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PRÁTICA

Terapia familiar em
cuidados de saúde
primários
A experiência do Centro de Saúde
de Sete Rios
CRISTINA MAGALHÃES*
MARIA AMÁLIA SILVA NUNES**

Resumo:
Confrontado diariamente com um número crescente de situações cuja resolução ultrapassa
o âmbito da Clinica Geral um grupo de Clínicos Gerais do Centro de Saúde de Sete Rios solicitou à
Direcção, em 1997, apoio específico na área da Terapia Familiar. Com o objectivo de ajudar as
famílias em situação de disfuncionalidade a efectuarem as mudanças necessárias a um a instituição da terapêutica considera-
funcionamento mais eficaz e satisfatório para os seus elementos e de, simultâneamente, promover da correcta conduzindo a um elevado
entre os profissionais do Centro de Saúde a compreensão dos problemas de saúde numa óptica número de consultas e a uma sobre-
sistémica, surgiu este projecto, a funcionar desde Janeiro de 1998. utilização desadequada dos serviços de
Com uma forte articulação entre Terapeutas Familiares e Médicos de Família, traduzida na saúde. Um número significativo destas
realização de reuniões periódicas entre os dois grupos profissionais para discussão das situações queixas parece relacionar-se com facto-
referenciadas e com um período de atendimento de 4 horas semanais, o projecto res de ordem psicossocial provenientes
abrangeu em Terapia Familiar, 52 famílias, às quais foram realizadas 212 dos vários sistemas em que os indiví-
entrevistas familiares sistémicas. Foram estudados os motivos de referência e foi feita
duos se inserem, com particular relevo
uma avaliação diagnóstica sistémica das situações apresentadas.
para o sistema familiar.
Verificou-se diminuição do consumo de consultas de Clínica Geral nas famílias
Benoit1, no seu livro Tratamento das
com adesão ao processo terapêutico, tendo sido igualmente observada
Perturbações Familiares, relembra-nos
diminuição ou desaparecimento dos sintomas em cerca de 53 % dos casos em que
o processo foi considerado terminado – por alta, referenciação ou abandono.
que, face à doença incompreensível,
absurda e grave que certos sujeitos tudo
Palavras-chave: parecem fazer para alimentar, a hipó-
Cuidados de Saúde Primários; Disfunção Familiar; tese ecosistémica vem afirmar que, para
Intervenção Familiar; Intervenção Sistémica; Terapia Familiar. além do doente, nos encontramos pe-
rante uma família cujos membros vivem
num clima de autodestruição – etiolo-
gia a ter em conta quando se desenha
INTRODUÇÃO o acompanhamento de tais situações.
Cristina Magalhães Na sua prática diária o Clínico Geral re-
Psicóloga Clínica Na prática de Clínica Geral/Medicina conhece bem a influência que as situa-
Terapeuta Familiar no
Familiar somos quotidianamente con- ções de doença ou perda de um elemen-
Centro de Saúde de Sete Rios
frontados com um elevado número de to da família representam para os ou-
Maria Amália Silva Nunes queixas vagas e indiferenciadas, com tros elementos do sistema; de igual for-
Assistente Graduada de sintomas dificilmente «encaixáveis» em ma se apercebe de como situações de
Clínica Geral e Terapeuta Familiar no quadros nosológicos conhecidos, com a disfuncionalidade familiar se podem as-
Centro de Saúde de Sete Rios. persistência das queixas mesmo após sociar ao aparecimento de sintoma-

