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Arlindo Ugulino Netto – CIRURGIA ABDOMINAL– MEDICINA P7 – 2010.

MED RESUMOS 2012

ARLINDO UGULINO NETTO


LUIZ GUSTAVO C. BARROS € YURI LEITE ELOY
MEDICINA – P7 – 2010.2

CIRURGIA ABDOMINAL

REFER€NCIAS
1. Material baseado nas aulas ministradas pelos Professores C•ssio Virg‚lio, Felipe Rocha e Marcelo
Gonƒalves na FAMENE durante o per‚odo letivo de 2010.2.
2. DANI, R.; CASTRO, P. L. Gastroenterologia Cl‚nica. Rio de Janeiro: Guanabara Koogan, 2001.
3. SABISTON, D. C.; TOWNSAND, Jr. Tratado de Cirurgia – As Bases Biol…gicas da Pr•tica Cir†rgica
Moderna. 16‡ ed. Rio de Janeiro: Guanabara Koogan, 2003.
4. VIEIRA, O. M.; CHAVES, C.P.; MANSO, J. E. F. Cl‚nica Cir†rgica – Fundamentos Te…ricos e Pr•ticos. 1‡
ed. Sˆo Paulo: Atheneu, 2000.
5. WAY, L.W.; DOHERTY, G.M. Cirurgia: Diagn…stico e Tratamento. 1‡ ed. Rio de Janeiro: Guanabara
Koogan, 1999.

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MED RESUMOS 2012


NETTO, Arlindo Ugulino.
CIRURGIA ABDOMINAL _________

TRAUMA ABDOMINAL
(Professor Marcelo Gonçalves)

A avalia€•o do abdome ‚ um dos componentes mais desafiadores da avalia€•o inicial do traumatizado.O trauma
abdominal, em especial, ‚ uma condi€•o muito frequente nas emergƒncias hospitalares, da„ a import…ncia de se estudar
e entender como socorrer uma v„tima de trauma abdominal. Devemos saber, por exemplo, que a prioridade e o melhor
m‚todo de avalia€•o abdominal devem ser determinados considerando o mecanismo do trauma, as for€as de les•o, sua
localiza€•o e o estado hemodin…mico do doente.
A les•o intra-abdominal n•o diagnosticada continua sendo causa frequente de mortes evit†veis ap‡s o trauma
do tronco. ˆ um engano acreditar que a ruptura de uma v„scera oca ou o sangramento decorrente de les‰es de v„sceras
parenquimatosas sejam reconhecidas precocemente. Por este motivo, qualquer doente que tenha sofrido traumatismos
contusos de porte significante afetando o tronco, seja por desaceleraۥo brusca, seja por impacto direto, ou que tenha
sido v„tima de ferimentos penetrantes no tronco, deve ser encarado como tendo les•o vascular ou de v„scera abdominal.
Para o estudo do paciente com suspeita ou com trauma abdominal concreto, devemos levantar as seguintes
quest‰es-chaves:
 O que ‚ o abdome, anatomicamente, para o atendimento no trauma?
 Qual ‚ a prioridade do trauma abdominal no tratamento do paciente com trauma mŠltiplo?
 Por que o mecanismo do trauma ‚ importante?
 Como descobrir se o choque pode ser devido ‹ les•o intra-adominal?
 Como saber se existe les•o abdominal?
 Como deve ser operado (laparotomia)?
 Como diagnosticar e tratar os pacientes com fratura de bacia?

OBJETIVOS DA ABORDAGEM AO T RAUMA A BDOMINAL


Em resumo, os objetivos do estudo das bases do atendimento do Trauma Abdominal s•o:
 Identificar as principais referências anatômicas do abdome. Para a identifica€•o de trauma abdominal deve-
se primeiramente conhecer anatomicamente a regi•o que se quer estudar, extens•o e limita€‰es, dada
principalmente por estruturas anatŒmicas. Isso ‚ de extrema import…ncia para a determina€•o da conduta a ser
tomada para com o paciente.
 Descrever os padrões de lesão no trauma fechado e nos ferimentos penetrantes. Os traumas abdominais
podem ser divididos em penetrantes (proj‚til de arma de fogo, armas brancas) e fechados (agress•o f„sica,
acidentes automobil„sticos). Ambos devem ser identificados e descritos corretamente pelo m‚dico. Cada um
produz um conjunto sintomatol‡gico espec„fico, exigindo, assim, condutas espec„ficas, seja ela cirŠrgica ou
conservadora.
 Descrever a avaliação do paciente com suspeita de lesão abdominal. Este passo se faz fundamental
quando partimos do pressuposto que nenhum paciente chega ao pronto-atendimento com a queixa de “trauma
abdominal”. Por esta raz•o, devemos saber realizar um exame abdominal espec„fico ao trauma, excluindo ou
selecionando pacientes com les‰es consider†veis.
 Identificar e utilizar procedimentos diagnósticos e terapêuticos mais apropriados. Devemos conhecer os
primeiros procedimentos a serem adotados, envolvendo, inclusive, a realizaۥo de exames complementares.
Isso se faz importante, pois nem todos os pacientes com trauma abdominal est•o aptos ou hemodinamicamente
est†veis para suportar o tempo que leva a realiza€•o de uma tomografia computadorizada (TC): pacientes que
se apresentam com sangramentos internos podem vir a ‡bito rapidamente pela simples mobiliza€•o visceral.
 Discutir o tratamento de urgência das fraturas do osso do quadril (bacia). Associado ao estudo do trauma
abdominal, ‚ de grande import…ncia estudar paralelamente as fraturas que ocorrem em n„vel da bacia. Isso
porque, muitas vezes o paciente apresenta fratura de bacia, ele possui um trauma abdominal associado. Nesses
casos, deve-se primeiramente tratar a les•o abdominal para s‡ ent•o intervir no osso. J† nas v„timas que
possuem somente trauma de bacia, devemos trat†-la, quando for necess†rio. Contudo, pacientes com trauma de
bacia referem dor abdominal importante muito frequentemente e, caso seja tratado primeiramente o abdome,
podemos causar outras complica€‰es ao seu estado f„sico.

C ONSIDERA•‚ES A NATƒMICAS
Como foi dito anteriormente, para que o diagn‡stico de pacientes com trauma abdominal seja realizado,
devemos, primeiramente, conhecer os limites anatŒmicos desta regi•o. Do ponto de vista topogr†fico, abdome ‚ a regi•o
do tronco entre o t‡rax e a pelve, limitada posteriormente pelas v‚rtebras lombares e discos intervertebrais, e …ntero-
lateralmente por paredes mŠsculo-tend„neas. ˆ um recipiente din…mico e flex„vel, que abriga a maioria dos ‡rg•os do
sistema digest‡rio e parte dos sistemas urin†rio e genital.
Do ponto de vista cirŠrgico e, com especial foco para o trauma, o abdome apresenta os seguintes limites:
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 Parede anterior. A parede anterior do abdome ‚ limitada pela linha inter-mamilar superiormente (fato este
comprovado, pois, durante a expira€•o, o mŠsculo diafragma – que delimita superiormente a cavidade
abdominal – pode se elevar at‚ o n„vel da linha mamilar); lateralmente, ‚ delimitada pela linha axilar anterior;
inferiormente, pelo „lio e pela margem superior do pŠbis.
 Parede lateral (flanco). A parede lateral do abdome, tamb‚m chamada de flanco, se estende desde a regi•o
axilar superiormente e se estende at‚ a regi•o da crista il„aca. Portanto, facadas que acometam a regi•o axilar,
se o paciente estiver durante uma expira€•o vigorosa, podem comprometer v„sceras abdominais.
 Parede posterior (dorso). Estende-se, superiormente, desde a linha formada entre as duas pontas das
esc†pulas at‚ a regi•o sacral, entre as duas asas dos ossos il„acos.

Outra maneira de abordar o abdome consiste em dividi-lo em: abdome superior e inferior. Essa divis•o ‚ feita
atrav‚s da referƒncia do colo transverso e a borda inferior do gradil costal: entre o colo transverso e a margem costal,
temos o abdome superior; entre o colo transverso e a abertura superior da pelve, temos o abdome inferior. Assim, no
abdome superior, est•o localizados a maioria dos ‡rg•os maci€os (f„gado, ba€o, p…ncreas, rins posteriormente).
Esta divis•o ‚ de grande import…ncia, pois ‚ atrav‚s dela que podemos suspeitar quais os poss„veis lesionados
quando encontramos les‰es de outros segmentos associadas. Por exemplo: pacientes com trauma tor†cico podem
apresentar acometimento de v„sceras do abdome superior. Tal acometimento pode ser resultado de uma simples
transferƒncia de energia, ou ainda, atrav‚s da fratura de costelas e, com isso, provocando a perfura€•o de algum ‡rg•o
abdominal.
Outra regi•o de grande import…ncia ‚ a cavidade p‚lvica, onde est•o localizados os ‡rg•os genitais, bexiga,
art‚rias e veias de grande calibre (que se lesionados provocam hemorragias importantes), reto e intestino delgado.
Portanto, v„timas apresentando fratura de bacia podem lesionar com facilidade tais estruturas. Por esta raz•o, n•o
devemos menosprezar o comprometimento da bacia durante a avaliaۥo do abdome (e vice-versa).
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OBS : Uma das considera€‰es importantes sobre os traumatismos de bacia ‚ com rela€•o aos sangramentos, pois o
paciente pode vir a desenvolver choque hipovolƒmico n•o devido ao trauma abdominal, mas devido a um sangramento
oriundo de vasos ou v„sceras p‚lvicas. Isso ocorre principalmente devido a fratura ‡ssea. Com isso os fragmentos
podem vir a lesionar estruturas tais como, mŠsculos, vasos, que levam ao sangramento intenso. Esse sangue fica retido
do espa€o retroperitoneal (localizado posteriormente a cavidade peritoneal). Nesse aspecto o m‚dico deve ter uma
aten€•o especial, pois geralmente os pacientes com trauma de bacia v•o referir dor abdominal baixa e se, por ventura,
ocorrer a abertura da cavidade peritoneal, o sangue vai se espalhar, dificultando a localizaۥo da origem do
sangramento, para que seja realizada a hemostasia. Da„ a import…ncia de saber identificar corretamente um trauma
abdominal de fraturas entre outras les‰es da bacia.

PRIMEIRO ATENDIMENTO AO T RAUMA


Sabe-se que, para qualquer v„tima de um trauma, devemos seguir, como primeira conduta, a realiza€•o de
protocolos estabelecidos pelo ATLS (Suporte Avan€ado de Vida no Trauma). Assim, temos:
A. Vias a‚reas (Airway) e prote€•o da coluna cervical. Consiste na permeabiliza€•o das vias a‚reas (verificar, na
cavidade oral, a presen€a de corpos estranhos, pr‡tese dent†ria, sangue a ser aspirado, etc.) e, ao mesmo
tempo, proteۥo da coluna cervical, deixando-a em posiۥo neutra.
B. Ventila€•o (Breathing). Realizar, neste passo, uma breve inspe€•o da expansibilidade do t‡rax e palpa€•o
das costelas.
C. Circula€•o (Circulation). Neste terceiro passo, avalia-se, de um modo geral, o estado hemodin…mico do
paciente e, se poss„vel, estabelecer dois acessos venosos com agulha de grosso calibre para reposi€•o
volƒmica com pelo menos 2000 ml de cristal‡ide (ringer lactato ou soro fisiol‡gico). Se o paciente n•o respondeu
ou responde inadequadamente, ou mesmo se a v„tima chegou muito chocada, devemos administrar bolsas de
sangue.
D. Avalia€•o neurol‡gica (Desability). Consiste na avalia€•o do n„vel de consciƒncia (Escala de Coma de
Glasgow), simetria pupilar e presen€a de d‚ficits focais.

Portanto, independente do tipo de trauma, devemos sempre dar prioridade a estas fun€‰es vitais mais nobres.
Para os pacientes que se encontram est†veis no primeiro atendimento, a avalia€•o do trauma abdominal dever† ser feita
atrav‚s de exames secund†rios, seja por meio do exame f„sico do abdome seja atrav‚s da realiza€•o de exames mais
complexos, j† em ambiente hospitalar.
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OBS : Como se sabe uma das principais causas de morte nos politraumatizados ‚ o choque hipovolƒmico. Atrav‚s da
cl„nica apresentada pelo paciente pode-se identificar se o choque foi proveniente de trauma abdominal ou de outra
regi•o. Entre outros choques que esses pacientes podem estar expostos incluem o choque cardiogƒnico, neurogƒnico e
s‚ptico. O choque medular decorre de uma flacidez p‡s-trauma principalmente nos casos daqueles pacientes que
sofreram trauma raquimedular.

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PRIORIDADE NO T RAUMA A BDOMINAL


Epidemiologicamente, o trauma intra-abdominal corresponde a uma das principais causas de morte evitável
quando incluímos os pacientes politraumatizados, sendo a falta do diagnóstico da lesão abdominal o real motivo de
morte por este trauma.
Contudo, independente da gravidade do trauma abdominal ou da presença de lesões em qualquer outra
localidade, devemos saber priorizar o atendimento, sempre se baseando nos parâmetros do ATLS. Desta forma, temos:
 Trauma de crânio e abdome: paciente que se apresenta com traumatismo craniano e com trauma abdominal, se ele estiver
hemodinamicamente instável, devemos dar prioridade ao abdome, uma vez que os traumas abdominais expõem um maior
risco de sangramentos e instabilidade hemodinâmica (passo C do ATLS). Se o paciente estiver estável do ponto de vista
hemodinâmico, podemos voltar nosso estudo ao trauma craniano (passo D do ATLS).
 Trauma de crânio, tórax e abdome: da mesma forma, se o paciente apresentar alguma alteração ventilatória (passo B do
ATLS), devemos voltar o nosso estudo para o tórax. Caso contrário, devemos voltar a nossa atenção para o abdome (pelo
risco de choque hipovolêmico; passo C) e, por último, o crânio (passo D).
 Trauma de crânio, tórax, abdome e extremidades: primeiramente devemos manter pérvias as vias aéreas e prover a
imobilização da coluna cervical. Depois disso, devemos seguir a ordem de prioridade: ventilação, avaliando bem o tórax da
vítima; circulação, contendo sangramentos abdominais ou de extremidades (ver OBS3) e, por último, checar o traumatismo
craniano.
 Trauma de crânio, tórax, abdome, extremidade e pelve: da mesma maneira que os demais, devemos seguir a prioridade
instituída pelo ATLS. Resumindo tudo até agora, devemos avaliar da seguinte maneira: vias aéreas e coluna cervical;
avaliação do tórax; avaliação do abdome, pelve (e bacia) e extremidades; e, por fim, avaliação do crânio.
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OBS : Na maioria dos casos, a origem do sangramento dos pacientes vítimas de trauma acontece em 4 lugares,
apenas: no tórax, no abdome, na bacia e nas extremidades. Portanto, se o paciente está em choque, estas regiões
devem ser especialmente avaliadas.

MECANISMO DO TRAUMA
A cinemática do trauma é de grande importância para analisar quais as possíveis lesões que a eventual vítima
pode vir a apresentar. Isto pode ser explicado da seguinte forma: vítima de acidente automobilístico que colidiu contra
um poste, poderá ser acometido por, pelo menos, três possibilidades de traumas: (1) trauma do próprio carro versus o
poste, (2) trauma do motorista versus o carro, principalmente contra o volante, com possível fratura de costela e
perfuração de órgãos torácicos, (3) trauma devido ao choque dos órgãos internos contra a parede de suas respectivas
cavidades.
Para as vítimas de arma de fogo, é indispensável priorizar o orifício de entrada e saída (quando presente),
calibre da arma utilizada, extensão da perfuração, possível trajeto do projétil, para só então suspeitar de quais órgãos
podem ter sido lesionados.
No que diz respeito ao politraumatizado, devemos selecionar com cautela os pacientes que devem ser
encaminhados para o serviço cirúrgico, ou aqueles que permanecerão em observação clínica. Para os pacientes
politraumatizados que preenchem critérios clínicos para cirurgia, mas que são atendidos em hospitais de baixa
complexidade, o médico de plantão deve mantê-lo estável ao máximo, no intuito de encaminhado imediatamente para
um serviço hospitalar que dê um suporte adequado ao paciente.
Analisando o mecanismo do trauma, podemos distinguir dois padrões distintos de trauma. São eles: traumas
fechados e abertos.

TRAUMA FECHADO
O trauma fechado, comum nos acidentes automobilísticos e agressões físicas, pode causar lesões através dos
seguintes mecanismos:
 Compressão
 Esmagamento
 Cisalhamento
 Desaceleração (movimentação interna de órgãos fixos)

O cisalhamento ocorre quando os órgãos são tracionados na mesma direção, mas em sentidos opostos, devido
a diferenças de fixação de cada órgão, causando, assim, uma lesão semelhante a uma torção. Ocorre com frequência
na lesão axonal difusa no encéfalo (no advento de um traumatismo cranioencefálico, por exemplo) ou na medula
espinhal, quando há fratura de coluna lombar.
Como exemplo de lesão por diferença de desaceleração, podemos ter o rompimento de artéria renal, comum em
acidentes automobilísticos. Neste mecanismo, o rim continua seu movimento de aceleração enquanto que a artéria
renal, fixa à artéria aorta, permanece no seu leito, o que pode promover o rompimento vascular, gerando um
sangramento importante. O rim pode ainda sofrer o mecanismo de compressão ou esmagamento pelo cinto de
segurança, se este estiver mal ajustado, ou sofrer impacto direto de colisões laterais.

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Nos traumas fechados os órgãos mais frequentemente lesionados são o baço, o fígado e o intestino delgado.
Nesses casos, o principal mecanismo de trauma se faz pela desaceleração abrupta dos órgãos. O baço e o fígado, em
especial, são órgãos que geralmente são sustentados por estruturas vasculares e possuem poucos ligamentos para sua
fixação na cavidade peritoneal. Com isso, quando há uma desaceleração abrupta, tais órgãos permanecem em
movimento, facilitando a ruptura dessas estruturas vasculares, o que predispõe a sangramentos graves.
Apesar de serem órgãos de intensa vascularização, nem todas as lesões desses órgãos são indicadas para a
cirurgia. As pequenas lacerações de baço, por exemplo, podem ser tratados clinicamente, contanto que estes pacientes
estejam estáveis hemodinamicamente, sem sinais de choque hipovolêmico, mantêm níveis adequados de hemoglobina
e hematócrito, normocorados, normotensos, com frequência cardíaca normal, e apenas uma pequena dor no hipocôndrio
esquerdo. Com isso esses pacientes são levados para a realização da TC, para visualização do tamanho, extensão da
lesão e com isso, é deixado internado em observação clínica.
Um tipo comum de trauma nos acidentes automobilísticos ocorre devido à pressão estabelecida pelo cinto de
segurança mal posicionado, que leva a compressão e ruptura de alças intestinais. Neste caso, muito provavelmente, o
paciente se apresentará com queixa de dor abdominal sem sinais de choque hipovolêmico, uma vez que o intestino
lesado dificilmente causará sangramentos consideráveis. Em contrapartida, este paciente, com cerca de 12 horas após o
evento, pode apresentar sinais de choque séptico. Portanto, para estas ocasiões, devemos sempre considerar a
indicação cirúrgica.

TRAUMA PENETRANTE
Os traumas penetrantes são aqueles caracterizados pela presença de uma solução de continuidade. Para isso,
algumas propriedades devem existir no elemento causador do trauma, tais como: energia cinética e pressão. Os
mecanismos de lesão mais comuns dos ferimentos penetrantes são:
 Arma branca (facas, punhais, foices, etc.) geralmente apresenta uma pequena transferência de energia, mas
uma grande capacidade de provocar lacerações.
 Arma de fogo, que apresenta alta energia, provocando lesões graves. Além disso, a arma de fogo produz vários
outros mecanismos de trauma, como: (1) transferência de energia cinética (energia de movimento) em energia
térmica (promovendo a queimadura das estruturas que se encontram tangencialmente à trajetória do projétil); (2)
cavitação temporária e permanente; (3) trajeto em cambalhota do projétil, visto que o trajeto do elemento, na
maioria das vezes, não é retilíneo, o que nos faz concluir que o projétil pode não fazer o trajeto marcado entre o
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orifício de entrada e o de saída (ver OBS ), podendo determinar lesões distantes destas referências; (4)
capacidade de sofrer fragmentação, o que dificulta ainda mais a localização.

Graças a estes mecanismos, um órgão pode se apresentar sem lesões no primeiro atendimento ao trauma.
Entretanto, devido à queimadura estabelecida pelo projétil após 4 a 6 horas, ele pode entrar em isquemia e falência.
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OBS : É sempre importante, na admissão de um paciente vítima de arma de fogo, localizar o orifício de entrada e o
eventual orifício de saída do projétil (quando este for presente). O orifício de entrada é pequeno, com bordas voltadas
para dentro, com um halo de queimadura visível e, na maioria das vezes, não sangrantes. O orifício de saída, por sua
vez, não possui halo de queimadura, tem bordas voltadas para fora e, na maioria das vezes, é sangrante. Contudo, vale
salientar que, devido à capacidade de realizar movimentos em cambalhota, o projétil pode não ter seguido o trajeto
retilíneo entre estes dois orifícios.
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OBS : Se não for possível determinar o trajeto da bala, a melhor alternativa é a intervenção cirúrgica. Contudo, a
intenção principal não é a retirada do projétil, mas sim a correção dos danos vasculares, orgânicos, nervosos, que a
mesma ocasionou. Por isso muitas vezes o projétil é deixado no interior do paciente sem causar nenhum dano ao
mesmo.

Diferentemente do trauma fechado, os principais órgãos lesionados nos traumas penetrantes por arma branca
(baixa energia) incluem o fígado, o intestino delgado, o músculo diafragma e o cólon, pois geralmente, as facadas
seguem em direção ao abdome e tórax baixo. Já nas lesões por arma de fogo (alta energia), os principais órgãos
afetados são: intestino delgado, cólon, fígado e estruturas vasculares.
Com isso pode-se concluir que nos traumas fechados os órgãos mais lesionados são os órgãos maciços localizados
no abdome superior, enquanto que nos trauma penetrante (arma branca e de fogo), ocorre com maior frequência, lesão
de vísceras ocas.

AVALIA•„O C L…NICA DO P OLITRAUMATIZADO

HISTÓRIA TRAUMÁTICA
A história do trauma do paciente, como já foi explicado anteriormente, é de grande utilidade principalmente para
estabelecer o mecanismo do trauma e quais os principais órgãos que puderam ser lesionados. Assim os principais
aspectos que devem ser levados em consideração são:

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 Traumas Fechados
 Velocidade: no momento do acidente o velocímetro registra a velocidade de impacto do veículo no momento
do acidente.
 Ponto de impacto: aspecto de fundamental importância, pois determina o padrão de lesão e modifica o
mecanismo do trauma, a depender se houve uma colisão lateral ou frontal.
 Intrusão do veículo: sinal de lesão grave, que ocorre quando motor do veículo vem de encontro a vítima.
 Avaliação completa do paciente: não excluindo nenhuma parte do corpo para que lesões não passem
despercebidas
 Condições do veículo: avaliar injúrias maiores que 50 cm que na maioria das vezes refletem traumas graves,
capotagens, esmagamentos laterais ou superiores.
 Avaliar utilização de equipamentos de segurança: utilização de cinto de segurança (ejeção do veículo ou
motocicleta, avaliar trauma contra volante), capacete, air-bag, posição em que se encontrava no momento
do trauma.

 Traumas Penetrantes
 Tipo de arma de fogo e calibre. Isso é importante, pois algumas vezes o orifício de entrada é pequeno,
entretanto o comprimento bala é longo, podendo lesionar diversas estruturas.
 Tipo de arma branca e comprimento: avaliando assim, a profundidade da lesão e se houve penetração ou
não da cavidade torácica ou abdominal.
 Distância entre a vítima e o agressor.
 Localização da lesão: parede anterior, flanco ou dorso.
 Avaliar presença de orifício de entrada e saída:
 Quantidade de lesões

Em alguns casos, estas informações não podem ser colhidas por intermédio da própria vítima, devido a suas
condições clínicas e, por isso, os bombeiros ou socorristas realizam uma função importante ao repassar todas as
informações necessárias aos médicos. Toas essas informações são importantes para o médico avaliar a gravidade do
quadro do paciente e determinar a melhor conduta a ser adotada.
Vale salientar que, mesmo na presença de um tiro no abdome, devemos sempre avaliar o paciente por completo,
dando ênfase ao protocolo do ABC do ATLS, sendo sempre necessário avaliar as vias aéreas em primeiro lugar.

EXAME FÍSICO
Depois de avaliada toda a história e conhecendo a cinemática do trauma, devemos realizar um minucioso exame
físico, que está dividido nas seguintes etapas:
 Inspeção: avaliar a presença de estigmas de trauma como a presença de ferimentos, lacerações, hematomas,
abaulamentos.
 Ausculta: é uma avaliação subjetiva, principalmente quando está relacionada ao abdome. Através dessa avaliação
geralmente não é possível avaliar se há ou não trauma abdominal.
 Percussão: avaliar hipertimpanismo (indicando o escape de ar de vísceras ocas no caso lesão das mesmas) ou som maciço
(devido à quantidade de sangue no interior da cavidade).
 Palpação: não tem nenhum valor clínico quando o paciente encontra-se inconsciente, choque neurogênico ou embriaguez.
Por isso é necessário ter conhecimento da suspeita clínica do paciente, através da cinemática do trauma, mecanismo do
trauma e choque hipovolêmico. Entretanto aqueles pacientes que se apresentam com dor a descompressão do abdome
(sinal de Blumberg), indicado sinais de peritonite, devem ser encaminhados diretamente para a cirurgia, sem a necessidade
de realização de exames complementares.

Alguns fatores podem interferir na realização do exame físico do paciente. Entre as principais (que já foram
citadas), incluem aquelas que envolvem alterações do nível de consciência. Os principais são:
 Álcool ou outras drogas
 Lesão cerebral ou de medula
 Fratura de costelas, coluna ou bacia

No que diz respeito a vítimas de trauma que se apresentam alcoolizadas e com nível de consciência rebaixado,
nós nunca devemos associar esta alteração da consciência à ingesta alcoólica. Ao contrário disso, devemos atribuir,
primeiramente, a causa da inconsciência aos seguintes fatores: (1) distúrbios das vias aéreas, (2) distúrbios ventilatórios,
(3) choque hipovolêmico, (4) TCE. Depois de avaliadas e excluídas todas estas possibilidades, podemos, então,
suspeitar como causa da inconsciência a ingestão exagerada de álcool.
Outra condição importante de comprometimento do exame inclui a supervalorização de uma determinada lesão.
Isto acontece quando o paciente apresenta dor e, sabidamente, diagnosticamos a presença de fraturas, seja nas
costelas, na coluna ou na bacia, e, por causa disso, deixamos de avaliar melhor o abdome. Esta condição pode
comprometer um bom exame do abdome, o qual poderia demonstrar alterações importantes.

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AVALIAÇÃO DO TRAUMA POR ARMA BRANCA


No que diz respeito ‹ avalia€•o de les‰es causadas por arma branca na parede anterior do abdome, em
especial, devemos, primeiramente, avaliar as condi€‰es de risco de morte preconizadas pelo ATLS, que incluem
avalia€•o das vias a‚reas, ventila€•o e circula€•o, procurando sinais cl„nicos de choque hipovolƒmico e, logo em
seguida, TCE. Enquanto avaliamos e estabilizamos a v„tima, devemos pesquisar a hist‡ria cl„nica do paciente,
investigando, principalmente, o tipo de arma utilizada, o mecanismo de trauma, a dist…ncia e localiza€•o. Depois de
realizados todos estes passos, devemos explorar a ferida, que corresponde a realizar a limpeza da les•o com assepsia
e anti-sepsia adequada seguida de anestesia local. Ap‡s isso, introduz-se o dedo no interior da ferida para melhor
avali†-la. Se for detectado que o ferimento perfurou a cavidade abdominal de fato, dizemos que a “explora€•o ‚
positiva”, havendo indica€•o para cirurgia.
Diferentemente disso, n•o devemos explorar com o dedo les‰es por arma branca quando localizadas na por€•o
inferior do t‡rax, dorso e parede lateral do abdome. Os motivos s•o claros:
 Nos traumas tor†cicos baixos, a introdu€•o do dedo feita erroneamente no espa€o intercostal pode deslocar um
eventual o sangramento para o interior da cavidade pleural, o que agrava ainda mais o quadro.
 No dorso ‚ contraindicada devido ‹ presen€a dos grandes vasos do retro-peritŒnio, que podem ser acometidos
pela abordagem digital.
 O flanco apresenta ‡rg•os vitais logo abaixo da pele, cuja manipula€•o pode comprometer ainda mais a les•o.

Portanto, s‡ podemos explorar les‰es por arma branca na parede anterior do abdome. Para as les‰es nas
demais regi‰es, no intuito de detectar a transfixa€•o da cavidade abdominal, podemos optar por um exame físico de
repetição ou ainda realiza€•o de exames complementares, que incluem ultrasonografia, tomografia computadorizada,
laparoscopia, toracoscopia, lavado peritoneal diagn‡stico (paracentese), podendo ser realizado por pun€•o ou abertura
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(cirŠrgica; ver OBS ).
Se houver sinais de irritaۥo intestinal, devemos encaminhar o paciente para a cirurgia, sob suspeita de
peritonite.
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OBS : Para a realiza€•o da paracentese diagn‡stica, ‚ colocado cerca de 1000 ml de soro fisiol‡gico na cavidade
abdominal e, posteriormente, o l„quido ‚ aspirado avaliando seu aspecto ao retorno. No trauma, a aspira€•o se faz
abaixo da cicatriz umbilical, exceto nos casos de gestantes e no trauma de bacia. Se for detectada presen€a de sangue
(100.000 hem†cias por campo ou 500 leuc‡citos), fibras, bile, secre€•o ent‚rica, o paciente ‚ indicado para a realiza€•o
de cirurgia.

AVALIAÇÃO DE FERIMENTOS PENETRANTES


Les‰es penetrantes em per„neo, reto, vagina e/ou regi•o glŠtea tamb‚m devem ser minuciosamente avaliadas.
Para isso, realiza-se uma inspe€•o completa nesta regi•o perineal, avaliando sinais de trauma, seguida da realiza€•o do
toque retal. Se houver a presen€a de sangue (na pr‡pria luva, por exemplo), conclui-se que h† les•o de ‡rg•o
abdominal. Se na avalia€•o da vagina for detectada a presen€a de sangue, conclui-se les•o de ‡rg•o ginecol‡gico.
Nos ferimentos da regi•o glŠtea, pode haver uma possibilidade iminente de o proj‚til ter penetrado a regi•o
glŠtea, principalmente quando o tiro ‚ deferido em sentido ascendente.

AVALIAÇÃO DE LESÕES POR ARMA DE FOGO NO ABDOME


No que diz respeito ao doente que apresenta um poss„vel ferimento por arma de fogo no abdome, at‚ que se
prove o contr†rio, sempre a melhor conduta ser† a cirurgia. A exce€•o se faz na suspeita de um tiro de direção
tangencial, ou seja, o proj‚til tem orif„cio de entrada muito pr‡ximo do orif„cio de sa„da. Isto sugere que a bala
atravessou apenas pele e tecido celular subcut…neo, sem perfurar o peritŒnio. Nestes casos, podemos realizar alguns
exames antes da indica€•o cirŠrgica, tais como: USG, TC, laparoscopia. Se houver dŠvidas nestes exames, indica-se a
cirŠrgica.
Entretanto, ainda pode existir a possibilidade da cavita€•o tempor†ria, que corresponde ‹ queimadura das
estruturas pr‡ximas ao trajeto do proj‚til e, com isso, ap‡s 4 a 6 horas, o paciente pode vir a apresentar sinais e
sintomas espec„ficos de isquemia desta regi•o. Da„ a import…ncia da realiza€•o de exames repetitivos nos pacientes
com les•o por arma de fogo, que n•o tiveram indica€•o cirŠrgica.
Sempre nos casos de les‰es por arma de fogo, devemos procurar o orif„cio de entrada e de sa„da, avaliando os
poss„veis ‡rg•os que foram lesionados. Quando o paciente apresentar somente orif„cio de entrada, sugere-se que o
proj‚til ficou retido no interior da cavidade abdominal. Como alternativa para este caso, se o paciente estiver em
condi€‰es cl„nicas adequadas (estabilidade hemodin…mica), podemos realizar uma radiografia simples de abdome, em
PA e perfil, para localiza€•o exata do proj‚til, de seu trajeto (lembrando que nem sempre o sentido estabelecido ‚
correto devido aos movimentos internos de “cambalhota” que o proj‚til realiza) e das prov†veis les‰es estruturais.
Nas les‰es por arma de fogo, devemos, pelo menos, solicitar radiografias de t‡rax, bacia e abdome. Embora
sejam pouco conclusivos para o trauma, a solicitaۥo de exames laboratoriais sempre deve ser feita. Contudo, na
maioria dos casos, a melhor estrat‚gia ‚ a cirurgia precoce.

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OBS : O trauma abdominal, de fato, pode levar ao choque. Para chegar ‹ conclus•o de que o paciente apresenta um
trauma abdominal, ‚ necess†rio ter conhecimento do mecanismo e da hist‡ria do trauma, logo que se estabiliza o
paciente. O modo ideal de aborda-lo ‚ realizando uma avalia€•o repetitiva, realizando os passos ABCD
incansavelmente, priorizando sempre o exame f„sico. Assim, os pacientes com trauma abdominal podem evoluir para o
choque hipovolƒmico e serem prontamente identificados. Atualmente, as fases do choque hipovolƒmico s•o
determinadas pela quantidade de sangue que o paciente perdeu. Desta forma, somente os pacientes com perda maior
ou igual a 1500 ml de sangue v•o permanecer hipotensos, ou seja, perdas de at‚ 1500 ml de sangue n•o implicam em
nenhuma interferƒncia na press•o arterial. Por esta raz•o, nem sempre as v„timas de trauma v•o se apresentar
hipotensos, mesmo com hemorragias consider†veis. Devemos, portanto, associar outros sinais de choque, tais como
queda da frequƒncia card„aca, sudorese, palidez cut…nea, altera€•o do n„vel de consciƒncia, etc.
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OBS : Em resumo, devemos suspeitar de um choque por trauma abdominal diante dos seguintes par…metros:
 Evidƒncia de les•o abdominal pelo mecanismo de trauma, pela hist‡ria ou pela avalia€•o.
 Sinais de hipotens•o.
 Ultrassom (FAST) positivo ou lavagem peritoneal diagn‡stica (LPD) francamente positiva.
 Ausƒncia de hemot‡rax maci€o pela radiografia.

MEDIDAS AUXILIARES
As medidas auxiliares s•o procedimentos que podem servir como diagn‡stico de algumas les‰es como tamb‚m
propedƒuticas terapƒuticas, aliviando alguns sintomas do paciente.
 Passagem de sonda nasogástrica. Durante o atendimento, ‚ importante a passagem de uma sonda
nasog†strica para o al„vio da distens•o e descompress•o do estŒmago antes da LPD. Por meio dela, podemos
identificar les‰es do pr‡prio estŒmago quando h† a presen€a de sangue na sonda. A utiliza€•o de sonda
nasog†strica est† contraindicada nos casos de fratura de base do cr…nio, clinicamente suspeitada pela equimose
periorbit†ria (sinal do guaxinim), ou ainda equimose retroauricular (sinal de battle), liquorreia, otorragia, etc.
Nesses casos, a sonda deve ser passada pela boca (orog†strica), pois ao passar pelo nariz, a sonda pode
atingir a cavidade intracraniana atrav‚s da fratura. Tamb‚m ‚ contraindicada nos pacientes que se apresentem
com eminƒncia de vŒmito. Nos casos graves deve-se realizar a entuba€•o orotraqueal do paciente evitando
aspira€‰es.

 Passagem de sonda vesical. ˆ um procedimento fundamental para monitoramento do d‚bito urin†rio (o que
reflete a volemia do paciente), al‚m de promover a descompress•o da bexiga antes da LPD e servir como
diagn‡stico para les‰es vesicais ou renais (trauma de via urin†ria). Devemos tomar cuidado na presen€a de
sinais de fratura de uretra (equimose perineal, sangue no meato uretral, etc.), o que contra-indica a passagem da
sonda, sob a pena de piorar a les•o. Por estas raz‰es, antes de introduzir a sonda vesical em pacientes
masculinos, ‚ prudente realizar um toque retal para avaliar a pr‡stata. Na presen€a de suspeitas de fratura,
podemos realizar um exame contrastado de via urin†ria (uretrocistografia) ou solicitar um urologista. Caso estas
op€‰es n•o sejam poss„veis, e o paciente apresente bexigoma, podemos optar por puncionar este ‡rg•o
utilizando um jelco logo acima de osso pŠbis.

EXAMES DIAGN†STICOS NO T RAUMA F ECHADO

RADIOGRAFIA SIMPLES
Sempre no trauma de abdome, devemos solicitar duas radiografias obrigat‡rias para o t‡rax e a bacia. A
avalia€•o da radiografia do t‡rax serve para identificar algum hemot‡rax ou pneumot‡rax associado. A avalia€•o
radiogr†fica da bacia serve para identificar poss„veis fraturas e, assim, avaliar melhor esta regi•o.
O estudo radiogr†fico abdominal ‚ solicitado principalmente para avaliar o posicionamento do proj‚til e sua
localiza€•o interna. Contudo, s‡ deve ser realizado se o paciente estiver hemodinamicamente est†vel – caso contr†rio,
dever† ser encaminhado para cirurgia.
De rotina, temos as seguintes indica€‰es:
 Para o trauma fechado, sempre devemos solicitar a radiografia de t‡rax e bacia em AP.
 Para ferimentos penetrantes, solicitar a radiografia de t‡rax em AP e abdome com marcas radiopacas (se
hemodinamicamente est†vel, tamb‚m podemos solicitar em perfil).

EXAMES LABORATORIAIS
Esses exames n•o tƒm nenhuma import…ncia cl„nica apesar de serem sempre solicitados. Al‚m disso, n•o
existem exames de sangue obrigat‡rios, e n•o v•o refletir a gravidade no trauma e les‰es prov†veis. Contudo, ‚
importante para pacientes anormais hemodinamicamente a realiza€•o da tipagem sangu„nea e a prova cruzada. Em
resumo, os principais exames a serem solicitados s•o:

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 Hemograma (hemoglobina e hematócrito): tem pouca import…ncia diagn‡stica, mas serve para o seguimento
e acompanhamento cl„nico do paciente. Se a hemoglobina e hemat‡crito do paciente est•o em decl„nio,
suspeita-se que o paciente est† com sangramento ativo, o que indica a cirurgia. Quando permanecem
inalterados, admite-se que o paciente est† est†vel.
 Tipagem Sanguínea: importante sua determina€•o, pois os pacientes v„timas de trauma podem necessitar de
reposi€•o sangu„nea. ˆ um exame obrigat‡rio. Como vimos, durante o passo C do ATLS (circula€•o), devemos
promover dois acessos venosos com jelco calibroso, e estabelecer uma reposi€•o com soro cristal‡ide (ringer
lactato ou soro fisiol‡gico – 2000 ml). Ap‡s essa administra€•o se n•o houve resposta por parte do paciente,
-
deve-se administrar sangue. Nos pacientes que est•o em emergƒncia absoluta pode-se administrar o sangue O
ou optar pelo sangue tipo espec„fico (ou seja, se o paciente ‚ do tipo A, administra-se A). Portanto, logo na
admiss•o (preferivelmente, durante o passo C) devemos identificar o tipo sangu„neo do paciente, no intuito de
reservar as bolsas de sangue.
 Outros exames: teste de gravidez (obrigat‡rio para pacientes em idade f‚rtil); pesquisa de †lcool ou outras
drogas; hematŠria macrosc‡pica vs microsc‡pica.
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OBS : A prioridade do atendimento na ocasi•o de uma gesta€•o ‚ sempre a m•e. Vale salientar que, se a m•e se
apresenta hipotensa, ‚ sinal que o feto j† estava hipotenso h† um bom tempo.

LAVADO PERITONEAL DIAGNÓSTICO (LPD)


ˆ um procedimento que pode complementar a pun€•o abdominal. Consiste na
infus•o de l„quidos dentro da cavidade abdominal (1500 – 2000 mL no adulto; 15 mL/Kg
de peso na crian€a) seguida de aspira€•o do mesmo.
O lavado peritoneal pode ser realizado em casos de punۥo negativa de
paracentese que ocorre, por exemplo, em suspeita de ruptura de v„sceras maci€as como
o f„gado ou ba€o, quando n•o se tem exames por imagem dispon„veis no servi€o de
emergƒncia. Infunde-se l„quido na cavidade abdominal, aguarda a homogeneiza€•o do
l„quido com o sangue e, logo depois, aspira novamente. Se o sangue estiver presente, ‚
um forte indicativo de les•o visceral, sendo a laparotomia indicada neste caso.
A LPD ‚ um processo diagn‡stico invasivo, de r†pida execu€•o, que alcan€a
uma sensibilidade de 98% para a detecۥo de hemorragia intraperitoneal e que altera,
de modo significativo, os achados subsequentes ao exame f„sico do doente.
Geralmente, ‚ utilizado nos pacientes v„timas de trauma fechado que se encontram hipotensos, sem condi€‰es
cl„nicas de realizar TC ou USG.
Em resumo, deve ser realizado na vigƒncia de qualquer uma das seguintes situa€‰es:
 Modifica€‰es agudas no estado de consciƒncia: TCE, intoxica€•o por †lcool, uso de drogas, etc;
 Modifica€‰es na sensibilidade: les•o da medula;
 Les‰es de estruturas adjacentes: Šltimas costelas, pelve, coluna lombar;
 Achados duvidosos ao exame f„sico;
 Previs•o de longa perda de contato com o doente: anestesia geral, estudos radiol‡gicos prolongados, etc.
 Sinal de contus•o da parede abdominal por cinto de seguran€a com suspeita de les•o de intestino.
 Investiga€•o de sangramento abdominal em pacientes inst†veis hemodinamicamente.

FAST
O FAST (Focused Abdominal Sonography for Trauma), caracterizado pela realizaۥo de ultrassonografia na sala
Emergƒncia, ‚ um exame r†pido e n•o invasivo, utilizado para detec€•o de trauma abdominal. ˆ realizado em quatro
pontos espec„ficos: (1) regi•o peric†rdica, (2) espa€o entre o f„gado e rim direito, (3) loja esplƒnica e (4) pelve. Nele
observa-se a presen€a de l„quido, para detec€•o de trauma abdominal.
Por meio dele, podemos avaliar de maneira efetiva a presen€a de l„quido livre na cavidade peritoneal e a les•o
de ‡rg•os parenquimatosos. Se positivo o achado, h† indica€•o de cirurgia (entretanto, a TC deve ser uma op€•o
adicional caso o paciente esteja est†vel). Vale salientar que o FAST ‚ um exame examinador-dependente.

TOMOGRAFIA COMPUTADORIZADA (TC)


Se o paciente estiver est†vel, sem dŠvida nenhuma, o melhor exame para avaliar o trauma abdominal ‚ a TC.
Contudo, a TC exige a transferƒncia do doente para o setor de radiologia, implica na administra€•o de contraste por via
endovenosa e requer o exame do abdome superior, inferior e da pelve. Consome mais tempo para a sua realizaۥo e
est† indicado apenas nos doentes hemodinamicamente normais, nos quais n•o h† aparente indica€•o para uma
laparotomia de emergƒncia.
A TC fornece informa€‰es sobre a presen€a e a extens•o de les‰es de ‡rg•os retroperitoneais e p‚lvicos, cuja
avalia€•o ‚ dif„cil pelo exame f„sico, FAST, ou pela lavagem peritoneal diagn‡stica.
Entre as contraindica€‰es relativas ao uso de TC podem ser lembradas a demora em ter o tom‡grafo dispon„vel,
a falta de colabora€•o de um doente que n•o pode ser sedado com seguran€a e a alergia a contrastes iodados quando
n•o se disp‰e de um contraste n•o-iŒnico.
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LPD FAST TC
Principais - Documentar sangramento se - Documentar a presen€a de l„quido se - Documentar les•o org…nica se
indicações doente hipotenso doente hipotenso PA normal
- Indicaۥo para todos os Indicaۥo para todos os doentes - Indicaۥo para todos os
doentes pacientes est†veis
Vantagens - Diagn‡stico precoce - Diagn‡stico precoce - O mais espec„fico para definir
- Realiza€•o r†pida - Indica€•o para todos os doentes les‰es
- Detecta les•o intestinal - N•o invasivo - Permitir vis•o panor…mica do
- N•o necessita transporte - Realiza€•o r†pida e repet„vel trauma abdominal
- N•o necessita transporte
Desvantagens - Invasivo - Operador-dependente - ↑ Custo e tempo
- Baixa especificidade - Distor€•o da imagem por meteorismo - N•o diagnostica les‰es de
- N•o diagnostica les•o de e enfisema subcut…neo diafragma, intestino e algumas
diafragma e de retro-peritŒnio - N•o diagnostica les‰es do diafragma, les‰es pancre†ticas
- N•o pode ser feito quando h† intestino e les‰es pancre†ticas - Necessita de transporte
sinais de peritonite (dor ‹ - N•o pode ser feito quando h† sinais
descompress•o), mesmo se o de peritonite, mesmo se o paciente
paciente estiver est†vel estiver est†vel
Tempo de duração R†pido R†pido Prolongado
Sensibilidade Alta (98%) Alta (operador-dependente) Alta (92 a 98% de acur†cia)
Especificidade Baixa Intermedi†ria Alta

EXAMES CONTRASTADOS
Devemos solicitar alguns exames contrastados, mas de modo secund†rio e quando o paciente j† estiver est†vel.
Isso porque s•o exames que demandam tempo e que n•o podem ser feitos na sala de emergƒncia. S•o eles:
 Uretrografia
 Cistografia
 Urografia excretora por TC
 Exames contrastados do tubo digestivo (enema opaco, por exemplo)
 Tomografia contrastada

ESTUDOS D IAGN†STICOS NO TRAUMA PENETRANTE


O estudo do trauma penetrante exige algumas peculiaridades, a depender da localiza€•o da les•o e da
disponibilidade de artif„cios no servi€o de antedimento:
 Ferimentos na parte baixa do tórax (transição tóraco-abdominal): devemos realizar exame f„sico repetido,
toracoscopia, laparoscopia ou tomografia. Em caso de ferimento t‡raco-abdominal esquerdo por arma de fogo,
a pol„tica mais segura ‚ a ado€•o de laparotomia.

