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PROFFORMA Nº 06 – Março 2012 Dislexia e Disortografia.

Da Linguagem Falada à Linguagem Escrital

Dislexia e Disortografia. Da Linguagem


Falada à Linguagem Escrita
Paula Teles
Psicóloga Educacional - especialista em dislexia

Resumo
Estamos numa nova era do ensino da leitura e da escrita. Este artigo propõe-se:
reflectir sobre os conhecimentos resultantes dos estudos realizados pela recém
designada “Ciência da Leitura”, ciência que se desenvolveu com os contributos da
psicologia cognitiva e das neurociências, as suas implicações nas práticas educativas;
apresentar um método de ensino da leitura e da escrita “Fonomímico e
Multissensorial”, baseado nos resultados da investigação científica, no estudo e longa
prática da autora, professora e psicóloga educacional, na reeducação de crianças e
jovens com perturbação da leitura e escrita.
Palavras-Chave: Linguagem Falada e Linguagem Escrita, Dislexia; Disortografia;
Perturbação da Leitura e da Escrita; Método Fonomímico.
Artigo Publicado na Revista “A Intervenção Psicológica em Problemas de Educação e
de Desenvolvimento Humano”. Outubro de 2010. Edições Universitárias Lusófonas.
Lisboa.

Introdução processos cognitivos envolvidos na sua


aquisição e dos métodos de ensino mais
Na sociedade actual a competência leitora é eficientes, são um desafio urgente que se
uma das mais importantes competências coloca a todos os responsáveis pelo ensino:
cognitivas e comunicativas. A leitura é o governantes, investigadores, médicos,
“veículo” que permite o acesso a todos os professores das escolas superiores de
outros saberes, quem não tiver um nível educação, educadores e professores (do
aceitável de literacia não poderá ensino regular e especial) e pais.
acompanhar a rápida evolução dos Ensinar as crianças a ler, a escrever e a
conhecimentos científicos e tecnológicos, a expressar as suas ideias com clareza, são
sua vida profissional e pessoal será das mais importantes funções dos
seriamente prejudicada, correndo sérios professores. (Lundberg, I. 1999)
riscos de marginalização.
Contrariamente à linguagem oral, a
Porque o baixo nível de capacidade leitora aprendizagem da leitura não emerge
– a Perturbação da Leitura e da Escrita, naturalmente, necessita de ser ensinada
Dislexia e Disortografia - afecta seriamente explicitamente. Quando as crianças iniciam
todas as áreas da vida pessoal, o a escolaridade as expectativas de todos os
conhecimento das suas causas, dos intervenientes envolvidos no processo de

1 Paula Teles
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aprendizagem são enormes. A grande Snowling, M. & Stackhouse, J. 1998;


maioria das crianças realiza esta Liberman, I. 1983; Catts & Kamhil, 1986;
aprendizagem sem esforço e com prazer, Shaywitz, S. 2003; Birsh, J. R. 2005)
porém, cerca de 5 a 10 por cento,
manifestam dificuldades inesperadas e Apesar da relação de interdependência e
persistentes que geram sentimentos de reciprocidade entre a linguagem falada e a
surpresa, incompreensão e sofrimento. linguagem escrita, aprender a ler não é o
mesmo que aprender a falar. Existem, entre
Até há poucos anos a origem desta ambas, enormes diferenças, não só a nível
dificuldade era desconhecida, era uma dos processos cognitivos envolvidos que
incapacidade invisível, um “mistério” que lhe estão subjacentes, mas também a nível
gerou mitos, preconceitos e estigmas que filogenético e ontogenético. (Wallach, G.
acompanharam e ainda acompanham, 1990; Cary, L. e Verghaeghe, A. 2001)
muitas crianças, jovens e adultos.
A nível filogenético existe entre a
A tomada de consciência desta dificuldade, linguagem falada e a linguagem escrita, uma
inesperada e incompreensível, incentivou a enorme distância temporal. Morais, J.
realização de inúmeras investigações com o (1997) refere: “não se sabe exactamente
objectivo de encontrar uma explicação desde quando é que os homens falam.
cognitiva e neurocientífica para os Foram encontradas indicações de um
processos mentais envolvidos na desenvolvimento da zona de Broca, zona
aprendizagem da leitura e da escrita. associada à produção da linguagem, no
Desses estudos emergiu a recém designada Homo habilis, nosso antepassado de há
“Ciência da Leitura”, que se desenvolveu dois milhões de anos.
apoiada nos conhecimentos da psicologia
cognitiva e das neurociências. (Castro, S. L. John DeFrancis (1989) sugere que a
e Gomes, I. 2000) linguagem falada emergiu, há cerca de 50
mil anos, como o modo de comunicação
Os resultados desses estudos têm-se dominante entre o Homo Sapiens. Em
revelado extremamente úteis permitindo todas as comunidades o homem
responder a diversas questões: Quais as desenvolveu a linguagem oral para
diferenças entre linguagem falada e comunicar, mas nem todas as linguagens
linguagem escrita? Quais as competências orais têm formas de linguagem escrita.
necessárias para aprender a ler e que Existe uma predisposição biológica para a
necessitam ser ensinadas explicitamente? linguagem oral, a linguagem é inata.
Quais as dificuldades experimentadas por (Chomsky, N. 1957; Pinker, S. 1994)
algumas crianças? Quais os princípios
orientadores dos métodos de ensino que A linguagem escrita é uma competência
provaram ser mais eficientes? (Lyon, R. muito recente na história da humanidade, é
1997; Shaywitz, S. 2003; Birsh, J.R., 2005; um produto da sua evolução histórica e
Snowling, M.J. 2001…) cultural, não faz parte do nosso património
genético, não existe no nosso cérebro um
módulo específico para a leitura. Para ler o
1. Linguagem falada e linguagem homem tem que utilizar o que a natureza
escrita lhe proporcionou “um módulo biológico
para a linguagem”. Sally Shaywitz (2003)
Falar, ouvir, ler e escrever são actividades
linguísticas. É do conhecimento general A escrita logográfica surgiu há cerca de 5
que a linguagem escrita é uma competência mil anos. Os mais antigos percursores,
que se apoia na linguagem falada e de que conhecidos, do alfabeto latino são de
entre ambas existe uma relação de origem semítica, e terão surgido há cerca
influência recíproca. (Vellutino, 1979; de 3500 anos, na Mesopotâmia.

