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Morfologia

• É... boa tarde a todas e todos... é... a nossa equipe ficou responsável
por abordar o túnel do tempo da morfologia do português...
• Como todo mundo já está cansado de saber... tem suas raízes... suas
origens lá no latim... mais precisamente no latim vulgar... no latim
falado... a famosa língua do povão...
• E a morfologia, de maneira bem resumida, é o estudo da forma, da
estrutura das palavras, seja ela escrita ou falada, tanto é que tem
“morphe” no nome, que em grego significa, justamente, "forma",
“estrutura”. O que nos faz lembrar “Morfeu”, o deus dos sonhos na
mitologia grega e que tinha a habilidade de assumir qualquer forma
humana e aparecer nos sonhos das pessoas... ou “A Metamorfose”,
de Franz Kafka, onde um homem acorda metamorfoseado num inseto
gigante, ou seja, com sua forma, estrutura totalmente mudada,
transformada... ou, ainda, também nos lembra o nostálgico “É Hora
de Morfar”, dos “Power Rangers”, que era quando eles se
transformavam nos heróis...
• E o interessante é que... assim como o homem muda ao longo da
história... ao longo do tempo... mudando e transformando,
consequentemente, a realidade a sua volta... como as tecnologias... as
roupas... a sociedade em geral... a língua também muda... também se
transforma junto ao homem... acho que essa é uma das maiores
provas do quão a língua é intrínseca ao ser humano... pois a língua
não existe sem o homem e o homem, sem a língua... é só mais um
animal... como qualquer outro...
• E como qualquer transformação... qualquer mudança ocorrida ao
longo do tempo, como, por exemplo, os carros, a língua também sofre
perdas e ganhos... no caso dos carros... perdeu-se os cavalos... mas
ganhou-se uma série de equipamentos e aparelhos tecnológicos...
como os motores...
• E também assim como os carros, que conforme os anos foram ficando
mais rápidos... se desenvolvendo e aperfeiçoando para chegar de um
ponto a outro... de lugar a outro lugar... de uma maneira mais veloz...
mais econômica... a língua também foi ficando mais "rápida"... mais
"econômica"... na questão da objetividade... é só pensarmos no
famoso e clichê caso do pronome de tratamento "você"... que
começou com "vossa mercê" até chegar na sua forma mais rápida...
objetiva... econômica... "você" ... que, em algumas regiões, já se
encaminhou pra "ocê"... como em alguns dialetos caipiras...
retratados incrivelmente bem pelo personagem de histórias em
quadrinhos Chico Bento, do Maurício de Sousa...
• Bem... então devido as perdas e ganhos... nós... assim como os textos
das apostilas... dividimos nossa apresentação em, também, perdas e
ganhos... e iremos começar pelas perdas...
• Só que, antes de começarmos a falar das mudanças morfológicas,
acho que vale a pena destacar aqui um fato muito interessante que eu
percebi estudando o assunto que é... o quanto as mudanças
morfológicas da língua portuguesa estão intrinsecamente ligadas as
mudanças fonológicas... sendo praticamente indissociáveis... ou seja...
a mudança ocorrida na fonologia afeta diretamente a morfologia...
ocasiona uma mudança morfológica...
• É como a água e a temperatura... a matéria... que aqui no caso seria a
morfologia... e o clima ambiente... que aqui no exemplo seria a
fonologia... percebam que se ocorrer uma mudança na temperatura
ocorrerá diretamente uma mudança na água... na matéria... se o clima
está muito quente a água evapora... se está muito frio a água
congela... se aprazível, líquida... então... assim... é muito difícil
estudarmos as mudanças morfológicas sem levarmos em conta as
mudanças fonológicas... estudarmos as mudanças da água
desconsiderando as mudanças do clima... da temperatura... é quase
impossível... justamente pelo fato da língua portuguesa ser
descendente do latim falada... do latim vulgar... e também pelo fato
das divisões linguísticas serem interdependentes... necessitarem uma
das outras... a sintaxe precisa da morfologia pra existir... da mesma

