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27/06/2019 Zoom Literário: Primeiras Estórias (1962) - João Guimarães Rosa

mais didi.mesquita59@gmail.com Painel Sair

Zoom Literário
Blog destinado aos meus alunos dos 3ºanos do ensino médio, como forma de acesso rápido a
conteúdos literários, simples e objetivos.Resumos de livros, filmes e dicas direcionadas para aqueles
desejam realizar o Enem.Conteúdos trabalhados progressivamente em sala de aula pela prof.ª Fábia
- 2011.

" Um público comprometido com a leitura é crítico, rebelde, inquieto, pouco manipulável... " Mario Vargas Llosa

31 de out de 2011 ZOOM LITERÁRIO

Primeiras Estórias (1962) - João


Guimarães Rosa

LITERATURA
Zoom Literário
Autores do Pré-Modernismo
Resumos de livros
Enem - Comentários e dicas
Enem - Elaboração da prova

Gênero literário
LINKS
O próprio autor cunhou o gênero estória como conto breve.
Época
INTERESSANTES
Terceiro tempo do Modernismo brasileiro, também conhecido na história da literatura Site do Enem
brasileira como Geração de 45, que tem como expoentes, além de Guimarães Rosa, prosa de
Prouni
Clarice Lispector e a poesia de João Cabral de Melo Neto.
Dicionário
Contexto histórico-cultural
BRASIL – Política e economia: anos JK, o "presidente bossa-nova"; euforia Baixar livros gratuitos
desenvolvimentista? industrialização acelerada do País ? Plano de Metas = 50 anos em 5;
fundação de Brasília; instalação da indústria automobilística.

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Literatura: Concretismo = poesia verbivocovisu-al: Haroldo de Campos, Augusto de
Campos, Décio Pignatari, José Paulo Paes, Pedro Xisto, José Lino Grunewald.
Musica popular brasileira: Bossa Nova João Gilberto, Johnny Alf, Tom Jobim, Vinícius de
Mo-raes, Carlos Lyra, Ronaldo Bôscoli, Luís Bonfá, Edu Lobo, Sérgio Ricardo, Juca Chaves, Jorge
Ben(jor), Maysa, Agostinho dos Santos.
Cinema novo: Nelson Pereira dos Santos, Roberto Santos, Joaquim Pedro de Andrade,
Gláuber Rocha.
Teatro: fim da geração TBC e início das gerações Arena e Oficina.
Futebol: seleção brasileira, bicampeã do mundo (1958 e 1962).
Comportamento: juventude transviada; geração Coca-Cola; participação estudantil: atuação
permanente da UNE.
MUNDO
Invenções: vacina Sabin (pólio, 1955); Sputnik (1957, URSS inicia a corrida espacial).
Política: XX Congresso do PC da URSS (1958: a desestalinização); Revolução Cubana
(1958).
Filosofia: Existencialismo, com Jean-Paul Sartre.
Literatura e cinema: Nouvelle Vague Robbe-Grillet; filmes de Louis Malle, François
Truffaut, Jean-Luc Godard.
Musica: explosão do rock-and-roll, com Elvis Presley, Bill Halley, Little Richard, Chuck Berry,
Paul Anka.
Categorias
Conforme a organização dos enredos e dos núcleos temáticos, as estórias pode ser
classificadas em cinco categorias.
Loucura
Sorôco, sua mãe e sua filha
Nada e a nossa condição
O cavalo que bebia cerveja
-A benfazeja
Darandina
Tarantão, meu patrão
Infância
As margens da alegria
A menina de lá
Pirlimpsiquice
Partida do audaz navegante
Os cimos
Violência
Famigerado
Os irmãos Dagobé
Fatalidade/Misticismo
A terceira margem do rio
Nenhum, nenhuma
O espelho
Um moço muito branco
Amor
Sequência
Luas-de-mel
Substância

