja, amigos, grupos
religiosos e/ou de convivência, meios de comunicação e, principalmente, a família. Portanto, a sociedade
pratica ações educativas em sexualidade em relação aos indivíduos que a constituem. Porém, em grande
parte das vezes, estas ações se tornam “deseducativas”, na medida em que reproduzem e perpetuam
tabus, desinformações e atitudes repressivas em relação à sexualidade humana.
Para Ribeiro, a Orientação Sexual pressupõe uma intervenção institucionalizada, sistematizada e
realizada por profissionais especialmente preparados para exercer esta função. Diferencia-se, portanto,
da Educação Sexual, que acontece durante toda a vida das pessoas, e que diz respeito ao processo
educacional referente às atitudes em relação à sexualidade. Desta forma, podemos pensar a Orientação
Sexual enquanto prática interventiva na vida das pessoas, prática que intervém na Educação Sexual que
todas elas receberam em contato com a sociedade em que vivem.

Citando Suplicy et. al. “Orientação Sexual é um processo de intervenção sistemática na área de
sexualidade, realizado principalmente nas escolas e envolve o desenvolvimento sexual compreendido
como: saúde reprodutiva, relações interpessoais, afetividade, imagem corporal, autoestima e relações de
gênero. Enfoca as dimensões fisiológicas, sociológicas, psicológicas e espirituais da sexualidade, através
do desenvolvimento das áreas cognitiva, afetiva e comportamental, incluindo as habilidades para a
comunicação e a tomada responsável de decisões”.

Percebemos a concordância de Suplicy et. al. com Ribeiro em afirmar que a Orientação Sexual é
uma prática interventiva sistemática na área da sexualidade. Suplicy et. al., na definição citada,
enfatiza que a Orientação Sexual deve ser pensada e executada a partir da consideração do orientando
enquanto ser integral, ou seja, devem ser consideradas suas dimensões fisiológicas, sociológicas,

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psicológicas e espirituais no exercício de sua sexualidade. Além disso, a Orientação Sexual deve
contemplar diversos aspectos do desenvolvimento sexual dos indivíduos, ou seja, saúde reprodutiva,
relações interpessoais, afetividade, imagem corporal, autoestima e relações de gênero. Compreende-se
o ser humano enquanto ser sexuado inserido num meio social, que continuamente se relaciona com
outros seres humanos. Desta forma, amplia-se o enfoque da Orientação Sexual no Brasil que, no início e
meados do século XX priorizava a dimensão biológica da sexualidade. No final do século XX e nos dias
atuais, deve-se compreender a sexualidade enquanto manifestação humana, com desdobramentos além
da mera reprodução e da possibilidade de contágio de doenças sexualmente transmissíveis. Tais
aspectos não devem ser descartados, mas deve-se somar a eles outros aspectos como o prazer, as
relações afetivas e os papéis sexuais na (re)definição de gênero.
Neste contexto, Santos e Bruns apontam que um dos objetivos da Orientação Sexual é levar o
indivíduo a valorizar o prazer, o respeito mútuo, possibilitando-lhe uma vivência mais íntegra e feliz.

Breve histórico da Orientação Sexual no Brasil

No Brasil, a sexualidade tem sido um aspecto polêmico do cotidiano das pessoas, desde a época da
Colônia do século XVI.
O homem brasileiro branco, nos primeiros anos da colonização, mantinha relações sexuais com várias
índias, tendo com elas muitos filhos, caracterizando um comportamento sexual bastante promíscuo.
Com o advento da escravatura, os jovens homens filhos dos senhores de engenho eram incentivados
a se relacionar sexualmente com as escravas negras, para provar que eram “machos”. As mulheres
brancas eram dominadas e submetidas às regras de seus pais, inicialmente, e de seus maridos, após o
casamento. Em geral, casavam ainda adolescentes com homens bem mais velhos que elas. Era-lhes
exigido um comportamento acanhado e humilde frente à sociedade.
Tal cenário brasileiro se mantém praticamente o mesmo durante os séculos XVII, XVIII e XIX. Neste
período da História do Brasil não há registros conhecidos de Orientação Sexual enquanto intervenção
sistematizada.
A preocupação com a Orientação Sexual no Brasil, enquanto tema científico e pedagógico, data do
início do século XX. Neste momento da história brasileira registra-se a organização dos primeiros espaços
urbanos, que originaram as cidades brasileiras. Nestes locais a comunidade científica brasileira se
organizava sofrendo forte influência europeia.

Barroso e Bruschini afirmam que, no início do século XX, esta influência europeia manifesta-se no
Brasil através de algumas correntes médicas e higienistas de sucesso na Europa. Tais correntes
pregavam a necessidade de uma Educação Sexual eficaz no combate à masturbação e às doenças
venéreas (termo utilizado na época para referir-se às doenças sexualmente transmissíveis – DST´s) e
que preparasse a mulher para desempenhar adequadamente seu “nobre papel de esposa e de mãe”.
Notamos que, logo no início de suas atividades no Brasil, a Orientação Sexual carrega uma característica
de incitação do medo aos jovens (combate à masturbação e às doenças sexualmente transmissíveis –
DST´s), além de ser impregnada pela chamada ideologia de gênero machista (preparar a mulher para
desempenhar adequadamente seu papel de esposa e mãe).
Neste momento, emerge a produção de teses, livros e manuais que tratam da Orientação Sexual,
todos baseados no modelo médico higienista vigente. Referenciando este período, Chauí cita uma obra
datada de 1938, de autoria de Oswaldo Brandão da Silva, intitulada Iniciação Sexual-Educacional. Este
livro, segundo consta, tinha um conteúdo destinado somente aos “meninos de valor”. Segundo esta
autora, o autor da obra não explica o significado do termo “valor”, mas fica claro que as meninas estavam
proibidas de ler tal obra, pois deveriam manter-se inocentes e ser iniciadas na vida sexual apenas por
seus maridos. Interessante ressaltar que, do grupo de meninas excluídas do acesso ao conteúdo da obra,
não fazem parte as prostitutas. Estas eram consideradas uma tentação para os meninos enquanto
aquelas eram chamadas de meninas de “boa família”.
Entre as décadas de 1920 e 1940, mesma época em que foi publicado o manual citado por Chauí,
foram publicados vários outros livros de orientação sexual cientificamente fundamentados, escritos por
médicos, professores e até sacerdotes. Assim foi criada a sexologia enquanto campo oficial do saber
médico.

Concomitante à consolidação do conhecimento científico da época em relação à sexualidade, a Igreja


Católica imprime severa repressão às práticas sexuais da população brasileira. Desta forma, a década
de 50 é considerada pobre no sentido de não contar com nenhuma iniciativa no campo da Orientação
Sexual.

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Na década de 60 surgem as primeiras experiências de Orientação Sexual nas escolas dos estados de
Minas Gerais (Belo Horizonte, em 1963, no Grupo Escolar Barão do Rio Branco), Rio de Janeiro (Rio de
Janeiro, em 1964, no Colégio Pedro Alcântara; em 1968, nos colégios Infante Dom Henrique, Orlando
Rouças, André Maurois e José Bonifácio) e São Paulo (São Paulo, de 1963 a 1968, no Colégio de
Aplicação Fidelino Figueiredo; de 1961 a 1969, nos Ginásios Vocacionais; de 1966 a 1969, no Ginásio
Estadual Pluricurricular Experimental). Estas experiências são realizadas com base na ênfase ao aspecto
biológico da sexualidade humana, tal qual era o tratamento dado a esta questão nos livros que
possibilitaram o surgimento da sexologia enquanto área do conhecimento da medicina. Além disso, estas
experiências foram fortemente carregadas com as marcas da repressão das manifestações da
sexualidade.

Na época das primeiras experiências em Orientação Sexual nas escolas brasileiras, o país vivia seu
período histórico e político chamado de ditadura militar. Em 1964, a população assiste à chegada das
forças armadas ao poder da República Federativa do Brasil, através da imposição do Golpe de Estado.
A partir daí, o regime militar reprime não só as manifestações políticas, mas também as manifestações
sexuais e as implicações nos padrões de comportamento delas decorrentes.
Em 1968, a deputada federal do Rio de Janeiro Júlia Steinbruk apresentou um projeto de lei que previa
a introdução obrigatória da Educação Sexual nas escolas brasileiras. Tal projeto de lei não foi
transformado em legislação porque o então Ministério da Educação e Cultura, através de sua Comissão
Moral e Civismo, rejeitou o projeto, demonstrando o severo receio por parte dos gestores da educação
brasileira da época em relação ao tratamento de questões sexuais com os estudantes.
Na década de 70, cresce a censura do governo militar e há um quase desaparecimento de projetos de
Orientação Sexual nas escolas brasileiras. Apenas em 1978, com a abertura política trazida pelo
presidente Ernesto Geisel, a Prefeitura Municipal de São Paulo implantou projetos de Orientação Sexual
em três escolas, os quais, posteriormente, foram ampliados para muitas escolas municipais, envolvendo
orientadores educacionais e professores de Ciências e Biologia. Em 1979, a rede pública estadual
paulista iniciou um trabalho de informação aos estudantes sobre os aspectos biológicos da reprodução,
por intermédio da disciplina de Ciências e Programas de Saúde da Secretaria de Educação do Estado de
São Paulo.
Ao fim da década de 70 e durante a década de 80, surgem novas ações no plano da Orientação Sexual,
como o aparecimento de serviços telefônicos, programas de rádio e de televisão, enciclopédias e
fascículos, congressos e encontros de professores. Proliferam as iniciativas na rede particular de ensino.
Nasce nessa época a SBRASH – Sociedade Brasileira de Sexualidade Humana.

De 1989 a 1992, na cidade de São Paulo, foi desenvolvido um abrangente projeto de Orientação
Sexual nas escolas municipais, com a participação do renomado GTPOS (Grupo de Trabalho e Pesquisa
em Orientação Sexual). Este projeto atingiu 30.000 alunos e foram capacitados 1.105 professores para
oferecer ações de orientação sexual nas escolas.
Nota-se que, desde as primeiras experiências de projetos de Orientação Sexual na década de 1960,
não existiram ações continuadas, sendo que estes projetos historicamente ficaram atrelados às vontades
político-partidárias de prefeitos ou governadores.
Ribeiro corrobora dizendo que, somente com a aprovação da LDB – Lei de Diretrizes e Bases em 1996
e o estabelecimento dos Parâmetros Curriculares Nacionais em 1997 como linhas a serem seguidas para
se concretizar a meta da educação para o exercício da cidadania, a Orientação Sexual teve oficialmente
reconhecida sua necessidade e importância enquanto ação educativa escolar.

Os programas de Orientação Sexual

Podemos constatar na maioria dos programas de Orientação Sexual executados no Brasil, ainda nos
dias atuais, uma tendência de mostrar apenas os problemas e possíveis más consequências da
sexualidade. Em geral, no conteúdo destes programas são enfatizadas (quando não são exclusivas) as
DST – Doenças Sexualmente Transmissíveis e as gravidezes precoces na adolescência, com
maternidade e/ou paternidade indesejadas. Este conteúdo não sensibiliza os jovens para a discussão
construtiva do tema sexualidade humana. Eles costumam não se sentir à vontade para receber uma
adequada Orientação Sexual, pois identificam claramente a repressão sexual que experimentam em seu
meio social, aqui também reproduzida pelos profissionais orientadores sexuais.
Em contato com um conteúdo de Orientação Sexual que prioriza os problemas advindos de uma
vivência inadequada da sexualidade e não os aspectos afetivos, prazerosos, e de respeito às relações
humanas, os jovens costumam não perceber uma relação coerente entre o conteúdo abordado e suas

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próprias experiências reais concretas. Comenta-se que o sexo traz problemas, mas a maioria dos jovens
percebe suas experiências sexuais como prazerosas, surgindo aí um paradoxo.
Desta forma, urge a necessidade da discussão de conteúdos adequados à realidade dos jovens para
que eles possam realmente tomar atitudes responsáveis na vivência de suas sexualidades. Assim, um
programa efetivo de Orientação Sexual deve reconhecer o exercício prazeroso da sexualidade, sem
deixar de contemplar as medidas de proteção à saúde e os métodos contraceptivos para tornar possível
a emergência de maternidades e paternidades responsáveis, no momento de escolha consciente de cada
pessoa que deseje ter filhos.
Nos dias atuais, percebe-se a crescente preocupação de alguns pais e educadores diante do número
de gestações na adolescência. Segundo o Ministério da Saúde, enquanto a taxa de fecundidade de
mulheres adultas tem caído nas últimas quatro décadas, entre as mulheres jovens existe uma relação
inversamente proporcional. “Desde os anos 90, a taxa de fecundidade entre adolescentes aumentou 26%.
Tal preocupação mobiliza e estimula o avanço das ações em orientação sexual, o que pode ser
intensamente benéfico para os jovens, visto que eles poderão ter maior acesso a programas desta
natureza. No entanto, cabe questionar se pais e educadores ainda mantêm seu foco sob uma concepção
repressiva da sexualidade humana, desejando que uma Orientação Sexual possa produzir uma atitude
sexualmente abstinente dos jovens brasileiros, desejo que se mostra absolutamente inalcançável e
indesejável. De outro modo, a preocupação advinda dos pais e educadores quanto ao número de
gestações na adolescência pode ser um ponto de partida para propiciar espaços abertos de discussão,
onde o jovem possa refletir sobre sua própria sexualidade, no sentido de conscientemente poder efetuar
escolhas para sua vida, que incluem ter ou não filhos. Para tal escolha, o jovem, que num futuro próximo
se tornará um adulto, deve ter conhecimento e autonomia sobre o uso de métodos contraceptivos.
Outra preocupação de pais e educadores que mobiliza a execução de programas de Orientação Sexual
são as doenças sexualmente transmissíveis uma vez que, ao iniciar a vida sexual, muitos jovens, ainda
que possuam conhecimento de prevenção, não utilizam preservativo.
Infelizmente a maioria dos programas brasileiros de Orientação Sexual não é contínua. Caracterizam-
se muitas vezes pelo oferecimento de palestras pontuais sobre sexualidade. Este tipo de programa não
atinge os objetivos de propiciar elementos para uma construção adequada do exercício da sexualidade
dos jovens. Para trazer efetivos benefícios à juventude, o processo de educação precisa de continuidade,
de vínculo, de tempo, de reconhecimento.

Orientação Sexual como tema transversal

O governo federal brasileiro, através do Ministério da Educação - MEC, em seus Parâmetros


Curriculares Nacionais (1997), estabelece a Orientação Sexual no Ensino Fundamental enquanto tema
transversal, isto é, um assunto a ser trabalhado em todas as disciplinas escolares, por quaisquer
professores que se sintam mobilizados, sempre que houver espaço na grade curricular ou em horários
extraclasses.
Segundo os Parâmetros Curriculares Nacionais - PCN, “propõe-se que a Orientação Sexual oferecida
pela escola aborde com as crianças e os jovens as repercussões das mensagens transmitidas pela mídia,
pela família e pelas demais instituições da sociedade. Trata-se de preencher lacunas nas informações
que a criança e o adolescente já possuem e, principalmente, criar a possibilidade de formar opinião a
respeito do que lhes é ou foi apresentado. A escola, ao propiciar informações atualizadas do ponto de
vista científico e ao explicitar e debater os diversos valores associados à sexualidade e aos
comportamentos sexuais existentes na sociedade, possibilita ao aluno desenvolver atitudes coerentes
com os valores que ele próprio eleger como seus”.

Percebemos o complexo dever atribuído à Orientação Sexual no âmbito escolar na medida em que é
sua função a reflexão contínua sobre as informações constantes recebidas pelos jovens em suas relações
sociais. Daí decorre a necessidade de que os profissionais que executam programas de Orientação
Sexual tenham conhecimentos científicos suficientes e adequados para abordar as demandas cotidianas
da juventude em relação à sexualidade. É preciso que, pela Orientação Sexual, os jovens possam formar
suas opiniões a respeito do tema para propiciar um pleno exercício de suas sexualidades.
Apesar da clara proposição dos PCN de conceber a Orientação Sexual no âmbito escolar enquanto
tema transversal extremamente importante para a formação de valores conscientes pelos jovens em
relação à sexualidade, muitas dificuldades têm permanecido no exercício diário desta prática educacional.
Como sexo é um assunto intensamente repleto de repressões em nossa sociedade ocidental, muitos
educadores não manifestam interesse sobre o tema, deixando de buscar formação adequada para o
trabalho de Orientação Sexual com a juventude.

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Além dos profissionais diretamente em contato com os jovens, há uma grande parcela de educadores
que são dirigentes de estabelecimentos educacionais e, reproduzem as mesmas repressões sociais em
relação à sexualidade, não contribuindo positivamente para a execução de bons programas de Orientação
Sexual, uma vez que não acreditam que este tema seja importante para a comunidade estudantil ou
acreditam que falar sobre sexualidade com jovens estudantes pode induzi-los à prática precoce de
relações sexuais.
A Orientação Sexual na escola ainda tem um extenso caminho a ser trilhado para que a sexualidade,
presente na vida de todas as pessoas, possa ser tratada (e aprendida) pelos profissionais da educação
e seus respectivos educandos sem os massacrantes e silenciadores tabus e com respeito e propriedade,
para inibir práticas inadequadas e produzir práticas saudáveis do exercício da sexualidade.

O Educador/Orientador Sexual

Retomando a discussão sobre a definição dos termos “educação sexual” e “orientação sexual”
presente no item “Orientação Sexual X Educação Sexual” deste trabalho, encontramos com maior
frequência na literatura especializada o termo “educador sexual” referindo-se àquele profissional que
exerce a prática educacional de Orientação Sexual, enquanto prática institucionalizada e sistematizada.
Desta forma, neste momento, utilizaremos o termo “educador sexual” para fazermos referência a este
profissional especializado e não aos membros da família e demais relações interpessoais dos jovens, que
contribuem para a sua educação em um sentido mais amplo, conforme Vitiello.
Segundo Canosa Gonçalves, o desenvolvimento psicossexual é um processo único e pessoal, que
sofre transformações ao longo do processo por diversos aspectos do comportamento sexual humano
sendo eles: constituição biológica do indivíduo (hereditariedade, níveis hormonais), relações familiares,
padrão econômico, características culturais, adoção da fé, entre outros.
Portanto, o educador sexual, ao realizar sua prática, está inserido neste complexo contexto do
comportamento humano e deve intervir nesta realidade. Os jovens com os quais o educador sexual
trabalhará trazem em suas histórias de vida diversas realidades, variadas construções biopsicossociais
em um mesmo grupo de jovens orientandos. Cabe ao educador sexual ter capacidade para perceber tais
diferenças e pautar suas ações de maneira a privilegiar a diversidade, num contexto de respeito às
escolhas pessoais de cada jovem. Ao educador sexual é requerida abertura intelectual, moral e afetiva
para tornar possível a realização da Orientação Sexual com jovens tão diversos.

A Orientação Sexual deve ser uma prática ofertada a todos os jovens, mas não uma prática arbitrária
e unidimensional, que reproduz os preconceitos repressivos de nossa sociedade. Assim, o educador
sexual deve ser flexível em relação às diversas orientações afetivo-sexuais, às religiosidades, enfim,
diversas concepções construídas sobre sexualidade na história pessoal de cada jovem. Orientação
Sexual “se destina à pessoa humana, com a prerrogativa de igualdade entre os seres humanos, em
primeiro lugar”.
O educador sexual deve apresentar adequação sexual, isto é, reconhecer-se enquanto pessoa
sexuada, com suas preferências e limites, e não influenciar as decisões dos jovens a partir destas
preferências. Diferenciar-se pessoalmente de quem orienta é imprescindível para que o educador sexual
possa propiciar condições para reflexão ao jovem para que este possa realizar suas próprias escolhas.
Segundo Canosa Gonçalves um bom educador sexual é “aquele que convive com os jovens no
dia-a-dia, que os conhece e é reconhecido por eles, e que tem em sua prática profissional os
pressupostos da educação”.
Desafiante para o trabalho do educador sexual com jovens é utilizar métodos e técnicas que
prendam a atenção deste público, que provoquem reflexão e que sejam capazes de fazer com que
o jovem se comprometa consigo próprio e com suas parcerias.
É imprescindível que o educador sexual possua conhecimentos científicos adequados sobre
desenvolvimento humano, constituição dos órgãos sexuais, saúde reprodutiva, métodos de prevenção às
DST´s e/ou contraceptivos, relacionamentos interpessoais e relações de gênero. Não é necessário que o
profissional detenha estes conhecimentos em nível de especialista em sexualidade humana, mas deve
continuar buscar atualizar tais saberes, afim de oferecer uma prática de qualidade em relação à
Orientação Sexual.
Nesta realidade, o desafio proposto ao orientador sexual é que, através de seu trabalho, possa
propiciar condições para que os jovens reflitam a respeito de suas sexualidades e possam exercê-las de
maneira saudável. Segundo Vitiello educar é dar ao educando condições e meios para que cresça
interiormente.

