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DOS CRIMES CONTRA A FAMÍLIA

Noções – O fundamento dos crimes contra a família encontra – se no art. 226


caput, da Constituição Federal, que assim dispõe: “A família, base da
sociedade, tem especial proteção do Estado”. Segundo Masson a razão dessa
preocupação é louvável, posto que a pessoa humana se forma na família,
sendo o sentimento familiar, força potente de moralidade, trabalho e sacrifício,
razão pela qual deve ser protegida e respeitada, e energicamente protegida,
inclusive pelo Direito Penal. Nesse sentido, a instituição da família desponta
como bem jurídico nitidamente comunitário e imprescindível ao
desenvolvimento humano.
Os crimes contra a família estão disciplinados no título VII da parte
especial do Código Penal – Dividido em quatro capítulos a saber: I - dos crimes
contra o casamento 9arts 235 a 239); II – dos crimes contra o estado de filiação
(arts. 241 a 243); III – dos crimes contra a assistência familiar (arts. 244 a 247)
e, IV – dos crimes contra o pátrio poder, tutela e curatela (arts. 248 a 247).
Passemos a analise de cada um deles:

I - DOS CRIMES CONTRA O CASAMENTO

DO CRIME DE BIGAMIA

Art. 235 – Contrair alguém, sendo casado, novo casamento:


Pena – reclusão, de dois a seis anos.
§ 1º – Aquele que, não sendo casado, contrai casamento com
pessoa casada, conhecendo essa circunstância, é punido com reclusão
ou detenção, de um a três anos.
§ 2º – Anulado por qualquer motivo o primeiro casamento, ou o
outro por motivo que não a bigamia, considera-se inexistente o crime.

ANALISE JURÍDICA

Considerações - o crime consiste em contrair, ou seja, formalizar novas


núpcias quando já se está casado. Segundo o Código Civil, não podem casar
(art. 1.521): I – os ascendentes com os descendentes, ou seja, o parentesco
natural ou civil; II – os afins em linha reta; III – o adotante com quem foi cônjuge
do adotado e o adotado com quem o foi do adotante; IV – os irmãos, unilaterais

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ou bilaterais, e demais colaterais, até o terceiro grau inclusive; V – o adotado
com o filho do adotante; VI – as pessoas casadas; VII – o cônjuge sobrevivente
com o condenado por homicídio ou tentativa de homicídio contra o seu
consorte. Caso, em qualquer das hipóteses, ciente do impedimento que gere a
nulidade, a pessoa vier a se casar, o crime será o do art. 237 do CP
(conhecimento prévio de impedimento), exceto na hipótese do inciso VI (as
pessoas casadas), quando o crime será o do art. 235 (bigamia), por força do
princípio da especialidade.

Obs.: Evidentemente, a poligamia também configura o delito, ou seja, a


contração de três ou mais casamentos pela mesma pessoa. Nesta hipótese, no
entanto, não haverá um único crime de bigamia, mas vários, em concurso (em
continuidade delitiva, se atendidos os requisitos do art. 71 do CP, ou em
concurso material, residualmente).

Poligamia e interpretação extensiva: Interpretação extensiva é a que amplia o


texto da lei, adaptando-o à sua real vontade. Ocorre quando a lei disse menos
do que quis (minus dixit quam voluit). De acordo com a interpretação extensiva,
o fato está implicitamente previsto no texto da lei. É admissível o seu emprego
até mesmo nas normas penais incriminadoras. Aplicam-se, para justificar a
interpretação extensiva, os argumentos da lógica dedutiva: a) argumento a
fortiori se a lei prevê um caso deve estendê-la a outro caso em que a razão da
lei se manifeste com maior vigor; b) argumento a maiori ad minus o que é
válido para o mais deve também ser válido para o menos; c) argumento a
minori ad maius o que é proibido para o menos é proibido para o mais (ex.: se
é crime a bigamia, com maior razão há de incriminar-se a poligamia). (TJSP,
Ap. Crim. N. 0003865-11.2003.8.26.0569, Rel. Des. Amable Lopes Soto. J.
30.9.2013).

A União estável - não configurará o crime em hipótese alguma. Duas uniões


estáveis, um casamento prévio e uma união estável posterior ou vice-versa.
Não importa! A união estável jamais será relevante para o crime de bigamia.
Somente ocorrerá o delito quando houver um casamento válido prévio. Por
isso, trata-se de crime de forma vinculada, pois só pode ser praticado mediante
a contração de segundo casamento, o qual depende do cumprimento de

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diversas formalidades legais. Da mesma forma, se o casamento religioso não
observar o que dispõe os arts. 1.515 e 1.516 do CC, não haverá o que se falar
em bigamia.

Falsidade ideológica - para a configuração do crime em analise, o agente


deve, necessariamente, praticar o crime de falsidade ideológica (CP, art. 299),
pois, ao prestar declaração sobre a existência de impedimentos, terá de mentir
para conseguir contrair novo casamento. Entretanto, por força do princípio da
consunção, deve ocorrer a sua absorção pelo delito de bigamia. Nesse sentido,
STJ: O delito de bigamia exige para se consumar a precedente falsidade, isto
é: a declaração falsa, no processo preliminar de habilitação do segundo
casamento, de que inexiste impedimento legal. 2. Constituindo-se a falsidade
ideológica (crime-meio) etapa da realização da prática do crime de bigamia
(crime-fim), não há concurso do crime entre estes delitos. 3. Assim, declarada
anteriormente a atipicidade da conduta do crime de bigamia pela Corte de
origem, não há como, na espécie, subsistir a figura delitiva da falsidade
ideológica, em razão do princípio da consunção. 4. Ordem concedida para
determinar a extensão dos efeitos quanto ao trancamento da ação penal do
crime de bigamia, anteriormente deferido pelo Tribunal a quo, à figura delitiva
precedente da falsidade ideológica. (HC 39583/MS, Relatora Ministra Laurita
Vaz. J. 8.3.2005).

Classificação doutrinária - crime simples (ofensa somente a um bem


jurídico), próprio (só pode ser praticado por pessoas casadas), material (exige
resultado naturalístico para a sua consumação), de dano (causa lesão ao
casamento), de forma vinculada (o meio de execução está agregado ao que
determina a lei civil), comissivo (exige uma ação), instantâneo de efeitos
permanentes (consuma-se no momento em que homologado o casamento,
mas seus efeitos se arrastam no tempo), plurissubjetivo (exige a presença de
duas pessoas) e plurissubsistente (a execução pode ser fracionada).

Objetividade jurídica - protege-se a instituição do casamento,


constitucionalmente prevista e tutelada, e a organização familiar que dele
decorre, estrutura fundamental do Estado, que são colocados em risco com o
novo casamento.

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Sujeito do crime - ativo: trata-se de crime próprio. Tanto o homem quanto a
mulher podem praticá-lo, mas é essencial que já sejam casados. Ademais,
trata-se de crime plurissubjetivo, plurilateral ou de concurso necessário, pois o
tipo penal exige a presença de duas pessoas. Passivo: imediatamente, o
Estado. O cônjuge enganado é sujeito passivo mediato do delito.

Tipo objetivo ou conduta – o tipo consiste em contrair, no sentido de ajustar,


convolar, formalizar novas núpcias. Trata-se de crime de forma vinculada, vez
que somente pode ser praticado mediante contração de um segundo
casamento, o qual depende do cumprimento de diversas formalidades
estabelecidas na lei civil.

Elemento subjetivo: é o dolo. O crime não é punido se praticado a título de


culpa.

Erro de tipo - Como o dolo, no âmbito do crime de bigamia, deve


necessariamente abranger a ciência da existência de impedimento para o
matrimônio, o desconhecimento do agente acerca de tal circunstância
caracteriza erro de tipo (CP, art. 20), acarretando a atipicidade do fato.
Exemplo: Uma pessoa vem a se casar após ser enganada pelo seu advogado,
que lhe cobra honorários sob o argumento de que prestou serviços
correspondentes à decretação judicial do seu divórcio. Nesse exemplo, o
agente incidiu em falsa percepção acerca de uma situação fática, nota
marcante do erro de tipo, excludente do dolo. Vale destacar, porém, que a
dúvida do agente no tocante ao seu estado civil configura o delito, a título de
dolo eventual. (MASSON, Cleber. Direito Penal Esquematizado, vol. 3).

Consumação e tentativa - por ser crime material, é essencial, para a sua


consumação, que o segundo casamento venha a, de fato, ocorrer. Trata-se de
crime instantâneo, que se consuma no momento do casamento, mas com
efeitos permanentes, que se arrastam no tempo.

