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Os Homens do

5 Reino - 1
Ilustrações por so-bin
Aviso Legal:
Obra foi traduzida e revisada de fã para fã. Não venda, ou ganhe dinheiro sobre o traba-
lho de outrem.
Se puderem contribuir com a obra do autor, o faça!

Sobre:
Assim como o anime, a obra tem muitos termos em inglês para diversas armas, itens e
etc...
Tentei deixar isso, mas as vezes tem que generalizar, já que é maçante saber o que era
realmente para ser em inglês, ou não ser.
EX:
-O Ainz se refere a ele como “Magic Caster” e não “Mahou...” alguma coisa.
Porém, algumas ressalvas:
-Alguns sistemas de magias e artes marciais são escritos japonês, alguns eu mantive ro-
majizados, outros ficaram em português.
-Armas e armaduras têm nomes misturados, uns são em inglês, outros em japonês. Por
ser bem difícil de verificar um por um, deixei tudo em inglês;
-Algumas equipes de aventureiros têm nomes em inglês, outras em japonês, neste caso
depende. Umas eu deixei em inglês (pois foram escritas com essa intenção) e outras em
português.

Tentei remover o máximo possível de erros de português e concordância. Mas sou ape-
nas um e com certeza falhas podem acontecer. E claro, não sou especialista na língua
portuguesa para tal nível de proficiência linguística.
Se encontrarem algum erro, sintam-se à vontade para entrarem em contato :)

Créditos e Agradecimentos:
Créditos:
ainzooalgown-br.blogspot.com
Base:
Inglês - skythewood.blogspot.com
Referência de nomes:
Wikia - overlordmaruyama.wikia.com

Atenção: Se baixou este arquivo de outro link que não o oficial do blog. Ou se tem muito
tempo que baixou e deixou guardado, que tal dar uma conferida no blog? Talvez esta seja
uma versão desatualizada :)

Revisão: 1.0A | Versão: 1.0A


Sumário
Prólogo ......................................................................................................................................................... 5
Capítulo 01: Os Sentimentos de Um Garoto ......................................................................16
Parte 1 ....................................................................................................................................................................................................................17
Parte 2 ....................................................................................................................................................................................................................25
Parte 3 ....................................................................................................................................................................................................................31
Parte 4 ....................................................................................................................................................................................................................51
Capítulo 02: As Rosas Azuis........................................................................................................56
Parte 1 ....................................................................................................................................................................................................................57
Parte 2 ....................................................................................................................................................................................................................76
Parte 3 ....................................................................................................................................................................................................................95
Interlúdio................................................................................................................................................ 100
Capítulo 03: Aqueles Que Pegam, Aqueles Que São Pegos .................................. 108
Parte 1 ................................................................................................................................................................................................................. 109
Parte 2 ................................................................................................................................................................................................................. 129
Capítulo 04: Homens Congregados ......................................................................................... 167
Parte 1 ................................................................................................................................................................................................................. 168
Parte 2 ................................................................................................................................................................................................................. 171
Parte 3 ................................................................................................................................................................................................................. 174
Parte 4 ................................................................................................................................................................................................................. 192
Capítulo 05: Brasas Apagadas, As Faíscas Esvoaçantes............................................... 212
Parte 1 ................................................................................................................................................................................................................. 213
Parte 2 ................................................................................................................................................................................................................. 231
Parte 3 ................................................................................................................................................................................................................. 257
Posfácio .................................................................................................................................................. 268
Ilustrações .............................................................................................................................................. 271
Glossário ................................................................................................................................................ 286
-Volume 05-
Os Homens do Reino -Parte 1-

Autor:

Maruyama Kugane
Ilustrador:

so-bin
Prólogo
1º Dia do mês Baixo Fogo (9º mês) – 14:15

uando ele olhou para cima, uma leve garoa começou a cair das nuvens es-

Q curas que cobriam o céu desde a manhã de hoje, como se não pudessem
mais conter toda a precipitação.

Gazef Stronoff, o Capitão Guerreiro do Reino, estalou a língua ruidosa-


mente enquanto olhava para o mundo cinza-escuro diante dele.

Se ele tivesse saído mais cedo, talvez já estivesse em casa agora.

Ele olhou para cima novamente e viu que as nuvens enchiam o céu acima de Re-Estize,
a capital real do Reino. Provavelmente não havia motivo para a chuva parar.

Portanto, ele decidiu não ficar no Palácio Real. Depois de vestir o capuz de sua capa, ele
saiu para a chuva.

Os guardas do portão abriram caminho quando o viram e ele entrou na estrada principal
da Capital Real.

Normalmente estaria cheio de vida e movimentada, mas agora não havia quase ninguém,
apenas alguns pedestres andando cuidadosamente na estrada encharcada, tomando cui-
dado para não escorregarem.

Não havia quase ninguém por perto e a chuva já caia há algum tempo.

Bem, já que é assim, não resta nada que eu possa fazer... Ter saído mais cedo não faria a
menor diferença.

A chuva intensa encharcava o exterior de sua capa fazendo com que ficasse pesada. Ele
caminhou silenciosamente através da chuva, passando por vários outros que estavam
igualmente vestidos com roupas de chuva. Mesmo que seu manto lhe desse uma medida
de proteção contra a chuva, a sensação pegajosa do pano úmido contra a pele era des-
confortável. Gazef apressou os passos e foi para casa.

Gazef soltou um suspiro de alívio quando se aproximou de casa e se livrou da capa en-
charcada. Só então, algo chamou sua atenção. Um homem imundo estava sentado em um
beco, sem se importar com a chuva que envolvia o mundo como um véu, estava atrofiado
dentro de um beco que ficava a uma curta distância da estrada principal.

O cabelo do homem parecia ter sido tingido a esmo, e podia-se ver a cor original nas
raízes. Seu cabelo estava grudado na testa pela chuva e coberto de gotas de água. Sua
cabeça estava baixa e seu rosto não podia ser visto.

A atenção de Gazef foi atraída para ele, Gazef estava intrigado com a forma como o ho-
mem não estava usando qualquer capa de chuva e parecia totalmente despreocupado
com o fato de que ele estava completamente encharcado. Algo parecia se destacar em sua
imagem — particularmente sua mão direita, que mais chamava atenção.

A mão direita apertava com força uma arma, como uma criança agarrada à mão da mãe.
Parecia bastante incongruente com a aparência desgrenhada do homem. Era uma arma
que vinha dos distantes desertos do sul, um tesouro raro e precioso conhecido como Ka-
tana.

Ele está segurando uma espada... é um bandido? Não... não é isso que sinto. Ele não é nada
disso. Parece quase que... nostálgico?

Um sentimento bizarro cresceu no coração de Gazef. Algo estava errado aqui, como se
ele tivesse abotoado a camisa com os botões na ordem errada.

Gazef parou para olhar o perfil do homem. Quando ele percebeu quem estava olhando,
as lembranças tomaram conta dele como o quebrar de uma grande onda.

“Não me diga que você é... Un-Unglaus?”

Mesmo quando ele disse isso, Gazef pensou:

Não pode ser.

Brain Unglaus. Seu adversário nas finais do torneio marcial do Reino.

A imagem do homem que lutou tão ferozmente e tão intimamente com ele ainda estava
marcada na mente de Gazef. Ele tinha sido o guerreiro mais forte que Gazef já havia en-
frentado desde que pegara a espada. Talvez fosse apenas um pensamento desejoso da
parte de Gazef, mas ele considerava que Brain era um adversário digno e não conseguia
esquecer o rosto do homem.

Sim, o perfil emaciado do homem diante dele era mais ou menos semelhante ao de seu
rival.

No entanto — isso não poderia ser verdade.

Suas características faciais eram muito semelhantes. Os anos poderiam tê-lo mudado,
mas Gazef ainda se lembrava da maneira como ele parecia naquela época. No entanto, o
homem na memória de Gazef não tinha uma expressão tão patética no rosto. Aquele ho-
mem estava absolutamente confiante em sua esgrima e seu espírito de luta queimava
latente como um inferno. Ele não parecia em nada com essa casca patética de um homem.

Com a água caindo ao redor dele, Gazef caminhou em direção ao homem em questão.

O homem pareceu reagir ao som e, lentamente, levantou a cabeça.


Gazef respirou fundo. Vê-lo de frente o fez mudar de idéia. Não havia dúvida de que esse
homem era Brain Unglaus, o espadachim gênio.

No entanto, o Brain diante dele havia perdido o brilho de seu passado, agora não era
nada mais do que um cachorro de rua.

Brain levantou-se instável em seus pés. Nenhum guerreiro jamais se permitiria mover-
se de forma tão lenta e preguiçosa. Mesmo um veterano idoso não agiria dessa maneira.
Seus olhos estavam abatidos quando ele se virou e saiu, seus passos estavam desprovi-
dos de energia.

Sua forma se encolheu na chuva. Gazef teve a sensação de que, se deixasse Brain ir agora,
nunca mais o veria, por isso gritou apressadamente:

“...Unglaus! Brain Unglaus!”

Se o homem tivesse dito: “Me confundiu com outro”, Gazef teria dito a si mesmo que
tinha visto apenas alguém parecido com ele. No entanto, uma voz fraca e trêmula, como
o zumbido de um mosquito, penetrou nos ouvidos de Gazef.

“...Stronoff?”

Era uma voz totalmente sem vida. Foi completamente diferente da voz do Brain que
apontou a espada para ele.

“O que está acontecendo? O que aconteceu com você?”

Perguntou Gazef em choque.

Mas o que estava acontecendo?

Qualquer homem poderia sucumbir, não importando quem fosse. Gazef tinha visto mui-
tas pessoas assim. Aqueles que queriam fugir das coisas e buscar refúgio na mediocri-
dade muitas vezes perderam tudo cometendo um único erro.

No entanto, ele não conseguia conectar pessoas assim à Brain Unglaus, afinal ele era o
espadachim gênio. Talvez ele não quisesse admitir que seu mais forte inimigo poderia
ter se degenerado a este ponto.

Seus olhos se encontraram.

Que tipo de cara é essa...

Suas bochechas estavam vazias e havia círculos escuros sob seus olhos. Os ditos olhos
estavam sem vida e seu rosto estava pálido. Ele parecia um cadáver.
Não, um cadáver seria melhor que isso... Unglaus, você parece um Zombie...

“...Stronoff. Está quebrado.”

“O quê?”

A primeira coisa que Gazef fez quando ouviu isso foi olhar para a espada na mão de
Brain. E então, Gazef percebeu que estava enganado. Não foi sua espada que foi quebrada

“Diga, somos fortes?”

Gazef não pôde responder “Somos fortes”.

Ele pensou no incidente do Vilarejo Carne. Naquela época, ele teria morrido com seus
homens se o poderoso magic caster chamado Ainz Ooal Gown não viesse salvá-los. O ho-
mem conhecido como o Mais Forte do Reino só pensava nisso. Ele não se atrevia a falar
com orgulho de sua força.

Gazef não sabia como Brain havia interpretado seu silêncio, mas o outro homem conti-
nuou:

“Fraco. Somos tão fracos... Nós somos apenas humanos, afinal, e os humanos são fracos.
Nossas habilidades de espada não passam de lixo. No final, não somos mais do que for-
mas de vida inferiores conhecidas como seres humanos.”

Era verdade; os humanos eram fracos.

Isso era óbvio quando eles eram comparados aos Dragões, a raça mais poderosa. Os hu-
manos não tinham escamas robustas, garras afiadas ou asas para levá-los através dos
céus. Nem eles poderiam expelir uma respiração que poderia aniquilar tudo diante deles.
Como os humanos poderiam competir com coisas assim?

Foi por isso que os guerreiros frequentemente desafiavam os Dragões para provar sua
força. Confiar na experiência, companheiros e as armas para derrotar um inimigo com
uma enorme vantagem nas habilidades físicas era glorioso, uma realização da qual ape-
nas alguns guerreiros excepcionais poderiam se orgulhar.

Sendo esse o caso, Brain teria falhado em matar um Dragão?

Será que ele alcançou um pico muito grande, porém tropeçou e assim caiu?

“...Eu não entendo. Qualquer guerreiro deveria saber disso, não? Os humanos sempre
foram fracos.”

De fato, ele não entendeu. Todos estavam familiarizados com o conceito de um pico ina-
cessível.
Gazef era saudado como o mais poderoso guerreiro das nações vizinhas, mas ele ainda
tinha dúvidas sobre si mesmo.

Por exemplo, poderia haver um guerreiro que fosse mais forte que Gazef, escondido na
Teocracia. Além disso, demi-humanos como Ogros e espécies gigantoides tinham melho-
res habilidades físicas do que Gazef, um humano. Portanto, se essas raças conseguissem
avançar suas habilidades para igualar as de Gazef — ou até mesmo se suas habilidades
fossem um pouco inferiores às deles — ele não seria capaz de vencê-los.

Gazef sabia que tais picos existiam mesmo que não pudessem ser vistos. Será que Brain
não entendeu isso? Parecia senso comum para qualquer guerreiro.

“Bem, existem raças mais fortes que nós. É por isso que treinamos para derrotá-las, não?”

Ele tinha que acreditar que ele poderia alcançar as alturas desses picos algum dia.

E então, Brain sacudiu a cabeça com força. A água do cabelo encharcado de chuva espir-
rou em todas as direções.

“Não! Isso não basta!”

Ele gritou como se estivesse vomitando sua vida.

O homem diante dele finalmente começou a se assemelhar à imagem nas memórias de


Gazef. Ele podia sentir algo parecido com o espírito que Brain mostrara enquanto empu-
nhando sua espada. No entanto, o conteúdo do que ele disse estava em desacordo com o
mesmo espírito.

“Stronoff! Não dá para vencer o verdadeiramente poder não importa o quanto treine!
Os humanos não podem fazer isso. Esse é o verdadeiro significado do poder. Nossa força
é risível, é brincadeira de criança para eles. Nós não somos nada mais do que crianças
brincando de guerreiros!”

Ele parecia ter perdido a calma ao encarar Gazef.

“...Me escute, Gazef. Você está muito confiante em suas habilidades com a espada, não é?
Mas... não é nada além de lixo. Você se apega ao seu lixo e acha que pode proteger as
pessoas?!”

“...Você viu algo tão poderoso assim?”

“Eu vi. Senti na pele. Era uma altura que nenhum humano poderia alcançar. Ou melhor...”

Brain sorriu, zombando de si mesmo antes de continuar:


“Eu nem sequer vi o quão alto esse pode realmente era. Eu estava fraco demais para
sequer vislumbrar uma coisa assim. Ela estava apenas brincando comigo. Que piada.”

“Então você deve treinar com mais afinco, na esperança de um dia poder vê-lo—”

Brain de repente reagiu, e seu rosto se contorceu de raiva.

“Você não entende nada! Homens não podem sequer chegar perto daquele monstro! Até
a esgrima perfeita não te levará até lá, tenho certeza disso! ...É tudo inútil. O que eu estava
pensando ao sonhar alcançar isso um dia?”

Gazef não tinha nada a dizer.

Ele tinha visto pessoas com cicatrizes na alma antes. Essas pessoas perderam toda a
esperança na vida porque seus amigos morreram diante deles.

Ninguém poderia salvá-los. Ninguém mais poderia ajudá-los. Eles tiveram de superar
isso e se recompor novamente. Caso contrário, não havia sentido em estender uma mão
amiga a eles.

“...Unglaus.”

“...Ouça-me, Stronoff. A força da espada não é nada. Em face do verdadeiro poder, não é
nada além de lixo.”

Gazef não viu nenhum sinal do rosto heroico que outrora fôra Brain.

“...Estou muito feliz por ter te conhecido.”

Gazef assistiu Brain sair com a dor marcada nos olhos.

Depois de ver os restos patéticos e totalmente quebrados do homem que um dia ele
considerara seu rival mais forte, Gazef não conseguiu mais chamar sua atenção. No en-
tanto, ele disse uma coisa antes de sair; Uma coisa que Gazef não podia fingir que não
ouvira.

“Agora... eu posso morrer.”

“Espere! Espere, Brain Unglaus!”

Um fogo ardia no coração de Gazef enquanto gritava atrás de Brain.

Ele deu um passo à frente e agarrou o ombro de Brain.

O andar vacilante de Brain não era nada parecido com quem ele tinha sido no passado.
Mesmo assim, quando Gazef puxou seu ombro com toda a força, ele perdeu o equilíbrio,
mas não caiu. Isso porque ele havia treinado a exaustão e seu senso de equilíbrio ainda
era muito bom.

Isso deixou Gazef um pouco à vontade. Seus instintos lhe disseram que a força de seu
rival não diminuíra.

Ainda havia esperança. Ele não podia ver um homem morrer assim.

“...O que você está fazendo?”

“Venha para minha casa.”

“Pare. Não me ajude. Eu só quero morrer... não quero mais viver com medo. Eu não
quero me esconder nas sombras ou pensar que alguém está me perseguindo. Não
aguento mais a realidade. Não quero admitir que bradei um pedaço de lixo e achei que
era alguém.”

O tom suplicante de Brain provocou irritação no coração de Gazef.

“Cala a boca. Apenas me siga.”

Mesmo dizendo a Brain para segui-lo, na verdade, Gazef estava apenas arrastando Brain
pelo braço. Os passos de Brain eram instáveis, mas ele não resistiu e seguiu obediente-
mente. Depois de ver Brain assim, um sentimento de desagrado cresceu em Gazef que ele
não conseguia articular.

“Não fique assim, quando chegarmos você vai comer algo e dormir um pouco.”

26º Dia do mês Meio Fogo (8º mês) – 13:45

Capital Real de Re-Estize, do Reino Re-Estize.

A capital dessa nação de nove milhões de pessoas poderia ser melhor descrita como
uma cidade envelhecida. Isso não apenas descrevia sua longa história, mas sugeria que a
vida aqui era simples, imutável e estagnada como sempre foi — entre outras coisas.

Isso era óbvio no momento em que alguém andasse pelas ruas.

As casas ao redor eram velhas e simples para a maioria dos cantos que alguém olhasse.
Quase nenhuma delas eram novas ou chiques. No entanto, havia muitas maneiras de ver
esse cenário. Alguns considerariam que ele seria rico em sabor histórico, enquanto ou-
tros o considerariam entediante e obsoleto.

A Capital Real parecia ser a mesma de sempre, perdurando temporada após estação ao
longo dos séculos.
Mas, claro, nada poderia permanecer inalterado para sempre.

♦♦♦

Muitas estradas na Capital Real não eram pavimentadas, e toda vez que a chuva chegava,
elas se transformavam em um lamaçal, criando assim uma visão que não pertencia a uma
cidade. Claro, isso não significa que os padrões do Reino fossem baixos. Pelo contrário,
os padrões do Império e da Teocracia que eram altos demais, de modo que nem sequer
poderiam ser comparados.

As ruas também não podiam ser consideradas largas. Portanto, ninguém andava no
meio da estrada — onde as carruagens passavam. Em vez disso, os cidadãos se esfrega-
ram em procissões confusas nos lados das ruas. Os cidadãos da Capital Real estavam
acostumados a isso e podiam atravessar a massa humana como a lançadeira de um tear
através da trama de fios. Mesmo quando duas pessoas estavam prestes a colidir umas
com as outras, elas escapavam momentos antes do impacto.

No entanto, a rua onde Sebas estava andando diferia em muito das outras. A superfície
era pavimentada — uma raridade na capital — e a estrada em si era larga.

A razão para isso ficou imediatamente aparente quando observava os dois lados da rua.
As casas ao longo desta rua eram régias e bem mobiliadas, irradiando uma atmosfera de
riqueza e prosperidade.

Isso porque essa avenida movimentada era a principal estrada da Capital Real.

Algumas senhoras se viraram para observar enquanto Sebas passeava em grande estilo,
atraídas por seus traços bonitos e seu distinto porte cavalheiresco. Algumas até lançaram
piscadelas com seus longos cílios para ele, mas Sebas não lhes deu atenção. Ele continuou
em frente com as costas retas, olhos fixos e passos ordenados sem muita pressa.

Seu passo inexorável — que não aparentava sinais de parar antes de chegar ao seu des-
tino — de repente parou. Então, ele olhou para os dois lados, examinando as carruagens
que se aproximavam de ambos os lados, e então atravessou a rua principal.

Ele caminhou em direção à uma velha senhora. Havia uma bolsa cheia de mercadorias
no chão, e a velha senhora estava massageando os tornozelos.

“É algo sério?”

A velha senhora foi surpreendida quando alguém subitamente começou a conversar


com ela. Ela levantou a cabeça, um olhar cauteloso em seu rosto. No entanto, o olhar de
Sebas e seu estilo opulento de vestir fizeram essa cautela desaparecer.

“A senhora parece estar em perigo. Posso ajudá-la em algo?”


“Não, tudo bem. Como eu poderia deixar um homem tão gentil como o senhor me aju-
dar...”

“Por favor, não dê atenção a isso. Afinal, ajudar os que estão com problemas é bom
senso.”

Sebas sorriu de maneira uniforme e a senhora corou. Aquele sorriso encantador, vindo
de um distinto cavalheiro como ele, rompeu as barreiras finais de seu coração.

A senhora havia corrido, ela estava a caminho de casa depois de fechar a longe depois
do longo dia. No entanto, ela torceu o tornozelo no meio do caminho, o que a irritou muito.

As ruas principais eram comparativamente seguras, mas isso não implicava que todas
as pessoas que a percorriam fossem de boa índole. Se ela pedisse ajuda à pessoa errada,
ela poderia acabar perdendo tudo o que tinha. A senhora tinha ouvido falar de tais roubos
antes, razão pela qual ela estava desconfiada de pedir a alguém.

Sendo esse o caso, a solução era simples.

“Eu a levarei para casa. Poderia me mostrar o caminho?”

“Senhor, está realmente bem com isso?”

“Claro. Tendo encontrado alguém que precisa de ajuda, fico contente em ajudar.”

Sebas virou as costas para a velha senhora enquanto ela agradecia.

“Venha, eu lhe darei uma carona.”

“Mas... mas...”

A senhora respondeu desconfortavelmente e completou:

“Minhas roupas estão sujas, vai acabar se sujando!”

Contudo—

Sebas sorriu amavelmente.

O que importava se suas roupas estivessem manchadas? Não havia necessidade de se


preocupar com essas ninharias ao ajudar alguém em necessidade.

Ele inconscientemente lembrou os rostos de seus colegas da Grande Tumba de Nazarick.


Eles provavelmente reagiriam a isso com surpresa, aborrecimento ou desprezo. Ainda
assim, não importa o que Demiurge — que era o mais fortemente contra esse tipo de
coisa — dizia a ele, Sebas estava convicto do que era certo.
Ajudar os outros era a coisa certa a fazer.

Depois de persuadir a senhora, ele a carregou de costas e levantou a bolsa com uma das
mãos.

Mesmo os espectadores — para não falar da senhora — ofegaram ao vê-lo caminhando


com passos largos, apesar de carregar aquela pesada bolsa.

Guiado pela senhora, Sebas partiu.


Capítulo 01: Os Sentimentos de Um Garoto
Parte 1

2º Dia do mês Baixo Fogo (9º mês) – 23:30

homem acendeu a lanterna que pendia de sua cintura. Usava um óleo espe-

O cial como combustível, produzia uma chama verde e emitia uma luz de apa-
rência assustadora que iluminava o ambiente.

Ele saiu e sentiu como se estivesse entrando numa parede de calor. Um


olhar de desgosto cruzou o rosto do homem, mas a esta estação do ano sempre foi quente
e nada poderia ser feito sobre isso. Por volta desse período, todos os lugares do Reino
ainda estavam úmidos e desagradáveis, mesmo depois do pôr do sol. Dito isto, o horário
de calor severo se foi, e a temperatura deveria diminuir com o passar do tempo.

Ainda assim, não havia sinal de que a sensação amena chegaria.

“Ah, hoje foi muito quente também.”

“Sim. Ouvi dizer que é mais frio no norte, perto do oceano” Resmungou o homem. Seu
parceiro para esta noite respondeu:

“Se ao menos viesse alguma chuva. Isso aliviaria esse calor.”

Ele olhou para o céu quando disse isso. O céu estava limpo; não havia nuvens e muito
menos sinais de nuvens de chuva. As constelações pareciam anormalmente grandes, mas
era simplesmente o céu noturno habitual.

“Sim, até mesmo chuvisco já seria bom... mas tudo bem, hora de trabalhar.”

Não seria correto descrever esses homens como aldeões comuns. Para começar, eles
estavam armados. Usavam armaduras de couro e tinham espadas longas na cintura; mi-
litarizado demais para os guardas comuns de aldeias. Além disso, seus rostos e corpos
não se pareciam com os dos agricultores, mas insinuavam uma familiaridade com a vio-
lência.

Os dois entraram no vilarejo silencioso.

Envolto na noite, o vilarejo ficou em silêncio, exceto por seus passos. Eles avançaram
firmemente em meio a essa atmosfera sinistra, como se fosse um local abandonado. Suas
atitudes calmas sugeriam que patrulhas como essas eram rotina para eles.

O vilarejo em que entraram estava cercado por um muro alto e havia seis torres de vigia
à vista. Elas pareciam robustas e bem construídas; vilarejos fronteiriços que eram fre-
quentemente atacadas por monstros não se orgulhavam de formidáveis torres de vigia.
Estava mais parecido com uma base militar do que um vilarejo.

Mesmo assim, um terceiro pode considerar apenas que este seja um vilarejo fortemente
fortificado. No entanto, olhando mais atentamente mostrava algo digno de enrugar as
sobrancelhas.

Em circunstâncias normais, a maioria das pessoas apenas cercaria residências e arma-


zéns ao construir um muro e ao deixar os campos de cultivo do lado de fora. Isso porque
um muro que era grande o suficiente para incluir os campos seria um investimento rui-
noso de tempo e dinheiro. No entanto, esse vilarejo fez exatamente isso, cercando os
campos verdes de plantações que balançavam no vento noturno em seus muros, dentro
do vilarejo. Era como se as referidas culturas fossem barras de ouro que tinham de ser
guardadas.

Os homens que caminhavam por esse estranho vilarejo sentiram alguém olhando para
eles de uma torre de vigia. O fato era que havia homens armados de arco nas torres. Tudo
o que ele precisava fazer era levantar a lanterna para o alto em caso de emergência, e
seus amigos iriam em seu auxílio.

Dito isso, quando ele pensava sobre as habilidades de seu colega, o homem não estava
muito empolgado em relação ao fogo de cobertura dos disparos de flechas. No entanto,
ele se tranquilizava pelo fato de que seus amigos poderiam acordar seus companheiros
ao tocar o alarme.

Seus colegas — que dormiam entre os turnos — lhe dariam uma bronca se ele erguesse
a lanterna por engano. Claro, o homem estava determinado a acenar ao menor sinal de
que algo estava errado.

Ele não queria perder sua vida por ter cometido algum deslize, por menor que fosse.

Dito isso, ele na verdade não achava que algo ruim aconteceria. Eles estavam realizando
as mesmas patrulhas por vários meses, e ele imaginou que essas patrulhas continuariam
para sempre.

Enquanto considerava o seu futuro com desgosto, o homem continuou sua lenta cami-
nhada através de sua rota habitual.

Na metade de sua patrulha, algo como uma serpente de repente se enrolou no pescoço
do homem. Não — não era uma cobra. O objeto que envolveu sua boca e não soltou era
quase que um tentáculo de polvo.

Logo depois que levantou o queixo do homem, uma dor lancinante floresceu sobre a
garganta exposta. Essa sequência de ações levou menos de um segundo.

Um som gorgolejante, como o de beber, saiu de sua garganta.


Esse foi o último som que o homem ouviu.

♦♦♦

A mão segurando sua boca o soltou, apoiando-o por trás para que ele não caísse no chão.
Depois de verificar que o homem havia sido completamente exsanguinado, seu agressor
[ L â m i n a V am pir a ]
retirou a Vampire Blade, a arma que o matou.

O ser segurando o homem na posição vertical era uma figura de preto. Seu corpo inteiro
estava obscurecido em vestes pretas, exceto seus olhos. A referida roupa era feita de te-
cido, com manoplas e outras peças de armadura para melhorar a capacidade defensiva.
Uma placa de metal cobria seu peito, mas se projetava visivelmente, dando a forma de
um par de seios femininos.

Outra figura similarmente vestida surgiu das costas do outro homem. Bem semelhante
ao seu par, também usava um peitoral de metal. A primeira olhou para a segunda e as-
sentiu.

Ela examinou seus arredores depois de verificar a morte silenciosa de sua vítima. Apa-
rentemente ninguém havia notado.

Em algum lugar em seu coração, ela deu um suspiro de alívio.

As lanternas os iluminavam, mas os observadores da plataforma acima não deveriam


poder vê-los, dado que estavam pressionadas firmemente contra os dois homens. Tudo
o que elas precisavam se preocupar era se pudessem ser vistas ao usar o 〈Yami Wa-
tari〉 — um teleporte de curta distância de uma sombra para outra — mas essa preocu-
pação era uma coisa do passado agora.

Ela não prestou atenção ao punhal, cuja tonalidade vermelha brilhante se tornara ainda
mais vibrante após a drenagem do sangue, e segurava o corpo do homem antes que ele
desmoronasse.

Da plataforma de observação acima, parecia que os dois homens de patrulha haviam


parado em suas trilhas. No entanto, se elas mantivessem os dois homens parados ou
deixá-los cair no chão, alguém suspeitaria.

Algo tinha que ser feito imediatamente. No entanto, esse não era o trabalho delas.

De repente, a mulher sentiu o corpo flácido do homem deslizar sob suas mãos, como se
alguém tivesse colocado uma estaca nele. No momento seguinte, ela sabia que não estava
enganada; o homem balançou em movimentos truncados.

O homem ainda estava se movendo apesar de estar claramente morto, mas a mulher
não ficou alarmada. Tudo estava acontecendo como planejado.
Ela soltou e ao mesmo tempo ativou uma habilidade. Esta foi uma técnica ninja que ela
aprendeu, chamada 〈Kage Hisomi〉. Com essa habilidade, ela poderia se fundir perfei-
tamente com qualquer sombra e se tornar invisível a olho nu.

As duas se misturaram nas sombras dos homens, e os homens se adiantaram, como se


tivessem sido subitamente abjugados. Depois da pausa seguida pela maneira como eles
percorreram a rota de patrulha original foi como se tivessem lembrado de repente do
que tinham que fazer. No entanto, eles se moviam devagar e desajeitadamente. Suas fe-
ridas não foram curadas, mas também não sangravam. Isso porque o sangue foi drenado
completamente de seus corpos.

Os dois homens se tornaram Zombies, seguindo obedientemente a vontade de sua cria-


dora. Não havia outra explicação para como eles ainda poderiam se mover naquele es-
tado.

As mulheres não tinham essa habilidade.

Para um simples observador, havia apenas dois homens aqui. Mesmo se visse através
da camuflagem das mulheres, haveria apenas quatro pessoas aqui. No entanto, havia uma
quinta pessoa presente. Esta quinta pessoa foi a responsável por criar este Zombie.

As mulheres não a enxergavam, mas uma das habilidades ninja que aprenderam permi-
tiu-lhes detectar a presença daqueles que estavam escondidos por magia ou outras ha-
bilidades, e uma dessas entidades estava diante delas.

“As preparações aqui estão completas.”

“Perfeito.”

Ela falou em baixo tom e recebeu uma resposta igualmente abafada.

“Mm, entendi, eu vi tudo. Vou para o próximo local. Preciso pegar alguém que seja sufi-
cientemente importante.”

Outra voz feminina falou. No entanto, mais aguda, dando a impressão de uma tenra don-
zela.

“Começaremos nosso ataque também. E as outras?”

“Elas estão relaxando porque não podem fazer nada?”

“Até parece. Elas estão se escondendo perto do vilarejo, se posicionaram lá. Em uma
emergência, elas lançarão um ataque frontal coordenado com vocês para um ataque de
pinça. Tudo bem, eu estou indo em direção a Prioridade Um. Atenham-se ao plano.”
Sua companheira oculta flutuou graciosamente — pelo menos, elas tiveram essa im-
pressão — no céu. Parecia consistente com o movimento concedido pela magia 「Fly」.

A presença se afastou ainda mais, até que ela desapareceu na construção que designara
como Prioridade Um. Esta era uma das estruturas dentro do vilarejo e um ponto chave
que tinha que ser tomado.

Na verdade, outros edifícios deveriam ter prioridade mais alta, mas este lugar tomou
precedência sobre os outros uma vez que o problema da magia 「Message」 entrava em
jogo.

Muitas pessoas consideravam essa forma de comunicação mágica como não confiável e,
portanto, raramente era usada. No entanto, houve outros que não pensaram nisso e usa-
ram-no. Por exemplo, havia o Império e seu quadro de magic casters treinados nacional-
mente, um certo número de operadores importantes que valorizavam a recepção rápida
de informações e, em seguida, os inimigos que controlavam esse vilarejo. Portanto, sua
principal prioridade era apreender o pessoal de comunicações dentro daquela constru-
ção.

Já que sua colega já estava a caminho, elas precisavam se esconder perto do objetivo o
mais rápido possível. Isso porque elas tiveram que agir simultaneamente e lançar seu
ataque antes que o inimigo descobrisse sua presença.

As duas ninjas respiravam rapidamente enquanto corriam.

As pessoas normais não conseguiriam seguir o caminho entre um canto escuro para o
outro. Além disso, quando elas usavam os itens mágicos que carregavam consigo, até
mesmo aventureiros de alto nível teriam dificuldade em identificá-las. Em outras pala-
vras, ninguém no vilarejo poderia detectá-las.

Uma delas mostrou uma série de sinais manuais para a outra enquanto corria. Embora
fosse apenas uma série de movimentos de flexão de dedos, o significado ficou imediata-
mente claro.

“—Nós tivemos sorte que eles não têm cachorros.”

Veio a resposta: “Concordo”.

Esta era a linguagem de sinais, de um tipo comumente utilizado por assassinos. Para
consumar profissionais como elas, esses sinais manuais eram tão rápidos quanto a fala
normal. Elas também ensinaram essa linguagem as suas companheiras, mas consegui-
ram aprender como fazer gestos simples e sinais secretos básicos. Em contraste, as duas
tinham um “vocabulário” amplo o bastante e velocidade de sinalização suficiente para
usar aquela linguagem de sinais para a fala cotidiana, e frequentemente transmitiam
mensagens secretas entre si dessa maneira.
“—Além do mais. As coisas são muito mais fáceis sem cães sendo atraídos pelo cheiro de
sangue.”

Se os patrulheiros trouxessem cães com eles, os assassinatos não teriam sido tão fáceis.
Elas tinham maneiras de lidar com cães, mas era melhor não ter que lidar com coisas
problemáticas.

Após sua resposta, sua companheira rapidamente sinalizou:

“—Então, eu vou para o edifício que fui designada.”

Ela respondeu: “Entendi”, e então sua companheira se afastou para o lado.

Com isso ela ficou sozinha enquanto avançava. Ela olhou de lado para os campos.

Esses campos não cultivavam trigo, grãos ou vegetais verdes. As plantas lá eram o in-
grediente básico para uma droga proibida cuja propagação estava em ascensão em todo
o Reino, chamada “Pó Preto”. Havia muitos desses campos dentro dos muros deste vila-
rejo, e todos cultivavam a mesma colheita. Isso provou que este vilarejo era um centro
de cultivo de drogas.

♦♦♦

A droga conhecida como Pó Preto também era conhecida como Pó de Lailah. Era uma
substância preta e pulverulenta que era dissolvida em água ou drinks.

Essa droga era fácil de produzir em massa, barata, e dava aos seus usuários acessibili-
dade à uma grande sensação de intoxicação. Assim, se tornou uma das drogas mais fa-
mosas do Reino. Embora fosse tóxica além dos efeitos acima mencionados, seus usuários
frequentemente acreditavam que não tinha efeitos colaterais, e isso os levou a abusar de
seu consumo sem se acanhar.

Ela bufou ao pensar nos efeitos colaterais do Pó Preto.

Todas as drogas tinham efeitos colaterais. “Eu posso parar de usar quando eu quiser” era
o material dos delírios de um louco. Depois de dissecar os cadáveres dos viciados em pó
preto, eles descobriram que seus cérebros tinham encolhido para quatro quintos do ta-
manho de uma pessoa normal.

O Pó Preto, feito de uma mistura de plantas silvestres, era originalmente um poderoso


veneno. Quem acreditaria que uma planta tão tóxica não era venenosa?

O Pó Preto onipresente nas ruas era um narcótico foi feito a partir do cultivo da planta
original que tinha potência reduzida.
Mesmo assim, o Pó Preto ainda era muito venenoso e só seria eliminado do corpo depois
de muito tempo. Como resultado, muitos viciados que tentavam parar de usar a droga,
muitas vezes se dosaram novamente antes que a mesma deixasse completamente o
corpo. Como resultado, depois de chegar a um certo estágio de dependência, era quase
impossível para os usuários abandonarem o vício de uma hora para outra, a menos que
os sacerdotes usassem sua magia para forçar a limpeza da droga em seu sistema.

A parte mais problemática sobre drogas como essas eram seus sutis sinais de depen-
dência. Mesmo os usuários em uma badtrip não mostram sinais de violência física e nem
prejudicavam os outros. Assim, o alto escalão do Reino não entendia o perigo do Pó Preto
e praticamente receberam sua aprovação silenciosa.

Não era de admirar que o Império tivesse apresentado queixas formais sobre o assunto,
sob a suspeita de que o Reino estava administrando uma indústria clandestina de drogas.

Nos tempos que agia como assassina, ela usou Pó Preto em algumas ocasiões, e sua or-
ganização cultivava as plantas necessárias para fazê-lo. Como resultado, ela não se opu-
nha pessoalmente à substância. Drogas como essa podem ser usadas de maneira eficaz
se aplicadas adequadamente. O fato era que era simplesmente uma erva medicinal peri-
gosa.

No entanto, ela havia sido contratada para esse trabalho e sua opinião pessoal não tinha
nada a dizer. Ainda assim—

...Solicitações que não passam pela Guilda dos Aventureiros são um pouco perigosas.

—Ela não ficou totalmente à vontade com esse pedido.

Ela franziu a testa sob o pano cobrindo o rosto. A solicitante desse trabalho era amiga
da líder de sua equipe. Ela estava segura de que a outra parte iria remunerá-las apropri-
adamente, mas não passar pela Guilda poderia causar problemas. Isso era verdade
mesmo se elas fossem uma das duas equipes de aventureiros adamantite do Reino.

Hm, não são três agora?

Enquanto pensava sobre a mais nova equipe de aventureiros adamantite, ela chegou ao
edifício designado Nº Dois.

Sua tarefa era recuperar toda a inteligência dentro desse prédio e, depois, incendiar os
campos.

A fumaça espessa emitida pelas drogas queimadas era venenosa, mas tinha que ser feito
para completar a missão.

Era bem possível que o vento pudesse levar a fumaça em uma direção que prejudicasse
os aldeões, mas elas não tinham tempo nem capacidade de evacuar os aldeões.
Sacrifícios devem ser feitos.

Com essas palavras para si mesma, ela descartou todos os pensamentos sobre a segu-
rança dos aldeões.

Ela foi treinada como assassina desde a infância, e a morte raramente incomodava seu
coração. Em particular, ela não se importava com os tristes destinos de estranhos, inde-
pendentemente das tragédias que os atingissem. A única coisa que ela não gostava era o
olhar no rosto de sua líder sempre que alguém tinha que ser sacrificado. No entanto, ela
havia obtido a aprovação de sua líder durante a elaboração deste plano, então a idéia de
salvar os outros nem sequer passou por sua cabeça.

Mais importante, depois que o ataque fosse completado, ela precisaria usar magia de
teletransporte para se moverem para outro vilarejo e queimá-lo também. Esse plano ocu-
pou sua mente e consumiria todos os seus esforços.

Este não era o único local que cultivava as matérias-primas para a droga. De acordo com
suas pesquisas, havia dez plantações em grande escala dentro do Reino, e ainda pode-
riam haver mais. Caso contrário, elas não seriam capazes de sustentar as enormes quan-
tidades de drogas sendo traficadas por todo o Reino.

Tudo o que podemos fazer é puxar as ervas daninhas onde as encontramos... é cansativo,
mas não há outro jeito...

Idealmente, elas seriam capazes de encontrar documentos com ordens dentro do vila-
rejo, mas isso era bem improvável. Tudo o que elas podiam fazer era esperar que o su-
pervisor do vilarejo ou equivalente tivesse informações de importância semelhante.

A Líder ficaria feliz se pudéssemos encontrar alguns traços de envolvimento da organiza-


ção nisso...

A organização criminosa que cultivava essas drogas era conhecida como Oito Dedos. O
nome veio do Deus dos Ladrões, e seus oito dedos, que era um vassalo do Deus da Terra.
Era um vasto sindicato criminoso que dominava o submundo do Reino.

Esta organização estava dividida em oito divisões, tráfico de escravos, assassinato, con-
trabando, roubo, tráfico de drogas, segurança, finanças e jogos de azar. Essas oito divi-
sões trabalharam juntas no Reino, como os chefes coletivos dos crimes. Devido ao tama-
nho de sua organização, toda a sua extensão estava velada em sigilo.

Contudo, havia um sinal claro da extensão da influência dentro do Reino. E esse era o
vilarejo diante de seus olhos.
Eles estavam cultivando abertamente plantas de contrabando nos vilarejos. Só isso era
prova de que os lordes destas terras estavam em conluio com eles. No entanto, mesmo
um inquérito oficial não daria frutos.

Mesmo que a Casa Real iniciasse uma investigação ou tomasse medidas legais, levar os
nobres em questão à justiça era muito difícil. O lorde certamente diria: “Eu não sabia que
essas plantas eram matéria-prima para drogas”, ou simplesmente descartaria o problema
nos aldeões e diria que foi idéia deles.

Havia limites para a ação legal que poderia ser tomada, e mesmo se alguém quisesse
interromper o fluxo de drogas, o processo seria impedido por nobres corruptos alinha-
dos à organização. A situação havia se deteriorado ao ponto de, aqueles que estavam do
lado certo da lei não mais conseguiam mais resolver isso.

Portanto, elas foram deixadas com o último recurso de usar a violência e queimar os
campos.

Sua franca opinião era que queimar essas drogas era apenas tratar os sintomas, e não a
doença. A organização ilegal que corroía o coração do Reino era poderosa demais e seu
apoio político era demasiadamente influente.

“Estamos apenas ganhando tempo... se não conseguirmos mudar as coisas, todos esses
esforços serão em vão...”

Parte 2

A chuva caia.

A cacofonia das gotas caindo ressoava nos ouvidos.

As ruas da Capital Real não foram projetadas tendo em mente a drenagem, particular-
mente as pequenas vielas. No final, o beco inteiro tornou-se um lago em miniatura.

Salpicos de água respigavam quando gotas de chuva caíam sobre a superfície da água. O
vento soprava através dos respingos e o cheiro de água era intenso no ar, fazendo a Ca-
pital Real parecer submersa.

Havia um menino neste mundo que tinha sido tingido de cinza pelos salpicos de água.

Ele morava em um casebre degradado. Não, usar a palavra casebre estaria dando louvor
a um local tão desprovido. Era pouco mais que um amontoado de coisas sustentado por
feixes estreitos, tão largos quanto o antebraço de um homem. Um pedaço de pano fazia a
função de telhado, e as bordas que caíam serviam de paredes.
Um menino de seis anos vivia nessas condições, talvez tal descrição pudesse dar a en-
tender que era como um restaurante ao ar livre, mas não havia nada disso em qualquer
sentido da palavra. Ele estava enrolado em um canto como um pedaço de lixo descartado
ao léu, deitado em um pano fino onde ele apoiava a cabeça.

Quando se pensava sobre isso, os suportes de madeira e o tecido manchado que servia
de telhado e paredes eram provavelmente o fruto do trabalho desse garoto — como uma
criança construindo uma base secreta.

O único mérito desta casa que era indigna do nome era que ele não estava diretamente
encharcado pela chuva. O dilúvio interminável fez a temperatura afundar como uma pe-
dra no lago, envolvendo o garoto com um frio indutor de tremores. A condensação de
suas respirações curtas e infrequentes era o único sinal de que ele estava vivo, o clima
roubava seu calor e o fazia desaparecer no ar.

O menino havia sido encharcado pela chuva gelada muito antes de entrar em sua casa e
estava perdendo rapidamente o calor do corpo.

Ele não tinha como parar seu tremor.

No entanto, este frio refrescante acalmou as contusões que cobriam seu corpo. Esse era
o único consolo para ele em meio a essas condições horríveis.

O menino permaneceu encolhido no chão enquanto olhava para o beco abandonado —


para o mundo.

As únicas coisas que ele podia ouvir eram o som da chuva e sua própria respiração. Não
havia mais nada na ausência desses sons, o que o fez pensar que era a única pessoa res-
tante no mundo.

O menino era muito novo, mas já entendia que morreria.

Ele não temia por ser jovem ao ponto de não entender completamente o conceito de
morte. Além disso, ele não achava que houvesse algum motivo específico para continuar
vivendo. Ele estava se agarrando à vida todo esse tempo porque estava com medo da dor
e tentou afugentá-la.

Se ele pudesse morrer, ali mesmo, sem sentir qualquer dor — apenas o frio do vento e
a fome roendo em seu estômago — então a morte dificilmente seria uma coisa ruim.

Ele lentamente perdeu a sensação do seu corpo encharcado de chuva, e sua mente co-
meçou a desvanecer-se em um borrão.

Ele deveria ter encontrado um lugar para se esconder da chuva antes que começasse a
cair, mas ele havia se deparado com vários baderneiros e recebido uma surra violenta.
Ele já deu sorte o bastante de ter conseguido voltar para cá.
Este era o único pedaço de alegria a que ele se agarrava. Isso significa que todo o resto
era sofrimento?

Era muito comum ele passar dois dias sem comer, de modo que dificilmente era uma
desgraça. Ele não tinha pais nem ninguém para cuidar dele, e era assim que sempre acon-
tecia, então não se qualificava como infelicidade. Suas roupas esfarrapadas e seu fedor
repulsivo eram um fato da vida para ele, então isso não era uma dificuldade para ele.
Comer comida estragada e beber água suja para encher a barriga era o único modo de
vida que ele conhecia, não fazia sentido em contar isso como sofrimento.

Mas então, seu chiqueiro às vezes era tomado por outros, ou destruído por aqueles que
tinham prazer em tal, e ele também era espancado por homens bêbados para que todo o
seu corpo doesse. Isso era seu sofrimento, então?

Não, não era.

O menino sofria, mas ele estava cego ao seu próprio sofrimento.

No entanto, tudo isso logo terminaria.

A miséria da qual ele era alegremente ignorante terminaria aqui.

A morte veio sem distinção para os afortunados e os desafortunados.

—Sim, a morte era absoluta.

♦♦♦

Ele fechou os olhos.

A força para mantê-los abertos esvaia-se, seu corpo há muito havia parado de sentir o
frio.

Ele podia ouvir seu próprio batimento cardíaco fraco na escuridão. O som da chuva se
misturou com isso, mas então ele ouviu algo estranho se intrometer nesse mundo.

Uma voz abafou o som da chuva. Em meio aos resquícios fugazes de sua consciência, o
menino forçou a abrir os olhos, atraído pela curiosidade única das crianças.

“A coisa” entrou no campo estreito de sua visão.

Os olhos que se fechavam lentamente para sempre, se arregalaram rapidamente.

Era bela.
Por um momento, ele não tinha idéia do que era.

A melhor descrição para isso seria “como uma joia” ou “brilhante como ouro”. É claro
que alguém como ele, que comia comida descartada e meio podre para sobreviver aos
dias, não conseguia pensar em tais coisas.

Sim.

Havia apenas uma coisa em sua mente.

—É como o sol.

Essa era a coisa mais distante e inatingível que ele poderia imaginar. Essa palavra apa-
receu em sua mente.

A chuva tingiu o mundo de cinza. O céu estava cheio de espeças nuvens negras. Mesmo
que o sol aparecesse, ninguém notaria. Mas mesmo assim, aparentemente o sol veio pas-
sear e apareceu diante dele.

Um pensamento assim passou por sua mente.

“A coisa” estendeu a mão para acariciar seu rosto. E então—

O menino até então não era um ser humano.

Já que ninguém o havia tratado como tal.

Mas neste dia, ele se tornou um ser humano.

♦♦♦

3º Dia do mês Baixo Fogo (9º mês) – 04:15

Capital Real do Reino Re-Estize. O Castelo Ro-Lente estava em seu coração, seus terre-
nos cercados por 400 metros de muralhas com 20 enormes torres espaçadas ao longo de
sua extensão.

Este cômodo estava localizado dentro de uma dessas 20 torres.

As lanternas estavam apagadas no cômodo não muito espaçoso e havia uma cama. Um
rapaz, em algum lugar entre a infância e a adolescência, estava deitado lá.

Seu cabelo loiro era cortado curto e sua pele estava bronzeada, parecia saudável.

Climb.
Ele possuía apenas um nome, sem sobrenome. Ele era um soldado que tinha sido auto-
rizado a defender a dama com o título de “Dourada” — uma honra que lhe conquistou a
inveja de muitos.

Ele se levantava cedo, sempre antes do sol nascer.

Quando ele percebeu que sua consciência havia emergido de um mundo distante de es-
curidão, sua mente se esclareceu imediatamente, e seu corpo estava quase totalmente
operacional. Climb se orgulhava de sua capacidade de dormir e acordar rapidamente.

Ele abriu os olhos amplamente e uma vontade de ferro queimará dentro deles.

Ele tirou o grosso cobertor que cobria seu corpo — era verão, mas as noites eram frias
quando dormia cercado por paredes de pedras — e Climb sentou-se em sua cama.

Ele tocou as pontas dos dedos no canto dos olhos. Eles saíram molhados.

“...Esse sonho de novo, huh.”

Climb enxugou as lágrimas com as mangas.

A chuva pesada de dois ou três dias atrás deve tê-lo lembrado da lembrança de sua ju-
ventude.

Ele não estava chorando de desgosto.

Quantas pessoas poderiam se encontrar em uma vida que merecia respeito? Quantos
mestres dignos, alguém poderia servir, o tipo pelo qual alguém alegremente daria sua
vida se fosse para protegê-lo?

Naquele dia, quando Climb teve a boa sorte de encontrar uma certa dama, ele decidiu
dar a vida por ela a qualquer momento.

As lágrimas que ele derramou vieram de alegria. Ele chorou de gratidão pelo milagre
que o encontro havia trazido.

O rosto jovem de Climb estava cheio de uma determinação constante quando ele se le-
vantou.

Não havia iluminação aqui. Neste mundo sem luz, Climb falou com uma voz rouca de
excesso de treinamento:

“Acender luzes.”
A lâmpada no teto liberou iluminação branca em resposta à palavra de comando de
Climb, iluminando o interior do cômodo. Este foi um item mágico encantado com a magia
「Continual Light」.

Embora itens como estes pudessem ser comprados no mercado, eles não eram baratos,
e Climb só possuía um devido à sua posição única.

Torres de pedra como estas tinham pouca ventilação, portanto lamparinas à óleo não
eram seguras. Quase todos os cômodos aqui eram mobiliados com iluminação mágica,
mesmo sendo um alto investimento a princípio.

A luz branca revelou que o chão e as paredes também eram de pedra. Vários tapetes
finos foram colocados no chão para diminuir a rispidez fria da pedra. Além disso, havia
uma cama de madeira ao estilo rústico, e um armário de roupa ligeiramente maior que
parecia grande o suficiente para guardar sua panóplia. Havia uma escrivaninha com ga-
vetas e uma cadeira de madeira com uma almofada fina no assento.

Um estranho poderia considerar isso austero, mas era mais do que ele merecia, isso em
sua opinião.

Soldados regulares não receberiam quartos individuais. Eles dividiriam beliches e vive-
riam em grupos. Os únicos outros móveis que lhes eram atribuídos, além das camas, era
um baú de madeira com fechadura, utilizado para guardar itens pessoais.

Ele então olhou para o conjunto branco puro da armadura de placas que estava no canto
da sala. Era tão brilhante que parecia brilhar por conta própria. Um soldado padrão
nunca receberia uma armadura tão requintada.

Naturalmente, Climb não mereceu tal tratamento especial por seus próprios méritos.
Este foi um presente da soberana a quem Climb devia sua lealdade. Assim, era inevitável
que outros se ressentissem dele.

Ele abriu o armário de roupas e pegou suas vestes. Então se vestiu enquanto observava
sua imagem no espelho do gabinete.

Primeiro, ele colocou um conjunto de roupas velhas. Elas cheiravam a metal, não im-
porta quantas vezes ele as lavasse. Então colocou uma camiseta por cima. Normalmente,
ele teria colocado sua armadura em cima disso, mas não havia necessidade de ser tão
formal agora. Em seu lugar, ele usava um colete com muitos bolsos e um par de calças, e
com isso ele estava vestido. Ele segurava um balde com um pano.

Depois disso, ele se observou no espelho mais uma vez, inspecionando a si mesmo por
qualquer coisa fora do lugar ou qualquer esquisitice em seu porte pessoal.

Qualquer erro que Climb fizesse seria motivo para ataques lançados contra a princesa
“Dourada” a quem ele servia.
Portanto, ele teve que ser extremamente cuidadoso. Ele não morava neste lugar para
causar problemas à sua Mestra. Ele foi autorizado a viver aqui para se dedicar tudo o que
tinha a ela.

Climb fechou os olhos diante do espelho e imaginou o rosto de sua Mestra.

Ela era a Princesa Dourada — Renner Theiere Chardelon Ryle Vaiself.

Como esperado de sua linhagem de nascimento, ela estava cercada por uma aura sa-
crossanta, como uma deusa descendo sobre a terra. Ela parecia brilhar de compaixão e
sua mente elaborava muitos planos e políticas cheio de sabedoria.

Ela era a nobre entre as nobres, a princesa entre as princesas. Ela era a mulher perfeita.

Seu brilho dourado — como uma gema preciosa e imaculada — não poderia ser desfi-
gurado de forma alguma.

Se alguém fosse usar um anel para comparação, Renner seria como um enorme dia-
mante lapidado e brilhante. Quanto a Climb, ele seria a moldura que mantinha a pedra
no lugar. Qualquer falha na moldura diminuiria o valor do anel, então ele não podia fazer
nada que pudesse desvalorizá-la.

O peito de Climb queimava incontrolavelmente enquanto pensava em sua Mestra.

Mesmo os suplicantes mais ferrenhos aos deuses não podiam se comparar à devoção de
Climb.

Ele se examinou por mais algum tempo. Depois de ter certeza de que não iria desgraçar
a honra de sua Mestra, Climb assentiu em satisfação e saiu de seu quarto.

Parte 3

3º Dia do mês Baixo Fogo (9º mês) – 04:35

Seu destino era um hall de treinamento que ocupava um andar inteiro da torre.

Normalmente, este lugar estaria cheio de calor e atividade dos soldados. No entanto, era
cedo, então não havia ninguém. O hall vazio estava em silêncio. Os arredores eram feitos
de pedra, o que fazia os passos de Climb ecoarem excepcionalmente altos.

As lâmpadas mágicas com 「Continual Light」 iluminaram o ambiente de treinamento


com intensidade.
Dentro do hall, havia peças de armaduras presas a pilares de madeira e bonecos feitos
de palha, para servir como alvos na pratica do arco e flecha. Todos os tipos de armas
embotadas estavam penduradas na parede.

O treinamento deveria ter sido conduzido do lado de fora, mas havia uma razão pela
qual isso era feito em ambientes fechados.

O Palácio de Valência situa-se dentro do Castelo Ro-Lente. Portanto, ter soldados trei-
nando do lado de fora, onde embaixadores e partidos diplomáticos pudessem vê-los, se-
ria grosseiro. Assim, vários halls de treinamento internos foram construídos dentro das
torres.

É verdade que ter soldados orgulhosos e fortes treinando em público poderia ser usado
para impressionar os colegas durante as negociações diplomáticas, mas o Rei não gos-
tava desse tipo de coisa. Para ele, o Reino era uma nação que deveria mostrar seu lado
gracioso, elegante e nobre aos convidados estrangeiros.

Dito isso, alguns treinamentos ainda precisavam ser realizados ao ar livre. Em tempos
como esses, os soldados tinham que fazê-lo secretamente em esquinas, ou em campos
fora do Castelo ou mesmo inteiramente fora da Capital.

Climb silenciosamente entrou no hall, como se estivesse atravessando um bloco de ar


frio, e começou a se aquecer em um canto.

Depois de cerca de meia hora de alongamento, o rosto de Climb já estava em um tom


incomum de vermelho. O suor escorria em sua testa e ele soltou baforadas de fumaça de
seus esforços.

Climb limpou o suor e se aproximou do cavalete com armas. Ele pegou uma espada de
treino pesada e sem fio com sua mão recém empolada e calejada. Então ele sentiu seu
peso, certificando-se de que se encaixasse bem em seu aperto.

Depois disso, ele encheu os bolsos com placas de metal e os prendeu no lugar, para que
as placas não caíssem.

Depois de prendê-los, suas roupas agora pesavam tanto quanto uma armadura com-
pleta de placas. Armaduras completas de placas não-encantadas eram resistentes, mas
muito pesadas, e as articulações também restringiam a amplitude de movimento. Por-
tanto, Climb deveria ter usado um conjunto de placas para praticar, pelo realismo.

No entanto, Climb não queria usar uma armadura de placas cheias apenas para treinos
regulares. Além disso, ele sabia que a armadura branca que recebera não era adequada
para treinamento. Portanto, ele usou as placas de metal como um substituto.

Ele agarrou com força sua espada, que era maior que uma espada longa, e adotou uma
posição alta. Então Climb começou a balançar para baixo, expelindo sua respiração
quando o fez. No momento em que a arma de treinamento bateu no chão, ele segurou-a
ainda, impedindo-a de atingir o chão, e então a trouxe de volta novamente enquanto ins-
pirava. Ele lentamente aumentou a velocidade de seus balanços, seus olhos fixos no ar na
frente dele, sua mente focada em sua prática.

Ele repetiu esses movimentos cerca de 300 vezes.

O rosto de Climb parecia não ficar mais vermelho, e gotas de suor escorriam por suas
bochechas. Sua respiração exalada estava quente, como se para desabafar o calor acumu-
lado dentro de seu corpo.

Climb tinha passado por um árduo treinamento como soldado, mas o porte desta espada
ainda era pesado para ele. Controlar a velocidade da espada para evitar que ela caísse no
chão depois de balançar a espada exigia considerável força do braço.

Após a 500ª repetição, os braços de Climb começaram a ceder e eles sentiram que esta-
vam chorando de dor. O suor escorria pelo seu rosto em um dilúvio.

Climb percebeu que ele estava no limite. Mesmo assim, ele não pretendia parar por aqui.

E então—

“Não acha que é hora de descansar?”

—Um terceiro o chamou. Climb rapidamente se virou para ver uma figura masculina
entrar em seu campo de visão.

Não havia melhor palavra para descrevê-lo do que “poderoso”. De fato, ele era um ho-
mem que parecia um pedaço de aço forjado. Seu rosto firme como uma rocha enrugou, e
as linhas de expressão assim produzidas o fizeram parecer mais velho do que sua idade
real. Seus músculos firmes provavam que ele não era uma pessoa comum.

Não havia soldado no reino que não pudesse reconhecê-lo.

“—Stronoff-sama.”

Ele era o Capitão Guerreiro do Reino, Gazef Stronoff. Ele foi saudado como o homem
mais poderoso do Reino e um guerreiro que ninguém nas nações vizinhas poderia riva-
lizar.

“Seu treinamento será em vão se não descansar. Não faz sentido se esforçar demais.”

Climb abaixou a espada e olhou para os braços que tremiam incontrolavelmente.

“O senhor tem razão. Eu exagerei um pouco.”


Gazef rodeou os ombros com o agradecimento inexpressivo de Climb.

“Se você realmente entende, então não me faça continuar repetindo sempre que te vejo
treinando. Quantas vezes já fez isso, afinal?”

“Eu sinto muito.”

Gazef deu de ombros novamente quando Climb fez uma reverência.

Este vai e vem repetiu-se entre eles inúmeras vezes. Em circunstâncias normais, os dois
deixariam as coisas e se concentrariam em seu próprio treinamento. No entanto, hoje foi
diferente.

“O que me diz, Climb. Vamos treinar uma rodada ou duas?”

A expressão normalmente vazia de Climb foi jogada em desordem quando ele ouviu Ga-
zef dizer essas palavras.

Eles haviam se encontrado aqui no passado, mas nunca haviam cruzado as lâminas. Essa
foi uma regra tácita entre eles.

Isso porque não lhes era bom praticar juntos. Ou melhor; havia méritos em fazê-lo, mas
eles eram superados em muito pelos deméritos.

O Reino estava agora dividido em Facção Real e Facção Nobre, a última era composta
por uma coalizão de três dos Seis Grandes Nobres da nação. A luta pelo poder entre elas
deixou a situação do Reino em um estado precário. Alguns até sentiram que a única razão
pela qual o país ainda não havia desmoronado era por causa de suas guerras anuais com
o Império.

Sob essas circunstâncias, o braço direito do Rei — Capitão Guerreiro Gazef Stronoff —
não poderia ser derrotado. Por exemplo, se ele fosse derrotado, isso daria à Facção Nobre
um amplo material para criticá-lo.

Quanto a Climb, sofrer uma derrota grave pode significar que os nobres não permitiriam
mais que ele defendesse o corpo da Princesa Renner. O fato de muitos nobres terem re-
pugnado que um soldado sem nome como Climb estava autorizado a ficar ao lado dela,
sendo ela uma princesa descomprometida e tida como a portadora de uma beleza ímpar.

Devido às circunstâncias acima mencionadas, nenhuma das partes poderia se dar ao


luxo de perder.

Mais do que isso, eles não podiam permitir que os outros vissem suas fraquezas e des-
sem a seus inimigos uma abertura para explorar. Ambos eram de nascimento comum, e
por isso tinham que ter muito cuidado em tudo o que faziam para não causar problemas
aos seus mestres.
Sendo esse o caso, por que Gazef decidiu quebrar essa regra tácita?

Climb olhou para os arredores.

Não poderia ser porque não havia mais ninguém por perto. O Castelo era uma área den-
samente povoada. Certamente alguém estaria observando de longe ou espionando-os
das sombras, mas ele não conseguia pensar em nenhum outro motivo.

Climb não tinha idéia se era por uma boa ou má razão. Ele estava confuso e chocado,
mas não expressou em seu rosto.

No entanto, a pessoa diante de Climb era o guerreiro mais poderoso do Reino. Embora
a consternação momentânea de Climb pudesse ter passado despercebida por uma pes-
soa comum, a pessoa à sua frente percebeu e respondeu:

“Ultimamente... comecei a sentir que minhas habilidades são inadequadas. Portanto, eu


queria treinar com alguém que pudesse durar um pouco contra mim.”

“O senhor realmente acha isso, Stronoff-sama?”

O que exatamente aconteceu para fazer Gazef, o melhor guerreiro do Reino, duvidar de
suas próprias habilidades? Só então, Climb lembrou que a unidade que Gazef liderava
tinha poucas pessoas.

Climb não tinha família e, portanto, só ouvira os rumores quando passava pelo hall. Apa-
rentemente, a unidade estava envolvida em um certo incidente e havia perdido várias
pessoas.

“De fato. Se não fosse por um magic caster compassivo que me ajudou contra o inimigo,
eu poderia não estar aqui hoje—”

Quando ouviu isso, Climb não pôde mais manter-se incrédulo aos motivos de Gazef. De
fato, não havia ninguém que não se surpreendesse ao ouvir essas palavras. Incapaz de
conter sua curiosidade, ele perguntou:

“Que tipo de pessoa era esse magic caster compassivo?”

“...Ele se chamava Ainz Ooal Gown. Pelos meus cálculos, ele deveria estar a par com
aquele monstro, o mago do Império.”

Climb nunca tinha ouvido esse nome antes.

Climb adorava heróis, ele tinha uma paixão secreta por sagas heroicas. Seu interesse até
cruzava as fronteiras raciais. Além disso, ele devorou avidamente todas as histórias de
aventureiros que encontrou nos países vizinhos. No entanto, ele não se lembrava da pes-
soa que Gazef havia mencionado.

Claro, ele pode estar usando um pseudônimo.

“Isso, ah— Ghrun!”

Climb socou sua curiosidade.