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forma que a morfologia precisa da fonologia e a fonologia da
fonética... então esse aspecto não pode ser desconsidero..
• Como, por exemplo, o fato do latim vulgar ter reduzido... diminuído o
número de vogais do latim clássico... que era o latim escrito... o latim
dos nobres... dos escolarizados... dos cultos... que tinha 10 (ā, ă, ē, ĕ, ī,
ĭ, ō, ŏ, ū, ŭ) e foi reduzido para 5 (a, e, i, o, u)... 7 se consideramos o
"é" e o "ó"... as vogais abertas... o que ocasionou nas perdas de várias
declinações... como o ablativo e nominativo... ao ponto de, hoje em
dia, no português, só restarem as declinações de gênero (feminino e
masculino), de número (singular e plural) e de grau (aumentativo e
diminutivo)... mas aí já entra muito na parte da sintaxe... bom... e
também por ter apagado... obscurecido as consoantes finais das
palavras... restando somente N, M, R, S e l... as nasais, róticos,
sibilantes e laterais... devido o processo de lenização... também
chamado de abrandamento... que é quando, pra poupar esforços...
energia... por praticidade... ou... preguiça mesmo... eu deixo de falar
uma determinada consoante... como as oclusivas... como o "B", "P",
"T" ou "D"... por serem explosivas... necessitarem de mais trabalho...
mais esforço pra falar... pois... né?... o ser humano gosta da
facilidade... da economia... tanto que o homem só está onde está
hoje... justamente por que existiram pessoas... cientistas...
inventores... que queriam simplificar... facilitar a vida... se olhamos
para os lados agora perceberemos que tudo criado pelo homem é
uma forma de descomplicar... de tornar nossa existência mais fácil...
por isso que creio que talvez o homem esteja caminhando pra se
tornar aqueles humanos do filme Wall-E... bem... voltando... um
exemplo desse abrandamento é a palavra latina "habebat"... que
modificou-se ao longo do tempo e em italiano se tornou "aveva", em
espanhol "había" e em português "havia"... uma grande
simplificação... né?... poupa muito energia pra quem pronuncia...
enfim... tudo isso são resquícios de mudanças fonológicas que
alteraram... transformaram diretamente a morfologia...
• E o engraçado é que o latim vulgar rompeu com as regras do latim
clássico... né?... a fala, desde sempre, desobedecendo a escrita... e,

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dessa ruptura, ele acabou criando uma nova morfologia...
estabelecendo novas regras morfológicas... ou seja... isso mostra o
quão hipócrita é a nossa sociedade... pois a mesma sociedade que
tem preconceito com as falas que fogem das normas gramaticais...
essa mesma sociedade surgiu dessas falas que romperam com as
regras... com as normas... essa é maior prova de que entre a fala e a
escrita não há uma melhor que a outra... não há superioridade e
inferioridade...
• Isso me faz questionar... será que essas mesmas falas que hoje são
vistas com maus olhos... no futuro serão normas... regras da
gramática?... o que me faz lembrar do poema de Carlos Drummond de
Andrade, "no meio do caminho tinha uma pedra", que na época de
sua publicação foi bastante criticado pelos gramáticos por substituir o
verbo "haver"... o padrão... pelo verbo "ter"... o coloquial... coisa que
hoje em dia não é mais vista com maus olhos e que em breve,
provavelmente, vai deixar de ser um erro... da mesma forma que a
substituição de pronomes pessoais clássicos por outros mais
coloquiais, como o "nós" pelo "a gente"... ou a substituição do futuro
do presente pelo futuro perifrástico, como "amarei" por "vou amar"...
e até mesmo a ênclise parece que em breve vai desaparecer, como o
"amo-te" que está sendo substituído por "te amo"...
• Enfim... talvez em um futuro próximo essas sejam as novas regras
gramaticais... influenciadas diretamente pela fala... como há vários
séculos atrás... no latim vulgar... que transformou, para sempre, a
nossa morfologia...
• Bem... só que também existem mudanças morfológicas
independentes... que não necessitam... não dependem de nenhuma
ação exterior... externa a ela... pra mudá-la... pois essa mudança...
essa transformação passa a ser um processo internalizado... interno...
dentro de si mesma... é quando, por exemplo, a escrita muda sem a
influência da fala... ou a fala sem a influência da escrita... é como uma
metamorfose de borboleta... onde a mudança... a transformação
ocorre dentro do próprio casulo...