Tentativa - é possível. No entanto, há discussão sobre o momento em que é


iniciada a execução do delito. Para uma primeira corrente, a execução do crime
inicia com o consentimento do agente (ou seja, logo após o “sim”). Portanto, a

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tentativa só seria possível entre o “sim” e a homologação do casamento. Para
uma segunda corrente, todavia, a execução é iniciada junto à celebração.

Do crime privilegiado e exclusão da tipicidade.

§ 1º Bigamia privilegiada - nos termos do, aquele que, não sendo casado,
contrai casamento com pessoa casada, conhecendo essa circunstância, é
punido com reclusão ou detenção, de um a três anos. Trata-se de exceção à
teoria monista, regra do art. 29 do CP, pois a pessoa casada responderá pelo
crime do caput, embora ambos tenham buscado o mesmo resultado, em
concurso de pessoas. Ademais, como o § 1º fala em conhecendo essa
circunstância, exige-se o dolo direto, não sendo possível a prática do delito
quando a pessoa age com dolo eventual.

§ 2º exclusão da tipicidade - temos duas situações diversas de exclusão da


tipicidade: a) se o primeiro casamento for anulado, por qualquer motivo; b) se o
segundo casamento for anulado, desde que a anulação não se dê em virtude
da própria bigamia. O dispositivo é aplicável tanto às causas de anulação
quanto às de nulidade (arts. 1.521, 1.548 e 1.550 do CC). Entretanto, atenção:
enquanto não ocorrer a anulação ou a declaração de nulidade, o agente poderá
ser processado pela prática do delito.

Ação penal - a bigamia é crime de ação penal pública incondicionada.

Observações importantes:

Da prescrição - A contagem do lapso prescricional da pretensão punitiva


estatal nos delitos de bigamia e falsificação ou alteração de assentamento do
registro civil, enquanto não transitada em julgado o decisum condenatório,
inicia-se na data em que o fato se tornou conhecido, ex vi do artigo 111, inciso
IV, do Código Penal. (TJSP, Ap. Crim. N. 0001177-98.2007.8.26.0116, Rel.
Des. Silmar Fernandes. J. 8.9.2013).

Casamento realizado no exterior - O fato de não ter a apelante homologado o


seu casamento firmado em solo americano no Brasil não retirou a sua condição
de pessoa casada, levando-a a cometer o crime de bigamia quando contraiu as
novas núpcias. A própria omissão da recorrente em relação ao primeiro
casamento, quando efetuou os trâmites do segundo matrimônio, demonstra a

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sua condição dolosa, situação que afasta a hipótese de erro de tipo. Não
tivesse o intuito doloso a acusada poderia ter se certificado junto ao Cartório de
Ipatinga acerca da validade de seu primeiro casamento, evitando-se, assim, a
ocorrência do crime. (TJMG, Ap. Crim. 2167812-11.2007.8.13.0313, Rel. Des.
Doorgal Andrada. J. 31.8.2011).

DO INDUZIMENTO A ERRO ESSENCIAL E OCULTAÇÃO DE IMPEDIMENTO

Art. 236 – Contrair casamento, induzindo em erro essencial o outro


contraente, ou ocultando-lhe impedimento que não seja casamento
anterior:
Pena – detenção, de seis meses a dois anos.
Parágrafo único – A ação penal depende de queixa do contraente
enganado e não pode ser intentada senão depois de transitar em julgado
a sentença que, por motivo de erro ou impedimento, anule o casamento.

Considerações - o crime consiste em contrair novo casamento, induzindo em


erro essencial o outro contraente, ou lhe ocultando impedimento que não seja
casamento anterior (se o impedimento for casamento anterior, o crime será o
de bigamia, do art. 235). Como o CP não conceitua erro essencial, tampouco
elenca as causas de impedimento, deve o intérprete da lei buscar a
complementação no Código Civil (portanto, norma penal em branco
homogênea). Maiores explicações na explicação da conduta.

Classificação doutrinária - crime simples (ofensa somente a um bem


jurídico), comum (pode ser praticado por qualquer pessoa), material (exige
resultado naturalístico para a sua consumação), de dano (causa lesão à
instituição familiar), de forma vinculada (o meio de execução está agregado ao
que determina a lei civil), comissivo (exige uma ação), instantâneo de efeitos
permanentes (consuma-se no momento em que homologado o casamento,
mas seus efeitos se arrastam no tempo), unissubjetivo (pode ser praticado por
uma única pessoa) e plurissubsistente (a execução pode ser fracionada).

Objetividade jurídica – protege a instituição do casamento e a organização da


família.

Sujeitos do delito - ativo: qualquer pessoa, homem ou mulher. O delito pode


ser praticado por ambos os cônjuges, ao mesmo tempo, desde que,

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dolosamente, ocultem causa de impedimento ou erro essencial um do outro –
se estiverem, no entanto, em unidade de desígnios, sendo hipótese de
nulidade absoluta, ambos praticarão o crime do art. 237 do CP.
Passivo: é o Estado. Mediatamente, o contraente de boa-fé, enganado pelo
agente. Caso o contraente passivo conheça a causa de impedimento capaz de
gerar a nulidade absoluta do casamento, responderá pelo crime do art. 237.

Tipo objetivo ou conduta – pune-se aquele que contrair casamento,


induzindo em erro essencial o outro contraente, ou ocultando-lhe impedimento
que não seja casamento anterior, sendo que no tipo penal verifica-se duas
condutas:
A primeira - é a de induzir outrem a erro essencial, contraindo com ele
casamento de acordo com o art. 1.557 do CC. Considera-se erro essencial
sobre a pessoa do cônjuge: I - o que diz respeito à sua identidade, sua honra e
boa fama, sendo esse erro tal que o seu conhecimento ulterior torne
insuportável a vida em comum ao cônjuge enganado; II - a ignorância de crime,
anterior ao casamento, que, por sua natureza, torne insuportável a vida
conjugal; III - a ignorância, anterior ao casamento, de defeito físico
irremediável, ou de moléstia grave e transmissível, pelo contágio ou herança,
capaz de pôr em risco a saúde do outro cônjuge ou de sua descendência; (Vide
Lei nº 13.146, de 2015) (Vigência) IV - a ignorância, anterior ao casamento, de
doença mental grave que, por sua natureza, torne insuportável a vida em
comum ao cônjuge enganado. (Vide Lei nº 13.146, de 2015) (Vigência)
A segunda é ocultar - desde que não seja anteriormente casado, pois se
tratar de casamento anterior o crime será o de bigamia ( art. 235 CP). O
impedimento torna o casamento nulo, e as hipóteses estão elencadas no Art.
1.521. Não podem casar: I – os ascendentes com os descendentes, seja o
parentesco natural ou civil; II – os afins em linha reta; III – o adotante com
quem foi cônjuge do adotado e o adotado com quem o foi do adotante; IV – os
irmãos, unilaterais ou bilaterais, e demais colaterais, até o terceiro grau
inclusive; V – o adotado com o filho do adotante; VI – as pessoas casadas; VII
– o cônjuge sobrevivente com o condenado por homicídio ou tentativa de
homicídio contra o seu consorte.

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Elemento subjetivo e voluntariedade - é o dolo, não é punido quando
praticado culposamente.

Consumação e tentativa - O crime é material ou causal: consuma-se com o


casamento, que se aperfeiçoa no momento em que o homem e a mulher
manifestam, perante o juiz, a sua vontade de estabelecer vínculo conjugal, e o
juiz os declara casados (CC, art. 1.514). Há, entretanto, entendimentos no
sentido de tratar-se de crime formal, pois não se exigiria a efetiva dissolução do
matrimônio por conta do erro ou do impedimento. Essa circunstância, em nossa
opinião, constitui mero exaurimento. (MASSON, Cleber. Direito Penal
Esquematizado, volume 3).

Tentativa – não é possível, por se tratar de crime condicionado à anulação ou


declaração de nulidade do casamento.

Ação penal - privada personalíssima, pois somente o ofendido pode ajuizar a


ação penal. Caso ocorra o seu falecimento, o direito de queixa não será
transmitido. Não é possível a nomeação de curador especial ao incapaz ou o
início da ação penal pelo seu representante legal. Em face da pena cominada
admite-se a transação penal e a suspensão condicional do processo (Lei
9.099/95).

Observações importantes - Condição de procedibilidade, prescrição e


decadência: a ação penal só poderá ser ajuizada depois de transitada em
julgado a sentença que anulou ou declarou nulo o casamento. Portanto, o
prazo decadencial só correrá a partir desse momento, e não do dia em que se
descobre a autoria do delito (regra para a contagem do prazo decadencial). Da
mesma forma, o prazo prescricional da pretensão punitiva também só passa a
correr da anulação do casamento. Ademais, como já comentado, somente o
contraente enganado poderá ajuizar a queixa-crime. Há, por fim, quem
sustente que a sentença civil não é somente condição de procedibilidade, mas,
sim, condição objetiva de punibilidade.

