FILOSOFIA EDUCACIONAL EM RELAÇÃO AO SURDO: ORALISMO Á
COMUNICAÇÃO TOTAL AO BILINGÜISMO
A importância da linguagem para o desenvolvimento humano
A falta de uma linguagem tem graves consequências para o desenvolvimento social, emocional e intelectual do ser humano. O valor fundamental da linguagem está na comunicação social, em que as pessoas fazem-se entender umas pelas outras, compartilham experiencias emocionais e intelectuais, e planejam a condução de suas vidas e a de sua comunidade. A linguagem desempenha importante papel na percepção, pois a criança começa a perceber o mundo não apenas através dos olhos, mas também da fala, que se torna parte essencial do seu desenvolvimento cognitivo. É através da linguagem que a criança passa a se comunicar e por conseguinte aprender sobre o mundo beneficiando-se da experiencia da linguagem e da comunicação. Se a linguagem tem a importante função intrapessoal de permitir comunicação social, ela também tem a vital função intrapessoal de permitir o pensamento, a formação e o reconhecimento de conceitos, a deliberada resolução de problemas, a atuação refletida e aprendizagem consciente. Concepções históricas sobre a surdez Discussões referentes à concepção de surdez estão presentes na sociedade há anos, caracterizadas pela disputa teórica sobre possibilidades comunicativas, e sucedidas por modos específicos de se perceber a surdez.
Nos anos 60 os linguistas tinham a concepção de que a linguagem falada é a única
forma de linguagem, entendemos o preconceito que cerca o surdo. São séculos da crença de que o surdo não seria educável ou mesmo responsável pelos seus atos, pensamento sempre justificável pela leitura dos clássicos. Aristóteles (384 – 322 a.C.) acreditava que quando não se falavam, consequentemente não possuíam linguagem e tampouco pensamento, dizia que: “... de todas as sensações, é a audição que contribuiu mais para a inteligência e o conhecimento..., portanto, os nascidos surdo-mudo se tornam insensatos e naturalmente incapazes de razão”, ele achava absurdo a intenção de ensinar o surdo a falar.
Kant (1793) concluiu que os surdos “nunca podem atingir mais
do que um análogo da razão¨ (1980, p.49), e que mesmo após aprender a sentir porque os sinais de que ele precisará para tanto nunca serão capazes de representar uma generalidade (1980, p.54) Schopenhauer também expressava ideias semelhantes. Para ele, os surdos, não teriam acesso direto ao raciocínio, já que o raciocínio depende da linguagem, e, à época, toda a linguagem plena seria oral. Wilhelm Wundt (1911) foi o único acadêmico a tentar a lidar com a língua de sinais como uma linguagem em seu próprio direito. Saussure (1916) enfatizou a arbitrariedade das relações entre o signo e o seu referente, e a iconicidade de certos sinais era visto como prova de sua inferioridade. Concebendo a língua de sinais como uma forma inferior de comunicação. Neste período da língua de sinais era considerada como forma inferior de comunicação composta de um vocabulário limitado de sinais equivalente à mera gesticulação mímica e pantomina, sem estrutura hierárquica, gramática ou abstração, limitada a uma representação holística de certos aspectos concretos da realidade. Hoje, já sabemos que tal concepção não corresponde a realidade. Ascensão e queda do oralismo Na segunda metade do século XVIII (18) existiam dois métodos de ensino dos surdos: Método de I´Epée que se baseava num sistema algo artificia de sinais; Método Alemão de Heinicke e Leipzig enfatizando o oralismo; Após o Congresso de Milão, o método oralismo tornou-se dominante, sendo assim, a educação dos surdos reduziu-se ao ensino do oralismo, os professores surdos forma expulsos, a língua de sinais foi banida e a comunidade surda foi excluída da política deixando de ser considerada cidadã. Como resultado da concentração exclusiva da educação na oralização, o nível educacional do surdo caiu em relação aos ouvintes, isso só começa a mudar em 1980 com o declínio do método oralista. O método oralista objetivava levar o surdo a falar e a desenvolver competência linguística oral o que lhe permitida desenvolver-se emocional, social e cognitivamente do modo mais normal possível, integrando-se como um membro produtivo ao mundo dos ouvintes. A filosofia oralista tem seu cheque mate nos anos 60, quando sucessos ocasionais não eram mais o suficiente e sim uma regra, se fazendo necessário apresentar um outro método/ filosofia de ensino que pudesse mudar esse quadro. Entre os anos 60 aos 90 surgem diversos avanços tecnológicos que mudam a ideia de ensino para o surdo e deixam a comunidade com muitas expectativas: desenvolvimento de aparelhos auditivos, programas de computadores, e por fim os implantes cocleares e os programas de treino auditivo intensivo nos primeiros anos de vida. Todo esse desenvolvimento apenas reparou o déficit auditivo, porém não atingiu o verdadeiro objetivo que é permitir ao surdo a aquisição e o desenvolvimento normais da linguagem. A era da comunicação total O que ficou esquecido por algum tempo foi que a linguagem oral não é a única forma de comunicação e também não é a única forma de linguagem. O objetivo maior da filosofia educacional oralista era permitir o desenvolvimento da linguagem e como ela nunca chegou a realizar satisfatoriamente este objetivo. Porém outra filosofia educacional pode alcançar esse objetivo. Objetivo aqui é utilizar todo e qualquer meio que promova a comunicação inclusive os próprios sinais. A filosofia educacional da comunicação total tem seus advogados em Ciccone, 1990; Denton, 1970; Raymann & Warth, 1981. Estes