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• E é justamente nessas modificações internas... independentes... que
percebemos... notamos as diferenças entre a fala e a escrita... as
distinções entre elas... como, por exemplo, o "mas" e "mais"... onde
na escrita nós temos duas formas... duas palavras diferentes para dois
sentidos diferentes... de oposição e acréscimo... enquanto na fala nós
também temos esses dois sentidos diferentes... mas a forma... a
palavra é a mesma... é sempre "mais" com "i"... pois ela é mais
eufônica... isto é... mais agradável aos ouvidos... e também é mais
fluída... mais fácil de se pronunciar... pois o acréscimo do "i" serve
como uma ponte para se chegar ao "s" de uma forma mais simples...
sem precisar pular do "a" até ela... sem gastar muita energia... ou
necessitar de muito esforço... se tornando, dessa forma, uma palavra
homônima... que tem a mesma morfologia... a mesma aparência...
forma... mas com funções... sentidos diferentes...
• Então é através dessas mudanças morfológicas internas...
independentes... que enxergamos a fala e a escrita como opostos
entre si... o que acaba gerando o preconceito linguístico... que vê a
escrita e a sua morfologia concreta... rígida... sólida... como superior à
fala e a sua morfologia abstrata... maleável... flexível... eu creio que,
talvez, essa ideia... esse pensamento de que a escrita é superior a
fala... se deva pelo fato de que a escrita transcende o homem e a sua
mortalidade... pois, quando morrermos, obviamente, deixaremos de
falar, então nós, definitivamente, deixaremos de existir no mundo...
nessa realidade material... onde o abstrato não tem vez, só o
concreto... mas se, por exemplo, escrevermos um livro, mesmo após a
nossa morte, continuaremos existindo... por meio dele...
continuaremos "falando" por assim dizer... então esse caráter quase
divino... celestial da escrita... que supera a morte... o inevitável fim de
todos... é o que nos faz a vê com uma certa superioridade... pois tudo
acima do mundo material é considerado, de certa forma, melhor...
superior... não é a toa que nós chamamos o mundo espiritual... a
morada de Deus... de céu... né?... pois está acima da gente... e a
sociedade grafocêntrica é um exemplo claro dessa visão... onde ela
valoriza a escrita... e por essa valorização... por esse prestígio... ela é

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tida como evoluída... a frente das outras sociedades... principalmente
as sociedades com tradições orais... como em algumas comunidades
indígenas...
• Outro exemplo dessas mudanças independentes... ... que criam essas
diferenças entre a fala e a escrita... é revestir uma antiga função com
uma nova forma... isto é... a forma muda... a aparência modifica...
mas a sua essência... a sua função continua a mesma... utilizando uma
analogia de carros... no período das carruagens nós tínhamos as
rédeas... que guiavam os cavalos na direção desejada... só que... com
as transformações ao longo do tempo... as rédeas deram lugar aos
volantes... ou seja... houve uma mudança... uma modificação na
forma... na aparência... entretanto, a essência... a função... continua a
mesma... que é guiar... direcionar... orientar...
• Aí a apostila nos dá o exemplo de "amabo" e "audiam"... que eram as
formas morfológicas do latim clássico... o escrito... mas que no latim
vulgar... o falado... foi substituído por "amare habeo" e "audire
habeo"... um era a forma sintética do futuro imperfeito do indicativo
e o outro era a forma perifrástica... como vocês podem ver... mudou-
se a forma... a aparência... a morfologia escrita seguiu um caminho... e
a falada seguiu outro... mas a função continuou a mesma... os
caminhos, apesar de divergentes, levavam para o mesmo destino... é
o nosso "amarei" e "vou amar"... que eu já tinha dito antes... né?...
"dormirei" e "vou dormir"... "comerei" e "vou comer"... a fala parece
que adotou para si a perífrase... o que me instiga muito... pois ela
utiliza duas palavras pra expressar aquilo que poderia ser dito com
uma... que tem o mesmo sentido... o que acaba indo contra a
economia... não sei se é por uma falta de conhecimento... de
escolarização por praticidade na pronuncia... ou porque já se enraizou
na fala ao ponto de se tornar natural... ou os três juntos... ou porque é
mais enfático... mais expressivo no sentido... na intenção... o que está
ligada à objetividade...
• Só que percebi uma coisa acerca desse tema... desse assunto... é
que... primeiro... as mudanças independentes acabam gerando
dependências... como por exemplo a utilização dos pronomes e