Desambiguação - os crimes do art. 236 e 237 do CP são bem próximos.


Vejamos: Art. 236 – Contrair casamento, induzindo em erro essencial o outro
contraente, ou ocultando-lhe impedimento que não seja casamento anterior.

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Art. 237 – Contrair casamento, conhecendo a existência de impedimento
que lhe cause a nulidade absoluta.

Exemplo, a hipótese do inciso VII do art. 1.521 do CC, causa de nulidade


do casamento: (não pode casar) o cônjuge sobrevivente com o condenado por
homicídio ou tentativa de homicídio contra o seu consorte. Caso o agente,
ciente dessa situação, vier a casar com a viúva da vítima de homicídio, sem
que ela saiba ser ele o autor do crime, em tese, dois delitos serão praticados:
tanto o do art. 236 quanto o do art. 237. Contudo, como houve a intenção de
enganar o contraente, prevalecerá o crime do art. 236, que tem penas mais
altas. Entretanto, caso a viúva e o homicida, ambos cientes da situação, vierem
a se casar, ambos praticarão o crime do art. 237. Portanto, a principal diferença
entre os dois delitos é o emprego de fraude, existente somente no primeiro (art.
236). Exige-se, dessa forma, uma conduta comissiva do agente. Ademais, o
art. 237 fala somente em causas de nulidade absoluta, redação não repetida no
art. 236. Nas palavras de Cleber Masson, se igual comportamento fosse
incriminado pelo art. 236 do Código Penal, não haveria razão legitimadora do
art. 237 do Código Penal. E o principal argumento repousa na sanção penal
cominada a cada um dos delitos. Com efeito, a pena mais grave do art. 236
somente se justifica em razão da fraude utilizada na execução do delito,
revelando o caráter subsidiário do art. 237, que será aplicado nas hipóteses de
silêncio do agente, ou seja, nas situações em que não houver fraude para a
contração do casamento (Direito Penal Esquematizado, volume 3).

DO CONHECIMENTO PRÉVIO DE IMPEDIMENTO

Art. 237. Contrair casamento, conhecendo a existência de impedimento


que lhe cause a nulidade absoluta:
Pena – detenção, de 3 (três) meses a 1 (um) ano.

Classificação doutrinária - crime simples (ofende um único bem jurídico),


comum (pode ser praticado por qualquer pessoa), material (para a
consumação, exige-se o resultado naturalístico: a celebração do casamento),
de dano (causa lesão à instituição familiar), de forma vinculada (o delito é
praticado pelo casamento, procedimento que deve atender aos ditames da lei
civil), comissivo, mas pode ser praticado por omissão, instantâneo com efeitos

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permanentes (consuma-se com a celebração do casamento, mas os seus
efeitos se arrastam no tempo), unissubjetivo (pode ser praticado por uma única
pessoa) e plurissubsistente (a conduta pode ser fracionada em diversos atos).

Objetividade jurídica – Tutela-se o casamento e a organização da família.

Sujeitos do delito - ativo: qualquer pessoa, que contraia casamento


conhecendo a existência de impedimento (absoluto) pratica o crime em estudo
9 podendo ser cometido por ambos os cônjuges, em coautoria).Passivo: é o
Estado. Também concorrendo com ele o cônjuge enganado.

Tipo objetivo ou conduta - a conduta consiste em contrair casamento ciente


de que está impedido por lei. Como o CP não elenca as hipóteses de nulidade
absoluta do casamento deve o intérprete da legislação buscar a
complementação no Código Civil (normal penal em branco homogênea):Art.
1.521. Não podem casar: I – os ascendentes com os descendentes, seja o
parentesco natural ou civil; II – os afins em linha reta; III – o adotante com
quem foi cônjuge do adotado e o adotado com quem o foi do adotante; IV – os
irmãos, unilaterais ou bilaterais, e demais colaterais, até o terceiro grau
inclusive; V – o adotado com o filho do adotante; VI – as pessoas casadas; VII
– o cônjuge sobrevivente com o condenado por homicídio ou tentativa de
homicídio contra o seu consorte.

Sujeitos do crime - ativo: qualquer pessoa, homem ou mulher. Se ambos os


contraentes conhecerem a causa de impedimento, responderão pelo delito do
art. 237 do CP, em coautoria. Sujeito passivo: imediatamente, o Estado;
mediatamente, o contraente de boa-fé, que desconhecia o impedimento.

Elemento subjetivo ou voluntariedade - é o dolo. Não se admite a


modalidade culposa.

Consumação e tentativa - por ser crime material, a sua consumação ocorre


no momento em que o casamento é realizado. Por ser crime plurissubsistente.
A tentativa é possível.

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Ação penal - a ação penal é pública incondicionada. Em face da pena
cominada admite-se a transação penal e a suspensão condicional do processo
(Lei 9.099/95).

DA SIMULAÇÃO DE AUTORIDADE PARA CELEBRAÇÃO DE CASAMENTO.

Art. 238. Atribuir-se falsamente autoridade para celebração de casamento:


Pena – detenção, de 1(um) a 3(três) anos, se o fato não constitui crime
mais grave.

Considerações - estudo é uma forma específica do delito de usurpação de


função pública (CP, art. 328). É de natureza subsidiária, somente incidindo se o
fato não constituir delito mais grave. Assim, se for praticado com vista à
obtenção de vantagem, a figura penal incidente será a do art. 328 do Código
Penal, cuja pena prevista é de reclusão de 2 a 5 anos, portanto mais grave.

Classificação doutrinária – crime simples; comum; formal de consumação


antecipada ou de resultado cortado, de dano; forma livre, comissivo;
instantâneo, unissubjetivo, unilateral ou de concurso eventual;
plurissubsistente.

Objetividade jurídica - Tutela-se além da instituição do casamento e a


organização da família, mas também a segurança jurídica na celebração da
união, que deve seguir todas as formalidades previstas em lei.

Sujeitos do delito - ativo: pode ser praticado por qualquer pessoa (inclusive o
funcionário público) que não tenha atribuição para celebrar casamento. É
possível a participação. Sujeito passivo: É o Estado, bem como os cônjuges
de boa-fé.

Tipo objetivo ou conduta – o núcleo do tipo é atribuir, imputar a si falsamente,


a qualidade de autoridade para celebração de casamentos. A palavra
falsamente indicativa de situação em descompasso com a realidade funciona
como elemento normativo do tipo. No tocante à autoridade para celebração de
casamentos, encontra-se descrito no art. 98, II da constituição Federal.

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Elemento subjetivo ou voluntariedade – é o dolo, consistente na vontade
livre e consciente de atribuir-se falsamente autoridade para a celebração de
casamento. Faz se necessário que o agente tenha efetivo conhecimento de
sua falta de atribuição para presidir esse ato. O erro quanto a tal circunstância
exclui o dolo e, configurando erro de tipo (CP, art. 20)

Consumação e tentativa - Por se tratar de crime formal, consuma-se com o


ato de o agente atribuir-se falsa autoridade, independentemente da efetiva
realização do casamento. A tentativa será possível nas hipóteses em que o
crime não se perfaz em um único ato.

Ação penal - a ação penal é pública incondicionada. Em face da pena


cominada não se admite a transação penal, mas permite a suspensão
condicional do processo (Lei 9.099/95).

DA SIMULAÇÃO DE CASAMENTO

Art. 239. Simular casamento mediante engano de outra pessoa:


Pena – detenção, de 1 (um) a 3 (três) anos, se o fato não constitui
elemento de crime mais grave.

Classificação doutrinária – crime simples; comum; formal de consumação


antecipada ou de resultado cortado, de forma livre, comissivo; instantâneo,
unissubjetivo, unilateral ou de concurso eventual; plurissubsistente.

Objetividade jurídica - Tutela-se além a instituição do casamento e a


organização da família, base da sociedade.

Sujeitos do delito - ativo: a despeito da divergência doutrinária, normalmente


é um dos contraentes ou ambos podem ser autores do delito em estudo. Para
Noronha, não só os nubentes podem ser sujeitos ativos do crime, por exemplo,
o magistrado e o oficial do Registro Civil. Sujeito passivo: É o Estado, bem
como o cônjuge ou os cônjuges enganados.

Tipo objetivo ou conduta – pune-se quem simula (fingir) casamento mediante


engano de outra pessoa, sendo essencial para a configuração do crime que a
ação enganosa ludibrie alguém diretamente interessado na celebração do

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matrimonio, como os nubentes ou seus responsáveis ( quando do seu
consentimento depende a união).