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Estilo rosiano
Em Primeiras Estórias, conforme a pesquisa levantada por Paulo Ronai (publicada na
introdução da obra, quando esta era editada pela José Olympio) e a de Mary Lou Daniel (em
João Guimarães Rosa: travessia literária), destacam-se os seguintes processos de invenção
verbal:
Aglutinação de palavras:
"equiparado" (= equus, em latim, cavalo + parado); "sussurruído" (= sussurro + ruído);
"descrevivendo" (= descrever + escrever + vivendo); "beladormeceu" (= bela + adormeceu);
"tutanico" (= tutano + titanico); "terrivorosos" (= terríveis + vorazes + horrorosos);
"personagente" (= persona, máscara, em latim + personagem + gente); "pensamor" (=
pensamento + amor); "enxadachim" (= enxada + espadachim).
Palavras que permutam de classes gramaticais:
"Desço em pulos passos" (substantivo usado como advérbio)
A gente pensava num logo luar" (advérbio usado como adjetivo)
Ênfase através de repetição de palavra:
"Infância é coisa, coisa?"
"Porque eu desconheci meus Pais – eram-me tão estranhos; jamais poderia verdadeiramente
conhecê-los, eu, eu?"
Permutação de tempo e modo verbais:
"Nem, olhasse mais a paisagem" (olhasse, imperfeito do subjuntivo usado como futuro do
pretérito, olharia)
"Só ele conhecesse, a palmos, a escuridão daquele brejão" (conhecesse, imperfeito do
subjuntivo usado como presente do indicativo, conhece)
Uso do artigo definido antes de pronomes indefi-nidos:
"as muitas pessoas"; "a alguma alegria"; "o parente nenhum"
Associação entre som e sentido – aliterações e assonâncias:
"Miúdo, moído..."; "leigos, ledos, lépidos" "chiquetichique"
Desarticulasses ou desvios sintáticos:
"A gente fica quase presos, alojados na cozinha" (silepse de número, o predicativo concorda
com a idéia de plural contida, pressuposta no sujeito)
Uso do anacoluto:
"Tia Liduina, que durante anos de amor tinham-na visto sorrir sobre sofrer [...]. Tia Liduina,
que já fina música e imagem."
Desdobramento de palavras através de sufixos pomposos:
"furibundância"; "circunspectância"; "blasfemífero"
Palavras de efeito grandiloqente e pedante:
"Só vivo no supracitado"; "Aquele senhor provisoriamente impoluto"
Inversão de lugares-comuns ou frases feitas:
"a menos não poder"; "com nenhum titubeio"; "com cara de nenhum amigo"; "E era o
impasse da mágica"; Um deu-nos-sacuda (deus-nos-acuda); prevenido para valer por quatro; "o
feio está ficando coi-sa..."
Citação ou criação de provérbios sertanejos:
"De pobre não me sujo, de rico não me emporca-lho."
"Eu ponho a mesa e pago a despesa."
"Aroeira de mato virgem não alisa."

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"Herói e no que dói."
"Para o pobre, os lugares são mais longe."
"Quem sou eu, quati, para cachorro me latir?"
Prosa rimada na forma de pares justapostos:
"E entrou – de peito feito"; "Moço esporte de forte."
Repetições múltiplas para provocar intensidade emocional:
"... ele me pareceu vir: da parte do além. E estou pedindo, pedindo, pedindo um perdão."
"Mato o Magrinho, é hoje, mato e mato, mato, mato!"
Mistura de vocabulário coloquial e erudito:
"Nosso homem, ignaro, escalara dela o fim, e fino. Susteve-se. [...) ao topo se encarapitava,
safado, sabiá, no páramo empíreo. Paravam os de seu perséquito, não menos que eu surpresos,
detidos, aqui em nível térreo, ante a infinita palmeira."
Criação de novos substantivos abstratos:
"eu já declinava para nãoezas?" (derivado do advérbio não)
"De roda, na vislumbrança, o que dos vales e serros vem e o que o horizonte é – tudo em
tudo." (derivado do verbo vislumbrar = ver indistintamente, ao longe) "Mas o tucano, sem falta,
