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Estudo do mecanismo de difusão no processo de

obtenção do acetileno

Daniella Stepheny Carvalho Andrade1, Maria Alice Melo Pinheiro1,


Nickolly Bukkyo Vieira Serafim1
1
Programa de pós-graduação em Engenharia Química, Centro de Tecnologia e
Geociências, Universidade Federal de Pernambuco

Resumo

Parâmetros que envolvem o mecanismo de difusão são fatores que influenciam no


processo de obtenção do acetileno e a busca pela melhor rota de processo é
sempre desejada pela indústria transformadora. Este trabalho teve como objetivo
obter os parâmetros de difusão que ocorrem na obtenção do acetileno em processo
de catálise em uma partícula sólida porosa, assim como estimar o módulo de Thiele
possibilitando verificar se o processo opera em regime químico ou difusivo. Para a
obtenção dos perfis de concentração e outros parâmetros, fez-se uma série de
hipóteses sobre o sistema avaliado como que o mesmo opera em regime de
escoamento estacionário, em temperatura constante, e que ocorre difusão de
Knudsen nos poros de geometria cilíndrica dentro da partícula. A análise dos
resultados obtidos permitiu estimar o módulo de Thiele (φ) e o número de Biot (Bi).
Verificou-se que a reação química é a etapa controladora do processo e que a
resistência externa tem grande influência sobre a difusão do processo.

PALAVRAS-CHAVE: Acetileno. Difusão. Partícula porosa. Módulo de Thiele.


1. Introdução

O acetileno é um hidrocarboneto de grande importância para a indústria


química. Sua aplicação se estende desde o corte a soldagem de materiais
metálicos, em iluminação de áreas remotas, na utilização como matéria prima para a
produção de compostos orgânicos, tais como acetona, ácido acético e álcool etílico
(CENTURION, 2003; SCHOBERT, 2013).
O surgimento de diversas aplicações após o conhecimento dos fluxos
gasosos na escala macro, micro e nano têm estimulado estudos dos fluxos de gases
nos últimos anos. Diversos parâmetros podem ser utilizados para caracterizar fluxos
gasosos, dentre eles existe o número de Knudsen que avalia a difusão de um fluido
dentro de um solido poroso relacionando o livre caminho médio entre as moléculas e
o diâmetro dos poros[ CITATION Sza15 \l 1046 ][ CITATION Bir02 \l 1046 ][ CITATION Jam08 \l
1046 ].
O módulo de Thiele (φ) é parâmetro que permite avaliar a transferência de
massa e a reação química em um catalisador poroso, relacionando a taxa de reação
com a difusão. Portanto, através do módulo de Thiele é possível verificar se o
processo opera em regime químico ou em regime difusivo. [ CITATION Bir02 \l 1046 ]
[ CITATION Jam08 \l 1046 ].
Em uma partícula sólida sempre existirá uma camada de fluido estagnado,
também chamado de filme, que exerce resistência à transferência de massa
influenciando na concentração da espécie que alcança de forma efetiva na
superfície do sólido. O número de Biot é um parâmetro que permite avaliar o efeito
da transferência de massa externa no processo difusivo [ CITATION Bir02 \l 1046 ]
[ CITATION Jam08 \l 1046 ].
Em gases multicomponentes o fenômeno da difusão é mais complexo do que
para misturas binárias. McCormack (1973) desenvolveu um modelo cinético
linearizado para estudo de gases ternários (três componentes) acionados por
pressão e fração molar em longos tubos. Szalmas (2015) calculou o coeficiente de
difusão, de fluxo térmico e da velocidade viscosa para a mistura He-Ar-Xe em uma
partícula esférica [ CITATION Sza15 \l 1046 ]. Keyes reportou sobre a difusão de misturas
ternárias gasosas tendo como componentes o hidrogênio e o nitrogênio visando
aplicação na separação dos gases por atmólise [ CITATION JJK57 \l 1046 ].
A difusão com reação química entre as espécies tem grandes aplicações no
tratamento da poluição na água e no ar, em isolamentos fibrosos, craqueamento de
espécies, fluxos atmosféricos e muitos outros problemas de engenharia química
[ CITATION Bha11 \l 1046 ].
Uma reação química ocorre nos sítios ativos de um catalisador poroso após a
difusão do soluto para dentro da partícula e deve-se considerar o sistema como
pseudohomogêneo, apreciando a área efetiva dos poros. Se um sólido poroso
apresenta área interna maior ou da mesma magnitude de sua área externa,
considera-se que a mistura de gases, após atingir a superfície da partícula, difunda
no interior da partícula para depois ser adsorvido e sofrer transformação por reação
química nas paredes dos sítios ativos do catalisador [ CITATION Ise18 \l 1046 ].
Este trabalho teve como objetivo determinar os parâmetros que envolvem o
mecanismo de difusão na obtenção do etileno em um catalisador de Fe poroso,
obtendo os perfis de concentração e avaliar se há efeito da transferência de massa
externa sobre a difusão, bem como se a reação química, reversível e de primeira
ordem, é um parâmetro que limita a transferência de massa.