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Mas afinal como é diversidade sexual/de gênero no ambiente escolar?

Gênero e sexualidade: diálogos e conflitos

Marcas epistemológicas
O modo de compreender a diferença evoluiu no sentido de pensa-la junto com o seu duplo, seu
contrário, seu avesso, ou seja, ela é sempre relacional e dificilmente bipolarizada. Esse modo de
compreensão aguça a sensibilidade humana e sua condição de experimentar, de se (auto)inventar.
A relevância do debate crítico ancorado no domínio discursivo da heterossexualidade que,
pretensiosamente hegemônica e unificada em um modo de ser, desconsidera outras formas que não
atendem às suas práticas discursivas. Pensamos que essa situação reflete-se diretamente nas práticas
curriculares, prejudicando o entendimento de diversas relações sociais e culturais presentes na escola, e
mais amplamente, na sociedade. Estamos entendendo como currículos as ações escolares, culturais e
tecnológicas (arquitetura, livros didáticos, vestimentas, músicas, conteúdos e dizeres científicos, meios
midiáticos e outros) que, significadas na cultura, ensinam e regulam o corpo, produzindo subjetividades
e arquitetando formas e configurações de viver na sociedade.

Os equívocos
Recorda-se que, no Brasil, a homossexualidade deixou de se configurar como doenças nos
instrumentos médicos (mais precisamente como desvio mental e transtorno sexual), em fevereiro de
1985. Essa alteração foi fruto de uma intensa campanha, liderada pelo antropólogo Luiz Mott, junto com
o Conselho Federal de Medicina (CFM) que, por resolução, retirou a homossexualidade da lista de
doença. Sendo importante lembrar que, já em 1973, a American Psychiatric Association, afirmara que a
homossexualidade não tinha ligação alguma com qualquer tipo de patologia e propusera a sua retirada
do Manual de Diagnóstico e Estatística de Transtornos Mentais (DSM-IV). Já a Organização Mundial de
Saúde (OMS), somente no dia 17 de maio de 1990, reuniu-se em Assembleia Geral e retirou a
homossexualidade de sua lista de doenças mentais, declarando que ela não constituía um distúrbio, uma
doença ou perversão. Assim, o que antes tinha sido classificado, estabelecido e difundido como desvio e
anormalidade, a partir dessa assembleia, seria considerado normal.
Se aceitarmos a sexualidade assim como a experiência estão condicionadas pela necessidade
humana de se construir nas interações sociais, culturais e históricas, aceitaremos também que não há
uma única sexualidade. A ausência de liberdade impede o movimento de busca pela completude, na qual
a sexualidade, como dimensão da humanidade, se constitui.
Existe um nexo entre a sexualidade, a vida e a curiosidade pelo saber. Esse movimento infinito em
busca de completude e em busca de conhecimento é fator que constitui o ser humano e seu desejo de
liberdade.
No entanto, ainda que pareça contraditório, não confiamos no desejo como princípio, condição e direito
de liberdade. Não cremos, em absoluto, que haja desejo anterior a um conjunto de normas ou acordos
sociais que o faça livre. Nós o pensamos como criado singularmente, mas em redes de relações.
Sem dúvidas, a compreensão da sexualidade poderá contribuir, de modo significativo, para novas
possibilidades de construção de conhecimentos e caminhos de busca do saber. Não se trata, portanto,
de aprisioná-la nos discursos sobre o ato sexual, mas de aproveitá-la em seu potencial epistemológico.
Essa análise é especialmente oportuna e necessária à escola.

A discussão na escola
Na escola, as atitudes de hostilidade às identidades sexuais dissidentes são capazes de gerar
inúmeras situações de violências homofóbicas. Algumas, que não se encontram na esfera dos números
e dados quantitativos, são vivenciadas no silêncio e ocultadas na invisibilidade.
A discriminação afirma o “direito” dos que discriminam e a subalternidade dos que são discriminados.
Nesse sentido, ela é observada nos espaços-tempos escolares. As identidades vinculadas às
expectativas de gênero e/ou sexo biológico estão no interior das hierarquizações e classificações sociais,
tanto quanto nos currículos e, mais amplamente, nas ações e relações do cotidiano escolar.
A sexualidade, infelizmente, é algo temido e capaz de gerar tantos discursos na sociedade, na ciência
e na cultura. Sua estreita relação com o conhecimento amedronta os que se nutrem da arrogância, porque
fragiliza suas verdades e certezas.

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Foucault64 nos ajuda a observar que é preciso fortalecer, aprofundar e prosseguir contra a dicotomia e
lógica binária, até que as oposições binárias deixem de ter sentido e se consolidem convivências
solidárias, em contextos sem discriminações e violências. Como estratégia para fazer difuso o antigo jogo
de poder que se instala na relação entre opressor e oprimido, a proposta foucaultiana é a “proliferação”
de saberes sobre os seres humanos e as relações e de poder que os oprimem, de tal modo que o modelo
jurídico de poder como opressão e regulação deixe de ser hegemônico. Talvez, desse significado de
“proliferação” de saberes, possamos retirar as bases para “proliferar” inúmeras e ilimitadas formas de
compreender os seres humanos, sem as violências, já tantas vezes vivenciadas, e com tantas
exterminações em massa, como na Segunda Guerra, devido à não aceitação do “outro”, a quem se atribui
dessemelhança e desigualdade, potencializando os efeitos destrutivos da xenofobia que, em todas as
suas manifestações, incluindo as homofóbicas, conduz e justifica a aversão, o domínio ou a eliminação
dos “estranhos”, que ameaçam e incomodam o exercício arbitrário do poder.

Diversidade e educação: apontamentos sobre sexualidade e gênero na escola


Desde as décadas de 1960 e 1970, expressivas mudanças socioculturais e históricas ocorreram, no
que se refere às perspectivas das relações de gênero e sexualidade. Essas mudanças se acentuaram de
modo significativo, a partir, não apenas da atuação de movimentos sociais, mas também da emergência
da discussão da AIDS nos anos 80.
Novas maneiras de entender e discutir as questões foram sendo consideradas, com desdobramentos
na esfera social e política (por meio de Organizações Não Governamentais/ONGs, de movimentos sociais
e de políticas públicas) e, na esfera acadêmica, com a efetivação de estudos em vários campos de
conhecimento, que têm direcionado seu foco para a sexualidade e as relações de gênero, como
fenômenos a serem conhecidos de modo mais fundamentado, expandindo sua discussão para outros
aspectos, como os das identidades e seus fundamentos históricos e culturais.
Sexo e sexualidade são frequentemente tomados como sinônimos; todavia, sexo admite uma
compreensão referida ao aspecto natural, biológico, da distinção física entre o homem e a mulher. No
senso comum, o sentido de sexo remete ao ato sexual. Já a sexualidade refere-se à esfera mais ampla,
dos sentimentos, das interações entre as pessoas.
Recorda-se e reafirma-se, portanto, que a sexualidade, como construção social, tem absorvido,
historicamente, em seus significados, elementos das relações de gênero, frequentemente submetidas a
prescrições de como homens e mulheres devem vivenciá-las. Contudo, apesar da sexualidade estar
imbricada, implícita ou explicitamente às relações de gênero, essas não são consideradas sinônimas65.
A vivência da sexualidade não é determinada por normas padronizadas às quais homens e mulheres
devem se adaptar. Esse é um dos princípios que motivam e sustentam significados mas amplos da
sexualidade e promovem a sua problematização, que incorpora aportes como os que são revistos nas
relações de gênero.

Problematização das relações de gênero: revisão de dados históricos e conceituais


O entendimento das relações de gênero implica a noção de que, no decorrer da vida, por intermédio
das mais díspares instituições e práticas sociais, os sujeitos se constituem como homens e mulheres, em
uma ação que não é unidimensional, coerente ou congruente e que também sempre estará inacabada ou
incompleta.
Sendo assim, partindo desse pressuposto de incompletude, encontra-se fundamento para realçar a
noção de gênero na educação, já que essa disposição teórica expande socialmente a própria ideia de
educação, podendo-se entender que educar envolve um conjunto de forçasse de processos, em cuja
dinâmica os sujeitos aprendem a se aceitar como homens e mulheres, na esfera das sociedades e dos
grupos que estão inseridos. Essa é mais uma premissa que contribui para a desconstrução de
estereótipos que limitam e reduzem a compreensão social, culturalmente contextualizada, de gênero.

Identidades sexuais: revisão de perspectivas de desconstrução de estereótipos


É oportuno indagar se é plausível que a manifestação aparente de identidades sexuais não normativas
na escola colabore para desajustar dispositivo de rejeição ou, ao contrário, para realçá-lo, uma vez que
a construção da heterossexualidade e da homossexualidade tem configurado por meio de oposição
recíproca. No mesmo sentido, é apropriado indagar sobre o alcance político de transformação para uma
escolarização radicalmente não heterossexista e excludente, com base na visibilidade dessas
identidades.

64
FOUCAULT, M. História da sexualidade – A vontade de saber. Rio de Janeiro: Graal, 1988.
65
LOURO, G.L. Gênero, sexualidade e educação: uma perspectiva pós-estruturalista. 2 ed., Petrópolis: Vozes, 1998.

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Dessa forma, enfatiza-se a relevância da efetivação de pesquisas sobre a presença de sexualidades
não normativas no espaço escolar como forma de ampliar vetores de análises dos processos
educacionais possivelmente geradores de antagonismos e exclusão que se contrapõem a políticas que
realçam o princípio da autonomia na educação inclusiva e, nela, o respeito ao significado plural da
diversidade, sem imposição de uma única identidade central, padrão.
Contudo, o que se espera da escola, no interesse de ensinar e aprender, mais amplamente, sobre
sexualidade, encontra barreiras em processos de atitudes homofóbicas que ainda permanecem
contaminando o seu ambiente.

Ninguém pode calar: homossexualidades e homofobia na escola


Recorda-se que, desde os anos 90, a preocupação com a prevenção da AIDS e da gravidez na
adolescência inseriu-se nas escolas de modo mais evidente e sistematizado. A ideia era a de que várias
disciplinas agregassem o assunto de modo conectado com outros temas. No entanto, o tratamento
alicerçado em uma ótica biologizante do sexo prosseguiu, sendo o debate sobre a diversidade de
orientação sexual ainda incipiente ou, na melhor das hipóteses, relegado a segundo plano.
Espera-se que a instituição escolar, como espaço de formação, local onde se formam cidadãos e se
estudam e consolidam direitos, reconheça o problema da discriminação gerada pela homofobia em suas
salas de aula e perceba a necessidade de enfrentá-lo, no interesse de que sejam superadas a intolerância
e a violência, que se multiplicam em sofrimento, silêncio, invisibilidade, medo e morte física e existencial.

Para saber mais...

A seguir alguns termos relevantes a serem considerados sobre a diversidade de gênero:

ASSIMETRIAS DE GÊNERO: desigualdades de oportunidades, condições e direitos entre homens e


mulheres, gerando hierarquias. Por exemplo: no mercado de trabalho.

BINARISMO: forma de pensamento que separa e opõe masculino e feminino, apoiando-se numa
concepção naturalizante dos corpos biológicos.

BISSEXUAL: pessoa que tem desejos, práticas sexuais e relacionamento afetivo-sexual com pessoas
de ambos os sexos;

CORPO: inclui além das potencialidades biológicas, todas as dimensões psicológicas, sociais e
culturais do aprendizado pelo qual as pessoas desenvolvem a percepção da própria vivência. Não existe
um corpo humano universal – mas sim corpos marcados por experiências específicas de classe, de etnia,
de raça, de gênero, de idade. Visto que os corpos são significados e alterados pelas diferentes culturas,
pelos processos morais, pelos hábitos, pelas distintas opções e possibilidades de desejo, além das
diversas formas de intervenção e produção tecnológica. Por isso, o corpo é uma produção histórica.
Foucault ao analisar instituições como escolas, prisões, hospitais psiquiátricos, fábricas, fala das
maneiras como as diferentes disciplinas controlam, domesticam, normalizam os corpos. Sua preocupação
é com as práticas sociais, sendo que é no corpo que se dá o controle da sociedade sobre os indivíduos.
Os corpos apresentam as marcas do processo de passar ou não pela escola como o auto disciplinamento,
o investimento continuado e autônomo do sujeito sobre si mesmo.
Louro parte do pressuposto antropológico de que "os corpos são o que são na cultura”, isto é, que os
corpos adquirem seu significado apenas através dos discursos na cultura e na história. Essa vertente se
afasta das discussões teóricas nas quais o corpo é tido como “natural”, no qual o biológico determina o
gênero.

DESIGUALDADE: é um fenômeno social que produz uma hierarquização entre os indivíduos e/ou
grupos que não permite o tratamento igualitário (em termos de mercado de trabalho, de acesso a bens e
recursos, para todos e todas.
Essa desigualdade existe na divisão dos atributos entre homens e mulheres. Esse desnível se
evidencia em vários contextos: familiar, social, escolar, religioso, econômico, político,... Dessa forma, fica
claro que existem fronteiras que separam atitudes e comportamentos tidos como apropriados, válidas e
legítimas relacionadas ao sexo masculino e ao feminino.

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DIFERENÇA: indivíduos e/ou grupos possuem várias formas de distinção e de semelhanças (cor, sexo,
idade, nacionalidade). A desigualdade pauta-se por essas diferenças e semelhanças que constituem os
indivíduos e/ou grupos.

DIREITOS SEXUAIS: direitos que asseguram aos indivíduos a liberdade e a autonomia nas escolhas
sexuais, como a de exercer a orientação sexual sem sofrer discriminações ou violência. Os direitos
sexuais englobam múltiplas expressões legítimas da sexualidade, como por exemplo, o direito à saúde –
direito de cada pessoa de ver reconhecidos e respeitados o seu corpo (autonomia), o seu desejo e o seu
direito de amar (reconhecimento da diversidade sexual).

DISCRIMINAÇÃO: ação de discriminar, tratar diferente, excluir, marginalizar.

ESTEREÓTIPO: é uma generalização de julgamentos subjetivos feitos a um grupo ou a um indivíduo.


Pode ser atribuindo valor negativo desqualificando-os e impondo-lhes um lugar inferior, ou simplesmente,
reduzindo determinado grupo ou indivíduo a algumas características e, assim, definindo lugares
específicos a serem ocupados.

FEMINILIDADE: se refere às características e comportamentos considerados por uma determinada


cultura associados ou apropriados às mulheres.
Caracterizar os comportamentos como “masculinos” ou “femininos” é basear-se nas noções
essencialistas do binarismo mulher/homem, isto quer dizer que, atributos que muitas vezes são
considerados femininos podem estar baseados no biológico e nas diferenças físicas. Dessa forma, a
feminilidade nos homens, bem como a masculinidade nas mulheres, é considerada negativa por agir
contra os papéis tradicionais da nossa cultura. Um estereótipo comum para homens homossexuais é de
que são efeminados porque utilizam ou exageram comportamentos tidos como femininos, por exemplo.

GÊNERO: conceito formulado a partir das discussões trazidas do movimento feminista para expressar
contraposição ao sexo biológico e aos termos “sexo” e “diferença sexual”, distinguindo a dimensão
biológica da dimensão sexual e, acentuando através da linguagem, “o caráter fundamentalmente social
das distinções baseadas no sexo”. Não com a intenção de negar totalmente a biologia dos corpos, mas
para enfatizar a construção social e histórica produzida sobre as características biológicas. Dessa forma,
gênero seria a construção social do sexo anatômico demarcando que homens e mulheres são produtos
da realidade social e não decorrência da anatomia dos seus corpos.

HETERONORMATIVIDADE: termo utilizado para expressar que existe uma norma social que está
relacionada ao comportamento heterossexual como padrão. Dessa forma, a ideia de que apenas o padrão
de conduta heterossexual é válido socialmente, colocando em desvantagem os sujeitos que possuem
uma orientação sexual diferente da heterossexual.

HETEROSSEXISMO: Se refere à ideia de que a heterossexualidade é a orientação sexual “normal” e


“natural”. Considerar a heterossexualidade como “natural”, aponta para algo inato, instintivo e que não
necessita de ser ensinado ou aprendido. Ao considerar a heterossexualidade “normal”, contrapõe-se a
ideia de que as outras orientações sexuais (homossexualidade e bissexualidade, por exemplo) são um
desvio à norma e reveladoras de perturbação, não sendo encaradas como um dos aspectos possíveis na
diversidade das expressões da sexualidade humana. O heterossexismo funciona através de um sistema
de negação e discriminação – a sociedade tende a negar a existência da homossexualidade, tornando-a
invisível (em quantos manuais escolares existem referências neutras ou positivas à homossexualidade?)
e tende a reprimir e discriminar todos aqueles que se tornam visíveis.

HETEROSSEXUAL: quem tem atração sexual por pessoas do sexo oposto ao seu, e relacionamento
afetivo-sexual com elas. Heterossexuais não precisam, necessariamente, terem vivido experiências
sexuais com pessoas do mesmo sexo ou do sexo oposto para se identificarem como tal.

HETEROSSEXUALIDADE COMPULSÓRIA: sistema que acomoda e hierarquiza as relações de


gênero, no qual o homem é o modelo para todas as relações, inclusive aquelas em que ele não está
presente.

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HOMOAFETIVO: é um termo utilizado para descrever relações entre pessoas do mesmo sexo e tem
relação com os aspectos emocionais e afetivos envolvidos na relação amorosa e sexual entre essas
pessoas.

HOMOFOBIA: termo usado para descrever vários fenômenos sociais relacionados ao preconceito, a
discriminação e à violência contra os homossexuais (ter desprezo, ódio, aversão ou medo de pessoas
com orientação sexual diferente do padrão heterossexual). O termo, no entanto, não se refere ao conceito
tradicional de fobia, facilmente associável à ideia de doença e tratados com terapias e antidepressivos.
Atualmente, grupos lésbicos, bissexuais e transgêneros, com o intuito de conferir maior visibilidade
política à suas lutas e criticar normas e valores postos pela dominação masculina, propõem, também, o
uso dos termos lesbofobia, bifobia e transfobia.
Daniel Borrillo faz uma leitura epistemológica e política desse conceito, não para compreender a
origem e o funcionamento da homossexualidade, mas para “analisar a hostilidade provocada por essa
forma específica de orientação sexual”. Segundo este autor quando a homossexualidade requer
publicamente sua expressão é que se torna insuportável, pois rompe com a hierarquia da ordem sexual.
Por isso, a tarefa pedagógica deve ser questionar a heterossexualidade compulsória e mostrar que a
hierarquia de sexualidades é tão insustentável quanto a de sexos, bem como incluir a ideia de diversidade
sexual em livros e apostilas escolares.

HOMOSSEXUAL: é a pessoa que tem atração sexual e afetiva por pessoas do mesmo gênero e
relacionamento com elas.

HOMOSSEXUALIDADE: é a atração sexual e afetiva por pessoas do mesmo sexo. Cabe uma
ressalva, não é correto o uso do termo homossexualismo, porque reveste de conotação negativa,
atribuindo-lhe significado de doença e aberração. Por isso, devemos preferir a utilização dos termos
homossexualidade, lesbianidade, bissexualidade, travestilidade, transgeneridade e transexualidade.

IDENTIDADE DE GÊNERO: Expressão utilizada primeiramente no campo médico-psiquiátrico para


designar os “transtornos de identidade de gênero”, isto é, o desconforto persistente criado pela
divergência entre o sexo atribuído ao corpo e a identificação subjetiva com o sexo oposto. Entretanto,
atualmente, a identidade de gênero corresponde à experiência de cada um, que pode ou não
corresponder ao sexo do nascimento. Podemos dizer que a identidade de gênero é a maneira como
alguém se sente e se apresenta para si ou para os outros na condição de homem ou de mulher, ou de
ambos, sem que isso tenha necessariamente uma relação direta com o sexo biológico. É composta e
definida por relações sociais e moldadas pelas redes de poder de uma sociedade. Os sujeitos têm
identidades plurais, múltiplas, identidades que se transformam, que não são fixas ou permanentes, que
podem até ser contraditórias. Os sujeitos se identificam, social e historicamente, como masculinos e
femininos e assim constroem suas identidades de gênero.
Cabe enfatizar que a identidade de gênero trata-se da forma que nos vemos e queremos ser vistos,
reconhecidos e respeitados, como homens ou mulheres, e não pode ser confundida com a orientação
sexual (atração sexual e afetiva pelo outro sexo, pelo mesmo sexo ou por ambos).