 Ferimentos por arma branca na parede anterior do abdome: realizar explora€•o do local do ferimento, LPD,
FAST ou exame f„sico repetido.

 Ferimento por arma branca no dorso ou nos flancos: LPD, exame f„sico repetido ou tomografia com duplo
ou triplo contraste (duplo: oral e venoso; triplo: oral, venoso e retal).

INDICA•‚ES PARA LAPAROTOMIA


Em certo doentes, o discernimento cirŠrgico ‚ o necess†rio para determinar o momento e a necessidade da
cirurgia. As indica€‰es abaixo s•o frequentes para facilitar o processo de decis•o do cirurgi•o em rela€•o a esse
problema:
Trauma fechado Ferimentos penetrantes
 ↓PA, suspeita de les•o de v„scera  Hipotens•o
 PneumoperitŒnio  Les•o peritoneal / retro-peritonial
 Ruptura de diafragma  Peritonite
 Peritonite  Eviscera€•o
 Positividade no LPD, FAST ou tomografia com  Positividade na LPD, FAST ou tomografia com
contraste contraste

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C ONSIDERA•‚ES SOBRE AS F RATURAS DE BACIA


O anel pélvico é constituído pelo sacro e pelos ossos inonimados (ílio, isquio e púbis) junto com um grande
número de estruturas ligamentares. A constatação de fraturas pélvicas ou de rupturas de ligamentos pélvicos faz supor
que o doente foi sujeito à ação de forças de grande intensidade.
Doentes com fraturas pélvicas instáveis e choque hemorrágico apresentam quatro fontes potenciais de perda
sanguínea: (1) superfícies ósseas fraturadas; (2) plexos venosos pélvicos; (3) lesão arterial pélvica, ou (4) fontes extra-
pélvicas.

MECANISMOS DE TRAUMA E CLASSIFICAÇÃO


Quatro padrões de força que causam fraturas pélvicas incluem:
 Compressão ântero-posterior: pode ser devida a atropelamento de pedestres, colisão de motocicleta,
esmagamento diretamento da pelve ou queda de altura superior a 3,6 metros (12 pés).
 Compressão lateral: decorre de uma colisão automobilística e resulta em rotação interna da hemipelve
envolvida, que pode projetar o púbis contra as vísceras do sistema genito-urinário inferior.
 Cisalhamento vertical: acontece quando um osso do quadril sobe por sobre o outro, resultando em ruptura dos
ligamentos sacroespinhosos e sacrotuberosos, o que provoca um sangramento importante associado a grave
instabilidade pélvica.
 Padrões complexos (combinados)

A classificação do trauma de bacia é feita basicamente em fraturas abertas e fraturas fechadas, sendo esta
classificação importante pela associação com o trauma abdominal e pela realização de diagnóstico diferencial.
Para que a fratura de bacia ocorra, é necessária, ao menos, a presença de uma força traumática significativa. As
fraturas pélvicas associam-se, com frequência, a lesões viscerais intra e retroperitoneais e a lesões de estruturas
vasculares. O sangramento pode ser oriundo da própria extremidade óssea, da musculatura e de veias/artérias
sobrejacentes ao trauma.

AVALIAÇÃO
É importante que se proceda rapidamente ao exame clínico dos flancos, do escroto e do períneo, para detectar a
ocorrência de sangue no meato uretral, de edema ou de equimoses e para verificar se existem lesões acometendo
períneo, a vagina, o reto ou as partes moles das nádegas, sugerindo a possibilidade de haver uma fratura pélvica aberta.
Devemos seguir a avaliação descrita abaixo:
 Inspeção da pelve
 Palpação da próstata
 Avaliação do anel pélvico: assimetria no tamanho das pernas, rotação externa e dor à palpação da bacia.
 Uso de manobras manuais, que devem ser realizadas apenas uma vez, durante o exame físico, pois, se
repetidas, podem resultar em destamponamento de vasos ocluídos por coágulos. Na presença de dor, devemos
parar a manipulação.

CONDUTA DE EMERGÊNCIA
Devemos proceder da seguinte maneira:
 Reposição de volume;
 Definir se a fratura é aberta ou fechada e se há associação com trauma abdominal;
 Avaliar a presença de lesões perineais / gênito-urinárias associadas;
 Avaliar a necessidade de transferência do paciente;
 Proceder com a imobilização da fratura de bacia: enfaixamento da pelve por um lençol, de modo a causar uma
rotação interna dos membros inferiores; aplicação de um dispositivo a vácuo de tração longitudinal da cluna; ou
aplicação de uma calça pneumática antichoque.

Se não houver líquido dentro do abdome na vigência


de uma fratura de quadril, não há indicação de laparotomia,
uma vez que não há associação trauma abdominal. Para este
caso, devemos solicitar uma arteriografia para realizar a
embolização do leito sangrante e, depois de parado o
sangramento, devemos fixar o quadil com o auxílio da
ortopedia.
Se durante a avaliação abdominal encontrarmos
sangue, não há condições de tratar com embolização. Neste
caso, devemos proceder com laparotomia para o controle da
hemorragia. Caso não seja possível tamponar o sangramento
pélvico, podemos solicitar a ateriorgrafia e, por fim, a fixação
óssea.

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C ONDUTAS CIR‡RGICAS NO TRAUMA A BDOMINAL


Como breve revis•o, devemos lembrar que, muito provavelmente, os pacientes com trauma abdominal ser•o
admitidos como politraumatizados, podendo apresentar v†rias formas de trauma, al‚m do abdominal. Para eles,
devemos seguir a prioridade de atendimento descrita abaixo:
 ABCDE do ATLS;
 Estabiliza€•o do paciente;
 Defini€•o das prioridades;
 Exames a depender da estabilidade hemodin…mica:
 Para pacientes inst†veis, podemos optar pelo hemograma, β-hCG na mulher em idade f‚rtil, tipagem
sangu„nea, ultrassonografia e LPD.
 Para pacientes est†veis, al‚m de solicitar, da mesma forma, o hemograma, β-hCG na mulher em idade
f‚rtil e a tipagem sangu„nea, temos a op€•o de fazer uso de TC.
 Defini€•o da indica€•o cirŠrgica;
 Definir les‰es associadas;
 Considerar cirurgia no caso de falha no tratamento conservador.

Portanto, s•o dois tipos de pacientes que ser•o encaminhados para cirurgia: aqueles que chegam na admiss•o
j† inst†veis hemodinamicamente, e aqueles que se encontravam bem, mas que passaram a apresentar sinais de
hipotens•o e choque, indicando falha na terapia conservadora.
Obviamente, al‚m da estabilidade hemodin…mica, devemos considerar o mecanismo do trauma para definir a
conduta terapƒutica adequada para a v„tima. No trauma por arma de fogo, por exemplo, a n•o ser que tenha sido um tiro
tangencial, ser† encaminhado para a cirurgia. Assim como nos casos de les‰es por p‚rfuro-cortantes, que quando h† o
comprometimento da integridade do peritŒnio, tem-se indica€•o cirŠrgica.
O trauma contuso, por sua vez, merece uma melhor avalia€•o, uma vez que n•o apresenta uma les•o externa
vis„vel e/ou bem definida. Neste caso, temos trƒs op€‰es a triar:
 Se o paciente se apresenta inst†vel, ele deve ser submetido ao USG ou ao LPD, no intuito de avaliar a
presen€a de sangue dentro da cavidade. Neste caso, se o paciente apresenta-se inst†vel e possui l„quido na
cavidade abdominal, conclui-se que a fonte de sangramento ‚ no abdome, o que exige a realiza€•o de
laparotomia nestas v„timas.
 Se o paciente apresenta-se inst†vel e, ao USG ou no LPD, n•o apresenta sangue na cavidade peritoneal,
conclui-se que a fonte do sangramento acontece em outro local (t‡rax, bacia ou extremidades). Devemos,
portanto, investigar essas outras regi‰es anatŒmicas.
 Se o paciente se apresenta est†vel, sem qualquer sinal de choque hipovolƒmico, altera€•o no n„vel de
consciƒncia ou no seu estado de alerta, podemos optar pela TC, logo de in„cio. A depender do achado da TC, a
cirurgia ser† indicada ou n•o. A presen€a de agita€•o e inquietude contraindica a realiza€•o da TC (para estes
casos, podemos sedar o paciente e/ou lan€ar m•o do US do LPD). Se, nestes casos, o US vier positivo,
significa dizer que o paciente tem sangramento (US positivo), sendo necess†ria uma melhor investiga€•o da
causa. Caso contr†rio, isto ‚, sem sangramento (US negativo), podemos optar pela observa€•o cl„nica e
tratamento conservador.

Antes de realizar a laparotomia exploradora para os pacientes adequados para a cirurgia, devemos realizar os
seguintes cuidados:
 Dois acessos venosos com jelco calibroso (14), de preferƒncia, um jelco grosso e curto em veia perif‚rica.
 Cristal‡ides (Ringer lactato ou soro fisiol‡gico, 2000ml)
 Hemoderivados
 Coleta de sangue
 Sondagem vesical (contraindicada em pacientes com les•o de pr‡stata ou com fratura de per„neo) e sondagem
g†strica (sonda nasog†strica contraindicada em pacientes com fratura de base de cr…nio)
 Monitoriza€•o
 Transporte
 Antibioticoprofilaxia (at‚ 6h do trauma) ou antibioticoterapia (ap‡s 6h do trauma). A escolha do antibi‡tico
depende do local lesionado: se for uma les•o de estŒmago, utiliza um antibi‡tico com espectro para gram-
negativo; se for les•o de intestino, antibi‡ticos que cobrem gram-negativos e anaer‡bios.
 Imuniza€•o antitet…nica
 Anestesia geral (obrigat‡ria no trauma).

A laparotomia padr•o para o trauma ‚ uma incis•o


longitudinal mediana supraumbilical ou infraumbilical, a
depender da topografia anatŒmica que se quer abordar. Em
caso de les•o hep†tica grave, podemos associar uma
incis•o subcostal ou lan€ar m•o da toracotomia.

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OBS : Ao se abrir o abdome, seja por laparoscopia ou por laparotomia, devemos proceder com o inventário da
cavidade, que consiste na revis•o cirŠrgica sistem†tica de toda a cavidade na busca de les‰es n•o diagnosticadas por
exames pr‚vios. Como sabemos, ferimentos por arma de fogo, por exemplo, n•o segue uma regra fixa, uma vez que o
trajeto do proj‚til ‚ errante, devido aos seus movimentos em cambalhota. Desta forma, devemos obedecer a seguinte
sequƒncia:
 Avalia€•o das goteiras parietais direita (espa€o entre o colo ascendente e o peritŒnio) e esquerda (espa€o entre
o colo descendente e o peritŒnio);
 Avalia€•o do intestino delgado, iniciando-se pelo …ngulo de Treitz (jun€•o duodeno-jejunal), at‚ chegar ‹ v†lvula
„leo-cecal.
 Rebate o intestino e inicia o estudo do colo ascendente, colo transverso, descendente e reto.
 Estudo do retro-peritŒnio e restante do abdome inferior.
 No abdome superior, devemos avaliar, sistematicamente, ba€o, f„gado e parede anterior do estŒmago.
 Abrir a retro-cavidade, que ‚ o espa€o situado entre o lobo hep†tico esquerdo e o estŒmago, para avalia€•o do
p…ncreas e duodeno.
 Estudar as lojas renais, no retro-peritŒnio.

TRAUMA DE CÓLON
Na ocasi•o de les•o do c‡lon, devemos, inicialmente, conhecer o mecanismo do trauma: se foi um trauma
contuso ou se foi por ferimento de arma de fogo ou p‚rfuro-cortante. Este passo ‚ importante devido ‹s particularidades
de cada caso: na vigƒncia de les•o por arma de fogo, por exemplo, devemos realizar o desbridamento da les•o em
queimadura ao redor da les•o aparente, al‚m de considerar a cavita€•o permanente e a cavita€•o tempor†ria.
O tempo transcorrido desde a lesão tamb‚m ‚ uma informa€•o fundamental na admiss•o do paciente ‹ sala
de cirurgia. Por estarmos falando de c‡lon, considera-se uma cirurgia antes de 6 horas de evolu€•o do trauma como
contaminada; quando h† mais de 6 horas de dura€•o, cirurgia infectada.
ˆ prudente conhecer ainda a presen€a de lesões associadas: trauma de al€a intestinal, de f„gado, de
estŒmago, etc. Na medida em que se realiza o invent†rio da cavidade, estaremos aptos a encontrar tais les‰es e, neste
mesmo momento, j† devemos trat†-las.
Al‚m de tudo isso, manter a condição hemodinâmica do paciente ‚ outro passo fundamental para garantir um
bom progn‡stico. A depender da situa€•o hemodin…mica do indiv„duo, a conduta terapƒutica pode variar.

Condutas.
A depender dos par…metros vistos anteriormente, podemos realizar as seguintes condutas para o tratamento das
les‰es de c‡lon:
 Desbridamento da les•o por arma de fogo;
 Sutura prim†ria da les•o;
 Exterioriza€•o da les•o e realiza€•o de colostomia;
 Ressec€•o da les•o e promo€•o de anastomoses.

Com bases nestas condutas, devemos associ†-las para melhor servir o paciente e tratar sua les•o. Desta forma,
pacientes que apresentem ferimentos por armas de fogo associadas a les‰es muito grandes, devemos desbridar a les•o
ou ressec†-la e realizar a anastomose entre os segmentos remanescentes. O paciente com longa evolu€•o da les•o –
que j† se encontra infectado – n•o pode ser submetido ‹ sutura prim†ria, sob o risco de forma€•o de f„stulas. Pacientes
inst†veis hemodinamicamente devem ser submetidos a cirurgias r†pidas, por‚m efetivas, para que a promo€•o da
estabiliza€•o hemodin…mica seja procedida com rapidez.
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OBS : Devemos lembrar que, no que diz respeito ao c‡lon direito, seu suprimento sangu„neo ‚ promovido pela art‚ria
mesent‚rica superior, a qual fornece dois ramos: a art‚ria c‡lica direita e a art‚ria „leo-ceco-c‡lica (que irriga o „lio
terminal, o ceco e a parte proximal do c‡lon direito). Por esta raz•o, toda vez que alvejamos a retirada do c‡lon direito,
devemos ressecar, junto a ele, parte do „lio e o ceco. Tal procedimento ‚ conhecido como colectomia direita e
anastomose íleo-cólica.

Escores de lesão colônica.

Colon Injury Scale (CIS) Flint Score


I Les•o da serosa Les‰es isoladas com perfura€‰es menores do c‡lon, choque
II Ferimento <50% da circunferƒncia do c‡lon ou I ausente ou tipo I, contamina€•o ausente ou m„nima e sem
les‰es parciais mŠltiplas retardo na cirurgia.
II Ferimento >50% da circunferƒncia do c‡lon sem II Les‰es associadas e transfixa€•o ou lacera€•o da parede do
transec€•o c‡lon, choque tipo II, contamina€•o moderada.
IV Transec€•o do c‡lon III Les‰es associadas, grande destrui€•o tecidual,
V Transec€•o do c‡lon com perda de tecido ou contamina€•o grande e choque > tipo III
desvascularizaۥo de um segmento
13
Arlindo Ugulino Netto – CIRURGIA ABDOMINAL– MEDICINA P7 – 2010.2

Tratamento do trauma de cólon segundo o CIS.

Segundo o fluxograma acima, pacientes com CIS I, II ou III (isto é, aqueles pacientes com lesão, mas sem
transecção), se estiverem estáveis hemodinamicamente, podem ser submetidos à sutura primária. Se não estiverem
estáveis, devem ser submetidos ao controle de dano ou, dependendo do paciente, serem submetidos à sutura primária.
Pacientes com CIS IV ou V (isto é, pacientes com transecção de cólon), se estáveis, devem ser submetidos à
ressecção de cólon seguida de anastomose. Pacientes que se apresentam instáveis, por se tratar de uma lesão muito
grande, deverão ser submetidos à colostomia, basicamente, ou controle de dano.

TRAUMA DE RETO
Anatomicamente, o reto está dividido em duas porções: o reto extraperitoneal (com cerca de 7 a 10cm,
localizado distalmente ao esfíncter externo) e o reto intraperitoneal (localizado internamente ao esfíncter). O reto
extraperitoneal está protegido pelos ossos da bacia, assoalho pélvico e órgãos urogenitais.
A etiologia das lesões do reto está relacionada com: projétil de arma de fogo, lesões por arma branca,
empalamentos (consiste na introdução de objetos pelo reto), intercurso sexual (abuso sexual) e trauma pelviperineal
complexo. Devido à associação frequente, toda vez que houver lesão urogenital, devemos investigar lesão retal (e vice-
versa).

Diagnóstico.
Para o diagnóstico do trauma retal, devemos ter o conhecimento dos seguintes parâmetros:
 Conhecimento do tipo de trauma;
 Inspeção do períneo;
 Realização do toque retal (para avaliar próstata, uretra prostática e reflexo anal através do tônus do esfíncter,
que é capaz de nos dar informações sobre a medula sacral) e toque vaginal;
 Retossigmoidoscopia ou anoscopia.

Condutas.
As condutas básicas para tratamento do trauma retal são:
 Derivação do conteúdo fecal para evitar a infecção local
e a fasceíte necrotizante (síndrome de Fournier).
 Desbridamento e sutura da lesão (reto proximal ou reto
distal), sempre que possível. Lesões no terço médio do
reto são mais difíceis de serem suturadas. Enquanto que
lesões do reto alto (proximal) podem ser tratadas como
lesões colônicas.
12
 Drenagem pré-sacral (ver OBS ).
 Antibioticoterapia para gram-negativos e anaeróbios.
 Lavagem do coto distal.
 Correção de lesões associadas.
12
OBS : Drenagem pré-sacral. Procedimento realizado através do períneo, com o paciente em posição de litotomia, por
meio de uma incisão unciforme entre o ânus e o cóccix. Realiza-se, desta maneira, a dissecção do espaço pré-sacral
pela abertura da fáscia de Waldeyer, seguida da instalação de drenos laminares ou vácuo.

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Arlindo Ugulino Netto – CIRURGIA ABDOMINAL– MEDICINA P7 – 2010.2

Complicações.
 Sepse grave;
 Abscesso;
 F„stulas;
 Incontinƒncia fecal;
 Estenoses.

TRAUMA DE PÂNCREAS
Para entender bem o trauma de p…ncreas, devemos conhecer o mecanismo do trauma que acometeu a v„tima.
Em 70% dos casos, os traumas pancre†ticos s•o penetrantes. O restante ‚ compreendido por les‰es contusas,
causadas por impacto direto na regi•o epig†strica. Em 66% dos casos, existem les‰es associadas (a les•o mais
associada ao trauma pancre†tico ‚ a les•o vascular).
Anatomicamente, podemos dividir o p…ncreas em cabe€a (por€•o circundada pelo duodeno), colo (parte do
p…ncreas localizada superiormente ‹ veia porta, formada pela veia mesent‚rica superior e veia esplƒnica) e cauda (mais
pr‡xima do ba€o). A ordem de incidƒncia de les‰es com rela€•o ‹ topografia do ‡rg•o ‚: cabe€a > corpo (colo) > cauda.

Considerações clínicas.
Com rela€•o aos aspectos cl„nicos do trauma pancre†tico, devemos levar em considera€•o o seguinte:
 Mecanismo de trauma e achados cl„nicos (dor abdominal persistente em abdome superior, com irradia€•o para o
dorso);
 Quadro cl„nico frustro ou dependente de les‰es associadas;
 Tr„ade cl„nica: dor, leucocitose e hiperamilasemia (nem sempre);
 Diagn‡stico muitas vezes intraoperat‡rio;
 Complica€‰es tardias de traumas n•o reconhecidos.

Diagnóstico.
 Amilase s‚rica
 Radiografia e US insatisfat‡rios para diagn‡stico espec„fico
 TC – exame de escolha
 Pancreatografia (endoscopia ou intraoperat‡ria) – controverso / proibitivo
 Colangio-resson…ncia (CRNM) para fase aguda e em pacientes est†veis.
 Laparotomia exploradora geralmente ‚ indicada por outras raz‰es:
 Hematoma retroperitonial ou pancre†tico;
 Edema peripancre†tico;
 Presen€a de bile na retrocavidade (sinal de les•o importante em ducto col‚doco).

Graduação do trauma pancreático segundo a American Association for the Surgery of Trauma e Condutas.
Grau Descrição da lesão
I
Hematoma Contus•o pequena sem les•o ductal
Lacera€•o Lacera€•o superficial sem les•o ductal
II
Hematoma Contus•o maior sem les•o ductal ou perda tecidual
Lacera€•o Lacera€•o maior sem les•o ductal ou perda tecidual
III
Lacera€•o Transec€•o distal ou les•o parenquimatosa com les•o ductal
IV
Lacera€•o Transec€•o proximal (‹ direita da veia mesent‚rica superior) ou les•o parenquimatosa envolvendo a ampola
V
Lacera€•o Destrui€•o maci€a da cabe€a do p…ncreas

Desta forma, temos:


 Les‰es grau I e II (70%): resolu€•o com desbridamento, sutura e drenagem.
 Les‰es grau III (12%): Pancreatectomia distal aos vasos.
 Les•o grau IV (10%): Ressec€•o proximal aos vasos mesent‚ricos.
13
 Les•o grau V (2%): duodenopancreatectomia (ver OBS ) ou diverticuliza€•o duodenal.
 Damage control: este artif„cio pode ser utilizado quando o paciente se apresenta inst†vel hemodinamicamente.
Neste caso, devemos realizar a cirurgia do modo mais r†pido poss„vel, retirando as estruturas que realmente
devem ser retiradas. Feito isso, instala-se uma sonda e realiza aplica€•o intra-abdominal de um grande nŠmero
de compressas para parar o sangramento. Depois, fecha temporariamente a laparotomia e envia o paciente para
a UTI. Quando o paciente estiver est†vel hemodinamicamente, faz-se a conclus•o do procedimento.

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Arlindo Ugulino Netto – CIRURGIA ABDOMINAL– MEDICINA P7 – 2010.2

13
OBS : A duodenopancreatectomia consiste na retirada da cabe€a
do p…ncreas e do duodeno. Neste procedimento, as vias biliares
permanecem abertas, assim como o ducto pancre†tico. A
reconstru€•o ‚ realizada com anastomose do estŒmago com uma
al€a intestinal (gastrojejunostomia), anastomose do p…ncreas com
o jejuno (pancreatojejunostomia) e uma deriva€•o „lio-digestiva (ou
seja, uma ducto-hepaticojejunostomia). Este procedimento tamb‚m
‚ muito utilizado no caso de neoplasias que acometam estas
estruturas (c…ncer de p…ncreas, de papila, etc.).

TRAUMA DE DUODENO
O trauma de duodeno ‚ raro, correspondendo a menos que 3% dos traumas abdominais. Quando ocorre,
geralmente est† associado a outras les‰es intra-abdominais. O mecanismo, na maioria das vezes, est† relacionado com
golpes diretos na regi•o epig†strica.
O fato de o duodeno est† protegido por outros ‡rg•os dificulta o diagn‡stico de suas les‰es. Se ele n•o sofrer
perfura€•o ou sangramento, por exemplo, seu tratamento, muito provavelmente, ser† prolongado.

Características.
As principais caracter„sticas do trauma de duodeno s•o:
 Mecanismo de trauma espec„fico: golpe na regi•o epig†strica.
 Diagn‡stico dif„cil.
 Sintomas frustros ou dependentes de outras les‰es, assim como o trauma pancre†tico.
 O n•o reconhecimento da les•o pode levar a complica€‰es graves. Isso ocorre porque, no trauma de duodeno,
al‚m da secre€•o duodenal caindo na cavidade abdominal, h† ainda a presen€a de bile, suco g†strico, etc.,
caracterizando um quadro bem mais grave que a les•o pancre†tica.

Diagnóstico.
 Radiografia simples: pode mostrar escoliose, ausƒncia de ar no bulbo duodenal e pneumoretroperitŒnio.
 Exame contrastado de esôfago, estômago e duodeno (EED): imagem caracter„stica com aspecto de mola
espiral ou empilhamento de moedas.
 TC: ar no retroperitŒnio.
 Laparotomia exploradora: geralmente ‚ indicada por outras raz‰es, e n•o para confirmar a suspeita de trauma
duodenal. Esta pode mostrar hematomas periduodenais e les‰es pancre†ticas. A manobra de Kocher com
mobilizaۥo duodenal consiste na rotaۥo do duodeno para avaliaۥo de sua parede posterior.

Condutas.
Grau Tipo de lesão Descrição
1 Hematoma Porۥo isolada do duodeno
Laceraۥo Penetraۥo parcial, sem perfuraۥo
2 Hematoma Mais de uma porۥo
Lacera€•o Altera€•o < 50% da circunferƒncia
3 Lacera€•o Altera€•o 50 a 75% da circunferƒncia de D2 (segunda por€•o duodeno).
Altera€•o 50 a 100% da circunferƒncia de D1, D3 e D4 (demais por€‰es).
4 Lacera€•o Altera€•o > 75% da circunferƒncia de D2; ampola ou ducto biliar comum.
5 Lacera€•o Altera€•o maci€a (destrui€•o) do duodeno / C…ncer de p…ncreas
Vascular Desvascularizaۥo duodenal

Desta forma, temos:


 Grau 1 e 2: reparo prim†rio. Ap‡s 6 horas pode ser necess†rio procedimento
descompressivo (duodenostomia por tubo).
 Grau 3: reparo prim†rio + exclus•o duodenal ou duodenojejunostomia em Y de Roux
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(ver OBS ) + descompress•o (SNG).
 Grau 4: reparo do duodeno + reparo biliar com drenagem em tubo T, exclus•o
duodenal + diverticuliza€•o do duodeno. Drenagem em “3 tubos” (contamina€•o)
 Grau 5: duodenopancreatectomia.
14
OBS : Cirurgia em Y de Roux. Anastomose do estŒmago com jejuno em Y: caracterizada
por uma gastrojeunostomia e uma dudodenojejunostomia, em que o estŒmago ‚ ligado a
por€•o distal ao doudeno (in„cio do jejuno) e este ‚ mantido para continuar recebendo as
secre€‰es pancre†ticas e biliares.

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Arlindo Ugulino Netto – CIRURGIA ABDOMINAL– MEDICINA P7 – 2010.2

TRAUMA HEPÁTICO
O trauma hep†tico geralmente ‚ causado por impacto direto. De uma forma geral, o mecanismo do trauma
hep†tico pode ser caracterizado por: 20% dos traumas contusos, estando relacionados com compress•o (entre a coluna
e as costelas) ou desacelera€•o do ‡rg•o. A maioria dos traumas hep†ticos ‚ penetrante. Geralmente, estes traumas
est•o associados a choques hipovolƒmicos (aqueles que n•o apresentam choque, podem ser tratados
conservadoramente, desde que n•o haja les•o importante).

Classificação.

Grau Tipo Descrição


I Hematoma Subcapsular, <10% da †rea de superf„cie
Lacera€•o Les•o capsular, profundidade < 1cm
II Hematoma Subcapsular, 10 – 50% da †rea de superf„cie, di…metro <10cm
Lacera€•o Les•o capsular, profundidade 1 – 3 cm, extens•o <10cm
III Hematoma Subcapsular, >50% da †rea de superf„cie
Hematoma intraparenquimatoso >10cm ou em expans•o
Les•o de parƒnquima > 3 cm
IV Lacera€•o Les•o parenquimatosa envolvendo 25 a 75% do lobo ou 1-3 segmentos de Couinauld
V Lacera€•o Les•o parenquimatosa envolvendo > 75% do lobo ou >3 segmentos de Couinauld de um lobo
Vascular Les•o vascular justa-hep†tica (V. cava retro-hep†tica, V. hep†tica central)
VI Vascular Avuls•o hep†tica

Conduta conservadora.
 Crit‚rios para conduta conservadora:
 Paciente est†vel;
 Transfus•o sangu„nea < 2 CGV;
 Sem outras les‰es cirŠrgicas associadas ou peritonite;
 Grau I a III, duvidoso IV a V (emboliza€•o);
 TC sem extravasamento de contraste na fase arterial;
 Equipe experiente e compromissada.

 Seguimento:
 Hb e Ht de controle;
 Exame abdominal repetitivo;
 Sinais vitais;
 UTI por 48 horas;
 Jejum por 48 horas;
 Repete TC em 5 dias;
 Atividade ap‡s 3 meses.

 Sobrevida:
 GI a III > 90%
 G IV e V ~ 80%

Conduta cirúrgica.
Quando h† indica€•o para cirurgia (ver crit‚rios abaixo), devemos primeiramente comprimir a les•o e tentar
parar o sangramento. Se n•o resolveu, dar-se um ponto de sutura para hemostasia. Se n•o resolveu, devemos abrir a
ferida para controlar o sangramento. Caso o sangramento ainda n•o seja aliviado com esta conduta, devemos seguir
com hepatectomia. Se n•o resolveu, faz-se damage control, com aplica€•o de compressas e interna€•o em UTI.
A cirurgia estar† indicada quando:
 Pacientes inst†veis;
 Grau IV e V (?), VI;
 Tecido necr‡tico extenso;
 Complica€‰es (biloma e abscesso)

Condutas específicas.
 Hematoma subcapsular: observa-se e drena-se a les•o do parƒnquima associada.
 Desbridamento: quando h† necrose.

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Arlindo Ugulino Netto – CIRURGIA ABDOMINAL– MEDICINA P7 – 2010.2

 Sangramento superficial: sem sucesso com compress•o, faz-se flap de omento ou “mesh”.
 Laceração profunda (III a V):
 Risco de f„stula biliar, hemobilia e abscesso;
 Se houver necessidade de sutura, deve-se antes ligar os vasos para uma melhor identifica€•o;
 Fratura hep†tica – plano n•o anatŒmico, digitoclasia;
 Esqueletiza€•o e ligadura separada;
 Em ferimento por arma de fogo (FAF), utiliza-se bal•o.
 Drenar (> Grau III)
 Ligar o hilo hep†tico com clamp vascular durante 40 minutos para controlar um sangramento intenso.
 Sangramento importante:
 Ligadura da art‚ria hep†tica: risco de infarto se les•o associada a porta.
 “ltimo caso  hepatectomias ou clamp de veia cava retro-hep†tica.
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OBS : A localiza€•o da les•o hep†tica ‚ sempre importante e, para isso, Couinauld dividiu os lobos hep†ticos em
segmentos. Desta forma, em resumo, temos: lobo caudado ‚ o segmento 1; no lobo esquerdo, temos os seguimentos 4a
e 2 (superiormente) e 4b e 3 (inferiormente); no lobo direito, temos os segmentos 8 e 5 (anteriormente), 7 e 6
posteriormente.

TRAUMA DE VIAS BILIARES


ˆ um tipo de trauma muito raro, correspondendo a cerca de 0,07% dos traumas abdominais. 70% deles s•o por
mecanismos penetrantes, estando comumente associados a outras les‰es. Suas principais complica€‰es s•o: f„stula
biliar, abscesso e hemobilia.
 Les•o do col‚doco:
 At‚ 50%: repara, esqueletiza e drena com Kher.
 50% ou total: coledocoenteroanastomose
 Ves„cula biliar: rara e devemos proceder com colecistectomia.

TRAUMA DE ESTÔMAGO E INTESTINO DELGADO


As principais caracter„sticas deste tipo de trauma que devem ser avaliadas para a conduta cirŠrgica s•o:
 Avaliar condi€‰es clinicas do paciente para definir se o tratamento ser† apenas por meio de suturas ou retirada
do segmento;
 Condi€‰es da cavidade;
 Viabilidade do ‡rg•o: ‚ o principal par…metro que diferencia a realiza€•o de sutura ou a retirada do ‡rg•o.
Dificilmente ser† necess†ria esta ressec€•o, salvo nos casos de comprometimento importante do ‡rg•o. Na
verdade, geralmente realizamos apenas a sutura.

Para o trauma de intestino delgado, podemos optar pela enterorrafia ou pela enterectomia com anastomose, a
depender de trƒs vari†veis da les•o: tamanho, condi€‰es cl„nicas do doente, les‰es associadas e complica€‰es
(peritonite).

TRAUMA ESPLÊNICO
O ba€o ‚ o ‡rg•o mais lesado nos traumas fechados, principalmente quando h† golpes diretos no hipocŒndrio ou
flanco direito. As principais caracter„sticas do trauma esplƒnico s•o:
 ”rg•o mais lesado em traumas fechados;
 Fratura de arcos costais inferiores previamente associada;
 Dor irradiada na face esquerda do pesco€o e ombro;
 Hipersensibilidade abdominal;
 Hipotens•o (choque);
 Indica€•o mais comum de esplenectomia (20%);
 Causa mais comum s•o acidentes automobil„sticos;
 Risco de sepse p‡s-esplenectomia (sendo necess†ria a vacina€•o para Influenza, Meningococos e Pneumococos).
 20 – 40% s•o indicados para cirurgia, mas tamb‚m podemos optar por tratamento conservador.

Graduação do trauma esplênico.


 Grau I: hematoma subcapsular (<10% da superf„cie) ou lacera€•o (<1cm de profundidade).
 Grau II: hematoma subcapsular (10 – 50% da superf„cie) ou lacera€•o (1 – 3 cm de profundidade).
 Grau III: hematoma subcapsular (>50% da superf„cie) ou lacera€•o (>3cm de profundidade).
 Grau IV: lacera€•o envolvendo vasos segmentares ou h„lares com desvasculariza€•o (>25%)
 Grau V: lacera€•o completa ou les•o hilar completa.

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Arlindo Ugulino Netto – CIRURGIA ABDOMINAL– MEDICINA P7 – 2010.2

Condutas.
 Grau 1 e 2: hemostasia simples ou rafia.
 Grau 3: hemostasia, esplenectomia parcial ou total.
 Grau 4: esplenectomia total ou parcial.
 Grau 5: esplenectomia total.

Critérios para conduta conservadora.


 Paciente estável;
 Transfusão sanguínea < 2 CGV;
 Sem outras lesões cirúrgicas associadas ou peritonite;
 Grau I a III, duvidoso IV a V (embolização);
 TC sem extravasamento de contraste na fase arterial;
 Equipe experiente e compromissada.

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Arlindo Ugulino Netto – CIRURGIA ABDOMINAL– MEDICINA P7 – 2010.2

MED RESUMOS 2012


CORREIA, Luiz Gustavo; NETTO, Arlindo Ugulino.
CIRURGIA ABDOMINAL _________

HÉRNIA DA PAREDE ABDOMINAL


(Professor Cássio Virgílio de Oliveira)

A correção cirúrgica das hérnias abdominais está entre os três procedimentos cirúrgicos mais realizados por
cirurgiões nos Estados Unidos, totalizando 700.000 operações por ano. Tais números, além de demonstrarem a
impressionante prevalência dessa condição, também nos fornecem a informação que as hérnias acometem todas as
faixas etárias, em ambos os sexos. A seguir, estudaremos a anatomia da região inguinofemoral (pré-requisito obrigatório
para entendimento das hérnias de parede abdominal), seguindo-se da epidemiológica, clinica e tratamento das hérnias
mais frequentes da parede abdominal.
Conceitua-se hérnia abdominal como sendo a protrusão de um órgão ou tecido interno através da parede
abdominal, demo que a porção exteriorizada se encontre recoberta por um saco peritoneal. Vários são os fatores que
propiciam ao aparecimento das hérnias: trauma local repetitivo, mudanças degenerativas por aumento da pressão intra-
abdominal, alterações na síntese do colágeno (hidroxiprolina), dentre outros.

ANATOMIA DA REGI„O INGUINOFEMORAL


Antes de iniciarmos a descrição da região inguinal, é importante revisarmos dois conceitos anatômicos, que serão de grande
valia para o entendimento e abordagem das hérnias: aponeurose e fáscia muscular. A aponeurose é uma porção tendinosa de
determinado grupamento muscular, responsável pela fixação deste à saliência óssea. É formada, predominantemente, por tecido
conjuntivo denso. Diferentemente, a fáscia muscular é considerada, para alguns anatomistas, uma bainha de contenção muscular
responsável pela compartimentalização muscular. Do mesmo modo que a aponeurose, o tecido conjuntivo também se sobressai na
formação da fáscia, porém, a sua natureza é frouxa. Conclui-se, portanto, que a aponeurose é um elemento confiável, dada pela sua
firmeza, para um papel de contensão durante a realização de um reparo cirúrgico.
A descrição da anatomia da região inguinofemoral deve seguir um plano estratigráfico, seguindo-se dos planos mais
superficiais até os mais profundos.

TECIDO CELULAR SUBCUTÂNEO


Logo abaixo da pele, encontramos o tecido celular subcutâneo (TCSC). Nele, podemos identificar duas camadas distintas,
determinadas pela presença de sua fáscia: (1) de Camper e (2) de Scarpa.
1. Fáscia de Camper. É uma fáscia delicada, bem vascularizada, de difícil visualização. Situa-se, anatomicamente, mais
superficial em relação à fáscia de Scarpa.
2. Fáscia de Scarpa. É considerada uma fáscia mais espessa, melhor visualizada, localizando-se sobre a superfície externa do
M. Oblíquo externo, seguindo-se em direção à bolsa escrotal, local em que se forma a túnica dartos do testículo.

APONEUROSE DO M. OBLÍQUO EXTERNO


A aponeurose do M. Oblíquo externo se localiza sob a fáscia de Scarpa. Pela anatomia, a porção muscular (ventre muscular)
desta musculatura está mais lateral à região inguinal. Logo abaixo da aponeurose, observa-se o canal inguinal; deste modo, o limite
anterior deste canal é formado por tal estrutura.
Da borda livre da aponeurose do M. Oblíquo externo se forma um espessamento, que segue da espinha ilíaca ântero-
superior em direção ao tubérculo púbico, que é o ligamento inguinal (ou de Poupart ou de Falópio). No instante que o ligamento
Inguinal se fixa ao tubérculo púbico, forma-se o ligamento lacunar.

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CANAL INGUINAL
O canal inguinal é definido como sendo uma
passagem pela musculatura da parede abdominal. Com
uma formatação obliqua, de direção látero-medial, este
canal tem uma extensão de 4cm, aproximadamente. Por ser
uma estrutura não-obliterada, subentende-se que sua
função é a de permitir a passagem de estruturas
anatômicas. No homem, principalmente, o canal inguinal é
responsável pelo trânsito de estruturas do sistema genital
masculino da cavidade abdominal em direção ao escroto.
Acima do canal inguinal, formando sua parede
superior e posterior estão o músculo obliquo interno e o
músculo transverso do abdome, com sua aponeurose. Para
que as estruturas da cavidade abdominal alcancem a região
da bolsa escrotal, no homem, é necessário que as mesmas
atravessem dois orifícios presentes nas estruturas
musculares recém-descritas: anel inguinal interno
(localizado na parede posterior, músculo transverso) e anel
inguinal externo (localizado na parte anterior, aponeurose
do músculo oblíquo externo).
Profundamente ao plano do músculo transverso do abdome, podemos visualizar a fáscia transversal, estrutura-chave para
compreensão das hérnias inguinais indiretas. De maneira simplificada, a fáscia transversal é a porção inguinal da fáscia
endoabdominal (que é a fáscia que reveste toda a musculatura da parede abdominal). Logo abaixo da fáscia transversal, existe uma
porção de gordura pré-peritoneal e, logo em seguida, o peritônio. Algumas estruturas localizadas abaixo do plano da fáscia
transversal, ou seja, entre esta e o peritônio, são muito importantes para o reparo das hérnias inguinais e femorais. O ligamento de
Cooper, correspondente anatômico do espessamento do periósteo da face interna do ramo superior do púbis, é muito empregado na
técnica operatória como ponto de reparo da técnica de McVay. Junto a este ligamento, existe a V. Corona mortis, de implicação em
termos de óbito caso seja atingida. Outra estrutura também importante é o trato iliopúbico (ligamento de Thomsom), que são um
conjunto de fibras aponeuróticas do músculo transverso que tem trajeto paralelo e posterior ao ligamento inguinal, formando, durante
este trajeto, a parte superior do anel femoral e a porção inferior do anel inguinal interno. É importante seu conhecimento no tratamento
das hérnias por videolaparoscopia.
Na parede posterior, existe uma região triangular denominada de Triângulo de Hessert (delimitada pelo M. oblíquo interno
superiormente, pelo M. reto abdominal medialmente, e pelo ligamento inguinal lateralmente). Dentro deste triângulo, existe uma área
triangular menor, descrita por Hesselbach (1814), que é o triangulo de Hesselbach (trígono inguinal), limitado súpero-lateralmente
pelo ligamento inguinal, medialmente pela borda lateral do M. reto abdominal e, superiormente, pelos vasos epigástricos inferiores.
Esta região triangular é a de maior fraqueza da fáscia transversal, com maior vulnerabilidade à formação de hérnias.

Quanto ao conteúdo do canal inguinal segundo do sexo, temos:


 Na mulher: ligamento redondo do útero.
 No homem: (1) Conteúdo nervoso: Ramo genital do N. Gênito-femoral; (2) Conteúdo vascular: Plexo pampiniforme, A. e
V. do ducto deferente, A. e V. espermática externa; (3) Conteúdo muscular: Músculo Cremáster; (4) Ducto deferente; e
(5) conduto peritônio-vaginal

CANAL FEMORAL
O canal femoral é limitado anteriormente pelo trato ileopúbico, ligamento de Cooper posteriormente e veia femoral
lateralmente.
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Arlindo Ugulino Netto – CIRURGIA ABDOMINAL– MEDICINA P7 – 2010.2

HIST†RICO
Desde 1552 a.C., o assunto referente às hérnias inguinais já era estudado (Papiro de Ebers). Em 1804, Cooper
descreveu uma frase que, de maneira verídica, demonstra a complexidade do tema em questão.

“Nenhuma doen•a do corpo humano, tratada


pelo cirurgi‚o, necessita no seu tratamento uma
melhor combina•‚o de precis‚o, conhecimento
anatƒmico com habilidade cir„rgica do que h…rnia em
todas as suas varia•†es.” (Cooper, 1804).

Nos dias atuais, as técnicas cirúrgicas para correção das hérnias são inúmeras, o que demonstra, em parte, a
idéia que não se alcançou a técnica ideal para seu tratamento.
Irving Lichenstein (1986) foi quem introduziu as bases bioquímicas da formação de hérnias. Basea-se na
deficiência de colágeno, com consequente fragilização da região. A partir desta informação, as técnicas cirúrgicas para
correção de hérnias passaram a utilizar telas de sustentação.

EPIDEMIOLOGIA
Anualmente, 1-2 milhões de americanos são operados por causa de hérnias abdominais. Destes, 1% evoluem
para o quadro infeccioso e, em 10%, aproximadamente, ocorrem complicações. Segue abaixo a percentagem de hérnias
na população americana:
 Hérnias inguinais indiretas 50%
 Hérnias inguinais diretas 25%
 Hérnias ventrais e incisionais 10%
 Hérnias femorais 6% (ocorrem mais comumente em mulheres do que em homens)
 Hérnias umbilicais 3%

CLASSIFICA•„O
As hérnias podem ser classificadas quanto ao seu conteúdo e localização. O conteúdo do saco herniário é
muito variável (quadro 1), podendo ocorrer desde as formas redutíveis (que é a hérnia que retorna ao seu local habitual
anatômico na vigência de manobras mecânicas ou por gravidade) até as formas estranguladas, que se caracterizam por
isquemia e necrose. A localização das hérnias é bastante diversificada (conforme mostra o quadro 2).

Quadro 1. Classificação das hérnias quanto ao conteúdo Quadro 2. Classificação das hérnias quanto à
 Redutível: Quando as hérnias retornam à localização
cavidade abdominal em ocasiões cotidianas (ao  Ventral
deitar, por exemplo) ou por manobras de  Umbilical
compressão.  Incisional
 Encarcerada: O conteúdo herniário não  Inguinais
consegue retornar ao seu local habitual  Spigel (quando ocorre na linha arqueada
anatômico, porém, a região ainda não se
de Douglas)
apresenta com isquemia. O tempo de corte para o
 Periestomais (ocorrem ao redor das
reparo cirúrgico da hérnia encarcerada é de 4
horas, caso não seja procedido neste tempo, a colostomias)
mesma evoluirá para a forma estrangulada.  Lombares (triangulo de Petit)
 Estrangulada: O conteúdo desta hérnia já se  Obturador
apresenta em sofrimento e, como consequência  Cistoceles, uretroceles, retoceles
do garroteamento dos vasos, instala-se a necrose  Perineais, Ciáticas
pós-isquemia. É a evolução final da hérnia  Diafragmáticas (DRGE)
encarcedada após 4h.  Internas
 Por deslizamento: Quando o conteúdo desliza
para o saco escrotal, sendo mais freqüente à
esquerda por uma alça intestinal ou colo
sigmóide.
 Interparietal
 Especiais (Litré e Richter): A de Litré é quando o
apêndice ou um divertículo faz parte do saco
herniário; Já a de Richter é quando a borda
ântero-mesentérica da alça, apenas, se encontra
no conteúdo herniado.