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A nível ontogenético também a linguagem sequência temporal, processa-se através de


falada precede a linguagem escrita, as sons auditivos contínuos.
crianças aprendem as primeiras palavras
por volta dos doze meses de idade, e só Na linguagem escrita a comunicação é
iniciam a aprendizagem da leitura, por volta estática, permanente, o interlocutor está
dos cinco ou seis anos, quando iniciam a ausente, processa-se no espaço, utilizando
escolaridade. Castro, S. L. e Gomes, símbolos gráficos.
I.(2000.)
Castro, S. L. e Gomes, I. (2000) referem
A linguagem falada é adquirida que as duas faces da fala são, a voz e a
naturalmente, decorre de uma audição, e as duas faces da escrita são o
predisposição biológica. As vocalizações, as grafismo e a visão (ou tacto, nos caracteres
palavras, as frases e a fluência verbal Braille).
surgem na mesma sequência em prazos
O conteúdo linguístico na linguagem falada
cronológicos idênticos. A espécie humana
é enriquecido por informações adicionais
possui um processamento fonológico
dadas pela entoação, pela expressão verbal
implícito, ou automático, isto é sem
e pelas diversas possibilidades fonológicas
atenção consciente e sem esforço, que
de cada símbolo, na linguagem escrita as
permite estabelecer relações entre os sons
informações, contidas em cada símbolo do
da fala e o seu significado. Aprende-se a
alfabeto, são limitadas.
falar naturalmente sem necessidade de
ensino formal, explícito.
2. Dislexia: Perspectiva Histórica
A Linguagem Escrita foi inventada pelo
homem, não segue um processo
A palavra “Dislexia” deriva do Grego, o
biologicamente determinado, utiliza
prefixo “dys”, que significa dificuldade e
códigos específicos para representar a fala.
“lexis” palavra escrita. (Clark, D. B. 1998).
Estes códigos não são aprendidos
naturalmente, necessitam de ser ensinados Em 1887, o termo “Dislexia”, foi usado
explicitamente, formalmente. Para pela primeira vez, pelo oftalmologista
aprender a ler, numa escrita alfabética, é alemão, Berlin, para descrever o caso de
necessário tornar explícito, tornar um paciente adulto que, após um acidente
consciente, o que na linguagem oral é um vascular cerebral, perdeu a capacidade
processo cognitivo implícito, inconsciente. leitora, apesar de ter mantido a visão, a
É necessário activar e relacionar os linguagem e a inteligência.
diversos subsistemas cognitivos, que não
foram seleccionados para o processo Em 1896, o pediatra inglês, Pringle-
evolucionista da leitura. (Cary, L. e Morgan, usou o termo “Cegueira Verbal
Verghaeghe, A. 2001) Congénita”, para descrever o caso de um
jovem de 14 anos que, apesar de ser
Entre a linguagem falada e escrita inteligente, apresentava uma incapacidade
verificam-se também diferenças a nível da para a linguagem escrita. (Pringle-Morgan,
forma de produção, da influência do W. 1896)
contexto, da gramática, do vocabulário e
do grau de explicitação. Em 1917, o oftalmologista escocês,
Hinshelwood, publicou uma monografia
Na linguagem oral a comunicação é sobre esta perturbação. Considerou que a
dinâmica, efémera, existe apenas no designação de “Cegueira Verbal” deveria
momento em que é produzida, o ser reservada para os casos muito severos e
interlocutor está presente, na maior parte propôs o termo “Dislexia Congénita” para
das situações ocorre face a face, tem numa os casos mais leves. (Hinshelwood, J. 1917)

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Nos anos 20, o conceito de “Disfunção ser entendidas no quadro de problema


