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OS OPERADORES DO DIREITO
RESUMO
ABSTRACT
1
Professora Titular de Medicina Forense da Faculdade de Direito da Universidade Presbiteriana Macken-
zie, Professora Doutora de Medicina Forense do Departamento de Direito Penal, Medicina Forense, Cri-
minologia da Faculdade de Direito da Universidade de S„o Paulo e Membro da Sociedade Brasileira de
Medicina Legal.
1
EVOLU«/O HIST”RICA
Tanto o Direito quanto a Medicina se preocupam com a harmonia que deve exis-
tir com o ser humano. Os dois tÍm um ponto em comum. O Direito se ocupa do ser in-
tegrado na sociedade, onde h· leis, regras e ordenamentos que lhes ditam obrigaÁıes e
lhes conferem direitos para que exista uma convivÍncia serena e pacÌfica. A medicina
cuida do homem dotado de inteligÍncia, de Ûrg„os e aparelhos, que devem funcionar a
contento. Quando o equilÌbrio org‚nico È quebrado surgem as doenÁas. Entre os direitos
protegidos temos a sa˙de, a integridade fÌsica e a vida, mas esses direitos podem ser
violados, num grupo social, È aÌ que essas ciÍncias se tocam. E o elo de uni„o entre elas
È a Medicina Legal, que age como uma ponte unindo ambas.
Bem afirma Gerardo Vasconcelos (1976, p. 02),
2
medicina judici·ria. Tudo decorria do poder dos sacerdotes, tidos como representantes
divinos, que determinavam normas para serem obedecidas de forma que os bons espÌri-
tos acompanhassem o grupo. Quando o castigo dos deuses atingia um membro, sob a
forma de doenÁa, eles eram chamados para afastar espÌritos e curar os doentes. Esses
sacerdotes eram ao mesmo tempo legislador, juiz e mÈdico e como os corpos eram sa-
grados, o exame cadavÈrico interno era proibido. Nesse perÌodo, portanto, a Medicina
Legal tinha apenas o propÛsito de tratar doentes.
O CÛdigo Penal de Hamurabi, da BabilÙnia, do sÈculo XVIII a.C. contÈm sen-
tenÁas ditadas pelo rei Hamurabi, demonstrando relaÁıes jurÌdicas entre mÈdico e paci-
ente. A boa remuneraÁ„o seria dada como uma retribuiÁ„o ao ato mÈdico bem sucedido,
no entanto, a puniÁ„o era aplicada em casos contr·rios. Se um mÈdico, ao tratar o feri-
mento do escravo ou do animal de um homem pobre, os levasse ‡ morte ou produzisse
sequelas, deveria pagar escravo por escravo, animal por animal.
Esse mesmo cÛdigo fazia referÍncia ‡ anulaÁ„o de contratos de compra e venda
de escravos, quando estes estivessem doentes. No sÈculo V a.C. as leis de Manu proibi-
am que idosos, deficientes mentais e loucos, crianÁas e embriagados fossem ouvidos
como testemunhas, impedimentos que surgiram mais tarde no mundo ocidental com a
Lei das XII T·buas em 449 a.C. No Egito, antes do embalsamamento era obrigatÛrio
exames para a elucidaÁ„o da causa da morte; pelas tÈcnicas usadas para embalsamar, os
egÌpcios foram considerados os maiores tanatÛlogos de todos os tempos e os mÈdicos,
de ent„o, distinguiram pela primeira vez as diversas formas de fraturas. Nos casos de
violÍncia sexual, o suspeito era atado ao catre, em uma sala do templo, observando as
hierÛdulas, nuas, danÁando, ao seu redor e, seria imediatamente condenado caso o Ûrg„o
o traÌsse. Pelas leis de MenÈs as mulheres gr·vidas somente seriam punidas apÛs o par-
to.Em 1240 a.C, na China, as legislaÁıes vigentes instruÌam sobre o exame ìpost-
mortemî, indicavam antÌdotos para venenos e j· orientavam sobre respiraÁ„o artificial.
