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SUMÁRIO

1 INTRODUÇÃO À ONCOLOGIA .................................................................. 3

2 POLÍTICA NACIONAL DE ATENÇÃO À ONCOLOGIA .............................. 4

3 PREVENÇÃO, RASTREAMENTO E DIAGNÓSTICO PRECOCE DO


CÂNCER 7

4 CÂNCER COMO DOENÇA GENÉTICA ................................................... 13

5 ALTERAÇÕES GENÉTICAS NA LINHA GERMINAL VERSUS


ALTERAÇÕES GENÉTICAS SOMÁTICAS............................................................... 15

6 ANORMALIDADES GENÉTICAS DO TIPO CONDUTOR E PASSAGEIRO


NA PATOGÊNESE DO CÂNCER ............................................................................. 18

7 ONCOGENES E PROTO-ONCOGENES ................................................. 20

8 PONTO DE MUTAÇÕES .......................................................................... 23

9 O IMPACTO DE UMA EQUIPE MULTIDISCIPLINAR NO TRATAMENTO


DO CÂNCER ............................................................................................................. 24

BIBLIOGRAFIA ............................................................................................... 28

10 LEITURA COMPLEMENTAR ................................................................ 29

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1 INTRODUÇÃO À ONCOLOGIA

Fonte: www.oncomedbh.com.br

A oncologia tem tido grande evolução nas técnicas diagnósticas e terapêuticas,


o que tem possibilitado a sobrevida e a qualidade de vida dos pacientes com câncer.
Cabe à enfermagem acompanhar o desenvolvimento dessa especialidade pelas
investigações científicas, que são os principais recursos para a atualização do
conhecimento para o cuidado ao paciente oncológico.
No contexto do câncer, o enfermeiro atua em ações de prevenção e controle.
Tem como competência prestar assistência a pacientes com câncer na avaliação
diagnóstica, tratamento, reabilitação e atendimento aos familiares. Além dessas ele
desenvolve ações educativas, ações integradas com outros profissionais, apoia
medidas legislativas e identifica fatores de risco ocupacional, na prática da assistência
ao paciente oncológico e sua família. Por isso, a pesquisa em enfermagem oncológica
é essencial para gerar a base de conhecimento que fundamenta a prática clínica, além
de poder identificar o impacto do câncer e do tratamento na vida de pacientes e
familiares.

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2 POLÍTICA NACIONAL DE ATENÇÃO À ONCOLOGIA

Fonte:www.posgraduacaoredentor.com.br

A incidência e prevalência do câncer vêm aumentando em quase todo o mundo


nas últimas décadas, sendo responsável por mais de sete milhões de óbitos a cada
ano e por cerca de 13% de todas as causas de morte no mundo (International Union
Against Câncer - UICC). É resultado das grandes transformações globais que
modificaram o estilo de vida e a situação de saúde dos povos, pela crescente
urbanização e adoção de novas formas de produção de bens e serviços e novos
padrões de consumo (BRASIL, 2011).
Esses fatores contribuem, de forma significativa, no impacto do câncer na
expectativa e na qualidade de vida da população, nos serviços de saúde e nos altos
investimentos na busca de sua prevenção e cura. Segundo a Agência Internacional
para Pesquisa em Câncer (IARC/OMS/ World Cancer Report, 2008), o impacto global
do câncer mais que dobrou nos últimos 30 anos, e metade dos casos novos e cerca
de dois terços dos óbitos por câncer no mundo ocorrerão nos países de médio e baixo
desenvolvimento.
No Brasil, desde 2003, o câncer é a segunda causa de morte na população,
atrás apenas das doenças cardiovasculares. Conforme o Instituto Nacional de Câncer
(Inca), estimou-se em 2010 a ocorrência de 489.270 casos novos de câncer. Esse
quantitativo é válido como estimativa também para o ano de 2011. Avalia-se que o

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câncer de pele, do tipo não melanoma, será o mais incidente, com a ocorrência de
114 mil casos novos na população brasileira. Os demais tipos incidentes, à exceção
do câncer de pele do tipo não melanoma, serão os de próstata, de pulmão, de
estômago e de cólon e reto no sexo masculino; e os de mama, colo do útero, cólon e
reto e pulmão no sexo feminino.
A mortalidade por câncer no Brasil e em São Paulo, em 2008, apresentou
comportamento semelhante, tendo como principais causas de morte no sexo
masculino os cânceres de pulmão, próstata e estômago. No sexo feminino, foram
registrados os de mama, pulmão e intestino.

Fonte: www.bahianoticias.com.br

Os dados do Inca indicam que o tabagismo é diretamente responsável por 30%


das mortes por câncer em geral, 90% das mortes por câncer de pulmão e 25% das
mortes por doença coronariana. Nas mulheres, a amamentação, a prática da atividade
física e alimentação saudável com a manutenção do peso corporal estão associadas
a um menor risco de desenvolver câncer de mama.
A explicação das altas taxas de óbitos por câncer está diretamente relacionada
à maior exposição dos indivíduos a fatores de risco cancerígenos. Os atuais padrões
de vida adotados em relação a trabalho, nutrição e consumo em geral expõem os
indivíduos a fatores ambientais mais agressivos, relacionados a agentes químicos,

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físicos e biológicos resultantes de um processo de industrialização e urbanização cada
vez mais crescente. (GUERRA, GALLO, MENDONÇA, 2005).
As adoções de medidas de prevenção do câncer são altamente eficazes para
a redução dos casos de câncer e a minimização de sua incidência com o incentivo a:
Estilo de vida saudável – melhoria na qualidade da alimentação e no combate
ao sedentarismo;
Restrição ao uso de tabaco e álcool
Diminuição da exposição ao sol e à proteção contra raios ultravioleta (Raios
UV);
Diminuição da exposição a poluentes atmosféricos e inaláveis; e
Diminuição da exposição ocupacional a agentes cancerígenos, dentre outros.
A detecção, o diagnóstico e o tratamento precoce nas fases iniciais da doença,
nos grupos de maior risco para alguns tipos de câncer (como mama, colo uterino,
próstata e colorretal), podem resultar na diminuição da mortalidade específica e
adoecimento. A orientação da população combinada com a formação de profissionais
e com o acesso aos serviços de saúde de qualidade são fatores preponderantes por
maiores taxas de cura e responsáveis na redução dos altos custos econômicos e
sociais da doença.

Fonte: maisacaomenoscancer.org.br

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O tratamento do câncer e de suas complicações é realizado através de
procedimentos cirúrgicos, quimioterápicos e radioterápicos, isolados ou combinados
entre si. O controle dos sintomas é primordial, tanto na fase inicial da doença como
na avançada, com possibilidades terapêuticas. O controle da dor deve ocorrer em
todas as fases da doença.
Os efeitos secundários da doença e os decorrentes de seu tratamento, como
depressão, ansiedade, menopausa precoce, osteoporose, fadiga, demais neoplasias,
dentre outros, devem compor o conjunto de cuidados na atenção e assistência aos
pacientes. O seguimento sistemático, necessário ao controle da evolução da doença
e de seu reaparecimento, deve ser realizado até a alta. Nos casos sem possibilidade
de cura, o tratamento dos sintomas, o conforto geral – físico, psíquico, social e
espiritual – e a assistência ao final da vida devem ter importância similar aos demais
procedimentos terapêuticos.

3 PREVENÇÃO, RASTREAMENTO E DIAGNÓSTICO PRECOCE DO CÂNCER

Fonte: veja.abril.com.br

Aprendemos, nas leituras anteriores, que, exceto em crianças, as neoplasias


são relacionadas ao estilo de vida, à cultura e ao tipo de exposição aos fatores que

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contribuem para o acúmulo de danos aos genes específicos e, a longo prazo, para o
aparecimento da doença.
Para prevenir o câncer, geralmente, é preciso alterar hábitos e culturas; dessa
maneira, a melhor arma do ser humano nessa luta é a informação. Para isso, o
profissional de saúde não deve poupar esforços, a fim de que a informação chegue
aos clientes de forma esclarecedora para conscientizá-los sobre a importância da
adequação de estilo de vida nesse cenário. Outra importante estratégia de prevenção
é mediante ações educativas, utilizando estratégias de educação e comunicação em
saúde.
Alterar hábito de vida é uma tarefa difícil, pois envolve crença (o indivíduo
aprendeu dessa maneira e acredita ser a correta) e automatismo (o indivíduo realiza
dessa forma há tanto tempo que não pensa mais ao executar). Essa situação exige
do profissional de saúde não apenas a função de informar, mas também conscientizar
a população da importância de aplicar as recomendações transmitidas, porque é
preciso que a pessoa seja de fato sensibilizada sobre os riscos de modo a incorporar
novos hábitos.

Fonte: www.jornaledicaodobrasil.com.br

A conscientização exige do profissional conhecimento científico sobre o tema a


ser abordado, para embasar a necessidade da mudança; conhecimento sobre o perfil

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social, cultural e financeiro da clientela; e também criatividade para definir formas e
recursos de comunicação, que podem contemplar folder, cartaz, aula, encenação,
música, dentre outros.
O Fundo Mundial de Pesquisa sobre Câncer (World Câncer Research Fund -
WCRF), em seu relatório de 2007 sobre alimentos, nutrição, atividade física e
prevenção do câncer, apresentou a seguinte lista de recomendações:
Mantenha-se magro, apresentando índice de massa corporal (IMC) entre 18,5
e 24,9;
Mantenha-se fisicamente ativo, como parte de sua rotina diária, incluindo
qualquer atividade física no cotidiano. Caso não seja possível realizar 30 minutos de
uma só vez, dívida em períodos de dez minutos;
Limite o consumo de alimentos de alto valor calórico, inclusive bebidas ricas
em açúcar, como refrigerante;
Coma mais verduras, frutas e legumes variados, bem como cereais e grãos
integrais, como exemplo podemos citar granola, feijão, soja, lentilha e ervilha. Esses
alimentos devem compor dois terços do prato de comida;
Limite o consumo de carnes vermelhas (até 500g por semana) e evite carnes
processadas e embutidas;
Limite a bebida alcoólica para até duas doses para homens e uma dose para
mulher por dia;
Limite o consumo de sal e de comidas industrializadas com sal, substituindo
por temperos naturais, tais como pimentas e ervas;
Busque alcançar suas necessidades nutricionais por meio da alimentação, pois
o uso de suplementos alimentares deve ser indicado por profissional especializado a
grupos especiais;
Mulheres devem amamentar seus bebês exclusivamente até os seis meses,
pois confere proteção para a mãe contra o câncer de mama, assim como minimiza a
possibilidade de sobrepeso na criança;
Após o tratamento, os pacientes de câncer devem seguir as recomendações
para a prevenção do câncer, pois um estilo de vida saudável pode minimizar o risco
de recorrência da doença;
Não fume. Caso não consiga parar de fumar sozinho, procure nas instituições
de saúde programas destinados aos dependentes de nicotina.