Cerebral Mínima”, veio afectar a social, e não no quadro de um problema
categorização das crianças com problemas médico. (Burt, C. 1937)
de aprendizagem. A dislexia foi incluída
num amplo conjunto de perturbações do Nos finais dos anos 40 e nos anos 50 o
desenvolvimento denominadas “Instituto de Cegos para as Palavras”, de
“Dificuldades de Aprendizagem”. Este Copenhaga, começou a estudar, de um
conjunto incluía diversas perturbações modo mais sistemático, as causas da
como a dislexia, hiperactividade, défice de dislexia e a implementar programas
atenção, perturbações cognitivas, reeducativos. Em 1950, Hallgren realizou
perceptivas, psicomotoras… Este conceito vários estudos de famílias com dificuldades
globalizante de “Dificuldades de de leitura e escrita e criou a designação de
Aprendizagem” criou sérios obstáculos à “Dislexia Constitucional”. (Hallgren, B.
investigação sobre a etiologia, diagnóstico, 1950)
prevenção e terapêutica, não só em relação
Nos anos 60, sob a influência das correntes
à dislexia, mas também em relação a todas
psicodinâmicas, e da pedagogia activa,
as outras perturbações do
foram minimizados os aspectos biológicos
desenvolvimento.
da dislexia. As dificuldades leitoras foram
Em 1937, o neurologista americano, atribuídas a “imaturidade”, problemas
Samuel Orton, desenvolveu um trabalho de emocionais, afectivos e pedagógicos, o que
grande relevância, tendo as suas constituiu mais um obstáculo, não só à
descobertas apresentado perspectivas investigação, mas também à
inovadoras. Inicialmente pensou que esta implementação de programas reeducativos
dificuldade seria causada por um problema eficientes. (Chiland, C. 1973)
no sistema visual (os sinais mais evidentes
Nos anos 70 os psicolinguístas
na dislexia manifestavam-se na escrita:
identificaram a estreita relação entre a
substituições de letras, erros de
linguagem escrita e a linguagem falada. A
sequência…), tendo utilizado o nome de
hipótese da existência de um “défice
“Estrefossimbolia”. Posteriormente,
linguístico”, a nível do processamento
apercebeu-se da relação entre a dislexia e a
fonológico, começou a tomar forma. Os
linguagem oral, passou a utilizar a
resultados dos diversos estudos mostraram
designação de “Alexia do
que as crianças com dislexia revelavam
Desenvolvimento”, e preconizou a
dificuldades em relacionar o nome das
necessidade de uma intervenção terapêutica
letras com os seus sons, sendo este um pré-
“individualizada, multissensorial,
requisito crucial para a descodificação das
estruturada, sistemática, sequencial e
palavras escritas. (Vellutino, F. 1979)
cumulativa”. (Orton, S.T. 1937).
Em 1992, Hulme e Snowling definiram a
Em 1949, em homenagem a Orton, foi
dislexia como “parte de um contínuo das
fundada a “Orton Dyslexia Association”,
perturbações de linguagem, caracterizada
percursora da actual “Internacional
por um défice no processamento verbal
Dyslexia Association”. Esta associação tem
dos sons”. (Hulme, C. & Snowling, M.
tido um contributo muito importante na
1992)
investigação e divulgação dos
conhecimentos científicos. (Leong, C. K. Nas últimas décadas os estudos realizados
2000) com as modernas tecnologias de imagem,
Ressonância Magnética Funcional, (fMRI)
Nos anos 30 e 40 verificou-se um
permitiram observar o funcionamento
deslocamento das perspectivas
cerebral durante as actividades de leitura.
neurológicas para as áreas educacionais e
Os resultados desses estudos vieram
sociais. As dificuldades leitoras passaram a

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proporcionar uma prova visível e culturais adequadas. Os problemas são


incontornável, da existência de uma causados por défices cognitivos básicos
“Perturbação da Leitura e Escrita - Dislexia que são frequentemente de origem
e Disortografia”, perturbação de génese constitucional”.
neurobiológica, causada por um défice no
funcionamento das zonas cerebrais Embora esta definição corresponda à
intervenientes nas actividades de leitura, experiência e conhecimentos da grande
um défice fonológico. maioria dos educadores apresenta o
inconveniente de não referir critérios de
Os resultados apresentados por Sally inclusão. A ausência de critérios de
Shaywitz, neurocientista da Universidade inclusão tem repercussões negativas a dois
de Yale, em “Overcoming Dyslexia”, 2003, níveis: a nível prático limita a sua utilização,
têm sido consistentes com os resultados pois que dificulta o diagnóstico e a
dos estudos de muitos outros cientistas consequente implementação de programas
como Bradley, Bryant, Uta Frith, Hulme, reeducativos; a nível do enquadramento
Snowling, Torleiv Hoien, Lundberg… legal, o reconhecimento da dislexia, como
um défice cognitivo básico, um défice
Paradoxalmente, apesar de todo um cognitivo-linguístico, sem critérios precisos
conjunto de estudos neuroanatómicos, de inclusão, dificulta a categorização dos
neurocognitivos e genéticos comprovarem alunos disléxicos prejudicando a adopção
a existência da dislexia, verifica-se uma das medidas reeducativas adequadas.
situação absurda e inexplicável: alguns
professores, médicos e psicólogos Em 1994, o “Manual de Diagnóstico e
continuam a negar a sua existência. Esta Estatística de Doenças Mentais”, DSM IV,
situação, incompreensível, tem dificultado inclui pela primeira vez, a dislexia nas
a divulgação do conhecimento científico e perturbações de aprendizagem, utiliza a
prejudicado seriamente as crianças denominação de “Perturbação da Leitura e
disléxicas, impossibilitando-as de da Escrita” e estabelece os seguintes
receberem uma intervenção educativa critérios de diagnóstico:
especializada e adequada às suas
dificuldades específicas. (Thomson, M. E. A. O rendimento na leitura/escrita,
1984) medido através de provas
normalizadas, situa-se
substancialmente abaixo do nível
3. Dislexia: À Procura de Uma
esperado para a idade do sujeito,
Definição quociente de inteligência e
escolaridade própria para a sua idade.
Desde que a dislexia mereceu a atenção da
comunidade científica, o próprio termo em B. A perturbação interfere
si, bem como a sua definição, tem sido significativamente com o rendimento
uma questão recorrente. escolar, ou actividades da vida
quotidiana que requerem aptidões de
Em 1968 a Federação Mundial de leitura/escrita.
Neurologia, decidiu-se pela adopção do
termo “Dislexia do Desenvolvimento” e C. Se existe um défice sensorial as
elaborou a seguinte definição: dificuldades são excessivas, em
relação às que lhe estariam
“Uma perturbação que se manifesta por habitualmente associadas.
dificuldades na aprendizagem da leitura,
apesar das crianças serem ensinadas com A utilização, pelo DSM IV, de “critérios de
métodos de ensino convencionais, terem discrepância” em relação ao nível cognitivo
inteligência normal e oportunidades socio- é contestada por diversos autores.