Na GrÈcia, antes da perÌcia, o mÈdico prestava juramento junto ao altar de Eu-
menes e, data dessa Època, os fundamentos da medicina do trabalho, em especial Plat„o
(427 a 347 a.C.) que descrevia as deformaÁıes nos artes„os em decorrÍncia de seus ofÌ-
cios. TambÈm vemos pr·ticas incipientes quando HipÛcrates opinava sobre os nasci-
mentos precoces e tardios. AristÛteles fixava em quarenta dias a Època de animaÁ„o do
feto, que foi acompanhada pelos magistrados do AreÛpago no julgamento dos crimes de
aborto (HERCULES, 2005, p.5-7 apud DEL-CAMPO, 2009, p. 03).
Periodo Romano - Em Roma, a primeira determinaÁ„o relativa ‡ perÌcia mÈdi-
co legal consta como sendo de Numa, inspirado pela ninfa EgÈria, e exgindo a pr·tica
da histerectomia2 nas gestantes mortas. Em todos os casos de morte violenta, o cad·ver
deveria ficar exposto ao p˙blico para que qualquer pessoa pudesse opinar sobre o fato
ocorrido. Na Lei das XII T·buas, j· citada, determinava-se que a duraÁ„o m·xima da
gravidez seria de dez meses, o que coincide com o nosso prazo de viuvez como causa
suspensiva de matrimÙnio. A primeira vÌtima de homicÌdio a passar por exame mÈdico,
foi J˙lio CÈsar em 44 a.C. O examinador foi Antistius, um mÈdico amigo, que consta-
tou 23 golpes, dos quais apenas um foi mortal.
No CÛdigo Justiniano encontra-se artigos referentes ao casamento, a impotÍncia,
ao aborto, ‡ interdiÁ„o ‡s doenÁas simuladas, ao parto. Depreende-se dessa lei (483 a
565 a.C.) que a Medicina Legal est· implÌcita, reconhecendo-se os mÈdicos como tes-
2
Denominada hoje cesariana, nome proveniente de ìcoedoî, cortar. In: PEIXOTO, Afr‚nio.
Medicina Legal. 8. ed. 2.vol. Sine local: Livraria Francisco Alves, 1938.
3
temunhas especiais em juÌzo. Registra ainda o Digesto, que a intervenÁ„o das parteiras
era exigida para o exame da prenhez, suposta e duvidosa.
Nessa Època cuidava-se, ainda, das disposiÁıes relacionadas ao casamento, sepa-
raÁ„o de corpos, impotÍncia e ‡ viabilidade fetal.
Segundo Tito LÌvio, o cad·ver de TarquÌnio, assassinado, foi examinado exter-
namente, por um mÈdico, em praÁa p˙blica.
Idade MÈdia ñ A ·rea pericial, nesse perÌodo demonstrou algum progresso. O
mÈdico iria contribuir mais diretamente para o direito, uma vez que Carlos Magno (742
a 814) determinava que os pareceres mÈdicos deviam orientar os juÌzes em casos de
les„o corporal, infanticÌdio, suicÌdio, estupro, impotÍncia e outras eventualidades.
Um perÌodo muito negro para o direito penal, e, para o que se denominaria mais
tarde Medicina Legal, com a fragmentaÁ„o do impÈrio de Carlos Magno, pois instalou-
se o regime feudal, e voltaram os costumes e usos locais, prevalecendo a pr·tica cruel
da mÌstica germ‚nica das provas inquisitoriais (ord·lios- JuÌzo de Deus). Prova da ·gua
e Ûleo ferventes, do fogo, da cruentaÁ„o e tantas outras.
No entanto na FranÁa, no sÈculo XIII, o Livro da Lei Comum de S„o Luis, de-
terminou a substituiÁ„o dos duelos judiciais e alguns ord·lios pela palavra dos mÈdicos.
Juntas mÈdicas constituÌdas por um mÈdico, um cirurgi„o e um botic·rio foram realiza-
das em casos de molÈstias alegadas, por determinaÁ„o do Edito de Godofredo de Bu-
lhıes.