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Fonte: quasedentista.wordpress.com

Há ainda situações que não foram contempladas nesse relatório, mas são de
grande impacto no Brasil. Estamos nos referindo à exposição solar, pois também já
sabemos que é um risco modificável; dessa maneira, há ações que podem ser
recomendadas para diminuir o risco de câncer de pele, um dos tipos mais comuns,
conforme observamos nos dados epidemiológicos:
Orientar que a exposição ao sol seja evitada no período entre 10 e 16 horas.
Para a proteção adequada, a pessoa pode procurar a sombra, utilizar chapéus ou
bonés com abas para proteger cabeça e pescoço, utilizar camisas e calças, aplicar
filtro solar com fator de proteção solar (FPS) no mínimo 15;
Em países tropicais, como o Brasil, recomenda-se o uso de protetor solar
durante todo o dia, inclusive quando a exposição ao sol ocorrer antes das 10 horas e
após as 16 horas;
Evitar lâmpadas de bronzeamento;
Atentar para a proteção de crianças e adolescentes, pois a exposição
cumulativa e excessiva nos primeiros 10 a 20 anos de vida aumenta muito o risco de
desenvolvimento de câncer de pele, mostrando ser a infância uma fase
particularmente vulnerável aos efeitos nocivos do sol;
Proteger os olhos com óculos que apresentam lentes com proteção a raios UV-
A e UV-B.

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Fonte: www.emtempo.com.br

Ressaltamos a dificuldade de prevenção do câncer na infância e adolescência,


visto que não estão claramente definidos os fatores carcinogênicos. Reforçamos a
importância do diagnóstico precoce, pois cerca de 70% dos pacientes acometidos de
câncer nessa fase da vida, se diagnosticado precocemente e tratado adequadamente,
têm possibilidade de cura e boa qualidade de vida após o tratamento.
Entretanto, vemos ainda pacientes sendo encaminhados aos centros
especializados de tratamento oncológico em estágio avançado. Essa situação é
multifatorial, decorrendo possivelmente da desinformação dos pais, medo do
diagnóstico de câncer (podendo levar à negação dos sintomas) e desinformação da
equipe de saúde. Além disso, pode também estar relacionada com a inespecificidade
dos sintomas de determinados tipos de tumor, porque a apresentação clínica dos
mesmos pode não diferir muito de diferentes doenças, muitas delas bastante comuns
na infância.

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Fonte: www.caucaiaagora.com.br

Como já dito, o surgimento do câncer é multifatorial, resultante das interações


de fatores externos e genéticos. Dessa forma, é importante informar a população de
que essas ações preventivas diminuem consideravelmente a probabilidade do câncer,
mas não excluem a possibilidade de sua ocorrência. Esse esclarecimento é
fundamental por duas razões: a primeira, para evitar o descrédito da equipe de saúde
que é referência da população; e a segunda, para alertar quanto à necessidade de
realizar as ações para o rastreamento do câncer. Atentar também para os sinais e
sintomas característicos, ambos são primordiais para a detecção precoce, uma forma
de prevenção secundária.
Ressaltamos a importância do diagnóstico precoce que tem como objetivo
viabilizar a intervenção antineoplásica no estágio inicial da doença, diminuindo a
morbidade e mortalidade da população.
Uma das etapas utilizadas para diagnosticar precocemente o câncer é o
rastreamento (screening), que consiste em realizar procedimentos de execução
simples, seguros, não invasivos, baratos, de sensibilidade e especificidade
comprovadas e de fácil aceitação pela população e pela comunidade científica. Esses
procedimentos são aplicados em grupos de indivíduos assintomáticos, com

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probabilidade relativamente alta para desenvolverem certos tipos de câncer, conforme
os fatores de risco: ocupacional, estilo de vida, idade, dentre outros.

Fonte: www.ictq.com.br

4 CÂNCER COMO DOENÇA GENÉTICA

A expansão clonal descontrolada de uma célula, que geralmente provoca a


invasão dos tecidos adjacentes e disseminação metastática, produz câncer. As
alterações genéticas iniciais nessa célula que desencadeiam proliferação aberrante
são acompanhadas pelo acúmulo de mutações adicionais entre os descendentes
genéticos. No final ocorre um processo seletivo em que subclones com propriedades
intensificadas de crescimento se tornam dominantes no interior do tumor – fenômeno
conhecido por progressão tumoral. Definiu-se para alguns tumores uma clara
evolução genética histológica e molecular de lesões pré-cancerígenas para câncer
maligno e invasivo (p.ex., câncer no cólon e câncer na bexiga); entretanto, em muitos
tipos de câncer esse processo talvez não seja clinicamente evidente. Os genes que
se alteram no desenvolvimento e na progressão do câncer ainda estão sendo objeto
de uma profunda investigação. Em muitos casos, a identificação desses genes levou
a uma visão mais detalhada dos mecanismos fisiológicos normais que controlam a

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proliferação celular. Os produtos desses genes estão envolvidos em atividades como
regulação do ciclo celular básico, transmissão de sinais de crescimento, regulação da
diferenciação e da morte das células, e estabelecimento da imortalidade celular. De
maneira geral, o rompimento desses genes ocorre exclusivamente nas células
somáticas cujo destino é se tornarem cancerígenas. Entretanto, em casos raros,
possivelmente ocorram mutações que sejam transmitidas pela linha germinal,
resultando em uma predisposição genética para o câncer (i.e., síndromes de câncer
familiar).

Fonte: www.brasilacademico.com

Acredita-se que fatores ambientais também contribuam para o


desenvolvimento de câncer. Em alguns casos, interações entre fatores ambientais e
variações genéticas sutis na linha germinal que distinguem os indivíduos podem
constituir um determinante importante de risco de câncer na população em geral. Em
outros casos há uma ligação direta entre o efeito do carcinógeno sobre o DNA
somático e mutações específicas que promovem tumores, como aquelas que ocorrem

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no gene supressor tumoral p53 (p.ex., exposição ao tabaco ou à aflatoxina, uma toxina
fúngica). A exposição à radiação ionizante é outra fonte de câncer com ligação direta
aos danos genéticos. A incidência de leucemia e de vários tumores sólidos nos
sobreviventes da bomba atômica produziu uma grande quantidade de dados para os
estudos clássicos sobre a dosagem de radiação e suas consequências. Os dados
mais recentes surgiram de casos de câncer como complicações tardias de
radioterapias e de quimioterapias radio miméticas usadas no tratamento de
malignidades em fase inicial.
Para finalizar, as infecções virais foram vinculadas ao desenvolvimento de tipos
específicos de câncer. As ligações câncer-vírus incluem carcinoma cervical e
orofaríngeo de células escamosas com subtipos específicos de papiloma vírus
humano; carcinoma hepatocelular com infecção crônica causada pelo vírus da
hepatite B; carcinoma nasofaríngeo e linfomas com vírus de Epstein-Barr em
hospedeiros imunossuprimidos; o caso raro de leucemia aguda de células T
transformando o vírus linfo trópico de células T humanas tipo I; e sarcoma de Kaposi
com herpes vírus humano tipo 8. Cabe observar que esses casos são exceções à
regra; a maior parte dos casos de câncer em seres humanos não é consequência de
infecções virais. Entretanto, grande parte de nossos conhecimentos sobre os genes
humanos envolvidos nos casos de câncer surgiu originalmente do estudo de vírus que
produzem tumores em galinhas e roedores. A apropriação indevida dos vírus dos
genes de hospedeiro envolvidos na proliferação celular por esses vírus resultou na
identificação de oncogenes e forneceu a primeira pista para os eventos genéticos que
causam câncer em seres humanos.

5 ALTERAÇÕES GENÉTICAS NA LINHA GERMINAL VERSUS ALTERAÇÕES


GENÉTICAS SOMÁTICAS

Na maior parte dos casos, as lesões genéticas que promovem tumorigênese


são adquiridas por meios somáticos e não envolvem alterações na linha germinal.
Essas alterações genéticas podem resultar na ativação ou no ganho funcional (de
oncogenes) e na perda funcional (de supressores tumorais). Em situações mais raras,
as anormalidades hereditárias na linha germinal contribuem para a patogênese do
câncer.

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Tipicamente, nessas circunstâncias, herda-se apenas uma única cópia
defeituosa de um gene, sendo que a transformação exige a perda do segundo alelo
(não mutante) em uma célula somática. Levando-se em consideração que a
velocidade de uma perda alélica somática simples é exponencialmente mais elevada
que a mutação independente de dois alelos no interior da mesma célula, a incidência
de tipos específicos de câncer nos portadores da mutação é dramaticamente elevada,
em comparação com a incidência na população em geral. De maneira geral (mas nem
sempre), nos casos de predisposição para câncer hereditário a perda funcional, e não
o ganho funcional, desses genes promove a carcinogênese. Consequentemente, por
definição, esses genes são supressores tumorais.

