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O Artesanato Mineiro Dentro da Moda

.
Kelle Cândida Antunes
Graduanda em História pela Faculdade Estácio de Sá.
e-mail: modahistoria@hotmail.com
Profa. Dra. Marcelina das Graças de Almeida
Faculdade Estácio de Sá, Campus Prado e Escola de Design, PPGD, UEMG
e-mail: marcelinaalmeida@yahoo.com.br

RESUMO: O artesanato tem origem juntamente com a própria trajetória do homem


acompanhando, assim, os processos evolutivos por qual a humanidade percorreu. No Brasil, o
artesanato surge juntamente com os índios, os mais antigos artesãos, através de pigmentos que
provinham de elementos naturais. O artesanato é parte do folclore e revela usos, costumes,
tradições e características de cada região. A moda se apropria dos mais variados elementos
culturais e sociais para criar tendências e lançar novos produtos no mercado. A moda também
se apropria do artesanato que pode estar presente em diversas formas: em acessórios, na
customização de peças, bordados e aplicações e que são feitas geralmente em tecidos de
superfície plana. O artesanato mineiro inserido dentro da moda atinge seu auge mercadológico
com a exportação, trazendo melhores condições financeiras para várias famílias de artesãos,
sobretudo no que diz respeito às famílias do Estado de Minas Gerais.

PALAVRAS-CHAVE: Artesanato Mineiro, Moda, Minas Gerais

ABSTRACT: The craft originated with the trajectory of the man thus following evolutionary
processes by which humanity has made. In Brazil, the craft comes along with the Indians, the
oldest craftsmen. Through pigments came from natural elements. The craft is part of the
folklore and reveals customs, traditions and characteristics of each region. Fashion
appropriates elements from many different cultural and social trends to create and launch new
products in new markets. Fashion also appropriates the craft that may be present in various
forms, accessories, customization of parts, applications and embroideries and fabrics are
usually made of flat surface. The miner craft inserted into fashion marketing reaches its peak
with the export, bringing better financial conditions for many families of artisans, above all
with respect, families of the state of Minas Gerais.

KEYWORDS: Miner crafts, fashion, Minas Gerais.


O Artesanato Mineiro e sua inserção na moda: contexto histórico

No presente trabalho, pretende-se fazer uma breve abordagem do artesanato mineiro e


sua inserção dentro do mundo da moda, debatendo um pouco de sua aceitação na moda
nacional. Neste sentido, busca-se demonstrar a diversidade de gostos que o artesanato de
Minas Gerais atende e tratar da questão financeira, apresentando este trabalho manual como
fonte de renda e de iniciativas organizacionais, criadas para melhorar a comercialização dos
produtos. Com a expansão do artesanato mineiro como fonte de renda para muitos artesãos,
busca-se apontar a sua expansão internacional e citar renomados estilistas que usam produtos
de fabricação manual em seus desfiles e coleções.
Uma vez que é tão pouco estudado e discutido, este artigo demonstra a relevância que
esses produtos representam para a moda e para a economia de uma maneira geral. É
interessante poder perceber a junção entre o artesanato, que é um exemplo de expressão de
regionalidades e conservadorismo, e a moda, que é marcada por transitoriedade no que diz
respeito a tendências e gostos. Mesmo apresentando tantas diferenças entre si, estes dois
diferentes mundos conseguem se interligar e criar uma grande identificação um com o outro,
demonstrando que peças muitas vezes consideradas rústicas, podem tornar-se sofisticadas
quando manuseadas por um estilista que prefere misturar diversas linhas de moda.
A proposta central deste trabalho acadêmico consiste em elaborar uma breve
abordagem sobre o artesanato mineiro, suas características regionais e trazer a percepção de
sua importância para o mercado da moda. Tendo por objetivos analisar a história do
artesanato, desde sua origem até a atualidade, destacar lugares conhecidos como divulgadores
do artesanato mineiro, a “Feira Hippie” de Belo Horizonte1 e, por fim, analisar a proporção
comercial que tomou esta modalidade de trabalho que chegou ao seu auge com a exportação.
Para desenvolvimento e conclusão da temática foi feita uma pesquisa documental
exploratória que é realizada através de consultas em livros, revistas e sites que tratam do
assunto. E foi feito um recorte regional para falar do artesanato dentro do Estado de Minas
Gerais.
Historicamente o artesanato é uma tradição, uma linhagem de conhecimento que passa
de pai para filho, de mestre para discípulo. Sua história tem início juntamente com a própria