2. Descrição e definição do problema

Foi considerado que o processo de obtenção do acetileno ocorre via catálise


heterogênea obedecendo a seguinte reação química reversível e de primeira ordem:


 C2 H 2  2 H 2
C2 H 6 

A reação ocorre dentro de um catalisador poroso e esférico com poros


cilíndricos distribuídos uniformemente em sua superfície conforme ilustrado na
Figura 1. O diâmetro médio desses poros é de 50 nm.
Figura 1. Imagens de microscopia eletrônica de varredura (MEV). a) partícula sólida, b) uma única
partícula porosa, c) particulas pororsas com pouca ampliação e d) superfície de uma partícula
porosa. Fonte: ISKANDAR, ABDULLAH e OKUYAMA, 2005 (adaptado).
O sistema opera a 873 K e 1 atm em regime de escoamento estacionário e
seus componentes têm comportamento ideal. As espécies da mistura, suas frações
e concentrações hipotéticas estão identificados conforme a Tabela 1.

Tabela 1. Identificação dos componentes, suas frações e


concentrações hipotéticas.
ID (i) Espécie yi Ci
A Etano 0,25 3,490 mol/m3
B Hidrogênio 0,50 6,980 mol/m3
C Etino 0,25 3,490 mol/ m3

O balanço de massa aplicado ao sistema foi em coordenadas esféricas (r, θ,


Ø) com fluxo unidimensional na direção r.

3. Equações utilizadas

De acordo com [ CITATION Jam08 \l 1046 ] o livre caminho médio (λ) está
relacionado com a temperatura (T) pela Equação 1.


λ= λπ (1)
√2 π σ 2 Ρ
Os gradientes de densidade adimensionais são proporcionais ao livre
caminho médio. Assim, se o livre caminho for duplicado a sua velocidade de
deslizamento também será duplicada [ CITATION Sza15 \l 1046 ]. O fator de efetividade,
n [adimensional], da espécie i é definido pela razão entre a taxa molar na superfície
externa da partícula (WiR) e a taxa de reação na superfície externa da partícula
(WiR,0).
3
η= ¿ (2)
Ф2

Onde Ф é o módulo de Thiele [adimensional] avaliado pela expressão


K
ϕ=R
√ De
(3)

O número de Biot é a razão entre resistência à transferência de massa interna


e a resistência à transferência de massa externa, possibilitando avaliar o efeito da
transferência de massa externa no processo. O número de Biot é dado por:
Lc K m , e
Bi= (4)
De

4. Soluções numéricas, matemáticas e discussão

O transporte de massa é gerado devido a gradientes de concentração das


espécies. Ou seja, o fluxo é induzido pelos gradientes das frações molares ao longo
da direção r, não necessitando de gradientes de temperatura e pressão. Os
gradientes de fração molares causam uma velocidade constante na mistura como
um todo, longe da superfície[ CITATION Sza15 \l 1046 ]. Na presente análise foram
considerados temperatura e pressão constante. Os dados correspondentes das
espécies na mistura estão dispostos na Tabela 2.

Tabela 2. Massa molar, caminho livre médio, número de Knudsen, coeficiente de difusão
de Knudsen, coeficiente de difusão da espécie na mistura e coeficiente de difusão efetivo
da espécie.
ID Etano (C2H6) Hidrogênio (H2) Etino (C2H2) Unidades

M 30,07 2,02 24,04 g/mol

σ 4,418 2,968 4,220 10-10 m

λ 1,371 3,039 1,500 10-7 m

Kn 2,743 6,079 3,005 -

DKi 0,131 0,507 0,147 cm2/s

Di-mix 0,88 3,57 0,89 cm2/s

Dei 0,11 0,44 0,10 cm2/s


Para obtenção da taxa de reação, foi necessário determinar as constantes de
equilíbrio de adsorção das espécies (Ki). Considerando as etapas de reação abaixo:

Etapa 1 C 2+ s → [ C2 H 6 ] −s

Etapa 2 [ C 2 H 6 ]−s → 2 H 2 + [ C 2 H 6 ]−s

Etapa 3 [ C 2 H 2 ]−s →C 2 H 2+ s

As constantes de adsorção das espécies são:

[C2 H 6 ]−s
K A= =1 (5)
[ C2 H 6 ] . s
[C 2 H 6 ]−s [C2 H6] . s 1 2
K B= =
( )
=
[ C2 H 2 ]−s . [ H 2 ] ² [ C2 H 2 ] . s . [ H 2 ] ² [ H 2 ]
(6)

[C H ]−s
K C= 2 2 =1 (7)
[C2 H2] . s
1 2
Assim, KA=KC e KB=
[ H2] ( )
. A taxa de reação (ri) de cada espécie foi dada

pelas Equações 8 a 10.