Fonte: cecilianutri.blogspot.com.br

Tipos histológicos diferentes de câncer estão associados a padrões


sobrepostos e distintos de alterações genéticas. Alguns eventos genéticos, em
particular translocações cromossômicas somáticas específicas, estão associados
exclusivamente a um tipo de câncer. Por exemplo, a translocação cromossômica
EWS-FLI 1 é específica para o sarcoma de Ewing; consequentemente, essa
translocação é um marco diagnóstico bastante útil para esse tipo de tumor.2 Outras
anormalidades genéticas somáticas, como a ativação mutacional do oncogene KRAS
ou a desativação do gene supressor tumoral p53, estão associadas a muitos tipos
diferentes de câncer. De maneira geral, no caso de defeitos genéticos na linha

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germinal a predisposição para um padrão tecidual específico de câncer é o resultado
da herança de alguma anormalidade em um gene supressor tumoral específico. Em
muitos casos, a base biológica dessa especificidade tecidual ainda permanece
obscura. Por exemplo, o gene BRCA1 é importante para a estabilidade genômica e
para o reparo do DNA em todos os tipos de células, porém, mesmo assim, as
mutações herdadas do BRCA1 estão associadas quase que exclusivamente à
predisposição para câncer de mama e ao câncer de ovário.

Fonte: setorsaude.com.br

Uma das descobertas relacionadas a esse fato é que os genes associados à


predisposição hereditária para o câncer possivelmente também estejam sujeitos à
desativação somática, embora esse conceito se aplique somente a um subgrupo
distinto de tipos de câncer. Consequentemente, os carcinomas de pulmão de
pequenas células (CPPCs) se caracterizam pela desativação somática do gene
supressor do tumor retinoblastoma (RB1).3, todavia, a mutação de RB1 na linha
germinal não está associada a uma incidência elevada de CPPC, mas está
relacionada à incidência de retinoblastoma e osteossarcoma. Teoricamente, esse
paradoxo aparente reflita papeis contextuais específicos desempenhados pelo gene
RB1, de modo que sua ativação seja suficiente para estimular a proliferação de alguns
tipos de câncer, enquanto que em outros tipos a ativação talvez seja necessária,
porém insuficiente para a tumorgênese, e ainda em outros tipos a ativação
possivelmente desencadeie respostas compensatórias, incluindo morte celular. Seja
qual for o caso, em geral temos uma compreensão relativamente limitada sobre a

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razão pela qual anormalidades genéticas específicas estão associadas a padrões
teciduais específicos de tumorigênese.

Fonte: medicsupply.net

6 ANORMALIDADES GENÉTICAS DO TIPO CONDUTOR E PASSAGEIRO NA


PATOGÊNESE DO CÂNCER

A maior parte dos tipos de câncer em seres humanos, principalmente o câncer


comum em adultos, abriga uma quantidade equivalente a dezenas ou mesmo
centenas de anormalidades genéticas somáticas. Em um dos estudos, os
investigadores preparam uma sequência ampla de carcinomas na mama e no cólon
com base no DNA. Uma mediana de aproximadamente 80 mutações, que deram
origem a uma truncagem proteica precoce ou a uma alteração na sequência proteica,
foram encontradas em cada tumor. Todavia, acreditava-se que apenas uma pequena
minoria dessas mutações (em torno de 15 por tumor) era “significativa”, tendo em vista
a recorrência em vários tipos de câncer. Essas mutações, observadas com maior
frequência em genes cancerígenos bem definidos como o p53 e o KRAS, foram
denominadas mutações “condutoras” porque se acreditava que estimulassem
transformações e progressões malignas.
Entretanto, de um modo geral, a maior parte das mutações somáticas
específicas de tumores não foram observadas de forma repetitiva em vários tipos de
tumor. Presume-se que essas mutações ocorram casualmente e não reflitam qualquer
instabilidade genética associada ao processo da tumorigênese. Portanto, passaram a
ser conhecidas como mutações do tipo “passageiro”.

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Fonte: www.biotecnika.org

A distinção entre anormalidades genéticas associadas a tumores do tipo


condutor e passageiro pode se tornar um grande desafio e envolve análises de larga
escala de genomas tumorais e estudos funcionais das vias cancerosas. A
identificação das anormalidades do tipo condutor está se tornando cada vez mais
relevante em face do desenvolvimento de uma nova geração de terapias para
tratamento de câncer com foco nessas vias específicas.

Fonte: www.newscientist.com

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7 ONCOGENES E PROTO-ONCOGENES

Fonte: www.biologyreference.com

Os genes causadores de câncer, ou oncogenes, foram descobertos quando os


pesquisadores observaram que os genes específicos de galinhas e os retrovírus de
roedores poderiam transformar as células normais de mamíferos em culturas.
Comprovou-se que esses genes transformadores virais eram homólogos
ativados de genes de mamíferos (conhecidos por proto-oncogenes) que foram
roubados da célula de hospedeiro durante a evolução viral por sua capacidade de
estimular a proliferação celular. Embora não sejam causados por infecções virais,
descobriu-se que os cânceres humanos primários abrigam alelos ativados
semelhantes de proto-oncogenes.
Entre os primeiros oncogenes que foram descobertos estavam aqueles que
codificavam as proteínas diretamente envolvidas na transmissão de sinais de
proliferação celular. Isso inclui os receptores de fatores de crescimento
(p.ex., receptor do fator de crescimento derivado das plaquetas [PDGR, do inglês
platelet-derived growth factor receptor] ou o receptor do fator de crescimento

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epidérmico [EGFR, do inglês epidermal growth factor receptor]) que se tornam
constitutivamente ativados como se estivessem respondendo à presença contínua de
um fator de crescimento e de moléculas sinalizadoras que se localizam no sentido do
fluxo (p.ex., HRAS, KRAS e NRAS) que normalmente respondem à sinalização do
fator de crescimento e alternam rapidamente entre os estados ativado e desativado,
mas sofrem mutações para células cancerígenas em uma posição permanentemente
ativada.
Os mecanismos através dos quais esses proto-oncogenes celulares normais
são ativados nos cânceres humanos incluem pontos de mutação, amplificação
genética e translocações cromossômicas. Essas mutações são conhecidas como
mutações de ganho funcional, considerando que resultam em propriedades funcionais
novas ou alteradas para a proteína codificada e são geneticamente dominantes sobre
o segundo alelo normal.

Fonte: ibbio.pbworks.com

Embora a ativação de oncogenes possa promover uma proliferação anormal


e/ou sobrevivência de células cancerígenas nascentes, esses efeitos têm um custo.
De maneira geral, a religação da sinalização de células cancerígenas que resultar da
ativação de oncogenes torna as células cancerígenas atipicamente dependentes de
rotas controladas pelo(s) oncogene(s) ativado(s) no interior daquelas células.

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Acredita-se que esse fenômeno, às vezes conhecido como “dependência de
oncogene”, reflita estresses metabólicos específicos associados à proliferação
desenfreada.
Consequentemente, embora o resultado da inibição química do receptor do
fator de crescimento epidérmico (EGFR) nas células normais seja apenas modesto, o
bloqueio da sinalização do EGFR nas células cancerígenas do pulmão, que abriga as
mutações ativadoras somáticas do EGFR, poderá induzir morte celular imediata.

Fonte: www.promega.com.br

Da mesma forma, as células cancerígenas que não apresentarem ativação de


um oncogene específico podem ser relativamente insensíveis a um agente terapêutico
com alvo específico que, em outras circunstâncias, seria altamente eficaz nos tipos
de câncer com a mutação relevante.
Por exemplo, em um grande teste randomizado que fez a comparação entre
quimioterapia e inibidor específico para o EGFR para tratamento de adenocarcinomas
pulmonares, os pacientes com tumores com mutação no EGFR obtiveram benefícios
substancialmente maiores com o inibidor com alvo específico, enquanto que os
pacientes sem essas mutações obtiveram melhores resultados com a
quimioterapia.6Observações como essas resultaram em uma ênfase maior sobre a
análise da genética tumoral na prática oncológica clínica.

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8 PONTO DE MUTAÇÕES

Os pontos de mutações capazes de ativar um produto genético são pouco


usuais e, tipicamente, são observados em um grupo altamente restrito de sítios
codificadores de proteínas no interior do gene.
Por exemplo, somente alterações específicas em três códons das proteínas da
família RAS levaram a uma ativação constitutiva da sinalização RAS.7Presume-se que
outras mutações possam ocorrer no interior desses genes, embora sejam
funcionalmente silenciosas ou resultem em proteínas inativas e, consequentemente,
não sejam selecionadas nas transformações malignas.
Da mesma forma, alterações em aminoácidos específicos nos receptores do
fator de crescimento ou outras moléculas sinalizadoras produzem um efeito ativo
indutor do crescimento ou impedem a infra regulação por sinais fisiológicos
apropriados. Há um interesse especial nas mutações no gene RET, que codifica um
receptor do fator de crescimento, além de ser o proto-oncogene raro que é modificado
na linha germinal de pacientes com predisposição para câncer.

Fonte: www.bbc.com

As substituições de aminoácidos dentro de domínios funcionais distintos da


proteína estão associadas à neoplasia endócrina múltipla tipo IIA das síndromes de
predisposição para câncer familiar ou ao câncer tireóideo medular.

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Por outro lado, a desativação das mutações no gene RET causa a doença de
Hirschsprung, um defeito evolutivo que afeta as inervações colônicas. 8 Essa ligação
impressionante entre mutações diferentes no gene RET e tipos distintos de câncer e
as síndromes de desenvolvimento possivelmente seja o resultado de propriedades
funcionais diferentes que são mediadas pelos vários domínios da proteína RET e de
rotas diferentes associadas à RET que podem ser ativadas em tipos diferentes de
tecidos.