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tologia num determinado elemento do de Saúde. O presente artigo pretende


grupo familiar – o chamado paciente apresentar a actividade desenvolvida
identificado que mais não é do que o neste âmbito entre Janeiro de1998 e
canal por onde a tensão familiar se es- Junho de 2000 - os objectivos da mes-
vai e o espelho de um funcionamento ma, as estratégias delineadas, os re-
familiar desajustado. sultados obtidos, seguidos de uma
Se é fácil para o Médico de Família o breve avaliação do trabalho realizado.
diagnóstico e a compreensão destas
situações, já a sua intervenção junto OBJECTIVOS
da família como um todo fica limitada
pela natureza do seu trabalho, centra- Com os objectivos gerais de ajudar as
do prioritariamente no indivíduo, com famílias com situações transitórias de
uma prestação de cuidados globais e disfuncionalidade a efectuarem no seu
continuados aos indivíduos da sua lista, interior as mudanças necessárias a um
obrigado a segredo profissional com funcionamento mais eficaz e satisfatório
cada um dos utentes que o procure. para todos os seus elementos e de pro-
Surge assim a necessidade de referen- mover entre os profissionais do Centro
ciar para outro tipo de cuidados – a de Saúde a compreensão dos proble-
Terapia Familiar. mas de saúde numa óptica sistémica,
A Terapia Familiar é uma forma de considerámos como objectivos específi-
intervenção sistémica, efectuada por cos desta actividade os seguintes:
profissionais com formação específica • ajudar as famílias a ultrapassar as di-
nesta área que, utilizando a entrevista ficuldades sentidas no desempenho das
familiar como método de trabalho e com tarefas próprias da fase do ciclo de vida
recurso a várias técnicas, procura aju- familiar em que se encontram
dar as famílias a realizar as mudanças • ajudar as famílias a resolver as crises
necessárias a um funcionamento mais normativas relacionadas com as tran-
saudável associado ao desenvolvimen- sições de fase do ciclo de vida familiar,
to harmonioso dos seus elementos. frequentemente associadas ao apareci-
Tendo como objecto de intervenção a mento de mal-estar ou patologia em al-
família, prestando cuidados de caracter gum dos seus elementos
episódico e não continuado, permitin- • libertar o «paciente identificado» dos
do a associação estratégica e provisória seus sintomas tendo em particular
dos terapeutas a um ou outro dos ele- atenção as situações de perturbação do
mentos familiares, a Terapia Familiar comportamento em crianças e adoles-
constitui assim uma forma de inter- centes ou de problemas de rendimento
venção complementar da Clínica Geral2. escolar
A estimativa de um elevado número • diminuir o número de consultas de clí-
de situações a referenciar para Terapia nica geral em situações de sobreuti-
Familiar no Centro de Saúde de Sete lização dos serviços motivadas por
Rios, a necessidade sentida por um problemas de disfunção familiar
grupo de médicos do referido Centro de • aumentar nas terapeutas familiares o
Saúde de apoio nesta área, a existência nível de conhecimentos de estratégias
de um elemento médico com formação em Terapia Familiar e melhorar o seu
em Terapia Familiar e a possibilidade de desempenho em co-terapia.
colaboração de uma Psicóloga Clínica,
Terapeuta Familiar, foram os factores POPULAÇÃO ALVO
determinantes para a criação de uma
consulta de Terapia Familiar a fun- Considerando como universo todos
cionar desde Janeiro de1998 no Centro os utentes inscritos no Centro de Saúde

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e respectivas famílias, a nossa activida- da evolução das famílias com terapêu-