1
A Feira Hippie atualmente acontece somente aos domingos na Avenida Afonso Pena entre a Rua da Bahia e
Rua dos Guajajaras, no centro de Belo Horizonte. A feira acompanha o parque Municipal de Belo Horizonte e o
Palácio das Artes, e o seu centro é também entrada do parque municipal Américo Rene Giannetti. O horário de
Funcionamento é de 07h00min às 14h00min. Retirado do site: <http://www.feirahippiebh.com/v2/index.php/pt-
br/feira> - acessado em 14/11/2011.
trajetória do homem, pois a necessidade de se reproduzir bens de utilidade e uso rotineiro
expressou a capacidade criativa e produtiva como forma de trabalho. “Os primeiros artesãos
surgiram no período neolítico (6.000 A.C), quando o homem aprendeu a partir a pedra, a
fabricar a cerâmica e a tecer fibras animais e vegetais” (KOHLER; 1996; p. 59). Já no
término do século XVIII as roupas tanto masculinas quanto femininas eram elaboradas e
confeccionadas com intuito de passar a mensagem de formalidade. Contudo, adornos
artesanais como fitas, enfeites e bordados não eram dispensados para composição e
combinação das roupas usadas no contexto presente, sendo que tais peças eram usadas em
homens e mulheres. A classe feminina usava com mais freqüência os bordados e enfeites e os
homens geralmente usavam penas pintadas em seus chapéus e confeccionadas com palha de
milho para prender seus cabelos.
Houve modificações de estilo, indo do formal para o mais infantil e simples que
ocorreu no período das Revoluções Americana (1776) e Francesa (1789). Havia fortes
reivindicações de mudança política, social e cultural devido ao fenômeno do Renascimento
(fins do século XIII a início do século XVII), que foi amplamente difundido. Em meio a essa
troca de paradigma vivenciada no continente europeu exercendo influência no continente Sul
Americano é que o Movimento Romântico2 com sua ênfase no simples e no natural começa a
refletir no modo de vestir, onde as peças artesanais ganham destaque e atenção e são usados
com frequência ainda maior.
O uso de peças artesanais foi especialmente evidente na Inglaterra, onde franzidos e
rendas eram usados para homens e mulheres de forma habitual. A moda americana seguiu a
moda inglesa, embora com certa distância, mas não deixou as peças artesanais de lado. Na
França o uso de adornos em excesso continuou até a véspera da Revolução. Quando o
Terceiro Estado provoca a abolição e a distinção de classes na maneira de se vestir,
aristocratas atemorizados com aquele movimento abandonam suas armações e jóias. Com o
país em crise poucas pessoas tem dinheiro para desenhar e comprar novas roupas. Passada a
crise, foram introduzidos estilos mais simples juntamente com adornos e peças artesanais
semelhantes aos artigos de fabricação manual existentes na Inglaterra.
No Brasil, o artesanato surge juntamente com os índios, os mais antigos artesãos.
Através de pigmentos que provinham de elementos naturais, eles faziam a arte da pintura,
cestaria e cerâmica. Sem esquecer a arte da plumaria, como coques, tangos e outras peças de

2
O Movimento Romântico surgiu nas últimas décadas do século XVIII na Europa, influenciando na Filosofia, na
Política e nas Artes. Defendia uma visão de mundo centrada no indivíduo.
vestuário. O artesanato brasileiro é um dos mais ricos do mundo e garante o sustento de
muitas famílias e comunidades, fazendo parte do folclore e revelando usos, costumes,
tradições e características de cada região.
Desde o período colonial, principalmente do século XVIII, trabalhadores usam as
mãos para confeccionar peças de uso decorativo e utilitário, e os artesãos se fazem presentes
nas áreas colonizadas em Minas Gerais.