PerÌodo CanÙnico - Nesse perÌodo tornaram-se habituais os Exames Periciais,
por forÁa do prestÌgio do Papa InocÍncio III em 1219. Essa Època foi influenciada bene-
ficamente pelo Cristianismo. Em 1234 substituiu-se o juramento da acusada pelo exame
mÈdico de virgindade, nos casos de anulaÁ„o de casamento.
A import‚ncia de mÈdicos nos tribunais foi ganhando maior destaque e, na Fran-
Áa, Felipe ìO Audazî emite as ìCartas Patentesî em 1278, fazendo referÍncia a cirurgi-
ıes juramentados junto ao rei, e, a nomeaÁ„o de mÈdicos, cirurgiıes, parteiras e barbei-
ros para funcionarem, como peritos, em casos de les„o corporal, morte violenta e aten-
tado ao pudor acabam se tornando frequentes em Paris.
As autÛpsias continuavam a ser realizadas clandestinamente pelos anatomistas,
mas em 1374 o Papa GregÛrio XI concedeu ‡ Faculdade de Medicina de Montpellier a
primeira autorizaÁ„o para exames internos para estudos anatÙmicos e clÌnicos. Ainda
estava longe a necrÛpsia MÈdico Legal. Em 1521, quando o Papa Le„o X veio a Ûbito
com suspeita de envenenamento, seu corpo foi necropsiado (FRAN«A, 2004, p. 04).
Em 1532 a promulgaÁ„o da ìConstitutio Criminalis Carolinaî, do imperador
alem„o Carlos V, marcou de maneira indelÈvel a histÛria da Medicina Legal. A Consti-
tuiÁ„o do ImpÈrio Germ‚nico abrigava o embri„o da mesma como disciplina distinta e
individualizada. Abordava v·rios temas mÈdico-legais. Tornava obrigatÛria a perÌcia
mÈdica, antes da decis„o dos juÌzes nos casos de ferimentos, assassinatos e tantos ou-
tros. … o primeiro documento bem organizado de Medicina Judici·ria. Como esses rela-
tÛrios eram avaliados pelas faculdades de medicina, acabou ocorrendo maior divulgaÁ„o
dos problemas mÈdico-legais e despertando muito interesse dos estudiosos. As compila-
Áıes desses relatÛrios foram, a bem da verdade, o germe das primeiras obras de valor no
mundo ocidental. Isto posto, È un‚nime e muito justo o pensamento de que a Alemanha
È o berÁo da Medicina Legal.
Em 1575, na FranÁa, Ambroise ParÈ, escreve o primeiro livro da matÈria, sendo
denominado por Lacassagne, pai da Medicina Forense e da Medicina Cir˙rgica, escre-
vendo v·rias obras sobre cirurgia e anatomia sem nunca ter estudado numa Faculdade
de Medicina. Para ele a Medicina Legal È a arte de fazer relatÛrios mÈdicos na justiÁa
4
(PEREIRA, 1982, p. 13;16-17). Em 1597, na It·lia, o mÈdico Baptista Codronchius,
publica uma obra onde estuda problemas mÈdico-legais de traumatologia, sexologia e
toxicologia. Em 1598 Fortunato Fidelis escreve um grande tratado em quatro livros,
defendendo a idÈia de que, sem o exame cadavÈrico completo a informaÁ„o pericial ao
direito nunca seria perfeita. Ainda nesse mesmo ano, SÈverin Pineau afirma em sua obra
que o hÌmen pode permanecer intacto, mesmo apÛs a conjunÁ„o carnal, sendo essa a
primeira citaÁ„o em literatura mÈdica ao hÌmen complacente.