Como eu poderia perguntar a ele com entusiasmo sobre um incidente em que ele perdeu
seus homens? ...Isso seria terrivelmente rude.

“Vou lembrar o nome dessa grande pessoa... então, está tudo bem se eu treinar com o
senhor?”

“Bem, dificilmente será um treinamento sério, apenas trocaremos uns golpes com as
lâminas uma ou duas vezes. Se você aprender ou não alguma coisa com isso, tudo de-
pende de você. Afinal, você é um guerreiro de primeira classe entre os soldados do Reino.
Isso me motiva a treinar com você.”

Isso foi um grande elogio, mas Climb só pôde aceitá-lo como cortesia padrão.

Não era que Climb fosse muito forte, mas que os padrões pelos quais ele era julgado
eram muito baixos. O soldado médio do Exército Real era pouco melhor do que o homem
comum e muito mais fraco que os Cavaleiros profissionais do Exército Imperial. Pratica-
mente nenhum deles era famoso por sua habilidade marcial em todas as nações vizinhas,
como Gazef era. Os subordinados diretos de Gazef eram excelentes soldados, mas eles
ainda estavam um pouco abaixo de Climb.

Entre os ranques de aventureiros cobre, ferro, prata, ouro, platina, mythril, orichalcum
e adamantite, Climb se classificaria na melhor das hipóteses como ouro. Ele não era fraco,
mas havia muitos outros que eram mais fortes que ele.

Poderia uma brincadeira como essa realmente motivar Gazef — quem era classificado
com adamantite em termos de aventureiro?

Climb afugentou os pensamentos que o enfraqueciam.

Ter o homem mais forte do Reino treinando com ele era uma oportunidade rara. Ele não
se arrependeria, mesmo se Gazef acabasse ficando desapontado no final da sessão.

“Então, eu rezo para que troque alguns golpes comigo.”

Gazef sorriu fracamente e fez uma reverência.


Os dois foram para o armário de armas e escolheram armas adequadas para si. Gazef
selecionou uma espada bastarda, enquanto Climb selecionou um pequeno escudo e uma
espada larga.

Depois disso, Climb removeu as placas de metal dos bolsos. Seria terrivelmente desres-
peitoso usá-las enquanto lutava contra alguém mais forte que ele. Além disso, ele preci-
sava dar tudo de si a seguir, caso contrário, ele não seria capaz de crescer.

Seu inimigo era o mais poderoso guerreiro do Reino. Ele tinha que concentrar todas as
suas energias e experimentar o poder desta poderosa muralha diante dele com toda a
sua força.

Depois que Climb ficou pronto, Gazef perguntou:

“Seus braços estão bem? Eles ainda estão rígidos?”

“Não mais, eles estão bem. Eles ainda estão um pouco quentes, mas isso não afeta minha
pegada nem nada assim.”

Climb acenou com os braços. Gazef viu seus movimentos e assentiu, havia ficado claro
que não estava mentindo.

“Realmente... embora de certa forma, é uma pena de certo modo. Em combate real, é
muito raro que alguém seja capaz de lutar em condições excelentes. Se a força que pode
manter no punho for afetada, você precisará pensar em uma maneira de lutar que a com-
pense. Já aprendeu algo assim?”

“Não, não, eu não tenho. O senhor gostaria que eu voltasse a balançar—”

“Ah, não, não há necessidade de ir tão longe. Eu só estou dizendo, você precisa proteger
Sua Alteza em todos os momentos. Você deve praticar estilos de luta que podem ser usa-
dos quando você é atacado, quando espadas não sejam a opção, ou talvez praticar usando
várias formas de armas na batalha. Fazer isso não faz mal a ninguém.”

“Sim!”

“...Espadas, escudos, lanças, machados, punhais, manoplas, arcos, clavas e armas de ar-
remesso. O uso dessas armas é conhecido como as Nove Artes, e elas são a base de todos
os combates armados... no entanto, se você tentar aprender tudo acabará tirando pouco
proveito. Eu sugiro escolher duas ou três e treinar com elas. Tudo bem, já falei demais.”

“Por favor, não diga isso, Stronoff-sama. Obrigado pela palestra!”

Gazef sorriu e acenou para agradecer a Climb.


“Então, vamos começar assim que estiver pronto. Comece por me dar o seu melhor mo-
vimento em sua condição atual. Depois disso, dependendo do tempo... Bem, eu posso não
ser capaz de te ajudar, mas vou encontrar uma chance de explicar as Nove Artes e os
segredos de lutar com outras armas.”

“Sim. Eu rezo para que o senhor me ensine sem reservas.”

“Muito bem. No entanto, não estou tratando isso como treino real. Venha para mim
como se esta fosse uma batalha verdadeira.”

Climb lentamente baixou a espada para uma posição baixa, obliquando seu corpo para
que seu lado esquerdo ficasse de frente para Gazef e atrás de seu escudo. O olhar nos
olhos de Climb era afiado, indicando que ele não mais tratava isso como uma luta de trei-
namento. Da mesma forma, a postura de Gazef falou de sua prontidão para a batalha.

Os dois travaram os olhos um no outro, mas Climb não conseguiu fazer o primeiro mo-
vimento.

Era muito mais fácil mover-se agora que ele havia removido as placas de metal, mas
ainda assim, ele não achava que poderia derrotar Gazef. O outro homem era muito supe-
rior a ele em termos de habilidade física e experiência.

Pisar descuidadamente ao seu alcance de ataque apenas convidaria um contra-ataque.


Gazef era um guerreiro melhor do que ele, então talvez não desse para evitar. No entanto,
se esta fosse uma batalha de vida ou morte, isso significa que ele deveria simplesmente
jogar sua vida fora porque “Não consegui evitar”?

Se não, então o que ele deveria fazer?

A única resposta para isso era: ele precisava atacar as fraquezas na postura de Gazef.

Climb era inferior em parâmetros físicos, experiência e espírito; todas as qualidades que
um guerreiro requeria. Se houvesse alguma maneira de abordar essa disparidade, seria
através de seus respectivos armamentos.

Gazef pegou uma espada bastarda. Em comparação, Climb estava usando uma espada
larga e um pequeno escudo. Talvez se o seu equipamento estivesse encantado, ele pode-
ria compensar, mas estas eram armas de treino, então eram fundamentalmente iguais.

No entanto, Gazef tinha apenas uma arma, enquanto Climb tinha duas — afinal, um es-
cudo poderia ser usado como arma. Por um lado, era mais fraco, mas por outro, lhe dava
mais opções.

—Ele defletiria um golpe com seu escudo e depois golpearia com sua espada. Ou isso,
ou use sua espada para criar uma abertura e depois bater com seu escudo.
Climb decidiu sobre sua estratégia, que era aproveitar as oportunidades para se contra-
atacar. Então, ele estudou cuidadosamente os movimentos de Gazef.

Depois de alguns segundos. Gazef riu.

“Vai vir ou não? Então, talvez eu deva ir até você— está pronto?”

Gazef ergueu a espada de maneira casual. Ele abaixou sua postura, reunindo forças
como uma mola espiralada. Climb também começou a inundar seu corpo com força,
pronto para desviar de qualquer ataque que pudesse acontecer.

Então, Gazef se adiantou, mirando a espada em seu escudo.

—Muito rápido!

Climb imediatamente abandonou a idéia de desviar esse golpe. Ele concentrou todas as
suas energias para a defesa, a fim de suportar esse golpe.

E no momento seguinte — um impacto surpreendente explodiu em seu escudo.

Tão poderoso foi o golpe que Climb se perguntou se o escudo havia se partido. Tinha
sido tão forte que a mão segurando o escudo ficou dormente. Não havia como evitá-lo
sem usar toda a força de seu corpo.

Pensar que eu realmente queria isso! Que tipo de sincronia é preciso para explorar uma
fraqueza nessa técnica? No mínimo, preciso aguentar esse golpe!

Climb grunhiu em sua ingenuidade e, em seguida, outro impacto floresceu em seu intes-
tino.

“Guwaargh!”

O corpo de Climb voou pelo ar. Suas costas bateram pesadamente no chão de pedra, o
deixando sem fôlego. Quando ele olhou para Gazef, imediatamente percebeu o que tinha
acontecido.

Gazef estava apoiando a perna no chão, Climb foi acertado por um chute poderoso e foi
jogado longe.

“...Você se concentrou em minhas mãos porque eu estava segurando apenas uma espada.
Isso não é bom. Você pode acabar recebendo um chute assim. Eu mirei na barriga, mas
eu poderia ter mirado em algum lugar com menos proteção, como tentar quebrar as ró-
tulas ou algo assim. Então... mesmo se eu segurasse uma xícara, se eu te chutasse na viri-
lha com uma bota de metal poderia quebrar alguma coisa se der azar, não? É preciso ficar
de olho no corpo inteiro do seu oponente e estudar cada movimento dele.”
“...Sim.”

Climb lentamente se levantou, rangendo os dentes contra a dor latejante vinda de sua
barriga.

Gazef era demasiadamente poderoso e sua força física correspondia à sua reputação no
Reino. Se Gazef estivesse levando a sério, poderia facilmente ter quebrado as costelas de
Climb através da cota de malha ou, de outro modo, deixado incapaz de lutar. O fato de
Climb não ter sofrido tal destino provavelmente porque Gazef estava se reprimindo. Em
vez disso, ele tinha apenas escolhido um alvo com o pé e depois aplicado um pouco de
força, então tudo o que ele fez foi mandar Climb voando ferozmente.

Então ainda levou como treinamento... muito obrigado.

Quando ele saboreou o gosto de ser pessoalmente disciplinado pelo maior guerreiro do
Reino, Climb ergueu sua espada novamente, seu coração transbordava de gratidão.

Este período de tempo era inestimável. Ele tinha que ter cuidado para não deixar que
isso acabasse cedo demais.

Climb se cobriu com o escudo novamente. Ele avançou em direção a Gazef, que estudava
Climb em silêncio. Se isso continuasse, ele só faria os mesmos erros antigos novamente.
Quando Climb se aproximou, ele foi forçado a reconsiderar suas táticas.

Gazef aguardava placidamente seu inimigo que se aproximava, com uma expressão as-
sustadoramente calma no rosto. Parece que Climb não poderia forçar Gazef a usar táticas
de resposta as suas habilidades.

No entanto, agonizando sobre esse fato seria uma forma de arrogância.

Climb estava chegando ao limite. Embora acordasse cedo para praticar todos os dias,
sua taxa de crescimento era mais lenta do que uma vaca que pastasse pela rua. Ele fez
pouco progresso desde que começou a aprender a arte da espada. Mesmo ele podendo
ser capaz de melhorar sua velocidade e força treinando seu corpo, ele pode não ser capaz
de dominar habilidades especiais como artes marciais e afins.

Seria terrivelmente rude para alguém como Climb resmungar sobre não ser capaz de
forçar um indivíduo talentoso a usar suas verdadeiras habilidades. Em vez disso, ele de-
veria culpar sua própria falta de talento por não ser capaz de fazer com que seu oponente
dê o máximo de si.

Com toda a probabilidade, quando Gazef disse a ele para tratar isso como uma batalha
verdadeira em vez de um treinamento simples, ele estava dizendo a Climb “lute como se
quiser tirar minha vida, caso contrário você não é digno de ser meu oponente”.

Climb rangeu os dentes, mas foi baixo.


Ele desprezava sua fraqueza. Se fosse mais forte, ele poderia ser mais útil. Ele poderia
se tornar a espada da Princesa e confrontar diretamente os vilões que assolam o povo do
Reino.

Ele se sentiu culpado, pois a única espada da Princesa era tão fraca que até para ser
sacada da bainha era preciso ser cauteloso

No entanto, Climb imediatamente afastou a culpa. Ele não deveria estar chafurdando em
autopiedade agora, mas usando todas as suas forças para lutar com o poderoso inimigo
diante dele, na esperança de crescer, mesmo que apenas um pouco.

Havia apenas um pensamento em seu coração.

Ele precisava emprestar sua força para a Princesa.

♦♦♦

“Hoh...”

Gazef exalou, e a expressão em seu rosto mudou um pouco.

Isso porque o jovem diante dele tinha um olhar diferente do habitual. Até agora ele só
havia mostrado feição de chocado, ansioso e nervoso. Mas com um simples chute, esse
humor irritante se foi, e agora ele parecia um bom guerreiro.

Gazef elevou seu nível de alerta mais um pouco.

Gazef considerava Climb melhor do que o próprio rapaz se considerava. O que ele mais
apreciava era a fome de força de Climb, bem como a lealdade que beirava o zelo. E por
fim, suas habilidades com a espada.

Climb não aprendera com um mestre, mas observava os outros e modificava suas ob-
servações em um estilo autodidata. Sua técnica não era elegante e tinha muitos movi-
mentos inúteis. No entanto, era diferente de estilos aprendidos através de lições rotinei-
ras. Ele considerou cuidadosamente cada golpe que fez, formando um estilo que era ideal
para o combate prático, ou para ser mais direto, para o assassinato.

Gazef sentiu que isso era bom.

Espadas nasceram como armas de assassinato. As habilidades de espada aprendidas


como uma forma de recreação não eram úteis no campo de batalha. Seus usuários não
poderiam defender aqueles que queriam proteger, e não podiam salvar aqueles que que-
riam resgatar. A única coisa que podiam fazer era esperar serem atacados pelo inimigo.
No entanto, Climb era diferente. Gazef tinha certeza de que ele poderia matar seus ini-
migos e salvaguardar as pessoas que eram importantes para ele.

Ainda assim —

“Você mudou sua atitude, mas ainda sou muito superior a você. O que você vai fazer
agora?”

Para ser honesto, Climb não tinha talento. Por mais que desse tudo de si, por mais que
treinasse seu corpo, nunca conseguiria atingir o apogeu da esgrima sem talento. Ele era
como pó se comparado a pessoas como Gazef ou Brain Unglaus.

O desejo de Climb de se tornar mais forte do que qualquer outra pessoa não era nada
mais que um sonho ou fantasia.

Mesmo assim, por que Gazef queria ajudar Climb? Não seria mais benéfico gastar seu
tempo com alguém melhor?

A resposta foi simples o suficiente; Gazef não podia ignorar a diligência inabalável de
Climb, por mais inútil que fosse. Se cada homem tivesse seus próprios limites pessoais,
então alguém poderia dizer que Gazef tinha pena do fato de que Climb tentava subir a
íngreme muralha de seus próprios limites.

Portanto, ele queria ensinar Climb outra coisa.

Ele sentia que havia um limite para as habilidades de uma pessoa, mas não limitava a
sua experiência.

Além disso, havia mais um motivo. Sentiu uma profunda pena pelo trágico estado de seu
grande rival.

Então, eu estou usando ele como substituto, huh... estou fazendo um desserviço... mas du-
vido que este confronto cause algum mal a ele.

“—Venha com o que tiver, Climb.”

Ele recebeu uma resposta estridente ao seu resmungo autodirigido.

“Sim!”

♦♦♦

Enquanto respondia, Climb fixou o pé com firmeza no chão e avançou para a frente.

Ao contrário de antes, a expressão de Gazef estava severa quando ele ergueu a espada
em uma posição alta.
Ele cortaria de cima para baixo.

Se Climb o bloqueasse com seu escudo, ele pararia no meio do caminho. Se ele o blo-
queasse com sua espada, sua arma seria derrubada. Esse ataque essencialmente fez sua
defesa sem sentido. Bloquear era uma jogada ruim, mas Climb estava usando uma espada
larga, em comparação com a espada bastarda de Gazef.

Tudo o que ele podia fazer era correr para o alcance da espada de Gazef. Gazef sabia
disso e se endireitou para atender a acusação.

Era como correr para a boca de um tigre — mas Climb apenas hesitou por um momento.

Ele mergulhou direto no alcance do ataque da espada de Gazef.

Gazef estava esperando por ele, e quando ele desceu seu braço, Climb bloqueou-o com
o escudo. O impacto impressionante foi maior do que o que ele sentiu antes. Climb fez
uma carranca quando a dor percorreu seu braço.

“Que pena. Pensar que a história se repetiria.”

Houve uma certa decepção no rosto de Gazef quando ele apontou o pé para a barriga de
Climb e então—

“《Fortaleza》!”

—O olhar no rosto de Gazef mudou para um de choque quando ele ouviu Climb gritar.

A arte marcial 《Fortaleza》 não exigia um escudo ou espada para ser usada. Se desejar,
pode-se ativá-lo com uma armadura ou até com as mãos nuas. É claro que a maioria das
pessoas usaria isso quando bloqueasse com uma arma ou escudo, porque o timing tinha
que ser exato. Ao usá-lo com armadura, um erro de cálculo resultaria em um ser deixado
indefeso diante dos inimigos. Portanto, a maioria das pessoas preferia usá-la com um
escudo ou arma. Era o senso comum.

No entanto, Climb sabia que Gazef iria dar um chute, então ele não precisava se preocu-
par com isso.

“Você estava esperando por isso?!”

“Sim, senhor!”

A força do chute de Gazef pareceu desaparecer, como se absorvida por algo macio. Gazef
não pôde colocar força em sua perna estendida e, assim, foi forçado a recuperar seu equi-
líbrio. Vendo o estado desiquilibrado de Gazef, Climb se aproximou dele.
“《Corte》!”

Ele ergueu a espada depois de iniciar a manobra e, em seguida, desferiu um golpe de


cima para baixo.

“Você precisa desenvolver uma técnica que possa desferir com confiança.”

Depois de obedecer ao conselho de um certo guerreiro, Climb e sua falta de talento co-
meçou a treinar com afinco, trabalhando de corpo e alma para produzir esse movimento,
um golpe que cortava de cima para baixo.

O corpo de Climb não estava embainhado nos músculos. Ele nascera com um físico nor-
mal e construir músculos era difícil. Ele também não era dotado de destreza, permitindo
que ele se movesse como queria, mesmo com um corpo musculoso.

Por causa disso, ele havia aperfeiçoado uma estrutura muscular especializada em si
mesmo após um treinamento quase que interminável.

O fruto disso foi esse golpe. Era um ataque cortante de alta velocidade que havia sido
refinado a níveis extraordinários, um lampejo de aço seguido por um poderoso vento.
Esse golpe atingiu a cabeça de Gazef.

Seria fatal se estivesse conectado, mas Climb não estava pensando nisso. Sua confiança
em Gazef era absoluta. Ele só usara esse movimento porque tinha certeza de que o pode-
roso Gazef não seria atacado por um ataque daquele nível.

Houve um zumbido de metal, e a espada larga colidiu com a espada bastarda levantada.

Tudo isso ainda estava dentro de suas expectativas.

Climb concentrou toda a extensão de sua força na tentativa de desequilibrar Gazef.

No entanto, Gazef permaneceu imóvel como uma montanha.

Era difícil manter o equilíbrio em um pé, mas Gazef havia bloqueado facilmente aquele
ataque feito com a força total de Climb. Era como se ele estivesse enraizado na própria
terra.

Climb atacou com seu golpe mais forte com toda a força que conseguiu reunir. No en-
tanto, mesmo a combinação desses dois fatores não conseguia abalar Gazef firme em seus
pés. Este fato chocou Climb em seu âmago, e seus olhos foram para sua barriga.

Ele teve que se aproximar para atacar com sua espada larga. Isso significava que Gazef
poderia ser capaz de chutar sua barriga mais uma vez.

Quando Climb saltou para longe, tal chute o atingiu seu corpo mais uma vez.

Houve uma dor fraca e latejante. Depois disso, os dois cambalearam vários passos sepa-
rados.

Gazef abaixou os olhos e os cantos de sua boca subiram ligeiramente.

Um sorriso, mas não aquele que causava descontentamento. Ele mostrou claramente
seu bom humor. Climb ficou um pouco desconfortável diante daquele sorriso, que era
como um pai vendo seu filho crescer.

“Bom trabalho. Melhor eu ficar um pouco sério agora.”

O rosto de Gazef mudou.

Uma emoção de terror percorreu o corpo de Climb. Isso porque seus instintos lhe diziam
que o lutador mais forte do Reino agora estava diante dele.

“Na verdade, eu tenho uma poção comigo. Deve ser capaz de consertar ossos quebrados,
então não se preocupe.”
“...Muito obrigado.”

O coração de Climb balançou quando ele ouviu seu oponente dizer que ele possivel-
mente sofreria uma fratura. Ele estava acostumado a ser ferido, mas isso não significava
que ele gostava.

Gazef deu um passo à frente, duas vezes mais rápido do que Climb.

A ponta da espada bastarda apontou para o chão, traçando um caminho baixo que veio
nas pernas de Climb. A velocidade do ataque trouxe pânico a Climb, e ele fincou a espada
no chão, preparando-se para proteger as pernas.

Houve um impacto feroz. Assim que Climb percebeu, a espada de Gazef saltou para cima.
A espada bastarda viajou ao longo do corpo da espada de Climb em uma trajetória ascen-
dente.

“Oog!”

Climb jogou o rosto — e o resto do corpo — para trás, e a espada bastarda passou por
seu corpo. Vários fios de cabelo foram cortados e seguiram o arrastro do ar.

Cheio de medo de como Gazef o havia dominado em um instante, Climb lançou os olhos
para a ponta da espada. Então, para seu horror, ele viu a espada bastarda parar de re-
pente, e então virar.

Seu corpo estava se movendo antes que sua mente pudesse pensar.

Como se impulsionado por um instinto básico de sobrevivência, ele estendeu seu pe-
queno escudo, que colidiu com a espada bastarda e produziu um som de metal.

E então—

“—Ahg!”

Houve uma onda de dor, e então Climb arremessado pelo impacto. Ele bateu no chão
rolando, e com o impacto ele perdeu seu controle no punho da espada.

Parece que a espada bastarda tinha mudado de direção imediatamente para uma varre-
dura horizontal depois de saltar do escudo, e isso atingiu a lateral de Climb, que estava
exposta.

“Siga o fluxo entre seus movimentos. Não pense em ataque e defesa como coisas sepa-
radas. Todo movimento deve ser feito para lançar o próximo ataque. Pense na sua defesa
como forma de configurar um ataque.”
Climb pegou sua espada caída e agarrou a dor em sua cintura enquanto ele lutava para
ficar de pé.

“Eu não usei muita força para poupá-lo de uma fratura, então deve ser capaz de lutar,
certo? Como está se sentindo?”

A respiração de Climb estava cheia de tensão e dor, em contraste com a respiração calma
e regular de Gazef.

Ele só estava desperdiçando o tempo de Gazef se não conseguisse nem levar alguns gol-
pes. Dito isso, Climb ainda queria se tornar o mais forte possível.

Ele acenou para Gazef e ergueu a espada.

“Tudo bem. Então vamos continuar.”

“Sim!”

Com aquele grito rouco, Climb começou a avançar.

Ele foi atingido, ele foi derrubado, ele foi até mesmo espancado. Climb foi amarrotado
no chão de pedra várias vezes. As lajes frias drenavam o calor de seu corpo através de
suas roupas e cota de malha, na verdade parecia muito confortável.

“Huuu... huu... huu...”

Ele não enxugou o suor. Mais precisamente, ele não tinha forças para fazê-lo.

Quando a dor inundou sua mente e todo o seu corpo, uma súbita onda de fadiga o inun-
dou, e seus olhos se fecharam levemente.

“Você fez bem. Eu tentei evitar quebrar ou trincar seus ossos enquanto o golpeava.
Como está se sentindo?”

“...”

Ainda no chão, Climb moveu as mãos para sentir os lugares que doíam.

Então ele abriu os olhos.

“Sem problemas aqui. Dói, mas essas são apenas inchaços e contusões.”

As ondas de dor eram bastante leves. Não afetariam seus deveres de proteger a Princesa.

“Entendo... então não precisaremos usar a poção.”


“Mm. Além disso, usá-la descuidadamente removerá os efeitos do treinamento muscu-
lar.”

“Bem, isso significa fornecer uma cura rápida, mas o efeito da magia também reverte o
músculo ao seu estado original. É assim que é. Então, vai proteger a Princesa depois disso,
correto?”

“Sim.”

“De todo modo, fique com isso então. Use-a se algo acontecer.”

O frasco de remédio tilintou quando Gazef o colocou ao lado de Climb.

“Muito obrigado.”

Ele sentou-se, olhando para Gazef. Ele olhou para o homem cujo o esgrima ele não podia
sonhar em competir.

O homem ileso achou estranho e perguntou:

“O que há de errado?”

“Não é nada... Eu apenas pensei que o senhor é realmente incrível.”

A testa de Gazef estava sem suor. Sua respiração estava calma e regular. Essa era a dife-
rença entre Climb, exausto no chão, e o homem mais forte do reino?

Climb suspirou, mas ele estava satisfeito com esse resultado.

Gazef, por outro lado, parecia estar sorrindo.

“...Se é o que acha. Bem...”

“Por quê—”

“—Se pretende perguntar o porquê eu sou tão forte, não posso lhe dar uma resposta.
Basicamente, eu nasci assim. Aliás, aprendi a lutar como mercenário. Os nobres chama-
vam meu hábito de chutar as pessoas de rude, mas foi nessa época que aprendi. Não des-
cobri algum segredo para me tornar forte.”

Concluiu Gazef. Climb pensara que repetindo a mesma prática repetidamente acabaria
por torná-lo um pouco mais forte, mas isso foi rejeitado em um instante.

“Nesse sentido, você é bastante adequado para o meu estilo de lutar com punhos e pés,
Climb.”
“O... O senhor acha mesmo?”

“Oh sim. Você não foi treinado como espadachim ou soldado, mas você tem uma boa
pegada. Quando alguém pega uma espada, é natural se concentrar em usá-la... mas não
acho que seja uma coisa boa. Eu sinto que a espada deve ser apenas um método de ataque,
assim como socos e chutes e assim por diante. Esse é um estilo de luta prático; é dito
como sujo... mas é um estilo de luta de aventureiro.”

O rosto de Climb não era mais como uma rocha. Havia um sorriso agora. Pensar que o
homem mais poderoso do Reino realmente elogiaria suas habilidades de espada aleató-
rias e desleixadas.

Ele ficou encantado com o fato de que sua esgrima — que os aristocratas desprezavam
— recebera tais elogios.

“Tudo bem, vamos parar de treinar por hoje. Tenho que ir. Preciso encontrar o Rei a
tempo do café da manhã. E você, não precisa se apressar e ir para o lado da Princesa?”

“Não, a Princesa tem uma visita hoje.”

“Uma visita? É algum nobre?”

E pensar que a Princesa teria um interlocutor.

Gazef ficou bastante surpreso e, em seguida, Climb respondeu:

“Sim, Aindra-sama.”

“Aindra? Oh! ...Qual dos Aindra? Azul... ou é o Vermelho?”

“Ah, é a Aindra-sama da Rosa Azul.”

Gazef suspirou em visível alívio.

“Entendo... então foi isso... então se uma amiga vier, isso significa...”

Gazef estava supondo que Renner havia impedido Climb de estar ao lado porque tinha
recebido a visita de uma amiga, mas a verdade era que Climb gentilmente recusou o con-
vite.

Ele e a princesa tinham um relacionamento em que não precisavam discutir trivialida-


des, até Gazef franzia a testa em desaprovação se soubesse que Climb recusara o convite
de um membro da Casa Real. Portanto, ele não declarou a verdade, mas deixou que Gazef
tirasse suas próprias conclusões.
Climb conheceu Aindra através de Renner, e Aindra o considerava muito bem. Certa-
mente ela não o rejeitaria como os outros nobres caso ele se juntasse a elas em um jantar.

No entanto, Climb considerou que sua mestra (Renner) não tinha quase nenhuma amiga,
e ele sentiu que se ele, como homem, não estivesse por perto, as duas senhoritas seriam
capazes de falar sobre coisas pessoais que elas não poderiam fazer normalmente.

“Muito obrigado por hoje, Gazef-sama.”

“Por favor, não faça cerimônias. Eu também me diverti muito.”

“...Se lhe agrada, posso pedir sua orientação novamente, como hoje?”

Gazef não pôde responder por um momento. Climb viu sua reação e começou a se des-
culpar, mas Gazef falou primeiro.

“Por mim tudo bem. Contanto que não haja mais ninguém por perto, é claro.”

Climb entendeu profundamente a relutância de Gazef e, por isso, não falou mais. Ele
forçou seu dolorido corpo a ficar de pé e falou seus sentimentos sinceros.

“Muito obrigado!”

Gazef acenou de volta e caminhou em frente.

“Então, por favor, arrume a bagunça. Seria terrível se eu não pudesse encontrar o Rei
para sua refeição matinal... ah, sim, aquele seu golpe descendente foi muito bom. No en-
tanto, você precisa pensar sobre o que virá depois. Considere o que você faria se seu
golpe fosse evitado ou bloqueado.”

“Sim!”

Parte 4

3º Dia do mês Baixo Fogo (9º mês) – 06:22

Depois de se despedir de Gazef, Climb limpou o suor com uma toalha úmida e foi para
um lugar que era drasticamente diferente do hall de treinamento de agora.

Esta sala tinha o mesmo tamanho do hall de treinamento. Estava cheio de muitas mesas
e bancos compridos, repletos de pessoas conversando alegremente. Uma fragrância de-
liciosa enchia o ar quente da sala.

Este era o refeitório.


Depois de entrar na sala, Climb passou pelo burburinho dos soldados e se juntou ao final
da fila.

Muito parecido com as pessoas na frente dele, Climb estava com vários vasilhames em-
pilhados. Havia uma bandeja, um prato, colher e copo, todos feitos de madeira.

Ele colocou sua refeição na ordem apropriada.

Uma batata cozida no vapor, um pouco maior do que o habitual, pão integral, ensopado
branco grosso cheio de ingredientes, repolho em conserva e uma salsicha. Para Climb,
essa era uma refeição sumptuosa.

As porções cheiravam perfumadas em sua bandeja. Climb olhou ao redor do refeitório


enquanto o cheiro instigava seu estômago.

Os barulhentos soldados estavam comendo. Eles se sentaram com os amigos e, en-


quanto comiam, conversavam sobre o que fariam na próxima folga, sobre a comida, fa-
mílias e em outros tópicos leves. Nada fora do comum.

Climb viu um assento vazio e atravessou o burburinho em sua direção.

Ele passou por cima do banco e sentou-se. Havia soldados de ambos os lados, conver-
sando cordialmente com seus amigos. Quando Climb sentou-se, eles se viraram para
olhá-lo, mas logo perderam o interesse e voltaram os olhos para outro lugar.

Era como se Climb sentasse no olho da tempestade.

Um espectador poderia pensar que isso era muito assustador.

Embora houvesse uma alegre conversa ao redor dele, ninguém deu atenção a Climb.
Embora fosse verdade que ninguém conversaria com um estranho, todos eles eram sol-
dados, servindo-se no mesmo local, e talvez precisassem depender um do outro em tem-
pos de guerra. Desse ponto de vista, a atitude deles era bem estranha.

Era como se Climb não existisse para eles.

De sua parte, Climb não planejava falar com mais ninguém, afinal, ele entendia clara-
mente sua posição.

Os guardas do Castelo Ro-Lente não eram meros soldados.

Soldados do Exército Real incluíam recrutas armados e equipados pelos lordes de vários
domínios, mercenários contratados pelas cidades, guardas encarregados de patrulhar as
cidades e assim por diante. No entanto, a única coisa que eles tinham em comum era que
eles eram todos de berço simples.
É claro que permitir que plebeus de proveniência incerta se aproximem da Casa Real e
do Palácio, com seus muitos segredos, causaria muitos problemas.

Portanto, os guardas do Castelo Ro-Lente eram aqueles que eram recomendados por
um nobre. Se os guardas causassem algum problema, seus nobres patrocinadores seriam
culpados em seu lugar. Com isso, todos os candidatos eram cidadãos justos e honestos.

No entanto, essa prática levou a um certo fenômeno.

Isso é, “faccionalização”.

Todos os nobres patrocinadores pertenciam a uma das duas facções. As tropas que eles
recomendaram naturalmente se juntariam às facções dos seus mestres. Já que qualquer
um que se opusesse aos nobres não tinha chance de ser escolhido, não era um exagero
dizer que todos os soldados aqui eram afiliados a alguma facção.

Soava puramente desvantajoso, mas o benefício era que os soldados constantemente


afiavam suas habilidades para não serem atraídos em um conflito de facções. Eles ainda
não estavam nem perto do nível dos Cavaleiros Imperiais, mas os guardas da Guarda Real
eram um tanto habilidosos.

Claro, Climb era muito mais habilidoso do que eles, mas os nobres tinham conseguido
encontrar falhas até nisso. Afinal, ele era mais forte que as tropas que os nobres propu-
seram.

Embora fosse verdade que nem todos nobres patrocinadores poderiam não pertencer a
uma facção, sob as atuais circunstâncias, o Reino estava dividido entre a Facção Nobre e
a Facção Real. Sob essas circunstâncias, havia apenas um nobre que podia voar entre os
dois lados como um morcego.

E comparativamente, havia um indivíduo semelhante entre as fileiras desses soldados


escolhidos a dedo.

E esse indivíduo era Climb.

Climb estava em uma posição muito estranha.

Originalmente, alguém como Climb não poderia ficar do lado de Renner. Por ser de nas-
cimento comum, ele nunca seria confiado com a pesada tarefa de defender a realeza. A
história até então foi que os nobres que estariam a encargo da proteção da Casa Real.

No entanto, houve exceções, na forma de Gazef Stronoff — o soldado mais forte do Reino
— e as tropas de elite sob seu comando. E então, quase ninguém poderia se opor publi-
camente ao desejo fervoroso da Princesa Renner. Talvez um membro da Casa Real pu-
desse rejeitá-la, mas como o Rei, a mais alta autoridade, dera sua aprovação, ninguém
mais poderia se opor.

Climb teve um quarto pessoal devido a posição incomum que possuía.

Renner lhe dera um quarto próprio. Mas, ao mesmo tempo, separou-o dos outros. Afinal
de contas, Climb não era afiliado a nenhuma facção e estava desconfortável em ambos os
campos, então ele era como uma batata quente passando de mão em mão.

Dada a situação e aos antecedentes de Climb, ele deveria ter sido um membro da Facção
Real. No entanto, a Facção Real era um grupo de nobres que havia jurado sua lealdade ao
Rei, e eles não aprovavam a presença de Climb, cujas origens eram desconhecidas.

No final, Climb tornou-se um ser muito espinhoso para ficar junto de alguém. Em vez
disso, eles escolheram deixá-lo em paz e esperar que ele se voluntariasse para ajudar por
vontade própria. Por outro lado, a Facção Nobre achava que apadrinhar Climb teria be-
nefícios, mas também seria como deixar um lobo entrar em suas próprias casas.

No entanto, as facções eram feitas de muitos nobres, e nem todas eram de uma só mente.
As facções eram, em última análise, organizações formadas para o lucro. Sendo esse o
caso, enquanto alguns membros da Facção Real o olhavam com desprezo — afinal, ele
era um mero plebeu que tinha sido autorizado a ser a pessoa mais próxima da Princesa
Dourada —, outros o queriam para interesses próprios.

Mas de todo modo, ninguém tinha sido descuidado o suficiente para arriscar dividir sua
facção por Climb.

Em conclusão, ambos consideraram Climb um ativo que nenhum deles queria, mas que
nenhum deles queria se render aos seus rivais.

Foi por isso que ninguém falava com ele, e ele foi deixado para comer sozinho.

Ele também não conversava com ninguém e não prestava atenção em seus assuntos. Ele
simplesmente comeu e terminou seu café da manhã em 10 minutos.

“Tudo bem, vamos lá.”

Satisfeito, ele murmurou para si mesmo — uma prática adquirida em longas horas de
solidão. Assim que ele estava prestes a se levantar, ele esbarrou em um soldado que pas-
sava.

O rosto de Climb estava impassível quando um cotovelo atingiu o local onde ele havia
se machucado em seu duelo com Gazef, mas ele ficou impassível pela dor.
O soldado que bateu nele não disse nada, apenas continuou. Os soldados ao redor tam-
bém ficaram em silêncio. Várias pessoas franziram as sobrancelhas quando viram isso,
mas ninguém disse nada.

Climb suspirou profundamente e saiu com a tigela e o prato.

Foi incômodo, mas não tanto. Ele estava simplesmente feliz por não haver cozido quente
na tigela naquele momento.

Tendo quase tropeçado por conta de um pé estendido, ele seguiu. Pessoas correndo con-
tra ele sob o pretexto de um acidente. Ele estava acostumado a essas coisas. Contudo—

—E daí?

Climb continuou em frente. Eles não podiam fazer mais nada com ele — não em um
lugar público como o refeitório.

Climb manteve a cabeça erguida. Seus olhos estavam fixos para frente e ele não titube-
aria por nada.

Se ele mostrasse algum sinal de comportamento impróprio, causaria problemas para


sua mestra, Renner. Afinal de contas, cada movimento que Climb fazia refletia direta-
mente na reputação de Renner — a mulher a quem ele devia sua lealdade.
Capítulo 02: As Rosas Azuis
Parte 1

3º Dia do mês Baixo Fogo (9º mês) – 08:02

rajado com sua armadura branca de placas e com sua espada embainhada,

T
Climb agora totalmente equipado entrou no Palácio de Valência.

O Palácio de Valência fôra dividido em três alas e ele acabara de entrar em


uma delas. Esta era a maior das três, onde residia a Família Real.

Ao contrário das locações de antes, o Palácio estava muito bem iluminado, coletando luz
do lado de fora de amplas janelas que parecia fazer o interior brilhar.

Os corredores polidos estavam livres de lixo; praticamente impecável, na verdade. A


armadura de placas de Climb não emitia som enquanto andava, sua composição era uma
liga de mythril e orichalcum, e acima disso foi adicionado um encanto mágico.

Ao longo dos corredores limpos e espaçosos, estavam os soldados de elite designados


para vigiar o Palácio. Eles pareciam resplandecentes em suas armaduras de corpo inteiro
— eram cavaleiros.

Os Cavaleiros do Império eram plebeus recrutados e treinados em soldados profissio-


nais. Em contraste, os cavaleiros do Reino eram geralmente terceiros filhos de nobres ou
outros que não poderiam herdar o patrimônio da família. No entanto, a Coroa pagou-lhes
muito bem, e assim apenas espadachins de primeira linha foram aceitos como membros.
Nem mesmo os nobres podiam se esgueirar por meio de conexões clandestinas.

A melhor maneira de descrevê-los seria “a guarda pessoal do Rei”.

Por um acaso, a posição de Gazef como Capitão Guerreiro foi porque muitas pessoas se
opuseram a sua condição de cavaleiro, e assim o Rei criou um novo título para ele. Desde
então, o grupo de soldados de elite que ele havia escolhido e treinado pessoalmente fica-
ram conhecidos como Guerreiros.

Climb assentiu levemente para eles. Quase todos eles retornaram o gesto. Apenas alguns
deles fizeram isso com relutância; a grande maioria era sincera em sua cortesia. Eles po-
diam ser nobres, mas também eram homens de espírito marcial que juraram ao Rei. Ex-
celentes guerreiros que devotaram suas vidas ao Rei eram dignos de seu respeito.

Em contraste, Climb passou por outro grupo de pessoas no corredor que o via com hos-
tilidade.

Eram as empregadas. Quase todas franziam as sobrancelhas sempre que viam Climb.
Ao contrário das empregadas comuns, as empregadas do Palácio Real eram todas no-
bres que tinham vindo aqui para erguer sua própria posição. Assim, em certa medida,
elas eram de status mais alto que Climb. Em particular, as empregadas que serviram pes-
soalmente à Família Real que eram herdeiras da alta nobreza. Elas demonstraram clara-
mente sua raiva por ter que se curvar e mitigar diante de um homem que em suma era
meramente o retrato da plebe.

Era verdade que Climb veio de berço pobre, então não era difícil entender por que elas
olhariam com desprezo quando Renner não estava presente. Climb entendeu isso e
nunca ficou zangado com elas por tais ações.

No entanto, essa mentalidade, combinada com a própria expressão séria de Climb, fez
as empregadas pensarem que ele estava esnobando-as e isso só aprofundou sua raiva
por ele. Porém, Climb não deu atenção a este ciclo vicioso. Ou melhor, seria melhor dizer
que, se ele fosse realmente tão cuidadoso com este assunto, ele deveria ser capaz de
amarrar as pontas soltas de uma maneira melhor.

Mesmo assim, Climb sentia-se mentalmente fatigado depois caminhar por estes corre-
dores do Palácio.

Havia outros membros da família real no Palácio além de Renner e o Rei Ranpossa III.

—Ggh?!

Quando Climb viu um desses membros da realeza aproximar-se, ele imediatamente foi
até a parede, posicionou as costas retas, e pressionou a mão contra o peito em uma sau-
dação.

Duas pessoas se aproximaram dele. O que estava por trás era um homem alto e magro,
de cabelos loiros penteados para trás.

Era Marquês Raeven, um dos Seis Grandes Nobres do Reino.

O problema era o homem rechonchudo andando na frente dele. Seu nome era Zanac
Valleon Igana Ryle Vaiself. Ele era o segundo filho do Rei e o segundo na linha de sucessão
ao trono.

Zanac parou e seu rosto rotundo se contorceu.

“Oh, se não é Climb. Pretende ir ver aquele monstro?”

Havia apenas uma pessoa a quem Príncipe Zanac se referia como monstro. Climb sabia
que o que ele estava prestes a fazer poderia ofender um superior hierárquico, mas ele
simplesmente não podia ficar em silêncio.
“Vossa Alteza. Perdoe minha impertinência, mas a Renner-sama não é um monstro. É a
pessoa mais gentil, compassiva e bela, sua aparência é digna de ser um tesouro do Reino.”

Ela havia resolvido o problema dos escravos e proposto políticas que colocavam o ho-
mem comum em primeiro lugar. Se ela não se qualificasse como um tesouro, então o que
mais seria? É verdade que os nobres frequentemente obstruíam sua legislação e impe-
diam que a maioria de suas políticas fosse implementada, mas Climb ainda sabia o quanto
ela pensava no povo.

Essa mulher gentil chorou diante de Climb sempre que suas políticas populistas eram
negadas. Que direito um homem inútil (Zanac) teria ao insultá-la assim?

A raiva explodiu no coração de Climb e ele desejou dar um bom soco em Zanac.

Eles poderiam ser irmãos de sangue, mesmo que apenas por parte de pai, mas ele não
deveria estar dizendo tais coisas. No entanto, Climb não permitiu que sua raiva assu-
misse a forma física.

Renner disse uma vez: “Meu irmão quer te provocar, te instigar a caluniá-lo. Tenho cer-
teza de que ele está tentando encontrar uma desculpa para te afastar de mim. Climb, você
não deve mostrar nenhuma fraqueza para meu irmão.”

Climb pensou no dia em que jurou solenemente que nunca trairia aquele olhar desam-
parado no rosto de sua mestra, que fôra abandonada até pela família.

“Eu nunca disse que a Renner era um monstro. Isso é apenas o que você está pensando...
esqueça, pare com as desculpas clichês. Ainda assim... e pensar que você realmente a con-
sidera um tesouro. Quando ela faz suas propostas, ela realmente acha que seriam aceitas?
Não posso deixar de pensar que ela os sugere mesmo quando sabe que serão rejeitadas.”

Como poderia ser isso? Era impossível. Este homem estava simplesmente fazendo su-
posições descontroladas vindas de sua inveja doentia.

“Seu servo alega que tal situação não é o caso aqui.”

“Huhuhuhu... Então você não considera aquela menina um monstro. Eu não sei se você
tem um péssimo gosto ou se a atuação dela é boa demais... eu sugiro que você duvide dela
um pouco mais.”

“Como eu poderia duvidar? Renner-sama é um tesouro do Reino. Disso não tenho dú-
vida.”

Tudo o que ela fez foi justo. Climb poderia chegar a essa conclusão porque ele estava
assistindo do lado dela.
“Veja só, é assim que pensa? Que interessante. Então, você poderia enviar uma mensa-
gem àquele monstro? ...Diga a ela que “embora eu, como seu irmão mais velho, a considere
como uma ferramenta política, se estiver disposta a me ajudar, posso aliviar sua herança e
conceder-lhe um domínio nas fronteiras”.”

A frustração aumentou no coração de Climb.

“...Certamente é uma brincadeira. Eu mal posso acreditar que Vossa Alteza realmente
me diria isso em um lugar como este, então fingirei que nunca ouvi isso.”

“Huhuhuhu. Que pena. Vamos indo, Marquês Raeven.”

O homem silencioso assentiu enquanto observava Climb e Zanac.

Climb não entendia muito bem o Marquês Raeven. Ele parecia distinguir muito bem a
situação de Climb, mas não olhava para Climb da mesma forma que os outros nobres.
Renner também não deu nenhuma instrução especial para Climb sobre as atitudes de
Raeven.

“Ah sim. Marquês Raeven concorda comigo que ela é um monstro. Não, é mais como se
tivéssemos a mesma opinião, daí a nossa aliança.”

“—Meu Príncipe.”

“Deixe-me dizer isso, Marquês Raeven. Preste atenção às minhas palavras, Climb. Se
você fosse cegamente devotado a ela, eu não estaria contando tudo isso para você. No
entanto... sinto que você foi enganado por àquele monstro. É por isso que eu estou di-
zendo a você, de boa-fé, sobre a natureza monstruosa da minha irmãzinha.”

“Meu Príncipe, perdoe minha grosseria, mas poderia me dizer de que maneira a Renner-
sama é um monstro? Ninguém se importa mais com o país e as pessoas do que ela.”

“...Isso é porque tudo que ela faz é um desperdício de esforço. Ela faz muitas jogadas de
pouca importância. No começo, eu achava que ela era simplesmente incapaz de lidar com
os outros. Então, enquanto discutia o assunto com o Marquês Raeven, percebi que ela já
poderia ter antecipado isso. Depois que eu percebi isso, tudo se encaixou. Se esse fosse
realmente o caso, então ela seria uma mulher que, mesmo trancada no Palácio, poderia
manipular os nobres como desejasse. O que é isso, se não um monstro?”

“Certamente deve estar enganado, Vossa Alteza. Renner-sama não é esse tipo de pessoa.”

—Insistiu Climb.

Suas lágrimas eram definitivamente genuínas. Renner era uma mulher compassiva.
Climb sabia disso melhor do que qualquer outra pessoa, já que ela o resgatou.
No entanto, as palavras de Climb não conseguiram abalar o Príncipe. Ele sorriu amarga-
mente e depois deixou Climb. Com isso, Marquês Raeven seguiu atrás dele.

Climb resmungou para si mesmo no corredor agora deserto.

“Renner-sama é a pessoa mais gentil do nosso país. Minha existência é prova disso. E
se...”

Climb engoliu as seguintes palavras, mas falou em seu coração.

Se a Renner-sama governasse o Reino, certamente se tornaria uma grande nação que co-
loca o povo em primeiro lugar.

Claro, esse era um sonho impossível, dada a realidade da sucessão. Mesmo assim, Climb
não conseguiu abandonar essa idéia.

3º Dia do mês Baixo Fogo (9º mês) – 08:11

Pouco depois, Climb chegou ao cômodo que mais visitava neste palácio.

Depois de verificar várias vezes para ter certeza de que ninguém estava por perto, ele
estendeu a mão e girou a maçaneta.

Entrando sem bater era um curso extremamente indelicado de ação. No entanto, a dona
desta sala pediu-lhe que o fizesse. Sua mestra se recusou a ouvir seus protestos, não im-
portando o que ele dissesse.

No final, Climb desistiu. Não havia como ganhar quando as lágrimas das mulheres fluís-
sem. Ainda assim, sua mestra lhe permitira várias exceções a isso. Por exemplo, não havia
como ele conseguir entrar sem ser anunciado se o Rei estivesse presente.

Claro, entrar sem bater eram uma atitude muito estressante para Climb. Pessoas que
fazem isso deveriam ser punidas. Era natural que ele se sentisse estressado quando pen-
sava nisso e abria a porta.

Assim que Climb estava prestes a abri-la, ele ouviu os sons de uma discussão acalorada
pela porta entreaberta.

Havia duas vozes, ambas femininas.

Uma delas pertencia a sua mestra. Climb ainda estava do lado de fora da porta, mas ela
não o havia notado. Isso foi provavelmente porque ela estava muito animada com a con-
versa. Sendo esse o caso, Climb não queria arrefecer seu ardor. Ele decidiu ficar parado,
ouvindo a discussão vinda de dentro da sala. Claro que se sentia culpado por espionar,
mas se sentiria pior se interrompesse a conversa.
“—Eu te disse, não é? As pessoas sempre se concentraram em ganhos imediatos.”

“Hm...”

“...O plano da rotação de culturas que estava falando, Renner... Eu não tenho idéia de
como isso vai aumentar os rendimentos... mas quanto tempo levará para mostrar os re-
sultados?”

“Cerca de seis anos ou mais.”

“E quanto dinheiro será perdido no plantio de outras culturas durante esses seis anos?”

“Isso dependeria das culturas em questão. No entanto, supondo que um rendimento


normal seja um, acho que o rendimento cairia para zero virgula oito... em outras palavras,
é uma perda de receita de vinte por cento. No entanto, após o sexto ano, o rendimento
subirá em zero virgula três para sempre. Tenho certeza de que o número será maior se
adicionarmos pastos para o gado na soma.”

“...Isso soa bastante tentador, mas os agricultores podem realmente perder vinte por
cento de sua renda durante seis anos inteiros?”

“...Eu acho que poderíamos ter o país providenciando empréstimos sem juros para com-
pensar a perda de vinte por cento, depois pediríamos o reembolso quando os rendimen-
tos voltassem ao normal... Se os rendimentos não subissem, então não precisaríamos ser
reembolsados, poderia haver alguns outros meios também. O importante é que, uma vez
que os rendimentos subam, os empréstimos poderiam ser pagos com prazos de quatro
anos.”

“Isso pode ser difícil.”

“Por que diz isso?”

“Eu te disse, não é? As pessoas preferem se concentrar em ganhos imediatos, a maioria


deles nunca verá nada que esteja além de seus olhos. Muitas pessoas hesitarão mesmo
se você disser que elas poderão obter cento e trinta porcento de suas culturas originais
em seis anos.”

“Eu... não entendo. Funcionou muito bem no campo de testes...”

“Talvez o experimento tenha corrido bem, mas você ainda não pode garantir que será
bem-sucedido.”

“...Bem, é verdade que não previmos todas as condições possíveis durante a realização
do experimento, por isso não podemos ter certeza absoluta dos resultados. Se tivéssemos
que considerar a qualidade do solo e o clima também, o experimento teria se tornado
muito grande...”
“Isso é preocupante. Não sei se esse aumento de trinta por cento é um valor mínimo ou
um valor médio. De qualquer forma, não é muito convincente. Você precisa garantir lu-
cros e que eles não perderão a curto prazo.”

“Que tal subsidiar o défice de vinte por cento para o período de seis anos?”

“A Facção Nobre adoraria isso, porque enfraqueceria o poder do Rei.”

“Mas, se pudermos garantir um grande retorno depois de seis anos, o Reino também
ficará mais forte, correto?”

“Isso também significa que a Facção Nobre oposta também se tornará mais forte, en-
quanto o lado do Rei terá um rendimento vinte por cento menor. Os nobres da Facção
Real não vão aguentar.”

“Então, que tal perguntar aos comerciantes...”

“Os grandes comerciantes? Eles têm uma política própria entre eles. Se eles ajudarem a
Realeza com muita facilidade, isso pode arruinar seu relacionamento com os nobres.”

“Certamente há muitos problemas... Lakyus.”

“...E todos eles surgiram porque você não é boa em planejar o futuro. Bem... eu entendo
que é difícil conseguir uma proposta aprovada quando o país é dividido por dois grandes
blocos... Que tal implementá-la apenas no território da Coroa?”

“Meus irmãos não aprovarão.”

“Ah, aqueles retard... aqueles cavalheiros que deixaram a sabedoria na barriga de suas
mães por sua causa.”

“...Mas nós não temos a mesma mãe.”

“Ahhhh, então eles deixaram no Rei! Ainda assim, é muito ruim quando até mesmo a
Família Real não está unida...”

A sala ficou em silêncio, o que disse à Climb que a discussão terminara.

“Ah, você pode entrar. Não é mesmo, Renner?”

“Hm?”

O coração de Climb tremeu quando ele ouviu aquelas palavras. Ele ficou surpreso por
ela ter percebido sua presença, e ao mesmo tempo, ele estava ansioso por isso.
Ele lentamente abriu a porta.

“—Perdão.”

Uma visão familiar encheu os olhos de Climb.

A sala era luxuosa, mas não brega, e havia duas donzelas de cabelos loiros sentadas à
uma mesa redonda próxima a janela.

Ambas eram belas damas em belos vestidos.

Uma era a dona desta sala, Renner.

A outra se sentava em frente a ela. Seus olhos eram verdes e seus lábios estavam rosados,
seus traços radiavam saúde. Talvez não fosse justo comparar sua aparência a de Renner,
ela exalava um encanto próprio. Se Renner brilhava como uma pedra preciosa, então ela
brilhava com vitalidade.

Seu nome era Lakyus Alvein Dale Aindra.

Era difícil dizer, dado o vestido cor-de-rosa que ela usava, mas essa mulher era a líder
de uma das duas equipes de aventureiros do Reino, e a melhor amiga de Renner.

Ela acumulara um número considerável de conquistas com a tenra idade de 19 anos, e


o fato de ter alcançado o cobiçado grau de adamantite deve-se a seu talento espantoso.
Climb sentiu a agitação do ciúme nas profundezas de sua alma.

“Bom dia, Renner-sama, Aindra-sama.”

“Bom dia, Climb.”

“Bom dia.”

Depois de cumprimentá-los, Climb se moveu para o local designado — atrás e à direita


de Renner —, mas uma voz o deteve.
“Climb, aí não. Aqui.”

Renner indicou a cadeira à sua direita.

Climb achou isso muito estranho. Havia cinco cadeiras dispostas ao redor da mesa cir-
cular. Isso era normal. No entanto, três xícaras de chá estavam postas.

Uma em frente a Renner, outra antes de Lakyus, e mais uma em frente ao assento ao
lado de Lakyus — não o que Renner havia indicado. Climb olhou em volta, mas não con-
seguiu encontrar nenhum vestígio da terceira pessoa.

Climb ficou surpreso, mas ele olhou para a cadeira de qualquer maneira.

As ordens de Renner para Climb causaram um grande esforço para ele, seja por ser ple-
beu compartilhando uma mesa com sua mestra — um membro da realeza — ou por en-
trar sem ser convidado.

“Mas...”

Climb olhou suplicante para a outra mulher em busca de ajuda. Ele esperava contra toda
a esperança que ela rejeitasse o pedido, mas essa esperança foi prontamente negada a
ele.

“Eu não me importo.”

“Ma-mas isso... Aindra-sama...”

“Eu te disse antes, não é? Me chame de Lakyus.”

Lakyus olhou para Renner.

“Climb é especial ♥.”

“...Malvada.”

Lakyus acrescentou o que parecia um coração ao final de sua frase em tons de doçura
treloso, Renner a respondeu com uma queixa e um sorriso.

Claro, isso era a carícia dos lábios que não correspondia aos olhos tidos como um sorriso.

“Aindra-sama, por favor, não faça gracejos assim.”

“Tá, tá, tudo bem. Você realmente é um tapado, não é, Climb? Você deve aprender a não
ficar preso a detalhes como ela.”
“Eh? Gracejos?”

Diante do olhar de surpresa de Renner, Lakyus congelou de uma maneira incrivelmente


falsa antes de exalar com intensidade exagerada.

“Mas é claro. Bem, Climb é especial, mas isso é porque ele é seu.”

O rosto de Renner ficou rosado e ela bateu as mãos nas bochechas. Climb não tinha idéia
do que fazer e desviou o olhar de Renner, e então seus olhos se arregalaram.

Isso porque havia alguém sentado nas sombras no canto da sala, abraçando os joelhos
para si. Ela era uma mulher, que usava roupas pretas justas que pareciam totalmente
incongruentes com a atmosfera da sala.

“Quê—!”

Chocado, Climb agarrou a espada em sua cintura e abaixou sua postura, preparado para
proteger Renner.

Lakyus suspirou.

“Agora você assustou o Climb, ele até assumiu essa postura.”

Não havia cautela ou consciência do perigo na voz fria de Lakyus. Climb percebeu o que
isso significava e deixou a força drenar de seus ombros.

“Entendido, chefe.”

A mulher sentada na escuridão se pôs de pé num instante.

“Ah, você provavelmente não a conhece, Climb. Ela é um membro da minha equipe—”

“—É Tina-san.”

Renner a ajudou a dizer.

Pelo que Climb sabia, a equipe adamantite “Rosa Azul” era composta por cinco mulhe-
res; a líder e magic caster divina, Lakyus, a guerreira Gagaran, a magic caster arcana Evi-
leye, e por fim as ladinas Tia e Tina.

Climb tinha visto as três primeiras antes, mas não as duas últimas.

Então ela deve estar... Entendo. Sua reputação não apenas um enfeite.

Dados seus longos membros e suas roupas justas, ela parecia alguém versado em técni-
cas ladinas.
“...Me perdoe. Prazer em conhecê-la, meu nome é Climb.”

Climb inclinou-se profundamente para Tina.

“Huh? Não se preocupe com isso.”

Ela acenou casualmente para Climb, e então silenciosamente seguiu em direção à mesa
com a graça fluida de uma besta selvagem. Então, ela se sentou na cadeira ao lado de
Lakyus. Parece que o chá de antes era dela.

Climb cuidadosamente inspecionando o seu entorno para verificar se mais alguém se


escondia. Havia apenas três xícaras de chá na mesa, então parecia improvável, mas ele o
fez assim mesmo.

Lakyus sentiu a razão por trás do olhar de Climb e disse:

“Tia não está aqui. Gagaran e Evileye não gostam de roupas abafadas... mas não é tão
abafado, é? Eu mesma estou usando um vestido apropriado, e olha que nem insisti para
que elas fizessem o mesmo.”

Mesmo que Lakyus dissesse isso, o fato era que a etiqueta exigia que se usasse um ves-
tido formal na frente de uma princesa. Claro, Climb não tinha intenção de dizer isso na
cara de uma amiga de Renner — particularmente uma dama que era membro da nobreza.

“Entendo. Ainda assim, é uma honra conhecer a famosa Tina-sama. Espero ter a chance
de me beneficiar de sua orientação no futuro.”

“Fale depois de se sentar, Climb.”

Dizendo isso, Renner serviu uma nova xícara de chá. O chá que fluía do item mágico
[Garrafa Quente]
conhecido como Warm Bottle estava bem quente, como se tivesse acabado de ser prepa-
rado.

A Warm Bottle podia manter a temperatura e harmonização de seu conteúdo por uma
hora, e era um dos itens mágicos favoritos de Renner. Seu uso era frequente ao entreter
convidados importantes, embora não em outros momentos.

Climb sabia que não havia protestos e se resignou. Assim, ele sentou-se e bebeu seu chá.

“É delicioso, Renner-sama.”

Renner sorriu, mas com toda a honestidade, Climb não sabia se era bom ou não. Ainda
assim, desde que Renner tinha feito isso, ele automaticamente considerou isso como algo
bom.
De repente, uma voz suave e sem emoção falou.

“—A garota que procura deve estar reunindo inteligência hoje. Nós três deveríamos vir
aqui juntas, mas no final nossa líder Diabólica entregou trabalho no último minuto. É
tudo culpa da nossa líder Diabólica.”

Escusado dizer que a voz veio de Tina. Um sorriso assustador apareceu no rosto de
Lakyus quando ela ouviu as palavras “Diabólica”. Climb desviou os olhos e disse:

“Entendo... eu espero poder vê-la em algum momento.”

“Climb, Tina-san e Tia-san são gêmeas. Até os penteados são quase idênticos.”

“Então, uma vez que você viu uma, você viu a outra.”

Climb não achou o assunto tão simples assim, mas assentiu em compreensão.

Ainda assim, Tina encarava Climb sem o menor pudor, fazendo-o se sentir desconfortá-
vel. Seu plano original era apenas suportar, mas então ele percebeu que ela poderia ter
notado algo, e então ele se decidiu perguntar:

“Aconteceu algo?”

“Você cresceu bastante.”

“...Huh?”

Ele ouviu, mas não entendeu. Depois de ver os pontos de interrogação surgindo na ca-
beça de Climb, Lakyus interrompeu e pediu desculpas:

“Não é nada; apenas uma piada dela. Não pense nisso, tudo bem, Climb? Não, não se
preocupe com isso.”

“Sim...”

“—Qual é o problema, Lakyus?”

Climb disse a si mesmo para não ser um intrometido, mas Renner não parecia aceitar e
interrompeu. Lakyus tinha uma expressão amarga no rosto enquanto olhava para Ren-
ner.

“É sério, sempre que começamos a falar sobre o Climb...”

“Ah, é que—”
“—Quieta. Eu não trouxe a Tia, porque ela encheria a cabeça da Renner de bobagens.
Então você poderia entender isso e não tagarelar tanto?”

“Sim, Chefe Diabólica.”

“...Lakyus. O que está acontecendo?”

O rosto de Lakyus começou a se contrair assim que Renner começou a perguntar, e sua
expressão ficou deprimida.

Ela mudou sua linha de visão para Climb quando ele estava prestes a se intrometer.

“Hm... Climb, parece que você realmente gosta dessa armadura.”

“Sim. Esta armadura é muito requintada. Muito obrigado.”

Esta foi uma mudança de assunto um tanto inusitada, mas Climb não queria envergo-
nhar uma convidada. Depois de aceitar isso, ele acariciou distraidamente a armadura
branco-neve que sua mestra. Ela foi feita com grandes quantidades de mythril — e ori-
chalcum — e foi encantada, tornando-a surpreendentemente leve e resistente.

A Rosa Azul havia fornecido o mythril para sua feitura sem nenhum custo. Climb não
pôde agradecer-lhes o suficiente por isso, por mais baixo que ele se curvasse.

Assim que ele estava prestes a fazê-lo, Lakyus o deteve.

“Não se preocupe com isso. Nós simplesmente lhe demos as sobras dos materiais das
nossas armaduras de mythril.”

Ela chamava de sobras, mas o fato era que o mythril era um material extremamente caro.
Talvez os aventureiros ranques mythril possuam uma arma de mythril, enquanto aven-
tureiros orichalcum possam ter condições de arcar com a manufatura de uma armadura
de mythril. Mas apenas aventureiros de posição adamantite poderiam dar trajes aos ou-
tros sem nenhum custo.

“Além disso, foi a Renner que me pediu. Como eu poderia recusar?”

“—Você se recusou a pegar meu dinheiro. Eu tinha algum dinheiro guardado...”

“...Não é certo que uma princesa gaste sua mesada, você não acha?”

“Isso é separado da renda do meu domínio. Eu só queria usar o meu próprio dinheiro
para fazer a armadura do Climb.”

“Eu imaginei que você queria usar o seu próprio dinheiro para fazer uma nova e bri-
lhante armadura de placas para o Climb...”
“...Se já sabia, então por que me deu de graça? Lakyus, sua idiota.”

“Dadas as circunstâncias, você deveria realmente me chamar de idiota...”

Assim, a fumegante Renner e a risonha Lakyus ficavam em um vai e vem, em argumen-


tos que dificilmente se qualificavam como tais.

Com isso, o rosto de Climb se endureceu em uma máscara sem emoção.

O fato de ele poder testemunhar uma cena reconfortante como essa era tudo graças a
ser resgatado por sua mestra. No entanto, ele não podia se permitir expressar seus sen-
timentos.

Mostrar sua gratidão era uma coisa, mas por trás dessa gratidão havia um sentimento
poderoso que nunca poderia ser exibido.

O amor que nutria por ela.

Climb forçosamente esmagou esse sentimento e escondeu dentro de si. Em seu lugar,
ele proferiu as palavras que repetira várias vezes:

“Muito obrigado, Renner-sama.”

Quando ela ouviu a maneira em que ele claramente demarcou a separação entre os dois
— um indício de que mestre e servo estavam em circunstâncias diferentes —, Renner
sorriu.

Apenas Climb — que a observara mais do que qualquer outra pessoa, que a vigiava to-
dos os dias — podia dizer que o sorriso dela escondia a solidão.

“Está bem. Então, acho que nos afastamos bastante do assunto. Vamos voltar para a dis-
cussão anterior.”

“Oito dedos, é isso? Estávamos falando sobre como atacamos três de seus vilarejos pro-
dutores de drogas e queimamos seus campos até as cinzas. Eu duvido que eles possam
se recuperar disso.”