de foi, contudo, dirigida para as famílias tica em curso.
com elementos em idade pré-escolar, Foram previstas entrevistas familia-
escolar e adolescentes que apresentas- res sistémicas, com a duração de 60 a
sem alguma das seguintes condições: 90 minutos, com periodicidade mensal
• problemas comportamentais em (flexível) sempre realizadas em regime
crianças e adolescentes de co-terapia. Cada entrevista deveria
• insucesso escolar relacionado com ser precedida de uma período de pre-
problemas de funcionamento familiar paração efectuado pelas duas terapeu-
• dificuldades na definição de fronteiras tas e seguida da avaliação e registo da
entre os vários subsistemas mesma em ficha própria.
• excessiva rigidez ou flexibilidade das A supervisão das duas técnicas, di-
regras familiares condicionando funcio- recta ou indirecta, realizada na Socie-
namento familiar caótico ou acentua- dade Portuguesa de Terapia Familiar,
damente rígido foi considerada uma estratégia tendente
• doença crónica na família condicio- a aperfeiçoar o seu desempenho e a au-
nando ou traduzindo funcionamento mentar o seu conhecimento de técnicas
familiar desajustado de intervenção em Terapia Familiar.
Numa fase inicial – 18 meses – esta
actividade estava planeada apenas para RESULTADOS
as famílias acima mencionadas envia-
das pelos Clínicos Gerais envolvidos no 1. Discussão de casos
Projecto Alfa dependente do Centro de Efectuaram-se 52 reuniões para dis-
Saúde, actualmente Extensão de cussão de situações a referenciar para
S.Domingos de Benfica e pela equipe de Terapia Familiar, com um número de
Saúde Escolar, devendo alargar-se pos- participantes variável entre 5 e 14 ele-
teriormente a todo o Centro de Saúde. mentos, incluindo médicos de família,
Excluímos deste trabalho as famílias internos do Internato Geral, internos
com problemas previamente conheci- do Internato Complementar de Clínica
dos de toxidependência por existirem na Geral, enfermeiras, estagiários de En-
comunidade serviços disponíveis para fermagem e de Serviço Social e alunos
este tipo de situações. da cadeira de Clínica Geral e Medicina
Comunitária da Faculdade de Medicina
ESTRATÉGIAS de Lisboa.
As reuniões seguiram habitualmente
As famílias referenciadas serão o seguinte modelo:
abrangidas por esta actividade após dis- • apresentação da família pelo Médico
cussão prévia das situações em equipe, de Família com recurso ao genograma
constituída no mínimo pelos seguintes e indicação dos elementos considerados
elementos : mais relevantes no desenvolvimento da
• 2 Terapeutas Familiares responsáveis situação
pela execução do projecto • apresentação da situação problemá-
• os responsáveis pela referência tica e do motivo de referência para Te-
• 1 técnica de Serviço Social do Centro rapia Familiar
de Saúde • apresentação do trabalho já desen-
A previsão foi de uma reunião quin- volvido com a família pelo Clínico Geral
zenal no início do processo a realizar com indicação dos recursos internos ou
posteriormente com uma periodicidade externos utilizados
mensal ; nas mesmas reuniões, sempre • colocação das hipóteses diagnósticas
que possível, proceder-se-ia à discussão sistémicas pelas Terapeutas Familiares

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e definição de algumas estratégias de in- QUADRO I