9 O IMPACTO DE UMA EQUIPE MULTIDISCIPLINAR NO TRATAMENTO DO


CÂNCER

Fonte: www.fsfx.com.br

O diagnóstico do câncer engloba mais de 600 tipos de tumores diferentes, cujos


tratamentos variam de acordo com a origem da célula e o tipo do tumor, o estágio em
que se encontra e a história natural da doença. A complexidade da doença torna
necessário o envolvimento de uma variedade de profissionais durante as
diversas fases do tratamento.
Esta equipe de profissionais, composta por diversas especialidades, é
conhecida como Equipe de Atendimento Multidisciplinar (EMD), sendo formada por
oncologistas clínicos, cirurgiões, radio terapeutas, enfermeiras, farmacêuticos,
nutricionistas, fisioterapeutas e psicólogos.
Outros grupos com formação especializada, tais como radiologistas,
patologistas e especialistas em cuidados paliativos também contribuem para o

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atendimento de pessoas com câncer e compõem, ao longo das diversas fases do
tratamento, a equipe de atendimento do paciente.
Na literatura existem diversos estudos que mostram que cuidar do paciente em
equipe multidisciplinar otimiza o trabalho e pode reduzir a taxa de mortalidade, além
de melhorar a gestão hospitalar e ambulatorial.
A demanda pela formação de equipes cresceu em paralelo com a reforma dos
cuidados em saúde e das expectativas crescentes para a melhoria da qualidade do
atendimento e do entendimento da relação custo-benefício em saúde. Compreender
como as equipes afetam a prestação de cuidados em oncologia ajudará a melhorar e
mensurar o desempenho da equipe na resolução da assistência.
Apesar dos incentivos e interesses na formação de EMD, ainda não sabemos
com detalhes o que torna o trabalho em equipe eficaz no tratamento do câncer. Muito
do que se sabe sobre o impacto das equipes multidisciplinares vem de estudos de
outras especialidades médicas, especialmente a geriatria, de alguns tipos específicos
de cirurgias e do tratamento de doentes crônicos.

Fonte: www.vovolourdes.com.br

Um dos primeiros estudos a analisar de forma sistemática o impacto da equipe


multidisciplinar no tratamento do câncer acaba de ser publicado. Pesquisadores do
Instituto Nacional do Câncer dos EUA e da Universidade Johns Hopkins fizeram uma
revisão sistemática da literatura publicada entre 2009 e 2014 e selecionaram 16
estudos de um total de 7.806.

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Estes estudos abrangiam diferentes fases do tratamento oncológico:
rastreamento, diagnóstico, tratamento ativo, cuidados paliativos e cuidados em final
da vida. Todos os trabalhos selecionados apresentavam uma equipe multidisciplinar
definida, um grupo comparativo e evidências sobre a evolução do paciente, como
controle de dor, satisfação do paciente, medidas de qualidade de vida, tratamento
baseado em diretrizes e sobrevida livre de doença.

Fonte: alavancasaude.com.br

O objetivo do estudo foi, através de métodos comparativos, identificar práticas


que pudessem levar a algumas conclusões sobre o desempenho dessas equipes, e
desta forma, contribuir para um melhor entendimento do funcionamento das equipes
multidisciplinares e auxiliar no desenho de estudos clínicos nesta área.
Os resultados encontrados, embora limitados pela diversidade dos estudos e
variáveis envolvidas, forneceram várias mensagens importantes para a prática clínica.
O estudo mostrou que a presença de equipes multidisciplinares nos Programas de
Rastreamento do câncer melhorava a adesão às diretrizes estabelecidas e diminuía o
tempo de realização de exames mais complexos após a presença de um resultado
suspeito, o que levaria à diagnósticos precoces em fases iniciais, possibilitando uma
maior chance de cura.
No momento do diagnóstico e do tratamento efetivo, a presença de uma equipe
multidisciplinar definida melhorava a discussão dos casos e afetava positivamente o
planejamento e implementação da terapia, com maior adesão às recomendações e

26
maior eficiência na tomada de decisões clínicas, na informação dos pacientes e nos
encaminhamentos para especialidades.
Na fase de cuidados paliativos, a presença da equipe multidisciplinar trouxe
melhora do controle da dor e maior aderência a medicações orais. Também foi
evidenciado uma potencial redução em hospitalizações e uma melhor qualidade no
final da vida.
O estudo mostra que a formação de Equipes Multidisciplinares atuantes no
tratamento do câncer é promissora no que diz respeito à melhoria da qualidade e da
eficiência dos serviços prestados, devendo ser estimulada.

Fonte: www.hospitalmoinhos.org.br

27
BIBLIOGRAFIA

ABCâncer - Associação Brasileira do Câncer. Disponível em


www.abcancer.org.br/sobre.php. Acesso em: 15 out. 2007.

FLORIANI, C.A. Cuidador do idoso com câncer avançado: uma abordagem bioética,
Ministério da Saúde - Fundação Oswaldo Cruz, Rio de Janeiro, março de 2004.
Disponível em: http://teses.cict.fiocruz.br/pdf/floriani.com.pdf. Acesso em: 30 jul. 2007.

GIL, A.C. Técnicas de pesquisa em economia. 2º ed. São Paulo Atlas, 1991.

GONÇALVES, L.O. Cuidadores Primários Familiares dos Idosos Atendidos na Clínica


Escola de Fisioterapia da Universidade do Vale do Itajaí - Univali Florianópolis, 2002.
Disponível em: http://teses.eps.ufsc.br/defesa/pdf/6721.pdf. Acesso em: 15 jul. 2007.

GORDILHO, A.; KARSCH, U., 2000. Desafios a serem enfrentados no terceiro milênio
pelo setor saúdes na atenção integral ao idoso. Universidade Aberta da Terceira
Idade,

HORTALE, V.P., SILVA, R.C.F., Cuidados Paliativos Oncológicos: Elementos para o


debate de diretrizes nesta área. Cad. Saúde Pública, n.22, v. 10, p.2055-66, 2006.

LEAL, M.G. “O Desafio da Longevidade ao Cuidador”. Revista da Terceira Idade.


Publicação do SESC, n. 20, 2000.

28
10 LEITURA COMPLEMENTAR

Autores: Daniel Silveira da Silva e Giselda Veronice Hahn

Disponível em: www.univates.br/revistas/index.php/cadped/article/view/861/85


Data de acesso: 22/11/2016

PROCESSO DE TRABALHO EM ONCOLOGIA E A EQUIPE MULDISCIPLINAR

Resumo
Estudo de caráter exploratório descritivo com abordagem qualiquantitativa, cujo
objetivo foi verificar como ocorre o processo de trabalho de uma equipe multisciplinar
que atua em serviço de oncologia, quais as facilidades e os entraves enfrentados e
suas repercussões entre os membros. Foram pesquisados 13 diferentes profissionais
da área da Saúde utilizando instrumento semiestruturado. Os profissionais
compreendem suas atribuições na equipe e sentem reconhecimento de seu trabalho
pelos colegas. Entretanto, estresse e diferenças de personalidade, a sobreposição de
papéis, injustiças no trabalho, dificuldade em compreender a linguagem utilizada pelos
colegas e grande demanda de trabalho foram aspectos negativos relatados. Ressalta-
se a importância de maior integração entre os membros da equipe para que esta avalie
seu processo de trabalho de modo a resultar em melhorias no trabalho e na
assistência ao paciente.

Palavras-chave: Equipe de Assistência ao Paciente. Serviço Hospitalar de


Oncologia. Condições de Trabalho.

INTRODUÇÃO
O processo de trabalho em oncologia é fundamentado na equipe
multidisciplinar. Devido à crescente aceitação do modelo de atenção integral, com
abordagem biopsicossocial em saúde, vem se fortalecendo o interesse pelo trabalho
nessa modalidade, o qual tem trazido novos desafios e exigido habilidades para o
trabalho em equipe (TONETTO; GOMES, 2007).

29
Os profissionais que compõem essas equipes enfrentam, entretanto,
dificuldades interprofissionais inerentes à sua prática, como diferenças de
personalidade, de formação e de opiniões. Em contrapartida são inegáveis as
facilidades em trabalhar nesse tipo de conformação, tanto para o paciente, que conta
com atendimento especializado multidisciplinar, quanto para os profissionais de
saúde, que podem desempenhar suas atividades com maior segurança. O trabalho
em equipe tem sido visto como uma estratégia para enfrentar o processo de
especialização da área da saúde. Todavia, não pretende abolir as especificidades,
pois estas melhoram os serviços prestados ao aprimorar o conhecimento e o
desempenho técnico em uma área (PEDUZZI, 2001).
Devido às características inerentes à doença oncológica, os profissionais que
trabalham diretamente com ela estão mais suscetíveis a alterações, sofrendo
impactos na saúde física e psicológica, os quais se estendem negativamente para o
nível familiar, social e laboral (LABATE; CASSORLA, 1999), causando estresse
(FERREIRA, 1996).
O contato próximo com os usuários mobiliza emoções e favorece conflitos,
tornando os profissionais da área da Saúde suscetíveis ao sofrimento psíquico e
adoecimento relacionado ao trabalho (RIOS, 2008). Além disso, a convivência
frequente com a morte expõe os profissionais a experiências e vivências de sofrimento
e angústia, o que pode levar ao esgotamento psíquico, denominado Burnout,
caracterizado por exaustão prolongada e perda de interesse. Essa situação pode ser
resultante da rotina de enfrentamento de situações que evidenciam a terminalidade
(QUEIROZ, 2008).
Os aspectos físicos e psíquicos dos trabalhadores estão diretamente
relacionados ao seu trabalho e podem representar tanto equilíbrio, satisfação e
desenvolvimento, quanto desajuste, tensão e, consequentemente, adoecimento
(DEJOURS; ABDOUCHELI; JAYET, 2009).
Ainda é escassa a produção de pesquisas empíricas sobre as práticas das
equipes de saúde, sendo preciso consultar estudos de âmbito internacional (PINHO,
2006), bem como as definições de equipe são relativamente raras nas literaturas
consultadas sobre trabalho em equipe multiprofissional (PEDUZZI, 1998).
Durante a realização deste estudo verificou-se que as pesquisas enfocam,
sobretudo, a relação do profissional com o doente e seus cuidadores ou do doente
com sua doença e fatores relacionados a ela. Todavia, a relação interprofissional, com

30
enfoque nas dificuldades laborais, não tem sido abordada com frequência na literatura
nacional, assim como o enfoque multidisciplinar em oncologia, visto que as temáticas
têm sido fragmentadas nas diferentes áreas do saber em saúde. Essa carência de
trabalhos acerca da multidisciplinaridade enfatiza a relevância de desenvolver estudos
com esta temática.
Nesse sentido, o presente estudo tem por objetivo verificar como ocorre o
processo de trabalho de uma equipe multidisciplinar em oncologia e conhecer as
facilidades e os entraves enfrentados nesse processo e suas repercussões entre os
membros.
METODOLOGIA