Quando ouviu esse nome, Climb mentalmente franziu seu cenho sob sua máscara de
ferro.

Oito Dedos era o nome do sindicato criminoso que se contorcia na escuridão do Reino.
Sua amada mestra havia tomado medidas para reprimi-los.
Não era difícil imaginar o destino miserável de um vilarejo, que dependia das drogas
para sobreviver, quando seus campos fossem queimados. No entanto, eram um sacrifício
necessário para eliminar as drogas que assolam o Reino.

Talvez se Renner possuísse o poder supremo, ela poderia fazer outra coisa. No entanto,
Renner não tinha patrocinadores, apesar de ser uma princesa. Tudo o que ela podia fazer
era realizar o cálculo frio de salvar aqueles que poderiam ser salvos e abandonar todos
os outros.

Por outro lado, Renner poderia implorar uma benção de seu pai para atacá-los com au-
toridade ou força militar. No entanto, a Oito Dedos estava profundamente entrelaçada
com os nobres, e se a notícia vazasse, eles poderiam queimar a evidência de seus erros.

Considerando esses pontos, Renner decidiu empregar diretamente sua amiga, Lakyus.

Climb sabia que esse era um caminho muito arriscado. Em circunstâncias normais, os
aventureiros trabalhavam através da Guilda e não podiam receber pedidos diretamente
dos clientes. Isso era uma violação das regras da Guilda dos Aventureiros.

É verdade que ele se lembrava de que a Guilda não podia punir seus aventureiros mais
bem classificados (ranque adamantite), nem poderia expulsá-los. Mesmo assim, ainda
mancharia sua reputação dentro Guilda e certamente levaria a repercussões no futuro.
No entanto, a equipe Rosa Azul aceitou a tarefa sem se importarem, porque elas amavam
muito seu país, e porque Renner era amiga delas.

A gratidão de Climb em relação a Lakyus cresceu quando percebeu que ela estava dis-
posta a fazer sacrifícios pelo bem maior.

♦♦♦

Lakyus decidiu que elas não deveriam mais falar mais sobre isso. Ela abriu a bolsa que
Tina lhe apresentou e tirou um pergaminho.

Era um documento que ninguém na Rosa Azul poderia decifrar. No entanto, Lakyus sen-
tiu que a pessoa mais inteligente que ela conhecia — Renner — poderia ser capaz de
fazer alguma coisa.

“Encontramos este pergaminho enquanto queimamos os vilarejos. Parecia algum tipo


de ordem escrita, então nós o trouxemos de volta... você consegue entender?”

Elas abriram o pergaminho e viram uma extensão de símbolos. Eles não se pareciam
com letras do idioma de qualquer país. Renner olhou para eles e casualmente respondeu:

“...É uma cifra de substituição, não?”


As cifras de substituição eram uma forma de código feita substituindo uma letra ou vá-
rias letras por outra letra ou símbolo. Por exemplo, “a” pode se tornar “△” e “b” pode se
tornar “▢”. Assim, os símbolos “△△▢▢△” significam “aabba”.

“Pensei em algo assim. Tentei trocar símbolos por horas, mas não consegui entender.
Nós pegamos um homem prisioneiro que parecia estar no comando porque suspeitamos
que ele pudesse ter memorizado a chave cifrada, e estávamos planejando usar magia de
charme nele para fazê-lo decodificar a mensagem para nós. No entanto... você deve saber
que quando o mesmo conjurador usa a mesma magia no mesmo sujeito várias vezes, os
resultados obtidos ficam mais fracos. Portanto, eu queria fazer bom uso da primeira con-
juração. Então eu decidi discutir isso com você antes de usar a magia.”

“Entendi... e a razão disso foi por causa de... armadilhas? Ou é algo mais? Se esse for o
caso, eles não usariam um código muito difícil de quebrar. Hmm, não acho que isso seja
muito difícil.”

As palavras de Renner deixaram os olhos de Lakyus arregalados. Ela não pôde deixar de
trocar olhares com Tina, que estava sentada ao lado dela.

Inacreditável. Mas, ao mesmo tempo, elas pensaram: “Eu sabia que ela poderia resolver
isso”.

“Deixe-me pensar... na língua do Reino, a primeira palavra de qualquer documento é um


pronome masculino, feminino ou neutro... me dê um momento...”

Enquanto ela murmurava para si mesma, Renner se levantou com o pergaminho e foi
buscar papel e caneta.

Então, ela começou a escrever blocos de texto no papel.

“Esta é uma simples cifra de substituição de um caractere para um símbolo, por isso é
fácil quebrá-la. E felizmente, eles estavam usando o idioma do Reino. Se eles tivessem
usado o do Império ou algo assim como uma cifra, seria quase inquebrável. Mas isso...
bem, uma vez que você saiba o que uma das palavras significa, pode preenchê-las uma a
uma. Qualquer um poderia quebrar isso se eles estivessem dispostos a se esforçar.”

“Não, não... bem, você faz parecer fácil. Mas isso não significa que você precisa saber
dezenas de milhares de palavras para quebrar o código?”

“Bem, esses são referências literárias de codificação. Geralmente não são muito rebus-
cados e eles não podem usar palavras que são muito complexas também. Então precisa-
riam simplificar o suficiente para que até uma criança entendesse. Isso diminui muito as
possibilidades.”

Dentro de seu coração, Lakyus começou a suar frio.


Sua amiga fez parecer muito simples, mas não era tão simples quanto ela dizia ser.

Ainda assim, ela realmente foi capaz de fazer isso... É difícil acreditar que tal gênio real-
mente exista.

Renner havia desconsiderado elogios assim toda vez que elas se encontravam ou con-
versavam, mas Lakyus nunca havia conhecido alguém como Renner que merecesse ser
chamado de gênio.

Enquanto Lakyus tremia internamente, Renner disse com ânimos leves: “Está feito. É
apenas um monte de referências de livros.”, antes de entregar o papel para ela.

Havia muitos locais dentro do Reino escritos nele, e sete deles estavam dentro da Capital
Real.

“São depósitos de drogas ou outras bases importantes?”

“Eu duvido que eles colocaram um documento tão importante em uma área de produção
comum... isso é provavelmente uma isca, não acha?”

“Isca? Como para uma armadilha?”

“Hm... eu não penso assim. Pense desta maneira. Oito Dedos é uma organização, mas eles
são mais como oito grupos separados trabalhando juntos, certo?”

Lakyus assentiu.

“Então, isso deve ser informação sobre os outros sete grupos... ou melhor dizendo, divi-
sões? De todo modo, essa é uma forma de vazar deliberadamente informações sobre to-
dos, muito além da divisão de drogas, para possíveis inimigos, a fim de tirar o foco de si
mesmos.”

“Em outras palavras, eles reuniram informações sobre as outras divisões para situações
assim... Eu não esperava que eles fossem totalmente unidos, mas isso é simplesmente
ridículo...”

Sendo uma aventureira, a noção de trair os companheiros a frustrou.

“Já estávamos nos preparando para fazer isso, mas é melhor não agirmos apressada-
mente, ou então pode acabar mal para nós.”

Depois de ver sua amiga (Renner) acenar, Lakyus perguntou novamente:

“Então, o que devemos fazer sobre aquele bordel? Eu ouvi dizer que é um lugar real-
mente ruim, onde se pode experimentar qualquer coisa que desejar.”
Lakyus sentiu sua raiva aumentando apenas por mencionar isso.

Desgraçados. Aquela escória que só consegue pensar com a luxúria deve ser morta!

Quando ela se lembrou das coisas que aconteciam no bordel em questão, ela não mais
tinha a postura de uma herdeira nobre, mas sim assumiu uma aventureira audaz, e os
amaldiçoamentos brotaram de dentro de seu coração. O significado da frase “qualquer
coisa que desejar” não era exagero. Era certo que algumas pessoas — homens e mulheres
— haviam sido assassinados em prol do entretenimento.

No passado, quando a escravidão ainda não havia sido criminalizada, havia alguns des-
ses bordéis operando no submundo. No entanto, graças a sua amiga aqui presente, o trá-
fico de escravos era agora ilegal, e esses estabelecimentos haviam desaparecido como
poeira ao vento. Este local em particular pode muito bem ser o último bordel ilegal do
Reino.

Por esse motivo, eles não o fechariam facilmente. Poderiam até imaginar que tipo de
resistência determinada os aguardava. Afinal de contas, era um paraíso contaminado
para aquelas pessoas com desejos crus e indescritíveis.

“Diga Renner. Como não podemos lidar com eles por meio da lei, por que não o forçamos
a se mostrarem e assim expomos seus crimes? Claro, contanto que encontremos provas,
não é mesmo? Se a Divisão de Escravatura estiver realmente administrando esse bordel,
quebrá-los será um grande golpe. Além disso, dependendo de onde as evidências apon-
tam, poderemos ensinar uma lição dolorosa aos nobres que estão em aliança com eles.”

“Você pode ter razão, Lakyus. Mas se fizer isso, não vai incomodar sua família... a família
Alvein? Eu acho muito difícil agir por causa disso. A mesma coisa vale para os outros
membros da Rosa Azul... e ter o Climb lá, no meio disso, parece quase impossível...”

“Seu servo lamenta profundamente a falta de força.”

Quando ela viu Climb se desculpar, Renner estendeu a mão para que Climb pegasse e
sorriu.

“Perdoe-me, Climb. Isso não foi o que eu quis dizer. É o único bordel do submundo na
Capital Real, então ninguém poderia derrubá-lo sozinho. Veja, eu confio em você mais do
que tudo, Climb. Eu sei o quanto você dá o seu melhor por mim. No entanto, não faça nada
que possa te envolver nisso. Este não é um pedido, mas uma ordem, entendeu? Se alguma
coisa acontecesse com você, eu...”

Até mesmo Lakyus, apenas os observando, ficou comovida pelas lágrimas da beleza ar-
rebatadora diante de seus olhos. E quanto a Climb?

Ele tentou ao máximo ficar com o rosto sem emoção, mas não conseguiu. Aquelas bo-
chechas ruborizadas disseram sentimentos além das palavras.
Se fosse um bardo a dar um título a esta cena em movimento, tal bardo certamente a
chamaria de “A Princesa e Seu Cavaleiro”. No entanto, Lakyus sentiu uma pontada de
medo. Ela pensou que deveria ser impossível, mas se Renner estivesse fazendo isso de
propósito, então ela seria uma megera de proporções verdadeiramente inimagináveis—

O que eu estou pensando? Por que estou duvidando da minha melhor amiga? Além disso,
tudo o que aconteceu até agora provou que ela não é em nada maquiavélica, não? Se eu
não posso confiar em alguém como ela — alguém com o título de “Dourada”, que faria uma
cruzada em nome da justiça — então em quem posso confiar?

Lakyus sacudiu a cabeça e falou. Isso também foi para dissipar a noção assustadora em
sua cabeça:

“Ah, sim. As investigações da Tina descobriram vários líderes no comércio de escravos


— vários nobres ligados a Coccodol. Mas ainda não verificamos o quanto envolvidos eles
estão, por isso ainda é muito cedo para agir.”

Renner e Climb reagiram a um nome particular entre a lista que Lakyus recitou.

“A filha desse homem é uma das minhas empregadas pessoais.”

“Hm? Bem, eu não acho que ela foi enviada para lá como espiã porque eles estão em
guarda contra você... mas ainda assim, eu não posso ter certeza que ela é apenas uma
empregada procurando se promover.”

“De fato. Parece que nós policiamos a informação muito bem. Climb, você também tem
que manter isso em mente.”

“Então, vamos discutir o que fazer com os locais que descobrimos no registro codificado.
Renner, você se importaria de me emprestar o Climb? Eu gostaria que ele dissesse a Ga-
garan e as outras que elas precisam se preparar para uma possível emergência.”

Parte 2

3º Dia do mês Baixo Fogo (9º mês) – 09:49

Climb caminhou ao longo da rua principal da Capital Real. Climb se mesclava perfeita-
mente com a massa de pessoas, dado que ele tinha poucas características distintivas.

Ele não usava seu traje distinto, armadura branca. Embora ele pudesse usar certos itens
alquímicos para mudar sua cor, isso era trivial. Além disso, não havia necessidade de an-
dar armadurado enquanto caminhava pelas ruas.
Como resultado, ele se vestiu levemente, uma cota de malha sob as roupas. Apenas a
espada longa em sua cintura o marcava como visivelmente diferente de um cidadão co-
mum.

Ele parecia um soldado patrulheiro — um guarda da cidade — ou um mercenário


quando equipado dessa forma. Algumas pessoas iriam evitá-lo, mas não sairiam do seu
caminho da maneira que fariam com alguém em armaduras pesadas.

Qualquer um em tal panóplia deveria ser um aventureiro. Não era incomum precisarem
mais de publicidade do que proteção.

Vestir-se de maneira atraente não era uma coisa estranha para os aventureiros, porque
ajudava a se promover. Alguns deles até favoreceram modas exclusivas e provocativas
para causar uma forte impressão nos outros. Assim, o boato se espalharia e sua reputa-
ção se desenvolveria. Em outras palavras, vestir-se de maneira estranha era algo como
uma marca registrada de aventureiros.

No entanto, não havia necessidade de aventureiros de alto nível — como os membros


da Rosa Azul, que Climb visitaria — o fazê-lo. No nível delas, apenas andar pela rua já era
o bastante.

Logo, ele viu uma estalagem de aventureiro ao longo da estrada. Tal estalagem tinha um
estábulo e um grande pátio para a prática de espada. Seu belo exterior prometia um in-
terior igualmente requintado, e as janelas de hóspedes estavam equipadas com pedaços
de vidro transparente.

Essa era a estalagem mais cara da Capital Real. Era um local de encontro para aventu-
reiros que estavam confiantes em suas habilidades e capazes de pagar as contas onerosas.

Climb abriu a porta da estalagem, sem prestar atenção aos guardas que a flanqueavam.

O bar de bebidas ocupava um andar inteiro, mas era pouco povoado de aventureiros,
considerando seu tamanho. Isso ilustrava claramente a raridade de aventureiros bem
remunerados.

O clamor dentro da estalagem acalmou-se por um momento, vários olhares curiosos fo-
ram lançados na direção de Climb. Ele não se importou e olhou ao redor do interior.

A maioria das pessoas aqui eram aventureiros de aparência poderosa. Quase todos aqui
poderiam derrotar Climb com facilidade. Cada visita a este lugar fazia Climb perceber o
quão pequeno ele era.

Ele resistiu ao desejo de cair em desespero, e seus olhos se concentraram em um ponto


dentro da estalagem.
À sua frente — no interior mais profundo da estalagem — havia uma mesa redonda. Ele
olhou para as duas pessoas lá sentadas.

Uma delas era minúscula, vestindo um longo manto escuro que cobria todo o corpo.

Seu rosto não podia ser visto. Não era porque a luz era insuficiente, mas porque ela
usava uma estranha máscara facial com uma joia carmesim. Havia uma fenda estreita que
corria ao longo do nível dos olhos, mas era impossível ver os olhos sob a máscara.

Então, havia a outra pessoa.

Se a primeira pessoa fosse uma anã, então esta seria uma gigante. Ver essa pessoa trouxe
à mente a palavra “pedregulho”. Na verdade, essa pessoa tinha um corpo robusto e ma-
ciço, mas essa circunferência não nasceu da obesidade.

Os braços daquela pessoa faziam os observadores lembrarem de troncos, enquanto o


pescoço que parecia tão largo quanto as coxas de uma mulher. A cabeça era de forma
quadrada. A mandíbula corpulenta — firmemente fechada — e a maneira como os olhos
da pessoa examinavam o entorno assemelhava-se aos de um predador. Os cabelos loiros
eram curtos por uma questão de praticidade.

O tórax dessa pessoa era visível sob seu traje, como se ela estivesse exibindo-o orgulho-
samente. Dito tórax parecia nada mais do que músculos peitorais extremamente defini-
dos. Colocando mais claramente, não se parecia em nada com a macies feminina.

Essas eram as outras integrantes da equipe aventureiras adamantite, composta apenas


de mulheres — Rosa Azul.

Uma era a magic caster arcana, Evileye, enquanto a outra era a guerreira Gagaran.

♦♦♦

Climb se aproximou delas. Uma das pessoas que ele procurava assentiu e depois gritou
com voz rouca:

“Yo, virgenzinho!”

Os olhares que estavam dispersos se concentraram em Climb mais uma vez, mas nin-
guém zombou dele. Em vez disso, desviaram o olhar mais uma vez, como se simpatizas-
sem por ele.

Eles fizeram isso porque sabiam que mesmo para os aventureiros mythril ou orichal-
cum, mostrar o menor desrespeito a Gagaran não era tanto bravura, mas sim imprudên-
cia.

Climb suportou o insulto e se aproximou com firmeza.


Não importa quantas vezes ele implorou para ela, Gagaran se recusou a chamar Climb
por seu nome próprio. Sendo esse o caso, o melhor curso de ação que ele poderia tomar
era desistir e fingir que não se importava.

“Bom te ver de novo, Gagaran-sam—san. E Evileye-sama.”

Ele chegou diante das duas e se curvou.

“Oh, há quanto tempo. Deixa eu adivinhar, veio dormir comigo, não é?”

Gagaran moveu o queixo para frente, indicando que ele deveria se sentar. Havia um sor-
riso maligno e selvagem naquele rosto quadrado.

Climb simplesmente balançou a cabeça inexpressivamente.

Gagaran dizia a mesma coisa todas as vezes, a ponto de se tornar algo como uma sauda-
ção. No entanto, ela não estava brincando. Se Climb respondesse “sim”, mesmo em tom
de brincadeira, ela o arrastaria imediatamente para um quarto de solteiros no segundo
andar. Climb não poderia resistir a isso diante da força incrível de Gagaran.

Gagaran, que se orgulhava de ser uma “colhedora de cereja”, era uma dessas pessoas.

Em contraste com Gagaran, Evileye o encarou estoicamente de frente, com seu rosto
imóvel. Talvez ela estivesse contemplando Climb sob a máscara, mas ele não podia ter
certeza disso.

“Não, não é isso. Aindra-sama me pediu para vir.”

“—Hm? A Líder pediu?”

“Sim. Eu trago uma mensagem. “Vocês podem precisar sair a qualquer momento. Eu ex-
plicarei os detalhes quando voltarem”. No entanto, Aindra-sama deseja que se preparem
e estejam prontas para agir a qualquer momento.”

“Entendido. Ainda assim, você teve o trabalho de vir até aqui somente por isso.”

O rosto de Gagaran se iluminou com um largo sorriso, e Climb se lembrou de que ele
tinha outra coisa para contar a ela.

“Hoje tive a boa sorte de treinar com o Stronoff-sama. O movimento que você me ensi-
nou — aquele golpe de cima para baixo —, Stronoff-sama gostou.”

Gagaran lhe ensinara aquele golpe no pátio de prática atrás da pousada. Seu rosto se
abriu com um sorriso, como se ela tivesse sido a pessoa que havia sido elogiada.
“Oh, aquele movimento? Hehe, nada mal, garoto. Mas você sabe...”

“Sim. Eu não ficarei satisfeito apenas com isso. Vou continuar a praticar e buscar a per-
feição.”

“Isso mesmo, você precisa continuar treinando. Mas também deve pensar sobre o que
fazer se alguém deter esse movimento. Pense no movimento seguinte caso isso aconteça.”

Foi coincidência, ou meramente o consenso de opiniões desses guerreiros de primeira


linha? O que Gagaran disse foi muito parecido com o conselho de Gazef. Um olhar de sur-
presa surgiu no rosto de Climb dado a semelhança de suas palavras. Gagaran parecia ter
lido sua reação do jeito errado, e riu:

“Claro, você tem que usar esse movimento de corte que eu lhe ensinei como um golpe
final, senão é perca de tempo.”

Então ela continuou:

“Na verdade, você precisa escolher um movimento no meio de todos os outros que tem
aplicabilidade universal. No entanto, você não pode fazer isso.”

As palavras de Gagaran sugeriram a falta de talento de Climb.

“Portanto, você precisa desenvolver uma maneira de atacar pelo menos em uma combi-
nação tripla. Essa combinação deve ser uma que evite que seu oponente contra-ataque,
mesmo que eles consigam se defender.”

Climb assentiu.

“Claro, isso não vai funcionar quando lutar contra monstros de muitos braços. Mas con-
tra os humanos, isso deveria ser o suficiente. Se você estiver em apuros e seu oponente
enxergar através de seus padrões de ataque, esse golpe deve ser eficaz na primeira vez
que você enfrentar qualquer inimigo. Pratique, pratique e continue praticando.”

“Entendido”, Climb assentiu com força.

Esta manhã, ele só conseguiu um sucesso contra Gazef. Em todas as outras ocasiões,
Gazef tinha visto através das intenções imediatamente e, por sua vez, havia contra-ata-
cado.

Então, ele poderia perder a confiança por causa disso? Claro que não.

Ele poderia se permitir cair em desespero por causa disso? Claro que não.

Era o oposto.
Precisamente o oposto

Já que um mero plebeu como ele próprio conseguira chegar tão perto do mais forte
guerreiro do Reino — não, dos países vizinhos. Climb sabia que Gazef não havia mostrado
nem mesmo uma fração de seu verdadeiro poder, mas para Climb — que andava em um
vale de sombras sem esperanças de ver alguma luz — isso foi uma tremenda dose de
encorajamento.

Era como dizer a ele: Seus esforços não foram em vão.

Enquanto pensava nisso, ele entendeu completamente o que Gagaran estava tentando
dizer.

Ele não estava confiante de que poderia desenvolver um bom ataque combinado, mas
estava disposto a tentar. Uma chama foi acesa nas profundezas do seu coração. Ele estava
determinado a se tornar mais forte, para que ele pudesse fazer com que Gazef mostrasse
mais de sua força na próxima vez que eles se enfrentassem.

“...Ah sim, acho que você perguntou a Evileye sobre algo antes, não é? Algo sobre apren-
der magia?”

“Sim.”

Climb olhou para Evileye. Naquela época, ela apenas rira dele por baixo da máscara e o
assunto havia sido esquecido. Perguntando-lhe a mesma coisa agora, sendo que a situa-
ção era praticamente a mesma, só resultaria na mesma resposta.

Contudo—

“Pirralho.”

Uma voz abafada alcançou seus ouvidos.

Sua voz era bastante surpreendente, mesmo sem remover a máscara que ela usava. A
máscara que ela usava não era particularmente grossa, então deveria ter sido fácil dis-
tinguir as qualidades de sua voz. No entanto, não havia como dizer a idade de Evileye ou
quaisquer inflexões emocionais. No máximo, ele poderia concluir que ela era mulher. Era
uma voz sem emoção e uniforme que soava velha e jovem ao mesmo tempo.

Isso provavelmente foi porque a máscara de Evileye era mágica. Mas por que ela escon-
dia sua voz?

“Você não tem talento. Coloque o seu esforço em outro lugar.”

Ela não permitiu que ele tivesse espaço para responder, como se não houvesse mais
nada a ser dito.
Climb sabia muito bem o que ela queria dizer.

Ele não tinha dom para magia. Não, isso não foi tudo.

Não importava o quanto praticasse a sua esgrima, quantas vezes sangrasse e empu-
nhasse até ficar com as mãos calejadas, ele não conseguia alcançar o nível que desejava.
Os picos baixos, nos quais um indivíduo talentoso poderia subir, eram como barreiras
intransponíveis para Climb.

No entanto, ele não poderia desistir de se esforçar para superar esse limite inacessível.
Como ele não tinha talento, ele precisava ter esperança que seu esforço implacável o aju-
dasse a melhorar de alguma forma.

“Você não parece feliz com isso.”

Tendo percebido as emoções sob a faceta sem emoções de Climb, Evileye continuou:

“Ter talento para algo é uma habilidade inata... Algumas pessoas dizem que talentos são
como botões antes de florescerem, e todo mundo tem talento para alguma coisa... hmph.
Para mim, isso é apenas um desejo, algo que os idiotas usam para se consolar. Até o líder
dos Treze Heróis já foi assim.”

O líder dos Treze Heróis. Segundo a lenda, ele era apenas uma pessoa comum, mais fraca
que qualquer outra pessoa. No entanto, ele continuou balançando sua espada, mesmo
quando ferido, e ele acabou se tornando um herói que era mais forte do que qualquer
outro. Ele era um poderoso ser que poderia crescer sem limites.

“Ele tinha talento, mas ainda não tinha florescido. É diferente do seu caso. Você já trei-
nou até demais, mas isso é todo o talento que você mostrou... Nem todo mundo tem ta-
lento, e a diferença é óbvia entre os que têm e os que não têm. Portanto, não vou lhe dizer
para desistir, mas você deve ficar ciente de seus limites.”

O severo sermão de Evileye foi seguido por um breve silêncio. No final, Evileye decidiu
falar.

“Gazef Stronoff... ele é um bom exemplo. Pessoas como ele seriam consideradas talento-
sas. Climb... você acha que pode compensar a diferença entre vocês dois com esforço?”

Ele não pôde responder. Seu treinamento hoje o fez perceber que ele não estava nem
perto desta liga.

“Tudo bem, talvez ele não seja um bom exemplo... ainda assim, ele é a única pessoa em
quem consigo pensar que se aproxime da esgrima de um dos Treze Heróis. A nossa Ga-
garan aqui é boa, mas ela não pode derrotar Gazef.”
“...Hey, não o compare a mim. Gazef é um homem com um pé no reino dos heróis, enten-
deu?”

“Hmph. Você é uma mulher heroica se assim posso dizer... mesmo que a parte mulher
seja difícil de acreditar.”

Assim que a voz de Evileye parou, Gagaran riu e respondeu:

“Ei ei, Evileye. Esses heróis em questão são monstros com habilidades únicas que ultra-
passaram o reino da humanidade, não é?”

“...Basicamente isso.”

“Então, eu sou apenas uma humana. Apenas uma pessoa comum que não pode alcançar
o reino dos heróis.”

“Mesmo assim, você ainda é talentosa. Você não é uma pessoa sem talento como o Climb.
Escute aqui Climb, essa idéia de alcançar as estrelas... não se prenda nisso.”

Climb sabia — melhor que ninguém — que ele não tinha talento. Mesmo assim, ouvi-la
repetir que “você não tem talento, você não tem talento” era muito deprimente. Dito isso,
Climb não tinha intenção de mudar o objetivo de sua vida.

—Esse corpo existe para a Princesa. Por ela, eu—

Talvez ela tenha sentido a determinação de um mártir em Climb, mas no final, Evileye
zombou de trás de sua máscara.

“...Então você não vai mesmo desistir, mesmo depois de eu ter dito tudo isso.”

“Sim.”

“Tolice. O tolo entre os tolos.”

Ela balançou a cabeça com força, incapaz de entendê-lo.

“Seguir em frente enquanto se apega a um sonho inacessível te colocará no caminho da


destruição. Você sabe disso, não sabe? Eu lhe direi novamente — você precisa conhecer
seus limites.”

“Eu entendo.”

“Você pode entender, mas não se importa, acertei? A palavra tolo nem sequer é o bas-
tante para descrever homens como você. Você é do tipo que morre cedo... e alguém vai
chorar por você quando isso acontecer, vai dizer é mentira?”
“Não é o que deu a entender, não é, Evileye? Essa falação toda com o Climb é porque se
importa com ele?”

Evileye rodeou seus ombros quando ouviu Gagaran falar. Então, ela se virou para Gaga-
ran e agarrou-a pelas lapelas enquanto gritava:

“Ô Massa de Músculos, cala essa sua boca!”

“Ei, você sabe que estou certa, vai dizer que é mentira?”

Gagaran estava contente em deixar Evileye se agarrar a ela, que respondia com indife-
rença. Evileye ficou sem fala por um momento, e então afundou de volta em sua cadeira.

Então, ela mandou o assunto de volta para Climb.

“Comece aprendendo sobre magia. Quando entender isso, você poderá entender como
os inimigos que usam magia pensam. Aí poderá escolher um curso de ação mais correto
dessa maneira.”

“Aprender sobre todas as magias que existem não é um pouco demais para ele?”

“Claro que não. O fato é que a maioria dos magic caster não usam a maior parte das
magias existentes. Apenas se concentre nas mais utilizadas. Se nem isso puder fazer, en-
tão desista logo.”

Evileye murmurou.

“Além disso, ele só precisará estudar até o terceiro nível. Isso não deve ser um problema.”

“...Mesmo assim, Evileye. Nós aqui sabemos que magias podem ir até o décimo nível,
mas ninguém nunca viu magia de nível tão alto sendo usada. E mesmo assim você sabe
disso. Por quê?”

“Hm...”

Evileye tinha um “olhar” de professora no rosto enquanto fazia algo sob o manto. No
instante seguinte, Climb percebeu que os sons ao redor deles pareciam mais distantes
agora. Era difícil descrever, mas parecia que havia um tecido que os separava dos demais.

“Não entre em pânico. Acabei de usar um itenzinho inútil.”

Climb não sabia que a ativação daquele item era um sinal de como ela estava preocupada
em ser ouvida. Tudo o que ele sabia era que Evileye pretendia responder à pergunta de
Gagaran com muita seriedade. Agora que ela tinha chegado a esse ponto, Climb alinhou
sua posição na cadeira.
“Nos mitos antigos — mais como lendas — havia menção de seres conhecidos como os
Oito Reis da Ganância. Eles eram conhecidos como pessoas que roubaram o poder dos
deuses, e os contos falam de como eles governaram este mundo com esse poder absoluto.”

Climb ouvira a história dos Oito Reis da Ganância. No entanto, não eram contos muito
populares, dado que eles eram apenas contos infantis, mas qualquer um com um pouco
de conhecimento saberia deles.

Em resumo, os seres conhecidos como os Oito Reis da Ganância apareceram há 500 anos.
Alguns diziam que eles eram tão altos quanto os céus, alguns diziam que se pareciam com
Dragões, mas em todo caso, os Oito Reis da Ganância devastaram as nações em um ins-
tante, dominando o mundo com seu poder que podia mover montanhas e separar os ma-
res. No entanto, seus desejos eram insaciáveis e lutaram entre si por suas posses, resul-
tando em sua extinção mútua.

Esta história não era popular por razões óbvias, mas debatia-se sobre se era ou não ape-
nas um conto de fadas infantil. Na opinião de Climb, havia sido muito floreada e adornada.
No entanto, um pequeno grupo de pessoas entre os aventureiros acreditava que os Oito
Reis da Ganância existiram — e que eles comandaram poderes além do imaginável, além
do que estas terras viram até então.

A prova disso era uma cidade bem ao sul do deserto. Rumores diziam que era a capital
construída quando os Oito Reis da Ganância conquistaram o continente.

Como Climb se perdeu em seus pensamentos, Evileye continuou falando:

“Aparentemente, os Oito Reis da Ganância possuíam inúmeros itens mágicos poderosos,


e o mais poderoso deles era chamado de Nameless Spellbook... pelo menos, é como as
pessoas o chamam. Essa é a resposta para tudo.”

“Ah? Então essas magias estão registradas nesse livro?”

“De fato. Eles dizem que os Oito Reis da Ganância da lenda deixaram para trás esse item
mágico inimaginavelmente poderoso, um grimório que registra todas as magias existen-
tes. Além disso, eles dizem que, devido a algum tipo de encantamento, até magias recém-
desenvolvidas aparecem em suas páginas também.”

Climb sabia dos Oito Reis da Ganância, mas não desse tomo. Ele tinha uma idéia aproxi-
mada de como esse item realmente era valioso, mas ele permaneceu em silêncio e escu-
tou.

“Sabemos da existência de magias de décimo nível por causa deste item. Claro, não há
muitas pessoas que conheçam o Nameless Spellbook em si...”

Climb engoliu em seco.


“E, e a senhora procura por esse Nameless Spellbook?”

Climb só fez essa pergunta porque sabia que elas eram aventureiras de primeira classe.

Evileye bufou, como se dissesse: Não seja ridículo.

“Hmph. Eles dizem que o grimório é defendido por uma magia poderosa e ninguém pode
tocá-lo, apenas seu legítimo dono. Aparentemente, é tão valioso quanto um mundo in-
teiro, é o que dizem... isso é uma boa dica de quão perigoso essa coisa realmente é. Eu
conheço meus limites, então não desejo isso. Eu prefiro não morrer de uma maneira es-
túpida como os Oito Reis da Ganância.”

“Dizem que sua líder empunha uma das armas pertencentes a um membro dos Treze
Heróis... ela se sente da mesma maneira?”

“...Isso é algo completamente diferente. Só que... eu ouvi falar de alguém que viu isso
antes, não estou certa sobre os detalhes. Acho que nos afastamos do assunto, mas é isso.
Entendeu agora, Gagaran?”

Depois disso, Evileye pareceu um pouco intrigada, o que era bastante raro para ela, e
então ela disse:

“Climb. Não abandone sua humanidade na busca pelo poder.”

“Abandonar a humanidade... você quer dizer como os demônios nas histórias?”

“Este é um dos caminhos. Se tornar um undead ou alguma criatura mágica também


conta.”

“Pessoas normais não podem fazer isso.”

“É verdade, mas em partes... mas depois que você se torna um undead, sua mente sem-
pre irá tentar de desviar. Quando você age para realizar um sonho apaixonado... as mu-
danças no corpo ecoam na alma e você se torna um monstro aterrorizante.”

A voz de baixo daquela máscara era tipicamente desprovida de inflexão emocional, mas
agora estava tingida de uma ponta de arrependimento. Gagaran notou como Evileye es-
tava olhando para a distância e deliberadamente falou em uma voz alegre.

“Bem, a Princesa provavelmente desmaiaria se acordasse um dia e visse que o Climb se


tornou um Ogro.”

Evileye provavelmente sentiu as boas intenções por trás das palavras de Gagaran. Sua
voz retornou ao seu usual tom de emoção.
“...De fato, seria assim. Magias do tipo Transmutação podem brevemente permitir que
você mude para outra espécie. Eu serei franca — elas são opções válidas para melhorar
seus atributos físicos.”

“Eu acho que isso não vai servir.”

“Se você simplesmente deseja força, então mudar para outra espécie é bastante eficaz.
Afinal, o corpo humano não é excepcional, e as mesmas habilidades são mais eficazes
quando os atributos físicos básicos são melhorados.”

Isso era óbvio. Entre dois oponentes habilidosos, aquele com os melhores atributos fí-
sicos teria a vantagem.

“O fato é que muitos dos Treze Heróis eram não-humanos. A propósito, eles são chama-
dos os Treze Heróis, mas houveram mais do que treze. No entanto, apenas treze deles
entraram para as canções e histórias... a batalha contra os Deuses Demônios cruzou todas
as fronteiras raciais, e certos pessoas com seus credos no ser humano não queriam deixar
as outras espécies brilharem demais nas sagas heroicas.”

Evileye parecia estar criticando certos povos. Então, sua atitude mudou e ela continuou
num tom nostálgico.
[Gigantes d o A r ] [Ciclone M a c h a d o ]
“O Chefe Guerreiro dos A i r Giants e seu Axe Cyclone, a Família Real Elfa que tinha as
características especiais dos Elfos ancestrais e o Cavaleiro Negro que manejava as Quatro
Espadas das Trevas — o proprietário original da Kilineiram da nossa líder — foi um ser
humano com sangue de demônio.”

“As Quatro Espadas das Trevas, huh...”

Um dos Treze Heróis, o Cavaleiro Negro, tinha quatro espadas: Hyumilis, a espada do
mal. Kilineiram, a espada amaldiçoada. Crocdabal, a espada corrompida e Sfeiz, a espada
da morte. A líder da Rosa Azul, Lakyus, possuía uma delas.

“A Espada Amaldiçoada Kilineiram, feita pela condensação da escuridão infinita, é dito


ser a mais poderosa das quatro... Eu tenho uma pergunta, é verdade que se ele liberar
todo o seu poder, ele poderia projetar energia escura suficiente para engolir um país in-
teiro?”

“Onde ouviu isso?”

Evileye perguntou em um tom confuso.

“Uma vez eu ouvi a líder murmurar para si mesma quando estava sozinha. Ela segurou
o braço direito e disse: “Só uma mulher que serve aos deuses como eu pode suprimir seu
poder demoníaco usando toda a minha força de vontade” ou algo assim.”
“Nunca ouvi falar de uma coisa assim antes...”

Evileye inclinou a cabeça em surpresa e completou:

“Ainda assim, já que ela, a proprietária, que disse isso... então pode ser verdade.”

“Então existe realmente uma Dark Lakyus, nascida do lado sombrio de seu espírito?”

“O quê?”

“Sei não, mas não faz muito tempo que ouvi ela resmungando para si mesma novamente.
Não acho que ela me notou, então fiquei lá ouvindo, e no final ela acabou dizendo, “Se eu
não tomar cuidado, esse ser de trevas nascido da fonte de toda a escuridão tomará conta
do meu corpo e liberará o Poder da Espada Amaldiçoada” ou algo assim. Soou muito ma-
ligno.”

“Isso... bem, não podemos descartar isso. Alguns itens amaldiçoados podem controlar
as mentes de seus donos... as coisas seriam bem terríveis se algo assim acontecesse com
a Lakyus.”

“Eu senti que ela estava tentando manter isso em segredo, mas isso é algo importante,
certo? Então, quando perguntei a ela, ela corou e disse que não era nada que eu devesse
me preocupar.”

“Hm. Deve ser muito embaraçoso para uma sacerdotisa — que deveria ser aquela que
remove maldições — acabar sendo vítima de uma maldição. Talvez ela não queira que
nos preocupemos? Ela realmente pretende suportar esse fardo sozinha?”

“Eu não a vi agir assim de novo depois disso... Mas pense comigo... Ela começou a usar
todos aqueles anéis de armadura sem sentido em todos os seus dedos depois de obter a
Espada Amaldiçoada, não foi?”

“Eu pensei que era alguma moda... então quer dizer que eles são itens mágicos que selam
algo, ou mesmo pedras de proteção de algum tipo?”

Climb não podia mais fingir ser indiferente, e ele franziu a testa.

Pelo que ele tinha visto e ouvido, Lakyus poderia estar sob o controle de um item mágico
maligno. Ele ficou ainda mais preocupado quando pensou de onde acabara de vir.

“...Renner-sama estará em perigo?”

Evileye parou Climb antes que ele pudesse sair correndo.

“Não se preocupe. Eu duvido que a situação se deteriore. Ela não vai ser pega de sur-
presa, mesmo que o poder das trevas ameace tomar o controle. Temos que aceitar o fato
de que ela não nos contou como um sinal da confiança dela em controlar isso sozinha.
Tenho certeza de que ela tem força mental para este tipo de coisa. Ainda assim... eu não
esperava que a espada tivesse esse tipo de poder. Até eu nunca ouvi falar disso antes.”

“Não seria melhor conversar com Azuth por segurança?”

“Não me agrada em nada pedir ajuda a um rival, mas... bem, ela é a sobrinha dele, pelo
menos devemos informá-lo disso.”

“Hm, já não era para termos feito isso antes? Precisamos saber onde ele está.”

“Mm. Devemos nos preparar para apoiar a Lakyus a qualquer momento.”

“Afinal de contas, é preciso um aventureiro adamantite para impedir outro.”

“—Hm? Ahhh! Me lembrou de algo, Gagaran. Ouvi dizer que uma terceira equipe de
aventureiros adamantite foi formada em E-Rantel.”

“O quê? Mesmo? Não sabia disso... descobriu isso quando foi para a Guilda dos Aventu-
reiros hoje de manhã?”

“Não... ah, sim. Desculpa. Eu esqueci de te contar. A equipe deles parece ser relacionada
ao preto.”

“Preto? Eu pensei que nós teríamos marrom ou verde depois de azul e vermelho.”

“Bem, o preto é uma das cores dos Seis Grandes Deuses. Nada de estranho nisso. Quem
sabe, o próximo pode ser branco?”

“Eu não sou fã da Teocracia Slane. Na verdade, tivemos uma grande briga com uma de
suas unidades de operações especiais, não é?”

Climb percebeu que ouvira um assunto muito perigoso, mas nenhum deles prestou
atenção nele enquanto continuavam conversando.

“Gagaran, você odeia eles? ...Bem, eles tentaram me matar uma vez, mas eu até entendo
como eles pensam. Ou melhor, seu credo e juramento é defender toda a humanidade. Mas
isso não é o correto, da perspectiva da humanidade como espécie?”

“Hah? Então quer dizer que está tudo bem para massacrar demi-humanos inocentes e
elfos para esse objetivo?”

Havia um olhar claro de desgosto no rosto de Gagaran, e as chamas de raiva queimavam


em seus olhos. Evileye suportou sua raiva e encolheu os ombros.
“Existem várias nações humanas por aqui, como o Reino, o Reino Sacro, o Império e as-
sim por diante. Mas e quanto as outras, Gagaran? Quanto mais longe você estiver daqui,
menos nações lideradas por humanos podem ser vistas. Todos elas são países compostos
por demi-humanos ou espécies que são superiores à humanidade. Você sabia que alguns
deles até negociam humanos como escravos? A razão pela qual não há nenhum desses
países por aqui é porque a Teocracia Slane exterminou qualquer demi-humano nas vizi-
nhanças.”

A raiva de Gagaran desapareceu quando ela ouviu as palavras de Evileye. Ainda assim,
ela estava franzindo a testa enquanto respondia:

“Bem, demi-humanos sempre foram fisicamente superiores à humanidade em todos os


sentidos. Se eles se unissem e desenvolvessem cultura, a humanidade não seria capaz de
lidar com eles.”

“Basicamente, todos os humanos deveriam gostar da Teocracia. É verdade que eles são
implacáveis, o que é um demérito, mas mesmo assim, ninguém fez mais pela humanidade
como um todo do que eles... claro, alguém que entrou no caminho deles não pensaria
assim. Além disso, é bem provável que eles foram os que originaram a Guilda dos Aven-
tureiros.”

“Sério?”

“Quem sabe? Não há como dizer se é verdade ou não, mas a possibilidade é muito alta.
Afinal de contas, a Guilda dos Aventureiros foi fundada após a batalha com os Deuses
Demônios, quando a força da humanidade estava mais fraca do que geralmente é. Minha
suposição é que estavam preservando seu poder e ao mesmo tempo ajudar as várias na-
ções sem causar atrito e, assim, estabeleceram uma Guilda.”

O silêncio encheu a mesa depois que a discussão terminou. Incapaz de suportar, Climb
falou:

“Perdoe minha interrupção, Evileye-sama. A senhora disse que novos aventureiro ada-
mantite surgiram; como eles se chamam?”

“Hm? Ah, bem, eu mencionei isso. Eu acho que um deles se chama... Momon. Ele é o líder
deles, ele é um guerreiro com o apelido de Herói Negro. Eles ainda não escolheram um
nome para sua equipe, mas todos os chamam de “Escuridão”.”

“Entendo. E os outros membros?”

“Ouvi dizer que ele tem como companheira uma mulher que chamam de Nabe, uma ma-
gic caster arcana conhecida como a Bela Princesa.”
“Hã? Apenas os dois? Essa informação é certa? Esses idiotas são tão confiantes em suas
habilidades que... não, é por causa dessas habilidades que eles são classificados por ada-
mantite. Eles estão escondendo algum tipo de arma secreta? É isso? Quais realizações
eles fizeram?”

Climb se inclinou para ouvir também. Esta era uma equipe de aventureiros que obtivera
a classificação de adamantite. Eles devem ter embarcado em todos os tipos de aventuras
que deixariam os corações das pessoas palpitando em excitação. Climb já estava ardendo
de antecipação mesmo antes de ouvir uma única palavra.

“Tudo isso foi feito em dois meses... primeiro, eles eliminaram os milhares de undeads
que apareceram em E-Rantel. Então, eles exterminaram a Aliança da Tribo Goblin do
Norte, encontraram ervas raras na Grande Floresta de Tob, mataram um Basilisco Gi-
gante e eliminaram um bando de undeads oriundos das Planícies Katze. Além disso, ouvi
dizer que eles derrotaram uma Vampira incrivelmente poderosa...”

“Um Basilisco Gigante...”

Climb repetiu em uma voz sem fôlego.

Era um monstro enorme que tinha quase dez metros de comprimento, como um cruza-
mento entre um lagarto e uma serpente. Tinha um ataque de olhar petrificante, seus flu-
idos corporais eram um veneno que poderia causar morte instantânea, e sua pele dura e
grossa rivalizava com mythril em tenacidade. Era um ser aterrorizante, então ser capaz
de derrotar um monstro como esse — que poderia destruir uma cidade — era uma razão
perfeitamente sensata para ser promovido a adamantite.

No entanto, houve um problema com isso—

“Isso é... incrível. Ainda assim, eles realmente fizeram isso apenas com os dois? Com cer-
teza, apenas duas pessoas, sendo um guerreiro e uma magic caster arcana, não consegui-
riam lidar com um Basilisco Gigante... Quero dizer, nem eu conseguiria algo assim.”

—De fato. Era quase impossível que apenas duas pessoas o fizessem, especialmente se
fossem um guerreiro e uma magic caster arcana. Como eles se curariam? Como eles po-
deriam resistir ao seu olhar petrificante, seus fluidos corporais tóxicos e outros ataques
especiais?

“Ah! Desculpe, não sei como, mas ouvi que foram os dois. Ouvi dizer que eles subjugaram
o Sábio Rei da Floresta à força e fizeram dele seu servo.”

“...O Sábio Rei da Floresta? Que tipo de animal é esse?”

Climb lembrou o nome de várias sagas heroicas e histórias semelhantes. No entanto,


seria terrivelmente rude interromper agora.
“Eu também não sei os detalhes, mas aparentemente era uma fera mágica que habitava
a Grande Floresta de Tob desde tempos antigos. Possui poder incomparável. Meus com-
panheiros antigamente... sim, eu não acho que eles o encontraram quando foram para a
Grande Floresta há duzentos anos.”

Evileye deu de ombros quando mencionou um passado de 200 anos atrás.

Tal número não seria nada fora do comum para os Elfos da Floresta, mas dada a atitude
dela, Climb só podia concluir que era uma brincadeira de algum tipo.

“Oho. Então, quão credíveis são essas histórias? Provavelmente foram exageradas ou
algo assim, não?”

Sempre foi assim. Às vezes, um conto era acidentalmente exagerado no relato, ou os


cadáveres eram tão desmembrados que não se podia obter uma contagem exata do corpo,
e às vezes os aventureiros só queriam se gabar pela fama. Assim, essas histórias muitas
vezes acabaram embelezadas.

Em contraste, Evileye ergueu um dedo e abanou-o com um “tch tch tch”.

“Bem, essas histórias parecem bastante factuais. O incidente de E-Rantel em particular,


onde esse tal guerreiro arremessou sua enorme espada e matou um undead gigantesco
então abriu seu caminho através de uma horda de milhares de undeads comuns. Esses
relatórios vieram dos guardas sobrevivente, todos os fios das histórias se conectam. As-
sim, duvido que exista algum exagero de suas façanhas. Eles eliminaram os mentores por
trás dessa horda de monstros e os cadáveres foram verificados, e antes disso, eles des-
truíram um par de Skeletal Dragons.”

Gagaran ficou sem fala e Climb perguntou:

“Mesmo você teria problemas com eles também, não é mesmo, Gagaran-san?”

“Se fossem apenas vários milhares de Zombies ou Skeletons, tudo bem. Eu poderia ras-
[ D r a g õ e s Es q u e l ét i c o s ]
gar meu caminho através deles. Mesmo os dois Skeletal Dragons podem ser factíveis.
Mas não posso dizer o mesmo para os mentores por trás do incidente. Eu não tenho con-
fiança de poder lidar com este tipo de gente sem saber do que são capazes.”

“Há relatos não-oficiais que afirmam que eles eram da Zurrernorn.”

“Isso é sério, Evileye? Ah... se fossem seus discípulos, então eu seria uma grande azarada.
Seria muito difícil vencê-los depois de lutar tanto em um território hostil. Cometer um
pequeno erro, ficar envenenada ou paralisada é o que basta para encontrar o fim. Como
os dois se curaram? Poções, talvez? Quem sabe, um guerreiro como esse Momon talvez
possa usar a magia divina como a nossa líder. Ou talvez essa Bela Princesa possa.”

“Não podemos descartar isso...”


Evileye concordou com a cabeça.

“Ainda assim, um Basilisco Gigante... Sim, nem eu faria isso. Inimigos como esse são de-
mais para guerreiros... para qualquer combatente de perto, na verdade. Eu tenho o poder
da Gaze Bane do meu lado, mas seria muito arriscado sem apoio.”

“Ouvi isso, Climb? Em outras palavras, nem a Gagaran pode fazer isso sozinha. Ou seja,
tudo dependeu dessa tal Nabe. Talvez você possa fazer o mesmo se estiver junta com ela...
ou não?”

“Ah, seria fácil se ela fosse tão forte quanto a Evileye. Se fosse você, você poderia cuidar
de si mesmo com combates de longa distância, mesmo sem levar a sério, vai dizer que é
mentira?”

“Até parece que sou tão boa assim. Para isso eu teria que mostrar meu verdadeiro poder.”

“Bem, com você por perto, a única coisa que eu teria que lidar seria os Skeletal Dragons...
não, isso significaria que eu estava apenas confiando na sua força. Se eu fosse com uma
magic caster de ranque orichalcum e nós nos separássemos... mas é isso aí, não vai acon-
tecer.”

Climb achou isso muito surpreendente.

Evileye era realmente uma magic caster poderosa assim? Em circunstâncias normais, as
equipes de aventureiros devem ser compostas de membros de igual força, e elas devem
ser capazes de se aventurar juntas. Por que havia uma discrepância tão grande aqui?

“Eu duvido que seja o caso. Eu conheço sua força muito bem, Gagaran-san. Tenho cer-
teza de que você não perderá para essas pessoas.”

“Uhyo~ gostei do elogio. E então, vamos para o reservado?”

“Eu vou ter que recusar.”

“É por isso que você é um virgenzinho. Não sabe como as coisas são? Dizem que é uma
vergonha para um homem não comer o que foi colocado na frente dele. Não faz sentido
ficar de frescura pra sempre, sabia? O que fará quando você finalmente se envolver com
a mulher que você gosta? Por acaso quer que ela diga que a única coisa que consegue dar
pra ela na cama é sono? Quer mesmo que isso aconteça? Você é masoquista ou algo as-
sim?”

Gagaran não esperou que Climb respondesse. Depois disso, ela suspirou com um volume
exagerado.
“Tudo bem, até te entendo... não vou te forçar. Mas fique sabendo que... sempre que qui-
ser uma rapidinha comigo, é só me avisar... Mudando de assunto, esse apelido de Bela
Princesa é muito embaraçoso. Ela realmente gosta deste tipo de coisa?”

“Eu ouvi que essa Nabe é muito bonita. De acordo com os rumores—”

Aqui Climb pensou ter percebido que Evileye olhava para ele; um palpite que provou
ser verdade momentos depois.

“—Ela é tão bonita quanto a Princesa Dourada do Reino.”

Gagaran lançou um olhar pretencioso para Climb, como se ele fosse um menino mau.
Climb adivinhou o que ela ia dizer e se antecipou dizendo:

“A beleza está nos olhos de quem vê. Para mim, ninguém é mais bela que a Renner-sama.”

“Ah, é como diz.”

Seu tom claramente afirmava, Que pena.

“Hm, acho que perdemos muito tempo com conversa fiada. Desculpe por fazer você ou-
vir essa conversa chata. Então, faremos o que a Lakyus diz, vamos nos preparar.”

Gagaran e Evileye se levantaram, Climb também o fez.

“Desculpe aí, Climb. Eu realmente queria me divertir com você, mas agora não tenho
tempo.”

“Por favor, não se preocupe com isso, Gagaran-san. E obrigado por suas palavras de sa-
bedoria, Evileye-sama.”

Gagaran estudou Climb cuidadosamente e depois riu desanimada.

“Mm, tudo bem, então. Você deve voltar imediatamente, então deixaremos a nossa líder
aos seus cuidados. Bom, te vejo por aí, virgenzinho... oh, quase me esqueci. Você precisa
se certificar desse equipamento. Essa coisa no seu cinto não é a sua arma habitual, né?”

“Sim. Esta é uma sobressalente.”

“As coisas acontecem do nada. Até entendo não usar armadura, mas é melhor você man-
ter sua espada ao seu lado. É um princípio básico de autodefesa para aventureiros, espe-
cialmente guerreiros. Você tem os itens que eu te dei?”

“Os sinos? Eles estão aqui.”

Climb deu um tapinha na bolsa em sua cintura.


“Excelente, é isso mesmo. Lembre-se, somos guerreiros; Tudo o que podemos fazer é
manusear nossas armas. Às vezes, ocorrem situações que não podem ser tratadas com
armas. É quando você depende de itens mágicos para ajudá-lo. Você precisa obter tantos
itens mágicos quanto possível e mantê-los com você, entendeu? Além disso, certifique-
se de ter pelo menos três poções de cura, entendeu? Elas me ajudaram mais de uma vez.”

Climb possuíra três desses frascos, mas ele só tinha dois com ele agora.

“Eu entendo.” Respondeu.

“...Bem, estamos sendo legais demais com um certo alguém hoje.”

“Que isso, dá um tempo, Evileye... desculpe, acabei atrasando mais ainda. Eu só queria
dizer que, não seja descuidado nos preparativos e fique atento.”

“Entendido.” Climb inclinou-se profundamente para Gagaran.

Parte 3

3º Dia do mês Baixo Fogo (9º mês) – 06:00

Nove homens e mulheres sentaram-se em volta de uma mesa circular.

As cabeças das oito divisões da Oito Dedos estavam lá, mas elas não se olhavam. Nem
estudaram os documentos em suas mãos ou falaram com os lacaios que esperavam or-
dens atrás deles.

Não parecia que eles eram da mesma organização. O clima ainda não estava prestes a
instaurar, mas a cautela deles contra inimigos em potencial era bastante óbvia. No en-
tanto, isso só era de se esperar. Eles podem estar na mesma organização e trabalhar um
com o outro, mas o fato é que eles cortam os lucros entre si em ocasionais ataques, algo
que pode ser considerado como cooperação.

A Divisão de Drogas era o principal exemplo, lidando com todos os aspectos da produ-
ção, processamento e tráfico por conta própria. O contrabando e outras divisões não le-
vantariam um dedo para ajudá-los. Mesmo que eles não se opusessem abertamente, era
comum que tentassem atrapalhar os outros nos bastidores.

Essas atividades — que não faziam bem à organização — se originaram do fato de que
eles no passado haviam sido de facções criminosas que se uniram.

A razão pela qual esses vice-reis do vício se reuniram em dias específicos para as reuni-
ões de chefes da Oito Dedos foi porque não o fazer seria desvantajoso.
Isso quer dizer que não participar dessas reuniões poderia ser interpretado como um
sinal de traição, e as partes ausentes seriam marcadas para a eliminação. Portanto,
mesmo aquelas pessoas que não costumavam vir à Capital Real fariam isso apenas para
essas reuniões.

Mesmo aquelas pessoas que normalmente passavam seus dias se escondendo em um


esconderijo viriam aqui para se expor. Mesmo aqueles que tinham tanto medo de assas-
sinato que se cercavam de guardas o fariam. Havia um número limitado de pessoas per-
mitidas em cada reunião, e cada um dos participantes trouxe dois de seus melhores ho-
mens de suas próprias divisões, claro, além de si mesmos.

—No entanto, uma pessoa era uma exceção a isso.

“Já que estamos todos aqui, vamos começar a reunião habitual.”

Enquanto a voz masculina falava, as pessoas reunidas voltaram para seus lugares e suas
cadeiras rangeram.

O palestrante foi o anfitrião deste evento, o coordenador da Oito Dedos. Este homem —
que parecia estar em seus 50 anos — usava um símbolo sagrado do Deus da Água em um
colar e tinha um rosto compassivo. Ele não parecia nada como um habitante do sub-
mundo.

“Há vários assuntos que precisam de discussão, e o primeiro deles é — Hilma.”

“Presente.”

A pessoa que respondeu foi uma mulher de pele clara.

A pele era tão pálida que quase parecia doentia e suas roupas também eram brancas.

Ela segurava um kiseru que emitia fumaça roxa em uma mão. Uma tatuagem de víbora
serpenteava a mão em direção ao ombro. Seu batom era o mesmo roxo que sua sombra.
Em sua roupa diáfana, ela era a própria imagem de uma prostituta de alta classe, com-
pleta com o ar dissipado que pairava sobre ela.

“Huwah~”

Ela bocejou de uma maneira exagerada e disse:

“Não poderíamos ter começado a reunião mais cedo?”

“...Ouvi dizer que suas plantações de drogas foram atacadas por alguém, é verídico?”
“Sim, eles atingiram um vilarejo que estávamos usando para produção. Me custou uma
boa quantia. Podemos precisar limitar o fornecimento de drogas.”

“Alguma idéia de quem pode estar por trás disso?”

“Não. No entanto, devido à como foi feito, não é difícil adivinhar o responsável.”

“Qual cor?”

Essa pergunta foi suficiente para todos os presentes entenderem.

“Não encontramos pistas. Fui informada recentemente do ataque. Não tive tempo para
descobrir mais.”

“Então é por isso. Atenção a todos, quem souber de algo, por favor, levante a mão.”

Não houve resposta. Ninguém sabia, ou ninguém queria compartilhar o que sabiam.

“Então, a seguir—”

“—Ei”

Uma voz baixa foi ouvida. Era uma voz masculina e escondia um poder incrível em suas
profundezas.

Todos os olhos se voltaram para a fonte dessa voz. O orador era um homem careca cujo
rosto estava parcialmente coberto por uma tatuagem de animal. No entanto, cada parte
de seu corpo era imensa. Sua estrutura muscular era evidente até mesmo através de suas
roupas, e seus olhos frios esculpiam a imagem de um guerreiro.

Todos os outros chefes de divisão tinham trazido guardas, mas só ele não tinha ninguém
atrás dele. Isso foi apenas sensato. Que sentido havia em trazer um grupo de pessoas
inúteis?

O homem olhou para Hilma, chefe da Divisão de Drogas. Não, ele provavelmente não
estava olhando; só que suas pupilas finas pareciam estar fazendo isso.

O guarda atrás dela perdeu a calma por um momento e sua respiração se tornou caótica.
Foi uma reação nascida de saber exatamente o quão forte tal homem era.

Afinal, esse homem era um monstro. Ele não teria problema algum em abater todos
nesta sala.

“Por que não me contratar? Acha mesmo que essas coisas na sua folha de pagamento
podem proteger alguma coisa?”
Seu nome era Zero. Ele era o gerente da Divisão de Segurança, que lidava com tudo,
desde simples guarda-costas até escoltar nobres. Ele era famoso por sua proeza de bata-
lha, que excedia em muito o de qualquer outro membro da Oito Dedos. E a resposta à sua
proposta foi—

“Não há necessidade.”

—Foi uma rejeição firme.

“Não há necessidade disso. Além do mais, não posso revelar a localização das minhas
bases para os outros.”

Esse foi o fim de tudo. Zero fechou os olhos, como se tivesse perdido o interesse. Isso fez
com que ele se assemelhasse a uma pedra.

“Isso seria ótimo. Aceito sua proposta em nome dela.”

O orador era um homem esguio. Ele parecia flácido e fraco, em contraste com Zero.

“Zero, quero contratar seu pessoal.”

“Oh, que inusitado, Coccodol. Você pode pagar?”

Se alguém considerasse que os negócios da Hilma — o tráfico de drogas — estariam


crescendo, então o campo desse homem — o tráfico de escravos — estava declinando a
cada dia. Isso porque a Princesa Dourada tornara ilegal a escravidão e, como resultado,
ele teve que ir à clandestinidade com seus negócios.

“Tudo bem, Zero. E, se possível, gostaria de contratar alguém no nível do Seis Braços, o
melhor dos melhores.”

“Oh...”

Zero abriu os olhos novamente, como se seu interesse fosse reacendido.

Ele não foi o único que ficou surpreso. Quase todos os presentes estavam com o mesmo
pensamento.

O nome do Seis Braços veio do irmão do Deus dos Ladrões, que tinha seis braços. Esse
nome se referia aos lutadores mais fortes da Divisão de Segurança.

Claro, o seu melhor homem era Zero, mas os outros cinco tinham destreza que rivaliza-
vam com os dele. Havia rumores de que um deles poderia cortar o tecido do espaço, outro
poderia controlar as ilusões e que um deles era até mesmo um poderoso undead conhe-
cido como o Elder Lich.
Se Gazef Stronoff ou aventureiros de ranque adamantite pudessem ser considerados os
guerreiros mais poderosos da sociedade formal, então os membros do Seis Braços eram
os maiores assassinos do submundo. Contratar alguém assim só pode significar uma
coisa.

“Nos metemos em grandes problemas, não é mesmo? Pode relaxar. Meus subordinados
mais fortes protegerão seus ativos.”

“Perdoe o inconveniente. Houve problemas com uma mulher que deveria ser eliminada.
Talvez isso possa ser uma reação exagerada, mas se esse lugar cair, eu terei um inferno
de coisas para arrumar. Ah, sim, discutiremos as taxas mais tarde.”

“Claro.”

“Você pode mandar seu homem logo após o término da reunião? Há algo que eu gostaria
que ele fizesse imediatamente.”

“Sem problemas. Eu trouxe alguém comigo; o emprestarei a você.”

“...Então, no próximo tópico. Em relação ao mais novo aventureiro, Momon da Escuridão,


classificado com adamantite... algum de vocês sabe algo dele, ou sabem de alguém que
fez alguma proposta para ele?”
Interlúdio
som de metais valiosos tilintando um contra o outro surgiu.

O Depois de garantir que a algibeira estava vazia, Ainz começou a separar as


moedas brilhantes espalhadas sobre a mesa.

Colocou dez moedas de prata ou ouro em cada pilha e depois as contou.

Depois de totalizar as pilhas de moedas várias vezes, Ainz olhou dentro da algibeira.

Estava vazio, como esperado. Depois de verificar esse fato, Ainz a deixou de lado e, em
seguida, agarrou a sua própria cabeça.

“Não é suficiente... não há dinheiro o suficiente...”

Seu rosto humano ilusório se contorceu em depressão. Claro, o dinheiro diante dele era
uma quantia considerável. Um cidadão comum poderia trabalhar por décadas e não acu-
mular esse valor. No entanto, para o mestre da Grande Tumba de Nazarick e sua única
fonte de renda, era pouco mais do que um trocado, este fato o deixou terrivelmente des-
confortável.

O estado mental de Ainz seria forçado a estabilizar uma vez que atingisse um certo li-
mite. Portanto, ele deveria ter sido automaticamente acalmado quando o choque de ter
dinheiro insuficiente fez um assalto relâmpago a tranquilidade de sua psique. No entanto,
a soma das moedas antigas que ele possuía deu-lhe uma margem de manobra emocional
e, portanto, o corte emocional não foi acionado. Em vez disso, ele queimava no fogo
brando da ansiedade.

Ainz balançou a cabeça e dividiu as moedas de ouro diante dele em várias pilhas.

“Primeiro, isso é financiamento adicional para Sebas.”

A pilha de dinheiro diante dele diminuiu em um instante, e o rosto de Ainz se contraiu.

“Então há essa pilha... fundos para a reconstrução e auxílio financeiro para a Aldeia Li-
zardman, de acordo com os desejos do Cocytus, e então...”

Foi menos do que antes, mas a pilha de dinheiro foi movida, deixando apenas algumas
peças de ouro para trás.

“...Esse dinheiro é para as despesas da Aldeia Lizardman... então se eu comprar da Guilda


dos Aventureiros, eu posso usar minha reputação como um aventureiro adamantite para
uns descontos. Isso deve tornar as coisas... mais baratas... então talvez isso funcione?”

Ele recuperou várias moedas da pilha de Cocytus.


Depois de contar e recontar as moedas restantes, Ainz murmurou baixinho para si
mesmo.

“...Talvez eu devesse conseguir um comerciante para me patrocinar ou algo assim... Seria


uma boa maneira de criar um fluxo regular de renda além das aventuras.”

Havia apenas três equipes de aventureiros adamantite no Reino, incluindo a do próprio


Ainz. Portanto, às vezes, os comerciantes faziam pedidos por nome. Esses trabalhos eram
fáceis e lucrativos para Ainz, e ele poderia facilmente se comprometer com alguns. No
entanto, ele não o fez até agora.

