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Café e ferrovias: a evolução O Prof.

Odilon Nogueira de Ma- cada vez mais os interesses dessa


ferroviária de São Paulo e tos, auto r de alg u ns trabalhos no- mesma burguesia .
o desenvolvimento da cultura tá veis como, por exemplo, a clás- Mas a importância do trabalho
s ica análi se sobre A cidade de de Od ilon Nogueira de Matos não
cafeeiro
São Paulo no século XIX publica- termina aqui, po is além de diri-
da na Revista de História, vem, de mi r alg u mas d úvidas fundamen-
Por Od ilon Nogueira de Matos. novo, ofe recer-nos uma o u tra a ná- tais, su gere um conjunto de pro-
São Paulo, Alfa-Omega, Soc io logia blemas que ainda requerem in-
lise escl arecedora e, em alguns
e Pol ít ica , 1974. 135 p. vestigações p a r a q ue se me-
aspectos,- muito suge stiva sobre a
re lação entre a evo lução ferroviá- lhor com p ree nda. o desenvolvi-
ria e o desenvolvimento da cu l- me nto socioeconôm ico de São
tu ra cafeeira em São Pa ulo. Pau lo, a partir da segu nda me-
tade do séc u lo XIX . Assi m, à pá-
Ao contrário . d a h ipótese de
g ina 44, q ua ndo anali sa as t ra ns-
Richa rd Gra ham , apresen tada em
for m ações ocorri das nas di versas
Grã-Bretanha" e o início da moder- reg iões do estado, devidas à ex-
nização no Brasil (S ão Paul o, Ed i- pa nsão cafeei r a e à evolu ção fer-
to ra Bras il ie nse, 1973 ), que arg u- rov 1a r1a, s ugere que ·"os mov i-
menta so b re a im portânci a d o ca- m en tos de desl ocação in ter na de
pital e da tecnologia inglesa para popu lações const it ui u m fasci-
a evolu ção fe rroviári a de São Pau- na n te capít ulo da h is tória de São
lo, Odilon Nogueira de Ma tos de- Pau lo, à espera a in d a de quem se
monstra que tal processo depen - dis ponha a estudá-l os" . De fa to,
deu fundamen ta lmente de incen- a té agora os est ud ioso s p reocupa-
tivos estatai s e do capi t al da b u r- ram "se fundarne ntalm en te com a
guesia cafeeira . De m ons t r a, tam - imi gração italia na para São Pau-
bém, de que fo r ma o e stado im · lo, pois considera m q ue tal mov i-
Este liv r inho · caro, com er ros de pe r ial e e specialmente o pro v in- m ento pop ul aci onal co ns ti tui um
diag ramação e revisão e pessima·· cial f o r a m crescente me n te in- nódulo histór ico impo r tante pa ra
men te im pres so, conté m u m im- fluenciado e com po s to por el e- a com preensão da passagem tra-
p o rtan te texto de análi se histó- men tos da burguesia cafeeira, " ga- ba lho escravo - colon ato -
rica , e laborado por u m dos m a is la rdoada com t ítu lo s de nob re- trab al ho livre no Bras il. Mas ob-
cu idad osos e pro fun dos conhece- za'', de fo r ma que não se co ns- se rve mos po r um mome nto os da-
dore s do processo de dese nvo lv i- tituía e m a lgo disti nto e s im nu- dos pop ul ac iona is que no s fo rne-
mento paulista do sécul o XIX. ma organização que representava ce Od ilon Nogueira de Ma tos :

Distribuição d q população por regiões do Es tado de São Pa ulo em 1846, 1854, 1886 , 1920 e 193 5

1846 1854 1886 1920 1935


Regiões I I I
População I % I População l % População I o{, IPopulação I o/c IPopu Iação I '!;

Norte 105 679 45,65 146 055 38,00 338 533 32,66 490 660 13,43 ' 483 834 9,79

124 Central 102 733 44,30 126 429 39,27 299 216 28,86 769 802 21,07 877 077 17,74

Mogiana 20 341 8,79 51 265 15,92 163 831 15,80 811 974 22,23 845 442 17,10

Paulista 2 764 1,26 21 889 6,81 133 697 12,90 537 237 14,71 661 920 17,39

Araraquarense 43 697 4,18 579 653 15,87 890 095 18,01

Alta-sorocabana 58 004 5,60 326 994 8,95 576 812 11,67

Noroeste 136 454 3,74 608027 12,30

Tota 231 51 7 100,00 346 638 100,00 1 036 639 100,00 3 652 774 100,00 4 943 207 100,00

Fonte: Odi lon N ogueira de Matos p . 39, 41. 43 e 44.

