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Letras em dia, Português, 11.

º ano

Testes por sequência • Teste 3

Sequência 3 • Camilo Castelo Branco, Amor de Perdição

Grupo I

Apresenta as tuas respostas de forma bem estruturada.

Parte A
Lê o texto. Se necessário, consulta as notas.

Ao romper da alva dum domingo de junho de 1803, foi Teresa chamada para ir com seu pai à
primeira missa da igreja paroquial. Vestiu-se a menina, assustada, e encontrou o velho na
antecâmara1 a recebê-la com muito agrado, perguntando-lhe se ela se erguia de bons humores
para dar ao autor de seus dias um resto de velhice feliz. O silêncio de Teresa era interrogador.
5 – Vais hoje dar a mão de esposa a teu primo Baltasar, minha filha. É preciso que te deixes
cegamente levar pela mão de teu pai. Logo que deres este passo difícil, conhecerás que a tua
felicidade é daquelas que precisam ser impostas pela violência. Mas repara, minha querida filha,
que a violência de um pai é sempre amor. Amor tem sido a minha condescendência e brandura
para contigo. Outro teria subjugado a tua desobediência com maus tratos, com os rigores do
10 convento, e talvez com o desfalque do teu grande património. Eu, não. Esperei que o tempo te
aclarasse o juízo, e felicito-me de te julgar desassombrada2 do diabólico prestígio3 do maldito que
acordou o teu inocente coração. [...]
Teresa não desfitou os olhos do pai; mas tão abstraída estava que escassamente lhe ouviu
as primeiras palavras, e nada das últimas.
15 – Não me respondes, Teresa?! – tornou Tadeu, tomando-lhe cariciosamente as mãos.
– Que hei de eu responder-lhe, meu pai? – balbuciou ela.
– Dás-me o que te peço? Enches de contentamento os poucos dias que me restam?
– E será o pai feliz com o meu sacrifício?
– Não digas sacrifício, Teresa… Amanhã a estas horas verás que transfiguração se fez na tua
20 alma. Teu primo é um composto de todas as virtudes; nem a qualidade de ser um gentil moço
lhe falta, como se a riqueza, a ciência 4 e as virtudes não bastassem a formar um marido
excelente.
– E ele quer-me, depois de eu me ter negado? – disse ela com amargura irónica.
– Se ele está apaixonado, filha!... E tem bastante confiança em si para crer que tu hás de amá-
25 lo muito!...
– E não será mais certo odiá-lo eu sempre!? Eu agora mesmo o abomino como nunca pensei
que se pudesse abominar5! Meu pai… – continuou ela, chorando, com as mãos erguidas –
mate--me; mas não me force a casar com meu primo! É escusada a violência, porque eu não
caso!…
30 Tadeu mudou de aspeto, e disse irado:
– Hás de casar! Quero que cases! Quero!… Quando não, amaldiçoada serás para sempre,
Teresa! Morrerás num convento!

CASTELO BRANCO, Camilo, 2015. Amor de Perdição. Porto: Porto Editora (pp. 42-43)

1. antecâmara: sala de espera; 2. desassombrada: serenada, tranquilizada; 3. prestígio: fascínio, encanto;

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Testes por sequência • Teste 3

4. ciência: conhecimento; 5. abominar: repelir com nojo ou horror, detestar, odiar.

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Testes por sequência • Teste 3

1. Relaciona as qualidades que Tadeu associa ao seu perfil de pai (ll. 5 a 12) com a decisão que
apresenta à filha.

2. Descreve a evolução do estado de espírito de Tadeu durante o diálogo com Teresa.

3. Comprova, a partir do excerto, a dimensão de heroína romântica de Teresa.

4. Seleciona a opção de resposta adequada para completar as afirmações abaixo apresentadas.


O excerto exemplifica a relevância dos diálogos em Amor de Perdição. Através desta
modalidade de reprodução de discurso, o relato ganha ________ e, através das palavras das
próprias personagens, conhecem-se ________.
(A) complexidade … o seu carácter e as tensões entre elas
(B) autenticidade … o seu carácter e as tensões entre elas
(C) complexidade … os seus pensamentos e conflitos anteriores
(D) autenticidade … os seus pensamentos e conflitos anteriores

Parte B

Lê o excerto da Farsa de Inês Pereira. Se necessário, consulta as notas.

Mãe Pêro Marques foi-se já? 15 e coma eu pão e cebola3.