Elemento subjetivo ou voluntariedade - É o dolo, consistente na vontade


livre e consciente de praticar a conduta típica. Por se tratar de crime
subsidiário, se a finalidade do agente for a de obter fraudulentamente a posse
sexual da mulher, o crime poderá ser outro (CP, art. 215).

Consumação e tentativa: Consuma-se com a simulação da celebração do


casamento. A tentativa é admissível.

Ação penal - Trata-se de crime de ação penal pública incondicionada. Tendo


em vista a pena mínima prevista, detenção de um ano, é cabível a suspensão
condicional do processo (art. 89 da Lei n. 9.099/95).

DO CRIME DE ADULTÉRIO

Art. 240. (Revogado pela Lei n. 11.106/2005)

Previsão legal: Dispunha o art. 240 do Código Penal: Cometer adultério.

Revogação – A Lei n. 11.106, de 28-3-2005, cuidou de revogar o art. 240 do


Código Penal, retirando-o do ordenamento jurídico. Operou-se verdadeira
abolitio criminis, dado que o fato passou a ser considerado atípico. Como o
comportamento deixou de constituir infração penal, o Estado perde a pretensão
de impor ao agente qualquer pena, razão pela qual se opera a extinção da
punibilidade, nos termos do art. 107, III, do Código Penal. O adultério, dessa
forma, a partir do advento da Lei n. 11.106/2005, passou a gerar efeitos apenas
na esfera cível, sendo uma das causas que justifica a separação judicial, não
surtindo mais qualquer efeito na esfera penal. Sobre separação judicial, vide a
Emenda Constitucional n. 66/2010, que alterou a redação do art. 226, § 6º, e
passou a dispor que “O casamento civil pode ser dissolvido pelo divórcio”, não
fazendo, portanto, mais qualquer menção aos requisitos da prévia separação
judicial por mais de um ano ou a comprovada separação de fato por mais de
dois anos.

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II - DOS CRIMES CONTRA O ESTADO DE FIALIAÇÃO

DO REGISTRO DE NASCIMENTO INEXISTENTE

art. 241- Promover no registro civil a inscrição de nascimento inexistente:


Pena - reclusão, de dois a seis anos.

Considerações - O núcleo é promover, no sentido de postular, provocar,


requerer, deve ser entendido no sentido de levar a efeito a inscrição no
cartório do registro civil, de um nascimento inexistente.
Poderá o agente anteriormente ter cometido falsidade ideológica, a
exemplo, daqueles que forja os dados constantes de um documento utilizado
pela maternidade onde supostamente teria nascido a criança, onde são
consignados o nome do pai, mãe, avós, o sexo, horário de nascimento, etc..,
individualizando a criança, que em tese acabara de nascer.
O crime de falsidade ideológica (crime meio) é absolvido pelo delito fim
(registro de nascimento inexistente).

Classificação doutrinaria - Crime comum, doloso, comissivo (regra geral, mas


pode ser praticado por omissão imprópria a ex.: do agente que goza do status
de garantidor, mesmo conhecendo a falsidade das declarações produzidas por
aquele que pretende levar a efeito o registro de um nascimento inexistente,
dolosamente, nada faz para impedir a inscrição falsa); material, de forma livre,
instantâneo, monossubjetivo, plurissubsistente, não transeunte.

Objetividade jurídica - Bem jurídico protegido o estado de filiação e a regular


constituição familiar.

Sujeitos do crime – ativo: qualquer pessoa. Passivo: o Estado, bem como


aquele que eventualmente prejudicado pelo falso registro.

Tipo objetivo ou conduta – consiste em promover (gerar, provocar, requerer)


no registro a inscrição de nascimento inexistente, ou seja, assentamento de
pessoa que não foi concebida (abrangendo também, a inscrição de nascimento
de natimorto).

Elemento subjetivo ou voluntariedade – é o dolo, não havendo previsão de


modalidade culposa.

DIREITO PENAL IV
Profª: Ana Maria Duarte Página 15
Consumação e tentativa - Se consuma no exato momento em que é
procedida a inscrição do nascimento inexistente no cartório de registro civil. Por
se tratar de crime plurissubsistente admite-se a tentativa.

Ação Penal - iniciativa publica incondicionada.

DO CRIME DE SUPOSTO - SUPRESSÃO OU ALTERAÇÃO DE DIREITO


INERENTE AO ESTADO CIVIL DE RECÉM-NASCIDO .

Art. 242. Dar parto alheio como próprio; registrar como seu o filho de
outrem; ocultar recém-nascido ou substituí-lo, suprimindo ou alterando
direito inerente ao estado civil:
Pena: reclusão, de 2 (dois) a 6 (seis) anos.
Parágrafo único. Se o crime é praticado por motivo de reconhecida
nobreza:
Pena: detenção, de 1 (um) a 2 (dois) anos, podendo o juiz deixar de
aplicar a pena.”

Classificação doutrinária - trata de crime comum (não se exige qualquer


qualidade ou condição especial do sujeito ativo). Na primeira modalidade,
entretanto, (dar parto alheio como próprio) trata-se de crime próprio; crime
material; doloso (não há previsão de modalidade culposa), de forma livre, isto
é, pode ser praticado por qualquer forma ou meio eleito pelo sujeito ativo,
comissivo (verbos nucleares implicam prática de uma ação), instantâneo, ou
seja, a consumação não se alonga no tempo, unissubjetivo (pode ser cometido
por uma única pessoa) e plurissubsistente, isto é, a conduta pode ser
desdobrada em vários atos, de acordo com o caso.

Objetividade Jurídica - o bem jurídico tutelado é a segurança do estado de


filiação e a fé pública dos documentos oficiais. Desta forma, a substância do
crime reside na falsidade de documento público, o qual tem sua reprovação
agravada pelo fato de atingir o estado de filiação, alterando ou suprimindo
direito inerente ao estado civil.

Sujeitos do Crime – ativo: na primeira modalidade “dar parto alheio como


próprio” o crime só pode ser praticado por mulher. Nas demais modalidades, os
sujeitos ativos podem ser quaisquer pessoas, pois dispensa a qualidade

DIREITO PENAL IV
Profª: Ana Maria Duarte Página 16
especial do agente. Sujeito passivo: É o Estado, bem como os herdeiros
prejudicados, as pessoas lesadas com o registro e os recém-nascidos.

Tipo Objetivo ou conduta - no tipo penal apresenta quatro formas de conduta:

a) A primeira - consiste em dar parto alheio como próprio, parto suposto,


no qual a mulher atribui a si “a maternidade de filho alheio, em regra, simulando
prenhez e parto”. Somente a mulher pode praticar
b) A segunda - consiste registrar no registro civil, como sendo seu filho de
outra pessoa. trata-se de conduta semelhante à do dispositivo (art. 241),
distinguindo-se pelo fato de que aqui, o nascimento efetivamente ocorreu. Essa
prática segundo Sanches é conhecida como adoção brasileira, bastante
utilizada pelos agentes que burlam a lei.
c) A terceira - consiste em ocultar o neonato, com a supressão de direitos
inerentes a seu estado civil, ou seja, o recém-nascido não é apresentado para
assumir seus direitos.
d) A quarta modalidade é substituir os recém-nascidos, alterando,
consequentemente, direito inerente ao estado civil destes, de maneira que a
um se atribua o estado civil que a outro competia.

Obs.: para a prática do delito tem-se que dar parto próprio como alheio não
corresponde à conduta descrita no art. 242, ou seja, mulher que leva a registro
o próprio filho como sendo de outra não incorre nas sanções do tipo em exame,
podendo, desta forma, responder pelo crime de falsidade documental, previsto
no art. 299 do Código Penal. Tal alternativa justifica-se, pois no Código Penal
Brasileiro não criminaliza a ação de dar parto próprio como alheio.
Além disso, em virtude do princípio da especialidade da norma penal,
eventual falsidade que venha a servir de crime-meio para a prática do delito do
art. 242 fica absorvida por este. De acordo com a Lei n. 6.898, o presente
dispositivo passou a prevalecer sobre o crime de falsidade ideológica (artigo
299 do Código Penal).
Elemento subjetivo ou voluntariedade - é composto, em todas as condutas
descritas, pelo dolo, o qual é representado pela vontade consciente de praticar
ações incriminadas, ou seja, de dar parto alheio como próprio, registrar
falsamente filho alheio como próprio, ocular recém-nascido com a finalidade de

DIREITO PENAL IV
Profª: Ana Maria Duarte Página 17
alterar ou suprimir direitos inerentes a seu estado civil ou substituir recém-
nascido, com o objetivo de suprimir ou alterar direito inerentes a seu estado
civil.
Todavia, nas duas últimas modalidades supramencionadas (ocular
recém-nascido com a finalidade de alterar ou suprimir direitos inerentes a seu
estado civil ou substituir recém-nascido, com o objetivo de suprimir ou alterar
direito inerentes a seu estado civil), o elemento subjetivo especial do tipo
consiste no especial fim de suprimir direitos inerentes ao estado civil dos
neonatos.
Consumação e tentativa - consuma-se o crime pela realização efetiva de
qualquer uma das condutas descritas no tipo penal, seja dando parto alheio,
seja registrando filho alheio como próprio, seja ocultando ou substituindo
recém-nascido, de forma a suprimir ou alterar direito inerente ao estado civil.

