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“Hoje, acredita-se que a repressão da bruxaria teve início na Europa por volta
dos anos 1420-1430, a partir de uma região geográfica bem definida que compreende o
Dauphiné, os Alpes franceses e suíços, o Jura, isto é, a região em que, a partir do século
XIII, se instalaram as colônias valdenses2. O mito da bruxaria foi construído pelos juízes
inquisidores que começaram a perseguir, com o mesmo ardor, hereges e bruxos.” P. 20/21
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Jacques Dubois e Jean de Beyrouth.
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Denominação etnorreligiosa fundada por Pierre Valdo, em Lyon, século XIII, que praticava e pregava a pobreza evangélica e
foram declarados hereges pelo papa, por isso, se refugiaram nos Alpes franceses e suíços.
[...] A bruxaria tornou-se, desse modo, pelo menos aos olhos de seus teóricos, uma anti-
religião cujos adeptos, os bruxos, se dedicavam ao culto do Diabo.” P. 22
“Esses temas esparsos, cuja história é antiga e que difundem lendas e crenças
europeias desde o começo da Idade Média, acabaram se cristalizando no século XV e se
fundindo no seio de um mito demonológico que resistiu até o fim do século XVIII. Na
prática repressiva, os primeiros anos do século XV foram primordiais, mas foi por volta
da década de 1480 que a formulação teórica da bruxaria demoníaca surgiu.” P. 29
“No fim do século XV, todos os ingredientes da caça aos bruxos estavam
reunidos. E apesar de casos já terem se manifestado, episodicamente, desde o começo do
século, os dois períodos críticos se situam, respectivamente, entre 1480 e 1520 e de 1580
a 1670.” P. 36
“Em uma sociedade em que não passava pela cabeça de ninguém pôr em
questão a adesão à religião cristã, é compreensível que o crime da bruxaria tenha sido
percebido como a pior das abominações. O bruxo, além de ser um herege, ao renegar a
religião de Deus pela do Diabo, torna-se também um apóstata. Comete o seu crime com
total consciência e não por ignorância, [...]” P. 36
“O pretexto sempre era uma crise das relações interpessoais com, no segundo
plano, o acumulo de desgraças individuais ou coletivas que assaltavam o mundo
campônio.” P. 41
“Uma acusação de bruxaria nunca era feita por acaso. As mulheres acusadas
desempenhavam, com muita frequência, um papel particular nas comunidades. Elas
conheciam o segredo das plantas. Quando a tensão aumentava e os rumores de bruxaria
se propagavam, elas se tornavam suspeitas aos olhos de uma população que temia os
poderes tradicionais.” P. 54
“Os estereótipos antifemininos resistiram até o século XVII. A mulher
assustava. A sua fisiologia não era bem conhecida pelos médicos e os teólogos viam nela
um ser inconstante, que devia ser vigiado. Do ponto de vista jurídico, ela estava sob a
tutela do pai, depois do marido. Só adquiria uma autonomia relativa com a viuvez, mas a
sua situação, então, se degradava. Michelet viu nessa exclusão social a causa de uma
necessidade de desforra que a viuvez procurou saciar na bruxaria.” P. 55
“O simples boato era suficiente para pôr em ação o aparelho judiciário e seu
espantoso arsenal. Assim que a suspeita de bruxaria surgia, o juiz devia intervir sem
demora e proceder a uma investigação e perseguição. Ora, essa suspeita não precisava de
muito para ser provocada. Qualquer morte, doença, acidente, qualquer acontecimento
desagradável tendo, ou parecido ter um caráter de imprevisto, podiam ser atribuídos ao
sortilégio.” P. 62
“A denúncia por outros bruxos, mesmo sob tortura, era aceita como prova.
Contrariando as leis gerais, as delações de crianças, mesmo não púberes, eram recebidas
contra os pais, que as tinham, segundo eles, induzidos à bruxaria.” P. 63
“Tentar entender por que certas regiões participaram da caça aos bruxos
enquanto outras se mantiveram à parte, levante mais uma vez o problema da diversidade
cultural na Europa na época moderna. Mas, por trás dessa constatação, coloca-se a
questão das origens profundas da bruxaria demoníaca e da sua prática.” P. 103