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Fletcher (1994) defende que “se para se das palavras no processo de leitura. A
estabelecer o diagnóstico de dislexia se perturbação também se manifesta na
requer uma discrepância entre o quociente capacidade de escrita pobre. A perturbação
de inteligência e o nível leitor então, disléxica é geralmente de transmissão
existem dois grupos distintos de maus familiar e pode pensar-se que existe uma
leitores: um grupo de maus leitores disposição genética. Outra característica da
inteligentes, “leitores com dislexia” e um dislexia é a sua persistência ao longo da
grupo de maus leitores com vida. Embora a capacidade de leitura possa
funcionamento intelectual deficitário atingir um nível aceitável as dificuldades de
“leitores com baixo nível de inteligência”. ortografia mantêm-se, na maioria dos
Os resultados de diversos estudos têm casos. A realização de testes de
mostrado que o défice a nível fonológico e competências fonológicas permite verificar
ortográfico não difere nos dois grupos, que esta incapacidade persiste ao longo da
sendo portanto independente do quociente vida adulta” (Hoien T, & Lundberg I.
de inteligência. (Siegel, 1992) 2000)

Em 2003, a “Associação Internacional de De uma maneira mais simples definem


Dislexia”, em colaboração com os dislexia como: “Uma perturbação
investigadores do “National Institute of persistente na descodificação da linguagem
Child Health and Human Development” escrita que tem a sua origem num défice no
(NICHD), desenvolveu uma definição para sistema fonológico”.
a dislexia: “Dislexia é uma incapacidade
específica de aprendizagem, de origem Tal como na definição do DSM IV,
neurobiológica. É caracterizada por referem que a dislexia é uma “dificuldade
dificuldades na correcção e/ou fluência na significativa na descodificação das palavras
leitura de palavras e por baixa competência e na escrita que tem na sua origem um
leitora e ortográfica. Estas dificuldades défice a nível do sistema fonológico”, mas
resultam de um Défice Fonológico, não a definem com base em “critérios de
inesperado, em relação às outras discrepância”. Para estes autores, tal como
capacidades cognitivas e às condições para Fletcher e Siegel, as pessoas podem
educativas. Secundariamente podem surgir ser disléxicas independentemente da sua
dificuldades de compreensão leitora e capacidade intelectual. Há pessoas com
experiência de leitura reduzida que pode elevados níveis intelectuais que têm
impedir o desenvolvimento do vocabulário dislexia, tal como há pessoas menos
e dos conhecimentos gerais”. dotadas que não têm quaisquer dificuldades
em adquirir boas competências de
Esta definição vem evidenciar que a descodificação. Os estudantes com baixas
principal característica da dislexia são as capacidades cognitivas, défices sensoriais,
dificuldades a nível da leitura e da ou perturbações emocionais, também
ortografia, sendo essas dificuldades podem ter dislexia, nestes casos os défices
originadas por um défice fonológico, extra irão exacerbar os problemas de
estando intactas todas as outras leitura.
competências cognitivas.
Em 2002, Uta Frith apresenta uma
Em 2000, Hoien e Lundberg apresentaram perspectiva que tem em consideração o
a seguinte definição de dislexia: “Dislexia é contexto cultural e refere que o critério das
uma perturbação em certas funções da manifestações sintomáticas, só por si,
linguagem que são importantes para a parece não ser um critério adequado para
utilização do princípio alfabético na definir a dislexia ao longo da vida. Tal
descodificação das palavras. Esta como os comportamentos se modificam ao
perturbação surge, inicialmente, como uma longo do tempo, também os sintomas da
dificuldade na descodificação automática dislexia melhoram com a aprendizagem e

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as intervenções compensatórias, apesar de com diferentes graus de severidade.