tinha sua soência de sobrevir... no pintar da aurora." (derivado do verbo soer = costumar, ter
por hábito).
Flexão de palavras invariáveis:
"Ah... e quase, quasinho... quasesinho, quase... Era de horrir-me o pêlo."
Verbos formados a partir de adjetivos:
"Cabisbaixara-se. Tio Man'Antônio, no dizer essas palavras..."
" – 'Falsa a beatinha e tu! ' – Brejeirinha se mal-criou."
Abrasileiramento de palavras estrangeiras:
"Eu, Reivalino Belarmino, capisquei." (do italiano capire (= compreender)
"Li se ia, se fugia, o meu esmarte patrão." (do inglês smart = astuto, esperto, sagaz, ladino)
Enredos das Primeiras Estórias
I – As margens da alegria: Um Menino descobre a vida, em ciclos alternados de alegria
(viagem de avião, deslumbramento pela flora e fauna) e tristeza (morte do peru e derrubada de
uma árvore).
II – Famigerado: Damázio Siqueira, homem sim-ples, atormenta-se com um problema
vocabular: ouviu a palavra "famigerado" de um moço do gover-no e vai procurar o farmacêutico,
pessoa letrada do lugar, para saber se tal termo era um insulto contra ele, jagunço.
III – Sorôco, sua mãe, sua filha": Um trem aguarda a chegada da mãe e da filha de
Sorôco, para conduzi-las ao manicômio de Barbacena. Durante o trajeto até a estação, levadas
por Sorôco, elas começam surpreendentemente a cantar. Quando o trem parte, Sorôco volta
para casa cantando a mesma canção, acompanhado pelos amigos da cidadezinha que,
solidariamente, passam a cantar junto.
IV – A menina de lá: Nhinhinha possuía dotes paranormais: seus desejos, por mais
estranhos que fossem, sempre se realizavam. Isolados na roga, seus parentes guardam em
segredo o fenômeno, para dele tirar proveito. As reticentes falas da menina tinham caráter de
premonição: por exemplo, o pai reclamara da impiedosa seca. Nhinhinha "quis" um arco-íris, que
se fez no céu, depois de alentadora chuva. Quando ela pede um caixãozinho cor-de-rosa com
enfeites brilhantes, ninguém percebe que o que ela queria era morrer...
V – Os irmãos Dagobé: O valentão Damastor Dagobé, depois de muito ridicularizar
Liojorge, e morto por ele. No arraial, todos dão como certa a vingança dos outros Dagobé:
Doricão, Dismundo e Derval. A expectativa da revanche cresce quando Liojorge comunica a
intenção de participar do enter-ro de Damastor. Para surpresa de todos, os irmãos não só
concordam, como justificam a atitude de Liojorge, dizendo que Damastor teve o fim que
merecia.A violência Iminente: o sertão e a era civilizatória no conto “Os irmãos
Dagobé”, de Guimarães Rosa”
Nome: Paula Roberta Gabbai Armelin nº. USP: 5420999
Prof. Dr.: José Miguel Wisnik
Disciplina: Literatura Brasileira IIResumo:
O conto “Os irmão Dagobés” permite identificar aspectos do hábito da violência sertaneja, não
por meio da luta de morte, mas através da expectativa de um coro, que na voz narrativa,
especula a todo o momento o destino do “lagalhé” Liojorge, que, em gesto de legítima defesa,
mata o “facínora” Damastor. Elementos de ambivalência e grande poder simbólico entrelaçam a
trama, colocando lado a lado um passado brasileiro marcado pela exploração e o país emergindo
como possibilidade do moderno, gerando nesse entremeio a latente interrogação: a civilização se
sobrepõe ao sertão? No entanto, a resposta não parece estar contida nos extremos. Nem sertão,
nem cidade. Mas um contínuo, uma mistura indissolúvel se instaura, construindo na voz de
Guimarães Rosa, sob a forma do recado, o mistério da história brasileira.
Em “Primeiras Estórias”, publicado em 1962, as fronteiras entre sertão e cidade parecem não