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Arlindo Ugulino Netto – CIRURGIA ABDOMINAL– MEDICINA P7 – 2010.2

A hérnia de Spiegel ‚ a h‚rnia localizada entre a borda lateral do mŠsculo reto do abdome e a linha semilunar
(de Spiegel), geralmente abaixo da linha arqueada de Douglas, apresentando localizaۥo infra-umbilical. Caracteriza-se,
clinicamente, por sintomas mal-definidos, diagn‡stico impreciso, ocorrendo, de sobremaneira, em indiv„duos obesos. Por
ser de dif„cil palpa€•o, os m‚todos complementares de diagn‡stico podem ser utilizados para o diagnostico final. O
tratamento ‚ cirŠrgico, consistindo na aproxima€•o dos tecidos adjacentes ao defeito, com pontos de suturas simples.
A hérnia de Richter ocorre quando h† o pin€amento lateral apenas da borda antimesent‚rica de uma v„scera
abdominal, permitindo o estrangulamento desse segmento de al€a, sem sinais de obstru€•o intestinal. Com isso, pode
ocorrer atraso no diagn‡stico do encarceramento. Sua ocorrƒncia ‚ mais freq•ente nos s„tios das h‚rnias femorais.
A hérnia de Littré ‚ caracteriza pela presen€a do divert„culo de Meckel no saco herni†rio, que pode apresentar
estrangulamento e necrose sem sinais de obstru€•o intestinal, o que torna o diagnostico no pr‚-operatorio muito dif„cil.

DIAGN†STICO

DIAGNÓSTICO CLÍNICO
O diagn‡stico das h‚rnias ‚ basicamente cl„nico. Na literatura atual, os m‚todos complementares de exames de
imagem n•o devem ser requisitados para o diagn‡stico desta patologia. Durante a anamnese, o paciente queixa de
v†rios sintomas ao interrogat‡rio sintomatol‡gico. Nos homens, mais frequentemente, a queixa ‚ de presen€a de
massas nos test„culos; J† nas mulheres, a massa se localiza nos grandes l†bios. Al‚m destes, as queixas mais
frequentes s•o relatadas abaixo:
 Protrusão aos esforços
 Sensação de peso
 Dor na parede abdominal
 Anormalidades urológicas
 A dor provocada pela hérnia pode ser em decorrƒncia do processo inflamat‡rio ou uma dor visceral (que ‚
pela tra€•o do mesent‚rio pela h‚rnia, por vezes, acompanhada, por vŒmitos).

EXAME FÍSICO
 Inspeção: O examinador deve inspecionar os test„culos, l†bios maiores e monte de Vƒnus e regi•o femural.
Presen€a de massa regular ou irregular.
 Palpação: O paciente deve, durante a palpa€•o, ser examinado em decŠbito dorsal e na posi€•o ortost†tica,
principalmente, nas suspeitas de h‚rnia inguinal e ventral. Uma vez localizada na regi•o inguinal, o examinador
deve introduzir o dedo no anel inguinal externo at‚ o anel inguinal interno, pedindo-se ao paciente para que
execute a manobra de Valsalva. Caso o examinador note um abaulamento na “ponta” do dedo, isso significa que
a h‚rnia se encontra lateral ‹ art‚ria epig†strica, sendo uma h‚rnia inguinal indireta. Caso o abaulamento se
mostre na parte lateral do dedo, significa que a h‚rnia est† medial ‹ art‚ria, caracterizando uma h‚rnia inguinal
direta. A crepita€•o est† presente, indicando que existe uma pris•o da al€a.

EXAMES COMPLEMENTARES
Conforme foi dito anteriormente, o diagn‡stico das h‚rnias ‚ puramente cl„nico, n•o havendo a necessidade de
realiza€•o de exames complementares. Alguns exames j† foram utilizados para o diagn‡stico, por‚m, ca„ram em
desuso:
 A herniografia ‚ um exame que se utiliza do filme
radiogr†fico contrastado para estudar a cavidade
abdominal e seu poss„vel conteŠdo herni†rio.
 A laparoscopia ‚ quando se observa a h‚rnia de
maneira acidental, ao proceder a um ato cirŠrgico na
cavidade abdominal, por exemplo.
 Ultrassonografia e tomografia computadorizada
s•o restritas aos pacientes que n•o podem ser
submetidos ao exame f„sico, por exemplo, pacientes
obesos ou com transtornos mentais.

O tratamento das h‚rnias ‚ eminentemente cirŠrgico, todas as h‚rnias devem ser operadas. Contudo, na
literatura, alguns estudos mostram a indica€•o do tratamento conservador em pacientes com h‚rnias:
 Pacientes que apresentam associa€•o com doen€as graves
 Crian€as com h‚rnia umbilical com menos de 5 anos de idade, pois, a h‚rnia pode recuperar-se voluntariamente;
 H‚rnias umbilicais em pacientes com hipertens•o portal

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Arlindo Ugulino Netto – CIRURGIA ABDOMINAL– MEDICINA P7 – 2010.2

DIAGN†STICO DIFERENCIAL
 Hérnia femoral
 Hidrocele (acúmulo de líquidos no testículo)
 Criptorquidia (não descida dos testículos da cavidade abdominal
 Lipoma de funículo
 Epididimite, Linfadenite e Torção de testículo pelo quadro doloroso, podendo confundir com a hérnia

HˆRNIAS INGUINAIS
Dentre as hérnias de parede abdominal, as hérnias inguinais são as mais frequentes, totalizado 75% delas. Do
ponto de vista epidemiológico, os homens são mais propensos ao desenvolvimento deste tipo de hérnia e, com maior
freqüência, do lado direito. Quanto ao mecanismo de formação, as hérnias inguinais podem ser classificadas em diretas
e indiretas.
 Hérnias indiretas: É a causa mais comum de todas as hérnias abdominais. Neste caso, o órgão herniado
deixa a cavidade abdominal lateralmente aos vasos epigástricos inferiores e entra no anel inguinal profundo.
Possuem causa congênita, sendo decorrentes do não-fechamento (persistência) do conduto peritônio-
vaginal (formado durante o trajeto feito pelo testículo durante sua descida da cavidade abdominal em direção
à bolsa escrotal). Em condições anatômicas normais, esse conduto é obliterado totalmente, recebendo o
nome de ligamento de Cloquet. Quando não há a obliteração do conduto após o nascimento (ou quando o
fechamento é parcial) permanece uma comunicação entre a cavidade abdominal e o canal inguinal,
permitindo não só o aparecimento de hérnia inguinal indireta, mas também de outras condições como
hidrocele do cordão e hidrocele comunicante. Já adiantando, as hérnias indiretas não requerem a colocação
de tela cirúrgica, ora, a causa de tais hérnias não é a deficiência de colágeno e sim uma alteração do
desenvolvimento embrionário.
 Hérnias diretas: o órgão herniado deixa a cavidade abdominal medialmente aos vasos epigástricos
inferiores, protraindo-se não pelo anel inguinal profundo, mas diretamente por uma área relativamente fraca
situada na parede posterior do canal inguinal (trígono inguinal). Possuem causa adquirida, atribuída ao
enfraquecimento da musculatura da parede posterior do canal inguinal. Por esta razão, a sua ocorrência é
mais prevalente no triângulo de Hesselbach, que é o segmento mais frágil da fáscia transversal.
Anatomicamente, o M. Oblíquo interno se fixa no reto abdominal (linha média) e, na maioria das pessoas, a
inserção deste grupamento muscular é relativamente baixa (inferior). Por vezes, a inserção do M. Oblíquo
interno é na parte mais alta do M. reto abdominal e, com isto, existirá uma área de fragilidade aumentada do
triângulo de Hesselbach.

EPIDEMIOLOGIA
No que diz respeito às hérnias inguinais, a hérnia inguinal indireta é a mais frequente em ambos os sexos. Sob o
ponto de vista sexual, a hérnia inguinal direita é rara nas mulheres sendo, pois, as femorais são mais comuns neste
grupo sexual.

ETIOLOGIA
Quanto à etiologia, as hérnias podem ocorrer por causas congênitas, traumática, aumento da pressão intra-
abdominal e por conta da alteração no metabolismo do colágeno. As alterações do metabolismo do colágeno constituem
uma importante causa de hérnias inguinais, sendo a mais frequente causa. Muito comumente, durante a gestação as
mulheres que já apresentavam hérnias passam a perceber aumento de determinada área, decorrente por conta do
aumento transitório da pressão intra-abdominal durante a gestação. Dentre os fatores precipitantes, destacam-se:
 Hipertrofia prostática, explicada pelo fato que os pacientes com esta alteração prostática requerem uma maior
força para a ejeção do primeiro jato urinário.
 Câncer de cólon esquerdo, geralmente, induzindo o paciente a uma constipação intestinal severa. Com isto,
durante o ato evacuatório o paciente tende forçar a saída de fezes.
 Cirrose e ascite
 Esplenomegalia maciça
 Aumento do útero na gravidez

FISIOPATOLOGIA
O mecanismo causal das hérnias inguinais está frequentemente relacionado a fatores bioquímicos e celulares.
Dentre os fatores bioquímicos, a diminuição da hidroxiprolina, componente fundamental do colágeno nas aponeuroses,
é uma das principais causas das hérnias. Além desta, a proliferação anormal de fibroblastos e alterações ultra-
estruturais das fibras colágenas da aponeurose do reto abdominal também são fatores que contribuem para a sua
formação. Estudos mais atuais também demonstram a influência do meio ambiente na fisiopatologia das hérnias, a
saber, o tabagismo, idade avançada, doenças que interferem na síntese de colágeno, doenças crônicas debilitantes,
atividade física intensa demonstram estreita relação com as hérnias inguinais.
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Arlindo Ugulino Netto – CIRURGIA ABDOMINAL– MEDICINA P7 – 2010.2

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OBS : Em resumo, como vimos anteriormente, um saco herniário que durante a abordagem anterior se anuncia
lateralmente aos vasos epigástricos inferiores corresponde à hérnia indireta. Um saco herniário que se insinua
medialmente aos vasos epigástricos inferiores é sinônimo de hérnia direta.

DIAGNÓSTICO
Na avaliação do paciente com hérnia inguinal, o exame clínico ainda se impõe como o principal e único
instrumento para o diagnostico desta patologia, sendo incomum a utilização de exames complementares. As queixas
mais frequentes de pacientes com hérnia são sensação de peso ou dor mal definida na região inguinal associada aos
esforços. A dor pode estar acompanhada de presença de abaulamento na região inguinal, que pode retornar
espontaneamente para a cavidade abdominal ou não, o que geralmente é acompanhada de dor intensa.
 Hérnia redutível: É o tipo de hérnia caracterizada pelo retorno do saco herniário à cavidade abdominal de
maneira espontânea, ou quando se utiliza de manobra manual (de Taxe).
 Hérnia encarcerada: É a hérnia que não se faz possível a redução manual do saco herniário, daí é uma
hérnia irredutível. Em cerca de 4h, pode evoluir para uma hérnia estrangulada.
 Hérnia estrangulada: Ocorre quando o encarceramento leva ao comprometimento vascular, associado aos
sinais flogísticos na região inguinal. Assim como o encarceramento, o estrangulamento também pode levar à
obstrução intestinal quando uma víscera do intestino delgado faz parte do saco herniário.

Durante o exame clínico, o examinador deverá buscar informações a respeito de fatores que levam ao aumento
da pressão intra-abdominal e o desenvolvimento de hérnias. Por isto, deve-se questionar o paciente sobre hipertrofia
prostática, ascite, tosse crônica, constipação crônica e tumorações abdominais volumosas.
O exame físico deve ser realizado com o paciente em posição ortostática. Na inspeção, o examinador deverá
perceber a presença ou não de abaulamentos na região inguinal em repouso e, por um mecanismo de inspeção
dinâmica (Manobra de Valsalva), a presença de hérnias. Feito isto, o passo seguinte é a palpação. Pela palpação, o
examinador poderá definir o mecanismo de hérnia (se é direta ou indireta). O exame é feito da seguinte maneira:
1. O examinador introduz o dedo no anel inguinal externo que é palpado através da bolsa escrotal; introduzindo
o dedo indicador na porção mais inferior da bolsa escrotal e invaginando o saco herniário para o interior do
canal inguinal, até que se encontre o orifício inguinal interna. Daí deve-se solicitar ao paciente para que
realize a manobra de Valsalva. Caso a protrusão seja palpada pela ponta do dedo, trata-se de uma hérnia
indireta (pois está justamente no anel inguinal interno). Caso a protusão seja sentida pelo corpo do dedo
(margem digital), a suspeita é de hérnia direta (pois esta está localizada no triângulo de Hesselbach).

2. A palpação com oclusão do anel inguinal interno, na sua topografia cutânea, combinada com manobras de
aumento da pressão abdominal também diferenciam a hérnia inguinal direta da indireta (manobra de
Landivar). O aparecimento da hérnia com a manobra caracteriza a hérnia direta, enquanto o não-
aparecimento caracteriza a hérnia indireta.

Os diagnósticos diferenciais das hérnias inguinais incluem hidrocele, varicocele, linfonomegalias inguinais,
lipomas, tumores do testículo e epidídimo.

Vários sistemas de classificação (por exemplo, Gilbert, Soudice) foram desenvolvidos para as hérnias inguinais,
sempre na tentativa de facilitar a comunicação entre os cirurgiões, permitindo a padronização da terapêutica e a
comparação dos resultados de diferentes hospitais. Um dos mais utilizados, atualmente, é a classificação de Nyhus, pela
sua precisão e simplicidade.

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CLASSIFICAÇÃO DE NYHUS
 Tipo I. Hérnia inguinal indireta com anel inguinal profundo normal (até 2 cm), é muito comum na faixa
etária pediátrica;
 Tipo II. Hérnia inguinal indireta com anel inguinal interno alargado (até 3 cm), porém com parede
posterior preservada (intacta); os vasos epigástricos inferiores profundos não são visualizados.
 Tipo III. Defeito na parede posterior. (A) Hérnia direta; (B) Hérnia indireta com alargamento importante
do anel interno e destruição da parede posterior (hérnia mista); (C) Hérnia femoral.
 Tipo IV. Hérnia recidivada. (A) direta; (B) indireta; (C) femoral e (D) combinada ou mista.

TRATAMENTO
O tratamento preconizado para as hérnias inguinais é cirúrgico. Salvo os casos de pacientes com algum risco
proibitivo, as hérnias devem ser tratadas cirurgicamente, pois, todas as hérnias tendem ao crescimento, o que aumenta
a probabilidade de complicações (encarceramento, estrangulamento). Estudos mais atuais são controversos a respeito
do tratamento cirúrgico em pacientes idosos assintomáticos ou com poucos sintomas. A decisão quanto ao momento
cirúrgico adequado e tipo de cirurgia dependem, quase que exclusivamente, das características da hérnia (se são
redutíveis, encarcerada ou estrangulada).
 Hérnia com encarceramento agudo: O paciente com este tipo de hérnia se apresenta, do ponto de vista
clinico, com quadro doloroso intenso na região inguinal. Geralmente, apresentam história de aumento súbito
da pressão intra-abdominal por uma situação qualquer, com abaulamento irredutível na região inguinal. Por
vezes, nas situações que o conteúdo do saco herniário é de intestino delgado, o paciente pode referir
obstrução intestinal. Nessas ocasiões, o mais correto é excluir a possibilidade de estrangulamento do saco
herniário. A primeira tentativa terapêutica é a manual, no sentido de tentar reduzir o saco herniário (Manobra
de Taxe). Caso não se consiga, deve-se lançar mão de analgesia venosa e posicionar o paciente na posição
de Tredelenburg para facilitar a redução. Caso a hérnia se mostre irredutível apesar de todas essas
manobras, devemos indicar tratamento cirúrgico em caráter de urgência, já que o risco de evolução para
estrangulamento é alto.
 Hérnia estrangulada: Trata-se de uma emergência médica, já que as estruturas intra-abdominais (vísceras,
omento, gordura pré-peritoneal) apresentam-se em sofrimento isquêmico, o que coloca o paciente em
grande risco de peritonite. A abordagem deve ser preferencialmente pela região inguinal, realizando a
enterectomia e reparar a hérnia inguinal. A laparotomia exploradora somente é indicada no caso de redução
acidental ou indevida de saco herniário estrangulado, como pode acontecer durante a indução anestésica.
 Hérnias redutíveis: A maioria dos casos é operada eletivamente. Inúmeras técnicas já foram desenvolvidas
para o tratamento das hérnias inguinais.

TÉCNICA DE BASSINI
Na técnica de Bassini, o reforço é
realizado através da sutura do tendão
conjunto e do arco muscular aponeurótico
do transverso no ligamento inguinal. Esta
técnica foi a que inaugurou a era moderna
da herniorrafia, e ainda hoje é muito
utilizada, apesar de apresentar o maior
índice de recidiva.

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Arlindo Ugulino Netto – CIRURGIA ABDOMINAL– MEDICINA P7 – 2010.2

TÉCNICA DE SHOULDICE
A técnica de Shouldice, desenvolvida no
hospital de mesmo nome no Canad†, ‚
uma das t‚cnicas com menor „ndice de
recidivas, por‚m uma das mais complexas
de se realizar. Utiliza-se, nesta t‚cnica,
imbricaۥo de quatro planos de estruturas
mŠsculo-aponeur‡ticas no refor€o da
parede posterior.

TÉCNICA DE LICHTENSTEIN
A grande revoluۥo no reparo das
h‚rnias foi a ado€•o dos reparos sem
tens•o (tension free), com utiliza€•o de
telas de material sint‚tico. A t‚cnica
padr•o ‚ a de Lichtenstein , em que tela
feita de polipropileno (M†rlex–) ‚
suturada ao longo do ligamento inguinal
inferiormente, no tend•o conjunto e sob
o obl„quo interno. ˆ feita a abertura da
tela para a passagem do cord•o
esperm†tico, que ‚ “abra€ado” pela tela.
Esta t‚cnica mostrou „ndice de recidiva
semelhante ou at‚ menor que os
conseguidos pelos melhores
procedimentos convencionais, ainda que
seja uma t‚cnica simples de execu€•o.

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Arlindo Ugulino Netto – CIRURGIA ABDOMINAL– MEDICINA P7 – 2010.2

TÉCNICA DE STOPPA
O outro grande grupo de reparos ‚ o que aborda a
regi•o inguinal pelo espa€o pr‚-peritoneal, ou seja,
“por dentro”. Essas t‚cnicas s•o indicadas em casos
de h‚rnias bilaterais e h‚rnias recidivadas, j† que
podemos atrav‚s de uma Šnica incis•o abordar toda a
regi•o inguinal e fugir da fibrose e distor€•o anatŒmica
de cirurgias anteriores. O reparo cl†ssico deste grupo ‚
o de Stoppa, em que atrav‚s de uma incis•o mediana
infra-umbilical descola-se o espa€o pr‚-peritoneal at‚ o
tub‚rculo pŠbico. S•o reduzidos os sacos herni†rios e
coloca-se uma tela gigante, da„ seu nome em inglƒs
giant mesh prothesis repair. Outras t‚cnicas variantes
da de Lichestein s•o a do reparo “plug-and-patch”, a
qual usa uma tela em forma de guarda chuva e o
“sistema prolene de h‚rnia” (Prolene Hernia System) o
qual usa trƒs telas em forma de sandu„che.

Tratamento convencional das hérnias inguinais


VANTAGENS DESVANTAGENS
 Resultados reproduz„veis  Incis•o maior
 Anestesia local  + Dif„cil na recidiva
 Custo menor  2 incis‰es nas bilaterais
 Alta no mesmo dia  Inspe€•o superficial
 N•o invade a cavidade  Repara todos orif„cios (?)

TRATAMENTO VIDEOLAPAROSCÓPICO
Ainda se faz poss„vel realizar o reparo
videolaparosc‡pico das h‚rnias inguinais.
Esse reparo pode ser realizado por via
extraperitoneal ou transabdominal pr‚-
peritonial. Seu uso ainda ‚ controverso, j†
que muitos cirurgi‰es acreditam que a
cirurgia videolaparosc‡pica n•o adiciona
nenhuma vantagem aos procedimentos
convencionais e aumenta o custo e risco
anest‚sico, j† que h† necessidade de
anestesia geral e induۥo de
pneumoperitŒnio. Entretanto, o reparo
videolaparosc‡pico tem o benef„cio de um
retorno mais r†pido ‹s atividades e menos
dor no p‡s-operat‡rio.

Tratamento videolaparoscópico das hérnias inguinais


VANTAGENS DESVANTAGENS
 Incis•o m„nima  Custo mais elevado
 Retorno precoce  T‚cnica complexa
 Pouca dor  Invas•o da cavidade abd.
 Inspe€•o ampla  Anestesia geral + CO2
 Reparo de todos orif„cios  Recidivas em longo prazo?
 Melhor na recidiva nas H‚rnias bilaterais

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Arlindo Ugulino Netto – CIRURGIA ABDOMINAL– MEDICINA P7 – 2010.2

COMPLICAÇÕES
As complicações do tratamento cirúrgico das hérnias inguinais são infreqüentes e podem ser divididas em
complicações de ferida operatória (hematoma, seroma e infecção), complicações isquêmicas e complicações
neurológicas.
O risco de infecção no reparo das hérnias não aumenta com uso de telas. Pacientes que possuem doenças
concomitantes tem maior chance de infecção do sitio cirúrgico, devendo assim receber uma dose de antibioticoprofilaxia
de 30-60 minutos antes da incisão. Este risco também está aumentando em pacientes com história de hérnia incisional
infectada, infecções crônicas de pele e infecções a distancia.
As complicações isquêmicas são resultado da trombose do delicado plexo venoso do testículo (plexo
pampiniforme) com atrofia testicular, que pode ser dolorosa ou não, quadro conhecido como orquite isquêmica. As
complicações neurológicas são decorrentes da lesão dos nervos da região inguinal (ramo genital do N. genitofemural),
podendo causar incômodo doloroso importante na face interna da coxa e na bolsa escrotal.

Complicações Cirúrgicas Complicações Pós-operatória


 Hemorragia  Complicações gerais
 Secção do cordão espermático  Retenção urinária
 Lesão de nervos  Equimose escrotal
 Lesão da irrigação testicular  Edema de testículo
 Lesão do deferente  Atrofia testicular
 Lesão intestinal  Hidrocele
 Lesão da bexiga  Infecção de ferida
 Intestino estrangulado  Neuroma
 Constricção de veia femural  Hérnia não vista
 Perda de domicílio  Recidiva

H ˆRNIAS E PIG‰STRICAS
As hérnias epigástricas são definidas como sendo a protrusão de
gordura pré-peritoneal ou do próprio peritônio, através do defeito da linha
Alba, no espaço compreendido entre o apêndice xifóide e a cicatriz
umbilical.
 A sintomatologia geralmente está ausente na maior parte dos
casos.
 Alguns pacientes apresentam dor surda, mal definida em epigástrio
e/ou mesogastro, geralmente, desproporcional ao tamanho da
hérnia.
 O tratamento consiste em fechamento simples (ráfia simples) do
defeito da linha Alba, atentando sempre para a presença de outros
defeitos aponeuróticos.
 A recidiva atinge cerca de 7-10% dos pacientes, daí, em hérnias
maiores, além do reparo por rafia simples também se preconiza a
utilização de tela pré-peritoneal.

H ˆRNIAS U MBILICAIS
A hérnia umbilical é definida como sendo a persistência do anel umbilical, sem o fechamento de sua camada
aponeurótica após o nascimento. A hérnia propriamente dita é a protrusão anormal do peritônio contendo tecido
gorduroso pré-peritoneal (comum) e omento. Na infância, ocorre com maior freqüência na raça negra e, por vezes,
tendem ao fechamento espontâneo até os 4-6 anos de vida.
 Por esta razão, a conduta é que se aguarde até os 5 anos de idade para avaliar uma possível terapia cirúrgica
 Excetuando-se nos casos de grandes hérnias umbilicais (>2cm), a coerente conduta é aguardar até a idade
recém-definida.

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Já no adulto, a hérnia umbilical ocorre como causa adquirida, decorrente de gravidez, traumatismo, obsedidade
ou ascite. A indicação do reparo cirúrgico em adultos inclui a presença de sintomas, anel herniário grande, ascite,
encarceramento.
 A técnica cirúrgica mais adequada é a redução do saco herniário com fechamento simples do anel herniário
em sentido transverso.
 Nos casos de hérnias volumosas, pode-se ainda utilizar a tela de Márlex como reforço da aponeurose
umbilical.

HˆRNIAS VENTRAIS (INCISIONAIS )


 As hérnias ventrais, ou incisionais, ocorrem por cicatrização inadequada ou tração excessiva dos tecidos.
 São conceituadas como sendo protrusões do conteúdo abdominal através de orifícios em áreas cirúrgicas
prévias.
 O tratamento cirúrgico, geralmente é trabalhoso, apresentando índice de recidiva razoável, mesmo em mãos
experientes: Rafia simples (orifício sem tensão); Técnica de Cattel; Reparo + reforço prostético (1 camada supra-
aponeurótica), Reparo + reforço prostético (1 camada extra-peritonial), Reparo + reforço prostético (2 camadas
Extra-peritonial e supra-aponeurótica).

Fatores de risco para hérnias incisionais


 Idade avançada
 Desnutrição
 Ascite
 Hematoma
 Diálise peritonial
 Gravidez
 Esteróides
 Quimioterapia
 Infecção
 DM
 Icterícia

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MED RESUMOS 2012


CORREIA, Luiz Gustavo; NETTO, Arlindo Ugulino.
CIRURGIA ABDOMINAL _________

CÂNCER DE ESÔFAGO
(Professor Felipe Rocha)

O esôfago, anatomicamente, é um tubo muscular que une a cavidade oral ao estômago, cuja principal função é a
de condução. O câncer esofágico é uma lesão que acomete o órgão, geralmente, em seu terço médio (esôfago torácico),
de aspecto ulcerado, vegetante ou outros.
Algumas doenças benignas, por vezes, podem simular o câncer de esôfago; a doença do refluxo
gastroesofageano (DRGE), cronicamente instalada, pode induzir o estreitamento esofágico; a acalasia, condição
frequente no megaesôfago chagásico, também pode simular os sintomas de uma neoplasia esofágica, incluindo-o em
seu diagnóstico diferencial; compressão mediastinal (metástase linfonodal ou carcinoma hilar do pulmão), também pode
causar o estreitamento da luz esofágica, proporcionando uma sintomatologia semelhante ao carcinoma do esôfago.

EPIDEMIOLOGIA _____
O câncer esofágico representa cerca de 6% de todos os cânceres que acometem o aparelho digestivo. Sua
incidência é mais evidente em indivíduos acima de 60 anos, predominando no sexo masculino. Alguns estudos
demonstram a distribuição geográfica heterogênea do câncer do esôfago, pois, a sua incidência não ocorre com a
mesma frequência ao redor de todo o mundo. Deste modo, o país que representa as maiores estatísticas desta
neoplasia é a China. No Brasil, a distribuição também é heterogênea, com maior freqüência em cidades localizadas no
Sul do País. As estatísticas da Paraíba mostram que a maior frequência de pacientes com câncer de esôfago são os
que residem em cidades interioranas, no Sertão do Estado.
Algumas características devem ser tecidas ainda neste tópico, dentre as quais, a raça prevalente de acordo com
o tipo histológico do câncer esofágico. A maioria das neoplasias que acometem o esôfago são carcinomas.
Histologicamente, todo carcinoma é originado de uma célula epitelial, porém, a depender do tipo desta célula,
desenvolvem-se vários tipos de carcinomas.
 O carcinoma de células escamosas ou epidermóide é mais comum na população de raça negra;
 O adenocarcinoma é mais frequente na raça branca e em mulheres. A incidência deste tipo em especial de
carcinoma está em crescimento acelerado quando comparado ao anterior, principalmente, nos últimos 10
anos. Isto se deve ao aumento da incidência da DRGE e de suas complicações, dentre elas, destaca-se o
esôfago de Barrett. Além da DRGE, a dieta ocidental também é demonstrada nos estudos como uma
possível causa de aumento do adenocarcinoma, especialmente, alimentos industrializados e pouca ingesta
de fibras. Outros estudos ainda tentam explicar o aumento desta incidência por causa farmacológica,
incluindo-se a administração, em longo prazo, de omeprazol (bloqueador da bomba de hidrogênio-potássio
ATPase).

F ATORES DE RISCO ______


Fatores predisponentes ou de risco são definidos como sendo fatores que, quando presentes no meio ambiente,
podem levar ao aumento da incidência do câncer de esôfago. No quadro 1 são listados os principais fatores
predisponentes ao câncer de esôfago (CE). O principal fator de risco para o CE e todo e qualquer câncer de aparelho
luminal (estomago, intestino delgado, cólon-retal) é o tabagismo. Os alimentos ricos em nitrosaminas são fatores
predisponentes para o CE, daí que, indivíduos que fazem ingesta de alimentos enlatados, alimentos quentes
(Chimarrão), ricos em gorduras tendem a apresentar maior chance de desenvolver o CE. Outros alimentos podem ser
considerados ainda como fatores de risco, tais como o amendoim, por apresentar uma contaminação freqüente por
fungos que liberam aflatoxinas.

A tilose congênita palmoplantar é uma doença genética, autossômica dominante, que


representa uma patologia com grandes possibilidades de lesão pré-neoplásica. Deste
modo, os pacientes com esta doença apresentam maior chance de desenvolvimento de
câncer de esôfago.
31
Arlindo Ugulino Netto – CIRURGIA ABDOMINAL– MEDICINA P7 – 2010.2

O esôfago de Barrett é uma metaplasia do tecido esofágico distal, com


alteração para tecido colunar símile ao intestinal. É uma complicação
da DRGE.

Quadro 1. Principais fatores de risco para o CE


 Tabagismo;
 Alcoolismo;
 Desnutrição;
 Contaminação fúngica de alimentos (aflatoxinas);
 Deficiência crônica de ferro;
 Alimentos ricos em nitrosaminas;
 Doenças congênitas, tilose palmoplantar.

1
OBS : Fatores predisponentes são diferentes de lesões pré-malignas. Ao ditarmos anteriormente que o tabagismo é um
fator de risco para o CE, levamos em conta a análise estatística populacional (indivíduos que fumam x indivíduos que
apresentaram CE). Deste modo, pessoas tabagistas podem ou não desenvolver o CE, até porque, a maior causa de
morte nesta população são as doenças cardiovasculares. Já as lesões pré-malignas são as que, se não controladas,
impreterivelmente, evoluirão para o carcinoma de esôfago. O quadro 2 demonstra as principais lesões pré-malignas de
CE.
 O esôfago de Barret constitui uma consequência da DRGE, podendo se apresentar com displasia severa ou leve.
A terapêutica dependerá, basicamente, das alterações histopatológicas da metaplasia intestinal.
 A acalasia e megaesôfago determinam uma dificuldade de deglutição (disfagia), que contribui para uma estase do
conteúdo alimentar. Em longo prazo, ocorre uma irritação crônica da mucosa esofágica, instituindo o
desenvolvimento do câncer esofágico.
 Síndrome de Plummer-Vinson, que é uma combinação de deficiência de vitamina A com a deficiência crônica de
ferro também é constituída como uma causa de lesão pré-maligna para desenvolvimento do CE.

Quadro 2. Principais lesões pré-malignas para o CE


 Esôfago de Barret;
 Acalásia e Megaesôfago;
 Lesões cáusticas do esôfago;
 Esclerodermia;
 Tilose congênita palmo-plantar;
 Síndrome de Plummer-Vinson;
 Alterações genéticas da proteina p53.

TIPOS HISTOL†GICOS _____


O câncer mais freqüente no esôfago é o carcinoma. Conforme descrito anteriormente, o carcinoma é uma
neoplasia maligna que deriva histologicamente, das células epiteliais. Pode ser subdividido em carcinoma de células
escamosas (ou epidermóide, espinocelular) e adenocarcinoma.
 Carcinoma de células escamosas: Origina-se, histologicamente, do epitélio escamoso estratificado. É o
mais frequente tipo de câncer que acomete o esôfago, principalmente, acometendo o segmento torácico
médio deste tubo muscular.
 Adenocarcinoma: Origina-se, histologicamente, das glândulas do esôfago. Predomina no segmento
torácico inferior do esôfago. As estatísticas mostram que é o câncer mais comum deste segmento, porém,
não é o mais comum no esôfago.

Portanto, o segmento mais afetado do esôfago por neoplasias é o segmento torácico médio.

ANATOMIA APLICADA DO ESƒFAGO _____


Anatomicamente, o esôfago apresenta várias relações. Dentre as quais, destacam-se as que ocorrem com
órgãos vitais, pertencentes ao sistema cardiovascular ou aas vias aéreas.

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Arlindo Ugulino Netto – CIRURGIA ABDOMINAL– MEDICINA P7 – 2010.2

 Anterior: Aorta torácica descendente, brônquios fontes direito


e esquerdo, traqueia, nervo laríngeo recorrente.
 Lateral: Nervo laríngeo recorrente.

LINFONODOS E DISSEMINAÇÃO
A disseminação é o termo dado à migração de células malignas de seu local de origem em direção a outros
tecidos ou regiões, a depender da via que transmite a célula neoplásica. Via de regra, as neoplasias que acometem o
esôfago são bastante agressivas.
Ora, a descrição histológica do esôfago nos mostra que sua composição é desprovida de serosa, somente
apresentando camadas mucosa, submucosa, muscular e de tecido conjuntivo (adventícia). Desta maneira, a proteção
exercida pela camada serosa é inexistente. Aliado a isto, a rica vascularização linfática, arterial e venosa do esôfago
também constitui um meio de rápida disseminação. A via de disseminação do CE se dá, basicamente, por três
caminhos:
 Linfática: é o mais freqüente tipo de disseminação, sendo a mais importante do ponto de vista de
prognóstico. Daí que, os pacientes que apresentam disseminação linfática de CE, em 5 anos, têm pior
prognóstico quando comparados aos que não apresentam disseminação linfática. Estatisticamente, a
maioria dos pacientes, na ocasião do diagnóstico, já apresenta disseminação linfática de CE. Pode acometer
linfonodos mediastinais, tronco celíaco e cervical.
 Hematogênica: a via hematogênica é a principal via metastática para o pulmão, fígado, ossos e cérebro.
 Contiguidade: o termo contigüidade significa vizinhança. Deste modo, a disseminação por contigüidade é a
que ocorre em estruturas vizinhas ao crescimento do carcinoma in situ. O comprometimento da aorta,
traqueia, brônquios e nervo laríngeo recorrente ocorre pelo crescimento adjacente do tumor.

DIAGN†STICO _____

DIAGNÓSTICO CLÍNICO
A avaliação clínica do paciente com os sintomas de CE somente sugere a presença de uma neoplasia deste
órgão muscular. A confirmação do CE é dada por exames complementares, que serão descritos no próximo tópico.
O principal sintoma, ou o sintoma que mais leva o paciente ao médico é a disfagia. A dificuldade de deglutir
(disfagia) é progressiva (sólidos, pastosa, líquida), de evolução rápida. A partir dos conceitos anteriormente citados, a
disfagia do câncer esofágico não perdura por longo tempo, ou seja, o paciente que apresenta mais de 1 ano de disfagia,
possivelmente, não apresenta CE. O tempo de evolução da disfagia do CE é de 3-6 meses.
A perda de peso está, geralmente, associada à disfagia pela própria inapetência do individuo. Pela perda
ponderal, o paciente pode se mostrar desnutrido. Sintomas atípicos e indicativos de doença avançada podem incluir:
 Tosse: Geralmente, já indica que ocorreu invasão da via aérea;
 Rouquidão e Disfonia: Denota a invasão do nervo laríngeo recorrente por contigüidade.

EXAMES COMPLEMENTARES
 Endoscopia digestiva alta: Pela EDA, podemos visualizar a extensão da lesão mucosa sugestiva do
câncer e, possivelmente, permite a biopsia para o diagnóstico histopatológico. É um exame indispensável
para a terapêutica do CE, assim sendo, não se institui qualquer tratamento sem a procedência de uma EDA.
 Esofagograma: Diferentemente da EDA, não é um exame indispensável para o diagnóstico final do câncer
de esôfago, porém, é um exame de fácil realização que permite avaliar a localização da lesão neoplásica,
assim como sua extensão longitudinal. Por meio deste exame, observamos o sinal do degrau.

33
Arlindo Ugulino Netto – CIRURGIA ABDOMINAL– MEDICINA P7 – 2010.2

ESTADIAMENTO _____
Após o diagnóstico anatômico, etiológico e sindrômico do câncer de esôfago, a próxima etapa é o estadiamento.
O estadiamento tem a função de descrever o real estágio da neoplasia e, com isto, destinar o tratamento específico.
Abaixo, são descritos as etapas para o estadiamento do câncer de esôfago:
 Avaliação clínica: Constitui a primeira etapa de qualquer estadiamento de câncer. Os sintomas atípicos,
como tosse freqüente, disfonia e rouquidão, já remetem um câncer avançado com invasão de estruturas
vizinhas. Deste modo, o tratamento cirúrgico pode ou não ser indicado. Além disto, o sinal de Trousseau,
que é o aumento do linfonodos supraclaviculares (ou de Virchow), também indica doença avançada.
 TC de tórax com contraste oral: Avalia metástase à distância (fígado, pulmão, ossos) e invasão de
estruturas vizinhas (aorta torácica e brônquios).
 Broncoscopia: É um exame que finda avaliar a invasão da via aérea. Na ocasião do exame, o examinador
busca abaulamentos ou invasão da mucosa dos brônquios e traquéia. Também se configura de um exame
indispensável para o câncer de esôfago em terço médio.
 Ultrassonografia endoscópica: É procedido pela endoscopia, sendo importante para avaliar a invasão de
linfonodos e o grau de invasão da parede do esôfago (estadiamento T). Podemos dizer que a US
endoscópica é um exame indispensável para os pacientes que serão submetidos à cirurgia.

ESTADIAMENTO TNM
T (Tumor)
T1. Tumor que invade a camada mucosa do esôfago;
T2. Tumor que invade a camada muscular do esôfago;
T3. Tumor que invade a camada adventícia do esôfago;
T4. Tumor que invade estruturas vizinhas (brônquios, nervo laríngeo recorrente, aorta torácica).

N (Linfonodos)
N0. Ausência de metástase linfonodal;
N1. Presença de metástase linfonodal.

M (Metástases à distância)
M0. Ausência de metástase à distância;
M1. Presença de metástase à distância.

Na TC, corte axial, percebemos espessamento da parede esofágica


suscitando a hipótese diagnóstica de câncer de esôfago. Note a presença de
nódulos hiperdensos na topografia do pulmão, compatíveis com metástase
pulmonar.

Na imagem, evidenciamos uma US-endoscópica, que é realizada dentro da


luz do esôfago. Nela, podemos estudar as camadas histológicas do esôfago
e, nesta imagem em especial, percebemos um tumor localizado na camada
muscular do esôfago. Através deste, poderíamos ainda notar a invasão da
aorta torácica. O empecilho deste exame é o fato de ser pouco disponível
ainda.

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Arlindo Ugulino Netto – CIRURGIA ABDOMINAL– MEDICINA P7 – 2010.2

TRATAMENTO _____
Antes da escolha da terapia de eleição para o câncer de esôfago, se faz necessário o conhecimento de algumas
características ligadas à lesão:
 Conhecimento do tipo histológico do carcinoma. Conhecidamente, o adenocarcinoma apresenta melhor
prognóstico quando comparado ao carcinoma epidermóide.
 Localização e extensão local do tumor no esôfago e, para isto, de antemão deve ter realizado
Esofagograma com contraste (localização) e US-endoscópico/TC contrastada (extensão local e à distância
do tumor).
 Avaliação linfonodal
 Condições globais de saúde do paciente: Devemos sempre ter em mente, que o papel do médico não é
curar doença e sim tratar doentes. A condição global de saúde ruim é um fator que proscreve o ato cirúrgico.

TRATAMENTO CURATIVO
A terapia do CE pode ser curativa ou paliativa. A terapia curativa objetiva uma sobrevida em 5 anos. O primeiro
passo, antes de se adotar a terapia curativa, é a análise das condições globais da saúde do paciente. O paciente é
inoperável quando apresentar doenças crônicas (diabetes mellitus, DPOC) ou agudas descompensadas, que podem
representar um risco para o ato cirúrgico. Além disto, o tumor não pode ser irressecável, que é quando invade outras
estruturas adjacentes (via aérea, aorta) ou estruturas à distância (fígado, cérebro, pulmão).
 A esofagectomia é a terapia curativa de eleição. Associado, a linfadenectomia também deve ser procedida.
Após a esofagectomia parcial por vídeo, deve-se proceder a anastomose esôfago-gástrica, seguida da
linfadenectomia.
 A radio e quimioterapia neo-adjuvante também podem ser usadas, precedendo a cirurgia, aumentando a
taxa de ressecabilidade. Geralmente, indica-se nos tumores com comprimento elevado.
2
OBS : Mesmo que os exames acusem ausência de comprometimento linfonodal (estadiamento N0), é prudente a
realização da linfadenectomia, pela possibilidade de foco microscópico.

TRATAMENTO PALIATIVO
A terapia paliativa visa o alívio dos sintomas, independente da sobrevida. Esta terapia é instituída quando o
paciente apresenta condição de saúde que inviabiliza o procedimento cirúrgico e/ou quando o tumor é muito extenso,
com invasão local e à distância.
 A esofagectomia paliativa é o método terapêutico de eleição para o câncer de esôfago. Seu objetivo,
diferentemente da cirurgia curativa, é o restabelecimento do transito alimentar e alivio dos sintomas.
 Prótese esofágica endoscópica
 Radioterapia
 Recanalização com laser
 By-pass cirúrgico esôfago-gástrico

1. O primeiro passo para o ato cirúrgico é a abertura do diafragma (frenotomia parcial).


2. Seguido, o cirurgião procede de uma dissecção bimanual
3. O próximo passo é a ligadura dos vasos que irrigam o tumor.
4. Procedendo de uma esôfago-gastro-anastomose cervical. No tratamento curativo, se faz a linfadenectomia,
diferentemente, da cirurgia paliativa, ainda que ambas sejam tratadas do mesmo modo cirurgicamente.

PROGN†STICO _____
 Cerca de 50% dos tumores são ressecáveis;
 Sobrevida em 5 anos: 10-20% dos casos.

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Arlindo Ugulino Netto – CIRURGIA ABDOMINAL– MEDICINA P7 – 2010.2

LEIOMIOMA DE E SƒFAGO
É uma neoplasia benigna do músculo liso do esôfago. Representa cerca de 67% das lesões intramurais
(localizada na musculatura do esôfago) benignas do esôfago.
Na maioria das vezes o paciente é assintomático, mesmo tendo uma tumoração na parede do esôfago. Quando
sintomático o sintoma mais comum é o sangramento digestivo, manifestando-se como sangramento oculto nas fezes. Se
manifesta dessa forma, pois é um sangramento lento, de pequenos volumes. A disfagia é mais rara, entretanto pode
ocorrer naqueles pacientes com Leiomioma grande.
Por ser uma doença que se localiza na musculatura esofagiana, o melhor exame para o diagnóstico é o USG
endoscópico. Exames como a radiografia simples contrastada e da endoscopia digestiva alta (EDA) podem ser
utilizados, embora apenas sugiram o diagnóstico (a endoscopia ainda pode desempenhar um papel importante ao excluir
lesão maligna/carcinoma no tecido epitelial).
O tratamento do paciente se limita a enucleação da lesão, feito somente naqueles pacientes sintomáticos.
Entretanto caso seja um achado endoscópico que exclui risco de lesão maligna, não há indicação cirúrgica.

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Arlindo Ugulino Netto – CIRURGIA ABDOMINAL– MEDICINA P7 – 2010.2

MED RESUMOS 2012


ELOY, Yuri Leite; NETTO, Arlindo Ugulino.
CIRURGIA ABDOMINAL _________

DOENÇA DO REFLUXO GASTROESOFÁGICO (DRGE)


(Professor Cássio Virgílio C. de Oliveira)

A DRGE ‚ uma afec€•o crŒnica decorrente do fluxo


retr‡grado de parte do conteŠdo gastroduodenal, para o esŒfago
ou ‡rg•os adjacentes a ele, acarretando um espectro vari†vel de
sintomas e/ou sinais esofagianos e/ou extra-esofagianos,
associados ou n•o ‹ les‰es teciduais.
De acordo com o conceito estabelecido pelo consenso
brasileiro de DRGE 2003, esta afecۥo pode ocorrer sem
altera€‰es prim†rias do esŒfago, e ainda, com exame
endosc‡pico normal. Assim o paciente pode ser portador da
DRGE, apresentar sinais e sintomas sugestivos da doen€a
(pirose, azia), e o exame endosc‡pico n•o identificar nenhuma
altera€•o tecidual importante no epit‚lio esofagiano.
Um exemplo, que deve ser citado, s•o pacientes
asm†ticos que devido ao distŠrbio vagal, podem referir sintomas
de DRGE devido a maior produ€•o de HCl g†strico e bile
hep†tica, podendo dessa forma refluir e lesar a mucosa
esofagiana.

EPIDEMIOLOGIA
A DRGE ‚ considerada uma doen€a crŒnica possuindo uma grande prevalƒncia. Algumas literaturas consideram
a incidƒncia de DRGE semelhante a patologias como diabetes e hipertens•o arterial sistƒmica, especialmente no que diz
respeito ‹ co-morbidades que esses pacientes est•o expostos.
Um estudo de 13.959 pessoas revelou que pelos menos 5% desses pacientes tem um epis‡dio de pirose
semanalmente, 7,3% 2 epis‡dios ou mais. Estima-se ainda que cerca 12% da popula€•o brasileira em geral, tem
epis‡dios de pirose.
Entretanto ‚ importante salientar que somente um epis‡dio isolado de pirose n•o caracteriza o diagn‡stico de
DRGE, um exemplo, s•o rec‚m-nascidos que ap‡s refei€‰es ocorre um pequeno refluxo que ‚ eliminado pela boca
(popularmente “gofar”), esse refluxo por sua vez ‚ fisiol‡gico, desde que, n•o haja sintomas e comprometimento e
les‰es de ‡rg•os.

