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DIOCESE DE NOVA FRIBURGO – RJ

SEMINÁRIO DIOCESANO IMACULADA CONCEIÇÃO


TÓPICOS DE LITERATURA E CULTURA
Prof. Ivo da Costa do Rosário

Periodização da Literatura
Literatura Portuguesa

A literatura portuguesa, que abrange já oito séculos de produção, pode ser dividida em três longos
espaços de tempo, acompanhando as grandes transformações vividas pela Europa: Era Medieval, Era
Clássica, Era Romântica ou Moderna. Essas três grandes eras apresentam-se subdivididas em fases
menores, chamadas escolas literárias ou estilos de época.

Estilos de
Produção literária Panorama mundial Datação
época
Era Medieval

* Feudalismo
Cantigas de amor, de amigo, de
Trovadorismo * Teocentrismo 1189 (?)
maldizer, de escárnio
* Primeiras universidades

* Crise do feudalismo
* Historiografia de Fernão Lopes
Humanismo * Comércio 1434
* Teatro de Gil Vicente
* Antropocentrismo
Era Clássica

Quinhentismo * Renascimento
* Sá de Miranda
ou * Capitalismo mercantil 1527
* Camões
Classicismo * Reforma Protestante

Seiscentismo * Literatura dos padres * Mercantilismo


1580
ou Barroco * Pe. Antônio Vieira * Contra-Reforma

* Literatura neoclássica * Iluminismo


Setecentismo
* Arcádias * Revolução Industrial 1756
ou Arcadismo
* Bocage * Revolução Francesa
Era Romântica

* Almeida Garret
* Liberalismo burguês
Romantismo * Alexandre Herculano 1825
* Guerras napoleônicas
* Camilo Castelo Branco

* Socialismo
* Questão Coimbrã
* Positivismo
Realismo * Antero de Quental 1865
* Evolucionismo
* Eça de Queiroz
* 2ª Revolução Industrial

* Decadentismo
* Pré-Guerra
* Eugênio de Castro
Simbolismo * Freud e a psicanálise 1890
* Antônio Nobre
* Vanguardas artísticas
* Camilo Pessanha

* 1ª Guerra Mundial
* Revista Orpheu * Revolução Russa
Modernismo * Fernando Pessoa * Nazi-fascismo 1915
* Mário de Sá-Carneiro * 2ª Guerra Mundial
* Guerra Fria
Literatura Brasileira

A literatura brasileira tem sua história dividida em duas grandes eras, que acompanham a evolução
política e econômica do país, a Era Colonial e a Era Nacional, separadas por um período de transição, que
corresponde à emancipação política do Brasil. Vejamos:

Estilos de época Panorama mundial Panorama brasileiro Datação


Era Colonial

* Grandes Navegações * Literatura Informativa


Quinhentismo 1500
* Companhia de Jesus (Jesuítas) * Literatura dos Jesuítas

Seiscentismo ou * Contra-Reforma * Invasões holandesas


1601
Barroco * Portugal sob domínio espanhol * Grupo Baiano
* Iluminismo
* Ciclo da mineração
Setecentismo ou * Revolução Industrial
* Inconfidência Mineira 1768
Arcadismo * Revolução Francesa
* Grupo Mineiro
* Independência dos EUA
* Corte portuguesa no Rio de Janeiro
Período de
* Guerras Napoleônicas * Independência 1808
Transição
* Regências
Era Romântica

* 2º Império
Romantismo * Burguesia no poder * Guerra do Paraguai 1836
* Lutas abolicionistas
* Socialismo * Abolição
* Positivismo * República
Realismo/
* Evolucionismo * Romance realista 1881
Naturalismo
* 2ª Revolução Industrial * Romance naturalista
* Lutas antiburguesas * Poesia parnasiana

* Pré-Guerra
* Freud e a psicanálise * Governo de Floriano
Simbolismo/
* Vanguardas artísticas * Revolta da Armada 1893
Pré-Modernismo
* 1ª Guerra Mundial * Revolta de Canudos
* Revolução Russa

* Nazismo
* Ditadura de Vargas
* Fascismo
Modernismo * Semana de Arte Moderna 1922
* 2ª Guerra Mundial
* As gerações modernistas
* Guerra Fria