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bem configuradas. Nas obras anteriores a cidade está presente, ou seja, os seus problemas e seu
confronto com o sertão estão colocados, mas abstraindo-se os elementos urbanos. “Primeiras
Estórias” é o livro em que a cidade começa a emergir de fato no mundo roseano, o mundo
sertanejo acusa sinais expressos de urbanização. Nesse mesmo sentido, o desenlace do conto
“Os irmãos Dagobé”, assim como em “Fatalidade” e outros contos, aponta um mote do livro que
os contém: a violência iminente que, em uma espécie de reviravolta, não se dá. Serão estes
sinais da extinção das regras de mandonismo, tão características do sertão, e, portanto, o
advento por completo da era civilizatória?
Para começar a resolver essa questão talvez seja essencial atentar para o espaço em que se
desenrola o conto “Os irmãos Dagobé”. Podemos dizer que este se insere em uma realidade
sociocultural sertaneja de pequenos vilarejos, recorrente no conjunto de contos do livro; é um
arraial anônimo, que conta com cemitério e igreja, mas em que o velório do (ex)mandão
Damastor é feito em casa, acompanhado por um pequeno aglomerado de gente, ao foco de
“lamparinas e lampiões” , sendo descrito pelo narrador como “à moda de lá”. Neste espaço
impera um machismo exacerbado, sem a “mulher em lar” e sem a presença de representantes
de qualquer autoridade (“no lugar não havia padre”).
Dessa maneira, as regras de convivência se mostram definidas, mais uma vez, nas relações de
mandonismo, em que a vingança é obrigatória, de violência cordial, num ponto de quase
coincidência entre a reverência e a ameaça, diante de uma lei não fundada, ou seja, estamos
diante da ausência de uma instância que simbolize e aponte para além do particular. Eis uma
reflexão fundamental em Guimarães Rosa, que corrobora para a obra “Primeiras Estórias” vibrar
como um conjunto harmonioso de contos: nos dois extremos do livro com “As margens da
alegria” e “Os cimos” está a construção da “cidade mais alevantada do mundo”, uma cidade
planejada, não nomeada, para não reduzir o horizonte de leitura, mas com indícios poderosos de
ser Brasília, contendo nela algo de muito ambíguo, por ser a ocupação contrária à colonização do
Brasil. O livro, como conjunto, aponta para o momento em que o Brasil emerge como
possibilidade de moderno, mas sendo e contendo em si o arcaico. Nesse sentido, a mudança dos
Dagobés, expressa através de Doricão ( “A gente, vamos [...] morar em cidade grande”) pode
ser indício de uma violência, de um costume se transfere para a cidade. As narrativas deixam
esse conflito latente no ar, ou seja, na euforia modernizante, as cidades ainda são sertão. Assim,
a mudança dos irmãos é índice de transformações, mas transformações muito relativas, pois a lei
de Estado sempre se mostrou inseparável do mandonismo local, reciclando e recompondo a
velha estrutura, ou seja, o poder “federal” se realizou através do poder local, com relações de
coronelismo; aos fazendeiros foi consagrado poder militar, gerando alianças entre o local e o
nacional. Estas são maneiras de oficializar os mecanismos dos mandões, gerando a confusão que
vigora firmemente nos dias de hoje entre o poder e a propriedade, entre o público e o privado.
Como observa Wisnik , a atualidade de Guimarães nos possibilita pensar não em algo de
profético, mas em uma espécie de recado, captando sutilmente a violência latente que continua
passando como enigma que interroga a singularidade da experiência brasileira.
Nesse sentido, destaca-se a postura que o narrador do conto “Os irmãos Dagobé” assume, sem
onisciência alguma, como um mero participante do evento que conta, o velório do “facínora”
Damastor, “o mais velho dos irmãos”, nos permite enxergá-lo como porta voz do comportamento
dos seus semelhantes, resignados a sofrer os desmandos dos valentões, como se habituados à
situação. O hábito se constrói com o tempo, gera os costumes e tem a poderosa força de
desfazer as estranhezas. Dessa maneira, é através do contar desse narrador, ou seja, do seu
fazer simbólico, que compreendemos a reação da “pequena multidão” presente no velório.
Interessante notar que aparentemente o motivo da presença dessa gente é mais por curiosidade
a cerca dos destinos de Liojorge, fazendo especulações a todo tempo. É um conto, portanto, que
tem uma espécie de coro, a exemplo de “A terçeira margem do rio”, em que o grupo social se
junta, arma-se para reagir à quebra de código feita pelo pai: ter como habitat o rio, contrariando
o hábito. Esse coro levanta hipóteses para explicar essa situação insólita, como a “razão de que
não queriam falar: doidera”, “pagamento de promessa” ou “por escrúpulo de estar com alguma
feia doença, que seja a lepra”. Na estória dos Dagobés, o coro acompanha os acontecimentos e
exprime, com cautela e sussurros, suas reações através da voz narrativa, desprovida de qualquer
imparcialidade. O narrador se posiciona desde o início (“enorme desgraça”) e prenuncia do
começo ao fim do conto, em gradação crescente, uma catástrofe (“saboreavam já o sangrar”, “já
estavam de mira firmada” “à queima bucha o matavam”), que deveria se dar, seguindo a regra
da vingança obrigatória, “sangue por sangue”, (“espantavam-se de que os irmãos não tivessem
obrado a vingança”) e a maldade essencial dos irmãos, “gente que não prestava”, se mostrando
incapaz de imaginar nos protagonistas novos critérios. Assim, nesse momento, atentamos para
as estâncias do Real, do Imaginário e do Simbólico , que, como argolas entrelaçadas, são base
da nossa construção psíquica. O Real é o estado bruto das coisas, independente da linguagem ou
da visão de mundo do sujeito; o Imaginário é a construção de imagens através das quais damos
sentido de todo ao Real e o Simbólico é fundamentalmente, a linguagem, o contar. O leitor

