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A arbitragem ante o poder público:

desafios e potencialidades

Ramiro Ferreira de Freitas


Lucas Alencar Pinto

Resumo: Este artigo visa analisar como os conceitos e princípios de resolução arbitral dos
conflitos podem servir diante do crítico sistema jurisdicional, à prudente formação de uma
cultura menos beligerante. A Lei 13.129/15 reivindica prática eficaz e, num só liame, viabiliza
modalidades específicas segundo casos controversos envolvendo particulares e administração
pública. Mediante investigação bibliográfica, objetiva-se: (1) Tecer breves comentários sobre a
Arbitragem, o Árbitro e suas funções; (2) Entender se o Poder Público em juízo tem utilizado
corretamente o instituto, visceralmente ligado às técnicas alternativas de tutela decisória e (3)
Indicar horizontes, cujo escopo – estimular cooperação minimizando lesões – traga,
futuramente, redução na quantidade de procedimentos judicializados, mas, sobretudo,
resolução sensata, nos moldes justos, dos problemas avaliados. O tema não se esgota, pois a
prática “forense” (mormente segundo novas balizas implementadas no Novo Código de
Processo Civil) suprirá lacunas e regulará os casos concretos protegendo o melhor interesse.

Palavras-chave: arbitragem; poder público; conflito; solução.

Introdução
Os meios alternativos de resolução de litígios ganham força. Evidência dessa assertiva é a
proliferação, nos diferentes setores, de uma cultura diretamente ligada às posturas menos
“judiciosas” quanto aos tratos sociais. Embora o Brasil tenha nos fóruns sua (ainda) principal
fonte de escolhas legitimadas no controle do Poder Judiciário, outros agentes protagonizam,
aos poucos, novas trajetórias cujos resultados invocam valorização das escolhas menos
resguardadas na figura do juiz togado.
Trata-se de atribuir funções essencialmente maduras à parte, ao advogado, ao
mediador/conciliador/árbitro, sujeitos hoje responsabilizados enquanto reconhecidos na esfera
geral das relações instáveis e, sem embargo, qualificados no ofício meritório. Não que eles
substituam o magistrado, representante estatal tecnicamente habilitado, mas conduzem
problemáticas cuja resposta, por via “tradicional” talvez gerasse contratempos indesejáveis e,
numa cultura dialógica, pacificam as divergências pontuais.


Estudante de Direito pela URCA (Universidade Regional do Cariri). Integrante do Grupo de Estudo e Pesquisa Em
Direitos Humanos Da UFCG - GEPDIH, da Universidade Federal de Campina Grande. Bolsa de iniciação científica junto ao
NUARC - Núcleo de Acessibilidade, setor vinculado à Pró-Reitoria de Pós-Graduação e Pesquisa e ao Departamento de
Letras e Literatura da URCA. ramiroferreira91@gmail.com

Advogado. Pós-graduando em Educação, Pobreza e Desigualdade Social pela Universidade Federal do Ceará (UFC).
Graduado em Direito e Pós-graduado em Direito das Famílias pela Universidade Regional do Cariri (URCA). Pesquisador
vinculado ao GEDHUF - Grupo de Estudos e Pesquisas em Direitos Humanos Fundamentais, vinculado ao Departamento
de Direito da URCA. lucaspintoalencar@gmail.com
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Neste trabalho, tratar-se-á de perceber em que medida a Administração Pública tem sido coesa
na prática da arbitragem. Inicialmente, serão feitas breves digressões acerca dos conceitos de
Conciliação, Mediação e a Arbitragem propriamente referida (objetivando situá-la no conjunto
maior de técnicas intituladas “Justiça Privada”), logo após, os reflexos da Lei nº 9.307/1996 e
suas alterações tomarão forma contextualizada e, finalmente, haverá indicação dos eventuais
avanços ou retrocessos dos institutos descritos, sustentados nas recentíssimas fontes legislativas
(mormente o NCPC – Novo Código de Processo Civil).
Com a pesquisa são esperados os seguintes resultados: (1) estímulo a práticas arbitrais nas
diferentes áreas de atuação pública no que diz respeito a interesses indisponíveis; (2) mostrar
vantagens e desvantagens do sistema atualmente em vigor no país, fazendo críticas e
suscitando aprimoramentos e (3) mostrar limites e expandir zonas pouco trabalhadas pelo
contemporâneo modelo gestor, ainda pouco afeiçoado às novas diretrizes consensuais. Justifica
o labor ora empreendido concepção (doutrinária e jurisprudencial) mostrando positivas
repercussões das técnicas alternativas à “batalha” autor X réu, porquanto o Direito não é
elemento dissociado da vida e, sendo objeto próprio à manutenção das relações, pretende
tutelar bens relevantes sem prévias convicções ou aferimento de culpa unidimensional.

