Você está na página 1de 5

Fichamento: Nome do Livro

Disciplina: IAU0917 – Meios Digitais 1


Docentes: Anja Pratschke; Pedro Teixeira

Isabella de O. Alves

GESSER, Audrei. Libras? Que língua é essa? Crenças e preconceitos em torno


da língua de sinais e da realidade surda. São Paulo: Parábola Editorial, 2009.

INTRODUÇÃO

Na introdução a autora expõe brevemente sua trajetória, o contexto e


concepção do livro e a que ele se propõe, de maneira geral, criar um espaço para
reflexões sobre algumas questões relativas à área da surdez. Ilustrando falas
recorrentes para trazer à tona algumas crenças, preconceitos e questionamentos
acerca da língua de sinais e da realidade surda.

CAPÍTULO 1: A LÍNGUA DE SINAIS

Assim como as línguas orais, as línguas de sinais não são universais e


uniformes.
A língua de sinais dos surdos não é artificial, pois evoluiu como parte cultural
do povo surdo. Existe uma língua artificial com objetivo maior de estabelecer
comunicação internacional, o Gestuno, que funciona como língua franca ou auxiliar.
Ao contrário do que muitos pensam, a língua de sinais possui gramática e
teve seu reconhecimento linguístico nos estudos do linguista americano Willian
Stokoe em 1960. Em níveis fonológicos e morfológicos temos os parâmetros:
configuração de mão (CM), orientação da palma da mão (O), ponto de articulação
(PA) ou locação (L) e movimento (M), podendo ser usadas uma ou duas mãos. Os
surdos também fazem uso extensivo de marcadores não manuais, as expressões
faciais são elementos gramaticais que compõem a estrutura da língua.
A partir dessa análise pode-se perceber que as línguas orais e de sinais são
semelhantes estruturalmente, diferindo-se quanto a forma como as combinações
são construídas: enquanto as línguas de sinais, de maneira geral, incorporam
unidades simultaneamente, as línguas orais tendem a organizá-las
linear/sequencialmente.
A crença da sociedade ouvinte de que a língua de sinais dos surdos não tem
gramática, está ancorada na crença de que elas não passariam de mímica e
pantomimas. Em estudo de 1979, Klima e Bellugi demonstraram a diferença entre
mímica e sinais a partir da observação de narrativas que necessitavam de
pantomimas para serem contadas. Usando surdos e não sinalizadores, os
pesquisadores procuraram estabelecer critérios para a diferenciação e constataram
que as pantomimas tinham muitas possibilidades, variando conforme o indivíduo,
enquanto na língua de sinais permanecia apenas uma variedade, a legitimada e
convencionada pelo grupo de usuários estudados. Outra diferença é que as
pantomimas ou mímicas são mais detalhadas e demoradas que os sinais, uma vez
que a pantomima quer fazer com que você veja o “objeto”, enquanto um sinal quer
que você veja o símbolo convencionado para esse objeto.
No entanto, essa recorrente pergunta ou comparação, traz em si um
preconceito muito grave, a visão de doença e anormalidade sobre a população
surda, como se eles conseguissem apenas se expressar limitadamente de uma
forma pantomímica, compreensível somente entre eles. Os surdos são fisicamente e
psicologicamente normais, é necessário que nós indivíduos de uma cultura de língua
oral, entendamos que o canal comunicativo diferente (visual-gestual) não inferioriza,
nem anula a existência de uma língua tão natural, complexa e genuína como é a
língua de sinais.
A língua de sinais não é exclusivamente icônica, embora exista um número
elevado desses sinais (beber, árvore...), é importante destacar que essa
característica não é exclusiva das línguas de sinais. Ainda amarrada a essa crença
está o que Wilcox e Wilcox (1997) destaca em seu livro: a de que as línguas de
sinais seriam mais conceituais do que as línguas orais. Na verdade, todas as línguas
são conceituais, a diferença está em como cada língua “empacota os conceitos em
unidades linguísticas”. Tampouco, a língua de sinais é um código secreto, essa é
uma crença que advêm da proibição histórica que os surdos tiveram de se
comunicar em sua língua natural. Várias implicações sociais, políticas, educacionais,
psicológicas e linguísticas decorrem dessa proibição.
Linguisticamente, pode-se afirmar que a língua de sinais É língua porque
apresenta características presentes em outras línguas naturais e, essencialmente,
porque é humana. Como vimos, ela tem e se apresenta estruturada em todos os
níveis, como as línguas orais: fonológico, morfológico, sintático e semântico. Além
