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Teste de avaliação – 11.

ºB ano
Educação Literária
Grupo I (100 pontos)
A (60 pontos)
Lê atentamente o seguinte texto.
Amava Simão uma sua vizinha, menina de quinze anos, rica herdeira, regularmente
bonita e bem-nascida. Da janela do seu quarto é que ele a vira a primeira vez, para
amá-la sempre. Não ficara ela incólume da ferida que fizera no coração do vizinho:
amou-o também, e com mais seriedade que a usual nos seus anos.
5 Os poetas cansam-nos a paciência a falarem do amor da mulher aos quinze anos,
como paixão perigosa, única e inflexível. Alguns prosadores de romances dizem o
mesmo. Enganam-se ambos. O amor aos quinze anos é uma brincadeira; é a última
manifestação do amor às bonecas; é tentativa da avezinha que ensaia o voo fora do
ninho, sempre com os olhos fitos na ave-mãe, que está da fronde1 próxima chamando:
10 tanto sabe a primeira o que é amar muito, como a segunda o que é voar para longe.
Teresa de Albuquerque devia ser, porventura, uma exceção no seu amor.
O magistrado e sua família eram odiosos ao pai de Teresa, por motivos de litígios,
em que Domingos Botelho lhes deu sentenças contra. Afora isso, ainda no ano anterior
dois criados de Tadeu de Albuquerque tinham sido feridos na celebrada pancadaria2
15 da fonte. É, pois, evidente que o amor de Teresa, declinando de si o dever de
obtemperar3 e sacrificar-se ao justo azedume de seu pai, era verdadeiro e forte. E este
amor era singularmente discreto e cauteloso. Viram-se e falaram-se três meses, sem
darem rebate à vizinhança, e nem sequer suspeitas às duas famílias. O destino que
ambos se prometiam era o mais honesto: ele ia formar-se para poder sustentá-la, se
20 não tivessem outros recursos; ela esperava que seu velho pai falecesse para, senhora
sua, lhe dar, com o coração, o seu grande património. Espanta discrição tamanha na
índole de Simão Botelho, e na presumível ignorância de Teresa em coisas materiais
da vida, como são um património!
Na véspera da sua ida para Coimbra, estava Simão Botelho despedindo-se da suspirosa
25 menina, quando subitamente ela foi arrancada da janela. O alucinado moço ouviu gemidos
daquela voz que, um momento antes, soluçava comovida por lágrimas de saudade.
Ferveu-lhe o sangue na cabeça; contorceu-se no seu quarto como o tigre contra as grades
inflexíveis da jaula. Teve tentações de se matar, na impotência de socorrê-la. As restantes
horas daquela noite passou-as em raivas e projetos de vingança. Com o amanhecer
30 esfriou-lhe o sangue e renasceu a esperança com os cálculos.
Camilo Castelo Branco, Amor de Perdição
1
folhagem, copa de árvore.
2
briga em que Simão se envolveu, descrita no início da obra.
3 obedecer.
1. Indica, com base no texto, quatro traços caracterizadores de Teresa. (20 pontos)

2. Explicita dois dos valores expressivos presentes na seguinte afirmação: “é


tentativa da avezinha que ensaia o voo fora do ninho, sempre com os olhos fitos
na ave-mãe, que está da fronde próxima chamando” (ll. 10-11). (20 pontos)

3. Identifica o recurso expressivo presente em “Não ficara ela incólume da ferida


que fizera no coração do vizinho” (l. 3-4) e comenta o seu valor. (20 pontos)
B (40 pontos)

INTRODUÇÃO

Folheando os livros de antigos assentamentos, no cartório das cadeias da


Relação do Porto, li, no das entradas dos presos desde 1803 a 1805, a folhas 232, o
seguinte:

Simão António Botelho, que assim disse chamar-se, ser solteiro, e estudante na
Universidade de Coimbra, natural da cidade de Lisboa, e assistente na ocasião de sua
prisão na cidade de Viseu, idade de dezoito anos, filho de Domingos José Correia
Botelho e de D. Rita Preciosa Caldeirão Castelo Branco; estatura ordinária, cara
redonda, olhos castanhos, cabelo e barba preta, vestido com jaqueta de baetão azul,
colete de fustão pintado e calça de pano pedrês. E fiz este assento, que assinei —
Filipe Moreira Dias.

A margem esquerda deste assento está escrito:

Foi para a Índia em 17 de março de 1807. […]

Dezoito anos! O amor daquela idade! A passagem do seio da família, dos braços de
mãe, dos beijos das irmãs para as carícias mais doces da virgem, que se lhe abre ao
lado como flor da mesma sazão e dos mesmos aromas, e à mesma hora da vida!
Dezoito anos!... E degredado da pátria, do amore da família! Nunca mais o céu de
Portugal, nem liberdade, nem irmãos, nem mãe, nem reabilitação, nem dignidade, nem
um amigo!... É triste!
O leitor decerto se compungiria; e a leitora, se lhe dissessem em menos de uma
linha a história daqueles dezoito anos, choraria!
Amou, perdeu-se, e morreu amando. É a história. E história assim poderá ouvi-la a olhos enxutos a
mulher, a criatura mais bem formada das branduras da piedade, a que por vezes traz consigo do céu
um reflexo da divina misericórdia; essa, a minha leitora, a carinhosa amiga de todos os infelizes, não
choraria se lhe dissessem que o pobre moço perdera honra, reabilitação, pátria, liberdade, irmãs, mãe,
vida, tudo, por amor da primeira mulher que o despertou do seu dormir de inocentes desejos?!
Chorava, chorava! Assim eu lhe soubesse dizer o doloroso sobressalto que me causaram aquelas
linhas, de propósito procuradas, e lidas com amargura e respeito e, ao mesmo tempo, ódio. Ódio,
sim... A tempo verão se é perdoável o ódio, ou se antes me não fora melhor abrir mão desde já de
uma história que me pode acarear enojos dos frios julgadores do coração, e das sentenças que eu aqui
lavrar contra a falsa virtude de homens, feitos bárbaros, em nome de sua honra.