PerÌodo Moderno - O verdadeiro fundador e maior autor de Medicina Legal,
reconhecido pela unanimidade dos autores, realmente foi Paulo Zacchia, que, de 1621 a
1635 para uns, 1621 a 1658 para outros, e ainda com muitas outras datas desencontra-
das, escreve ìTodas as Questıes de Medicina Legalî em sete volumes ou dez como
afirmam [...].3
Sob a influÍncia das obras escritas, an·lises em anatomia, e exames cadavÈricos,
percebeu-se a import‚ncia dessa disciplina, bem como a necessidade de dar-se uma
formaÁ„o especÌfica nessa ·rea, que tanto se relacionava com o direito. Surge assim,
o primeiro curso especializado em Medicina Legal, em Faculdade de Medicina, em
1650, na Alemanha. Em 1682 È realizada a prova hidrost·tica de Galeno em caso de
infanticÌ- dio, substituindo-se a confiss„o da m„e por prova pericial. Em 1689 publica-
se a princi- pal obra alem„, atÈ ent„o, onde as lesıes corporais s„o classificadas em
mortais por si e as que s„o letais quando agravadas por outros meios; as caracterÌsticas
diferenciadoras entre as lesıes ìintra vitamî e ìpost mortemî s„o mostradas; a
necessidade da autÛpsia completa È provada e, informava que deveria haver um maior
controle mÈdico dos ve- nenos, agente lesivo muito utilizado para a pr·tica de
homicÌdios.
Na FranÁa apÛs Ambroise ParÈ, quase nada de import‚ncia se produziu. Os peri-
tos, na sua maioria, eram venais, incompetentes e sem experiÍncia; eram muitas as ju-
risdiÁıes, para a obtenÁ„o da confiss„o, torturavam-se os rÈus, ‡s vezes com a ausÍncia
de defensor durante todo andamento da causa. Os mÈdicos, funcion·rios do Estado,
exerciam ao mesmo tempo a atividade pericial e a medicina preventiva. O ˙nico a ter
algum destaque ent„o foi o professor de Medicina Legal e Sa˙de P˙blica Antoine Louis,
que dentre os trabalhos escritos discorreu, em 1772, sobre as lesıes por contragolpe nos
traumatismos cranianos. Todavia, o cÛdigo promulgado por Napole„o em 1808, colocou
ponto final em todos os abusos, pr·ticas secretas e inquisitoriais. O trabalho dos juÌzes
e o parecer dos mÈdicos tornaram-se p˙blicos. O interesse pelo social fez com que a
medicina preventiva se desenvolvesse mais, pois a plebe e a burguesia, menos favoreci-
das que a nobreza, eram as mais sofridas e atingidas por epidemias, surge assim a Medi-
cina P˙blica. A fÌsica, quÌmica e biologia foram incorporadas ‡ Medicina Legal, em
raz„o das grandes informaÁıes que prestavam. Orfila, pai da toxicologia moderna, in-
troduziu ricos informes na ·rea pericial, tendo em vista serem muito comuns os casos de
envenenamentos, por suicÌdio, acidente e homicÌdio4.
A partir de 1821 ocorre um progresso na ·rea da Medicina Legal surgindo no-
mes importantes como Philippe Pinel na Psiquiatria Forense, Auguste Tardieu e Paul
Camille Brouardell que organizaram uma disciplina mais pr·tica e objetiva sem perder
seu car·ter cientÌfico. Lutaram incansavelmente pela evoluÁ„o dessa ciÍncia auxiliar do
Direito Lacassagne, FoderÈ, Thoinot, Balthazard, Edmond Locard e modernamente Si-
3
ALMEIDA JR, 1991. p. 13-15; CARVALHO, 1987. p.1-3 ; et al., F¡VERO, 1962. p. 16-17.; FRAN-
«A, 2004. p. 4-5.; HERCULES, 2005. p.7.; SIMONIN, 1962. p.1-2..
4
HERCULES, Hygino de Carvalho. Medicina Legal: Texto e Atlas, S„o Paulo: Atheneu, 2005. p.07.
5
monin. Em 1834 Devergie instalou o primeiro Curso Pr·tico de Medicina Legal, que
comeÁou realmente a dar certo a partir de 1878, quando foi reaberto por Brouardell, que
era assistente de Tardieu, catedr·tico de Medicina Legal em Paris. Em Viena, em 1818
tivemos o primeiro Instituto MÈdico Legal graÁas a aÁ„o de Von Hoffmann. Na It·lia a
fase ·urea foi representada por Cesare Lombroso, Mario Carrara e Enrique Ferri. 5De-
pois de 1800, o ensino da Medicina Legal n„o ficou mais despercebido nem deixado de
lado, e as decisıes judici·rias passaram a ter e contam atÈ hoje com uma grande aliada
na demonstraÁ„o da verdade dos fatos.