Isso porque Ainz queria evitar dar aos mercadores ou aventureiros a impressão de que
sua persona, Momon, era um homem ganancioso, ou talvez de alguém que faria qualquer
coisa por dinheiro.

Ainz pretendia construir uma imagem pública de um aventureiro amado por todos e
depois transferir essa glória para Ainz Ooal Gown. Assim, ele tinha que estar atento ao
que outras pessoas pensavam dele.

“Ainda assim... eu estou sem dinheiro. Por que fui inventar de ficar em uma pousada tão
cara...”

Ainz olhou ao redor do cômodo opulento.

Esta era a melhor pousada de toda a E-Rantel, e esse era seu melhor quarto. Natural-
mente, os preços para este quarto eram igualmente surpreendentes. No entanto, este
quarto superior não significava nada para Ainz, que não precisava dormir. Dado a este
fato, ele queria gastar o dinheiro em outro lugar.

O mesmo valia para as suas refeições. Por mais esplêndidos que fossem os pratos que a
pousada preparara para Ainz, que não podia comê-los, tais pratos acabavam por serem
insignificantes. Seria mais sensato cancelar as refeições e economizar o dinheiro.

No entanto, Ainz sabia exatamente por que ele não podia fazer isso.

Ainz... ou melhor dizendo, Momon era o único aventureiro classificado como adamantite
nesta cidade. Um grande nome como ele não poderia morar em um albergue sem con-
forto onde era preciso fazer tudo sozinho.

Os padrões de vida eram uma maneira fácil de comparar as pessoas. Um aventureiro


classificado como adamantite tinha que levar um estilo de vida consistente com seu ran-
que, como a pousada onde ele ficava e o que ele usava.

Afinal, o homem se faz por sua roupa.


Assim, Ainz não podia se rebaixar a ficar em alojamentos baratos. Embora ele enten-
desse que isso era um desperdício de dinheiro, era possível entender a lógica.

“Se eles acham que sou realmente tão valioso, então a Guilda deveria reservar um quarto
para mim... hahh... Se bem que é até provável que fariam isso se eu pedisse...”

Dito isso, ele não queria dever favores às pessoas. Até o momento, sempre que a Guilda
fazia pedidos urgentes, ele entrava imediatamente em ação para fazê-los sentirem-se em
dívida com ele. Uma vez que ele tivesse acumulado influência suficiente, ele então come-
çaria a usar de sua vantagem. Se ele permitisse que as pessoas pagassem suas dívidas
com coisas tão pequenas, seu plano estaria arruinado.

“Ah... não há dinheiro. Preciso fazer alguma coisa... talvez, mais pedidos? Mas não houve
tarefas bem remunerados recentemente. E se eu pegar muitos de uma vez, os outros
aventureiros me odiarão...”

Ele queria que Ainz Ooal Gown se tornasse uma lenda eterna, mas obviamente ele não
queria que esse nome se tornasse infame. Ainz fez o semblante de um suspiro, então me-
morizou a quantia de dinheiro que seria retirado da pilha.

“Falando em dinheiro, e quanto ao salário dos Guardiões?”

Ainz fez “Hmm” e recostou-se na cadeira, olhando para o teto.

Os Guardiões insistiram em não receber um salário, dizendo que sua maior alegria na
vida era servir os Seres Supremos, e que era para Ainz não ousar pensar que receberiam
pagamento por isso.

No entanto, Ainz sentiu que não deveria confiar demais nessa boa vontade. É preciso
recompensar o bom trabalho de maneira apropriada.

Embora os Guardiões tivessem indicado que a lealdade aos Seres Supremos era a me-
lhor recompensa, Ainz não aceitou essa declaração com facilidade.

Talvez fosse esse o conceito de um homem que só trabalhava de modo satisfatório a


troco de um salário, mas ele achava que o trabalho deveria ser compensado.

Por tudo que ele sabia, instituir um sistema salarial poderia levar à decadência e cor-
rupção para essas crianças puras e ingênuas. Mesmo assim, ele achava que isso merecia
um experimento.

“A questão agora é como eu deveria pagá-los.”

Os olhos de Ainz foram do teto para a diminuta pilha de moedas de ouro na mesa.
“Se considerarmos que o salário dos Guardiões é equivalente ao de um chefe de depar-
tamento em uma empresa de alto nível, isso significa que eles arrecadariam quinze mi-
lhões de ienes por ano... Shalltear, Cocytus, Aura, Mare Demiurge e Albedo deveriam es-
tar recebendo mais certo? O que significa que vou ter que multiplicar isso por seis. Ah,
não vai dar. É impossível ganhar essa quantia.”

Ainz agarrou sua cabeça em contemplação, e então seus olhos se abriram.

“Já sei! Só é preciso pagá-los com outra coisa! Talvez eu possa emitir notas apenas para
Nazarick — como dinheiro fictício, talvez — e depois fixar seu valor em cem mil cada.
Isso pode funcionar!”

Mas depois de gritar isso, o rosto de Ainz se torceu novamente.

Como ele faria todos usarem essas notas?

Todas as instalações da Grande Tumba de Nazarick eram gratuitas. Mesmo que ele im-
primisse essas notas, ele não sabia onde elas seriam utilizadas.

“E se eles se acostumarem a comprar itens desse mundo?”

Depois de comparar os bens deste mundo com os de Nazarick, ele não pôde deixar de
imaginar quem iria querer comprar coisas do mundo exterior.

“Essas instalações foram gratuitas até agora, mas se eu começar a cobrar por elas, eu
colocaria a carroça na frente dos cavalos... o que devo fazer?”

Depois de refletir por mais um tempo, Ainz teve outra idéia brilhante.

“Já sei! Vou pedir aos Guardiões para pensar em algo. Tudo o que preciso fazer é per-
guntar-lhes em que gastariam dinheiro. Isso deve bastar!”

Assim que Ainz estava murmurando: “Que ótima idéia” para si mesmo, seu rosto com
uma expressão amarga novamente.

“Ainda assim...”

Cada vez mais eu fico conversando sozinho...

Pensou Ainz.

Quando tudo isso ainda era um jogo, ele sabia que estava falando muito com ele mesmo
porque não havia mais ninguém por perto. No entanto, agora que os NPCs haviam ga-
nhado sapiência, vontade e orientação própria, E Ainz ainda estava falando sozinho. Por
que isso?
Foi porque se tornou um hábito? Ou foi porque—

“Porque eu ainda me sinto só, huh...”

Ainz riu de sua solidão.

Claro, ele estava cercado por NPCs sapientes, então era quase ilógico dizer que estava
realmente sozinho. No entanto, ele ainda se sentia assim. Talvez estivesse ocupado apa-
gando a personalidade de Suzuki Satoru, a fim de melhor desempenhar o papel de Ainz
Ooal Gown, o grande líder dos 41 Seres Supremos que os Guardiões o acusavam de ser.

Ainz suspirou, e quando ele olhou de volta para as moedas em sua mesa, ele ouviu uma
batida na porta.

Depois de pouco tempo, a porta se abriu. Após verificar que era a pessoa que ele espe-
rava — Narberal Gamma — Ainz enrugou o cenho.

Agora, o canto da boca de Ainz estava enrolado, como se ele estivesse desaprovando-a.

A ilusão de baixo nível que Ainz estava usando refletia seus pensamentos, de modo que
ocasionalmente podia exibir uma expressão que não se encaixava no Governante da
Grande Tumba de Nazarick. Portanto, sempre que havia alguém por perto, e particular-
mente na frente de Narberal, ele tipicamente colocava uma expressão que o fazia parecer
um governante severo e digno. Ele havia praticado isso diante do espelho muitas vezes,
aperfeiçoando essa expressão com perfeição.

“Aconteceu algo, Nabe?”

Sua voz era a mesma voz forçada que ele sempre fazia.

“Sim, Momon sa—n.”

“Há o velho hábito novamente. Sempre que eu chamo sua atenção a isso, você para de
fazer por um tempo, é melhor eu desistir disso, huh. Ahhh, não precisa se curvar. Eu não
estou com raiva, e o fato de você mostrar respeito por mim... bem, tudo bem também. O
Chefe da Guilda e os outros parecem ter ficado com a impressão errada disso, mas tudo
bem. Então, o que te traz aqui?”

“Sim. Diz respeito ao minério que o senhor ordenou aos mercadores para encontrar,
Momon-san.”

Eu não dei nenhuma ordem, foram apenas negócios....

Ainz resmungou dentro de seu coração. Dito isso, a expressão severa em seu rosto per-
maneceu impassível.
“Perfeito... de qual local estamos falando? Eles coletaram amostras de todos os oito lu-
gares?”

“Minhas mais profundas desculpas, mas eu não perguntei tais detalhes.”

“...Tudo bem, não se preocupe. Nós temos dinheiro. Mesmo que não saibamos de onde
vieram, poderemos comprar todos.”

Ainz grandiosamente moveu as moedas na mesa para uma algibeira e jogou para Nar-
beral. Ele viu quando ela decorosamente pegou a algibeira de dinheiro.

“Entendido. No entanto, se me permite, posso perguntar o porquê?”

“Por que estou comprando minério de vários locais?”

Narberal assentiu e Ainz explicou.

“Eu pretendo jogá-los na Exchange Box. Simplificando, gostaria de ver se a quantidade


de dinheiro recebido muda de acordo com a qualidade e localização do minério.”

A Exchange Box não deve ser afetada por tais coisas. Por exemplo, até mesmo uma es-
tátua primorosamente esculpida contaria apenas o mesmo que um pedaço bruto do
mesmo material quando colocado na Exchange Box. Sendo esse o caso, e se a composição
— a qualidade intrínseca do material variasse? Foi por isso que ele comprou todos esses
minérios.

“Nabe, sabia que eu consegui fixar um preço jogando grãos na caixa?”

Eu tive que jogar uma pilha de grãos até sair uma única moedinha....

Ainz resmungou em seu coração.

Se fosse esse o caso, tudo o que ele tinha que fazer era começar a produção em massa.
Assim, ele considerou a abertura de terras para fazendas de grãos fora de Nazarick, ma-
nejada por undeads ou Golems, tal mão de obra daria conta de grandes fazendas. Natu-
ralmente, a execução desse plano apresentava uma montanha de problemas por si só.

“Entendido. Então farei as compras imediatamente.”

“Mm. No entanto, tenha cuidado. Não podemos garantir que não haverá charlatões. Se
alguma coisa acontecer... Sabe o que fazer, certo?”
[Demônio Sombra]
“Vou usar o Shadow Demon como um escudo de carne. Não pensarei em obter informa-
ções e priorizarei a segurança ao recuar o mais rápido possível. Eu então me teletrans-
portarei para a falsa Nazarick de Aura-sama para enganar o inimigo.”
“Muito bom. Preste atenção à segurança e não ande em áreas isoladas ou tome rotas que
a torne vulnerável a ataques. Além disso, não espanque as pessoas até a morte se elas te
incomodarem ou tentarem conversar com você. Sendo sincero, fiquei bastante surpreso
quando aquele homem chorou e me implorou para salvá-lo e disse que ele estava apenas
tentando flertar com você. Além disso, você não deve projetar sua intenção assassina sem
motivo algum. Esmagar as mãos dos batedores de carteira pode ser aceitável, mas não o
faça o tempo todo. Além disso, não se refira, em nenhuma circunstância, aos seres huma-
nos como insetos. Vou deixar bem claro, mantenha seus impulsos nocivos contidos, afinal,
somos Momon e Nabe, os aventureiros de maior hierarquia conhecidos como Escuridão.”

Uma vez que ele viu Narberal indicar que entendia, Ainz sentiu que não havia mais nada
para lembrá-la e assentiu.

“...Mm. Creio que é isso. Agora vá, Nabe.”

Ainda segurando a algibeira, Narberal fez uma reverência antes de sair do quarto. Ao
assisti-la sair, Ainz suspirou profundamente, apesar de sua falta de pulmões.

“...E pensar que eu tenho que gastar ainda mais mesmo sem verba... Que droga.”
Capítulo 03: Aqueles Que Pegam, Aqueles Que São Pegos
Parte 1

26º Dia do mês Meio Fogo (8º mês) – 15:27

epois de escoltar a velha senhora para casa, Sebas continuou seu destino

D
original.

Ele chegou a uma longa extensão de muros.

Três torres — cada uma com cinco andares de altura — erguiam-se de dentro daqueles
muros. A altura delas se tornava ainda mais imponente pelo fato de serem as construções
mais altas das redondezas.

Estas torres foram cercadas por vários edifícios longos e estreitos de dois andares.

Essa era a sede da Guilda dos Magistas do Reino. Eles precisavam de amplo espaço para
o desenvolvimento de novas magias e o treinamento de magias arcanas. A razão pela qual
eles poderiam arcar com toda essa terra apesar de praticamente não ter apoio nacional
provavelmente se devia à fabricação e venda de itens mágicos.

Depois de caminhar um pouco mais, ele viu um portão robusto. O portão de treliça se
abriu, e de cada lado havia vários guardas armados, posicionados perto dos edifícios de
dois andares.

Os guardas não obstruíram Sebas — embora eles o olhassem passar — e ele passou pelo
portão.

Havia uma escadaria levemente inclinada diante dele e um conjunto de portas que se
abriam para uma casa de aparência distinta. Naturalmente, essas portas estavam abertas
para receber os visitantes.

Ao entrar, ele se viu em um pequeno hall de entrada, com o saguão do prédio à sua frente.
Uma série de candelabros mágicos pendia do teto alto do hall.

À direita, um lounge de hóspedes que continha um sofá e várias outras peças de mobília.
Mais ao fundo havia vários magic casters palestrando. À esquerda havia um quadro de
avisos. Várias pessoas estavam estudando isso seriamente; alguns usavam túnicas e pa-
reciam arcanistas, enquanto outros pareciam ser aventureiros.

Havia um balcão nos recantos mais profundos do hall, lá havia vários homens e mulhe-
res jovens sentados atrás dele. Todos usavam túnicas e tinham emblemas no peito que
combinavam com o símbolo que ele havia visto ao entrar no edifício.

Em cada lado do balcão havia um par de bonecos de madeira esguios, do tipo usado
como referência para poses. Eles eram do tamanho de humanos reais e eles não tinham
traços faciais — ou em outras palavras, Golems de Madeira. Aparentemente, eles estavam
sendo usados como sentinelas. O fato de não terem colocado sentinelas humanas dentro
deve ter sido motivo de orgulho por parte da Guilda dos Magistas, claro, ainda haviam as
sentinelas externas.

Os sapatos de Sebas pisavam firmes quando ele se aproximou do balcão.

O jovem no balcão notou Sebas e o cumprimentou com um olhar. Sebas assentiu em


retorno. Ele era um cliente frequente aqui, então ambos estavam familiarizados um com
o outro.

“Bem-vindo à Guilda dos Magistas, Sebas-sama. Como posso ajudá-lo, hoje?”

“Sim, gostaria de comprar um pergaminho com magia. Posso consultar a lista usual?”

“Certamente.”

O jovem rapidamente trouxe um grande tomo para o balcão. Ele deve ter ficado de pron-
tidão quando notou Sebas se aproximando.

As páginas do livro eram feitas de papel de alta qualidade que era fino e branco como a
neve, já a capa era feita de couro. O artigo geral foi de construção requintada. As letras
na capa estavam impressas em ouro, e só o custo deste livro provavelmente estava além
do descritível em poucas palavras.

Sebas trouxe o livro para si e o folheou.

Lamentavelmente, Sebas não entendia as palavras escritas sobre ele. Ou melhor, pode
ser melhor dizer que seres de YGGDRASIL não conseguiram compreendê-las. Apesar do
princípio bizarro que traduzia a linguagem falada neste mundo, o texto escrito não era
traduzido automaticamente.

No entanto, o mestre de Sebas havia lhe dado um item mágico que poderia resolver esse
problema.

Sebas tirou uma caixa de óculos do bolso do peito e o abriu.

Um par de óculos estava dentro. Sua ponte era feita de um metal parecido com platina,
e em um olhar mais atento, parecia ter sido inscrito com caracteres minúsculos, ou algum
tipo de padrão texturizado. As próprias lentes haviam sido polidas a partir de um cristal
que lembrava gelo azul.

Ao colocar esses óculos, ele conseguia entender o texto escrito através do poder da ma-
gia.
Sebas leu rápida e cuidadosamente as páginas, e então de repente ficou imóvel. Ele des-
viou o olhar do livro, para a garota ao lado do jovem no balcão e gentilmente perguntou:

“É algo importante?”

“Ah, não é nada...”

A garota corou e abaixou o rosto.

“Eu só pensei que... o senhor é muito bonito.”

“Muito obrigado.”

Sebas sorriu e o rosto da garota ficou ainda mais vermelho.

Sebas, o cavalheiro de cabelos brancos, era uma pessoa que podia hipnotizar os outros
à primeira vista. Ele era bonito, mas o modo como ele se comportava era ainda mais im-
pressionante. Quando ele andava nas ruas, nove em cada dez mulheres — independen-
temente da idade — se viravam para dar uma segunda olhada nele. Não era de admirar
que as garotas do balcão se sentissem extasiadas por ele, afinal era uma ocorrência co-
mum.

Sebas achou isso compreensível, e então voltou seus olhos para o tomo. Ele parou em
uma determinada página e perguntou ao jovem:

“Poderia me falar sobre essa magia... 「Floating Board」, é assim que se pronuncia?”

“Certamente.”

O jovem começou seu discurso.

“「Floating Board」 é uma magia de primeiro nível que cria uma plataforma flutuante
translúcida. O tamanho e a capacidade de carga da plataforma variam com o poder do
conjurador. No entanto, quando lançado a partir de um pergaminho, é limitado a uma
superfície de um metro quadrado e pode transportar um máximo de cinquenta quilos. A
plataforma move-se atrás de quem a conjurar e pode estar a uma distância máxima de
cinco metros de quem a lançar. Como a 「Floating Board」 só pode seguir atrás do con-
jurador, ela não pode ser movida para frente. Se o conjurador se virar, a plataforma irá
se mover lentamente até que fique alinhada com as costas. É principalmente uma magia
de transporte e pode ser comumente vista durante os trabalhos de terraplanagem.”

“Entendo...”

Sebas assentiu antes de continuar:

“Então eu vou levar um pergaminho com essa magia.”


“Como desejar.”

O jovem não ficou surpreso pelo fato de Sebas ter escolhido uma magia de baixa de-
manda como essa. Mas no fim, quase todos os pergaminhos que Sebas havia comprado
eram de magias impopulares como esta. Além disso, ser capaz de esvaziar os estoques
excedentes era uma dádiva de Deus para a Guilda dos Magistas.

“Apenas um será o bastante?”

“Apenas um, por favor. Obrigado.”

Para um jovem sentado perto dali o atendente gesticulou.

O homem — que estivera escutando a conversa — levantou-se imediatamente e abriu


uma porta que dava para um quarto atrás do balcão, no qual ele entrou. Os pergaminhos
eram itens caros e, mesmo havendo guardas, não era necessário empilhá-los em um mos-
truário de vendas.

Após cerca de cinco minutos, o homem que saíra voltou. Nas mãos dele havia um rolo
de pergaminho.

“Seu pergaminho, senhor.”

Sebas olhou para o pergaminho no balcão. Foi feito de forma primorosa e parecia dis-
tintamente diferente do papel que se poderia comprar nos comércios. O nome da magia
foi escrito em tinta preta no lado de fora do pergaminho, e depois de verificar que era
mesmo a magia que ele queria, ele tirou os óculos.

“De fato, é este mesmo. Ficarei com isto.”

“Agradecemos a preferência.”

O jovem curvou-se educadamente e disse:

“Como este é um pergaminho de primeiro nível, será uma moeda ouro e dez de prata.”

Uma poção com encantamentos de nível similar custaria duas moedas de ouro, então
esse pergaminho era comparativamente mais barato. Isso porque, em circunstâncias
normais, pergaminhos de magia só podiam ser usados por magic casters com conheci-
mento da magia usada. Assim, só fazia sentido que as poções fossem mais caras, dado
que poderiam ser usadas por qualquer pessoa.

Dito isso, “comparativamente” foi a palavra-chave aqui. Um ouro e dez moedas de prata
era muito caro para uma pessoa comum; equivalente a cerca de meio mês de salário. No
entanto, para Sebas — ou melhor, o mestre de Sebas — era uma despesa trivial.
Sebas então retirou uma bolsa carteira. A abriu, retirou 11 moedas e entregou ao jovem.

“A quantia está correta, senhor.”

O jovem não testou a autenticidade do dinheiro na frente de Sebas. Suas transações, até
então, haviam garantido a Sebas tal confiança.

♦♦♦

“Aquele velho cavalheiro é muito bonito!”

“Mm!”

Debate surgiu entre o pessoal do balcão — especialmente as senhoritas — uma vez que
Sebas havia deixado a Guilda dos Magistas.

Elas não eram mais mulheres sábias, mas garotinhas apaixonadas que tinham acabado
de conhecer seu Príncipe Encantado. Um dos homens sentados no balcão franziu a testa
e seu rosto ficou com expressão amarga, mas até ele sentiu a presença culta de Sebas e
então ficou quieto.

“Ele deve ter tido experiência em servir algum nobre de alto escalão. Eu não ficaria sur-
preso se ele mesmo fosse um nobre, o terceiro filho de algum lorde menor ou algo assim.”

Era uma coisa comum para as crianças nobres que não podiam herdar a propriedade se
tornarem mordomos ou empregadas. Famílias nobres de posição mais alta tenderiam a
contratar pessoas de tais origens. Depois de testemunhar o porte nobre de Sebas, eles
puderam aceitar o fato de que Sebas era de berço rico.

“Cada pequeno gesto que ele faz é elegante, do jeito que ele fica em pé à maneira como
ele se move.”

Ninguém pôde deixar de assentir.

“Se ele me convidasse para tomar chá, eu definitivamente aceitaria.”

“Mm! Eu também! Eu também! Eu definitivamente também aceitaria!”

As senhoritas gritaram e arrulharam uma após a outra. Elas conversaram sobre onde
estavam os bons cafés e, em seguida, sobre como ele seria perfeito como acompanhante.
Os homens olharam para elas e começaram a falar também.

“Ele realmente parece alguém com grande conhecimento. Vocês acham que ele é um
magic caster também?”
“Não faço idéia, mas ele pode ser.”

As magias que Sebas comprou foram todas desenvolvidas recentemente. Isso implicava
uma ampla familiaridade com a magia. Se ele tivesse sido obrigado a comprar um perga-
minho, ele poderia simplesmente ter perguntado diretamente ao pessoal do balcão, sem
precisar navegar pelo catálogo. O fato de Sebas ter folheado o livro era um sinal de que
ele estava tomando as decisões sobre quais gostaria de comprar.

Isso não era algo que qualquer homem comum pudesse fazer. Em outras palavras, eles
poderiam supor que ele tinha recebido uma educação especializada em magia — ou que
ele próprio fosse magic caster.

“E além disso há aqueles óculos... eles parecem caros.”

“São um item mágico?”

“Eu duvido, parecem ser uma peça muito bem trabalhada, não? Feito pelos Dwarfs, eu
acho.”

“Hmm, isso é incrível, possuir um par de óculos assim.”

“Eu gostaria de ver a linda dama com quem ele veio uma vez...”

Um dos homens murmurou. A resposta do lado deles foi uma onda de desaprovação.

“Eh, aquela mulher provavelmente não é nada além de sua aparência.”

“Mm, me senti tão triste por Sebas-san. Ela estava ofuscando sua presença.”

“Ela parece bonita, mas definitivamente parece ter uma personalidade terrível. Você viu
a maneira repugnante que ela estava nos olhando? Eu sinto muito por Sebas-san, ter que
servir uma pessoa assim.”

Os homens não ousaram responder depois de ouvirem as senhoritas criticarem uma


mulher. A mestra de Sebas era uma beleza arrebatadora, e ela roubara seus corações num
instante. Claro, as mulheres ao lado deles também tinham sido escolhidas a dedo como o
rosto da Guilda dos Magistas, mas compará-las àquela mulher era como comparar a lua
a uma tartaruga enlameada. Os homens queriam dizer para não serem tão ciumentas,
mas estava claro o que aconteceria se eles realmente dessem voz a tais palavras.

Nenhum dos homens era estúpido o suficiente para fazer isso. Assim sendo—

“Tudo bem, chega de conversa fiada.”

As palavras do jovem cortaram sua conversa enquanto um aventureiro se aproximava


do balcão. Todos os rostos ficaram sérios e começaram a trabalhar seriamente.
♦♦♦

26º Dia do mês Meio Fogo (8º mês) – 16:06

Depois de deixar a Guilda dos Magistas, Sebas olhou para o céu.

Escoltar a senhora até em casa o fizera atrasar um pouco, o céu estava lentamente fi-
cando mais vermelho. Depois de olhar para o relógio que havia tirado do bolso do peito,
ele sabia que era hora de voltar para casa. No entanto, os negócios do dia ainda não ha-
viam terminado. Mas já que esses assuntos poderiam ser adiados até amanhã, então não
deveria adiá-lo? Ou deveria manter o plano e terminar sua agenda de hoje, mesmo que
isso o leve a fazer horas extras?

Ele apenas hesitou por um momento.

A questão da velha senhora foi sua própria decisão. Assim, ele deveria cumprir suas ta-
refas.

“—Shadow Demon.”

Uma presença fervilhante emergiu da sombra de Sebas.

“Informe a Solution que chegarei um pouco atrasado. Isso é tudo.”

Não houve resposta, mas a presença começou a se mover. Ele transcorreu de sombra
em sombra e gradualmente se afastou.

“Ótimo.”

Sebas murmurou, e assim começou a se mover.

Ele não tinha destino em mente. Sebas desejava se familiarizar totalmente com o layout
da Capital Real. Seu mestre não ordenou que ele fizesse isso — ele simplesmente esco-
lhera se mover de forma independente como parte de seus deveres de coleta de informa-
ções.

“Então, devo ir naquela direção hoje.”

Depois de resmungar para si mesmo e ajeitar a barba, Sebas girou o pergaminho que
segurava na mão. Ele parecia uma criança se entretendo ao fazê-lo.

Ele se dirigiu para a frente, afastando-se do distrito central da Capital Real, onde ainda
estava seguro.
Depois de passar por várias esquinas, as vielas começaram a ficar mais sujas e um fedor
fraco passou a impregnar o ar, era o fedor de lixo fresco e outros resíduos. Parecia que
fisicamente mancharia suas roupas, mas Sebas continuou em silêncio.

De repente, ele parou e examinou seus arredores. Parece que ele tinha entrado em um
beco muito recôndito, tão apertado que as pessoas teriam que se espremer umas nas
outras para avançar.

Era difícil atravessar esses becos estreitos, onde a luz do sol poente era bloqueada pelas
construções altas ao redor, já o chão era atroz. No entanto, não representava obstáculo
para Sebas. Ele caminhou em silêncio e ocultando sua presença, como se tivesse se fun-
dido nas sombras.

Sebas virou mais algumas esquinas enquanto se dirigia para uma região ainda mais es-
cassamente povoada, e então seu passo confiante sem hesitação de repente parou.

Suas viagens sem objetivo o trouxeram até aqui e ele percebeu que havia percorrido um
longo caminho desde sua morada. Os instintos de Sebas, em grande parte, já o haviam
deixado ciente de sua localização, e ele traçou mentalmente a rota de sua casa até esse
lugar.

Dado os atributos físicos de Sebas, ele poderia ter coberto a distância em uma linha reta.
Se mover normalmente em meios a tantas vielas consumia muito mais tempo do que o
comum. Agora que a noite estava se aproximando, provavelmente era hora de voltar.

Ele não estava preocupado com a segurança de Solution, com quem compartilhava a
mesma casa.

Mesmo que um poderoso inimigo aparecesse, Solution ainda tinha um monstro em sua
sombra, muito parecido com o de Sebas. Ela deveria ser capaz de ganhar tempo para
recuar usando-o como um escudo. Dito isto—

“...Devo voltar?”

Com toda a honestidade, ele queria continuar andando, mas perder tempo em uma ati-
vidade que fosse algo como lazer não seria permitido. Ainda assim, mesmo que voltasse
para casa, ele podia pelo menos ver o que estava à sua frente. Ele continuou andando
pelas vielas estreitas.

Enquanto Sebas forjicou silenciosamente à frente na escuridão, ele viu uma pesada
porta de aço logo a frente — a cerca de 15 metros de distância — de repente veio a vida
ao se abrir, uma luz vinha de dentro. Sebas parou e observou silenciosamente.

Assim que a porta se abriu completamente, alguém pontou a cabeça para fora. A luz de
fundo só permitia que Sebas visse sua silhueta, mas a pessoa provavelmente era um ho-
mem. O homem olhou em volta, mas não notou Sebas, então recuou para dentro.
Houve um baque quando um grande saco atingiu o chão do lado de fora. Iluminado pela
luz de dentro, Sebas pôde ver que havia um objeto macio no interior, que havia mudado
de forma com a queda.

A porta ainda estava aberta, mas a pessoa que jogava o saco como se fosse lixo parecia
ter voltado para dentro, e não houve movimentos por um tempo.

Sebas franziu a testa, debatendo se deveria seguir em frente ou seguir em outra direção.
Intrometer em coisas que não eram da sua conta provavelmente levaria a problemas.

Depois de hesitar brevemente, ele continuou seu avanço silencioso ao longo do beco
escuro e estreito.

“—Melhor continuar.”

A boca do saco se abriu.

Os sapatos de Sebas foram passando mais lentamente ao se aproximar do saco.

E assim que estava prestes a seguir em frente, ele parou.

Sebas sentiu que algo havia pegado suas calças. Olhando para baixo, Sebas viu o que
esperava.

Um braço esguio, como um galho seco, se estendeu de dentro do saco, agarrando a bai-
nha de sua calça. O corpo seminu de uma mulher surgiu de dentro

Foi quando o saco abriu completamente, expondo a parte superior do corpo da mulher.

Seus olhos azuis estavam opacos, nebulosos e vazios de vida. Seu cabelo na altura dos
ombros estava bagunçado, com pontas duplas e quebradiços. Seu rosto estava inchado
como se fosse um saco de pancadas, e havia numerosas manchas vermelhas pálidas por
toda a pele ressecada e ferida.

Ela era como um animal desnutrido se apegando a sua vida moribunda, não havia pra-
ticamente nenhuma vitalidade nela.

Certamente isso deveria ser um cadáver. Não — ela ainda respirava. A mão segurando
a bainha da calça de Sebas era o melhor sinal disso. No entanto, se tudo o que ela podia
fazer era respirar, isso realmente se qualificava como um ser vivo?

“...Você poderia, por favor, me soltar?”

A garota não respondeu às palavras de Sebas. Era evidente que ela não o estava igno-
rando. Afinal, suas pálpebras estavam tão inchadas que só estavam separadas por uma
fina fenda. As pupilas turvas que pareciam estar olhando para o céu, aparentemente não
conseguiam ver nada.

Tudo o que Sebas teria que fazer era mover a perna e ele seria capaz de se livrar daque-
les dedos, tão finos que mesmo compará-los a galhos secos não seria acurado. No entanto,
ele não o fez. Em vez disso, ele continuou perguntando:

“...Você está com dificuldades? Se estiver—”

“—Hey, velho. Tá olhando o quê?”

Sebas foi interrompido por uma voz baixa e bruta.

Um homem apareceu atrás da porta. Seus braços e peito se arquearam com músculos.
Seu rosto com cicatrizes mostrava claramente sua hostilidade, e ele olhou com ódio para
Sebas. A lanterna que ele estava segurando emitia uma luz vermelha.

“Ei ei ei, por que tá metendo o nariz aqui, velho?”

O homem estalou a língua em exagerada deliberação e depois ergueu o queixo para Se-
bas.

“Dá o fora daqui, velho. Aproveita que ainda pode andar.’

Vendo que Sebas permaneceu imóvel, o homem deu um passo à frente. A porta se fechou
atrás dele com um baque pesado. O homem lentamente colocou a lanterna a seus pés
com uma arrogância intimidadora.

“Ô seu velho, tá surdo, é?”

Ele rodeou os ombros e estalou o pescoço. Então ele lentamente levantou a mão direita
e apertou-a em um punho. Ele claramente não tinha medo de usar violência.

“Hm...”

Sebas sorriu. Vindo de um cavalheiro idoso como Sebas, aquele sorriso digno mostrava
claramente uma calma e compaixão incomparáveis. No entanto, por alguma razão, o ho-
mem recuou como se um carnívoro feroz tivesse aparecido diante dele.

“Uh... uh, uh, o que você—”

Abalado pelo sorriso de Sebas, o homem não conseguiu terminar as palavras que estava
tentando formar. Ele cambaleou para trás, sem perceber o quanto estava ofegante.

Sebas colocou o pergaminho — marcado com o emblema da Guilda dos Magistas — que
ele segurava no cinto. Então ele deu um único passo à frente, encurtando o espaço para
o homem, e estendeu a mão. O homem não pôde nem mesmo reagir a esse movimento.
Com um sussurro silencioso, a mão que segurava a bainha da calça de Sebas caiu no chão
do beco.

Esse pareceu ser o sinal para Sebas agarrar o homem pelo colarinho — e então ele facil-
mente levantou seu corpo do chão.

Qualquer um vendo isso certamente se perguntaria se isso era algum tipo de piada.

Apenas considerando as aparências, não havia chance de que Sebas pudesse estar em
igualdade com este homem em uma briga. Seja em termos de idade, musculatura, altura,
massa e a aura de violência ao seu redor, o homem mais jovem tinha a vantagem.

E, no entanto, este distinto senhor estava levantando este peso pesado com uma mão.

—Não, não foi esse o caso. Talvez uma testemunha ocular fosse capaz de sentir a dife-
rença entre os dois. Os humanos tinham instintos limitados, mas eles ainda podiam sentir
uma diferença suficientemente díspar entre as duas partes.

A diferença entre Sebas e este homem era—

A diferença entre um superior absoluto e um inferior absoluto.

O outro homem — que havia sido levantado completamente do chão — agitava as per-
nas e torcia o corpo. Então, quando ele pensou em pegar a mão de Sebas em suas próprias
mãos, seus olhos se encheram de medo quando ele percebeu algo.

Ele finalmente percebeu que o homem diante dele não era nada parecido com o que sua
aparência sugeria. Ele também percebeu que a resistência inútil só serviria para irritar o
monstro diante dele.

“O que ela é?”

Quando o homem começou a enrijecer de medo, aquela voz fria penetrou em seus ouvi-
dos.

Aquela voz era tão nítida e suave quanto um riacho que fluía suavemente. O contraste
absoluto com a mão que o levantava facilmente só aumentava o medo do homem.

“Ela, ela trabalha aqui.”

O homem respondeu, sua voz saiu com pânico.

“Eu perguntei o que ela era. E a sua resposta é que ela trabalha aqui?”
O homem se perguntou se ele havia dito a coisa errada. No entanto, foi a resposta mais
correta que ele poderia ter dado nas circunstâncias atuais. Os olhos do homem estavam
arregalados de medo, tremendo como os de um pequeno animal assustado.

“Não é nada. É só que alguns dos meus colegas vêem os humanos como objetos, então
eu acreditava que você também via as pessoas como objetos. Se você mantivesse esse
ponto de vista, creio que não haveria problema. No entanto, você respondeu que ela tra-
balha aqui. Em outras palavras, você a considera um ser humano. Estou correto? Então,
permita-me outra pergunta. O que você pretende fazer com ela?”

O homem pensou por um momento. Contudo—

Quase se podia ouvir algo comprimir.

O aperto de Sebas se intensificou e o homem ficou brevemente ofegante.

“—Uggghhh!”

Sebas apertou ainda mais o colarinho, tornando mais difícil para ele respirar, e o homem
soltou um grunhido estranho. Sebas estava dando uma mensagem clara: “Eu não vou te
dar tempo para pensar — responda agora.”

“Ela tá doente, então eu ia levar ela no templo.”

“—Eu não gosto de mentiras.”

“Hiiiieee!”

O aperto de Sebas ficou ainda mais forte, e o rosto do homem ficou vermelho quando
um grito estrangulado vazou de sua garganta. Por mais generoso que ele pudesse ter sido,
descontando o fato de ter colocado alguém em um saco para transporte, as ações do ho-
mem ao despejar um ser humano em um saco já deixara entendido que não tinha a in-
tenção de levar a pessoa doente ao templo. Foi apenas como se livrar de lixo.

“Por favor... pare...”

O homem estava com dificuldade para respirar. Ele se debatia selvagemente quando
percebeu o perigo mortal em que estava.

Sebas casualmente bloqueou o punho em direção ao seu rosto com uma mão. As pernas
agitadas bateram no corpo de Sebas e sujaram suas roupas, mas Sebas estava tão estóico
quanto as montanhas.

—Mas é claro.
Como as pernas de um mero humano poderiam mover um bloco de aço? Mesmo depois
de acertar em cheio, Sebas simplesmente tirou o pó e disse indiferente:

“Eu aconselho que diga a verdade.”

“Gahhhh—”

O homem não conseguiu respirar e Sebas estreitou os olhos para o rosto vermelho do
homem. Então o soltou pouco antes de desmaiar.

Com um grande baque, o homem caiu no chão do beco.

“G-guwaaargh!”

O homem expeliu as últimas gotas de ar dentro de si mesmo, como um grito ofegante, e


então avidamente bebeu no ar fresco em grandes goles. Sebas continuou olhando para
ele em silêncio. Então, Sebas estendeu a mão em direção a garganta do homem nova-
mente.

“E-espera... p-por favor, espere!”

Tendo experimentado pessoalmente os terrores da privação de oxigênio, o homem se


afastou da mão de Sebas.

“É que— Isso é, sim! Eu tava levando ela no templo!”

Ele ainda está mentindo?

Pensar que sua vontade é tão forte...

Sebas pensou que o homem superou facilmente o medo de perder a vida. No entanto,
mesmo o homem tendo aparentado medo, ele não parecia disposto a falar tudo que sabia.
Em outras palavras, o perigo de deixar vazar essa informação estava no mesmo nível da
intimidação de Sebas.

Sebas pensou se deveria mudar seu plano de abordagem. Este era o território inimigo.
O fato de o homem não ter gritado para quem estava atrás da porta pedindo ajuda indi-
cou que ele não esperava que alguém o resgatasse imediatamente. Dito isto, ficar aqui
por muito tempo só levaria a mais problemas.

Seu mestre não ordenou que ele causasse problemas. Suas ordens eram se misturar à
sociedade e secretamente reunir inteligência.

“Se você pretende leva-la ao templo, permita-me fazê-lo. Eu garantirei sua segurança.”
O homem engoliu em seco e seus olhos estremeceram. Então ele freneticamente tentou
criar uma desculpa.

“...Não há garantia de que você realmente vai levá-la até lá.”

“Então me acompanhe até lá.”

“Tô ocupado agora, não posso ir. Vou levar ela mais tarde.”

O homem parecia ter percebido algo da expressão de Sebas e continuou apressada-


mente:

“Ela é nossa por lei! Se você se intrometer, vai violar as leis do país! E se você ousar levar
ela embora, será sequestro!”

Sebas parou imediatamente e franziu a testa pela primeira vez.

O homem jogou com sua maior fraqueza.

Seu mestre dissera que ele poderia agir quando a situação exigisse, isso era apenas
quando ele estava fazendo o papel de um mordomo cuidando de sua mestra.

Quebrar a lei levaria a uma investigação, e possivelmente até levaria o seu disfarce a ser
descoberto. Em outras palavras, isso poderia levar a grandes e óbvias repercussões, so-
bre as quais seu mestre não ficaria feliz.

Sebas não achava que esse homem bruto fosse muito instruído, mas sua voz estava cheia
de confiança. Em outras palavras, alguém deve ter lhe ensinado um pouco sobre a lei.
Sendo esse o caso, pode haver alguma base factual para sua declaração.

Como não havia testemunhas, a resposta para isso foi simples; violência. Ele simples-
mente se tornaria outro cadáver, mas um com o pescoço quebrado.

No entanto, esse era um último recurso; algo que ele só poderia fazer em serviço direto
aos objetivos de seu mestre. Ele não podia atacar por uma garota que ele havia encon-
trado por acaso.

Dito isto, seria certo abandonar esta mulher?

Quando Sebas hesitou, a risada grosseira do homem encheu-o de raiva.

“Oh, mordomo-sama, vai realmente querer enganar seu mestre, quer causar problemas?”

Pela primeira vez, a sobrancelha de Sebas se franziu visivelmente enquanto ele obser-
vava a alegre expressão do homem. Talvez o homem tivesse compreendido sua fraqueza
devido a como reagiu agora a pouco.
“Eu não sei qual nobre o senhor serve, mas causar problemas pro seu mestre pode ser
ruim, não é? Vai saber, seu mestre pode ter laços com o nosso estabelecimento. Não tem
medo dele te repreender?”

“...Você realmente acha que meu mestre não conseguiria resolver uma questão dessa
magnitude? As regras existem para serem quebradas pelos fortes, não?”

Isso pareceu ter perfurado o homem, e o medo atravessou seu rosto por um momento.
No entanto, ele recuperou sua confiança quase que imediatamente.

“...Por que não experimenta, então?”

“...Hmph.”

O blefe de Sebas não funcionou no homem. Ele deve ter algum tipo de apoiador influente.
Julgando que essa abordagem não foi eficaz, Sebas decidiu mudar de rumo.

“...Entendo. De fato, seria bastante problemático no sentido legal. No entanto, há tam-


bém uma lei que afirma que, se alguém pedir ajuda, é permitido prestar ajuda sem medo
de consequências legais. Eu estava apenas agindo de acordo com essa lei. Para começar,
ela está inconsciente, então ela deve ser levada ao templo para tratamento. Estou errado?”

“Er... não... isso...”

O homem murmurou para si mesmo enquanto atormentava seu cérebro.

Seu disfarce havia caído.

Sebas soltou um suspiro de alívio diante das más habilidades de atuação do homem e
de suas reações lentas. Sebas acabara de contar uma mentira. Desde que sua oposição
decidira tentar usar a lei contra ele, Sebas por sua vez disse um monte de bobagens de
cunho legal.

Se o homem continuasse a argumentar usando a lei — mesmo que ele estivesse apenas
mentindo —, Sebas e sua compreensão limitada das leis do Reino não teriam uma res-
posta lógica para tudo. No entanto, o homem não entendia a lei e estava apenas repetindo
o que tinha ouvido, então ele não podia ver através das mentiras de Sebas.

Além disso, sua falta de conhecimento legal significava que ele não tinha resposta
quando alguém usava a lei para argumentar contra ele. Além disso, esse homem prova-
velmente era o lacaio de alguém, então não tinha autoridade para tomar decisões por
conta própria.

Sebas se afastou do homem e apoiou a cabeça da mulher.


“Você quer que eu te resgate?”

Sebas perguntou, antes de trazer sua orelha perto dos lábios ressecados da mulher.

Tudo o que ele podia ouvir era o som de respiração fraca. Não, era mais como o último
suspiro de um balão vazio. Um som assim contava como respirar?

Não houve resposta. Sebas balançou a cabeça e perguntou novamente:

“Você quer que eu te salve?”

Salvar essa garota era completamente diferente de ajudar aquela velha senhora. Sebas
queria ajudar o máximo de pessoas que o rodeavam, mas salvar essa garota poderia re-
sultar em sérios problemas. O Supremo entenderia o porquê ele fazia essas coisas? Não
era isso uma violação da vontade de seu mestre? Uma rajada fria atormentava seu cora-
ção enquanto contemplava esse ponto.

Ainda não houve resposta.

Um leve sorriso ainda rude retornou para o rosto do homem.

Dado que ele sabia que tipo de inferno que ela tinha passado, era óbvio o motivo de seu
sorriso de zombaria. Caso contrário, por que ele a teria jogado fora, pronta para ser des-
cartada?

Boa sorte não se repetia, afinal, fenômenos que ocorrem regularmente não podem ser
considerados boa sorte.

De fato, se alguém considerasse seu ato de segurar a bainha da calça de Sebas como
sorte, seria como ela ter gastado todo o resto de sorte que tinha.

—No caso dela, sua única boa sorte foi o fato de Sebas ter entrado nesse beco e apenas
isso. Tudo o resto dependia de quanto ela queria sobreviver.
Não era certo considerar isso como sorte.

—Até que.

Sim. Os lábios da garota se moveram levemente. Não foi o movimento natural da respi-
ração. Foi uma ação voluntária e consciente.

“—”

A única resposta de Sebas ao ouvir essas palavras foi um grande aceno de cabeça.

“Eu não acredito em ajudar aqueles que só podem orar para serem salvos. No entanto...
você ainda luta pela sua vida...”

Os dedos de Sebas se moveram lentamente para fechar os olhos da garota.

“Não tenha medo. Descanse. Você está sob minha proteção agora.”

A garota fechou os olhos nublados, como se envolvida em uma quente mortalha de com-
paixão.

O homem não podia acreditar no que acabara de ver e, assim, deixou escapar a primeira
coisa que lhe veio à mente.

“Não vem com essa—”

Eu não ouvi nada, o homem queria dizer, mas ele estava paralisado no lugar.

“Está insinuando que... eu sou um mentiroso?”

Ele não percebeu Sebas levantar, mas agora seu olhar afiado deixava o homem parali-
sado.

Aqueles eram olhos que incutiam o terror.

Aqueles olhos cruéis pararam a respiração do homem, como se possuíssem a capaci-


dade de esmagar fisicamente seu coração dentro de seu peito.

“Está dizendo que eu mentiria para um tipo como você?”

“Ah, não, ah...”

O homem resmungou e depois engoliu em seco. Seus olhos se moveram, fixando nos
braços de Sebas. Ele deve ter se lembrado das consequências de extrapolar seu lugar.
“Então, eu vou levá-la comigo.”

“Ah, espere! Não, por favor, espere!”

O homem gritou. Sebas olhou para ele pelo canto dos olhos.

“O que é agora? Tentando comprar mais tempo?”

“Não, não é isso. É que se levar ela embora, vai dar problema. O senhor vai levar proble-
mas para o senhor e seu mestre! Nunca ouviu falar da Oito Dedos?”

Sebas ouvira esse nome durante sua coleta de informações. Eles eram uma organização
criminosa que governava o Reino das sombras.

“Tem que me ajudar. Por favor, finja que não viu nada aqui. Se levar ela embora, eles vão
me condenar e me punir.”

Vendo que o homem estava tentando convencê-lo, agora que o uso da força havia fa-
lhado, Sebas olhou friamente para ele e falou em tons igualmente frígidos:

“Eu vou levá-la comigo.”

“Que isso, tem que me ajudar, cara! Eles vão me matar!”

Eu poderia matá-lo agora.

Pensou Sebas. O homem ainda estava implorando enquanto Sebas pesava os prós e con-
tras de acabar com a vida do homem.

Sebas tinha pensado originalmente que o homem estava apenas tentando ganhar tempo
até a ajudar chegar, mas isso não deveria ser o caso, dada a sua atitude. No entanto, ele
não conseguia pensar em uma razão diferente.

“E por que não pediu ajuda antes?”

Os olhos do homem se arregalaram em choque e, em seguida, ele respondeu apressada-


mente.

A longa resposta curta era que se a mulher fugisse enquanto ele estava pedindo ajuda.
Essencialmente, estaria dizendo ao seu povo que ele havia cometido um erro irrecupe-
rável. Além disso, ele não achava que poderia derrotar Sebas, mesmo se ele chamasse
seus colegas para ajudar. Foi por isso que ele estava tentando convencer Sebas a mudar
de idéia.
Mesmo Sebas não conseguiu reunir sua motivação diante daquela atitude patética e sua
intenção de matá-lo desapareceu. Dito isso, ele ainda não pretendia entregar a garota ao
homem. Assim sendo—

“...Então por que você não foge?”

“Por favor, olhe minha situação. Onde eu arrumaria dinheiro pra fugir?”

“Eu não considero o dinheiro mais importante que a vida. Contudo... eu providenciarei
se assim precisar.”

O rosto do homem se iluminou com as palavras de Sebas.

Talvez matá-lo realmente fosse mais seguro, mas, ao mesmo tempo, deixá-lo fugir
usando o medo como força motriz poderia ser capaz de comprá-lo algum tempo. Ele usa-
ria esse tempo para tratá-la e levá-la para algum lugar seguro.

Mais especificamente, matá-lo aqui poderia levar outros a procurá-la, já que ela estaria
desaparecida.

Além disso, poderia causar problemas para as pessoas próximas a ela, uma vez que ele
não conhecia as circunstâncias que levaram ao seu estado atual.

Nesse momento, Sebas começou a se perguntar o porquê ele havia seguido um curso
perigoso de ação.

A verdade era que ele não entendia as ações de seu coração, os quais o levaram a resga-
tar essa mulher. Qualquer outro habitante de Nazarick teria ignorado ela para evitar se
envolver em assuntos problemáticos. Eles teriam fingido não ter visto e deixado este lu-
gar.

—Salvar alguém em apuros é senso comum.

Sebas decidiu ignorar aquela frase que inexplicavelmente surgira em seu coração e
disse:

“Pegue isso, contrate um aventureiro e fuja.”

Sebas jogou uma bolsa carteira. O homem olhou para aquilo, duvidou em seus olhos. A
visão de uma bolsa tão pequena provavelmente não era muito reconfortante.

No momento seguinte, os olhos do homem seguiram as moedas que caíram no chão do


beco, fixadas naquele brilho prateado. Aquelas moedas de platina rolavam no chão, dez
no total, cada uma valendo dez vezes mais que ouro.
“Fuja com todas as suas forças, entendeu? Além disso, tenho algumas perguntas para
você. Você tem tempo para respondê-las?”

“Ah, tudo bem. Eu já disse pra eles que eu ia sair e levar ela no templo. Ainda devo ter
algum tempo.”

“Compreendo. Venha comigo, então.”

Com isso, Sebas levantou o queixo para indicar que o homem deveria segui-lo. Então ele
pegou a menina em seus braços e caminhou para frente.

Parte 2

26º Dia do mês Meio Fogo (8º mês) – 18:58

Sebas atualmente residia em um bairro residencial de alto nível da Capital Real, a segu-
rança era reforçada se comparada a outras partes da capital.

Essa moradia em particular era menor que as mansões que a ladeavam, como se fosse
uma casa para os servos das famílias que habitavam os prédios vizinhos. No entanto,
ainda era muito grande para apenas Sebas e Solution.

E claro, havia um motivo para eles alugarem um local tão grande; já que eles estavam
agindo como membros de uma família rica de terras longínquas, eles não poderiam mo-
rar em uma casa velha e decadente. Por essa razão — e porque não tinham credenciais
para apresentar ou fazer conexões — eles tiveram que pagar várias vezes mais do preço
cobrado pela União dos Construtores ao alugar a casa. Além disso, eles tiveram que pagar
total à vista, o que representou uma despesa bastante grande.

Sebas recebeu uma pronta recepção quando chegou à casa e entrou pela porta da frente.
Esse alguém estava vestido de branco; ela era uma das subordinadas de Sebas, Solution
Epsilon das Empregadas de Batalha, Pleiades. Os outros moradores da casa incluíam Sha-
dow Demons e Gargoyles, mas eles eram designados para tarefas de sentinela e não vie-
ram dar-lhe boas-vindas.

“Bem-vindo, Sebas—”

Solution parou suas palavras no meio da fala, e até parou o meio de sua reverência. Ela
olhou para o objeto que Sebas estava carregando com os olhos mais frios do que o normal.

“...Sebas-sama, o que é isso?”

“Eu a encontrei.”
Solution não respondeu a essa resposta concisa. No entanto, o ar parecia ficar mais pe-
sado ao redor deles.

“...Entendo. Eu não acredito que seja um presente para mim, então posso perguntar
como o senhor pretende se desfazer disso?”

“No momento. Você poderia começar curando suas feridas?”

“Curar...”

Solution olhou para a garota que Sebas estava segurando. Uma vez que entendeu, ela
balançou a cabeça e olhou para Sebas.

“Se fosse apenas por isso, não bastava levá-la ao templo?”

“...De fato. Tolice a minha, me esqueci completamente disso...”

Vendo que Sebas estava completamente indiferente, Solution fixou seu olhar frio nele.
Seus olhos se encontraram por um segundo e, no final, foi Solution quem piscou primeiro.

“Devo jogá-la fora, então?”

“Não. Eu já a trouxe aqui. Devemos pensar sobre a melhor forma de lidar com ela.”

“...Compreendo.”

Solution era do tipo que não tinha expressão própria, mas seu rosto atual estava como
uma máscara. Mesmo Sebas não conseguia ler as emoções que estavam em seus olhos.
Tudo o que ele podia dizer, era que Solution estava completamente descontente com as
circunstâncias presentes.

“Você poderia realizar um exame de saúde nela?”

“Compreendo. Então, eu devo imediatamente...”

“Não aqui...”

A garota não significava nada para Solution, mas mesmo assim, avaliar sua condição de
saúde na porta da frente poderia chamar atenção indesejada.

“Creio que há um quarto de hóspedes lá dentro. Você poderia fazer o exame lá?”

Solution assentiu silenciosamente como resposta.


Nenhum dos dois conversou enquanto levavam a garota para o quarto de hóspedes.
Com certeza, Sebas e Solution nunca tinham sido do tipo que conversaram muito, mas
isso não explicava o constrangimento entre eles.

Solution abriu a porta para Sebas, que segurava a menina em seus braços. As pesadas
cortinas estavam fechadas e por isso o quarto estava escuro, mas não parecia abafado. A
porta havia sido aberta muitas vezes antes, por isso o ar lá dentro estava fresco e o inte-
rior estava impecavelmente limpo.

O quarto em si estava iluminado pela luz do luar que atravessava entre as estreitas aber-
turas das cortinas. Depois de entrar, Sebas deitou a menina nos lençóis limpos da cama.

Ele havia infundido a garota com seu ki e realizado alguma cura básica. No entanto, ela
permaneceu tão imóvel quanto um cadáver.

“Então...”

Solution arrancou descuidadamente a garota do tecido que a cobria, revelando um


corpo surrado e machucado. Aquela visão horrível deveria ter sido uma visão difícil, mas
a expressão de Solution não mudara, e ela tinha um olhar aborrecido e desinteressado
em seus olhos.

“...Solution, deixarei que cuide disso.”

Com isso, Sebas saiu do quarto. Solution não aparentava que o chamaria de volta e assim
começou seu diagnóstico.

Agora que ele estava no corredor, provavelmente não poderia ouvir Solution sussurrar:

“Quanta tolice.”

Seus murmúrios desapareceram no corredor e, naturalmente, ninguém respondeu a


eles.

Sebas acariciou a barba sem pensar nisso. Por que ele salvou aquela garota? Mesmo ele
não conseguia explicar o porquê.

Foi pena?

Não, não foi isso. Por que ele a salvou?

Sebas era um mordomo e também estava encarregado dos servos de Nazarick. Sua leal-
dade pertencia a cada um dos 41 Seres Supremos. Ele devia seu serviço fiel ao Chefe de
Guilda que levara o nome de Ainz Ooal Gown.
Sua lealdade era genuína. Ele poderia dizer com confiança que de bom grado entregaria
sua vida a serviço do Supremo.

No entanto... se, hipoteticamente falando, ele tivesse que escolher apenas um dos 41
Seres Supremos para obedecer, Sebas escolheria sem hesitação alguma o homem cha-
mado Touch Me.

♦♦♦

Ele era o ser mais poderoso da Ainz Ooal Gown, e aquele que tinha projetado Sebas. Ele
era um Campeão Mundial e uma figura incomparável de fama.

A guilda florescera principalmente por PKing. Quem ousaria acreditar que Touch Me,
dos Nove Originais, havia fundado o clã que antecedeu a guilda para proteger os fracos?
No entanto, foi exatamente isso que aconteceu.

Quando Momonga tinha sido repetidamente Pked e quase desistiu do jogo com raiva, foi
o Touch Me que o salvou. Quando Bukubukuchagama não conseguiu encontrar alguém
para se aventurar com ela devido à sua aparência, foi Touch Me quem se aproximou dela.

♦♦♦

A vontade persistente daquele homem se tornou a corrente invisível que agora conduzia
Sebas.

“Será isso uma maldição...”

Essas palavras foram terrivelmente rudes. Se algum dos outros seres que serviam Ainz
Ooal Gown — aqueles que haviam sido criados pelos 41 Seres Supremos — estivessem
presentes e ouvissem essas palavras, eles poderiam tê-lo atacado bem no local por sua
falta de respeito.

“É errado mostrar pena e oferecer ajuda àqueles que não pertencem a Ainz Ooal
Gown...?”

Sebas murmurou austeramente.

Isso era apenas esperado.

Todos os membros de Nazarick — salvo aqueles que haviam sido programados de outra
forma pelos 41 Seres Supremos, como a Chefe das Empregadas, Pestonya S. Wanko —
acreditavam firmemente que abandonar aqueles que não pertenciam a Ainz Ooal Gown
era o curso correto de ação.

Por exemplo, ele havia ouvido de Solution que uma de suas companheiras (Pleiades) —
Lupusregina — se dava muito bem com uma garota do Vilarejo Carne. No entanto, Sebas
estava plenamente consciente de que, se surgisse algo, Lupusregina abandonaria essa
garota sem hesitação.

Isso não foi porque ela era cruel.

Se os Seres Supremos ordenassem que eles deveriam morrer, eles se matariam sem he-
sitar. Se os Seres Supremos ordenassem que alguém precisava morrer, eles os matariam,
mesmo que o alvo fosse um amigo. Por outro lado, quem não entendesse isso receberia
olhares de pena de seus camaradas.

Tomar uma decisão baseada em sentimentos humanos — em outras palavras, valores


sem valor — era a coisa errada a fazer.

Mas sobre o ponto de vista dele? Ele tinha tomado o curso correto de ação?

Assim que Sebas estava prestes a morder o lábio, Solution saiu do quarto. Seu rosto
ainda era uma máscara sem expressões.

“Como foi?

“...Ela está sofrendo de sífilis e outras duas doenças sexualmente transmissíveis. Várias
de suas costelas e dedos estão quebrados. Os tendões do braço direito e da perna es-
querda foram cortados. Seus incisivos superiores e inferiores foram retirados. Seus ór-
gãos funcionam precariamente e ela tem o ânus fissurado. Há sinais de dependência de
drogas. Além disso, há inúmeros traços de contusões e lacerações. Isso conclui o resumo
básico de sua condição. O senhor deseja de uma explicação mais detalhada?”

“Não, acho que não. O importante é — ela pode ser curada?”

“Facilmente.”

Sebas também esperava uma resposta sem hesitação.

Habilidades de cura podem até ajudar alguém que teve todos os seus membros decepa-
dos. Na verdade, Sebas poderia usar o ki para curar qualquer tipo de lesão física. A ver-
dade era que, se ele não estivesse preocupado com emergências ou com a verdade vindo
à tona, ele poderia curar o tornozelo torcido da velha senhora no local.

Obviamente, seu ki poderia curar ferimentos físicos, mas não poderia ajudar com enve-
nenamento ou doenças, Sebas não havia aprendido essas habilidades. Portanto, ele teve
que pedir a Solution para ajudar nesse aspecto.

“Então, deixarei que cuide disso.”

“Se a magia de cura precisa ser usada, talvez seja melhor procurar a Pestonya-sama.”
“Não há necessidade de criar tantos problemas. Solution, você tem um pergaminho de
magia de cura, não é?”

Depois de ver o aceno de Solution, Sebas continuou:

“Use-o então.”

“...Sebas-sama. Esse pergaminho nos foi dado pelo Supremo. Não deve ser usado em uma
mera humana.”

De fato. Ele deveria ter pensado em outra maneira. Seria melhor curar suas feridas e
estabilizá-la primeiro, antes de curar seu vício e doenças. No entanto, ele não sabia se
tinha tempo para isso. Se ela estivesse morrendo por causa de seu vício ou doenças, curá-
la seria um exercício de futilidade a menos que a cura fosse constantemente reaplicada.

Depois de pensar sobre isso, Sebas entregou uma ordem para Solution em uma voz com
tons de aço, seria o melhor para evitar que qualquer um aprendesse suas verdadeiras
intenções.

“O faça.”

Solution estreitou os olhos e uma chama negra avermelhada pareceu incendiar-se em


suas profundezas. No entanto, Solution inclinou a cabeça em reconhecimento para es-
conder essa mudança.

“...Compreendo. Devo restaurar essa mulher a uma condição intocada — em outras pa-
lavras, vou reverter seu corpo ao estado em que estava antes de se engajar nessas ativi-
dades. É isso que o senhor deseja?”

Depois de receber a aprovação de Sebas, Solution curvou-se novamente.

“Eu o farei imediatamente.”

“Então, posso incomodá-la para ferver um pouco de água e limpá-la depois do trata-
mento? Vou comprar algo para comer.”

Ninguém aqui precisava comer e ninguém aqui podia cozinhar. Mas ninguém aqui pos-
suía itens mágicos sobressalentes que eliminassem a necessidade de comer. Assim, ele
teve que obter comida para ela.

“...Sebas-sama. Curar o corpo é uma tarefa simples, mas... eu não possuo a capacidade
de curar traumas mentais.”

Solution parou aqui e depois olhou diretamente para Sebas antes de continuar:
“Se houver a necessidade de curar tais traumas, eu sinto que seria melhor pedir ajuda
ao Ainz-sama. O senhor não vai pedir para ele fazer isso?”

“...Não há necessidade de incomodar o Ainz-sama. Vamos deixar os sintomas mentais


para mais tarde.”

Solution curvou-se profundamente novamente. Então ela abriu a porta e entrou no


quarto. Sebas a assistiu entrar, ele se inclinou lentamente contra uma parede próxima.

Como ele deveria lidar com ela?

A melhor maneira era esperar até que ela fosse tratada — enquanto o rufião estava fu-
gindo — e depois levá-la para onde ela desejasse ir e, assim, libertá-la. Ele precisava es-
colher um local que estivesse suficientemente longe da Capital Real. Dizê-la para sair da-
qui não só seria muito perigoso, mas também bastante cruel. Isso jogaria sua ajuda no
lixo.

Ainda assim, tudo isso era realmente a coisa certa para ele — Sebas Tian, mordomo de
Nazarick — fazer?

Sebas suspirou pesadamente.

Se ao menos isso permitisse que ele expulsasse fisicamente as preocupações que se acu-
mularam em seu coração. No entanto, isso não aconteceu. Seu coração estava acelerado
e seus pensamentos eram um mero borrão em meio as suas preocupações.

“Quão tolo eu fui. Pensar que eu, Sebas, faria tudo isso por uma humana...”

Mas não importava o quanto ele pensasse, ele não conseguia chegar a uma conclusão.
Assim, Sebas decidiu parar de procurar uma resposta. Agora, ele deveria começar resol-
vendo os problemas simples. Isso apenas atrasaria o inevitável, mas isso foi o melhor que
Sebas pôde inventar no momento.

♦♦♦

Solution mudou a forma de seus dedos. O dedo fino se alongou, tornando-se uma estru-
tura semelhante a um fórceps, com vários milímetros de espessura. Por ser uma Shog-
goth, Solution sempre foi capaz de fazer grandes alterações em sua forma, então alterar
a espessura de seus dedos era brincadeira de criança.

Ela olhou para a porta e, quando percebeu que ele não estava mais lá fora, aproximou-
se da mulher na cama.

“Já que o Sebas-sama aprovou, eu também poderia cuidar dessa coisa desagradável ra-
pidamente. Você provavelmente preferiria assim, não? Além disso, não é como se esti-
vesse ciente dessa coisa dentro de você, ou está?”
Solution alcançou dentro de seu corpo com a mão não transformada e retirou um per-
gaminho armazenado dentro de si.

Aquele pergaminho não era o único item que Solution escondia dentro de si. Além de
pergaminhos e outros itens mágicos descartáveis, ela também continha um grande nú-
mero de armas, proteções e outros equipamentos de guerra. Isso não era nada fora do
comum, considerando que seu corpo poderia armazenar vários seres humanos.

Solution olhou para a mulher inconsciente.

Ela não estava interessada em sua aparência. Apenas um pensamento passou por sua
mente.

Essa humana não parece saborosa.

Este corpo parecia um cadáver ambulante. Provavelmente não iria debulhar descontro-
ladamente e encher Solution com o deleite da morte, mesmo que ela a derretesse com
corrosivos.

“Eu poderia entender as intenções de Sebas-sama se ele pretendesse fazer dela o meu
brinquedo depois que ela se recuperasse, mas isso é...”