Foi realizada uma pesquisa exploratória descritiva com abordagem


qualiquantitativa, do tipo pesquisa de campo. A amostra foi intencional e constituída
de profissionais que atuam em uma equipe multidisciplinar de saúde do serviço de
quimioterapia de um hospital filantrópico do interior do Rio Grande do Sul. Os aspectos
éticos foram respeitados de acordo com a Resolução 196/96 do Ministério da Saúde
em relação às pesquisas envolvendo seres humanos (BRASIL, 1996). O projeto foi
aprovado pelo Comitê de Ética em Pesquisa (COEP) do Centro Universitário
UNIVATES por meio do número 108/10.
Os critérios de inclusão da amostra foram: ser profissional da área da saúde,
de nível superior e médio, integrante da equipe multidisciplinar de um serviço de
quimioterapia e devolver o instrumento de coleta de dados preenchido e o Termo de
Consentimento Livre e Esclarecido assinado em duas vias dentro do prazo
estabelecido. Como critérios de exclusão adotou-se: profissionais da equipe de saúde
com tempo de atuação inferior a três meses no serviço ou que estivessem ausentes
no período de coleta de dados devido a férias ou licenças.
Os sujeitos tiveram duas semanas para responder ao questionário e a entrega
foi feita em uma urna deixada no serviço e recolhida após o prazo estipulado.
Foi aplicado um questionário semiestruturado contendo questões abertas e
fechadas, precedidas de dados de identificação. Estes foram utilizados para traçar o
perfil sociodemográfico da amostra. Previamente foi realizado um pré-teste para
avaliar o instrumento no setor de radioterapia, o qual também possui uma equipe
multidisciplinar, que revelou não haver necessidade de ajustes.

31
Os dados foram analisados de forma quantitativa por meio da estatística
descritiva e também qualitativamente pela análise de conteúdo proposta por Minayo
(2007) que, por meio de procedimentos especializados e científicos, permitem tornar
replicáveis e válidas inferências sobre dados de um determinado contexto. A partir
dos resultados foram definidas as categorias de análise, sendo utilizada a literatura
disponível para a interpretação dos dados.

COMUNICAÇÃO NA EQUIPE MULTIDISCIPLINAR

As relações humanas, tanto com o paciente quanto com a equipe


multidisciplinar, são a base do trabalho do profissional de saúde. O processo
comunicativo, inserido nesse contexto, é imprescindível para a ação profissional
(SILVA, 2003).
Em pesquisa realizada com enfermeiros acerca de agentes estressores no
trabalho, o item mais citado esteve relacionado aos problemas de relacionamento e
comunicação - fato apoiado por vários estudos internacionais (MARTINS et al., 2000).
Neste estudo, entretanto, a dificuldade de comunicação entre os integrantes da
equipe foi relatada por 62% dos sujeitos como evento que ocorre “algumas vezes” e
“raramente” para 38%, evidenciada nos seguintes relatos:

Em algumas situações a falta de comunicação devido ao pouco tempo para


trocar informações interferem na qualidade do trabalho (P2). Ocasionalmente
temos dificuldade na “cadeia” [grifo do sujeito] de troca de informações, na
sequência. Acredito ser uma falha em algum ponto que não conseguimos
ainda detectar exatamente como corrigir. Talvez com este trabalho possamos
iniciar esta investigação (P3). Falta ou comunicação incorreta [...] (P7).

Os profissionais se comunicam para superar problemas e, nesse sentido, são


capazes de reconhecê-los, analisá-los e buscar formas de reinventar/recriar as
alternativas de trabalho (MISHIMA; PEREIRA; FORTUNA; MATUMOTO, 2003).
“Portanto, a comunicação entre os profissionais é o denominador comum do trabalho
em equipe, o qual decorre da relação recíproca entre trabalho e interação” (PEDUZZI,
2001, p. 106).
Por outro lado, existem situações nas equipes de saúde que particularmente
dificultam a sua estruturação, como a linguagem utilizada e a falta de confiança
interprofissional em virtude das relações de poder entre os diferentes profissionais
(PINHO, 2006). O trabalho em saúde ainda é pautado tradicionalmente pelas relações

32
hierárquicas e o trabalho individualizado, todavia é possível criar espaços de troca, de
conversa e discussão em que se busque a integração, democratização e
horizontalização das relações de trabalho (PEDUZZI, 2007).
No que tange à linguagem utilizada por outros profissionais da equipe
multidisciplinar devido às diferentes formações, a maior parte da amostra, 69%,
relatou “raramente” ou “nunca” enfrentar dificuldades de compreensão e o restante,
31%, referiu enfrentar “algumas vezes” essa dificuldade. P12 relata que:
O mais difícil de tudo é compreender as expectativas individuais e alentar as mesmas com o
grupo. Fazer com que cada um fale e se expresse, sem invadir ou ofender o outro.
Em estudo de Tonetto e Gomes (2007) a ausência de linguagem clara e objetiva
já foi apontada como uma dificuldade na relação do psicólogo com a equipe. Vale
ressaltar que as mensagens que passamos diariamente são interpretadas não apenas
pelas palavras que pronunciamos, mas também pela forma como nos comportamos
(SILVA, 2003). Compete à equipe multidisciplinar conhecer os mecanismos de
comunicação que auxiliarão na melhora do relacionamento entre os membros da
equipe.

RELACIONAMENTO INTERPESSOAL ESTRESSE

Referente ao estresse gerado pelo trabalho em equipe, as respostas foram bem


variadas, visto que 38% relataram o enfrentar algumas vezes, outros 38% raramente,
15% frequentemente e 8% que nunca o vivenciam.
Em um estudo de Balancieri e Bianco (2004) a dificuldade de relacionamento
profissional entre colegas no ambiente de trabalho surgiu como fator desencadeador
de estresse em 50% das respostas. O contato próximo com os usuários mobiliza
emoções e conflitos inconscientes, além de outros fatores, e torna os profissionais da
área da saúde suscetíveis ao sofrimento psíquico e adoecimento relacionado ao
trabalho (RIOS, 2008).
Estudo de Queiroz (2008) demonstrou que as condições de trabalho podem
interferir no estado de saúde do trabalhador de enfermagem desencadeando
problemas como estresse, mudança de humor, depressão, dores lombares, doenças
de pele e lesões por materiais perfurocortantes. Foi observado ainda elevado número
de licenças médicas e de transtornos de ordem física e mental relacionados às
dificuldades enfrentadas pelos profissionais frente ao tratamento de pacientes

33
oncológicos e ao estresse, entre outros fatores. As doenças apontadas foram
identificadas como sendo de origem psicossomática, podendo este fato ser
relacionado à gravidade dos pacientes e com a instabilidade clínica dos usuários.

INVASÃO DO NÚCLEO DE ATUAÇÃO DA PROFISSÃO

Os integrantes da equipe, de maneira geral, não se sentem invadidos em seu


núcleo de atuação pelos profissionais de outras especialidades, visto que a grande
maioria, ou seja, 92%, relatou que nunca e raramente se sente invadido, tendo apenas
8% indicado algumas vezes ter vivido essa situação.
O trabalho multiprofissional refere-se à recomposição de diferentes processos
de trabalho que devem, para se integrar, concomitantemente, preservar as diferenças
técnicas ou especificidades de cada trabalho e articular as intervenções realizadas
pelos componentes da equipe (PEDUZZI, 2007). A interação, articulação e o poder
são fatores de satisfação nas relações profissionais e auxiliam na manutenção dos
integrantes nas equipes. Entretanto, as relações de trabalho são dinâmicas e definem
a maior ou menor interação entre os profissionais. Os entraves que surgem no
desenvolvimento das atividades laborais afetam as relações entre os membros das
equipes e entre estes e os pacientes e familiares. As relações construídas dentro de
experiências interdisciplinares possibilitam que entraves e conflitos comuns nas
organizações sejam superados ou minimizados, o que se projeta na satisfação tanto
para os profissionais quanto para os pacientes (MATOS; PIRES; CAMPOS, 2009).
A interação e a articulação na equipe interdisciplinar acontecem considerando
a assimetria das relações interprofissionais e entre trabalhador e usuário. Parte do
trabalho de natureza interdisciplinar se constitui no ouvir os colegas e considerar as
contribuições na definição do trabalho a ser desenvolvido (MATOS; PIRES; CAMPOS,
2009).
Conforme Tonetto e Gomes (2007), um fator que dificulta o trabalho em equipe
é a falta de clareza quanto às atribuições dos diferentes profissionais que a constitui.
Entretanto, os profissionais deste estudo compreendem quais são as suas atribuições
dentro da equipe, visto que 54% relataram raramente e 46% nunca encontrarem essa
dificuldade em seu processo de trabalho.
Em estudo realizado com psicólogas, estas consideram as condições de
trabalho variáveis entre diferentes hospitais, assim como em diferentes unidades de

34
uma mesma instituição. A forma de interação com os demais profissionais varia de
acordo com questões hierárquicas, o grau de importância atribuído aos aspectos
emocionais e o conhecimento do trabalho desenvolvido por essa área (TONETTO;
GOMES, 2007).

DIFICULDADES LABORAIS E SUA INFLUÊNCIA NO PROCESSO DE


TRABALHO

Ao final do instrumento havia duas questões abertas referentes a outras


dificuldades laborais e sua influência no processo de trabalho que permitiram aos
sujeitos acrescentar informações específicas do serviço. Os sujeitos reforçaram a
importância das relações interprofissionais na equipe e citaram alguns aspectos
organizacionais do serviço, como poucos profissionais, falta de profissionais com
experiência em oncologia e falta de comprometimento com o serviço, assim como
desgaste emocional, sobrecarga de trabalho e distribuição desigual dos pacientes ao
longo da semana, como dificuldades enfrentadas no trabalho que atrasam as
atividades laborais, geram grande demanda de trabalho à equipe e causam desgaste
emocional, angústia e insegurança.
A divisão técnica e social do trabalho, em parte, sugere que as relações
estabelecidas dentro do processo de trabalho são desenvolvidas por diferentes
profissionais (agentes) que possuem parcelas de conhecimento, poder e autonomia
distintas entre eles (MISHIMA; PEREIRA; FORTUNA; MATUMOTO, 2003). Para a
resolução de conflitos que emergem no que tange ao trabalho coletivo, com a
estruturação de novas profissões, o modelo médico centrado ainda é mantido, tendo
este profissional a última palavra nos conflitos, independentemente de as decisões
estarem corretas ou não, atuando os demais profissionais como práticas auxiliares
(LEOPARDI, 1999).
É crescente na literatura consultada o destaque para a atenção integral e
multidisciplinar em saúde, com valorização de todos os membros da equipe. Um dos
princípios norteadores da Política Nacional de Humanização é o “fortalecimento de
trabalho em equipe multiprofissional, fomentando a transversalidade e a grupalidade”
(BRAZIL, 2004, p. 5). O trabalho em equipe multidisciplinar é um destaque na
evolução da saúde do Brasil, e de acordo com Kowalski et al. (2002), a oncologia
requer esse enfoque.