IDENTIDADE SEXUAL: Identidades sexuais se constituem através das formas como vivemos nossa
sexualidade, e refere-se a duas questões diferenciadas:
1) é o modo como a pessoa se percebe em termos de orientação sexual;
2) é o modo como ela torna pública (ou não) essa percepção de si em determinados ambientes ou
situações. Quer dizer, corresponde ao posicionamento (nem sempre permanente) da pessoa como
homossexual, heterossexual, ou bissexual, e aos contextos em que essa orientação pode ser assumida
pela pessoa e/ou reconhecida em seu entorno.

INTERSEXUAL OU INTERSEX: a palavra intersexual é preferível ao termo hermafrodita e é um termo


usado para se referir a uma variedade de condições (genéticas e/ou somáticas) com que uma pessoa
nasce, apresentando uma anatomia reprodutiva e sexual que não se ajusta às definições de masculino e
feminino, tendo parcial ou completamente desenvolvidos ambos os órgãos sexuais, ou um predominando
sobre o outro. A intersexualidade, enquanto transgeneridade é uma condição e não uma orientação
sexual. Portanto, as pessoas que se autodenominam intersexuais podem se identificar como
homossexuais, heterossexuais ou bissexuais.

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LESBOFOBIA: termo usado para descrever vários fenômenos sociais relacionados ao preconceito, a
discriminação e à violência contra as lésbicas (ter desprezo, ódio, aversão ou medo de pessoas com
orientação sexual diferente do padrão heterossexual). Ver homofobia.

MACHISMO: é a crença de que os homens são superiores às mulheres. É uma construção cultural
que definiu que as características atribuídas aos homens, tem um valor maior. Se pensarmos na educação
de meninos e meninas, veremos que há um tratamento diferenciado que reproduz as manifestações de
machismo nos meninos, e às vezes, nas próprias meninas. Ao incentivar (infidelidade, violência
doméstica, esporte, diferença de direitos).

MASCULINIDADE: Faz oposição ao termo feminilidade e diz respeito a imagem estereotipada de tudo
aquilo que seria próprio dos indivíduos homens, ou seja, às características e comportamentos
considerados por uma determinada cultura como associados ou apropriados aos homens. Ver
feminilidade, pois são conceitos relacionais que não passíveis de serem entendidos separadamente.

MASCULINIDADE HEGEMÔNICA: É um modelo construído socialmente que controla, domina e


substima as diversas formas de expressão de outras masculinidades, tornando-se um padrão de
masculinidade.

MOVIMENTO FEMINISTA: o movimento feminista surgiu para questionar a organização social,


política, econômica, sexual e cultural de uma sociedade profundamente hierárquica, autoritária,
masculina, branca e excludente. Sendo assim, o feminismo pode ser entendido como uma luta pela
transformação da condição das mulheres, que é pública e também privada. E que pode ser entendida, a
partir de três eixos:
1) como movimento social e político;
2) como política social;
3) e como ciência, ampliando os debates teóricos e conceituais (derivando a categoria gênero como
analítica de sexo).
Essas vias se entrecruzam, por diversas vezes, para desestabilizar representações, questionar a
divisão sexual da sociedade, opor-se à hierarquização dos gêneros e, por isso, as teorias nem sempre
podem dissociar-se de suas ações políticas, e vice-versa.

PODER/RELAÇÕES DE PODER: nossas definições, crenças, convenções, identidades e


comportamentos sexuais têm sido modeladas no interior de relações definidas de poder. Para Michel
Foucault, o poder está em toda parte; não porque englobe tudo e sim porque provém de todos os lugares.
O poder se exerce de diversas formas: poder de produzir os corpos que controla, produz sujeitos, fabrica
corpos dóceis, induz comportamentos. Foucault propõe que observemos o poder como uma rede que,
capilarmente, se distribui por toda a sociedade. Nas palavras dele: “lá onde há poder, há resistência e, no
entanto (ou melhor, por si mesmo) esta nunca se encontra em posição de exterioridade em relação ao
poder”.

PRECONCEITO: é um pré-conceito uma opinião que se emite antecipadamente alimentada pelo


estereótipo, é um juízo preconcebido, manifestado geralmente na forma de uma atitude discriminatória
perante pessoas, lugares ou tradições considerados diferentes ou "estranhos".

RACISMO: conjunto de princípios que se baseia na superioridade de uma raça sobre a outra. A atitude
racista é aquela que atribui qualidades aos indivíduos conforme seu suposto pertencimento biológico a
uma determinada raça. Não é apenas uma reação ao outro, mas é uma forma de subordinação do outro.

SEXISMO: atitude preconceituosa que difere homens de mulheres definindo características


específicas para cada um, subordinando o feminino ao masculino.

SEXO BIOLÓGICO: é o conjunto de características fisiológicas, informações cromossômicas, órgãos


genitais, potencialidade individual para o exercício de qualquer função biológica que diferencia machos e
fêmeas. Entretanto, o sexo não é simplesmente algo que lhe foi dado pela biologia. Foucault analisa o
sexo biológico como um efeito discursivo. O poder cria o corpo ao anunciá-lo sexuado, ao fazer de sua
constituição biológica um fator natural que carrega características específicas e torna indiscutível a divisão
dos humanos em dois blocos distintos (homens e mulheres). Isto não significa que o corpo não exista de
forma sexuada. O que o poder cria é outra coisa: é a importância dada a esse fator corporal (biológico).

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O sexo produz, interdita, possibilita e regula o corpo limitando certos tipos de escolhas para a produção
de um corpo sexuado que seja culturalmente aceitável e inteligível. Assim, o sexo é uma norma através
da qual alguém se torna viável.

SEXUALIDADE: É aprendida, ou melhor, é construída ao longo de toda a vida, de muitos e diferentes


modos, por todos os sujeitos por isso, é entendida como um conceito dinâmico que se modifica conforme
as posições do sujeito e suas disputas políticas. A sexualidade tem a ver tanto com o corpo, como também
com os rituais, o desejo, a fantasia, as palavras, as sensações, emoções, imagens e experiências. Ela
não tem ligação somente com a questão do sexo e dos atos sexuais, mas também com os prazeres e
sua relação com o corpo e a cultura compreendendo o erotismo, o desejo e o afeto; até questões relativas
a reprodução, saúde sexual, utilização de novas tecnologias.

TRANSEXUAL: pessoa que possui uma identidade de gênero diferente do sexo designado no
nascimento. Homens e mulheres transexuais podem manifestar o desejo de se submeterem a
intervenções médico-cirúrgicas para realizarem a adequação dos seus atributos físicos de nascença
(inclusive genitais) à sua identidade de gênero constituída.

TRANSFOBIA: termo usado para descrever vários fenômenos sociais relacionados ao preconceito, a
discriminação e à violência contra transexuais (ter desprezo, ódio, aversão ou medo de pessoas com
orientação sexual diferente do padrão heterossexual). Ver homofobia.

TRANSGÊNEROS OU TRANS: são termos utilizados para reunir, numa só categoria, travestis e
transexuais como sujeitos que realizam um trânsito entre um gênero e outro.

TRAVESTI: pessoa que nasce do sexo masculino ou feminino, mas que tem sua identidade de gênero
oposta a seu sexo biológico, assumindo papéis de gênero diferentes daquele imposto pela sociedade.
Muitas travestis modificam seus corpos através de hormonioterapias, aplicações de silicone e/ou cirurgias
plásticas, porém vale ressaltar que isso não é regra para todas (Definição adotada pelo Conferência
Nacional LGBT em 2008)

ORIENTAÇÃO SEXUAL: refere-se ao sexo das pessoas que elegemos para nos relacionar afetiva e
sexualmente. Atualmente temos três tipos de orientação sexual: heterossexual, homossexual e bissexual.
Contrapõem a OPÇÃO SEXUAL entendida como escolha deliberada e realizada de forma autônoma.

VIOLÊNCIA DE GÊNERO: É aquela oriunda do preconceito e da desigualdade entre homens e


mulheres e apoia-se no estigma da virilidade masculina (legítima defesa da honra) e da submissão
feminina.
Quando as vítimas são crianças e adolescentes o Art. 245 do ECA, obriga os profissionais da saúde e
educadores e educadoras a comunicarem o fato aos órgãos competentes. Na escola a discriminação é
manifestada por meio de apelidos, exclusões, perseguição, agressão física.

Questões

01. (SEDUC-SP- Conhecimentos Pedagógicos- FGV) Leia o fragmento a seguir. “Além das novas
demandas e dos entraves do cenário escolar e suas próprias condições de vida e de trabalho, o professor
ainda se depara com outras dificuldades que complicam a realização das intenções dos PCNs de ênfase
em parâmetros curriculares não tradicionais, como sexualidade e gênero”. (Abramovay et al., 2004)
Assinale a alternativa que apresenta a proposta que tem como objetivo mitigar o apresentado no
fragmento.
(A) Suspender a aplicação do tema transversal orientação sexual.
(B) Deixar o tema da sexualidade e da afetividade como responsabilidade exclusiva dos professores
da área de Biologia, já que configuram o “saber competente”.
(C) Capacitar os professores para lidar com o tema sexualidade.
(D) Delegar a responsabilidade pela orientação sexual aos movimentos sociais.
(E) Delegar a responsabilidade pela orientação sexual às famílias dos alunos.

02. (SEDUC-RJ- Conhecimentos Básicos- Todos os cargos- CEPERJ) Uma das questões
formativas fundamentais da vida humana, incorporadas pelos Parâmetros Curriculares Nacionais, é a
orientação sexual. Segundo os PCNs, as questões relativas à orientação sexual devem constituir:

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(A) uma nova disciplina com horário específico de aulas na escola
(B) uma nova área de conhecimento a ser desenvolvida em interface com as agências de educação
permanente da sociedade
(C) uma área de conhecimento específica do ensino médio e tratada como disciplina
(D) um tema específico a ser tratado nas aulas de Biologia e Sociologia
(E) um tema transversal que permeia as diferentes disciplinas e áreas de conhecimento

03. (IF-PE- Assistente de alunos- IF-PE/2016) Leia a seguinte sentença: “Temas como gênero,
sexualidade e diversidade sexual estão pautados dentro das políticas sociais e devem ser discutidos em
diferentes instâncias da sociedade”. A expressão “gênero”, na sentença transcrita, refere-se
(A) exclusivamente às características físicas e biológicas entre o corpo do homem e da mulher, do
menino e da menina.
(B) às diferenças entre o masculino e o feminino que foram construídas a partir do século XXI.
(C) às diferenças entre o masculino e o feminino que foram construídas exclusivamente depois dos
movimentos feministas.
(D) às diferenças entre o masculino e o feminino que foram construídas no decorrer da história da
humanidade por meio dos costumes, ideias, atitudes, crenças e regras criadas pela sociedade.
(E) exclusivamente às características físicas e biológicas entre o corpo do homem e da mulher, depois
que eles atingem a maturidade sexual.

04. (IF-PE- Assistente de Alunos- IF-PE/2016) Leia a seguinte sentença: “Temas como gênero,
sexualidade e diversidade sexual estão pautados dentro das políticas sociais e devem ser discutidos em
diferentes instâncias da sociedade”. A expressão “gênero”, na sentença transcrita, refere-se
(A) exclusivamente às características físicas e biológicas entre o corpo do homem e da mulher, do
menino e da menina.
(B) às diferenças entre o masculino e o feminino que foram construídas a partir do século XXI.
(C) às diferenças entre o masculino e o feminino que foram construídas exclusivamente depois dos
movimentos feministas.
(D) às diferenças entre o masculino e o feminino que foram construídas no decorrer da história da
humanidade por meio dos costumes, ideias, atitudes, crenças e regras criadas pela sociedade.
(E) exclusivamente às características físicas e biológicas entre o corpo do homem e da mulher, depois
que eles atingem a maturidade sexual.

Respostas

01.C. / 02. E. / 03. D. / 04. D.

01.C.
A letra A trata a suspensão do tema e essa não é uma pratica proposta uma vez que a orientação
sexual esta como tema transversal nos PCN desde 1995.
A letra B trata de deixar o tema como responsabilidade do professor de biologia, está errada pois como
tema transversal não é um saber competente de uma única disciplina.
A letra C está correta.
A letra D sugere delegar a responsabilidade pela orientação sexual aos movimentos sociais, está
errada pois os movimentos sociais podem até tratar o tema mas não deve ser colocado como
responsabilidade destes.
A letra E está errada uma vez que a responsabilidade pela orientação sexual não deve ser somente
da família mas também da escola.

02. E.
O governo federal brasileiro, através do Ministério da Educação - MEC, em seus Parâmetros
Curriculares Nacionais (1997), estabelece a Orientação Sexual no Ensino Fundamental enquanto tema
transversal, isto é, um assunto a ser trabalhado em todas as disciplinas escolares, por quaisquer
professores que se sintam mobilizados, sempre que houver espaço na grade curricular ou em horários
extraclasses.

03. D.
Ao falar em sexo referem-se às características físicas e biológicas de cada um, às diferenças entre um
corpo de homem e de mulher, de menino e de menina. Porém ao falar em gênero, trata-se às diferenças

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que foram construídas ao longo da história da humanidade por meio dos costumes, ideias, atitudes,
crenças e regras criadas pela sociedade.

04. D.
Quando falamos em sexo nos referimos às características físicas e biológicas de cada um, às
diferenças entre um corpo de homem e de mulher, de menino e de menina.
Mas, quando falamos em gênero, nos referimos às diferenças que foram construídas ao longo da
história da humanidade por meio dos costumes, ideias, atitudes, crenças e regras criadas pela sociedade.
Relações de Gênero: “...Saber a respeito das diferenças sexuais - histórica, social e culturalmente
construída. Portanto relativa, contextual, contestável e mutável. É um saber que atravessa todas as
relações que se constituem na sociedade, organizando as relações de poder a partir do significados que
cada sociedade atribui à diferença sexual”. É mais do que a maneira que as pessoas se relacionam é o
jeito de olhar e compreender a realidade. (Fórum Saúde Mulher)

4 Teorias do currículo. 4.1 Acesso, permanência e sucesso do aluno na escola.

Teorias do Currículo

Teoria Tradicional

Kliebard66 apresenta que os fundamentos da teoria curricular de John Bobbit estão baseados na
concepção de administração científica de Taylor, e que a extrapolação desses princípios para a área de
currículo transformou a criança no objeto de trabalho da engrenagem burocrática da escola.
Neste sentido, as finalidades do currículo eram:
- educar o indivíduo segundo as suas potencialidades;
- desenvolver o conteúdo do currículo de modo suficientemente variado com o fim de satisfazer as
necessidades de todos os tipos de indivíduos na comunidade;
- favorecer um ritmo de treinamento e de estudo que seja suficientemente flexível;
- dar ao indivíduo somente aquilo de que ele necessita;
- estabelecer padrões de qualidade e quantidade definitivos para o produto;
- desenvolver objetivos educacionais precisos e que incluam o domínio ilimitado da capacidade
humana através do conhecimento de hábitos, habilidades, capacidades, formas de pensamento, valores,
ambições, etc., enfim, conhecer o que seus membros necessitam para o desempenho de suas atividades;
- oferecer “experiências diretas” quando essas múltiplas necessidades não fossem atendidas por
“experiências indiretas”.

Da transposição dos princípios gerais da administração científica para a administração das escolas
passou-se ao domínio da teoria curricular. As implicações para a prática de uma escola em que a criança
é o material e a escola é a escola-fábrica e, que, portanto deve modelá-la como um produto de acordo
com as especificações da sociedade, tem seus objetivos voltados para um controle de qualidade.

Kliebard67, defendia que “padrões qualitativos e quantitativos definitivos fossem estabelecidos para o
produto”, considerando esse produto como o material criança, a professor deveria obter de seus alunos
a maior capacidade que eles possuíssem para solucionar determinada tarefa em determinado período de
tempo.
A prática docente desse currículo é facilmente compreendida, pois baseia-se num modelo funcional
de aplicação de conteúdos e atividades. Para Kliebard a padronização de atividades ou unidades de
trabalho e dos próprios produtos (crianças), exigiu a especificação de objetivos educacionais e tornou a
criança, em idade escolar como algo a ser modelado e manipulado, produzido de modo que se encaixasse
em seu papel social predeterminado.
Em sequência a essa concepção fabril de currículo, Kliebard apresenta o pensamento de Tyler, que
afirma que o professor pode controlar as experiências de aprendizagem através da “manipulação do
ambiente de tal forma que crie situações estimulantes – situações que irão suscitar a espécie de

66
KLIEBARD, H. Burocracia e teoria de currículo. In: MESSIK, R.; PAIXÃO, L.; BASTOS, L. (Orgs.). Currículo: análise e debate. São Paulo: Zahar,1980. p.107-
126.
67
KLIEBARD, H. Os princípios de Tyler. In: MESSIK, R.; PAIXÃO, L.; BASTOS, L. (Orgs.) Currículo: análise e debate. São Paulo: Zahar, 1980. p.107-126.

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comportamento desejado, portanto, parte do pressuposto de que “a educação é um processo de mudança
nos padrões de comportamento das pessoas”.

Nesse sentido, a elaboração do currículo limitava-se a ser uma atividade burocrática,


desprovida de sentido e fundamentada na concepção de que o ensino estava centrado na figura
do professor, que transmitia conhecimentos específicos aos alunos, estes vistos apenas como
meros repetidores dos assuntos apresentados.

Teoria Crítica

Quando Bobbitt (in Kliebard) concebeu esse currículo, acreditamos que talvez não tenha tido a
intenção de, além de padronizar atividades, padronizar pessoas. Essa teoria produziu uma concepção
mecanizada de currículo que perdura até hoje, mas ela abriu espaço para o campo político e econômico,
conferindo ao currículo conteúdos implícitos de dominação e poder, através da ideologia dominante.
Essa foi a percepção de Michael Apple do que vinha acontecendo com o currículo e que o tornou,
segundo Paraskeva68, o grande precursor da Escola de Frankfurt no campo da educação e do currículo
e o primeiro a reavivar, de uma forma explícita, o cunho político do ato educativo e curricular, colocando
a teorização crítica como a saída para a compreensão do atual fenômeno da escolarização.
Aponta que Apple, em “Ideilogy and Curriculum”, denuncia a feliz promiscuidade entre Ideologia,
Cultura e Currículo e o modo como os movimentos hegemônicos (e também contra hegemônicos) se [re]
[des] constroem e disputam um determinado conhecimento decisivo na construção e manutenção de um
dado senso comum com implicações diretas nas políticas sociais, em geral e educativas e curriculares,
em particular. E esta obra, para muitas figuras de proa no campo do currículo – Huebner, McDonald,
Mann, Kliebard, Beane, McLaren, Giroux, Macedo – seria o inaugurar de uma nova era no campo, em
que passava-se do Tylerismo ao Appleanismo.
Paraskeva, apresenta que para Apple, a problemática do conhecimento é considerada como pedra
angular para o estudo da escolarização como veículo de seletividade, um conhecimento que se toma
parte nas dinâmicas desiguais de poder e de controle, no qual o processo de escolarização não é
inocente.
Sobre a preocupação com as formas de conhecimento difundido Apple69, considera fundamental
questionar “para quem é esse conhecimento”, demonstrando uma preocupação com o que deve ser
ensinado não apenas como questão educacional, mas, sobretudo, como questão ideológica e política.
Destaca a escola e o currículo porque considera “que discutir sobre o que acontece, o que pode
acontecer e o que deveria acontecer em sala de aula” (...) é uma “tarefa que merece a aplicação de
nossos melhores esforços”.
Nesse sentido observa que “enquanto não levarmos à sério a intensidade do envolvimento da
educação com o mundo real das alternativas e desiguais relações de poder, estaremos vivendo em um
mundo divorciado da realidade. As teorias, diretrizes e práticas envolvidas na educação não são técnicas.
São intrinsecamente éticas e políticas, e em última análise envolvem – uma vez que assim se reconheça
– escolhas profundamente pessoais em relação ao que Marcus Raskin denomina “o bem comum”.
Quanto ao professor afirma que “queria que os educadores, sobretudo aqueles com interesse
específico no que acontece nas salas de aula, examinassem criticamente as suas próprias ideias acerca
dos efeitos da educação”. Esse posicionamento certamente modificaria a prática pedagógica, não no
sentido de aplicação metodológica, mas enquanto intenções provocativas à reflexão e à emancipação.
Portanto, segundo Silva70, as teorias tradicionais pretendem ser apenas “teorias” neutras, científicas,
desinteressadas, concentrando-se em questões técnicas e de organização, enquanto que “as teorias
críticas e as teorias pós-críticas argumentam que nenhuma teoria é neutra, científica ou desinteressada,
mas que está, inevitavelmente implicada em relações de poder. Não se limita a questionar “que
conhecimentos”, mas por que esse conhecimento e não outro? Quais interesses fazem com que esse
conhecimento e não outro esteja no currículo? Por que privilegiar um determinado tipo de identidade ou
subjetividade e não outro?”
Desta forma, percebemos que as teorias críticas pretendem trazer as relações sociais e sua discussão
para a sala de aula: questões de raça, de religião, dominação política e ideológica, diferenças culturais,
etc. A intenção é legítima quanto à uma educação voltada para a redução e até mesmo, nivelação das
desigualdades.