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artigos... que surgiu na fala... no latim vulgar e nos romanços... uma
mudança totalmente independente... mas que... por essa
independência... acabou gerando dependência... no caso...
dependência da escrita... que... digamos formalizou essa
informalidade... foi dependente dessa independência da fala...
• E geralmente a fala que é sempre independente e a escrita
dependente... a fala que sempre influencia a escrita... acho que
pouquíssimas mudanças morfológicas autônomas da escrita
influenciaram a fala... tornaram ela dependente da escrita...
• Que foi nessa questão da forma... da aparência... pois tem casos que a
forma muda e a função muda também... ou seja... se torna uma nova
palavra... mas uma nova palavra que teve origens de uma palavra já
existente... é como dois caminhos divergentes... que vão, também,
para destinos diferentes... mas que tiveram o mesmo ponto de
partida... é o famoso neologismo... a formação... a criança de novas
palavras... como por exemplo "padeiro" e "padaria"... são palavras
com formas diferentes e funções... sentidos diferentes... mas que
tiveram um mesmo ponto de partida... uma mesma raiz... "panem"...
pão em Latim... e esse processo de criação de novas palavras
geralmente é feito por analogia... eu vejo "barbeiro", "pedreiro",
"doceiro", então, por analogia, eu crio "padeiro"... eu associo esse
sufixo "-eiro" a algum ofício... profissão... ocupação... outro exemplo...
utilizando novamente Carlos Drummond de Andrade... está no poema
"Amar"... onde ele cria a palavra "desamar"... que também é feita por
meio de analogia... ele viu "desfazer"... "desunir"... "desenterrar"... e
percebeu que o prefixo "des" dá uma ideia de contradição...
oposição... e criou assim a palavra "desamar"...
• E esse processo de criação de novas palavras pode se dá de várias
maneiras... por derivação... composição... hibridismo... redução... por
onomatopeia... enfim... e geralmente se dá de forma independente,
dentro da escrita ou da fala...
• Agora partindo para um outro assunto... bem... todos os filólogos
concordam que não existia artigo no latim clássico... isso já é certo... é

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unanimidade... e que ele só veio a existir... só veio a surgir no fim do
latim vulgar e início das línguas românicas... dos romanços...
• E o artigo ele nasceu de um pronome... ... pra ser mais preciso... os
artigos definidos (o, a, os, as) nasceram dos pronomes demonstrativas
(este, esse e aquele)... ... que em Latim, mais especificamente, era o
ille... que era declinado em gênero e número (illu, illa, illos e illas)... e
como de illu, illa, illos e illas chegamos a o, a, os e as?... esse processo
morfológico é até fácil de explicar...
• Primeiro o latim vulgar, por meio da simplificação das vogais do latim
clássico, converteu o "i" em "e"... pois não tinham diferença nenhuma
na pronúncia... então ficou ello, ella, ellos e ellas... depois as
consoantes geminadas, que são essas consoantes gêmeas... iguais e
unidas "ll"... foram simplificadas... ficando apenas um "l"... daí ficou
elo e elos e ela e elas... que nós ainda utilizamos nos pronomes
pessoais de caso reto...
• E o "e" inicial deixaria de ser falada... também iria embora... cairia em
desuso... porque ele está em uma posição proclítica... isto é... pelo
fato desse "e" ser uma sílaba átona... uma sílaba fraca... que está
perante... diante de uma sílaba tônica... uma sílaba forte... que... no
caso... é o "los"... ele seria integrado... assimilado... absorvido na
pronúncia dessa sílaba tônica... formando um único vocábulo
fonético... uma única fala... ou seja... o "e" foi incorporado na
pronúncia do "los"... deixando, praticamente, no decorrer do tempo,
de ser pronunciado...
• É como a gravidade... o tecido gravitacional... quanto mais denso...
mais pesado for um corpo celeste... mais ele assimilará... introduzirá
corpos menores... menos densos... menos pesados... dentro do seu
campo gravitacional... que é o que ocorre no nosso sistema solar...
onde o planeta terra... por ser menor... está preso no campo
gravitacional do sol... que é maior... então o "e" seria o nosso planeta
terra... fraco... com pouca densidade... enquanto o "los" o sol...
forte... com muita densidade... só que eu creio que ao longo do tempo
essa sílaba tônica "los" deixou de ser como o sol e passou a ser um