Inês E pera que era ele aqui? Siquer4 uma cantiguinha!
Mãe E não t’agrada ele a ti? Discreto, feito em farinha5,
Inês Vá-se muitieramá1! porque isto me degola6.
5 Que sempre disse e direi:
mãe, eu me não casarei Mãe Sempre tu hás de bailar,
senão com homem discreto, 20 e sempre ele há de tanger?
e assi vo-lo prometo Se não tiveres que comer,
ou antes o leixarei. o tanger te há de fartar?

10 Que seja homem mal feito, Inês Cada louco com sua teima.
feio, pobre, sem feição, Com uma borda de boleima
como tiver discrição, 25 e uma vez d’água fria7,
não lhe quero mais proveito. não quero mais cada dia.
saiba tanger2 viola, Mãe Como às vezes isso queima8!

VICENTE, Gil, 2014. Farsa de Inês Pereira. Porto: Porto Editora (pp. 30-32)

1. muitieramá: em muito má hora;


2. tanger: tocar;
3. coma eu pão e cebola: coma eu mal;
4. Siquer: ao menos;
5. feito em farinha: macio (meigo, condescendente);
6. me degola: me agrada;
7. uma borda de boleima / e uma vez d’água fria: um bocado de bolo e um gole de água;
8. queima: custa.

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5. Interpreta a fala da Mãe nos versos 19 a 22, atendendo ao modelo de marido anteriormente descrito
por Inês.

6. Analisa comparativamente o papel do pai de Teresa, no texto da Parte A, e o da Mãe de Inês, no


excerto da Farsa de Inês Pereira (texto da Parte B).

Parte C

7. Na «Introdução» a Amor de Perdição, o narrador sintetiza a história do herói – Simão Botelho


através da frase: «Amou, perdeu-se, e morreu amando.»

Escreve uma breve exposição em que reflitas sobre a adequação da síntese do narrador à
estrutura da novela romântica de Camilo Castelo Branco.
A tua exposição deve incluir:
– uma introdução ao tema;
– um desenvolvimento no qual explicites a pertinência da frase, considerando os capítulos de
Amor de Perdição que leste e o percurso sentimental do protagonista.
– uma conclusão adequada ao desenvolvimento do tema.

Grupo II

Nas respostas aos itens de escolha múltipla, seleciona a opção correta.

Lê o texto.

O verbo aventurar-se

A aventura designa uma experiência de transformação. O que vive a aventura fica


exposto, mesmo que não tenha ainda consciência disso, a alguma coisa de misterioso ou
de maravilhoso, com consequências imprevisíveis sobre a sua própria existência. A
aventura devolve-nos à imensidão do aberto, às suas possibilidades plásticas; coloca-nos
5 à escuta do inaudito; desprotege-nos das armaduras, de todo o tipo, que habitualmente
nos revestem; avizinha-nos temerariamente do verbo nascer, esse que, cada vez mais,
implica também a ousadia do esvaziamento e a travessia simbólica da morte. Mas a
verdade é que o ser humano não pode não se aventurar. E sabemos que, para quem não
se aventura, a morte não só é maior, torna-se também sem sentido. [...]
10 Macróbio, um escritor romano do século IV, que foi muito lido e comentado pelo mundo
medieval, dizia que cada homem, no desenrolar da sua aventura, tinha de confrontar-se
com quatro princípios: a sua individualidade (o Daimon), a sorte (a Tique), o amor (o Eros)
e a necessidade (a Ananké). Mais tarde, acrescentou-se a esta lista um quinto elemento
que deve configurar a aventura humana: a esperança (a Elpis).

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15 Não é preciso ser um viajante atordoado pelo exotismo da distância ou um frenético


membro de um desses clubes da aventura, cujo móbil é atirar, a qualquer preço, a pessoa
para fora de si. A viagem à volta do seu quarto pode ser tão extensa como uma volta ao
mundo e o mergulhar reconciliado no próprio coração pode equivaler ao contacto com
pátrias e línguas desconhecidas. Há pequenas viagens de vinte mil passos à superfície
20 que têm um alcance maior do que vinte mil léguas submarinas e gestos comuns que, na
sua quase imobilidade, atingem velocidades que a técnica jamais reproduzirá. Na
verdadeira aventura a vida experimenta-se não como atividade que termina em si mesmo,
mas descobre-se como potência: e isso, só por si, é regenerador. A vida revela-se não
apenas no horizonte do que neste momento é, mas reconhece-se no pulsar silencioso
25 daquilo que, a qualquer momento, ela pode vir a ser. Não admira que a maior aventura
seja a do amor. Seja o infinito para o qual ele nos abre. No pequeno livro do filósofo
Giorgio Agamben intitulado precisamente A aventura, sublinho estas palavras: «O amor é
sempre sem esperança e, contudo, apenas a ele pertence a esperança.»