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envolvido pela visão expressa pelo narrador, fica na espera de uma catástrofe, preparada pelos
irmãos, cínica e bem articulada, e engana-se na idéia de que Liojorge está amedrontado,
recuado, “solitário em casa, resignado já ao péssimo, sem ânimo de nenhum movimento” e, que,
portanto, a partir de um real (fato de ter assassinado Damastor) está preso num imaginário,
como se imaginando a própria morte. Mas o narrador erra em todas as hipóteses que constrói,
pois o desenrolar da estória mostra o contrário: Liojorge, por meio do recado, já estava agindo,
ou seja, Liojorge se salva justamente através do simbólico, por meio da linguagem. Nesse
sentido, os três irmãos que restaram, em uma espécie de reviravolta, não atacam o “rapaz
Liojorge”, “estimado de todos”, a vingança iminente não se dá. Assim o medo que o narrador
deveria passar ao seu espectador vira recurso cômico de contador de estórias que mantém a
expectativa do leitor para e frustrá-la ao final.
Com isso, o conto de desenrola (a exemplo do conto “Fatalidade”), como uma paródia de
bangue-bangue, em que os atores não correspondem aos estereótipos do gênero, pois nem o
bom moço, Liojorge, que “não tinha querido matar”, salva o povo das maldades dos Dagobés e
assume o comando do arraial, nem os irmãos que restaram executam a regra de vingança em
resposta à morte do chefe. Aliás, nem o duelo, característico do gênero bangue-bangue, entre o
mocinho e o mandão é descrito, sendo anterior ao evento narrado. A morte de Damastor é
assinalada por uma única frase feita, que, se não bastasse, ainda é irônica e deturpada: “Até aí
viveu o Telles”, A frase feita, na verdade, seria “Até aí morreu o Neves”, que significa vamos
adiante... você não disse nada de novo. Além de tudo, quem mata o temível mandão Damastor,
é o “ pacífico e lagalhé”, Liojorge, sem aparência nenhuma de extremos, seja, de herói, seja de
assassino. A respeito do vocábulo “lagalhé”, João Ribeiro (1908) esclarece, como sendo o
indivíduo sem insignificante e sem importância social; a palavra tem origem latina, leguleius, “o
rábula que conhece apenas de memória o texto das leis e não tem carta para advogar. Os
leguleios, por numerosos e sem consideração ou importância são lhagalhés e opõem-se aos
doutores”
Esse poder de empregar elementos precisos e concisos, por serem carregados de sentidos
diversos e, muitas vezes, oriundos das mais variadas esferas da sociedade, do erudito ao
popular, da literatura tida como “clássica” aos mais diversos manuais de literatura “não oficial” e
ainda, com o direito a todo tipo de aberrações fonéticas, revela o poder de simbolização, ou seja,
a maestria de uso da linguagem em Guimarães Rosa, o que nos leva a, de certa maneira,
desconfiar de cada palavra, de cada expressão inserida no texto. Assim, talvez devamos pensar
que não seja exatamente coincidência a causa de os quatro irmãos terem o nome (além do
sobrenome) iniciado pela letra “D”: Damastor, Doricão, Dismundo e Derval. Aliás, os nomes de
personagem aparecem não raras vezes como elemento muito carregado de sentido na obra do
autor, vale lembrar o famoso “Recado do Morro”, em que símbolos míticos são disfarçados e
insinuados em nomes sertanejos ao longo das viagens, tanto do recado, quando da comitiva:
Saturnino, Jove, Dona Vininha, Nhô Hermes, Nhâ Selena, Marciano e Apolinário, podem ser lido
interpretativamente como, Júpiter, Vênus, Mercúrio, a Lua, Marte e o Sol, que são as fazendas
pelas quais a comitiva passa, representando uma viagem que vai do chumbo ao ouro, do opaco
ao iluminado, mas com mediações, que incorpora sentidos diferentes. Inseridos também nessa
ligação entre símbolos celestes e a vivência humana, que faz do céu um grande livro, estão os
sete recadeiros, todos lunáticos, mas um diferente do outro, cada um com a sua motivação:
Gorgulho é saturnino, sua motivação é de colocar limite; Catraz se relaciona com Vênus, sua
motivação é de se casar, de uma vida amorosa, a imaginação é o seu maior canal de contato
com o mundo; o “menino Joãozezim”, com a motivação de contar ao outro, de das forma verbal,
de falar, se relaciona com Mercúrio; Guegue, de atenção flutuante, preso àquilo que muda,
estabelece relação cambiante com o mundo e, assim, nos remete à Lua; Nomindome, traz o
tema da urgência do tempo, motivado pela tensão, conflito, pela urgência diante da ameaça, nos
remete a Marte; o coletor, sexto recadeiro, traz em si a sensação de ordem do mundo,
relacionando-se com Júpiter e , por fim, está Laudelim, que da forma ao recado, pois ouve sem
se apegar, através de uma atenção que logo escapa, representando o Sol.
Assim, para os irmãos Dagobé, mais uma vez a onomástica, estudo e investigação a cerca de
nomes próprios, mostra-se uma importante chave interpretativa para a obra de Guimarães Rosa
e, portanto, levantamos algumas hipóteses (nada impede que elas atuem conjuntamente) para a
insistência na letra “D”. Primeiramente, podemos pensar no fato de que algumas famílias
realmente nomeiam os filhos de modo que haja alguma relação entre os nomes, simbolizando a
ligação, a proximidade familiar. Por outro lado, podemos pensar que os próprios nomes já trazem
em seu significante, nesse insistência fonética, o caráter seqencial da chefia desse mandonismo
sertanejo, que começa com o filho mais velho ( Damastor) e deve seguir por ordem de idade.
Para essa hipótese corrobora a postura de Doricão “agora o mais velho, mostrava-se já solene
sucessor”, “corpulento”, “com especial compostura”. No entanto, Francis nos revela uma forte
possibilidade: a inicial repercute a marca diabólica em cada prenome. Em Doricão há o par “Dor”
e “Cão”; em Dismundo, a discórdia global , através da raiz germânica “mund”: “aquele que não