ApÛs meados do sÈculo XIX, as ciÍncias biolÛgicas, fazendo uso de mÈtodo ci-
entÌfico, acarretaram um grande progresso e modificaÁ„o nos diagnÛsticos mÈdicos de
doenÁas. Surgiram aos poucos, as especialidades clÌnicas e cir˙rgicas, tudo na esteira
dos estudos dos pesquisadores da ·rea pericial, e, sendo assim, a Medicina Legal passou
a ser considerada ciÍncia, uma forma de medicina aplicada.6
A Medicina Legal no Brasil sofreu forte influÍncia dos franceses depois italianos
e alem„es. Segundo Hil·rio Veiga de Carvalho, a primeira publicaÁ„o da ·rea, registra-
da por FlamÌnio F·vero e Oscar Freire data de 1814. A evoluÁ„o do estudo, ensino e
pesquisa desta ciÍncia auxiliar do direito partiu da Bahia e do Rio de Janeiro, onde em
1832 foram fundadas as primeiras escolas de medicina do Brasil.
A opini„o dos autores, acompanhando Oscar Freire divide a evoluÁ„o da Medi-
cina Legal em trÍs fases: a estrangeira, a de transiÁ„o e a de nacionalizaÁ„o.
Fase Estrangeira ñ Compreende o fim do perÌodo colonial atÈ quando Souza
Lima assume a c·tedra de Medicina Legal da Faculdade de Medicina que hoje pertence
‡ Universidade Federal do Rio de Janeiro, em 1877.
Naquela Època os juÌzes n„o eram obrigados a ouvir peritos, a imposiÁ„o decor-
reu apenas com o advento do primeiro CÛdigo Penal Brasileiro em 1830.
Em 1832 sendo regulamentado o processo penal, regras foram estabelecidas para os
exames de corpo de delito, criando-se a perÌcia profissional. Ainda nesse mesmo ano as
escolas mÈdico-cir˙rgicas criadas por D. Jo„o VI em 1808, na Bahia e Rio de Janeiro
foram transformadas em Faculdades de Medicina Oficiais, sendo instalada em ambas a
cadeira de Medicina Legal. Como os alunos, para obter o grau de doutor, necessitavam
defender uma tese, a maioria escolhia a ·rea de Medicina Legal e embora, esses traba-
lhos se tratassem de cÛpias de obras europÈias, serviram para abrir caminho e ampliar as
5
FRAN«A, Genival Veloso de. Fundamentos de Medicina Legal.7.ed. Rio de Janeiro: Guanabara Ko-
ogan S.A, 2004. p. 4-5.
6
ALMEIDA JR, 1991. p. 13-15; CARVALHO, 1987. p.1-3 ; et al., F¡VERO, 1962. p. 16-17.; FRAN-
«A, 2004. p. 4-5.; HERCULES, 2005. p.7.; SIMONIN, 1962. p.1-2.
6
pesquisas. Em 1835 tivemos a primeira publicaÁ„o sobre tanatologia (autÛpsia mÈdico-
legal) no Brasil.
Fase de TransiÁ„o ñ ComeÁou em 1877 com a entrada de Souza Lima para a
Faculdade de Medicina do Rio de Janeiro, desenvolvendo o ensino pr·tico em laboratÛ-
rio, e levando progresso ao campo da toxicologia. Inaugurou o primeiro curso de tanato-
logia forense, ministrado no necrotÈrio da polÌcia. Publicou in˙meras obras na ·rea da
Medicina Legal relacionando-a ao Direito, ‡ JurisprudÍncia, ‡ Toxicologia ClÌnica e
QuÌmica Legal, elaborou um Tratado de Medicina Legal e tantas outras. Foi, segundo
FlamÌnio F·vero, (1962, p.20) o maior incentivador e batalhador pela nacionalizaÁ„o da
Medicina Legal. Um exemplo aos mÈdicos e aos juristas; eram magistrais as interpreta-
Áıes que fazia dos textos legais.