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buraco negro... ganhou tanta densidade... tanto peso que acabou, de
fato, engolindo o "e"... ao ponto de nem ser pronunciado junto mais...
• Por fim, esse "l" de "lo", "los", "la" e "las", durante a passagem do
latim ao português, seguiu a evolução natural... normal da fonética
das consoantes... em relação as posições intervocálicas... que são as
consoantes que estão entre vogais... como foi o caso aqui... por
exemplo em "de 'l'os campos"... onde... pelo fato do "l" está entre
duas vogais... sozinho... isolado... ele acabou sofrendo queda...
deixado de ser pronunciado... de ser falado... mas isso no português...
em espanhol esse "l" ainda existe... isso ocorreu por causa das
palavras clíticas... que é quando, fonologicamente, nós juntamos duas
ou mais palavras em uma só... ou seja... por economia... eu
simplifico... eu resumo... eu transformo duas ou mais palavras em
uma só palavra... por exemplo... "numa" (em uma)... "embora" (em
boa hora)... "duma" (de uma)... "doutro" (de outro)... alguns fonemas
deixam de ser pronunciados... deixam de ser falados... e já que a
escrita é... digamos... a representação da fala... as letras... que seriam
esses fonemas... também desaparecerem... somem...
• enfim... com a ausência desse "l" no português ficou só o "o", "a", "os"
e "as"... os nossos práticos e econômicos artigos...
• E esse estudo morfológico da origem dos artigos português é muito
importante para entendermos e compreendermos o quanto a língua
portuguesa é próxima da língua espanhola... são... realmente... línguas
irmãs... línguas parentes... que dividem, praticamente, o mesmo galho
da árvore genealógica... e também para termos a ciência dessa
divisão... dessa ruptura entre Portugal e a Espanha... que seguiram
cada qual suas próprias regras gramaticais... no período da
independência portuguesa e da separação do galego-português... e eu
percebi que o mais incrível disso tudo... é que esse "l" de "lo", "la",
"los" e "las", que foi morto pela língua portuguesa... e que ainda vive
nos artigos espanhóis... esse "l", na verdade, ainda ressurge no
português... renasce das cinzas como uma fênix... na questão dos
pronomes oblíquos átonos... como: amá-lo, deixá-la, escrevê-los,
buscá-las... ... onde os artigos voltam a suas formas iniciais... de

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quando o português e o espanhol eram, de certa forma, a mesma
língua... então o "l" que nós ainda utilizamos é um resquício... é...
digamos o código genético... o "DNA" que prova esse parentesco...
esse laço familiar de ambas as línguas... que são sangue do mesmo
sangue... sendo a língua portuguesa a irmã casula... a última flor do
lácio, como diria Olavo Bilac... a última língua a nascer... a evoluir do
latim...
• Essa é a teoria mais aceita proposto pelo linguísta "Joaquim Mattoso
Câmara Júnior" e pelo filólogo "William Dwight Whitney"... sobre a
origem do artigo português...
• Só que William Dwight Whitney ele vai além... e vai dizer que no latim
clássico, no escrito, existiu um sistema que acabou se perdendo... mas
que era usado para a indeterminação dos substantivos... eu não vou
me aprofundar muito aqui... mas, resumidamente... esse sistema era
como uma marca que dizia que um substantivo era indeterminado...
essa marca era como uma flexão... ou uma declinação... que
modificava... alterava as terminações desses substantivos... então era
como se... os substantivos que não tinham essa marca... de
indefinição... eram substantivos determinados... era como se tivesse
um artigo implícito alí... por justamente não ter essa marca de
indeterminação... então as línguas românicas implementaram uma
nova forma para uma antiga função... é o caso das rédeas e do
volante de novo... só que eles inverterem... ao invés de colocar uma
marca pra dizer que um substantivo era indeterminado... não tinha
artigo... eles fizeram o oposto... acrescentaram uma marca pra
justamente determinar o substantivo... dizer que tinha um artigo alí...
ou seja... o artigo que antes era implícito... invisível... tornou-se
explícito... visível... então... tentando exemplificar pra nossa língua...
para os latinos... dizer "(A) menina bonita" era como se houvesse um
artigo alí implícito... que não necessitaria ser falado para
entendermos... para compreendermos que o substantivo era
determinado... enquanto dizer "A Menina Bonita"... era como mostrar
que aquele "A"... aquele artigo... estaria ausente naquela sentença...
não existiria... tornando o substantivo indeterminado... coisa que