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oferece proteção”; Derval, também através de raiz germânica “wald”: “ aquele que governa”,
sugere o desgoverno. Tudo isso em plena contradição com algo de positivo no sobrenome,
também de origem germânica, “Dag”, “brilhante”. A riqueza da linguagem de Guimarães parece
nunca se esgotar, trazendo novas “perturbações” a cada nova leitura, possibilitando novas,
reveladoras e inúmeras camadas de sentido. O sobrenome “Dagobé” ainda possibilita associação
com Dagnbé, a serpente do Vodum , princípio da mobilidade e da eternidade das forças
criadoras.
Também em Liojorge, “lagalhé pacífico e honesto” traz seu nome um recado : Lio remete a
“leão” e Georgios indica “agricultor. Este é sutilmente revelado ao leitor ao longo do conto:
“Liojorge, ousado lavrador”, é o homem do trabalho com a terra.
Ao cumprir o “destino” trazido no recado do nome, Liojorge parece impedir que os antagonistas
cumpram o deles. De fato, com a morte do irmão mais velho, o chefe Damastor, a maldade não
de perpetua, pelo menos em um primeiro momento, já que a questão fica no ar com a mudança
para a cidade. Assim, o comportamento dos irmãos, “serenos, e, até sem folia mas com alguma
alegria”, eles “não conseguiam disfarçar o certo solerte contentamento, perto de rir” apesar dos
juízos feitos pelo narrador ao longo de toda narrativa, revela-se altamente ambíguo,
principalmente no que diz respeito ao irmão caçula, Derval, “se mexia, social, tão diligente para
os que chegavam ou estavam: - ‘Desculpe os maus tratos’, este irmão estaria mais longe de
orquestrar as maldades. Nesse sentido, em Doricão, supostamente o próximo mandão, parece
haver um esforço para manter a “especial compostura”. É quase como se a morte do irmão
“cabeça, ferrabrás e mestre” livrasse os outros três de uma espécie de dever de maldade, afinal,
fora o mais velho que “botara na obrigação da ruim fama os mais moços”.
Inserido nessa mesma rede de ambigidades, está a figura do mandão: ele é a propriedade e a
lei, pode decidir arbitrariamente, mas, ao mesmo tempo, é paternal e hospitaleiro: eis o homem
cordial brasileiro, um dos elementos de raiz da confusão entre público e privado, que perdura até
os dias de hoje. Esse é uma das possíveis interpretações para o comportamento dos irmãos, que
apesar de “brutos só de assomos”, “faziam as devidas honras”.
Nesse mesmo sentido, parece-nos uma provável hipótese que a crise do mandão chefe se dê por
excesso de mandonismo, algo de falta da noção do limite ou excesso de uso de poder, em menor
intensidade, mas à semelhança do que ocorre no conto “A hora e a vez de Augusto Matraga”, em
que o mandão fica enredado numa iminência de perda do poder, incluindo a fuga da mulher e
dos jagunços, que passam para o lado do major. Para essa hipótese colabora o fato de que
Damastor, teria atacado o rapaz Liojorge aparentemente sem motivo algum, “sem sabida razão
ameaçara-lhe de cortar as orelhas”, o que resulta em uma ação de legítima defesa do bom moço,
instalando a iminência de uma vingança.
Dessa violência iminente, que não se realiza, fica uma sombra indicada na intermitência da
chuva, no velório e no enterro, simétrica ao vagalume de “As margens da Alegria” e que
recomeça simbolicamente na passagem em direção à “cidade grande”. O narrador descreve, mas
não interpreta essa intermitência com um possível, embora não absoluto, significado de
purificação. Com a noite do velório, dois focos se instalam: a casa em que se passa o velório,
lugar de aglomeração e a solidão de Liojorge, entre eles há a movimentação daqueles que
carregam o recado, gerando ao final um cortejo unificado. O “lagalhé” adquire lugar de
destaque, carregando a alça “à frente, da banda esquerda”: lado nefasto na tradição ocidental e
lado ideal para “enquadrar a vítima” na opinião do narrador. Há no narrador sempre a focalização
negativa em torno da postura de Liojorge, mas é um Dagobé quem dá o passo de recuo. No
momento decisivo, realmente se estabelece um conflito entre o suposto sucessor, Doricão e o
moço Liojorge, não o previsto, não por meio de armas, mas somente através de gestos: o
Dagobé olhando “curtamente” e falando “em baixo e mal som” demonstra ausência de força no
olhar e na fala e assim, “outra chuva começava”, deixando na lama o passado, mas,
possivelmente, arrastando nos pés vestígios fortes desse sertão, que nos chega através de
Guimarães Rosa sob a forma de um grande recado. Nem serão, nem cidade. Mas um contínuo,
uma mistura indissolúvel se instaura, construindo, sob a forma do recado, o mistério da história
brasileira.Referências Bibliográficas:
RiBEIRO, Jõao. Frazes feitas. Rio de Janeiro – Nova Fronteira, 1985
ROSA, João Gumarães. Primeiras estórias. Rio de Janeiro. Nova Fronteira, 1985.
UTÉZA, Francis. Certo Sertão: Estórias. In: Scripta, v.5 – n.10, Belo Horizonte - 2002
WISNIK, José Miguel. O famigerado. In: Scripta, v.5, n.10 - Belo Horizonte – 2002.
VI – A terceira margem do rio: Um homem aban-dona família e sociedade, para viver à
deriva numa canoa, no meio de um grande rio. Com o tempo, todos, menos o filho primogênito,
desistem de apelar para o seu retorno e se mudam do lugar. O filho, por vinculo de amor,
esforça-se para compreender o gesto paterno; por isso, ali permaneceu por muitos anos. Já de
cabelos brancos e tomado por intensa culpa, ele decide substituir o pai na canoa e comuni-ca-
1he sua decisão. Quando o pai faz menção de se aproximar, o filho se apavora e foge, para viver
o resto de seus dias ruminando o "falimento" e a covardia.