pensadores defendiam em seus estudo o uso de todos os meios que possam facilitar a comunicação, da fala sinalizada, a uma série de sistemas artificiais até os sinais. Como consequência tivemos a adoção da língua falada sinalizada nas escolas e nos lares, as crianças começaram a participar das conversas com seus professores e familiares. Esse modo de comunicação teve aparente sucesso que passou a ser o “método”. Recursos da comunicação total Os sistemas de sinais podem basear-se no vocabulário da língua de sinais, mas adicionar a ele aspectos da língua falada, ou então podem adotar um vocabulário artificial. Devemos nos ater ao fato da língua de sinais sempre seguir a ordem da produção das palavras faladas. O que permitia as crianças surdas algumas das regras das línguas faladas que aparecerão na escrita que ela deverá aprender. A estrutura das sentenças construídas por meio de sistemas de sinais transfere-se mais facilmente à língua escrita do que a daquelas em língua de sinais. Língua falada sinalizada passa a ser usada em diversos países: França, Rússia, USA, Dinamarca. A grande desvantagem dos sistemas utilizados consiste no fato de que constituem uma solução de compromisso que, além de requerer esforço por parte do aprendiz, acabam sendo sempre suficientes como meio principal de comunicação devido às complexidades de inflexão da língua falada que se está tentando sinalizar com marcadores. Sistema de sinais de Paget-Gomann (SSPG) 1 foi concebido para ajudar as crianças surdas a aprender a língua falada-escrita e que era emprego também com crianças com severos distúrbios de aprendizagem. Embora se tenha obtido avanços promissores com os estudantes surdos, os resultados esperados ainda eram muito pequenos, e a maioria dos surdos continuava enfrentando sérias dificuldades para comunicar-se e para aprender na escola. Estudiosos empenhados em descobrir qual era o motivo dessa ineficácia descobriram algo desconcertante, porém, inovador em relação às línguas de sinais: "[...] embora, por princípio, a comunicação total apoiasse o uso simultâneo da língua de sinais com sistemas de sinais, na prática, tal conciliação nunca foi e nem seria efetivamente possível, devido à natureza extremamente distinta da LS" (CAPOVILLA, 2000, p.10). O Vocabulário Makaton teve usa origem como instrumento de capacitação de linguagem para deficientes mentais surdos, consistente em 350 sinais derivados de um dialeto da língua de sinais britânica de sinais. Nos anos 70 era amplamente utilizado em escolas com alunos com distúrbios de aprendizagem na Grã-Bretanha , sendo mais utilizado que a própria língua de sinais britânica, já que a incidência de distúrbios severos de aprendizagem é oito vezes maior que a da surdez profunda. A queda da comunicação total e ascensão do bilinguismo Se analisarmos a filosofia educacional liberal da comunicação total, os diversos sistemas de sinais criados de fato conseguiram aumentar a visibilidade da língua falada, para além da mera leitura labial, e assim lograram auxiliar a compreensão da língua falada em certa medida. Em meados dos anos 70 notamos os primeiros problemas com a comunicação total e para os quais não obtivemos respostas. Não havendo melhora esperada na aquisição da leitura e escrita sendo assim, foi registrada as aulas do ponto de vista do aluno e as professoras perceberam que mesmo elas não compreendiam sua própria fala. Pois durante as aulas quando falam e sinalizam costumam omitir sinais e pistas gramaticais o que interfere no entendimento e absorção do conteúdo transmitido. Conclusão desconcertante óbvia é a de que as crianças não estavam obtendo uma versão visual da língua falada na sala de aula, mas sim uma amostra linguística incompleta e inconsistente, em que nem os sinais nem as palavras faladas podiam ser compreendido em sua plenitude. Tornando as crianças “hemi-lingues” sem ter acesso a qualquer uma das línguas plenamente e sem conhecer os limites entre um e outra. Hansen (1990), [...] o surdo deve ser capaz de usar o meio de expressão que seja adequado à situação e com o qual ele se sinta mais confortável. Deve ser capaz de se expressar com surdos ou ouvintes sinalizastes; ao conversar com ouvintes não- sinalizastes, ele pode escrever ou oralizar ou usar um interprete ouvinte.
Um programa bilíngue pioneiro
1 SSPG é um sistema que adota um vocabulário totalmente artificial concebido para ajudar crianças na aprendizagem de língua escrita. Também é utilizado para crianças com severos distúrbios de aprendizagem, deficiência física e autismo. Seu uso atingiu o pico na década de 1970 (CAPOVILLA, 2000). O primeiro país a entender o surdo como cidadão político foi a Suécia, reconhecendo como uma minoria linguística com direitos políticos assegurados a educação em línguas falada e de sinais linguísticos com direitos políticos assegurados a educação em língua falada e de sinais. Este programa bilingue foi desenvolvido e acompanhado por oito anos o desenvolvimento dos alunos surdos. O primeiro ano foco seria no desenvolvimento da língua de sinais e o fortalecimento a base da edificação escolar; na sequência é introduzido a primeira língua “estrangeira”. Durante este tempo as crianças surdas desenvolveram a comunicação e o entendimento da língua escrita e falada, juntamente com o desenvolvimento da língua de sinais. Os efeitos da educação bilingue na criança surda são muitos. incluindo o desenvolvimento adequado de competências linguísticas e comunicativas, a aquisição espontânea da língua, com o desenvolvimento intuitivo de regras linguísticas e em contextos sociais,