o défice fonológico, que lhe está (Rosenberger, 1992)
subjacente, persistir ao longo da vida.
Apresenta a seguinte definição: “Dislexia é 4. Dislexia: Teorias Explicativas
uma desordem neuro-desenvolvimental,
que existe desde o nascimento, com
diferentes manifestações ao longo do Como tem sido referido as causas da
desenvolvimento”. Os conhecimentos dislexia, bem como o próprio
acumulados nos diversos estudos sobre reconhecimento desta perturbação, têm
dislexia indicam que a dislexia não é uma suscitado, ao longo dos anos, inúmeras
perturbação que aparece na idade escolar e controvérsias. Os recentes estudos,
que desaparece na vida adulta, não é uma utilizando as modernas técnicas de
preocupação exclusiva da infância, é um imagem, realizados por especialistas de
“fardo” que se tem que carregar por toda a diversas áreas científicas, têm sido
vida. convergentes, quer em relação à sua origem
genética e neurobiológica, quer em relação
Começa a emergir um consenso em relação aos processos cognitivos que lhe estão
a uma definição mais abrangente de subjacentes. Têm sido formuladas diversas
dislexia “Dislexia é uma perturbação teorias explicativas:
neuro-desenvolvimental, de origem
biológica, com impacto no processamento A “Teoria do Défice Fonológico” é a teoria
da linguagem, que envolvem uma série de com maior aceitação na comunidade
manifestações clínicas. Existem provas da científica. (Rack J. 1999)
existência de uma base genética e cerebral e
Esta teoria postula que a dislexia é causada
é evidente que as manifestações se
por um défice no sistema de
estendem para além dos problemas a nível
processamento fonológico, motivado por
da linguagem escrita”. A influência dos
uma “disrupção” no sistema neurológico
factores ambientais é muito importante, há
cerebral, a nível do processamento
contextos em que a perturbação quase não
fonológico. (Bradley et al, 2000)
transparece, enquanto que noutros é
geradora de grande sofrimento. Existe Este Défice Fonológico dificulta a
grande variabilidade intra e inter-individual discriminação e processamento dos sons da
e, como já foi referido, a dislexia, situa-se linguagem, a consciência de que a
num contínuo de dificuldades desde as linguagem é formada por palavras, as
mais ténues às mais severas. (Frith, U. palavras por sílabas, as sílabas por fonemas
2002) e o conhecimento de que os caracteres do
alfabeto são a representação gráfica desses
O modelo de distribuição da dislexia, tendo
fonemas. (Shaywitz, S. 2003)
como base os estudos realizados em
populações escolares, mostram que a A leitura integra dois processos cognitivos
dislexia segue o modelo da curva normal, distintos e indissociáveis: a
existindo uma continuidade entre “descodificação” (a correspondência grafo-
população disléxica e não disléxica. fonémica) e a “compreensão” da
(Shaywitz 1992) mensagem escrita. A compreensão de um
texto só é possível após a sua
Segundo este modelo, tal como acontece
descodificação, isto é após a
com muitas outras doenças, como a
transformação, pelo leitor, dos símbolos
hipertensão e a obesidade, não é possível
gráficos em fonemas, sílabas, palavras com
estabelecer limites precisos. A dislexia é
sentido.
uma entidade sem limites claramente
definidos, existindo dificuldades leitoras O défice fonológico afecta unicamente a
descodificação, todas as competências

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cognitivas superiores necessárias à e automática. Quanto mais


compreensão estão intactas: a inteligência automaticamente for feita a activação desta
geral, o vocabulário, a sintaxe, o discurso, o área, mais eficiente é o processo leitor.
raciocínio e a formação de conceitos.
Os leitores eficientes utilizam um percurso
Sally Shaywitz et al, (1998) utilizaram a rápido, automático, para ler as palavras.
(fMRI) para estudar o funcionamento do Activam, simultaneamente, os sistemas
cérebro durante as tarefas de leitura e neurológicos das três regiões e conseguem
identificaram três áreas, no hemisfério ler as palavras instantaneamente, em cerca
esquerdo, que desempenham funções de 150 milésimos de segundo.
chave no processo de leitura: o girus
inferior frontal, a área parietal-temporal e a Os leitores disléxicos utilizam um percurso
área occipital-temporal. (Shaywitz, S. et al. lento e analítico para descodificar as
1998) palavras. Activam intensamente o girus
inferior frontal, onde vocalizam as
palavras, e a zona parietal-temporal onde
segmentam as palavras em sílabas e em
fonemas, fazem a tradução grafo-fonémica,
a fusão fonémica e as fusões silábicas até
aceder ao seu significado.