Na maestria de confeccionar objetos, a criatividade do mineiro sempre foi ímpar, nas


mais variadas regiões culturais mineiras de acordo com o processo histórico de cada
uma, criam-se variados objetos, quem conhece a história da nossa colonização é
capaz de compreender melhor a história desses objetos, sua respectivas curiosidades
e sua características peculiares as quais traduzem o jeito de ser e a cultura da
comunidade de origem. (FIGUEIREDO; 1997; p. 128).

No Livro “História da moda” do autor João Braga (1988) se pode perceber a


interação existente entre moda e história. De uma forma bem sucinta, o autor relata a história
do vestuário e da moda em vários povos, sendo descritas vestimentas dos povos da
Antiguidade (4.000/3500 a.C – 476 d.C), da Idade Média (século V a século XV), no
Renascimento e nos séculos XVIII e XIX. Braga aborda diversos aspectos do tema: moda
masculina, moda feminina, os materiais empregados, os métodos de confecção, as tinturas que
eram usadas. A partir da análise desta obra, pode-se obter um aparato teórico mais substancial
para entender as diferentes relações que a moda estabeleceu em todos os períodos históricos,
além de auxiliar na compreensão da trajetória do artesanato dentro da moda e a moda dentro
da história.
Já Luciano Figueiredo em “Barrocas Famílias” (1997) apresenta a vida familiar nas
Minas coloniais, demonstrando de maneira ampla como era o cotidiano dos homens e
mulheres setecentistas, além de ajudar no entendimento sobre a indumentária e vestimenta
coloniais. Apesar da extração do ouro, a exploração feita através de altos impostos que eram
cobrados a pobreza prevalecia na região das Minas, o que obrigou as pessoas a desenvolverem
trabalhos artesanais. As mulheres então, se enfeitavam fazendo belas criações com artesanato,
o interessante é notar que as mulheres de um poder aquisitivo melhor aderiram às peças
artesanais feitas pelas mulheres pobres, ou seja, a moda sendo ditada por uma classe inferior e
adotando um viés socioeconômico. Com a leitura deste livro, questionamentos surgiram sobre
como se desenvolveu o artesanato mineiro.
A “Revista Talentos do Brasil” (2009) foi outra fonte importante para se argumentar
melhor sobre a entrada do artesanato no mundo da moda, falar de alguns estilistas mineiros
que aderiam ao artesanato mineiro em suas coleções e perceber a necessidade do mercado que
sempre busca pelo novo, e passa uma mensagem de transitoriedade e moderno, de criar ou
adaptar algo que remetesse ao passado e tradicional. Nada melhor e mais sugestivo do que o
próprio artesanato, com destaque ao mineiro.
O site do SEBRAE (Serviço de apoio às Micro e Pequenas Empresas) oferece várias
informações sobre as cidades de Minas que trabalham com artesanato, o tipo de matéria-prima
que é usada para confeccionar as peças, além de ter criado um cadastro para o artesão
comercializar seus produtos, dados estatísticos que informam a quantidade de peças para
comercialização. São feitas comparações que informam a quantidade de peça e o lucro que é
obtido com a sua venda em diferentes anos. As informações existentes no SEBRAE, além de
conseguir dados e informações de grande relevância para desenvolvimento de pesquisas
possibilitando uma visão econômica sobre o artesanato, e demonstrando que realmente o
artesanato é uma fonte de renda para varias famílias mineiras. E que existe uma valorização
muito grande dos produtos mineiros em outros estados e países.

Imagem 01 – Enfeite de Mesa – “Tricoteira”.


