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12. Podemos, pois, dividir aqui todas as percepções da mente em duas classes ou espécies, as
quais se distinguem pelos seus diferentes graus de força ou vivacidade. As menos fortes ou
vivazes são comumente denominadas pensamentos ou ideias. A outra espécie não tem nome em
nossa língua, como em muitas outras, suponho que por não ser necessário para nenhum fim que
não fosse filosófico o incluí-las sob um termo ou designação geral. Tomemos, pois, uma
pequena liberdade e chamemo-las impressões, usando a palavra num sentido algo diferente do
usual. Pelo termo impressão entendo todas as nossas percepções mais vivazes, quando ouvimos,
vemos, sentimos, amamos, odiamos, desejamos ou queremos. E as impressões distinguem-se
das ideiasp, que são as impressões menos vivazes das quais temos consciência quando
refletimos sobre qualquer dessas sensações ou movimentos acima mencionados.
13. (...) Podemos conceber um cavalo virtuoso, pois os nossos sentimentos nos levam à
concepção de virtude, e esta pode unir-se à figura e forma de um cavalo, animal que nos é
familiar. Em resumo, todos os materiais do pensamento derivam da sensação interna ou externa;
só a mistura e composição destas dependem da mente e da vontade. Ou, para expressar-me em
linguagem filosófica, todas as nossas ideias ou percepções mais fracas são cópias de nossas
impressões, ou percepções mais vivas.
60. E que exemplo mais convincente do que este se pode apresentar da surpreendente ignorância
e debilidade do entendimento? Se existe relação entre objetos que nos importe conhecer com
perfeição, é por certo a de causa e efeito. Nela se baseiam todos os nossos raciocínios sobre
questões de fato ou existência. Só por meio dela alcançamos qualquer certeza sobre os objetos
afastados do testemunho presente de nossa memória e de nossos sentidos. A única utilidade
imediata de todas as ciências é ensinar-nos a maneira de controlar e regular os acontecimentos
futuros por meio de suas causas. Nossos pensamentos e indagações ocupam-se, pois, a todo
instante, com essa relação. E, todavia, tão imperfeitas são as ideias que fazemos a seu respeito,
que é impossível dar uma definição precisa de causa, salvo definições provenientes de algo que
lhe é estranho e alheio. Os objetos semelhantes sempre aparecem juntos com seus semelhantes:
disto temos experiência. De acordo, pois, com essa experiência, podemos definir a causa como
sendo um objeto seguido de outro, quando todos os objetos semelhantes ao primeiro são
seguidos de objetos semelhantes ao segundo. Ou, em outras palavras, quando, não existindo o
primeiro objeto, jamais existiria o segundo. O aparecimento de uma causa sempre transporta o
intelecto, por uma transição habitual, à ideia do efeito. Disto também temos experiência.
Podemos assim, de acordo com essa experiência, formular outra definição da causa e chamá-la
um objeto seguido de outro, e cujo aparecimento sempre transporta o pensamento para esse
outro. Mas, se bem que ambas essas definições derivem de circunstâncias estranhas à causa, não
podemos remediar esse inconveniente nem alcançar uma definição mais perfeita, que indique
essa circunstância da causa que lhe dá uma conexão com o seu efeito. Não temos nenhuma ideia
dessa conexão e nem sequer uma noção clara do que desejamos saber quando nos esforçamos
por concebê-la. Dizemos, por exemplo, que a vibração desta corda é a causa deste som
particular. Mas que entendemos por esta afirmação? Ou que esta vibração é seguida deste som e
todas as vibrações semelhantes têm sido seguidas de sons semelhantes, ou que esta vibração é
seguida deste som, e ao aparecer a primeira a mente antecipa-se aos sentidos e forma
imediatamente uma idéia do segundo. Podemos considerar a relação de causa e efeito de
qualquer destes dois pontos de vista; mas, fora deles, não fazemos nenhuma idéia de tal relação.
Tratado sobre a natureza humana · Sobre a identidade pessoal