Os diferentes subsistemas desempenham


diferentes funções na leitura, o modo
como são activados depende das
necessidades funcionais dos leitores e
A região “Inferior Frontal” é a área da variam ao longo do seu processo evolutivo.
linguagem oral. É a zona onde se processa As crianças com dislexia apresentam uma
a vocalização e articulação das palavras, “disrupção” no sistema neurológico que
onde se inicia a análise dos fonemas. A dificulta o processamento fonológico e o
subvocalização ajuda a leitura fornecendo consequente acesso ao sistema de leitura
um modelo oral das palavras. Esta zona automática. Para compensar esta
está particularmente activa nos leitores dificuldade utilizam mais intensamente a
iniciantes e disléxicos. área da linguagem oral, região Inferior
A região “Parietal Temporal” é a área onde Frontal, e as áreas do hemisfério direito
é feita a análise das palavras. É a zona onde que fornecem pistas visuais.
se processa a análise das palavras, a A “Teoria do Duplo Défice” postula que
correspondência grafo-fonémica, a fusão os disléxicos, para além do Défice
fonémica e silábica. Esta leitura analítica Fonológico, apresentam um “Défice na
processa-se lentamente, sílaba a sílaba. Capacidade de Nomeação Rápida”. Este
A região “Occipital Temporal” é a área défice interfere negativamente com a
para onde convergem todas as informações velocidade leitora, constituindo uma
dos diferentes sistemas sensoriais, e onde dificuldade adicional à dificuldade de
se encontra armazenado o “modelo descodificação correcta dos grafemas,
neurológico de cada palavra”. Este modelo sílabas e palavras. Os disléxicos que
contem todas as informações relevantes de possuem ambos os défices apresentam
cada palavra, integra a ortografia, “como maiores dificuldades na aquisição de uma
parece”, a pronúncia, “como soa”, o leitura correcta, fluente e compreensiva.
significado, “o que quer dizer”. É a zona A “Teoria do Défice de Automatização”
onde se processa o reconhecimento visual postula que os disléxicos, apresentam um
das palavras, onde se realiza a leitura rápida “Défice Generalizado na Capacidade de

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Automatização”. Manifestam dificuldades compreensão são comuns à linguagem


em automatizar as correspondências falada e à linguagem escrita. Cary, L. e
fonema-grafema, as fusões fonémicas, as Verghaeghe, A. (2001)
fusões silábicas, as fusões silábicas
sequenciais, e as tarefas que implicam a Quais são, então, os processos que
motricidade global, fina e a permitem descodificar o código escrito
grafomotricidade. Esta dificuldade transformando-o numa mensagem
generalizada de automatização obriga a um compreensível?
maior treino de leitura a fim de se
Para ler, descodificar o código escrito, é
conseguir adquirir uma leitura correcta,
necessário ter o conhecimento consciente
automática, fluente e compreensiva.
de que a linguagem é formada por palavras
A minha experiência na reeducação de “Consciência Fonológica”, as palavras são
alunos disléxicos leva-me a considerar que formadas por sílabas “Consciência
estas teorias são complementares, a grande Silábica”, as sílabas são formadas por
maioria dos disléxicos apresentam estes fonemas “Consciência Fonémica”, que as
défices, ainda que em diferentes graus de letras do alfabeto são a representação
severidade. gráfica desses fonemas, têm um nome e
representam um som da linguagem oral
“Consciência do Princípio Alfabético”.
5. Quais as Competências Necessárias
Para Aprender a Ler? Para ler, descodificar o código escrito, é
ainda necessário saber realizar as “Fusões
Como temos vindo a referir, aprender a ler Fonémicas” e as “Fusões Silábicas
não é um processo natural. Contrariamente Sequenciais”, encontrar a pronúncia
à linguagem oral a leitura não emerge correcta para aceder ao significado das
naturalmente da interacção com os pais e palavras e para escrever é necessário saber
os outros adultos, por mais estimulante que analisar e segmentar as palavras em sílabas
seja o meio a nível cultural. e fonemas.

Morais (1997), refere “é corrente confundir A “Consciência Fonológica” é uma


a capacidade de leitura, os objectivos da competência difícil de adquirir, porque na
leitura, a actividade da leitura e o linguagem oral não é perceptível a audição
desempenho de leitura”. A capacidade de separada dos diferentes fonemas. Quando
leitura é o conjunto de recursos mentais ouvimos a palavra “pai” ouvimos os três
que mobilizamos para ler, os objectivos da sons conjuntamente e não os três sons
leitura são a compreensão do texto escrito, individualizados.
a actividade de leitura envolve o conjunto
O “Princípio Alfabético” é igualmente
de processos cognitivos, sensoriais e
difícil devido às irregularidades existentes
motores, e o desempenho de leitura é o
nas correspondências fonema Û grafema.
grau de sucesso obtido. Ler consiste em
transformar as palavras escritas em Para ler, compreender a mensagem escrita,
representações fonológicas com é necessário descodificar correctamente as
significado. palavras, ter uma leitura fluente, isto é, sem
atenção consciente e com o dispêndio
Como refere Morais os objectivos da
mínimo de esforço. A capacidade de
leitura são a compreensão do texto escrito,
compreensão leitora está fortemente
mas os processos cognitivos específicos da
relacionada com a compreensão da
leitura não são os processos de
compreensão, mas sim os processos de linguagem oral, com o possuir um
vocabulário oral rico e com a fluência e
recodificação que se processam antes da
correcção leitora.
compreensão. Os processos de