−kCa
r As=
1 (8)
1+Ca+ +Cc
Cb
1
−k
Cb
r Bs= (9)
1
1+Ca+ +Cc
Cb
−kCc
r As=
1 (10)
1+Ca+ +Cc
Cb

Considerando que a transferência de massa ocorreu em uma única direção,


sendo a direção r, temos:

d 2
dr
( r N Ar ) (11)

Onde NAr o fluxo molar [mol/m2s]. O balanço de massa geral para a partícula
esférica com fluxo unidimensional na direção r é:

∂C i D ik ∂ 2 ∂ Ci ∂C i
−u + 2
∂ r r dr
r (
∂r
+ri=
∂t ) (12)
Onde Dik é o coeficiente de difusão [m2/s] e está relacionado com os
fenômenos envolvidos na difusão e a fase da mistura, ri denota a taxa de reação
[mol/m3s] e t é o tempo, medido em segundo. A resolução da Eq. (13) aplicada ao
sistema avaliado, permitiu obter o perfil de concentração Ci da espécie [mol/m3].
Considerando que o sistema opera em estado estacionário, que não há fluxo
convectivo e nem acúmulo, o balanço foi representando pela seguinte equação:

D ik ∂ 2 ∂Ci
r 2 dr
r(∂r
+ R i=0 ) (13)

Solucionando as equações e aplicando as condições de contorno r = R ⇒ Ci =


CiR e r = 0 ⇒ (dCi)/dr = 0, chegamos a um perfil geral de concentração.

k k
R e√ √
r −r
Dei Dei
1 −e
(
C i ( r ) =C IR 1+C A +
CB
+C C
)( r ) e √
R
k
Dei
−R
−e √ k
Dei
(14)

Substituindo as concentrações das espécies, o raio da partícula (0,005 m) a


constante cinética adotada (0,8 s -1) e os coeficientes de difusão efetivos, chegamos
aos perfis de concentração para cada espécie:

0,142 e 264,9r −e−264,9 r


C A (r )= ( r ) 3,494
(14)

1 0,284 e 134,2r −e−134,2r


C B (r )
= (r )
1,445
(15)

0,142 e94,9 r −e−94,9 r


C C (r )= ( r ) 0,985
(16)

O efeito da concentração inicial de B, foi avaliado a partir dos valores


referentes as concentrações das espécies A e C em R = 0,006 m como sendo
CA=CC=3,490 e plotando a variação de C B em função de r, sendo ri=0,005m e
r0=0,006m, dessa forma, obtemos a Figura 2, C B versus r.

Figura 2. Perfil de concentração da espécie B mantendo constante A e C.


Analisando a Figura 2, é possível verificar que a espécie B será produzida
após o processo de transferência de massa com reação, quando o r < 0,006 m,
corroborando com a reação que reescreve a reação.
O módulo de Thiele e o fator efetividade obtidos estão na Tabela 3.

Tabela 3. Condições de contorno do sistema.


I ϕi ηi
A 1,323 0,900
B 0,671 0,971
C 0,474 0,985

A partir desses valores foi possível observar que todos os valores do fator de
efetividade tendem a 1, significando que a reação química é a etapa controladora do
processo.
A partir desses dados obtidos foi possível observar que todos os valores do
fator de efetividade tendem a 1, significando que a contribuição da reação química e
da difusão na transferência de massa é a praticamente a mesma.

4. Considerações finais

A difusão, seus parâmetros e mecanismos na obtenção do acetileno foram


obtidos e avaliados. Os resultados obtidos permitiram verificar que a transferência
de massa é limitada pela reação química e que a transferência de massa externa
tem forte influência no mecanismo de difusão como um todo, fornecendo uma forte
resistência à difusão.
REFERÊNCIAS

BHATTACHARYYA, K. Dual solutions in boundary layer stagnation-point flow and mass


transfer with chemical reaction past a stretching/shrinking sheet. International
Communications in Heat and Mass Transfer, v. 38, p. 917-922, 2011.
BIRD, R. B.; STEWART, W. E.; LIGHFOOT, E. N. Transport Phenomena. 2ª. ed. [S.l.]:
John Wiley & Sons, 2002.
CENTURION, J. M. R. Segurança do trabalho na distribuição do acetileno. 168 f.
Dissertação (Mestrado em Engenharia de Produção) – Centro Tecnológico, Universidade
Federal de Santa Catarina, Florianópolis, 2003.
ISKANDAR, F.; ABDULLAH, M.; OKUYAMA, K. Preparation of Optical and Magnetic
Ordered Macroporous Material via Colloidal Templates. Proceedings of Asian Physics
Symposium, p. 93-98, 2005.
J.J. KEYES, J.; PIGFORD, R. L. Diffusion in a ternary gas system with application to gas
separation. Chemical Engineering Science, v. 6, p. 215-226, 1957.
SZALMÁS, L. Viscous velocity, diffusion and thermal slip coefficients for ternary gas
mixtures. European Journal of Mechanics - B/Fluids, v. 53, p. 264-271, 2015.
WELTY, J. R. et al. Fundamentals of Momentum, Heat, and Mass Transfer. 5ª. ed. [S.l.]:
John Wiley & Sons, 2008.
SCHOBERT, H. Production of Acetylene and Acetylene-based Chemicals from Coal.
Chemical Reviews, v. 114, n.3, p. 1743–1760, 2013. doi: 10.1021 / cr400276u 

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