TROVADORISMO

Embora Portugal tivesse conhecido, na primeira época medieval, manifestações literárias na prosa e no teatro,
foi a poesia que alcançou grande popularidade, tanto entre os nobres das cortes quanto entre as pessoas comuns do
povo.
Uma das razões dessa predominância foi o fato de a escrita ser pouco difundida na época, o que favorecia a
difusão da poesia, que era memorizada e transmitida oralmente. Os poemas eram sempre cantados e
acompanhados de instrumentos musicais e de dança e, por esse motivo, foram denominados cantigas. Os autores
dessas cantigas eram trovadores (pessoas que faziam trovas, rimas), originando o nome Trovadorismo. Esses
poetas geralmente pertenciam à nobreza ou ao clero e, além da letra, criavam também a música das composições
que executavam para o seleto público das cortes. Entre as camadas populares, quem cantava e executava as
canções, mas não as criava, eram os jograis.
As cantigas chegaram até nós por meio dos cancioneiros, coletâncas (reuniões) de poemas de vários tipos,
produzidos por muitos autores. Os cancioneiros mais importantes são o Cancioneiro da Ajuda, compilado
provavelmente no século XIII; o Cancioneiro da Vaticana, provavelmente compilado no século XV; e o
Cancioneiro da Biblioteca Nacional ou Cancioneiro Colocci-Brancutti, compilado possivelmente no século
XIV.
Tradicionalmente se tem apontado a Cantiga da Ribeirinha ou Cantiga da Guarvaia, de Paio Soares de
Taveirós, de 1189 ou 1198, como a cantiga mais antiga de que se tem registro.
As cantigas foram cultivadas tanto no gênero lírico quanto no satírico. Dependendo de algumas características
que apresentam - como o eu lírico, o assunto, a estrutura, a linguagem, etc. -, elas podem ser organizadas em
quatro tipos. No gênero lírico: cantigas de amigo e cantigas de amor; no gênero satírico: cantigas de escárnio e
cantigas de maldizer.
CANTIGAS DO TROVADORISMO
LÍRICAS SATÍRICAS
DE AMOR DE AMIGO DE ESCÁRNIO DE MALDIZER
 amor do trovador pela mulher  O trovador coloca-se no lugar da  referências indiretas;  sátira direta;
amada; mulher que sofre pelo amado que  ironia;  maledicência;
 mulher idealizada; partiu;  ambigüidade  uso de palavras
 contemplação platônica;  mulher concreta-real; (vocabulário de obscenas ou de
 uso de “meu senhor”;  conversa com a natureza; duplo sentido); conteúdo erótico;
 sofrimento por amor;  popular - mulher camponesa;  não se revela o nome  citação nominal da
 vassalagem amorosa;  uso do termo “amigo” =  da pessoa satirizada. pessoa satirizada.
 amor cortês; namorado, amante, marido;
 estribrilho ou refrão.  paralelismo e refrão.

Canção da Ribeirinha
Segundo consta, esta cantiga teria sido inspirada em dona Maria Pais Ribeiro, a Ribeirinha, mulher
muito cobiçada e que se tornou amante de D. Sancho, o segundo rei de Portugal. A seguir, transcrevemos a
cantiga da forma como foi escrita. Veja, à direita, uma interpretação verso a verso.

No mundo non me sei parelha,


mentre me for' como me vai, No mundo ninguém se assemelha a mim (parelha: semelhante)
ca ja inoiro por vós - e ai enquanto a minha vida continuar como vai
mia senhor branca e vermelha, porque morro por vós, e ai
queredes que vos retraia minha senhora de pele alva e faces rosadas,
quando vos eu vi en saia! quereis que vos descreva (retrate)
Mao dia me levantei, quando vos eu vi sem manto (saia: roupa íntima)
que vos enton non vi fea! Maldito dia! me levantei
que não vos vi feia (ou seja, a viu mais bela)
E, mia senhor, des aquel di', ai!
me foi a mi muin mal, E, minha senhora, desde aquele dia, ai
e vós, filha de don Paai tudo me foi muito mal
Moniz, e ben vos semelha e vós, filha de don Pai
d'aver eu por vós guarvaia, Moniz, e bem vos parece
pois eu, mia senhor, d'alfaia de ter eu por vós guarvaia (guarvaia: roupa luxuosa)
nunca de vós ouve nem ei pois eu, minha senhora, como mimo (ou prova de amor)
valia d'ua correa. de vós nunca recebi
algo, mesmo que sem valor. (correa: coisa sem valor)
(Paio Soares de Taveirós)

Leia, como exemplo, outra cantiga, escrita por D. Dinis, rei de Portugal que viveu entre 1261 e 1325.

