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Colégio Diocesano de

Nossa Senhora da Apresentação

Departamento Curricular de Línguas


Ano letivo 2014-2015
90 min.

PORTUGUÊS  8º ano
Teste escrito n.º 6
GRUPO I

(20 pontos)

Lê o texto. Em caso de necessidade, consulta as notas e o vocabulário apresentados.

Encantamentos

10

15

20

25

30

35

- Para que serve a poesia?


Esta é uma daquelas questões que, cedo ou tarde, todos os poetas enfrentam. A
resposta mais frequente, mais falha de imaginação e de verdade, assegura que a
poesia não serve para nada. Alguns poetas, em
especial os portugueses, acrescentam a seguir que também a vida não serve para
nada, etc. […]
Na origem, a poesia era uma disciplina da magia. Servia para encantar. Continua a
ser assim, embora,
no sentido literal, poucas pessoas ainda exercitem essa antiquíssima arte. Uma
tarde, em Benguela1, conheci uma das derradeiras praticantes. Almoçava com amigos,
e amigos de amigos, num desses quintalões
antigos, carregados de frutos, e de boa sombra, da cidade das acácias rubras. A
determinada altura escutei
um sujeito que se referiu a uma tal Dona Aurora:
- A velha receita poesias.
- Recita - corrigi.
O homem, um oficial do exército, encarou-me, irritado:
- Não senhor! Receita! Dona Aurora receita poesias. Resolve problemas de amor,
amarrações, mauolhado, tudo com versinhos.
Fiquei interessado. Anotei o endereço da curandeira num guardanapo e na manhã
seguinte bati-lhe à
porta. Dona Aurora morava na Restinga2, num casarão, em madeira, muito maltratado.
A velha senhora,
miúda, muito magra, vestia de cor de rosa. Toda a sua força parecia residir na
cabeleira, a qual mantinha
uma vigorosa rebeldia juvenil. Convidou-me a entrar. Móveis dos anos 50, muito
gastos. Estantes carregadas de livros velhos. Aproximei-me. Poesia, e mais poesia:
Florbela, Camões, Vinícius, José Régio, Sophia,
Drummond, Manuel Bandeira, tudo misturado, num bem-aventurado desrespeito a
fronteiras políticas, estéticas e ideológicas. «O meu marido sempre gostou de
poesia», justificou-se: «Eu, menos. Foi só depois de
ele morrer, há 30 anos, que descobri o poder dos versos.»
Acontecera um pouco por acaso - contou. Uma tarde deu-se conta de que certos
sonetos parnasianos 3
(os mais trabalhosos) a ajudavam a vencer a insónia. Mais tarde, que João Cabral de
Melo Neto, a partir de
«O cão sem plumas», era muito eficaz no combate à cefaleia4. Pouco a pouco foi
desenvolvendo um método. Combatia a prisão de ventre lendo alto a Sagrada Esperança
5. Mantinha o quintal livre de ervas daninhas, percorrendo-o, ao crepúsculo6,
enquanto soprava devagar «O guardador de rebanhos»7.
Numa cidade pequena não tardou que tais excentricidades lhe trouxessem, primeiro
inimigos, e depois
devotos seguidores e pacientes. Hoje, ela recebe a todos, ricos e pobres, na sala
onde me recebeu a mim.
Ouve as suas queixas, levanta-se, percorre as estantes, e regressa com a solução.
«Quem me procura mais
são mulheres querendo reconquistar o coração dos maridos. Recomendo que lhes
murmurem, enquanto
dormem, algum Neruda, às vezes Camões, outras Bocage.»
Dona Aurora não aceita dinheiro pelos serviços prestados. «Não sou eu quem cura»,
explicou-me, «é a
poesia».
José Eduardo Agualusa, in LER, Livros & Leitores, N.º 113, maio 2012 (texto com
supressões)
Professores de Português – 8º ano

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VOCABULÁRIO E NOTAS
1 - Benguela – cidade angolana, capital da província de Benguela.
2 - Restinga – zona da cidade do Lobito, na província de Benguela.
3

- sonetos parnasianos – composições poéticas com características do parnasianismo,


uma corrente literária.
- cefaleia – dor de cabeça forte e persistente.
5 - Sagrada Esperança – obra de Agostinho Neto, poeta e primeiro presidente da
República de Angola.
6 - crepúsculo – luminosidade que ocorre antes do nascer do dia ou após o pôr do
sol.
7 - «O guardador de rebanhos» – título de um conjunto de poemas escrito por
Fernando Pessoa.
4