C ONSIDERA•‚ES A NATƒMICAS
O esŒfago ‚ um tubo muscular que se estende desde a orofaringe, at‚ sua jun€•o com
o estŒmago. Com isso, podemos dizer que possui trƒs por€‰es: cervical, tor†cica e abdominal.
Ao se unir com o estŒmago na regi•o da c†rdia, forma um …ngulo agudo chamado de
ângulo de His (incisura c†rdica - formada pelo esŒfago abdominal e o fundo g†strico). Esta
angulaۥo, juntamente com outros mecanismos de contenۥo (como membranas
frenoesofagiana, vasos g†stricos curtos e g†strica esquerda) s•o fundamentais para a
manuten€•o do esŒfago abdominal em seu devido local anatŒmico.
Estudos de micrografia eletrŒnica demonstram que a regi•o de alta press•o esofagiana,
ou seja, o esf„ncter esofagiano inferior (EIE), do ponto de vista fisiol‡gico, ‚ apenas funcional,
n•o tendo altera€‰es caracter„sticas como, por exemplo, na transi€•o do estŒmago para o
duodeno, em que h† o piloro (espessamento da camada muscular que comp‰e o estŒmago).
Com isso nessa zona de alta press•o ocorre uma contra€•o tŒnica intr„nsecas das fibras
musculares que se relaxam com a degluti€•o, fibras suspensoras da c†rdia, hiato diafragm†tico
e press•o abdominal. Esses fatores determinam uma zona de alta press•o na transi€•o esofagog†strica, fazendo com
que ocorra uma altera€•o funcional e n•o anatŒmica determinada de EIE. Sendo a principal estrutura respons†vel por
impedir o refluxo do estŒmago para o esŒfago.

HÉRNIA DE HIATO
As altera€‰es funcionais que podem ocorrer nessa regi•o v•o determinar a ocorrƒncia de h‚rnia de hiato. Assim
a presen€a da jun€•o esŒfago g†strica em outra regi•o fora do normal (localiza€•o tor†cica), caracteriza uma deficiƒncia
na contra€•o externa por parte da press•o positiva do abdome contra o esŒfago, os pilares diafragm†ticos n•o
desempenham sua fun€•o esfincteriana acess‡ria, e ainda determina que uma pequena †rea do estŒmago transpasse
para a cavidade tor†cica, facilitando ainda mais o refluxo. Com isso, a h‚rnia por deslizamento ‚ o principal mecanismo
anatŒmico que se encontra alterado nos pacientes com DRGE.
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Arlindo Ugulino Netto – CIRURGIA ABDOMINAL– MEDICINA P7 – 2010.2

A h‚rnia de hiato ainda pode ser classificada em 4 tipos: (1) h‚rnia em que somente a transi€•o esŒfago g†strica
est† fora da cavidade abdominal, caracterizando a h‚rnia por deslizamento, mostrada na figura “A”, (2) h‚rnia por
rolamento (figura B) que caracteriza a hernia€•o do fundo g†strico, entretanto a jun€•o esofagog†strica encontra-se
anatomicamente inalterada, (3) h‚rnia mista (figura C) em que tanto a regi•o esofagog†strica e fundo g†strico se
herniaram e (4) h‚rnia tipo 4, em que h† hernia€•o de outro ‡rg•o (principalmente ba€o e intestino delgado), al‚m do
estŒmago e esŒfago.
Apesar da grande rela€•o de h‚rnia de hiato com a DRGE, nem sempre os pacientes portadores de h‚rnia de
hiato v•o apresentar como complica€•o principal a doen€a do refluxo, assim como os pacientes com DRGE n•o
necessariamente apresentam h‚rnia de hiato. Epidemiologicamente cerca de 90% dos pacientes com DRGE
apresentam h‚rnia de hiato.
Anatomicamente sabe-se que a press•o do estŒmago ‚ maior que no interior do t‡rax, com isso, quando o
esŒfago distal se h‚rnia para a cavidade abdominal, permanece contra„do ou comprimido por uma press•o menor do
que o estŒmago, com isso o conteŠdo g†strico tente a refluir para o esŒfago herniado.

FISIOPATOLOGIA
Os principais mecanismos fisiol‡gicos associados ‹ ocorrƒncia de DRGE s•o:
 Distúrbios da Motilidade ou contração: se manifesta quando a †rea de alta press•o se encontra alterada. Isso
pode ocorrer por h‚rnia do esf„ncter inferior do esŒfago, expondo o mesmo a uma baixa press•o, favorecendo a
ocorrƒncia de refluxo.
 Episódios Isolados de Relaxamento Transitório: ocorre com frequƒncia nos pacientes que fazem uso crŒnico
de aminofilina, subst…ncia que leva ao relaxamento do esf„ncter inferior do esŒfago.
 Disfunções pilóricas: pacientes portadores de doen€a de Chagas podem desenvolver al‚m das altera€‰es do
esf„ncter de alta press•o, algumas altera€‰es pil‡ricas. Pacientes com hist‡ria de Ulcera p‚ptica cicatrizada com
presen€a de estenose pode determinar um esvaziamento g†strico lentificado ou pacientes com diabetes devido
a gastroparesia. Com isso, todos os fatores que determinam um esvaziamento g†strico lentificado, favorecem ao
aumento da press•o no interior do estŒmago, podendo determinar o refluxo.
 Baixa Pressão do EEI.

Os mecanismos descritos acima podem estar inclu„dos como causa de doen€a do refluxo. Entretanto deve-se
salientar que assim como na Šlcera p‚ptica, existem mecanismos de defesa, e fatores agressivos. O principal fator de
agress•o do esŒfago, pulm•o, traqu‚ia, orofaringe, seios da face ‚ o refluxo. Entretanto o refluxo s‡ ‚ considerado
patol‡gico, quando os fatores de agress•o superam os fatores de defesa. Entre os fatores que favorecem aos
mecanismos de defesa temos:
 Peristalse esofágica: quando o paciente possui um epis‡dio de refluxo, entretanto possui uma peristalse
normal, todo o conteŠdo g†strico reflu„do ‚ conduzido novamente para o estŒmago, impedindo que ocorra les•o
dessa regi•o.
 Salivação: o conteŠdo salivar ‚ rico em bicarbonato, e quando deglutido protege a mucosa esof†gica. Al‚m
disso, possui muco que tamb‚m exerce um papel protetor importante. Por isso, pacientes que apresentam
DRGE, ou ainda, epis‡dios de refluxo com freq•ƒncia, n•o devem fumar, pois o cigarro relaxa o EEI, diminui a
quantidade de saliva e, consequentemente, a quantidade de muco produzido, e a pouca saliva que ‚ produzida ‚
pobre em bicarbonato. Al‚m disso, estimula secre€•o †cida.
 Gravidade: a pr‡pria condi€•o humana, por ser b„pede, funciona como um fator que contribui para a n•o
ocorrƒncia de refluxo durante e ap‡s refei€‰es.

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Arlindo Ugulino Netto – CIRURGIA ABDOMINAL– MEDICINA P7 – 2010.2

MANIFESTA•‚ES CL…NICAS
Como vimos anteriormente, a DRGE é uma afecção crônica decorrente do fluxo retrógrado de parte do conteúdo
gastroduodenal, para o esôfago ou órgãos adjacentes a ele, acarretando um espectro variável de sintomas e/ou
sinais esofagianos e/ou extra-esofagianos, associados ou não a lesões teciduais.
De acordo com o conceito de DRGE, pode-se observar que os sintomas podem ser tanto extra-esofagianos
(caracterizados como atípicos) como esofagianos (típicos). Com isso paciente pode vir a desenvolver sinais e sintomas
apenas esofagianos ou extra-esofagianos, e associação de ambos.

MANIFESTAÇÕES TÍPICAS
O principal sintoma é a pirose pós-prandial, diferentemente da úlcera em que a pirose se manifesta antes de
alimentar. Isso ocorre, pois o refluxo só ocorre quando o estômago se encontra expandido e distendido por conteúdo
alimentar.
A regurgitação ácida pode ser relatada pelo paciente, podendo o alimento atingir a cavidade oral ou não.
Quando o alimento atinge a cavidade oral, e é novamente deglutido, denomina-se esse episódio de ruminação.
Os pacientes que apresentam uma lesão tecidual mais importante podem apresentar disfagia por alteração motora,
ou ainda por episódios repetitivos de inflamação com cicatrização e estenose da região.
Quanto à duração dos sintomas, difere do paciente com úlcera que possuem ritmicidade e periodicidade, pois na
doença do refluxo os pacientes não apresentam essas características. A intensidade e freqüência da dor não têm
relação com a esofagite (que está presente em cerca de 50% dos pacientes). Além disso, quanto maior for à história do
paciente de DRGE, maiores são as chances de desenvolver a doença o esôfago de Barret (metaplasia intestinal).
O esôfago de Barret atualmente é a principal causa de neoplasia de esôfago distal. Antigamente a porção mais
atingida era a porção média, com o tipo neoplásico epidermoide, entretanto com o aumento da incidência de DRGE, a
região mais atingida é o esôfago distal, e o tipo histológico mais comum é o adenocarcinoma, se manifestando sob a
forma de esôfago de Barret.

MANIFESTAÇÕES ATÍPICAS
Entre as mais comuns é a dor torácica de origem não-cardíaca, que semiologicamente se apresenta
semelhante a dor coronariana, ou seja, dor tipo espasmo na região pré-cordial, podendo irradiar-se para o ombro ou
mento. Estima-se que cerca de 50% dos pacientes que são atendidos no PA, com dor torácica, são oriundas de
espasmos esofagianos.
Há ainda alterações pulmonares como:
 Tosse crônica
 Asma
 Pneumonias de repetição
 Hemoptise
 Sensação de asfixia

Antigamente acreditava-se que para os pacientes com DRGE apresentar sinais e sintomas de asma era
necessário a ocorrência de broncoaspiração. Entretanto atualmente sabe-se que a própria presença do conteúdo ácido
na luz esofagiana, pode determinar via reflexo vagal, episódio de broncoespasmo.
Os sintomas otorrinolaringológicos mais presentes na doença do refluxo são: Pigarro, rouquidão, laringite e
sinusite crônicas, otalgia. E ainda podem ocorrer manifestações orais: desgaste do esmalte dentário, halitose,
aftas.

DIAGN†STICO
Para a realização do diagnóstico de DRGE, é necessária a realização de uma história clínica bem orientada,
baseada na queixa principal do paciente. Geralmente os pacientes são atendidos queixando-se de queimação
retroesternal (pirose), principalmente após refeições, eructações e ruminação mais de duas vezes na semana.
Para estes pacientes, não há necessidade da realização de exames complementares para estabelecer o
diagnóstico de DRGE. A partir desse momento os exames são solicitados para a classificação quanto ao grau evolutivo
do paciente, pesquisa de complicações e orientações terapêuticas.

EXAMES COMPLEMENTARES

Endoscopia Digestiva Alta (EDA)


Não é considerado um bom exame para o diagnóstico de DRGE. Cerca de 50% dos pacientes portadores de
DRGE não apresentam esofagite erosiva, ou seja, a endoscopia pode ser normal. Isso é importante, pois, pacientes com
sintomas clássicos de DRGE, com endoscopia normal, não afasta o diagnóstico, somente de esofagite.
Além da esofagite, através da EDA é possível avaliar as seguintes alterações: erosões, úlceras, estenose
péptica e realização de biópsias e alguns procedimentos terapêuticos.

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Arlindo Ugulino Netto – CIRURGIA ABDOMINAL– MEDICINA P7 – 2010.2

pH-metria de 24 horas.
É considerado o exame padrão ouro para o diagnóstico de DRGE. É realizado
introduzindo-se um cateter através das narinas até a porção distal do esôfago. Esse cateter
possui diversos canais (eletrodos) que registram as alterações ácido-base, em toda a
extensão do esôfago. Esse cateter permanece no paciente um tempo mínimo de 24 horas.
Com isso os valores são registrados em um leitor específico.
É o exame que correlaciona os sintomas apresentados pelo paciente de acordo
com o refluxo ácido apresentado por ele. Suas principais indicações são: (1) sintomas
típicos, sem melhora com tratamento, sem esofagite, (2) manifestações atípicas, sem
esofagite (2 canais), nesse caso deve-se ter uma atenção especial para os pacientes
portadores de sintomas asmáticos, (3) refluxo duodeno-gástrico com auxílio da
impedanciometria.

Manometria.
É um exame semelhante à pHmetria, com colocação do
cateter por via nasal, entretanto, esse exame é feito em torno de 30
minutos. Após a administração do cateter é sugerido para o paciente
deglutir, com isso os sensores distribuídos ao longo do cateter vão
registrar as pressões dos movimentos peristálticos do esôfago (EEI e
corpo gástrico), registrando graficamente. Com isso as principais
alterações registradas por esse exame são: presença de distúrbio
motor associado, doença do colágeno, espasmo esofagiano difuso.
É um exame importante para o tratamento cirúrgico,
principalmente devido a pacientes que apresentam um relaxamento
inicial do EIE, e automaticamente refluxo, na maioria das vezes
possuem manifestações motoras do esôfago, como por exemplo,
esclerodermia, em que há como primeiro comprometimento a
musculatura distal (esclerose da camada muscular) do esôfago. Com
isso pode-se operar o paciente aumentando a pressão da transição
esôfago gástrica, de forma que o paciente não terá uma peristalse
suficiente para conduzir o alimento. Esses pacientes se não operados
novamente terão como principal sintoma a disfagia por toda a vida.
Com isso é importante ter conhecimento das forças contráteis do
esôfago antes da indicação de um procedimento cirúrgico.
Quando o paciente apresentar uma extensão menor que 1cm,
uma pressão média inferior a 6 mmHg e esôfago abdominal menor
que 3cm, o paciente possui um esôfago extremamente comprometido,
não tendo eficácia com tratamento clínico, sendo necessário a
realização de uma abordagem mais invasiva por meio cirúrgico.

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Arlindo Ugulino Netto – CIRURGIA ABDOMINAL– MEDICINA P7 – 2010.2

Radiografia do Tórax.
ˆ um exame barato e bem difundido, mas com baixa sensibilidade. Traz
informa€‰es importantes sobre a morfologia esofagiana, como presen€a de estenose,
Šlcera, retra€‰es, h‚rnia hiatal, altera€‰es motoras, ondas terci†rias, espasmos. Com isso
favorece para o estudo dos casos de DRGE com indica€•o cirŠrgica.
ˆ solicitado com frequƒncia para investiga€•o de disfagia, odinofagia,
especialmente quando o paciente apresenta uma estenose, que n•o permite a passagem
do endosc‡pio. Essa estenose pode estar associada com adenocarcinoma (estenose
tumoral) ou ainda com esŒfago de Barret (estenose cicatricial). Essa diferencia€•o ‚
importante, pois pacientes com estenose cicatricial poder•o ser tratados com dilata€•o,
enquanto que os pacientes portadores de estenose tumoral, o tratamento ‚ a ressec€•o
cirŠrgica.

Bilimetria.
ˆ importante que, al‚m do registro do pH, a manometria avalie a colora€•o atrav‚s da espectrofotometria, pois
pacientes com refluxo (suco g†strico e bile), esse refluxo pode ter um pH normal, devido ao efeito base da bile sobre o
refluxo †cido, mascarando o diagn‡stico. Com isso, paciente sintom†tico, com pHmetria normal, entretanto detecta-se
atrav‚s da espectrofotometria a presen€a da bile, pode ter o diagn‡stico de DRGE.

TRATAMENTO
O tratamento dos pacientes com doen€a do refluxo tem como principais objetivos: al„vio dos sintomas,
cicatriza€•o das les‰es, preven€•o de recidivas e complica€‰es, qualidade de vida.
Entre os aspectos abordados no tratamento para alcan€ar os objetivos citados acima est•o: eleva€•o do pH
esof†gico, acelerar esvaziamento g†strico, reduzir potencial agressivo do suco g†strico, melhora da fun€•o motora,
clareamento do †cido reflu„do, eleva€•o da press•o basal EIE e aumento da saliva€•o.
Esses efeitos podem ser alcan€ados atrav‚s de medica€‰es, medidas comportamentais ou ainda cirurgia devido
a complica€‰es e insucesso terapƒutico.

MEDIDAS COMPORTAMENTAIS E MEDICAMENTOS


 Medidas gerais e higieno-dietéticas: tais medidas sempre devem ser destacadas e associadas ao tratamento
estabelecido. S•o elas:
 Eleva€•o da cabeceira da cama (15 cm)
 Moderar a ingest•o dos seguintes alimentos, na dependƒncia da correla€•o com sintomas: gordurosos,
c„tricos, caf‚, bebidas alco‡licas, bebidas gasosas, menta, hortel•, produtos ‹ base de tomate, chocolate
 Cuidados especiais com medicamentos potencialmente “de risco”, como colin‚rgicos, teofilina,
bloqueadores de canal de c†lcio, alendronato
 Evitar deitar-se nas duas horas posteriores ‹s refei€‰es
 Evitar refei€‰es copiosas ou ingerir l„quidos durante a refei€•o
 Suspens•o do fumo
 Redu€•o do peso corporal em obesos

 Tratamento medicamentoso: o tratamento cl„nico tem como objetivo o al„vio dos sintomas, a cicatriza€•o das
les‰es e a preven€•o de recidivas e complica€‰es. Os principais f†rmacos empregados para o tratamento da
DRGE est•o expostos no Quadro abaixo. Recomenda-se o conhecimento de maiores detalhes sobre a
prescriۥo, como interaۥo medicamentosa, eventos adversos, etc.

TRATAMENTO CIRÚRGICO
O tratamento cirŠrgico est† indicado para os casos de DRGE n•o complicada nas seguintes condi€‰es: (1)
impossibilidade de tratar clinicamente o paciente devido a fatores pessoais (negaۥo do paciente de tomar medidas
protetoras como interrup€•o do fumo, e mudan€as do padr•o alimentar), econŒmicos ou intoler…ncia medicamentosa
(cefal‚ia e diarr‚ia principalmente), (2) tratamento cont„nuo em pacientes jovens, (3) recidiva de DRGE ap‡s tratamento
cl„nico, (4) n•o apresenta al„vio dos sintomas durante o tratamento.
Fora as indica€‰es citadas acima, deve-se operar o paciente nos casos de complica€‰es como: estenose e/ou
Šlcera, adenocarcinoma. Quanto a presen€a do esŒfago de Barret sem displasia n•o existe um consenso, entretanto, os
cirurgi‰es de uma forma geral tem uma tendƒncia a indica€•o do tratamento cirŠrgico e os cl„nicos, gastroenterologistas,
tendem a fazer um tratamento cl„nico a base de medicamentos e acompanhamento endosc‡pico.
Outras indica€‰es do tratamento cirŠrgico s•o pacientes com presen€a de sintomas at„picos e complica€‰es
associadas tais como: pacientes com sintomas pulmonares que desenvolveram um quadro de asma brŒnquica, ou ainda
manifesta€‰es otorrinolaringol‡gicas, em que h† forma€•o de n‡dulos nas cordas vocais que favorece a ocorrƒncia de
carcinoma epidermoide.

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Arlindo Ugulino Netto – CIRURGIA ABDOMINAL– MEDICINA P7 – 2010.2

Técnicas Cirúrgicas.
De uma forma geral o tratamento cirúrgico dos pacientes portadores de DRGE tem como principal intenção:
 Reposicionamento do esôfago na cavidade abdominal
 Aproximação dos braços do pilar diafragmático esquerdo (hiatoplastia)
 Envolvimento do esôfago distal pelo fundo gástrico (fundoplicatura):

I. Princípio pneumático
Cirurgicamente forma-se uma válvula pneumática quando envolvemos o esôfago pelo fundo gástrico devido à
presença de gás em seu interior no momento da alimentação, ocorre à compressão do esôfago formando a válvula
pneumática. A esse mecanismo denomina-se de válvula anti-refluxo.

II. Princípio Anatômico


É um tipo de tratamento que estava baseado somente na correção anatômica, ou seja, recolocação do esôfago
em sua posição anatômica, denominada de cirurgia de Hill, técnica que foi abandonada.

III. Inocuidade do refluxo


É indicado nos casos dos pacientes que apresentam múltiplas recidivas, pode-se utilizar a técnica da inocuidade
do refluxo, ou seja, deixa-se o conteúdo gástrico retornar ao esôfago, desde que esse refluxo não leve a nenhuma
alteração fisiológica importante. Faz-se uma cirurgia em que se desvia a bile e pouco ácido é refluído. A técnica mais
utilizada é a Vagotomia troncular associada a antrectomia com reconstrução de Y de Roux.

IV. Hiatoplastia com fundoplicatura a Nissen, por via laparoscópica


É o procedimento cirúrgico padrão. É realizada com o paciente em decúbito dorsal horizontal, sem incisões,
apenas com pequenos orifícios. São realizados 5 orifícios: o primeiro ao nível do apêndice xifóide com intenção de retirar
o fígado do campo operatório, dois laterais funcionando com mão esquerda e direita do cirurgião, supra-umbilical por
onde será colocada a fibra óptica, e o último mais lateralmente para tracionar a transição esofagogástrica. A cirurgia é
realizada nos seguintes tempos:
 Abertura da membrana frenoesofagiana, tendo assim acesso ao hiato esofágico
 Isolamento do esôfago, trazendo-o de volta ao abdome
 Identificação dos pilares diafragmáticos
 Realizar a hiatoplastia fechando parcialmente esse orifício, evitando que o esôfago abdominal retorne
para a cavidade torácica.
 E, por fim, envolve-se o fundo gástrico ao esôfago distal (Fundoplicatura 360º). Nos pacientes em que a
manometria mostra uma peristalse esofágica menor que 50mmHg, pode-se fazer uma fundoplicatura
parcial (270º), diminuindo a pressão nessa área e com isso, o paciente teria menos disfagia.

As complicações deste procedimento podem ocorrer tanto no transoperatório como pós-operatório,


representando uma mortalidade em torno de 0,2%. As complicações do transoperatório são: Pneumotórax (8%): ocorre
quando disseca-se o hiato, identificando os pilares e manipulando o esôfago. Muitas vezes o processo inflamatório
impede a identificação da pleura, podendo lesar a mesma; Hérnia valvulada; e Perfuração.
As complicações pós-cirúrgicas por sua vez incluem:
 Disfagia temporária (50%), sendo assim importante informar ao paciente que está contra-indicada a ingestão
de alimentos sólidos durante aproximadamente 3 semanas, e ainda evitar refeições acima de 300 gramas, pois
refeições volumosas podem distender o fundo gástrico e romper os pontos da válvula. Entretanto, a válvula
provoca uma sensação de saciedade precoce, de modo que, mesmo após 300 gramas de alimento, o paciente
não sentirá fome, perdendo peso favorecendo a melhora do refluxo.
 Disfagia persistente por 3 meses (7%) a 1 ano (0,5 a 1% dos pacientes).
 Flatulência (45%) podendo estar associada à sensação de plenitude gástrica, principalmente quando o
processo inflamatório era intenso, e gerou lesão do nervo vago.
 Dificuldade para eructar (25%).

A cirurgia, de uma forma geral, possui uma alta taxa de sucesso para controle dos sintomas típicos; no entanto
os pacientes com sintomas atípicos não tem grande sucesso pois, na maioria das vezes, o paciente relata ter melhorado
da asma, mas apresenta plenitude precoce. É importante salientar que a cirurgia não atua na prevenção do esôfago de
Barret e adenocarcinoma, entretanto diminui sua incidência, ou seja, os pacientes com esôfago de Barret terão uma
redução nos riscos de desenvolver adenocarcinoma, entretanto não terá esses riscos totalmente abolidos, sendo assim
necessário o acompanhamento com EDA. Após 20 anos os pacientes operados ainda podem vir a desenvolver
novamente a doença do refluxo, associada principalmente a flacidez dos tecidos e folga da válvula.

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Arlindo Ugulino Netto – CIRURGIA ABDOMINAL– MEDICINA P7 – 2010.2

MED RESUMOS 2012


ELOY, Yuri Leite; NETTO, Arlindo Ugulino.
CIRURGIA ABDOMINAL _________

DIVERTÍCULOS ESOFAGIANOS
(Professor Felipe Rocha)

O divertículo faringoesofágico é uma herniação da mucosa


da parede posterior do hipofaringe e foi descrito inicialmente por
Ludlow, há mais de 200 anos, e revisado pelo patologista alemão
Zenker. Desde então é chamado divertículo de Zenker (DZ).
Apresenta uma fisiopatologia que sugere altas pressões intra-
esofágicas sobre áreas frágeis da hipofaringe. Os pacientes
apresentam-se com quadro clínico característico e de fácil
confirmação diagnóstica pela radiografia contrastada do esôfago-
estômago-duodeno (REED). Embora haja relatos de tratamento
endoscóspico dessa afecção com bons resultados, o tratamento
cirúrgico continua sendo o de escolha na maioria dos serviços.
Os divertículos são caracterizados por formações
saculares, que podem ocorrer em toda extensão da parede
esofágica. Entretanto, dependendo de sua localização, recebe um
nome específico, desses o mais comum é o divertículo de Zenker
que está localizado na parede posterior do esôfago cervical, tema
este que será discutido com maiores detalhes ao longo deste
capítulo.

CLASSIFICA•„O
Antes de definição propriamente dita de divertículos de Zenker, devemos entender que, de uma forma geral, os
divertículos possuem duas classificações: uma classificação fisiopatológica (considerando que a doença ocorre a partir
da função normal do órgão acometido) e outra etiopatogênica (levando-se em pauta a causa que leva ao
desenvolvimento da doença). Desta forma, temos as seguintes classificações:
 Divertículos de pulsão: são aqueles que ocorrem devido à protrusão da mucosa e submucosa esofágica
através de uma fragilidade da musculatura. É o tipo de divertículo esofágico mais comum, que ocorre devido a
uma força de pulsão que, atua de dentro para fora em relação ao esôfago, causando uma herniação das
camadas mais internas do esôfago em relação a parede muscular do órgão. Com isso para que esse tipo de
divertículo ocorra é necessário que haja previamente uma fraqueza muscular, sendo nessa área que ocorre o
desenvolvimento do divertículo.
 Divertículos de tração: resultam da tração da parede esofágica por linfonodos mediastinais inflamados e
cicatrizados, devido a sua íntima relação anatômica com a parede esofagiana. Uma das patologias mais comuns
que levam a formação desse tipo de divertículo é a tuberculose pulmonar. Apesar disso, é um tipo de divertículo
que não traz sinais e sintomas exuberantes, sendo assim um achado intra-operatório, principalmente em
cirurgias de ressecção de câncer de esôfago.

Além dessa classificação proposta acima, outra proposta por Larrey, classifica-os divertículos em três estágios
evolutivos, levando em consideração a intensidade dos sintomas do paciente.
 Estágio I: geralmente são pacientes assintomáticos ou que possuem um processo inflamatório leve produzindo
sintomas mínimos. Geralmente esses pacientes não sabem que são portadores da doença de Zenker.
 Estágio II: são os pacientes que apresentam disfagia e regurgitação do alimento não digerido.
 Estágio III: além dos sintomas do estágio II, os exames complementares mostram a presença de obstrução
esofágica.

DEFINI•„O
O divertículo de Zenker é um divertículo de pulsão, entretanto o contrário não é verdadeiro, ou seja, nem todo
divertículo de pulsão é divertículo de Zenker, já que, para ser classificado como divertículo de Zenker, deve surgir na
linha média do pescoço, na região entre os músculos cricofaríngeos e constrictor inferior da faringe, área
anatomicamente denominada de triângulo de Killian (base formada pelo músculo constrictor inferior da faringe e o ápice
pelo músculo cricofaríngeo). Com isso, pode-se dizer que é nessa área que se desenvolve uma fraqueza muscular,
favorecendo ao aparecimento do divertículo de Zenker.
De acordo com o conceito, pode-se dizer que o divertículo de Zenker é uma doença congênita, mesmo se
manifestando tardiamente, devido a sua formação lenta.

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Arlindo Ugulino Netto – CIRURGIA ABDOMINAL– MEDICINA P7 – 2010.2

FISIOPATOLOGIA
Como foi explicado o divertículo de Zenker é o resultado de
uma fragilidade muscular que ocorre ao nível do triângulo de Killian,
região delimitada anatomicamente entre o músculo constrictor inferior
da faringe e cricofaríngeo, favorecendo a herniação de camadas
internas, e assim, formando uma projeção em forma de bolsa, que
produz os sinais e sintomas desses pacientes.
Além desse mecanismo, é necessário que haja pressões
elevadas de deglutição, pois são essas pressões que promovem a
força de pulsão das camadas internas na área do triângulo de Killian,
e dessa forma, levando lentamente ao desenvolvimento da formação
diverticular.

EPIDEMIOLOGIA
O termo epidemiologia se refere à incidência de determinadas
doenças na população, levando-se em consideração, idade, sexo,
frequência em relação às patologias de uma forma geral. Em relação
ao divertículo de Zenker, a idade está na mesma faixa etária do
câncer de esôfago, ou seja, acima de 60 anos, predominando no sexo
masculino. É o divertículo esofágico mais freqüente.

QUADRO CL…NICO
 Disfagia: é explicada pela formação de uma projeção sacular, onde o alimento vai se acumulando em seu interior
e com isso, o paciente desenvolve este sintoma.
 Inchaço no Pescoço: com o acúmulo constante de bolo alimentar em seu interior, gera uma tumefação na região
cervical, fato este que está ausente nos pacientes portadores de câncer de esôfago.
 Ruídos de gorgolejo após a alimentação: é caracterizado pela movimentação do alimento no interior do
divertículo, ou seja, entrando e saindo. Muitas vezes próprio o paciente esvazia o divertículo, quando este atinge
grandes proporções.
 Halitose: devido à presença do alimento não-digerido, sofrendo o processo bacteriano de fermentação,
manifestando o odor desagradável do hálito.
 Regurgitação de alimento não-digerido.
1
OBS : nos pacientes portadores de divertículo de Zenker não há perda de peso, já que está é uma patologia benigna,
tendo uma evolução lenta, além disso, não existe uma obstrução da luz esofagiana, diferentemente do que ocorre os os
tumores malignos desse órgão.
2
OBS : Semiologicamente, é importante saber diferenciar as causas de disfagia. O relato de uma disfagia antiga, com
histórico progressivo há anos, geralmente está relacionado ao megaesôfago. O relato de disfagia abrupta de evolução
rápida (meses ou dias), fala a favor de câncer de esôfago. Uma disfagia que ocorre somente no final da alimentação
fala a favor de divertículo de Zencker (a disfagia ocorre apenas quando o bolsão está cheio). O relato de uma disfagia
sem característica alguma, com períodos intensidade incerta, fala a favor de distúrbios motores do esôfago.

DIAGN†STICO
O exame complementar de escolha para confirmação diagnóstica de um paciente com suspeita de divertículo de
Zenker é o esofagograma. Através pode-se perceber a presença de uma protuberância arredondada e lisa que se
projeta posteriormente na linha média do pescoço, região paravertebral esquerda.
Com isso na descrição do exame podemos observar a presença de um acúmulo de contraste em uma formação
sacular projetando-se para a região paravertebral esquerda, com um esôfago de diâmetro normal.

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Arlindo Ugulino Netto – CIRURGIA ABDOMINAL– MEDICINA P7 – 2010.2

TRATAMENTO
O tratamento mais eficaz para os casos de divertículos de Zenker é a diverticulectomia, ou seja, retirada
completa da formação sacular, seguida de sutura com grampeador da base do divertículo. Além disso, como há uma
fragilidade na musculatura, que predispõe a formação do divertículo é necessária a realização de uma miotomia. Assim
realiza-se a secção do músculo cricofaríngeo, que compõe o esfíncter esofagiano superior. Esse procedimento é
necessário, pois corrige a deglutição em alta pressão, ou seja, durante a deglutição o alimento encontra uma área de
alta pressão, dada pela hipertonia do esfíncter superior do esôfago, fato este que é corrigido com a miotomia. Não
havendo assim uma zona aumentada na área de fraqueza.
Com isso, pode-se dizer que a miotomia é o elemento mais importante para a eficácia no tratamento do
divertículo de Zenker. Caso não seja realizada a miotomia, ocorrerá recidiva.

3
OBS : Atualmente ainda existe a terapêutica endoscópica, entretanto só é realizada em casos selecionados, geralmente
em divertículos pequenos, que não geram sintomas. Contudo, a técnica mais utilizada é a diverticulectomia seguida da
miotomia do músculo cricofaríngeo.

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Arlindo Ugulino Netto – CIRURGIA ABDOMINAL– MEDICINA P7 – 2010.2

MED RESUMOS 2012


CORREIA, Luiz Gustavo; NETTO, Arlindo Ugulino.
CIRURGIA ABDOMINAL _________

MEGAESÔFAGO
(Professor Marcelo Gonçalves)

O megaesŒfago ‚ um termo que descreve uma dilata€•o anormal do esŒfago. ˆ um distŠrbio de motilidade
esof†gica, causada por les‰es, principalmente, da inerva€•o interna ou intr„nseca deste ‡rg•o. A conseq•ƒncia final
deste distŠrbio ‚ a dilata€•o da luz esof†gica. Megaesôfago e acalasia s•o sinŒnimos, sendo o termo “acalasia” mais
utilizada nos pa„ses do hemisf‚rio norte e europeu. Ambos tƒm o mesmo significado, que ‚ a ausƒncia do relaxamento
do esf„ncter esof†gico inferior. Thomas Willis (1672) foi quem primeiro descreveu o termo acalasia.

BASES AN‰TOMO- FISIOL†GICAS DO ESƒFAGO


O conhecimento sobre a anatomia e fisiologia do esŒfago ‚ importante para a determina€•o do local topogr†fico
do megaesŒfago. Sem tal aprimoramento anatŒmico, os exames deixariam de ser complementares e passariam a ser
fundamentais.
O esŒfago apresenta uma dupla inerva€•o: (1) intrínseca e (2) extrínseca. A inerva€•o intr„nseca ‚ a que ocorre
nas por€‰es internas do esŒfago. Est† direcionada ‹ inerva€•o dos ter€os m‚dio e inferior do esŒfago, local que se faz
presente uma maior quantidade de tecido muscular liso, que ‚ o respons†vel pela peristalse. A inerva€•o extr„nseca ‚
conferida por a€•o do N. vago e seus ramos. Sua inerva€•o ‚ mais evidente no ter€o superior do esŒfago, por
apresentar uma maior quantidade de tecido muscular estriado. J† adiantando, a inerva€•o mais comumente afetada no
megaesŒfago ‚ a inerva€•o intrínseca, sendo a Doen€a de Chagas o seu prot‡tipo.

MOTRICIDADE ESOFÁGICA
A peristalse normal ocorre como um resultado de uma sequƒncia de inibição e excitação do mŠsculo esof†gico.
A intera€•o desses dois mecanismos determina a propaga€•o e a amplitude das contra€‰es. A propaga€•o das ondas
perist†lticas no esŒfago determina a abertura de dois esf„ncteres: superior (ESE) e inferior (EIE). O ESE apresenta um
relaxamento no instante em que o bolo alimentar transita da cavidade oral para a por€•o alta do esŒfago, ultrapassando
a orofaringe. J† o EIE se apresenta em relaxamento, no instante que o bolo alimentar est† se aproximando do esŒfago
distal, antes de cair na cavidade g†strica. Ap‡s o evento rec‚m-mencionado, o EIE volta a uma condi€•o de tŒnus
muscular fisiol‡gico, com o intuito de impedir que o conteŠdo g†strico reflua em dire€•o ao esŒfago distal.
O megaesŒfago causa distúrbio motor. As principais
altera€‰es motoras do esŒfago nesta condi€•o s•o aperistalse e
ausência de relaxamento do esfíncter esofágico inferior. Primariamente,
ocorre um desequil„brio entre os neurŒnios excitat‡rios e inibit‡rios do
plexo mioent‚rico. Com isto, o corpo do esŒfago se apresente
hipocontr†til (falta de estimula€•o dos neurŒnios excitat‡rios, com
neurŒnios inibit‡rios normalmente ativados) e o EIE se apresenta
hipertŒnico (estimula€•o direcionada aos neurŒnios excitat‡rios, com
ausƒncia de ativa€•o dos inibit‡rios).
 Lesão de 50% das fibras excitat‡rias do corpo esof†gico
determina uma altera€•o da motilidade esof†gica.
 Lesão de mais de 90% do corpo esof†gico, ocorre uma
dilata€•o esof†gica. A dilata€•o ‚ explicada,
fisiopatologicamente, pois, o gradiente de press•o, nessa
ocasi•o, ‚ perdido gradativamente. Imaginemos, o esf„ncter
esof†gico inferior se apresentar† contra„do, impossibilitando a
aerofagia e o alimento alcan€ar o estŒmago, com isto, o corpo
hipotŒnico e atr‡fico passa a dilatar por aumento do volume
aero-alimentar.

GENERALIDADES _____
O megaesŒfago (ME) ‚ um distŠrbio neurogƒnico ou distŠrbio prim†rio da motilidade esof†gica com les•o das
c‚lulas ganglionares no plexo mioent‚rico (de Auerbach), levando a distŠrbios do peristaltismo esofagiano e da fun€•o
do esf„ncter inferior do esŒfago. Segue abaixo as principais caracter„sticas sobre esta patologia:
 Falta de abertura do EIE em resposta ‹ degluti€•o, apresentando, na esofagografia, o aspecto em “bico-de-
p†ssaro”;
 Maior comprometimento da inerva€•o intr„nseca, comprometendo o peristaltismo do corpo do esŒfago, marcada
por contra€‰es de longa dura€•o;
46
Arlindo Ugulino Netto – CIRURGIA ABDOMINAL– MEDICINA P7 – 2010.2

 A inervação inibitória, produtora de óxido nítrico (NO) é a mais comprometida, resultando assim na maior
atividade da inervação excitatória colinérgica;
 O esôfago, macroscopicamente, se apresenta dilatado, alongado, com paredes hipertrofiadas;
 Disfagia lentamente progressiva. O principal diagnóstico diferencial é com o câncer de esôfago, até porque o
ME é considerado fator de risco para o carcinoma espinocelular de esôfago.

ANÁTOMO-PATOLÓGICO
 Infiltrado inflamatório linfo-histiocitário das fibras musculares e na região do plexo mioentérico;
 Degeneração do plexo de Auerbach;
 Proliferação do tecido conjuntivo no nível do plexo mioentérico

CLASSIFICAÇÃO
O megaesôfago ou acalasia é classificado em dois tipos: (1) acalasia idiopática ou primária e (2) Megaesôfago
Chagásico. A acalasia idiopática (primária), ocorrente em 20% dos casos, é definida como sendo a ausência do EIE por
causas que não sejam chagásicas:
 Auto-imune (anticorpos anti-neurônios);
 Infecciosas (sarampo, herpes-zoster);
 Degenerativas;
 Fatores genéticos (Síndrome de Allgrove, que é caracterizada por alacrimia, insuficiência adrenal e
acalasia).

A doença de Chagas é a principal etiologia da ausência do relaxamento do EIE, ocupando o topo das
estatísticas mundiais (80-90%). A principal causa é a infecção pelo protozoário Trypanossoma cruzi, pela ação do
mosquito barbeiro. A infecção pode ocorre de três maneiras distintas:
1. Direta: Quando a própria ação do protozoário destrói o neurônio.
2. Indireta: Quando o T. cruzi produz toxinas que lesionam e destroem a inervação intrínseca.
3. Auto-modulada: O antígeno do protozoário promove a produção de anticorpos que reconhecem proteínas
da inervação intrínseca.

A CALASIA PRIM‰RIA _____


De etiologia desconhecida, a acalasia primária ou idiopática, é uma das possíveis causas da ausência do
relaxamento do EIE. Nesta condição, ocorre uma diminuição progressiva dos gânglios e dos complexos nervosos
mioentéricos esofágicos, com isto, ocorre contração exagerada do EIE.
Além disto, a diminuição do polipeptídio intestinal vasoativo (VIP), também influencia o aumento da contração do
EIE. Outros estudos ainda demonstram a superestimulação parassimpática e a presença do anticorpo contra a 62-kd
protein estão associados a etiologia da acalasia primária. Na acalasia idiopática, diferentemente do ME chagásico, a
contração do esfíncter será muito intensa, não havendo a dilatação do corpo do esôfago.

MEGAESƒFAGO C HAG‰SICO _____

EPIDEMIOLOGIA E FATORES DE RISCO


 Maior incidência no interior do País, principalmente, no Nordeste;
 Faixa etária mais afetada entre a 2ª-5ª década de vida;
 No Brasil, existem cinco milhões de pessoas com Doença de Chagas, destes, 5-8% têm megaesôfago;
 A proporção é de 1:100.000 habitantes;
 Mais comum na raça branca
 Não há distinção quanto ao sexo, ambos são igualmente afetados.

DIAGNÓSTICO DIFERENCIAL
 Diabetes mellitus;
 Acidente vascular cerebral em território de tronco encefálico;
 Obstrução ou Pseudo-obstrução do esôfago, tais como: estenoses consequente à refluxo; tumores na porção
proximal do esôfago, dentre outros;
 Amiloidose;
 Obstrução por câncer esofágico;
 Complicações da DRGE.

MANIFESTAÇÕES CLÍNICAS
O sintoma mais evidente do ME é a disfagia de evolução lenta, progressiva e de longa duração. A média de
duração deste sintoma varia de 5-6 anos, podendo até alcançar 10-20 anos. A disfagia não segue um padrão típico, ou

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Arlindo Ugulino Netto – CIRURGIA ABDOMINAL– MEDICINA P7 – 2010.2

seja, o paciente pode apresentar, inicialmente, uma disfagia para l„quidos, sem ter apresentado, anteriormente, uma
disfagia para s‡lidos e pastosos, respectivamente. Neste caso, a semiologia intitulou o termo “disfagia paradoxal”,
estabelecendo-se uma manifesta€•o at„pica. Aliada ou n•o a disfagia, o paciente pode se queixar de regurgitação
(retorno de liquido g†strico e vŒmitos), emagrecimento (80% dos casos), dor tor†cica (30-50% dos casos), odinofagia e
desnutriۥo (caso seja infanto, pode evoluir ao retardo do crescimento).
Obstrução intestinal ‚ um sintoma freq•ente, dado a partir do comprometimento do c‡lon (megac‡lon).
Hematƒmese e melena s•o sintomas associados aos descritos anteriormente. Sinais e sintomas respirat‡rios tamb‚m
podem vir acompanhados dos gastrointestinais, tais como: abscesso pulmonar, bronquiectasias, broncoaspiraۥo (tosse
noturna), dentre outros. Um achado importante ‚ a hipertrofia das gl…ndulas par‡tidas, sinal conhecido como reflexo
esof†gico salivar de Roger.

“Os pacientes com Acalasia comem devagar, bebem grandes


quantidades de •gua para empurrar o alimento para o estomago e
podem ate contorcer o corpo (torcendo a parte superior do tronco,
elevando o queixo e estendendo o pesco‚o), para ajudar o alimento a
“descer”. Conforme mais •gua „ deglutida, o peso da coluna liquida do
es…fago aumenta, assim como a sensa‚†o de plenitude retroesternal, at„
que o EEI seja for‚ado a abrir-se e um al‡vio repentino seja sentido ˆ
medida que o es…fago esvazia.”
SABISTON, Textbook of Surgery. 17— Ed. 2005
1
OBS : O alimento retido determina uma reten€•o tamb‚m de bact‚rias. Com isto, os sobrenadantes quebram os
compostos de nitrato em compostos de nitroso, induzindo uma altera€•o histol‡gica da mucosa. Da metaplasia, pode
ocorrer indiferencia€•o do tecido, havendo a evolu€•o para o carcinoma espinocelular. Desta maneira, os indiv„duos com
ME apresentam 33x mais chances de evolu„rem para o carcinoma espinocelular quando comparado com a popula€•o
geral.

EXAMES COMPLEMENTARES
A radiografia de tórax ‚ o primeiro exame a ser solicitado nos pacientes com ME chag†sico. Uma das
explica€‰es para sua utiliza€•o est† relacionada a grande quantidade de sintomas respirat‡rios nestes pacientes, que
faz com que o m‚dico prescreva a R-X para buscar altera€‰es pulmonares.

Os principais achados na R-X de t‡rax s•o:


 Alargamento mediastinal
 Duplo contorno card„aco
 Massa mediastinal posterior, vista no PERFIL
 Ausƒncia de bolha g†strica
 N„vel l„quido no esŒfago
 Complica€‰es pulmonares
 Altera€‰es da qualidade do mediastino

Na imagem ao lado, podemos evidenciar ausƒncia de c…mara g†strica, material


estagnado e dilata€•o g†strica (massa tubular).

O exame contrastado de esôfago (EED) ‚ importante para avaliar a


presen€a ou n•o de dilata€•o. Na R-X, evidencia-se dilata€•o esof†gica,
com presen€a de alimento simulando uma massa neopl†sica. O afilamento
do esŒfago, no local da constric€•o do EIE, demonstra a presen€a do “sinal
do bico de P†ssaro”, em 90% dos casos.

48
Arlindo Ugulino Netto – CIRURGIA ABDOMINAL– MEDICINA P7 – 2010.2

Rezende propôs a seguinte classificação


radiológica para o megaesôfago:

I. Calibre mantido, discreta retenção de contraste.


II. Aumento moderado de calibre, retenção de
contraste e ondas terciárias.
III. Grande aumento de calibre e hipotonia.
IV. Dolicomegaesôfago.

A endoscopia digestiva alta avalia a mucosa e ainda institui uma


medida terapêutica. As principais características a serem avaliadas durante a
endoscopia são descritas abaixo:
 Mucosa (friável ou não, esofagite, ulcerações, candidíase)
 Estenose orgânica
 Divertículos
 Refluxo
 Ingesta de cáusticos
 Dilatação do corpo do esôfago.