Fonte: imagem gentilmente cedida por Heloísa Nazaré.
O Artesanato Mineiro dentro da moda
Existe uma herança cultural dentro do artesanato de Minas onde o predominante é a
tradição transmitida de geração em geração, tendo uma preocupação com o tradicional, que se
transforma na própria identidade do local em que é produzido, sendo que a produção artesanal
se destaca no cenário nacional como a mais bela e bem elaborada.
Na personalidade do artesão já está fixada a idéia de tradicionalismo, sendo que ele
consegue transmitir a característica do regionalismo para as peças que são confeccionadas.
Existe uma imensa satisfação por parte dos artesãos em confeccionar suas peças, porque as
técnicas tradicionais de produção que eram utilizadas por seus avós são resgatadas. Há
também um zelo por parte destes trabalhadores para que essa cultura não se perca, tendo
sempre um cuidado para que todo processo de confecção das peças sejam inteiramente
artesanal.
Um exemplo deste cuidado é demonstrado na produção de adornos feitos com folhas
de bananeira e capim dourado na qual a colheita das folhas é realizada com cautela, para que
as folhas sejam aproveitadas de forma integral. As tintas usadas são feitas pelos artesãos a
partir da matéria-prima (terra e argila) obtida nos arredores da região e nos quintais dos
próprios artesãos, a partir desta mistura do barro com as folhas surgem cores rosa, marrom e
vermelho, pela enorme quantidade e diversificação de matéria-prima, uma grande variedade
de produtos é confeccionada. Com essas técnicas rústicas e antigas tem-se aumentado
expressivamente no mercado da moda os trabalhos contendo fortes traços culturais.
A produção artesanal mineira acontece principalmente nas cidades onde foram
registrados importantes fatos históricos. Pode-se perceber que estes centros de visitação
turística necessitam oferecer produtos para os visitantes, essas peças são confeccionadas pelos
habitantes locais com matéria-prima também local. Assim, existe uma demanda por produtos
considerados tradicionais de determinada região que é suprida pela produção local.
Tiradentes trabalha com biscuit para confecção de acessórios e couro que é usado para
fazer detalhes de roupas e colares; Ouro Preto optou por produzir bordados e aplicação de
renda em roupas; Sabará confecciona acessórios com o capim dourado; Congonhas utiliza
flores de palha para detalhes em roupas, crochês e bordados em geral; em São João Del Rei é
muito rico o trabalho feito com tricô pelas bordadeiras da cidade; no vale do Jequitinhonha
existem artesãos que trabalham com cerâmica e palha de bananeira, dentro das comunidades
de Coqueiro do Campo3, com tais matérias-primas são confeccionados detalhes para roupas e
acessórios como colares e pulseiras.
O artesanato está ligado ao tradicionalismo e as cidades históricas, também é utilizado
em centros urbanos como acontece em Belo Horizonte com a Feira Hippie, localizada na
Avenida Afonso Pena, é hoje, sem dúvida, uma das maiores feiras de artesanato da América
Latina. Esta feira iniciou-se em 1969 com um movimento cultural envolvendo principalmente
artistas plásticos que semanalmente expunham seu trabalho. Aos poucos foram se juntando
aos artistas, artesãos de todos os tipos, fazendo com que o evento inicial se transformasse na
“Feira Hippie” da Praça da Liberdade. Em 1991, devido ao tamanho alcançado, a feira foi
transferida para a Av. Afonso Pena assimilando esse nome.

Imagem 02: Vestido de algodão bordado a mão com tricô.


Fonte:< http://www.vilaboadegoias.com.br/goiania/artesanato_em_goiania.htm>. Acesso dia 12/10/2011.