Ela estava familiarizada com a personalidade de Sebas, já que ele era o líder das Empre-
gadas de Batalha, Pleiades. Ele nunca permitiria tal coisa. Afinal, ele não permitira que
ela capturasse e comesse humanos durante sua jornada, exceto aqueles que tentaram
emboscá-los.

“Se o Sebas-sama a resgatou sob ordens do Supremo, então eu ficaria feliz em obedecer...
mas realmente vale a pena gastar um ativo valioso dos Seres Supremos em uma mera
humana?”

Solution balançou a cabeça e dissipou esses pensamentos.

“...Eu deveria comê-lo antes que Sebas-sama retorne?”

Solution quebrou o selo e desenrolou o pergaminho. A magia contida se chamava


「Heal」. Uma poderosa magia de cura de 6º nível, e poderia restaurar uma grande
quantidade de saúde, além de curar várias doenças e outras condições de status anor-
mais.

Em circunstâncias normais, usar a magia do pergaminho exigiria níveis em profissões


apropriadas. Em outras palavras, seria necessário níveis em profissões típicas para clé-
rigos e assim usar magias clericais, uma vertente divina da magia. No entanto, certas pro-
fissões ladinas tinham a capacidade de emular uma profissão e usar dispositivos mágicos
ao “iludi-los”, como um pergaminho.
Como assassina, Solution tinha níveis em várias profissões ladinas. Assim, ela foi capaz
de usar este pergaminho de 「Heal」, ela não seria capaz de usar se não fosse por isso.

“Apenas no caso, eu provavelmente deveria colocá-la para dormir. Depois disso...”

Solution usou uma habilidade para sintetizar um veneno adormecedor com relaxante
muscular, e então injetou na menina.

♦♦♦

26º Dia do mês Meio Fogo (8º mês) – 19:37

Sebas voltou com a refeição assim que Solution saiu do quarto. Ela tinha um balde de
água morna em cada mão, cada um com vários panos dentro.

Os panos estavam imundos e a água quente estava suja, indicando as condições insalu-
bres em que a menina estava.

“Obrigado por seus esforços. É correto afirmar que não houve problemas com o pro-
cesso de cura...?”

“Sim. Tudo foi resolvido e não houve imprevistos. No entanto, não havia roupas para ela
usar, então selecionei uma roupa para ela ao acaso. O senhor aprova?”

“Claro. Isso deve ser o bastante.”

“Entendo... A toxina de relaxamento já deve ter dissipado... se o senhor não tiver mais
diretrizes, aqui me despeço.”

“Muito obrigado, Solution.”

Solution acenou com a cabeça em resposta e passou por Sebas.

Depois de vê-la sair, Sebas bateu na porta. Não houve resposta, mas ele sentiu alguém
se movendo no interior, e assim, silenciosamente abriu a porta.

A menina que dormia na cama tinha acabado de recuperar a consciência. Ela sentou-se
ainda sonolenta.

Ela estava completamente diferente de como a havia encontrado horas atrás.

Seus cabelos loiros imundos agora reluziam com um lindo brilho. Suas feições emacia-
das haviam recuperado sua plenitude. Seus lábios rachados agora eram de um rosa sau-
dável.
No geral, ela era linda, embora sua aparência pudesse ser melhor descrita como uma
beleza tenra ao invés de sexy.

Sua idade agora estava mais fácil de perceber. Ela parecia estar no final da adolescência,
entre 15 e 19 anos, embora a escuridão em seu rosto devido aos anos inferno que passou
a fizesse parecer mais velha do que realmente era.

Solution lhe dera uma camisola branca para vestir, mas era simples e sem adornos, sem
babados, rendas ou outras decorações atraentes.

“Creio que você está completamente recuperada. Como está se sentindo?”

Não houve resposta. Seus olhos vazios não pareciam confiantes o suficiente para olhar
para Sebas. No entanto, ele não se importou, mas continuou falando.

Não, a verdade era que ele não esperava que ela lhe respondesse. Isso porque ele pode-
ria dizer que sua expressão vazia pertencia a alguém que estava distraída e desanimada.

“Está com fome? Trouxe uma refeição.”

Ele havia comprado a refeição de um restaurante, veio com tigela e tudo.

O mingau salgado na tigela de madeira foi feito com caldo colorido. Ele tinha um pouco
de óleo de gergelim para aprimorar o sabor e, no geral, irradiava um aroma de dar água
na boca.

O rosto da garota se contraiu em resposta à fragrância.

“Vamos, fique à vontade.”

Vendo que a garota ainda não havia saído completamente de seu próprio mundo, Sebas
colocou a tigela de madeira e sua colher diante da garota.

Ela não se mexeu, mas Sebas não insistiu que ela comesse.

Um terceiro provavelmente teria começado a ficar frustrado neste momento. Depois de


muito tempo, as mãos da moça se moviam devagar; os movimentos nascidos do medo de
ser brutalmente espancada.

As feridas do lado de fora tinham sido completamente curadas, mas a dor que havia sido
marcada em suas memórias ainda permanecia.

Ela pegou a colher de madeira, mergulhou-a no mingau, depois levou-a à boca e comeu
tudo.
O mingau salgado normal geralmente era saboroso, porém grosso demais. Sebas pediu
ao lojista que 14 ingredientes diferentes fossem cortados em fatias finas e também para
que fossem cozidos em fogo lento, assim a refeição poderia ser ingerida sem a necessi-
dade de mastigar.

Ela forçou a garganta e o mingau escorregou até seu estômago.

Os olhos da garota tremeram um pouco. Foi um pequeno movimento, mas foi suficiente
para convertê-la de uma boneca sem alma em um ser humano real. Sua outra mão tremia
enquanto se movia para pegar a tigela de Sebas.

Sebas apoiou a tigela, deslocando-a para um lugar que era mais fácil para ela alcançar.

A menina agarrou a tigela para si mesma, em seguida, enchia colher após colher do min-
gau enquanto o devorava a grandes bocadas.

Se o mingau não tivesse sido resfriado até a temperatura adequada, seu frenético frenesi
provavelmente a teria feito queimar a língua. O caldo vazou de sua boca e manchou a
blusa de seu pijama, mas ela não se importou. Ela mais o bebia do que mastigava.

Depois de terminar a tigela com uma velocidade que era completamente diferente de
seu eu anterior, a garota segurou a tigela e expirou profundamente.

Com sua humanidade restaurada, suas pálpebras se fecharam lenta e pesadamente.

A combinação de uma barriga cheia, roupas frescas e um corpo limpo pareciam acalmar
seu espírito, e ela começou a sentir fadiga.

No entanto, assim que seus olhos se estreitaram, ela os forçou a abrir novamente e abra-
çou a seu próprio corpo como um animal amedrontado.

Ela estava com medo de fechar os olhos, ou estava com medo de que tudo que estava
experimentando desapareceria como uma bolha de sabão estourada? Seria algo mais?
Sebas a observava, mas nem mesmo ele sabia.

Talvez nem mesmo ela soubesse.

Para confortá-la, Sebas disse gentilmente:

“Você precisa dormir. Não se esforce e tenha um bom descanso. Você não sofrerá ne-
nhum dano enquanto permanecer aqui. Eu garanto isso — quando você acordar, ainda
estará nesta cama.”

Os olhos da garota se moveram pela primeira vez e olharam diretamente para Sebas.
Suas pupilas azuis eram estólidas e careciam de vitalidade. No entanto, esses não eram
os olhos de um cadáver, mas uma pessoa viva.

Sua pequena boca se abriu — e fechou. Então se abriu — e fechou novamente. Isso se
repetiu várias vezes. Sebas a observou ternamente. Ele não pediu que ela fizesse nada;
ele simplesmente observou em silêncio.

“Ah...”

Por fim, abriu a boca e ruídos quase inaudíveis surgiram. Então, ela acrescentou rapida-
mente:

“Mui... muito obrigada.”

As primeiras palavras que ela falou não foram para perguntar sobre suas circunstâncias
presentes, mas para agradecer-lhe. Tendo compreendido parte de seu caráter, Sebas lhe
deu um sorriso genuíno; Não o habitual falso que usava no cotidiano.

“Está bem. Já que eu te resgatei, farei o meu melhor para garantir sua segurança.”

Os olhos da garota se arregalaram um pouco mais sua boca começou a tremer.

Seus olhos azuis umedeceram e depois transbordaram em lágrimas. A menina abriu a


boca e depois chorou copiosamente.

Logo, ele podia ouvir o som de amaldiçoamento através do choro.

Ela amaldiçoou seu destino. Ela se ressentia do fato de existir. Ela estava cheia de ódio
que ninguém a ajudou até agora. Sua ira foi dirigida a Sebas também.

Se você tivesse me salvado antes. Esse tipo de coisas.

Depois de receber a gentileza de Sebas — depois de ser tratada como um ser humano,
era como se uma parte dela tivesse quebrado sob a tensão de tudo o que ela suportara
até agora. Não, talvez seja melhor dizer que depois de ter sua humanidade restaurada,
ela não poderia mais suportar suas memórias dolorosas.

Ela puxou os cabelos e os fios se quebraram quando o fez. Inúmeras fibras douradas
estavam emaranhadas ao redor de seus dedos delgados. A tigela de mingau e a colher
rolaram da cama.

Sebas assistiu em silêncio enquanto ela enlouquecia.


Seu ódio e amaldiçoamentos foram direcionados para a pessoa errada. Ela estava clara-
mente procurando um bode expiatório. Talvez a dita pessoa estivesse infeliz ao presen-
ciar isso, talvez até furioso. No entanto, não havia raiva em seu rosto. Suas marcar de
expressão estavam cheias de bondade.

Sebas se inclinou para frente e a abraçou.

Era como um pai abraçando sua filha. Não havia malícia neste gesto, apenas uma bon-
dade interminável.

Seu corpo enrijeceu por um momento. Então, quando percebeu que esse abraço era di-
ferente dos homens que procuravam apenas violar sua carne, seu corpo lentamente re-
laxou.

“Está tudo bem.”

Sebas repetiu essas palavras como um mantra, gentilmente acariciando-a nas costas,
como se estivesse consolando uma criança chorando.

A garota gemeu — e então, quando lentamente entendeu o que Sebas estava dizendo,
ela enterrou o rosto no peito de Sebas e chorou ainda mais alto. No entanto, o contexto
de suas lágrimas era um pouco diferente de agora a pouco.

♦♦♦

Ela finalmente conseguiu parar de chorar depois de algum tempo, a roupa de Sebas ti-
nha sido encharcada pelas lágrimas. Ela lentamente se soltou dos braços de Sebas e abai-
xou a cabeça para esconder seu rosto corado.

“Ah... eu... sinto muito...”

“Por favor, não se preocupe com isso. Ser capaz de oferecer um ombro amigo quando
uma dama precisa é um símbolo de orgulho para um homem.”

Sebas extraiu um lenço limpo do bolso do peito e entregou a ela.

“Por favor, use isso.”

“Mas... emprestar... isso... está...limpo...”

A garota perguntou cheia de nervosismo. Sebas estendeu a mão para segurar o queixo
dela, depois gentilmente levantou o rosto. Ela não tinha idéia do que tinha acontecido,
mas estava com medo, então o lenço tocou suavemente sobre os olhos — absorvendo os
rastros de suas lágrimas.
Isso me lembra da última conversa via 「Message」 que a Solution teve com a Shalltear...
Shalltear estava aparentemente muito orgulhosa do fato de que o Ainz-sama havia ajudado
a enxugar suas lágrimas.

Que circunstâncias teriam feito com que seu mestre enxugasse as lágrimas de Shalltear?
Ele não podia imaginar Shalltear chorando. Enquanto sua mente se ocupava com suposi-
ções inúteis, suas mãos moviam suavemente para limpar o rosto da garota.

“Ah...”

“Aqui, por favor, use isso.”

Disse Sebas quando colocou o lenço um pouco úmido em suas mãos, e finalizou:

“É muito triste quando um lenço não é usado. Especialmente quando não consegue nem
secar as lágrimas.”

Sebas sorriu e então se afastou dela.

“Tudo bem. Tenha um bom descanso. Quando acordar, conversaremos sobre seu futuro
e outras coisas.”

Não havia nada que a magia não pudesse fazer. Seu corpo havia sido restaurado através
da cura mágica de Solution, e seu cansaço mental havia sido apagado. Assim, ela pode ser
restaurada ao seu eu quase que imediatamente. No entanto, ela esteve vivendo um in-
ferno até algumas horas atrás. Suas feridas emocionais poderiam se romper novamente
depois de uma longa conversa.

A verdade era que sua mente não estava completamente estável, daí a agonia vinda do
choro de momentos atrás. A magia poderia brevemente aliviar o sofrimento espiritual,
mas só poderia tratar os sintomas e não a causa. Ao contrário do corpo físico, as feridas
invisíveis do espírito não poderiam ser tão facilmente curadas.

Até onde Sebas sabia, as únicas pessoas que poderiam remover completamente seu
dano mental eram seu Mestre ou possivelmente Pestonya S. Wanko.

Sebas queria deixar a garota descansar, mas ela respondeu apressadamente:

“O futuro...?”

Sebas não sabia se deveria continuar falando com ela. No entanto, já que ela tinha sido
a única a iniciar a conversa, ele decidiu responder enquanto a olhava discretamente.

“Continuar na Capital Real não te trará segurança alguma. Tem amigos ou parentes para
quem recorrer?”
A garota baixou a cabeça.

“Entendo...”

Você não tem nenhum? Mas é claro que ele não disse isso.

Isso será problemático...

Sebas pensou. No entanto, não havia necessidade de ser apressado. Aquele homem pro-
vavelmente não seria capturado tão cedo, e chegar até Sebas levaria algum tempo. Ele
sabia que estava sendo otimista, e dizia a si mesmo para não se preocupar, esperando que
esse fosse realmente o caso. No mínimo, ele esperava que a garota fosse capaz de recu-
perar seu espírito primeiro.

“Tudo bem, então. Pode me dizer como se chama?”

“Ah... eu... Tsuare...”

“Tsuare, é isso? Eu não te disse meu nome ainda. Me chamo Sebas Tian, me chame ape-
nas de Sebas. Eu sou o servo de Solution-sama, a Milady quem sirvo.”

Ele disse a história base de seu disfarce.

Solution normalmente usava seu vestido branco em vez de seu traje de empregada, para
o caso de serem surpreendidos pelos convidados. No entanto, ele teria que lembrá-la de
permanecer no personagem como a senhora desta casa agora que Tsuare estava em casa.

“So... tion... sam...”

“Sim, Solution Epsilon-sama. Embora duvide que você tenha muita chance de conhecê-
la.”

“...?”

“A Milady pode ser... difícil de lidar às vezes.”

Sebas ficou em silêncio, como se quisesse indicar que era tudo o que ele dizia sobre o
assunto. Depois de um breve silêncio, ele falou mais uma vez.

“Tudo bem. Tenha um bom descanso hoje. Discutiremos o futuro amanhã.”

“Tá... bem...”

Depois de verificar que Tsuare estava de volta na cama, Sebas pegou a tigela de mingau
e saiu do quarto.
Quando ele abriu a porta, não ficou surpreso ao encontrar Solution parada ali. Ela pro-
vavelmente estava bisbilhotando, mas Sebas não a culpava. Solution não sentiu que Se-
bas a repreenderia por fazê-lo, então tudo o que ela fez foi mascarar sua presença e ficar
à espreita do lado de fora. Como ela tinha níveis em profissões relacionadas à assassinos,
ela poderia ter feito um trabalho melhor de se esconder se quisesse.

“Qual o problema?”

“Sebas-sama. Posso perguntar como o senhor pretende se desfazer dela?”

A atenção de Sebas foi para a porta atrás dele. Era bem grossa, mas não completamente
à prova de som. Se eles falassem aqui, ela provavelmente seria capaz de escutar um
pouco da conversa deles.

Sebas se moveu da frente da porta e Solution o seguiu silenciosamente por trás.

Quando chegaram a um lugar onde ele tinha certeza de que não seriam ouvidos, ele pa-
rou.

“...Está se referindo a Tsuare, eu suponho. Eu pretendo esperar até amanhã antes de


decidir o que fazer.”

“Esse nome...”

Solution não terminou a frase, mas se recompôs e falou novamente.

“Talvez eu tenha me excedido, mas sinto que essa coisa tem uma grande chance de im-
pedir nossas atividades. Devemos lidar com isso o mais rápido possível.”

Mas o que exatamente as palavras “lidar com” significam?

Depois de ouvir as palavras frias de Solution, Sebas pensou: Como eu esperava. Esta era
a opinião que uma serva leal de Nazarick, de pensamento correto — alinhado com os 41
Seres Supremos — teria sobre uma entidade não-Nazarickiana. Foi a atitude de Sebas em
relação a Tsuare que era anormal.

“Tem razão. Se ela interferir com as ordens que o Ainz-sama nos deu, então lidarei com
ela sem demora.”

Solution pareceu surpresa, como se dissesse: “Se está ciente disso, então por que o senhor
o fez?”

“Ela pode ter seus usos. E já que nós a acolhemos, seria uma pena descartá-la. Precisa-
mos pensar em uma maneira de utilizá-la adequadamente.”
“...Sebas-sama. Eu não sei onde ou o porquê o senhor a pegou, mas os ferimentos que
ela recebeu indicam que ela vem de um histórico conturbado. O senhor não acha que a
pessoa que infligiu esses ferimentos naquela humana ficaria infeliz em saber que ainda
estava viva?”

“Não deve haver problemas relacionados a isso.”

“...Então o senhor quer dizer que já se livrou dessas pessoas?”

“Não. Não é isso. Se algum problema surgir, vou agir. Portanto, espero que você seja
capaz de observar tranquilamente até então. Entendeu, Solution?”

“...Compreendo.”

Solution engoliu sua frustração crescente enquanto observava Sebas sair.

Agora que Sebas tinha dito tudo suas razões, ela não podia dizer nada, mesmo se esti-
vesse profundamente insatisfeita com a maneira como ele lidava com a situação. Além
disso, ela realmente poderia apenas sentar lá e ver se algo aconteceria.

Dito isto—

“Pensar que ele usaria os recursos de Nazarick em uma mera humana...”

Toda a riqueza e recursos de Nazarick pertenciam a Ainz Ooal Gown — em outras pala-
vras, pertenciam ao Supremo. Era realmente correto gastá-los sem permissão?

Ela não conseguia chegar a uma resposta, não importava o quanto pensasse.

♦♦♦

3º Dia do mês Baixo Fogo (9º mês) – 09:48

Sebas abriu a porta principal. Como de costume, ele foi à Guilda dos Aventureiros de
manhã e registrou todos os pedidos no quadro de avisos em seu caderno antes que os
aventureiros pudessem levá-los.

Sebas havia empenhado toda a informação que obtivera na Capital Real — até mesmo
as fofocas de rua — em papel e depois a enviara para Nazarick. A análise de dados era
um processo difícil, por isso foi deixado inteiramente para os intelectuais de Nazarick
lidarem.

Ele passou pela porta e entrou na casa. Alguns dias atrás, Solution teria vindo cumpri-
mentá-lo. Contudo—

“Bem-vindo... de volta... Sebas... ma.”


Esta tarefa estava a cargo da garota de fala suave, agora ela estava com roupa de empre-
gada cuja saia longa cobria suas pernas.

No dia seguinte à recepção de Tsuare, houve uma discussão e decidiram que ela traba-
lharia nessa casa.

Eles poderiam tê-la tratado como convidada, mas Tsuare recusou.

Ela disse que se sentia desconfortável por ser tratada como hóspede, pois foi resgatada
por Sebas. Embora não se qualificasse como recompensa por sua gentileza, ela esperava
poder fazer algo para ajudar em casa.

Depois de ver quais eram suas verdadeiras intenções, ele começou a se sentir descon-
fortável também.

Em outras palavras, ela entendia que sua posição aqui era precária — que ela era uma
fonte de problemas para esta casa — e então queria trabalhar o máximo que pudesse
para evitar ser descartada.

É claro que Sebas dissera a Tsuare que ele não a abandonaria. Se ele fosse do tipo que
poderia descartar alguém com ninguém a quem recorrer, então não haveria motivo para
tê-la resgatado. No entanto, ele não tinha o poder de persuasão para curar as feridas no
coração de Tsuare.

“Estou de volta, Tsuare. Fez bem seus deveres?”

Tsuare assentiu.

Ao contrário de como ela tinha sido quando eles se conheceram, seu cabelo estava bem
aparado e ela usava um pequeno laço com babados brancos.

“Fiz... bem.”

“Ótimo. Isso é bom de ouvir.”

Ela parecia tão sombria como sempre e sua expressão dificilmente mudava, mas ser ca-
paz de viver como um ser humano gradualmente aliviou o medo que a dominava, e ela
podia falar muito mais claramente agora.

O que ainda resta em seu coração é o que me preocupa...

Sebas andou e Tsuare caminhou com ele.

Tecnicamente falando, seria uma violação da etiqueta uma empregada como ela andar
ao lado de Sebas — seu superior. No entanto, Tsuare nunca havia sido treinada como
empregada e não entendia tais formalidades, e Sebas não queria educá-la nesses assun-
tos.

“O que teremos hoje?”

“Gui... guisado... de batata...”

“Entendo. Não vejo a hora para prová-lo. Sua comida é deliciosa, Tsuare.”

Ela corou e baixou o rosto quando Sebas a elogiou com um sorriso. Suas mãos nervosa-
mente seguraram o avental de uniforme de empregada.

“O, o senhor é muito... gentil...”

“Não, não sou, é só o que eu penso. Eu não sei nada sobre culinária, então você me fez
um grande favor. Tem os ingredientes que precisa? Diga-me se há algo que gostaria que
eu comprasse.”

“Sim. Eu... informo... quando precisar.”

Tsuare andava normalmente dentro da casa e na frente de Sebas, mas ela ainda tinha
uma aversão ao mundo exterior. Como ela não podia trabalhar ao ar livre, Sebas assumiu
a tarefa de comprar ingredientes e assim por diante.

Os pratos de Tsuare dificilmente tinham algum diferencial gastronômico. Ela fazia pra-
tos simples e cotidianos.

Como esses pratos não exigiam ingredientes caros, eles eram facilmente obtidos nos
mercados. Sebas também havia aprendido sobre os ingredientes no mercado e os alimen-
tos e bebidas deste mundo, que ele considerava estar matando dois coelhos com uma
cajadada só.

Um flash de inspiração de repente atingiu Sebas.

“...Vamos fazer compras juntos depois.”

Um olhar de choque apareceu no rosto de Tsuare, e então ela sacudiu a cabeça timida-
mente. Seu rosto ficou pálido por um momento e ela começou a suar frio.

“Eu, eu acho... melhor não...”

Sebas pensou, Como esperado, mas não deixou transparecer.

Tsuare se recusou a fazer qualquer coisa que pudesse envolver ir para fora desde que
ela começou a trabalhar.
Ela tinha considerado esta casa para ser sua defesa absoluta, a fim de suprimir o medo
profundamente marcado dentro de si. Em outras palavras, ela traçara um limite para di-
zer a si mesma que esse lugar era diferente do mundo exterior, do mundo que a machu-
cara. Essa era a única maneira que ela encontrou para conseguir ter forças para fazer
algo.

No entanto, se isso continuasse, Tsuare nunca seria capaz de sair de casa, e Sebas não
poderia mantê-la aqui por toda a vida.

Sebas sabia que era muito cruel esperar que Tsuare caminhasse entre as massas, dada
sua condição mental. Ele deveria ter passado mais tempo para ajudá-la a se acostumar a
estar perto dos outros novamente, mas isso, naturalmente, exigia tempo.

Sebas não pretendia se esconder aqui ou passar o resto de sua vida neste lugar. Ele era
um estranho que havia se infiltrado apenas nessa cidade para coletar informações. Se o
seu mestre emitisse a ordem para se retirar então—

Ele precisava continuar treinando Tsuare para lhe dar possibilidades adicionais, em
preparação para quando tal dia chegasse.

Sebas parou seus passos e olhou diretamente para Tsuare. Ela corou e abaixou a cabeça
timidamente, mas Sebas pegou suas bochechas com as duas mãos e levantou o rosto.

“Tsuare, eu entendo seus medos. No entanto, espero que se acalme. Eu — Sebas — te


protegerei. Esmagarei todo e qualquer perigo que se aproximar e garanto que você não
será ferida.”

“...”

“Tsuare, por favor, saia comigo. Quando tiver medo, pode fechar os olhos.”

“...”

Quando Tsuare hesitou, Sebas segurou suas mãos delicadas. O que ele disse em seguida
foi terrivelmente injusto para ela.

“Você está disposta a confiar em mim, Tsuare?”

O silêncio encheu o corredor, por um momento, o passar do tempo estava mais lento
entre eles. No final, os olhos de Tsuare ficaram úmidos, e seus lábios macios se separaram
revelando seus dentes brancos perolados.

“...Sebas-sama... o senhor é muito astuto... Quando... pergunta assim... como eu poderia


recusar?”
“Por favor, relaxe. Apesar da minha aparência, sou muito forte... Deixe-me colocar desta
forma. Em todo o mundo existem apenas Quarenta & Um que são mais fortes do que eu...
bem, e mais alguns.”

“Isso... é... muito?”

Dado o modo como ele disse, fez Tsuare pensar que Sebas estava apenas contando uma
piada para tranquilizá-la, e então ela sorriu. Sebas viu isso e sorriu de volta sem dizer
nada.

Sebas começou a andar novamente. Ele sabia que Tsuare estava espiando seu rosto dis-
cretamente, mas ele não mencionou isso.

Sebas sabia que Tsuare tinha alguns indícios de atração por ele. No entanto, Sebas sentiu
que era algo como gratidão a ele por salvá-la de seu tormento. Era semelhante a uma
lavagem cerebral, ou mesmo a confiança que ela depositava em alguém confiável.

Além disso, Sebas era um homem idoso e talvez Tsuare tivesse confundido seu acalento
afetuoso com o amor romântico.

Mesmo que Tsuare sentisse amor genuíno por Sebas, ele não achava que poderia de-
volvê-lo adequadamente. Afinal, ele estava escondendo várias coisas dela, e suas respec-
tivas circunstâncias estavam muito distantes uma da outra.

“Então eu vou buscá-lo depois de discutir algumas coisas com a Milady.”

“Solu... sam...”

O humor de Tsuare ficou sombrio. Sebas sabia o porquê, mas se manteve em silêncio.

Solution mal havia se encontrado com Tsuare. No máximo trocaram alguns olhares an-
tes de Solution sair sem dizer uma palavra. Qualquer um se sentiria desconfortável por
ser ignorado assim e, no caso de Tsuare, ela provavelmente ficaria aterrorizada.

“Está bem. A Milady é assim para todos. Não é como se ela fosse assim apenas com você...
mas sendo honesto, as vezes ela é um pouco obstinada. Você tem que manter isso em
segredo, sabe por que—”

Sebas sorriu, e depois de terminar suas palavras meio brincalhonas, o desconforto no


rosto de Tsuare se iluminou um pouco.

“Muitas vezes ela faz birras quando vê garotas bonitas.”

“...Eu ... como eu poderia... eu não sou nada como... Solu...”

Tsuare acenou freneticamente as mãos como se quisesse ignorar aquelas palavras.


De fato, Tsuare era bela, mas nada que se comparasse a Solution. No entanto, os dizeres
do ditado “a beleza estava nos olhos de quem vê” entrou em vigor.

“Em termos de aparência, eu prefiro você ao invés de Milady.”

“Quê?! Não... pode...”

O rosto de Tsuare ficou vermelho enquanto ela o abaixava. Sebas olhou gentilmente
para ela, e então ele viu sua expressão mudar e suas sobrancelhas franzirem.

“E eu... eu sou... imunda...”

Sebas suspirou por dentro enquanto observava o rosto de Tsuare se encher de tristeza.
Então, ele se virou para ela e disse:

“Certamente, é assim que as joias são. As sem manchas ou trincas valem mais e são con-
sideradas mais puras.”

O rosto de Tsuare ficou ainda triste mais quando ela ouviu essas palavras.

“No entanto — as pessoas não são pedras preciosas.”

Tsuare de repente levantou a cabeça.

“Tsuare, você parece se considerar suja. Mas quem pode julgar a pureza de um ser hu-
mano? Existem padrões para pedras preciosas... mas quem estabelecerá os padrões para
a virtude de um ser humano? Existe algum valor comum para superar? Alguma opinião
pública que deve ser respeitada? Isso significa que todos os pensamentos e opiniões de
outras pessoas podem ser descartados?”

Sebas parou aqui e continuou:

“Toda pessoa tem uma definição diferente de beleza. Se a beleza não pode ser determi-
nada pela aparência de alguém, então, em minha opinião, não podemos determinar a be-
leza baseando-se apenas no que as pessoas viveram, mas sim pela forma como elas são
por dentro... Eu não sei o que você passou e estamos convivendo aqui há poucos dias,
mas o que eu sei, é que a pessoa dentro de você está muito distante do conceito de
imundo, muito mais do que eu possa imaginar.”

Sebas se calou e seus passos ecoaram pelo corredor. Tsuare parecia ter se decidido e ela
disse:

“...Se... o senhor sente que eu sou pura... então me abra—”

Sebas prontamente a abraçou antes que ela pudesse terminar suas palavras.
“Para mim, você é muito linda.”

Os olhos de Tsuare se encheram de lágrimas quando ela ouviu as palavras suaves de


Sebas. Sebas gentilmente acariciou as costas de Tsuare, que então lentamente a soltou.

“Tsuare, me perdoe. A Milady me chama e eu preciso responder.”

“Eu, eu entendo...”

Sebas deixou Tsuare, agora de olhos vermelhos se curvando atrás dele, e bateu na porta.
Ele então abriu sem esperar por uma resposta. Ao fechá-la, sorriu para Tsuare, que o
espionara o tempo todo.

Esta casa foi alugada, por isso não era muito mobilhada apesar dos seus muitos cômodos.
No entanto, este cômodo foi preenchido com mobiliário elegante, o suficiente para im-
pressionar qualquer hóspede. Claro, qualquer um que soubesse o mínimo perceberia que
nenhum dos móveis ali era uma antiguidade venerável e que a sala inteira era vazia de
estilo ou qualquer profundidade cultural.

“Milady, aqui estou.”

“...Obrigada, Sebas.”

Solution, a falsa mestra da mansão, tinha uma expressão airada no rosto enquanto des-
cansava no sofá no centro da sala. No entanto, isso era apenas uma encenação. Isso por-
que Tsuare, a intrusa, também estava na casa, então ela teve que colocar a máscara de
uma herdeira orgulhosa.

Os olhos de Solution deixaram Sebas para se focarem na porta.

“...Ela já foi, correto?”

“Assim parece.”

Os dois olharam para o rosto um do outro e Solution falou em tom normal.

“Quando o senhor vai se livrar dela?”

Solution sempre fazia a mesma pergunta sempre que se encontravam, e Sebas sempre
dava a mesma resposta.

“Quando chegar a hora.”


Em circunstâncias normais, isso seria o fim. Solution suspiraria deliberadamente e de-
pois descartaria o assunto. No entanto, Solution não parecia inclinada a deixá-lo ir hoje,
e ela continuou perguntando:

“...O senhor poderia me dar uma indicação clara de quando será a hora? Pelo que sabe-
mos, esconder essa humana pode trazer problemas para nós. Isso não viola as ordens de
Ainz-sama?”

“Não houve problemas até agora... Temer humanos e os problemas que eles podem fazer,
dificilmente é a atitude que um servo de Ainz-sama deveria ter.”

Silêncio mortal reinou entre eles, e Sebas calmamente exalou.

A situação estava muito ruim.

Solution não tinha expressão em seu rosto, mas Sebas podia dizer que ela estava fer-
vendo de raiva por suas ações. Esta casa pode ser apenas uma base temporária, mas So-
lution a considerava como uma ramificação de Nazarick, e o fato de uma humana estar
morando aqui sem permissão a deixava muito infeliz.

Solution não tinha feito qualquer movimento para prejudicar Tsuare até agora devido a
ser impedida forçadamente por Sebas. No entanto, se as coisas permanecessem assim,
talvez esse impedimento se tornasse ineficaz.

Sebas estava ciente de que estava ficando sem tempo.

“...Sebas-sama. Uma vez que aquela humana violar as ordens que o Ainz-sama estabele-
ceu—”

“—Ela não ficará em nosso caminho.”

Sebas terminou a frase sem dar uma chance à Solution de continuar. Ela virou um olhar
sem emoção para ele, e então assentiu para indicar que ela entendia.

“Então eu não direi mais nada. Sebas-sama, mas por favor, não esqueça as palavras que
acabou de dizer.”

“Não esquecerei, Solution.”

“...Ainda assim.”

O tom silencioso de Solution escondia emoções tão poderosas que fizeram Sebas parar.

“...Ainda assim, Sebas-sama. Não deveríamos reportar a presença dessa Tsuare ao Ainz-
sama?”
Sebas ficou em silêncio. Depois de alguns segundos ele respondeu:

“Eu acho que vai ficar bem. Seria um incômodo desperdiçar o tempo de Ainz-sama com
uma humana insignificante.”

“...Entoma e as outras regularmente entram em contato com o senhor através do「Mes-


sage」. Por que não mencioná-la quando isso acontecer? ...Ou há algo que o senhor deseja
esconder?”

“Por que diz isso? Eu não tenho tais pensamentos. Nem em meus pesadelos eu—”

“Posso afirmar que... tudo que o senhor fez não foi para seu próprio ganho pessoal...
estou certa?”

O ar entre eles ficou tenso.

Sebas sabia que Solution estava escolhendo deliberadamente este tópico, e ele estava
ciente do perigo de suas palavras.

Cada cidadão de Nazarick deve lealdade absoluta à Ainz Ooal Gown — para cada um dos
Seres Supremos. Era certo que todos se sentiam assim, especialmente os Guardiões. Até
mesmo o Mordomo Assistente Eclair, que planejava tomar Nazarick para si, sentia sin-
cera lealdade e respeito pelos 41 Seres Supremos.

Naturalmente, Sebas tinha tal lealdade.

Dito isso, ele ainda achava que era errado abandonar um ser miserável apenas porque
tinha medo do perigo. No entanto, ele também entendia que a maioria daqueles em Na-
zarick não aprovaria esse curso de ação.

Não, ele só achava que entendia. A atitude de Solution de alguns segundos atrás clara-
mente o informara da extensão de sua ingenuidade.

Solution foi séria. Ela poderia muito bem enfrentar Sebas — que era um dos mais gra-
duados e um dos mais fortes combatentes corpo a corpo de Nazarick — dependendo de
sua resposta. Ele não esperava que Solution fosse tão longe para remover um problema.

—Sebas sorriu.

Ao ver aquele sorriso, os olhos de Solution se encheram de surpresa.

“...Claro. Não foi por ganho pessoal que eu não relatei isso ao Ainz-sama.”

“Existe alguma prova que suporte isso?”

“Eu aprecio a técnica culinária daquela garota.”


“O senhor diz... os pratos que ela faz?”

Era como se houvesse um ponto de interrogação no topo da cabeça de Solution.

“Sim. Além disso, não seria suspeito se apenas duas pessoas vivessem em uma casa tão
grande?”

“...Possivelmente.”

Solution não teve escolha senão concordar com essa inquirição. Qualquer um acharia
estranho que uma casa tão grande fosse pouco ocupada, ainda mais com todo o dinheiro
gasto ao alugá-la.

“Eu sinto que precisamos de algumas pessoas por perto. Além disso, não seria ruim se
não pudéssemos servir um único prato se os convidados chegassem?”

“...Quer dizer, o senhor está usando aquela humana como camuflagem?”

“Precisamente”

“Mas por que o senhor teve que usar essa humana em particular...”

“Estou interessado em Tsuare. Eu sinto que mesmo que ela tenha suas dúvidas sobre
nós, ela nunca as tornaria públicas. Estou enganado?”

Solution pensou brevemente no assunto e depois assentiu.

“Certamente.”

“Perfeito. Isso é meramente um despiste, então não há necessidade de procurar especi-


almente a permissão de Ainz-sama para fazê-lo. Por tudo o que sabemos, ele pode nos
castigar e dizer: “Vocês mesmo devem lidar com esses pequenos detalhes”.”

Foi assim que Sebas se explicou calmamente à, agora silenciosa, Solution.

“Você pode aceitar isso?”

“...Compreendo.”

“Então, vamos continuar assim—”

Sebas parou no meio do caminho porque ouviu algo parecido com dois objetos duros
colidindo.

Foi um som muito suave; provavelmente ninguém além de Sebas teria ouvido.
Aquele barulho desordenado se repetiu novamente, e ele estava certo de que tinha sido
deliberadamente feito.

Sebas abriu a porta da sala e entrou no corredor, concentrando seus sentidos.

Eles congelaram quando perceberam que o som vinha da aldrava da porta principal.
Ninguém jamais havia batido naquela porta desde que haviam chegado à Capital Real.
Eles haviam conduzido seus negócios pessoalmente e nunca pediram a ninguém para ir
à casa. Isso porque eles estavam preocupados que os outros se perguntariam o porquê
uma casa tão grande só era ocupada por duas pessoas.

Mas agora, alguém veio visitá-los. Certamente deve haver algum tipo de problema em
andamento.

Sebas manteve Solution na sala e caminhou até a porta principal, onde ele levantou a
tampa do ilhó da porta.

Ele podia ver um homem gordo do lado de fora, e soldados do Exército Real o ladeando
por trás, esperando por ordens.

O homem rechonchudo estava bem vestido e usava roupas de boa qualidade. Ele tinha
um distintivo pesado no peito que refletia uma luz acobreada. Seu rosto vermelho e su-
ado também era bem rechonchudo e tinha um brilho oleoso, provavelmente devido à
muitas refeições fartas.

Nos fundos do cortejo havia um homem de aparência estranha.

Sua pele pálida parecia nunca ter visto o sol antes. Seus olhos estavam aguçados e seu
rosto magro parecia com algum predador — um coletor de cadáveres, na verdade. Suas
roupas escuras pendiam frouxamente sobre ele, e ele certamente portava algum tipo de
arma.

Ele irradiava um cheiro de sangue e malícia, isso alertou o sexto sentido de Sebas.

Sebas não tinha idéia de quem era esse grupo de desajustados ou o que eles queriam.

“...Posso saber quem chama?”

“Eu sou o Inspetor, Staffan Heivish.”

Relatou o homem gordo à frente do grupo. Sua voz era estridente e um pouco desafinada.
Inspetores eram funcionários públicos que mantinham a ordem na Capital Real. Poder-
se-ia dizer que eles eram os comandantes dos guardas que patrulhavam a Capital e ti-
nham grande autoridade. Sebas não tinha idéia do porquê esse homem chamado Staffan
tinha vindo, e isso o preocupava.

Staffan ignorou a reação de Sebas e continuou:

“Eu confio que está ciente que as leis do Reino proíbem o tráfico de escravos... Essa lei
foi proposta pela própria Princesa Renner e colocada em vigor após ser revisada pelo
Parlamento. O relatório que recebi indica que os habitantes deste domicílio violaram
essa lei. Assim, desejo investigar o assunto.”

Staffan pontuou sua declaração, dizendo:

“Posso entrar, por favor?”

Sebas hesitou e quando o fez, começou a suar frio.

Ele pensou em muitas desculpas para negar sua entrada, mas negá-lo poderia levar a
maiores problemas no futuro.

Não havia garantia de que Staffan era realmente quem ele disse que era. Todos os ser-
vidores públicos do Reino tinham que usar distintivos como Staffan, mas não havia como
dizer se ele era ou não um funcionário legítimo do Estado. Por tudo o que ele sabia, podia
ser falso — embora a penalidade por isso fosse muito severa.

Dito isso, que mal faria para permitir que vários humanos entrassem na casa? Se eles
pretendiam recorrer à violência, Sebas poderia facilmente lidar com eles. De fato, serem
impostores só serviriam aos propósitos de Sebas.

Não havia como dizer o que Staffan pensava do silêncio contemplativo de Sebas. Mais
uma vez, ele perguntou:

“Se possível, posso ter uma audiência com o dono da casa? Embora nada poderá ser feito
se o dono não estiver, mas estamos aqui para conduzir uma investigação. Será proble-
mático se voltarmos sem nada.”

Staffan sorriu. Não havia sinal de humildade naquele sorriso. Ele ocultava os tons de
intimidação através do abuso de poder.

“Antes disso, eu gostaria de perguntar — quem é aquele homem lá no fundo?”

“Hm? Se chama Succulent. Ele representa o estabelecimento que relatou esse incidente
para mim.”

“Sou Succulent. Prazer em conhecê-lo.”


Depois de ver o sorriso falso de Succulent, Sebas sentiu uma sensação de derrota raste-
jando em sua direção.

Seu sorriso era como o de um caçador cruel zombando de sua presa ao observá-la entrar
em sua armadilha. Ele certamente deve ter feito todos os arranjos apropriados com todas
as partes apropriadas antes de se aproximar dele, um misto de coragem e ousadia. Sendo
esse o caso, Staffan era provavelmente se encaixava como um oficial adequado. Eles cer-
tamente estariam preparados para qualquer recusa da parte dele. Sendo esse o caso, se-
ria melhor aguardar e ver o que prepararam.

“...Compreendo. Informarei imediatamente a Milady de sua presença. Espero que os se-


nhores tenham a gentileza de esperar aqui por um momento.”

“Muito bem, esperamos sim, pode ir.”

“Peço para que por favor seja rápido. Nós não temos o dia todo.”

Succulent zombou, enquanto Staffan deu de ombros.

“Farei o possível. Então, por favor, me deem licença.”

Sebas abaixou a tampa do ilhó e virou-se para Solution. Antes disso, porém, ele preci-
sava dizer a Tsuare para se esconder no interior da casa—

♦♦♦

Ele pediu que soldados esperarem do lado de fora, e assim trouxe Staffan e Succulent
para dentro. Ambos ficaram visivelmente chocados quando viram Solution.

Seus rostos ficaram estampados com surpresa, talvez não esperassem ver uma mulher
tão bonita. A expressão de Staffan lentamente ficou lasciva, seus olhos vagando entre o
rosto e os fartos seios. Havia um olhar sombrio de luxúria em seus olhos. Em contraste,
o rosto de Succulent gradualmente se contraiu, sem vontade de relaxar.

Ficou claro qual deles era mais digno de cautela. Sebas pediu que se sentassem no sofá
em frente à Solution.

Solution, que já estava sentada, se apresentou a Staffan e Succulent, que estavam se ajei-
tando no sofá.

“Então, qual é o problema?”

A pergunta de Solution trouxe uma tosse exagerada de Staffan, que disse:


“Um certo estabelecimento relatou que alguém havia levado uma de suas funcionárias.
Ao mesmo tempo, ouvi dizer que a pessoa responsável pagou uma grande quantia de
dinheiro sujo a outro trabalhador. Nosso país proíbe o tráfico de escravos... isso não soa
como infringir a lei para a senhora?”

A voz de Staffan ficou cada vez mais animada e áspera, mas a resposta de Solution foi
completamente desinteressada:

“Oh, jura?”

Seu tom quase fez os dois revirarem os olhos. Eles estavam claramente tentando inti-
midá-la, mas não esperavam uma resposta daquelas.

“Sebas lidará com todas essas coisas problemáticas. Sebas, cuide disso por mim.”

“Está, está tudo bem? Se as coisas correrem mal, a senhora pode se tornar uma crimi-
nosa.”

“Ooooh, estou tããão assustada. Informe-me quando eu estiver prestes a me tornar uma
criminosa. Sebas.”

Solution sorriu amplamente para eles quando se levantou.

“Divirtam-se.”

Ninguém pôde detê-la quando ela saiu. Naquele instante, eles perceberam exatamente
o quão poderoso o sorriso de uma mulher bonita poderia ser.

Antes que o trancar da porta pudesse escoar pela casa, eles ouviram suspiros de sur-
presa quando os soldados do lado de fora ficaram surpresos com a boa aparência de So-
lution.

“—Então eu ouvirei os senhores em nome de Milady.”

Sebas sentou-se diante deles com um sorriso. Staffan recuou quando viu seu sorriso,
mas Succulent decidiu falar em seu nome para ajudar a manter o controle da situação.

“Bem, se diz. Assumirei a conversa aqui, Sebas-san. Como o Havish-san disse na porta,
uma das pessoas no nosso... estabelecimento desapareceu. Nós questionamos um ho-
mem, e ele disse que a entregou por dinheiro. Eu pensei; Isso é tráfico de escravos, o
mesmo que é proibido no Reino? Eu não estava disposto a acreditar que um dos nossos
funcionários pudesse realmente fazer uma coisa dessas, mas eu não tinha escolha senão
relatar isso.”

“De fato. Não podemos perdoar a degeneração que o tráfico de escravos traz!”
Staffan bateu a mesa.

“Por essa razão, meu caro Succulent aqui relatou este caso, mesmo correndo o risco de
manchar a reputação de seu negócio! Um exemplo de cidadão modelo!”

Succulent assentiu em agradecimento enquanto Staffan balbuciou seus dizeres.

“Obrigado, Havish-sama.”

Que tipo de farsa é essa...

Sebas pensou. Sua mente estava analisando as possibilidades. Os dois estavam clara-
mente em conluio. Sendo esse o caso, era quase certo que eles tinham tomado precauções
amplas antes de fazerem esse movimento. Sendo esse o caso, sua derrota seria certa.
Ainda assim, ele precisava minimizar suas perdas, mas como?

Ignorando isso por um momento, quais eram as condições para a vitória de Sebas?

Como mordomo de Nazarick, a condição de vitória de Sebas era eliminar o problema e


não deixar as coisas se acumularem. Proteger Tsuare definitivamente não fazia parte
disso.

Contudo—

“Acredito que o homem que afirma ter recebido o dinheiro pode ter dado falso testemu-
nho. Onde ele está agora?”

“Ele foi preso por suspeita de tráfico de escravos e está sob custódia agora. Depois de
interrogá-lo, descobrimos—”

“—A identidade da pessoa que comprou nossa funcionária, ou seja, o senhor, Sebas-san.”

O homem prontamente abriu o bico, como um canário cantando. Ele provavelmente ti-
nha sido forçado a dizer informações úteis para eles quando foi questionado.

Sebas ponderou se deveria agir como um idiota, mentir ou dar uma réplica firme e cor-
reta.

E se ele dissesse que ela não estava na casa? E se ele dissesse que ela estava morta?

Numerosas frases apareceram em sua cabeça, mas nenhuma delas parecia funcionar e
a oposição provavelmente não desistiria facilmente. Seria melhor que ele perguntasse o
que precisava saber.

“Ainda assim, o que trouxe os senhores a mim? Quais provas têm?”


Era isso que perturbava Sebas. Ele não deixou nenhum traço de seu nome ou identidade.
Eles não deveriam ter encontrado nenhuma evidência apontando para ele. No entanto,
os dois estavam aqui. Como eles o encontraram? Ele sempre foi muito cuidadoso durante
suas excursões e sempre desconfiado de possíveis perseguidores. Ele não achava que al-
guém nesta cidade pudesse segui-lo sem ser visto.

“Graças à um pergaminho.”

Um raio de luz passou pela mente de Sebas.

—O pergaminho que ele comprou na Guilda dos Magistas.

A qualidade daquele pergaminho sublime e certamente não era um pedaço comum de


pergaminho. Qualquer um que pudesse reconhecer um pergaminho como aquele seria
capaz de dizer que foi comprado da Guilda dos Magistas. Depois de perguntar aqui e ali,
eles certamente encontrariam pistas, e um homem em um uniforme de mordomo carre-
gando um pergaminho seria bastante proeminente.

Ainda assim, isso por si só não provaria que Tsuare estava aqui. Ele também poderia
pleitear que havia alguém que se parecia com ele.

No entanto, ele estaria em problemas se dissessem que revistariam a casa. Pois desco-
bririam que apenas três pessoas moravam nesta casa, incluindo Tsuare.

Sendo esse o caso tudo o que ele podia fazer era deixar as coisas em pratos limpos. Sebas
decidiu deixar seu destino para os deuses.

“...Eu a levei embora. Isso é um fato. No entanto, ela estava gravemente ferida na época
e eu fui forçado a fazê-lo, pois temia que sua vida estivesse em perigo.”

“Em outras palavras, admite comprá-la.”

“Posso falar com esse homem que mencionou?”

“Infelizmente, não podemos permitir isso. As coisas seriam ruins se tivessem permissão
para combinar suas histórias.”

“Então poderia—”

Estar presente e ouvir nossa conversa. Sebas queria dizer isso, mas preferiu se calar.

Afinal, eles planejaram a coisa toda. Mesmo que se encontrassem, não era provável que
a situação pudesse favorecer Sebas. Continuar com essa abordagem era simplesmente
uma perda de tempo.
“...Antes de entrarmos nisso, os senhores não acham que permitir que ela trabalhasse
com ferimentos tão graves enquanto é bastante problemático aos olhos da nação? Não
existem leis contra isso também?”

“As condições em nosso estabelecimento são mais duras que a maioria. Lesão é inevitá-
vel. Considere que o trabalho em minas e afins também inclui os riscos ocupacionais. É a
mesma coisa.”

“...Duvido que sejam a mesma coisa.”

“Hahaha. Estamos no a serviço da indústria. Há todos os tipos de clientes nisso. Somos


atenciosos, sabe. Mas tudo bem, eu entendi seu ponto. Seremos mais cuidadosos da pró-
xima vez... sim, um pouco mais cautelosos.”

“...Só um pouco?”

“Ah sim. Preocupar-se demais com detalhes custa dinheiro, sabe. Há muitos problemas
nisso.”

Succulent zombou da pergunta de Sebas.

Por sua vez, Sebas sorriu.

“—Tudo bem, entendi seu ponto de vista.”

Staffan suspirou. Sua atitude era típica de quando alguém lidava com tolos.

“Meu dever é verificar se o tráfico de escravos estava acontecendo. O bem-estar dos em-
pregados é outra questão. Tudo o que posso dizer é que isso não tem relação com o caso.”

“...Então, poderia me dizer quem são as pessoas responsáveis que lidam com problemas
deste tipo?”

“...Hm, poderia lhe dizer, mas há algumas dificuldades em fazê-lo. Infelizmente, enfiar o
nariz nos negócios dos outros só vai lhe render ressentimento.”

“...Então, por favor, espere até eu encontrar as pessoas relevantes primeiro.”

Staffan sorriu maldosamente, como se dissesse: “Eu estava esperando que dissesse isso.”

Succulent tinha o mesmo tipo de olhar.

“...Ah, se dependesse apenas de mim não teria problema, mas o negócio já entrou com
processo, então devo prendê-lo e começar as investigações. Estou de mãos atadas quanto
a isso.”
Em outras palavras, ele estava sem tempo.

“Dada a situação e as provas circunstanciais, claramente o apontam como culpado, mas


o relator disse que está disposto a abrandar as coisas. Uma compensação será necessária
para suavizar as coisas, é claro, e destruir a documentação relacionada à ofensa do co-
mércio de escravos também exigirá um pouco de dinheiro.”

“O que exatamente o senhor quer dizer com abrandar as coisas?”

“Veja bem. Gostaríamos que devolvesse a nossa funcionária e compensasse a perda de


receita incorrida neste tempo que a impediu de trabalhar.”

“Entendo. E de quanto estamos falando?”

“Em moedas de ouro... bem. Ah, eu vou te dar um desconto. Cem moedas de ouro. A
compensação será mais trezentas moedas de ouro, então um total de quatrocentas, justo,
não acha?”

“...Isso é uma soma e tanto. Como chegou a este valor? Quanto ela faz um dia e como
exatamente é calculado?”

“Espere um pouco—”

Disse Staffan e continuou:

“Isso não é tudo, Succulent-san.”

“Ah, quase me esqueci. Como eu já fiz um relatório, será preciso pagar para destruí-lo
também, mesmo que este problema seja resolvido debaixo dos panos.”

“Tem razão. Como pude esquecer disso, meu caro Succulent?”

Staffan sorriu perversamente mais uma vez.

“...Assim sendo?”

“Hm?”

“Não, não é nada....”

Disse Sebas calmamente enquanto sorria.

Succulent curvou-se para Staffan e disse:


“Hm, me perdoe, Heivish-sama. Destruir os documentos custa um terço das taxas de
compensação, desse modo serão mais cem moedas de ouro. Isso é um total de quinhentas
moedas de ouro, creio eu.”

“O dinheiro que eu paguei para aquele homem, conta?”

“Como poderia? Ouça, meu caro. Ao chegar em acordo com a outra parte, isso significa
que não comprou uma escrava. Em outras palavras, as despesas de comprá-la como es-
crava são anuladas. Imagine que foi vítima de um golpe e perdeu dinheiro.”

Pensar que eles realmente esperariam que Sebas assumisse que ele havia perdido 100
moedas de ouro. Com toda a probabilidade, a maior parte do dinheiro já havia caminhado
sinuosamente para seus bolsos.

“...No entanto, os ferimentos dela ainda não estão totalmente recuperados. Se a levarem
embora agora, suas feridas podem reabrir. E se ela não receber o tratamento adequado,
ela pode muito bem perder a vida. Eu acredito que seria melhor ela ficasse comigo e re-
ceber cuidados aqui. O que os senhores acham?”

Os olhos de Succulent brilhavam de um jeito bizarro.

Quando percebeu isso, Sebas percebeu a profundidade de seu erro. Ele permitiu que
percebessem o quanto Tsuare significava para ele.

“Entendi, faz sentido. É como diz. Não obstante a morte dela, precisamos que pague pelo
dinheiro que seria gasto com ela. Enquanto ela está se recuperando, que tal um pouco de
diversão com a dama da casa?”

“Ohhh! Isso faz muito sentido. Se há uma vaga, não há problema em preenchê-la!”

Havia visível luxúria no largo sorriso do rosto gordo de Staffan. Ele estava certamente
imaginando o ato de despir Solution de suas roupas

O sorriso desapareceu do rosto de Sebas, que ficou impassível.

Era provável que Succulent não falasse sério, mas era certo que ele pressionaria o ata-
que se mostrasse alguma fraqueza. Para o infortúnio de Sebas ao expor seu apego a Tsu-
are, ainda existia a possibilidade de que a situação se deteriorasse ainda mais.

“...Por acaso não tem medo desses seus desejos te colocarem em problemas?”

“Como se atreve a falar assim comigo?!”

O rosto de Staffan estava vermelho brilhante enquanto ele gritava.

Soa como um porco sendo morto...


Sebas pensou. Ele olhou para Staffan sem dizer uma única palavra.

“O que quer dizer com meus desejos? Tudo isso é para manter a lei aprovada pela glori-
osa vontade da Princesa Renner! Como se atreve a chamar isso de desejo?! Mostre algum
respeito, homem!”

“Sim, sim, não se preocupe, Heivish-sama.”

Quando Succulent disse, Staffan se acalmou imediatamente. Sua raiva havia desapare-
cido como se nunca havia de fato estado ali, um sinal de que aquilo era apenas uma tática
de intimidação não uma raiva genuína.

Que atuação terrível, refletiu Sebas.

“Como eu ia dizendo, Succulent-san...”

“Heivish-sama, nós já dissemos tudo que era para ser dito. Eu estava pensando em voltar
amanhã para saber o que ele pensa depois de refletir bem. Tudo bem assim, Sebas-san?”

“Perfeitamente bem.”

Com isso, Sebas os levou para a porta principal. Ao despachá-los, Succulent — que ficara
até o final — sorriu para Sebas e o deixou com essas palavras:

“Ainda assim, tenho que agradecer àquela vagabunda. Pensar que um pedaço de lixo
poderia realmente se transformar em uma galinha dos ovos de ouro.”

Com isso, a porta se fechou com um baque.

Sebas olhou para eles, como se a porta fosse transparente. Não havia expressão particu-
lar no rosto de Sebas. Ele parecia tão calmo como sempre. No entanto, havia uma emoção
distinta em seus olhos.

Essa emoção era raiva.

—Não, a palavra “raiva” era muito branda para descrever como ele se sentia.

“Furioso” e “Irado”; essas palavras seriam mais adequadas.

A mensagem de despedida de Succulent foi honesta, porque ele tinha certeza de que
Sebas estava no seu limite e não tinha para onde ir — sua vitória estava garantida.

“Solution, pode sair agora, não?”


Solution saiu das sombras em resposta à voz de Sebas. Ela tinha se fundido nas sombras
com habilidades vindas de sua profissão de assassino.

“Você ouviu tudo?”

Sebas só perguntou como formalidade. Naturalmente, Solution acenou para dizer: “claro
que sim”.

“O que o senhor planeja fazer agora, Sebas-sama?”

Sebas não pôde responder a essa pergunta imediatamente. Ao ver isso, Solution olhou
friamente para ele.

“...Que tal entregar aquela humana para eles?”

“Eu não sinto que isso vai resolver o problema.”

“...E por quê?”

“Se eu expor uma fraqueza, eles tentarão capitalizar até tirarem cada moeda. Esse é o
tipo de pessoas que são. Eu não acho que entregar a Tsuare para eles irá resolver o pro-
blema. Mais ao ponto, o problema real é o quanto eles aprenderam enquanto nos inves-
tigavam. Nós entramos na Capital Real como comerciantes, mas se eles investigarem
mais de perto, eles perceberão a verdade — descobrirão nosso disfarce.”

“Então, o que o senhor pretende fazer?”

“Eu não sei. Eu gostaria de dar um passeio lá fora e pensar.”

Sebas abriu a porta e saiu.

♦♦♦

Solution assistiu em silêncio, olhando para as costas de Sebas quando este se distanciou.

Nada fazia sentido para ela.

Nada disso teria acontecido se ele não tivesse resgatado aquela humana. Dito isto, era
tarde demais para lamúrias. A questão era o que eles fariam a seguir.

Como subordinada de Sebas, ela não podia simplesmente ignorar suas instruções, mas
sentia que deixar as coisas só levaria a um resultado pior.

Se nossa irmãzinha pudesse sair... se eu pudesse agir como uma Pleiade, não teríamos esse
problema agora.
Ela estava hesitante.

Ela estava desconcertada. Ela nunca tinha sido tão hesitante em sua vida.

No final, se decidiu. Ela levantou a mão esquerda.

Algo se projetava dela, como se estivesse flutuando na água. Era um pergaminho que ela
havia armazenado dentro de seu corpo. Originalmente havia sido dado a ela para comu-
nicação em caso de emergência — embora, graças aos esforções de Demiurge, agora ha-
via uma maneira de fabricar pergaminhos de baixo nível. Ainda assim, Solution não foi
informada disso e então acreditava que esse pergaminho deveria ser usado apenas em
uma situação terrível — e Solution acreditava tal situação se qualificava como tal.

Ela abriu o pergaminho e ativou a magia dentro dele. Uma vez usado, o pergaminho de-
sintegrava-se e os resto caiam no chão como pó, e então até mesmo o pó desaparecia.

Quando a magia entrou em vigor, Solution foi conectada à outra parte. Ela perguntou:

“É o senhor, Ainz-sama?”

『Solution — hm? O que aconteceu? Para estar me contatando, isso significa que houve
uma emergência?』

“Sim.”

Solution ficou em silêncio por um momento. Ela havia parado por causa de sua lealdade
a Sebas e porque havia considerado a possibilidade de estar errada. No entanto, sua le-
aldade a Ainz estava acima de tudo.

Além disso, eles deveriam considerar os benefícios aos 41 Seres Supremos em cada mo-
vimento que fizessem. No entanto, tudo o que Sebas tinha feito até agora poderia ter vi-
olado esse preceito. Portanto, ela decidiu recomendar a decisão nas mãos de seu mestre
e disse:

“É sobre o Sebas-sama, ele pode ter nos traído.”

『Quê?! ...Ah? ...Não, como isso... mhm... Não faça estes tipos de brincadeiras, Solution.
Está proibida de acusar os outros sem provas... ou tem alguma prova?』

“Sim. Embora possa não contar exatamente como prova...”


Capítulo 04: Homens Congregados
Parte 1

3º Dia do mês Baixo Fogo (9º mês) – 04:01

fadiga acumulada de Brain o atingiu toda de uma vez, e assim ele dormiu

A
por quase um dia inteiro ao entrar na casa de Gazef. Ele acordou para comer
um pouco e depois voltou para a cama.

Ele não queria admitir, mas a casa de Gazef era um lugar que ele podia se
sentir seguro. Ele sabia que mesmo seu rival Gazef não poderia suportar um único golpe
daquela Vampira chamada Shalltear, mas a casa de seu antigo inimigo era agora o lugar
mais seguro do mundo. Sua tensão agora estava aliviada, o que permitia que dormisse
profundamente.

A luz que atravessava as frestas da janela escura atingiram o rosto de Brain.

A luz despertou Brain de seu sono sem sonhos.

Ele abriu os olhos, mas os raios penetrantes fizeram com que ele fechasse os olhos no-
vamente. Ele estendeu a mão para bloquear a luz do sol.

Brain apoiou-se em um braço e depois pendulou as pernas para se sentar ao lado da


cama. E como um rato assustado. ele olhou ao redor do quarto. A simplicidade do quarto
era bem diferente do esperado, tinha o mínimo de móveis e a panóplia de Brain estava
empilhado em um canto.

“Este é o quarto que o Capitão Guerreiro do Reino usa para receber convidados?”

Enquanto Brain olhava ao redor, ele deixou algumas palavras sem som saírem de seus
lábios, a falta de pessoas o deixava à vontade. Então, ele se esticou e suas articulações
emitiram ruídos, agora o corpo rígido relaxava e o sangue circulava mais uma vez.

Um enorme bocejo escapou dele.

“...Ele deve ter deixado o pessoal dele passar a noite aqui no passado, então? Eles devem
ter ficado desapontados.”

A razão pela qual a realeza e a nobreza levaram vidas tão luxuosas não era simplesmente
porque gostavam disso. Mas também pela vaidade; para proteger sua imagem.

Da mesma forma, quando os homens viram o estilo de vida opulento de seu líder, isso
estimularia seu desejo de fazer um nome para si e lhes dar motivação.

“...Não, quem sou eu para dizer algo assim...”


Murmurou Brain. Então ele bufou; mas foi dirigido a si mesmo e não a Gazef.

A provável causa seria que agora ele tinha se afastado da beira da loucura, o lugar onde
ele quase havia sido levado por aqueles choques mentais. Pensar que ele estaria real-
mente pensando em assuntos tão triviais.

Enquanto Brain pensava naquele poderoso monstro, ele percebeu que não conseguia
parar os tremores em sua mão.

“Como eu pensava...”

O terror abissal que se agarrava ao seu coração ainda não havia sido removido.

Shalltear Bloodfallen.

Uma figura de poder absoluto, alguém que até mesmo Brain — que havia abandonado
tudo em prol de aprimorar suas habilidades com espadas — não poderia se equiparar.
Ela era um monstro entre monstros; ainda assim, alguém cuja aparência era a soma total
de toda a beleza do mundo. Ela era alguém que exercia o poder verdadeiro.

Uma emoção de medo perfurava seu coração com a mera lembrança de seu semblante.

Ele havia vivido em constante terror da perseguição daquele monstro e, assim que che-
gou à estrada para a Capital Real, não havia dormido nem descansado, ficou apenas fu-
gindo para salvar sua vida. O espectro de seu algoz, Shalltear, aparecia diante dele
quando dormia, e a noite pareceu desnorteá-lo enquanto corria pelas estradas. Esma-
gado sob essa inquietação, ele não conseguira ter uma boa noite de sono. Tudo o que ele
podia fazer era correr como se não houvesse mais nada no mundo para ele.

Ele havia escolhido fugir para a Capital Real porque acreditava que poderia se perder
entre as massas de pessoas e despistá-la de seu rastro. No entanto, ele não pensava no
pesado custo que sua exaustiva fuga lhe causaria, ou a falta de autopreservação que se
desenvolvera como resultado.

Encontrar Gazef foi um desenvolvimento inesperado. Talvez Brain tenha imaginado que
Gazef pudesse eliminar Shalltear, e assim suas pernas inconscientemente o trouxeram
em busca de seu rival. Entretanto, ele não sabia que resposta buscava.

“O que eu devo fazer agora...”

Ele não tinha nada.

Ele abriu as mãos e estavam vazias.

Ele olhou para a sua panóplia de guerra no canto do quarto.


Ele obteve uma Katana para triunfar sobre Gazef. No entanto, o que ele faria depois de
vencer Gazef? Agora ele sabia da existência de uma criatura com várias ordens de mag-
nitude mais poderoso que ele. Se não pudesse derrotar o dito ser, qual era o ponto de
triunfar sobre aqueles que estavam abaixo dele?