68
PARASKEVA, J.M. Michael Apple e os estudos [curriculares] críticos. Currículo sem Fronteiras, v.2, n. 1, p. 106-120, Jan./Jun. 2002.
69
APPLE, M. W. Repensando ideologia e currículo. In: MOREIRA, A. F.; SILVA, T. T. (Orgs.). Currículo, cultura e sociedade. São Paulo: Cortez, 1994, p. 39-57.
70
SILVA, T. T. Documentos de identidade: uma introdução às teorias do currículo. Belo Horizonte: Autêntica, 1999.

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Trazer essas intenções para a sala de aula, concretizar essa teorização crítica do currículo na prática
pedagógica não é tarefa fácil. É possível perceber essa dificuldade sobre o que observamos do que
Moreira71 apresenta quando a teoria curricular crítica é vista em crise tanto nos Estados Unidos como no
Brasil, e revela as seguintes interpretações:
- para Pinar, Reynolds Slattery e Taubman, como críticos à essa teoria, a crise resulta do ecletismo do
discurso, decorrente da amplidão desmedida de seus interesses e de suas categorias;
- para James Ladwig, a crise resulta de um impasse teórico, pois são fundamentalmente qualitativos e
não apresentam evidências suficientes de suas proposições, o que os torna pouco convincentes para
grande parte da comunidade educacional tradicional;
- para Jennifer Gore a crise é mais evidente nos trabalhos de Giroux e Peter Maclaren e são descritas
em duas razões: ausência de sugestões para uma prática docente crítica e a utilização de um discurso
altamente abstrato e complexo, cujos princípios dificilmente podem ser entendidos e operacionalizados
pelos professores.
Quanto ao Brasil, apresenta que Regina Celli Cunha considera que a concepção crítica de currículo
vivencia uma crise de legitimação, por não conseguir, na prática, implementar seus princípios teóricos.
Moreira revela, ainda, que a opinião dominante entre especialistas em currículo acerca da crise é de que
os avanços teóricos afetam pouco a prática docente e que essas discussões têm predominância no
campo acadêmico, dificilmente alcançando a escola, não contribuindo para maior renovação, e que,
apesar da crise, a teoria curricular crítica constitui a mais produtiva tendência do campo do currículo.

Fundamentos:
- Crítica aos processos de convencimento, adaptação e repressão da hegemonia dominante;
- Contraposição ao empiricismo e ao pragmatismo das teorias tradicionais;
- Crítica à razão iluminista e racionalidade técnica;
- Busca da ruptura do status quo;
- Materialismo Histórico Dialético – crítica da organização social pautada na propriedade privada dos
meios de produção (fundamentos em Marx e Gramsci);
- Crítica à escola como reprodutora da hegemonia dominante e das desigualdades sociais. (Michael
Apple)

Principais Fundamentos:

- Escola Francesa: teoria da reprodução cultural – “capital cultural”. O currículo da escola está
baseado na cultura dominante, na linguagem dominante, transmitido através do código cultural (Bourdieu
e Passeron)

- Escola de Frankfurt: crítica à racionalidade técnica da escola “pedagogia da possibilidade” – da


resistência. Currículo como emancipação e libertação. (Giroux e Freire)

Assim sendo, a função do currículo, mais do que um conjunto coordenado e ordenado de


matérias, seria também a de conter uma estrutura crítica que permitisse uma perspectiva
libertadora e conceitualmente crítica em favorecimento das massas populares. As práticas
curriculares, nesse sentido, eram vistas como um espaço de defesa das lutas no campo cultural
e social.

Teoria Pós-Críticas

Já a teoria pós-críticas emergiu a partir das décadas de 1970 e 1980, partindo dos princípios da
fenomenologia, do pós-estruturalismo e dos ideais multiculturais. Assim como a teoria crítica, a
perspectiva pós-crítica criticou duramente a teoria tradicional, mas elevaram as suas condições para além
da questão das classes sociais, indo direto ao foco principal: o sujeito.
Desse modo, mais do que a realidade social dos indivíduos, era preciso compreender também os
estigmas étnicos e culturais, tais como a racialidade, o gênero, a orientação sexual e todos os elementos
próprios das diferenças entre as pessoas. Nesse sentido, era preciso estabelecer o combate à opressão
de grupos semanticamente marginalizados e lutar por sua inclusão no meio social.
A teorias pós-crítica considerava que o currículo tradicional atuava como o legitimador dos modus
operandi dos preconceitos que se estabelecem pela sociedade. Assim, a sua função era a de se adaptar

71
MOREIRA, A. F. B. A crise da teoria curricular crítica. 1999.

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ao contexto específico dos estudantes para que o aluno compreendesse nos costumes e práticas do outro
uma relação de diversidade e respeito.
Além do mais, em um viés pós-estruturalista, o currículo passou a considerar a ideia de que não existe
um conhecimento único e verdadeiro, sendo esse uma questão de perspectiva histórica, ou seja, que se
transforma nos diferentes tempos e lugares.

Fundamentos:

Currículo Multiculturalista – nenhuma cultura pode ser julgada superior a outra.

Multiculturalismo – contra o currículo universitário tradicional (cultura branca, masculina e europeia


e heterossexual).

- As questões de gênero são uma das questões muito presentes nas teorias pós-críticas;
- O acesso à educação era desigual para homens e mulheres e dentro do currículo havia distinções
de disciplinas masculinas e femininas;
- Assim certas carreiras eram exclusivamente masculinas sem que as mulheres tivessem
oportunidades;
- A intenção era que os currículos percebessem as experiências, os interesses, os pensamentos e os
conhecimentos femininos dando-lhes igual importância;
- As questões raciais e étnicas também começaram a fazer parte das teorias pós-críticas do currículo,
tendo sido percebida a problemática da identidade étnica e racial.

É essencial, por meio do currículo, desconstruir o texto racial, questionar por que e como
valores de certos grupos étnicos e raciais foram desconsiderados ou menosprezados no
desenvolvimento cultural e histórico da humanidade e, pela organização do currículo,
proporcionar os mesmos significados e valores a todos os grupos, sem supervalorização de um
ou de outro.

Uma Análise Comparativa

Teorias Críticas Teorias Pós Críticas


- Conceitos e conhecimentos históricos - Fim das metanarrativas;
e científicos;
- Concepções; - Hibridismo;
- Teoria de currículo – conceitos; - Currículo como discurso-representações;
- Trabalho; - Cultura;
- Materialidade/objetividade; - Identidade/subjetividade;
- Realidade; - Discurso;
- Classes Sociais; - Gênero, raça, etnia, sexualidade;
- Emancipação e libertação; - Representação e incertezas;
- Desigualdade Social; - Multiculturalismo;
- Currículo como resistência; - Currículo como construção de identidades;
- Currículo oculto; - Relativismo;
- Definição do “o quê” e “por quê” se - Compreensão do “para quem” se constrói
ensina; o currículo – formação de identidades.
- Noção de sujeito.

Políticas Públicas: Acesso e Permanência na Escola - um Direito72

A história da educação pública está associada à construção dos direitos sociais e humanos. De forma
tímida, podemos identificar, em nossa história, inúmeros movimentos da sociedade que exigiam e que
ainda exigem a ampliação do atendimento educacional como a ampliação da laicidade, da
obrigatoriedade, da universalização do acesso, da gestão democrática, da ampliação da jornada escolar,
da educação de tempo integral, da garantia do padrão de qualidade. Esses aspectos estão vinculados à
criação de condições de oferta da educação pública, envolvendo a educação básica e superior, tendo
como concepção de educação de qualidade como direito social.
72 Texto adaptado de Adriana Maria Jacob de Souza, disponível em http://www.unifia.edu.br/

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Em 1988, com a promulgação da Constituição, fica afirmado em seu Artigo 1º, que a República
Federativa do Brasil “constitui-se em Estado Democrático de Direitos”. Assumir essa condição significa
que o Brasil submete-se à ordem jurídica ou às leis de modo a proteger e salvaguardar os direitos de
todos os cidadãos. O Estado de Direito compreende a supremacia da lei; o princípio de legalidade; a
igualdade de todos perante a lei; a garantia dos direitos individuais e sociais, entre os quais a educação;
a independência do magistério quanto à pluralidade de ideias e de concepções pedagógicas e a
responsabilidade em regime de colaboração entre a União, Estados e Municípios, o que caracteriza a
descentralização dos poderes.
Seu artigo 205, diz que a educação é direito de todos e visa ao preparo da pessoa para o exercício da
cidadania. Observamos que o constituinte dá uma definição política de educação: é um direito de todos
e um dever do Estado e da família. Todos, sem distinção, têm direito à educação. Mas qual educação?
Segundo a Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional nº 9.394/96, em seu artigo 1º, “A educação
abrange os processos formativos que se desenvolvem na vida familiar, na convivência humana, no
trabalho, nas instituições de ensino e pesquisa, nos movimentos sociais e organizações da sociedade
civil e nas manifestações culturais”. Podemos considerar dessa forma, a dimensão abrangente do
fenômeno educativo. A educação, então, não é somente aquela que acontece na escola em salas de
aula, mas ultrapassa os muros das instituições de ensino sistematizadas e formais.
Ainda no artigo 205 da Constituição, encontram-se os objetivos da educação nacional. Sendo primeiro,
o pleno desenvolvimento da pessoa – saber ser; segundo, seu preparo para o exercício da cidadania –
saber conviver, e terceiro, sua qualificação para o trabalho – saber fazer. Portanto, desenvolvimento,
cidadania e trabalho, são palavras centrais no campo das finalidades educacionais.
No artigo 206 encontram-se relacionados os princípios que devem orientar o ensino, entre os quais:
igualdades de condições de acesso e permanência na escola; liberdade de aprender, ensinar, pesquisar
e divulgar o pensamento, a arte e o saber; pluralidade de ideias e de concepções pedagógicas; gratuidade
no ensino público em estabelecimentos oficiais; gestão democrática do ensino público e garantia de
padrão de qualidade.
Pode-se observar que todos esses princípios do ensino estão comprometidos com a educação para
todos. Contudo, somente o Ensino Fundamental encontra-se alicerçado pelas políticas como obrigatório
e gratuito na escola pública às crianças de 6 a 14 anos de idade. Com garantias de acesso e permanência
como atendimento ao educando, através de programas suplementares de material didático-escolar,
transporte, alimentação e assistência à saúde.
Mas é importante destacar que a democratização da educação não se limita somente ao acesso a
instituição de ensino. A garantia do acesso é essencial, mas torna-se necessário também que todas as
crianças que ingressam na escola tenham condições de permanecer com sucesso, isto é, que enquanto
o aluno estiver nos bancos escolares ele possa aprender de forma significativa os conhecimentos
indispensáveis à sua vida em sociedade.
No entanto, apesar da suposta universalização do Ensino Fundamental, segundo Pesquisa Nacional
por Amostra de Domicílios, feita em 2006 pelo Instituto de Geografia e Pesquisa – IBGE, 2,6% de
brasileiros entre 7 e 14 anos estão fora da escola, o que representa 660 mil crianças e jovens. Essa
estatística inclui tanto as crianças que largaram os estudos como as que nem chegaram a ser
matriculadas. Dentre as principais causas sociais e familiares são o envolvimento com drogas, trabalho
precoce, falta de transporte ou documentação. Paralelo a esses dados, temos as taxas de frequência e
de repetência.
Estudo conduzido pelo Centro de Políticas Sociais da Fundação Getúlio Vargas – FGV, revela que
apenas 72% dos estudantes matriculados estão efetivamente nas salas de aula. Os 28% restantes,
apesar de ter o nome na lista de chamada, faltam muito ou não assistem à jornada considerada mínima
para o aprendizado (200 dias letivos com mínimo de 800 horas aula). O fato é que o não comparecimento
desencadeia outros problemas como a repetência, distorção idade-série e a evasão escolar.
A Organização das Nações Unidas para a Educação, Ciência e Cultura – UNESCO, aponta em
relatório finalizado em abril de 2007, que 53,8% dos que iniciam o 1º ano não chegam ao 9º, desses,
poucos retornam as salas de aulas na Educação de Jovens e Adultos – EJA.
É considerando o previsto na legislação nacional e nos dados acima citados que observamos a
distância que há entre as letras da lei e a realidade educacional que nos encontramos. Necessitamos de
políticas públicas articuladas com o compromisso do acesso e permanência do aluno na escola e que
todos tenham êxito durante e ao concluir seus estudos, especialmente na escola pública. Que ao sair da
escola o aluno saiba ler, escrever, interpretar, argumentar, decidir, se defender, entre tantas outras
competências. Nesse sentido o sucesso escolar é o retorno da qualidade do ensino, um ensino
democrático, direito de todos.

. 155
1484041 E-book gerado especialmente para MAURICIO PEREIRA BARROS
4.2 Gestão da aprendizagem. 4.3 Planejamento e gestão educacional.

Gestão democrática e a mobilização da equipe escolar73

E por falar em gestão, como proceder de forma mais democrática nos sistemas de ensino e nas escolas
públicas?

A participação é educativa tanto para a equipe gestora quanto para os demais membros das
comunidades escolar e local. Ela permite e requer o confronto de ideias, de argumentos e de diferentes
pontos de vista, além de expor novas sugestões e alternativas. Maior participação e envolvimento da
comunidade nas escolas produzem os seguintes resultados:

- Respeito à diversidade cultural, à coexistência de ideias e de concepções pedagógicas, mediante um


diálogo franco, esclarecedor e respeitoso;
- Formulações de alternativas, após um período de discussões onde as divergências são expostas.
- Tomada de decisões mediante procedimentos aprovados por toda a comunidade envolvida
- Participação e convivência de diferentes sujeitos sociais em um espaço comum de decisões
educacionais.
A gestão democrática dos sistemas de ensino e das escolas públicas requer a participação coletiva
das comunidades escolar e local na administração dos recursos educacionais financeiros, de pessoal, de
patrimônio, na construção e na implementação dos projetos educacionais.
Mas para promover a participação e deste modo implementar a gestão democrática da escola,
procedimentos prévios podem ser observados:
- Solicitar a todos os envolvidos que explicitem seu comprometimento com a alternativa de ação
escolhida;
- Responsabilizar pessoas pela implementação das alternativas acordadas;
- Estabelecer normas prévias sobre como os debates e as decisões serão realizados;
- Estabelecer regras adequadas à igualdade de participação de todos os segmentos envolvidos;
- Articular interesses comuns, ideias e alternativas complementares, de forma a contribuir para
organizar propostas mais coletivas.
- Esclarecer como a implementação das ações serão acompanhadas e supervisionadas;
- Criar formas de divulgação das ideias e alternativas em debate como também do processo de
decisão.

Gestão democrática implica compartilhar o poder, descentralizando-o. Como fazer isso? Incentivando
a participação e respeitando as pessoas e suas opiniões; desenvolvendo um clima de confiança entre os
vários segmentos das comunidades escolar e local; ajudando a desenvolver competências básicas
necessárias à participação (por exemplo, saber ouvir, saber comunicar suas ideias). A participação
proporciona mudanças significativas na vida das pessoas, na medida em que elas passam a se interessar
e se sentir responsáveis por tudo que representa interesse comum.
Assumir responsabilidades, escolher e inventar novas formas de relações coletivas faz parte do
processo de participação e trazem possibilidades de mudanças que atendam a interesses mais coletivos.
A participação social começa no interior da escola, por meio da criação de espaços nos quais
professores, funcionários, alunos, pais de alunos etc. possam discutir criticamente o cotidiano escolar.
Nesse sentido, a função da escola é formar indivíduos críticos, criativos e participativos, com condições
de participar criticamente do mundo do trabalho e de lutar pela democratização da educação. A escola,
no desempenho dessa função, precisa ter clareza de que o processo de formação para uma vida cidadã
e, portanto, de gestão democrática passa pela construção de mecanismos de participação da comunidade
escolar, como: Conselho Escolar, Associação de Pais e Mestres, Grêmio Estudantil, Conselhos de
Classes etc.
Para que a tomada de decisão seja partilhada e coletiva, é necessária a efetivação de vários
mecanismos de participação, tais como: o aprimoramento dos processos de escolha ao cargo de dirigente
escolar; a criação e a consolidação de órgãos colegiados na escola (conselhos escolares e conselho de

73
Dourado, L. F.Progestão: como promover, articular e envolver a ação das pessoas no processo de gestão escolar? Brasília : CONSED – Conselho Nacional
de Secretários de Educação, 2001.

. 156
1484041 E-book gerado especialmente para MAURICIO PEREIRA BARROS
classe); o fortalecimento da participação estudantil por meio da criação e da consolidação de grêmios
estudantis; a construção coletiva do Projeto Político-Pedagógico da escola; a redefinição das tarefas e
funções da associação de pais e mestres, na perspectiva de construção de novas maneiras de se partilhar
o poder e a decisão nas instituições.
Não existe apenas uma forma ou mecanismo de participação. Entre os mecanismos de participação
que podem ser criados na escola, destacam-se: o conselho escolar, o conselho de classe, a associação
de pais e mestres e o grêmio escolar.

Conselho escolar
O conselho escolar é um órgão de representação da comunidade escolar. Trata-se de uma instância
colegiada que deve ser composta por representantes de todos os segmentos da comunidade escolar e
constitui-se num espaço de discussão de caráter consultivo e/ou deliberativo. Ele não deve ser o único
órgão de representação, mas aquele que congrega as diversas representações para se constituir em
instrumento que, por sua natureza, criará as condições para a instauração de processos mais
democráticos dentro da escola. Portanto, o conselho escolar deve ser fruto de um processo coerente e
efetivo de construção coletiva. A configuração do conselho escolar varia entre os estados, entre os
municípios e até mesmo entre as escolas. Assim, a quantidade de representantes eleitos, na maioria das
vezes, depende do tamanho da escola, do número de classes e de estudantes que ela possui.

Conselho de classe
O conselho de classe é mais um dos mecanismos de participação da comunidade na gestão e no
processo de ensino-aprendizagem desenvolvido na unidade escolar. Constitui-se numa das instâncias de
vital importância num processo de gestão democrática, pois "guarda em si a possibilidade de articular os
diversos segmentos da escola e tem por objeto de estudo o processo de ensino, que é o eixo central em
torno do qual desenvolve-se o processo de trabalho escolar" (DALBEN, 1995). Nesse sentido,
entendemos que o conselho de classe não deve ser uma instância que tem como função reunir-se ao
final de cada bimestre ou do ano letivo para definir a aprovação ou reprovação de alunos, mas deve atuar
em espaço de avaliação permanente, que tenha como objetivo avaliar o trabalho pedagógico e as
atividades da escola. Nessa ótica, é fundamental que se reveja a atual estrutura dessa instância,
rediscutindo sua função, sua natureza e seu papel na unidade escolar.

Associação de pais e mestres


A associação de pais e mestres, enquanto instância de participação, constitui-se em mais um dos
mecanismos de participação da comunidade na escola, tornando-se uma valiosa forma de aproximação
entre os pais e a instituição, contribuindo para que a educação escolarizada ultrapasse os muros da
escola e a democratização da gestão seja uma conquista possível.