MENDONÇA, José Tolentino, 2016. «O verbo aventurar-se».


E (Expresso), n.º 2287, 27 de agosto de 2016 (p. 88)

1. Relativamente ao género, o texto apresentado é


(A) uma exposição sobre um tema, pois procura explicar, com concisão e carácter demonstrativo,
a ideia de aventura.
(B) uma apreciação crítica, já que consiste na descrição sucinta de uma experiência de aventura,
acompanhada de comentários críticos.
(C) um texto de opinião, dado que nele se expressa um ponto de vista sobre o conceito de
aventura.
(D) uma reportagem, uma vez que apresenta informação objetiva sobre aventuras diversas.

2. Atendendo ao primeiro parágrafo, é possível afirmar que o autor não apresenta como
consequência da aventura em quem a vive
(A) a mudança.
(B) a vulnerabilidade.
(C) o desprendimento.
(D) o temor.

3. De acordo com a perspetiva exposta no início do último parágrafo, a ideia de viagem pode
associar-se a um universo
(A) longínquo.
(B) íntimo.
(C) singular.
(D) distante.

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4. Segundo o autor, o amor exemplifica


(A) a dimensão finita da aventura.
(B) a multiplicidade de experiências ligadas à aventura.
(C) a longevidade do espírito de aventura.
(D) as potencialidades ilimitadas da aventura.

5. As orações introduzidas por «que» nas linhas 10 e 11 são


(A) subordinada adjetiva relativa explicativa, no primeiro caso, e subordinada substantiva
completiva, no segundo caso.
(B) subordinada adjetiva relativa restritiva, no primeiro caso, e subordinada substantiva completiva,
no segundo caso.
(C) subordinada adjetiva relativa explicativa, no primeiro caso, e subordinada adjetiva relativa
restritiva, no segundo caso.
(D) subordinadas adjetivas relativas restritivas, em ambos os casos.

6. A passagem «A viagem à volta do seu quarto pode ser tão extensa como uma volta ao mundo e o
mergulhar reconciliado no próprio coração pode equivaler ao contacto com pátrias e línguas
desconhecidas.» (ll. 17-19) exprime a modalidade
(A) epistémica com valor de certeza.
(B) epistémica com valor de probabilidade.
(C) deôntica com valor de permissão.
(D) apreciativa.

7. Refere os mecanismos de coesão textual concretizados com o recurso à expressão «mesmo que»
(l. 2) e ao pronome «isso» (l. 23).

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Grupo III
A juventude é uma fase da vida frequentemente associada à rebeldia e à força das convicções.
Num texto de opinião bem estruturado, com um mínimo de duzentas e um máximo de trezentas e
cinquenta palavras, defende uma perspetiva pessoal sobre a importância da juventude para a
construção da identidade individual.
No teu texto:
– explicita, de forma clara e pertinente, o teu ponto de vista, fundamentando-o em dois argumentos,
cada um deles ilustrado com um exemplo significativo;
– utiliza um discurso valorativo (juízo de valor explícito ou implícito).

Observações:
1. Para efeitos de contagem, considera-se uma palavra qualquer sequência delimitada por espaços em branco, mesmo
quando esta integre elementos ligados por hífen (ex.: /dir-se-ia/). Qualquer número conta como uma única palavra,
independentemente do número de algarismos que o constituam (ex.: /2022/).
2. Relativamente ao desvio dos limites de extensão indicados, há que atender ao seguinte:
− um desvio dos limites de extensão indicados implica uma desvalorização parcial do texto produzido;
− um texto com extensão inferior a oitenta palavras é classificado com zero pontos.

Cotações
Grupo Item
Cotação (em pontos)
1. 2. 3. 4. 5. 6. 7. 104
I
16 16 16 8 16 16 16
1. 2. 3. 4. 5. 6. 7. 56
II
8 8 8 8 8 8 8

III Item único 40


TOTAL 200

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Matriz do Teste 3 • Camilo Castelo Branco, Amor de Perdição

Estrutura e cotação Domínios Aprendizagens Essenciais

 Interpretar obras literárias


Parte A
portuguesas produzidas entre os
séculos XVII e XIX:
1. 16 pontos Amor de Perdição, de Camilo
Castelo Branco.
2. 16 pontos

3. 16 pontos  Interpretar textos literários


portugueses produzidos entre os
4. 8 pontos Educação séculos XII e XVI:
Literária Farsa de Inês Pereira, de Gil
Grupo I Vicente. [Retoma]
Parte B
104 pontos
 Comparar textos de diferentes
5. 16 pontos épocas em função dos temas,
ideias, valores e marcos
históricos e culturais: Amor de
6. 16 pontos Perdição e Farsa de Inês
Pereira.