O tratamento endoscópico pode ser obtido por dilatação ou administração local de toxina botulínica (inibe a
liberação da acetilcolina, impedindo seu relaxamento). Além disto, a endoscopia também serve para evidenciar sinais
precoces de carcinoma espinocelular. Os objetivos do tratamento endoscópico são: alivio sintomático, vencer a barreira
do EIE, melhora do status nutricional, cromoscopia.
O melhor exame que define a alteração
neuromuscular é o esofagomanometria (quadro
1). Este exame é indispensável para avaliar o grau
de acometimento da musculatura do esôfago,
estudar o recidivo pós-operatório e ainda nas
ocasiões de persistência da dúvida diagnóstica.

Principais alterações do
esofagomanometria
 Aperistalse total do corpo
esofágico
 Relaxamento incompleto do
EIE
 Pressão basal infra-esofágica
elevada
 Ondas sincrônicas, de baixa
amplitude, espontâneas e
repetitivas
 Hiper-estímulos com drogas
colinérgicas

Outros exames ainda podem ser solicitados. A cintilografia é indicada para avaliar o tempo de esvaziamento
gástrico. Já os exames laboratoriais indicarão a infecção por T. cruzi, dentre os quais, destacam-se: reação sorológica
de Machado Guerreiro, imunofluorescência indireta, hemaglutinação.

49
Arlindo Ugulino Netto – CIRURGIA ABDOMINAL– MEDICINA P7 – 2010.2

TRATAMENTO
O tratamento do megaesŒfago visa o alivio sintom†tico, com a prima-fun€•o de remover o EIE como obst†culo
funcional ao alimento. V†rias s•o as medidas terapƒuticas que podem ser utilizadas para a palia€•o do megaesŒfago,
que ser•o escolhidas a depender o grau do megaesŒfago, condi€‰es cl„nicas e sociais do paciente:
 Tratamento farmacol‡gico
 Bloqueio com uso de Toxina botul„nica
 Dilata€•o instrumental
 CirŠrgica

Tratamento farmacológico.
O tratamento farmacol‡gico deve priorizar a utiliza€•o de drogas que atuem no EIE, com a€•o hipotensora ou
2+
hipotŒnica. Usam-se nitratos e bloqueadores dos canais de Ca , para tal fun€•o. ˆ indicada nos raros casos de fase
incipiente ou na ocasi•o de recusa ao tratamento cirŠrgico. A melhora obtida por este processo ‚ tempor†ria e parcial e,
as estat„sticas demonstram a necessidade de outro tratamento ap‡s 6 meses – 1 ano.

Toxina botulínica.
Utilizando-se do Clostridium botulinum, o tratamento visa o relaxamento do EIE. O mais utilizado ‚ o tipo “A”, ou
Botox–, que reduz em 70% a press•o do EIE. A remiss•o ocorre, invariavelmente, em dois anos. ˆ Štil em pacientes
idosos, ou os que apresentam impossibilidade de realiza€•o de outros tipos de tratamento. ˆ utilizada,
preferencialmente, na acalasia idiopática. Dentre as complica€‰es, dor tor†cica (25%), refluxo (menos que 5%) e rash
cut…neo s•o as mais comuns.

Dilatação instrumental.
ˆ o m‚todo mais antigo de tratamento do ME chag†sico (Willis,
1616). Utilizando-se bal•o pneum†tico e hidrost†tico e/ou sondas (nos
casos dos pacientes cardiopatas, gestantes, com idade avan€ada), o
m‚dico prioriza a dilata€•o do EIE. A dilata€•o endosc‡pica ‚
indicada, basicamente, nas seguintes situa€‰es:
 Cardiomiotomia incompleta
 Recidiva p‡s-cirŠrgica
 Grau I e II
 MegaesŒfago avan€ado sem condi€‰es cirŠrgicas
A dilata€•o pneum†tica de baixa complacƒncia ‚ uma op€•o de
efic†cia comprovada. Apresenta menor incidƒncia de complica€‰es e
com maior controle de efeito terapƒutico. Geralmente, s•o necess†rias
v†rias dilata€‰es.
Dentre as complica€‰es, a dor tor†cica, hematoma esof†gico e refluxo s•o os mais frequentes.

Cirurgia.
A cirurgia como terapƒutica paliativa do ME ‚ institu„da nos graus II, III e IV. Nos graus II e III, a cirurgia de
elei€•o ‚ a cardiomiotomia extramucosa associada a fundoaplicatura. J† o tratamento para o grau IV ‚ a de ressec€•o
cirŠrgica, podendo ser procedido v†rios tipos de cirurgias.
50
Arlindo Ugulino Netto – CIRURGIA ABDOMINAL– MEDICINA P7 – 2010.2

Cardiomiotomia Extramucosa + Fundoaplicatura


É o procedimento cirúrgico indicado para os graus II e III de
megaesôfago. Apresenta sucesso terapêutico satisfatório
(70-90% de sucesso terapêutico). Pode ser feita por via
convencional ou por videolaparoscopia. Geralmente,
associa-se a fundoaplicatura por diminuir a probabilidade de
refluxo gastroesofágico no pós-operatório. A
fundoaplicatura, quando feita anteriormente, é denominada
de cirurgia de Heller-Pinnotti.

No grau IV, opta-se por esofagectomia subtotal. Pode ser feita por esofagocoloplastia ou esofagogastroplasia.
Vagotomia troncular, retirada do antro e reconstrução em Y de Roux é a melhor opção terapêutica para o tipo IV de ME
(esofagogastroplasia + vagotomia troncular + antrectomia + reconstrução em Y de Roux).

51
Arlindo Ugulino Netto – CIRURGIA ABDOMINAL– MEDICINA P7 – 2010.2

MED RESUMOS 2012


ELOY, Yuri Leite; NETTO, Arlindo Ugulino.
CIRURGIA ABDOMINAL _________

PERFURAÇÕES DE ESÔFAGO
(Professor Marcelo Gonçalves)

Anatomicamente o esŒfago est† dividido em trƒs por€‰es:


cervical localizado acima da fŠrcula esternal, pr‡ximo a cartilagem
tire‡idea, onde est† inserido o mŠsculo cricofar„ngeo, tor†cica que se
estende at‚ o diafragma, e por Šltimo o esŒfago abdominal, abaixo do
diafragma.
O esŒfago tor†cico, que se inicia ao n„vel da fŠrcula esternal,
est† a aproximadamente 21 cm da arcada dent†ria superior. A 23 cm
da arcada dent†ria superior est† localizada a carina da traqueia, e a
cerca de 37 cm est† a transi€•o esofagog†strica. Assim pode-se dizer
que o esŒfago se une ao estŒmago a aproximadamente 40 cm da
arcada dent†ria superior. Isso ‚ importante, pois nas les‰es
esofagianas, deve-se ter conhecimento de qual porۥo foi acometida,
j† que, o tratamento varia de acordo com a localiza€•o e extens•o da
les•o.

EPIDEMIOLOGIA
As perfura€‰es esof†gicas s•o les‰es pouco comuns, mas de
alta gravidade, especialmente se ocorrer em sua por€•o tor†cica,
podendo produzir um quadro de mediastinite, condi€•o grave de dif„cil
tratamento e com elevado „ndice de morte. J† no esŒfago abdominal
pode cursar com retroperitonite, que tem uma mortalidade elevada,
entretanto n•o comparada a mediastinite. Com isso, pode-se dizer
que as les‰es perfurativas do esŒfago s•o mais brandas em sua
por€•o cervical quando comparada com a tor†cica e abdominal.
De uma forma geral as perfura€‰es de esŒfago tƒm uma
mortalidade elevada, estando em torno de 10 a 50%. Quando ocorre
produz uma variedade de sintomas que podem cervicais, tor†cicos e
abdominais, com isso sugerindo diversas patologias, contribuindo
dessa forma para o atraso do diagn‡stico e com isso da mortalidade.
Al‚m disso, nas primeiras horas ap‡s a perfura€•o o paciente n•o
apresenta sintomas sugestivos, e quando os tem s•o discretos, n•o
dando assim a devido import…ncia.

ETIOLOGIA
As perfura€‰es esof†gicas por trauma raramente ocorrem, uma vez que o esŒfago ‚ protegido, anteriormente
pelas estruturas da via a‚rea e posteriormente pela coluna. Entretanto, pode-se pensar em perfura€•o esof†gica nos
casos de feridas penetrantes, principalmente por arma de fogo, tanto na por€•o cervical, tor†cica ou abdominal. Da„ a
import…ncia de se entender a cinem†tica do trauma.
A maioria das les‰es esofagianas ‚ iatrogƒnica, principalmente de origem endosc‡pica. As †reas mais comuns
de les•o s•o aquelas que possuem estreitamento, ou seja, no esf„ncter superior do esŒfago (†rea cricofar„ngea), nas
proximidades do brŒnquio fonte esquerdo e hiato esofagiano.
A endoscopia digestiva alta (EDA), com finalidade diagn‡stica n•o possui muitas les‰es, entretanto, a EDA
terapƒutica (dilata€•o, coagula€•o a laser) tem at‚ 25% de chances de ocorrer uma perfura€•o esofagiana.
Cerca de 10% dos pacientes com perfura€•o de esŒfago tem uma patologia esofagiana pr‚via, megaesŒfago
que na maioria das vezes est† associada ao megacolo, adenocarcinoma de esŒfago, divert„culo esofagiano, DRGE.
Entre outras causas comuns podemos citar: ingest•o de corpos estranhos, cirurgias de coluna, passagem de
sonda ou cateter ou ainda les•o intra-operat‡ria.

SÍNDROME DE BOERHAAVE
Consiste na ruptura espont…nea de todas as camadas de esŒfago, sendo essa uma das causas comuns de
perfura€•o de esŒfago. Ocorre com uma maior frequƒncia na face p‡stero-lateral esquerda – 3,5 cm acima da jun€•o
gastroesof†gica ou por€•o tor†cica m‚dia, do lado direito, ao n„vel da veia †zigo.

52
Arlindo Ugulino Netto – CIRURGIA ABDOMINAL– MEDICINA P7 – 2010.2

A perfura€•o nessa s„ndrome ocorre devido ao aumento da press•o intraluminal, como ocorre em epis‡dios
intensos de vŒmitos, especialmente quando est† associado com um esf„ncter superior do esŒfago, hipertŒnico. Outras
situa€‰es que podem ocorrer ‹ s„ndrome de Boerhaave s•o: parto, defeca€•o, convuls‰es, levantamentos de peso e
deglutiۥo vigorosa.
Quando ocorre viola€•o da pleura associada ‹ perfura€•o do esŒfago, al‚m da mediastinite o paciente vai
apresentar empiema pleural e mediastino contaminado.

SÍNDROME DE MALLORY WEISS


ˆ uma causa frequente de hemorragia digestiva alta, acometendo com frequƒncia indiv„duos alcoolistas
crŒnicos. Nela ocorre uma lacera€•o da jun€•o esofagog†strica, provocando les‰es do tipo el„ptica e longitudinais.
Tamb‚m est† associada com o aumento da press•o, como ocorre no reflexo da tosse e vŒmito.
Pode se manifestar clinicamente na forma de hematƒmese ou melena (ou mesmo, hematƒmese com a presen€a
de bile), e na maioria das vezes cessa espontaneamente. Nos pacientes cujo sangramento n•o ‚ cessado tenta-se o
tratamento endosc‡pico, ou ainda tratamento cirŠrgico.

QUADRO CL…NICO

SINAIS E SINTOMAS
O quadro cl„nico cl†ssico desses pacientes consiste na dor retroesternal ou abdominal, febre (sugere um
quadro mais avan€ado com pior progn‡stico – resposta inflamat‡ria sistƒmica ou sepse), e o enfisema (presen€a de ar
fora de uma cavidade). Entretanto esses sintomas n•o constituem uma regra, podendo irradiar-se para outras regi‰es,
como por exemplo, na perfura€•o do esŒfago abdominal, o paciente pode referir dor nos ombros devido ao
comprometimento do nervo frƒnico, ou ainda perfura€•o do esŒfago tor†cico distal com repercuss‰es cl„nicas tanto nos
ombros como no abdome superior. De uma forma geral a dor na perfura€•o esofagiana ‚ mais comum no local.
Nas perfura€‰es de esŒfago tor†cico ‚ comum o aparecimento de dispnéia, explicado pela les•o da pleura,
podendo assim desenvolver um quadro de pneumot‡rax e derrame pleural, pneumomediastino, desvio da linha m‚dia
das vias †reas. Ou ainda a dispn‚ia pode estar presente devido a um quadro s‚ptico.
Os sintomas relacionados ao TGI destacam-se: disfagia, odinofagia, disfonia, sialorr‚ia, hematƒmese ou melena.
Quando o diagn‡stico n•o ‚ dado precocemente, os pacientes v„timas de perfura€•o esofagiana evoluem com dor local,
febre, sepse, deficiƒncia de mŠltiplos ‡rg•os, caracterizando um quadro de choque s‚ptico com ‡bito.

EXAME FÍSICO
No exame f„sico desses pacientes avaliam-se os sinais vitais: FC, FR, press•o arterial, satura€•o de O2 e
avalia€•o das vias a‚reas (geralmente as perfura€‰es de esŒfago est•o associadas a comprometimento das vias
a‚reas), distŠrbios ventilat‡rios (enfisema, derrame pleural, pneumot‡rax, presen€a de corpo estranho) e controlar
estado hemodin…mico.
Na avalia€•o da regi•o cervical procura-se por dor, crepita€•o, enfisema e hematoma. Na inspe€•o do t‡rax
devem-se observar sinais e sintomas que indiquem algum tipo de trauma, como perfura€‰es, contus‰es, retra€‰es,
abaulamentos, na palpa€•o avaliar a presen€a de dor, poss„veis les‰es das costelas. Na percuss•o avaliar a presen€a
de sons hipertimp…nicos ou maci€os, indicando pneumot‡rax hipertensivo, hemot‡rax e derrame pleural,
respectivamente.
Na avalia€•o do abdome, atentar principalmente para dor a descompress•o (sinal de Blumberg), indicando
peritonite. Existe um sinal espec„fico chamado de sinal de Hamman que consiste em um rangido mediastinal, provocado
principalmente por enfisema. Assim ‚ definido como crepita€‰es sincronizadas aos batimentos card„acos e n•o com os
movimentos respirat‡rios.

EXAMES C OMPLEMENTARES
Ap‡s a realiza€•o de um exame f„sico adequado, levanta-se a suspeita de perfura€•o de esŒfago. Entretanto
para sua confirma€•o ‚ necess†ria a realiza€•o de exames complementares. Al‚m de confirmar o diagn‡stico os
exames complementares desempenham um papel importante nos seguintes aspectos:
 Avaliação, localização e extensão da lesão: informa€‰es de grande valia para uma abordagem terapƒutica
adequada.
 Avaliar complicações: mediastinite, derrame pleural, pneumot‡rax.
 Estadiamento de Patologias associadas: megaesŒfago, neoplasia, DRGE.
 Extravasamento do meio de contraste ou ar ou formação de coleções: d† informa€‰es importantes sobre a
presen€a de derrame pleural, empiema, pneumot‡rax. Al‚m disso, pode localizar a les•o de acordo com a
localiza€•o do extravasamento de contraste, extens•o e com isso gravidade.
 Tomografia Computadorizada: avalia a presen€a de cole€‰es purulentas.

53
Arlindo Ugulino Netto – CIRURGIA ABDOMINAL– MEDICINA P7 – 2010.2

 Toracocentese: é uma técnica pouco utilizada para avaliação de perfurações e lacerações esofagianas. Na
maioria das vezes o aspecto do líquido é turvo ou purulento, entretanto também pode se apresentar com aspecto
sanguinolento.

RADIOGRAFIA SIMPLES
A radiografia a ser realizada depende da topografia podendo estar localizada tanto na região cervical, torácica ou
abdominal. O exame de radiografia simples vai avaliar a presença de ar em tecidos moles, mediastino
(pneumomediastino), cavidade pleural (pneumotórax) ou peritônio (pneumoperitônio).
O derrame pleural se manifesta principalmente à esquerda (70%), estando presente principalmente na síndrome
de Boerhaave. Ou ainda pode ter coluna aérea traqueoesofágica presente até 23 cm da arcada dentária superior,
podendo ainda apresentar uma coleção retroesofágica. Entretanto o melhor exame para avaliar coleções é a TC.

ESOFAGOGRAMA
Tem sua importância para o estabelecimento do tratamento, localização e extensão da lesão, patologias
associadas, podendo ser utilizado tanto o contraste iodado ou baritado, levando-se em consideração as contra-
indicações de cada paciente.

ENDOSCOPIA DIGESTIVA ALTA (EDA)


Como foi dito anteriormente à própria endoscopia é uma das causas de perfurações esofágicas. Assim a
realização da EDA em pacientes com suspeita de perfuração pode aumentar a lesão se for mal conduzida, por isso não
é um exame de rotina, além de possuir uma baixa sensibilidade. A EDA só está indicada para os casos de dúvida no
diagnóstico mesmo com o exame contrastado, sendo assim uma complementação desse exame para o diagnóstico.

TOMOGRAFIA COMPUTADORIZADA
A tomografia devido a sua capacidade de identificar possíveis complicações (derrame pleural, pneumotórax etc.),
pode quando bem realizada substituir o esofagograma. Assim a TC permite a realização de um diagnóstico precoce e
mais acurado das complicações. Através dela, pode-se identificar a presença de coleções ou abscessos,
pneumomediastino, derrame pleural e extravasamento de contraste. Devido a todas essas características em alguns
casos pode substituir o esofagograma para estabelecer o diagnóstico.

OUTROS EXAMES
 Punção Pleural:
 Broncoscopia: é solicitada quando há suspeita de além da perfuração esofagiana, ocorreu concomitamente
lesão com laceração das vias aéreas.
 Azul de Metileno: nos casos de pneumotórax, que estão sendo drenados, pode-se administrar o contraste, se
for visto sendo eliminado através do dreno indica perfuração.

TRATAMENTO
As perfurações esofágicas são raras, entretanto quando ocorrem tem um grande índice de mortalidade. Por isso
antes de abordar um paciente com tal suspeita deve-se atentar para as seguintes condições:
 Equipe hábil em cirurgia esofágica: nem todos os cirurgiões são hábeis a abordar esse órgão. Com isso deve-se
ter um profissional qualificado para que não ocorra uma piora do quadro do paciente.
 Condições clínicas do paciente;
 Condições locais: avaliando se há condições de realizar um procedimento cirúrgico de grande porte, assim
como, manter o paciente estável no pós-operatório.
 Etiologia e local da perfuração;
 Tempo do diagnóstico;
 Presença de doenças associadas.

TRATAMENTO CLÍNICO
Os pacientes que são atendidos no pronto socorro, com suspeita de perfuração esofágica mesmo sem a
realização de exames, e estadiamento quanto a sua gravidade, deve-se realizar antibioticoterapia, principalmente para
Gram-positivos e anaeróbios. Dar ao paciente um suporte nutricional adequado, evitando assim complicações
infecciosas, sendo realizado através da colocação de uma sonda guiada por endoscopia.
Assim as principais situações em que se pode optar pelo tratamento clínico são:
 Pequenas perfurações
 Diagnóstico em menos de 6 horas
 Sem sinais de Sepse
 Perfuração Cervical
 Ruptura Incompleta

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Arlindo Ugulino Netto – CIRURGIA ABDOMINAL– MEDICINA P7 – 2010.2

 Paciente com péssimo prognóstico: são pacientes que se apresentam muito graves, com instabilidade
hemodinâmica, que não suporta a realização de um procedimento mais agressivo.

TRATAMENTO CIRÚRGICO
Os pacientes que estão indicados para o tratamento cirúrgico são:
 Diagnóstico precoce: geralmente antes de 24 horas
 Controlar o extravasamento: principalmente para o mediastino e cavidade pleural, diminuindo os riscos de
complicações.
 Desbridamento;
 Ampla Drenagem;
 Via nutrição: pode ser realizada através de sonda nasogástrica, gastrostomia ou jenunostomia.
 Preferencialmente não retirar o órgão: a retirada do esôfago na maioria das vezes leva a uma maior
mortalidade. A retirada do órgão é feita somente naqueles pacientes que tem alguma patologia associada.

TÉCNICAS CIRÚRGICAS NA ABORDAGEM DO PACIENTE COM PERFURAÇÃO DE ESÔFAGO

Sutura.
Um dos tratamentos cirúrgicos propostos para os pacientes com perfuração de esôfago consiste simplesmente
na sutura da lesão. Está indicado para aqueles pacientes com perfurações pequenas e com menos de 24 horas, onde o
tratamento clínico não foi eficaz. Nas perfurações com mais de 24 horas, na maioria das vezes já possui um processo
infeccioso instalado, determinando assim maiores riscos de ruptura da sutura. Entre outras condições em que a sutura
está contra-indicada são naqueles pacientes com más condições locais e/ou sistêmicas, ou ainda, presença de doenças
esofagianas associadas.
Durante o procedimento deve-se realizar a drenagem, e a sutura da lesão, com retalhos caso necessário.

Drenagem Local.
Está indicada para pequenas lesões, onde sua localização não está estabelecida, mesmo com a realização de
exames complementares. Ocorre com uma maior frequência naqueles pacientes com perfurações esofágicas.
O tratamento apenas com a drenagem depende das condições locais e sistêmicas do paciente. Quando o
paciente se apresenta com um estado geral ruim a tendência é realizar procedimentos menores, visando diminuir os
riscos de complicações. Em contrapartida pacientes jovens, estáveis, pode ser realizado um procedimento mais invasivo.
Quando persiste o extravasamento a mortalidade é de 47 a 100%. Mostrando a importância da realização de um
diagnóstico precoce, e estabelecer um tratamento adequado.

Esofagectomia.
Consiste na última opção terapêutica escolhida como tratamento. As principais condições para a realização
desse procedimento são:
 Presença de doenças esofágicas associadas
 Perfurações irreparáveis em esôfagos gravemente comprometidos
 Relação do tempo com a condição clínica do paciente: nos pacientes com condições clínicas muito ruins, drena-
se o local da lesão, e posteriormente realiza-se uma esofagostomia cervical. Esse procedimento está mais
indicado naqueles pacientes com perfurações com mais de 24 horas.
 Reconstrução precoce ou tardia: a reconstrução na maioria das vezes é tardia, estando em torno de 60 a 90 dias
quando o processo inflamatório foi cessado, após drenagem de abscessos.

Ostomias.
Pode ter como indicação tanto como uso isolado, como ocorre nos pacientes com condições clínicas ruins em
que a esofagectomia não é indicada, ou associada a outro procedimento principal.
Tem como função estabelecer uma via nutricional, como gastrostomia, jenunostomia, e ainda drenagem de
secreções como é o caso da cervicostomia. Entretanto mesmo sendo um procedimento simples de ser realizado deve-se
avaliar as condições clínicas do paciente, antes da realização das ostomias.

Outros procedimentos.
 Colocação de tubo em T: não e muito utilizada. Em perfurações esofágicas em que todos os métodos acima
citados estão contra-indicados pode-se optar como alternativa a colocação do tubo em T.
 Exclusão do trânsito:
 Irrigação transperfuração contínua: colocação de soro fisiológico e logo após aspiração dos mesmos.
 Colocação de próteses:
1
OBS : De acordo com o que foi discutido a respeito do tratamento dos pacientes vítimas de perfuração do esôfago, não
há uma regra a ser seguida, já que essas lesões podem se apresentar com uma diversidade de sinais e sintomas que,
55
Arlindo Ugulino Netto – CIRURGIA ABDOMINAL– MEDICINA P7 – 2010.2

atrasam no diagnóstico. Além disso, o tratamento é individual, ou seja, atentar para as condições clínicas do paciente,
avaliar o melhor procedimento para o mesmo, sendo ele clínico ou cirúrgico.

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Arlindo Ugulino Netto – CIRURGIA ABDOMINAL– MEDICINA P7 – 2010.2

MED RESUMOS 2012


ELOY, Yuri Leite; NETTO, Arlindo Ugulino.
CIRURGIA ABDOMINAL _________

LESÕES CÁUSTICAS AGUDAS


(Professor Marcelo Gonçalves)

As les‰es c†usticas s•o produzidas por subst…ncia corrosiva, que, ao entrar em contato com a mucosa esofagiana leva a
destrui€•o e dano ao tecido vivo, atrav‚s da destrui€•o das membranas celulares e conseq•entemente necrose. As les‰es c†usticas
incluem a ingest•o de produtos †cidos ou †lcalis.
A principal complica€•o tardia da ingest•o dessas subst…ncias ‚ a estenose esofagiana, e precocemente a perfura€•o. A
estenose ocorre devido ao processo inflamat‡rio intenso, devido ‹ les•o a parede esofagiana, levando a cicatriza€•o e fibrose.

EPIDEMIOLOGIA
A ingesta acidental ocorre com maior frequƒncia em crian€as. Nos adultos, ‚ mais frequente a ingest•o
volunt†ria, associando-se geralmente, a maior gravidade das les‰es, pois se trata de ingest‰es maiores.
A sua ocorrƒncia ‚ mais frequente no sexo feminino, parecendo estar associada, a les‰es menos graves. Isso ‚
explicado, pois na maioria das vezes a ingest•o ocorre por fatores emocionais, cuja inten€•o principal n•o ‚ o ‡bito. A
idade m‚dia de ocorrƒncia ‚ vari†vel, sendo apontada a 4— d‚cada como a mais afetada.

‰ CIDOS
A ingest•o de †cido leva a uma necrose por coagula€•o dos tecidos, atrav‚s da perda de †gua, com
consolida€•o do tecido conjuntivo (forma€•o de escara), fato este que limita a progress•o da les•o. De forma mais
objetiva, a presen€a do †cido em contato com a mucosa leva a uma maior elimina€•o de †gua pelos tecidos, criando um
exsudato de tecido conjuntivo que interrompe a continua€•o da les•o. Ao contr†rio da base, em que h† uma les•o por
liquefa€•o, a mucosa permanece constantemente Šmida, n•o tendo grande forma€•o de tecido conjuntivo, promovendo
uma maior les•o da parede esofagiana do que o †cido.
Assim as les‰es por ingest•o †cida levam a uma menor penetra€•o tecidual, quando comparada aos †lcalis,
acometem frequentemente o estŒmago, enquanto que o esŒfago ‚ mais acometido com ingest•o de †lcalis.
Entretanto a ingest•o de †cidos predisp‰e a maiores distŠrbios sistƒmicos, como acidose, hem‡lise, insuficiƒncia
renal aguda.
Entre os principais produtos ingeridos incluem: produtos de limpeza sanit†ria (†cido hidroclor„drico e sulfŠrico),
antiferrugem (†cidos ox†lico, hidroflŠorico), l„quido de bateria (†cido sulfŠrico) e de limpeza de piscinas (†cido
hidroclor„drico).

FATORES DE GRAVIDADE
Entre os principais fatores de gravidade, ou que, potencializam os efeitos do †cido est•o: (1) concentração, (2)
quantidade, (3) estado físico, (4) potencial Ocorrência de efeitos sistêmicos. Assim pacientes idosos, com co-
morbidades, ingest•o de grandes volumes e alta concentra€•o tem riscos maiores que indiv„duos jovens e previamente
h„gidos. Al‚m disso, ‚ importante informar-se se houve (5) intenção suicida, pois geralmente nesses pacientes h† uma
grande ingest•o de l„quidos, (6) tempo de exposição.
Al‚m disso, deve-se informar sobre a (7) repleção gástrica, ou seja, ingest•o pr‚via de alimentos. Nos
pacientes que estavam previamente alimentados, a les•o ocorre com uma maior frequƒncia no piloro e, em menor
propor€•o a pequena curvatura. J† quando o estŒmago encontra-se vazio, mais contra„do e verticalizado, as les‰es se
concentram no antro e corpo g†strico.
Al‚m disso, ‚ importante investigar poss„veis doen€as associadas principalmente ao TGI, tais como doen€as do
tr…nsito gastrointestinal (DRGE, altera€‰es estruturais, megaesŒfago, megacolo, retardo do esvaziamento g†strico –
fatores que determinam um maior tempo de exposi€•o ao †cido promovendo les‰es mais agressivas).
Como as subst…ncias †cidas provocam muita dor quando entram em contato com a mucosa do paciente, a
quantidade ingerida por ele tende a ser menor. Ao contr†rio dos †lcalis que, devido ao fato de que inicialmente n•o
provocarem tanta dor, a sua ingest•o tende a ser maior (al‚m disso, sua capacidade de penetra€•o tecidual ‚ maior que
a dos †cidos).

‰LCALIS
Nos †lcalis ocorre uma les•o por liquefa€•o, com saponifica€•o de lip„dios, desnatura€•o prot‚ica e trombose
capilar. Como j† foi explicado anteriormente, nesses casos n•o h† forma€•o de coagula€•o por parte do tecido
conjuntivo, com isso, ap‡s 3 a 4 dias ap‡s a ingest•o, os †lcalis ainda podem estar lesando a mucosa do paciente.
Devido a essas caracter„sticas os †lcalis possuem um maior potencial de penetra€•o tecidual. As les‰es se
concentram principalmente no esŒfago. Como no mecanismo de les•o os †lcalis geram uma maior reten€•o de †gua, as

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les‰es s•o mais profundas. As les‰es no estŒmago s•o menores, devido ‹ a€•o neutralizadora do †cido clor„drico,
limitando a gravidade das les‰es.
As les‰es determinadas por †lcalis ocorrem com uma maior frequƒncia nos pa„ses ocidentais, entre os principais
s•o: produtos de limpeza como per‡xido de hidrogƒnio, fosfato, tripolifosfato de s‡dio e hipoclorito de s‡dio, com pH
variando em torno de 10,8 e 11,4.
A sua ingest•o acidental a seco resultam em les‰es de maior gravidade, principalmente quando cont‚m
hidr‡xido de s‡dio em concentra€‰es altas, geralmente entre 4 a 54%.

MECANISMO DE LESÃO (PATOGENIA)


Na fase aguda ocorre a inflama€•o, necrose celular, saponifica€•o das gorduras, desnatura€•o prot‚ica,
hemorragias e trombose. Com isso al‚m do risco de ocorrer perfura€•o esof†gica (que pode ocorrer at‚ o 5˜ dia ap‡s a
ingesta) devido ‹ necrose celular, o paciente pode cursar com hemorragia digestiva.
Al‚m disso, com o progredir do tempo, h† possibilidade de ocorrer infec€•o bacteriana, devido ‹ isquemia,
necrose tecidual, favorecendo a esse tipo de ocorrƒncia. Geralmente quando h† infec€•o o progn‡stico do paciente piora
consideravelmente.
Com o evoluir da les•o, vai ocorrer o desprendimento do tecido necrosado, redu€•o da hiperemia e edema, e
neovascularizaۥo em torno de 4 a 7 dias. Essa reorganizaۥo vai levar a formaۥo de um tecido de granulaۥo,
prolifera€•o de fibroblastos, deposi€•o de col†geno e por fim estenoses cicatriciais em torno de 15 dias.
Ap‡s o epis‡dio de ingest•o de †lcalis ‚ necess†rio saber a localiza€•o, gravidade e extens•o das les‰es, assim
como as repercuss‰es cl„nicas e sistƒmicas dessas les‰es.
Quanto ao estado f„sico do produto ingerido, podemos destacar: (1) sólido, causando les‰es em orofaringe,
tendo menores repercuss‰es esof†gicas; e os (2) líquidos que, por serem deglutidos em maior quantidade, causam
les‰es mais extensas, difusas e circunferenciais, podendo se difundir para todo o esŒfago, estŒmago e duodeno. As
subst…ncias com pH maior ou igual a 12,5 promovem ulcera€‰es esof†gicas independentemente da concentra€•o.
Al‚m dos fatores de les•o citados acima, pode ocorrer com freq•ƒncia o mecanismo de “gangorra”,
caracterizado pela ocorrƒncia de um espasmo ao n„vel do piloro (piloroespasmo), em resposta a presen€a do conteŠdo
alcalino, com concomitante fechamento do mŠsculo cricofar„ngeo, podendo levar a v†rias les‰es, repetitivas.
Assim as fases de evolu€•o das les‰es por †lcalis s•o:
 Fase aguda: ocorre em torno de 4 a 7 dias, caracterizada pelo edema, congest•o vascular, trombose e necrose.
 Subaguda: tem uma dura€•o m‚dia de 4 a 21 dias, ocorrendo ‹ forma€•o de tecido de granula€•o, substituindo
†reas de les•o.
 Crônica: ap‡s 21 dias o tecido lesado encontra-se cicatrizado e fibrosado, favorecendo ao aparecimento de
cicatriz e estenose.

QUADRO CL…NICO
 Dor oral;
 Saliva€•o, estridor e Rouquid•o: a presen€a de rouquid•o pode indicar les‰es das cordas vocais, com isso
avaliando as poss„veis les‰es que poder•o ter ocorrido nas vias a‚reas.
 Odinofagia;
 N†useas, vŒmitos e hemorragia digestiva alta;
 Dor retroesternal e dorsal: principalmente quando h† perfura€•o associada. Podendo se manifestar todos os
sinais e sintomas de perfura€•o esof†gica.
 Dor abdominal;
 Sintomas tardios: estenose (jejunal) e Refluxo. Outras complica€‰es tardias hipocloridria ou acloridria, mucocele
esof†gica e disfonia.
1
OBS : A ausƒncia de sintomas n•o exclui les•o importante. Os sintomas nas les‰es por ingest•o de produtos t‡xicos
ocorrem com uma maior freq•ƒncia, quando h† perfura€•o esof†gica.
2
OBS : Os pacientes com hist‡ria de ingest•o de subst…ncias c†usticas tƒm maiores chances de desenvolver c…ncer
espinocelular de esŒfago. Esta associada principalmente em casos de estenose, em que leva a reten€•o de l„quido e
les•o da mucosa. Estima-se que esses pacientes possuem um risco cerca de 1000 a 3000 vezes superior que a
popula€•o em geral. Aproximadamente 3% dos doentes com carcinoma do esŒfago admitem ingest•o de produtos
c†usticos no passado e cerca de 1 a 7%, tƒm hist‡ria pr‚via de les•o c†ustica. A idade m‚dia de apresenta€•o est† em
torno de 40 anos ap‡s a ingest•o. O carcinoma g†strico ocorre raramente.

EXAME F…SICO
No paciente com hist‡ria de ingest•o de produtos t‡xicos deve-se atentar para os seguintes aspectos:
 Sinais de Perfura€•o;
 Dispn‚ia / Taquipneia
 Queimaduras na Orofaringe (escaras / Šlcera)
 Defesa abdominal / Irrita€•o Peritoneal
 Choque Hipovolƒmico / S‚ptico
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TRATAMENTO
Antes de tratar o paciente deve-se documentar a existência, localização e gravidade das lesões. Assim o
diagnóstico de lesões cáusticas se inicia através de uma anamnese e exame físico criterioso e realização de exames
complementares. O exame mais solicitado para o diagnóstico de lesões cáusticas é a endoscopia digestiva alta (EDA).
Entretanto caso no raio X simples contrastado mostre sinais de perfuração pode ser dado o diagnóstico.

CONDUTA INICIAL
Antes de iniciar o tratamento específico do paciente, deve-se estabilizar do ponto de vista respiratório e
hemodinâmico. Assim a avaliação da via área e necessidade de suplementação de oxigênio é prioritária a qualquer outro
procedimento.
O controle das vias aéreas é de extrema importância, devendo sempre que possível estabelecer uma via área
segura através da intubação orotraqueal (IOT). Pois caso haja o comprometimento das cordas vocais pode haver o
desencadeamento de um processo inflamatório e com isso, levar a edema impossibilitando a realização da IOT, tendo
como alternativa principal a realização de cricotireoidostomia.
Além disso, deve-se realizar uma hidratação adequada desse paciente, analgesia e administração de inibidores
da bomba de prótons. Entre outras medidas incluem: passagem de sonda nasogástrica está indicada para pacientes que
tiveram uma grande ingestão de ácidos, manter o paciente em jejum oral, monitorizar sinais vitais e manter o paciente
em decúbito elevado.
A avaliação laboratorial desse paciente deve ser feita com a realização de exames tais como: gasometria,
hemograma, coagulograma, PCR, função renal, eletrólitos, provas hepáticas, LDH e amilasemia. Esses exames não são
utilizados para estabelecer o diagnóstico mais sim para avaliar as condições clínicas do paciente, visando corrigir as
possíveis anormalidades.
Em relação aos exames de imagem é solicitado o raios-X de tórax e abdome, avaliando a presença de
perfurações, caso exista deve-se realizar uma investigação mais criteriosa com tomografia computadorizada. E
obrigatoriamente deve ser realizada uma EDA nas primeiras 12 horas.
Na suspeita de comprometimento de vias aéreas como laringe a investigação é feita com laringoscopia. A
seriografia de esôfago, estômago nem sempre é solicitado, já que a TC traz informações mais fidedignas. Além disso,
esse exame pode induzir ao vômito e dificuldade de deglutição. Assim o exame contrastado nas perfurações cáusticas
deve ser evitado, entretanto em outras causas pode ser realizado. Com isso melhor exame é a EDA, associada ao raio X
simples e/ou TC.
Nos pacientes com lesão por ingestão de produtos tóxicos é contra-indicada à realização da lavagem gástrica,
indução do vômito favorecendo ao retorno do conteúdo ingerido (lesando o esôfago) e utilização de substâncias
neutralizantes. Uma das alternativas é na ingestão de sólidos transformar em água na tentativa de diminuir a
concentração ou ainda na presença de ácido em grandes quantidades, pode-se passar a sonda nasogástrica, para
realização de aspiração. A utilização de corticóide também está contra-indicada, com exceção naqueles pacientes que
pode vir a desenvolver um quadro de broncoespasmo importante, administrando para reduzir esse efeito. Os antibióticos
também estão contra-indicados exceto quando existe evidência de infecção, broncoaspiração ou suspeita de perfuração.

FASE AGUDA

Endoscopia Digestiva Alta.


É importante a realização da EDA, pois orienta quanto à terapêutica e prognóstico do paciente. Avalia a
localização, extensão e profundidade da lesão, permitindo a realização de alguns procedimentos terapêuticos como a
aspiração do líquido ingerido. Sua indicação é feita principalmente para 12 a 48 horas após a ingestão. Após 12 a 24
horas as ulcerações e a mucosa tornam-se esbranquiçadas, permitindo uma melhor visualização.
Após a visualização das lesões é necessária a realização da classificação de acordo com Zargar, para o
estabelecimento da melhor conduta para o paciente:
 Grau I: edema ou hiperemia da mucosa
 Grau IIa: friabilidade, hemorragia, exsudatos, úlceras superficiais
 Grau IIb: características do grau IIa + ulceração discretamente profunda ou circunferencial
 Grau III: áreas de necrose, úlceras profundas e múltiplas
 Grau IV: perfuração.

O tratamento deve priorizar o controle da inflamação, diminuição do edema, manutenção do calibre do órgão
acometido e profilaxia das complicações (estenose / infecções). Os pacientes assintomáticos (I ou IIa) permanecem em
observação por 4 a 6 horas, se durante esse tempo não ocorrer uma evolução desfavorável pode ser dada a alta.
Já os pacientes com lesões esofágicas grua IIb e III devem ser internados, realização de lavagem gástrica (só
pra fenóis), manutenção do estado nutricional (nutrição parenteral ou enteral). Uso de SNG está contra-indicada, exceto
nos casos em que há grande volume de ácido no interior do estômago, e ainda utilizar os inibidores da bomba de
prótons como já foi dito anteriormente.

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A EDA est† contra-indicada para os casos de les‰es graves da hipofaringe, obstru€•o da via a‚rea superior
sinais e sintomas de perfura€•o e instabilidade hemodin…mica, choque, per„odo entre 5˜ a 15˜ dia ap‡s a ingesta. Como
foi dito a endoscopia ‚ indicada somente ap‡s 12 a 24 horas ap‡s a ingest•o, quando realizada precocemente (4 a 6
horas), pode subestimar o verdadeiro grau de les•o tecidual, possui o risco de induzir o vŒmito. Ao contr†rio quando
administrado ap‡s 5 a 15 dias pode determinar um desprendimento do tecido necrosado e instala€•o incompleta de
fibrose, com maiores riscos de perfura€‰es.

FASE TARDIA
A principal complica€•o tardia ‚ a estenose. Sabe-se que a estenose aumenta o grau da les•o quando avaliado
pela EDA, e ainda aumenta o risco de les‰es malignas, devido ‹ reten€•o l„quida e les•o da mucosa. Apesar disso,
nenhuma medida parece ser eficaz na preven€•o da estenose esof†gica, embora tenha sido tentado corticoides,
agentes antifibr‡ticos entre outros. Entre as poss„veis formas de tratamento para a estenose temos: dilata€•o
endosc‡pica, coloca€•o de pr‡teses pl†sticas, inje€•o de cortic‡ides (estenose refrat†ria a dilata€•o ou estenoses
dominantes), ou ainda cirurgia – esofagectomia.

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Arlindo Ugulino Netto – CIRURGIA ABDOMINAL– MEDICINA P7 – 2010.2

Estenose Esofágica.
O principal sintoma dos pacientes com estenose c†ustica ‚ a disfagia. Essa estenose pode ocorrer devido ao
edema provocado pelo processo inflamat‡rio ou ainda pelo processo cicatricial e fibr‡tico. Isso vai levar a uma
impacta€•o de alimentos, reten€•o h„drica caracterizando a disfagia e ainda levando a mais les‰es da mucosa.
A estenose esof†gica torna-se evidente 21 dias ap‡s a ingest•o. A instala€•o completa da estenose ocorre em
torno de 4 a 6 semanas. J† os sintomas aparecem em torno de 3 a 6 semanas.
Assim para a avalia€•o de uma estenose esof†gica deve-se seguir todo o protocolo descrito previamente, com,
avalia€•o cl„nica, exames laboratoriais, (hemograma, eletr‡litos, gasometria, raios-X de t‡rax e abdome e EDA), avaliar a
presen€a de les‰es orais e presen€a de complica€‰es.
O tratamento da estenose pode ser feito atrav‚s da dilata€•o, sendo est† a primeira op€•o terapƒutica, evitando
procedimentos mais invasivos, preservando o ‡rg•o. A dilata€•o pode ser feita da seguinte forma:
 Velas – bal‰es (hidrost†ticos ou pneum†ticos)
 Dilatador de Savary-Gillard
 Bal‰es de baixa complacƒncia

As dilata€‰es podem ser iniciadas a partir da terceira semana, com intervalo entre 2 a 3 semanas . O nŠmero de
sess‰es varia de acordo os sintomas apresentados pelo paciente. A principal complica€•o da dilata€•o ‚ a perfura€•o
esof†gica (0 a 1,4%), hematoma, sangramentos. Os fatores de mau progn‡stico para esse tipo de tratamento s•o:
 Parede de espessura > 9mmm
 Estenose > 5 cm de extens•o
 Pequeno lŠmen residual
 In„cio tardio das dilata€‰es
 RGE
 Estenose Tortuosa

A estenose refrat†ria pode


ocorrer, nesses casos, deve-se
administrar inje€•o de cortic‡ides.
Precedendo a estenose
recomenda-se acetato
triancinolona, com aplica€‰es
circunferenciais nos quatro
quadrantes em intervalo de 2 a 3
semanas. Nesses pacientes ‚
comum infec€•o fŠngica, podendo
ser tratado com cetoconazol e
nistatina ap‡s o procedimento (7
dias).
O procedimento cirŠrgico
mais realizado ‚ a reconstrução
esofágica com tubo gástrico ou
interposição de jejuno ou cólon.

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MED RESUMOS 2012


NETTO, Arlindo Ugulino.
CIRURGIA ABDOMINAL _________

NEOPLASIAS GÁSTRICAS
(Professor Marcelo Gonçalves)

O c…ncer g†strico ‚ uma das patologias mais incidentes no mundo todo, representando um dos tumores
mais frequentes do aparelho digest‡rio. No Brasil, representam a terceira neoplasia mais comum em homens
(ap‡s pr‡stata e pulm•o) e a segunda causa de ‡bito por c…ncer. Entre as mulheres, constituem na quinta mais
comum (mama, colo uterino, c‡lon e pulm•o) e a quarta causa de ‡bitos por neoplasias.

ANATOMIA DO ESTƒMAGO
O estômago ‚ a parte expandida do trato
alimentar entre o esŒfago e o intestino delgado. ˆ
especializado para o acŠmulo de alimento
ingerida, que ‚ qu„mica e mecanicamente
preparado para a digest•o e passagem para o
duodeno. Com exce€•o da parte pil‡rica, que est†
no quadrante superior direito, o estŒmago est†
localizado no quadrante superior esquerdo,
quando apresenta um formato em “C” invertido,
por‚m quando apresenta um formato em “J” em
indiv„duos longil„neos, em que ele pode se
alongar at‚ o quadrante inferior esquerdo.
Anteriormente, o estomago se relaciona com: parede abdominal anterior, diafragma, margem costal esquerda e
lobo esquerdo do f„gado. Posteriormente, est† relacionado com: bolsa omental, diafragma, ba€o, gl…ndula supra-renal
esquerda, parte superior do rim esquerdo, art‚ria esplƒnica, p…ncreas, mesoc‡lon transverso e colo transverso.

DIVISÃO ANATÔMICA
Externamente, o estomago ‚ configurado pelas seguintes regi‰es: C†rdia (‡stio c†rdico), Fundo g†strico, Corpo
g†strico, Parte pil‡rica (antro pil‡rico, canal pil‡rico, piloro e ‡stio pil‡rico), Parede anterior, Parede posterior, Curvatura
maior (incisura c†rdica) e Curvatura menor (incisura angular). Internamente, sua configura€•o constitui-se em: pregas
g†stricas, sulco g†strico, ‡stio c†rdico e ‡stio pil‡rico.
O estŒmago apresenta trƒs camadas musculares: uma longitudinal (externa), uma circular (m‚dia) e uma obliqua
(interna). Essa camada obliqua adicional representa a necessidade de uma camada muscular extra para a funۥo de
propuls•o e mistura realizada por esse ‡rg•o.