Fase de NacionalizaÁ„o - Esse perÌodo teve inicio na Bahia com Nina Rodri-
gues. Percebendo, desde logo, que as condiÁıes do meio fÌsico, psicolÛgico e social n„o
eram iguais as encontradas na Europa, esse ilustre professor compreendeu que havia
necessidade de colher, em nosso prÛprio paÌs, os elementos de laboratÛrio e de clÌnica,
para a soluÁ„o de problemas mÈdico-legais e de criminologia. Desta forma, apÛs estudos
acerca da origem Ètnica das nossas populaÁıes, executou ìAs raÁas humanas e a respon-
sabilidade penal no Brasilî (Idem. p.21).
Com ele tem inicio a era das pesquisas originais. Preocupava-se em n„o permitir
que os julgamentos fossem alicerÁados em doutrinas europÈias. O juÌzo deveria sempre
estar embasado em ensinamentos do nosso prÛprio meio.
Outro seguidor da escola baiana foi Oscar Freire, que jamais se deixou levar pe-
lo meio estrangeiro, dando na sua formaÁ„o tÈcnico-cientÌfica, preferÍncia a uma menta-
lidade nacional.
Na Bahia ensinou Medicina Legal na perÌcia, como Nina Rodrigues sempre de-
sejou, e graÁas a ele houve um grande desenvolvimento nessa ·rea, sendo regulamenta-
do, inclusive em 1916 o funcionamento do ServiÁo MÈdico Legal, onde hoje È o Institu-
to Nina Rodrigues, no qual se concentra o exercÌcio e a docÍncia da especialidade.
Em 1918 Oscar Freire veio para S„o Paulo a convite de Arnaldo Vieira de Car-
valho, organizador da Faculdade Paulista de Medicina. ComeÁou aÌ a sua luta, para o
inÌcio do ensino cientÌfico da Medicina Legal, lanÁando bases para a formaÁ„o de um
grande centro de pesquisas. Depois de ·rdua luta, conseguiu construir a sede da cadeira
na Faculdade de Medicina, e em 1922 instalou-se o Instituto Oscar Freire, onde atÈ hoje
s„o ministradas as aulas de Medicina Legal.
ìO ensino de Medicina Legal nos Cursos de Direito foi proposto por Rui Barbo-
sa, que conseguiu aprovar na C‚mara dos Deputados um Decreto criando a C·tedra de
Medicina Legal nas Faculdades de Direito de todo paÌs, a partir de 1891î. (FRAN«A,
2004, p. 03).
Mesmo que no seu conceito e concepÁ„o pr·tica a Medicina Legal seja uma sÛ,
as metodologias de ensino devem ser diferentes conforme estejamos num curso de me-
dicina ou de direito.
No curso mÈdico, o ensino deve ressaltar o lado pericial, considerando a forma-
Á„o de um profissional capaz de atender ‡ JustiÁa como perito oficial ou nomeado, ensi-
nando a fazer. DaÌ a denominaÁ„o Medicina Legal. Por outro lado deve, tambÈm, quan-
to a Deontologia MÈdica, parte constante da Medicina Legal, cuidar da discuss„o e an·-
lise de temas que interessem na formaÁ„o Ètica de cada mÈdico.
No curso jurÌdico, a Medicina Legal deve ser mais doutrin·ria, como forma de
ensinar a interpretaÁ„o dos Documentos MÈdico Forenses, os laudos, pareceres e atesta-
7
dos, sem deixar de ensinar a import‚ncia pericial, uma vez que ela È necess·ria no dia a
dia dos operadores do direito. DaÌ a denominaÁ„o Medicina Forense.
DefiniÁ„o: A Medicina Legal constitui-se na soma de todas as especialidades
mÈdicas acrescentadas de conhecimento de outras tantas complementares, destacando-
se entre elas a ciÍncia do direito, n„o sendo assim especialidade, mas uma disciplina.