disso, podemos encontrar nela outras caraterísticas: a produtividade/criatividade, a
flexibilidade, a descontinuidade e a arbitrariedade.
A língua de sinais é o alfabeto manual? De forma alguma. O alfabeto manual,
utilizado para soletrar manualmente as palavras (soletramento digital ou datilologia),
é apenas um recurso utilizado por falantes da língua de sinais. Imagine quanto
tempo levaria para um surdo falar uma sentença ou ter uma conversa se utilizasse
apenas soletramento manual? Entretanto, é importante destacar a função desse
recurso na interação entre os usuários da língua de sinais: ele é usado para soletrar
nomes próprios de pessoas ou lugares, siglas e algum vocábulo não existente na
língua. Além disso, recorre-se também a datilologia para realizar sinais de
pontuação, podendo o mesmo ocorrer com as preposições ou outras classes de
palavras.
No Brasil, o alfabeto manual é composto de 27 formatos (contando com o
grafema do Ç que é a configuração da letra C com movimento trêmulo). Cada
formato de mão corresponde a uma letra do alfabeto português brasileiro. Por ser
uma convenção, o alfabeto manual se configura de forma específica nas línguas de
sinais de cada país. Existe também o alfabeto manual para surdos-cegos, com a
diferença crucial de que os surdos-cegos precisam pegar na mão do interlocutor e
tatear o sinal.
É importante ressaltar que o soletramento, tanto na sua forma receptiva
quanto produtiva, supõe e implica letramento. O soletrante que não for alfabetizado
na língua oral de sua comunidade, terá as mesmas dificuldades de um indivíduo
iletrado para lançar mão deste uso. Mais uma prova para desconstruir a crença:
afinal, o português não é o abecedário.
Vimos que a língua de sinais não é datilologia ou mímica, também não é
universal, muito menos artificial. Ligada a essas crenças, vem a indagação: Seria a
LIBRAS um português sinalizado? Também não, pois a língua de sinais tem estrutura
própria e é autônoma, ou seja, independe de qualquer língua oral em sua concepção
linguística. Educacionalmente, o uso do português sinalizado tem sido alvo de
muitas críticas, porque se insere na filosofia do bimodalismo. Nessa visão encara-se
a língua de sinais como um meio para se atingir um fim, ou seja, apenas um recurso
para ensinar a língua oral (no Brasil, o português), funcionando como uma mistura
de sinais e fala.
Junto a indagação anterior pressupõe-se também que a língua de sinais teria
origem na língua oral, o que da mesma forma, não procede. Cada língua de sinais
tem suas influências e raízes históricas a partir de línguas de sinais específicas.
Tanto a língua americana de sinais (American sign Language – ASL) quanto a língua
brasileira de sinais (LIBRAS) têm origem na língua francesa de sinais.
Em 1855, o surdo francês Ernest Huet veio ao Brasil por convite do Imperador
dom Pedro II, para criar a primeira escola para surdos brasileiros e, em 1857 foi
fundado o Instituto Nacional de Educação de Surdo (INES), no Rio de Janeiro, no
mesmo endereço que se localiza até hoje. Durante anos, o INES tem sido o centro
de referência e de formação dos indivíduos surdos. Outro fato importante na história
das línguas de sinais foi o congresso de Milão, em 1880, que, em função de sua
decisão em favor das filosofias e métodos oralistas, afetou a educação dos surdos
ao redor de todo o mundo.
Apesar do nome, a língua de brasileira de sinais não é uma unidade. Em
todas as línguas humanas, há variedade e diversidade. A língua portuguesa é “uma
unidade que se constitui de muitas variedades” (Parâmetros circulares Nacionais,
1998:29 apud Bagno, 1999:19). Portanto, dizer que todos os brasileiros falam o
mesmo português é uma inverdade da mesma proporção que dizer que todos
surdos usam a mesma LIBRAS. Afirmar essa unidade é negar a variedade línguas,
quando de fato nenhuma é uniforme e homogênea.
A língua de sinais é uma língua ágrafa? Não, mas, até bem pouco tempo, era
considerada uma língua sem escrita. A ideia de representar as línguas de sinais
remete à história da coreógrafa americana Velerie Sutton. Em 1974 ela criou um
sistema para registrar as danças de seus alunos que chamou a atenção da
comunidade científica dinamarquesa de língua de sinais. A partir do contato com
pesquisadores da Universidade de Copenhagen, ocorreu a transição dos “sinais de
dança” para a “escrita dos sinais” ou “SingWriting”, sistema que pode ser aplicado na
representação de qualquer língua de sinais.

