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A oralidade em Luuanda

Os traços de oralidade presentes na obra de Luuanda são observados nos


aspectos da posição e o estilo do narrador com a relação as tradições orais
angolanas na narração das estórias, além da estrutura do texto, construções
frasais, sintáticas e lexicais.
Primeiramente, antes da análise, farei um breve relato sobre a obra, do autor e
do contexto na qual a obra foi escrita. José Luandino Vieira é na verdade um
pseudônimo de José Mateus Vieira da Graça, nascido em Portugual, mais
mudou-se ainda bebê para Angola em busca de melhores condições de vida.
Dessa maneira, Luandino, e os demais angolanos, se rebelam ao não
aceitarem as condições do colonizador e passam a lutar pela libertação do seu
país. Devido a esse fato, Luandino é preso por 11 anos, e na cadeia, escreve
Luuanda.
A obra é composta por três contos: o primeiro da Vavó Xixi e seu neto Zeca
Santos, na qual a história conta sobre um rapaz desempregado que junto com
sua avó tem uma condição miserável tal que não havia nada para se alimentar
em casa, apenas raízes de plantas que a Vavó achara no lixo.
Já na segunda estória, A do ladrão e do papagaio, relata como foi a prisão de
um ladrão de patos, onde a história começa a partir de sua prisão, também
menciona como foi a prisão de Garrido, ladrão do papagaio Jacó, todavia,
agora contada todo o fato que motivou o homem a cometer esse delito.
Dessa forma, o último conto a Estória da Galinha e do Ovo, narra a briga de
duas vizinhas pela posse de um ovo, onde o animal havia botado no quintal de
uma, mais a galinha era de outra pessoa.
Um dos aspectos importantes na relação oralidade/escrita no texto é
fundamental compreender as verdadeiras intenções do autor.
A obra Luuanda, escrita por Luandino teve influência de Guimaraes Rosa, pois
o autor leu Sagarana, segundo o autor, a obra foi essencial para o ensino e
construção da fala dos seus personagens, além da liberdade de criar uma
linguagem que não possam ser a que seus personagens usem.
Percebemos a oralidade em Luuanda em dois aspectos: o da narração das estórias,
que são da tradição oral, e a parte linguística, o léxico, a sintaxe, apresentadas na
mistura do quimbundo com o português entre outros.
Observamos o narrador no qual aparece nos três contos como um mero contador de
histórias. Até no primeiro conto, o narrador surge nos traços históricos contados
conforme a tradição oral está quase que imperceptível (nas rupturas sequencias
temporais, tem menos marcas orais do narrador), assim há uma possibilidade de
percepção de algumas características de um contador de histórias, como a utilização
do discurso indireto livre:
“Junto com os estalos da lenha a arder e o cantar da água na lata, os soluços de Zeca
Santos enchiam a cubata (…) Mas também, Zeca não ganhava mais juízo, quando
estava ganhar o vencimento no emprego, que lhe correram, só queria camisa, só
queria calça de quinze embaixo, só queria peúga vermelha, mesmo que lhe avisava
para guardar ainda um dinheiro, qual?!” Ladino (p.12).

Agora nas outras narrativas, a ideia do contador aparece de forma mais clara. Ao
pensar nas personagens, o autor demonstra a intenção de apresentar o coletivo, e não
somente o indivíduo. Desse modo, as histórias orais não apresentam uma
complexidade dos seres sobre quem conta a história, mais o que interessa mesmo são
os casos e as situações que ocorrem entre eles.
Outro ponto do discurso que Ladino demonstra na história escrita é que pode ser bem
contada oralmente, na forma como o narrador do início, isto é, no estilo do “era uma
vez...”. “A estória da galinha e do ovo. Estes casos passaram no musseque
Sambizanga, nesta nossa terra de Luanda “Um tal Lomelino dos Reis, Dos reis para
os amigos e ex-Loló para as pequenas vivia com a mulher dele e dois filhos no
musseque Sambizanga.”