Forma privilegiada do crime – perdão judicial e prescrição – o artigo 242,


parágrafo único, prevê minorante (privilégio) a pena poderá ser atenuada,
podendo, inclusive, ser concedido perdão judicial ao agente, desde que tenha
praticado o crime por motivo de reconhecida nobreza, tal como altruísmo,
solidariedade ou humanidade. Além disso, uma vez reconhecida a motivação
nobre da conduta tipificada, apresenta-se alternativamente a possibilidade de
substituir a pena por detenção, de maneira a reduzi-la entre 1 a 2 anos. De
acordo com as circunstâncias concretas, o julgador pode, até mesmo, deixar de
aplicar qualquer pena.
Assim, sempre que os fatos permitirem a conclusão da absoluta não
imposição de pena, seja pela nobreza da ação, seja pelas consequências que
produziram, é recomendável, segundo Cezar Roberto Bitencourt, a isenção de
pena, concedendo-se o que a doutrina denomina perdão judicial.

Ação Penal - pública incondicionada. Em face da pena cominada - reclusão,


de 2 a 6 anos, não se admite qualquer dos institutos despenalizadores da lei
9.099/95. Já a forma privilegiada que comina pena de detenção, de 1 a 2 anos,
de maneira que pode o juiz deixar de aplicar a pena.

DIREITO PENAL IV
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Prescrição da pretensão punitiva – a prescrição da pretensão punitiva do
crime definido no art. 242 é a data em que o fato se tornou conhecido (art. 111,
IV do CP).

III - DOS CRIMES CONTRA A ASSISTÊNCIA FAMILIAR

DO ABANDONO MATERIAL

Art. 244. Deixar, sem justa causa, de prover a subsistência do


cônjuge, ou de filho menor de 18 (dezoito) anos ou inapto para o trabalho,
ou de ascendente inválido ou maior de 60 (sessenta) anos, não lhes
proporcionando os recursos necessários ou faltando ao pagamento de
pensão alimentícia judicialmente acordada, fixada ou majorada; deixar,
sem justa causa, de socorrer descendente ou ascendente, gravemente
enfermo: (Redação dada pela Lei nº 10.741, de 2003).
Pena - detenção, de 1 (um) a 4 (quatro) anos e multa, de uma a dez
vezes omaior salário mínimo vigente no País. (Redação dada pela Lei nº
5.478, de 1968).
Parágrafo único - Nas mesmas penas incide quem, sendo solvente,
frustra ou ilide, de qualquer modo, inclusive por abandono injustificado
de emprego ou função, o pagamento de pensão alimentícia judicialmente
acordada, fixada ou majorada. (Incluído pela Lei nº 5.478, de 1968).

Considerações - Segundo o professor Rogério Greco “a solidariedade é um


dos valores fundamentais que devem existir na sociedade. Tanto isso é
verdade que o legislador constituinte teve a preocupação de inseri-la
expressamente no art. 3º d a Constituição Federal, como um dos objetivos do
Estado Brasileiro”: Art. 3º - Constituem objetivos fundamentais da República
Federativa do Brasil: I – construir uma sociedade livre, justa e solidária.
O crime poderá ser executado de duas maneiras:

a) - não proporcionando o agente os recursos necessários à


subsistência; ou,
b) - faltando ao pagamento da pensão alimentícia, judicialmente
acordada.

Obs.: A pena cominada ao crime é de um a quatro anos e multa de um a


dez vezes o maior salário mínimo vigente no país. Esta não se confunde com a
prisão civil, prevista no art. 733 do Código de Processo Civil, também voltada à
inadimplência de prestação alimentícia. Primeiramente, porque uma pode
ocorrer independente da outra, sendo a tutela civil direcionada a fazer com que

DIREITO PENAL IV
Profª: Ana Maria Duarte Página 19
o obrigado venha a cumprir com a obrigação alimentar, tendo como princípio o
curto período de aprisionamento (máximo, regulado pela Lei nº 5.478 /68, de
60 dias), para evitar que o inadimplente perca as condições de arcar com a
pensão. Decorrido o prazo previsto, ou adimplida a obrigação, o devedor é
solto, sem prejuízo da configuração do crime de abandono.
Já na tutela penal, a jurisprudência tem entendido que é necessária a
recusa reiterada para que se configure o crime de abandono material, bem
como o dolo na atitude, devendo o agente ter conhecimento do estado de
necessidade da vítima, e a ausência de justificativa. Também se diferenciam
porquanto a tutela criminal deve ser afastada se comprovado que o réu, apesar
de deixar de contribuir com o todo ou parte da pensão, arque diretamente com
as custas de subsistência ou parte da pensão alimentícia. Neste caso,
obedecida à súmula 309 do STJ, pode-se ter a execução fundada no art. 733
do Código de Processo Civil, mas a conduta permanece atípica.
Configura-se o abandono material na sua primeira figura quando há
permanência na omissão, não havendo o crime por ato transitório, em
que há ocasional omissão por parte do devedor (RESE nº 0012210-
16.2011.8.26.0223, TJSP, 16ª Câmara de Direito Criminal, 13/08/13).

Classificação doutrinária – trata-se de crime próprio, tanto com relação ao


sujeito ativo, quanto passivo; doloso; omissivo próprio; formal (na modalidade
de não cumprimento da obrigação alimentícia); de perigo concreto (quando
deixa de provar a subsistência de cônjuge, ou de filho menor de 18 anos ou
inapto para o trabalho, ou de ascendente inválido ou maior de 60 anos, ou de
socorrer descendente ou ascendente gravemente enfermo); de forma livre
(com exceção do não pagamento da pensão alimentícia, haja vista que esse é
o meio exigido pelo tipo penal, considerado de forma vinculada); permanente
(portanto, os efeitos se prolongam no tempo, podendo ser interrompidos pela
vontade do agente); monossubjetivo; unissubsistente; e, via de regra,
transeunte.

Objetividade jurídica – a lei tutela a regular manutenção da família, buscando-


se a garantia de subsistência de seus membros. Trata-se de crime cuja tutela
visa inibir o abandono familiar, preservando a entidade e buscando impedir que
aquele que é responsável deixe sem condições de subsistência a sua família,

DIREITO PENAL IV
Profª: Ana Maria Duarte Página 20
principalmente os entes mais vulneráveis (maiores de 60 anos, menores de 18
anos e incapazes).
Segundo os ensinamentos do estudioso Guilherme de Souza Nucci
“objeto material pode ser renda, pensão ou outro auxílio. O objeto jurídico é a
proteção dispensada pelo Estado à família”. Desse modo, por meio da
incriminação do abandono material, busca-se proteger a família, mais
especificamente o dever de assistência que uns dever ter com relação aos
outros no seio familiar.

Sujeitos do Crime - Ativo: só pode ser praticado por aquele que tem o dever
legal de garantir a subsistência da vítima (cônjuge, ascendentes e
descendentes), e a pessoa devedora de pensão alimentícia judicialmente
acordada, fixada ou majorada. Passivo: Será aquele que pode exigir o amparo
por parte do agente (cônjuges, o filho menor de 18 anos, ou inapto para o
trabalho, ou de ascendente inválido ou maior de 60 anos, bem como qualquer
descendente ou ascendente, não importando o grau de parentesco, que estiver
gravemente enfermo).

Tipo Objetivo ou conduta – há três modalidades típicas distintas:

1) - Deixar de prover sem justa causa - o necessário para a subsistência


da vítima – cônjuge, filho menor de 18 anos ou inapto para o trabalho, ou de
ascendente invalido ou maior de sessenta anos, não lhes proporcionando os
recursos necessários (abandono material em sentido estrito).
2) Frustrar ou ilidir o pagamento de pensão alimentícia fixada
judicialmente, o que consiste em não honrar uma obrigação, sendo nota
marcante dessa modalidade criminosa a existência de decisão judicial
homologando acordo, fixando ou majorando alimentos devidos, de qualquer
natureza (provisórios, definitivos ou gravídicos e etc.), e o agente sem justa
causa, falta o pagamento, sendo necessário que o agente deixe transcorrer in
albis o prazo estipulado em juízo para o pagamento. Antes do decurso desse
interim, somente é possível reconhecer o delito em sua primeira modalidade.