35
CONCLUSÃO

Evidenciou-se que diferenças de personalidade foi o problema mais destacado


pela equipe. Apesar do exposto, percebeu-se que os profissionais não enfrentam
dificuldade em compreender suas atribuições na equipe e um grande percentual
referiu sentir reconhecimento do seu trabalho pelos colegas. Foi encontrado baixo
percentual de respostas afirmativas referente à sobreposição de papéis ou à invasão
em seus núcleos de atuação, à injustiça no trabalho e à dificuldade em compreender
a linguagem utilizada pelos colegas da equipe, evidenciando que problemas na
comunicação são pouco frequentes. Por meio das perguntas abertas surgiram novas
dificuldades que refletem de forma negativa no processo de trabalho, causando
desgaste emocional, angústia e insegurança.
As atribuições de cada membro da equipe são definidas por meio de
legislações específicas. É possível respeitá-las e, ao mesmo tempo, realizar um
cuidado integral através do que Cecílio (2001) denomina de ‘integralidade focalizada’,
ou seja, atender as necessidades dos usuários através do esforço de cada um dos
trabalhadores e da equipe de saúde como um todo. É o atendimento integral como
fruto do trabalho solidário da equipe. Isso demanda comunicação e possibilita maior
integração entre os membros, oferecendo um cuidado que atenda às necessidades
de cada usuário.
O processo de trabalho em oncologia é imprescindivelmente multiprofissional,
considerando suas peculiaridades. Os resultados desta pesquisa parecem corroborar
com outros estudos desta temática visto que apresentam dificuldades semelhantes.
Entretanto, foram apontadas questões específicas que possibilitam inferir sobre as
particularidades da equipe estudada.
Não é possível generalizar os resultados, pois cada equipe possui dificuldades
e facilidades que podem ser semelhantes e distintas às outras, mas são próprias. São
necessários novos estudos para avaliar essas especificidades envolvendo equipes
multidisciplinares em oncologia, de maneira a pensar em formas de melhorar
constantemente as relações de trabalho nessa área. Novas pesquisas podem ser
desenvolvidas para favorecer a melhoria das relações interprofissionais, pois, além
destes, os usuários dos serviços também serão beneficiados.

36
BIBLIOGRAFIA

CECILIO, Luiz Carlos de Oliveira. As necessidades de saúde como conceito


estruturante na luta pela integralidade e equidade na atenção em saúde. In:
PINHEIRO, Roseli; MATTOS, Ruben Araújo de. (Org.). Os sentidos da integralidade
na atenção e no cuidado à saúde. Rio de Janeiro: ABRASCO, 2001.

DEJOURS, Christophe; ABDOUCHELI, Elisabeth; JAYET, Christian. Psicodinâmica


do trabalho: contribuições da Escola Dejouriana à análise da relação prazer,
sofrimento e trabalho. São Paulo: Atlas, 2009.

KOWALSKI, Luiz Paulo et al. Manual de condutas diagnósticas e terapêuticas em


oncologia. 2 ed. São Paulo: Âmbito Editores, 2002.

KRON, Thora. Administração dos cuidados de enfermagem ao paciente: colocando


em ação as habilidades de liderança. 6 eds. Rio de Janeiro: Inter livros, 1994.

LEOPARDI, Maria Tereza (Org). O processo de Trabalho em Saúde: organização e


subjetividade. Florianópolis: Papa-Livros, 1999.

MINAYO, Maria Cecília Souza. O Desafio do conhecimento: pesquisa qualitativa em


saúde. 10. ed. São Paulo: Hucitec; 2007.

SILVA, Maria Júlia Paes. Comunicação tem remédio: a comunicação nas relações
interpessoais em saúde. 2 ed. São Paulo: Edições Loyola, 2003.

ARTIGO PARA REFLEXÃO

Autores: Cleonice Antonieta Costa, Wilson Danilo Lunardi Filho e Narciso Vieira
Soares

Disponível em: http://www.scielo.br/pdf/reben/v56n3/a19v56n3

Data de acesso: 23/11/2016

37
ASSISTÊNCIA HUMANIZADA AO CLIENTE ONCOLÓGICO: reflexões junto
à equipe

RESUMO
O presente relato refere-se a uma prática assistencial, construída e
implementada junto a membros da equipe de saúde de um Serviço de Oncologia e
Radioterapia de um hospital geral de grande porte da região leste do Rio Grande do
Sul, visando à humanização da assistência. Constituiu-se numa possibilidade de
refletir com a equipe de trabalho, acerca da assistência prestada aos clientes à luz
das propostas do Sistema Único de Saúde (SUS) e sob a ótica da abordagem
humanística e suas propostas metodológicas.

Palavras chave: enfermagem oncológica; educação; equipe de enfermagem;


ética
INTRODUÇÃO

Cada vez mais, vivencia-se o aumento significativo das neoplasias malignas.


No quadro sanitário brasileiro, esta realidade tem ampliado a discussão sobre o
controle desse grupo de doenças, incluindo-as como uma das prioridades em saúde.
Apesar de ainda haver áreas obscuras na compreensão da etiologia do câncer, já se
tem conhecimentos suficientes para embasar ações de controle capazes de diminuir
a sua incidência e mortalidade.
A possibilidade de cura do câncer, na maioria de suas formas, está diretamente
relacionada à sua extensão, quando é instituído o primeiro tratamento, assim como a
qualidade e disponibilidade dos recursos para tratá-lo. No Brasil, as doenças crônico
degenerativas, entre elas o câncer, vêm recebendo atenção caracterizada por ações
essencialmente terapêuticas, de alta tecnologia e alto custo, dirigidas a pacientes com
doenças sintomáticas e, na maioria das vezes, avançadas. Esta situação, com
frequência é agravada pela falta de definição sobre o caminho a ser seguido pelo
paciente, desde a primeira queixa até a confirmação do diagnóstico e o início do
tratamento especializado.
Assim, a assistência ao paciente oncológico dá mostras de sua complexidade,
pois precisa envolver a consideração de múltiplos aspectos, tais como: físicos,
psicológicos, sociais, culturais, espirituais e econômicos, bem como os preconceitos

38
e tabus existentes, pois a palavra câncer, ainda, vem carregada da ideia de maldição
e morte. Como a maioria dos pacientes tem confirmado o seu diagnóstico somente
em fase avançada, além da cura de muitos tipos de câncer ainda não ser possível e
como o quadro que grande parte dos pacientes apresenta, geralmente, é doloroso de
se ver e acompanhar, os subterfúgios aumentam, decorrendo daí o emprego de
termos substitutos ou sinônimos: “a doença ruim”, “aquela doença”, “tumor”, “neo”,
dentre tantos outros. Ao ser abordada a questão do câncer como uma perspectiva de
finitude, pode-se afirmar que se mostra tão ameaçador porque representa não apenas
uma ameaça de morte, mas uma tríplice ameaça: de dor física, de mutilação e de
morte.

A EQUIPE E A ASSISTÊNCIA AO CLIENTE COM CÂNCER

O paciente com câncer não deve ser considerado, apenas, como mais um caso.
Nessa perspectiva, precisa ser empreendida uma visão holística e multidisciplinar,
buscando compreendê-lo nas suas múltiplas relações para proporcionar uma
abordagem profissional humanizada profundamente solidária, geradora não só de
saúde, mas, principalmente, de vida. Os profissionais que trabalham em oncologia
estão expostos, no seu dia-a-dia de trabalho, a situações geradoras de conflitos. Os
fatores que predispõem aos conflitos são, dentre outros, as frequentes perdas por
morte; as pressões que expõem o modelo médico tradicional de responsabilidade em
relação à cura e à longevidade; o trabalho constante com doenças graves e com a
tristeza dos familiares, o contato frequente com os familiares e paciente, levando à
criação de vínculo com maior envolvimento com o problema vivido.
Não raro surge o sentimento de impotência do profissional diante da doença,
principalmente em sua fase terminal, que pode traduzir-se em revolta ou em
abatimento. De suma importância e, provavelmente, a mola mestra que vai mobilizar
toda a assistência emocional que será prestada ao paciente com câncer e sua família,
é a forma como a equipe comunica-se e interage com eles. A comunicação, portanto,
não deve ser vista, apenas, como um processo de transmissão de informações, mas
compreendida como uma possibilidade de entendimento entre as pessoas(4). Desse
modo, pode ser considerada como sendo um dos elementos fundamentais no
processo de autonomia do ser humano(5). Considera-se de grande ajuda, neste
sentido, a interação multiprofissional, tendo clara a possibilidade de visualizar o cliente

39
como um todo, nos seus aspectos bio-psico-sócioespirituais, pois o cuidado à saúde
transcende o simples ato de assistir centrado no fazer, nas técnicas ou nos
procedimentos; significa, também, reconhecer os clientes e seus familiares como
seres humanos singulares, vivenciando um difícil momento de suas vidas.