Perguntar-vos quero por Deus,


Senhor fremosa, que vos fez Vocabulário
mesurada e de bon prez, senhor: senhora.
que pecados foron os meus
que nunca tevestes por ben Fremosa: formosa, bonita.
de nunca mi fazerdes ben. mesurada; comedida.
Pero sempre vos soub' amar, bon prez: honrada.
des aquel dia que vos vi,
mays que os meus olhos en mi, foron: foram.
e assy o quis Deus guisar,
pero: já que, porém,
que nunca tevestes por ben
de nunca mi fazerdes ben. des: desde.

Des que vos vi, sempr' o mayor mays: mais.


ben que vos podia querer
Mi: mim.
vos quigi, a todo meu poder,
e pero quis Nostro Senhor auy: assim.
que nunca tevestes por ben
de nunca mi fazerdes ben. guisar: decidir, preparar.
quigi: dei, dediquei.
Mays, senhor, ainda con ben
se cobraria ben por ben. a todo meu poder: de todo meu coração.
* Leia, a seguir, uma cantiga de amigo do trovador Fernando Esguio, que viveu entre os séculos XIII e XIV.

Vaiamos, irmãa, vaiamos dormir Seu arco na mãao as aves ferir,


(en) nas ribas do lago, u eu andar vi a las que cantavam leixa-las guarir,
a las aves meu amigo. a las aves meu amigo.

Vaiamos, irmãa, vaiamos folgar Seu arco na mãao as aves tirar,


nas ribas do lago, u eu vi andar a las que cantavam non nas quer matar,
a las aves meu amigo. a las aves meu amigo.

En nas ribas do lago, u eu andar vi, Vocabulário:


arco na mãao as aves ferir, amigo: namorado.
a las aves meu amigo. folgar: descansar, divertir-se.
En nas ribas do lago, u eu vi andar, vaiamos: vamos.
u: onde.
arco na mãao a las aves tirar, tirar: atirar.
a las aves meu amigo. leixa-las guarir:deixava-as salvar-se.
irmãa: irmã.

1. Na cantiga, quem fala (o eu lírico) é uma moça que se dirige a uma irmã, fazendo-lhe um convite.

a) Que tipo de convite é feito?


b) O lugar aonde pretende ir é um ambiente rural ou urbano?

2. Na época, era comum as pessoas irem à beira do lago, nas tardes quentes, para refrescar-se. Nessa cantiga,
entretanto, é possível depreender outro interesse por parte do eu lírico. Interprete: qual é esse interesse?

3. Ao referir-se ao namorado, o eu lírico destaca as qualidades da pessoa amada, especialmente sua bondade.
Explique: em que consiste essa bondade?

4. As cantigas de amigo, em grande parte, apresentam uma estrutura paralelística, isto é, uma construção
formal baseada na repetição parcial ou total de versos. Observe que a 1ª e a 2ª estrofes são quase idênticas,
com a diferença da troca de dormir (1º verso da 1ª estrofe) por folgar (1º verso da 2ª estrofe). Essas
repetições, que se chamam paralelismo de par de estrofes, também ocorrem entre os pares seguintes de
estrofes? Justifique com partes do próprio texto.

5. A repetição constante de versos confere maior ritmo e musicalidade ao texto. Por outro lado, confere
também:

a) maior profundidade de idéias e sentimentos.


b) maior superficialidade de idéias e sentimentos.

Cantigas de escárnio

A cantiga de escárnio apresenta críticas sutis e bem-humoradas acerca de uma pessoa que é
facilmente reconhecível pelos demais elementos da sociedade.
Há também cantigas de escárnio em que o poeta satiriza a obra de outro trovador. Vejamos um
exemplo de cantiga de escárnio.

Pero me vós, donzela, mal queredes, as feituras e o cós que avedes.


por que vos amo, conselhar-vos-ei
que, pois vos vós entoucar non sabedes, Vocabulário:
que façades quanto vos eu direi: entoucar- pentear ou colocar touca.
buscades quen vos entouque melhor correja: corrija.
e vos correja, polo meu amor, feituras do cós: formas do corpo.
avedes: tereis, havereis.