9 Paula Teles
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Escrever não é a operação inversa da nome das letras e dos sons que lhes
leitura, é uma competência com um grau correspondem, dificuldades de
de complexidade muito maior, exige uma memorização dos nomes das cores, das
dupla descodificação. noções temporais…. e do objectivo da
leitura. (Shaywitz, S. et al. 1998)
Para escrever correctamente é necessário
saber identificar as palavras constituintes Para além destas dificuldades verificam-se,
das frases, saber discriminar os fonemas com frequência, dificuldades na memória a
que formam as palavras, saber segmentar curto termo, na capacidade de
as palavras em sílabas “Segmentação automatização, de nomeação rápida e na
Silábica”, saber segmentar as sílabas em capacidade de focalização e sustentação da
fonemas “Segmentação Fonémica”, e saber atenção.
quais as correspondências fonema-grafema
correctas que devem ser utilizadas. Os factores motivacionais são igualmente
importantes no desenvolvimento da
Todas estas competências têm que ser capacidade leitora dado que a melhoria
integradas através do ensino e da prática desta competência está altamente
sistemática de actividades de leitura e relacionada com o querer, com a vontade
escrita. de persistir, pese embora, as dificuldades
sentidas e a não obtenção de resultados
6. Quais as Dificuldades imediatos.
Experimentadas por Algumas
Crianças? 7. O Método Fonomímico, princípios
orientadores, a quem se destina.
Como vimos as dificuldades na
aprendizagem da leitura têm origem na O MÉTODO FONOMÍMICO Paula Teles®, é
existência de um défice fonológico. um método Fonético, Multissensorial,
Embora na linguagem oral algumas Sistemático, Sequencial e Cumulativo que
crianças utilizem correctamente as palavras, tem como objectivo o desenvolvimento
as sílabas e os fonemas, não têm o das competências fonológicas, o ensino e
conhecimento consciente destas unidades reeducação da leitura e da escrita.
linguísticas, apresentam um défice a nível
da consciência da estrutura fonológica das Foi elaborado com base nos resultados da
palavras. investigação neurocientífica, no estudo e
experiência profissional da autora,
Sendo a leitura a transcrição de um código professora e psicóloga educacional que, ao
gráfico para um código fonológico, as longo de mais de quatro décadas, tem
dificuldades de identificação e exercido funções na avaliação, ensino e
discriminação fonológica reflectem-se reeducação de crianças e jovens com
negativamente na sua aprendizagem. perturbações de leitura e escrita.

As crianças que apresentam maiores riscos Ao longo do seu trabalho foi constatando a
de futuras dificuldades na aprendizagem da ausência de materiais reeducativos, com o
leitura são as que têm familiares com rigor necessário a uma intervenção com
dificuldades na linguagem oral e escrita, sucesso, pelo que foi desenvolvendo e
que apresentam desenvolvimento aperfeiçoando diversos materiais, que
linguístico tardio, dislálias fonológicas, que distribuía pelas crianças, pais e professores.
no jardim-de-infância, na pré-primária e no
início da escolaridade apresentam A publicação destes materiais foi sendo
dificuldades na consciência fonológica, insistentemente solicitada sempre que
silábica e fonémica, na identificação do apresentava comunicações públicas mas, a
falta de tempo resultante do trabalho

10 Paula Teles
PROFFORMA Nº 06 – Março 2012 Dislexia e Disortografia. Da Linguagem Falada à Linguagem Escrital

pedagógico e clínico diários, da elaboração Combley, M. 1997; Snowling, M, &


de novos materiais, da preparação e Stackhouse, J. 1997; Kaufman, L. 2000;
participação em conferências, foram Stanovich, K. E. 1986; Henry, M. K. 2000;
adiando a sua publicação. Shaywitz, S. 2003; Morais, J. 1997;
Snowling, M.J. 2001)
O MÉTODO FONOMÍMICO Paula Teles
propõe-se ser um contributo para a Porque, como já foi referido, as crianças
divulgação do conhecimento científico disléxicas, para alem do défice fonológico,
sobre a génese das dificuldades subjacentes apresentam outras dificuldades, os
à aquisição da leitura e escrita e apresentar métodos de ensino multissensoriais
estratégias de ensino facilitadoras destas permitem obter um maior sucesso. Ao
aprendizagens. (L. e Verghaeghe, A. 1994; utilizar simultaneamente as diferentes vias
Brady, S. & Moats, L. 1997; Lyon, R. 1997; de acesso ao cérebro são estabelecidas
Feitelson, D. 1988; Morais, J. 1997; Birsh, interligações neuronais que potencializam a
J.R. 2005) aprendizagem e reforçam a memorização.
O Método Fonomímico permite às
Permite às crianças iniciar a aprendizagem crianças integrar o “ver”, o “ouvir”, o
da leitura e da escrita mediante a realização “cantar” o “fazer o gesto” e o “escrever”.
de actividades multissensoriais, atractivas e
motivadoras, em que a fundamentação e A Associação Internacional de Dislexia, e
rigor científico estão sempre presentes, uma imensidade de investigadores,
constituindo uma mais valia facilitadora da promovem activamente a utilização de
aprendizagem. métodos multissensoriais, indicando os
princípios e os conteúdos educativos que
As crianças observam os desenhos de cada necessitam de ser ensinados explicitamente
“Animal-Fonema”, ouvem e cantam as e que foram seguidos na concepção do
suas “Histórias-Cantilenas” e mimam os Método Fonomímico que a autora foi
respectivos gestos. A realização destas construindo e aperfeiçoando no decorrer
actividades multissensoriais, metacognitivas da sua prática reeducativa.
e psicolinguístas, permite-lhes descobrir
com prazer e entusiasmo a relação entre os Aprendizagem Multissensorial: a leitura e a
sons da linguagem oral e as letras do escrita são actividades multissensoriais. As
alfabeto e, de degrau em degrau, progredir crianças têm que olhar para as letras
nas competências da leitura e da escrita. impressas, dizer, ou subvocalizar, os sons,
fazer os movimentos necessários à escrita e
Esta metodologia facilita a aprendizagem usar os conhecimentos linguísticos para
das crianças sem quaisquer dificuldades, aceder ao sentido das palavras. Os
que estão a iniciar a aprendizagem da Métodos Fonomímicos-Multissensoriais
leitura e escrita, a crianças com utilizam simultaneamente os diversos
perturbações fonológicas da linguagem e sentidos.
que apresentem indicadores de risco de
dislexia, e a crianças e jovens que já Sistemático e Cumulativo: os conteúdos a
apresentam dificuldades na aprendizagem aprender seguem a sequência lógica da
da leitura e da escrita, aquisição da linguagem. O ensino inicia-se
com os elementos mais básicos e fáceis da
Os estudos realizados por diversos linguagem e progride gradualmente até aos
investigadores mostraram que os métodos mais complexos e difíceis. São ensinados
multissensoriais, estruturados e os sons e as letras que os representam, com
cumulativos são a intervenção mais o apoio musical das histórias-cantilenas, (as
eficiente para todas as crianças, correspondências fonemaÛgrafema), as
independentemente de terem, ou não, letras e os sons que lhes correspondem (as
défices fonológicos. (Broomfield, H. & correspondências grafemaÛfonema), como