Grêmio estudantil
Numa escola que tem como objetivo formar indivíduos participativos, críticos e criativos, a organização
estudantil adquire importância fundamental.
O grêmio estudantil constitui-se em mecanismo de participação dos estudantes nas discussões do
cotidiano escolar e em seus processos decisórios, constituindo-se num laboratório de aprendizagem da
função política da educação e do jogo democrático. Possibilita, ainda, que os estudantes aprendam a se
organizarem politicamente e a lutar pelos seus direitos.
Articulado ao processo de constituição de mecanismos de participação colegiada dentro da escola
destaca-se também a necessidade da participação e acompanhamento da aplicação dos recursos
financeiros, tanto na escola como nos sistemas de ensino. A responsabilidade de acompanhar e fiscalizar
a aplicação dos recursos para a educação é de toda a sociedade. Todos os envolvidos direta e
indiretamente são chamados a se responsabilizar pelo bom uso das verbas destinadas à educação.
Nesse sentido, pais, alunos, professores, servidores administrativos, associação de bairros, ou seja, as
comunidades escolar e local têm o direito de participar, por meio dos diferentes conselhos criados para
essa finalidade.

O processo de participação na escola produz, também, efeitos culturais importantes. Ele ajuda a
comunidade a reconhecer o patrimônio das instituições educativas – escolas, bibliotecas, equipamentos
– como um bem público comum, que é a expressão de um valor reconhecido por todos, o qual oferece
vantagens e benefícios coletivos. Sua utilização por algumas pessoas não exclui o uso pelas demais. É
um bem de todos; todos podem e devem zelar pelo seu uso e sua adequada conservação. A manutenção
e o desenvolvimento de um bem público comum requerem algumas condições:

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1. Recursos financeiros adequados, regulares e bem gerenciados, de modo a oferecer as mesmas
condições de uso, acesso e permanência nas escolas a alunos em condições sociais desiguais;
2. Transparência administrativa e financeira com o controle público de ações e decisões. Desse modo,
cabe ao gestor informar com clareza e em tempo hábil a relação dos recursos disponíveis, fazer
prestações de contas, promover o registro preciso e claro das decisões tomadas em reuniões;
3. Processo participativo de tomada de decisões, implementação, acompanhamento e avaliação.
Ressaltamos que o cotidiano de trabalho das escolas deve ter por referência um projeto pedagógico
construído coletivamente e o apreço às decisões tomadas pelos órgãos colegiados representativos.

Em síntese, a gestão democrática do ensino pressupõe uma maneira de atuar coletivamente,


oferecendo aos membros das comunidades local e escolar oportunidades para:
- Reconhecer que existe uma discrepância entre a situação real (o que é) e o que gostaríamos que
fosse (o que pode vir a ser).
- Identificar possíveis razões para essa discrepância.
- Elaborar um plano de ação para minimizar ou solucionar esses problemas.

Envolvendo a comunidade na gestão da escola


A gestão escolar constitui um modo de articular pessoas e experiências educativas, atingir objetivos
da instituição escolar, administrar recursos materiais, coordenar pessoas, planejar atividades, distribuir
funções e atribuições. Em síntese, se estabelecem, intencionalmente, contatos entre as pessoas, os
recursos administrativos, financeiros e jurídicos na construção do projeto pedagógico da escola. A gestão
democrática, por sua vez, requer, dentre outros, a participação da comunidade nas ações desenvolvidas
na escola. Envolver a comunidades escolar e local é tarefa complexa, pois articula interesses,
sentimentos e valores diversos. Nem sempre é fácil, mas compete às equipes gestoras pensar e
desenvolver estratégias para motivar as pessoas a se envolver e participar na vida da escola. As
possibilidades de motivação são várias, desde a concepção e o uso dos espaços escolares até a
organização do trabalho pedagógico. A mobilização das pessoas pode começar quando elas se
defrontam com situações-problema. As dificuldades nos incentivam a criar novas formas de organização,
de participar das decisões para resolvê-las. Espaços de discussão possibilitam trabalhar ideias
divergentes na construção do projeto educativo. Como criar, ou então fortalecer, ambientes que
favoreçam a participação? Na construção de ambientes de participação e mobilização de pessoas,
algumas estratégias tornam-se fundamentais. Vejamos algumas:

- Estar atento às solicitações da comunidade.


- Ouvir com atenção o que os membros da comunidade têm a dizer.
- Delegar responsabilidades ao máximo possível de pessoas.
- Mostrar a responsabilidade e a importância do papel de cada um para o bom andamento do processo.
- Garantir a palavra a todos.
- Respeitar as decisões tomadas em grupo.
- Criar ambientes físicos confortáveis para assembleias e reuniões.
- Estimularcadapresentenasreuniõesounasassembléiasaseresponsabilizar por trazer, pelo menos,
mais uma pessoa para o próximo encontro.
- Tornar a escola um espaço de sociabilidade.
- Valorizar o trabalho participativo.
- Destacar a importância da integração entre as pessoas.
- Submeter o trabalho desenvolvido na escola às avaliações da comunidade e dos conselhos ou órgãos
colegiados.
- Valorizar a presença de cada um e de todos.
- Desenvolver projetos educativos voltados para a comunidade em geral, não só para os alunos.
- Ressaltar a importância da comunidade na identidade da unidade escolar.
- Tornar o espaço escolar disponível para comunidade.

Gestão escolar para o sucesso do ensino e da aprendizagem74


Práticas de organização e gestão e escolas bem-sucedidas
Pesquisas acerca dos elementos da organização escolar que interferem no sucesso escolar dos alunos
mostram que o modo como funciona uma escola faz diferença em relação aos resultados escolares dos
alunos. Embora as escolas não sejam iguais, essas pesquisas indicam características organizacionais

74
LIBÂNEO, J. C. Organização e gestão da escola: teoria e prática; 6ª edição, São Paulo, Heccus Editora, 2013.

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úteis para compreensão do funcionamento das escolas, considerados os contextos e as situações
escolares específicos. Os aspectos a seguir aparecem em várias dessas pesquisas:

a) Em relação aos professores: boa formação profissional, autonomia profissional, capacidade de


assumir responsabilidade pelo êxito ou fracasso de seus alunos, condições de estabilidade
profissional, formação profissional em serviço, disposição para aceitar inovações com base nos seus
conhecimentos e experiências; capacidade de análise crítico-reflexiva.
b) Quanto à estrutura organizacional: sistema de organização e gestão, plano de trabalho com
metas bem definidas e expectativas elevadas; competência específica e liderança efetiva e
reconhecida da direção e coordenação pedagógica; integração dos professores e articulação do
trabalho conjunto e participativo; clima de trabalho propício ao ensino e à aprendizagem; práticas de
gestão participativa; oportunidades de reflexão conjunta e trocas de experiências entre os professores;
c) Autonomia da escola, criação de identidade própria, com possibilidade de projeto próprio e
tomada de decisões sobre problemas específicos; planejamento compatível com as realidades locais;
decisão e controle sobre uso de recursos financeiros; planejamento participativo e gestão participativa,
bom relacionamento entre os professores, responsabilidades assumidas em conjunto;
d) Prédios adequados e disponibilidade de condições materiais, recursos didáticos, biblioteca e
outros, que propiciem aos alunos oportunidades concretas para aprender;
e) Quanto à estrutura curricular: adequada seleção e organização dos conteúdos; valorização das
aprendizagens acadêmicas e não apenas das dimensões sociais e relacionais; modalidades de
avaliação formativa; organização do tempo escolar de forma a garantir o máximo de tempo para as
aprendizagens e o clima para o estudo; acompanhamento de alunos com dificuldades de
aprendizagem.
f) Participação dos pais nas atividades da escola; investimento em formar uma imagem pública
positiva da escola.

Essas características reforçam a ideia de que a qualidade de ensino depende de mudanças no âmbito
da organização escolar, envolvendo a estrutura física e as condições de funcionamento, a estrutura
organizacional, a cultura organizacional, as relações entre alunos, professores, funcionários, as práticas
colaborativas e participativas. É a escola como um todo que deve responsabilizar-se pela
aprendizagem dos alunos, especialmente em face dos problemas sociais, culturais, econômicos,
enfrentados atualmente.

Ampliando o conceito de organização e de gestão de escolas


Para a perspectiva que compreende a escola apenas como organização administrativa, também
conhecida como perspectiva técnico-racional, a organização e gestão da escola diz respeito, comumente,
à estrutura de funcionamento, às formas de coordenação e gestão do trabalho, ao estabelecimento de
normas administrativas, ao provimento e utilização dos recursos materiais e financeiros, aos
procedimentos administrativos, etc., que formam o conjunto de condições e meios de garantir o
funcionamento da escola. A concepção técnico-racional reduz as formas de organização apenas a esses
aspectos, prevalecendo uma visão burocrática de organização, decisões centralizadas, baixo grau de
participação, separação entre o administrativo e o pedagógico. Abdalla indica os inconvenientes dessa
concepção funcionalista e produtiva: “A organização se fecha, os professores se individualizam, as
interações se enfraquecem, regras são impostas, potencializa-se o campo do poder com vistas a controlar
as estruturas administrativas e pedagógicas”.
Na perspectiva da escola como organização social, para além da visão “administrativa”, as
organizações escolares são abordadas como unidades sociais formadas de pessoas que atuam em torno
de objetivos comuns, portanto, como lugares de relações interpessoais. A escola é uma organização em
sentido amplo, uma “unidade social que reúne pessoas que interagem entre si, intencionalmente, e que
opera através de estruturas e processos próprios, a fim de alcançar os objetivos da instituição”.
Destas duas perspectivas ampliou-se a compreensão da escola como lugar de aprendizagem, de
compartilhamento de saberes e experiências, ou seja, um espaço educativo que gera efeitos nas
aprendizagens de professores e alunos. As formas de organização e de gestão adquirem dois novos
sentidos:
a) o ambiente escolar é considerado em sua dimensão educativa, ou seja, as formas de organização
e gestão, o estilo das relações interpessoais, as rotinas administrativas, a organização do espaço físico,
os processos de tomada de decisões, etc., são também práticas educativas;

. 159
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b) as escolas são tidas como instituições aprendentes, portanto, espaço de formação e aprendizagem,
em que as pessoas mudam com as organizações e as organizações mudam com as pessoas.

A organização escolar como lugar de práticas educativas e de aprendizagem


A escola entendida como espaço de compartilhamento de idéias, práticas socioculturais e
institucionais, valores, atitudes de modos de agir, tem recebido várias denominações, com diferentes
justificativas: comunidade de aprendizagem, comunidade de práticas, comunidade aprendente,
organizações aprendentes, aprendizagem colaborativa, entre outras. Adotaremos aqui a noção de ensino
como “atividade situada em contextos”.
Conforme a teoria histórico-cultural da atividade a atividade humana mediatiza a relação entre o ser
humano e o meio físico e social. Esta relação é histórico-social, isto é, depende das práticas sociais
anteriores, de modo que a atividade conjunta acumulada historicamente influencia a atividade presente
das pessoas. Ao mesmo tempo, o ser humano, ao pôr-se em contato com o mundo dos objetos e
fenômenos, atua sobre essa realidade modificando-a e transformando-se a si mesmo. Este entendimento
decorre da lei genética do desenvolvimento cultural, segundo a qual “todas as funções no
desenvolvimento da criança aparecem duas vezes: primeiro, no nível social e, depois, no nível individual.
Primeiro, entre pessoas (interpsicológica) e, depois, no interior da criança (intrapsicológica)”. Esse
princípio acentua as origens sociais do desenvolvimento mental individual, especialmente o peso atribuído
às mediações culturais. Sendo assim, os contextos socioculturais e institucionais atuam na formação do
pensamento conceitual o que, em outras palavras, significa dizer que as práticas sociais em que uma
pessoa está envolvida influenciam o modo de pensar dessa pessoa.
A teoria da atividade, assim, possibilita compreender a influência das práticas socioculturais e
institucionais nas aprendizagens e o papel dos indivíduos em modificar essas práticas. De que práticas
se trata? Elas referem-se tanto ao contexto mais amplo da sociedade (o sistema econômico, as
contradições sociais, por exemplo), quanto ao contexto mais próximo, por exemplo, a comunidade em
que está inserida a escola, as práticas de organização e gestão, o tipo de relacionamento entre as
pessoas da escola, as atitudes dos professores, as rotinas cotidianas, o clima organizacional, o material
didático, o espaço físico, o edifício escolar, etc. Desse modo, as práticas sociais e culturais que ocorrem
nos vários espaços da escola são, também, mediações culturais, que atuam na aprendizagem das
pessoas (professores, especialistas, funcionários, alunos).
Tais práticas institucionais afetam significativamente o significado e o sentido, ou seja, atuam,
positivamente ou negativamente, na motivação e na aprendizagem dos alunos, já que, de alguma forma,
eles participam nessas práticas.
O ensino é, portanto, uma atividade situada, ou seja, é uma prática social que se realiza num contexto
de cultura, de relações e de conhecimento, histórica e socialmente construídos. Isso significa que não é
apenas na sala de aula que os alunos aprendem, eles aprendem também com os contextos socioculturais,
com as interações sociais, com as formas de organização e de gestão, de modo que a escola pode ser
vista como uma organização aprendente, uma comunidade democrática de aprendizagem. As pessoas –
alunos, professores, funcionários - respondem, com suas ações, a um contexto institucional e pedagógico
preparado para produzir mudanças qualitativas na sua personalidade e na sua aprendizagem.
A noção de cultura organizacional é útil para compreender melhor o papel educativo das práticas de
organização e gestão. Ela é constituída do conjunto dos significados, modos de pensar e agir, valores,
comportamentos, modos de funcionar que revelam a identidade, os traços característicos, de uma
instituição – escola, empresa, hospital, prisão, etc. - e das pessoas que nela trabalham. A cultura
organizacional sintetiza os sentidos que as pessoas dão às coisas e situações, gerando um modo
característico de pensar, de perceber coisas e de agir. Isso explica, por exemplo, a aceitação ou
resistência frente a inovações, certos modos de tratar os alunos, as formas de enfrentamento de
problemas de disciplina, a aceitação ou não de mudanças na rotina de trabalho, etc. Segundo o sociólogo
francês Forquin “A escola é, também, um mundo social, que tem suas características de vida próprias,
seus ritmos e seus ritos, sua linguagem, seu imaginário, seus modos próprios de regulação e de
transgressão, seu regime próprio de produção e de gestão de símbolos”.
Essa afirmação mostra que, nas escolas, para além daquelas diretrizes, normas, procedimentos
operacionais, rotinas administrativas, há aspectos de natureza sociocultural que as diferenciam umas das
outras, a maior parte deles pouco perceptíveis ou explícitos, traço que em estudos sobre currículo tem
sido denominado de “currículo oculto”. Essas diferenças aparecem nas formas de interação entre as
pessoas, nas crenças, valores, significados, modos de agir, configurando práticas que se projetam nas
normas disciplinares, na relação dos professores com os alunos na aula, na cantina, nos corredores, na
preparação de alimentos e distribuição da merenda, nas formas de tratamento com os pais, na
metodologia de aula etc.

. 160
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As atividades compartilhadas entre direção, professores e alunos.
A cultura organizacional aparece sob duas formas: como cultura instituída e como cultura instituinte. A
cultura instituída refere-se a normas legais, estrutura organizacional definida pelos órgãos oficiais, rotinas,
grade curricular, horários, normas disciplinares etc. A cultura instituinte é aquela que os membros da
escola criam, recriam, nas suas relações e na vivência cotidiana, podendo modificar a cultura instituída.
Neste sentido, as escolas são espaços de aprendizagem, comunidades democráticas de aprendizagem
onde se compartilham significados, criam-se outros modos de agir, mudam-se práticas, recria-se a cultura
vigente, aprende-se com a participação real de seus membros. As ações realizadas na escola nesta
perspectiva implicam a adoção de formas de participação real das pessoas nas decisões em relação ao
projeto pedagógico-curricular, ao desenvolvimento do currículo, às formas de avaliação e
acompanhamento da aprendizagem escolar, às normas de funcionamento e convivência, etc.

Para uma revisão das práticas de organização e gestão das escolas


Conclui-se que não é possível à escola atingir seus objetivos de melhoria da aprendizagem escolar
dos alunos sem formas de organização e gestão, tanto como provimento de condições e meios para o
funcionamento da escola, quanto como práticas socioculturais e institucionais com caráter formativo. Uma
revisão das práticas de organização e gestão precisa considerar cinco aspectos, que apresentamos a
seguir:

a) As práticas de organização e gestão devem estar voltadas à aprendizagem dos alunos.


As práticas de organização e gestão, a participação dos professores na gestão, o trabalho colaborativo,
estão a serviço da melhoria do ensino e da aprendizagem. Mencionou-se anteriormente que o que faz a
diferença entre as escolas é o grau em que conseguem melhorar a qualidade da aprendizagem escolar
dos alunos. Desse modo, uma escola bem organizada e gerida é aquela que cria as condições
organizacionais, operacionais e pedagógico-didáticas que permitam o bom desempenho dos professores
em sala de aula, de modo que todos os seus alunos sejam bem sucedidos em suas aprendizagens.

b) A qualidade do ensino depende do exercício eficaz da direção e da coordenação pedagógica


Há boas razões para crer que a instituição escolar não pode prescindir de ações básicas que garantem
o seu funcionamento: formular planos, estabelecer objetivos, metas e ações; estabelecer normas e rotinas
em relação a recursos físicos, materiais e financeiros; ter uma estrutura de funcionamento e definição
clara de responsabilidades dos integrantes da equipe escolar; exercer liderança; organizar e controlar as
atividades de apoio técnico-administrativo; cuidar das questões da legislação e das diretrizes pedagógicas
e curriculares; cobrar responsabilidades das pessoas; organizar horários, rotinas, procedimentos;
estabelecer formas de relacionamento entre a escola e a comunidade, especialmente com as famílias;
efetivar ações de avaliação do currículo e dos professores; cuidar das condições do edifício escolar e de
todo o espaço físico da escola; assegurar materiais didáticos e livros na biblioteca.
Tais ações representam, sem dúvida, o primeiro conjunto de competências de diretores e
coordenadores pedagógicos. Falamos da escola como espaço de compartilhamento, lugar de
aprendizagem, comunidade democrática de aprendizagem, gestão participativa, etc., mas as escolas
precisam ser organizadas e geridas como garantia de efetivação dos seus objetivos. Uma escola
democrática tem por tarefa propiciar a todos os alunos, sem distinção, educação e ensino de qualidade,
o que põe a exigência de justiça. Isto supõe estrutura organizacional, regras explícitas e sua aplicação
igual para todos sem privilégios ou discriminações, garantia de ambiente de estudo e aprendizagem,
tratamento das pessoas conforme critérios públicos e justificados. Por mais que tais exigências pareçam
como excesso de “racionalidade”, elas se justificam pelo fato de as escolas serem unidades sociais em
que pessoas trabalham juntas em agrupamentos humanos intencionalmente constituídos, visando
objetivos de aprendizagem. As escolas recebem hoje alunos de diferentes origens sociais, culturais,
familiares, portadores vivos das contradições da sociedade. É preciso que o grupo de dirigentes e
professores definam formas de gestão e de convivência que regulem a organização da vida escolar e as
práticas pedagógicas, precisamente para conter tendências de discriminação e desigualdade social e
assegurar a todos o usufruto da escolarização de qualidade.

c) A organização e a gestão implicam a gestão participativa e a gestão da participação


A organização da escola requer atender a duas necessidades: a participação na gestão, enquanto
requisito democrático, e a gestão da participação, como requisito técnico. Por um lado, as escolas
precisam cultivar os processos democráticos e colaborativos de trabalho, em função da convivência e da
tomada de decisões. Por outro, precisam funcionar bem tecnicamente, a fim de poder atingir eficazmente
seus objetivos, o que implica a gestão da participação. A gestão participativa significa alcançar de forma

