Você está na página 1de 4

Trovadorismo

Trovadorismo é um estilo de época surgido na Idade Média. Nesse período histórico,


predominava o teocentrismo (a ideia de que Deus é o centro de tudo), pois a Igreja Católica,
com poderio econômico e político, exercia total domínio no Ocidente. Nesse contexto, surgiram
as cantigas trovadorescas ou provençais. São elas: cantigas de amor, de amigo, de escárnio e
de maldizer.

As cantigas de amor tinham como tema o sofrimento amoroso. As de amizade cantavam a


saudade do ser amado. Já as cantigas satíricas demonstravam a ousadia do trovador ao
criticar a sociedade da época, em que o livre pensamento era combatido pela Igreja. Assim, na
Europa, houve muitos trovadores cujas obras chegaram até nós, como as cantigas dos
trovadores portugueses Dom Dinis e João Garcia de Guilhade, entre outros.

Contexto histórico do trovadorismo

A Idade Média foi um período histórico que durou de 476 a 1453. A sociedade medieval estava
dividida entre clero, nobreza e povo. No entanto, a Igreja Católica era detentora de poder
político e econômico no Ocidente. Nessa época, portanto, predominou o teocentrismo — a
ideia de que Deus é o centro de tudo.

No período medieval, a maioria da população era analfabeta, a escrita e a leitura estavam


restritas ao clero e a alguns nobres. Os livros eram muito caros, pois a reprodução das obras
era feita por copistas, elas eram manuscritas. Além disso, devido à influência católica, a maior
parte da arte produzida nesse período era de cunho religioso.

A Europa estava imersa em uma guerra santa entre cristãos e muçulmanos (mouros) — as
Cruzadas. Além disso, o Tribunal do Santo Ofício torturava e condenava à fogueira aqueles
que se opunham ao que era imposto pela Igreja.

Características do Trovadorismo

Nesse contexto, em que a liberdade artística e de pensamento eram restringidas pelo clero,
surgiu o Trovadorismo, movimento literário medieval caracterizado por uma “poesia cantada”,
as chamadas cantigas trovadorescas. Elas são assim classificadas: de amor, de amigo, de
escárnio e de maldizer.

Tais composições eram cantadas pelo trovador (troubadour, como era chamado o poeta
provençal), daí o termo “trovadoresco”. Assim, as cantigas trovadorescas podem ser chamadas
também de cantigas provençais. Isso porque foi na Provença, no Sul da França, que esse tipo
de arte surgiu, no século XI, devido a um clima de maior independência em relação à Igreja.

A poesia trovadoresca, portanto, possui uma vertente lírico-amorosa (as cantigas de amor e de
amigo) e outra satírica (as cantigas de escárnio e de maldizer). Na primeira, predominam os
temas do sofrimento amoroso e da saudade. Na segunda, são feitas críticas a pessoas ou
costumes, algo bastante ousado em uma época de repressão ao livre pensamento.

Trovadorismo em Portugal

Portugal separou-se do reino de Leão e Castela em 1140. Assim, tornou-se um país


independente. O galego-português era o idioma falado então. Com o novo Estado formado,
surgiu também a literatura portuguesa. Possivelmente, a Cantiga da Ribeirinha é o texto que
inaugurou a literatura portuguesa em 1198.

Os trovadores cantavam o amor e a saudade, mas também faziam críticas à sociedade


portuguesa.

Cantigas do Trovadorismo
As cantigas trovadorescas ou provençais são divididas em quatro tipos; cada um com
características específicas. Assim, temos:

1 - Cantigas de amor
Manifestam uma paixão infeliz, um amor não correspondido do trovador pela sua dama;
A mulher é tratada como superior, a partir de adjetivos tais como “dona” e “senhora”, e seu
nome jamais é revelado pelo trovador;
O eu lírico é sempre masculino;
A dama, a “senhora”, é membro da corte;
O trovador se diz coitado, cativo, enlouquecido, sofredor;
A dama é identificada por suas qualidades físicas, morais e sociais; portanto é uma mulher
idealizada;
Muitas cantigas apresentam refrão.

2 - Cantigas de amigo
A temática desse tipo de cantiga é a saudade;
Evidenciam a relação amorosa concreta entre pessoas do campo;
O eu lírico é sempre feminino;
A mulher (amiga) manifesta saudade pela ausência do amigo (namorado ou amante);
Quem compõe as cantigas é um homem, o trovador, que cria um eu lírico feminino;
O cenário sempre caracteriza um ambiente campesino;
Além da mulher e seu “amigo”, outros personagens podem aparecer, como mães, amigas,
irmãs;
Apresentam refrão.

3 - Cantigas de escárnio
Críticas ao comportamento social;
Palavras de duplo sentido;
Ironias e trocadilhos;
Sem identificação direta da pessoa atacada.

A seguir, um trecho de uma cantiga de escárnio de João Garcia de Guilhade. Note que o
trovador não menciona o nome da mulher que é objeto da ofensa, a qual é chamada de “dona
feia”:

Ai dona fea, fostes-vos queixar


que vos nunca louv’en[o] meu cantar;
mais ora quero fazer um cantar
em que vos loarei todavia;
e vedes como vos quero loar:
dona fea, velha e sandia!
Ai dona feia, fostes-vos queixar
que vos nunca louvei em meu cantar;
mas agora quero fazer um cantar
em que vos louvarei ainda;
e vedes como vos quero louvar:
dona feia, velha e idiota!