Cantigas de maldizer

Faz-se na cantiga de maldizer, uma crítica pesada, com intenção de ofender a pessoa ridicularizada.
Há o uso de palavras grosseiras (palavrões, inclusive) e cita-se o nome ou o cargo da pessoa sobre quem se
faz a crítica. Leia este exemplo:

Meu senhor arcebispo, and'eu escomungado, Porque fiz lealdade; enganou-m'i o pecado.
Soltade-m’, ai, senhor, e dei-o a seu don', e ei medo da morte.
e jurarei, mandado, que seja traedor. Soltade-m’, ai, senhor,
e jurarei, mandado, que seja traedor.
Se traiçon fezesse, nunca vo-la diria;
mais fiz lealdade, vel por Sancta Maria, Vocabulário:
Soltade-m’, ai, senhor, arcebispo: arcebispo de Braga.
e jurarei, mandado, que seja traedor. porque fiz lealdade: porque me mantive fiel ao juramento (fala o
alcaide do castelo).
enganou-m'i o pecado: o demônio tentou-me.
Per mia malaventura tive un castelo en Souza vel: ai!
e dei-o a seu don’, e tenho que fiz gran cousa: soltade-m': libertai-me da excomunhão.
Soltade-m’, ai, senhor, mandado: obediente.
e jurarei, mandado, que seja traedor. Sousa: local do qual derivou o nome de uma família importante.
don: D. Sancho II.
tenho que fiz gran cousa: creio que cometi pecado.
Por meus negros pecados, tive un castelo forte

Nessa cantiga, o eu lírico é um homem que pergunta à mulher amada por que ela não corresponde a
seus sentimentos. Teria ele infringido alguma regra do jogo amoroso? O texto assume, assim, uma nítida
intenção argumentativa, já que o desejo do eu lírico é convencer a mulher amada a aceitar seu amor.

Cantiga, de D. Dinis
Un tal ome* sei eu, ai ben-talhada*, eu, mia dona.
que por vós ten a sa* morte chegada;
vedes quen é seed'en nembrada*; Vocabulário:
eu, mia dona. amo: homem.
ben-talhado: bem-feita, formosa.
Un tal ome sei eu que preto* sente sa: sua.
de si morte chegada certamente; seed'en nembrado: não vos esqueçais; lembrai-vos.
preto: perto.
vedes quen é e venha-vos em mente*: venho-vos em mente: tende em mente; lembrai-vos
eu, mia dona. aquest'oíde: ouvi isto; a expressão tem a função de chamar a
atenção da mulher.
Un tal ome sei eu: aquest'oíde*: morr': morre.
que por vós morr'* e vo-lo en partide*; vo-lo en partide: vós o afustais de vós, no sentido de “deixá-lo
vedes quen é e non xe vos obride*: partir”, “afastar-se”.
nom xe vos obride: não vos esqueçais dele.

* Escreva (1) para cantiga de amor e (2) para cantiga de amigo:

( ) eu-lírico masculino ( ) linguagem mais simples ( ) mulher casada


( ) amor platônico ( ) busca de musicalidade ( ) composições com diálogos
( ) mulher socialmente superior ( ) cantigas de maestria, sem refrão ( ) vassalagem amorosa
( ) eu-lírico feminino ( ) cantigas com paralelismo ( ) relação amorosa verdadeira
( ) temática variada ( ) cantigas de refrão

* Leia:

“Ai, flores, ai flores do verde ramo


se sabedes1 novas do meu amado?
Ai, Deus, e u2 é?

# Os versos acima pertencem a uma cantiga de _______________, característica do Trovadorismo Português,


estética literária dos séculos XII, XIIIe XIV.

* Amor, desamor e ciúme; freqüente inspiração na vida popular, bem como a exploração do eu feminino
indicam cantigas de:

( ) amigo
( ) amor e amigo
( ) amor
( ) escárnio
( ) maldizer

* Leia os textos a seguir:


1
Sabedes = sabeis
2
u = onde
Textos 1: Texto 2:      Tradução do texto 2:
Ai, dona fea, foste-vos queixar 
porque vos nunca louv’-en meu trobar  Ai, dona feia, foste-vos queixar
Vi eu, mia madr’, andar 
mais ora quero fazer un cantar        que nunca vos louvo em meu cantar;
as barcas eno mar: 
en que vos loarei toda via (1),        mas agora quero fazer um cantar
e moiro-me d’amor.
e vedes como vos quero loar       em que vos louvares de qualquer
 
dona fea, velha e sandia (2).  modo;
Fui eu, madre, veer 
      e vede como quero vos louvar
as barcas eno ler (1): 
Ai dona fea! se Deus me perdon!        dona feia, velha e maluca!
e moiro-me d’amor.
e pois havedes tan gran coraçon 
que vos eu loe en esta razon (3),        Dona feia, que Deus me perdoe,
As barcas eno mar 
vos quero já loar toda via,        pois tendes tão grande desejo
a foi-las aguardar: 
e vedes qual será a loaçon:        de que eu vos louve, por este motivo
e moiro-me d’amor
dona fea, velha e sandia!        quero vos louvar já de qualquer
 
modo;
As barcas eno ler 
Dona fea, nunca vos eu loei        e vede qual será a louvação:
E foi-las atender (2)  
en meu trobar, pero (4) muito trobei;        dona feia, velha e maluca!
e moiro-me d’amor
mais ora já um bom cantar farei 
en que vos loarei toda via;        Dona feia, eu nunca vos louvei
E foi-las aguardar 
e direi-vos como vos loarei:        em meu trovar, embora tenha
e non o pud’achar: 
dona fea, velha e sandia! trovado muito;
e moiro-me d’amor.
      mas agora já farei um bom cantar;
        (João Garcia de Guilhade)       em que vos louvarei de qualquer
      (Nuno Fernandes Torneol) 1. para sempre; modo;
2. louca, demente;         e vos direi como vos louvarei:
   1. praia;  3. que eu a louve por este motivo;
4. porém, todavia.
      dona feia, velha e maluca!
2. esperar.
 

* Classifique as duas cantigas acima;


 
II. Leia a cantiga a seguir
 
“Rui Queimado morreu con amor
en seus cantares, por Sancta Maria
por  ua dona que gran ben queria,
e, por se meter por mais trovador,
porque lh’ela non quis [o] ben fazer(1),
fez - s’el  en seus cantares morrer,
mas ressurgiu depois ao tercer dia!
Esto fez el por ua sa senhor
que quer gran ben, e mais vos en diria:
porque cuida que faz i maestria (2),
enos cantares que fez sabor(3)
de morrer i e desi d’ar viver (4);
esto faz el que x’o pode fazer,
mas outr’omem per ren non [n] o faria.
E non há já de sa morte pavor,
senon sa morte mais la temeria,
mas sabede ben, per sa sabedoria,
que viverá, des quando morto for
e faz - (s’) en seu cantar morte prender,
desi ar viver: vede que poder
que lhi Deus deu, mas que non cuidaria.
E, si mi Deus a mim desse poder,
qual oi’el há, pois morrer, de viver,
jamais morte nunca temeria.
 
1. porque ela não lhe quis atender as súplicas;
2. porque ele imagina que tem talento;
3. a gosto, satisfeito;
4. de aí morrer e, mais tarde, reviver.
 
1) A cantiga anterior é de autoria de Pedro Maria Burgalês. Por suas características e conteúdo, ela é uma cantiga:
a) de amigo;
b) de escárnio;
c) de amor;
d) de maldizer;
e) n.d.a.
2) Fazem parte da prosa trovadoresca em Portugal:

a) as hagiografias e as cantigas de maldizer;


b) os livros de linhagem e os cronicões;
c) as novelas de cavalaria e os romances;
d) os cronicões e as crônicas;
e) os livros de linhagem e os sonetos.
3) Assinale a alternativa incorreta:

a) Na cantiga de amigo, o “eu-lírico” feminino lamenta a ausência do amigo distante;


b) Na cantiga de escárnio, a sátira é feita indiretamente e usam-se a ironia e as ambigüidades;
c) Na cantiga de maldizer, o erotismo pode estar presente;
d) Na cantiga de amor, o apelo erótico é purificado e ocorre a idealização do amor;
e) Na cantiga de amigo, usa-se o refrão, mas não existe paralelismo.
 