Seu campo de aÁ„o sendo vasto e extenso torna difÌcil uma definiÁ„o precisa, sendo
assim, cada autor acaba propondo uma definiÁ„o de acordo com o seu prÛprio ponto de
vista. Mas se quisÈssemos defini-la dirÌamos simplesmente Medicina Legal È a medici-
na a serviÁo das ciÍncias JurÌdicas e Sociais. Sob o ponto de vista contempor‚neo ela È
uma matÈria interdisciplinar, que auxilia na formaÁ„o de especialistas para dar atendi-
mento aos interesses comuns da medicina e do direito, ou ainda:
RelaÁıes: Serve mais a ·rea JurÌdica, do que ‡ prÛpria medicina uma vez que foi
criada em prol das necessidades do Direito. Desta maneira, com as CiÍncias JurÌdicas e
Sociais relaciona-se, completando-se ambas sem nenhum embate.
Colabora com o Direito Penal, quando s„o realizados exames periciais avaliando
lesıes corporais; analisando a realidade ou n„o da ocorrÍncia do infanticÌdio; exami-
nando o cad·ver interna e externamente em casos de homicÌdio; avaliando indÌcios e
vestÌgios em casos de estupro; apresenta interesse na constataÁ„o da periculosidade do
sentenciado e da imputabilidade plena, parcial ou nula do indiciado etc. Com o Direito
Civil no que tange a problemas de paternidade, comoriÍncia, impedimentos matrimoni-
ais, gravidez, impotÍncia ìlato sensuî, concepÁ„o de defeito fÌsico irremedi·vel etc.
Com o Direito do Trabalho quando cuida das doenÁas profissionais, acidentes do traba-
lho, insalubridade e higiene. Quando trata de questıes sobre a dissolubilidade do ma-
trimÙnio, a proteÁ„o da inf‚ncia e ‡ maternidade se presta ao Direito Constitucional.
Com o Direito Processual Civil quando trata a concepÁ„o da interdiÁ„o e da avaliaÁ„o
da capacidade civil e, Penal quando cuida da insanidade mental se estuda a psicologia
da testemunha, da confiss„o e da acareaÁ„o do acusado e da vÌtima.
O Direito Penitenci·rio tambÈm n„o permanece fora do campo de aÁ„o da Medi-
cina Legal na medida em que trata da psicologia do detento, concess„o de livramento
condicional bem como da psicossexualidade nos presÌdios. … uma ciÍncia social vez que
trata ainda dos diagnÛsticos e tratamentos de embriaguez, toxicofilias. Relaciona-se
ainda com o Direito dos Desportos, Internacional P˙blico, Internacional Privado, Direi-
to CanÙnico e Direito Comercial.
N„o raro uma perÌcia mÈdico-legal, para a elucidaÁ„o dos fatos ocorridos, neces-
sita ainda dos prÈstimos da QuÌmica, FÌsica, Biologia,Toxicologia, BalÌstica, Dactilos-
copia, Economia, Sociologia, Entomologia e Antropologia (FRAN«A, 2004, p. 02).
Divis„o Did·tica: A Medicina Legal possui uma parte geral, onde se estuda a
JurisprudÍncia MÈdica, ou a Deontologia MÈdica que ensina aos profissionais da ·rea
mÈdica seus direitos e deveres. Tem tambÈm uma parte especial dividida nos seguintes
capÌtulos:
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Antropologia Forense ou MÈdico-legal: … o estudo da identidade e identifica-
Á„o mÈdico-legal e judici·ria.
Traumatologia Forense ou MÈdico-legal: CapÌtulo extenso e denso que estuda
as lesıes corporais e os agentes lesivos.
Tanatologia Forense ou MÈdico-legal: Estuda a morte e o morto. Conceito,
momento, realidade e causa da morte. Tipos de morte. Sinais de morte. Destino legal do
cad·ver, direito sobre o cad·ver etc.
Asfixiologia Forense ou MÈdico-legal: Trata das asfixias de origem violenta.
As asfixias mec‚nicas como enforcamento, estrangulamento, esganadura, afogamento,
soterramento, sufocaÁ„o direta e indireta e as asfixias por gases irrespir·veis.