11 Paula Teles
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juntar os fonemas e as sílabas (fusão Referências


fonémica e silábica), como separar as
sílabas e fonemas (segmentação silábica e American Psychiatric Association. (1994).
fonémica), como ler palavras (fusões DSM IV: Manual de Diagnóstico e
silábicas sequenciais) e finalmente como ler Estatística de Doenças Mentais.
textos correcta, fluente e Lisboa: Climepsi Editores
compreensivamente. Os conhecimentos
adquiridos são revistos frequentemente a Birsh, J.R. (2005). Multissensorial Teaching
fim de manter e reforçar a sua of Basic Language Skills. Paul Brook
memorização. Publishing Co.
Bradley et al. (2000). Phonological Processing
Ensino Directo – Explícito: todos os Systems. The Neural Basis of
conceitos são ensinados directa e Developmental Dyslexia, Annals of
explicitamente. Dyslexia: Vol. 50 (pp.8 -14).
Ensino Sintético e Analítico: são ensinadas Brady, S. & Moats, L. (1997). A Position
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dos grafemasÛfonemas para identificar as Association.
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as palavras, ensino explícito da Fusão London: University of London
Fonémica e Silábica e das Fusões Silábicas Press.
Sequenciais. Análise das palavras para
identificar as sílabas, análise das sílabas Broomfield, H. & Combley, M. (1997).
para identificar os fonemas, ensino Overcoming Dyslexia, A Practical
explícito da Segmentação Silábica e Handbook for the Classroom. Whurr
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Avaliação Diagnostica: o plano educativo phonemic analysis ability among
baseia-se numa avaliação diagnóstica, Kindergartners. Reading and Writing:
rigorosa e contínua, dos conhecimentos já A International Journal, 6.
adquiridos e a adquirir por cada aluno.
Cary, L. e Verghaeghe, A. (2001). Acesso
Automatização das Competências Aprendidas: consciente aos gestos articulatórios
As competências aprendidas devem ser da fala: evidência de uma dissociação
treinadas até à sua automatização, isto é, entre maus e leitores disléxicos.
até à sua realização, sem atenção Psicologia Educação e Cultura, (Vol.
consciente e com o mínimo de esforço e de nº2 pp. 237-250).
tempo. A automatização irá disponibilizar a Clark, D. B. (1988). Dyslexia: Theory &
atenção para aceder à compreensão do Practice of Remedial Instruction.
texto. York Press/Parkton, Maryland.
Desejo que os educadores, professores, Castro, S. L. e Gomes, I. (2000). Dificuldades
pais e especialistas nas áreas da linguagem e de Aprendizagem da Língua Materna.
leitura sintam a sua utilidade, beneficiem Universidade Aberta.
das suas orientações e, muito Catts, H.W. & Kamhil, A. (1986). The
especialmente, que contribua para a Linguistic basis of reading disorders:
obtenção de um maior sucesso na Implications for the speech-language
aprendizagem das crianças e jovens que pathologist. Language, Speech, and
acompanham. Hearing Services in Schools, 17, 329-
341.

12 Paula Teles
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Bibliografia Recomendada Clínica de Dislexia Dra. Paula Teles

Rua Joaquim Paço D' Arcos, 2 F, 4º D -


Castro, S. L. e Gomes, I. (2000). Edifício Fonte Nova - Torre A
Dificuldades de Aprendizagem da Língua
Materna. Universidade Aberta. 1500 - 366 Lisboa
Margaret J. Snowling, (2001). Dislexia. Tel: 21 714 70 49 - Fax: 21 714 70 51 -
Livraria Santos Editora Ltda. Tm: 96 249 80 73 -
Morais J (1997), A Arte de Ler, Psicologia E-mail: paula.teles@netcabo.pt
Cognitiva da Leitura, Edições Cosmos,
Lisboa. www.clinicadedislexia.com

15 Paula Teles

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