3
Coqueiro Campo é uma localidade do município de Minas Novas, integrante do Vale do Jequitinhonha,
localizada no nordeste de Minas Gerais. Nessa região de limites incertos, reside um grupo de ceramistas, em sua
maioria vindas de um bairro vizinho denominado Campo Alegre, onde aprenderam o ofício com suas mães, tias
e avós, sendo que, suas técnicas de produção são as mesmas utilizadas pelos antepassados.
Segundo Caldas (1999) quem trabalha com a moda hoje deve estar atento a tudo o que
acontece de importante em termos de comportamento, cultura, arte, espetáculos, movimentos
sociais, políticos, dentre outros. Para se entender a relação entre moda e artesanato, é preciso
definir qual o significado do termo moda como fenômeno social da mudança cíclica dos
costumes e hábitos, das escolhas, dos gostos, coletivamente validado se tornando quase um
formato obrigatório. O fazer artesanato está ligado à raiz cultural do artesão e ao modo como
ele coloca seu produto no mercado. A junção entre a tendência da moda e a tradição fortalece
o produto perante o mercado e possibilita ao artesão criar novas possibilidades de trabalho, no
entanto, o que realmente faz o objeto artesanal é a sua identidade local.
A moda se apropria dos mais variados elementos culturais e sociais para criar
tendências e lançar novos produtos no mercado, neste sentido, o artesanato pode estar
presente de diversas formas, em acessórios, na customização de peças bordadas e aplicações.
Existem várias tendências da moda que valorizam o artesanato mineiro e fazem deste
estilo de vestir e decorar, um jeito de viver. Para produzir e atender a exigências do mercado
da moda, não basta somente querer ser um bom artesão, é preciso ter estilo, personalidade e
capacidade de produzir peças que venham revelar a beleza de um trabalho, que cada dia esta
mais presente nas revistas de moda e estilo. A capacitação e o conhecimento das técnicas de
produzir fazem a diferença na peça realizada.
Revistas de moda como Vogue e Elle são referências para a moda mundial e quando
mostram em suas páginas peças artesanais despertam o desejo de milhares de mulheres e
atendem do estilo mais clássico ao jovial, espontâneo e moderno. Revistas de receitas de
peças de crochê e tricô são muito vendidas e revelam o bom gosto atendendo ao estilo da
moda. Muito além das peças de tricô e crochê, as revistas que contêm orientações de moda,
com peças de artesanato, vão desenvolvendo a cada dia novas técnicas, inclusive na
customização e reciclagem de peças que de uma simples veste se transformam em verdadeiras
obras de arte.
No mundo da moda, constantemente tem se revelado modelos exclusivos desfilando
com peças de artesanato que agradam a todos os gostos. Isso demonstra que o artesanato
mineiro tem atendido as mais variadas demandas da moda, agradando pessoas de diferentes
faixas etárias em praticamente todas as estações do ano. Na moda masculina, feminina,
jovem, infantil e adulta são invadidos pelas peças delicadas de crochê, colocando toda a
beleza das cores e linhas dessa arte de tecer. As peças feitas de tricô usam a lã em cores
vibrantes para aquecer os dias de inverno rigoroso, ou tons escuros para a sobriedade em
peças clássicas que demonstram elegância e estilo. No verão, uma peça de crochê dialoga e
transparece a leveza própria da estação.
Com características muito particulares o artesanato revela traços do passado e às
formas antigas de produção, são adicionadas, modernas técnicas que fazem com que essa
tradição permaneça sempre atual. Por fim, observa-se que o artesanato mineiro, dentro da
moda brasileira, passa por um processo de amadurecimento, pelo qual tem procurado
construir uma identidade e conceito próprio.

Estilistas e Designers que adotaram o Artesanato Mineiro em suas coleções

Diferentemente de tempos atrás, em que os materiais artesanais eram vistos como


peças rústicas e dificilmente eram adicionados ao guarda-roupa do dia a dia urbano, o
artesanato está em foco na moda atual e sendo muito usado em desfiles e coleções por vários
estilistas renomados.
Vários estilistas brasileiros tais como Cristine Ban4 (1973) apostam no artesanato
como uma inserção positiva na moda. A marca é uma adepta do tricô em suas criações
acreditando na nobreza das fibras naturais, confeccionando roupas com materiais artesanais
que permitem aliar conforto a um visual elegante. Além disso, este trabalho demonstra a
inserção de algo estritamente brasileiro às produções que muitas vezes são apresentadas em
todo o mundo, levando um pouco de uma manifestação de arte do país ao restante do globo.
O crochê, por exemplo, apareceu no desfile de primavera-verão 2010 da Marca Espaço
Fashion em vestidos assimétricos com lavagem estonada. Na mesma temporada, Reinaldo
Lourenço5 (1969) ousou em apresentar requintados ternos, vestidos e saias feitos de ráfia –
material usado para produzir sacos de café nas cores coral, marrom e bege. Já a coleção
primavera-verão do estilista Ronaldo Fraga6 (1975) teve como inspiração o Nordeste
brasileiro e contou com trabalhos de artesãos dos estados de Pernambuco, Paraíba e de Minas
Gerais.

4
Cristine Ban nasceu em Nova Friburgo, no Rio de Janeiro, no ano de 1973, descendente de uma família de
japoneses, estudou arquitetura na Universidade Federal do Rio de Janeiro, no entanto sempre se interessou por
moda. Em 1986, integrou a primeira turma do Curso de Moda do SENAI-Cetiqt. Em 1993, monta sua primeira
confecção, cinco anos mais tarde inaugura a primeira loja de varejo no Bairro de Ipanema.