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27/06/2019 Zoom Literário: Primeiras Estórias (1962) - João Guimarães Rosa
VII – Pirlimpsiquice: Um grupo de colegiais ensaia um drama para apresentá-lo na festa
do colégio. No dia da apresentação, há um imprevisto e um dos atores se vê obrigado a faltar.
Como não havia mais possibilidade de se adiar a apresentação, os adolescentes improvisam uma
comédia, que e entusiasticamente bem recebida pela platéia.
VIII – Nenhum, nenhuma: Uma criança, não se sabe se em sonho ou realidade, passa
férias numa fazenda, em companhia de um casal de noivos, de um homem triste e de uma velha
velhíssima, de quem a noiva cuidava. O casal interrompe o noivado, e o Menino, que conhecera
o Amor observando-os, volta para a casa paterna. Lá chegando,
explode sua fúria diante dos pais, ao notar que eles se suportavam, pois haviam
transformado seu casamento num desastre confortável.
IX – Fatalidade: Zé Centeralfe procura o delegado de uma cidadezinha, queixando-se de
que Herculinão Socó vivia tentando seduzir-lhe a esposa. A situação tornara-se tão insuportável
que o casal mudara de arraial. Não adiantou: o Herculinão foi atrás. O delegado, misto de
filósofo,
justiceiro e poeta, depois de ouvir pacientemente a queixa, procura o conquistador e, sem a
mínima hesitação, mata-o. Justifica o fato como necessário, em nome da paz e do bem-estar do
universo.
X – Sequência: Uma vaca fugitiva retorna a sua fazenda de origem. Decidido a resgatá-la,
um vaqueiro persegue-a com incomum denodo. Ao chegar à fazenda para onde a vaca retornara,
o vaqueiro descobre que havia outro motivo para sua determinação: a filha do fazendeiro, com
quem o rapaz se casa.
XI – O espelho: Um sujeito se coloca diante de um espelho, procurando reeducar seu
olhar, apagando as imagens do seu rosto externo. A progressão desses exercícios lhe permitiu,
daí a algum tempo, conhecer sua fisionomia mais pura, a que revela a imagem de sua essência.
Linguagem próxima da do ensaio, pelo caráter filosófico do enredo.
XII – Nada e a nossa condição: O fazendeiro Tio Man'Antônio, com a morte da esposa e
o casamento das filhas, sente-se envelhecido e solitário. Decide vender o gado, distribuindo o
dinheiro entre filhas e genros. A seguir, divide sua fazenda em lotes e os distribui entre os
empregados, estipulando em testamento uma condição que só deveria ser revelada quando
morresse. Quando o fato ocorre, os empregados colocam seu corpo na mesa da sala da casa-
grande e incendeiam a casa: a insólita cerimônia de cremação era seu último desejo.
XIII – O cavalo que bebia cerveja: Giovânio era um velho italiano de hábitos
excêntricos: comia caramujo e dava cerveja para cavalo. Isso o torna alvo da atenção do
delegado e de funcionários do Consulado, que convocam o empregado da chácara de "seo
Giovânio", Reivalino, para um interrogatório. Notando que o empregado ficava cada vez mais
ressabiado e curioso, o italiano resol-ve então abrir sua casa para Reivalino e para o dele-gado:
dentro havia um cavalo branco empalhado. Passado um tempo, outra surpresa: Giovânio leva
Reivalino até a sala, onde o corpo de seu irmão Jo-sepe, desfigurado pela guerra, jazia no chão.
Reivalino é incumbido de enterrá-lo, conforme a tradição cristã. Com isso, afeiçoa-se cada
vez mais ao patrão, a ponto de ser nomeado seu herdeiro quando o italiano morre.
XIV – Um moço muito branco: Os habitantes de Serro Frio, numa noite de novembro de
1872, tem a impressão de que um disco voador atravessou o espaço, depois de um terremoto.
Após esses eventos, apareceu na fazenda de Hilário Cordeiro um moço muito branco, portando
roupas maltrapilhas. Com seu ar angelical, impõe-se como um ser superior, capaz de prodígios:
os negócios de Hilário Cordeiro, o fazendeiro que o acolheu, tem uma guinada es-pantosamente
positiva. Depois de fatos igualmente miraculosos, o moço desaparece do mesmo modo que
chegara.
XV – Luas-de-mel: Joaquim Norberto e Sa-Maria Andreza recebem em sua fazenda um
casal fugitivo, versão sertaneja de Romeu e Julieta. Certos de que os capangas do pai da moça
viria resgatá-la, todos se preparam para um enfrentamento: a casa da fazenda transforma-se
num castelo fortificado. E nesse clima de tensão que se celebra o casamento dos jovens, a que
se segue a lua-de-mel, que acontece em dose dupla: dos noivos e do velho casal de anfitriões,
cujo amor foi reavivado com o fato. Na manhã seguinte, a expectativa se esvazia com a chegada
do irmão
da donzela, que propõe solução satisfatória para o caso.
XVI – Partida do audaz navegante: Quatro crian-ças, três irmãs e um primo, brincam
dentro de casa, aguardando o término da chuva. A caçula, Brejeiri-nha, brinca com o que lhe
dava mais prazer: as pala-vras. Inventa uma estória do tipo "Simbad, o maru-jo", que ganha
novos elementos quando todos vão para o quintal, brincar a beira de um riacho. Libe-rando sua
fantasia, Brejeirinha transforma um ex-cremento de gado no "audaz navegante", colocando-o
para navegar riacho abaixo.
XVII – A benfazeja: Mula-Marmela era mulher de Mumbungo, sujeito perverso que se
excitava com o sangue de suas vítimas. Esse vampiro tinha um filho, Retrupé, cujo prazer só
diferia do pai quanto à faixa etária das vítimas: preferia as mais frescas. Apesar de amar seu