4 - Cantigas de maldizer
Críticas feitas explicitamente, com identificação da pessoa satirizada;
Linguagem ofensiva e palavrões.

Note que, na cantiga de maldizer seguinte, de Afonso Anes do Cotom, a pessoa ofendida é
nomeada – Urraca López:

A ũa velha quisera trobar


quand’em Toledo fiquei desta vez;
e veo-me Orraca López rogar
e disso-m’assi: — Por Deus que vos fez,
nom trobedes a nulha velh’aqui
ca cuidarám que trobades a mim.
A uma velha quisera trovar
quando em Toledo fiquei desta vez;
e veio-me Urraca López rogar
e disse-me assim: — Por Deus que vos fez,
não troveis a nenhuma velha aqui
pois acharão que trovastes para mim.

Resumo

O Trovadorismo é um movimento literário medieval;


A Idade Média foi um período histórico que durou de 476 a 1473;
Nessa época, a Igreja Católica era detentora de poder político e econômico;
No período medieval, predominou o teocentrismo, a ideia de que Deus é o centro de tudo;
A maioria da população medieval era analfabeta;
Somente o clero e alguns nobres sabiam ler e escrever durante esse período;
Os trovadores compunham cantigas de amor, de amigo, de escárnio e de maldizer;
O sofrimento amoroso do eu lírico é o tema das cantigas de amor;
Nas cantigas de amigo, a temática é a saudade;
As cantigas satíricas medievais são as cantigas de escárnio e de maldizer;
O texto Cantiga da Ribeirinha inaugurou a literatura portuguesa;
Dom Dinis e João Garcia de Guilhade são alguns dos principais trovadores portugueses.

Exercício

Questão 1 - Leia a seguir uma cantiga de Pero Gonçalves de Portocarreiro, adaptada ao


português atual:

Por Deus, coitada vivo:


pois não vem meu amigo;
pois não vem, que farei?
meus cabelos, com sirgo
eu não vos liarei

Pois não vem de Castela,


não é vivo, ai mazela,
ou detém-no o rei:
minhas toucas de Estela,
eu não usarei.

Ainda que eu pareça alegre,


não me sei dar conselho;
amigas, que farei?
em vós, ai meu espelho,
eu não me verei.

Estas doas muito belas,


ele me deu, ai donzelas,
isso não negarei;
minhas cintas das fivelas,
eu não vos cingirei.

Vocabulário

Sirgo: fita de seda, símbolo da mulher casada ou comprometida.


Liarei: prenderei.
Estela: cidade da Espanha famosa pelas toucas feitas ali.
Doas: presentes.
Cingir: envolver, cercar, rodear.
De acordo com as características dessa cantiga, ela pode ser assim classificada:
a) Cantiga de amor
b) Cantiga de amigo
c) Cantiga de escárnio
d) Cantiga de maldizer

Questão 2 - Leia o texto a seguir:

Mha senhor, com’oje dia son,


Atan cuitad’e sen cor assi!
E par Deus non sei que farei i,
Ca non dormho á mui gran sazon.
Mha senhor, ai meu lum’e meu ben,
Meu coraçon non sei o que ten.

Noit’e dia no meu coraçon


Nulha ren se non a morte vi,
E pois tal coita non mereci,
Moir’eu logo, se Deus mi perdon.
Mha senhor, ai meu lum’e meu bem,
Meu coraçon non sei o que ten.

Des oimais o viver m’é prison:


Grave di’aquel em que naci!
Mha senhor, ai rezade por mi,
Ca perç’o sen e perç’a razon.
Mha senhor, ai meu lum’e meu ben,
Meu coraçon non sei o que ten.

Essa é uma cantiga feita por Manuel Bandeira, um poeta modernista brasileiro. Nesse poema,
ele recria a escrita trovadoresca medieval. A partir de versos como “Meu coraçon non sei o que
ten” e “E pois tal coita non mereci”, é possível concluir que o título desse poema é:

a) Cantar de amor.
b) Cantar de amigo.
c) Cantar de escárnio.
d) Cantar de maldizer.

Questão 3 - Leia a primeira estrofe de uma cantiga satírica de Dom Dinis, adaptada ao
português atual:

Quando outro dia esteve sentado Dom Fulano,


em mim começou grande aborrecimento crescer
de muitas coisas que lhe ouvi dizer
Disse ele: — Irei, pois já se vão deitar.
E disse eu: — Boa sorte achaste,
porque irás e me deixarás.
[...]

Após a leitura, é possível concluir que esse texto é parte de uma cantiga de escárnio, uma vez
que:
a) demonstra o sofrimento do eu lírico no verso “em mim começou grande aborrecimento
crescer”.
b) demonstra saudade do eu lírico no verso “porque irás e me deixarás”, em referência ao
misterioso “amigo”.
c) não há identificação da pessoa a quem o eu lírico critica, pois ela é chamada de “Dom
Fulano”.
d) não há a identificação do trovador no texto, o que mostra sua sutileza ao fazer a sua crítica.

Você também pode gostar