CAPÍTULO 2: O SURDO

Surdo, surdo-mudo ou deficiente auditivo? A maioria dos ouvintes


desconhece a carga semântica desses termos. Ao contrário do que se parece com o
mais “politicamente correto”, o termo que a comunidade surda mais adota e se
identifica é o surdo, os demais termos infringem sobre eles a condição de doença ou
excepcionalidade. Como já apontado, o surdo com aparelho fonador intacto se for
treinado, pode falar.
Essa visão fisiológica e medicalizada, traz muitas percepções falhas e
preconceitos, com diversas implicações sociais e culturais. A crença de que estar
em um contexto surdo é estar num mundo silencioso, por exemplo. Por definição,
barulho é a ausência de silêncio; é um ruído ou som perceptível aos ouvidos.
Todavia, na cultura surda o barulho e silêncio assumem novas versões. Como eles
“ouvem com os olhos”, O “barulho” é perceptível a visão dos surdos, manifestado em
forma de movimento, conversas paralelas, risos, expressões faciais, corporais e
manuais. Poderíamos nos referir a uma espécie de “ruído visual” como diz Gesser
(2006).
Não há desvantagem na surdez quando se fala em comunicação e interação,
visto que não é a modalidade da língua que define se estamos em silêncio ou não.
Os surdos dançam, “ouvem” música, ruídos e vibrações, tem sensações e
constroem seus mundos e subjetividades na e através da língua de sinais, em
resumo, concebem e redefinem seu mundo através da visão.
Uma grande questão que traz vários debates e preconceitos de ambos os
lados do espectro, surdo e ouvinte, é a oralização para integração à sociedade, ou
seja, o treino fonoaudiológico para fazer leitura labial e falar a língua portuguesa.
Oralizar é sinônimo de negação da língua dos surdos, sinônimo de correção,
imposição de treinos exaustivos, repetitivos e mecânicos da fala, que deixaram
marcas e traumas profundos na vida da maioria dos surdos. Um dos grandes nomes
do oralismo, dado seu prestígio na época (1880), foi Alexandre Graham Bell, que
contribuiu de maneira crucial com seu discurso eugenista para a negação e
opressão da língua de sinais. O ponto mediador entre ambos os extremos do
purismo linguístico seria o de que, se respeitarmos a língua de sinais e o direito do
surdo de ser educado nela, devemos também respeitar o direito daqueles surdos
que optam por falar a língua oral.
Os surdos possuem identidade e cultura próprias, sim. Mas é importante
acrescentar à asserção um plural: todos somos permeados, surdos e ouvintes, por
múltiplas identidades e culturas. Essa identidade muitas vezes forçosamente
homogeneizada e unificada é importante para resistência e visibilidade de um grupo
minoritário, contudo pensar o surdo no singular é apagar a diversidade e
multiculturalismo que distingue o surdo negro da surda mulher, o surdo índio do
surdo gaúcho, o surdo oralizado do surdo de lares surdos etc. Por isso se fala
também em várias culturas surdas.
Outra crença comum é a de que os surdos têm dificuldade de falar e escrever
por não saberem a língua oral. Como já posto, surdos vocalizam e a oralização é um
treino. Para além disso, é necessário expandir o conceito que temos de língua
humana e enxergar outra dimensão na qual conceber a língua: o canal viso-gestual.
Mesmo não oralizando os surdos falam, por sinais, é preciso descontruir a
perspectiva essencialmente oral-auditiva de fala e língua.
Quanto a escrita, o fato dela ter uma relação fônica com a língua oral pode e
de fato cria outro desafio para o surdo: reconhecer uma realidade fônica que não lhe
é familiar acusticamente. São símbolos “abstratos” para o surdo (Ahlgren, 1994).
A escrita é uma habilidade cognitiva que demanda esforço de todos (surdos,
ouvintes, ricos, pobres, homens e mulheres) e geralmente é desenvolvida quando se
recebe instrução formal. Aí se cai no lugar comum para reforçar que não se trata de
dificuldade, mas sim oportunidade. Oportunidade de acesso a uma escola que
reconheça diferenças linguísticas; que promova acesso a língua padrão; e no caso
dos surdos, que tenha professores proficientes na língua de sinais; que permita a
alfabetização na língua primeira e natural dos surdos.
O uso da língua de sinais não atrapalha a aprendizagem da língua oral, o
ensino da escrita para surdos deve passar por ela. Atualmente há um consenso
entre especialistas sobre o fracasso escolar em relação à aquisição de
conhecimento e ao desenvolvimento da linguagem (escrita) quando a língua de
sinais não é utilizada como língua de instrução. Todos os cidadãos devem ter o
direito de ser educado em sua própria língua (Honenberger, 1998).
A língua portuguesa tem, sim, um papel fundamental na escolarização e vida
cotidiana do surdo, da mesma forma que na vida de todos os brasileiros. Para dar
conta das questões educacionais na formação de surdos, inclusive na aprendizagem
da língua portuguesa, há a necessidade de inverter a lógica praticada até então nos
ambientes escolares e afirmar: “Os professores ouvintes de crianças surdas é que
precisam saber LIBRAS para poderem educá-las”.
Ainda que a filosofia oralista tenha predominado por muito tempo na
educação dos surdos, nem todo surdo faz leitura labial, havendo variação entre
surdos mais e menos habilidosos. Lembrando que: leitura labial é só um recurso
utilizado em situações emergenciais com os surdos. Para aqueles que interagem
frequentemente com eles a língua de sinais é indispensável.

CAPÍTULO 3: A SURDEZ

REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS
Indicar as referências dos materiais utilizados, seguindo as normas da ABNT.

Você também pode gostar