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homem e ser correspondida, Mula-Marmela não hesitou em matá-lo e depois cegar Retrupé, de
quem se torna guia. Passado algum tempo, resolveu assassiná-lo: percebera que esta seria a
única maneira de refrear o instinto de lobiso-mem do rapaz.
XVIII – Darandina: Um sujeito bem vestido rouba uma caneta, é surpreendido e, para
escapar dos que o perseguiam, escala uma palmeira. Uma multidão acompanha atentamente os
esforços das autoridades que procuram convencer o rapaz a descer. Resistindo, ele diz frases
desconexas e tira toda a roupa, revelando notável equilíbrio físico.
A sessão de nudismo leva um médico a nova tentativa de diálogo. Ao se aproximar, o médico
percebe que o sujeito voltara à normalidade e que, envergonhado, pedia socorro. A multidão,
sentindo-se ludibriada, não aceita esta repentina sanidade e se dispõe a linchá-lo. Sentindo o
risco, o sujeito berra um grito de louvor a liberdade, motivo bastante para a multidão ovacioná-lo
e carregá-lo nos ombros.
XIX – Substância: O fazendeiro Sionésio apaixona-se por sua empregada Maria Exita, que
fora abandonada pela família e criada pela peneireira Nhatiaga. Na fazenda, o ofício de Maria
Exita era o de quebrar polvilho, trabalho duro mas que a moça realizava com prazer e
competência. Embora preocupado com a ascendência da moça, Sionésio sente que a paixão é
maior que o preconceito e pede-a em casamento.
XX – Tarantão, meu patrão: O fazendeiro João-de Barros-Dinis-Robertes tem uma
surpreendente explosão de vitalidade em sua velhice caduca. Como se fora um Quixote,
determina-se a matar seu médico: o Magrinho, sobrinho-neto do fazendeiro. Ao longo da viagem
rumo à cidade,
recruta um bando de desocupados, ciganos e jagunços, que acatam sua liderança, pelo
carisma natural do velho. Chegando à "frente de batalha", Tarantão percebe que era dia de
festa: uma das filhas de Magrinho fazia aniversário. O susto inicial, provocado pela invasão do
"exército", transforma-se em alívio quando o velho discursa, dizendo de seu apreço pela família e
pelos novos amigos, colecionados ao longo da última cavalgada.
XXI – Os cimos: O Menino da primeira estória revela agora a face do sofrimento, causado
pela doença da Mãe, fato que apressa sua viagem de volta à casa paterna. Os últimos dias de
férias são de preocupação. O Menino só relaxava quando via, todas as manhãs e sempre a
mesma hora, um tucano se aproximar da casa dos tios, onde se hospedava. Num processo de
sublimação, desencadeado pela Beleza da ave, o Menino ganha energia para resistir e transferir à
Mãe uma carga de fluidos mentais positivos, que lhe permitam superar a doença. Quando o Tio o
procura para comunicar a melhora da Mãe, o Menino experimenta momentos de êxtase, pois só
ele sabia o motivo da cura.
Foco narrativo
As indicações feitas a seguir são pontuadas com os algarismos que indicam a ordem de
publicação de cada estória no livro.
Terceira pessoa:
I – "As margens da alegria", II – "Famigerado", III – "Sorôco, sua mãe, sua filha";
IV – "A menina de lá"; V – "Os iramos Dagobé"; VIII – "Nenhum, nenhuma",
X – "Seqência";
XIV – "Um moço muito branco";
XIX – "Substância" e
XXI – "Os cimos".
Primeira pessoa:
VI – "A terceira margem do rio";
VII – "Pirlimpsiquice";
IX – "Fatalidade";
XI – "O espelho";
XII – "Nada e a nossa condição";
XIII – "O cavalo que bebia cerveja";
XV – "Luas-de-mel";
XVI – "Partida do audaz navegante";
XVII – "A benfazeja";
XVIII – "Darandi na" e XX – "Tarantão, meu pa-trão".
Dessas onze estórias, apenas duas apresentam o narrador como protagonista: "O espelho" e
"Pirlimpsiquice"; nas outras, o relato e feito por um espectador privilegiado, que presencia a ação
e registra suas impressões a respeito do que assiste. O narrador pode ser também uma
personagem secundária da estoira, com laços de parentesco ou de amizade com o protagonista.
Quanto ao emprego dos tempos verbais, nota-se que, na maior parte das estórias, o relato
se faz através de uma mistura do pretérito perfeito com o pretérito imperfeito do indicativo.
Espaço
A maioria das est6rias se passa em ambiente rural não especificado, em sítios e fazendas;
algumas tem como cenário pequenos lugarejos, arraiais ou vilas. Os ambientes são apresentados

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com poucos mas precisos toques: moldura de altos morros, vas-tos horizontes, grandes rios,
pasto extensos, escassas lavouras. Duas estórias, no entanto – "O espelho" e "Darandina" –,
transcorrem em cidades, pressupostas até como grandes centros urbanos, pelo fato de
mencionarem a existência de secretarias de governo, hospício, corpo de bombeiros, jornalistas,
parques de diversões, prédios de repartições publicas e outros serviços tipicamente urbanos.
Personagens
Embora variem muito quanto a faixa etária e experiência de vida, as personagens se ligam
por um aspecto comum: suas reações psicossociais extrapolam o limite da normalidade. São
crianças e adolescentes superdotados, santos, bandidos, gurus sertanejos, vampiros e,
principalmente, loucos: sete estórias apresentam personagens com este traço.
(Paráfrase do livro Primeiras Estórias – Roteiro de Leitura – Dácio Antônio de
Castro – Editora Ática – Série Princípios)

Postado por Zoom às segunda-feira, outubro 31, 2011

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