Toxicologia Forense ou MÈdico-legal: Analisa os c·usticos e os venenos.
Sexologia Forense ou MÈdico-legal: … um capÌtulo social e cultural.… informa-
tivo e analisa a sexualidade sob o ponto de vista normal, patolÛgico e criminoso.
Psicologia Forense ou MÈdico-legal: Estuda as causas que podem deformar um
psiquismo normal, bem como, a capacidade de entendimento da testemunha, da confis-
s„o, do delinq¸ente e da vÌtima.
Psiquiatria Forense ou MÈdico-legal: Neste capÌtulo a an·lise È mais profunda,
pois trata dos transtornos mentais e da conduta, da capacidade civil e da responsabilida-
de penal.
CriminalÌstica: Estuda a din‚mica do crime, analisando seus indÌcios e vestÌgios
materiais.
Criminologia: Preocupa-se com o criminoso, com a vÌtima e com o ambiente.
Estuda a criminogÍnese.
InfortunÌstica: Estuda os acidentes e doenÁas do trabalho, doenÁas profissio-
nais, higiene e insalubridade laborativas. Devendo sempre lembrar-se da necessidade do
exame pericial do local do trabalho para que se estabeleÁa um nexo de causalidade entre
acidente ou doenÁa e o trabalho.
GenÈtica Forense ou MÈdico-legal: Especifica as questıes ligadas ‡ heranÁa e
ao vÌnculo genÈtico da paternidade e maternidade.
Vitimologia: Analisa a vÌtima como elemento participativo na ocorrÍncia do de-
lito.
Policiologia CientÌfica: Considera os mÈtodos cientÌficos-mÈdico-legais usados
pela polÌcia na investigaÁ„o e elucidaÁ„o dos crimes.
Import‚ncia da Medicina Legal: O Direito È uma ciÍncia humana, desta forma
mister se faz que os profissionais da ·rea tenham um bom conhecimento do que È o ser
humano em sua totalidade. Para tanto n„o È preciso possuir conhecimentos como um
profissional de biomÈdica, no entanto, o mÌnimo para essa compreens„o È necess·rio,
sendo a Medicina Legal um suporte para essa finalidade. A evoluÁ„o tecnolÛgica e das
· reas do conhecimento humano, fizeram com que o exercÌcio do direito moderno
de- penda cada vez mais da contribuiÁ„o desta ciÍncia e, os operadores da ·rea jurÌdica
n„o tÍm como desprezar os conhecimentos tÈcnicos de peritos preparados para dar o
respal- do cientÌfico aos trabalhos forenses, pois somente assim È vi·vel chegar-se o
mais prÛ- ximo possÌvel da verdade dos fatos. No entanto, ela n„o vem recebendo a
merecida atenÁ„o por parte dos profissionais do campo para o qual È destinada.
Muitas vezes È preciso distinguir o certo do que est· duvidoso, explicar de maneira
clara todos os indÌ- cios relacionados ao ocorrido, n„o sendo omitidas
particularidades, para que haja uma conclus„o correta. Nem sempre tem valor para a
medicina convencional algo, que para a Medicina Legal apresenta extraordin·ria
import‚ncia.
9
O juiz, n„o pode prescindir desta ciÍncia auxiliar do direito, para ter condiÁıes
de avaliar e sopesar a verdade, analisando os documentos resultantes das perÌcias, ad-
quirindo uma consciÍncia tÈcnica dos fatos que envolvem o problema jurÌdico. Para a
maioria dos autores, a mais importante miss„o do exame pericial È orientar e iluminar a
consciÍncia do magistrado. Erros periciais podem ocorrer, mas conhecendo a Medicina
Legal o aplicador da lei ter· novos elementos de convicÁ„o ao apreciar a prova, poden-
do analisar melhor as informaÁıes tÈcnicas, prolatando sentenÁas, livres de relatÛrios
viciados. Para FranÁa (2004, p.04-05), a necessidade de dar cumprimento ‡s exigÍncias
penais, corroboram com a necessidade de conhecimento da Medicina Legal,
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