tervenção sistémica
FREQUÊNCIA DE ENTREVISTAS POR FAMÍLIA
• avaliação da capacidade de interven-
ção do Médico de Família, quer no tra-
balho directo com a família, quer na N.o Entrevistas N.o Famílias Total
mobilização desta para Terapia Familiar 1 12 12
• informação, dada pelas Terapeutas 2 5 10
Familiares, sobre as famílias em pro- 3 7 21
cesso terapêutico 4 7 28
• supervisão do acompanhamento feito 5 4 20
pelos Clínicos Gerais a famílias proble- 6 4 24
máticas das suas listas de utentes 7 7 49
Foram apresentadas para discussão 8 6 48
83 situações; 63 tiveram indicação Total 52 212
para acompanhamento em Terapia
Familiar, ficando as restantes a cargo
dos médicos de família após sugestões além das duas técnicas, os elementos
apresentadas no decurso das reuniões da família que coabitam. Ocasional-
e 52 famílias iniciaram o processo mente foram chamados a participar ele-
terapêutico. mentos não coabitantes mas significa-
tivos no «desenrolar» do problema e na
2. Trabalho efectuado com famílias resolução do mesmo.
Dispondo de um período de 4 horas A definição e amplificação do proble-
semanais para atendimento, abrange- ma, o reenquadramento do sintoma, a
mos 52 famílias no processo de Terapia modificação de fronteiras entre os sub-
Familiar. Do ponto de vista sociológico sistemas, a promoção da circulação da
podem agrupar-se, quanto à sua es- informação, a metacomunicação no
trutura, do modo seguinte : seio da família, o recurso à narrativa te-
rapêutica3, o reforço dos aspectos posi-
Nuclear ............................ 38 famílias tivos presentes no sistema e o uso da
Alargada .......................... 8 famílias prescrição, incluindo prescrição para-
Monoparental .................. 3 famílias doxal do sintoma, foram as técnicas
Reconstruída .................. 3 famílias mais utilizadas nas várias sessões.
No decurso de cada entrevista é fei-
Foram realizadas 212 Entrevistas ta uma breve interrupção para dis-
Familiares; o quadro I apresenta a fre- cussão da mesma entre as terapeutas
quência de entrevistas por família. Cada e afinação das estratégias de interven-
sessão de Terapia Familiar foi precedi- ção com definição das eventuais pres-
da de uma fase de preparação efectua- crições a fornecer à família no final da
da pelas duas terapeutas onde, após sessão. Após retorno à sala de terapia
reavaliação da situação familiar e das é feita a conclusão da entrevista, sendo
consequências das intervenções já comunicados os aspectos pertinentes
feitas, foram definidos o plano de acção da avaliação efectuada pelas terapeu-
e as estratégias da entrevista seguinte. tas, apresentadas as prescrições a
As sessões terapêuticas foram reali- cumprir pela família e combinada a
zadas em regime de co-terapia segun- data da sessão seguinte.
do um modelo de cooperação (com se- Após cada entrevista é feito o registo
melhança de estatutos e papeis das te- da mesma em folha expressamente ela-
rapeutas). A construção do sistema te- borada para tal, dele constando o no e a
rapêutico envolveu habitualmente, para data da sessão, as presenças e o de-

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senho gráfico da distribuição dos vários Problemas relacionados com


elementos na sala, bem como das mu- fronteiras .................................... 407
danças ocorridas nessa distribuição ao formação de tríades rígidas - 16
longo da entrevista. São ainda regista- dificuldades em manter
dos os temas abordados, a avaliação fei- limites com famílias de origem – 11
ta pelas terapeutas, não só da actual en- aglutinação – 11
trevista mas também da situação glob- desagregação - 2
al da família e das mudanças ocorridas
no processo terapêutico, as prescrições Problemas de funcionamento
feitas, a data da entrevista seguinte e a conjugal ...................................... 28*
indicação dos elementos convocados.
As sessões tiveram habitualmente Perturbações da comunicação.... 228
uma periodicidade mensal por nos escalada simétrica - 5
parecer, de acordo com outros autores, comunicação verbal escassa - 5
nomeadamente Andolfi, Angelo 4 e dificuldades na comunicação de
Ausloos5, ser este o período necessário sentimentos - 5
às famílias para experimentarem e complementaridade rígida - 4
consolidarem organizações e funciona- pontuação diferente das sequências
mentos alternativos conducentes à mu- comunicacionais - 4
dança.
Verificaram-se como motivos de re- Problemas relacionados com
ferência para esta consulta os seguin- regras familiares .......................... 13
tes: (classificados de acordo com os
critérios do DSM IV6) Problemas de autonomização
individual ........................................ 8
• Síndromes depressivos .............. 20
• Distúrbios somatoformes .......... 13 Problemas no funcionamento
• Problemas escolares .................. 10 do subsistema parental .................. 7
• Problemas conjugais .................. 10
• Distúrbios do comportamento Problemas com distribuição do
alimentar.................................... 4 poder na família ............................ 7
• Comportamento anti-social
em adolescentes ........................ 3 * incluindo ausência de intimidade no
• Relação problemática casal, desajuste sexual e dificuldade na
pais-filhos .................................. 2 gestão de conflitos
• Distúrbio
obsessivo-compulsivo ................ 2 AVALIAÇÃO
• Enurese...................................... 2
• Encoprese .................................. 1 No quadro II apresentam-se os re-
• Suspeita de incesto .................... 1 sultados da análise da evolução do pro-
• Comportamento anti-social cesso terapêutico.
na infância ................................ 1 A avaliação foi feita segundo os indi-
• Delírio de ruína .......................... 1 cadores operacionais definidos na ela-
boração do projecto - o total de consul-
Situando-nos, como terapeutas fami- tas de Clínica Geral efectuadas pelos
liares, numa abordagem essencialmen- vários elementos da família no ano em
te estrutural, procurámos fazer uma que decorreu a terapia em comparação
avaliação diagnóstica sistémica das si- com as do ano anterior e total de situa-
tuações até agora acompanhadas, ten- ções em que se verifique o desapareci-
do obtido os resultados seguintes: mento dos sintomas apresentados.