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inverteu-se ao longo dos séculos... mostrar o artigo passou a
determinar o substantivo e não mostrar a indeterminar... então,
surpreendendo a todos, William vai dizer que, de certa forma, no
latim clássico, existia sim artigos, só que, claro, não da forma que
conhecemos hoje... era implícita... escondida... de uma maneira
subentendida...
• E só uma curiosidade... os artigos eles são dêiticos... isto... eles não
tem sentido por si só... eles não têm significados... função nenhuma
sozinhos... por isso que eles necessitam de um substantivo... pois são
dependentes de significação para existirem...
• Então, para o filólogo William, o nascimento dos artigos foi um
processo independente... isto é... foi uma transformação interna...
que já existia dentro da morfologia escrita, do latim clássico... sem
depender, necessariamente, da fala... e que foi a fala... a morfologia
oral que dependeu... que sofreu influencia da escrita...
• Agora vamos passar para o surgimento dos pronomes pessoais... mais
precisamente de caso reto... e com enfoque maior no ele e ela/eles e
elas... eu creio que dentre todas as contribuições do latim falado e dos
romanços ao longo da evolução da língua... a inovação do uso de uma
terceira pessoa do pronome pessoal foi a maior... pois só tínhamos no
latim o eu, tu, nós e vós...
• No latim clássico a pessoa do verbo era marcada apenas pela flexão
verbal... do verbo... da palavra... ou seja... pela sua terminação... pela
desinência verbal... eu já saberia se se tratava do eu, tu, nós, enfim...
e frequentemente só se usava os pronomes pessoais de fato para
enfatizar... dar ênfase... ou, então, no caso do latim falado, era usado
de uma forma redundante... pois eu utilizava o pronome sendo que
na terminação do verbo eu já saberia qual era a pessoa... o pronome...
era uma insistência desnecessária da mesma ideia... pois utilizava dois
elementos morfológicos que expressavam o mesmo sentido... a
mesma ideia... uma característica que vive como nunca no
português... então herdamos do latim falado uma estrutura
sentencial... sintática... totalmente redundante... em que o sujeito é
marcado duas vezes: pela pronome pessoal e pela flexão do verbo... o

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que acaba tornando o "subir pra cima" e o "entrar pra dentro"
brincadeira de criança...
• E diferentemente do latim clássico, temos no português, ao lado do
eu, tu, nós e vós, a presença do ele/ela e eles/elas... também
descendente do "ille"... como mostrei a vocês... entretanto, ao
contrário dos artigos, eles não são dêiticos... ou seja, eles têm
sentidos... significados próprios... não dependendo de nenhuma outra
palavra...
• Bem... e a gramática histórica têm duas teorias... hipóteses para
explicar a questão do timbre fechado em "ele" e o timbre aberto em
"ela"... a primeira é que poderia ser uma distinção morfológica de
gênero, masculino e feminino... e a segunda é que a vogal "e" se abriu
em metafonia com a vogal "a"... que é quando uma vogal átona
influencia uma vogal tônica... mas uma coisa que se sabe é que as
formas no plural de ele e ela foram criados pelas línguas românicas...

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