Responde aos itens que se seguem, de acordo com as orientações que te são dadas.
1. Seleciona, para responderes a cada item (1.1. a 1.4.), a única opção que permite
obter uma afirmação
adequada ao sentido do texto. Escreve o número do item e a letra que identifica a
opção escolhida.
1.1. Segundo o autor, «−Para que serve a poesia?» (linha 1) apresenta-se aos poetas
como uma
questão
(4 pontos)
(A) inédita.
(B) inevitável.
(C) invulgar.
(D) inimaginável.
1.2. A confusão gerada entre «receita» (linha 10) e «Recita» (linha 11) deve-se ao
facto de se tratar de
palavras
(4 pontos)
(A) com um significado muito próximo.
(B) da mesma família.
(C) do mesmo campo lexical.
(D) com uma sonoridade muito próxima.
1.3. Os exemplos de aplicação do método que Dona Aurora foi desenvolvendo,
apresentados nas linhas 26 e 27, têm em comum o facto de incluírem referência
(4 pontos)
(A) à frequência com que a leitura do poema deve ser realizada.
(B) à extensão do poema que deve ser lido.
(C) ao modo como o poema deve ser lido.
(D) ao espaço em que a leitura do poema deve ser realizada.
1.4. De acordo com o último parágrafo do texto, pode afirmar-se que Dona Aurora
revela
(A) oportunismo e arrogância.
(B) ambição e inveja.
(C) generosidade e modéstia.
(D) humildade e rebeldia.

(4 pontos)

2. Seleciona a opção que corresponde à única afirmação falsa, de acordo com o


sentido do texto.
Escreve o número do item e a letra que identifica a opção escolhida.
(4 pontos)
(A) «que» (linha 9) refere-se a «um sujeito».
(B) «a qual» (linha 17) refere-se a «Toda a sua força».
(C) «ele» (linha 22) refere-se a «O meu marido».
(D) «lhes» (linha 31) refere-se a «os maridos».
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GRUPO II

(30 pontos)

Lê atentamente o poema.

O Vagabundo do mar
Sou barco de vela e remo
Sou vagabundo do mar.
Não tenho escala marcada
Nem hora para chegar:
É tudo conforme o vento,
Tudo conforme a maré...
Muitas vezes acontece
Largar o rumo tomado
Da praia para onde ia...
Foi o vento que virou?
Foi o mar que enraiveceu
E não há porto de abrigo?
Ou foi a minha vontade
De vagabundo do mar?
Sei lá.
Fosse o que fosse
Não tenho rota marcada
Ando ao sabor da maré.
É, por isso, meus amigos,
Que a tempestade da Vida
Me apanhou no alto mar.
E agora,
Queira ou não queira,
Cara alegre e braço forte:
Estou no meu posto a lutar!
Se for ao fundo acabou-se.
Estas coisas acontecem
Aos vagabundos do mar.
Manuel da Fonseca, Obra Poética, Editorial Caminho

1. Aponta duas características do perfil psicológico do sujeito poético, com base


na apresentação que faz
de si próprio como “vagabundo do mar” (v. 2).
(5 pontos)
2. Identifica o recurso expressivo presente em “Sou barco de vela e remo” (v. 1),
explicitando o seu sentido.

(5 pontos)

3. O sujeito poético dá a conhecer que nas suas viagens nem sempre cumpre a rota
traçada.
3.1. Refere, com base no poema, o que poderá motivar a alteração da rota inicial.

(5 pontos)

4. Caracteriza a postura do sujeito poético, com base nos dez últimos versos.

(5 pontos)

5. Explica a passagem do uso do singular “vagabundo do mar” para o plural


“vagabundos do mar”.
(5 pontos)

6. Faz a análise da estrutura formal do poema.


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(5 pontos)
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GRUPO III

(20 pontos)

Responde aos itens que se seguem, de acordo com as orientações que te são dadas.
1. Identifica a relação estabelecida entre as palavras sublinhadas nas seguintes
frases.

(4 pontos)

1.1. É impossível que eles viajem com este tempo. / O sujeito poético fez uma
viagem sem rota marcada.
1.2. A maré está baixa. / Ando numa maré de azar.
2. Indica as funções sintáticas dos constituintes do verso “Sou vagabundo do mar”.

(4 pontos)

3. Divide e classifica as orações do verso “Se for ao fundo acabou-se.”

(4 pontos)

4. Reescreve as frases, substituindo as palavras/expressões sublinhadas pela forma


adequada do
pronome pessoal. Faz apenas as alterações necessárias.

(4 pontos)

4.1. O mar impõe muitas cautelas.


4.2. Daríamos a volta ao mundo, se soubéssemos navegar.
5. Indica o tempo e o modo em que se encontra o verbo no verso “Queira ou não
queira”.

GRUPO IV

(4 pontos)

(30 pontos)

Elabora um texto argumentativo, com um mínimo de 170 e um máximo de 230 palavras,


acerca das
vantagens e das desvantagens de assumirmos na vida uma atitude de “vagabundo do
mar”, semelhante à
presente no poema de Manuel da Fonseca.
Estrutura o texto em três partes:

Introdução – (1 parágrafo): em que explicites o tema e o(s) ponto(s) de vista que


defenderás;

Desenvolvimento – ( 2 ou mais parágrafos): em que apresentes argumentos e exemplos


que fundamentem o(s) teu(s) ponto(s) de vista.

Conclusão – (1 parágrafo): em que sintetizes as principais ideias apresentadas ao


longo do texto e
reforces o(s) teu(s) ponto(s) de vista.
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