5
Reinaldo Lourenço é um estilista nascido em Presidente Prudente interior de São Paulo no ano de 1969.
Estudou Studio Berçot em Paris e em 1983 volta a São Paulo onde lança sua própria marca
6
Ronaldo Fraga nasceu em Belo Horizonte no ano de 1975 e estudou moda na Universidade Federal de Minas
Gerias (UFMG). Reconhecido estilista mineiro, desfilou na ultima edição da São Paulo Fashion Week.
A partir dessas informações consegue-se perceber que cada vez mais o artesanato
tende a incorporar e se tornar um recurso que a moda brasileira das passarelas usa para
demonstrar um diferencial, frente aos estilistas estrangeiros. Ao se colocar algo tão regional às
produções, coloca-se também toda a tradicionalidade e criatividade brasileira nas peças.

O Artesanato Mineiro como fonte de renda

O artesanato é uma fonte de renda para várias famílias que comercializam seus
produtos em feiras locais. Além de ser um produto, o objeto artesanal traz consigo uma
identidade popular, que faz parte do patrimônio cultural do nosso país. A confecção do
artesanato Mineiro é uma grande fonte de trabalho e geração de renda na maioria dos 853
municípios existentes do estado de Minas Gerais.
Em Cristina, uma cidade do interior de Minas Gerais, boa parte da população viveu
durante muitos anos da produção artesanal de produtos de couro, mas desde 1999, esse
trabalho se profissionalizou. Virou artigo de luxo vendido em várias lojas com valor das peças
que variavam de R$ 90,00 a R$ 400,00 reais. E foi usado como peças decorativas em cenário
de novelas do canal de televisão Rede Globo.
De norte a sul do país o uso de peças artesanais vem crescendo continuamente. O que
se observa nesse movimento de “expansão artesanal” é a participação de grandes e pequenas
entidades da manutenção. Foi criado um projeto pelo SEBRAE em parceria com
confeccionistas e estilistas no ramo da moda que objetiva consolidar o artesanato mineiro
como uma opção de fonte de renda. Para aqueles artesãos que desejam participar, o projeto
tem como foco a capacitação dos trabalhadores e o acesso ao setor de mercado.

A partir de 2006, o foco das capacitações oferecidas pelo SEBRAE MINAS passou
a ser o associativismo por meio do Programa de Redes Associativas, que trabalha
com a formação de grupos bem estruturados que possam estabelecer relações
duradouras de trabalho e renda, além de abordar aspectos comportamentais como
participação, cooperação e associativismo. Entre os anos de 2004 e 2005, o projeto
proporcionou aumento de cerca de 20% na renda obtida com a atividade 7.

7
SEBRAE - MG; fonte:< www.sebrae.com.br. >Acesso em 03/11/2011.
O Programa de Redes Associativas trata-se de um projeto de empreendimento
coletivo, no qual os artesãos se capacitam adquirindo conhecimento sobre cooperação,
associativismo e gestão, além de compreender como se realizam o planejamento e a
legalização de um negócio coletivo. Com isso, esses trabalhadores conseguem desenvolver
seu trabalho e ao mesmo tempo administrá-lo de maneira eficiente, gerando lucro e
minimizando as perdas, que muitas vezes surgiam devido a uma administração errada.
A quantidade de artesãos inseridos nas atividades de profissionalização dessa área
aumentou e superou todas as metas estabelecidas para o ano de 2004. Ano que foi iniciado o
projeto. “O resultado foi alcançado por meio da participação dos artesãos em feiras
nacionais e regionais e nas e nos grandes desfiles como São Paulo Fashion Week”8. Com
isso, desenvolve-se uma economia sustentável dentro das comunidades. Surge então a
Superintendência de Artesanato, que tem por finalidade implantar a política estadual do
artesanato mineiro.
A partir da percepção que se tem desse crescimento econômico artesanal foram criadas
parcerias com agências de apoio ao empreendedor ao pequeno empresário sendo elas: o
SEBRAE, IEL (Instituto Euvaldo Lodi) e Instituto de Centro Cape (Curso de capacitação da
Universidade FUMEC); Universidade FUMEC: que resultaram no desfile de moda “Cortejo
Da Paixão”; SEDVAN (Secretaria de Estado Extraordinária para o Desenvolvimento dos
Vales do Jequitinhonha e Mucuri e do Norte de Minas): Participação do grupo Gestor de
Artesanato Mineiro em movimento dos 188 municípios do Vale do Jequitinhonha, Mucuri,
São Mateus, e norte de Minas; Trilha dos Inconfidentes, UFSJ (Universidade Federal de São
João Del Rey) e EMATER (Empresa de Assistência Técnica e Extensão Rural) com o
Programa de Desenvolvimento Integrado do Turismo e artesanato das trilhas dos
Inconfidentes da Estrada Real e o SERVAS (Serviço Voluntário de Assistência Social) com
Projeto Natal na Praça, concurso de Presépios no ano de 2005.