“Seria melhor eu ir arar alguma terra... provavelmente seria mais significativo.”

Então, Brain sentiu alguém do lado de fora quando estava prestes a zombar de si mesmo.

“Unglaus, já acordou? ...Parece que sim, né?”

Essa voz pertencia ao dono da casa.

“Ah, Stronoff. Já levantei.”

A porta se abriu e Gazef entrou no quarto. Ele estava totalmente equipado em sua panó-
plia.

“Você dormiu bastante. Fiquei até assustado de como o seu sono estava pesado.”

“Sim, obrigado por me deixar em paz. Me desculpe por incomodar.”

“Não se preocupe com isso. Agora eu preciso ir ao Palácio. Mas quando eu voltar vamos
conversar sobre o que aconteceu.”

“...É terrível, sabia? Pode acabar como eu.”

“Mesmo assim, tenho que ouvir. Eu acho que será melhor beber um pouco nessa con-
versa, vai aliviar o clima... Sinta-se em casa, fique à vontade. Se ficar com fome é só pedir
a criadagem, eles devem ser capazes de cozinhar algo para você. E se quiser sair... tem
algum dinheiro?”

“...Não. Mas... se eu precisar de alguma coisa, posso vender meus itens mágicos.”

Brain mostrou a Gazef os anéis que ele usava.

“Tem certeza? Eles não são nada baratos.”

“Não tem problema. Eu não me importo.”

Ele havia comprado esses itens para derrotar Gazef. Agora que ele sabia que não havia
sentido em fazê-lo, que significado havia para valorizar essas bugigangas?

“Às vezes itens de alto preço podem ser difíceis de vender. O comprador precisa ter um
bom amonte de dinheiro, afinal. Aqui, use isso.”
Gazef jogou-lhe uma pequena algibeira de pano. Brain pegou, e ouviu o som de metal
tilintando em seu interior.

“...Desculpe por isto. Aceito o empréstimo então.”

Parte 2

3º Dia do mês Baixo Fogo (9º mês) – 10:31

Sebas passeava vagarosamente enquanto ponderava sobre como lidar com as cinco pes-
soas que o seguiam desde que saíra de casa. Ele acreditava que exercitar seu corpo au-
mentaria seu humor e o ajudaria a pensar em uma boa idéia.

Logo, ele viu uma multidão de pessoas ocupando a estrada frente a ele.

O som que vinha deles era algo entre o praguejar maldoso e o riso zombeteiro, acompa-
nhado pelo som de algo batendo em alguma coisa. Gritos ao longo das palavras de “Ele
vai morrer” e “Melhor chamar os guardas” era ouvido.

A multidão bloqueava sua linha de visão, mas ele estava certo de que algum tipo de vio-
lência estava em andamento.

Sebas pensou que talvez devesse mudar de direção e seguir por outro caminho. Ele he-
sitou por um momento — e então continuou em frente.

Seu caminho levou-o para o centro da multidão.

“Com licença.”

Sebas passou pelos espectadores com essas palavras e alcançou o centro da multidão.

A visão de um homem idoso movendo-se com uma elegância bizarra e fluida chocou e
enervou os espectadores, uma das pessoas que viram Sebas passando diante deles ficara
bastante surpresa.

Parecia haver alguém tentando chegar ao coração da multidão, além de Sebas. A dita
pessoa disse: “Com licença”, mas não conseguiu avançar através da multidão e ficou presa,
incapaz de avançar ou recuar.

Sebas entrou no centro da congregação sem dificuldade, e lá ele viu o que estava acon-
tecendo com seus próprios olhos.

Vários homens de aparência desleixada chutavam e pisavam em alguma coisa.


Sebas seguiu em frente sem um único som, parando apenas quando ele estava ao alcance
dos homens.

“Perdeu alguma coisa aqui, velho?”

Um dos cinco homens notou Sebas se aproximando e rosnou para ele.

“Este lugar parecia um pouco barulhento, então vim dar uma olhada.”

“Quer levar umas também?!”

Os homens rapidamente cercaram Sebas. Quando eles deixaram suas posições originais,
revelaram o objeto que estavam chutando todo esse tempo. Parecia um menino. Ele es-
tava em posição fetal no chão, seu rosto estava sangrando. Não ficou claro se o sangue
vinha de sua boca ou nariz.

Aparentemente, o menino desmaiou depois de ser brutalizado por tanto tempo, mas
ainda parecia estar respirando.

Sebas olhou para os homens. O cheiro de álcool emanava de suas bocas e corpos. Seus
rostos estavam vermelhos, mas não do esforço da atividade física.

Teriam eles perdido o controle de seus impulsos violentos porque estavam bêbados?

Sebas tinha uma expressão sem emoção no rosto quando perguntou:

“Eu não sei o porquê estão fazendo isso, mas não acham que é hora de parar?”

“Hah?! Este pivete sujou minha camisa de comida! Por que eu ia deixar ele se safar?

Um dos homens apontou para um ponto em sua camisa. Parecia uma mancha. No en-
tanto, as roupas do homem estavam muito mais sujas do que a extensão da mancha.
Sendo esse o caso, a mancha dificilmente era notada.

Sebas olhou para aquele que parecia ser o chefe dos cinco baderneiros. A diferença pode
ter sido muito sutil para um ser humano comum detectar, mas Sebas — que tinha as
percepções sensoriais aguçadas de um guerreiro — foi capaz de selecioná-lo.

“Ainda assim... segurança pública nesta cidade é um tanto ruim.”

“Ah?!”

Sebas falou como se tivesse acabado de confirmar algo que observara de longe. Os ho-
mens pensaram que ele os banalizou e fez ruídos de desagrado.

“...Sumam daqui.”
“Ah? Que merda é essa que falou aí, velho?”

“Eu vou dizer de novo — Sumam daqui.”

“Ô seu velho desgraçado!”

O chefe deles ficou vermelho de raiva e cerrou o punho e— caiu desmaiado no chão.

Sons de choque vieram de todos ao seu redor, incluindo os quatro homens restantes.

O que Sebas fizera foi bastante simples. Ele simplesmente havia fechado a mão e golpe-
ado o queixo do homem — embora a uma velocidade que os humanos não perceberiam.
Isso deu ao homem uma concussão cerebral em alta velocidade. Ele também poderia ter
enviado o homem aos céus com sua velocidade inimaginável, mas isso não serviria para
assustar os outros. Assim, ele havia retido o poder de seu golpe.

“Ainda querem brigar?”

Sebas disse calmamente.

Sua calma e força cortam a intoxicação pasma dos homens. Eles deram vários passos e
fizeram um pedido de desculpas.

Sebas pensou, vocês estão se desculpando com a pessoa errada, mas não disse isso.

Os homens agarraram seu colega inconsciente e fugiram. Sebas não se incomodou em


observá-los e, em vez disso, foi até o menino caído. No entanto, ele parou no meio do
caminho.

O que ele estava fazendo?

Na situação que estava, ele deveria estar lidando com outro problema. Só um idiota pe-
garia mais problemas para si mesmo em um momento como esse. Se ele não agisse sem
pensar, ainda assim ele teria acabado nesse estado precário?

Mas de todo modo, o menino havia sido salvo. Já fiz o bastante.

Esse pensamento cruzou a mente de Sebas, mas ele ainda se dirigiu para o menino. Ele
tocou as costas do garoto imóvel e infundiu um pouco de ki nele. Canalizar seu ki com
mais potência provavelmente curaria todas as suas feridas imediatamente, mas isso cha-
maria muita atenção.

Assim, Sebas fez o mínimo necessário, e então apontou para alguém que encontrou seus
olhos.
“...Por favor, leve este menino ao templo. Suas costelas podem estar quebradas, por fa-
vor, tenha cuidado ao carregá-lo, use uma prancha para transporte, e não o sacuda muito.”

O homem que Sebas ordenou assentiu, e então Sebas se aproximou. Ele não precisou
empurrar a multidão, porque eles se afastaram quando ele deu um passo à frente.

Sebas continuou em frente mais uma vez. Em pouco tempo, ele sentiu que o número de
presenças que o seguiam aumentara.

No entanto, havia um problema — suas identidades.

As cinco pessoas que o seguiram da casa eram provavelmente os homens de Succulent.


Nesse caso, e os dois que se juntaram a eles depois de ele ter salvado o menino?

Eles pareciam ser homens crescidos pelo som de seus passos e seu ritmo, mas ele não
tinha idéia de quem eles eram.

“Não consigo pensar em uma resposta. Ainda assim... será melhor se eu aprender algo
sobre isso primeiro.”

Sebas virou uma esquina em uma região pouco iluminada. Seus seguidores permanece-
ram em seu rastro.

“...Eles realmente estão se escondendo?”

Eles não haviam escondido os sons de seus passos. Eles não tinham a capacidade de
fazê-lo, ou havia algum outro motivo? Ele decidiu não pensar muito sobre o assunto. Afi-
nal, ele poderia verificar a verdade depois de capturá-los. Sebas decidiu fazer o seu mo-
vimento uma vez que ele não podia mais sentir a presença de outras pessoas ao seu redor.

Só então, uma voz rouca — mas jovem — veio de uma das pessoas que o seguiam.

“—Desculpe incomodar.”

Parte 3

3º Dia do mês Baixo Fogo (9º mês) – 10:27

Climb estava pensando em voltar para o Palácio Real.

Ele pensava no treino que havia feito com Gazef naquela manhã, repetindo a luta em sua
mente várias vezes e considerando como lutar mais habilmente. Quais táticas vou tentar
se tiver outra chance, ele pensava.
Enquanto Climb lentamente chegava à sua conclusão, ele viu um grupo de pessoas se
amontoar na frente dele. Gritos de raiva vinham deles, e dois guardas observavam de
longe, sem saber o que fazer.

Os sons de uma discussão vinham do centro do grupo, e não soava como uma briga co-
mum.

A expressão de Climb ficou fria e ele caminhou ao lado dos guardas.

“O que está fazendo?”

O guarda saltou de susto, dado que alguém o chamou por trás, e ele se virou e deu de
cara com Climb.

O homem usava cota de malha e carregava uma lança. Ele usava uma túnica estampada
com o brasão do Reino em cima da cota. Este era o uniforme padrão da guarda comum
no Reino, mas Climb podia sentir que nenhuma das pessoas à sua frente era bem treinada.

Para começar, nenhum deles havia aperfeiçoado o físico. Na verdade, nem mesmo fize-
ram a barba e suas cotas de malha não tinham sido polidas. Um leve ar de sujeira pairava
sobre eles e pareciam bastante desleixados na aparência geral.

“E você é...”

Climb era mais jovem do que ele, então o guarda respondeu a ele com um tom que era
uma mistura de perplexidade e aborrecimento.

“Estou de folga no momento.”

A confusão se espalhou pelo rosto do guarda quando ele ouviu a voz firme e insistente
de Climb. Talvez fosse porque ele irradiava uma aura de superioridade apesar de ser
mais jovem que eles.

Os guardas pareciam ter concluído que não podiam errar, assumindo uma postura sub-
missa, e se endireitaram.

“Parece ser uma perturbação civil.”

Climb resistiu à vontade de puni-los dizendo que eu já sabia disso. Ao contrário dos
guardas do Palácio, os guardas que patrulhavam a cidade eram retirados da população
civil e não eram bem treinados. Na verdade, eles eram meros civis que sabiam usar armas.

Climb moveu os olhos dos guardas nervosos para a multidão. Seria mais rápido resolver
o assunto pessoalmente do que esperar que eles fizessem alguma coisa.
Meter o nariz no trabalho da guarda pudesse ser considerado um passo à frente de sua
autoridade, mas ele não seria capaz de enfrentar sua amada mestra se ele simplesmente
ficasse parado enquanto um cidadão estava sendo maltratado.

“Você, espera aqui.”

Sem esperar por sua resposta, Climb firmou sua determinação e foi para a multidão,
forçando seu corpo em meios as massas. Havia espaços entre cada pessoa, mas ele foi
incapaz de passar pelo meio. Não, na verdade o normal seria não ser capaz de fazê-lo.

Ele quase foi jogado para trás, mas ele lutou para abrir seu caminho para frente. Foi
quando ele ouviu uma voz do centro da multidão.

“...Sumam daqui.”

“Ah? Que merda é essa que falou aí, velho?”

“Eu vou dizer de novo — Sumam daqui.”

“Ô seu velho desgraçado!”

Isso era problema.

Esses baderneiros não ficaram satisfeitos com espancar seja lá quem fosse; agora eles
queriam atacar um homem velho também.

O rosto de Climb ficou vermelho enquanto ele se empurrava desesperadamente para


frente e, quando atravessou a multidão, viu a figura de um velho diante dele. Ele estava
cercado por um grupo de homens mais jovens. Aos pés deles estava um menino que havia
sido espancado ao ponto de parecer um pedaço de trapo surrado.

O velho estava elegantemente vestido e exalava a sensação de ser da nobreza ou servo


de algum nobre. Os homens que o cercavam eram musculosos e pareciam embriagados.
De relance ficava visível o lado vil do bando

Um dos homens — aquele que parecia mais musculoso — cerrou o punho. Comparado
a ele, o velho parecia muito inferior, seja na resistência de seus corpos, na protuberância
de seus músculos ou em sua brutalidade sanguinária. Certamente o homem mais jovem
poderia facilmente nocautear o velho com apenas um soco. As pessoas ao redor deles
perceberam isso e ofegaram horrorizados com a tragédia que estava prestes a acontecer
com o velho.

Em meio a tudo isso, apenas Climb sentiu que algo estava fora de lugar.

De fato, o homem mais jovem parecia mais forte. No entanto, Climb podia sentir uma
aura de poder absoluto vindo do homem.
Por um momento ele ficou sem reação e perdeu a chance de conter a violência que se
seguia. O homem levantou o punho—

—E então desabou por completo no chão.

As pessoas ao redor de Climb exclamaram em choque.

Parece que o velho deu um soco e atingiu o outro homem no queixo, a uma velocidade
incrível. Mesmo a visão aguçada de Climb mal conseguiu acompanhar a rapidez do golpe.

“Ainda querem brigar?”

O velho dirigiu essa pergunta serena e séria aos homens restantes.

A combinação de seu exterior inescrutável e seu tom calmo rompeu a embriaguez dos
homens. Não — até mesmo as pessoas ao redor tinham se assustado com sua presença.
Os homens perderam toda a vontade de lutar.

“Er, hum. Nós, nós sentimos muito.”

Os homens recuaram e fizeram um pedido de desculpas e, em seguida, pegaram o colega


— que estava no chão caído de forma vergonhosa — e fugiram com o rabo entre as per-
nas. Climb não pensou em seguir esses homens. Afinal de contas, a postura ereta do velho
senhor, com o peito erguido, roubara seu coração e o deixara congelado no lugar.

Ele parecia uma lâmina magistral. Era uma visão que encheria qualquer guerreiro que
a visse com reverência. Não é de admirar que ele ficasse imóvel.

O velho tateou as costas do menino caído, como se estivesse examinando suas feridas, e
então ordenou a um transeunte que levasse o menino ao tratamento antes de se afastar.
A multidão abriu um caminho para o velho homem. Os olhos de todos estavam fixos nas
costas dele, tal era o fascínio por sua presença.

Climb correu até o garoto caído e tirou a poção que Gazef lhe dera depois da sessão de
treinamento.

“Pode beber isso?”

Não houve resposta. Ele desmaiou.

Climb abriu a garrafa e despejou o líquido no corpo do menino. Muitas pessoas acredi-
tavam que as poções tinham que ser bebidas, mas o fato era que funcionaria mesmo
quando derramadas na pele. A praticidade da magia era sem igual.

A pele do menino pareceu absorver o líquido e a cor retornou ao rosto até então pálido.
Climb assentiu em alívio.

Quando a multidão percebeu que Climb acabara de usar um item caro como aquela po-
ção, eles ficaram tão impressionados com ele quanto com a habilidade sobrenatural do
velho.

Climb não se arrependeu de usar a poção. Tendo tomado os impostos do povo, era na-
tural que ele — como alguém que vivia dos impostos — os protegesse e mantivesse a
ordem pública. Ele sentiu que deveria ser capaz de fazer algo assim, mesmo que não pu-
desse defender o povo.

O menino deveria estar bem agora que Climb lhe dera a poção, mas seria melhor que ele
fosse ao templo apenas por segurança. Ele olhou para os guardas e notou que a dupla se
tornara um trio. Aparentemente alguém chegou atrasado.

A multidão vinha lançando olhares críticos para os guardas desde então.

Climb se dirigiu a um dos guardas que estava muito desconfortável:

“Leve esse menino para o templo.”

“O que aconteceu com ele...?”

“Alguém o agrediu. Eu já usei uma poção de cura nele, mas espero que você o leve ao
templo, por segurança.”

“Sim. Entendido!”

Depois de deixar a bagunça para os guardas limparem, Climb concluiu que não havia
mais nada que pudesse fazer aqui. Como soldado designado para o Palácio, seria melhor
não interferir nos assuntos de outros lugares.

“Posso deixar em suas mãos o dever de questionar qualquer testemunha ocular sobre
os detalhes do que aconteceu aqui?”

“Entendido.”

“Então conto com você.”

Climb observou que os guardas pareciam ter ganhado confiança, eles moveram rapida-
mente ao receber suas ordens. Então Climb avançou em silêncio.

“Onde está indo...”

Um dos guardas disse, mas Climb o ignorou.


Ele só diminuiu a velocidade quando chegou a equina que o velho tinha virado.

Depois disso, ele começou sua perseguição.

Logo, ele viu o velho andando pela rua.

Ele queria chamá-lo, mas estava sem coragem para fazê-lo. Isso porque sentia uma pa-
rede invisível entre eles; uma sensação de um poder incrível que parecia esmagá-lo.

O velho virou uma esquina e se dirigiu para uma região mais escura. Climb continuou
seguindo. Ele estava andando atrás do velho, mas não ousou falar nem se dirigir a sua
pessoa.

Climb havia se tornado um perseguidor?

Climb começou a se sentir incomodado com o que estava fazendo. Mesmo que ele não
soubesse como abordar o velho, ele não poderia continuar seguindo-o assim. Em um es-
forço para mudar a situação, Climb continuou seguindo em silêncio.

Uma vez que entraram em um beco vazio, Climb respirou fundo várias vezes, como se
ele fosse um menino se preparando para confessar seu amor a uma garota. Então convo-
cou sua coragem e disse:

“—Desculpe incomodar.”

O velho se virou depois de ouvir alguém chamar por ele.

Seu cabelo era branco, assim como a barba. No entanto, suas costas estavam retas, como
uma obra-prima, uma lâmina forjada de aço. Seu rosto bonito estava enrugado, dando
uma expressão gentil às suas feições, mas seus olhos estavam aguçados e fixos em sua
presa, como os de uma águia.

Ele até tinha um ar de nobreza sobre ele.

“Posso ajudar em algo?”

A voz parecia um pouco envelhecida, mas transbordava com uma vitalidade inegável.
Climb sentiu uma pressão invisível rolando em sua direção e engoliu em seco.

“Ah, ah—”

Climb não conseguia falar, tal era a aura de opressão que a presença do velho homem
emitia. Ao ver isso, o velho pareceu relaxar e a tensão de seu corpo dissipou.

“E você, quem é?”


Seu tom foi gentil. Liberto da imensa e esmagadora pressão, a garganta de Climb recu-
perou sua capacidade de funcionar.

“...Me chamo Climb, sou um humilde soldado desta nação. Obrigado por sua ação cora-
josa em completar uma tarefa que deveria ser minha por dever.”

Climb curvou-se profundamente em agradecimento. O velho ficou pensativo, depois es-


treitou os olhos. E então, ele calmamente disse “Ah...” quando percebeu o que Climb que-
ria dizer.

“...Está bem. Então, até mais ver.”

O velho terminou a conversa e partiu, mas Climb levantou a cabeça e perguntou:

“Por favor, espere. Na verdade... bem, isso é um pouco embaraçoso, mas eu tenho se-
guido o senhor por um tempo porque tenho um pedido. Eu sei que pode parecer que
estou cobiçando mais do que posso ter, e o senhor tem todo o direito de rir de mim, mas
se não se importar, o senhor poderia me ensinar a técnica que usou agora a pouco?”

“...O que quer dizer com isso?”

“Ah. Tenho estudado as artes marciais há muito tempo e gostaria de melhorar ainda
mais minhas habilidades. Depois que eu vi aquele seu movimento impecável, eu estava
esperando que o senhor pudesse me ensinar um pouco da sua técnica, se não for incô-
modo.”

O velho mediu Climb de cima à baixo.

“Hm... mostre-me suas mãos.”

Climb estendeu as mãos e o velho examinou cuidadosamente as palmas das mãos. Isso
fez Climb se sentir um pouco desajeitado. O velho virou as mãos, olhou para as unhas e
assentiu em satisfação.

“Ásperas e firmes. Estas são verdadeiramente as mãos de um guerreiro.”

O peito de Climb esquentou quando ele ouviu o elogio. A alegria em seu coração era
muito parecida com a que ele sentiu quando Gazef em pessoa o elogiou.

“Não, alguém como eu... mal serve ao título de guerreiro.”

“Eu não acho que você precisa ser tão humilde... Posso ver sua espada?”

O velho aceitou a espada e inspecionou o cabo. Então ele voltou seu olhar afiado para a
lâmina da espada.
“Entendo... isso é uma arma de reserva?”

“Como o senhor sabia!?”

“Como eu pensava. Veja, vê esta endentação aqui?”

Climb olhou para onde o velho estava apontando. Com certeza, parte da lâmina havia
sido danificada; provavelmente por causa de cortes errados feitos durante o treino.

“Peço desculpas por exibir algo tão vergonhoso!”

Climb ficou tão envergonhado que quis entrar em um buraco no chão.

Climb sabia que suas habilidades precisavam de mais refinamento, de modo que ele era
quase um neurótico para cuidar de suas armas, a fim de melhorar suas chances de vitória.
Ou pelo menos, achava que tinha sido... até agora.

“Entendo. Eu acho que tenho uma noção da pessoa que é. Para um guerreiro, sua arma
é como um espelho que reflete sua personalidade. Você é um homem muito admirável.”

As pontas das orelhas de Climb ainda estavam quentes quando ele levantou a cabeça
para olhar o velho.

Ele viu um sorriso benigno, gentil e cheio de elegância.

“Compreendo. Então, vou tentar te treinar um pouco. Contudo—”

Assim que Climb estava prestes a oferecer seus agradecimentos, o velho o interrompeu
e continuou falando.

“Tenho um assunto sobre o qual gostaria de lhe consultar. Você disse que era um sol-
dado, correto? Bem, há vários dias, eu salvei uma garota—”

Depois de ouvir a história do velho homem — Sebas —, ele ficou lívido de raiva.

Ele não podia esconder seu descontentamento com o fato de que as leis de manumissão
de escravos de Renner haviam sido mal utilizadas de tal maneira, e que as coisas não
haviam mudado até agora.

Não, isso não está certo. Climb sacudiu a cabeça.

As leis do Reino proibiam o comércio de escravos. Dito isto, era comum que as pessoas
fossem forçadas a trabalhar em condições precárias para pagar suas dívidas. Lacunas
como aquelas estavam por toda parte. De fato, foi por causa deles que a lei contra a es-
cravidão foi aprovada.
As leis de Renner foram inúteis. Esse pensamento arrepiante percorreu sua mente por
um momento, no entanto, ele logo o afugentou. Agora, ele tinha que pensar sobre a situ-
ação de Sebas.

Climb franziu a testa.

Sebas estava em uma posição muito ruim. Talvez se pudessem investigar o contrato da
garota, eles poderiam recusar, mas Climb não achava que a oposição não teria se prepa-
rado para essa eventualidade.

Se este assunto fosse para os tribunais, uma coisa era certa, Sebas perderia.

Seus adversários provavelmente não haviam entrado com um processo porque sentiam
que poderiam extorquir mais dinheiro dessa maneira.

“Conhece algum indivíduo justo que possa me ajudar neste assunto?”

Climb só conhecia uma dessas pessoas — sua mestra. Ele podia dizer com toda confi-
ança que nenhum nobre era mais correto e digno de confiança do que ela.

Claro, ele não poderia apresentar Renner a ele.

Dado que essas pessoas poderiam ir tão longe, elas certamente devem ter conexões de
longo alcance com aqueles no poder. Qualquer nobre envolvido com eles era certo de ser
influente. Se a Princesa — que era afiliada à Facção Real — tentasse investigar ou enviar
ajuda e assim danificasse um membro da Facção Nobre, poderia desencadear uma guerra
total entre os dois lados.

O uso do poder era um negócio complicado, especialmente em um país dividido como o


Reino. A Guerra Civil certamente era uma consequência muito real se a situação se de-
senrolasse erradamente.

Ele não podia pedir que Renner fizesse algo que separasse o país.

Essa foi a conclusão que ele havia chegado enquanto conversava com Lakyus e as outras.
Foi por isso que Climb não disse nada — ou melhor, ele não podia dizer nada.

“Entendo”, disse Sebas com a voz quase inaudível.

Não havia como saber como ele conseguira captar o tumulto interno de Climb, mas essas
palavras tiveram um impacto palpável em Climb.

“...Segundo ela, havia vários outros lá, homens e mulheres.”


Como pode? Só havia um bordel administrado pela Divisão de Escravatura. Existe outro?
Ou... é nesse lugar que o bordel de que falamos antes?

“Talvez pudéssemos pensar em uma maneira de libertá-los... Eu tenho que perguntar


primeiro a minha suserana, minha suserana controla um domínio, se pudéssemos deixar
essas pessoas escaparem...”

“Sua suserana pode fazê-lo? ...Isso significa que ela poderia se abrigar lá também?”

“...Peço perdão, Sebas-sama. Preciso esclarecer isso também com minha suserana. No
entanto, ela possui um grande coração. Eu não acho que vai haver problemas!”

“Oh... Sua suserana deve ser uma pessoa incrível já que a considera com tanto respeito.”

Climb assentiu profundamente em resposta a Sebas. De fato, não havia mestra mais acla-
mada do que Renner.

“Vamos para outro tópico. O que aconteceria se houvesse evidência de que esse bordel
violou a lei? Por exemplo, se eles estivessem comprovadamente envolvidos no tráfico de
escravos. Essa evidência seria destruída também?”

“A possibilidade existe, mas uma vez que a informação relevante seja levada às autori-
dades competentes... bem, espero que o Reino ainda não tenha se deteriorado até esse
ponto.”

“...Compreendo. Então, por favor responda mais essa pergunta. Por que quer se tornar
mais forte?”

“Eh?”

Climb grunhiu. Isso era de se esperar, dado que essa mudança de tópico foi mais drástica
do que a anterior.

“Bem, acabou de dizer que queria que eu o treinasse. Eu acredito em seus motivos, mas
também gostaria de saber o porquê deseja se tornar mais forte.”

Climb estreitou os olhos com a pergunta de Sebas.

Por que ele queria se tornar mais forte?

Climb já foi uma criança abandonada. Ele nem mesmo tinha visto os rostos de seus pais.
Essa não era uma ocorrência incomum no Reino. Órfãos morrendo na sarjeta faziam
parte do cotidiano.

Originalmente, Climb estava destinado a morrer de tal maneira naquele dia chuvoso.
E então — naquele dia, Climb viu o sol. Ele — um ser que só podia rastejar em meio à
sujeira e imundície — ficou profundamente fascinado com aquela resplandecência ja-
mais vista.

Quando criança, ele só sentia admiração. Mas à medida que envelhecia, um sentimento
dentro dele tornou-se cada vez mais inabalável.

—Amor.

Ele teve que anular essa emoção. Era um milagre, dos tipos que os bardos cantavam nas
sagas heroicas. E pensar que algo assim poderia acontecer na vida real. Assim como ne-
nhum homem poderia tocar o sol, Climb não seria capaz de alcançá-la. Além disso, ele
não podia fazer uma coisa assim.

A mulher que Climb amava tão profundamente estava destinada a ser a noiva de outra
pessoa. Como princesa, ela não poderia pertencer a alguém como Climb, cujas origens
eram incertas, ele conseguia ser menos influente que um plebeu.

Se o Rei falecesse, o Primeiro Príncipe herdaria o trono e Renner se casaria com um dos
Grandes Nobres. Com toda a probabilidade, o Príncipe já havia organizado algo assim
com algum deles. Ela pode até ser enviada para outro país como parte de um casamento
político.

O fato de que Renner — que estava em idade de casar — ainda era solteira e não tinha
nenhum noivo era um tanto surpreendente.

O tempo que passavam juntos se tornara tão precioso que ele pagaria qualquer preço
para deter a marcha do tempo, só para que ele pudesse preservar esses momentos dou-
rados para sempre. Se ele não gastasse seu tempo treinando, ele poderia aproveitar mais.

Mas Climb não tinha talento. Ele era um reles homem. Através do treino repetidas vezes,
ele se tornou bastante forte para um mero soldado. Então, ele não deveria se contentar
com isso? Ele não deveria parar de treinar, ficar do lado de Renner e não perder seu breve
tempo juntos?

Mas — isso realmente seria bom?

Climb admirava aquele brilho dourado como o sol. Isso não era mentira, ou algo que
dizia para se enganar. Era o desejo sincero de Climb.

Contudo—

“É porque eu sou um homem.”

Climb sorriu.
De fato. Climb queria ficar ao lado de Renner. O sol brilhava no céu, e um simples homem
não podia esperar alcançá-lo. Mesmo assim, Climb queria subir os picos mais altos para
chegar o mais perto possível.

Ele não queria apenas admirar e louvar o sol de longe.

Este era o desejo fraco de um jovem, mas ao mesmo tempo era um desejo que se encai-
xava perfeitamente a um jovem.

Ele queria se tornar um homem digno de ficar perto da mulher que admirava, mesmo
que sua união nunca pudesse ser concretizada.

Ele podia suportar sua vida sem amigos, seu treinamento intenso e trabalho tiravam seu
sono, pois eram alimentados por seu desejo.

Ele aceitou deixar os outros rirem dele por sua tolice.

Afinal, eles não conseguiam entender como se sentia, a menos que realmente amassem
alguém.

♦♦♦

Sebas estreitou os olhos enquanto estudava Climb. Havia um olhar severo em seu rosto,
como se ele estivesse tentando decifrar as sutilezas ocultas da resposta simples de Climb.

Então ele assentiu.

“Depois de ouvir sua resposta, decidi como te treinar.”

Assim que Climb estava prestes a oferecer seus agradecimentos, a mão estendida de
Sebas o deteve.

“No entanto — espero que perdoe minha franqueza — você não tem talento. O treina-
mento adequado levará muito tempo. Entretanto, não tenho esse tempo. Eu gostaria de
treiná-lo de uma forma que mostrará resultados rapidamente, mas será um processo ár-
duo.”

Climb engoliu em seco novamente.

O olhar nos olhos de Sebas causou um arrepio na espinha de Climb.

Aqueles olhos estavam cheios de um poder inacreditável, excedendo a pressão espiri-


tual que Gazef exercia quando ficava sério. Assim, ele não poderia responder imediata-
mente.

“Sendo sincero, você pode morrer.”


Não havia nenhum indício de falsidade nessas palavras.

Os instintos de Climb disseram isso a ele. Climb não temia a morte, mas ele queria mor-
rer por Renner. Não queria jogar sua vida fora por uma razão egoísta.

Ele não era um covarde— não, talvez tivesse uma parte muito covarde.

Climb engoliu mais uma vez e ficou imóvel. O silêncio encheu o ambiente por um tempo,
e ele podia até ouvir o clamor ao longe.

“Se você morre ou não, dependerá da sua atitude... se há algo importante para você, algo
que te faz querer viver, mesmo que seja apenas para te dar um chão a qual pisar, então
deve ficar bem.”

Ele não vai ensinar artes marciais?

Essa pergunta surgiu na mente de Climb, mas essa não era a questão agora. Ele ponde-
rou o significado das palavras de Sebas, certificou-se de que ele entendeu e então deu sua
resposta.

“Estou preparado para isso. Conto com sua ajuda.”

“Você acredita que vai morrer?”

Climb sacudiu a cabeça negativamente. Ele não acreditava.

Isso porque Climb sempre teria sua razão, uma que o manteria agarrado à vida, mesmo
que tivesse que fazê-lo rastejando como um verme.

Sebas olhou nos olhos de Climb, como se adivinhasse suas intenções. Então assentiu
com entusiasmo.

“Compreendo. Então, nós começaremos aqui.”

“Bem aqui?”

“Sim. Será rápido. Alguns minutos bastam. Por favor, saque sua espada.”

O que ele vai fazer?

Climb sacou a espada como solicitado. Seu coração era uma mistura de inquietação e
confusão sobre o desconhecido, com débeis fundamentos de curiosidade e expectativa.

O som da espada saindo de sua bainha ecoou pelo beco apertado.


Climb segurou sua arma em uma posição intermediária, os olhos de Sebas estavam fixos
nele.

“Aqui vou eu. Por favor, tente permanecer consciente.”

E no momento seguinte—

—Era como se Sebas estivesse irradiando navalhas de gelo em todas as direções.

Climb não conseguia nem mesmo falar.

Sebas agora estava no centro de um vórtice de intenção assassina.

Essa sede de sangue era forte o bastante para esmagar o coração de Climb em um ins-
tante, parecia quase tangível quando caiu sobre ele como um tsunami. Em algum lugar
distante, ele podia ouvir o grito de uma alma sendo pulverizada. Estava perto e longe ao
mesmo tempo, e talvez o clamor pudesse ser de sua própria alma.

Quando o fluxo obsidiana da intenção assassina o tomou, Climb sentiu sua consciência
lentamente descolorir-se no branco infinito. Este terror esmagador fez seu corpo querer
abandonar as amarras da mente, ele foi levado pela onda que o inundava.

“...É só isso que ser um Homem significa para você? Foi apenas um aquecimento.”

A voz desapontada de Sebas parecia anormalmente alta nas profundezas da consciência


desvanecida de Climb.

O significado dessas palavras perfurara Climb mais fundo que qualquer lâmina. Até o
fez esquecer o medo diante dele por um momento.

Seu coração batia pesadamente em seu peito.


“Huuuuuuuuuhhhhh!” Climb ofegou.

Ele estava apavorado. Ele queria correr. Mas lutou contra o desejo de fazê-lo, mesmo
quando as lágrimas escorriam por suas bochechas. Suas mãos tremiam quando segura-
ram sua espada, e a ponta de sua espada movia como uma abelha confusa intoxicada de
fumaça. Sua camisa cota de malha fazia ruídos de seus tremores de corpo inteiro.

Mesmo assim, Climb cerrou os dentes e tentou resistir ao terror mortal que vinha de
Sebas.

Sebas riu da visão patética diante dele. Então trouxe a mão direita diante dos olhos e,
lentamente, cerrou o punho. Em um piscar de olhos, o punho se fechou tão firme quanto
uma bola de aço.

Ele então puxou o punho para trás, como se estivesse fazendo um arco.

Climb entendeu o que ia acontecer e balançou a cabeça. Claro, Sebas não deu atenção à
sua resposta.

“Então... prepare-se para morrer.”

O punho de Sebas rasgou o ar com um whoosh, como uma flecha disparada com toda a
força.

Foi a morte instantânea.

A marcha do tempo pareceu desacelerar, pelo menos assim os instintos de Climb enten-
deram. A imagem de sua morte certa dominou sua mente, como uma enorme bola de
demolição que várias ordens de grandeza maior do que ele, aproximando-se a velocida-
des incríveis. Mesmo que ele levantasse a espada para bloquear, aquele punho certa-
mente a esmagaria facilmente.

Seu corpo estava congelado. Ele ficou inflexível pela tensão.

—Ele não poderia escapar da morte diante dele.

A renúncia de Climb a seu destino o encheu de raiva.

Se ele não pudesse morrer por Renner, então por que ele não havia morrido naquele dia
álgido? Ele deveria ter congelado até a morte durante aquela chuva e desapegado do seu
corpo mortal na solidão.

O belo sorriso de Renner apareceu diante dele.


Dizia-se que à beira da morte, as pessoas veriam suas vidas passarem diante de seus
olhos como as animações de um zootropo. A opinião comum era que o intelecto do indi-
víduo procuraria desesperadamente pelos eventos passados de sua vida tentando achar
uma maneira de escapar de sua situação atual. No entanto, foi um tanto risível que a úl-
tima coisa que Climb se deparou foi com o sorriso de sua amada princesa.

De fato, Climb viu Renner sorrindo.

Quando ela o salvou, a jovem Renner não sorriu. Quando ela começou a sorrir para ele?

Ele não conseguia lembrar. No entanto, ele se lembrava vividamente do sorriso singelo
de Renner naquela época.

Como ela reagiria se soubesse que Climb tinha morrido? Esse sorriso perderia seu bri-
lho, como as nuvens obscurecendo o sol?

—Como posso deixar isso acontecer?!

Uma onda de raiva surgiu no coração de Climb.

Ela a recolheu de sua vida descartada na sarjeta. Isso significava que sua vida não era
mais sua. Ele vivia para Renner... para lhe conceder alegria, por mais minúsculo que
fosse—

Tem que haver um modo de superar isso—!

A paixão explosiva dentro dele estraçalhou as correntes de medo que o mantinham pri-
sioneiro.

Suas mãos podiam se mover.

Suas pernas podiam se mover.

Os olhos que procuravam apenas se fechar devagar se abriram, procurando desespera-


damente a imagem do punho que lhe chegava.

Seus sentidos foram levados ao seu limite, até o ponto em que ele podia sentir os leves
movimentos das partículas no ar.

Havia um fenômeno chamado de “pico de adrenalina”, onde o cérebro de alguém em


extrema dificuldade liberavam os limites de seus corpos físicos, permitindo uma explo-
são de incrível poder.

Ao mesmo tempo, o cérebro secretaria vastas quantidades de hormônios e a capacidade


total da mente seria focada na sobrevivência. O cérebro computaria vastas quantidades
de informação para encontrar a melhor maneira possível de viver.
Naquele momento, Climb havia entrado no reino de um guerreiro de primeira classe. No
entanto, a velocidade do ataque de Sebas estava além daquele domínio elevado. Talvez
fosse tarde demais para desviar do punho de Sebas. Talvez sempre tenha sido tarde de-
mais. Mesmo assim, ele ainda precisava se mexer. Ele não podia desistir aqui.

A marcha do tempo acelerava rapidamente, mas Climb percebeu que seus próprios mo-
vimentos eram tão lentos quanto o escorrer do melaço. Mas ainda assim, ele se virou,
tentando se mover.

E então—

O punho de Sebas passou pelo rosto de Climb, com o som do trovão. O vendaval que
seguiu cortou vários fios do cabelo de Climb.

Uma voz calma filtrou em seus ouvidos.

“Parabéns. Como se sente ao conquistar o medo da morte?”

“—”

Climb ficou ali parado, incapaz de entender o significado.

“Como foi enfrentar a morte? Como foi superá-la?”

Climb respirando pesadamente, olhou para Sebas como se sua alma tivesse sido rou-
bada. Não havia hostilidade em torno de Sebas, como se tivesse sido nada mais que uma
mentira. Ele relaxou quando começou a perceber a intenção de Sebas.

Climb desabou como uma marionete cujas cordas foram cortadas, como se não mais
suportasse a intenção assassina de instantes atrás.

Ele caiu de quatro no beco, famintamente, ofegando ar fresco em seus pulmões.

“...Felizmente você não morreu de choque. Essas coisas acontecem quando alguém está
tão certo da sua morte que desiste da vontade de viver.”

Havia um gosto amargo nas profundezas da garganta de Climb. Ele estava certo de que
era o gosto da morte.

“Se você repetir isso mais algumas vezes, tenho certeza de que será capaz de superar o
medo comum aos vivos. No entanto, não se esqueça que o medo desencadeia o instinto
de sobrevivência. Se ficar entorpecido a essa sensação, então será incapaz de sentir um
perigo mesmo se estiver na sua frente. Você precisa ser capaz de dizer claramente
quando uma verdadeira ameaça se aproxima.”
“...Perdoe-me por bisbilhotar, mas que tipo de homem o senhor é?”

Climb pranteou de seu lugar no chão.

“O que quer dizer?”

“Essa, essa intenção assassina não foi normal. O que exatamente—”

“Sou simplesmente um homem velho que tem alguma confiança nas habilidades que
adquiri. Por hora é isso.”

Climb não conseguia tirar os olhos do rosto de Sebas. O que parecia ser um sorriso agra-
dável também parecia um sorriso selvagem de um poder absoluto; aquele que ultrapas-
sava em muito Gazef.

Ele era provavelmente um ser maior do que Gazef, o mais poderoso guerreiro das na-
ções vizinhas.

—Climb quis que sua curiosidade fosse saciada. Ele achava que seria melhor não conti-
nuar investigando esse mistério.

Mesmo assim, de onde esse cavalheiro, Sebas, veio? Essa era a única questão que ardia em
seu coração. Ele até se perguntou:

Será que é um dos Treze Heróis?

“Então, vamos tentar de novo—”

“—Espere! Por favor, espere! Eu, eu tenho algo para perguntar a vocês dois.”

De trás de Sebas, a voz de um homem assustado o interrompeu.

Parte 4

3º Dia do mês Baixo Fogo (9º mês) – 10:27

Brain saiu da casa de Gazef.

Ele olhou para trás e pensou no retorno, e assim memorizou a aparência externa da casa.
Sua memória estava confusa dado a quase o estado hipotérmico quando Gazef o trouxe
para cá, de modo que suas lembranças de dias atrás estavam nebulosas.
Ele conhecia o endereço de Gazef porque planejava desafiar o homem para um duelo
algum dia. No entanto, essa informação foi coletada de boca a boca, e era um pouco im-
precisa.

“Não há espada alguma cravada no telhado.”

Ele execrou as informações que o informante lhe dissera, então inspecionou cuidadosa-
mente a casa.

Era muito menor do que as residências nobres, e parecia mais uma morada de plebeu.
No entanto, era mais do que suficiente para Gazef e o casal de caseiros que moravam com
ele.

Depois de memorizar o exterior da casa, Brain ajeitou sua postura.

Ele não tinha nenhum destino específico em mente.

Ele não queria comprar armas, armaduras ou itens mágicos.

“O que farei agora...”

Sua voz em tom de resmungo se dissipou no ar.

Ele não se opunha a idéia de sair vagando até desaparecer em algum lugar. Na verdade,
tal pensamento ainda era bastante atraente.

Ele procurou em si mesmo o que deveria fazer em seguida, mas encontrou apenas um
vazio no coração. Seu objetivo foi destruído e totalmente aniquilado, sem deixar vestígios
para trás.

Sendo esse o caso, por quê—

Ele olhou para a mão direita, que ainda segurava sua Katana. Ele ainda usava a camisa
de cota de malha por baixo das roupas.

Foi o medo que manteve a espada na mão durante sua jornada à Capital Real. Ele sabia
que sua lâmina era inútil contra aquele monstro que poderia defletir seus melhores ata-
ques com a unha do dedo mindinho, mas ficar desarmado continuava assustando-o.

Sendo esse o caso, por que ele ainda estava segurando sua espada? Ele poderia tê-la
deixado na casa de Gazef. Foi porque ele ainda estava com medo?

Brain pensou sobre isso e então balançou a cabeça.

Não era por isso.


Nesse caso, por que ele estava segurando sua Katana? No fim, a resposta não veio.

Brain recordou a primeira vez que ele veio para a Capital Real enquanto caminhava.
Alguns edifícios permaneceram os mesmos, como a Guilda dos Magistas ou o Palácio Real,
mas havia muitos edifícios novos que estavam ausentes de suas memórias. Enquanto
Brain saboreava a diferença entre suas memórias e a realidade, ele notou um alvoroço à
sua frente.

O barulho o fez franzir as sobrancelhas. Ele sentiu a violência vindo da multidão à frente.

Brain estava prestes a ignorar e ir para outro lugar quando um homem velho chamou
sua atenção. O velho entrou na multidão, como se estivesse deslizando entre as massas.

“...O que, o que é isso? Que tipo de movimento é esse?”

Ele piscou várias vezes, inconscientemente ofegando em reverência. Os movimentos do


velho o fizeram ficar incrédulo. Brain se perguntou se estava sonhando tardiamente, ou
se havia sido afetado por algum tipo de magia.

Talvez até mesmo Brain não seja capaz de se mover como o velho. Era uma técnica digna
de alguma divindade, que exigia uma compreensão aguda da vontade de sua contraparte,
ou neste caso, os fluxos de força e movimento de toda a multidão.

Em outras palavras, esses movimentos estavam em uma espécie de pináculo.

Seus pés o levaram para a multidão sem hesitação.

Brain empurrou os outros para fora do caminho, e quando chegou ao centro, ele viu o
instante em que o velho atingiu o queixo de um homem mais jovem.

Quê? Eu... eu conseguiria bloquear esse golpe? Seria difícil... eu acho. Ele distraiu a atenção
do outro homem? Estou imaginando coisas? Ainda assim, foi um golpe magnífico. Isso vale-
ria ser ensinado em um tomo ou algo assim...

Ele grunhiu para si mesmo enquanto relembrava o soco que acabara de ver em sua
mente.

Era certo que ele não tinha conseguido analisar completamente, e era muito difícil com-
parar espadachins e pugilistas na mesma escala. Mesmo assim, esse breve vislumbre fez
com que Brain percebesse que o velho diante dele era incrivelmente habilidoso.

Por tudo o que ele sabia, aquele velho podia até ser mais forte que ele mesmo.

Brain mordeu o lábio inferior enquanto comparava o perfil do rosto do velho à lista de
expoentes marciais em sua memória. No entanto, ele não encontrou nenhum que fosse
correspondente.
Quem é ele?

O velho deixou a multidão em um instante. Um adolescente começou a segui-lo. Por um


capricho, Brain seguiu o menino, como se tivesse sido fisgado por alguma isca.

Seus instintos lhe disseram que o velho homem tinha olhos na parte de trás da cabeça,
então não se atreveu a segui-lo diretamente. No entanto, se seguisse o jovem, ele não
teria que se preocupar em ser visto. De um ponto de vista mais esperto, ele ainda estaria
seguro, mesmo que o menino fosse descoberto.

Enquanto os seguia, Brain sentiu várias outras presenças. No entanto, Brain não se im-
portou.

Em pouco tempo, os dois viraram uma esquina e entraram em uma área escura. Brain
se sentiu desconfortável, pois esse movimento parecia calculado para atraí-lo para uma
armadilha.

Aquele garoto não acha estranho?

Enquanto o sentimento de surpresa o preenchia, o menino falou com o velho.

Os dois falaram perto do ponto de virada de um beco. Assim, Brain se escondeu na curva
e os espionou.

Em resumo, o menino estava pedindo ao velho para treiná-lo.

Até parece... Um velho desse porte nunca aceitaria um pirralho como esse como discípulo.

Se alguém fosse comparar os dois, o menino seria uma pedrinha, enquanto o velho era
uma rocha gigantesca. Os dois viviam em mundos completamente diferentes.

...Que pena. Não saber o quanto é inferior a alguém. Desista garoto.

Brain não falou essas palavras, apenas resmungou para si mesmo.

Essas palavras foram dirigidas ao menino, elas também foram uma crítica sincera de um
idiota que já se considerou invencível — indubitavelmente, seu eu passado.

Ele continuou ouvindo — embora não tivesse interesse em fofoca — e ao que pareceu,
o velho estava disposto a treinar o jovem. Brain não tinha idéia do que aquele garoto
tinha a oferecer ao ponto de interessar àquele incrível homem.

É isso mesmo? Eu já julguei mal alguém de novo? Não, não pode ser. Esse garoto tem pouca
habilidade como guerreiro. É certo que ele não tem talento algum!
Como o velho o treinaria? Ele só podia ouvi-los daqui, mas não conseguia ver o que es-
tava acontecendo. Curioso, Brain escondeu sua presença e se apressou para espioná-los.
Mas antes que ele soubesse—

Uma aura aterrorizante passou por ele.

Ele gritou sem palavras.

Seu corpo inteiro congelou de medo.

Parecia um enorme carnívoro pressionando sua bocarra sedenta por sangue perto dele,
exalando por todo o corpo. A torrente de intenção assassina tingia o mundo de uma cor
diferente. Ele não conseguia nem piscar, muito menos se mexer. Por um momento, ele
pensou que seu coração havia parado de bater.

Brain pensou que Shalltear Bloodfallen era o ser mais poderoso do mundo, mas o que
ele sentia agora era comparável a ela.

Uma pessoa fraca poderia morrer ao presenciar essa intenção assassina.

Suas pernas tremeram e ele caiu no chão.

Olha, olha o estado que fiquei. Isso significa que aquele menino... morreu?

Se o menino tivesse sorte, poderia desmaiar antes disso.

Brain se arrastou pelo chão, nervosamente ansiando ver os dois. O que ele viu o chocou
até o cerne, a ponto de ele esquecer seu medo por um momento.

O garoto ainda estava de pé.

Suas pernas tremiam como as de Brain. Mas ele ainda estava de pé.

O que está acontecendo? Como aquele pirralho sem talento ainda está em pé?!

Brain não conseguia entender por que o jovem ainda podia ficar de pé enquanto o medo
reduzia suas pernas a uma poça de geleia trêmula.

Ele tinha algum tipo de item mágico ou arte marcial que resistisse ao medo? Ou ele tem
algum talento especial?

De fato, não havia como garantir que ele não possuísse tal item. No entanto, seus instin-
tos lhe disseram que nenhum dos itens acima se aplicava quando ele olhou para o garoto
de pé, mesmo todo trêmulo. A resposta era difícil de acreditar, mas foi a única possível.

Aquele garoto era mais forte que Brain.


Impossível! Não pode ser!

O garoto parecia ter tido algum treinamento, mas não tinha músculos suficientes. De-
pois de observar o modo como o garoto se movia enquanto o seguia, Brain concluiu que
o garoto tinha algum talento, mas não tanto assim. E ainda assim, esse garoto comum
estava em pé, enquanto ele estava se arrastando no chão.

É isso mesmo? Eu sou realmente tão fraco assim?

Sua visão ficou turva.

Brain sabia que estava chorando, mas não conseguiu enxugar as lágrimas.

Ele tentou engolir seus lamentos, mas as lágrimas continuaram fluindo independente-
mente.

“Por que, ah... por quê?”

Brain se apoiou no chão e tentou se obrigar a ficar de pé. No entanto, o tsunami mortí-
fero o deixara imóvel. Suas pernas se recusaram a mover, como se estivessem sob o con-
trole de outra pessoa. Tudo o que ele podia fazer era levantar a cabeça e observar os dois.

Ele viu suas costas.

O menino ainda estava de pé, o mesmo de antes.

O garoto ainda poderia ficar de pé contra aquele velho e sua onda de intenção assassina.
Mesmo aquelas costas fracas pareciam longe demais para ele alcançar.

“Eu sou...”

Ele era realmente tão fraco?

Quando a onda de sede de sangue se dispersou como névoa, ele conseguiu se pôr de pé.
Esse fato frustrou Brain.

O velho e o menino pareciam que treinariam mais, mas Brain não conseguia mais se
conter. Reunindo coragem, ele saiu correndo da esquina e gritou:

“—Espere! Por favor, espere! Eu, eu tenho algo para perguntar a vocês dois.”

Brain deliberadamente interrompeu a sessão de treinamento, nem mesmo pensou em


escolher um bom momento para tal.
O jovem se virou quando ouviu aquele grito desesperado. Seus ombros estremeceram e
houve uma expressão de surpresa no rosto. Em sua posição, Brain provavelmente teria
feito o mesmo.

“Primeiro, por favor, deixe-me pedir desculpas a vocês dois. Eu simplesmente não podia
esperar mais.”

“...O senhor o conhece, Sebas-sama?”

“Não, eu não. Entendo, então ele não era seu amigo também.”

Os dois olhares suspeitos para ele, mas Brain já esperava algo assim.

“Por favor, permita que este que vos fala diga como se chama. Este que vos fala se chama
Brain Unglaus. Por favor, este que vos fala sabe que isso foi muito rude e reza que seja
perdoado. Este que vos fala realmente sente muito por isso.”

Ele se curvou ainda mais do que antes e pôde sentir um leve movimento dos dois.

Depois de esperar por um tempo suficientemente longo para transmitir sua sinceridade,
Brain levantou a cabeça e sentiu que a cautela com relação a ele havia diminuído um
pouco.

“Então, o que te traz aqui?”

Em resposta à pergunta do velho, Brain olhou para o jovem.

“Como conseguiu fazer aquilo?”

Quando ele viu a dúvida nos olhos do garoto, Brain perguntou mais uma vez, como se
estivesse tossindo sangue.

“Como... como pôde permanecer de pé diante daquela intenção assassina?”

Seus olhos se abriram. Ele tipicamente fingia um olhar sem vida, mas essa pequena mu-
dança indicava uma enorme agitação emocional dentro dele.

“Só queria saber... Essa onda de sede de sangue era mais do que a maioria das pessoas
pode suportar. Mesmo eu... perdão, mesmo este que vos fala não poderia suportar isso.
Ainda assim, se provou diferente. Suportou aquilo de pé. O enfrentou. Como fez aquilo?
Como conseguiu tal façanha?”

Sua excitação o fez repetir-se, mas ele não podia reprimir. Quando confrontado com o
poder esmagador de Shalltear Bloodfallen, ele tivera tanto medo que fugiu. No entanto,
esse garoto havia enfrentado o mesmo grau de intensão assassina e se manteve firme.
Ele queria saber qual era a diferença entre eles.
Ele tinha que descobrir, não importava o custo.

Brain parecia ter transmitido toda sua sinceridade para o garoto. Climb estava confuso,
mas considerou cuidadosamente o assunto antes de responder:

“...Eu não sei. Não entendo muito bem. Não tenho idéia de como pude suportar aquela
tempestade sedenta por sangue. Ainda assim, talvez... talvez tenha sido porque eu estava
pensando em minha suserana.”

“...Sua suserana?”

“Sim. Enquanto eu pensar na grande pessoa a quem sirvo, terei forças para continuar.”

Como alguém poderia se manter de pé apenas por isso, Brain quase gritou. Mas antes
disso, o velho explicou calmamente seu significado.

“Em outras palavras, a lealdade foi suficiente para superar o medo, Unglaus-san. As pes-
soas podem exercer grande força por algo que apreciam. Por exemplo, uma mãe pode
segurar um pilar em uma casa em colapso para salvar seus filhos, ou um marido pode
segurar sua esposa com uma mão sem deixá-la cair. Eu sinto que esse é o poder da hu-
manidade. Em outras palavras, esse jovem soube aproveitar desse poder. Também não
está limitado a ele. Contanto que você tenha algo que não abandonará, certamente será
capaz de aproveitar a força que jamais poderia ter imaginado.”

Brain não pôde acreditar. Seu objetivo, a coisa que ele não abandonaria — era sua sede
por se tornar mais forte. Mas isso era algo que ele não mais sentia. Esse sonho tinha sido
facilmente destruído, e tudo o que ele pôde fazer foi fugir com medo.

O rosto de Brain ficou sombrio e ele abaixou a cabeça olhando para o chão. Então, as
próximas palavras do velho o fizeram levantar a cabeça novamente.

“...Algo construído por você mesmo é frágil. Quando você cair, será seu fim. Não confie
em si mesmo para tudo. Se puder construir sua confiança com outra pessoa e se doar
para os outros, então você não cairá mesmo se sofrer um revés.”

Brain ficou em silêncio. Ele tinha algo assim?

Ele não conseguia pensar em nada. Isso porque ele havia abandonado todo o resto, ex-
ceto sua busca pela esgrima. Poderia ser que as coisas que ele havia descartado em sua
busca por força fossem realmente as coisas mais importantes?

Brain não pôde deixar de rir. Ele riu de sua vida cheia de erros. Nem ele pôde evitar a
reclamação amarga que depois escapou dele.

“Eu abandonei tudo. É tarde demais para eu recuperar o que abandonei?”


“Vai ficar tudo bem. Mesmo alguém sem talento como eu conseguiu fazê-lo. Alguém
como você pode certamente fazer isso também, Unglaus-san! Definitivamente não é
tarde demais para você!”

Não havia base para as palavras do jovem. No entanto, por mais estranho que pareça,
suas palavras aqueceram o coração de Brain.

“Você é realmente uma pessoa gentil e forte... Eu realmente sinto muito.”

O garoto congelou quando Brain se desculpou com ele do nada.

Brain tinha presumido que garoto corajoso diante dele era um mero pirralho e com isso
o desprezou.

Eu sou um idiota. Um tolo...

“Ah, sim, você disse que se chamava Brain Unglaus... você é o mesmo Brain Unglaus que
lutou com o Stronoff-sama no torneio que teve tempos atrás?”

“...Então você sabe disso também... Assistiu a luta?”

“Ah, não. Eu ouvi dos outros. Stronoff-sama disse que era um incrível espadachim, e que
estava no caminho para ser o homem mais forte do Reino. Depois de ver seus movimen-
tos e sua calma, agora percebo a verdade das palavras de Stronoff-sama!”

Inundado pela sinceridade da boa vontade de Climb, Brain se esforçou para balbuciar
uma resposta.

“...Er, obrigado... muito obrigado. Eu sinto que tenho um longo caminho a percorrer,
mas... fico realmente grato que alguém como você me elogie.”

“Hm... Unglaus-san.”

“Senhor, por favor, me chame de Unglaus. Não há necessidade de usar qualquer honori-
fico para um perdedor como eu.”

“Nesse caso, eu sou Sebas Tian, mas espero que me chame de Sebas... Então, Unglaus-
kun.”

Ser endereçado como “-kun” envergonhou Brain um pouco, mas dada a diferença em
suas idades, tal termo era apropriado.

“Posso lhe confiar a responsabilidade de treinar o Climb-kun? Eu acredito que isso tam-
bém será benéfico para você, Unglaus-kun.”
“Ah! Me perdoe! Me chamo Climb, Unglaus-sama.”

“Você não seria treinado por ele... me perdoe. Sebas-sama não o treinaria? Eu acredito
que eu os interrompi enquanto estava no meio de uma sessão...?

“Certamente. Essa era a minha intenção original, mas parece que temos convidados. Eu
pretendia chamar eles — ah, eles chegaram. Parece que eles demoraram um pouco para
se prepararem para a batalha.”

Sebas olhou para o lado. Brain demorou um pouco mais para olhar na mesma direção.

Três homens se revelaram lentamente. Eles usavam cotas de malha e carregavam pu-
nhais afiados em mãos protegidas por luvas de couro reforçado.

Eles não estavam irradiando hostilidade, mas cheios de intenção assassina. A intenção
parecia ser dirigida ao velho, mas eles não pareciam do tipo que deixariam testemunhas
vivas.

Brain estava visivelmente chocado quando os viu, e ele gritou:

“Nem pensar! Eles querem vir depois de sentirem aquela sede de sangue? Quão forte
esses caras são?!”

Se fosse esse o caso, então cada um deles provavelmente estava no mesmo nível de
Brain — não, eles seriam mais fortes que ele. Poderia ser que suas habilidades de ignorar
tal fato fossem porque eram guerreiros treinados e não eram adeptos de seguir os ou-
tros?

E então, Sebas aliviou as preocupações de Brain.

“Eu confio que está ciente de que eu apenas dirigi a minha intenção só para vocês dois,
não?”

“...Eh?”

Até mesmo Brain sentiu que sua resposta parecia muito estúpida.

“A intenção assassina dirigida ao Climb-kun foi para treiná-lo. No seu caso, foi porque
eu não sabia quem você era, portanto quis atrai-lo. Além disso, foi para sentir sua vontade
de lutar, hostilidade e assim por diante. Mas aqueles senhores ali, eu os via como inimigos
desde o início, então não direcionei minha intenção assassina para eles. Seria ruim as-
sustá-los.”

Brain ficou chocado além da capacidade de expressar quando ouviu Sebas casualmente
explicar a surpreendente verdade. Ser capaz de controlar com precisão a intenção assas-
sina daquela intensidade estava além do que ele sabia ser possível.
“Eu, eu entendo. Então, o senhor sabe quem eles são, Sebas-sama?”

“Eu posso adivinhar. Ainda assim, não tenho certeza. Por isso, desejo capturar um ou
dois deles para questionamento. Contudo—”

Sebas baixou a cabeça em desculpas.

“Parece que eu acidentalmente envolvi vocês dois nisso. Posso incomodá-los a deixar
este lugar?”

“Antes disso, gostaria de fazer uma pergunta se assim permitir. Eles são... criminosos?”

“Sinto que são algo assim. Eles obviamente são maus elementos.”

Um fogo brilhou nos olhos de Climb quando ele ouviu Brain dizer isso.

“Talvez eu atrapalhe, mas quero lutar também. Como um homem que protege a ordem
pública da Capital Real, cabe a mim defender o povo.”

Não é como se tivéssemos certeza de que esse homem, Sebas, está do lado do bem aqui...

Pensou Brain para si mesmo, interpretando o advogado do diabo com essa declaração.
De fato, dada sua atitude honesta e objetiva, Sebas certamente parecia estar certo em
relação àquele bando. No entanto, eles não podiam ter certeza disso.

Ele é realmente neutro...

Ainda assim, ele podia entender como o garoto se sentia.

Até mesmo Brain poderia imediatamente concluir a quem ajudar, é claro que seria o
homem que salvou uma criança de um bando de baderneiros bêbados ao invés de um
bando de homens suspeitos.

“Pessoalmente, eu realmente não acho que o senhor precisa da ajuda, mas... Sebas-sama.
Por favor, permita que eu... er, não, por favor, permita que este quem lhe fala ajude.”

Brain tomou o seu lugar ao lado de Climb. Sebas não precisava da ajuda deles. Na ver-
dade, ele até disse que seria melhor se eles fossem embora. No entanto, ele queria apren-
der com Climb, alguém que lutava pelos outros. Ele queria escolher o caminho que o seu
eu passado nunca escolheria. Ele queria proteger o garoto cujo o coração era forte, mas
a esgrima era fraca.

Brain viu as armas que estavam segurando e franziu a testa.


“Aquilo é, veneno... Usar uma espada de dois gumes como essa indica que eles devem
ter alguma experiência... são assassinos?”

Os punhais que eles estavam usando eram chamados de Rompe-Malha. Havia reserva-
tórios esculpidos nas lâminas de suas armas e os reservatórios refletiam o brilho oleoso
de algum liquido desconhecido. O fato de que esses homens pareciam priorizar agilidade
e facilidade de movimento — diferentemente dos espadachins profissionais — era uma
indicação melhor da verdade do que os murmúrios autodirigidos de Brain.

“Climb-kun, é melhor tomar cuidado. A menos que você tenha um item mágico que re-
sista ao veneno, não seja arranhado por aquilo mais de uma vez.”

Alguém com o nível de proeza física de Brain era praticamente imune ao veneno, mas
Climb poderiam sucumbir a toxinas fortes.

“Eles vieram de frente, mas não estão fazendo nada. Eles estão esperando que as outras
duas pessoas circulem atrás de nós? Isso é uma oportunidade rara, por que não ir para
cima com tudo sem esperar?”

Sebas deliberadamente levantou a voz alto o suficiente para que eles ouvissem, e os mo-
vimentos dos homens congelaram. Eles tinham sido claramente abalados pela exposição
do seu plano de cerco.

“Isso parece certo. Seria mais seguro derrotar os que estão na frente e depois os que
viessem por trás.

Parece que Brain compartilhava a opinião de Sebas. No entanto, o próprio Sebas rejeitou
as palavras de Brain.

“Ah, mas isso abriria uma brecha para que fujam. Que tal isso — eu vou lidar com os três
na frente, os dois que virão na retaguarda, posso deixá-los para vocês?”

Brain acenou com cabeça, Climb também o fez. Esta luta pertencia a Sebas, e foram eles
dois que pediram a Sebas para participarem. Eles deveriam ouvir Sebas enquanto ele não
cometesse erro fatal algum.

“Tudo bem, vamos.”

Depois de dizer isso para Climb, Brain virou as costas para os homens. A razão pela qual
ele ousou abaixar a guarda foi porque Sebas estava por perto. Quando ele deixou a reta-
guarda para Sebas, ele se sentiu tão seguro como se fosse defendido por uma densa mu-
ralha de castelo.