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QUADRO II objectiva. O número de situações que


após discussão em equipe permaneceu
EVOLUÇÃO DO PROCESSO DE TERAPIA FAMILIAR
a cargo dos Clínicos Gerais (25%) pode
constituir uma forma de indirectamente
Evolução do N.o de avaliarmos este aspecto.
Processo Terapêutico Famílias %
Alta 21 40,3 CONCLUSÕES
Abandono 14 27,0
Em curso 7 13,5 A inexistência de dados publicados
Referenciadas 6 11,5 sobre trabalhos de cariz semelhante
Interrupção temporária a) 4 7,7 realizados entre nós no âmbito dos Cui-
Total 52 100,0 dados de Saúde Primários dificulta a in-
terpretação dos resultados que obtive-
a) Famílias sujeitas a follow-up mos. Ainda que efectuado em contexto
diferente, o trabalho da Equipe do
Núcleo de Seguimento Infantil e Acção
Relativamente ao primeiro indicador Familiar** da Faculdade de Psicologia
foi possível fazer a sua análise no que e Ciências de Educação da Universida-
se refere ao primeiro ano de trabalho e de de Coimbra, descrito por Ana Paula
os resultados foram os seguintes: Relvas em Conversas com Famílias9
• em 12 das 14 famílias com alta o no permite, contudo, identificar algumas
de consultas diminuiu; não temos in- semelhanças na metodologia utilizada
formação sobre as restantes e comparar resultados. São sobre-
• em 3 das famílias referenciadas o con- poníveis os dados referentes às situa-
sumo diminuiu tendo-se verificado um ções com sucesso terapêutico – 53 % na
aumento nas 3 restantes nossa experiência, 52% no trabalho do
• nas famílias com interrupção tem- NUSIAF.
porária verificou-se diminuição do con- Conscientes de que os efeitos de uma
sumo de consultas intervenção familiar podem não ser ime-
No que se refere ao 2o indicador foi diatamente avaliáveis - nem sempre,
feita a sua análise nas famílias que in- como nos lembra Andolfi,3 o desapare-
terromperam o processo por alta, aban- cimento do sintoma corresponde a mu-
dono, referenciação ou interrupção dança significativa ocorrida no sistema,
temporária. Das 45 famílias nestas con- podendo esta surgir em famílias com
dições, em 24 verificou-se desapareci- abandono do processo terapêutico -
mento do sintoma, em 9 modificação do parece-nos, contudo, poder considerar
mesmo e a sua manutenção nas como globalmente positivos os resulta-
restantes. dos da actividade que desenvolvemos.
O desempenho em co-terapia foi De particular importância nos pare-
sofrendo aperfeiçoamento progressivo ceu o trabalho de articulação entre
no decurso do processo, experimenta- Terapeutas Familiares e Médicos de
do subjectivamente pelas terapeutas e Família, nomeadamente os da Extensão
avaliado de uma forma mais objectiva de S. Domingos de Benfica com quem
através da supervisão. a experiência de trabalho foi mais lon-
O facto de não terem sido previamen- ga. Definir com êxito os limites das duas
te definidos indicadores avaliativos da áreas de intervenção e encontrar uma
aquisição, pelos médicos de família, de plataforma comum de actuação, foram
novas competências no manejo de si- desafios estimulantes, resolvidos com
tuações familiares problemáticas não sucesso neste trabalho de articulação
permitiu, neste campo, uma avaliação entre os vários profissionais.