8
SEBRAE - MG; fonte:< www.sebrae.com.br.>Acesso em 03/11/2011.
Imagem 03: Brincos confeccionados com Capim Dourado
Fonte: imagem gentilmente cedida por Heloísa Nazaré.

Para melhor organização burocrática foi criado o cadastro para artesãos, no qual o
governo do Estado procura saber e diagnosticar as atividades desses profissionais em cada
região mineira. O interessado em fazer parte desse levantamento deve entrar em contato com
a Superintendência de Artesanato da Secretaria de Estado de Desenvolvimento, Indústria e
Comercio Exterior (MDIC). O cadastro, com informações unificadas em âmbito nacional,
servirá com base para ações voltadas para artesanato nos próximos anos, por isso seu
preenchimento é importante.
Os artesãos cadastrados recebem apoio para expor seu trabalho em eventos realizados
em Minas Gerais, no país e no exterior. Se forem feitas tais parcerias para melhorar a entrada
do artesanato no mercado, os ganhos das famílias que o confeccionam irão aumentar
substancialmente. O trabalho de mão de obra desses artesãos requer muito tempo e dedicação
para confecção de tais peças, nesse sentido, deve-se valorizar esse trabalho que atualmente é
vendido por preços irrisórios se comparado ao lucro obtido na comercialização desses
produtos.

Expansão do artesanato Mineiro dentro da moda

Ligado à sustentabilidade e aos movimentos ecológicos, o trabalho artesanal voltou a


ser valorizado e começou a atingir um novo patamar, distante do entendimento inicial que
havia sobre ele, que o caracterizava como produto feito a partir da ausência de recursos. Hoje
o artesanato adquire status de luxo, delicadeza e abrange a moda internacional.
A moda produzida por familiares de artesãos de Minas Gerais do Grupo Linha do
Horizonte, integrantes do programa de Talentos do Brasil Moda, participou de 4 a 7 de
setembro em Paris, na França no salão “Prêt-a-Porter,” uma das mais importantes feiras de
acessórios da Europa. “O grupo mineiro trabalha com bordados de linha de pedras, crochê e
trançados e utiliza o bagaço da cana em bijuterias como colares e pulseiras” 9.
A utilização de material reciclado está ampliando a aceitação do artesanato mineiro no
exterior. Produtos estão abrindo o mercado e aumentando os ganhos dos artesãos radicados
em Minas. Segundo dados do Instituto Centro Capem Mãos de Minas, principal responsável
pela inclusão dos artesãos mineiros na rota da exportação, as vendas nacionais de produtos
artesanais passaram de US$10 mil em 2001 para US$650 mil em 2006, um salto de 550%. Se
o faturamento com vendas obtidas na feira nacional de artesanato realizada na Expo Minas, do
final de 2010 for incluso nessa conta, a receita dos artesãos com a exportação de 2006 salta
para US$1,2 milhão. Não de pode dizer ao certo qual é a participação do artesanato feito com
material reciclado. Mas o mercado externo privilegia trabalhos feitos com matérias primas
ambientalmente corretas. Do total de peças exportadas pela mão de Minas, mais de 50% são
feitas com material desse tipo.

Imagem 04: Casaqueto de renda todo feito à mão.


Fonte:< http://divinopolis.olx.com.br/pictures/roupas-artesanais-iid-51505433>. Acesso dia 13/11/2011.