“Bem, pode ser meio vergonhoso... mas por favor, permita-me ser seu oponente— oya,
por favor, não joguem nenhum projétil nesses dois, entendido?”
Olhando para trás, Brain viu Sebas com três punhais presos entre os dedos da mão di-
reita. Ele abriu a mão e os punhais que eles atiraram contra Brain e Climb, que estavam
vulneráveis, caíram no chão.

A intenção assassina dos homens estava ficando mais fraca.

Mas é claro. Qualquer um perderia a vontade de lutar depois de ver seus punhais serem
apanhados dessa maneira. Vocês finalmente perceberam o quão poderoso o Sebas-sama é?
Que pena, aprenderam isso tarde demais.

Eles estavam todos dançando na palma da mão do velho. Mesmo se dividissem os 3 não
seria de ajuda alguma.

“Surpreendente.”

Disse Climb ao lado de Brain.

“Concordo. Se me disserem que o Sebas-sama é o homem mais forte do Reino, eu acre-


dito sem pestanejar.”

“Ainda mais forte que o Capitão Guerreiro?”

“Stronoff? Hm. Bem, esse velho é alguém que este... eu mesmo... desculpe, falarei em um
tom mais informal agora. Mesmo que o Stronoff e eu estivéssemos contra ele de uma só
vez, a gente perderia com certeza... oh, eles chegaram.”

Os outros dois homens deram a volta e apareceram atrás deles. Os dois estavam vestidos
da mesma maneira que os três primeiros.

O som de uma espada deixando a bainha veio do lado de Brain e, um momento depois,
Brain sacou sua própria lâmina.

“Eles provavelmente saíram do esconderijo ao invés de arremessarem mais facas, pois


suas intenções foram descobertas.”

As emboscadas só funcionavam quando eram inesperadas. Se alguém tivesse visto de


antemão, então eles só estariam dividindo suas forças. O inimigo deve ter julgado que
seria melhor atacar todos de uma vez, agora que haviam sido expostos.

“Ingênuos demais... Climb-kun, cuidarei da direita. Você segure o da esquerda.”

Depois de examinar seus movimentos, Brain sentiu que um deles era mais fraco do que
o outro e indicou para o jovem ao lado dele. O jovem assentiu e ergueu a espada. Seus
movimentos não hesitantes eram aqueles que só se podia encontrar naquelas pessoas
que haviam lutado por suas vidas. Brain ficou aliviado por não ser um recém-chegado
que nunca tinha lutado a sério.
O Climb-kun deve ter a vantagem, mas... dado que seu oponente usa veneno, pode ser uma
vitória muito disputada.

Mesmo que Climb tivesse experiência real de combate, Brain não sentia que ele era um
guerreiro banhado em sangue, ou que havia enfrentado oponentes que usavam veneno.
Por tudo que ele sabia, essa poderia ser sua primeira vez fazendo isso.

Até mesmo Brain teve problemas contra monstros que usavam ácidos corrosivos ou po-
deroso veneno. Quando os combatia, ele tornava-se excessivamente cauteloso e não con-
seguia exercer toda a sua força.

Devo matar esse cara imediatamente e depois ajudá-lo? Isso o ajudaria em algo? Será que
machucaria seu orgulho se eu saísse do meu caminho para ajudá-lo? Devo lutar contra eles
em seu nome? Ou o Sebas-sama pretendia ajudar se houver algum perigo? Se o Sebas-sama
não intervir, isso significa que eu deveria? Pensar que chegaria o dia em que eu realmente
me preocuparia com algo assim...

Brain coçou a cabeça com a mão livre e encarou seu inimigo.

“Tudo bem. Desculpem-me por ter que te usar como sacrifício para compensar o tempo
ocioso que gastei.”

♦♦♦

Três acertos.

Sebas entrou no alcance dos três homens, eles não puderam nem reagir, muito menos
se defenderem. Então Sebas socou três vezes e a luta acabou.

Mas é claro. Sebas ocupava o pináculo do poder de combate de Nazarick. Ele podia lidar
com assassinos desse calibre apenas com a ponta do dedo mindinho.

Os homens se curvaram, caindo no chão como um molusco choco. Sebas se afastou deles
e olhou para a batalha atrás dele.

Brain havia dominado seu inimigo do começo ao fim, o que o deixou à vontade.

O assassino que estava de frente para ele parecia estar procurando uma chance de fugir,
mas Brain não o deu essa oportunidade. Na verdade, ele até parecia estar brincando com
seu oponente... não, isso não era meramente uma brincadeira. Sebas sentiu que Brain
estava passando por seu repertório de movimentos para refazer suas habilidades enfer-
rujadas.
Certo, acho que o ouvi dizer algo sobre “compensar o tempo ocioso”. Além disso, ele parece
estar preocupado com o Climb-kun. Assim, ele não está lutando a sério para poder vir em
seu auxílio a qualquer momento. Ele parece ser um bom sujeito.

Sebas mudou sua atenção de Brain para Climb.

Hm, ele deve ficar bem.

A batalha estava em um vai e vem. O fato de seu adversário usar veneno o deixou um
pouco desconfortável, mas não parecia haver necessidade de resgatá-lo de imediato. Se-
bas se sentia desconfortável em envolver um estranho — particularmente alguém a
quem ele favorecia — em assuntos que só diziam respeito a si mesmo, mas—

Se ele não tivesse dito que queria se tornar mais forte, eu teria ido ajudá-lo. Uma luta pela
vida de alguém é uma boa prática. Eu vou ajudá-lo se ele estiver em perigo.

Sebas acariciou a barba e observou Climb em sua luta.

Climb bloqueou um golpe com sua lâmina.

Um fio de suor frio escorria pelas costas. Aquilo quase atingiu sua armadura. Uma su-
gestão de desapontamento brilhou no rosto cruel do homem com quem ele estava lu-
tando.

Climb apunhalou reto, medindo a distância entre os dois. Ele notou que seu inimigo es-
tava recuando lentamente e não queria deixar o homem escapar.

O estilo de luta habitual de Climb era defender com o escudo e atacar simultaneamente
com a espada. Ser forçado a lutar apenas com a espada era uma experiência tortuosa. A
lâmina envenenada também o deixou muito nervoso. Rompe-Malhas eram armas espe-
cializadas em ataques perfurantes, então ele sabia que só precisava se preocupar com
estocadas. Mesmo assim, o fato de não poder se permitir ser atingido pela arma fazia seus
movimentos ficarem rijos.

Ele acalmou sua respiração, que estava em desordem por sua fadiga física e mental.

Parece que não sou apenas eu. Esse cara parece cansado também.

A testa de seu inimigo estava coberta de suor. O homem usava sua agilidade para zom-
bar de seu inimigo, que era uma maneira de lutar verdadeiramente típica de assassinos.
Assim, ferir qualquer um de seus membros faria com que ele perdesse a vantagem e per-
turbasse o equilíbrio do poder de luta.

A batalha seria decidida em um acerto.


Esta foi a fonte da tensão de ambas as partes. Claro, todas as batalhas uniformemente
combinadas eram assim, mas estava muito mais óbvio nesta luta.

“Huuuh!”

Com uma exalada forte, Climb golpeou em direção ao inimigo. O golpe não foi muito
rápido pois não colocou muita força. Isso porque se usasse muita força e o inimigo se
esquivasse, ele acabaria ficando com uma abertura fatal.

O assassino facilmente se esquivou e enfiou a mão no bolso do peito. Climb observou o


próximo ataque, de olho na mão do assassino.

Um punhal veio voando diretamente para Climb, que por sua vez cortou através do ar
com sua espada.

Ele teve sorte. Ele conseguiria desviar desde que prestasse atenção.

No entanto, ainda não poderia respirar aliviado. O assassino já havia baixado sua pos-
tura e esgueirou para o alcance do ataque.

Droga!

Sua espinha congelou.

Ele não conseguiu evitar o ataque subsequente. Ele golpeou com muita força ao desviar
o punhal. Sua espada estava em uma posição ruim, e era tarde demais para conseguir
interceptar seu inimigo. Pensou em fugir, mas a agilidade do assassino era superior à sua.

Não havia mais nada a ser feito. Talvez ele pudesse usar o braço como escudo—

Assim que Climb decidiu o que faria, o assassino cambaleou para trás agarrando-se ao
rosto.

Parece que uma pedrinha do tamanho de um feijão atingiu o assassino logo acima do
olho esquerdo. As percepções de Climb, aumentadas pela situação perigosa, confirma-
ram esse fato.

Ele sabia quem havia jogado mesmo sem olhar para trás. A voz de Sebas atrás dele era
a melhor prova disso.

“O medo é uma emoção importante. Mas não pode ser governado pelo medo. Eu tenho
te observado lutar e agora sinto que seu estilo de luta é simples e conservador. Se o seu
inimigo estivesse disposto a sacrificar um braço, você certamente estaria morto. Se suas
habilidades físicas são inferiores ao seu oponente, então deve derrotá-lo com seu espírito.
A força de vontade de alguém pode às vezes superar a fraqueza da sua carne.”
Climb respondeu “sim” em seu coração e ficou surpreso ao se ver muito mais relaxado.
Ele não se sentia como se pudesse depender de outra pessoa para observá-lo, mas ficou
aliviado por saber que alguém o estava observando.

Claro, seu medo da morte não desapareceu completamente, mas mesmo assim...

“Se... se eu morrer, por favor, diga a Renner-sama... Sua Alteza... sobre a minha gloriosa
batalha.”

Ele expeliu um longo suspiro e, em seguida, silenciosamente firmou sua espada.

Climb sentiu um brilho nos olhos do assassino que era diferente de antes. Fazia pouco
tempo, mas nessa luta onde a vida e mortes estavam em jogo, ele, de algum modo, se
sentiu conectado com o espírito do assassino.

O assassino percebeu que Climb estava preparado para a morte, e com isso decidiu co-
locar sua vida em risco também.

Ele deu um passo à frente, sem dizer uma palavra, claro, e encurtou a distância em um
único movimento.

Depois de verificar que o assassino estava dentro de seu alcance de ataque, Climb trouxe
sua espada para baixo, como um golpe de foice. Naquele momento, o assassino saltou de
volta. Parecia que o outro homem tinha conseguido a medida dos manuseios de Climb e
como tal, usou como isca para fazer uma simulação em Climb.

No entanto, o assassino havia esquecido uma coisa.

Ele até poderia ter entendido a velocidade de Climb. No entanto, ele não conhecia esse
movimento. Climb estava muito mais confiante neste ataque descendente. O golpe foi
muito mais rápido e forte que todos os outros movimentos dele.

O golpe no ombro foi interrompido pela cota de malha e, por isso, não cortou o homem
em dois. No entanto, facilmente quebrou sua clavícula e esmagou sua carne junto com
sua omoplata.

O assassino desabou pesadamente no chão. Ele estava babando devido a dor intensa e
uivava em agonia.

“Magnífico.”

Sebas apareceu atrás dele e casualmente pisou na barriga do assassino.

Com isso, o assassino ficou em silêncio, como uma marionete cujas cordas foram corta-
das. Ele deve ter desmaiado.
Pelo canto do olho, ele viu que Brain já tinha tomando conta do outro assassino. Ele
acenou casualmente para Climb celebrando a vitória.

“Então, vou começar o interrogatório. Se tiverem alguma dúvida, não hesitem em per-
guntar.”

Sebas trouxe um dos homens e o esbofeteou forçando-o a acordar. O homem recobrou


a consciência com um tremelique e Sebas tocou a mão na cabeça. Sebas não tinha usado
muita força, mas em dois segundos a cabeça do homem recuou, depois voltou à sua posi-
ção original como um pêndulo.

Os olhos do homem estavam agora turvos, como se ele estivesse bêbado.

Sebas começou a fazer perguntas. O assassino, um homem cujo o trabalho consistia e


manter a boca fechada, agora cantava como um canário. Diante dessa visão bizarra, Climb
perguntou a Sebas:

“O que o senhor fez com ele?”

“Esta é uma habilidade chamada 「Puppeteer’s Palm」... felizmente, parece que funci-
onou.”

Climb nunca tinha ouvido essa técnica antes, mas ele franziu a testa para o que o homem
estava dizendo.

Eles eram assassinos treinados pelo Seis Braços, os mais fortes combatentes da Oito De-
dos. Eles aparentemente seguiram Sebas para matá-lo. Brain perguntou a Climb:

“...Eu não sei muito sobre eles, mas a Oito Dedos é aquele grande sindicato criminoso, é
isso? Eu acho que eles têm conexões com alguns mercenários...”

“Sim, e o Seis Braços é o mais assustador de todos. O nome Seis Braços refere-se aos seis
lutadores que compõem a força de combate mais forte da organização. Ouvi dizer que
cada um deles pode rivalizar com um aventureiro de ranque adamantite. No entanto, não
sei exatamente quem são essas seis pessoas, pois não tenho certeza sobre os detalhes de
sua organização.”

O homem passou a dizer que Succulent, aquele que visitou a casa de Sebas, era um mem-
bro do Seis Braços, conhecido como “Diabo das Ilusões”. Aparentemente, seu plano era
eliminar Sebas e depois tirar proveito da jovem senhorita, a quem ele servia.

Ao ouvir isso, Climb sentiu um vento frio passar por ele. A fonte desse frio era Sebas.

Sebas se levantou lentamente e Brain se dirigiu a ele.

“O que o senhor planeja fazer agora, Sebas-sama?”


“Já me decidi. Primeiro, vou destruir o dito lugar problemático. Além disso, parece que
esse Succulent também estará lá, de acordo com este homem, é claro. É melhor apagar as
brasas, antes que as faíscam façam um incêndio.”

Brain e Climb, ambos inalaram agudamente àquela resposta casual.

O fato de ele ter declarado sua intenção de abrir caminho até o quartel-general inimigo
indicava que estava confiante em derrotar um aventureiro adamantite — em outras pa-
lavras, um homem cujo poder de luta estava no auge da realização humana.

No entanto, nenhum deles ficou surpreso.

Ele pôde derrotar três assassinos habilidosos em um piscar de olhos e até mesmo o reno-
mado Unglaus-sama mostrava deferência a ele. Que tipo de homem o senhor é, Sebas-sama?
Será que é um aventureiro adamantite aposentado?

“...Também ouvi dizer que há outros cativos lá. Seria melhor se mover rapidamente.”

“Isso faz sentido. Se os assassinos não retornarem, isso despertará suspeitas. Não pode-
remos salvar os cativos se eles forem movidos para outro lugar.”

Sebas estava em uma situação em que o tempo não estava do seu lado, mas sim com o
inimigo.

“Irei imediatamente. Peço desculpas, mas estou sem tempo. Posso incomodar vocês dois
para levarem esses assassinos para o posto de guarda mais próximo?”

“Por favor espere, Sebas-sama! Se o senhor não se importa, poderia me deixar... poderia
deixar este que lhe fala ajudá-lo? Claro, só se o senhor estiver disposto.”

“Eu também. Proteger a paz da Capital Real é meu dever como fiel servidor de Renner-
sama. Se os cidadãos do Reino estão sendo oprimidos, minha espada deve agir em seu
auxílio.”

“...Eu não acho que o Unglaus-kun tenha problema, mas pode ser um pouco perigoso
para você.”

“Eu entendo os riscos.”

“Climb-kun... Eu acho que o Sebas-sama acha que você pode atrapalhar, não? Embora,
em vista deste homem, eu também não passo de um transtorno.”

“Não, não, não foi isso que eu quis dizer. Eu estava simplesmente preocupado com você.
Espero que entenda que não posso protegê-lo como fiz agora apouco.”
“Estou pronto e entendo os riscos.”

“...O que eu estou fazendo a seguir pode não ganhar honra para você ou sua mestra, está
ciente disso? Sinto que haverá outras chances para você apostar sua vida na batalha, você
não acha?”

“Se eu apenas assistir sem agir só pelas coisas serem perigosas, isso só prova que eu sou
um homem que não merece servi-la. Assim como minha mestra salvou o povo comum,
eu também gostaria de fazer tudo o que puder para ajudar os que estão em apuros.”

Assim como ela estendeu a mão para me ajudar—

Sebas e Brain se entreolharam. Talvez eles tivessem percebido sua determinação de


ferro.

“...Está preparado para isso?”

Sebas perguntou e Climb prontamente assentiu.

“Compreendo. Sendo assim, não há mais nada a ser dito. Conto com a ajuda de ambos.”
Capítulo 05: Brasas Apagadas, As Faíscas Esvoaçantes
Parte 1

3º Dia do mês Baixo Fogo (9º mês) – 12:07

bordel fica logo atrás dessa porta. De acordo com o assassino, deve haver

O uma entrada no prédio perto daqui.”

Sebas estava na entrada do bordel, em frente à porta onde Tsuare havia


sido descartada. Então, ele apontou para um prédio várias casas de distân-
cia. Brain e Climb estavam presentes quando questionou o assassino, mas eles não ti-
nham ido ao bordel antes, então aceitaram a explicação de Sebas pelo seu aparente valor.

“Faz sentido. As entradas também podem servir como rotas de fuga, e aquele cara disse
que é gerenciado por pelo menos duas pessoas. Já que vamos nos separar, devemos dei-
xar o senhor segurar a porta principal, Sebas-sama, enquanto Climb e este que vos fala,
ficamos encarregados da entrada. O que o senhor acha?”

“Eu não sou contra isso. O que me diz, Climb-kun?”

“Eu também não tenho objeções. Ainda assim, o que faremos depois de entrarmos, Un-
glaus-sama? Vamos procurar juntos?”

“Me chame de Brain. Este quem lhe fala também pede humildemente que o senhor faça
o mesmo, Sebas-sama. Então... comumente, devemos nos mover em pares por ser mais
seguro, mas pode haver túneis secretos que nem o assassino ouviu falar. Devemos vas-
culhar o interior o mais rápido possível, enquanto o Sebas-sama faz seu ataque pela
frente. Além disso, geralmente há passagens que só o chefe sabe.” —Acrescentou Brain,
em voz baixa.

“Nesse caso, devemos nos separar depois de entrar?”

“...De todo modo, estamos correndo um risco apenas por entrar. Isso pode dar os me-
lhores resultados.”

Sebas e Climb concordaram com a declaração de Brain.

“Eu poderia pedir para o senhor procurar no interior, Ungl— Brain-sama? O senhor é
mais forte que eu, afinal de contas.”

“Tudo bem. Então, por favor vigie a saída, Climb-kun.”

Era mais provável encontrar inimigos ao vasculhar o interior do edifício. Ele assumiu a
tarefa que seria mais perigosa. Portanto, era melhor deixar para Brain, que era muito
mais forte que Climb.
“Então, quanto aos nossos preparativos finais?”

Eles já haviam discutido esse assunto no caminho para o bordel, mas havia algumas de-
cisões que só podiam ser feitas depois de ver o lugar pessoalmente. Eles divulgariam os
detalhes aqui e ninguém contradiria a declaração de Sebas.

Sebas deu um passo à frente, movendo-se para a porta de metal de aparência sólida.
Climb nunca seria capaz de mover a porta, mas para Sebas era pouco mais que uma folha
de seda.

As defesas estavam fadadas a serem mais pesadas neste lugar, mas nenhum deles estava
preocupado com Sebas, que avançaria sozinho. Afinal de contas, o atacante era alguém
que até mesmo Gazef Stronoff — renomado como o mais poderoso guerreiro das nações
vizinhas — e Brain Unglaus — que poderia lutar no mesmo nível que Gazef — não pode-
ria esperar derrotar mesmo se unissem forças. Isso não estava mais dentro da esfera da
habilidade humana.

“Então vamos prosseguir. De acordo com o assassino, o sinal secreto na outra entrada é
bater quatro vezes na porta. Duvido que tenham esquecido, mas um lembrete não fará
mal algum.”

“Obrigado, Sebas-sama.”

Climb não tinha esquecido, mas agradeceu Sebas mesmo assim.

“Tentarei deixá-los vivos, mas se resistirem, eu os matarei sem misericórdia. Eu confio


que não haverá problemas, correto?”

Brain e Climb sentiram um arrepio quando viram o sorriso gentil de Sebas.

Seus métodos eram perfeitamente sólidos. Ambos provavelmente teriam feito o mesmo
se estivessem no lugar de Sebas. Mesmo assim, uma emoção de medo perfurou suas cos-
tas, porque a expressão de Sebas e suas palavras fizeram parecer que ele tinha uma per-
sonalidade destoante de sua aparência.

Ele era um gentil cavalheiro e um guerreiro de sangue frio. Ele continha tanto a huma-
nidade quanto insensibilidade dentro de si em forte disparidade.

Eles tiveram uma premonição de que se Sebas entrasse com esse sorriso, ele poderia
acabar matando todos que encontrasse.

Climb nervosamente disse a Sebas:

“Eu sinto que algumas mortes serão inevitáveis, mas pode ser bom evitar mortes des-
necessárias. Somos poucos em número, afinal. Ainda assim, se o senhor encontrar al-
guém no comando que parece ser da Oito Dedos, posso incomodá-lo para tentar capturá-
lo? Se pudermos interrogar alguém importante deles, podemos reduzir o número de vi-
das perdidas no futuro.”

“Eu não sou um assassino em massa e não vim aqui para um massacre. Por favor, relaxe.”

Climb ficou aliviado ao ver o sorriso de Sebas.

“Por favor me perdoe. Contamos com o senhor.”

♦♦♦

“Vejamos, destruindo este lugar de uma só vez, deverá comprar algum tempo.”

Sebas achava que destruir esse bordel deveria acabar com a interferência deles em sua
vida. Se as coisas corressem bem e ele conseguisse obter documentos secretos ou algo
parecido, eles poderiam acabar ocupados demais lidando com as consequências ao invés
de se preocupar com Tsuare.

Por pior que fosse as coisas, ele poderia dar a Tsuare uma chance de escapar enquanto
usufruíam do tempo, por menor que fosse, que ele conseguiria comprar. E quem sabe,
poderia surgir alguma outra solução melhor.

“Lembro daquele comerciante em E-Rantel que se aproximou de mim para uma con-
versa cordial. Me pergunto se ele poderia ajudar?”

Tsuare ainda precisaria de alguém de confiança para ajudá-la, mesmo que ela conse-
guisse se recompor. Essa era a única maneira que ela teria uma vida melhor.

Sebas se virou para encarar a pesada porta de aço mais uma vez. Ele se lembrou daquele
dia em que Tsuare foi descartada enquanto tocava a superfície da porta. Era feito de ma-
deira e reforçada com placas de metal, tornando-a grossa e pesada. Ficou imediatamente
aparente que um ser humano comum teria muitos problemas para quebrar a porta sem
o uso de ferramentas.

“Me pergunto se o Climb-kun está bem.”

Ele não estava preocupado com o homem chamado Brain Unglaus. Mesmo que ele cru-
zasse lâminas com Succulent, dificilmente perderia. No entanto, Climb era um assunto
diferente. Não havia como Climb conseguir derrotar Succulent.

Tinha sido idéia de Sebas invadir o bordel, então Climb, como alguém que oferecera
ajuda, deveria estar preparado para sua própria morte. No entanto, Sebas não pôde dei-
xar de pensar que o jovem e compassivo que só queria ajudar acabaria perdendo a vida
por nada.

“Eu desejo que jovens como ele possam viver mais...”


Essas palavras eram características de um idoso. No entanto, Sebas apenas foi esculpido
sob a forma de um homem velho. Mas tecnicamente, Sebas era mais jovem que Climb, se
contasse desde o momento da gênese até agora.

“Seria melhor se eu sozinho capturasse esse Succulent. Esse seria o curso mais ideal dos
eventos. Espero que eles não vão em sua direção.”

Sebas orou para os 41 Seres Supremos pela segurança de Climb.

Se Succulent fosse o lutador mais forte aqui, era muito provável que ele fosse colocado
contra Sebas. No entanto, se ele fosse um guarda-costas, ele poderia ser designado para
escoltar sua carga para a segurança.

Sentindo-se um pouco ansioso, Sebas pegou a maçaneta da porta e a girou.

Mas a maçaneta parou no meio do caminho. Naturalmente, a porta para uma empresa
com instalações subterrâneas estaria fechada.

“Eu não sou adepto de abrir fechaduras. No entanto, não há como evitar. Terei que fazer
do meu jeito...”

Sebas murmurou para si mesmo em frustração. Então abaixou sua postura e esticou a
mão direita até ficar como um fio de uma lâmina, e então moveu a mão esquerda para a
frente com o punho fechado enquanto se posicionava. Sua postura estava imaculada, tão
estável quanto as montanhas e tão pitoresca quanto um cedro de mil anos.

“Yeeart!”

O que se seguiu foi uma visão inacreditável.

Seu braço afundou na porta de metal, na dobradiça. Não parou por aí, o braço ainda fazia
ruídos de moagem enquanto perfurava o metal da porta.

As dobradiças rangeram alto quando foram arrancadas da parede.

Sebas abriu a porta sem resistência.

“Que... merda é essa...?”

Dentro havia uma passagem que terminava em duas portas duplas. Na frente estava um
homem corpulento e barbado. Sua boca estava aberta e ele tinha um olhar retardado no
rosto.

“A porta estava enferrujada, então tive que usar um pouco de força para abri-la. Seria
bom lubrificarem as dobradiças.”
Dizendo isso, Sebas fechou a porta. Não, seria mais correto dizer que ele encostou a
porta no batente.

Enquanto o homem ainda estava congelado em choque, Sebas entrou sem qualquer he-
sitação.

“—Ei, o que foi isso?”

“Que merda de barulho foi esse!?”

Mais vozes masculinas vieram de trás do homem de antes.

No entanto, o homem que encarava Sebas não se incomodou com eles. Em vez disso, ele
se dirigiu a Sebas:

“...Er... B-bem-vindo?”

Completamente perplexo, o homem ficou parado enquanto Sebas se aproximava dele.


As pessoas que trabalham aqui estavam acostumadas à violência. No entanto, a cena di-
ante dele excedeu em muito o que havia encontrado em suas experiências anteriores.

O homem sorriu para Sebas de uma maneira simpática, ignorando as perguntas a gritos
feitas por seus colegas na retaguarda. Seu instinto de sobrevivência dizia que a melhor
escolha seria agir com boa vontade para com Sebas. Ou não; talvez ele tivesse reagido
assim porque se enganara pensando que Sebas era o mordomo de um dos fregueses da-
qui.

A visão de um homem corpulento e barbado tentando manter um sorriso no rosto era


bem difícil de suportar.

Sebas sorriu em resposta. Um sorriso gentil e compassivo. No entanto, não havia ne-
nhum traço de boa vontade em seus olhos. Era mais como um brilho de luz mortal e fas-
cinante passeando ao longo do gume de uma espada afiada.

“Eu poderia incomodá-lo para me deixar passar?”

Um *Thump*. Ou melhor, era mais um *Splat*. Um som nauseante ecoou pelo interior.

Ele era um homem musculoso de armadura. Ele pesava 85 quilos no mínimo. Ele agora
girava no ar como uma espécie de piada, voando para o lado a velocidades invisíveis a
olho nu. Seu corpo impactou violentamente a parede próxima com um som molhado de
respingos.

O prédio inteiro balançou violentamente, como se o punho de um gigante tivesse atin-


gido.
“...Oh céus. Eu deveria tê-lo matado mais adentro. Dessa forma ele teria feito uma barri-
cada melhor... ah, bem. Mais estão vindo, então eu só preciso ter mais cuidado com os
próximos.”

Depois de admoestar-se para não exagerar da próxima vez, Sebas passou pelo cadáver
e se dirigiu para dentro.

Ele abriu as portas e entrou além sala. Era uma sala requintadamente mobiliada. Parecia
mais que ele estava andando por uma casa vazia do que invadindo uma base inimiga.

Havia dois homens dentro.

Seus olhos se arregalaram e suas mandíbulas caíram enquanto olhavam para a cena
atrás de Sebas, para os enormes respingos de sangue que tinham pintado toda a parede
de vermelho.

O cheiro de álcool barato pairava no ar — um cheiro que nunca se encontraria em Na-


zarick. Misturou-se imediatamente com o fedor de sangue fresco, vísceras e resíduos in-
ternos, produzindo um odor repugnante.

Sebas examinou a informação que obteve de Tsuare e do assassino, depois tentou des-
cobrir a estrutura do edifício. Suas lembranças eram nebulosas e ela não se lembrava de
nada importante, mas dissera à Sebas que o verdadeiro estabelecimento estava locali-
zado no subsolo. O assassino não havia ido no subsolo, então sua informação a partir
daqui seria imprecisa.

Ele olhou para o chão. No entanto, o alçapão que levava ao subsolo estava astuciosa-
mente oculto, e Sebas não conseguiu encontrá-lo.

Ainda assim, se ele não pudesse encontrá-lo, então tudo o que tinha que fazer era per-
guntar a alguém que sabia onde estava.

“Com licença. Eu gostaria de fazer uma pergunta...”

“Hiiiiieee!”

O homem a quem ele se dirigiu respondeu imediatamente com um grito rouco. Parece
que ele não tinha intenção de lutar.

Isso aliviou Sebas. Sempre que ele pensava em Tsuare, ele não conseguia controlar seus
punhos, e ele iria matar sua oposição em um único golpe.

Já que ele não tinha intenção de lutar, quebrar as duas pernas deveria ser o suficiente.
O homem aterrorizado se afastou de Sebas, se apoiou tremendo contra a parede, quando
o fez. Sebas olhou impassível para essa visão vergonhosa e sorriu.

“Haiiiiiiieeeee!”

Isso assustou ainda mais o homem. O fedor de amônia encheu a sala.

Parece que o homem se assustou e Sebas franziu a testa.

O outro homem desabou no chão. Seus olhos pareciam ter virado para trás, então tudo
que podia ser visto eram suas escleras. Aparentemente, a pressão extrema exercida por
Sebas foi demais e com isso ele desmaiou. O outro homem olhou para ele com inveja.

“Ah... Como eu estava dizendo, gostaria de fazer uma pergunta. Sendo assim — eu gos-
taria de ir ao subsolo. Poderia me dizer como chegar lá?”

“...Isso, isso é...”

O homem estava com muito medo de trair sua organização. Sebas podia ver o medo em
seus olhos. Muito parecido com aqueles assassinos, este homem parecia ter medo de re-
presálias de sua organização. Sebas recordou o homem que ele conheceu naquela noite
e como ele fugiu com o dinheiro de Sebas. A retribuição em questão provavelmente era
sinônimo de “morte”.

O homem ainda estava hesitando em falar ou não quando Sebas cortou sua relutância
com suas próximas palavras.

“Há duas pessoas que podem falar aqui. Eu não necessariamente tenho que perguntar a
você, sabe?”

A testa do homem era como uma represa de suor oleoso e suas costas estremeceram.

“A-al-ali! É ali! Há uma porta escondida!”

“Naquela direção, hm.”

Sebas olhou para onde o homem havia indicado. Olhando mais de perto, havia uma pe-
quena fresta no chão, separando parte do chão do resto.

“Entendo. Obrigado. Sua inutilidade está para acabar.”

Sebas sorriu e o homem percebeu que aconteceria com ele depois daquelas palavras.
Seu rosto perdeu a cor e ele tremia incontrolavelmente. Ainda assim, se agarrou a uma
fraca esperança e clamou:

“Por favor, por favor não, não me mate!”


“Não.”

A pronta resposta de Sebas congelou o ambiente. Os olhos do homem se arregalaram,


do jeito que os humanos faziam quando tentavam rejeitar uma realidade na qual não
queriam acreditar.

“Mas eu te disse, não é? Por favor, eu farei qualquer coisa, apenas me poupe!”

“De fato você fez. Contudo...”

Sebas suspirou profundamente.

“Eu não posso.”

“Isso... isso é uma piada?”

“Você pode tomar isso como uma piada, se quiser. No entanto, o resultado ainda será o
mesmo, não?”

“...Oh... Deus...”

Sebas recordou o estado trágico de Tsuare quando a resgatou e estreitou os olhos.

Que direito os vilões tinham de pedir ajuda aos deuses? Mais precisamente, os deuses
de Sebas eram os 41 Seres Supremos. O argumento do homem era como um insulto para
eles.

“Tu colhes o que semeias.”

Aquelas palavras, tão frias e duras como aço, cortaram toda a esperança e fizeram o
homem dolorosamente consciente de sua própria morte.

Ele escolheria lutar ou escolheria fugir? Dado apenas um instante para decidir, o homem
escolheu imediatamente — ele escolheu fugir.

Ele encontraria um destino indescritível se ousasse combater Sebas, isso era óbvio.
Nesse caso, ele poderia fugir. Fazer isso lhe daria uma fraca possibilidade de sobrevivên-
cia.

Ele estava certo em pensar assim.

Ao fazer isso, ele prolongou sua vida por alguns segundos... ou melhor, alguns décimos
de segundo.
O homem correu para a porta. Sebas alcançou-o em um instante e fez um movimento
giratório. Um vento rápido passou sobre a cabeça do homem e seu corpo desmoronou
como uma marionete cujas cordas haviam sido cortadas. Uma bola atingiu a parede e
deslizou para o chão, deixando um rastro de sangue em seu caminho.

Um momento depois, o corpo sem cabeça do homem lançou um gêiser de sangue de seu
pescoço, cobrindo o chão com o liquido carmesim.

Essa técnica foi praticamente divina. Apenas a façanha de decapitar alguém com um
chute circular teria exigido força e velocidade incríveis, mas o mais impressionante foi
que os sapatos de Sebas estavam imaculados, sem mancha alguma.

Sebas, com seus sapatos imaculados, foi em direção ao outro homem inconsciente. Ele
levantou a perna e a bateu com força. Houve um som como galhos secos quebrando. O
homem se contraiu várias vezes e então seu corpo ficou imóvel.

“...Quando você lembra de tudo que fez até agora, esse destino não é esperado? Ainda
assim, fique à vontade. Seus corpos serão usados para pequenas compensações por seus
pecados.”

Sebas estendeu a mão para os cadáveres.

Seu plano era mutilar os cadáveres e organizá-los nos degraus como um aviso para as-
sustar qualquer um que pretendesse fugir pelas escadas e deixá-los incapazes de avançar
ou recuar. Sebas faria isso, já que não seria bom destruir a saída.

Depois de organizar os cadáveres recolhidos, Sebas caminhou em direção à porta es-


condida no chão.

Primeiro, houve o som de componentes de metal quebrando. Então, um grande buraco


no chão foi visto. A porta quebrada deslizou pelas escadas abaixo com um estrondo res-
sonante.

“Entendo... se eu destruir esta escadaria, eles não poderão escapar por aqui.”

♦♦♦

Era um quarto pequeno.

A única mobília neste quarto quase vazio era um armário e uma cama.

O colchão não era um simples costurado com palha, mas um verdadeiro colchão de al-
godão. Era bem feito, do tipo que casas nobres poderiam usar. No entanto, este colchão
foi projetado para funcionalidade e por isso parecia simples, sem qualquer decoração.

Um homem nu estava sentado no colchão.


Ele estava bem no auge da sua meia-idade e a gula tornara a sua estrutura flácida.

Sua aparência originalmente era, na melhor das hipóteses, média, mas graças aos quilos
ganhos de fartos banquetes o tornara muito mais feio. Independentemente de onde
olhasse, ele parecia um porco.

Aliás, os porcos eram animais inteligentes e fofos que amavam a limpeza. A palavra
“porco”, neste caso, era um termo depreciativo usado para descrever pessoas estúpidas,
grosseiras e imundas.

Era Staffan Heivish.

♦♦♦

Ele levantou o punho — e socou o colchão.

Mas o som de carne socando carne foi ouvido.

Um olhar de deleite floresceu no rosto de Staffan. A sensação de esmagar a carne sob


seus punhos percorreu seu braço, e seu corpo estremeceu com arrepios de prazer o inun-
dando.

“Uhhh...”

Ele levantou lentamente o punho, cujos nós dos dedos estavam agora manchados de
sangue.

Staffan estava pressionando seu corpo contra uma mulher nua.

O rosto da mulher estava inchado e machucado, a pele estava salpicada de manchas de


sangue. Seu nariz estava quebrado e o sangue que escorria dele coagulara em sua pele.
Seus lábios e pálpebras estavam igualmente inchados, distorcendo completamente seu
rosto que outrora fôra belo. Havia hematomas no resto do corpo, mas o dano era pior em
seu rosto. Os lençóis ao redor estavam manchados de sangue velho e seco.

Ela estava tentando proteger o rosto com as mãos até agora, mas agora seus braços es-
tavam murchos na cama. Seu cabelo se espalhava bagunçado no colchão, como se esti-
vesse flutuando na água.

“Ei, o que é isso? Já se cansou? Huh?!”

A mulher parecia inconsciente.

Staffan levantou o punho e a socou novamente.


Com um baque, seu punho se conectou com sua bochecha, e a dor subiu a mão de Staffan.

Seu rosto se contorceu.

“Cheh. Isso doeu, sua puta!”

Ele furiosamente a socou novamente.

O colchão rangia com cada pancada de seu punho conta a carne. A pele já inchada da
mulher se partiu, manchando os dedos de Staffan com sangue. O sangue espalhado gru-
dou no colchão, coagulando em manchas de carmim.

“...Uuu...”

A mulher não se debateu mais, apesar do espancamento. Não houve resposta de seu
corpo.

Uma rodada de socos sem parar como essa pode acabar matando alguém. No entanto, a
mulher havia sobrevivido, mas não porque Staffan foi misericordioso. A mulher se agar-
rava à vida porque o colchão havia dissipado a força dos golpes. Se ela tivesse sido es-
pancada deitada em uma cama mais dura, ela poderia estar morta agora.

Staffan tinha sido brutal, mas não porque soubesse desse efeito do colchão. Pelo contrá-
rio, foi porque a morte da mulher não o preocupava. Tudo o que era necessário era pagar
para eliminar o problema.

Na verdade, Staffan havia espancado várias mulheres até a morte neste lugar.

Claro, ele precisava pagar pela limpeza toda vez que matava alguém, o que era incômodo
para sua carteira. Assim, ele inconscientemente não usou toda a força que queria.

Quando olhou sedento para o rosto imóvel da mulher, Staffan lambeu os lábios.

Este bordel era perfeito para satisfazer fetiches sexuais peculiares. Bordéis normais não
permitiriam que seus clientes fizessem tais coisas. Bem, talvez eles pudessem, mas Staf-
fan não sabia de nenhum desses lugares.

A vida era boa quando a escravidão era permitida.

Os escravos eram uma forma de propriedade e as pessoas que os maltratavam eram


desprezadas. Era como se os outros revirassem os olhos em desprezo para as pessoas
que desperdiçassem dinheiro.

No entanto, os escravos tinham sido o único caminho para alguém como Staffan — com
suas preferências sexuais — satisfazer seus desejos. Sem eles, Staffan tinha sido forçado
a saciar sua luxúria neste lugar. Quem sabia o que teria acontecido se ele não soubesse
desse estabelecimento?

Não havia dúvida de que ele teria cometido um crime e teria sido preso.

Staffan estava praticamente lacrimejando em gratidão ao seu nobre mestre, que lhe re-
comendara este lugar. Naturalmente, era para que ele pudesse usar seu poder para o
benefício de seu mestre.

“Obrigado — meu mestre.”

Um olhar de alívio veio sobre os olhos de Staffan. Era difícil imaginar que ele pudesse
ser tão grato ao seu suserano, dada sua personalidade e suas inclinações sexuais.

Contudo—

As brasas de uma chama ardiam nas profundezas de sua pelve — as chamas da ira.

Essa emoção foi dirigida à mulher que o privou de escravos para satisfazer suas luxúrias.

“—Aquela puta!”

Seu rosto ficou vermelho de raiva e seus olhos ficavam com os capilares inchados de
sangue.

Ele imaginou o rosto da realeza a quem ele deveria estar servindo — a Princesa — no
corpo da mulher abaixo dele. Staffan juntou a raiva dentro de si e jogou na mulher inde-
fesa.

Sangue fresco voou com cada golpe que ele acertava.

“Se ao menos, se eu pudesse quebrar aquele rosto! Seria tão gostoso!”

Ele a inundou a mulher abaixo dele com soco após soco.

Seu punho atingiu a bochecha e uma quantidade surpreendente de sangue jorrou entre
os lábios inchados da mulher. Talvez ela tivesse cortado o interior de sua boca com a
carne sendo impactada contra seus dentes.

A única resposta da mulher a essa surra foi tremer ligeiramente.

“—Huu... huu...”

Depois de mais alguns golpes, Staffan ficou ofegante e seus ombros subiram e desceram.
Seu corpo e testa estavam escorregadios de suor.
Staffan olhou para a mulher que ele havia prendido debaixo dele. Sua condição só pode-
ria ser descrita como “trágica”, e ela estava perto da morte neste momento. O que havia
ali era uma marionete cujas cordas haviam sido cortadas.

Staffan engoliu em seco.

Nada lhe agradava mais do que estuprar uma mulher espancada e ensanguentada.
Quanto mais bonita ela tinha sido originalmente, melhor. Não havia melhor maneira de
satisfazer seus desejos sádicos do que destruir algo bonito.

“Se eu pudesse foder aquela mulher assim...”

Staffan pensou nos traços arrogantes que pertenciam à jovem milady da casa que ele
acabara de visitar. Ela era tão bonita quanto a Princesa, que era conhecida como a mulher
mais bonita do Reino.

Claro, Staffan estava muito consciente que ele não teria a chance de abusar de uma dama
de alta classe. As únicas pessoas com quem Staffan podia satisfazer seus fetiches eram
nesses resíduos da humanos que haviam sido despejados nesse bordel, para serem usa-
dos e depois descartados.

Uma mulher tão bonita certamente seria comprada por um rico e poderoso nobre por
uma quantia enorme. Ela então seria levada para o seu domínio e viveria em isolamento,
a fim de evitar que sua venda se tornasse de conhecimento público.

“Como eu gostaria de poder espancar uma mulher assim — espancá-la até a morte.”

Quão feliz e satisfeito seria se pudesse fazer isso?

Claro, isso não era nada mais do que delírios de um louco.

Staffan olhou para a mulher esmagada abaixo dele. Seu peito nu estava se movendo li-
geiramente. Ele sorriu lascivamente quando confirmou esse fato.

Staffan se abaixou para agarrar os seios da mulher, deformando a carne macia entre os
dedos.

A mulher não reagiu. Ela estava à beira da morte e não pôde responder a essa dor trivial.
A mulher que Staffan estava espremendo diferia de uma boneca apenas pela suavidade
de seu corpo.

No entanto, Staffan estava um pouco insatisfeito com a falta de resistência.

“Me salve.”

“Me poupe.”
“Eu sinto muito.”

“Por favor pare.”

Os gritos da mulher ecoaram na mente de Staffan.

Ele deveria tê-la fodido enquanto ela ainda tinha forças para gritar?

Staffan continuou espremendo seus seios, uma vaga sensação de arrependimento em


seu coração.

A maioria das mulheres que foram enviadas para esse bordel não estava mais em um
estado de espírito correto. Elas escolheram fugir da realidade. Quando alguém levava
isso em consideração, a mulher escolhida para servir Staffan hoje foi melhor do que a
maioria.

“Será que aquela mulher era assim?”

Staffan imaginou Tsuare. Ele não tinha interesse no que aconteceu com a funcionária do
bordel que fôra descartada.

No entanto, quando ele pensou no mordomo que encontrou durante a sua visita, Staffan
não pôde reprimir o riso zombeteiro em seu coração.

Aquela coisa já havia sido usada por inúmeros homens, de parceiras femininas à não-
humanos. Não havia sentido em protegê-la. E, no entanto, aquele velho mordomo dissera
que estava disposto a pagar centenas de moedas de ouro por ela. O verdadeiro milagre
foi Staffan não cair na gargalhada naquele local.

“Ah, lembro daquela mulher que fugiu, ela gritava bastante.”

Ele procurou através de suas memórias e recordou seus lamentos. Ela tinha sido bas-
tante normal pelos padrões das garotas enviadas para esse bordel.

Staffan sorriu lascivamente e começou a saciar sua luxúria bestial. Ele agarrou uma das
pernas nuas da mulher imobilizada e a abriu bem. Sua perna magra e emaciada era magra
o suficiente para que Staffan pudesse envolvê-la com uma mão.

Staffan roçou entre as pernas da mulher.

Assim, ele agarrou sua ferramenta, agora firme e túrgida do desejo ardente que consu-
mia seu corpo e—

—A porta atrás dele estalou e abriu-se devagar.


“Ah!”

Staffan virou apressadamente, e um velho vagamente familiar apareceu dentro de seu


campo de visão. Então, ele se lembrou de quem era aquele velho.

O mordomo que ele conheceu naquela mansão.

As solas dos sapatos do velho — Sebas — estalaram nitidamente quando ele entrou na
sala. Staffan ficou sem palavras diante de seus movimentos naturais e casuais.

O que o mordomo daquela casa estava fazendo aqui? Por que ele veio a este quarto? A
mente de Staffan ficou em branco diante dessa situação inexplicável.

Sebas foi até Staffan. Então, ele viu a mulher esmagada sob o corpo de Staffan.

Depois disso, Sebas dirigiu um olhar incomparavelmente frio para Staffan.

“Você gosta de bater nas pessoas, não é?”

“Ah!”

O estranho humor no ar fez Staffan a se levantar procurando por suas roupas.

No entanto, Sebas se moveu mais rápido que ele.

Um *thwap* ressoou nos ouvidos de Staffan, e então sua visão tremeu descontrolada-
mente.

Uma batida depois, a bochecha direita de Staffan ardia pela dor latejante que o preen-
chia.

Ele tinha sido atingido — não, neste caso, seria mais apropriado dizer que ele havia sido
esbofeteado. Demorou um pouco para Staffan perceber isso.

“Seu maldito, como se atreve—”

Um outro *thwap* ressoou no rosto de Staffan. Logo foi seguido por muitos mais.

Esquerda, direita, esquerda, direita, esquerda, direita, esquerda, direita—

“Bhare—!”

Staffan sempre foi quem bateu nos outros. Ninguém jamais bateu nele. Esses poucos
golpes o deixaram em lágrimas.

Ele levantou a mão para proteger seu rosto enquanto tropeçava para trás.
Suas bochechas latejavam de dor, como se tivessem sido escaldadas.

“Sheu, sheu desbhaçado! Chomo ousha bazer issooo!!”

Suas bochechas inchadas e avermelhadas doíam sempre que ele falava.

“Qual seria o problema?”

“Nhão vaish she safar dishoo! Idhiota! Qhuem bensa que euh souh?!”

“Só mais um idiota.”

Sebas se aproximou de Staffan que se arrastava sentado no chão e mais um *thwap*


eccou, ele deu mais um tapa retumbante.

“Bhare! Bor fhavor bhare!”

Staffan cobriu o rosto como uma criança sendo atingida por seus pais.

Ele gostava de usar a violência, mas sempre usava nos mais fracos que ele. Mesmo que
Sebas parecesse ser apenas um idoso qualquer, Staffan não ousou levantar a mão para
ele. Ele só faria o seu movimento quando estivesse absolutamente certo de que sua ví-
tima não poderia revidar.

Talvez tivesse percebido a natureza covarde de Staffan, mas Sebas perdeu o interesse
por ele e olhou de volta para a garota.

“Que trágico...”

Staffan correu de Sebas, que observava a garota.

“Idhiotha!” Staffan fumegou.

Que velho idiota.

Ele reuniria todos neste lugar para ensinar a esse velho uma dolorosa lição. Como Sebas
se atreveu a atacar alguém assim?! Ele não maneiraria na lição por ele ser um velho. Staf-
fan se certificaria de que ele ficasse cheio de dor e medo.

A imagem da mestra do mordomo, a garota de aparência angelical, apareceu na mente


de Staffan.

A mestra do mordomo teria que assumir a responsabilidade pelos erros de seu servo.
Ele a faria suportar o fardo da dor que o velho lhe causara. Staffan ensinaria aquele velho
o quão perigoso era o vespeiro que ele tinha perturbado.
Quando aqueles pensamentos sombrios passaram por sua mente, Staffan saiu correndo
pela porta, sua barriga de cerveja balançava violentamente.

“Albghen! Albghen meh ajudhe!” Ele gritou.

Certamente um empregado viria em seu auxílio se ele pedisse ajuda.

No entanto, suas esperanças foram frustradas no momento em que ele entrou no corre-
dor.

O corredor estava em um silêncio sepulcral.

Era como se ninguém estivesse por perto.

Staffan olhou em volta nervosamente, ainda nu.

O bizarro silêncio do corredor encheu-o de medo.

De relance, havia várias portas em ambos os lados dele. Era natural que ninguém lhe
respondesse. Este lugar atendia clientes com gostos exóticos — os perigosos, na verdade.
Assim, os quartos eram todos isolados acusticamente.

No entanto, não havia como os funcionários não terem ouvido seu grito.

Ele tinha visto vários deles quando foi para o quarto de antes. Cada um deles era um
homem corpulento com músculos volumosos. Como poderia um homem velho como Se-
bas comparar?

“Bor que ninbhem vhem?!”

“—Eles estão todos mortos ou inconscientes.”

Disse a voz calma que respondeu ao lamento de Staffan.

Virando-se para trás, Staffan viu Sebas parado serenamente atrás dele.

“Aparentemente, havia muitos deles... mas a maioria está dormindo agora.”

“Ishso... Ishso eh imbossíbel! Buantas pesshoas benhsa queh tehm aquhy?!”

“...Havia três que pareciam empregados do térreo e mais dez no subsolo. Havia outros
sete como você.”

De onde tirou essa bobagem?! Staffan olhou incrédulo para Sebas.


“De todo modo, ninguém aqui, no andar de cima ou no andar de baixo, pode salvá-lo.
Mesmo que alguém acorde, eu já quebrei seus braços e pernas. Tudo o que eles podem
fazer é rastejar como lagartas.”

A expressão de Staffan foi de choque total. Impossível, ele pensou, mas o silêncio dentro
do bordel provava a verdade das palavras de Sebas.

“Tudo bem, eu não acho que haja necessidade de poupar sua vida. Sendo esse o caso,
por favor, morra.”

Sebas não sacou uma espada nem preparou qualquer tipo de arma. Ele simplesmente
caminhou até Staffan em silêncio, como se fosse a coisa mais natural do mundo. Essa in-
diferença só serviu para assustar Staffan ainda mais, porque ele sabia que Sebas real-
mente o queria morto.

“Esphere! Esbhereee!! O qhuê qbuer... uh... dhinheero? Teh douh doto meuh bhinehiro!”

“...Não entendo muito bem o que você está dizendo. Eu acredito que está tentando me
oferecer um incentivo financeiro, é isso? Entendo... não estou interessado.”

“Bor queh esthbá fafhendo ishsoo?!”

O que fiz para merecer isso? Por que eu tenho que morrer?

Staffan finalmente disse a mensagem que Sebas esperava receber.

“...Você não sabe, mesmo depois de procurar em seu coração?”

Staffan considerou tudo o que ele tinha feito até agora. O que ele fez de errado?

Sebas suspirou.

“...Entendo”

Assim que disse isso, Sebas chutou Staffan no intestino, que por sua vez foi arremessado
longe.

“Então é isso que eles querem dizer quando dizem que algo não vale a pena ser mantido
vivo.”

Staffan foi preenchido com uma dor imensurável quando vários de seus órgãos internos
se romperam. A agonia era tal que um homem poderia se contorcer e sofrer até que mor-
resse, mas Staffan permaneceu consciente, embora sua mente fosse um borrão.

Isso dói!
Isso dói!

Isso dói!

Ele queria gritar e rolar no chão, mas estava imóvel pela dor intensa.

“Descanse em paz. Ou não, se assim posso dizer.”

Uma voz fria disse ao futuro cadáver de Staffan.

Staffan queria gritar por ajuda, mas sua garganta não responderia.

Uma lagrima escorria em seus olhos e sua visão ficou turva. Ainda assim, ele podia ver
as costas de Sebas.

Me salve!

Por favor me salve!

Eu pago o quanto quiserem, só me salvem! Por favor!

Ninguém poderia responder ao pedido silencioso de ajuda.

No fim, Staffan Heivish agonizava com a dor indescritível em seu abdômen enquanto
morria lentamente.

Parte 2

3º Dia do mês Baixo Fogo (9º mês) – 12:12

“Climb, é melhor matar todos. Não tenho nada comigo para amarrá-los, se eles conse-
guirem soar o alarme, teremos problemas. Mesmo se os derrubarmos, eles podem acor-
dar. Nestas circunstâncias, é muito arriscado tentar subjugar um local sobre o qual não
sabemos nada... sentiu algo errado?”

“Ah, não, não é nada.”

Climb balançou a cabeça para afastar sua inquietação. Seu coração palpitava dentro de
seu peito, mas ele tentou o seu melhor para ignorá-lo.

“Me perdoe. Estou bem. Pronto para ir a qualquer momento.”

“Mesmo? ...Hm, parece que você é uma pessoa diferente. Tem agido de forma estranha
desde que chegamos aqui, mas agora tem o rosto firme de um guerreiro. Eu entendo
como se sente, porque há um inimigo poderoso aqui que você não pode vencer no mo-
mento. Mas não precisa se preocupar. Eu estou aqui e o Sebas-sama também. Concentre-
se em permanecer vivo e motivado.”

Brain deu um tapinha nas costas de Climb, depois bateu na porta quatro vezes com a
mão que não segurava a espada.

Climb apertou o punho de sua arma com força também.

O som de passos pesados veio de trás da porta. Então eles ouviram o som das fechaduras
sendo destravadas — três, para ser preciso.

No instante em que a porta se abriu, o Climb a abriu, de acordo com o plano.

Brain já havia entrando antes que as pessoas dentro pudessem gritar de surpresa.
Houve o som de um corpo sendo cortado, seguido por um objeto pesado batendo no chão.

Climb estava um passo atrás de Brain.

Ele entrou a tempo de ver Brain abater seu segundo homem. Havia mais uma pessoa
dentro da sala, um homem de armadura de couro e carregando uma espada curta. Climb
correu para ele e encurtou a distância em um instante.

“Ah! Quem diabos é você?!”


O homem tentou perfurar Climb, mas Climb facilmente a desviou com sua espada.

Depois disso, Climb levantou a espada e a desceu com força sobre o homem.

O homem tentou bloqueá-la com sua adaga, mas uma mera espada curta não suportaria
um golpe com o peso total de Climb como impulso. A espada de Climb desviou a espada
curta e sua lâmina afundou no ombro do homem, encravando até sua laringe.

O homem gritou de dor quando desabou no chão, Climb não pôde acreditar que o corpo
humano pudesse conter tanto sangue. Seu oponente se contorcia e tremia no chão en-
quanto estava morrendo.

Depois de verificar que a ferida que ele havia causado era mortal, Climb correu mais
para dentro da sala, seguindo o fluxo da batalha, enquanto permanecia alerta. Nenhum
inimigo saiu do esconderijo para encontrá-lo. Por trás, ele podia ouvir Brain subindo as
escadas rumo ao segundo andar.

A mobília aqui era simples e comum. Climb garantiu que não havia inimigos aqui antes
de passar para a próxima sala.

Um minuto se passou.

Tendo verificado seus respectivos andares e se convencendo de que não havia outros
inimigos, Climb e Brain se encontraram na entrada.

“Eu fui até o primeiro andar, mas não vi nenhum inimigo.”

“O mesmo com o segundo andar. Eles nem tinham camas lá, então isso significa que eles
não moram aqui... eu tenho certeza, tem que haver uma passagem secreta que leva ao
lugar onde eles ficam.”

“O senhor achou isso? Tenho certeza que não é no terceiro andar.”

“Não, nada disso. Mas se o que você disse está certo, deve estar no primeiro andar,
Climb-kun.”

Climb e Brain trocaram olhares e depois olharam para dentro do prédio.

Climb não havia aprendido nenhuma habilidade ladina, por isso não conseguia detectar
portas secretas só de olhar. Se houvesse alguma farinha aqui, e eles tivessem tempo, eles
poderiam ser capazes de espalhá-la completamente para encontrar a passagem escon-
dida.

As partículas de farinha cairiam nas junções das portas secretas e facilitariam a sua lo-
calização. No entanto, eles não tinham a farinha e o tempo para espalhá-la. Portanto,
Climb tirou os itens mágicos da sua bolsa de cintura.
Os sinos de mão dado a ele por Gagaran da Rosa Azul. Ela disse: “É perigoso se aventurar
sem um amigo ladino, mas às vezes é inevitável. Nessas situações, ter um item como esse
pode fazer uma enorme diferença”.

Climb olhou para os desenhos de cada um dos sinos e escolheu o que ele precisava.
[ S i n o de D e t e c ç ã o de Portas Secretas]
O item mágico que ele selecionou foi chamado de Bell of Detecting Secret Doors.

Climb sentiu Brain olhando com interesse para o sino e assim o tocou. O sino produziu
uma nota pura, mas que só o seu detentor podia ouvir.

Em resposta ao sino, um canto do chão brilhou com uma luz branca pálida e pulsante,
dizendo a ele que havia uma porta secreta ali.

“Oh, esse é um item mágico útil. Os meus só servem para aprimoramento; eles são úteis
apenas em batalhas.”

“Mas qualquer guerreiro obviamente escolheria esses itens, certo?”

“Um guerreiro, huh...”

Climb deixou Brain, que sorria tristemente para si mesmo. Ele memorizou a posição da
porta escondida e, em seguida, percorreu um circuito ao redor do primeiro andar. Os
efeitos desse item mágico durariam pouco tempo, e ele tinha que aproveitar ao máximo
esse tempo para pesquisar a área. No entanto, depois que ele terminou de andar, nenhum
outro lugar reagiu à magia além do lugar onde ele havia começado.

Depois disso, tudo o que teriam que fazer era abrir a porta secreta e passar. No entanto,
Climb estreitou os olhos e observou a porta. Então suspirou e alcançou os três sinos no-
vamente.

Este sino tinha diferentes padrões do anterior. Ele o tocou assim como fez com o outro.

Um som similar, mas diferente, encheu o ar.


[ S i n o d e R e m o ç ã o d e Armadilhas]
Este era o Bell of Removing Traps.

Não custava nada ser cauteloso. Como guerreiro, Climb não conseguia encontrar nem
desarmar armadilhas, e não havia nada que ele pudesse fazer contra seus efeitos. Talvez
se ele tivesse um magic caster com ele, ele poderia ser capaz de se recuperar de veneno
ou paralisia, mas ele e Brain eram apenas dois guerreiros. Havia aparentemente algumas
artes marciais que poderiam atrasar os efeitos de veneno e coisas assim por um tempo,
mas Climb não as tinha aprendido e nem ele tinha poções antídoto consigo. Ele teve que
considerar ser envenenado como uma condição fatal.
Este item mágico tinha um número limitado de usos por dia, mas seria melhor usá-los
sem hesitação do que o risco de cair em uma armadilha.

Um clangor veio da porta secreta.

Climb enfiou a ponta da espada no espaço entre a porta secreta e o chão e a pressionou.

O piso de madeira subiu e caiu na outra direção. Havia uma balestra colocada dentro da
porta, havia um ferrolho armado. Sob a luz da lâmpada, sua ponta brilhava com um brilho
estranho que não era metálico por natureza.

Climb se esgueirou e examinou a balestra.

Havia um líquido muito pegajoso na ponta, provavelmente um tipo de veneno.

Se ele tivesse aberto a porta secreta sem pensar, o projétil envenenado teria sido dispa-
rado em sua direção.

Climb deu um suspiro de alívio e depois checou para ver se poderia removê-la. No en-
tanto, foi instalada com minuciosamente e não pode ser removida sem ferramentas.

Climb decidiu abandonar essa noção e olhou para além da porta secreta.

Uma escadaria se estendia para baixo, mas ele não conseguia enxergar seu comprimento
devido ao ângulo de observação. A dita escadaria estava apoiada em blocos de pedra e
parecia muito sólida.

“Então, o que devemos fazer? Devemos esperar aqui?”

“Eu não sou muito bom em lutar em ambientes fechados. Prefiro encontrar um espaço
amplo e esperar o inimigo aparecer.”

“Quando se trata de combate um contra um, esperar pelo inimigo no topo da escada trás
as melhores chances. No entanto, se acabar lutando aqui, posso não ser capaz de ouvi-lo
se eu estiver longe. Além disso, reforços inimigos podem aparecer, seria ruim tentar se-
gurar eles aqui. Nesse caso, vamos juntos.”

“Sim. Obrigado.”

“Vou assumir a liderança. Espere um pouco antes de me seguir.”

“Entendido. A propósito, o item de desarmamento de armadilhas que usei agora pode


ser ativado três vezes por dia, mas não pode ser usado consecutivamente; eu tenho que
esperar meia hora entre os usos. Então, não podemos contar com isso por enquanto.”

“Entendido. Redobrarei meus cuidados. Me avise se notar algo.”


Com isso, Brain desceu as escadas, e Climb o seguiu.

Por segurança, Brain cutucou as escadas com a espada enquanto descia, avançando
passo a passo com cuidado.

Depois de saírem das escadas, descobriram que a passagem diante deles estava reves-
tida de pedra cortadas e as paredes também tinham sido reforçadas com alvenaria. Uma
porta ficava vários metros à frente deles, e os arredores eram reforçados com chapas de
aço.

Brain não achava que um túnel de fuga seria equipado com uma armadilha mais letal
que uma balestra, mas tinha ouvido falar de armadilhas de fossos, que poderiam tirar até
mesmo guerreiros fortemente armadurados da luta. Evitar armadilhas desse tipo estava
como prioridade absoluta.

Embora fosse apenas uma curta distância, Brain ainda se deu este trabalho e avançou
com cautela. Eventualmente, eles chegaram à porta. Climb estava esperando na escada,
para evitar ser apanhado se algo acontecesse.

Brain cutucou a porta usando a espada. Depois de repetir isso algumas vezes, ele se de-
cidiu, segurou a maçaneta— e a girou.

E então parou.

Assim que Climb estava ficando preocupado, imaginando se algo havia acontecido com
ele, Brain o encarou com uma expressão amarga no rosto dizendo:

“...Trancado.”

Obviamente estaria. Qualquer um teria esperado isso.

“Tem algum item que ajude com isso? Caso contrário, terei que tentar derrubá-la.”

“Ah sim. Um momento por favor.”

Climb tirou o último dos três sinos e o tocou perto da porta.


[ S i n o d e A b e r t u r a d e Fechaduras]
Um leve clique veio da porta quando o Bell of Opening Locks entrou em vigor.

Brain segurou o puxador e abriu a porta só um pouquinho para observar as condições


dentro da sala.

“Está vazio. Vou avançar.”

Climb seguiu atrás de Brain quando o mesmo adentrou.


Era um hall de algum tipo.

As paredes eram revestidas com gaiolas e caixotes grandes o bastante para levar seres
humanos. Talvez este fosse um depósito. Ainda assim, parecia grande demais para ser
um.

As portas do outro lado não estavam trancadas. Climb se concentrou para ouvir e assim
ele ouviu os sons de um burburinho à distância.

Brain olhou para trás e perguntou:

“O que acha do lugar? Parece grande o suficiente... O lado ruim é que pode ser preciso
enfrentar vários de uma vez.”

“Se eles se juntarem em mim, vou em direção a saída e luto perto das escadas.”

“Entendi. Vou verificar os arredores e voltarei em breve. Climb, não invente de morrer
aqui.”

“Muito obrigado. Por favor, tenha cuidado, Brain-sama.”

“Se importa de me emprestar esses sinos?”

“Claro que não. Perdoe-me por não pensar nisso antes.”

Climb entregou os três sinos para Brain, que os colocou na bolsa da cintura. Então, o
semblante de um guerreiro severo tomou conta dele. Com um breve “Estou indo”, ele
passou pela porta destrancada e se dirigiu para as profundezas do bordel.

Isso deixou Climb sozinho. Ele olhou ao redor da sala silenciosa.

Começou a procurar os arredores, certificando-se de que ninguém estava escondido e


de que não havia túneis secretos atrás dos caixotes. Ele era apenas um guerreiro, mas
sentia que não havia portas escondidas ou coisas do tipo. Então, ele inspecionou os cai-
xotes mais afundo.

Ele esperava encontrar alguma informação sobre outras instalações da Oito Dedos. Se
ele conseguisse encontrar mercadorias roubadas ou contrabandeadas, melhor ainda.
Claro, uma investigação profunda teria que esperar depois que eles tivessem tomado o
controle deste lugar, mas antes disso, ele deveria inspecionar o melhor que pudesse.