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colaborativa e democrática os objetivos da escola. A participação é o principal meio de tomar decisões,
de mobilizar as pessoas para decidir sobre os objetivos, os conteúdos, as formas de organização do
trabalho e o clima de trabalho desejado para si próprias e para os outros. A participação se viabiliza por
interação comunicativa, diálogo, discussão pública, busca de consensos e de superações de conflitos.
Nesse sentido, a melhor forma de gestão é aquela que criar um sistema de práticas interativas e
colaborativas para troca de idéias e experiências para chegar a ideias e ações comuns.
Já a gestão da participação implica repensar as práticas de gestão, seja para assegurar relações
interativas, democráticas e solidárias, seja para buscar meios mais eficazes de funcionamento da escola.
A gestão da participação refere-se à coordenação, acompanhamento e avaliação do trabalho das
pessoas, como garantia para assegurar o sistema de relações interativas e democráticas. Para isso, faz-
se necessária uma bem definida estrutura organizacional, responsabilidades claras e formas eficazes de
tomada de decisões grupais. As exigências de gestão e liderança por parte de diretores e coordenadores
se justificam cada vez mais em face de problemas que incidem no cotidiano escolar: problemas sociais e
econômicos das famílias, problemas de disciplina manifestos em agressão verbal, uso de armas, uso de
drogas, ameaças a professores, violência física e verbal. Os problemas se acentuam com a inexperiência
ou precária formação profissional de muitos professores que levam a dificuldades no manejo da sala de
aula, no exercício da autoridade, no diálogo com os alunos. Constatar esses problemas implica que não
pensemos apenas em mudanças curriculares ou metodológicas, mas em formas de organização do
trabalhado escolar que articulem, eficazmente, práticas participativas e colaborativas com uma sólida
estrutura organizacional.

d) Projeto pedagógico-curricular bem concebido e eficazmente executado


O projeto pedagógico-curricular é uma declaração de intenções do grupo de profissionais da escola, é
expressão da coletividade escolar. Em sua elaboração, é sumamente relevante levar-se em conta a
cultura da escola ou a cultura organizacional e, também, seu papel de instituidor de outra cultura
organizacional. Para isso, uma recomendação inicial é de que a equipe de dirigentes e professores tenha
conhecimento e sensibilidade em relação às necessidades sociais e demandas da comunidade local e do
próprio funcionamento da escola, de modo a ter clareza sobre as mudanças a serem esperadas nos
alunos em relação ao seu desenvolvimento e aprendizagem. Com base nos dados da realidade, é preciso
que o projeto pedagógico-curricular dê respostas a esta pergunta: em que comportamentos cognitivos,
afetivos, físicos, morais, estéticos, etc., queremos intervir, de forma a produzir mudanças qualitativas no
desenvolvimento e aprendizagem dos alunos?
Além disso, é necessário ter clareza sobre os objetivos da escola que, em minha opinião, é o de
garantir a todos os alunos uma base cultural e científica comum e uma base comum de formação moral
e de práticas de cidadania, baseadas em critérios de solidariedade e justiça, na alteridade, na descoberta
e respeito pelo outro, no aprender a viver junto. Isto significa: uma escolarização igual, para sujeitos
diferentes, por meio de um currículo comum a todos, na formulação de Gimeno Sacristán. A partir de uma
base comum de cultura geral para todos, o currículo para sujeitos diferentes significa acolher a diversidade
e a experiência particular dos diferentes grupos de alunos, propiciando na escola e nas salas de aula, um
espaço de diálogo e comunicação. Um dos mais relevantes objetivos democráticos no ensino será fazer
da escola um lugar em que todos os alunos e alunas possam experimentar sua própria forma de
realização e sucesso. Para tudo isso, são necessárias formas de execução, gestão e avaliação do projeto
pedagógico-curricular.

e) A atividade conjunta dos professores na elaboração e avaliação das atividades de ensino


A modalidade mais rica e eficaz de formação docente continuada ocorre pela atividade conjunta dos
professores na discussão e elaboração das atividades orientadoras de ensino. É assim porque a formação
continuada passa a ser entendida como um modo habitual de funcionamento do cotidiano da escola, um
modo de ser e de existir da escola. Para Moura, o projeto pedagógico se concretiza mediante a realização
de atividades pedagógicas. Para isso, os professores realizam ações compartilhadas que exigem troca
de significados, possibilitando ampliar o conhecimento da realidade. Desse modo, “a coletividade de
formação constitui-se ao desenvolver a ação pedagógica. É essa constituição da coletividade que
possibilita o movimento de formação do professor”.

Questões

01. (IF-PI- Pedagogo- FUNRIO) Os estudos sobre a administração escolar não é novo, bem como a
da organização do trabalho aí realizado.

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1484041 E-book gerado especialmente para MAURICIO PEREIRA BARROS
É sempre útil distinguir, no estudo desta questão, a existência de duas concepções, que norteiam as
análises: a científico-racional e a crítico, de cunho sócio-político.
Na primeira delas, que é o modelo mais comum de funcionamento das instituições de ensino, as
escolas dão muita ênfase à estrutura organizacional, que pode ser planejada, organizada e controlada,
de modo a alcançar maiores índices de eficácia e eficiência, uma vez que a organização escolar se
embasa numa percepção de “realidade objetiva, neutra, técnica, que funciona racionalmente".
Na segunda concepção, a organização escolar se estabelece “basicamente como um sistema que
agrega pessoas, importando bastante a intencionalidade e as interações sociais, o contexto sócio-político
etc., constituindo-se numa construção social a ser construída pelos professores, alunos, pais e integrantes
da comunidade próxima, caracterizada pelo interesse público.

A visão crítica da escola resulta em diferentes formas de viabilização da...


(A) administração empresarial.
(B) administração escolar.
(C) gestão democrática.
(D) gestão empresarial.
(E) administração colegiada.

02. (IF-PB- Técnico em Assuntos Educacionais- IF-PB) Dentre os princípios e características da


gestão escolar participativa, destaca-se a autonomia como o fundamento da concepção democrático-
participativa de gestão escolar. Com base nessa informação, a autonomia na concepção democrático-
participativa de gestão escolar está expressa em:
(A) A faculdade de uma pessoa de autogovernar-se, decidir sobre o próprio destino, gerenciamento
das ações e recursos financeiros.
(B) A organização escolar depende exclusivamente de decisões do poder central.
(C) O êxito da gestão da escola está no controle emanado pelo poder central.
(D) A gestão da autonomia não implica corresponsabilidade dos membros da equipe escolar.
(E) A autonomia é um princípio que implica que um líder tome as decisões para que os demais
membros possam participar do processo de gestão.

03. (IF-MT- Auxiliar em Administração- UFMT)

O novo gestor escolar


Escrito por Roberta Braga
Publicado em 03, Novembro de 2014.

As mudanças na sociedade, nas famílias e na forma de as pessoas perceberem a vida são constantes.
Ideais autoritários ficam cada vez mais enfraquecidos, e ações colaborativas ganham mais força. A escola
como ambiente de convívio e educação é impactada por essas mudanças de comportamento. Nesse
cenário, o gestor escolar passa a ter papel ainda mais importante, uma vez que a maneira como a escola
é administrada pode refletir um melhor ambiente, tanto de trabalho quanto de aprendizagem.
Apesar de não existir uma receita pronta de administração que funcione em todas as escolas, alguns
princípios ajudam a nortear o trabalho dos gestores [...]. “A tendência é de uma gestão em que o poder é
distribuído, em que existe incentivo ao trabalho coletivo e às decisões tomadas em conjunto com os
envolvidos", observa Helena Machado de Paula Albuquerque, doutora em Educação e coordenadora do

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1484041 E-book gerado especialmente para MAURICIO PEREIRA BARROS
curso de especialização em Gestão Educacional e Escolar da Pontifícia Universidade Católica de São
Paulo (PUC-SP). Para a especialista, o momento atual pelo qual o sistema de ensino passa é o de
perceber as novas necessidades e migrar, pouco a pouco, para esse tipo de gestão. “Nós ainda estamos
engatinhando para perceber a escola como ela está e atender às necessidades reais do processo
educativo", considera [...].
(Disponível em http://www.gestaoeducacional.com.br/. Acesso em 13/07/2015.)

De acordo com o texto, qual é o modelo de gestão que possibilita a distribuição do poder e
incentiva o trabalho coletivo e as decisões tomadas em conjunto com os envolvidos?
(A) Gestão participativa
(B) Gestão autoritária
(C) Gestão por competência
(D) Gestão mecanicista
Gabarito

01.C / 02.A / 03.A

Comentários

01. C.
"A gestão, numa concepção democrática, efetiva-se por meio da participação dos sujeitos sociais
envolvidos com a comunidade escolar, na elaboração e construção de seus projetos, como também nos
processos de decisão, de escolhas coletivas e nas vivências e aprendizagens de cidadania.

02. A.
Segundo Libâneo (2004) “autonomia é a faculdade das pessoas de autogovernar-se, de decidir sobre
seu próprio destino”. Autonomia de uma instituição significa ter o poder de decisão sobre seus objetivos
e suas formas de organização, manter-se relativamente independente do poder central, administrar
livremente recursos financeiros.

03. A.
A gestão participativa significa alcançar de forma colaborativa e democrática os objetivos da escola. A
participação é o principal meio de tomar decisões, de mobilizar as pessoas para decidir sobre os objetivos,
os conteúdos, as formas de organização do trabalho e o clima de trabalho desejado para si próprias e
para os outros. A participação se viabiliza por interação comunicativa, diálogo, discussão pública, busca
de consensos e de superações de conflitos. Nesse sentido, a melhor forma de gestão é aquela que criar
um sistema de práticas interativas e colaborativas para troca de ideias e experiências para chegar a ideias
e ações comuns.

4.4 Avaliação institucional, de desempenho e de aprendizagem.

Avaliação em questão75

A avaliação escolar, para Méndez, Esteban, Fernandes, Hoffman, constitui-se do ato de conhecer,
averiguar o que os alunos já sabem, o que aprenderam e o que ainda falta conhecer sobre
determinado conhecimento. Essa ação caracteriza-se por um processo formativo de avaliação que
surge da interação dos sujeitos com o mundo.
Dessa forma, o conceito de avaliação como ato de examinar, ao qual tem o intuito de medir, comparar
e, muitas vezes, ranquear os processos diferenciados de cada aluno em um único patamar, muito utilizado
na prática docente e de sistema é então discutido e questionado por eles.
Méndez elucida que por meio da avaliação também adquirimos conhecimento. A avaliação deve ser
entendida como uma atividade crítica com o fim de promover a aprendizagem tanto do aluno como do
professor.

75
LIMEIRA, L. C. – Avaliação Institucional e Projeto Político Pedagógico – Uma Trama em Permanente Construção. Universidade Católica de Brasília.
http://www.anpae.org.br/seminario/ANPAE2012

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1484041 E-book gerado especialmente para MAURICIO PEREIRA BARROS
O professor aprende para conhecer e para melhorar a prática docente em sua complexidade, bem
como para colaborar na aprendizagem do aluno, conhecendo as dificuldades que deve superar, o modo
de resolvê-las e as estratégias que coloca em funcionamento.
A avaliação é o instrumento adequado para orientar o professor na correção desses desvios. Quando
somente aplicada ao final de períodos, muitas vezes longos de um para o outro, chega tarde demais e
passa a ter características classificatórias, dado o sentido que esta tem de qualificar o que os alunos
apresentaram.

A avaliação deve abrir o leque para as muitas possibilidades existentes na construção do


conhecimento. O erro deve denotar um dos caminhos traçados pelo aluno para o alcance dos
resultados esperados e não, como uma incapacidade de resolução.
De um modo mais amplo, sem o intuito de culpabilizar o professor pelos maus resultados encontrados,
a avaliação deve questionar qual a relação existente entre ensino oferecido e a aprendizagem verificada.
Esta deve constituir-se de uma reflexão contínua promovida pela interação dos sujeitos nos mais diversos
espaços onde convivem.
Hoffmann esclarece que nesse processo os sujeitos exercem influência uns sobre os outros pelo modo
de pensar, analisar e julgar seus atos em relação a si e aos outros. Reforça também o papel da avaliação
como o ato de repensar as práticas pedagógicas a partir das informações por ela apresentadas e por
manter um constante diálogo entre as “intervenções dos docentes e dos educandos”. Para a autora:

A diversificação dos instrumentos avaliativos tem uma função estratégica na coleta de um maior
número e variedade de informações sobre o trabalho docente e os percursos de aprendizagens. Desta
maneira, restringir a avaliação ao produto e a um instrumento é desperdiçar uma diversidade, no mínimo,
de informações do processo que são úteis ao entendimento do fenômeno educativo e à tomada de
decisão para as mudanças necessárias (HOFFMANN, 2001).76

Assim, a avaliação educacional e avaliação institucional diferenciam-se pelos processos e


finalidades a que servem. Alguns autores esclarecem que a avaliação educacional refere-se à
avaliação da aprendizagem ou do desempenho de alunos (ou de profissionais) e à avaliação de
currículos, concentrando-se no processo de ensinoaprendizagem e nos fatores que interferem em
seu desenvolvimento. Já a avaliação institucional, por sua vez, destina-se à avaliação de
instituições (como a escola e o sistema educacional), políticas e projetos, tendo atenção
centralizada em processos, relações, decisões e resultados das ações de uma instituição ou do
sistema educacional como um todo. Nesse sentido, para ser completa, a avaliação institucional
contempla e incorpora os resultados da avaliação educacional.
A avaliação da aprendizagem é voltada para o acompanhamento do desenvolvimento global dos
alunos, com caráter fundamentalmente formativo, considerando-se os diversos aspectos da
aprendizagem (cognitivo, social, afetivo, psicomotor, entre outros) num contexto de permanente
transformação social.

Já a avaliação institucional, que também apresenta caráter formativo, “está voltada para
compreender a escola ou o sistema educacional como espaço vivo, integrado por sujeitos ativos
e participantes, na busca de transformação de si próprios e da sociedade”.

Dessa forma, os processos avaliativos presentes nas escolas constituem uma complexa ação dos
docentes. Envolvem, ao mesmo tempo, as aprendizagens dos alunos, assim como os processos de
ensino necessários para que elas se desenvolvam. Ao compreender diferentes atores nesses processos,
a avaliação envolve também uma diversidade de interesses, concepções e valores que orientam e, muitas
vezes, criam empecilhos na sua aplicação.
Para Freitas, os professores não podem ignorar a existência de um projeto político- pedagógico da
escola que orienta os caminhos e o que se deseja alcançar no trabalho coletivo da escola. O autor
esclarece ainda que as escolas não devem se opor à avaliação de seu trabalho. Cabe-lhes aceitar a
prestação pública de contas daquilo que fazem em área tão importante para a sociedade. Os pactos de
qualidade que firmam internamente devem produzir resultados que se tornem visíveis externamente e
que permitam algum controle social.
Quando os processos avaliativos então se ampliam para o ato de ensinar, para as ações desenvolvidas
pela escola no intuito de atender a uma comunidade que busca uma educação de qualidade e, também

76
HOFFMANN, Jussara. Avaliar para promover: as setas do caminho. Porto Alegre: Mediação, 2001.

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do sistema como está gerindo tais escolas, os professores passam a ser objeto de avaliação. Surgem,
então, as resistências.
Sordi e Lüdke trazem uma importante contribuição acerca desse assunto afirmando que a avaliação
vem ganhando centralidade na cena política e os espaços de sua interferência têm sido ampliados de
modo marcante, ultrapassando o âmbito da aprendizagem dos alunos. Por tratar-se de campo fortemente
atravessado por interesses, diante dos quais posturas ingênuas não podem ser aceitas, compete aos
profissionais da educação desenvolverem alguma competência para lidar com a avaliação.
Esclarecem ainda que constitui um grande desafio para o trabalho dos professores vivenciar diferentes
formas de avaliação dos alunos e do seu próprio trabalho desenvolvendo uma relação mais madura,
inclusive com os que são designados a fazê-lo com os professores.
As autoras também ressaltam que os professores, quando se veem surpreendidos por políticas
públicas que usam a avaliação como recurso de gestão, reagem aos dados, ou se recusando a participar
ativamente do processo, ou culpabilizando terceiros, passando a estes a responsabilidade quanto aos
maus resultados. Desperdiçam a possibilidade de pensar em ações que superem os problemas
detectados. As mudanças, nesse sentido, vêm carregadas de resistências.

A avaliação institucional

A avaliação institucional, diferentemente da avaliação individual das aprendizagens dos alunos,


apresenta uma amplitude bem maior porque busca compreender como se processam as relações
e as estruturas que compõem a instituição.

A avaliação institucional não é instrumento de medida de atividades de indivíduos isolados, nem de


trabalhos descolados de seus meios de produção; não é mecanismo para exposição pública de
fragilidades ou ineficiência de profissionais individualizados. A avaliação institucional deve ser promovida
como um processo de caráter essencialmente pedagógico.
Em decorrência do movimento de avaliação dos processos internos das instituições superiores de
ensino ocorrido desde os anos 80, conforme histórico apresentado por Ristoff (2000), as instituições
públicas de ensino que atendem à Educação Básica também foram adotando tais processos de avaliação
e sendo estimuladas a desenvolver a prática da avaliação institucional.
As políticas públicas de educação no Brasil, impulsionadas pelos programas financiados por
organismos internacionais que definem diretrizes para políticas e programas em vários países do mundo,
têm seguido na mesma direção. Marinho informa que a agenda traçada pelo Banco Mundial, por exemplo,
inclui, dentre outras diretrizes, a busca do uso mais racional dos recursos, estipulando que um fator
primordial para isso seria a autonomia das instituições educacionais; recomenda que se dê especial
atenção aos resultados, enfatizando a necessidade de que se implementem sistemas de avaliação;
reforça a ideia de busca da eficiência e maior articulação entre os setores públicos e privados, tendo em
vista ampliar a oferta em educação.
Seguindo essa tendência e em conformidade com as orientações dadas por esses programas, foi
criado o Índice de Desenvolvimento da Educação Brasileira (IDEB) – Decreto 6.069/07. Seu objetivo é
verificar o cumprimento das metas estabelecidas no Termo de Adesão ao Compromisso Todos pela
Educação, cujo um dos eixos é o Plano de Desenvolvimento da Educação (PDE) do Ministério da
Educação – MEC (INEP-MEC).
Com a implementação dessas políticas, a avaliação institucional passou a fazer parte do cotidiano
escolar. Ao mobilizar cada vez mais esforços de professores e gestores em apresentar melhores
resultados, tem como um dos objetivos proporcionar à sociedade um diagnóstico da educação brasileira
e, a partir dele, buscar melhorias e oferecer uma educação de qualidade.
A avaliação institucional é um processo que leva a instituição ao autoconhecimento profundo revelando
causas e apontando indicadores que norteiam o trabalho pedagógico. Sendo assim, a avaliação é um
mecanismo que acompanha a implantação e viabiliza a correção dos rumos de um certo modelo de
escola, de um certo projeto político-pedagógico”. E complementa que é impossível gerenciar uma
instituição séria como é a escola, que deve primar pela qualidade, competência, justiça e
responsabilidade, sem, contudo, ter em mãos “um conjunto de informações” precisas e fidedignas, que
subsidiem as tomadas de decisão, não só do gestor mais de toda comunidade educativa.
A avaliação institucional, para Freitas, deve servir como um espaço privilegiado para a localização e
reconhecimento de problemas, reflexão e busca de soluções. Adverte, no entanto, que a escola não deve
deixar de buscar do poder público o cumprimento de suas responsabilidades. Esclarece ainda que assim,
pensar em avaliação institucional implica repensar o significado da participação dos diferentes atores na
vida e no destino das escolas. Implica recuperar a dimensão coletiva do projeto político-pedagógico e,

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responsavelmente, refletir sobre suas potencialidades, vulnerabilidades e repercussões em nível de sala
de aula, junto aos estudantes.
Desta forma, a escola precisa rever suas práticas avaliativas no intuito de não hierarquizar os
conhecimentos trabalhados nem segregar os alunos pelos resultados que alcançam. Há que se rever
como produtora de conhecimentos e em consequência, suas práticas também precisam ser avaliadas.
Nesse sentido, a aprendizagem da avaliação institucional inclui o saber posicionar-se, fruto de
contínuas experiências de participação em momentos coletivos entre todos os envolvidos no processo de
ensino: professores, gestores, funcionários, alunos e comunidade escolar. Também, da possibilidade de
adesão e efetiva participação dos professores numa análise mais aprofundada sobre o trabalho da escola,
o estabelecimento de metas e o planejamento de ações para a superação de desafios. Para que isto se
dê, falta aos professores o necessário conhecimento do PPP de sua escola e o reconhecimento da
importância de sua permanente construção e avaliação coletiva.