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IRRIGAÇÃO DO ESTÔMAGO
De um modo direto (ou indireto), o estômago é amplamente irrigado pelo tronco celíaco. Este constitui o
primeiro grande ramo da artéria aorta abdominal e dá origem a três ramos: a artéria gástrica esquerda, artéria esplênica
e a artéria hepática comum. A artéria gástrica esquerda, ramo direto do tronco celíaco, segue ao longo da curvatura
menor do estômago; a artéria esplênica, que parte por trás do estômago para irrigar o baço, fornece as pequenas
artérias gástricas curtas e à artéria gastromental esquerda (que segue ao longo da curvatura maior do estômago); a
artéria hepática comum dá origem à artéria gastroduodenal (que desce por trás do piloro e do duodeno dá origem à
artéria gastromental direita) e à artéria hepática própria (que, durante seu trajeto ao hilo hepático, dá origem à artéria
gástrica direita, que segue ao longo da curvatura menor do estômago para se unir com a artéria gástrica esquerda).
Desta forma, temos:
 Artéria gástrica esquerda: primeiro
ramo do tronco celíaco que segue na
curvatura menor do estômago para se
anastomosar por inosculação com a A.
gástrica direita
 Artéria gástrica direita: ramo da artéria
hepática própria (ramo da hepática
comum, oriunda do tronco celíaco).
 Artéria gastromental esquerda: ramo
da artéria esplênica (ramo do tronco
celíaco), que brota posteriormente ao
estômago, seguindo na curvatura maior
do estômago para se anastomosar com a
A. gastromental direita.
 Artéria gastromental direita: ramo da
artéria gastroduodenal (que é ramo da A.
hepática comum, oriunda do tronco
celíaco).
 Artérias gástricas curtas: ramos da
artéria esplênica (ramo do tronco celíaco).

DRENAGEM LINFÁTICA DO ESTÔMAGO


Os vasos linfáticos que drenam o estômago seguem as artérias gástricas.
 Vasos linfáticos Gástricos esquerdo  linfonodos celíacos
 Vasos linfáticos Gástricos direito  linfonodos celíacos
 Vasos linfáticos Gastromentais esquerdo  linfonodos esplênicos, pancreáticos e celíacos.
 Vasos linfáticos Gastromentais direitos  linfonodos celíacos.

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Arlindo Ugulino Netto – CIRURGIA ABDOMINAL– MEDICINA P7 – 2010.2

INCIDŠNCIA E MORTALIDADE
Em termos globais, o câncer gástrico corresponde à 4ª causa de câncer em incidência e à 2ª causa de
mortalidade por câncer. Nos EUA, em 2008, foram registrados pouco mais de 21000 novos casos, com cerca de 10880
mortes.
60% dos casos de câncer gástrico acontece em países subdesenvolvidos, especialmente, na Ásia e na América
do Sul. Este fato pode ser explicado por seus principais fatores de risco estarem envolvidos com o subdesenvolvimento.
Cerca de 2/3 dos pacientes se apresentam com doença avançada ou metastática logo ao diagnóstico. O
restante, isto é, apenas 1/3 dos pacientes, por ainda não possuírem a doença avançada, são candidatos à ressecção do
tumor. Contudo, dos pacientes submetidos à ressecção com intenção curativa, 60% apresentam recorrência, sendo a
maioria das recidivas em apenas 3 anos.
A recorrência locorregional acontece em até 45% dos casos (isto é: quase metade dos pacientes). Quando o
tumor retorna, geralmente ele se desenvolve no local da anastomose, no leito gástrico ou nos linfonodos regionais (por
esta razão, durante a cirurgia, é prudente a retirada de uma boa margem de segurança com relação ao leito tumoral,
associada à retirada do número máximo de linfonodos possíveis, diminuindo, assim, as chances de recidiva).
A metade dos pacientes (praticamente 50% deles), quando são submetidos à ressecção tumoral, apresenta
disseminação peritoneal. Portanto, metade dos pacientes que são submetidos à cirurgia, ou apresentam disseminação
linfonodal ou desenvolvem disseminação peritoneal. Conclui-se que, poucos pacientes conseguem a cura definitiva do
câncer gástrico.

EPIDEMIOLOGIA
O estômago é sitio comum
de tumores, sejam eles benignos
ou malignos. Dos tumores
benignos, os mais comuns são:
pólipos hiperplásicos (mais
comuns, que podem ser tratados
conservadoramente); pólipos
adenomatosos (pode evoluir para
adenocarcinoma); leiomiomas
(podem evoluir para o
leiomiossarcoma), Schwannomas
(pode evoluir para sarcoma neural).
A maioria dos tumores
benignos do estômago são
achados de forma acidental por
endoscopia, sendo eles pequenos
e facilmente submetidos à
ressecção endoscópica.
Dos tumores malignos do estômago, os mais comuns são os adenocarcinomas (cerca de 95%) e 5%
compreende ao restante: carcinoides, linfomas, tumores estromais (GIST), sarcomas, tumores metastáticos. Em resumo,
no que diz respeito aos tumores malignos do estômago, temos:
 95% são adenocarcinomas, que podem ser caracterizados pelos seguintes padrões histológicos: papilar,
tubular, mucinoso, anel de sinete, pequenas células, etc. Nesta ordem de progressão, pior é a diferenciação
celular e pior o prognóstico.
 5% correspondem aos: tumores neuroendócrinos, linfomas, leiomiossarcomas, tumores estromais (GIST),
tumores metastáticos, etc.
1
OBS : Algumas considerações da Patologia Geral devem ser feitas para que o estudante de medicina não confunda
alguns termos. O termo biópsia diz respeito ao estudo patológico de um fragmento de uma peça tumoral, por exemplo. O
termo anátomo-patológico, por sua vez, condiz ao estudo da peça inteira, totalmente ressecada. Para o diagnóstico
histológico do câncer gástrico, necessitamos o estudo anátomo-patológico da peça ressecada.

O câncer gástrico é considerado a 2ª neoplasia mais comum do trato digestório (perdendo apenas para o câncer
cólon-retal), apresentando uma incidência importante no Japão (devido ao padrão alimentar e utilização de molhos
específicos de sua culinária), nas Américas e no leste Asiático.
O aumento de sua incidência está relacionada com o aumento na ingestão de alimentos defumados e/ou
diminuição na ingestão de frutas e verduras frescas. Tanto é que a melhora no preparo e conservação dos alimentos
diminuiu a incidência de neoplasias gástricas. Estes fatos mostram que o câncer gástrico é uma neoplasia de países
subdesenvolvidos.

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FATORES DE RISCO
H† muitos fatores implicados no aumento do risco de desenvolvimento do c…ncer g†strico. De maneira
geral, observa-se que a maior incidƒncia desse tumor ocorre em pessoas acima de 40 anos de idade, com
progress•o com o passar dos anos, do sexo masculino, ra€a negra e com baixas condi€‰es socioeconŒmicas.
Dentre os principais fatores de risco, podemos destacar:
 Susceptibilidade genética: sabe-se hoje que muitos dos pacientes que desenvolvem c…ncer g†strico
apresentam uma predisposi€•o gen‚tica que, quando associada a alguns fatores ambientais, sofre o
aumento da possibilidade de desenvolver a neoplasia. As principais altera€‰es gen‚ticas relacionadas com
o c…ncer g†strico s•o:
 Polipose adenomatosa familiar;
 S„ndrome de Peutz Jeghers, que tamb‚m ‚ uma polipose;
 Polipose infantil;
 C…ncer de colo heredit†rio n•o-polip‡ide (HNPCC);
 S„ndrome de Li-Fraumeni
 BRCA-2, gene relacionado ao c…ncer de mama;
 HDGC
 Fatores gen‚ticos como E. Caderinas (CHD1 – cromossomo 16q22) e Grupo sangu„neo A (fator
ainda question†vel)

 Fatores ambientais: o meio ambiente interfere como fator de risco para neoplasia g†strica a partir do momento
que associamos este tipo de c…ncer com uma maior incidƒncia em pa„ses subdesenvolvidos. Isto se deve aos
seguintes fatores, entre outros:
 Falta de refrigera€•o dos alimentos
 Alimentos em temperaturas altas (predispondo ‹ forma€•o de aminas heteroc„clicas)
 Fatores ocupacionais
 Tabagismo e †lcool est•o relacionados ‹s neoplasias g†stricas, mas n•o s•o fatores independentes
 Baixas condi€‰es s‡cio-econŒmicas
 Infec€•o por H. pylori (principal fator independente da neoplasia g†strica)

 Infecção por Helicobacter pylori: A Helicobacter pylori, bact‚ria gram-negativa microaer‡fila que reside
dentro da camada de muco da parede g†strica sem invadi-la, tem sido implicada na gƒnese do carcinoma
g†strico. Corresponde ao principal fator independente da neoplasia g†strica. A H. pylori tamb‚m ‚ descrita
como fator de risco para o desenvolvimento de linfoma g†strico de tecido linf†tico associado ‹ mucosa
(MALT), um tipo de linfoma n•o-Hodgkin. Contudo, n•o h† provas concretas da rela€•o do H. pylori com o
adenocarcinoma g†strico, o tumor mais frequente deste ‡rg•o. A fisiopatologia do c…ncer g†strico pelo H.
pylori est† relacionada, principalmente, com a progressão para gastrite atrófica crônica e a quebra da
barreira gástrica. A gastrite atr‡fica crŒnica ‚ uma les•o precursora do carcinoma g†strico e est†
presente em 80% a 90% dos pacientes, com incidƒncia universal em popula€‰es de alta taxa de
diagn‡stico de c…ncer g†strico, aumentando o risco de desenvolvimento de neoplasia em 45 a 90 vezes.

 Fatores nutricionais: o surgimento de neoplasias g†stricas est† relacionado com: ingest•o cont„nua de
alimentos preservados em sal ou defumados; condimentos que envolvem nitrosaminas (enlatados e
conservantes) em sua prepara€•o; ingest•o elevada de amido; alimenta€•o pobre de vegetais e frutas
frescas; alimentos contaminados por fungos. Al‚m destes fatores, podemos destacar:
 Baixo consumo de prote„nas, vegetais frescos e frutas;
 Ingest•o de peixe ou carne salgados;
 Baixo consumo de vitaminas A e C
 Ch† verde e alho s•o considerados fatores protetores

 Operações gástricas: estudos prospectivos mostraram que pacientes gastrectomizados tinham maior
propens•o de desenvolver c…ncer no coto g†strico remanescente. Al‚m disso, pacientes submetidos ‹
gastrectomia Billroth II apresentam uma maior incidƒncia de refluxo biliar, propens•o de desenvolver
gastrite alcalina e, assim, c…ncer g†strico.

 Lesões predisponentes:
 Adenomas g†stricos (epitelial e mesenquimal)  75%
 Polipose g†strica difusa
 Gastrite atr‡fica
 Anemia perniciosa
 Metaplasia intestinal
 Displasias

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ADENOCARCINOMA G ‰STRICO
O adenocarcinoma gástrico corresponde a pelo menos 95% dos tumores gástricos, manifestando-se,
principalmente, entre a 5ª e 6ª décadas de vida. Há um predomínio ligeiramente maior no sexo masculino (2 H: 1 M).
Várias características clínicas do adenocarcinoma gástrico servem para as demais neoplasias deste órgão e, portanto,
daremos maior ênfase a este tumor.

AVALIAÇÃO INICIAL
Segundo o National Comprehensive Cancer Network, quando suspeitamos que um paciente pode apresentar
uma neoplasia gástrica, devemos estabelecer os seguintes passos durante a sua avaliação inicial, com o intuito de
concluir se este paciente é cirúrgico ou não.
 Anamnese completa, para verificar compatibilidade com neoplasia gástrica, sobretudo no que diz respeito aos
fatores de risco para tal doença;
 Exame físico, buscando indícios de doença avançada ou não;
 Exames laboratoriais: hemograma, bioquímica do sangue, função renal, função hepática (albumina e
coagulograma)
 Avaliação nutricional
 Radiografia de tórax, para avaliação de doenças pulmonares associadas
 TC de abdome e pelve, para avaliar a presença de linfonodos positivos à distância, perilesionais, tamanho da
lesão, invasão da lesão em órgãos sobrejacentes, presença de ascite, critérios de ressecabilidade, etc.
 Endoscopia com biópsia da lesão
 Avaliação laboratorial de marcadores tumorais:
 CA 19-9, sensibilidade de (presente em) 62% dos casos, mas de especificidade muito baixa (pode estar presente
em vários tumores, como de fígado, via biliar e pâncreas);
 CEA: não dá o diagnóstico, mas serve como parâmetro para monitoramento e acompanhamento. É pouco
específico (pode ser alterado na presença de outros tumores) e, quanto mais alto estiver, maior a sua relação com
metástases. Outras situações podem alterar o CEA, tais como: tabagismo, doença não-maligna, doença bronco-
pulmonar obstrutiva crônica (DBPOC), pancreatite e insuficiência renal.
 CA 72-4 ou TAG72: são pouco específicos, pois podem estar presentes nos tumores gástricos, como nos tumores
de mama, pulmão, ovário, colo-retal e pâncreas. Servem para monitorar o tratamento e para predizer o retorno da
malignidade. Sua maior utilidade está na diferenciação de neoplasias malignas de benignas, estando mais elevado
naquelas e menos nestas.
Conclui-se, então, que não existem marcadores específicos para as neoplasias gástricas.

DIAGNÓSTICO CLÍNICO
Os sintomas das neoplasias gástricas são pouco específicos, que podem caracterizar quadros de dispepsia
funcional, de refluxo ou de doença péptica. Contudo, devemos dar maior atenção quando houver sinais de alerta, tais
como: hemorragia digestiva, epigastralgia sem resposta clínica, disfagia, perda de peso, massa palpável, etc.
 Quadro clínico: dentre os principais sintomas, temos:
 Dor abdominal (72%)  Melena (5%)
 Fraqueza (58%)  Alteração do hábito intestinal (38%)
 Emagrecimento (74%)  Plenitude gástrica (33%)
 Hematêmese (9,3%)  Disfagia (14%)

 Exame físico: como sinais físicos de neoplasia avançada temos:


 Hepatomegalia nodular
 Ascite: está relacionada com tumores que ultrapassaram as camadas gástricas e alcançaram o peritônio
 Gânglio de Virchow (adenopatia supra-clavicular esquerda)
 Prateleira de Plummer: nodulações na parede anterior do reto, perceptíveis ao exame do toque, caracterizando
implante de células disseminadas do estômago para a pelve (fundo de saco de Douglas, localizado entre a
bexiga e o reto).
 Massa abdominal palpável
 Metástase ovariana (tumor de Krukenberg): tumor ovariano relacionado com tumores de estômago que, por
contiguidade, dissminou-se para a pelve até se implantar nos ovários. Se refere, portanto, a uma malignidade
ovariana secundária cuja localização primária foi o trato gastrointestinal.
 Linfonodo palpável periumbilical (sinal de Mary Jospeh).

 Endoscopia: fornece o aspecto macroscópico da lesão, com ou sem corante. Por meio dela, podemos
classificar a lesão através da classificação de Bormann da seguinte maneira:
o Borman I: aspecto polipóide.
o Borman II: aspecto erosivo ou ulcerado.
o Borman III: aspecto ulcerado e infiltrativo.
o Borman IV: aspecto infiltrante grosseiro, acometendo boa parte da parede do estômago.
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 Ecoendoscopia: exame endosc‡pico que utiliza a propriedade da ultrassonografia para avaliar a invas•o da
parede g†strica. Por meio dela, podemos calcular o T do estadiamento do c…ncer g†strico, isto ‚: invas•o da
l…mina pr‡pria, da submucosa, da camada muscular ou da camada serosa.

 Tomografia computadorizada (TC): exame obrigat‡rio quando se tem o diagn‡stico do c…ncer g†strico. Por
meio dele, podemos identificar ascite, presen€a de linfonodos positivos ‹ dist…ncia, perilesionais, tamanho da
les•o, invas•o da les•o em ‡rg•os sobrejacentes, crit‚rios de ressecabilidade, etc.

 Laparoscopia diagnóstica (LD): exame necess†rio para avaliar as condi€‰es de ressecabilidade tumoral. Por
meio dela, podemos avaliar a presen€a de ascite e de met†stases peritoneais e hep†ticas, al‚m de dar a
possibilidade de biopsi†-las. Se a bi‡psia revelar que a les•o realmente se trata de uma met†stase, contra-
indica-se a cirurgia. Desta maneira, a LD evita em at‚ 40% laparotomias desnecess†rias por doen€as
avan€adas. Menos de 2% dos pacientes necessitar•o de cirurgia paliativa ap‡s laparoscopia.

 Outros exames: ultra-som laparosc‡pico; lavado peritoneal; positron emission tomography (PET).

ESTADIAMENTO DO CÂNCER GÁSTRICO


O estadiamento (p‡s-cirŠrgico) do c…ncer g†strico segundo a Japanese Gastric Cancer Association (JGCA),
Union Internacionale Contre le Cancer (UICC) e American Joint Committee on Cancer (AJCC) tem, como objetivo, o
planejamento adequado do tratamento para o c…ncer g†strico. Os exames necess†rios para o estadiamento s•o: TC de
abdome, ecoendoscopia e laparoscopia.
O estadiamento do c…ncer g†strico ‚ feito pelo sistema TNM (observe a figura ao lado), devendo-se avaliar
a progress•o da doen€a na parede g†strica, a progress•o linf†tica, a progress•o hematogƒnica e a sementeira
peritoneal.
 T1 – Invas•o da l…mina pr‡pria e submucosa
 T1a – l…mina pr‡pria
 T1b – submucosa
 T2 – Invas•o da camada muscular
 T3 – Invas•o da camada serosa

 N1 – 1 a 2 linfonodos comprometidos
 N2 – 3 a 6 linfonodos comprometidos
 N3a – 7 a 15 linfondos comprometidos
 N3b – mais de 16 linfonodos comprometidos

 M0 – sem met†stase
 M1 – com met†stase

CLASSIFICAÇÃO E ANATOMIA PATOLÓGICA


Do ponto de vista cirŠrgico, devemos estabelecer a classifica€•o dos tumores g†stricos em dois tipos: c…ncer
precoce e avan€ado, a depender do achado da eco-endoscopia. Al‚m desta, podemos lan€ar m•o de outras
modalidades classificat‡rias:
 Classificação eco-endoscópica:
o C…ncer precoce: tumor prim†rio de mucosa e submucosa, independente se h† linfonodos
comprometidos ou n•o. O c…ncer g†strico precoce ‚ subclassificado pelos crit‚rios do col‚gio japonƒs
2
(ver OBS ).
o C…ncer avan€ado: tumor que se localiza al‚m da submucosa. Se n•o dispomos de aparelhos de eco-
endoscopia, todo c…ncer g†strico ser† tratado como avan€ado.
 Classificação de Borrman: como j† vimos anteriormente:
o Borman I: aspecto polip‡ide.
o Borman II: aspecto erosivo ou ulcerado.
o Borman III: aspecto ulcerado e infiltrativo.
o Borman IV: aspecto infiltrante grosseiro, acometendo boa parte da parede do estŒmago.
 Classificação de Lauren: classifica€•o an†tomo-patol‡gica.
o Tipo 1 - difuso (50%). Padr•o indiferenciado, sendo necess†ria a realiza€•o de uma cirurgia maior, uma
vez que se localiza em v†rios locais do estŒmago.
o Tipo 2 - intestinal (40%). Padr•o mais diferenciado, apresentando melhor progn‡stico, acontecendo,
mais comumente, em pacientes ap‡s a 5— d‚cada de vida.
o Misto (10%).

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 Classificação de Broders: divide os tumores a partir do seu grau de diferencia€•o, em tumores diferenciados,
moderadamente diferenciados e indiferenciados.
2
OBS : A Japanese Gastric Cancer Association define o c…ncer
g†strico precoce (classifica€•o eco-endosc‡pica) como
carcinoma limitado ‹s camadas mucosa e submucosa,
independente da presen€a de met†stases linfonodais. Este
crit‚rio japonƒs ‚ o que determina a defini€•o cirŠrgica no
Brasil. Desta forma, temos o quadro ao lado:

Esta classifica€•o ‚ feita atrav‚s de crit‚rios eco-


endosc‡picos, e est† diretamente relacionada com a sobrevida
do paciente, de modo que, quanto maior for o grau, pior o
progn‡stico (o tumor tipo 0 III, por exemplo, apresenta uma
sobrevida de 10% em 5 anos).

ESTAÇÕES LINFÁTICAS REGIONAIS DO CÂNCER GÁSTRICO


1 Linfonodos c†rdicos direitos 15 Vasos c‡licos m‚dios
2 C†rdicos esquerdos 16 Perar‡rticos
3 Pequena curvatura 16a1 Hiato a‡rtico
4 Grande curvatura 16a2 Tronco cel„aco ‹ veia renal esquerda
4sa Vasos curtos 16b1 Veia renal esquerda ‹ art‚ria mesent‚rica inferior
4sb Vasos gastroepipl‡icos esquerdos 16b2 Veia mesent‚rica inferior ‹ bifurca€•o a‡rtica
4d Vasos gastroepipl‡icos diretos 17 Anterior ‹ cabe€a do p…ncreas
5 Supra-pil‡ricos 18 Margem inferior da cabe€a do p…ncreas
6 Infra-pil‡ricos 19 Infra-diafragm†ticos
7 Art‚ria g†strica esquerda 20 Hiato esof†gico do diafragma
8 Art‚ria hep†tica comum 105 Paraesof†gicos no t‡rax superior
8a Grupo …ntero-superior 106 Traqu‚ia (no t‡rax)
8b Grupo posterior 107 Bifurca€•o da traqu‚ia
9 Tronco cel„aco 108 Paraesof†gico do estŒmago m‚dio
10 Hilo esplƒnico 109 Hilo pulmonar
11 Art‚ria esplƒnica 110 Paraesof†gico do t‡rax inferior
12 Ligamento hepato-duodenal 111 Supra-diafragm†ticos
13 Superf„cie posterior da cabe€a do p…ncreas 112 Mediastinais posteriores
14 Raiz do mesent‚rio
14a Art‚ria mesent‚rica superior
14v Veia mesent‚rica superior

Em resumo, temos que os linfonodos 1 – 6 s•o aqueles pr‡ximos ao estŒmago; os linfonodos 7 – 14 s•o
linfonodos ao redor ou pr‡ximo ao p…ncreas. A retirada dos linfonodos at‚ a cadeia 6 corresponde a uma
linfadenectomia a D1, enquanto que a retirada dos linfonodos at‚ 14 corresponde a uma linfadenectomia à D2.

TRATAMENTO
O tratamento do c…ncer g†strico consiste na cirurgia curativa, que ‚ designada como a letra “R”. A retirada dos
linfonodos, como sabemos, ‚ designada como letra “D”. Desta forma, temos:
 Presença de doença residual:  Linfadenectomia:
 R0: quando se opera o paciente e n•o o N•o-radicais:
observa mais nenhum resqu„cio do tumor  D0: remo€•o incompleta N1 (linfonodos
(sem doen€a residual). pr‡ximos ao estŒmago)
 R1: quando se opera o paciente e observa  D1: remo€•o completa N1
margem comprometida, com doen€a residual
microsc‡pica. o Radicais:
 R2: quando se opera o paciente e ainda  D2: remo€•o completa N1 e N2
sobra boa parte do tumor. Este tem pior  D3: remo€•o completa N1, N2 e N3
progn‡stico e geralmente s‡ ‚ feita de forma
paliativa quando o paciente est† em urgƒncia.

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Arlindo Ugulino Netto – CIRURGIA ABDOMINAL– MEDICINA P7 – 2010.2

Ressec€•o cir‚rgica com finalidade curativa.


Para realizar a cirurgia curativa, devemos obedecer aos seguintes aspectos:
 Exérese do tumor com margens cirúrgicas livres
 Linfadenectomia
 Remoção dos omentos
 Ressecção de estruturas e órgãos envolvidos

3
OBS : Com relação as vias de disseminação tumoral e o tipo de tratamento a ser sugerido, temos:
 Disseminação linfática (para os linfonodos), por continuidade (do estômago para o duodeno ou para o esôfago) e
por contiguidade (do estômago para o pâncreas) podem ser resolvidas através da cirurgia.
 Disseminação hematogênica deve ser tratada através da quimioterapia, neoadjuvante ou adjuvante.
 Na ocasião de uma disseminação transperitoneal (carcinomatose peritoneal), devemos optar por uma
peritoniectomia e quimioterapia (em altas temperaturas). Esta opção terapêutica foi realizada, por exemplo, no
atual Vice-Presidente da República José Alencar.
4
OBS : Vale salientar que os tumores de estômago podem se disseminar por continuidade (disseminação horizontal),
passando através dos canais linfáticos intramurais. O piloro e a cárdia não impedem a disseminação horizontal.

Extens•o da ressec€•o do estƒmago.


Para determinar o quanto de estômago deverá ser ressecado, devemos realizar uma definição pré-operatória no
que diz respeito às características do tumor, tais como: localização, profundidade, tamanho, multicentricidade,
classificação histológica (de Lauren), classificação macroscópica (classificação de Borrman).
Antes da cirurgia, devemos realizar ainda o estadiamento pré-operatório, lançando mão da endoscopia digestiva
alta com biópsia, exame contrastado do esôfago, estômago e duodeno (REED), endossonografia, US abdominal, TC
helicoidal (tórax e abdome), entre outros (laparoscopia, RM, etc.).
No intra-operatório, devemos reavaliar a extensão da ressecção gástrica, avaliando as seguintes características:
 “Checklist” do cirurgião
 Abertura e exame da peça cirúrgica
 Biópsia perioperatória das bordas de ressecção cirúrgica
 Exame histológico das margens (peça)

Tratamento cir‚rgico.
O tratamento cirúrgico do câncer gástrico depende de alguns aspectos. Dentre eles, temos a localização e as
características do tumor.
 Tumor proximal (35 – 50%): o tumor proximal consiste naqueles localizados no fundo gástrico e no corpo alto.
Para eles, devemos optar pela gastrectomia total (seguida de anastomose esofagojejunal) ou, como segunda
opção, realizar uma gastrectomia proximal subtotal. Contudo, esta segunda opção, frequentemente, causa
esofagites pós-operatórias, carcinomas multicêntricos e antro sem vantagem funcional.
 O procedimento de escolha para o tratamento cirúrgico do carcinoma g…strico avan€ado do ter€o
proximal (fundo) é a gastrectomia total; contudo, considera-se este procedimento como o de maior
radicalidade oncológica.
 Algumas vezes, a ressecção combinada do diafragma periesofágico é necessária (20% de
acometimento).
 No tumor do terço proximal ocorre acometimento de esôfago (1,5 a 3,0 cm) em 50% dos casos, sendo
necessária a retirada de parte deste órgão (de pelo menos de 3 a 6cm). Quando há invasão de luz do
esôfago (chamados tumores de c•rdia), facilmente diagnosticados com a EED, devemos realizar, além
da gastrectomia, a esofagectomia. Portanto, na presença de tumores cárdicos ou subcárdicos, devemos
optar pela ressecção esofágica (>6cm), especialmente para o tipo difuso, com estadiamento de até T3
(seroso) + gastrectomia total ou optar por uma esofagectomia subtotal.

 Carcinoma do ter€o m†dio: devemos escolher entre as duas opções:


 Gastrectomia total para carcinomas avançados, localizados na curvatura menor, extensos (>4cm) ou
difusos. Esta opção é a mais atualizada no que diz respeito ao tratamento de carcinomas do terço
médio, independente de outras características.
 Gastrectomia quase total: consiste na retirada de boa parte do estômago, mas deixando um coto
remanescente que fará anastomose com o jejuno, o que é mais seguro do que a anastomose
esofagojejunal. Pode ser utilizado para carcinomas intestinais (tipo 2 de Lauren) localizados na curvatura
maior ou menos extensos.

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Arlindo Ugulino Netto – CIRURGIA ABDOMINAL– MEDICINA P7 – 2010.2

 Tumor distal (35%): de um modo geral, opta-se pela gastrectomia subtotal (deixando parte do corpo alto e o
fundo g†strico), em que se retira cerca de 3/4 do ‡rg•o, com margens de 5 – 6 cm de seguran€a. Podemos
realizar a reconstruۥo em Y de Roux, que consiste em uma gastrojeunostomia e uma enteroenterostomia, em
que o estomago ‚ ligado a por€•o distal do doudeno e este ‚ mantido para continuar recebendo as secre€‰es
pancre†ticas e biliares. Devemos considerar ainda os seguintes passos:
 Ressec€•o de 3/4 a 4/5 do estŒmago, com margem proximal m„nima de 6 cm e retirada de toda
curvatura menor.
 Ressec€•o de mais de 4cm de duodeno em monobloco para evitar a invas•o duodenal (que ocorre em
25 a 46% dos casos).
Devemos saber considerar ainda alguns pacientes que, mesmo apresentando tumor em coto distal, devem ser
submetidos a uma gastrectomia total. S•o eles:
 Pacientes com c…ncer g†strico de natureza multicƒntrica ou tipo 1 de Lauren;
 Frequƒncia de altera€‰es displ†sicas e atrofia grave na mucosa g†strica residual;
 Invas•o tumoral impercept„vel na margem cirŠrgica proximal;
 Met†stase linf†tica intramurais no coto g†strico das GSTD.
Portanto, para o padr•o difuso (tipo 1 de Lauren), mesmo sendo distal, devemos ampliar a margem cirŠrgica
proximal da GSTD para 8 – 10 cm ou realizar gastrectomia total logo de princ„pio.
5
OBS : As indica€‰es especiais nos tumores intestinais do ter€o distal para a realiza€•o de gastrectomia total s•o:
 Extensas †reas de metaplasia intestinal
 Displasias de alto grau
 Polipose adenomatosa
 Gastrite atr‡fica com anemia perniciosa

Linfadenectomia.
Associada ‹ gastrectomia, devemos retirar os linfonodos associados com a drenagem linf†tica g†strica, a
depender de alguns fatores. Kodama et al (1981) afirmou que a linfadenectomia radical aumentou a sobrevida de
pacientes em 5 anos: linfadenectomia radical em 39% e linfadenectomia regional (D1) em 18%.
O acometimento das cadeias linfonodais tende a seguir um padr•o de acordo com a localiza€•o topogr†fica
(ter€os) do tumor no estŒmago. Desta forma, os linfonodos N1 do fundo g†strico s•o diferentes do N1 do corpo e que,
por sua vez, s•o diferentes do N1 do antro, por exemplo.
Portanto, como vimos anteriormente, a linfadenectomia D1 consiste na retirada completa dos linfonodos N1
(sendo N o conjunto de linfonodos listados logo abaixo), enquanto que a linfadenectomia D2 consiste na retirada
completa dos linfonodos N1 e N2. E como acabamos de ver, os grupos linfonodais N1 e N2 variam de acordo com o
ter€o g†strico a ser ressecado. Desta forma, temos:
 Terço proximal: as cadeias linfonodais a serem ressecadas na linfadenectomia D2 em tumores do ter€o
proximal s•o:
o Cadeias N1: 1, 2, 3, 4sa e 4sb.
o Cadeias N2: 4d, 7, 8a, 9, 10, 11p e 11d.
 Terço médio: as cadeias linfonodais a serem ressecadas na linfadenectomia D2 em tumores do ter€o m‚dio
s•o:
o Cadeias N1: 1, 3, 4sb, 4d, 5 e 6
o Cadeias N2: 7, 8a, 9, 11p e 12a, 12p e 13+.
 Terço distal: as cadeias linfonodais a serem ressecadas na linfadenectomia D2 em tumores do ter€o distal s•o:
o Cadeias N1:
o Cadeias N2: 1, 7, 8a, 9, 11b, 12a e 14v, 12p e 13+.

A principal justificativa das linfadenectomias radicais ‚ a de que os m‚todos de avalia€•o (pr‚ e per-operat‡rios)
do acometimento linfonodal s•o falhos e somente este tipo de procedimento ‚ capaz de garantir a remo€•o dos
linfonodos acometidos. Portanto, na maioria das vezes, a linfadenectomia a D2 ser† a escolha.
No c…ncer g†strico, o acometimento metast†tico dos linfonodos regionais est† intimamente relacionado ao
progn‡stico, sendo considerado um dos principais fatores na determina€•o da sobrevida. Como a literatura mostra que a
linfadenectomia a D2 est† relacionada a uma maior sobrevida, esta sempre dever† ser tentada.
O nŠmero m‚dio de linfonodos dissecados ‚ de 15 na linfadenectomia a D1; 31,6 na linfadenectomia a D2; e
35,4 na linfadenectomia a D3.
Portanto, no que diz respeito ‹ extens•o da linfadenectomia, temos:
 D2 ser† o procedimento de escolha;
 Melhora da sobrevida (5 anos);
 Realiza€•o rotineira de D3 n•o ‚ ben‚fica;
 D3 apresenta maior morbimortalidade que D2 (e ser† utilizada apenas em casos selecionados)

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Arlindo Ugulino Netto – CIRURGIA ABDOMINAL– MEDICINA P7 – 2010.2

Em termos gerais, para saber a quantidade correta e quais linfonodos devem ser retirados (extens•o da
linfadenectomia), devemos considerar a extens•o do tumor, o grau histol‡gico (diferenciado ou indiferenciado) e o
tamanho do tumor. Quando n•o se tem dispon„vel a eco-endoscopia, devemos considerar todos os tumores g†stricos
como avan€ados, realizando sempre a linfadenectomia a D2. Contudo, podemos optar pela linfadenectomia a D1
quando conseguimos avaliar a histologia e a penetra€•o do tumor. Portanto, em caso de dŠvida, sempre devemos
realizar linfadenectomia a D2.
6
OBS : O mais importante fator progn‡stico no c…ncer g†strico precoce parece ser a presen€a ou ausƒncia de
met†stases linfonodais. Os crit‚rios para ressec€•o local sem a necessidade de linfadenectomia s•o:
 Les‰es elevadas bem diferenciadas com menos de 3,0 cm.
 Les‰es deprimidas, com menos de 1,0 cm, bem diferenciadas e n•o-ulceradas.
7
OBS : A ultra-sonografia endosc‡pica possibilita as seguintes vantagens:
 Avalia€•o da profundidade da invas•o na parede g†strica (est†dio pT);
 Boa visualiza€•o dos linfonodos perig†stricos.

Cirurgia intra-luminal endoscópica.


A cirurgia endosc‡pica intra-luminal consiste no tratamento local do c…ncer g†strico, de car†ter curativo, mas
minimamente invasivo. Podemos optar por esta escolha diante dos seguintes dados:
 Quando o risco de met†stase linfonodal for m„nima;
 Capacidade de remo€•o do tumor em bloco;
 C…ncer g†strico bem diferenciado (EMR);
 Menor do que 1 cm – tipo IIb e IIc sem Šlcera ou cicatriz;
 Menor do que 2 cm – tipo IIa (mucosa);
 Grandes les‰es, sem met†stase linfonodal – t‚cnica de dissec€•o endosc‡pica da submucosa (ESD).

Linhas gerais de tratamento.


No que diz respeito ‹ ressec€•o, temos as seguintes linhas gerais:
 Tumor no ter€o proximal: gastrectomia total (escolha) desde que n•o tenha crit‚rios de ressec€•o local ou
gastrectomia subtotal proximal.
 Tumores dos ter€os m‚dio e distal: opta-se pela gastrectomia subtotal distal, com margem cirŠrgica proximal de
2 cm. Devemos optar pela gastrectomia total nas seguintes condi€‰es:
 Portadores de muta€‰es CDH1 – gene E caderina
 Hist‡ria familiar de c…ncer g†strico
 C…ncer precoce multicƒntrico (tipo 1 de Lauren)
 C…ncer precoce de remanescente g†strico sem indica€•o de ressec€•o local.

Portanto, o procedimento padr•o tem sido associar a gastrectomia + linfadenectomia a D2. Contudo, para
informa€‰es gerais, o quadro abaixo traz os crit‚rios para realiza€•o das demais linfadenectomias.
Critérios para realização da Critérios para realização da Critérios para realização da
linfadenectomia a D1 linfadenectomia a D2 linfadenectomia a D3
 Tumores mucosos (sem  Tumores submucosos (T1b)  Dissec€•o seletiva
crit‚rios para ressec€•o  Tumores com met†stases N1+  Suspeita pr‚ ou
total)  Tumores mucosos indiferenciados, transoperat‡ria de
 Pacientes idosos (acima de ≥ 2cm, em pacientes com estado envolvimento de N3
80 anos) geral preservado  Tumores proximais
 Condi€‰es cl„nicas  Casos sem indica€•o para  Presen€a de algum
prec†rias (co-morbidades) ressec€•o local linfonodo N3 positivo
 Hipertens•o portal  Tumores sem diagn‡stico eco-
endosc‡pico

8
OBS : A express•o “linfonodo sentinela” ‚ o conceito anatŒmico que foi definido para o primeiro linfonodo a receber a
drenagem da linfa de um determinado ‡rg•o. Com isso, em casos de met†stase, trata-se do primeiro linfonodo a receber
a linfa do ‡rg•o que vai apresentar uma determinada neoplasia. Contudo, pode haver algumas exce€‰es, como no caso
do g…nglio de Virchow, que ‚ um linfonodo sentinela para carcinomas esof†gicos ou g†stricos invasores de esŒfago.
Este g…nglio localiza-se na fossa supra-clavicular esquerda (quando aumentado, temos o sinal de Troisier) e, portanto,
n•o faz parte da cadeia ganglionar do estomago ou do esŒfago. As caracter„sticas do teste do linfonodo sentinela s•o:
 Acur†cia de 98% para carcinomas g†stricos precoces
 Falsos negativos (micromet†stases) e met†stases salteadas em 5,3% a 14%
 Assunto em evolu€•o (m‚todo promissor)
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Arlindo Ugulino Netto – CIRURGIA ABDOMINAL– MEDICINA P7 – 2010.2

A linite plástica do estômago deve ser tratada atrav‚s de uma gastrectomia total + ressec€•o do esŒfago
terminal (2 a 4 cm) e de 3 – 4 cm do duodeno.O ideal ‚ a realiza€•o de bi‡psias transoperat‡rias das margens cirŠrgicas
(falsos negativos em 9 a 21%).
De um modo geral, o Consenso do Col‚gio Brasileiro de Cirurgi‰es (2001) defende as seguintes bases para o
tratamento do c…ncer g†strico:
 Linfadenectomia a D2 ‚ o m‚todo de escolha
 Idade n•o ‚ fator limitante (devendo preferir apenas a linfadenectomia a D1 para idosos acima de 80 anos)
 Nas opera€‰es com finalidade curativa (rotineira), devemos retirar pelo menos 30 linfonodos;
 Amplia€•o de D2 para D3 em casos selecionados;
 Independente da suspeita de envolvimento linfonodal, devemos retirar os linfonodos.

Opções de terapia adjuvante.


Os tratamentos adjuvantes ainda s•o discutidos na literatura, embora alguns trabalhos tragam resultados
promissores. Os tratamentos dispostos s•o:
 Quimioterapia
 Radioterapia
 Quimiorradioterapia
 Radioterapia intra-operat‡ria

No nosso meio, utiliza-se quimiorradioterapia adjuvante (depois da cirurgia), mas que ainda n•o traz bom
resultados. A melhor op€•o ainda ‚ a cirurgia.

Tratamento paliativo.
Geralmente ‚ utilizado para tumores em estadio IV da seguinte maneira:
 Tratamento cirŠrgico:
 Palia€•o dos sintomas (sangramento, obstru€•o e perfura€•o)
 Melhora da qualidade de vida
 N•o objetiva aumento da sobrevida
 Abla€•o endosc‡pica: laser, argŒnio, stens.

TUMOR NEUROEND†CRINO (TNE)


Anteriormente denominado de tumor carcinoide, ‚ uma neoplasia de origem neuroectod‚rmica ou de c‚lulas
pluripotentes, caracterizadas pela presen€a de gr…nulos neurosecretores. Com isso s•o tumores que tem a capacidade
de secretar determinados hormŒnios.
Esses tumores podem se apresentar com uma ampla variedade, podendo ser um tumor diferenciado, com pouco
potencial invasivo, ou ainda tumores de pequenas c‚lulas, como ocorre nos pulm‰es, sendo tumores extremamente
agressivos.
Os tumores neuroend‡crinos se caracterizam por se originarem em c‚lulas nervosas, c‚lulas do sistema
end‡crino difuso e gl…ndulas. A muta€•o dessas c‚lulas leva a uma sinaliza€•o intracelular inadequada que leva a uma
prolifera€•o aumentada, aumento da sobrevida e transforma€•o. Essas altera€‰es levam a um potencial secretor
aumentado, secre€•o de pept„deos hormonais e neurotransmissores que s•o respons†veis pelo aparecimento dos sinais
e sintomas desses pacientes.

CLASSIFICAÇÃO
Os tumores neuroend‡crinos podem ser classificados com (1) funcionais, quando possuem um potencial
secretor (hormŒnios ou neurotransmissores), ou (2) não funcionais, que n•o secretam nenhuma subst…ncia ou quando
secretam compostos que n•o levam a altera€‰es expressivas.
Os tumores neuroend‡crinos do TGI s•o podem ser divididos em alto, m‚dio e baixo. Os tumores altos, ou seja,
que acometem o estŒmago, duodeno, p…ncreas (pode aparecer tumores funcionais) e ves„cula biliar s•o n•o funcionais,
diferentemente dos tumores m‚dios e baixos, que se mostram funcionais.
Eles ainda podem ser classificados de acordo com o grau de diferenciaۥo:
 Tumor Endócrino bem diferenciado: s•o carcinoides t„picos ou at„picos. Dentre os tumores neuroend‡crino
s•o os que possuem o melhor progn‡stico.
 Carcinoma Neuroendócrino bem diferenciado: progn‡stico moderado.
 Carcinoma neuroendócrino pouco diferenciado: pequenas ou grandes c‚lulas. Pior progn‡stico.

O que determina se um tumor neuroend‡crino ‚ de alto ou baixo grau s•o as seguintes condi€‰es:
 Estrutura: s‡lido, trabecular, glandular acinar, misto
 Marcadores (receptores): cromogranina A.
 Prognóstico: quando maior que 2 cm tem um pior progn‡stico, invas•o vascular e perineural, e ainda, ploidia.

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Arlindo Ugulino Netto – CIRURGIA ABDOMINAL– MEDICINA P7 – 2010.2

9
OBS : Os tumores neuroendócrinos múltiplos podem ser associados aos tumores neuroendócrinos gástricos. A mutação
do gene MEN1 pode levar a associação de tumores neuroendócrinos com tumores de paratireóide, glândula pituitária,
foregut (tumor da ilhota pancreática). Além disso, ainda pode estar presente na síndrome de Von Hipple Lindau em que
há associação do carcinoma renal, SNC hemangioblastoma, feocromocitoma e tumor da ilhota pancreática.

EVOLUÇÃO
Os tumores neuroendócrinos se originam de células neuroendócrinas normais, através do processo de mutação,
transformando-as em células hiperplásicas, com potencial secretor aumentado. Com isso, essas células, se tornam
displásicas, considerando-se como lesão tumoral. A partir desse ponto evolui para tumor bem, moderado e pouco
diferenciado, até enviar metástase.

DIAGNÓSTICO
O diagnóstico dos TNE é feito avaliando os seguintes critérios:
 Histologia: caracterizando quando ao grau de diferenciação
 Localização: local ou distante
 Invasão vascular ou perineural: presente ou ausente
 Tamanho: maior ou menor que 2 cm
 Ki67: marcador tumoral que, se estiver superior a 2%, sugere pior prognóstico
 Secreção de peptídeo: funcional ou não funcional, sendo o funcional de pior prognóstico.
 Metástase presente: fígado, ossos
 Síndrome carcinóides: liberação de serotonina aumentada que leva ao aparecimento clínico de rubor, diarréia,
broncoespasmo, taquicardia e ICC esquerda. Ocorre principalmente nos pacientes que apresentam tumores
hepáticos. É um fator de pior prognóstico, pois se manifesta em pacientes com doença avançada, em já houve
instalação da metástase.
 MEN1;
 Cromogranina A (CAG-A): quando positivo, há cerca de 80% de chances do paciente apresentar um tumor
neuroendócrino. Não está relacionada com a funcionalidade do tumor, entretanto tumores funcionais têm valores
desse marcador mais elevado.
 5-Hidroxi-indolacético (5-HIAA): avalia a presença de síndrome carcinóide quando está aumentado. Pouco
comum em tumores do intestino proximal, já que esses em sua grande maioria são não funcionais.

Paciente com tumor neuroendócrino deve-se realizar o exame histológico, para caracterização do grau do tumor.
Caso o paciente apresente repercussões clínicas que indiquem liberação hormonal, pode-se suspeitar do tipo de
hormônio que está sendo secretado em excesso (gastrinoma, insulinoma, somastotatinoma, glucagoma etc). Para essa
avaliação pode ser solicitado a dosagem do CgA, 5-HIAA e peptídeos. Além disso, nesses pacientes é pertinente a
investigação de metástase, para isso solicita-se USG abdominal, TC de tórax e abdome, RNM e cintilografia na pesquisa
de metástase óssea. Caso haja metástase pode-se realizar uma investigação mais criteriosa, realizando uma
cintilografia com Octreoscan. Caso haja captação (60 a 70%) desse composto significa dizer que o tumor possui
receptores para a somatostatina, sendo assim funcional.