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Alguns constrangimentos de carac- REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS


ter institucional relacionados com a 1. Benoit J C. Tratamento das perturbações fa-
contratação das terapeutas tiveram miliares. Lisboa: Climepsi Editores; 1997.
repercussão negativa no desenvolvi- 2. Nunes AS, Almeida P. A fuga da Familia L.
Familiarmente 1999 Jul; 2 (2) : 4, 9.
mento do trabalho condicionando, em 3. Sluzky C. La transformation des récits en the-
algumas fases, abrandamento do seu rapie in Elkaïn M.La Therapie familiale en change-
ritmo – situação que, no momento, se ment. Le Plessis- Robinson: Synthélabo; 1994
4. Andolfi M, Angelo C. Tempo e Mito em Psico-
encontra em fase de resolução. terapia Familiar. Porto Alegre: Artes Médicas; 1989
Foi nosso objectivo, ao realizar este 5. Ausloos G. A competência das Famílias.
projecto, introduzir a Terapia Familiar Lisboa: Climepsi Editores; 1996
6. American Psychiatric Association; Diagnostic
nos Cuidados de Saúde Primários. Estão and Statistical Manual of Mental Disorders, 4 th Ed.
dados os primeiros passos; assegurar Washinton DC: American Psychiatric Press;1994
entre nós a sua continuidade parece ser 7. Minuchin S. Famílias. Funcionamento e
Tratamento. Porto Alegre: Artes Médicas; 1990
agora o próximo desafio. Podemos, as- 8. Watzlawick P, Beavin JH, Jackson DD.
sim, de alguma forma, tornar nossas as Pragmática da Comunicação Humana. São Paulo:
palavras de Jacques Miermont10: «A par- Editora Cultrix 1993.
9. Relvas A P. Conversas com Famílias. Porto:
tir do momento em que somos capazes Edições Afrontamento;1999
de dizer às pessoas quem somos, o que 10. Miermont J. Serão necessárias três gerações
vamos fazer e como vamos trabalhar para gerar um psicótico? In Prieur B (coorde-
nação). As heranças familiares. Lisboa: Climepsi
com os nossos colegas que agem a ou- Editores;1999
tros níveis de competência e de respon-
sabilidade, então começamos a co-or-
Recebido em 28/11/2000
ganizar alguma coisa. Quando isto está Aceite para publicação em 20/04/2001
colocado no seu devido lugar, então,
mesmo que o jogo não esteja ganho, está Endereço para correspondência
Maria Amália Silva Nunes
pelo menos bem encaminhado.» Rua Cidade de Malange, 3, 2º D
** NUSIAF 1800 Lisboa

FAMILY THERAPY IN PRIMARY HEALTH CARE. EXPERIENCE AT THE SETE RIOS HEALTH CENTRE

ABSTRACT:
The growing number of problems out of the scope of general practice that GPs at the Sete Rios Health Centre
have to deal with on a daily basis, led a group of the former to ask the Health Centre’s Director in 1997
for specific support in family therapy services. This new project was thus set up in January 1998 in order to
help dysfunctional families to change towards more effective and satisfactory ways of functioning by their
members. This project also aimed to foster a systemic understanding of this type of problems by the health
centre’s professionals. Family therapists and family doctors started to articulate and meet periodically to
discuss cases. With 4-hour weekly sessions, the project included 52 families on therapy with which 212
systemic family interviews were conducted. Reasons for referral for therapy were studied, and a systemic
diagnostic assessment of the cases was made. Among the families that complied with the therapeutic pro-
cess, there was a decrease in the number of GP surgery visits. Furthermore, there was a decrease or even
resolution of symptoms in 53% of the cases for which the therapeutic process was deemed complete – either
on account of discharge, referral or drop-out.

Key-words:
Primary Health Care; Family Intervention; Systemic Intervention; Family Therapy

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