Diálogo entre diferentes dimensões avaliativas

Embora fundamentais por abrir perspectivas para as diretrizes das políticas educacionais e para os
debates sobre a qualidade do ensino, as avaliações externas não dão conta da amplitude e complexidade
do trabalho escolar. A Prova Brasil, por exemplo, mostra a média de desempenho dos alunos da escola
de modo geral, mas não traz detalhamentos ou informações que permitam intervenções imediatas no
processo pedagógico de um ano para outro. Isso significa que ela não fornece todas as informações
necessárias para avançarmos na ampliação da oferta de oportunidades de aprendizagem.
Para prosseguir com essa busca é necessário considerar as diferentes ferramentas avaliativas
disponíveis no âmbito interno das escolas, que são capazes de fornecer informações adicionais e
qualificadas sobre as práticas escolares, além de complementar e dialogar com a avaliação externa: a
avaliação da aprendizagem (realizada no contexto da ação pedagógica do professor em sala de aula) e
a avaliação institucional (realizada pelo coletivo da escola no escopo de seu projeto pedagógico), ou seja,
as avaliações internas, realizadas sistematicamente pelas escolas.
Para concretizar a possibilidade de diálogo entre essas três formas de avaliação, parte-se do
entendimento de que as três, quando relacionadas, clarificam a tomada de decisões pertinentes a
situações especificas.
Nesse diálogo está presente um movimento de integração, que respeita o lugar de cada uma (com
suas características e especificidades) colocando-as em igual patamar de importância para o avanço da
aprendizagem dos alunos.

Projeto político-pedagógico em ação

Entre uma pluralidade de propostas voltadas para a organização e funcionamento da escola pública,
situa-se uma proposta nacional, que incentiva a escola a traçar seu próprio caminho educativo, conhecida
como “Projeto Político-pedagógico”. A proposta foi incluída na Lei de Diretrizes e Bases da Educação
Nacional de 1996, no inciso I do artigo 1277.

77
FONSECA, Marília. O projeto político‐pedagógico e o Plano de Desenvolvimento da Escola: duas concepções antagônicas de gestão escolar. Cad. Cedes,
Campinas, v. 23, n. 61, p. 302‐318, dez. 2003.

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Em sua importante contribuição sobre o conceito de Projeto Político-pedagógico, Veiga esclarece que
este se constitui como a própria organização do trabalho pedagógico da escola. Nela, as noções de
qualidade, igualdade, liberdade, gestão democrática, entre outras, são alguns dos princípios que
aparecem como ponto de partida para a sua construção. Para a autora, ao se constituir em processo
democrático, o projeto político-pedagógico preocupa-se em instaurar uma forma de organização do
trabalho pedagógico que supere os conflitos, buscando eliminar as relações competitivas, corporativas e
autoritárias, rompendo com a rotina do mando impessoal e racionalizado da burocracia que permeia as
relações no interior da escola, diminuindo os efeitos fragmentários da divisão do trabalho que reforça as
diferenças e hierarquiza os poderes de decisão.

Também Souza, ao tratar sobre a funcionalidade do PPP, acrescenta que este constitui um instrumento
tanto de luta contra a fragmentação do trabalho pedagógico da escola, quanto de fortalecedor de sua
autonomia. Quando o Estado delega às instituições de ensino a tarefa de produzir e executar um projeto
pedagógico, em conformidade com normas estabelecidas a todo o sistema de ensino, aponta o caminho
para a construção da autonomia destas por meio da gestão democrática.
Para Neves, a escola precisa seguir às leis regidas pelo Estado. Sua autonomia é fruto de leis próprias
criadas para, em comum acordo com as já existentes, dar o devido atendimento e respostas à
comunidade que serve. A autora justifica que a autonomia existente nas escolas é o diferencial que as
faz se organizar e agir de modo próprio, singular e isto passa a ser reconhecido pela sociedade.
A autonomia da escola é, pois, um exercício de democratização de um espaço público: é delegar ao
diretor e aos demais agentes pedagógicos a possibilidade de dar respostas ao cidadão (aluno e
responsável) a quem servem, em vez de encaminhá-lo para órgãos centrais distantes onde ele não é
conhecido e, muitas vezes, sequer atendido.
A avaliação institucional, tanto externa quanto interna, deve ser o instrumento de autoavaliação das
escolas para que estas reconduzam os processos educativos que desenvolvem de forma consciente,
condizente com o seu PPP e em detrimento da comunidade que atende. Por melhor que seja uma
avaliação, se ela não for validada, sentida e vivida, pelos professores e envolvidos, poderá ser prejudicial
ao processo como um todo.

A avaliação institucional contribui para que os saberes dos diferentes atores envolvidos na
escola sejam incorporados e reconhecidos como legítimos, intensificando a qualidade das trocas
intersubjetivas que ocorrem na escola empoderando os atores locais para a ação. Ação que se
orienta pelas “estratégias de compromisso” com o direito das crianças aprenderem ao invés de
um acatamento cego às normas e regras existentes a que se obtém adesão sem
comprometimento, como resposta de conveniência às “estratégias do controle” institucional.

Questões

01. (SEAP-DF- Analista- Pedagogia- IADES) Quanto à avaliação institucional, assinale a alternativa
correta.
(A) A avaliação institucional possibilita um olhar crítico e detalhista sobre a instituição e seus
colaboradores, abordando vários aspectos relevantes para a organização.
(B) A pedagogia empresarial usa a avaliação institucional para conferir quem pode, dentro das
organizações, assumir cargos de gestão.
(C) A avaliação institucional é uma particularidade de instituições públicas, não se aplicando a outras
instituições do setor privado.
(D) Na administração científica, entende-se a necessidade exclusiva de utilização desse instrumento
pelo pedagogo empresarial ou pelo psicólogo institucional, uma vez que esses profissionais exercem
função semelhante.
(E) Trata-se de uma abordagem exclusivamente pedagógica, que consiste na aplicação de provas
para gestores e colaboradores de empresas e indústrias.

02. (IF-BA- Técnico em Assuntos Educacionais- FUNRIO/2016) A avaliação da escola é chamada


de avaliação:
(A) Formativa, cujo foco são os percursos de aprendizagens.
(B) Somativa, cujo resultado refere-se aos indicadores obtidos.
(C) Diagnóstica, cujo propósito é verificar os conhecimentos prévios.
(D) Institucional, cujo apoio é o projeto político-pedagógico da escola.
(E) Mediadora, cuja intenção é mediar os processos.

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Gabarito

01. A / 02. D

Respostas

01. A.
A avaliação institucional, diferentemente da avaliação individual das aprendizagens dos alunos,
apresenta uma amplitude bem maior porque busca compreender como se processam as relações e as
estruturas que compõem a instituição.
A avaliação institucional é um processo que leva a instituição ao autoconhecimento profundo revelando
causas e apontando indicadores que norteiam o trabalho pedagógico.

02. D.
A avaliação institucional, tanto externa quanto interna, deve ser o instrumento de autoavaliação das
escolas para que estas reconduzam os processos educativos que desenvolvem de forma consciente,
condizente com o seu projeto político-pedagógico (PPP) e em detrimento da comunidade que atende.

Avaliação de Desempenho Individual78

Várias empresas têm se utilizado de modelos de gestão que procuram ampliar a importância das
pessoas nessa demanda, devido à convicção sobre o seu impacto nos resultados organizacionais. O
estabelecimento de políticas de gestão de pessoas que atendam simultaneamente aos principais
interesses da empresa e das pessoas é a base de sustentação para uma relação proveitosa para ambas
as partes envolvidas.
Para contribuir com a construção dessa relação a empresa deve buscar conhecer os interesses de
seus colaboradores para, a partir de uma análise e negociação, desenvolver ações que atendam aos
principais interesses comuns e explorem as suas vantagens para tornar-se mais competitiva. Assim, deve
estar atenta para as sutilezas próprias do ser humano, observando-o com um ser formador de sua história.
Dentre os processos de gestão de pessoas está a avaliação de desempenho individual, através do
qual as empresas procuram mensurar a performance de cada funcionário, comparando o
resultado obtido por ele com um padrão pré-estabelecido. Porém, muitos dos modelos de avaliação
de desempenho utilizados não correspondem mais às expectativas organizacionais, apresentando, em
alguns casos, critérios injustos para os avaliados e inadequados aos objetivos da organização que os
avalia. Os critérios e a forma como ocorre essa avaliação influenciam a motivação do funcionário e o
clima organizacional, devido a sua vinculação com a remuneração, carreira profissional e, em muitos
casos, com a permanência do funcionário na empresa79

Essa percepção advém da diversidade de opções de mercado que exige cada vez mais profissionais
de relevante desempenho. A realidade nos leva a refletir: Será que os modelos de avaliação de
desempenho evidenciam ao sistema novos caminhos, visando a identificação e a seleção daqueles que
conduzem ou conduzirão com sucesso o futuro da instituição? Será que o modelo ou instrumento
concebido para avaliar permitiu promover e orientar o crescimento pessoal e profissional das pessoas? 80

Tendências de modelos de gestão e avaliação

Dentre os vários mecanismos existentes para realizar a avaliação, a avaliação de desempenho


certamente é aquele que apresenta maior eficiência e eficácia, desde que adequadamente adaptado às
particularidades e cultura dos agentes e das instituições.
Qualquer que seja a Instituição – governo, indústria, igreja, exército, comércio, bancos, Universidades,
Faculdades, entre outros – são instituições que apresentam funções diferenciadas, mas os problemas
administrativos são praticamente comuns. Os seus administradores, gerentes, diretores ou gestores, não
importam as denominações, são sujeitos essenciais a toda Instituição e devem adotar princípios básicos
do ato de gerir: planejar, acompanhar e avaliar. A diferença residirá na visibilidade a uma marca diferencial
das demais administrações que lhe antecedeu, ao propor ações que busquem a objetividade do trabalho.

78
Texto adaptado de Wagner Soares Fernandes dos Santos.
79
LUCENA, M. D. Avaliação de desempenho. São Paulo: Atlas, 1992.
80
GURGEL, Carmesina Ribeiro. Avaliação do Desempenho Docente do Centro de Ciências da Educação - UFPI. Dissertação (Mestrado em Educação com área
de concentração em Avaliação Educacional). Fortaleza/ Universidade Federal do Ceará, 1998.

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A dinâmica e o sucesso de uma gestão requerem, além da adoção de princípios administrativos, atitudes,
valores, capacidade de articular ideias respeitando a pluralidade a benefício da instituição e não apenas
em causa. Toda Instituição existe, não para si mesma, mas para alcançar seus objetivos e produzir
resultados. É em função dos objetivos e dos resultados que uma organização deve ser dimensionada,
estruturada e orientada, um gestor pode adotar vários modelos de gestão como marco referencial da sua
administração, por exemplo, a ênfase nos objetivos institucionais. Neste caso, darão prioridade as ações
que justificam a existência e a importância da Instituição, a partir dos resultados pretendidos, como meio
de avaliar o desempenho institucional e o cumprimento da missão junto à sociedade.
Sua funcionalidade acontece a partir do entendimento de que o resultado da avaliação poderá ser
utilizado como elemento promotor de melhoria da qualidade das instituições de forma global. Esse
fenômeno ocorre porque uma das funções da avaliação é contribuir para averiguação do grau de
eficiência e eficácia das ações desenvolvidas. Três fenômenos de origem social, segundo Bonniol
explicam a universalização da cultura da avaliação como mecanismo de regulação e, ao mesmo tempo,
de emancipação:
a) o ato de avaliar estabelece ligação diretamente relacionada ao desenvolvimento das práticas
democráticas, fortalecendo o direito do exercício da cidadania.
b) a aparição das práticas avaliativas de ordem organizacional, exigindo mudanças de paradigmas ou
atitude de gestão;
c) a necessidade de legitimar as ações institucionais perante a sociedade.

Avaliar o desenvolvimento das práticas democráticas é uma necessidade que surge a partir do grau
de exigência do cidadão em relação aos seus direitos, a qualidade de serviços prestados, entre outros.
Assim, a exigência da avaliação, identifica-se com a necessidade de prestar conta e provocar
responsabilidades e consequências. Na opinião do referido autor avaliamos porque não sabemos o que
fazemos, nenhuma instituição pode afirmar que é legítima por si mesma, porque não tem certeza de seus
efeitos. O único instrumento capaz de legitimar a validade ou não das ações de uma instituição e,
consequentemente, de um gestor é a avaliação.
Numa visão contemporânea, administrar consiste em orientar, dirigir e avaliar os esforços de um grupo
de pessoas para um objetivo comum. Um bom gestor ou administrador é naturalmente, aquele que
possibilita a sua equipe de assessores alcançarem os objetivos institucionais com o mínimo dispêndio de
recursos, de esforços e habilidade para minimizar os atritos com outras atividades úteis.
Administrar, nesta visão torna-se uma atividade essencial a todo esforço humano coletivo, seja qual
for o tipo de Instituição, pois o ser humano cada vez mais necessita de cooperar com outras pessoas para
atingir seus objetivos, isto é trabalhar socialmente e, como prática social a administração torna-se uma
ação basicamente de coordenação de atividades grupais que vem corroborar com o entendimento das
novas tendências de modelo de gestão e avaliação de desempenho nesse século.
Estamos na era das ideias, não há mais distância entre as informações em virtude dos avanços
tecnológicos. Diante deste contexto, vem se resgatando o lado humanista nos sistemas de gestão, onde
o essencial é a interação entre as pessoas e a maior necessidade do desenvolvimento da criatividade,
dos talentos e da sensibilidade. As tendências ascendentes de gestão apresentam-se nas formas de
integração com o meio ambiente, com a comunidade, e com o potencial humano.
Sendo assim os novos paradigmas estão fundamentados nos talentos das pessoas, na gestão da
informação, na visão comum, na ajuda mutua e na identidade de valores compartilhados. A partir disso
quem dita as condições para o sucesso no mercado é o próprio mercado e às empresas resta buscar
alternativas que atendam essa nova fase.

Para que uma equipe de trabalho possa apresentar padrões elevados de eficiência e eficácia é preciso
entender a diferença entre estas duas ações. A eficiência é voltada para a melhor maneira pela qual
as ações devem ser desenvolvidas, a fim de que os recursos sejam aplicados de forma mais
racional possível. Uma equipe eficiente deve preocupar-se com os meios, com os métodos e
procedimentos mais indicados para assegurar a otimização da utilização dos recursos. A eficácia de uma
ação é medida pelo alcance dos resultados, pela capacidade de satisfazer uma necessidade por
meio de suprimento de seus produtos, bem ou serviços.

Assim, uma Instituição pode ser eficiente em suas ações e pode não ser eficaz, como também, pode
ser ineficiente em suas funções, mas apesar disso, ser eficaz.
Alguns indicadores de eficiência e eficácia são encontrados na literatura que torna compreensível esta
situação:

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Indicadores de eficiência – centrar ênfase nos meios; desenvolver ações corretas para cada objetivo
proposto; resolver os problemas em tempo hábil; administrar corretamente o orçamento; cumprir
criteriosamente o cronograma de tarefas e obrigações; promover treinamento em serviço; manter
instrumentos e equipamentos de trabalho em condições de funcionamento; manter harmonia no ambiente
de trabalho; promover atividades sociais; ser presente no ambiente de trabalho.

Indicadores de eficácia – gestão centrada nos resultados; prima pelas ações corretas; dar ênfase ao
alcance dos objetivos; otimizar a utilização dos recursos financeiros; valorizar a equipe de trabalho;
manter bons equipamentos; exercer a prática de valores humanos; ter autoestima positiva e saber
conviver socialmente.

Em busca da eficiência e da eficácia, uma Instituição deve adotar princípios funcionais e hierárquicos
orientada para o objetivo de produzir bens ou serviços. Nesta ótica, surge a divisão de trabalho, as
especialidades, a hierarquia e amplitude administrativa. A divisão de trabalho é importante porque facilita
a direção e execução das tarefas e sua operacionalização. Do ponto de vista administrativo pode-se
apresentar em três níveis: institucional (gestor máximo e assessores); intermediário (diretores/gerentes)
e operacional (coordenadores/supervisores e outros).
Pela necessidade de divisão do trabalho, surge a especialização, ou seja, cada órgão passa ter
funções e tarefas específicas, cujo objetivo é proporcionar melhorias de métodos e incentivos no trabalho
e melhorando o desempenho funcional. Ainda como consequência da divisão do trabalho e da diversidade
profissional dentro da Instituição surge a hierarquia com a finalidade de dirigir as ações dos níveis que
lhe estão subordinadas. A pluralidade de funções exige o desdobramento da função de comando, cuja
missão é dirigir para que todas as atividades sejam cumpridas harmonicamente.
A hierarquia divide a Instituição em camadas ou níveis de autoridade. Quando mais alto a escala
hierárquica maior o volume de autoridade do gestor. A autoridade pode ser definida como sendo o direito
formal e legítimo de tomar decisões, transmitir ordens e alocar recursos para alcançar os objetivos
desejados pela organização. O grau de autoridade é proporcional ao grau de responsabilidade assumida
pela pessoa. No entanto, a autoridade pode ser delegada conforme a posições e funções
desempenhadas.
Quando um gestor transmite autoridade e responsabilidade a uma pessoa numa determinada
hierarquia, pode-se dizer que houve uma delegação. A amplitude administrativa ou de comando ou de
controle torna-se necessário quando a Instituição encontra-se em fase de expansão e precisa garantir a
qualidade de seus serviços. No entanto, alguns cuidados devem ser observados, pois quanto mais restrita
é a amplitude da estrutura organizacional menos disperso as ações e melhor sua comunicação.
Outro fator deve ser levado em conta quando estamos em posição de comando de uma Instituição ou
parte dela é o fenômeno da centralização e da descentralização.
Ambas as situações têm suas vantagens e desvantagens, vejamos resumidamente cada uma delas
no quadro a seguir:
I- VANTAGENS
Gestão Centralizada Gestão Descentralizada
Tomada de decisões por quem possui visão global da Rapidez nas decisões/ Ausencia de conflitos.
Instituição.
Decisões tomadas no topo são mais bem treinadas e Sentimento de equidade/ Informalidade e
preparadas. democracia.
Decisões mais consistentes com os objetivos Mais aproximação entre gestores e sua
Institucionais. equipe de trabalho.
Elimina esforços duplicados de vários tomadores de Substituição da administração por portarias/
decisões e reduz custos operacionais. medidas por informações.

II- DESVANTAGENS
Gestão Centralizada Gestão Descentralizada
Decisões distanciadas dos fatos e das Falhas de informação entre os departamentos/ setores
circunstâncias. envolvidos.
Tomadas de decisões tem pouco contato Maior custo pela exigencia de melhor seleção e
com as pessoas e situações envolvidas. treinamento dos administradores médios.
A comunicação pode ocasionar custos Risco de subobjetivação. Os gestores podem defender
operacionais. mais os objetivos de seus setores do que os
institucionais.

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Pode ocasionar distorções e erros no As plíticas e procedimentos podem variar enormemente
processo de comunicação. nos diversos departamentos.

Enfim, administrar numa sociedade onde todas as suas atividades são voltadas para produção de bens
ou para a prestação de serviços especializados e, que a vida das pessoas depende das Instituições e
esta depende do seu trabalho, realmente podemos afirmar que ser gestor nesta conjuntura requer
conhecimento, maturidade, habilidade e competência para reunir todos estes atributos na arte de
administrar. Dito de outra forma, administrar é a condução racional das atividades de uma Instituição seja
qual for o campo de atuação. O ato de administrar envolve o planejamento e monitoramento de todas as
atividades diferenciadas pela divisão de trabalho que ocorram dentro da Instituição. A capacidade de
administrar é imprescindível para a existência, sobrevivência e sucesso da Instituição, é preciso ser acima
de tudo ser um gestor, um articulador de ideias.
Neste sentido, a avaliação torna-se um instrumento para subsidiar a gestão de desempenho e deve
ser considerada parte integrante deste processo. A gestão de desempenho envolve a reforma dos
processos centrais de gerenciamento, sendo, portanto, de responsabilidade dos gestores em cada
instituição, enquanto que a avaliação é vista como um método especializado, frequentemente aplicado
por especialistas ou avaliadores externos. A maioria dos gestores vê a avaliação como parte de uma
estrutura mais ampla da gestão de desempenho, no entanto, o grau de integração entre avaliação e a
gestão irá depender dos fins que se propõe com seus resultados.
Várias abordagens sobre avaliação que partem de premissas acerca da natureza do conhecimento
avaliativo, da possibilidade de criação de conhecimento confiável e quanto ao melhor uso legitimo dos
resultados. Não há um método ideal de condução de uma avaliação, o papel da avaliação é diferente em
cada um dos processos de tomada de decisão e aprendizagem, por exemplo, a avaliação econômica e
experimental usada para decisões orçamentárias e a avaliação naturalista usada para melhoria de
programas e projetos. A questão relevante é a necessidade de adequar a avaliação ao elemento que se
deseja avaliar, as informações desejadas, aos recursos disponíveis e ao uso pretendido para os
resultados. Qualquer que seja a abordagem, a metodologia avaliativa é intrínseca a cada modelo. Os
problemas metodológicos mais comuns às práticas avaliativas são: casualidade; lentidão para término;
mecanismos de coleta de dados; dificuldade de identificar resultados dos programas; generalização dos
resultados; limitações e tratamento apropriado dos problemas.