TRATAMENTO
Tumores bem diferenciados.
Quando se apresentam operáveis e ressecáveis, realiza-se a ressecção tumoral, com ou sem linfadenectomia.
Entretanto caso o paciente apresente um tumor carcinóide associado à CAG-A menor que 1 cm, devido as lesões serem
muito pequenas, a ressecção pode ser feita por via endoscópica. Nos pacientes que apresentam uma neoplasia
avançada, há chances de ocorrer metástase para o fígado, e com isso desenvolver síndrome carcinóide. Para evitar o
aparecimento da síndrome, pode ser feito drogas análogas da somastotatina, ou ainda, realizar a embolização de áreas
hepáticas, especialmente nas regiões com focos tumorais. Além desses dois procedimentos deve-se realizar a
colecistectomia, devido ao risco do paciente desenvolver colelitíase.
Nos tumores bem diferenciados que se apresentam com metástase, quando ressecáveis, deve-se retirar a lesão
tumoral primária e as metástases.
Nos tumores que são irressecáveis (invasão de estruturas adjacentes, vasos etc) assintomáticos, deve-se
realizar exames de imagem e fazer o acompanhamento desses pacientes a cada 8 semanas. Uma das alternativas
nesse caso pode ser a administração de Octreotida (análogo da somatostatina) 30mg IM, na tentativa de diminuir a taxa
de progressão tumoral. Entretanto um tratamento proposto mais utilizado parta tumores neuroendócrino médio e baixo,
por isso, não sendo tão eficaz nos tumores altos e não funcionais.
Nos tumores bem diferenciados irressecáveis sintomáticos, pode-se indicar a administração de análogos da
somatostatina (Octreotida). Caso o tumor esteja invadindo o fígado pode ser feito a embolização em QT (através da
artéria hepática), redução cirúrgica da massa tumoral, mesmo quando há metástase.
Na doença predominantemente extra-hepática podem-se administrar análogos da somatostatina, Interferon alfa,
Bevacizumabe, Everolimo, Sunitinibe e Sorafenibe.

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Arlindo Ugulino Netto – CIRURGIA ABDOMINAL– MEDICINA P7 – 2010.2

Tumores pouco diferenciados.


Geralmente esses pacientes se apresentam com doença avançada. Entretanto quando a doença está localizada
pode ser realizada a ressecção e quimioterapia adjuvante. A utilização da radioterapia está limitada.

TUMOR ESTROMAL G ASTROINTESTINAL (GIST)


Anteriormente denominados como leiomiossarcoma, entretanto com o avanço da imuno-histoquímica, mostrou
que esses tumores apresentavam como marcador o C-KIT. Com isso, foi comprovado que se tratava de um tumor de
origem muscular, entretanto que não se comportava como um leiomiossarcoma clássico.
Sua localização mais comum é no estômago, contudo pode ainda acometer o intestino delgado (20-30%),
mesentério, omento, retroperitônio, esôfago, corresponde a 10% dos GIST.
Cerca de 30% dos GIST são malignos. É diferenciado com leiomioma, pois este se origina basicamente da
musculatura lisa, tem uma maior predominância no esôfago, possuindo como marcador o actina positiva e C-KIT
negativa, e na maioria das vezes tem uma evolução benigna.
Assim o GIST é conceituado como tumor que apresenta a proteína C-KI ou CD117. São tumores que se
originam de celulas intersticiais (indiferenciadas), que estão localizadas na camada muscular do estômago (CAJAL), ou
seja, são tumores estromais do tubo digestivo, de origem não epitelial (sendo subepitelial), com proliferação imatura das
células epitelióides ou fusiformes a partir da camada muscular da parede do TGI.
As células de CAJAL estão em maior concentração na grande curvatura, a aproximadamente 6 cm da transição
esôfago gástrica. Essas células são consideradas o marcapasso gástrico, pois determinam a contração peristáltica.
Assim as células de CAJAL criam uma onda lenta, que quando transmitidas para os miócitos, desencadeiam um
potencial de ação e com isso ocorrendo a peristalse. Assim essas células não são celulas de fato da musculatura. As
células de CAJAL podem sofrer mutações em diversos exons (11, 9, 13, 17). De acordo com o tipo de mutação pode
haver mudança consideráveis no tratamento do paciente. Essa mutação gera uma alteração da tirosina quinase,
acelerando a divisão celular favorecendo ao crescimento do tumoral e manifestando o C-KIT positivo.

EPIDEMIOLOGIA
Corresponde de 1 a 3% dos tumores do TGI. Acomete igualmente todas as etnias, em ambos os sexos. Pode
estar associado com a neurofibromatose e a tríade de Carney. Geralmente acomete pacientes em idade superior a 50
6
anos, com uma incidência média de 10 a 20 casos para cada 10 habitantes por ano. Pode surgir de forma esporádica
ou ter uma forte influência familiar.

MARCADORES DO GIST
 C-KIT: está presente em todos os GIST. Entretanto mutações em determinados exons podem evoluir como
GIST e não apresentar C-Kit positivo, entretanto na prática clínica, considera-se C-KIT característicos dos GIST.
 H&E: determina coloração específica no exame da imunohistoquímica, indicando GIST.
10
OBS : por ser um tumor de origem subepitelial sua avaliação pode ser feita com USG endoscópico. Avaliando a
presença de abaulamentos localizados na parede do estômago, especialmente na curvatura maior. Além disso, por estar
localizado na parede pode ter um componente luminal e extra-luminal.

QUADRO CLÍNICO
Os sinais e sintomas dos pacientes com GIST só aparecem quando o mesmo se encontra grande. Pois não são
tumores que evoluem com secreção de hormônios, produzindo síndromes características. Assim os pacientes podem
apresentar massa abdominal palpável (50 a 70%), dor vaga e desconforto abdominal e sangramento do TGI. Pode
vir associada à anorexia, emagrecimento, náusea, obstrução intestinal e icterícia (devido a compressão das vias
biliares).
Para o estadiamento da lesão deve-se realizar exames complementares como: hemograma, raio X de tórax,
ECG, TC de abdome.

CLASSIFICAÇÃO HISTOPATOLÓGICA
Apesar dessa classificação, a mesma não interfere na história evolutiva do tumor.
 Fusiforme: correspondendo a 70% dos casos
 Epitelióide: 20%
 Misto: 10%

DIAGNÓSTICO
Atualmente não há consenso sobre a realização ou não da biópsia. Entretanto recomenda-se a realização de
biópsia cirúrgica excisional com margem. Caso a biópsia seja indicada a punção subepitelial é feita guiada por
endoscopia.

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CRITÉRIOS DE MALIGNIDADE E BENIGNIDADE


 Tamanho
o < 5 cm – benigno
o > 5 cm – maligno
 Celularidade
o Baixa
o Alta
 Pleomorfismo Nuclear
o Ausente / m„nimo
o Proeminente
 Necrose
o Ausente
o Presente
 Infiltração
o Ausente
o Invade estruturas adjacentes
 Metástase
o Ausente
o Presente
 Mutação C-KIT
o Ausente
o Frequentemente presente

Outra forma de avaliar a malignidade do GIST ‚ o grau do tumor, dado de acordo com o tamanho e „ndice de
mitoses no campo avaliado. Assim temos:
 Baixo Grau: s•o mais comuns, com menor „ndice de ‡bito.
 Intermediário Grau:
 Elevado Grau: menos comum, entretanto com maior mortalidade
 Indiferenciado: tumores agressivos com elevado grau de mortalidade
11
OBS : De uma forma geral, todos os GIST devem ser considerados malignos na ocasi•o do diagn‡stico. Iniciando
assim uma investiga€•o cl„nica mais agressiva e eficaz. O exame PET-CT est† indicado para os casos localmente
avan€ados, ou ainda, tumores irressec†veis ou recidiva. Em cerca de 10 a 30% dos casos h† met†stase ‹ dist…ncia ou
doen€a irressec†vel; nessas situa€‰es, o tratamento ‚ feito clinicamente com Imatinibe como droga de primeira escolha,
caso o paciente adquira resistƒncia, usa-se o Sunitinibe ou Sorafenibe.

TRATAMENTO
Nos GIST deve-se evitar a ressec€•o endosc‡pica, pois por ser um tumor localizado na submucosa, h† maiores
riscos de complica€‰es, cuja principal ‚ a perfura€•o. O procedimento padr•o para o tratamento desses tumores ‚ a
realiza€•o de ressec€•o com margem sem linfadenectomia. Assim os principais tempos cirŠrgicos est•o descritos
abaixo:
I. Ressec€•o completa da massa tumoral e de sua pseudo-c†psula, incluindo se necess†rio, ‡rg•os adjacentes
com invas•o da neopl†sica.
II. Margens de ressec€•o devem estar livres de neoplasia e por esse motivo, pode at‚ haver necessidade de
retirada de todo o ‡rg•o.
III. N•o parece haver benef„cio com margem extensa de ressec€•o livre de neoplasia
IV. Evitar violar a integridade tumoral durante a ressec€•o. Sua ruptura est† relacionada ao sangramento,
dissemina€•o peritoneal e a pior progn‡stico.
V. Evitar contamina€•o (celulas tumorais) no intra-operat‡rio, pela simples manipula€•o. ˆ aconselhado, prote€•o
da neoplasia, a fim de se evitar disseminaۥo.
VI. Linfadenectomia n•o ‚ necess†ria, pois o comprometimento linfonodal ‚ raro.
VII. Les‰es mesmo que de pequeno volume devem ser ressecadas, pois, sempre existe potencial maligno. Existe
lugar definido para cirurgia v„deolaparosc‡pica em les‰es de menor volume
VIII. Existe lugar para ressec€•o combinada por laparotomia – endoscopia para GIST’s situados na pequena
curvatura, parede posterior, c†rdia e junto ao piloro.
12
OBS : A localiza€•o do tumor no estŒmago e melhor progn‡stico est† relacionada mais frequentemente ‹ muta€•o do
ˆxon 11 e nesses casos a evolu€•o ‚ mais favor†vel.
13
OBS : Em GIST’s com alto grau de malignidade o tratamento cirŠrgico isolado, em regra, n•o ‚ curativo.
14
OBS : Recorrƒncia neopl†sica ocorre em cerca de 50% dos doentes que s•o submetidos a opera€‰es classificadas
como curativas. Nos casos de recorrƒncia ou met†stase a sobrevida varia entre 6 a 18 meses.
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LINFOMA G ‰STRICO
O estŒmago constitui o local mais comum de linfoma extranodal, corresponde a mais da metade de todos os
tumores do TGI. Sua origem pode ser pr‡pria do estŒmago (prim†rio) ou metast†tico (secund†rio, sendo este a forma
mais comum). O diagn‡stico e tratamento do secund†rio s•o iguais ao sistƒmico.
N•o existe fatores carcinogƒnicos alimentares n•o predisp‰e ao aparecimento da doen€a, acidez g†strica ainda
‚ controverso, n•o tendo nenhum estudo comprovado.
Existe les•o pr‚-maligna denominada de pseudolinfoma, caracterizada pela hiperplasia do tecido linf‡ide do
estŒmago. Os linfomas g†stricos tƒm uma maior predile€•o por homens, tendo seu pico em torno dos 50 anos.
Sua localiza€•o mais comum ‚ na parede posterior e ao longo da pequena e grande curvatura do antro e corpo
g†strico. Sua dissemina€•o ‚ dada principalmente pela submucosa, podendo invadir o duodeno e esŒfago. Em sua
maioria s•o considerados grandes, variando em torno de 5 a 10 cm. Cerca de 20 a 25% dos pacientes portadores de
linfoma g†strico possuem mais de um foco, tendo assim a necessidade de investigar por meio de exames
complementares outros ‡rg•os.
Sua incidƒncia elevada de linfonodos, entretanto nem sempre s•o linfonodos metast†ticos. Sendo muito
frequentemente linfonodos reacionais.

FORMAS DE APRESENTAÇÃO
Na macroscopia podem-se utilizar os crit‚rios de Borrmann para sua classifica€•o, apesar de ser utilizado
somente para adenocarcinoma g†strico. Assim pode ser: (1) Borrmann 1 – polip‡ide, (2) Borrmann 2 – ulcerado, (3)
Borrmann 3 – infiltrativo, (4) Borrmann 4 – quando a les•o infiltra em toda a parede do estŒmago.
Apesar disso pode apresentar as seguintes formas:
 Nodular
 Polipóides
 Ulcerada
 Infiltrativo
 Combinado

Quando ao seu crescimento pode ocorrer em direۥo intraluminal (40%), extraluminal (20%)ou ainda, adotar um
crescimento infiltrativo intraluminal (40%).

QUADRO CLÍNICO
Os sintomas dos pacientes s•o semelhantes ‹s doen€as p‚pticas. Geralmente os pacientes se queixam de dor
tipo queima€•o retroesternal, com al„vio dos sintomas com terapia anti†cida, perda de peso progressiva, embora n•o
seja t•o acentuada como ocorre nos casos de adenocarcinoma g†strico, hematƒmese, perfura€•o e ainda sinais
inespec„ficos como ‚ o caso de desconforto cont„nuo, n†useas, vŒmitos, anorexia e fraqueza.

DIAGNÓSTICO
O exame an†tomo-patol‡gico ‚ utilizado para avaliar o grau da tumora€•o, podendo se apresentar de alto ou
baixo grau, podendo o tumor de baixo grau evoluir para alto grau e vice-versa.
A EDA com bi‡psias mŠltiplas ‚ quem define o diagn‡stico do linfoma g†strico, o exame padr•o ouro nesses
casos ‚ a ecoendoscopia. A pesquisa do H. pylori ‚ importante, pois, boa parte dos pacientes infectados est†
relacionada com linfoma g†strico. Quando presente deve associar o tratamento para linfoma e combate a bact‚ria.
Esses pacientes devem fazer todo o estadiamento semelhante ao estadiamento do adenocarcinoma com realizaۥo de
TC de t‡rax, abdome e pelve.
Nos casos de linfoma secund†rio, a investiga€•o deve ser conduzida com bi‡psia de medula, hemograma, DHL,
eletroforese de prote„na, beta 2 microglobulina, ur‚ia, creatinina e enzimas e sorologias.

ESTADIAMENTO CLÍNICO ANN-ARBOR MODIFICADO

 Estádio IE1: mucosa e submucosa


 Estádio IE2: muscular pr‡pria e subserosa
 Estádio IIE1: linfonodos perig†stricos
 Estádio IIE2: linfonodos regionais
 Estádio III: linfonodos dos dois lados do diafragma.
 Estádio IV: comprometimento visceral ou extranodal.

Somente 10% apresentam-se em est†gio III e IV. Os linfomas das c‚lulas B s•o linfomas de baixo grau tipo
MALT, em cerca de 40% dos casos. Os linfomas de alto grau correspondem a 50 a 70% dos casos e est•o associados
com baixo grau. A associa€•o com H. pylori, tem rela€•o com a ocorrƒncia de recidivas, ou seja, ap‡s o tratamento da
infec€•o, caso haja recidiva pode a haver tamb‚m a reinfec€•o pela H. pylori.

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Arlindo Ugulino Netto – CIRURGIA ABDOMINAL– MEDICINA P7 – 2010.2

Os linfomas MALT tƒm melhor progn‡stico que o linfoma de alto grau tipo difuso de grandes celulas do
estŒmago.
Anteriormente o tratamento de escolha era a cirurgia para todos os casos de linfoma, depois disso, era realizado
a quimioterapia. Atualmente a cirurgia s‡ est† indicada para os casos complicados com hemorragia, obstru€•o ou
sangramento. Os procedimentos cirŠrgicos adotados s•o semelhantes ao carcinoma, com realiza€•o de gastrectomia
total ou parcial dependendo da localiza€•o, associada ‹ linfadenectomia, bi‡psia hep†tica e associa€•o com
esplenectomia.

TRATAMENTO

Linfoma de Baixo Grau ou Linfoma Extranodal de C†lulas B da Zona Marginal (MALT).


 Est…dio IE: nesse estadiamento o tratamento consiste na erradica€•o do H. pylori, que reduz cerca de 85%
sendo necess†ria a realiza€•o de uma avalia€•o de 4 a 6 semanas, durante 18 semanas. O acompanhamento
desses pacientes ‚ feito com EDA a cada 4 semanas com realiza€•o de bi‡psia, avaliando as poss„veis
recidivas. Ap‡s o tratamento o paciente repete a EDA com bi‡psia a cada 4 meses por 2 anos. Caso n•o haja
resposta ao tratamento descrito acima, ou ainda recidiva pode ser feita a radioterapia.
 Est…dio IIE: radioterapia externa e erradicar H. pylori.
 Est…dios IE e IIE sem H. pylori: o tratamento de escolha ‚ a radioterapia, como segunda op€•o realiza-se a
cirurgia.
 Est…dio III ou IV com ou sem H. pylori ou recidiva p‡s-radioterapia: o tratamento ‚ feito com rituximabe
(quimioter†pico) durante 4 semanas 1 vez por semana, seguida por 1 vez a cada 8 semanas por 4 doses.

Linfoma difuso de grandes c†lulas do Estƒmago – linfoma de alto Grau.


 Est…dio IE e IIE: quimioterapia com 4 ciclos seguidos de R-CHOP – rituximabe, ciclofosfamida, doxorrubicina,
vincristina e prednisona. Esse tratamento deve ser seguido pela radioterapia. Tratar a H. pylori, pois relatos
mostraram regress•o do tumor. A cirurgia nesses pacientes esta indicada nos casos de sangramentos ativos,
obstruۥo ou ainda sinais de perfuraۥo. Se realizada a cirurgia associar com quimioterapia adjuvante.
 Est…dio IIIE e IV: quimioterapia 6 a 8 ciclos de CHOP associados por rituximabe.

LEIOMIOSSARCOMA
ˆ um tumor maligno da musculatura lisa g†strica, sendo o segundo sarcoma mais comum. Corresponde a 1%
dos tumores malignos g†stricos. Cerca de 20 a 40% tem um comportamento maligno. N•o tem predile€•o quanto ao
sexo, acometendo pacientes em torno da 5˜ ou 6˜ d‚cada de vida. ˆ um tumor de dif„cil caracteriza€•o maligna, sendo
muitas vezes visto como leiomioma, por isso, ambos devem ser considerados malignos na ocasi•o do diagn‡stico
cl„nico.
Acomete principalmente o ter€o m‚dio e superior do estŒmago, tem um crescimento extrag†strico em torno de
45% dos casos e intraluminal em 45%. Pode ter um comportamento infiltrativo em 10% dos casos. Apresenta um
crescimento lento e com ulcera€‰es.
Quanto ‹ dissemina€•o pode ocorrer por via hematogƒnica, principalmente para o f„gado, linfonodal (baixa) e
peritoneal (rara).
Nesses pacientes o sintoma mais expressivo ‚ o sangramento, e raramente pode evoluir com oclus•o intestinal.
Al‚m disso pode apresentar dor e pouca perda de peso.
O tratamento ‚ feito com ressec€•o local ou gastrectomia parcial, dependendo do tamanho. A quimioterapia ou
radioterapia como terapƒutica adjuvante s•o ineficazes, com isso o tratamento ‚ basicamente cirŠrgico.
A sobrevida em 5 anos est† em torno de 35 a 50% para os casos submetidos a ressec€•o radical.

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MED RESUMOS 2012


NETTO, Arlindo Ugulino.
CIRURGIA ABDOMINAL _________

TRATAMENTO CIRÚRGICO DA ÚLCERA PÉPTICA E SUAS COMPLICAÇÕES


(Professor Felipe Rocha)

No s‚culo passado, Theodor Billroth (1829 – 1894) foi o pioneiro na idealiza€•o do


tratamento cirŠrgico da Šlcera p‚ptica (UP). De fato, at‚ os dias atuais, a cirurgia para o
tratamento deste tipo de Šlcera ainda leva o nome de seu criador.
Por defini€•o, a Šlcera p‚ptica ‚ qualquer tipo de les•o ulcerosa que esteja
relacionada ‹ a€•o da pepsina, enzima produzida pelo trato gastrointestinal alto na forma de
pepsinogƒnio e que ‚ ativada pela a€•o do ácido clorídrico. Deste modo, a Šlcera p‚ptica
pode se desenvolver no esŒfago, no estŒmago (Šlcera g†strica) e no duodeno (Šlcera
duodenal).
O tratamento cirŠrgico ‚ um dos principais aliados no tratamento deste tipo de Šlcera,
principalmente quando ela imp‰e riscos de morte ao paciente. Contudo, ‚ importante salientar
que, atualmente, o nŠmero de interven€‰es cirŠrgicas para tratamento da Šlcera g†strica tem
diminu„do em todo mundo. O mesmo vale para a Šlcera duodenal.
Podemos associar esta mudan€a na realidade do tratamento cirŠrgico da Šlcera p‚ptica a pelo menos dois
fatores:
 O advento da cria€•o de drogas inibidoras de bomba de pr‡ton, que servem, de forma eficiente, para o
tratamento da Šlcera p‚ptica, o que fez mudar a realidade do panorama de evolu€•o das Šlceras;
 Diagn‡stico precoce e erradica€•o da Helicobacter pylori, que est† diretamente associada ‹ etiopatogenia da
doen€a ulcerosa p‚ptica.

C ONSIDERA•‚ES SOBRE A ‡LCERA P ˆPTICA G ASTRODUODENAL


A Šlcera p‚ptica gastroduodenal ‚ uma das causas mais frequentes de hemorragia digestiva alta, embora essa
complica€•o tenha diminu„do com a introdu€•o dos antagonistas dos receptores H2 e dos bloqueadores da bomba
protŒnica, a identifica€•o da H. pylori e as medidas terapƒuticas para a sua erradica€•o.
Entretanto, o risco de recorrƒncia da hemorragia secund†ria ‹ ulcera eleva sua taxa de mortalidade, exigindo
per„cia na orienta€•o terapƒutica.

CLASSIFICA•„O DE J OHNSON
Johnson estabeleceu uma classificaۥo que leva em consideraۥo dois fatores:
 Localiza€•o;
 Potencialidade de secre€•o †cido-p‚ptica pelo estŒmago: Šlcera normossecretora ou hiper-secretora.

Esta classifica€•o ‚ considerada como a mais importante para a Šlcera g†strica. Isto se faz, principalmente, pela
considera€•o ‹ secre€•o clor„drica pela Šlcera. Desta forma, devemos ter em conta que o estŒmago n•o ‚ apenas uma
dilata€•o sacular do tubo digest‡rio, mas um ‡rg•o de funcionamento complexo, que funciona sob o regime de um
marca-passo vagal, no que diz respeito ao controle de sua secreۥo e seu esvaziamento. Com isso, temos:
 Tipo I: Šlcera da pequena curvatura, pr‡xima a incisura angularis; baixa secre€•o †cida; 60% dos casos.
 Tipo II: Šlcera da pequena curvatura (na mesma localiza€•o da tipo I), associada ‹ Šlcera duodenal; hiper-
secretora de †cido.
 Tipo III: Šlcera pr‚-pil‡rica; hiper-secre€•o g†strica.
 Tipo IV: Šlcera g†strica alta em pequena curvatura (pr‡xima ao esŒfago: 1-2cm da jun€•o esŒfago-g†strica);
hiper-secretora de †cido.
 Tipo V: Šlceras mŠltiplas; associada a drogas ulcerogƒnicas como anti-inflamat‡rios. N•o est† associada ‹
fisiopatologia da doen€a ulcerosa p‚ptica, pois ‚ uma Šlcera aguda, secund†ria ao uso de medicamentos. Difere,
portanto, das demais.

Dentre todas essas Šlceras, a forma de apresenta€•o endosc‡pica mais comum da Šlcera g†strica ‚ a les•o
ulcerosa na pequena curvatura, proximalmente ao piloro (tipo I). Corresponde a cerca de 60% dos casos e apresenta
baixa secre€•o g†strica. Conclui-se, ent•o, que: a maioria das Šlceras classificadas por Johnson s•o normossecretoras.
Dentro desta classifica€•o, apenas as tipos II, III e IV s•o hiper-secretoras de †cido, mas n•o correspondem ‹
maioria das Šlceras g†stricas – ao contr†rio: correspondem ‹ minoria.

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INDICA•‚ES DE C IRURGIA PARA ‡ LCERA PˆPTICA


O tratamento cirúrgico da úlcera gástrica, geralmente, é individualizado, mas prontamente indicado quando sua
protelação represente risco de morte para o paciente. De um modo geral, as principais indicações são:
 Tratamento das complicações: hemorragia de difícil controle, perfuração, obstrução;
 Portadores de úlcera péptica com hemorragia maciça sem resposta às medidas terapêuticas iniciais;
 Pacientes com mais de 60 anos de idade, cardiopata ou pneumopata, que tenham ressangrado na mesma
internação;
 Outras indicações:
1
 Para úlceras gástricas com suspeita de neoplasia (ver OBS );
 Úlceras gigantes (acima de 4 cm);
 Pacientes de alto risco para complicações de úlcera péptica.

Atualmente, no que diz respeito à úlcera duodenal, o tratamento cirúrgico é necessário nos casos de
complicações da úlcera como hemorragia, perfuração e estenose, da mesma forma que na úlcera gástrica. Isso
acontece porque, do mesmo modo que ocorreu com a úlcera gástrica, a redução do tratamento cirúrgico para a úlcera
duodenal foi eminente graças a dois fatores: (1) efetividade de drogas antissecretoras potentes como inibidores de
3
bomba de próton; (2) erradicação do H. pylori e sua relação etiológica com a úlcera péptica duodenal (ver OBS ).

OBS1: Particularmente, a relação da úlcera gástrica com neoplasias é tão importante que, diante de um diagnóstico de úlcera gástrica,
sempre devemos realizar biópsia. Isto porque sempre devemos encarar a lesão ulcerosa gástrica como uma fator predisponente à
neoplasias e, diante da suspeita de lesões deste tipo, devemos submetê-la à biópsia. Por outro lado, a úlcera duodenal tem pouca ou
nenhuma relação com o câncer e, portanto, a biópsia desta lesão não se faz importante. Portanto, a úlcera duodenal pode e deve ser
tratada sem biópsia, diferentemente da úlcera gástrica.
OBS2: A úlcera gigante não é, por si só, uma indicação absoluta para o tratamento cirúrgico, mas deve ser associada a todo um
contexto clínico que acompanha o paciente. Contudo, as úlceras gigantes, até que se prove o contrário, são consideradas lesões
neoplásicas, e não uma lesão benigna.
OBS3: De todas as úlceras pépticas, a que guarda relação mais importante com a infecção pelo H. pylori é a úlcera duodenal, de
modo que, atualmente, não existem mais dúvidas: toda úlcera duodenal é H. pylori-positiva.

C OMPLICA•‚ES DA UP

HEMORRAGIA DIGESTIVA POR ÚLCERA PÉPTICA


Como falamos anteriormente, a úlcera péptica é causa importante de hemorragia digestiva alta (uma vez que o
esôfago, o estômago e o duodeno estão localizados acima do ângulo de Treitz), podendo se manifestar na forma de
hematêmese e melena, principalmente.
Do ponto de vista etiopatogênio, a HDA produzida pela úlcera gástrica e pela duodenal pode ser diferenciada da
seguinte maneira:
 Úlcera gástrica: erosão da artéria gástrica esquerda ou seus ramos, que correm ao longo da pequena curvatura
do estômago.
 Úlcera duodenal: erosão da artéria gastroduodenal ou seus ramos, que corre posteriormente ao duodeno.

Endoscopia digestiva mostrando sangramento ativo de úlcera pré-pilórica de


curvatura menor do estômago (tipo I de Johnson). Neste caso, é sempre prudente
realizar biópsia por dois motivos: primeiramente, por se tratar de uma úlcera
1
gástrica que, como vimos a propósito da OBS , sempre terá relação com a
neoplasia; em segundo lugar, o fato de a maioria dos cânceres gástricos se
localizarem na mesma posição da úlcera tipo I de Johnson. Contudo, as outras
classificações de Johnson podem caracterizar uma posição atípica da neoplasia
gástrica. Conclui-se que: toda úlcera gástrica deve ser biopsiada.

Abordagem inicial da hemorragia digestiva.


Diante de uma úlcera péptica ativa, com hemorragia digestiva importante, devemos realizar as seguintes
medidas iniciais:
 Reposição volêmica e avaliação clínica periódica (parâmetros hemodinâmicos, sondagem nasogástrica para
quantificar a perda sanguínea, dosagem de hemoglobina/hematócrito com finalidade de diagnosticar anemia
aguda, coagulograma para avaliar função hepática);
 Inibidor de bomba de próton, responsável por diminuir as chances de ressangramento;
 Octeotride (fármaco análogo da somatostatina, um inibidor potente das secreções digestivas).

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Tratamento endoscópico.
Depois que o paciente est† estabilizado do ponto de vista cl„nico, devemos proceder com a endoscopia. ˆ
errado utilizar a endoscopia como primeiro artif„cio para o tratamento da Šlcera. Este procedimento sempre deve ser
precedido de medidas gerais e tratamento cl„nico (Octeotridea e Inibidor de Bomba protŒnica, principalmente).
O tratamento endosc‡pico ‚ indicado nos casos preditivos de recorrƒncia do sangramento ou de mau
progn‡stico (sangramento ativo, vaso vis„vel e co†gulo aderido).
A hemostasia pode ser feita atrav‚s de fotocoagula€•o a laser, da termocoagula€•o (heater probe), da
eletrocoagula€•o (mono ou bipolar), da coloca€•o de clipes met†licos, da esclerose dos vasos, da alcooliza€•o, etc.
Os principais fatores relacionados ao insucesso terapƒutico que refor€am a necessidade do tratamento cirŠrgico
s•o:
 Vaso vis„vel na base da Šlcera;
 Sangramento ativo no momento do exame;
 “lceras >2,0 cm.

Principais indicações para o controle cirúrgico da Hemorragia digestiva.


Os principais fatores que predizem a necessidade do tratamento cirŠrgico da HDA est•o descritos logo abaixo.
Para a maioria das indica€‰es, a endoscopia ‚, inclusive, contra-indicada, sendo necess†ria a abordagem cirŠrgica
imediata, logo depois das medidas cl„nicas (principalmente quando o paciente se mostra em choque hipovolƒmico).
As principais indica€‰es s•o:
 HDA grave e de dif„cil controle com choque hipovolƒmico na admiss•o;
 Sangramento arterial ativo com vaso vis„vel ‹ endoscopia (neste caso, suspende a endoscopia – que est† sendo
realizada – para dar lugar ‹ terapia cirŠrgica);
 Necessidade de mais de 5 unidades (bolsas de sangue) para transfus•o;
 Falha de controle do sangramento ap‡s duas tentativas de hemostasia endosc‡pica;
 Ressangramento na mesma interna€•o: por si s‡, este crit‚rio n•o define a necessidade de cirurgia, mas serve
apenas como uma sugest•o para lan€ar m•o deste artif„cio. Contudo, a presen€a das seguintes situa€‰es de
risco, associadas a este ressangramento, ressaltam a necessidade da terapia cirŠrgica:
 Paciente > 60 anos;
 Portadores de doen€a cardiovascular;
 Usu†rios obrigat‡rios de anti-inflamat‡rio.

O Tratamento CirŠrgico da “lcera P‚ptica ‚ indicado em apenas 10% dos casos. Portanto, n•o ‚ frequente a
indica€•o deste tratamento para a conduta da Šlcera p‚ptica, uma vez que 1 a cada 10 pacientes necessitar•o do uso
deste par…metro. O tratamento cirŠrgico da HDA consiste nos seguintes par…metros:
 Ataque direto ao sangramento;
 Tratamento da doen€a ulcerosa, no intuito de tratar a causa do sangramento (este artif„cio s‡ poder† ser usado
diante de alguns crit‚rios que veremos mais adiante neste cap„tulo).

ÚLCERA PÉPTICA PERFURADA CRÔNICA


A fisiopatologia da Šlcera perfurada est† relacionada com uma necrose de todas as paredes do ‡rg•o envolvido
(ou o estŒmago, ou o duodeno), sendo decorrente da digest•o †cido-p‚ptica capaz de gerar uma solu€•o de
continuidade na v„scera.
Tal complica€•o ocorre em cerca de 10% das Šlceras p‚pticas (a mesma incidƒncia do sangramento decorrente
da Šlcera p‚ptica), sendo considerada um evento raro. Desta forma, as principais regi‰es que perfuram s•o:
 Parede anterior da primeira por€•o do duodeno;
 Pequena curvatura do antro g†strico.
4
OBS : Nota-se que a pequena curvatura do antro g†strico serve como s„tio de instala€•o do tipo mais comum das
Šlceras g†stricas (tipo I de Johnson), sendo tamb‚m a regi•o que mais sofre sangramentos e perfura€‰es. A Šlcera
duodenal, diferentemente, causa mais sangramentos quando localizada na parede posterior do ‡rg•o (por acometer a
art‚ria gastroduodenal), mas sofre perfura€‰es mais comumente em sua parede anterior.

No que diz respeito ‹ doen€a ulcerosa p‚ptica perfurada, devemos distinguir duas situa€‰es importantes: a
Šlcera p‚ptica perfurada sem bloqueio e bloqueada.
 Úlcera péptica em peritônio livre (UP sem bloqueio): tipo de Šlcera p‚ptica que gera um quadro de peritonite
difusa, que geralmente evolui para sepse e choque s‚ptico. Acontece quando o paciente tem uma perfura€•o
que permite a passagem de secreۥo digestiva para a cavidade peritoneal, causando, inicialmente, uma
peritonite qu„mica seguida de uma peritonite infecciosa (causando um quadro importante de abdome agudo
perfurativo), o que pode levar ao choque s‚ptico. Esta ‚ a forma mais comum da Šlcera p‚ptica perfurada.

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 Úlcera péptica bloqueada: situação em que um órgão vizinho à região da úlcera (ou por intermédio de outros
componentes, como um epiploon, fibrina, fibrose, etc) realiza o tamponamento da perfuração. Isto gera um
quadro clínico frustro, totalmente diferente daquele gerado pela UP sem bloqueio. Geralmente ela causa uma
simples dor abdominal, que pode muitas vezes passar despercebida.

Radiografia de tórax mostrando um pneumoperitônio (ar, na forma de


radiotransparência, logo abaixo das cúpulas diafragmáticas), achado
radiográfico patognomônico de úlcera perfurada. Uma vez presente este sinal,
quando associada a um quadro de abdome agudo, significa dizer que o
paciente apresenta uma úlcera péptica perfurada confirmada.
Contudo, se o pneumoperitônio estiver ausente, não exclui o diagnóstico, pois
podemos estar diante de um quadro de UP bloqueada. Para confirmar este
diagnóstico, podemos lançar mão da injeção de 20ml ar pela sonda naso-
gástrica, o que promove um desbloqueio da UP bloqueada, predispondo ao
aparecimento do pneumoperitônio.

Telerradiografia simples de tórax, demonstrando a presença de


pneumoperitônio extenso, com elevação do hemi-diafragma direito e distensão
gástrica.

Aparência cirúrgica de uma úlcera péptica perfurada no corpo do estômago,


circundada por uma área endurecida, fibrótica (calo fibroso), que só acontece
na úlcera perfurada crônica.

No que diz respeito à úlcera péptica perfurada crônica (diferentemente da úlcera aguda perfurada, como
5
veremos na OBS ) é necessário um tratamento cirúrgico definitivo, tanto para a perfuração como para a úlcera.
5
OBS : Existe uma entidade conhecida como úlcera aguda perfurada que pouco se assemelha à úlcera péptica
perfurada que acabamos de conhecer, do ponto de vista fisiopatológico. Trata-se de uma lesão que perfura de forma
aguda, que ocorre tanto no duodeno como no estômago, sem que haja um histórico prévio de úlcera ou a presença de
um calo fibroso no halo da perfuração. Sua etiologia está relacionada, principalmente, com situações de estresse e uso
de medicamentos, tais como:
 Uso de AINH;  Doença grave concomitante;
 Trauma;  Pós-operatório.
 Sepse;
Geralmente, acomete pacientes internados em UTI que estavam tratando outra doença e que, de forma aguda,
desenvolvem uma úlcera perfurada. A úlcera aguda perfurada, diferentemente da doença ulcerosa péptica perfurada
crônica, não necessidade de tratamento cirúrgico definitivo, sendo necessária apenas a realização de uma rafia (sutura)
primária da solução de continuidade.

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OBSTRUÇÃO PILÓRICA
A obstrução pilórica representa outra complicação da úlcera péptica, sendo caracterizada por uma obstrução da
passagem do conteúdo do estômago para o duodeno. A fisiopatologia desta obstrução se deve a presença de ciclos
repetidos de inflamação e cicatrização. Caracteriza-se por aquele paciente que apresenta úlcera há vários anos, mas
sem melhora definitiva, e que passa a se queixar de alguns sintomas de empachamento.
Além da fisiopatologia principal da obstrução pilórica, devemos levar em consideração que a obstrução deste
segmento gástrico pode ocorrer decorrente do edema inflamatório e do espasmo muscular. Este mecanismo ocorre,
principalmente, com aqueles pacientes que apresentam-se com úlcera pela primeira vez, sem que haja uma história
crônica por trás do quadro. O tratamento, como veremos, é diferente para os dois casos apresentados.
Portanto, podemos caracterizar o quadro clássico de obstrução da junção gastro-duodenal da seguinte maneira:
 Longa história de doença ulcerosa péptica;
 Falha do tratamento clínico;
 Vômitos pós-prandiais de conteúdo alimentar e quadro típico de síndrome pilórica (alcalose metabólica,
hipocloremia e hipocalemia).

O tratamento para a obstrução pilórica depende da diferenciação entre as duas situações que estão relacionadas
com a fisiopatologia do quadro:
 Obstrução inflamatória: edema e espasmo muscular;
 Obstrução fibrótica: fibrose com estenose da junção gastro-duodenal.

Para diferenciar as duas situações, devemos iniciar o tratamento com drenagem nasogástrica, inibidores de
bomba protônica e hidratação venosa. Se após 5 a 7 dias de aspiração gástrica não houver alívio da obstrução, significa
dizer que não havia edema de origem inflamatória, mas sim, uma obstrução fibrótica, de modo que a descompressão
não foi suficiente para tratar o quadro. Esta é, portanto, uma prova propedêutica para indicação de cirurgia.
Conclui-se que o tratamento clínico com drenagem nasogástrica e inibidor de bomba protônica resolve o quadro
de obstrução inflamatória. Já o quadro de obstrução fibrótica deve ser tratado através da cirurgia.

CIRURGIAS NA ‡ LCERA PˆPTICA


Antes de descrever a propedêutica cirúrgica utilizada
para o tratamento da úlcera péptica, devemos tomar
conhecimento da real importância da inervação vagal em
nível gástrico.
O nervo vago (X par de nervos cranianos), além de
exercer uma função sensitiva (aferente visceral geral) para o
estômago, ele exerce uma função eferente (eferente visceral
geral), que não só inerva as células parietais (que mediadas
pela acetilcolina, aumenta a produção do ácido clorídrico),
como também exerce uma função motora, que aumenta a
motilidade da região antro-pilórica, estabelecendo o bom
funcionamento da bomba antro-pilórica.
Esta bomba tem, por função, regular o esvaziamento
gástrico e, ao mesmo tempo, controlar o refluxo do duodeno
para o estômago. Esta função se faz, principalmente, graças
ao esfíncter piloro. O nervo vago é, portanto, responsável por
6
toda esta função (ver OBS ), sendo o mesmo nervo que é
sacrificado em determinados procedimentos cirúrgicos, o que
pode causar complicações importantes.
6
OBS : Um ramo do tronco vagal anterior (oriundo do N. vago direito) importante para a região antro-pilórica é o nervo
principal anterior do estômago, também chamado pelo epônimo de Nervo de Latarjet.

As principais cirurgias ácido-redutoras utilizadas para o tratamento da úlcera péptica estão citadas logo abaixo. A
opção entre uma ou outra leva em consideração alguns parâmetros clínicos (sobretudo a estabilidade hemodinâmica):
 Vagotomia troncular com antrectomia: secção do nervo vago em seu tronco associada a uma ressecção do
antro gástrico. Tal cirurgia compromete a motilidade gástrica e a bomba antro-pilórica. Consiste, portanto, em
uma cirurgia muito radical, mas de rápida realização.
 Vagotomia gástrica proximal ou de células parietais: secção do nervo vago na porção proximal do estômago,
que corresponde à população das células parietais secretoras de ácido. Neste cirurgia, não há ressecção da
bomba antro-pilórica, a qual continuará com sua funcionalidade preservada. Consiste no procedimento mais
fisiológico e menos radical.

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 Vagotomia troncular com procedimento de drenagem: nesta cirurgia, associamos a retirada do vago não a
uma gastrectomia, mas a um procedimento de drenagem no intuito de ajudar o estômago a esvaziar
adequadamente. Para isso, devemos realizar uma piloroplastia (a Heineke-Mickulickz) ou uma gastro-
jejunostomia (vincular o estômago direto ao intestino, o que é muitas vezes necessário). Em determinadas
situações, esta é a melhor conduta.

VAGOTOMIA TRONCULAR COM ANTRECTOMIA


Este procedimento é caracterizado pelos seguintes
passos:
 Secção dos troncos vagais;
 Ressecção do antro gástrico com reconstrução à
Billroth:
 Ressecção a Billroth I: anastomose do estômago
com duodeno.
 Ressecção a Billroth II: anastomose do estômago
com jejuno.

A cirurgia consiste na passagem e uma pinça Mixter


por baixo dos troncos vagais e na secção dos mesmos com o
bisturi elétrico. É uma cirurgia muito simples, rápida e eficiente
com relação à secreção cloridro-péptica, sendo ela ideal para
o tratamento da úlcera sangrante em pacientes com choque
hipovolêmico.
A taxa de recorrência da úlcera é pequena (cerca de 2-3%), sendo esta sua grande vantagem. Era, por isso,
uma cirurgia muito utilizada no passado, quando não se tinha subsídios clínicos adequados.
Contudo, devido à retirada dos vagos e do antro, tem uma maior incidência de complicações tardias (síndromes
pós-gastrectomias). É, portanto, uma cirurgia mais mórbida, sendo pouco utilizada atualmente diante dos artifícios
clínicos que se tem.

VAGOTOMIA GÁSTRICA PROXIMAL (VAGOTOMIA DE CÉLULAS PARIETAIS OU SUPER-SELETIVA)


A vagotomia gástrica proximal (VGP) consiste na denervação de todos os ramos vagais dos 2/3 proximais do
estômago. Há, neste caso, a preservação dos nervos principais de Latarjet, os quais continuam, de certa forma,
funcionantes. Por esta razão, e por preservar a bomba antro-pilórica, esta cirurgia garante um esvaziamento gástrico
relativamente normal.
Sua principal vantagem é, portanto, a relativa preservação da motilidade gástrica, além de estar relacionada com
uma menor frequência de síndromes pós-gastrectomias. Consiste no procedimento mais fisiológico e menos radical, pois
preserva uma maior funcionalidade do órgão. A única indicação desta cirurgia é a perfuração da úlcera duodenal
(quando não há comemorativos que contraindiquem sua realização ou evolução maior que 12 horas).
Contudo, é uma cirurgia mais trabalhosa, que demora cerca de 6 a 8 horas, sendo impossível de ser realizada
no paciente com sangramento importante e choque hipovolêmico (para estes, opta-se por uma cirurgia mais rápida,
como é a vagotomia troncular). Além disso, a recorrência da úlcera é mais frequente (cerca de 10%).

VAGOTOMIA TRONCULAR COM PROCEDIMENTO DE DRENAGEM (PILOROPLASTIA)


Procedimento baseado na ressecção dos troncos vagais (o
que garante um retardo do esvaziamento gástrico) associada a uma
piloroplastia ou gastro-jejunostomia (para compensar o efeito da
vagotomia sobre a motilidade gástrica).
Neste procedimento, portanto, realizamos:
 Secção dos troncos vagais.
 Procedimento de drenagem: secção do piloro em sentido
horizontal com sutura transversal (piloroplastia a Heineke-
Mickulickz). Como podemos observar na figura ao lado, consiste
na diérese em um sentido e na rafia em outro.

Os dois procedimentos somados não levam mais do que 20


minutos, o que é importante, pois pouco soma, em morbidade, ao
paciente. É por isso que esta cirurgia é indicada para o tratamento
da úlcera péptica com sangramento ativo (é contra-indicada apenas
nos casos de pacientes que se apresentam com choque
hipovolêmico, para os quais devemos adotar a vagotomia troncular
com antrectomia).
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Portanto, este procedimento consiste em uma opção tecnicamente simples, ideal para pacientes com hemorragia
digestiva, mas com uma certa estabilidade hemodinâmica. Contudo, apresenta uma maior recorrência da doença
ulcerosa péptica quando comparada à vagotomia com antrectomia, podendo causar também síndromes pós-
gastrectomias (menos frequente do que na vagotomia troncular com antrectomia).

TRATAMENTO CIR‡RGICO DA ‡LCERA PˆPTICA PERFURADA


Com relação à úlcera péptica perfurada, também devemos levar em consideração parâmetros clínicos do
paciente. Se o paciente chega sem peritonite difusa, sem choque séptico e/ou sem nenhuma doença associada que
impediria a realização de um procedimento cirúrgico mais invasivo e definitivo, nós podemos lança mão da rafia da
úlcera associada a procedimento ácido-redutor (que consiste no tratamento cirúrgico da úlcera péptica, no intuito de
diminuir a produção da secreção cloridropéptica). Caso contrário, devemos optar apenas pela rafia da úlcera.
Desta forma, temos:
 Rafia da úlcera e procedimento ácido-redutor: consiste no tratamento definitivo da úlcera. É o procedimento
de escolha para os pacientes estáveis, sem peritonite difusa, choque e/ou ausência de co-morbidades.
Geralmente, esta opção é a escolha para pacientes com menos de 12 horas de evolução do quadro clínico. O
procedimento ácido-redutor consiste no artifício curativo, que evita (ou pelo menos diminui) a recidiva da úlcera.
 Rafia simples da úlcera: consiste no tratamento por oclusão da úlcera. Deve ser utilizado quando o paciente
apresentar condições locais e/ou gerais insatisfatórias (abdome agudo, com abdome em tábua, choque séptico,
febre importante, peritonite, secreção purulenta na cavidade abdominal, etc.) ou quando apresentar perfuração
aguda, ou quando apresentar mais de 12 horas de evolução do quadro clínico.