Situando a arbitragem
Hoje, é realidade patente que a arbitragem ganha prestígio. Se antes havia resistência na sua
utilização, tal dificuldade passou a não mais prejudicar procedimentos arbitrais. Porém, antes de
minudenciar quaisquer formas jurídicas, estas devem estar corretamente delimitadas e gozar de
cientificidade.
Durante muito tempo, a ideia de arbitramento esteve inerte. O ordenamento pátrio rechaçava-a
e não aceitava facilmente técnicas novas. Somente em 1996, no advento da lei nº 9.307,
mudança substancial emerge. Notou o legislador que um modelo privado (particularizado
segundo opções sugeridas pelos interessados) de solução de conflitos relativos a direitos
patrimoniais disponíveis, mediante o qual as partes escolhem um ou mais especialistas na
matéria-objeto de beligerância, para decidir questões complexas era tanto melhor para os
próprios sujeitos de direito – que têm opinião cogente e convicta do árbitro, pessoa hábil e
idônea – quanto menos gravosa para Tribunais e juízes togados – pois reduz, significativamente,
a “exaustão processual”. Na arbitragem, a lide é sanada sem interferência direta do Poder
Judiciário, salvo casos excepcionais (urgência de medidas cautelares ou incidentes). A sentença
arbitral, ademais, constitui título executivo judicial (art. 515, VII do NCPC/15), tal qual a sentença
proferida pelo juízo estatal, podendo ser executada judicialmente, em havendo resistência do
postulante vencido. Então, os dois sistemas – “oficial” e “alternativo” não se excluem,
complementam-se (SODRÉ, 2008, p. 17). Princípios inerentes à justiça são respeitados nos dois
ambientes (arbitral e jurisdicional), exibindo suaves diferenças:

No processo judicial comum, como no processo de arbitragem, preza-se pelo


direito das partes ao contraditório. Ocorre que, no processo judicial, o juiz é
obrigado a ouvir a outra parte toda vez que a contraparte fizer uma nova
alegação ou juntar um novo documento. [...] Há cartórios no fórum central de
São Paulo em que a simples juntada de uma petição ao processo leva mais de
60 dias. [...] No processo arbitral, as partes indicam obrigatoriamente os
endereços, físico e eletrônico, onde podem ser cientificados sobre as ordens
processuais do Tribunal Arbitral. Essa intimação ocorre, em regra, por e-mail,
seguida pelo envio do documento via SEDEX, tudo em pouquíssimos dias.
(SODRÉ, 2008, pp. 24, 25)

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Sem embargo, as realidades são bastante segregadas! E nem se diga que a Constituição,
prevenindo ameaças a direito (art. 5, XXXV), negligenciou a liberdade individual. A garantia de
ação, consumada no valor útil da tutela jurisdicional deve, sempre, receber temperamentos e
permanece adstrita à razoabilidade. Orientações consensuais, quase certamente, produzem
menores riscos do que uma sentença imediata e previnem futuras retaliações. A ultima ratio
decidendi evidencia promissora geração das opções singulares, construídas sob medidas
necessárias. Ficando as partes à vontade para expressarem sentimentos, dividirem expectativas e
dialogarem, muito provavelmente achar-se-ão mais preparadas para enfrentamentos variados
que o dia a dia reserva.