Métodos Básicos de Avaliação de Desempenho Individual

Para Lucena, as empresas têm uma preocupação permanente e natural com o desempenho humano
e em como torná-lo mais produtivo, uma vez que os seus resultados são consequência desse
desempenho. A mensuração desse desempenho permite a empresa conhecer a performance de cada
um de seus funcionários e do impacto desse desempenho nos resultados organizacionais, sendo esta
uma função precípua para a organização.

A avaliação de desempenho individual é prática cotidiana e instrumento de mensuração que


procura integrar diferentes níveis organizacionais e promover a melhoria da performance de todas
as pessoas da organização.

Avaliar significa comparar resultados alcançados com aqueles que eram esperados/planejados, de
forma que apenas o trabalho previamente planejado deve ser objeto de avaliação. Isto pressupõe a
comparação entre o que se espera do indivíduo em termos de realização (resultado esperado), a sua
atuação efetiva (trabalho realizado) e a existência de algum mecanismo de acompanhamento, que
permita corrigir desvios para assegurar que a execução corresponda ao que foi planejado. Na literatura
são encontrados vários objetivos para a avaliação de desempenho individual, que variam conforme a
abordagem dos autores. Entretanto, existem aspectos em que eles são convergentes, entre os quais
estão a definição clara que possibilite a compreensão por todos e a sua utilização como ferramenta
gerencial para a área de gestão de pessoas.

A gestão de desempenho individual pode ser definida como um método que visa estabelecer
um contrato com os funcionários, para estabelecer os resultados esperados pela organização,
como ocorrerá o acompanhamento dos desafios propostos, a correção dos rumos, e avaliar os
resultados alcançados.

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Como métodos básicos de avaliação do desempenho individual podem ser citados três, que são
utilizados conforme a escolha estratégica da empresa:

- Avaliação Direta – o gestor deve emitir parecer sobre todo o pessoal que está sob sua
responsabilidade direta. O ponto favorável é que o gerente imediato é quem melhor conhece o
desempenho do funcionário. O ponto desfavorável é que a avaliação realizada pode ser contaminada por
disfunções na percepção gerencial, de acordo com a proximidade ou distanciamento que ele mantém
com o avaliado.

- Avaliação conjunta – mostra a possibilidade de avaliador e avaliado conversarem sobre o seu


desempenho e, muitas vezes em conjunto, responderem a avaliação de desempenho. Tem a vantagem
de ser uma prática rica por permitir um diálogo franco entre avaliador e avaliado sobre o esperado e o
obtido durante o período.

- Auto avaliação – o próprio avaliado realiza o julgamento sobre o seu desempenho, com base nos
parâmetros estabelecidos pela empresa. Este método tem como ponto favorável a diluição da
centralização da avaliação.

Essas técnicas de avaliação evoluíram de um modelo de avaliação unilateral, onde o gerente realizava
um diagnóstico dos pontos fortes e fracos do subordinado, para modelos de avaliação bilateral, em que
gerente e subordinado discutem em conjunto o desempenho do último, para a avaliação 360º que se
utiliza de múltiplas fontes, ou seja, a avaliação do empregado por diversas pessoas envolvidas no
trabalho, como gerentes, pares, subordinados e, também, a opinião do cliente. Entretanto, Resende
adverte que a opinião do cliente interno e externo somente pode ser utilizada se as relações estiverem
bem definidas e houver amadurecimento cultural para que isso ocorra. Caso contrário, podem ocorrer
traumas de gestão que colocam os sistemas que estão sendo implementados e a direção da empresa
sob o foco da descrença, tendo consequências antônimas às que foram planejadas para os resultados
organizacionais.
Outro fator relevante é a clareza das etapas do processo de avaliação de desempenho que
normalmente segue algumas etapas para ser realizada:
Etapa 1: Definição do Sistema da Avaliação de Desempenho, nessa etapa é realizada um
mapeamento dos indicadores/objetivos da avaliação.
Etapa 2: Construção e validação do formulário de avaliação, ocorre a elaboração do material a ser
utilizado no processo avaliativo.
Etapa 3: Sensibilização, ocorre a conscientização e preparação de avaliadores e avaliados.
Etapa 4: Aplicação da Avaliação de Desempenho, é a aplicação efetiva do projeto.
Etapa 5: Apresentação do Resultado da Avaliação de Desempenho, ocorre a entrevista de feedback
aos avaliados.

Para Stoffel a avaliação do desempenho deve ser um processo participativo, dinâmico, contínuo
e sistematizado. Participativo para ter a participação do gestor de equipe e dos integrantes da equipe na
negociação democrática de um plano de trabalho viável e ambicioso, que tenha como foco principal a
consecução das metas organizacionais. Dinâmico para considerar a evolução dos fatos e o contexto no
qual estão inseridos, com flexibilidade suficiente para permitir ajustes que se fizerem necessários à
melhoria do próprio processo e de seus resultados. Contínuo para ter caráter de ação permanente, de
forma que qualquer descontinuidade pode eliminar os ganhos obtidos até então e substituí-los por
sensações de descrédito e desconfiança dos funcionários para com o sistema de gestão da empresa. E
sistematizado para ser um procedimento metodológico com características, etapas e sequência bem
definidas e objetivos pré-estabelecidos.

Os modelos de avaliação de desempenho existente

A sistemática de avaliação de desempenho, como instrumento complementar a política salarial é


representada na forma de apreciação do desempenho do indivíduo na sua função, posicionando-o
individualmente, na escala ou estrutura impessoal de salários.
Recebe diferentes denominações, tais como: avaliação de mérito, avaliação dos funcionários,
relatórios de progresso, avaliação da eficiência funcional e outros termos equivalentes. Já o instrumento
de plano de carreiras define as carreiras ou agrupamento de cargos, inerentes a uma organização, de
forma a indicar, a cada empregado ou funcionário, os modelos de que dispõe para seu desenvolvimento.

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É um processo continuo de interação entre o funcionário e a instituição do qual resultam passos
selecionados e o caminho que mutuamente atendem aos objetivos da Instituição e às aspirações do
funcionário.
A avaliação de desempenho pode ser considerada uma sistemática voltada para a apreciação do
desempenho individual do funcionário no exercício das atribuições inerentes a seu cargo. No Plano de
Cargos, Carreira e Vencimentos dos Servidores Públicos (federal, estadual ou municipal) geralmente, a
avaliação do desempenho é concebida como instrumento técnico gerencial destinado a aferir, de forma
objetiva, o grau de eficiência do servidor no desempenho das atribuições do seu cargo. Usualmente, a
forma mais adotada é o próprio superior hierárquico proceder à avaliação do desempenho de cada
servidor, aferindo o desempenho funcional. Os objetivos principais em relação ao desempenho dos
servidores na maioria são:
- adequação do funcionário ao cargo;
- identificação das necessidades de treinamento;
- promoções, incentivo salarial ao bom desempenho;
- melhoria do relacionamento entre o chefe e subordinado;
- auto aperfeiçoamento do funcionário;
- estimativa do potencial de desenvolvimento dos funcionários;
- estímulo à maior produtividade;
- oportunidade de conhecimento dos padrões de desempenho da instituição;
- feedback ao próprio indivíduo avaliado;
- decisões sobre transferências, dispensas e progressão/ ascensão funcional.

A avaliação de desempenho propiciará os seguintes benefícios:


a) para os gestores: contar com um sistema de medição capaz de neutralizar a subjetividade; melhorar
o padrão de desempenho dos funcionários; melhorar a comunicação.
b) para os funcionários: conhecer as regras institucionais; conhecer as expectativas da Instituição e do
chefe; oportuniza a auto avaliação e autocrítica do seu desempenho.
c) para a Instituição: avalia seu potencial humano e a contribuição de cada empregado; identifica os
empregados que necessitam de capacitação; dinamiza a política de recursos humanos; defini o grau de
contribuição de cada servidor para a instituição; identifica os desempenhos conforme qualificação
requerida pelo cargo que exerce; identifica em que medida os programas de treinamento têm contribuído
para a melhoria do desempenho dos servidores; obtêm subsídios para redefinir o perfil requerido dos
ocupantes dos cargos e promoção; subsídios para elaboração de planos de ação para desempenhos
insatisfatórios.

Atualmente as avaliações de desempenho podem ser desenvolvidas pelos seguintes agentes:

∗ Chefe imediato/gerente – ninguém melhor que o chefe imediato para avaliar o empregado. Todavia
favorece a subjetividade, podendo desvirtuar dos objetivos de toda a Instituição.
∗ Próprio servidor – exige amplo grau de abertura da Instituição e de maturidade do empregado.
Requer determinação de parâmetros objetivos.
∗ Equipe de trabalho – avalia o desempenho, define objetivos e metas. Requer suficiente maturidade.
∗ Comissão de avaliação – constituída por membros de diversas áreas da Instituição que têm poder
de decisão. Desenvolvem padrões de julgamento mais homogêneo.
∗ Servidores – “avaliação invertida”. Possibilita o chefe conhecer a opinião do empregado a seu
respeito. Pode transformar-se num mero canal de insatisfação, com críticas que não acrescentam
aspectos positivos.
∗ Órgão de Recursos Humanos – trata-se de modalidade bastante centralizadora. Proporciona pouca
liberdade aos avaliadores. Padroniza o desempenho das pessoas, desprezando suas peculiaridades.
∗ Entorno do avaliado – é uma técnica recente que procura envolver todos os agentes do processo.
Uma delas é denominada “Avaliação 360 Graus”. A pessoa é avaliada por todos que mantêm interação:
chefe, colegas, subordinados, clientes externo e interno e fornecedores. Sua aplicação é trabalhosa, mas
fornece um amplo feedback.

Não obstante, a avaliação é um processo de análise de resultados das políticas públicas institucionais,
organizações, de programas e desempenhos que enfatizam a confiabilidade e a utilidade das
informações. Destina-se a colher melhores dados e reduzir as incertezas. Contudo, mesmo mediante a
aplicação dos rigorosos métodos, as avaliações sempre estarão sujeitas a algum grau de julgamento
subjetivo. Uma instância central do processo de avaliação consiste em determinar o grau em que foram

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alcançadas as finalidades de um plano, programa ou projeto. Isto requer dimensionar o objetivo em ações
específicas, os quais terá metas, cuja obtenção será medida através de indicadores.
O conceito tradicional de meta é a representação quantificada de um objetivo (baliza, barreira, marco,
limite, alvo, mira, objetivo, termo, limite, fim), isto é, meta é um objetivo temporal, espacial e
quantitativamente dimensionado. Numa visão contemporânea a meta é considerada a dimensionalização
operacional dos objetivos específicos, que traduz o significado correto da operação que se utiliza.
Exemplificando a partir dos objetivos de Plano de Cargos, Carreira e Vencimento:

- Objetivo 1 - Adequar os funcionários ao cargo.


Meta 1 – Desenvolver estudo avaliativo sobre a formação e titulação do servidor para saber a
adequação de sua formação com a função ou cargo que exerce.
- Objetivo 2 - Identificar as necessidades de treinamento.
Meta 2 – Promover cursos de formação continuada visando promoções, incentivo salarial ao bom
desempenho.

Qualquer processo de avaliação pressupõe o uso de fontes de informação apropriadas que fornecem
um conjunto de dados e referências descritivas úteis para caracterizar os indicadores de qualidade. Um
dos princípios que podemos estabelecer no processo avaliativo é que um indicador possa estar
associado, simultaneamente, a vários aspectos do desempenho funcional. Neste sentido, cada indicador
deverá ser associado ao critério que estabelece, de forma detalhada, a situação desejável de cada
indicador. O juízo de valor sobre o grau de atendimento de cada critério deverá ser construído a partir das
múltiplas fontes de informações disponíveis com a aplicação de técnicas e instrumentos, tais como:
questionários de avaliação de desempenho, entrevistas e reuniões grupais, informações de caráter
qualitativo e quantitativo, observações, entre outros.
Na avaliação, o indicador é a unidade que permite medir o alcance de um objetivo especifico. Distingue-
se em indicadores diretos e indiretos.
Indicadores diretos traduzem a obtenção do objetivo específico em uma relação de implicação lógica.
Exemplo: Se aumentar à produtividade do servidor público, é um objetivo institucional, sua definição já
determinou o indicador, que é “produtividade funcional” que mostrará as variações para mais ou para
menos que ocorreram nas realizações do avaliado. Esta variação expressa o efeito do Plano de Cargo,
Carreiro e Vencimento, por exemplo, como elemento motivador ou não da melhoria do desempenho
funcional.

- Objetivo 1 - Adequar os funcionários ao cargo.


Meta 1 – Desenvolver estudo avaliativo sobre a formação e titulação do servidor para saber a
adequação de sua formação com a função ou cargo que exerce.
Indicador 1- Quantidade de servidores exercendo cargos compatíveis com formação e titulação
acadêmica.

Por outro lado, pode surgir os chamados indicadores indiretos, que emergem da forma em que o
desempenho do servidor se expressa. Neste caso, a relação entre indicador e meta apresenta um caráter
probabilístico e não tem implicação lógica, isto porque, torna-se mais conveniente incrementar o número
de indicadores de uma meta para aumentar a probabilidade de conseguir uma medição adequada.

Objetivo 1 - Adequar os funcionários ao cargo.


Meta 1 – Desenvolver estudo avaliativo sobre a formação e titulação do servidor para saber a
adequação de sua formação com a função ou cargo que exerce.
Indicador 1 – Índice de servidor ocupando cargo indevidamente.

Os indicadores da avaliação não surgem necessariamente da programação realizada. Ainda que na


formulação do Plano tenham sido considerados as metas e indicadores determinados. Pode ocorrer que
as metas tenham sido mal estabelecidas e os indicadores incorretamente definidos. Mas isto não constitui
uma restrição para a avaliação. Seu principal referencial não é a programação, e sim o comportamento
da realidade como consequência da ação (plano). O objetivo da avaliação é verificar de que modo,
em que medida foi produzida as transformações no grupo afetado - pelo plano. A partir dessas
observações é possível determinar quais são os indicadores (indiretos) válidos para a avaliação.
A literatura disponibiliza vários modelos de avaliação de desempenho, e a avaliação de mérito, modelo
que enfatiza os critérios de desempenho, idealizado por Michael Scriven, que define a avaliação uma

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atividade metodológica de coleta e análise de dados relativos ao desempenho. Para isso, usa-se um
conjunto ponderado de escalas e critérios que possibilite classificações comparativas ou numéricas.
A maioria das instituições centra, atualmente, avaliação numa série de instrumentos registrados
periodicamente em forma de questionários contemplando como parâmetros listas de atributos pessoais
e profissionais, seguido de valores escalares cuja função é valorar a performance do servidor (funcionário;
docente ou outras categorias). O resultado desse processo, via de regra automatizada, estabelece níveis
diferenciados de desempenho entre as pessoas, conforme as categorias associadas à escala
estabelecida para cada instrumento, os mais usados (ótimos, regulares e péssimos) associados a uma
escala 1, 2, 3,
Certamente este modelo tem gerado insatisfações entre os avaliados, comprometendo a credibilidade
das instituições e os fins do processo avaliativo, pois são questionados pela falta de objetividade, pela
burocratização do processo, além da probabilidade de distorções e fatores que induzem interpretações
tendenciosas e injustas. No entanto, um sistema de avaliação adequado cumpre além da função de
escolher e selecionar os futuros líderes constitui num instrumento de promoção do crescimento pessoal
e profissional das pessoas. Os maiores problemas de gerenciamento acontecem quando as instituições
imputam aos seus servidores a responsabilidade pelo mau desempenho. Vários estudos têm
demonstrado que na realidade esse insucesso advém do processo de gestão, ou do próprio sistema, não
sendo, portanto de responsabilidade dos servidores, mas de gerência.

Para saber mais... Indicadores de desempenho - Conceito81

Os indicadores são instrumentos de gestão essenciais nas atividades de monitoramento e avaliação


das organizações, assim como seus projetos, programas e políticas, pois permitem acompanhar o
alcance das metas, identificar avanços, melhorias de qualidade, correção de problemas, necessidades
de mudança etc.

Pode-se dizer que os indicadores possuem, minimamente, duas funções básicas:


- a primeira é descrever por meio da geração de informações o estado real dos acontecimentos
e o seu comportamento;
- a segunda é de caráter valorativo que consiste em analisar as informações presentes com
base nas anteriores de forma a realizar proposições valorativas.

Objetivo dos indicadores

Dessa forma os indicadores servem para:


- mensurar os resultados e gerir o desempenho;
- embasar a análise crítica dos resultados obtidos e do processo de tomada decisão;
- contribuir para a melhoria contínua dos processos organizacionais;
- facilitar o planejamento e o controle do desempenho; e
- viabilizar a análise comparativa do desempenho da organização.

Elementos essenciais para a elaboração dos indicadores

- Os indicadores devem contribuir de forma explícita para o cumprimento dos objetivos estratégicos
(Mapa estratégico);
- Devem estar intimamente relacionados às principais conclusões do processo de elaboração do
Planejamento (pontos fracos, pontos fortes, oportunidades e ameaças);
- Devem medir performance e não atividade;
- Devem custar o mínimo possível e ter o máximo de justificativa possível;
- Devem ser simples e de preferência exigir pouca ou nenhuma explicação;
- Devem permitir fixação de metas e autonomia na obtenção das mesmas;
- A interpretação dos dados deve subsidiar o processo decisório.

A cadeia de Valor e os 6Es do desempenho


Mensurar o desempenho da organização com base nos elementos da cadeia de valor permite que as
organizações analisem suas principais variáveis associadas ao cumprimento dos seus objetivos: quantos

81
http://www.antaq.gov.br/

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e quais insumos são requeridos, quais ações são executadas, quantos e quais produtos/serviços são
entregues e quais os impactos finais alcançados.

Cadeia de valor:

A cadeia de valor é definida como o levantamento de toda a ação ou processo necessário para gerar
ou entregar produtos ou serviços a um beneficiário. É a representação das atividades de uma organização
e permite melhor visualização do valor ou do benefício agregado no processo. O modelo da cadeia de
valor mensura o que se deve realizar para se produzir um resultado significativo no futuro.

6 Es do Desempenho

O modelo dos 6 Es de desempenho constitui-se nas dimensões de esforços que serão despendidos
considerando os resultados desdobrados em outras dimensões do desempenho. As dimensões de
esforço são economicidade, execução e excelência; e as dimensões de resultado são eficiência, eficácia
e efetividade.

Quantidade e qualidade dos indicadores selecionados

Quantidade: Para o trabalho com indicadores de desempenho deve-se esquecer o mito da “Medição
absoluta”. Não é necessário monitorar e controlar tudo e todos ao mesmo tempo e na mesma hora. A
postura correta é a alta seletividade. Medir apenas o que é importante e significativo. A quantidade ideal
sofrerá mudanças pelo nível de amadurecimento da instituição no tratamento das questões que envolvem
avaliação de performance e desempenho.
Pode-se começar com poucos indicadores, medindo apenas os processos básicos, e ir aumentando
gradativamente à medida que haja melhor sensibilidade institucional ao trato desse assunto.

Qualidade: As medidas devem ser úteis, fazer sentido para orientar a gestão no dia a dia. A medição
tem que ser orientada para a melhoria do desempenho e a melhoria do desempenho tem que ser
orientada pela medição. Se com a medição consegue-se extrair informações de gestão, ele terá
qualidade.

E como fica a Avaliação de Desempenho nas escolas?

Avaliação da aprendizagem

A avaliação apresenta-se como uma das questões mais controversas no processo de ensino
aprendizagem, isto porque comumente avaliamos, considerando sempre a realidade como algo objetivo
e estável. Nesse enfoque, a avaliação assume a finalidade de proporcionar uma visão retrospectiva e/ou
pontual sobre a aprendizagem e medir o que foi aprendido, legitimando a função de: recapitulação
(armazenamento) e seleção social (promoção do aluno).
A proposta de avaliação da aprendizagem, é realizada em função dos objetivos expressos nos planos
de cursos, considerando os aspectos cognitivos, afetivos e psicossociais do educando, apresentando-se
em três momentos avaliativos: diagnóstico, formativo e somativo, além de momentos coletivos de auto e
heteroavaliaç