4) Classifique as cantigas abaixo:

     Ondas do mar de Vigo,       Se vistes meu amado,


      se vistes meu amigo?       por que ei gram coidado?       Acaso vistes meu amigo
      E ai Deus, se verra cedo!       E ai Deus, se verra cedo!       aquele por quem suspiro?
      Queira Deus que ele venha cedo!
      Ondas do mar levado,       Ondas do mar de Vigo,
      se vistes meu amado?       acaso vistes meu amigo?       Acaso vistes meu amado,
      E ai Deus, se verra cedo!       Queira Deus que ele venha cedo!       por quem tenho grande cuidado
(preocupado) ?
      Se vistes meu amigo,       Ondas do mar agitado,       Queira Deus que ele venha cedo!
      o por que eu sospiro?       acaso vistes meu amado?
      E ai Deus, se verra cedo!       Queira Deus que ele venha cedo!

*********************************

Ai flores, ai flores do verde pino,


se sabedes novass do meu amigo!
Ai Deus, e u é?

Ai flores, ai flores do verde ramo,


se sabedes novas do meu amado!
Ai Deus, e u é?

Se sabedes novas do meu amigo,


aquel que lmentiu do que pôs comigo!
Ai Deus, e u é?

Se sabedes novas do meu amado,


aquel que mentiu do que mi á jurado!
Ai Deus, e u é?

- Vós me preguntades polo voss’amado,


e eu bem vos digo que é san’e vivo.
Ai Deus, e u é?
Vós me preguntades polo voss’amado,
e eu bem vos digo que é viv’e sano.
Ai Deus, e u é?

E eu bem vos digo que é san’e vivo


e seera vosc’ant’o prazo saído.
Ai Deus, e u é?

E eu bem vos digo que é viv’e sano


e seera vosc’ant’o prazo passado.
Ai Deus, e u é?

     
Explicações
      pino: pinheiro
      novas: notícias
      e u é?: e onde ele está?
      do que pôs comigo: sobre aquilo que combinou comigo (isto é, o encontro sob os pinheiros)
      preguntades: perguntais
      polo: pelo
      que é san’e vivo: que está são (com saúde e vivo)
      e seera vosc’ant’o prazo saído (passado): e estará convosco antes de terminar o prazo combinado

Quer’eu em maneira de proença!       Quero à moda provençal


      fazer agora um cantar d’amor       fazer agora um cantar de amor,
      e querrei muit’i loar lmia senhor       e quererei muito aí louvar minha senhora
      a que prez nem fremosura nom fal,       a quem honra nem formosura não faltam
      nem bondade; e mais vos direi ém:       nem bondade; e mais vos direi sobre ela:
      tanto a fez Deus comprida de bem       Deus a fez tão cheia de qualidades
      que mais que todas las do mundo val.       que ela mais que todas do mundo.
      Ca mia senhor quizo Deus fazer tal,       Pois Deus quis fazer minha senhora de tal modo
      quando a faz, que a fez sabedord       quando a fez, que a fez conhecedorad
      e todo bem e de mui gram valor,       e todo bem e de muito grande valor,
      e com tod’est[o] é mui comunal       e além de tudo isto é muito sociável
      ali u deve; er deu-lhi bom sém,       quando deve; também deu-lhe bom senso,
      e desi nom lhi fez pouco de bem       e desde então lhe fez pouco bem
      quando nom quis lh’outra       impedindo que nenhuma outra fosse igual a ela
      foss’igual       Porque em minha senhora nunca Deus pôs mal,
      Ca mia senhor nunca Deus pôs mal,       mas pôs nela honra e beleza e mérito
      mais pôs i prez e beldad’e loor       e capacidade de falar bem, e de rir melhor
      e falar mui bem, e riir melhor       que outra mulher também é muito leal
      que outra molher; desi é leal       e por isto não sei hoje quem
      muit’, e por esto nom sei oj’eu quem       possa cabalmente falar no seu próprio bem
      possa compridamente no seu bem       pois não há outro bem, para além do seu.
      falar, ca nom á, tra-lo seu bem, al.

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   De vós, senhor, quer’eu dizer verdade       Sobre vós, senhora, eu quero dizer verdade
      e nom ja sobr’[o] amor que vos ei:       e não já sobre o amor ue tenho por vós:
      senhor, bem [moor] é vossa torpicidade       senhora, bem maior é vossa estupidez
      de quantas outras eno mundo sei;       do que a de quantas outras conheço no mundo
      assi de fea come de maldade       tanto na feiúra quanto na maldade
      nom vos vence oje senom filha dum rei       não vos vence hoje senão a filha de um rei
      [Eu] nom vos amo nem me perderei,       Eu não vos amo nem me perderei
      u vos nom vir, por vós de soidade[...]       de saudade por vós, quando não vos vir.

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