Prática da arbitragem
É cediço que em decorrência de uma cultura beligerante, a população cada vez mais busca o
Poder Judiciário para a resolução de seus conflitos. É na ‘defesa’ eloquente e no ‘julgamento’
definitivo que encontram respaldo para condutas e, necessariamente, encontram suporte para
rejeições. Esta demanda exacerbada reverberou em um déficit na eficiência do mencionado
poder que passou a ser moroso na função da prestação jurisdicional, sua típica natureza. Muitos
litígios seriam resolvidos se, tão-somente, as partes deitassem fora rancores e cooperassem
(NCPC, art. 6), mas tal procedimento consensual é difícil num ambiente voltado à ‘luta’
aniquiladora do adversário. A combinação dos fatores alhures aludidos tem resultado
impactante no crescimento da procura dos métodos alternativos de resolução de lides, dentre
eles, a arbitragem, até mesmo nos casos em que a Administração Pública figura como polo do
conflito (Lei 13.128/2015, doravante LAAP – Lei de Arbitragem na Administração Pública):

o o o o o
Art. 1 Os arts. 1 , 2 , 4 , 13, 19, 23, 30, 32, 33, 35 e 39 da Lei n 9.307, de 23
o
de setembro de 1996, passam a vigorar com a seguinte redação: “Art. 1 [...] §
o
1 A administração pública direta e indireta poderá utilizar-se da arbitragem
o
para dirimir conflitos relativos a direitos patrimoniais disponíveis. § 2 A
autoridade ou o órgão competente da administração pública direta para a
celebração de convenção de arbitragem é a mesma para a realização de
o
acordos ou transações. § 3 A arbitragem que envolva a administração pública
será sempre de direito e respeitará o princípio da publicidade.”

Historicamente, a arbitragem surge como relação obrigatória entre comerciantes (século XIX).
Em outros setores privados, ela surge apenas em 1996. A grande novidade atualizando
perspectivas foi debatida exaustivamente no Congresso Nacional e recebeu amparo somente
em 2015. O principal argumento dos críticos dizia respeito à eventual contradição – pois o
interesse coletivo não seria digno, afirmavam, quando violasse o monopólio estatal. Superada
foi essa objeção, porquanto o duplo limite (não envolvimento de interesses dos incapazes e
matéria estritamente disponível) constitui segurança jurídica da escolha (livre) pela arbitragem.
Câmaras de Julgamento Arbitral especializam-se, como verdadeiros escritórios advocatícios e
compõem-se por juristas, médicos, economistas e estudiosos em ciências diversas. Também
sociedades empresárias e organizações de classe fundam seus próprios “tribunais” internos
extrajudiciais (a exemplo da FIESP).


A denominação é apenas para efeito de citação, porquanto o diploma novel faz muito mais. Para efeitos didáticos e
corroboração do foco neste ensaio exposto, reduziu-se o patamar de abrangência. Vale destacar que as mudanças
repercutem nas relações particulares também e, por evidente, são aplicáveis na esfera privada.
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Com precisão semântica, o legislador restringiu a condução arbitral à forma “de direito”. Sem
embargo, definir classificação na qual os árbitros se empenham (conforme diferenças
modulares das causas) é didaticamente útil.
Salutar promoção das vontades interpartes possui efeito positivo enquanto estímulo à
comunicação, ao jogo dialogal e, inclusive ao local (país) sede da arbitragem. Enquanto na
modalidade equitativa, o árbitro não se vincula à legislação no sentido literal, tomando sua
decisão com fundamento na própria convicção e experiências vividas anteriormente, na “de
direito”, o sistema (ordenamento) deve restar observado (princípio da legalidade – CRFB-88, art.
37, caput). Outro foco inovador da “condução pública arbitral” está no eventual tom flexível das
normas, elogiável superação do formalismo:

LAAP, modificando os arts. 13, 19, 23 e 30 da LGA – Lei Geral de


o
Arbitragem: “(...) § 4 As partes, de comum acordo, poderão afastar a
aplicação de dispositivo do regulamento do órgão arbitral institucional ou
entidade especializada que limite a escolha do árbitro único, coárbitro ou
presidente do tribunal à respectiva lista de árbitros, autorizado o controle da
escolha pelos órgãos competentes da instituição, sendo que, nos casos de
impasse e arbitragem multiparte, deverá ser observado o que dispuser o
o
regulamento aplicável. (...) Art. 19 [...] § 1 Instituída a arbitragem e
entendendo o árbitro ou o tribunal arbitral que há necessidade de explicitar
questão disposta na convenção de arbitragem, será elaborado, juntamente
com as partes, adendo firmado por todos, que passará a fazer parte integrante
o
da convenção de arbitragem. § 2 A instituição da arbitragem interrompe a
prescrição, retroagindo à data do requerimento de sua instauração, ainda que
o
extinta a arbitragem por ausência de jurisdição. (...) Art. 23 [...] § 1 Os árbitros
o
poderão proferir sentenças parciais. § 2 As partes e os árbitros, de comum
acordo, poderão prorrogar o prazo para proferir a sentença final. (...) Art. 30.
No prazo de 5 (cinco) dias, a contar do recebimento da notificação ou da
ciência pessoal da sentença arbitral, salvo se outro prazo for acordado entre
as partes, a parte interessada, mediante comunicação à outra parte, poderá
solicitar ao árbitro ou ao tribunal arbitral que: [...] Parágrafo único. O árbitro
ou o tribunal arbitral decidirá no prazo de 10 (dez) dias ou em prazo acordado
com as partes, aditará a sentença arbitral e notificará as partes na forma do
art. 29.”

Não isenta de falhas, a sentença arbitral pode ser nula desde significativos vícios. Contudo, o
Poder Judiciário aqui funciona como órgão supletivo. O artigo 33 da LGA reformulado deve ser
relido à vista das novas convicções numa querela apenas plasmada no dia 18 de março de 2016.
Sem embargo, os liames (e ajustes) ainda merecem acurada discussão e superam, na margem
temporal, paradigmas e (pre)conceitos reinantes no imaginário (senso comum teórico) dos
magistrados, advogados e demais colaboradores/operadores jurídicos. Por isso mesmo a


A doutrina menciona, existem: a) Arbitragem Obrigatória – NÃO aceita no Brasil porquanto viola a Constituição (livre
escolha das partes quanto às próprias decisões) e Voluntária – Modalidade aceita na maioria das nações; b) Informal –
decorrência da lógica e pautada no bom senso (infelizmente rejeitada pelo Judiciário quando da execução de sentença)
e Formal – segundo as regras jurídicas vigentes e adotando compromisso arbitral ou cláusula compromissória; c) de
Direito e de Equidade (acima vistas); d) “Ad hoc” – regras selecionadas pelas partes em obediência à regular
compreensão das mesmas, e Institucional – pela Corte (Tribunal) traçada no fundamental disciplinamento e e) Interna –
sentença proferida no território do país onde as partes residem e Internacional, com decisão final tomada noutro
território e a ser executada no Brasil.

O que dizemos está implicado no Novo CPC (art. 485, VII), sendo defeso ao juiz resolver o mérito quando acolhe
indicação de convenção arbitral existente ou quando o próprio juízo arbitral reconhece sua competência. No processo
civil, incumbe ao réu alegar convenção de arbitragem visando impedir lesões ao seu direito que um mérito mal
analisado promoveria (art. 337, X).
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justeza das fórmulas novas vem somada à natureza pós-romanista na seara do
antiautoritarismo. Os princípios e tutelas de direitos fundamentais são tributários desde que não
cindam valores alheios. O Estado de Direito é pautado no alvitre social no âmbito material do
bem comum:

“Art. 33. A parte interessada poderá pleitear ao órgão do Poder Judiciário


competente a declaração de nulidade da sentença arbitral, nos casos previstos
o
nesta Lei. § 1 A demanda para a declaração de nulidade da sentença arbitral,
parcial ou final, seguirá as regras do procedimento comum, previstas na Lei
o
n 5.869, de 11 de janeiro de 1973 (Código de Processo Civil), e deverá ser
proposta no prazo de até 90 (noventa) dias após o recebimento da notificação
da respectiva sentença, parcial ou final, ou da decisão do pedido de
o
esclarecimentos. § 2 A sentença que julgar procedente o pedido declarará a
nulidade da sentença arbitral, nos casos do art. 32, e determinará, se for o
o
caso, que o árbitro ou o tribunal profira nova sentença arbitral. § 3 A
declaração de nulidade da sentença arbitral também poderá ser arguida
o
mediante impugnação, conforme o art. 475-L e seguintes da Lei n 5.869, de
11 de janeiro de 1973 (Código de Processo Civil), se houver execução judicial.
o
§ 4 A parte interessada poderá ingressar em juízo para requerer a prolação
de sentença arbitral complementar, se o árbitro não decidir todos os pedidos
submetidos à arbitragem.”

