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Artigo publicado anteriormente nos Anais do XVIII Encontro da ANPU RJ /2018 – Encontro
Internacional
O debate em torno dos usos da razão, em fins do século XIX e inícios do século
XX, provocou inflexões no pensamento ocidental acerca da sua própria capacidade de
produzir conhecimento. Romper-se-ia, segundo Henry Kariel, a lógica da filosofia
política tradicional. Para Kariel, três pensadores seriam responsáveis por tais rupturas:
Nietzsche, Freud e Mannheim. A transição dos séculos esteve impregnada por
importantes mudanças no mundo civilizado pela racionalidade: a emergência do
proletariado (da massa); a tentativa de adequação da Igreja Católica às condições de
desigualdade social que faziam transparecer as contradições das questões sociais,
enquanto a expansão imperialista moldava as relações econômicas, sociais e políticas
mundiais sob a lógica do livre mercado. No início do século XX, alguns intelectuais,
críticos do que consideravam o ceticismo do século XIX, defendiam a possibilidade de
constituírem um novo pensamento capaz de recuperar a crença numa possível nova
síntese equilibrada e harmoniosa do conhecimento. Nesta perspectiva, punham-se contra
o pensamento liberal e comunista. Reivindicavam, ante ao cosmopolitismo e avanços
tecnológicos, a “rehumanização” do homem. Neste sentido, correntes intelectuais e
políticas que consideram a necessidade de uma “revolução espiritual”, tomariam forma
como condição alternativa às chamadas interpretações materialistas das possibilidades de
organização da humanidade. Este artigo pretende discutir o projeto integralista brasileiro
de Revolução espiritual, construindo um debate com as intercessões, contato ou rejeição
ao pensamento de Popper e outros intelectuais críticos do materialismo histórico, com a
“Doutrina do Sigma”.
Segundo Celeste Natário,
“O percurso intelectual do espiritualismo, em França, do
evolucionismo, em Inglaterra, do neo-Kantismo na Alemanha,
podem ter surgido com alguma tranquilidade. Acima de tudo, se
1
Professora do Departamento de História do Instituto de Ciências da Sociedade e Desenvolvimento
Regional da Universidade Federal Fluminense. Coordenadora do Laboratório de Estudos das Direitas e dos
Autoritarismos (LEDA/UFF) e do Laboratório de Estudos da Imanência e da Transcendência (LEIT/UFF.
para uns era a ciência e a técnica que deveriam dominar, para
outros o importante era a busca da interioridade do homem,
embora os meios pudessem divergir, desde a intuição ao sonho.
Schopenhauer, Nietzsche, Bergson, com pensamentos diferentes,
buscam uma compreensão da vida íntima e de um mundo que a história
da filosofia aproxima das posições vitalistas. Num plano de
historicismo e raciovitalismo surgem nomes como Ortega y Gasset e
William Dilthey, também a fenomenologia de Husserl e a metafísica de
Whitehead, Jaspers, Merleau-Ponty se encontram do lado da busca
interior” (NATÁRIO, 2008:118)
2
FAUSTO, Ruy. Marx, Lógica & Política. São Paulo: Brasiliense, 1983, p. 15. Apud KONDER,
Leandro. A Derrota da Dialética – a recepção das ideias de Marx no Brasil, até o começo dos anos 30. Rio
de Janeiro: Campus, 1988, p. 14.
Contrapondo-se aos determinismos que demarcariam o nascimento da História
como disciplina, os intelectuais do integralismo optaram por uma interpretação que,
porém, antimoderna, pois anti-iluminista, confrontava-se com o vir-a-ser idealizado de
uma “Quarta Humanidade” pelos integralistas brasileiros. Enquanto última etapa da
humanidade proposta pelo integralismo, pode-se interpretá-la como totalitária, no sentido
de integração doutrinária, enquanto ideia. Mas, não segundo os integralistas, já que não
coletivista em sua organização.
Embora movimento integrado à modernidade, já que “de massa”, refutava o
modelo da sociedade moderna considerando-o desumanizador no qual perder-se-ia a
espiritualidade para uma “mística” cosmopolita, coletivista, totalitária, em que, perdendo-
se o sentido da existência humana, seria perdido “o sentido da nossa finalidade”
(SALGADO, 1946:153).
Referências Bibliográficas:
POPPER, Karl. A Sociedade Democrática e seus inimigos. Belo Horizonte: Itatiaia, 1959.