1. No início do texto, reproduz-se o assento de prisão de Simão Botelho-


1.1.Identifica a passagem textual que comprova que o narrador não o descobriu por
acaso. (10 pontos)

1.2 Interpreta a funcionalidade narrativa da transcrição. (30 pontos)


Grupo II (50 pontos)

Nas respostas aos itens de escolha múltipla, seleciona a opção correta.


Escreve, na folha de respostas, o número do item e a letra que identifica a opção escolhida.

Leitura | Gramática (60 pontos)

Teresa de Albuquerque em sua carta ao Mundo


Simão Botelho, meu amado esposo.
Não te admires da configuração daquela que te há de parecer uma bem estranha
carta. Quando estas laudas1 chegarem às tuas mãos, saberás que as escrevi com tinta
feita da cinza que dia e noite me rodeia, diluída na escorrenteza das minhas próprias
5 lágrimas. Oxalá matérias tão precárias resistam à viagem e consigam levar-te saudações
da minha parte, seja onde for que te encontres, e estejas tu acompanhado por quem quer
que seja que o destino te tenha dado por amiga ou amante.
Pois pelo meu lado, se muito mudei, continuo a querer-te como no primeiro dia em
que te vi cavalgando pelas ruas de Viseu, e a amar-te da mesma forma, sem refrigério2
10 nem apelo, como no último instante, quando te dirigiste ao portaló para receberes as
minhas cartas, na nau que em breve partiria levando-te a caminho da Índia. Nessa hora,
a minha vida acabou, Simão, mas a tua felicidade, fatalmente sem mim, continua a ser
o meu maior cuidado. A tua felicidade é o meu destino. Vê como são as coisas, meu
amado. Agora, pouco me importa que aquela, com quem fazias projetos de partilhar
15 uma casinha nos arredores de Coimbra, já não se chame Teresa, nem que o peito onde
sonhavas encostar a tua cabeça, já não seja o seu. A vida mudou, isto é, a morte mudou
o que foi sonhado em vida. Mas o mais importante é que sei agora o que não sabia
antes. E por isso posso dizer-te que a natureza daquela Eternidade que ora víamos como
um paraíso perfeito, ora como um lugar de quietude e silêncio para onde os dois iríamos
20 adormecer para sempre, afinal é muito diferente do que ambos imaginávamos. Posso
dizer-te que se escrevo esta carta, é porque faço empenho em avisar-te para que não
sejas tomado tu pela surpresa que a mim me prende. Meu divino esposo do céu, meu
amado, estávamos enganados, a vida a partir daqui tem um sentido diferente. O amor
que aí vivemos até ao desespero, cá deste lado, não tem o valor de um pinto, e os bens
25
que pensávamos que nos conduziriam a um lugar de bom merecimento, ficaram pelo
caminho. Grande dolo3. Só o meu amor por ti, meu adorado esposo, continua igual,
absoluto e derradeiro, e por isso preciso explicar-te o que por cá se passa, antes que seja
tarde. Podes crer. Tão grande é a minha emoção ao fazer esta denúncia, que me
atrapalho nas letras de cinza que desenho sobre este pedaço de sudário4, e tão grande a
30 minha urgência em fazer-to saber, que nem sei como chamar as palavras.
Colóquio Letras, n.º 181, setembro/dezembro de 2012, p. 136.

1
folhas de papel.
2
alívio, conforto.
3
engano, fraude.
4
lenço usado para envolver um cadáver, mortalha.

1.Teresa escreve “uma bem estranha carta” (l. 2), uma vez que
A. se encontra enclausurada.
B. já morreu e comunica com Simão.
C. as frases não têm nexo.
D. a tinta é de má qualidade.
2. As “matérias tão precárias” (l. 4) remetem para
A. as lágrimas.
B. o papel usado.
C. materiais pouco frágeis.
D. cinza diluída em lágrimas.
3. A expressão “não tem o valor de um pinto” (l. 25) significa
A. tem pouco valor.
B. não vale tanto como um pintainho.
C. não significa nada para mim.
D. não é correspondido.
4. O pronome presente em “nos conduziriam” (l. 26) desempenha a função sintática de
A. complemento indireto.
B. complemento agente da passiva.
C. complemento direto.
D. sujeito.
5. A oração “que me atrapalho nas letras de cinza” (ll. 29-30) é
A. subordinada substantiva completiva.
B. subordinada adverbial causal.
C. subordinada adverbial consecutiva.
D. subordinada adjetiva relativa explicativa.
6. Indica a função sintática de ”Simão” (l.12),
7. Classifica as seguintes orações “ora víamos como um paraíso perfeito, ora como um
lugar de quietude e silêncio” (ll. 18 e 19).
8. Indica a função sintática da expressão “a minha emoção” (l. 29).

Grupo III (40 pontos)


Escrita

Algumas pessoas pensam que a influencia mais importante na vida dos jovens e a
família. Outras pensam que são os amigos.

Apresenta o teu ponto de vista sobre este assunto, num texto de opinião de duzentas
a duzentas e cinquenta palavras.
A professora, Paula Cruz

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