Administração pública e seus parceiros na solução de conflitos: vantagens da arbitragem


O Estado, conforme dito alhures, possui o condão de delegar, por vezes, a realização da
prestação de alguns serviços, a chamada descentralização dos serviços. Tal subsídio abarca
tarefas essenciais e sempre deve atender os interesses sociais.
Em algumas situações o erário delega atividades à iniciativa privada, tal prática é conhecida
como delegação negocial. É nesta seara que temos os contratos de concessão e permissão, bem
como as parcerias público-privadas em que figuram a possibilidade da cláusula arbitral em
contratos típicos do fisco.
Há bastante tempo é possível vislumbrar a adoção da arbitragem como mecanismo de solução
dos conflitos em casos que envolvem a administração pública, como se percebe a partir do
Decreto 15.783/92, antigo Código de Contabilidade da União, que possibilitava a
disponibilidade dos bens públicos dominicais, visto que estes eram passíveis de valoração
econômica, igualmente poderiam ser alvos de contratos regidos pelo direito privado, sobretudo,
por não apresentarem afronta ao interesse público. (DI PIETRO, 2015)
Com os avanços legislativos, algumas normas traziam expressamente a possibilidade da
convenção de arbitragem em alguns casos como nos contratos que dispunham acerca de
concessões e permissões, conforme elencado pelas leis 8.987/95 (que dispões sobre concessões
e permissões para prestação de serviços públicos), 9.478/97 (dispões sobre a política energética
nacional), dentre outras legislações esparsas.
A arbitragem, embora regulada, inicialmente, pela Lei 9.307/96, não é adstrita num único texto
legal. Efeitos irradiam No bojo dos microssistemas (consumerista, mercantil, etc.), já que o texto
aprovado nas duas Casas legislativas era muito genérico e causava intensa celeuma sobre a
possibilidade ou não de adoção da arbitragem enquanto mecanismo de solução de impasses
envolvendo a administração pública. Em maio de 2015, a situação insustentável dos processos
inconclusos finalmente recebe atenção. Diante deste cenário, o ente público passa a gozar da
possibilidade de dispor da cláusula arbitral também nos contratos ditados pelo regime jurídico

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de direito público, responsabilizando-se pelo êxito da correta averiguação das pretensões e
priorizando resultados céleres e eficiência.
Os administrativistas mais conservadores, basilados pelos pressupostos que norteiam o erário,
principalmente, evocando o princípio da não-disponibilidade do interesse público, bem como o
da supremacia do interesse público sobre o privado, recalcitraram em reconhecer a
possibilidade da convenção de arbitragem nos moldes da lei 13.129/15, alegando que o Estado
ao desempenhar suas funções estaria representando o interesse público o que afastaria o
método alternativo de solução do conflito. (LOCKS, s-d)
Contudo, apesar dos encalces doutrinários, e para dar maior vazão aos processos em que
figurem como parte a fazenda pública, o legislador buscou minimizar o impacto das possíveis
controvérsias judiciais e autorizou a realização das convenções de arbitragem, desde que haja a
disponibilidade de um direito patrimonial, tão somente, mensurável, visto que este não
conflitará com o interesse público. (CARVALHO, 2016; TEDESCO, 2015)
Insta salientar que até mesmo os posicionamentos dos tribunais superiores do nosso país eram
divergentes no que tange à temática ora discutida, inclusive, estas já se manifestavam a respeito
da questão antes mesmo da edição da nova legislação. O Supremo Tribunal Federal (STF) aduz
há tempos que seria mitigar a soberania da administração pública para celebrar contratos, caso
fosse inadmissível a utilização da arbitragem em lides que envolvesse a Fazenda. No mesmo
entendimento segue o posicionamento do Superior Tribunal de Justiça (SJT). Em sentido
contrário, outrora, eram emanadas as decisões do Tribunal de Contas da União (TCU) face à
indisponibilidade do interesse público, contudo, o entendimento deste último foi flexibilizado
desde o advento da nova legislação. (TIBURCIO, 2008)
Embora sofra críticas doutrinárias, a novidade e, principalmente, o razoável curso das
necessidades públicas autorizam uma saída diferente – “terceira via” – que pertence aos modos
não judicializados de composição autônoma, nos quais sujeitos e entidades (sejam públicos ou
não) amadurecem, solucionam problemas ponderando, com equilíbrio, em prol dos melhores
interesses recíprocos. Longe de violar a potestade do melhor interesse social, a arbitragem
enriquece a cultura do direito, sedenta por ordem e prestígio, combalida ante a notória
insuficiência das vetustas práticas forenses.
O Estado não é tirano, é guardião dos valores insculpidos na pactuada soberania metaindividual
e, se encontra um meio pouco traumático e menos oneroso de pôr em xeque as desavenças,
pode e, mais ainda, é obrigado a fazê-lo.