Criada por Guimarães Rosa, a palavra estória, tem o objetivo de diferenciar os casos
que não ocorreram daqueles que ocorrem de fato (história). Desse jeito, o autor deixa
evidente que aqueles fatos não possam ter ocorrido, enquanto o narrador tenta
lubrificar o leitor de que tudo aquilo aconteceu e é um fato verídico: estória. Se é
bonita, se é feia, vocês é que sabem. Eu só juro não falei mentira e estes casos
passaram nesta nossa terra de Luanda.”

A mistura do gênero literário tem a preocupação em relatar a realidade e o gênero das


estórias contadas, nas quais necessitam de um toque fantástico.
Na Angola, as histórias sobrenaturais são chamadas de mi-sosso. O mi-sosso é
similar ao da fabula onde existem animais falantes, pensantes, e a “moral da história”,
que constituem na vitória do mais fraco sobre o mais forte. Porém os contos de
Luuanda não são propriamente mi-sossos, mais apresentam algumas características
parecidas e comuns a esse gênero.
A primeira estória é literária, relata e apresenta mais a realidade, isto é, a
verossimilhança com a realidade não é apenas uma história metafórica, pois está
acontecendo com a população de Luanda na colonização, e o colonizador (o mais
forte) é quem seria o vencedor. O segundo conto já possui elementos da fabula como
é o caso da reklaç

O primeiro conto é mais literário, está relatando mais a realidade, isto é, o que
realmente e literalmente (entenda-se que não se trata de uma história metafórica) está
acontecendo com o povo de Luanda diante da colonização, e o colonizador
(considerado mais forte) é quem sai vencedor. O segundo conto já possui alguns
elementos mais difíceis de aceitar como fatos realmente ocorridos, como é o caso da
relação do papagaio e Inácia. Se na fábula aparece um animal falante, o conto de
Luandino apresenta um papagaio que, apesar de não falar racionalmente, e sim repete
os sons emitidos por sua dona, a desconfiança por alguns momentos se esse animal
não tem mesmo consciência do que fala e faz: “Logo Jacó abriu a asa e pôs um
barulho que parecia riso de pessoa, antes de falar.” (ELP, p. 66). Porém, as próprias
personagens do conto, mesmo que às vezes por alguns motivos pensem na
humanidade do papagaio, não aceitam o bicho como ser pensante: “Verdade é que os
monas lhe xingavam de ouvir o papagaio, mas quem ensinou foi a Inácia, ela é quem
inventou. Papagaio não pensa, só fala o que ouve, o que estão lhe dizer.” (ELP, p. 86).

O terceiro conto também apresenta um animal como elemento de importância na


história, há um final feliz, onde o problema é resolvido entre as vizinhas. Além da
ameaça de perderem o ovo e a galinha, Zefa, Bina e os moradores do musseque
uniram -se suas forças contra seus algozes que queriam lhes tomar o que pertenciam,
o mais fraco, o povo triunfou no final.
As fábulas os seres inferiores (animais) são os que precisam de adaptação para o
sistema linguístico e intelectual dos superiores esses os seres humanos. Na estória da
galinha e do ovo, a vitória do povo vem dessa adaptação, assim podemos pensar na
possibilidade da vitória dos colonizados sob os colonizadores seria uma mera
adaptação do português ao quimbundo e não o contrário, como ocorreram na
realidade
Por isso se diz que na Angola, a história remete aquilo que poderia ser a história e não
o que ela realmente é.
Pensando nesse desejo do autor em que a cultura colonizadora se adaptasse à
colonizada, e sabendo que ocorre o contrário, é possível perceber uma ironia nos
contos, já que o texto é escrito em português, mas incorpora algumas construções
quimbundas e léxicas dessa língua. Esse é um dos traços encontrados em outra
maneira de se perceber a oralidade na obra: a análise da estrutura linguística
decorrente do discurso informal.
LEITE, Ana Mafalda. Modelos críticos das representações da oralidade nos textos
literários africanos e sua adequação no quadro das teorias pós-coloniais. (texto
policopiado)

SANTILLI, Maria Aparecida. A “Luuanda” de Luandino Vieira. In: VÁRIOS. Luandino –


José Luandino Vieira e sua obra. Lisboa: Edições 70, 1980.

VIEIRA, José Luandino. Luuanda. São Paulo: Ática, 19

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