HUMANIZANDO A ASSISTÊNCIA AO CLIENTE ONCOLÓGICO E SUA FAMÍLIA

A assistência humanizada ao paciente com câncer e seus familiares consiste


no emprego de atitudes que originem espaços que permitam a todos verbalizar seus
sentimentos e valorizá-los; identificar áreas potencialmente problemáticas; auxiliá-los
a identificar fontes de ajuda, que podem estar dentro ou fora da própria família;
fornecer informações e esclarecer suas percepções; ajudá-los na busca de soluções
dos problemas relacionados ao tratamento; instrumentalizá-los para que tomem
decisões sobre o tratamento proposto; e levar ao desempenho de ações de
autocuidado, dentro de suas possibilidades. Entre as múltiplas ações de saúde
necessárias para propiciar cuidados que privilegiem, dentre outros, os aspectos
psicológicos, estão à disponibilidade, a atitude de aceitação e de escuta e a criação e
a manutenção de um ambiente terapêutico.
A partir dessa compreensão e diante da importância atribuída a uma
assistência humanizada aos clientes, o que se pretendeu com a realização deste
estudo foi construir e implementar uma prática assistencial junto à equipe de trabalho
do serviço de oncologia de uma instituição hospitalar de grande porte da região leste
do Rio Grande do Sul, fundamentada na Teoria Humanística, visando a humanização
da assistência aos clientes ali atendidos.

CAMINHO METODOLÓGICO

Este estudo teve como eixo norteador o processo de diálogo reflexivo junto à
equipe dessa unidade de oncologia. Caracteriza-se como uma prática assistencial,
que buscou construir uma proposta de assistência humanizada aos clientes por ela
atendidos. Apoiando-se no referencial da enfermagem fenomenológicab, teve o
diálogo como meio facilitador do intercâmbio de saberes enfermeira/equipe, visando
sua instrumentalização para prestar uma assistência ao cliente como sujeito do
cuidado.

40
A opção pelo trabalho com a equipe deveu-se ao fato de considerar-se que, a
partir de encontros para discussões e reflexões, podem-se transformar
comportamentos para prestar uma assistência com qualidade e de forma abrangente
para, assim, colaborar para a melhoria da qualidade de vida dos clientes. A cada um
dos participantes foi solicitado o consentimento livre e esclarecido, conforme
determina a resolução 196/96 do Ministério da Saúde, bem como o Código de Ética
dos Profissionais de Enfermagem. Para garantir o anonimato e o sigilo das
informações, foi sugerido aos participantes adotarem nomes de flores. Assim, cada
membro do grupo espontaneamente escolheu aquela de sua preferência para
identificar-se: Violeta, Amor Perfeito, Lírio, Orquídea, Bem-me-quer, Cravo, Girassol
e Rosa.
Os encontros foram realizados em uma das salas da unidade de oncologia, em
ambiente confortável, claro e arejado, sendo possível visualizar o verde da natureza,
através das janelas, e tendo o canto dos pássaros como fundo musical, constituindo-
se em um respiradouro para os membros do grupo. Ocorreram uma vez por semana,
às sextas-feiras, devido ao menor fluxo de clientes, totalizando oito encontros com a
duração aproximada de uma hora. Os diálogos foram captados em fitas magnéticas
numeradas, transcritas e digitadas, contemplando as falas utilizadas pelos sujeitos
com a linguagem com a qual cada um expressou suas crenças, seus valores e
opiniões, acerca da assistência prestada aos clientes.

OPERACIONALIZAÇÃO DA PRÁTICA ASSISTENCIAL

A experiência vivenciada resultou desse processo dialógico com oito membros


da equipe de trabalho da unidade de oncologia, sujeitos desta prática assistencial,
cujas cinco fases da enfermagem fenomenológica foram relacionadas aos seguintes
passos do processo de enfermagem: Investigação – coleta de dados subjetivos e
objetivos sobre e com a equipe, por meio do diálogo, da observação das reações e
expressões de cada um dos participantes e da sua interação com o grupo. Foi possível
conhecer opiniões, acerca da assistência que vêm prestando aos clientes, dúvidas,
anseios e expectativas. Esta compreensão intuitiva do outro é necessária porque “a
enfermeira tem que fazer uso da sua intuição como pessoa e como profissional para
saber como agir da melhor forma possível em determinadas situações(9); Diagnóstico
– elaborado através do diálogo, do conhecimento de si e do outro, com a participação

41
de todos os sujeitos desse processo. A partir da constatação das necessidades do
grupo, dos problemas vividos, foi possível elaborar um plano de cuidados;
Planejamento e Implementação – descrição das metas a serem atingidas, conforme
os objetivos definidos junto com o grupo. As metas de bem-estar ou de vir a ser foram
atingidas pelo diálogo, através do encontro e da presença da enfermeira com a equipe.
Foi estabelecido como objetivo a ser atingido o fortalecimento do grupo, visando a
humanização da assistência aos clientes atendidos na unidade; e Avaliação – ocorreu
ao longo do desenvolvimento da prática assistencial, quando, ao final de cada
encontro, era realizada uma avaliação, no sentido de identificar se houve ou não
possíveis mudanças no comportamento dos membros da equipe, em relação à prática
cotidiana e a percepção de necessidades de alterações na prática assistencial, dentre
outros.

DESCREVENDO OS ENCONTROS E AS REFLEXÕES EMERGENTES

A partir da instrumentalização inicial, mediante leituras e aprofundamento


teórico, consolidou-se a preparação para conhecer os outros. O primeiro contato com
o grupo visou o conhecimento subjetivo e objetivo de seus membros. Neste encontro
inicial, compareceram sete dos oito integrantes do grupo, quando foi explicitado,
novamente, o objetivo dessa prática assistencial, deixando claro que a sua realização
só seria possível com a participação ativa de cada um. Alguns mostraram-se ansiosos
e inibidos, diante da gravação das suas falas. Buscou-se, então, estabelecer,
inicialmente, um diálogo descontraído, visando deixá-los mais à vontade para
expressarem suas opiniões.
Dentre os assuntos discutidos, estão àqueles relativos à importância das
reuniões da equipe, percebidas como espaços para o diálogo, troca de ideias,
experiências, discussão e reflexão acerca dos assuntos relativos à sua prática
cotidiana. Refletindo-se sobre a importância das reuniões e o seu potencial de
fortalecimento da equipe para alcançar os objetivos de humanização da assistência
ao paciente oncológico, partiu-se do pressuposto de que todos podem contribuir com
suas ideias e opiniões para a solução de problemas. Essa característica essencial do
trabalho em equipe faz com que as chances de êxito na resolução dos problemas
sejam maiores(10). Em outras palavras, as reuniões não devem ser realizadas,
apenas, para a cobrança do cumprimento de normas e rotinas da unidade ou para

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criticar o que está errado, mas devem servir para, a partir da identificação dos
problemas, levantar sugestões, visando chegar a soluções mais concretas. Também,
devem ser realizadas para elogiar, quando a equipe desempenha seu trabalho com
qualidade.
Assim, pode-se perceber que o trabalho em equipe pode liberar a criatividade
e a energia. As comunicações em equipes eficazes são, automaticamente, interativas;
as pessoas desenvolvem-se por meio das sugestões de outras, acrescentando novas
perspectivas que fazem com que a discussão evolua. Estas assertivas estão
contempladas nas reflexões sobre a importância do diálogo com o grupo, sobre o seu
fazer com uma perspectiva de melhoria na qualidade da assistência ao cliente
oncológico, caracterizadas pela seguinte fala:

O mais importante é que, através dessas reuniões, está se construindo uma


proposta de trabalho como início de um processo maior, onde irá se
desenvolver maior união entre o grupo. Esta união só vem em benefício do
paciente, pois, à medida que cada um ajudar o outro, melhor será o trabalho
da equipe (Cravo).

Houve o consenso de que a equipe já vinha prestando uma assistência com


bastante qualidade, embora reconheçam que sempre se pode melhorar, ou seja,
podemos buscar sempre “sermos mais”, em nossas atividades cotidianas,
complementada pelo entendimento de que a assistência humanizada corresponde a
uma forma ideal para tratar os clientes. A gente mostra que devemos tratar o paciente
com respeito e não passando, para ele, a impressão de que temos pena dele (Cravo).
Refletindo acerca da prática assistencial proposta e do fazer cotidiano, em
relação à humanização da assistência ao cliente oncológico, também houve o
consenso que é:

Um direito do cliente ser bem atendido, implicando reconhecê-lo como sujeito


e não como um mero objeto. [...] O que nos falta é o que a enfermeira está
nos propondo, de uma forma bastante inteligente, ou seja,
instrumentalizarmo-nos melhor, visando assistir melhor. [...] temos que fazer
exercícios, parar e refletir, pois isto é uma situação bastante nova. Tratarmos
as pessoas com humanidade não deve ser novo, não deveria ser novidade e
sim uma rotina em nossa prática profissional. Mas, como medir, como
identificar esta atuação da equipe, frente às pessoas, bem como sentir isto
como nós estamos sentindo, discutindo de uma forma coletiva? A realidade
nos coloca em cheque, no dia a dia, questões bem complexas (Girassol).

Uma questão vivenciada frequentemente em oncologia é a possibilidade da


ocorrência e do pressentimento constante de morte a que estão submetidos os

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clientes e familiares. Nesse sentido, surgiu o consenso de que se deve levar em conta
não somente suas necessidades biológicas, mas, principalmente, suas necessidades
espirituais decorrentes dessa situação.

Eu acho que a gente falha com a assistência, quando se trabalha visando,


apenas, a questão material, vendo o cliente como uma fonte de lucro, quando
não se trabalha a questão espiritual do ser humano. Eu percebo, em toda a
equipe, essa disponibilidade, essa boa vontade (Girassol).