Considerações finais
Os meios para solução extrajudicial de problemas (entre pessoas físicas e/ou jurídicas) não
devem ser subestimados. Conforme apresentado nos tópicos deste ensaio, resta configurada a
necessidade, embora legislativamente esteja o Brasil na vanguarda da tutela sobre Arbitragem


Sem esquecer que o uso dos meios alternativos arbitrais ante o Poder Público Administrativo, no que pertine aos
contratos de concessão, remonta dispositivos registrados na Lei nº 11.196/2005 que, por suas especificidades e escopo
quase impassível de ação, não constitui opinio júris estimuladora da arbitragem, antes, trata-a como mera tese de
sentido ambíguo.

Neste sentido, Matheus CARVALHO: “A matéria encontra acirradas críticas doutrinárias, pelo fato de que as
controvérsias envolvendo a Administração Pública devem ser analisadas por agentes licitamente investidos na qualidade
de julgadores, pelo próprio Estado. A previsão da arbitragem viola a indisponibilidade do interesse público uma vez que
admite que particulares resolvam contendas de relevância para toda a coletividade”. (2016, p. 424)

Embora seja, ainda, uma tímida iniciativa, já podemos constatar (em sede doutrinal) preocupações e ponderações
recentíssimas acerca dos mecanismos implicados na práxis arbitral. Citamos, como precursores duma mentalidade
reformada, os estudos de CARDOSO, 2015 e MELLO, 2015.
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(especificamente útil pelo efeito vinculante decisório que garante), de modificações e
uniformização prática dos instrumentos arbitrais.
O “julgamento provado”, quando orientado nas balizas lógicas do sistema regulamentar
vigente, é substancialmente viável. Sua produção satisfativa torna imperativo enfrentar os
problemas na raiz sistêmica e causal. Um país com, segundo dados do CNJ, com mais de 100
milhões de processos judicializados, como negligenciar opções? Ainda mais, tais opções fazem
dos sujeitos envolvidos protagonistas da própria escolha (“livre-arbítrio”). Inexiste, em regra, no
espírito ponderador à divergência nos interesses natural, obrigatória adesão de alguém aos
caprichos supostos por outrem. Bem diferente é o enfoque dialogal movido por imparcial
escrutínio rigoroso das demandas.
Enfim, o processo é mutável e nos tempos novos que brindam rapidez, segurança, cooperação e
liberdade, valores em conflitos merecem amparo moldado segundo circunstâncias, sejam eles,
ou não, levados ao juiz togado.

The arbitration to the public power: challenges and potentialities

Abstract: This article aims to analyze how the concepts and principles of arbitral resolution of
conflicts can serve before the critical judicial system, the prudent formation of a less belligerent
culture. Law 13,129/15 claims effective practice, a single bond, enables specific modalities
controversial cases involving private and public administration. Through bibliographical
research, the objective is to: (1) Weaving brief comments on the arbitration, the Arbitrator and
its functions; (2) Understand the Government in court has correctly used the institute, viscerally
attached to alternative operative protection and technical (3) Indicate horizons, whose purpose -
to stimulate cooperation minimizing injury - bring in the future reduction in the amount of
judicialized procedures, but, above all, sensible resolution in fair manner, the assessed problems.
The theme does not end because the "forensic" practice (especially according to new goals
implemented in the New Civil Procedure Code) will supply gaps and regulate specific cases
protecting the best interest.

Keywords: arbitration; public power; conflict; solution.

Referências
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2016.
CARDOSO, Maurício. Brasil atinge marca de 100 milhões de processos em tramitação na justiça.
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