9
MONTES; Fonte:
<http://www.biblioteca.sebrae.com.br/bds/nsf/subarea2?OpenForm&autoframed&jmm=ARTESANATO>.
Acesso em 02/06/2011.
Outro exemplo de grupos de artesãos mineiros que apostam em vendas externas é
Missão Roma Crisma, uma organização não governamental que reúne 34 artesãos da periferia
de Betim, região metropolitana de Belo Horizonte. No início de março de 2011, foram
embarcadas 320 bolsas feitas de jornal rumo ao Estados Unidos. Por enquanto a exportação
representa 20% da produção, até o fim do ano de 2011, essa participação devera chegar até
40%, explica a Superintendente da missão, Roma Crisma.
Bonecas artesanais que são feitas em Divinópolis tiveram sua primeira encomenda
internacional em 2007, num total de 600 bonecas. A encomenda foi realizada pela Itália. Em
2009, 100% da produção dessas bonecas foram destinadas ao mercado internacional. Como a
artesã Stela Mares que ano de 2008 fabricou 1,8 milhões de bonecas ao mês das quais 40%
foram destinadas a países, como França, Inglaterra, Portugal, Espanha e Estados Unidos.
O que anima o artesão mineiro a apostar no mercado internacional, são fatores como a
conquista de novas e maiores possibilidades de negociação, a valorização dos produtos dentro
do próprio mercado Interno, melhores ganhos com o aumento do volume de vendas e com a
produção em maior escala.
Considerações Finais

O artesanato mineiro buscou e conseguiu seu espaço como uma tendência no mundo
da moda e não perdeu sua identidade, que é a mensagem do regionalismo mineiro transmitido
através das peças e objetos confeccionados. A tradicionalidade das peças leva um pouco da
história do estado para o restante do mundo, mostrando que é possível unir o que produzido
por artesãos ao luxo dos desfiles de grifes. A moda é muito democrática e consegue que essa
mistura se torne ao mesmo tempo regional sem deixar de ser fashion.
A conexão que se dá entre o artesanato e a moda é uma troca em que ambos se
beneficiam. O artesanato busca conceitos existentes na moda e a moda usa artesanato como
fonte de inspiração. O encontro entre uma organização mercadológica e elementos culturais
valoriza o papel do artesão que, na condição de criador, cultiva suas raízes regionais. Os
conceitos culturais existentes no artesanato, sejam eles de origem mineira ou de qualquer
outra região do Brasil, são reconhecidos, valorizados e transmitidos pelos estilistas os
conceitos culturais existentes no artesanato. Seja ele de origem mineira ou de qualquer outra
região do Brasil.
Como fonte de renda para milhares de famílias esta atividade conseguiu nos últimos
anos, ganhar o seu espaço e proporcionar aos artesãos uma vida mais confortável. Nesse
sentido esses artistas se mostram cada vez mais inseridos no mundo do trabalho e conquistam
aos poucos o seu espaço como fornecedores para confecções e estilistas.
REFERÊNCIAS

BRAGA, João. História da moda. São Paulo: Editora Anhembi Morumbi, 2007.

DURANT, José Carlos. Moda, luxo e economia: São Paulo: Babel Cultural, 1988.

FIGUEIRDEDO, Luciano de Almeida. Barrocas famílias. São Paulo: Editora Hucitec, 1997.

JORNAL PASSO-A-PASSO SEBRAE – MG. Site:


<www.sebraemg.com.br/arquivos/.../passoapasso/PSP%20120.pdf>. Jornal Passo a Passo
Sebrae – MG. Acesso em 03/11/2011.

KOLHER, Carl. História do vestuário. São Paulo: Martins Fontes, 1996.

MONTES, Alan. Revista Talentos do Brasil: São Paulo, 2009. Negócios. Disponível
em:<http://www.biblioteca.sebrae.com.br/bds/nsf/subarea2?OpenForm&autoframed&jmm=A
RTESANATO. >Acesso em 02/06/2011.

<http://www.desenvolvimento.mg.gov.br/pt/subscretaria/subsecretarias-de-industria-
comercios.> Acesso em 07/06/2011.

<http://www.feirahippiebh.com/v2/index.php/pt-br/feira.> Acesso em 14/11/2011.

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