Parte C  Escrever uma exposição


Escrita sobre um tema, respeitando
7. 16 pontos as marcas de género.

1. 8 pontos  Ler em suportes variados


textos de diferentes graus de
2. 8 pontos complexidade do género:
artigo de opinião.
3. 8 pontos  Explicitar o conhecimento
Leitura gramatical relacionado com a
Grupo II
4. 8 pontos articulação entre constituintes e
56 pontos
Gramática entre frases (frase complexa).
5. 8 pontos  Reconhecer diferentes valores
modais, atendendo à situação
6. 8 pontos
comunicativa.
 Analisar processos de coesão
7. 8 pontos
e de progressão do texto.

 Escrever um texto de opinião,


Grupo III
Item único 40 pontos Escrita respeitando as marcas de
40 pontos
género.

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Sugestões de resolução do Teste 3 Grupo I – Parte C


7. Resposta pessoal. Tópicos de resposta:
Grupo I – Parte A – a força dos sentimentos – «amou»;
1. Tadeu apresenta-se como decisor incontestado e – o conflito e o desafio às convenções sociais e
responsável pelo futuro da filha, de quem entende que familiares, que conduz Simão ao confronto direto com
deve merecer confiança cega (l. 6) e cuja orientação, Baltasar e à sua «perdição» após o homicídio do rival
na sua perspetiva, justifica uma certa «violência» (l. 8). (cadeia, condenação e pena de degredo);
Considera-se marcado pela «brandura» e pela – a morte a caminho do degredo, motivada, em
«condescendência» (l. 8), qualidades que o impediram primeira instância, pelo amor-paixão.
de castigar a «desobediência» (l. 9) da filha, ao
envolver-
Grupo II
-se com Simão, e que fundamentam, no seu ponto de
vista, a decisão paciente de, decorrido algum tempo de 1. (C)
espera, casar Teresa com o seu primo Baltasar. 2. (D)
2. No início do diálogo, Tadeu recebe Teresa «com 3. (B)
muito agrado» (l. 3), dirigindo-se-lhe de modo calmo e 4. (D)
procurando convencê-la «cariciosamente» (l. 15) a
aceitar o casamento com Baltasar. Mostra-se inquieto e 5. (A)
expectante face à aparente hesitação e ausência de 6. (B)
resposta da filha (ll. 17 e 23-24) e reage «irado» (l. 28) 7. Coesão gramatical interfrásica e coesão gramatical
à recusa de Teresa em aceitar o enlace com o primo, referencial (anáfora).
assumindo uma postura autoritária e agressiva (ll. 29-
-30).
Grupo III
3. Teresa revela, no diálogo com Tadeu, a força de
Resposta pessoal.
carácter e a determinação próprias dos heróis
românticos. Afronta a autoridade do pai e as
conveniências sociais em nome dos seus sentimentos
e resiste à «violência» (l. 27) imposta pelo progenitor,
em defesa da sua liberdade individual.
4. (B)

Grupo I – Parte B
5. Na fala dos versos 19 a 22, a Mãe reage
ironicamente ao modelo de marido anteriormente
definido por Inês: um «homem discreto» (v. 7), ainda
que «mal feito, / feio, pobre, sem feição» (vv. 10-11),
mas que «saiba tanger viola» (v. 14) e se mostre doce.
Em resposta, a Mãe insinua que as qualidades
procuradas pela filha num marido não garantem a sua
subsistência, sugerindo a necessidade de conseguir
um casamento que lhe assegure desafogo financeiro.
6. As figuras dos progenitores partilham a preocupação
com o bem-estar dos filhos, ainda que determinando
esse bem-estar a partir dos seus parâmetros pessoais
e sociais. Tadeu procura orientar a filha a aceitar um
casamento conveniente e enquadrado nas convenções
sociais e familiares da época, acabando, contudo, por
exercer a sua autoridade paterna de forma repressiva e
enclausurar Teresa num convento. A Mãe, na peça de
Gil Vicente, apela à prudência da filha e alerta Inês
para a necessidade de se casar com alguém que lhe
garanta segurança económica. Permite-lhe, contudo,
concretizar a sua vontade e aprender com a sua
própria experiência, com o casamento com o
Escudeiro.

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