Obs.: A conduta também se estende ao convivente, que esta obrigada por


decisão judicial a pagar pesão alimentícia ao outro convivente.

DIREITO PENAL IV
Profª: Ana Maria Duarte Página 21
3) Deixar de socorrer, sem justa causa – ascendente ou desentende
gravemente enfermo, é negar proteção e assistência, enfermidade grave é a
seria alteração ou perturbação da saúde física ou mental. Sua comprovação
depende de análise médica da vítima no caso concreto. Nessa modalidade
criminosa, alei exclui o cônjuge da proteção penal, abarcando somente os
ascendentes e descendentes. Mas, se o agente deixar de socorrer o cônjuge, a
conduta se amoldará na primeira figura do delito.

Tipo ou elemento Subjetivo ou voluntariedade: é o dolo (sem finalidade


específica), consubstanciada na vontade consciente de praticar uma das
condutas típicas, não a previsão para a modalidade culposa. Desse modo,
aquele que, por exemplo, esquecer por descuido de depositar, na conta
corrente do alimentando, o valor da pensão alimentícia que lhe era devida, não
será responsabilizado pelo delito em questão. Não há a finalidade de deixar de
levar a efeito o pagamento de pensão judicialmente acordada, fixada ou
majorada. No entanto, cabe ressaltar que não há a impossibilidade de dolo
eventual. Em outras palavras, deve haver a vontade livre e consciente de
deixar de prócer a subsistência do cônjuge ou do filho menor de 18 anos ou
inapto para o trabalho; de não pagar a pensão alimentícia judicialmente
acordada, fixada ou majorada; ou de não socorrer ascendente ou descendente
gravemente enfermo.

Consumação e tentativa – segundo Nucci, nas três modalidades, o crime é


omissivo próprio, reputando-se consumado com a realização da conduta.
Independe de resultado material para a consumação do crime. Ainda que a
vítima não venha a perecer ou consiga sobreviver com outros recursos o crime
ocorre. Não se admite a tentativa.

OBS.: A princípio, não admite a forma tentada, no entanto, para o


professor Rogério Greco, a hipótese concreta é que será decisiva para se
concluir ou não pela possibilidade do conatus, razão pela qual, mesmo
reconhecendo a sua dificuldade, não a descarta, ficando o raciocínio
dependendo da hipótese a ser analisada.

DIREITO PENAL IV
Profª: Ana Maria Duarte Página 22
Pena e Ação Penal - pública incondicionada, para evitar que o preceito
resulte em letra morta, pelo pudor familial, que inibiria o membro de uma família
de processar o outro.

A pena cominada ao delito de abandono material é de detenção de 1 a 4


anos e multa. Importante ressaltar que, ainda que consignado em lei que a
multa será de uma a dez vezes o maior salário mínimo vigente no País, tal
dispositivo encontra-se revogado pelo art. 2oda Lei 7.209, de 11 de julho de
1984, que diz: Art. 2º - São canceladas, na Parte Especial do Código Penal e
nas leis especiais alcançadas pelo art. 12 do Código Penal, quaisquer
referencias a valores de multas, substituindo-se a expressão multa de por
multa. Diante do exposto, aplica-se normalmente o art. 244 do CP o critério de
dias-multa, nos termos do art. 49 do mesmo diploma.

ENTREGA DE FILHO MENOR A PESSOA INIDÔNEA

Art.245 – Entregar filho menor de dezoito anos a pessoa em cuja


companhia saiba ou deva saber que o menor fica moral ou materialmente
em perigo.
Pena – detenção, de um a dois anos.
§1º A pena é de um a quatro anos de reclusão, se o agente pratica
delito para obter lucro, ou se o menor é enviado para o exterior.
§2º Incorre, também, na pena do parágrafo anterior quem, embora
excluído o perigo moral ou material, auxilia a efetivação de ato destinado
ao envio de menor para o exterior, com o fito de obter lucro.

Classificação doutrinária - trata-se de crime simples, próprio de crime comum


(só pode ser praticado pelos pais do menor de 18 anos); crime material ou
causal; de perigo concreto (exige prova da situação de perigo material ou
moral `criança ou adolescente); de forma livre, isto é, pode ser praticado por
qualquer forma ou meio, em regra, comissivo unissubjetivo, unilateral ou de
concurso eventual (pode ser cometido por uma única pessoa ou concurso de
agentes) e plurissubsistente, isto é, a conduta pode ser fracionnada em
diversos atos).

Objetividade jurídica - Consoante o art. 229 da CF, Os pais têm o dever de


assistir, criar e educar os filhos menores... portanto, o bem tutelado é a devida

DIREITO PENAL IV
Profª: Ana Maria Duarte Página 23
assistência, criação e educação. Haverá infração e esses deveres se o genitor
entregar o filho menor, para criação e educação, a pessoas inidôneas.

Tipo objetivo ou conduta – é o verbo entregar, no sentido de deixar o filho


menor de 18 anos de idade aos cuidados de pessoa que o agente saiba ou
deva saber que ficará em perigo moral ou material.

Sujeitos do crime - ativo: Somente podem praticar esse crime os pais do


menor. Sujeito passivo: É o filho menor de 18 anos de idade.
Obs.: em face da vedação do emprego da analogia in malam parte, no
Direito Penal, os tutores ou guardiães não podem figurar como sujeito ativo de
delito.
Elemento subjetivo ou voluntariedade – É o dolo, direito (representado pela
palavra saiba) ou eventual (indicado na expressão deva saber) ,
independentemente de qualquer finalidade especifica. Não admite a
modalidade culposa. Porem há entendimentos diversos, no sentido de que a
expressão deva saber é indicativa anômala de previsão culposa.

Segundo entendimento de Capez trata-se de dolo eventual, mas de


anômala previsão de figura culposa. Com efeito, o Código Penal exige para o
dolo eventual que o agente não apenas preveja, mas também assuma o risco
de produzir o resultado. A expressão “deve saber” indica apenas que o agente
desconhecia o perigo a que estaria sujeito o menor, quando devia saber.
Infringiu, portanto, uma obrigação de cautela. Isso não é dolo: é culpa.

Obs.: discordamos, posto que a forma culposa de crime depende de


previsão legal expressa, nos termos do paragrafo único do art. 18, CP, o que a
doutrina convencionou chamar de princípio da excepcionalidade do crime
culposo.

Consumação e tentativa – cuida-se de crime material ou causal. Consuma-se


com a entrega do menor a pessoa inidônea. Não se exige que ele fique sob os
cuidados desta durante longo período de tempo. Em que pese tratar-se de
crime de perigo concreto, posto que é preciso demonstrar a efetiva
comprovação da situação de perigo material ou moral à vítima. Tentativa: é

DIREITO PENAL IV
Profª: Ana Maria Duarte Página 24
possível, em face do caráter plurissubsistente, em que permite o fracionamento
do inter criminis.

FORMAS:
Simples - prevista no caput do artigo.
Qualificada - Está prevista no §1º do artigo. A pena é de 1 a 4 anos de
reclusão, se o agente pratica o delito:
a) - Para obter lucro. Cuida-se aqui do chamado elemento subjetivo do tipo.
Cite-se o exemplo do genitor que entrega o filho aos cuidados de um
alcoólatra, para que o menor preste serviços remunerados, vindo ele a se
favorecer do ordenado recebido pelo seu filho.
b) - Ou se o menor é enviado para o exterior. Essa conduta é considerada
mais grave em razão do maior perigo a que o menor está exposto, pois, além
de estar sujeito aos cuidados de pessoa inidônea, ele é retirado de seu país de
origem.

Equiparada - Está prevista no § 2º. Incorre, também, na pena do parágrafo


anterior quem, embora excluído o perigo moral ou material, auxilia a efetivação
de ato destinado ao envio de menor para o exterior, com o fito de obter lucro.
Pune-se aquele que, com intuito de lucro, ajuda a enviar menor para o exterior.
Qualquer pessoa pode praticar o crime em tela, inclusive o tutor. Não se exige
o perigo moral ou material. Consuma-se o crime com a prestação de auxílio.

