Você está na página 1de 2

Lê atentamente o seguinte texto e consulta as notas apresentadas.

Ao longe os montes têm neve ao sol,


Mas é suave já o frio calmo
Que alisa e agudece
Os dardos do sol alto.
Hoje, Neera, não nos escondamos,
Nada nos falta, porque nada somos.
Não esperamos nada
5 E temos frio ao sol.

Mas tal como é, gozemos o momento, 


Solenes na alegria levemente,
E aguardando a morte
Como quem a conhece.
10

Ricardo Reis, Poesia, Manuela Parreira da Silva (ed.), Lisboa: Assírio &
Alvim, 2007, p.98.

1. Explicita o modo como o sujeito poético encara a paisagem.

2. Interpreta os versos “Hoje, Neera, não nos escondamos, / Nada nos falta, porque nada
somos.” (vv. 5,6).

3. A partir da última estrofe, regista duas expressões que comprovem que o “eu” adota uma
filosofia de vida de base clássica e explica o sentido de cada uma delas, justificando essa
adoção.
1. O sujeito poético encara a paisagem de forma tranquila e positiva.
Efetivamente, o sujeito poético vê a paisagem à distância (“Ao longe os montes têm neve ao
sol”)como espelho da vida e da fugacidade do tempo, numa atitude de aceitação pacífica (“Mas é
suave já o frio calmo”). Assim, torna-se menos difícil evitar o sofrimento que possa causar qualquer
aproximação, porque ela será sempre seguida de ausência.
Em suma, a paisagem poderá simbolizar o desejo, as emoções, que mantidos asseguram a nobreza
da nossa vida.

2. O sujeito poético interpela Neera, um dos nomes de inspiração horaciana.


Assim, pede-lhe para não se esconderem porque nada desejam, na certeza de que as suas
escapadas são inofensivas. O seu exemplo magnânimo demonstra a consciência da efemeridade da
vida e a sua aceitação com calma, naturalidade, sem luta, não resistindo ao inevitável “porque nada
somos”.
Em suma, o sujeito convida Neera a viver de forma tranquila, sem afetos nem emoções, para evitar o
sofrimento.

3. A última estrofe apresenta claramente a ideia de que o “eu” adota uma filosofia de vida
assente no epicurismo e no estoicismo. De facto, a expressão “gozemos o momento” está
associada ao carpe diem de inspiração horaciana, pois significa que se deve aproveitar o
momento presente porque o amanhã é incerto. A expressão “solenes na alegria levemente”
expressa a ataraxia e a contenção estoica, evidenciando que a felicidade reside, pois, na
forma tranquila de conduzir a vida, sem excessos. O sujeito poético adota essa filosofia de
vida numa atitude cerebral de autodisciplina, como forma de evitar o sofrimento, perante a
consciência da passagem inexorável do tempo e da inevitabilidade da morte – “E
aguardando a morte/Como quem a conhece.” Em conclusão, a recusa das paixões
exacerbadas permite viver de forma menos dolorosa

Você também pode gostar