Revis ta d e Administração de Empresas


É evidente que tanto a queda constitui um dos raros defeitos Compras: princípios
do volume relativo das popula- substantivos do livro - é se a e aplicações
ções das regiões norte e central evolução ferroviária se deu atra-
como o cresc imento das regiões vés do emprego de trabalhadores
paulis ta, araraquarense, alta-soro- livres . O autor esclarece que a Por Paul Farrel & Stuart F. Hein-
cabana e noroeste não se deveram Sa n Pau lo Railway foi construída ritz. São Paulo, Editora Atlas,
apenas às migrações internacio- po r obr igação contratual imposta 1972. 536 p. fndice analítico de
na is . Houve, evidentemente, im- pel o Governo, ut ilizando o traba- 14 p. Traduzido por Augusto Reis,
portantes movimentos populacio- lho liv re. Porém nada diz a esse da 5.• edição norte-americana de
nais internos no Brasil e entre as respeito sobre todas as outras Purchasing, principies and appli-
regiões paulistas no período que ferrovias. Ora ,_ ainda que afi rme ' cations. Prentice-Hall, Inc.
vai de 1846 a 1886, quando o vo- à pág ina 107 que "a grande ex·
lume das migrações internaci o- pansão pa u Iista para oeste ( cafe-
nais para São Pau lo ail!da era eira e ferrov iária ), tendo ocorri-
desprezível. A constatação desse do nos fi ns do século passado e
fenômeno coloca uma série de nas duas primeiras décadas do
questões que requerem aná lises sécu lo at ual , livre, portanto, da
mais aprofundadas: qual a pro- con junt ura escravista, tem que
porção de escravos livres na po- ser associada ao movimento ·.mi-
pulação? De onde provinha? Que gratório que marcou a paisagem
tipos de funções econÔmicas de- huma na , soc ial e cu lt ural de nos-
sempenhava? Etc. so Estado ... ", boa parte da rede
Od iiQn Nogueira de Matos su- ferroviária ( 2· 425 km hav ia m si-
gere algumas respostas parciais a do-constr uídos até 1890 ) foi cons-
essas pergu ntas . Ass im; a nalisa n- t ru ída antes da Al::?o lição. É, po r-
do a década de 80-90, af irma à tanto, necessário saber-se q ue t i-·
pági na 7 1: "um impo rtan te e le- po de mão-de-obra foi empregada
to de traba lho predom inava, pois E D ITORA ATLAS S. A.
mento lembra do por Tiw nay no
texto atrás tra nscr ito, veio con- to de traba lho predom inava , po is
tr ibu ir, de ma ne ira acen ,.uada, pa- tal informação viri a colaborar
ra del inear uma nova pa isagem para o es cl arec i m~nto de . ques- Rever este livro em português é
no in terio r pa ulista: a <:o nt rib ui- tões relat"ivas à passagem do sis- voltar ao meu primeiro curso de
ção de mineiros e fll.l minenses os tema escravista para o do traba- compras. Sim, naquela época não
q ua is, em grandes cont in gentes, lho livre. se falava adm inistração de mate-
vieram abr ir fazendas no oes te Porém, essas importantes ques- riais, mas simplesmente compras
pau li sta, que se lhes af igurava tões suger idas . pelo a ufor ultra- e o curso que fiz na Michigan Sta-
um novo Eldorado, terrivel mente passam de mui to os objetivos do te University, sob a competente
contrastante com as reg iões don- livro onde, no primeiro cap ítulo, direção do Prof . Hoagland, tinha
de provinha'm. Rara a cidade do ele expõe o q uadro gera l do siste- como livro-texto o Heinritz. É da-
oeste pa u lista que não t enha ma de com unicações na proví n- q uele tempo o meu permanente
troncos mineiros o u fl uminenses cia ao iniciar-se o sécu lo XIX; in teresse pe la ciência de com-
entre os seus fundadores". O q ue apresenta, em segu ida, traços ge-
pras e cada vez ma is me apro-
não fi ca cl aro no texto - e tal rais da hi stória do café, para , nos
fundei na ap licação da matemáti-
fato não consti tui defeito, por- do is capítu los seguintes, disc uti r
ca que tra nsformou compras nu-
que os objet ivos do livro são ou- ·os primórdios da era ferroviária
tros - é o vo lu me desse contin- e seu desenvo lvimento. Conclui, ma área da pesquisa operacional.
e nfim , o traba lho an alisando as A primeira edição ·do Heinritz
gente e como tal pop ulação se
colocava na economi a: eram pro- inf luências das ferrovias na pa isa- sa i1.1 em 1947. De lá para cá, ca-
prietários ou trabalhadores livres? gem paulista. p ítulos foram acrescidos ao livro, 125
Se eram proprietários~ e mprega· Por essas e outras razões que que se manteve num excelente
va ~ mão-de-obra escrava ou li- aqui não foram apontadas, Café nível de capacitação profissiona l
vre mi abertura dessas frentes e ferrovias constitui fonte indis- dos seus leitores para exercer o
que, como a t.abe la sugere, ocor- pensáve l a qualquer estudioso da árduo trabalho de comprador. O
reu antes da Abol ição? Enfim, o história do Brasil do sécu lo XIX. índice em português mostra co-
que o autor de Café e ferrovias o mo é completo:
suge re é q ue não se tem prestado
a devida atenção às migrações in- 1 . A função compra.
Manoel Tosta Berlinck
ternas e às suas funções no pro-
cesso de desenvolv imento econô- 2 . As compras e a administra-
mico ocorrido em São Paulo, du- ção .
ran te o sécu lo XIX. Outra ques-
tão que não es tá suficientemente 3. A organização para as com-
clara no texto - e, isso sim, pras .

Resenha bibliográfica

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