Ação Penal - pública incondicionada, portanto independe de representação


do ofendido ou de seu representante legal. Constitui infração menor potencial
ofensivo, procedimento sumaríssimo da Lei n. 9.099/95, em face da máxima
prevista (detenção, de 1 a 2 anos), sendo, também, cabível o instituto da
suspensão condicional do processo (art. 89 da Lei). O art. 89 da mesma lei,
também é aplicável ao §§ 1º e 2º do referente artigo.

DO ABANDONO INTELECTUAL

Art. 246 - Deixar, sem justa causa, de prover à instrução primária de filho
em idade escolar:
Pena - detenção, de quinze dias a um mês, ou multa.

DIREITO PENAL IV
Profª: Ana Maria Duarte Página 25
Considerações - O crime de abandono intelectual consiste no
descumprimento, por parte dos pais, do dever de prover à instrução intelectual
dos filhos menores em idade escolar. A instrução primária a que se refere o
texto penal é, atualmente, chamada de ensino fundamental (art. 210 da
Constituição Federal). A Lei n. 9.394/96 — Lei de Diretrizes e Bases da
Educação Nacional — complementa o tipo penal em estudo (norma penal em
branco), estabelecendo a obrigatoriedade dos pais em efetuar a matrícula dos
filhos menores, a partir dos seis anos de idade no ensino fundamental.
Assim, cometem o crime os pais que não efetuam a matrícula, sem justa
causa, quando a criança atinge a idade para cursar o ensino fundamental (seis
anos), bem como aqueles que permitem a evasão do ensino antes de
completado o ciclo de nove anos mencionado na Lei de Diretrizes.
A jurisprudência entende como justa causa, hábil a não configurar o
crime, a ausência de vagas em escolas públicas; penúria da família etc.
Para que exista crime, é necessário que haja dolo na conduta dos
genitores, no sentido de privar os filhos menores da educação do ensino
fundamental.
Na atualidade, o crime de abandono intelectual vem sendo relativizado
pela prática do homeschooling, que consiste na promoção do ensino em casa
pelos pais, e que ainda não possui regulamentação, mas já é pauta de
discussão nos tribunais.

Classificação doutrinária – crime simples; próprio, formal, de consumação


antecipada ou de resultado cortado, crime abstrato, de forma livre, omissivo
próprio ou puro, crime permanente, unissubjetivo, unilateral de concurso
eventual e unissubsistente, ou seja, a conduta se exterioriza em único ato,
necessário e suficiente para a consumação.

Objetividade jurídica – é a educação, prevista pela legislação civil (vide art.


1.634, I). O bem-interesse protegido, mais especificamente, é a alfabetização
das crianças, que deverão cursar ao menos o curso primário.
Como se pode observar no ar. 205 na própria Constituição Federal de
1988, a educação é um dos pilares fundamentais que dão sustento até mesmo
a noção de cidadania: Art. 205. A educação, direito de todos e dever do Estado

DIREITO PENAL IV
Profª: Ana Maria Duarte Página 26
de da família, será promovida e incentivada com a colaboração da sociedade,
visando ao pleno desenvolvimento da pessoa, seu preparo para o exercício da
cidadania e sua qualificação para o trabalho.

Sujeitos do crime – ativo: Só os pais podem ser sujeitos ativos e é irrelevante


se vivem ou não em companhia de seus filhos. Assim, ainda que não convivam
com seus filhos, são obrigados a lhes prover à instrução. Trata-se de crime
próprio, que, entretanto, não abrange os meros tutores ou curadores do menor.
Sujeitos passivos: Os filhos menores em idade escolar.

Consumação e Tentativa - O crime se consuma com a omissão, ou seja, no


momento em que o filho atinge a idade escolar e os genitores revelam
inequivocamente a vontade de não cumprir com o dever. Rogério Grego
entende diferente, que o delito se consuma quando esgotado o último prazo
para a realização da matrícula daquele que necessita do ensino fundamental,
desde que não haja justa causa para tanto.

Tipo Objetivo ou conduta – é deixar sem justa causa, de prover á instrução


de filho menor em idade escolar. Desse modo, o tipo penal tem por objetivo
assegurar os estudos às crianças menores de 18 anos.

Tipo Subjetivo ou voluntariedade - é o dolo, consistente na vontade livre e


consciente de não cumprir o dever de dar educação, não n havendo previsão
para a modalidade de natureza culposa.

Consumação e tentativa - O delito em questão consuma-se com a omissão


dos pais que deixam, dolosamente, de levar a efeito a matrícula, em
estabelecimento de ensino próprio, do seu filho que ainda se encontra em
idade escolar. Para o professor Rogério Greco, a consumação vai ocorrer
quando esgotado o último dia do prazo para a realização da matrícula daquele
que necessita do ensino fundamental. Indispensável ressaltar que, para
consumar o tipo penal, não pode ter justa causa para a ocorrência do fato.

Tentativa – como se trata de crime omissivo próprio, não é possível a tentativa.


Se o agente atua, realizando os atos necessários a admissão de seu filho em
estabelecimento de ensino fundamental, o fato será atípico.

DIREITO PENAL IV
Profª: Ana Maria Duarte Página 27
Ação penal – é publica incondicionada. Em face da pena cominada trata-se de
crime de menor potencial ofensivo, sujeitando-se à transação penal e proposta
de suspensão condicional do processo (art. 89 da citada lei adiante) - rito
sumaríssimo (Lei nº 9.099/95).

DO ABANDONO MORAL

Art. 247 - Permitir alguém que menor de dezoito anos, sujeito a seu poder
ou confiado à sua guarda ou vigilância:
I - frequente casa de jogo ou mal-afamada, ou conviva com pessoa
viciosa ou de má vida;
II - frequente espetáculo capaz de pervertê-lo ou de ofender- lhe o pudor,
ou participe de representação de igual natureza;
III - resida ou trabalhe em casa de prostituição;
IV - mendigue ou sirva a mendigo para excitar a comiseração pública:
Pena - detenção, de um a três meses, ou multa.

Classificação doutrinária – crime simples; próprio, formal, de consumação


antecipada ou de resultado cortado, crime de perigo concreto, de forma livre,
comissivo ou omissivo próprio ou puro, crime habitual (frequentar); permanente
(conviver e residir) ou instantâneo (participar ou mendigar); unissubjetivo,
unilateral de concurso eventual e unissubsistente (quando omissivo) ou
plurissubisitente (se comissivo).

Objetividade jurídica – embora o legislador não conferiu nomenclatura


específica ao crime do art. 247, mas a doutrina é unanime em atribuir a esse
crime a denominação “abandono moral”, pois todas as condutas descritas são
contrarias á formação moral do menor de 18 anos de idade.

Sujeitos do crime – ativo: trata-se de crime próprio e especial, pois somente


pode ser cometido pelo titular do poder familiar, ou pela pessoa que de
qualquer modo é responsável pela guarda ou vigilância da criança ou
adolescente. Ex. diretor da escola onde o menor estuda. Sujeito passivo: o
menor de 18 anos de idade submetido ao poder familiar ou confiado à guarda,
ou vigilância de alguém.

Tipo Objetivo ou conduta – é permitir, que pode ser concretizado tanto por
ação como omissão, equivale a propiciar, consentir, deixar que o menor de 18

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anos de idade realize qualquer dos comportamentos descritos nos incisos do
referido art. 247 CP, a saber:

Tipo Subjetivo ou voluntariedade - é o dolo, independentemente de qualquer


finalidade especifica, nas condutas dos incisos I a III, já no inciso IV, exige-se,
além do dolo um especial fim de agir (elemento subjetivo especifico),
representado pela expressão “para excitar a comiseração pública”, ou seja, a
compaixão ou piedade causada perante a coletividade. Tentativa – não se
admite a modalidade culposa, assim, se o responsável pelo menor de 18 anos
for negligente em sua proteção, não caracteriza crime, o fato será atípico.

Consumação e tentativa - o momento consumativo varia em cada uma das


modalidades criminosas:

 Na modalidade frequentar casa de jogo mal-afamada e frequentar


espetáculo capaz de pervertê-lo ou de ofender o pudor – o crime reclama
habitualidade, logo não se configura o crime em um único comparecimento da
criança ou adolescente a qualquer dos locais indicados;
 Na s espécies conviver com pessoa viciosa ou de má vida e residir ou
trabalhar em casa de prostituição – exige-se a permanência do menor de 18
anos de idade por tempo juridicamente relevante, capaz de colocar em risco
sua formação moral, no local ou junto à pessoa apontada no tipo penal
( nessas modalidades trata-se de crime permanente)
 Nas situações em que a criança ou adolescente participa de
representação capaz de pervertê-lo ou de ofender - lhe o pudor ou mendigar ou
que sirva de mendigo para excitar a comiseração pública - é suficiente a
permissão do sujeito ativo quanto a conduta do menor para a consumação do
delito (crime instantâneo) .
Obs.: Em todas as espécies o crime é formal, de consumação antecipada ou
de resultado cortado. Trata ainda de crime de perigo concreto.