Havia caixotes de todos os tamanhos e ele se aproximou do maior. Parecia ter cerca de
dois metros de altura.
Ele verificou o grande caixote procurando por armadilhas. Naturalmente, Climb não de-
senvolveu espontaneamente nenhuma habilidade de detecção desde então, então tudo o
que ele podia fazer era desajeitadamente imitar o que os ladinos faziam para ganhar a
vida.

Ele colocou o ouvido na caixa e ouviu.

Ele não achava que contivesse algo, mas esse era o domínio de uma sociedade secreta,
então poderia encontrar algo. Também pode conter uma forma de vida contrabandeada
ilegalmente ou algo assim.

Mas como ele esperava, não houve som algum. Climb estendeu a mão e tentou abrir o
topo do caixote.

—Não abriu.

Nem mesmo se moveu.

Ele procurou por um pé-de-cabra ou uma haste, mas a rápida investigada na área não
revelou ferramentas do tipo.

“...Não há nada que eu possa fazer.”

Depois disso, ele tentou abrir um caixote com cerca de um metro cúbico de tamanho.

O caixote abriu com bastante facilidade. Ao observar o interior, ele viu roupas de muitas
cores e variedades. Havia de tudo, de ponchos a vestidos dignos de nobres.

“O que é isso? Há algo escondido sob essas roupas... não parece... Roupas de reposição,
talvez? Ou são algo como roupas de trabalho? Uniformes de empregada, talvez? Onde
estas coisas seriam utilizadas?”

Climb não tinha idéia do propósito daquelas roupas. Ele pegou uma peça e olhou de
perto, mas parecia ser apenas mais uma peça comum. Se ele quisesse vinculá-lo a um
crime, na melhor das hipóteses ele poderia ter sido roubado, mas não constituía evidên-
cia suficiente para fechar o bordel.

Ele não conseguia descobrir, então decidiu não se incomodar. Depois disso, Climb pas-
sou para outro caixote de tamanho similar. Só então, um baque alto ecoou pela sala.

Isso seria impossível. Ele vasculhou tudo e se certificou de que não havia ninguém.

Só então, uma idéia passou por sua mente.

Será que alguém estava escondido o tempo todo, usando 「Invisibility」 para se escon-
der?
Chocado com sua própria conclusão, Climb olhou apressadamente para a fonte do som.
Tinha vindo do caixote de dois metros que verificara agora a pouco, o que ele não conse-
guira abrir. Um lado dele estava pressionado contra a parede, e as tábuas opostas se abri-
ram.

Isso expôs o interior. Não continha nada exceto dois homens. Havia um buraco na parte
de trás do caixote, dando em direção à um túnel onde deveria haver uma parede sólida.
Parece que a passagem secreta estava ligada ao caixote.

Um homem saiu do caixote enquanto Climb estava em choque.

Suor frio escorria pelas costas de Climb.

Um deles parecia exatamente o homem que Sebas descrevera. Esse homem se chamava
Succulent. Ele era o maior obstáculo para essa operação de aquisição e o maior prêmio
de todos.

Ele era um membro do Seis Braços, cuja destreza era comparável àquela dos aventurei-
ros adamantite. Em outras palavras, ele era um inimigo imbatível para o Climb.

Succulent tirou a lâmina da bainha assim que viu Climb, depois estreitou os olhos e
disse:

“Sabíamos que havia intrusos graças ao 「Alarm」, pegamos a passagem secreta para
evitar encontrá-los... acho que deveríamos fazer outro, huh?”

“Que sentido há em dizer isso?” O homem atrás dele respondeu com uma voz estridente.

“Huh? Já vi esse menino em algum lugar antes?”

“Considerando as circunstâncias, eu vou ficar bem irritador se quiser dormir com ele.”

“Você é tão maldoso, Succulent. Não em uma situação assim. Ah, lembrei. Ele é o lacaio
daquela puta desgraçada, não há ninguém no mundo que eu odeie mais que ela.”

“Oh, ele é o servo daquela princesa, então.”

Succulent examinou Climb da cabeça aos pés.

O homem atrás dele tinha um olhar nauseante de luxúria em seus olhos, mas Succulent
parecia estar avaliando a força de Climb como um guerreiro, muito parecido com o modo
de serpente observar sua próxima refeição antes de dar o bote.

O homem atrás dele lambeu os lábios e perguntou:


“Eu gostaria de levar esse menino comigo. Pode fazer isso?”

Um calafrio subiu pela espinha de Climb e ele sentiu uma pontada no ânus.

Urg, ele é esse tipo de cara...!

“Isso vai custar extra.”

Succulent virou-se para encarar o Climb, ignorando os gritos internos do mesmo. Sua
postura não expunha fraquezas, e ele parecia um obstáculo ainda mais formidável para
Climb agora.

Succulent de repente se adiantou.

A onda de pressão que se aproximava forçou Climb a dar um passo para trás.

Quando havia uma enorme disparidade de força entre dois oponentes, a batalha deles
não demoraria muito. No entanto, Climb teve que assumir essa árdua tarefa.

Se eu permanecer na defensiva e me concentrar em bloquear ataques, devo ser capaz de


ganhar tempo até que eles retornem.

Mas antes disso, ele tinha que fazer uma coisa.

Climb respirou fundo e:

“ALGUÉM ME AJUDE—!”

Ele gritou com toda a força, como se estivesse tentando expelir todo o ar em seus pul-
mões.

Não havia como ele ganhar se lutasse sozinho. Capturar essas pessoas e impedir sua
fuga contaria como uma vitória para ele. Permitir que alguém tão forte quanto este ho-
mem — em outras palavras, alguém que provavelmente teria muitas informações impor-
tantes — escapar será uma derrota ainda maior

Sendo esse o caso, por que ele deveria hesitar em gritar por ajuda?

De fato, a expressão de Succulent se tornou cruel no instante de seu grito.

Agora que Climb tinha feito isso, Succulent estava em uma corrida contra o tempo. Em
outras palavras, ele pode acabar tendo que usar todos os seus trunfos logo de início.

Climb continuou a observá-lo, sem se atrever a relaxar.


“Coccodol-san. Capturá-lo pode ser um pouco difícil. Eu tenho que acabar com ele antes
que seus amigos cheguem.”

“Como assim?! Você não é um membro do Seis Braços? Quer me dizer que não pode
derrotar um pirralho desses? Essa desgraça de apelido de Diabo das Ilusões é só enfeite?”

“Pensando por esse modo, bem... Tudo bem, farei o meu melhor. Mas não se esqueça, a
única condição de vitória aqui é você escapar, entendido?”

Climb permaneceu em guarda e olhou para Succulent, tentando encontrar a razão pela
qual ele era chamado de Diabo das Ilusões. Para portar um epíteto assim, suas habilida-
des são seriam muito diferentes do que o nome sugeria. Sendo esse o caso, ele provavel-
mente poderia discernir essas habilidades encontrando a razão para o nome. Infeliz-
mente, ele não podia dizer nada da aparência de seu inimigo e seu equipamento.

Climb sabia que as probabilidades estavam contra ele, mas deu um grito valoroso para
se enrijecer como aço.

“Eu guardo a saída! Você não passará enquanto eu respirar!”

“Isso é o que vamos ver. Quanto estiver todo surrado no chão e mergulhado em desgraça,
você vai acreditar em mim.”

Succulent lentamente levantou a espada e tomou uma postura.

Huh?

Climb questionou o que seus olhos acabaram de lhe dizer.

A lâmina pareceu tremular. Ele não estava vendo coisas. A oscilação desapareceu com
rapidez suficiente, mas Climb tinha certeza do que acabara de testemunhar.

Isso é uma arte marcial ou algo assim—?

Essa provavelmente era a fonte do epíteto de “Diabo das Ilusões”. Seu inimigo provavel-
mente usou algum tipo de habilidade. Ele deve ser cauteloso e permanecer alerta.

Succulent entrou no alcance e golpeou com a espada.

Esse movimento não condizia com um ataque de um guerreiro equiparado com um


aventureiro adamantite. Na verdade, parecia mais desleixado do que um dos ataques do
próprio Climb. Ele levantou a lâmina em preparação para interceptar o ataque — então
um calafrio destoante da temperatura do ar passou por seu corpo, e ele rapidamente sal-
tou para o lado.

De repente, a dor floresceu do outro lado do corpo, e ele quase foi jogado para longe.
“Gwaargh!”

Climb recuou vários passos e colidiu contra a parede. Ele não teve tempo para pensar
sobre o que havia acontecido — Succulent já estava de frente para ele novamente.

A lâmina moveu como da última vez. Climb levantou a espada para proteger a cabeça e
rapidamente desviou para a esquerda para fugir do golpe.

Dessa vez seu braço direito foi tingido pela agonia.

Climb recuperou sua postura depois ter cambaleado para longe, então, sem pensar, ten-
tou um golpe perfurante.

Sua lâmina não atingiu nada além de ar.

Agora que ele sabia que seu inimigo não iria importuná-lo, ele olhou para trás, segu-
rando o braço direito. Então viu Succulent indo para a porta que levava à escada, ainda
atento aos movimentos de Climb.

Climb ignorou Succulent que almejava a saída e olhou para Coccodol. Ele imaginou que
Succulent seria prejudicado pelo simples fato de sua presença aqui era unicamente para
proteger Coccodol.

Seu palpite estava certo.

Succulent parou de almejar a saída e colocou-se entre Climb e Coccodol, estalando a lín-
gua enquanto o fazia. Depois disso, ele olhou entre Climb e a porta levando a saída, depois
olhou para Coccodol, com o rosto torcido.

“Droga, quase cai na armadilha dele. Desculpe, mas eu tenho que matar esse pirralho
aqui.”

“Do que está falando? Se mantivermos esse garoto vivo, podemos usá-lo para chanta-
gear aquela vadiazinha, não?”

“Ele me enganou. É tudo porque ele estava guardando a porta... então declarar que im-
pediria nossa saída era parte do plano. E pensar que esse merdinha tentaria me iludir.”

...Perfeito! Ele mordeu a isca. Parece que não sabe o que está acontecendo lá fora. Agora
eles não vão tentar fugir.

Sabia que Coccodol tinha apenas um guarda-costas, tentar fugir enquanto Climb ainda
podia lutar era um curso tolo de ação. Isso porque eles podem acabar sendo flanqueados
se Climb tivesse colegas esperando na escada. Justamente por isso que Succulent não
podia deixar Coccodol fugir sozinho enquanto não lidasse com Climb.
O que confundiu Succulent foi o fato de que Climb havia declarado em voz alta que de-
fenderia a saída, mas ele a deixou rapidamente quando surgiu a oportunidade de atacar
Coccodol. Agora, Succulent tinha certeza de que havia emboscadores esperando do lado
de fora, preparados para lançar um ataque de pinça para capturar Coccodol. Essa certeza
limitava as opções táticas que ele poderia considerar.

Agora, Succulent provavelmente estava pensando na necessidade de eliminar Climb


para escapar em segurança. Claro, ele estava operando sem conhecimento das condições
do lado de fora. Caso contrário, ele o teria driblado e fugido há muito tempo.

Climb havia ganhado essa aposta, mas ele ergueu a espada em resposta a uma súbita
onda de intenção assassina.

“!”

Climb pressionou seus dentes pela dor vinda de suas costelas e do seu braço direito.
Talvez suas costelas estivessem quebradas, mas felizmente ainda podia se mexer. Não,
era certo que ele jazeria em pedados no chão se aquele pervertido não tivesse declarado
seu desejo pelo corpo de Climb. Até mesmo uma cota de malha não oferecia imunidade
completa a violentos ataques cortantes.

Mas que tipo de golpe estranho é esse? Ele adiciona outro golpe de alta velocidade após o
ataque inicial? Não parece que é isso...

O rosto de Gazef lampejou pela mente de Climb.

Gazef Stronoff possuía uma arte marcial única, o 《Corte de Luz Sêxtuplo》, que lhe
permitia infligir seis cortes simultaneamente. Talvez Succulent estivesse usando uma
versão mais fraca disso, talvez algo como um 《Corte de Luz Duplo》?

Se fosse esse o caso, então Succulent provavelmente estava usando alguma arte marcial
desse porte, onde seu primeiro ataque era feito em velocidade normal e depois seguido
por um segundo golpe rápido.

Algo não se encaixa. Se eu puder descobrir o segredo dessa técnica, eu devo ser capaz de
lidar com isso... Ainda estou em desvantagem, estou constantemente na defensiva. Hora de
atacar.

Climb engoliu a seco e começou a correr. Seus olhos foram de Succulent para Coccodol.

O rosto de Succulent ficou ainda torcido.

Dado que é o guarda-costas, ele vai odiar que alguém avance em direção a quem ele deve
proteger, mesmo que seja apenas uma distração. É minha função, então eu sei bem como se
sente.
Climb se aproximava tentando aplicar sua própria experiência de trabalho ao seu ini-
migo.

Diabo das ilusões... Se isso for verdade... então talvez aquele golpe por si só seja uma ar-
madilha... Mas ainda vale a pena ter certeza.

Ele se aproximou e clivou para baixo. Como esperado, o golpe foi facilmente desviado.
Segurou o reverberar do impacto em seu braço e golpeou novamente. O golpe foi fraco,
mais fraco ainda por não ter levantado a espada, mas isso foi o suficiente.

Succulent desviou o ataque novamente. Climb assentiu em satisfação e se afastou.

“É uma ilusão, não uma arte marcial!”

Ele sentiu algo estranho quando sua espada foi desviada. Era como se seu ataque tivesse
saltado antes mesmo de ter feito contato com a espada que ele podia ver.

“Esse seu braço direito é uma ilusão! Seu braço de verdade assim como a espada que
estão invisíveis!”

Em outras palavras, anteriormente ele havia bloqueado a ilusão, enquanto a espada in-
visível o atingira.

O rosto de Succulent ficou pálido e ele calmamente respondeu:

“...É isso aí. É só uma combinação de magias de invisibilidade e ilusão. Eu treinei como
ilusionista e esgrimista. Depois de descobrir, o truque perde a graça, não é? Pode rir se
quiser.”

Como ele poderia rir disso? Parecia simples, em princípio, e ele se perguntou por que
não havia percebido isso antes. No entanto, uma lâmina invisível era um verdadeiro ter-
ror em uma batalha de vida ou morte, onde cada golpe poderia ser o último. A ilusão de
que ele podia ver só contribuiu para o engano.

“Eu suponho que estou inferior a você em capacidade bruta de luta, pois segui dois ca-
minhos ao mesmo tempo. Contudo...”

A mão da espada de Succulent virou um círculo completo. Mas essa era sua mão real?
Por tudo o que ele sabia, ele estava observando um braço invisível e a mão real já poderia
ter preparado uma adaga de arremesso.

Climb começou a suar frio quando percebeu o temível poder das ilusões.
“Entre as vocações dos arcanistas, os ilusionistas só podem usar magias da escola de
ilusão. Claro, algumas magias de nível mais alto podem causar danos tão realistas que
podem fazer o cérebro aceitar a morte... mas não sou tão habilidoso.”

“Soa como uma mentira. Não há como provar que está dizendo a verdade.”

“É como eu disse...”

Succulent sorriu e completou:

“Eh, ainda assim, não precisa acreditar em mim. Bem, eu já disse o que me cabe... De
todo modo, eu não posso me aprimorar com magias, nem posso enfraquecê-lo por esses
meios. No entanto... você pode dizer o que é real e o que é meramente ilusão?”

Dizendo isso, o corpo de Succulent se dividiu em várias imagens de si mesmo, empilha-


das uma sobre a outra.

“「Multiple Vision」.”

O do centro parecia o original, mas Climb não tinha como ter certeza.

Droga, eu o dei tempo para se preparar!

O objetivo de Climb era ganhar tempo, mas era muito arriscado permitir que um magic
caster se aprimorasse.

Climb esbravejou, e usou uma arte marcial para melhorar seus sentidos, prontamente
iniciou seu ataque a Succulent.

“「Scintillating Scotoma」.”

“Uuurgh!”

Parte do campo de visão de Climb repentinamente desapareceu. No entanto, o efeito da


magia terminou imediatamente. Ele deve ter resistido a magia.

Climb avançou girando a espada em um grande e amplo ataque. Claro, apenas um dos
Succulent’s estava ao seu alcance. Para obter todos os Succulent’s ao alcance de seu ba-
lanço, seria necessário ficar extremamente próximo, onde ele não seria capaz de fazer
sua investida de espada.

Sua espada atingiu um dos Succulent’s, que se dividiu lateralmente em dois. No entanto,
seu inimigo não vomitou sangue, nem a espada encontrou resistência quando passou di-
reto através do corpo de Succulent.

“—Palpite errado.”
Um calafrio subiu de suas entranhas e sua garganta ficou quente de repente. Climb re-
flexivamente levantou a mão esquerda para agarrar a origem do calor em seu corpo.

Climb cerrou os dentes como se ele estivesse tentando quebrá-los em sua boca.

Ele não se permitiria morrer. Ele não se permitiria perder a vida sem que Renner o or-
denasse.

“Guh, geh! Gyuhh, gegehh...”

Seu rugido estava em algum lugar entre um gemido e um ranger de dentes, a fim de
estimular seu espírito indeciso, que estava prestes a se render à dor.

Ele não podia morrer. Ainda não.

Climb lutou fortemente para se lembrar de Renner. Ele precisava voltar ao seu lado
hoje—

“Estamos com pouco tempo, por isso vou acabar com a sua desgraça agora. Adeus.”

Succulent apontou a espada para o jovem agonizando.

Ele havia sido fatalmente ferido. Sua morte era apenas uma questão de tempo. Ainda
assim, Succulent tinha a sensação de que seria melhor acabar com ele agora.

“...Diga, podemos levá-lo conosco?”

“Dá um tempo, Coccocol-san. Ele pode ter amigos atrás daquela porta, não entendeu?
Além disso, mesmo que o levemos, ele não durará até ficarmos em segurança. Apenas
esqueça dele.”

“Então, pelo menos tire a cabeça dele. Eu quero colocá-la em um buquê e enviá-la para
aquela putinha dourada.”

“Tá, tudo bem. Se for só a cabeça, eu ainda posso— ah, uauh!”

Succulent saltou para trás.

O jovem golpeou com a espada.

Para alguém à beira da morte, o golpe tinha sido firme e verdadeiro.

Succulent originalmente havia desprezado sua presa moribunda com olhos arrogantes.
Aqueles olhos agora se arregalaram.
O garoto usara a espada para se levantar e voltar a ficar de pé.

Impossível.

Succulent tinha levado cem vidas até agora, e ele estava certo de que ele havia dado um
golpe mortal no garoto. Não havia como ele ainda estar de pé depois disso.

No entanto, a visão diante dele voou em face da experiência que Succulent havia acumu-
lado.

“Por que, como ainda pode se levantar?!”

Era uma visão assustadora. Era como se Climb fosse um undead.

Um longo e fino rastro de saliva escorria do canto da boca do garoto, e seu rosto pálido
e exsanguinado parecia desprovido de toda sua humanidade.

“Eu... morrerei... defendendo... a honra... de Renner-sama....”

Sua súbita ingestão de ar congelou nos pulmões de Succulent enquanto o olhar ardente
de Climb se fixou nele. Ele estava com medo. Ele estava com medo de como esse jovem
tornara o impossível possível.

O jovem cambaleou e Succulent voltou a si. Um sentimento de vergonha repentinamente


brotou dentro dele.

Como poderia ele — como membro do Seis Braços — ter medo de alguém tão fraco?
Como ele poderia aceitar isso?

“Você não sabe morrer?! Vá pro inferno!”

Succulent avançou em direção ao seu oponente. Ele tinha certeza de que uma única es-
tocada terminaria o trabalho

♦♦♦

No entanto, ele havia subestimado seu adversário.

Era verdade que, em termos de capacidade de combate geral, Succulent era esmagado-
ramente superior à Climb. No entanto, Succulent havia escolhido percorrer o caminho do
ilusionista e do esgrimista ao mesmo tempo, enquanto Climb focou em ser um guerreiro
toda a sua vida. Assim, em termos de habilidade marcial, não só não havia disparidade
de força, mas também se podia dizer que Climb era superior à Succulent. A única razão
pela qual Climb não conseguiu igualar o Succulent foi devido à magia. Sem a ajuda de
magias para aprimorá-lo, Succulent seria um combatente inferior.
♦♦♦

Ouviu-se um som estridente quando a lâmina veio cortante de cima e depois houve um
agudo som de metal.

A única razão pela qual Succulent pôde bloquear o golpe do garoto foi porque seus mo-
vimentos estavam letárgicos pelo aproximar da morte.

Um fio de suor frio escorreu pelo rosto de Succulent.

Seu inimigo estava morrendo. Succulent tinha sido distraído por esse fato, e seus olhos
escuros se arregalaram.

Por ser parte esgrimista, Succulent treinou por incontáveis horas para escapar dos gol-
pes do inimigo. O fato de ele ter que realmente usar sua espada para bloquear o ataque
de Climb foi extraordinário.

—Isso não foi o ataque de um moribundo.

Essas palavras passaram pela mente de Succulent com cada vez mais frenesi.

Não, não era apenas isso. A velocidade da lâmina de Climb tinha sido ainda mais rápida
do que quando ele estava ileso.

“Como fez essa droga de golpe, seu desgraçado!”

Isto foi alguém que se tornou mais forte durante a batalha. Não era impossível, mas Suc-
culent nunca tinha presenciado ninguém assim antes.

Ele até começou a sentir que o jovem havia eliminado algum tipo de limitação.

“Que caralhos você fez? Foi um item mágico? Arte marcial?!”

Pelo seu tom, ninguém seria capaz de dizer quem saíra vitorioso da batalha que se se-
guia.

♦♦♦

Depois de bloquear o poderoso golpe, Succulent foi lançado para trás.

O impacto de sua aterrissagem grosseira ressoou através de suas costas e agitou suas
entranhas. Sua cota de malha de orichalcum absorveu parte do impacto, mas a súbita
perca de ar de seus pulmões o deixou incapaz de respirar por um momento.

O que tinha acontecido? Succulent — que sofrera o golpe — não conseguiu explicar, mas
Coccodol que observava a situação havia percebido.
Succulent tinha sido chutado.

O menino prontamente chutou Succulent assim que seu golpe foi bloqueado.

Succulent não tinha idéia do que estava acontecendo, mas ele rapidamente se levantou.
Para esgrimistas — para quem a mobilidade era o seu maior trunfo — ficar de bruços no
chão seria uma sentença de morte.

“Droga! Que tipo de soldado você é?! Você até me chutou! Soldados só devem fazer o
que sabem e não tentar novos truques!”

Succulent bravejou furiosamente quando ele rolou o corpo para a posição vertical.

Diferente do currículo de combate padrão dos soldados comuns, o estilo de luta suja e
incomum de Climb fez Succulent sentir que estava enfrentando um aventureiro. Assim,
ele não poderia ser subestimado.

Succulent começou a se preocupar.

No começo, ele achava que a luta estava em sua mão. Matar um pirralho como esse de-
veria ter sido fácil como roubar doces de crianças. No entanto, ele agora sentia que a
compostura escapava de seu ser.

No entanto, quando Succulent levantou, ele viu o jovem que se tornara uma ameaça cair
no chão, e deu um suspiro de alívio.

O rosto do jovem estava terrível, como se a série de golpes tivesse apagado a chama de
sua vida. Não — foi exatamente o que aconteceu. Esta deve ter sido uma última explosão
de fogo, Como a luz de uma vela antes de se apagar. Sim, esse deve ter sido o poder que
ele usou.

Neste momento, aquele menino morreria com o menor toque.

Quando viu a condição de Climb, Succulent começou a se sentir aliviado, mas logo o sen-
timento foi substituído por confusão e raiva.

Ele estava furioso com o fato de que alguém como ele, um membro do Seis Braços, tinha
sido tão duramente pressionado por um miserável capanga da guarda real como Climb.
Ele estava zangado com o fato de que havia começado a entrar em pânico. Ainda assim,
o vencedor dessa contenda estava declarado. Tudo o que ele tinha que fazer era matar o
garoto e fugir.

Contudo—

“—Não acha que já fez demais?”


♦♦♦

Parece que ele chegou a tempo, de alguma forma.

Climb estava de bruços no chão, o rosto coberto de suor, a pele tão pálida que era prati-
camente branca. Ainda assim, ele estava respirando. Dito isto, a ferida em sua barriga era
fatal, e ele morreria em poucos minutos se não fosse tratado imediatamente.

Brain sentiu que não poderia relaxar assim que entrou na sala.

Havia dois homens dentro. Um deles não parecia um lutador.

“Não preste atenção a esse esquisito aí, mate-o agora!”

“Se eu fizer isso, ele que vai me matar na hora. Esse cara não é igual esse pirralho. Eu
preciso me concentrar para vencê-lo. Se eu distrair e não tomar cuidado, será o meu fim.”

E assim Succulent respondeu. Brain sabia exatamente quem era o homem. Ele parecia
exatamente a descrição que lhe havia sido fornecida. Além disso, o homem estava segu-
rando uma lâmina manchada de sangue, e havia dois dele. Brain havia suspeitado dele
desde o início, e suas suspeitas acabaram de ser confirmadas.

Sem dizer nada, Brain correu em sua direção, sacou sua espada e cortou. Não houve
hesitação em seus movimentos. Succulent saltou antes mesmo de o golpe chegar perto, e
a Katana apenas cortou o ar. No entanto, Brain só fez isso para afastar seu oponente de
Climb. Ele ficou em pé sobre já caído Climb, firme em seus pés em um local onde ele po-
deria proteger o rapaz.

“Climb, você está bem? Tem algum item de cura?”

Suas palavras foram rápidas e cheias de tensão. Se Climb não tivesse nada assim, ele
teria que encontrar outra maneira de salvá-lo.

“Hahhhh. Hahhh Hahh Hah Si... sim... eu tenho.”

Ele olhou e viu que as mãos de Climb haviam soltado sua espada e começado a se mover.

“Ainda bem.”

Um grande peso foi tirado dos ombros de Brain. Depois de responder a Climb, ele olhou
ferozmente para Succulent.

“Agora seu problema é comigo. Permita-me vingar em nome desse garoto.”


“...Você é muito convencido. Mas isso é apenas esperado. E pensar que carregaria uma
arma tão valiosa do Sul... Não sei se já ouvi falar de você... como se chama?”

Ele não pretendia responder.

Climb era um camarada — um irmão de armas. Como alguém poderia responder com
calma quando o irmão estava à beira da morte?

Só então, uma dúvida floresceu no coração de Brain.

Eu era assim no passado?

Seu antigo eu não vivera por nada além de aprimorar sua esgrima. Quanto tempo fazia
desde que se importara com outra coisa?

Então, ele riu para si mesmo.

...Agora eu entendo.

Sua ambição, seu sonho, seu objetivo, sua vida, seu modo de vida — todos eles haviam
sido destruídos além da recuperação pelo monstro chamado Shalltear Bloodfallen, e as
partes quebradas de seu coração, aparentemente foram preenchidos pela pessoa cha-
mada Climb. Quando confrontado com a cruel sede de sangue do misterioso Sebas, Brain
ficou de joelhos, mas Climb — embora mais fraco que ele — superou de pé. Foi exata-
mente naquela ocasião mais cedo, quando Brain se encheu de admiração, que Climb pre-
encheu o coração de Brain. Isso porque Brain tinha visto uma centelha de brilho mascu-
lino dentro de Climb que ele mesmo não tinha.

Ele parou diante de Climb, e encarou fixamente Succulent. Climb agora via nas costas de
Brain a mesma determinação que Brain o havia visto mais cedo?

Seu antigo eu teria rido disso. Seu antigo eu teria rido de quão fraco ele havia se tornado.

No passado, ele acreditava que essas coisas não passavam de fraquezas para um guer-
reiro. Ele acreditava que tudo que um guerreiro precisava era ser tão afiado quanto uma
espada.

No entanto — ele entendeu agora.

“Então é assim que você sempre viu a vida... Entendi, Gazef... Parece que, mesmo agora,
eu ainda não sou páreo para você.”

“Tá me ouvindo? Não me faça repetir, como se chama?”

“Me perdoe. Eu realmente não vejo sentido em dizer, mas, bem... eu sou Brain Unglaus.”
Os olhos de Succulent se arregalaram.

“O quê? Quer dizer aquele..!”

“Nem pensar! O homem em pessoal? Que tipo de brincadeira é essa?!”

“Não, eu não acho que seja um engano, Coccodol-san. Armas valiosas indicam o nível de
um guerreiro. Uma Katana assim certamente combina com alguém como ele.”

Um sorriso irônico cruzou o rosto de Brain.

“Mais da metade das pessoas que encontrei me reconheceram... bem, meu antigo eu te-
ria ficado orgulhoso. Mas agora é um pouco mais complicado.”

Brain não sabia o porquê Succulent sorria para ele tão amigavelmente. No entanto, suas
dúvidas foram logo respondidas.

“Unglaus, ouça bem! Não há nenhum sentido nessa luta, não é? Alguém forte como você
é digno de fazer parte de algo maior. Por que não se tornar um de nós? Você poderia
facilmente se tornar um membro do Seis Braços já que é bem forte. É óbvio que é habili-
doso. Você é como eu, não? Quer se tornar forte. Eu posso dizer só de olhar seus olhos.”

“...É como diz.”

“Não é? Então, deixe-me deixar as coisas claras. Oito dedos é um bom lugar. É ótimo para
quem é forte. Eles te darão todos os itens mágicos que quiser, tão poderosos quanto qui-
ser. Veja isso, uma cota de malha de orichalcum! Essa espada aqui é de mythril! Anéis!
Roupas! Botas! Todos são todos os itens mágicos! Vamos, Brain Unglaus. Junte-se a nós.
Junte-se ao Seis Braços.”

“...Sem valor. É só isso que sua organização pode oferecer?”

A atitude inimaginavelmente fria e desdenhosa de Brain congelou o sorriso no rosto de


Succulent.

“O que disse?”

“Não me ouviu? Eu disse, se isso é tudo o que tem a oferecer, então não vão conseguir
nada, mesmo se juntarem tudo.”

“Ora seu! ...Hmph. Bem, se você diz isso, então sua força também não é nada especial!”

“Com certeza. Alguém como eu não é nada de especial. Eu aprendi muito bem depois de
testemunhar um verdadeiro monstro.”
Brain estava com pena de Succulent e sua atitude arrogante. Ele realmente era como um
sapo em um poço. Assim, Brain decidiu dar-lhe um aviso sincero.

“O mesmo vale para sua força. Talvez sejamos mesmo parecidos. É por isso que quero
avisá-lo — não somos nada de especial.”

Brain se virou e olhou por cima do ombro para Climb, que havia bebido sua poção de
cura.

“Além disso, aprendi mais uma coisa. A força obtida por alguém é maior do que a que a
obtida quando luta por si mesmo.”

Brain sorriu. Foi um sorriso gentil e despreocupado.

“Talvez seja apenas um pouco, mas ainda assim eu entendo.”

“Eu não tenho idéia do que está falando... Que pena, Unglaus. É uma pena que eu tenha
que matar um gênio espadachim que já esteve no mesmo nível do poderoso Gazef Stro-
noff.”

“Tem certeza que pode fazer isso, mesmo usando sua espada apenas em benefício pró-
prio?”

“Claro que posso. Será bastante fácil. E depois que eu te matar, vou matar esse pirralho
aí. Sem mais brincadeiras e joguetes. Eu vou com tudo.”

Enquanto Brain observava Succulent começar um encantamento, ele sentiu alguém se


movendo atrás dele e emitiu um aviso.

“Climb-kun, não se mova. Você ainda não está totalmente recuperado, está?”

Climb congelou.

Brain sorriu. Ele ficou tão surpreso com isso quanto com o que fizera naquele momento.
Então, acrescentou:

“Deixa que eu resolvo isso.”

“—Muito obrigado.”

Brain sorriu em resposta e embainhou sua espada. Então, abaixou a postura e inclinou
a espada e a bainha em sua cintura.

“Por favor, tenha cuidado. Succulent usa ilusões. O que o senhor vê pode não ser o real.”
“Agradeço o aviso... sim, um adversário bastante complicado. Mas não se preocupe, tudo
ficará bem.”

Brain ficou onde estava, olhando silenciosamente para Succulent. Ele havia criado cinco
duplicatas ilusórias do nada, ele brilhava com o que parecia ser um brilho mágico. Além
disso, ele parecia ter vestido algum tipo de capa sombria. Brain não tinha idéia de que
tipo de magia Succulent usara.

“Obrigado por me dar tempo para me preparar. Os magic casters são mais poderosos
que os guerreiros quando podem se preparar. Você perdeu, Unglaus!”

“Hm, não precisa me agradecer. Depois de falar com ele... bem, tenho certeza que não
posso perder.”

“...Grandes palavras para alguém que tem a lâmina comprada por trocados! Então você
vai ficar para proteger esse merdinha. Que gentil da sua parte.”

Brain ouviu o som de Climb se deslocando.

Climb deve estar se sentindo culpado por dar tempo ao inimigo para se preparar. Por-
tanto, Brain fez uma declaração, alto o suficiente para que Climb pudesse ouvir.

“—Um golpe.”

“Quê?”

“Eu disse, vou te derrotar com um golpe, Succulent.”

“Quero ver você tentar!”

Succulent o atacou, envolto por suas duplicatas.

Quando seu oponente entrou em seu alcance de ataque, Brain deu meia volta, ignorando
completamente como estava expondo suas costas indefesas à Succulent que se aproxi-
mava. E então — com Climb no meio — Brain sacou com uma velocidade incrível e cortou
o ar vazio.

♦♦♦

Houve um poderoso estrondo quando as paredes tremeram.

Climb, ainda no chão, e Coccodol viraram-se para a fonte do som.

Succulent estava ali. Ele bateu no chão e ficou imóvel. Sua espada caiu no chão.
O poderoso corte de Brain havia lançado Succulent voando, esmagando-o contra a pa-
rede com uma força tremenda, e logo em seguida ele desabou no chão. Se Brain não o
tivesse atingido com o dorso da espada, Succulent estaria no chão em dois pedaços em
vez de um. Mesmo a cota de malha de orichalcum que ele usava não fez diferença, tão
poderoso foi aquele golpe.

“...Meu 《Campo》 pode pegar qualquer coisa — até mesmo alguém invisível. A ilusão
na frente era para chamar minha atenção para que ele pudesse atacar por trás... Um mo-
vimento astuto, mas infelizmente, ele usou contra a pessoa errada. Além disso, atacar o
Climb-kun foi uma má escolha. Deixe-me adivinhar, você queria matá-lo e depois zombar
de mim por não ser capaz de protegê-lo. No entanto, você estava tão focado em atacar o
Climb-kun que estava deitado no chão que você não estava de olho em mim. Você esque-
ceu quem você estava lutando?”

Brain embainhou sua espada e sorriu para Climb.

“Eu disse a você, não é? Um ataque.”

“Bom trabalho!” Disse Climb.

Mas outra pessoa disse “Bom trabalho” além de Climb, e as duas vozes se misturaram.
Era Sebas, isso não era nada de especial. Em vez disso, era de onde vinha a voz que sur-
preendia.

Os dois olharam para onde Coccodol estivera de pé.

Em seu lugar estava Sebas, e ao lado dele estava a forma inerte de Coccodol.

“Quando o senhor chegou!?”

Sebas respondeu calmamente à pergunta de Brain:

“Agora mesmo. Creio que é porque vocês estavam focados em Succulent e não me nota-
ram.”

“M-mesmo?”

Nem pensar... Brain pensou enquanto respondia.

Eu tinha 《Campo》 ativo, não? Pode ter um raio pequeno, mas eu deveria tê-lo sentido
se ele tivesse vindo correndo até nós. Mas eu não o senti... Até agora, apenas aquele monstro,
Shalltear Bloodfallen, pôde fazer isso. Bem, eu tive minhas suspeitas quando ele emitiu sua
intenção assassina mais cedo, mas agora eu tenho certeza disso — ele está no mesmo nível
daquele monstro. De onde ele vem?
“De todo modo, as pessoas presas aqui foram resgatadas. Além disso, Climb-kun... Me
desculpe, mas algumas pessoas resistiram ferozmente, então eu tive que matá-las. Por
favor, me perdoe... mas antes disso, eu devo curar suas feridas.”

Sebas veio diante de Climb e colocou as mãos em sua barriga. Foi um breve contato —
ele tirou a mão logo após tocá-lo. No entanto, os resultados foram claramente óbvios. O
rosto de Climb ainda estava pálido depois de beber a poção, mas agora ele estava de volta
a um estado saudável.

“Minhas feridas estão curadas... O senhor é um sacerdote?”

“Não, eu não usei o poder dos deuses. Em vez disso, infundi meu ki em você para curar.”

“Um monge então! Não é de se admirar!”

Brain exclamou. Agora ele entendia por que Sebas não estava armado nem armadurado.
Sebas apenas sorriu como afirmativo.

“Então, o que planejam fazer agora?”

“Bem, pretendo ir imediatamente até o posto de guarda mais próximo, explicar a situa-
ção e voltar com alguns homens. Espero que os senhores possam vigiar a fortificação
enquanto isso. Pelo que sabemos, a Oito Dedos pode enviar reforços.”

“...Bem, já que estou aqui, não fará mal algum ficar mais um pouco.”

“Não vejo problemas também. No entanto, eu poderia incomodá-lo para não mencionar
minha participação? Eu vim a este país para fazer negócios e, para ser honesto, não de-
sejo continuar interferindo no submundo de uma nação estrangeira.”

“Por mim tudo bem. Se alguém perguntar, basta dizer que o Stronoff irá atestar em meu
nome.”

“Compreendo. Eu farei como os senhores dizem. Então, por favor, protejam aqui por
enquanto.”

Parte 3

3º Dia do mês Baixo Fogo (9º mês) – 19:05

Climb finalmente retornou ao Palácio Real quando a escuridão começou a se espalhar


pela Capital Real.
Suas feridas estavam completamente curadas, mas ele estava cansado além da conta. Os
combates levaram bastante tempo, e ainda tiveram que coordenar as coisas depois do
fato. No final, as coisas funcionaram não porque Climb tivesse o apoio de Renner, mas
porque os soldados tinham medo da Oito Dedos e não ousavam lidar com as coisas com
muita ansiedade. O maior problema foi a questão de assumir responsabilidade.

O responsável também pode se tornar um alvo da Oito Dedos — ser usado como exem-
plo. Esta não era uma probabilidade distante, mas uma possibilidade distinta. Portanto,
Climb simplesmente anotou os eventos e pediu aos soldados que enviassem a Renner.
Depois de receber sua aprovação, ele assinou seu nome e o de sua mestra Renner como
responsáveis.

Claro, havia desvantagens em fazer isso, mas havia pelo menos dois méritos para essa
abordagem.

A primeira seria que a reputação de Renner aumentaria.

Ela tinha agido contra uma organização que corrompia o coração do Reino, e ainda cap-
turaram o responsável pelo tráfico de escravos. Além disso, seu subordinado havia lide-
rado uma investida contra esse sindicato do crime. Isso certamente impulsionaria a opi-
nião pública de Renner, que de outra forma permaneceria dentro do Palácio.

A segunda seria que eles poderiam proteger Sebas e a mulher que ele havia resgatado
do abuso naquele bordel.

Agora que Climb e Renner tinham recebido crédito por isso, isso impediria Sebas e
aquela mulher de chamar a atenção, e também evitaria que se tornassem alvos prioritá-
rios para a Oito Dedos.

Eu não fiz nada durante o ataque... só o mínimo possível...

Quanto a Brain, ele disse que falaria com Gazef por conta própria e incentivou Climb a
não se preocupar.

Climb pensou sobre essas coisas quando bateu na porta de Renner.

Renner disse a ele que não havia necessidade de bater e que ele deveria entrar direta-
mente. No entanto, ele estava atrasado, e além disso, era indelicado adentrar em seu
quarto sem avisar. Desde do dia que acidentalmente viu Renner em uma camisola de
seda pura, ele fez questão de bater toda vez que a visitava.

Sua mestra concordou com isso.

Enquanto Climb esperava por uma resposta, ele se cheirou.


Ele tomara banho e se esfregara, mas não tinha certeza de que o fedor de sangue desa-
parecera, afinal, seu nariz estava acostumado a isso. E para ser sincero, ele não deveria
ter entrado nos aposentos de Renner neste traje, mas era imperativo que relatasse os
eventos do dia para Renner com suas próprias palavras.

O mais importante era as pessoas que estavam trancafiadas naquele lugar. Elas estavam
atualmente sob a custódia do posto de guarda, mas precisariam ser levadas para algum
lugar seguro dentro de alguns dias. Algumas ficaram feridas, então ele teve que provi-
denciar para os sacerdotes e outros curandeiros a ajudá-los.

Renner-sama é gentil. Ela certamente dará uma ajuda ao povo que estiver em necessidade.

Climb sentiu seu coração ficar pesado enquanto pensava em todas as coisas com as
quais ele perturbaria sua mestra a ouvir. Ele não pôde deixar de pensar em como seria
melhor se ele fosse mais forte. Foi tudo graças a ela que ele poderia levar uma vida como
esta e servir uma mestra tão altruísta, mas ele não poderia fazer mais por ela.

...Estranho. Ela ainda não respondeu... será que não ouvi?

Ele não a ouviu conceder permissão para entrar.

Ninguém estava de pé em frente à porta, então Renner não deveria estar dormindo
ainda. Poderia ter acidentalmente adormecido sem informar o guarda?

Climb bateu novamente.

Desta vez, Climb ouviu uma voz calma concedendo-lhe a entrada de dentro do quarto.
Isso colocou seu coração à vontade e ele entrou. Ele já havia decidido a primeira coisa
que faria.

“Perdoe meu retorno tardio.”

Ele abaixou a cabeça, em desculpas.

“Eu estava tão preocupada!”

Climb podia ouvir uma raiva distinta na voz de Renner, o que o surpreendeu. A mestra
de Climb raramente ficava com raiva. Mesmo quando insultada, ela nunca mostrava sua
raiva na frente de Climb. Foi por isso que ele estava ciente de que Renner estava real-
mente preocupada.

Ele lutou contra as lágrimas quentes que ameaçavam escorrer do canto dos olhos e abai-
xou a cabeça em sincero pedido de desculpas.
“Eu estava realmente preocupada com você! Quando pensei nos tipos de coisas que a
Oito Dedos poderia ter feito com você, então... o que exatamente aconteceu? Recebi um
breve relatório, mas me explique os detalhes, por favor?”

Climb entregaria seu relatório de pé, mas Renner insistiu que ele se sentasse.

Assim, Climb se sentou. Havia uma xícara de chá na frente dele, e Renner serviu-lhe uma
xícara de chá quente de seu item mágico Warm Bottle.

Depois de agradecer, ele bebeu o chá.

Depois narrou toda a situação para Renner, e o porquê de algumas pessoas precisarem
da ajuda dela.

“O que você pensou dessas pessoas quando as viu?”

Climb ficou brevemente perplexo com a primeira pergunta que Renner havia feito de-
pois de ouvir os procedimentos. No entanto, ela perguntou, então ele teve que responder.

“Eu senti pena. Se eu fosse mais forte, poderia salvar essas pessoas do sofrimento.”

“Eu sei que sim... Você deve ter sentido pena delas, Climb.”

“Sim.”

“É seu jeito. Você é muito incrível, Climb.”

“Renner-sama, se precisar de mim para protegê-las, eu posso ir a qualquer momento.


Eu já me decidi.”

“...Vou te avisar quando chegar a hora. Vamos deixar isso de lado por enquanto; tenho
algo para te dizer. Amanhã, ou depois de amanhã, pretendemos lançar ataques contra as
bases da Oito Dedos, indicadas no pergaminho que a Lakyus nos deu. Você pode imaginar
como suas defesas se tornarão mais fortes com o passar do tempo, graças ao ataque ao
bordel.”

“Minhas sinceras desculpas! Foi minha culpa por agir sozinho!”

“Não, por favor, não se preocupe. Pense nisso como se estivéssemos decidindo sobre um
curso de ação. Além disso, gosto de como você se impôs desta vez, Climb. Você capturou
Succulent, um membro do Seis Braços, e trouxe Coccodol, o chefe da Divisão de Escrava-
tura. Isso deve fragilizar nossos oponentes. Portanto, quero aproveitar essa vitória.”

Renner deu um leve soco no ar de um jeito fofo.


“Nós os derrotaremos novamente antes que eles façam qualquer estardalhaço na Capi-
tal!”

“Entendido! Vou descansar agora e reunir minhas forças para as operações de amanhã!”

“Por favor faça. Eu acho que amanhã será um dia muito emocionante. Por favor, mante-
nha isso em mente.”

♦♦♦

Climb deixou o quarto. Ele sentiu o cheiro de sangue ter desaparecido um pouco.

“Muitíssimo obrigada, Climb. A seguir...”

Depois de terminar o chá agora frio, Renner se levantou. Ela caminhou até uma campa-
inha. Se ela a agitasse, o sino na sala adjacente também tocaria. Enquanto pensava no
rosto da serva esperando no cômodo ao lado, ela sorriu friamente. Que sorte que ela es-
tava de plantão hoje.

“Ora ora, que tipo de expressão devo colocar agora?”

Renner ficou diante do espelho e segurou o rosto com as duas mãos. Então ela esfregou
para cima e para baixo suas bochechas. Ela era apenas humana, e isso não mudaria a
forma de seu rosto. Foi apenas uma forma de autoafirmação.

Renner soltou e sorriu.

“Não, este é o sorriso que uma princesa usa para conhecer outras pessoas...”

Renner sorriu novamente. Ela passou por uma variedade deles antes de se decidir por
um sorriso puro e inocente.

“Assim está melhor.”

Depois que os preparativos foram concluídos, Renner tocou a campainha. Logo, uma
empregada bateu na porta e entrou.

“Você poderia fazer algo por mim? Poderia me ajudar a ferver um pouco de água
quente?”

“Imediatamente, Renner-sama.”

A empregada se curvou e Renner sorriu para ela.

“Qual o problema? A senhora parece muito feliz hoje. Aconteceu alguma coisa boa?”
Agora que sua presa mordera a isca, o sorriso de Renner ficou ainda mais alegre.

“Ei, ficou sabendo? O Climb-kun foi muito bom hoje! Ele foi fantástico!”

Ela falava como uma criança. A atitude que se encaixava em uma princesa tola que va-
zava informações importantes sem nem perceber.

“Bem, isso é adorável da parte dele.”

A empregada odiava Climb, e ela tentou o seu melhor para esconder seu descontenta-
mento. No entanto, ela não conseguia manter suas emoções fora de suas palavras.

—Morra.

—Você deve morrer.

—Todos que ousam desprezar meu Climb devem morrer.

Renner fingiu que não tinha ouvido a resposta da empregada, afinal, Renner era uma
princesinha inocente. Ela não sentia as más intenções dos outros e não dava a grosseria
deles. Ela era uma princesa ingênua, inocente e tola.

“Sim! Ele foi tãããão incrível! O Climb derrotou um monte de bandidos! E então resgatou
um monte de gente que os bandidos prenderam! Ele as enviou para... ah, sim, acho que
ele as enviou para um posto da guarda. Agora podemos punir os nobres que ajudaram os
bandidos a fazer coisas ruins!”

“Jura? Maravilhoso, esse Climb-san é realmente digno da senhora, Renner-sama. Se não


for incômodo, poderia me contar mais sobre seus feitos heroicos?”

A empregada acreditava que a princesa não tinha a menor idéia e não suspeitaria de
nada. Assim, Renner começou a emaranhar aquela mulher estúpida em seu esquema.

Tudo estava dançando na palma de sua mão. Tudo isso foi para ganhar o que ela queria.

3º Dia do mês Baixo Fogo (9º mês) – 22:10

Um grupo de aparência estranha se fundia na escuridão.

Todos equipados de forma diferente, sem qualquer senso de arregimentação ou uni-


dade. A coisa mais próxima a aparência provavelmente seriam os aventureiros.

À sua frente estava um homem robusto e musculoso. Atrás dele, havia um belo homem
de aparência frágil, assim como uma mulher de cabelos prateados. Atrás dele estava al-
guém coberto por um robe, e mais atrás outro em uma armadura completa.
O grupo estava olhando para uma porta aberta. A sala do outro lado era escura como
um breu, e eles sentiram que todos os ocupantes anteriores haviam partido há muito
tempo. Uma olhada ao redor não mostrou mais ninguém.

Esta foi uma situação bastante estranha. De fato, o bordel deveria ter sido despido e
tomado pelo posto de guarda. Dito isto, alguém deveria ter sido postado para vigiar,
mesmo que o lugar estivesse vazio. De fato, se alguém olhasse ao longo das ruas vazias,
seria possível ver sinais de fogo onde o guarda noturno estaria posicionado.

No entanto, não havia ninguém aqui. Isso porque esse grupo usou sua influência para se
livrar temporariamente das sentinelas.

O homem de rosto firme como uma rocha — Zero — encarou ferozmente o bordel es-
vaziado e rosnou:

“Isso é muito grande para ser uma mera piada. Preciso me desculpar com o Coccodol.
Emprestei o Succulent do Seis Braços, mas acho que este lugar foi tomado facilmente e
no dia em que o enviei... Que piada.”

Uma risada desdenhosa veio de trás dele. Zero se virou e fixou a fonte daquela risada
com um olhar afiado.

A mulher em trajes de seda conhecia a personalidade de Zero, e disse apressadamente:

“Ah, bem... Então chefe, o que devemos fazer agora? Matar o Succulent, já que ele foi
capturado? Se sim, ele deve estar no posto de guarda. Somos todos do tipo de ataque
direto e, se isso não funcionar, teremos que contratar assassinos de outros departamen-
tos... o que me diz?”

“Não há necessidade de ir tão longe. Até um homem como ele tem seus usos. Vou pedir
ao Conde para libertá-lo... Mas isso vai custar um bom dinheiro. Melhor ir fazendo uma
lista do que o Conde gosta.”

“E quanto ao Coccodol?”

O homem belo de aparência delicada perguntou.

“Ele tem suas próprias conexões. Se ele tiver alguma solicitação, nós as trataremos por
meio de nossas conexões. Considere como uma forma de desculpas. E a lista de convida-
dos? Eu ouvi que os guardas a pegaram, não?”

“Informações desse meio ainda não chegaram. Ou melhor, ouvi dizer que eles não des-
vendaram detalhes concretos.”

A voz de baixo do robe era sombria. Era como se alguém estivesse falando de um túmulo.
A voz sepulcral provocava arrepios nas espinhas dos ouvintes.
“Eu gostaria de colocar minhas mãos nisso. Podemos usá-lo para todos os tipos de chan-
tagem.”

“Não seja tolo. Se conseguirmos, as outras divisões ficarão ainda mais desconfiadas de
nós. As pessoas já estão suspeitando que estávamos por trás de tudo isso. Se encontrar-
mos a lista de convidados em algum lugar, dê a Coccodol alguns dias depois e peça des-
culpas. Além disso, a lista deve estar codificada, impossibilitando o uso por terceiros.”

O belo homem deu de ombros em resposta ao discurso de Zero.

“De qualquer forma, investigaremos esse assunto mais tarde. Meu palpite é que, se exis-
tir, estará escondido em algum cofre... ainda assim, quem quebrou essa porta realmente
fez um feito e tanto. Como eles fizeram esse buraco? Eu duvido que eles usaram uma
arma... foi magia?”

“Foi um punho.”

Todos os olhos foram para o corpo de Zero. Zero repetiu-se — que essas marcas foram
feitas por um punho.

“Punhos... Bem, isso é uma coisa e tanto.”

“—Não seja tolo. Isso não é nada.”

Zero respirou fundo e interrompeu o suspiro de surpresa da mulher, depois cortou a


porta com a mão nua. Sua mão afundou na porta como se ele estivesse rasgando papel.
Zero retirou a mão, deixando um rasgo que combinava com o que Sebas havia deixado.

O homem de bela aparência falou um pouco sem jeito:

“Bem, você não é uma boa comparação, chefe... ainda assim, nosso inimigo pode derru-
bar uma porta reforçada com aço. Succulent era o mais fraco de nós, mas ainda assim,
isso significa que ele derrubou um membro do Seis Braços. Deveríamos tomá-lo como
um inimigo em potencial, então?”

“Mesmo considerando isso, a derrota de Succulent, isso não indica que o inimigo é muito
forte, não?”

Havia uma corrente de escárnio na voz da pessoa de robe.

“Ele é muito mais fraco do que nós quando percebem suas ilusões. Ele é bom contra as
pessoas medíocres, mas perde contra qualquer oposição decente. Não sabiam disso?”

Ele foi respondido por várias risadas. Isso era tanto um sinal de aprovação quanto um
sinal de zombaria para os mais fracos que eles.
“Nós dissemos tudo o que precisava ser dito. Eu perguntarei novamente — o que deve-
mos fazer? Recuar? Eu não acho que o confronto com o nosso adversário valerá as perdas
potenciais.”

“Não seja ridículo.”

As palavras de Zero estavam atadas com uma raiva que ele não podia suprimir comple-
tamente.

“Nossa reputação será prejudicada se não dermos um exemplo da pessoa que atacou
esse lugar. Que se dane as perdas. Os Seis Braços marcharão junto para eliminar esse
intrusor. Rei Undead, Davernoch.”

O homem de robe estendeu a mão. A dita mão não pertencia a uma criatura viva, e se-
gurava uma esfera que irradiava uma aura bizarra em resposta às emoções do dono.

“Corte Espacial, Peshurian.”

O homem até então silencioso em armadura de placas bateu no peito com um estrondo
retumbante de metal.

“Cimitarra Dançante, Edström.”

A mulher vestida de seda inclinou a cabeça elegantemente, e as pulseiras em seus pulsos


tilintaram.

“Mil Mortes, Malmvist.”

O belo homem estalou os calcanhares junto com um relatório ressonante.

“E mesmo eu, Demônio de Batalha, Zero!”

As pessoas ao seu redor acenaram para mostrar sua concordância e compreensão.

“Primeiro, vamos resgatar o Succulent e questioná-lo. Depois disso... encontre um bom


torturador. Vamos mostrar ao atacante o verdadeiro significado do inferno. Nós vamos
fazê-lo se arrepender de sua tolice!”

3º Dia do mês Baixo Fogo (9º mês) – 17:42

Era o pôr do sol quando tudo terminou e Sebas voltou para casa.

Climb-kun está protegendo todas as pessoas capturadas. Succulent, o dono e todos os ou-
tros foram presos. Isso deve mantê-los em silêncio por um tempo. Espero que isso tenha me
comprado algum tempo.
Então, o que ele deveria fazer sobre Tsuare? Sebas achava que a melhor opção seria
leva-la a algum lugar seguro, mas Sebas sabia que havia apenas um lugar realmente se-
guro em todo o mundo.

Enquanto Sebas agonizava sobre o assunto, seus pés o trouxeram de volta para casa.

Assim que ele estava prestes a abrir a porta, sua mão congelou. Alguém estava atrás da
porta. Ele sentiu que era Solution, mas Sebas não tinha idéia do porquê ela estava por
trás disso.

Havia algum tipo de emergência?

Sebas teve um mau pressentimento sobre isso, mas ele ainda abriu a porta. O que ele
viu a seguir desafiou suas expectativas e o deixou sem movimento.

“Bem-vindo de volta, Sebas-sama.”

Solution estava em seu uniforme de Empregada de Batalha.

Um arrepio percorreu a espinha de Sebas.

Solution — que fazia o papel de uma herdeira mercante — estava usando seu uniforme
de Empregada na presença de Tsuare, uma humana que não sabia nada sobre a verdade.
Foi porque ela não precisava atuar mais, ou havia algum motivo que exigisse que ela
usasse seu uniforme?

Se fosse o primeiro, isso significaria que algo havia acontecido com Tsuare. Se fosse o
último—

“—Sebas-sama. Ainz-sama o está esperando, por favor, entre.”

Tanto a voz quanto a tranquilidade de Solution fizeram o coração de Sebas ribombar em


seu peito.

Sebas, que podia permanecer calmo diante de um poderoso inimigo, que era tão forte
quanto um Guardião de Andar estava realmente ansioso e tenso quando ouviu que seu
mestre o esperava.

“Por que, por que ele está...”

Sebas gaguejou. Solution continuou o observando em silencio antes de dizer:

“Sebas-sama. Ainz-sana o espera.”


Não havia mais nada a ser dito. Tudo o que Sebas pôde fazer foi seguir Solution para o
interior da casa.

Seus passos eram pesados, como um criminoso condenado caminhando para a guilho-
tina.
Posfácio
Aqui é o autor, Maruyama Kugane. Overlord atingiu seu quinto volume num piscar de
olhos. Por favor, permita-me agradecer a todos que apoiaram esta série.

Muito obrigado.

Falando nisso, já que os Volumes 5 e 6 serão correlatos eu fiquei me perguntando, “Eu


preciso de um posfácio?” Eu discuti isso com a Editora-san e no final, a Editora-san disse
que alguns leitores desejariam isso, então eu provavelmente deveria escrever um...

Mas alguém realmente espera pelo posfácio? Será que as palavras afinal são realmente
interessantes...? Hm, a Editora-san quer dizer que eu deveria me forçar a escrever algo
interessante?

Algo interessante... Bem, para lidar com as inúmeras questões que surgiram nos Volu-
mes 5 e 6, passei todos os meus dias de folga entre agosto e o final de novembro em casa,
a fim de apressar o lançamento do livro... isso é tudo que tenho.

Além disso, como o Volume 6 incluirá um CD Drama como o Volume 4, o tempo é ainda
mais apertado do que o normal. É um ritmo realmente alucinante...

Mas essa é a vida de um escritor de meio período! Hm. Não é nada interessante. Eu estou
arruinando as esperanças e sonhos de todos, eu sei.

Então, vamos mudar o assunto. A versão WN de OVERLORD também está sendo atuali-
zada, mas o Volume 6 será 90% de novidades.

Inicialmente, concentrei-me em adicionar novos elementos ao reescrever os capítulos


da WN para o lançamento. Notará isso no próximo volume.

O manuscrito já está completo, então, se nada aparecer, ele deve ser colocado à venda
em janeiro de 2014. Espero que possamos nos encontrar novamente no próximo posfá-
cio.

Agora, aos agradecimentos.

So-bin-sama, que faz ilustrações, Chord Design Studio, que faz o design do livro, Ohaku-
sama, que faz revisão, F-da-sama, a editora, assim como todos que ajudaram a fazer
OVERLORD o que ele é hoje — obrigado a todos. Além disso, obrigado por toda sua ajuda,
Honey. Finalmente, obrigado a todos vocês leitores por comprarem este livro! Vocês têm
a minha sincera gratidão!

Maruyama Kugane
Ilustrações
Glossário
Glossário
-Magias, Habilidades & Passivas- -Nomes-
Tradução livre de seus nomes
Lailah:ライラ - é equivalente a palavra hebraica para
Alarm: .............................................................................. Alarme. “noite” (laylah ‫)לילה‬, que também é um nome de um anjo.
Continual Light: ................................................. Luz Contínua. Succulent: .......... Nome vindo do francês para “delicioso”.
Floating Board: ........................................ Prancha Flutuante.
Fly: ........................................................................................ Voar.
Heal: .................................................................................... Curar. -Raças & Monstros-
Invisibility:......................................................... Invisibilidade.
Kage Hisomi: ........................................ Esconder na Sombra. Air Giant: ............................................................ Gigante do Ar.
Message: .................................................................. Mensagem. Basilisco Gigante:Em grego: βασιλίσκος; transl.: basilís-
Multiple Vision: ...............................................Visão Múltipla. kos, “pequeno rei”.
Puppeteer’s Palm: .......................... Palma do Marionetista. Gargoyle:O termo é originário do gargouille francês, que
Scintillating Scotoma: ........................ Escotoma Cintilante. em inglês provavelmente significa “garganta” ou é conhe-
Yami Watari: ............................................ Travessia Sombria. cido como “esôfago”.
Shoggoth:Vem dos Cthulhu Mythos, são seres amorfos,
uma massa protoplásmica viva que compõe os Shoggoths
-Itens- é formada por um colóide translúcido, semi-fluido de as-
Tradução livre & Curiosidades pecto viscos
Skeletal Dragon: .................................... Dragão Esquelético.
Axe Cyclone: ................................................ Ciclone Machado. Ubbo-Sathla:Vem dos Cthulhu Mythos, também conhe-
Bell of Detecting Secret Doors: Sino de Detecção de Por- cido como a Fonte Unbegotten. É descrito como uma
tas Secretas. enorme massa protoplasmática que repousa em uma
Bell of Opening Locks: ..Sino de Abertura de Fechaduras gruta bem abaixo da terra congelada. O ser é de uma
Bell of Removing Traps:Sino de Remoção de Armadi- monstruosa fecundidade, gerando espontaneamente or-
lhas. ganismos unicelulares primordiais que fluem incessante-
Nameless Spellbook: ........... Livro das Magias Sem Nome. mente de sua forma disforme.
Vampire Blade: ........................................... Lâmina Vampira. Undead: ...................................................................Morto-Vivo.
Warm Bottle: ................................................... Garrafa Morna.

-Honoríficos & Tratamentos-


-Termos & Terminologias-
Kun:君 - O sufixo “Kun” é bastante utilizado na relação
Badtrip:É o termo (gíria) que representa as sensações fi- “superior falando com um inferior”, mas apenas se houver
siológicas e psicológicas desagradáveis provocadas pelo um certo grau de intimidade e amizade entre ambos.
uso de substâncias psicoativas durante os efeitos psico- Sama:様 | さま- O sufixo “Sama” é uma versão mais res-
trópicos. Às vezes são causadas por fatores internos; peitosa e formal de “san”. A traduções mais próxima do
como o estado mental que o usuário já apresentava antes termo “sama” para o português seria “Vossa Senhoria”.
do consumo e a droga ampliou. Não é conhecido como Japão, não é importante referir-se
Escotoma:Do grego scotoma, escuridão) é uma região do a pessoas importantes ou a alguém que não admira e é
campo visual que apresenta perda total ou parcial da acui- muito importante, não império antigo era muito usado
dade visual, rodeada de uma outra região em que a visão para se referir como rainhas.
normal está preservada. San:さん - O sufixo “San” é um honorífico que pode ser
Colhedora de Cereja:É uma alusão ao termo “Menino Ce- usado em praticamente todas as situações, independente
reja” チェリーボーイ, traduzido acima como “Virgenzi- do sexo da pessoa. Normalmente é usado para pessoas
nho”. Na cultura japonesa são homens com nenhuma ex- que temos pouca ou nenhuma intimidade. Também usado
periência sexual, não é um termo usado por aqui. quando a pessoa considera o interlocutor como um de
Kiseru:煙管 - é um cachimbo japonês tradicionalmente igual hierarquia.
usado para fumar uma pequena porção (cerca de 25 mg)
de kizami, um produto de tabaco finamente picado que
lembra cabelo.
Lounge: Área de espera em estabelecimentos comerciais.
Rotação de Culturas: É uma técnica agrícola de conser-
vação que visa a diminuir a exaustão do solo. Isto é feito
trocando as culturas a cada novo plantio de forma que as
necessidades de adubação sejam diferentes a cada ciclo.
Consiste em alternar espécies vegetais numa mesma área
agrícola. As espécies escolhidas devem ter, ao mesmo
tempo, propósitos comercial e de recuperação do solo.
Notas da Tradução:
O Basilísco. As aventuras de Momon e Nabe com o Basilísco vem do CD Áudio Drama
02 - A História do Herói Negro.

Escuridão. Esse nome da equipe do Momon vem de 漆黒 (Shikkoku), é quase que uma
correlação com a equipe Espada das Trevas do volume 2 漆黒の剣 (Shikkoku No Ken).
Mas traduzir o nome da equipe do Momon para Trevas, ou traduzir o nome do finado
grupo para Espadas da Escuridão... também ficaria meio estranho ao meu ver. Então fi-
quem cientes dessa correlação dos nomes.
O Reino Re-Estize está sendo ameaçado pela “Oito Dedos”, uma organização
criminosa que governa a parte clandestina do Reino. Sendo o tipo de mor-
domo que é leal ao seu mestre, Sebas vai para o Reino para coletar informa-
ções sob o comando de Ainz.

Climb está ansioso por causa sua fraqueza, apesar de sua lealdade à Prin-
cesa Dourada.

Após sua derrota humilhante nas mãos de Shalltear Bloodfallen, Brain re-
torna à Capital Real como uma casca vazia do guerreiro que já foi.

Com o Reino como palco, esses três homens juntos enfrentam a organização
clandestina, cada um com seus próprios motivos!

ISBN: 978-4047292598

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