Por sua vez, os pacientes que vivenciam a possibilidade de ocorrência da


morte, muitas vezes, imaginam-se na iminência de “perder tudo e todos que amam”
(12:93). Frente a esta possibilidade, pacientes e familiares recorrem à religiosidade
para superarem esse difícil momento de suas vidas. É necessário, portanto, que a
equipe reconheça a importância de fazer-se presente e atender também as
necessidades religiosas dos pacientes, conforme as especificidades de sua religião,
em qualquer momento, [pois] não só é uma necessidade como um direito do
paciente(13). A proximidade da morte não deve implicar o afastamento dos membros
da equipe de saúde tanto do próprio cliente como dos seus familiares.
Reportando-se a esta última fala, houve o questionamento sobre que
estratégias poderiam ser adotadas, no sentido de evitar atitudes desumanizantes,
impessoais, visualizando o paciente, apenas, como fonte de lucro. Com o objetivo de
incentivar o debate, foram trazidas, então, algumas reflexões sobre a natureza
humana dos membros da equipe e, por isso, ser impossível assumir uma postura,
apenas, de indiferença frente aos clientes, mas capaz de olhar para suas existências,
reconhecer suas unicidades, dando significado às suas experiências e à sua busca
de “ser mais”. Outro assunto que emergiu refere-se à união do grupo como resultado
para o melhor atendimento ao cliente. O relato, a seguir, reforça a importância desta
união como fator facilitador para a prestação do cuidado, dentro de uma visão
humanística.

A gente pode ver qual a dificuldade do colega. Numa passada de olhos,


verificar se está necessitando de ajuda. Isto pode vir em benefício de todos,
pois demonstra que estamos, neste grupo, tentando fazer o melhor trabalho
possível. Quando a gente se predispõe a fazer alguma coisa, tem que se
fazer com carinho, tem que ter a honestidade, a solidariedade como princípios
norteadores (Cravo).

A equipe, também, necessita de cuidados especiais, de atenção, visando


mantê-la forte e unida, pois, quando não dispõe da ajuda necessária para se proteger

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dos riscos do trabalho nem para usufruir recompensas, todo o tipo de problema pode
surgir como reuniões incômodas e destrutivas e o sentimento de decepção ou
desmotivação, cujos reflexos podem implicar baixa qualidade da assistência prestada.
Refletindo-se sobre o cuidado da própria equipe como uma exigência para cuidar dos
outros, foi evocado um estudo que buscou obter respostas a como se dá a
governabilidade na enfermagem, abordando o cuidado de si como exigência para o
cuidado do outro. Isto porque, para os membros da equipe reconhecerem no paciente
um ser humano e assim tratá-lo, precisam, também e num estágio anterior,
reconhecer-se e tratar-se como seres humanos. Como podemos falar em
humanização do paciente se, antes, não podemos constatar a presença de equipes
[...] humanizadas?
O diálogo vivo e o entrosamento entre os membros da equipe podem ser
considerados como um fenômeno que envolve a nutrição do bem-estar e do mais-ser
(7). Esta transação intersubjetiva entre a equipe se dá num evento vivo experiência
pelos participantes. A partir dessa prática assistencial, houve maior interação entre
eles e está passou a ser, cada vez mais, constante no seu cotidiano, como o atesta a
seguinte fala.

Apesar de trabalhar, há alguns anos, com pacientes oncológicos percebi que


houve um maior entrosamento entre a equipe, principalmente, com os
pacientes, procurando atendê-los melhor, dispensando mais atenção,
priorizando as suas necessidades de verbalizar suas dúvidas, em relação à
doença (Orquídea).

Assim, percebe-se que a assistência humanizada inclui o estar junto de forma


empática, ouvir, buscar a compreensão de necessidades, resgatando o entendimento
de uma situação existencial que transcenda ao somente assistir, dentro de uma visão
tradicional(9), provando com isso que, por mais que seja feito, sempre se pode fazer
melhor. Portanto, quanto mais conseguimos incluir de nós mesmos, mais
conseguimos estar abertos aos outros. Quanto mais conseguimos estar junto aos
outros, mais nos permitimos compartilhar com eles.
As discussões acerca do fazer cotidiano e a opção por uma assistência
humanizada, como consequente ampliação da perspectiva do cuidado, vendo o
cliente para além dos aspectos meramente físicos, prosseguiram nos demais
encontros. Esta perspectiva de realizar o cuidado, de maneira diferenciada, foi
identificada como uma possibilidade que vem ocorrendo de refletir sobre aquilo que

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se está fazendo, a partir da realização dos primeiros encontros desta prática
assistencial, como atesta a fala a seguir.

Esta semana, quando fui aplicar a quimioterapia num paciente, percebi que o
mesmo estava muito angustiado. Fiquei conversando com ele por
aproximadamente meia hora, antes de realizar a punção. Relatou-me que,
além da doença, estava vivenciando problemas familiares. Após a conversa,
percebi que o paciente estava menos tenso, quando, então, pude aplicar o
tratamento. [...] Depois das reuniões, tem sido melhor, porque percebemos
como é importante para o paciente ser bem atendido (Amor Perfeito).

Embora já houvesse o consenso de já estar sendo prestada uma assistência


diferenciada, houve a manifestação explícita do reconhecimento da importância dos
encontros até então realizados e suas repercussões no trabalho que vêm
desenvolvendo. Gastam-se alguns minutos a mais para estar com o cliente, mas
ganha-se em qualidade na assistência, representando maior ganho para todos.
Refletiu-se que esta é a diferença entre prestar uma assistência com qualidade ou,
simplesmente, realizada de forma mecânica, desconsiderando o cliente como um ser
semelhante a nós, que necessita, também, de atenção, de diálogo, de carinho. Nesse
processo reflexivo, emergiu, ainda, que o atendimento diferenciado ao cliente pode
ser prestado por qualquer membro da equipe, desde aquele que realiza as funções
mais elementares até aquele que realiza as mais complexas. Por exemplo, à medida
que quem realiza a limpeza do ambiente demonstrar sua disponibilidade ao cliente,
diante de suas necessidades, estará contribuindo para a melhoria da assistência
prestada a este mesmo cliente. Daí porque são importantes o diálogo e a interação,
em que as pessoas ouvem, riem, choram, contemplam, participam do dia-a-dia
demonstrando, cada um à sua maneira, sensibilidade à importância de cada um na
assistência. Esta possibilidade de ajuda mútua, de união do grupo está contemplada
na fala que se segue.

Eu acho que, de agora em diante, vai melhorar mais do que está. Acho que
estamos mais unidos, fazemos uns pelos outros, ajudando uns aos outros [...]
Eu gosto muito do meu trabalho, tenho muito amor ao serviço. Nós somos
uma pequena família (Rosa).

A equipe de trabalho da unidade de oncologia, mesmo sendo constituída de


pessoas com diferentes saberes, valores e histórias de vida, neste momento, vem
convergindo seu interesse em refletir, cada vez mais, acerca da assistência que vem
prestando aos clientes.

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Quanto mais tempo passamos juntos, mais unidos vamos ficar. O que
percebo como diferença de outros lugares em que já trabalhei é o coleguismo
que existe, aqui. Coleguismo mesmo. Quando qualquer um de nós apresenta-
se estressado, cansado, sempre tem alguém para ajudar, dizendo: não. Para
ai! Deixa que eu faço! Eu punciono a veia para ti e tu fazes outra coisa. Nos
outros lugares, não tem disso. Tu tens que fazer o teu serviço, embora,
estejas cansada, angustiada, estressada. Tens que fazer e pronto (Amor
Perfeito).

As experiências vividas, durante a realização dessa prática assistencial,


apontam para o fortalecimento do grupo como equipe, em que um vai dando suporte
ao outro na realização do seu fazer cotidiano, como tão bem exemplifica a seguinte
fala.

Aqui, nós somos todos unidos, nós ajudamos uns aos outros, formamos uma
família, trabalhamos em paz, o que, às vezes, a gente não tem em casa.
Muitas vezes, é domingo e a gente está louca para vir trabalhar (Amor
Perfeito).

Esse estar disponível para o outro, significa compartilhar as experiências


diárias, enfrentando as incertezas da vida cotidiana, reconhecendo necessidades e
lutas do outro como necessidades e lutas próprias, enfim, como parte do processo de
vida, como parte do processo de vida em família.

CONSIDERAÇÕES FINAIS

Durante o transcorrer do processo de reflexão coletiva com o grupo de trabalho


da unidade de oncologia, afloraram sentimentos que não eram percebidos ou, muitas
vezes, não manifestados no dia-a-dia de trabalho. Dentre eles, aqueles contemplados
nas falas apresentadas, a sensibilidade, o choro incontido, durante os depoimentos
de alguns membros do grupo, acerca do significado de seu trabalho na unidade.
Embora a assistência humanizada já fosse uma característica percebida como
presente no atendimento ao paciente oncológico, a observação calcada no marco
referencial construído possibilitou perceberem-se sob uma nova visão, como seres
humanos que, através do diálogo intersubjetivo experiência, podem utilizar seus
potenciais para estar melhor. O estabelecimento de uma relação dialógica, um estar
disponível, ouvir e falar oportunizaram a troca de conhecimentos, em que a nossa
presença autêntica de cuidadores possibilitou nos avançar em nossas reflexões.
Constatou-se que os profissionais que trabalham em oncologia estão expostos,
no cotidiano do seu trabalho, a situações geradoras de conflitos que, muitas vezes,

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são transferidos para as relações interpessoais. A partir da teoria humanística, pôde-
se interagir melhor com os membros dessa equipe, oferecendo um espaço para o
diálogo para que, desta forma, pudessem ser exteriorizados os sentimentos.
Acreditamos na importância desta prática tanto para nós, como enfermeiros, quanto
para a equipe de trabalho da unidade de oncologia porque reconhecemos que a
interação e o diálogo vivo podem ser utilizados como uma prática assistencial,
permitindo que se possa estabelecer e atingir objetivos compartilhados.

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BIBLIOGRAFIA

Fornés VJ. Actitudes del personal sanitário frente al cáncer: un estudio comparativo
entre estudiantes y profesionales de enfermería. Granada: Prensa Universitária; 1991.
135 p.

Gomes ES, Anselmo MEO, Lunardi Filho, WD. As reuniões de equipe como elemento
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Saúde. Ações de enfermagem para o controle do câncer. Rio de Janeiro: PRO-ONCO;
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Psiquiatria, Rio de Janeiro, mai./jun., 1980;29(3):199- 202.

Paterson JG, Zederad LT. Humanistic nursing. New York: National League for Nursing;
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Pessini LBC. Problemas atuais de bioética. 5ª ed. São Paulo: Edições Loyola; Centro
Universitário São Camilo, 1996. 527 p.

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