Tentativa – é possível nas hipóteses de crime comissivo (praticado mediante


ação), mas tratando-se das modalidades omissivas do crime, afasta a figura
tentada como se trata de crime omissivo próprio, não é possível a tentativa. Ou
o agente se omite dolosamente, de forma a permitir que o menor sujeito a sua

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guarda ou vigilância incida em qualquer dos incisos do art. 247, e o crime
estará consumado, ou age de outro moldo a não permitir o comportamento
ilícito, o fato será penalmente irrelevante.

Ação penal – é publica incondicionada. Em face da pena cominada trata-se de


crime de menor potencial ofensivo, sujeitando-se à transação penal e proposta
de suspensão condicional do processo (art. 89 da citada lei adiante) - rito
sumaríssimo (Lei nº 9.099/95).

IV - DOS CRIMES CONTRA O PÁTRIO PODER, TUTELA CURATELA.

Considerações – Os artigos 248 e 249, ambos do Código Penal enuncia fatos


constitutivos de crimes contra o pátrio poder, a tutela e a curatela, protegendo
mais uma vez a organização da família, base da sociedade.
Atualmente o pátrio poder esta disciplinado como título de poder familiar
(arts. 1.630 e segts. do CC). Antes de elaborarmos analise dos crimes
descritos, verificaremos o significado das expressões tutela e curatela.
Tutela - é o poder conferido por lei a alguém para proteger, dar amparo, e
auxílio, a pessoa menor de 18 anos de idade, com finalidade de administrar
seus bens cujos pais faleceram ou foram judicialmente declarados ausentes,
ou decaíram do poder familiar.

Curatela – é o encargo público imposto por lei a alguém para proteger


determinada pessoa e administrar seus bens. Sujeitam-se á curatela, nos
termos do art. 1.767 do CC, quer po causa transitória ou permanente, bem
como os ébrios habituais e os viciados em drogas, assim como os pródigos.

INDUZIMENTO A FUGA, ENTREGA ARBITRÁRIA OU SONEGAÇÃO DE


INCAPAZES:

Art. 248 - Induzir menor de dezoito anos, ou interdito, a fugir do lugar em


que se acha por determinação de quem sobre ele exerce autoridade, em
virtude de lei ou de ordem judicial; confiar a outrem sem ordem do pai, do
tutor ou do curador algum menor de dezoito anos ou interdito, ou deixar,
sem justa causa, de entregá-lo a quem legitimamente o reclame:
Pena - detenção, de um mês a um ano, ou multa.

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Classificação doutrinaria - Crimes simples (ofende apenas um bem jurídico);
comuns (podem ser praticados por qualquer pessoa); formais (induzimento a
fugas, com divergência doutrinária, e sonegação de incapazes), material
(entrega arbitrária), de forma livre. Em regra comissivos (induzimento à fuga e
entrega arbitrária) ou omissivo próprio ou puro (sonegação de incapazes);
instantâneos, unissubjetivos, unilaterais ou de concurso eventual; e,
plurissubsistentes (induzimento à fuga e entrega arbitrária) ou unissubjsistente
(sonegação de incapazes).

Objetividade jurídica - poder familiar, sendo que o artigo 248 do Código Penal
prevê um tipo misto cumulativo com três figuras típicas:1) Induzimento a fuga
de incapazes; 2) Entrega Arbitrária de Incapazes; 3) Sonegação de Incapazes.

Tipo objetivo ou conduta – no delito de induzimento à fuga - o verbo do tipo


é induzir, criar a ideia, fazer nascer na mente do menor de 18 anos de idade ou
interdito a vontade de fugir do lugar em que se acha por determinação de quem
sobre ela exerce autoridade, em virtude ou decisão judicial.
Na Entrega arbitrária – é confiar, no sentido de entregar a outrem, sem ordem
dos pais, do tutor ou do curador, a pessoa menor de 18 anos de idade ou
interditada judicialmente.
Sonegação de incapazes – o núcleo do tipo penal deixar que equivale a
recusar-se a entregar o menor de 18 anos ou interdito a quem legitimamente o
reclame, comportando-se desta forma sem justa causa, cuida-se de crime
omissivo próprio ou puro., pois que o tipo penal descreve uma conduta
omissiva.
Sujeitos do delito - ativo: pode ser praticado por qualquer pessoa. Sujeito
passivo- aqueles que detêm a guarda do menor de 18 anos ou interdito em
virtude da lei, bem como os próprios menores de 18 anos ou interditos.

Elementos subjetivo ou voluntariedade - É o dolo, independentemente de


qualquer finalidade específica, não havendo previsão para a modalidade
culposa.

Consumação e tentativa - Consumação no momento em que o menor de 18


anos ou o interdito é retirado da esfera especial de quem sobre eles detinha a

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guarda. Tentativa: é admissível, salvo na sonegação de incapazes por se tratar
de crime omissivo próprio ou puro, em face do caráter unissubsistente do
delito, incompatível com o fracionamento do inter criminis.

Ação penal - publica incondicionada. Competência do JECrim, tratando-se de


infração penal de menor potencial ofensivo - art. 60 e 61 lei 9099/95.

DA SUBTRAÇÃO DE INCAPAZES:

Art. 249 - Subtrair menor de dezoito anos ou interdito ao poder de quem o


tem sob sua guarda em virtude de lei ou de ordem judicial:
Pena - detenção, de dois meses a dois anos, se o fato não constitui
elemento de outro crime.
§ 1º - O fato de ser o agente pai ou tutor do menor ou curador do
interdito não o exime de pena, se destituído ou temporariamente privado
do pátrio poder, tutela, curatela ou guarda.
§ 2º - No caso de restituição do menor ou do interdito, se este não
sofreu maus-tratos ou privações, o juiz pode deixar de aplicar pena.

Considerações - O crime previsto no artigo 249 do Código Penal fala sobre o


ato de subtrair menor de dezoito anos ou interdito de quem o tem por guarda
em virtude de lei ou ordem judicial. É uma norma subsidiária, pois há a ressalva
de o crime ser punido se não for elemento de outro crime, objetivando proteger
a guarda do menor e do interdito, visando proteger o poder familiar, a tutela e a
curatela.

Classificação doutrinária – Crime simples (ofende apenas um bem jurídico);


comum (podem ser praticados por qualquer pessoa); material ou causal
(consuma-se o resultado naturalístico, consistente na efetiva retirada do menor
de 18 anos ou interdito do poder de quem detém sua guarda); de forma livre
(admite qualquer meio de execução); em regra comissivo; instantâneo
(induzimento à fuga e entrega arbitrária); em regra comissivo; unissubjetivo ou
de concurso eventual, e normalmente, plurissubsistente (a conduta pode ser
fracionada).

Objetividade jurídica – é o poder familiar, a titela e a curatela, como medidas


inerentes instituição familiar.

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Tipo objetivo ou conduta – o verbo do tipo é o subtrair, no sentido de retirar o
menor de 18 anos de idade ou interdito de quem detém sua guarda. A guarda
pode emanar da lei – decorrente do poder familiar; ou de decisão judicial
nomeação de tutor ou curador.

Sujeitos do crime - ativo: pode ser qualquer pessoa. Sujeito passivo: são os
pais tutores ou curadores ou a pessoa sob quem estava à guarda do menor ou
interdito. A objetividade do crime se caracteriza pela necessidade de que o
agente retire o menor ou interdito do poder daquele que legalmente possui sua
guarda, tutela ou curatela, sem a autorização destes.

Elemento subjetivo ou voluntariedade – é o dolo, independentemente de


qualquer finalidade especifica. Não admite a modalidade culposa.

Consumação e tentativa – consuma-se com a efetiva subtração do menor ou


interdito.

Tentativa é possível, quando o agente, por motivos alheios a sua vontade, não
consegue finalizar o ato de subtração do menor ou interdito. Pode haver o
perdão judicial se o agente se o menor, após a subtração, for devolvido aos
seus responsáveis. A pena é de detenção de dois meses a dois anos se não
constituir crime mais grave, portanto crime subsidiário , evidenciando a
subsidiariedade do crime de sonegação de incapazes, se o fato não constituir
elemento de outro crime.

Ação penal – publica incondicionada. Cuida-se de crime de menor potencial


ofensivo, sujeitando-se a=à transação penal e a suspensão condicional do
processo, rito sumaríssimo, nos moldes da lei 9.099/95.

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