No que diz respeito ao procedimento ácido-redutor, podemos lançar mão dos seguintes procedimentos:
 Rafia da úlcera com vagotomia gástrica proximal para a úlcera péptica duodenal perfurada;
 Ressecção das bordas da lesão ulcerada (para confirmação com biópsia), rafia e vagotomia com
piloroplastia para a úlcera péptica gástrica perfurada. Note que não haveria necessidade de realizar um
procedimento ácido-redutor mais efetivo no tratamento da úlcera gástrica uma vez que, como vimos no início
deste capítulo, a maioria das úlceras gástricas são normossecretoras (tipo I de Johnson). Contudo, opta-se pela
vagotomia devido à ocasião da cirurgia, sendo prudente promover uma redução clorídrica, uma vez que, embora
seja mais comum, nem sempre teremos uma úlcera normossecretora. Além disso, a ressecção da lesão é
fundamental para a realização da biópsia (que é obrigatória para úlcera gástrica)

Contudo, estes dois procedimentos pré-citados só deverão ser utilizados para pacientes estáveis, sem peritonite
ou qualquer outra co-morbidade (com evolução menor que 12 horas). Caso contrário, devemos optar por uma cirurgia
mais rápida, como a gastrectomia (vagotomia troncular com antrectomia), sendo esta a última opção a ser tomada.

TRATAMENTO DA HEMORRAGIA DIGESTIVA ALTA (HDA)


No que diz respeito à HDA, independente do local onde ela se instala, devemos realizar uma abordagem inicial
efetiva, com reposição volêmica e avaliação clínica periódica, inibidor de bomba de próton e administração de
Octeotridea (análogo da somatostatina com poucos ou nenhum efeito colateral). Para cada caso específico de úlcera
péptica, temos:
 HDA em úlcera gástrica: Ataque ao local do sangramento e ressecção da lesão ulcerada, vagotomia troncular e
piloroplastia. Dificilmente utilizamos a gastrectomia , apenas em casos selecionados.
 HDA em úlcera duodenal: Ataque direto ao local do sangramento; Procedimento ácido-redutor: vagotomia com
piloroplastia; ou vagotomia gástrica proximal. A gastrectomia (vagotomia troncular com antrectomia) deve ser
utilizada nos casos de hemostasia difícil (casos extremos).

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TRATAMENTO CIR‡RGICO DA OBSTRU•„O P IL†RICA


A obstru€•o pil‡rica consiste na Šnica complica€•o da doen€a ulcerosa p‚ptica que sempre necessitamos
realizar um procedimento de drenagem associada, pois neste caso, independente da vagotomia, devemos criar um canal
de drenagem para um estŒmago cujo piloro est† obstru„do.
Para diferenciar se h† necessidade de cirurgia na obstru€•o pil‡rica (caso haja uma obstru€•o fibr‡tica) ou n•o
(caso haja uma obstru€•o inflamat‡ria), devemos iniciar o tratamento com drenagem nasog†strica, inibidores de bomba
protŒnica e hidrata€•o venosa. Se ap‡s 5 a 7 dias de aspira€•o g†strica n•o houver al„vio da obstru€•o, significa dizer
que n•o havia edema de origem inflamat‡ria, mas sim, uma obstru€•o fibr‡tica, de modo que a descompress•o n•o foi
suficiente para tratar o quadro. Esta ‚, portanto, uma prova propedƒutica para indica€•o de cirurgia.
Conclui-se que o tratamento cl„nico com drenagem nasog†strica e inibidor de bomba protŒnica resolve o quadro
de obstru€•o inflamat‡ria. J† o quadro de obstru€•o fibr‡tica deve ser tratado atrav‚s da cirurgia, em que devemos
realizar vagotomia troncular ou g†strica proximal associada ‹ procedimento de drenagem.

REVIS„O E C ONSIDERA•‚ES FINAIS


 Em resumo, a Šlcera p‚ptica tem as seguintes complica€‰es que indicam cirurgia:
 “lcera g†strica: Sangramento, perfura€•o, suspeita de neoplasia.
 “lcera duodenal: Sangramento, perfura€•o, obstru€•o.

 O que fazer na hemorragia e na perfura€•o?


 Depende da avalia€•o cl„nica do paciente
 Na hemorragia, devemos realizar uma abordagem inicial, com avalia€•o cl„nica dos par…metros (hemodin…micos,
SNG, Ht/Hb, coagulograma) e administrar IBP e Octreotide (droga mais usada do ponto de vista vasomotora na
hemorragia digestiva). Feito isso, devemos realizar endoscopia ou considerar a cirurgia, independente da Šlcera ser
g†strica ou duodenal – o que devemos levar em considera€•o s•o os dados cl„nicos do doente.
 Pacientes que chegam em choque devem ser encaminhados diretamente para a cirurgia, sem a realiza€•o de
endoscopia. Pacientes est†veis hemodinamicamente podem ser submetidos ao tratamento endosc‡pico.
a) Durante a endoscopia, podemos sugerir (e n•o indicar absolutamente) a necessidade de um procedimento
cirŠrgico quando visualizamos um vaso sangrante na base da Šlcera, sangramento ativo no momento do exame
ou Šlceras maiores que 2 cm.
b) Se depois da realiza€•o de 2 endoscopias n•o h† resolu€•o do sangramento, a 3— tentativa ‚ contra-indicada:
devemos optar pelo tratamento cirŠrgico.
c) As outras indica€‰es para a cirurgia s•o avaliadas durante a interna€•o: necessidade de mais de 5 unidades de
sangue, ressangramento na mesma internaۥo (se tiver fatores de risco associados: idade acima de 60 anos,
cardiopata e uso obrigat‡rio de AINEs).

 A op€•o do ato cirŠrgico a ser realizado depende da avalia€•o cl„nica do doente.


 Para pacientes chocados, devemos fazer apenas o ataque direto ao sangramento: oclus•o da art‚ria g†strica
esquerda na Šlcera g†strica ou oclus•o da art‚ria gastroduodenal na Šlcera duodenal.
 O procedimento definitivo para o tratamento da Šlcera p‚ptica sangrante (procedimento †cido-redutor) dever† ser
associado se o paciente apresentar condi€‰es cl„nicas, sem co-morbidades. Na presen€a destas (cardiopatias,
pneumopatias, hepatopatias, idade avan€ada) n•o podemos realizar outros procedimentos que n•o o ataque direto
ao sangramento.

 Na realiza€•o de um procedimento †cido-redutor, devemos considerar os seguintes pontos:


 Para a Šlcera g†strica, devemos ressecar a borda da les•o (bi‡psia) associada a uma vagotomia troncular com
piloroplastia, que consiste em uma cirurgia r†pida. N•o ‚ necess†rio se preocupar com a secre€•o cloridro-p‚ptica
na Šlcera g†strica, uma vez que esta n•o ‚ importante, visto que 60% delas s•o normossecretoras.
 Para a Šlcera duodenal, devemos realizar a mesma cirurgia: vagotomia troncular com piloroplastia.

 Na perfura€•o, devemos considerar os seguintes pontos:


 N•o existe tratamento conservador para a perfura€•o.
 O tratamento da perfura€•o leva em conta a dura€•o da evolu€•o:
a) Perfura€•o da Šlcera g†strica com menos de 12 horas de evolu€•o: devemos ressecar a borda da les•o,
realizar a rafia da perfuraۥo e realizar vagotomia troncular com piloroplastia.
b) Perfura€•o da Šlcera duodenal com menos de 12 horas: rafia da Šlcera com vagotomia g†strica proximal
(consiste na Šnica indica€•o da VGP).
c) Perfura€•o de qualquer Šlcera p‚ptica com mais de 12 horas: vagotomia troncular com antrectomia.

 Em quais ocasi‰es devemos optar pelo procedimento de drenagem pil‡rica?


 Quando o paciente chega com exames endosc‡picos mostrando obstru€•o pil‡rica.
 Presen€a da s„ndrome pil‡rica: vŒmitos p‡s-prandiais associados ‹ s„ndromes metab‡licas.
 Faz-se ent•o sonda nasog†strica durante 5 a 7 dias.
a) Se houve melhora, provavelmente se tratava de uma condi€•o inflamat‡ria, em que n•o precisa se fazer mais
nada.
b) Se n•o houve melhora, significa dizer que ‚ a obstru€•o ‚ fibr‡tica e necessita de cirurgia.

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MED RESUMOS 2012


NETTO, Arlindo Ugulino.
CIRURGIA ABDOMINAL _________

ABDOME AGUDO
(Professor Felipe Rocha e Semin•rios – TURMA FAMENE 2007.2)

O termo abdome agudo indica qualquer distúrbio não-


traumático espontâneo súbito, cuja principal manifestação
ocorre na área abdominal, principalmente na forma de dor, e
para a qual pode ser necessária uma operação urgente. Como
existe, com frequência, um distúrbio intra-abdominal subjacente
progressivo, o retardo indevido no diagnóstico e tratamento
afeta de maneira adversa o resultado.
Um abdome agudo deve ser suspeito mesmo quando o
paciente apresenta queixas brandas ou atípicas. A história e o
exame físico devem sugerir as prováveis etiologias e orientar
na escolha dos exames diagnósticos iniciais. Aliás, como
veremos ao longo deste capítulo, o exame clínico é primordial
no diagnóstico dos diversos tipos de abdome agudo, ao ponto
de fazer dos demais exames, em muitos casos, meros
procedimentos complementares.
O médico deve, então, decidir se há exigência de uma observação no hospital; se são necessários exames
adicionais; se a operação precoce está indicada; ou se o tratamento não-operatório seria o mais adequado.

TIPOS DE D OR A BDOMINAL
 A dor é o aspecto mais comum e predominante de um abdome agudo. A cuidadosa consideração da localização,
modalidade de estabelecimento e de progressão, e o caráter da dor vão sugerir uma lista preliminar de diagnósticos
diferenciais.
 As principais modalidades de dor são:
 Dor visceral verdadeira: é provocada por distensão, inflamação ou isquemia, que estimula os neurônios (fibras
C) dos receptores ou por envolvimento direito (por exemplo, infiltração maligna). A sensação centralmente
percebida, geralmente, é lenta em seu estabelecimento, maciça, difusamente localizada, e protraída. Diferentes
estruturas viscerais estão associadas a diferentes níveis sensoriais da coluna vertebral. Devido a isso, a tensão
aumentada da parede decorrente da distensão luminal ou a contração vigorosa de um músculo liso produz a dor
difusa, profundamente situada, sentida na porção média do epigástrio, área periumbilical e nos flancos. A dor
visceral é mais frequentemente percebida na linha média, por causa do suprimento sensorial e lateral para a
medula.
 Dor somática (parietal): decorre devida a irritação direta do peritônio parietal, somaticamente inervado por
fibras nervosas C e A-delta, estimuladas por pus, bile, urina ou secreções gastrointestinais, e que levam a dor
mais exatamente localizada nos segmentos de T6 a L1. A dor parietal é mais facilmente localizada que a dor
visceral, é convencionalmente descrita como ocorrendo em um dos quadrantes abdominais ou na área
abdominal epigástrica ou central.
 Dor referida: indicam sensações nocivas (usualmente cutâneas) percebidas em um sítio distante daquele de um
estímulo primário forte. Por exemplo, a dor decorrente da irritação subdiafragmática por ar, líquido peritoneal,
sangue ou uma lesão de massa é referida ao ombro por meio do nervo mediado por C4 (frênico). A dor também
pode ser referida a partir de lesões supra-diafragmáticas como a pleurisia ou a pneumonia de lobo inferior. Ainda
há a dor biliar referida, que é percebida na região escapular direita, mas que ainda pode mimetizar uma angina
do peito, quando é percebida no tórax anterior ou área do ombro esquerdo.

 OBS1: Nas vias que levam à percepção da dor visceral referida, ocorre a
participação de elementos componentes da cadeia de neurônios, responsável pela
sensibilidade somática. No corno posterior da medula, muitas das fibras aferentes
viscerais contraem sinapse com neurônios secundários, que recebem, também,
neurônios procedentes de zonas superficiais do corpo. Consequentemente, a
representação cerebral de estímulos vindos das vísceras pode ser interpretada como
procedente da superfície, no dermátomo correspondente ao do neurônio somático, que
se conectou com o neurônio secundário, comum a ambas as procedências. Em outras
palavras, há fibras somáticas e fibras viscerais que carreiam impulsos a neurônios
secundários, comuns a ambas, no corno posterior da medula, originando percepção de
dor em área que não coincide, exatamente, com aquela de origem dos estímulos.

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TIPOS DE ABDOME AGUDO


O abdome agudo é, portanto, toda condição dolorosa desta parte do organismo, em geral de início súbito e que
requer uma decisão rápida, seja ela clínica ou cirúrgica. Constitui um dos problemas mais importantes para o médico
não só pela frequência com que ocorre como também pelas dificuldades diagnósticas que pode vir a apresentar.
O conceito de abdome agudo pode ser simplificado como qualquer dor que acometa o abdome de um indivíduo
previamente sadio, durando cerca de 6 horas e sendo necessária uma intervenção cirúrgica ou clínica.
O abdome agudo pode ser classificado por meio da sua respectiva fisiopatologia:
 Abdome agudo inflamatório: a dor apresenta uma característica variável, apresentando uma progressão de acordo com a
causa. Geralmente é associada a náuseas, vômitos, mal-estar geral, febre, sinais de irritação peritoneal (sensibilidade
dolorosa à palpação, abdome contraído ou em tábua, ausência da respiração abdominal, etc.). As principais causas são:
apendicite aguda, colecistite aguda, pancreatite aguda, doença inflamatória pélvica, diverticulite aguda.
 Abdome agudo obstrutivo: a dor tende a ser do tipo cólica e o paciente tende a apresentar um abdome distendido. O que
acontece, geralmente, é uma parada de eliminação de gases e fezes. O paciente pode apresentar ainda náuseas e vômitos.
As principais causas são: aderências (pós-operatório), neoplasia de cólon, volvo de sigmoide, bolo de áscaris, obstrução
pilórica, hérnia encarcerada e estrangulada, bridas, corpos estranhos, cálculo biliar, intussuscepção (entrada de uma alça
intestinal dentro da outra). No raio-X, as alças intestinais apresentam-se dilatadas.
 Abdome agudo perfurativo: é o tipo de abdome agudo que mais causa peritonite. A dor abdominal é de forte intensidade,
fazendo com que apareça o abdome em tábua. É caracterizado, principalmente, pelo pneumoperitônio e história anterior de
úlcera. As principais causas são: úlcera péptica, câncer gastrointestinal, febre tifoide, amebíase, divertículos de cólons,
perfuração do apêndice, perfuração da vesícula biliar.
 Abdome agudo vascular (isquêmico): dor abdominal intensa relacionada com história anterior de arteriopatias crônicas,
IAM, AVC, claudicação abdominal (dor após a alimentação). O que acontece é uma eliminação de líquido necrótico causada
por trombose arterial periférica, embolia arterial ou trombose venosa mesentérica. As principais causas são: trombose da
artéria mesentérica, torção do grande omento, torção do pedículo de cisto ovariano, infarto esplênico.
 Abdome agudo hemorrágico: tende a cursar com dor abdominal intensa, síndrome hipovolêmica, sinais de irritação
peritoneal. As principais causas são: gravidez ectópica, rotura de aneurisma abdominal, cisto hemorrágico de ovário, rotura
de baço, endometriose, necrose tumoral.
 Abdome agudo ginecológico: referido por alguns autores como sendo uma modalidade específica da mulher. Contudo, o
tema ainda é discutido na literatura tendo em vista que suas principais causas podem ser, facilmente, enquadradas nas
demais classificações de abdome agudo.

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ABDOME AGUDO INFLAMAT†RIO


Abdome agudo inflamatório é caracterizado pela dor abdominal decorrente da inflamação aguda ou crônica do
peritônio causada por agentes diversos (bacterianos, químicos, físicos), e/ou secundária a uma inflamação prévia de
vísceras abdominais (apendicite, pancreatite, colecistite, enterites). Neste caso, há disseminação e implantação de
células inflamatórias no peritônio, caracterizando o quadro. O abdome agudo inflamatório representa a causa mais
frequente de abdome agudo.

ETIOLOGIA
Os principais agentes etiológicos do abdome agudo inflamatório são bactérias aeróbicas e anaeróbias. Contudo,
não há padrão único, mas sim, variável conforme região, causa, flora hospitalar e centros de cuidados intensivos. De um
modo geral, as bactérias mais comuns no que diz respeito ao órgão acometido são:
 Esôfago: Gram-positivas e cândida;
 Estômago: Gram-positivas e cândida;
 Vesícula: enterococos, Gram-negativos, anaeróbios e Clostridium perfringens;
 Intestino delgado: enterobacteriáceas;
 Apêndice: Gram-negativas, E.coli e anaeróbios;
 Cólon e reto: anaeróbios (Bacteroides fragilis, clostridium, cocos anaeróbios) e enterobacteriáceas;
 Ginecologia: anaeróbios.

As principais causas de abdome agudo inflamatório são: apendicite aguda, colecistite aguda, pancreatite aguda,
doença inflamatória pélvica, diverticulite aguda. Podemos considerar a apendicite aguda como o protótipo deste tipo de
abdome e, sobre ela, faremos alguns comentários quando necessário.

QUADRO CLÍNICO E CARACTERÍSTICAS DA DOR


Consiste no quadro clínico menos dramático, quando comparado a outras causas de abdome agudo. É
caracterizado por uma dor branda e contínua, que se torna intensamente centralizada em uma área bem definida dentro
de 1 ou 2 horas. Esta modalidade de início é mais típica de colecistite aguda e pancreatite aguda.
A dor do abdome agudo inflamatório é caracterizada por:
 Modo de aparecimento e curso. A dor de uma gastroenterite aguda costuma ser autolimitada, enquanto, em
outras doenças, pode ter caráter progressivo. Considera-se, como uma regra geral, que para a maioria dos
pacientes, as dores abdominais fortes, que se apresentam em pessoas que antes estavam bem, com duração
de até seis horas, são sugestivas de que o caso exigirá tratamento cirúrgico.
 Localização inicial, mudança de local e irradiação. A dor visceral, como regra, localiza-se na linha mediana
ou em suas imediações, e estará localizada tanto mais para baixo dessa linha quanto mais distal estiver a lesão
no tubo digestivo e em outras vísceras abdominais.

o Na área A da figura 3, correspondente ao epigástrio e imediações, costumam localizar-se as dores da


úlceras gástrica e duodenal, das gastrites agudas, das colecistites e pancreatites, das obstruções

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intestinais altas, da apendicite (fase inicial), dos abscessos subfrƒnicos, das hepatites agudas e at‚ de
afec€‰es supradiafragm†ticas, como pneumonias, angina e infarto do mioc†rdio.
o Na †rea B da figura 3, correspondente ao mesog†strio e adjacƒncias, localizam-se as dores de afec€‰es
agudas do intestino delgado (infec€‰es, obstru€•o, isquemia, distens•o), da apendicite (fase inicial) e da
pancreatite aguda.
o Na †rea C da figura 3, correspondendo ao hipog†strio e zonas lim„trofes, e em todo o baixo ventre,
situam-se as dores do intestino grosso (obstru€•o, isquemia, distens•o, diverticulite, apendicite), de
doen€as ginecol‡gicas (salpingite, gravidez ect‡pica, afec€‰es dos ov†rios) e urol‡gicas (cistites).
o Quando o peritŒnio parietal ‚ atingido por um processo inflamat‡rio ou irritativo agudo, a dor abdominal
tende a migrar e localizar-se na regi•o correspondente ‹ da les•o e ter irradia€‰es mais ou menos
caracter„sticas (figura 4).
 Intensidade e tipo. As dores mais intensas costumam ser provocadas pelas afec€‰es agudas de car†ter
inflamat‡rio, isquƒmico ou obstrutivo. Entretanto, uma condi€•o estritamente funcional, como o espasmo de uma
v„scera oca, pode produzir dor de forte intensidade. A dor “em pontada” ou “em facada” apresenta-se em
processos inflamat‡rios , que envolvem o peritŒnio.
 Fatores agravantes e fatores que aliviam. S•o, principalmente, relacionados a posi€‰es que o doente assume.
Pacientes com peritonite movem-se o m„nimo poss„vel, e a deambula€•o e a trepida€•o (por exemplo, no
autom‡vel, ao ser transportado ao hospital) pioram a dor. Nas afec€‰es inflamat‡rias do retroperitŒnio, como nas
pancreatites, o paciente tende a fletir o tronco em rela€•o aos membros inferiores ou pŒr-se em posi€•o de
c‡coras.
 Sinais e sintomas associados. A febre baixa e constante ‚ comum nas condi€‰es inflamat‡rias. A
desorienta€•o e letargia extrema, combinada a uma febre muito alta (maior que 39˜C), ou a febre oscilante ou
com calafrios, significa o choque s‚ptico eminente. Esta ‚ mais frequente decorrente da peritonite avan€ada,
colangite aguda e pielonefrite.

Os sinais sistƒmicos acompanhantes (taquicardia, taquipneia, sudorese, choque) logo suplantam os distŠrbios abdominais, e
ressaltam a necessidade de reanima€•o volum‚trica e laparotomia imediata. Isso pois a sudorese, palidez, bradicardia, hipotens•o
arterial, n†useas e vŒmitos s•o sinais de que a dor, efetivamente, tem grande intensidade, mesmo colocando-se ‹ parte os
componentes ps„quicos que estejam interferindo no quadro cl„nico.
Al‚m desses sintomas que sugerem gravidade, outros inespec„ficos podem acompanhar a dor abdominal. Entre eles,
destacam-se: anorexia, n†usea e vŒmito, constipa€•o e diarreia. Estes n•o possuem valor diagn‡stico.

DIAGNÓSTICO
A história e o exame clínico fornecem o diagn‡stico em mais de 90% dos casos de abdome agudo na mulher e
em aproximadamente 98% dos casos no homem (os dois sexos somam cerca de 89% dos casos). Contudo, podemos
lan€ar m•o de exames laboratoriais e radiol‡gicos complementares para o diagn‡stico de muitas condi€‰es cirŠrgicas,
para exclus•o das etiologias cl„nicas ordinariamente n•o tratadas por opera€•o, e para prepara€•o pr‚-operat‡ria.
Exames adicionais s•o aconselh†veis apenas se eles tiverem a probabilidade de alterar ou melhorar
significativamente as decis‰es terapƒuticas. No uso mais liberal dos exames diagn‡sticos est† justificada para os
pacientes idosos ou gravemente doentes, nos quais a hist‡ria e os achados f„sicos podem ser menos confi†veis e um
diagn‡stico precoce pode ser vital para garantir um resultado bem sucedido.

Exame clínico.
O exame cl„nico ‚ considerado o mais importante e fidedigno (ao ponto de tornar os demais exames
insignificantes). Tanto ‚ que, na maioria dos casos de abdome agudo inflamat‡rio, a cirurgia pode ser indicada apenas
baseada em par…metros cl„nicos. ˆ importante avaliar os seguintes pontos:
 Hist‡ria pregressa: ginecol‡gica, medicamentosa, familiar, cirŠrgica. A hist‡ria ginecol‡gica ‚ bastante
importante: ‚ fundamental questionar sobre o per„odo do ciclo sexual, atraso menstrual, corrimento vaginal
(sinal de doen€a inflamat‡ria p‚lvica). A doen€a inflamat‡ria p‚lvica ‚ o principal diagn‡stico diferencial com
a apendicite na mulher, por exemplo.
 Sintomas: dor abdominal (caracter„sticas), vŒmitos, constipa€•o, outros sintomas: anorexia, urin†rios.
 Exame f„sico:
o Geral: sinais sistƒmicos, febre.
o Abdome: o principal par…metro f„sico para diagn‡stico do abdome agudo inflamat‡rio ‚ a palpa€•o
atrav‚s de sinais semiol‡gicos especiais como o Blumberg, Rovsing, Murphy, Jobert, Lapinsky (psoas),
obturador, Cullen, Grey-Turner, Kehr, Lenander. Contudo, o mais importante achado no exame f„sico ‚
o sinal de defesa abdominal (sinal da contratura muscular involunt†ria).
o Exame reto-vaginal.

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Exame físico.
O exame cl„nico do paciente deve incluir o exame f„sico geral, o exame do segmento cef†lico e do pesco€o, do
t‡rax e do abdome, dos membros e do sistema nervoso. No exame f„sico do abdome, destacamos:
 Inspeção. Geralmente, apresenta-se como abdome em t†bua. Contudo, a inspe€•o ‚ pouco espec„fica para o
abdome agudo inflamat‡rio e tem pouco valor diagn‡stico.
 Ausculta. A redu€•o dos ru„dos ou, mais ainda, sua aboli€•o, constituem um elemento semiol‡gico indicativo de
ausƒncia de movimentos das al€as intestinais, sugerindo que o abdome agudo esteja acompanhado de
peritonite. Exceto para os padr‰es mais extremos, as muitas variantes de ausculta ouvidas em outras condi€‰es
as tornam, em grande parte, inŠteis para o diagn‡stico espec„fico.
 Palpação. Quando o peritŒnio parietal for afetado por um processo inflamat‡rio ou irritativo, haver† hiperalgesia
‹ palpa€•o, na mesma regi•o anatŒmica onde se situa o processo patol‡gico. Al‚m disso, desencadeia-se um
fenŒmeno reflexo, que faz com que haja aumento de tens•o, at‚ mesmo, rigidez da musculatura, na †rea
correspondente. Durante a palpaۥo, os seguintes sinais devem ser considerados:
o Sinal de Murphy: o examinador toca o fundo da ves„cula no ponto c„stico e solicita a inspira€•o for€ada do
paciente. O sinal de Murphy ‚ positivo se o paciente reagir com uma contratura de defesa e interrup€•o da
inspiraۥo. Sugere colecistite aguda.
o Manobra da descompressão súbita e Sinal de Blumberg: comprime-se o ponto de McBurney (ponto
apendicular), na fossa il„aca direita, at‚ o m†ximo tolerado, descomprimindo subitamente. Esse sinal ‚ positivo
quando ocorre um aumento sŠbito da dor ap‡s a descompress•o. Sugere, geralmente, apendicite aguda com
inflama€•o de peritŒnio. Inicialmente, esta manobra foi descrita para a fossa il„aca direita nos casos de apendicite
aguda supurada; no entanto, ela ‚ positiva em todos os casos de irrita€•o peritoneal qualquer que seja a causa. A
manobra de provoca€•o de dor ‹ descompress•o brusca (DB), feita, cautelosamente, para n•o induzir sofrimento
desnecess†rio ao paciente, indicar† peritonite (DB positiva). A localiza€•o anatŒmica de tais anormalidades indicar†
o prov†vel ‡rg•o comprometido.
o Sinal de defesa abdominal (contratura muscular involuntária): a defesa ‚ avaliada ao se colocar ambas as
m•os sobre os mŠsculos da parede …ntero-lateral do abdome e deprimindo gentilmente os dedos. A manobra ‚
positiva se houver contratura involunt†ria ‹ palpa€•o, denotando dor parietal. ˆ necess†rio, contudo, diferenciar esta
contra€•o de um espasmo volunt†rio feito pelo paciente. Se o espasmo ‚ volunt†rio, se perceber† que o mŠsculo
relaxa quando o paciente inspira profundamente pela boca (manobra propedêutica). Entretanto, quando o espasmo
involunt†rio ‚ verdadeiro (sinal de contratura muscular involunt†ria), o mŠsculo permanecer† tenso e r„gido (“em
t†bua”) durante toda a respira€•o. Este sinal ‚ sugestivo de peritonite e, portanto, de abdome agudo inflamat‡rio.
o Sinal de Rowsing: realiza-se a palpa€•o profunda e sucessiva, desde o c‡lon descendente (na fossa il„aca
esquerda), seguindo a moldura do intestino grosso, levando o ar, em sentido contr†rio ao trajeto do bolo fecal, at‚ o
apƒndice. Este movimento estimula o deslocamento do ar desde a fossa il„aca esquerda at‚ a regi•o do apƒndice. A
distens•o do apƒndice sugere uma apendicite aguda.
o Sinal de Giordano: A produ€•o de dor pela punho-percuss•o da regi•o lombar indica doen€a inflamat‡ria do
retroperitŒnio (e/ou afec€•o das vias urin†rias).
 Percussão. A hipersensibilidade ‹ percuss•o ‚ semelhante ‹ provocar ‹ hipersensibilidade por recha€o. Ambas
refletem a irritaۥo peritoneal e dor parietal.

OBS2: A associa€•o entre o sinal de defesa abdominal involuntária e o sinal de sensibilidade localizada (dor ‹ palpa€•o profunda e/ou
superficial em topografia espec„fica do abdome) confirma o diagn‡stico cl„nico de abdome inflamat‡rio agudo. Isso acontece porque a
dor parietal ‚ caracter„stica do abdome agudo inflamat‡rio (diferentemente da dor visceral).

Exames laboratoriais.
Aconselha-se que dois exames devam ser feitos em pacientes que apresentem o quadro de abdome agudo: o
hemograma e a an†lise de rotina da urina.
 Exame de sangue. O hemograma dar† informa€‰es sobre a ocorrƒncia de anemia e de suas caracter„sticas,
cuja presen€a n•o s‡ auxilia a confec€•o do diagn‡stico, como, tamb‚m, fornece ao cirurgi•o elementos para a
indica€•o de transfus•o de sangue, objetivando a eventual opera€•o de urgƒncia. No abdome agudo
inflamat‡rio, temos os seguintes achados:
 Hemograma mostrando leucocitose com neutrofilia acentuada. A leucopenia ‚ comum em peritonites
avan€adas.
 Hemat‡crito aumentado devido ‹ perda de l„quido para 3˜ espa€o.
 Ureia e Creatinina aumentadas. Estas s•o importantes principalmente quando a hipovolemia ‚ esperada
devido ao choque, vŒmito ou diarreia copiosa, distens•o abdominal tensa ou retardo de v†rios dias
depois do in„cio dos sintomas.
 Hemossedimenta€•o: Quando aumentado, significa destrui€•o tissular; pouco alterada na apendicite
Aguda; elevada nos processos inflamat‡rios p‚lvicos.
 A determina€•o da amilasemia ‚ dado laboratorial muito Štil para o diagn‡stico das pancreatites agudas
ou das recidivas agudas das pancreatites crŒnicas. A amilasemia aumenta quando h† pancreatites,
perfura€‰es gastroduodenais e obstru€‰es intestinais. Sua eleva€•o no sangue permanece, no m†ximo,
por 24 a 48 horas, da„ a import…ncia de se fazer a sua determina€•o na urina (2 a 5 dias).

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 Exame do líquido ascítico: A contagem de polimorfonucleares, no líquido ascítico de paciente com suspeita de
3
peritonite bacteriana espontânea, indicará esse diagnóstico, quando for acima de 250/mm .

 Exame de urina: verificar piúria, cistite, pielite e nefrite. A presença de hematúria revela infecções urológicas.

Exames de imagem.
 Ultrassonografia. Sendo um exame absolutamente inócuo, sem contraindicações, de baixo custo, disponível na maioria dos
hospitais e capaz de fornecer, com rapidez, imagens muito úteis para o diagnóstico do abdome agudo, a ultrassonografia é
uma aliada indispensável para o clínico. Modelos portáteis de aparelhos de ultrassonografia permitem que o exame de
imagem seja feito em seguida ao exame físico, no próprio leito do paciente, propiciando maior rapidez para a obtenção do
diagnóstico. Embora pleno de facilidades, o exame ultrassonográfico exige muita capacitação do profissional que o faz e o
interpreta. O fato do ultrassom ter especificidade e sensibilidade relativamente baixas, pode acusar resultados falso-positivos
(por ser pouco específico) e falso-negativos (por ser pouco sensível). Embora a USG seja mais sensível do que específica.
A ultrassonografia é o exame particularmente útil para confirmar ou afastar hipóteses diagnósticas levantadas durante o
exame clínico de causas de abdome agudo inflamatório. As apendicites, as colecistites, as diverticulites, a gravidez ectópica
e as doenças inflamatórias pélvicas e do trato urinário são diferenciadas com segurança através da USG.
A USG, por ser um exame útil para avaliar ovários, trompas e útero, além do apêndice, consegue traçar diagnóstico
diferenciais de doenças ginecológicas com outras causas de abdome agudo (como a própria apendicite aguda),
principalmente quando há dúvidas no exame físico.

 Tomografia (TC): A tomografia computadorizada, cada vez mais, vem ganhando importância na elucidação diagnóstica do
abdome agudo. Por ter alta sensibilidade e especificidade (S98% e E97%), é o exame ideal para os casos de clínica
duvidosa. Do ponto de vista propedêutico, a TC deve ser solicitada nos casos de exame clínico duvidoso e USG inconclusiva.
A tomografia helicoidal permite que o exame do abdome seja feito em menor tempo do que o faz a tomografia axial. Contudo,
ela não é um bom exame para avaliar útero, trompas e ovário, fazendo com que ela seja menos vantajosa do que a
videolaparoscopia. Suas vantagens são:
 Distingue massas inflamatórias e líquido intraperitoneal,
 Evidencia ar nas vias biliares ou na veia porta,
 Detecta gás fora do tubo intestinal ou na sua parede ou na parede vesicular,
 É útil no diagnóstico da isquemia ou infarto intestinal, revelando gás e espessamento da parede intestinal e por
vezes oclusão vascular e gás na rede venosa mesentérica,
 Diagnóstico e avaliação da pancreatite aguda,
 É capaz de examinar toda a cavidade abdominal e pélvica.

 Videolaparoscopia: exame fundamental para avaliar melhor os órgãos femininos, principalmente no que diz respeito ao
diagnóstico diferencial com endometriose e, especialmente, com doenças inflamatórias pélvicas, caso a USG seja
inconclusiva (sendo esta sua principal indicação). Além disso, a videolaparoscopia serve para o tratamento de uma eventual
apendicite, o que impõe vantagens a ela com relação à TC.
A laparoscopia pode ser útil para separar doenças que têm indicação de tratamento clínico daquelas que devem ser tratadas
por meio da cirurgia. Como exemplo, em mulher em idade fértil e peritonite no quadrante inferior direito, permite diferenciar
uma apendicite aguda de uma salpingite aguda ou da rotura de folículo ovariano.

OBS3: Nota-se que, depois do exame clínico, podemos optar pela ultrassonografia como primeiro exame complementar a ser
solicitado caso seja necessário. Contudo, caso a USG seja inconclusiva, devemos lançar mão da tomografia ou da videolaparoscopia.
A videolaparoscopia deve servir como segunda opção para as mulheres (uma vez que ela avalia melhor os órgãos genitais femininos,
permitindo diagnósticos diferenciais da doença inflamatória pélvica em casos de exame clínico duvidoso e USG inconclusivo),
enquanto que a tomografia serve como melhor segunda opção para os homens, evitando uma laparoscopia desnecessária.

Outros exames menos utilizados para o diagnóstico de abdome agudo inflamatório são:
 Radiografia: De um modo geral, o exame radiográfico simples do abdome não tem nenhuma importância para o diagnóstico
do abdome agudo inflamatório. Contudo, pela simplicidade e pela facilidade em ser realizado, pode ser solicitado na
generalidade dos casos. Além disso, a radiografia simples de abdome é capaz de identificar uma causa comum de abdome
agudo inflamatório, que é a presença de cálculo em ureter. As indicações e vantagens da radiografia simples são:
 Diagnóstico de doença não suspeitada pelo exame clínico e/ou confirmar diagnóstico clínico;
 Diagnóstico diferencial entre doenças de tratamentos diferentes (p.ex., pancreatite aguda e úlcera perfurada);
 Confirmar o diagnóstico de cálculo em ureter;
 Avaliar os casos de abdome agudo quando o exame clínico é difícil de ser realizado (idoso, traumatismo, criança).

 Ressonância nuclear magnética. Não parece oferecer vantagens sobre a TC no abdome agudo. A ressonância magnética,
contrastada com gadolínio, é indicada como uma alternativa à tomografia computadorizada, na avaliação e no estadiamento
da pancreatite aguda, quando houver intolerância do paciente a contrastes iodados ou insuficiência renal. O emprego da
ressonância magnética, no diagnóstico da causa de abdome agudo, restringe-se, praticamente, à avaliação das afecções do
pâncreas e das vias biliares e não suplanta os resultados da tomografia computadorizada, a não ser nas condições
especificadas acima.

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 Outros exames. A lavagem peritoneal ‚ Štil para o diagn‡stico da presen€a de hemoperitŒnio, decorrente de rotura de
‡rg•os, da presen€a de pus ou outros materiais provenientes de rotura ou perfura€‰es de ‡rg•os tubulares. A laparotomia
exploradora est† indicada na suspeita de rotura de ‡rg•os ou de aneurisma e em outras condi€‰es em que o retardo de uma
interven€•o poder† pŒr em grave risco a vida do paciente. A cistografia deve ser feita em caso de suspeita de les•o de
bexiga. A colangiografia venosa permite a confirma€•o do diagn‡stico de colecistite aguda em at‚ 2 horas.

LINHAS GERAIS DE TRATAMENTO


Em resumo, o exame cl„nico (principalmente a palpa€•o do abdome, quando bem realizada), consiste no procedimento
diagn‡stico mais fidedigno diante da suspeita de abdome agudo inflamat‡rio, ao ponto de tornar os demais procedimentos
insignificantes ou, de fato, meros exames “complementares”.
O tratamento do abdome agudo depende, logicamente, da sua causa de base. A cirurgia, na maioria dos casos, ‚ elei€•o
(da„ o sinŒnimo muito utilizado: abdome agudo cirŠrgico). A confirma€•o diagn‡stica atrav‚s do exame cl„nico ‚ suficiente para a
indica€•o cirŠrgica.

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ABDOME AGUDO ISQUŠMICO (V ASCULAR)


O abdome agudo isquƒmico (ou vascular) constitui doen€a grave, com mortalidade atingindo 80% na maioria dos estudos.
Tal fato se deve ao diagn‡stico quase sempre tardio, e pelo fato de acometer principalmente pacientes idosos, que j† apresentavam
v†rias doen€as crŒnicas por si s‡ graves. Considera-se que, na maioria das vezes, o diagn‡stico s‡ ‚ estabelecido quando o paciente
j† se apresenta na fase avan€ada da doen€a (caracterizada pela necrose de al€as intestinais).
A obstru€•o aguda das grandes art‚rias intestinais ‚ considerada uma cat†strofe abdominal, que resulta na morte da maioria
das suas v„timas. Considerada uma doen€a de idosos por sua forte rela€•o com a aterosclerose e suas consequƒncias card„acas,
situa€‰es essas que acometem mais os senis.
Apesar dos avan€os considerados no diagn‡stico e conduta cl„nica e cirŠrgica dos pacientes com isquemia mesent‚rica
aguda, a mortalidade e as complica€‰es tardias como a s„ndrome do intestino curto permanecem desalentadoramente elevadas.

ETIOLOGIA
As principais causas de abdome agudo isquƒmico s•o:
 Embolia da art‚ria mesent‚rica superior
 Trombose da art‚ria mesent‚rica superior
 Trombose da veia mesent‚rica superior
 Isquemia mesent‚rica aguda n•o-oclusiva
 Colite isquƒmica

Em se tratando de abdome agudo isquƒmico, podemos destacar a isquemia ou oclusão mesentérica aguda como principal
causa e que ser† a entidade cl„nica que servir† como prot‡tipo deste tipo de abdome agudo.
A Isquemia Mesent‚rica Aguda ‚ uma entidade potencialmente fatal cujo diagn‡stico exige bastante perspic†cia por parte do
m‚dico assistente. O desafio de detectar o processo isquƒmico antes que as altera€‰es irrevers„veis se instalem frequentemente
deixa pouco ou nenhum espa€o para atrasos e equ„vocos (BIBLIOMED, 2008).

ETIOPATOGENIA E FISIOPATOLOGIA
A fisiopatologia envolve uma les•o isquƒmica inicial (o que leva a les‰es precoces na mucosa, torando-se posteriormente
transmurais), perpetuada pelo vasoespasmo reflexo da circula€•o mesent‚rica e completada pela les•o de reperfus•o.
Portanto, o mecanismo b†sico da isquemia intestinal aguda se d† por esta queda abrupta do fluxo sangu„neo mesent‚rico
por oclus•o aguda ou por vasoconstric€•o prolongada de vasos mesent‚ricos.

FATORES DE RISCO PARA ISQUEMIA MESENTÉRICA AGUDA


 Idade > 50 anos  Hipercoagulabilidade
 Arritmia card„aca  Queimadura
 Fibrila€•o Atrial  Pancreatite
 IAM recente  Hemorragia significativa recente ou atual
 ICC  Trombose venosa profunda (TVP)
 Anticoncepcional oral (ACO)

QUADRO CLÍNICO E CARACTERÍSTICAS DA DOR


Bergan definiu trƒs classifica€‰es cl„nicas para o abdome agudo isquƒmico: embolia arterial, trombose arterial e
isquemia n•o conclusiva.
Embolia aterial Trombose arterial Isquemia não-oclusiva
 Dor abdominal difusa e intensa,  In„cio insidioso, com dor  Dor ausente ou moderada
de in„cio abrupto podendo ser em abdominal vaga, inapetƒncia,  Fezes sanguinolentas como
c‡lica ou cont„nua e ser seguida n†useas e vŒmitos sintoma inicial
de n†useas ou vŒmitos;  Pode haver elimina€•o de fezes  Ao exame: abdome distendido e
 Epis‡dio de esvaziamento com sangue vis„vel ou oculto pouco doloroso ‹ palpa€•o,
intestinal  Simula quadro de oclus•o sugerindo „leo paral„tico
 Hist‡ria de cardiopatia intestinal aguda  Hist‡ria de cardiopatia e uso de
embol„gena (FV)  Ao exame: Abdome distendido e digit†licos
 30% tem hist‡ria pregressa de RHA ou –  P‡s-operat‡rio de cirurgia
embolia arterial  Hist‡ria prolongada de dor card„aca (0,8%)
abdominal p‡s prandial e perda
de peso sugerindo isquemia
intestinal crŒnica

De um modo geral, o paciente com abdome agudo isquƒmico apresenta, invariavelmente, dor abdominal intensa, difusa,
mal-definida e de instalação rápida (diferentemente da dor da apendicite aguda). Esta dor apresenta uma despropor€•o intensa
quando comparada ‹ cl„nica do paciente. A suspeita diagn‡stica ‚ aumentada quando associamos as seguintes condi€‰es: idade (60
ou mais); cardiopatia grave; arritmia; aterosclerose avan€ada; abdome distendido e doloroso difusamente.
A depender da fase em que se encontra o paciente, a dor pode se apresentar de maneira diferente:
 Fase precoce: dor em c‡lica, espasm‡dica e relacionada ‹ alimenta€•o. Esta fase pode ser detectada pela arteriografia.
 Fase tardia: dor intensa, difusa e associa€•o ‹ distens•o abdominal e sinais de choque hipovolƒmico e/ou s‚ptico,
decorrente da necrose de al€as intestinais.

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DIAGNÓSTICO

Exame clínico.
O exame clínico é essencial para o diagnóstico do abdome agudo vascular, principalmente através dos seguintes
pontos:
 História clínica: nela, devemos procurar reconhecer os fatores de risco para isquemia mesentérica aguda (já
listados anteriormente) ou para as demais causas de abdome agudo isquêmico. De um modo geral, devemos
questionar a idade (idosos), presença de dor intensa e mal-definida, antecedentes pessoais (infarto agudo,
insuficiência cardíaca, uso de ACO, cardiopata crônico).
 Exame físico:
o Exame físico abdominal: o exame físico do abdome, isolado, é pobre para o diagnóstico de abdome
agudo isquêmico (diferentemente do abdome agudo inflamatório, onde a clínica é soberana), tendo
pouco valor diagnóstico. Contudo, a presença de uma história clínica recheada de fatores de risco e
relato de dor intensa e mal-definida associados à distensão abdominal difusa à inspeção (sinal
completamente diferente do encontrado na apendicite aguda, protótipo do abdome agudo inflamatório),
sugere o diagnóstico clínico de abdome agudo isquêmico em estágio avançado (80 a 90% dos pacientes
já se apresentam com necrose intestinal). Além da distensão abdominal, é evidente o timpanismo
aumentado à percussão do abdome. Se estes aspectos do exame físico estiverem isolados, sem
associação aos fatores de risco, talvez não tenham tanto valor semiológico. Caso contrário, isto é, caso
haja a associação destes achados físicos a uma história repleta de fatores de risco, o diagnóstico é
bastante sugestivo.
o Exame físico geral: alguns sinais sistêmicos podem sugerir a presença de abdome agudo isquêmico,
tais como: hipotensão arterial, taquicardia, dispneia, etc. Portanto, sinais de sepse e/ou de choque são
muito comuns na vigência do abdome agudo vascular, mas que raramente acontece no caso de abdome
agudo inflamatório ou obstrutivo. De um modo geral, a avaliação destes sinais sistêmicos sugestivos de
choque é imprescindível para estabelecer o diagnóstico clínico de abdome agudo vascular.
o Exame proctológico: a presença de sangue ao toque retal é praticamente patognomônico de isquemia
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mesentérica (ver OBS ). O sangramento é causado pelo desprendimento de mucosa intestinal
decorrente da lesão vascular a este órgão. Em curtas palavras, o abdome agudo vascular é a única
modalidade de abdome agudo que apresenta sangue ao toque retal.

Personificando um exemplo clínico de abdome agudo vascular teríamos um paciente idoso, com dor abdominal
importante, mas difusa e mal-localizada, com distensão abdominal importante e, ao avaliar seus parâmetros
hidrodinâmicos, todos se mostram alterados. Muitas vezes, este paciente pode se apresentar em choque hipovolêmico.
Portanto, o choque que acontece precocemente na importância de um abdome agudo estabelece, praticamente,
o diagnóstico de abdome agudo vascular.

OBS4: Do ponto de vista diagnóstico, se fosse possível destacar dois pontos do exame físico essenciais para o diagnóstico do
abdome agudo vascular, teríamos: (1) a presença de sinais sistêmicos sugestivos de choque; e (2) presença de sangue no toque
retal.

Diagnóstico laboratorial.
Os exames laboratoriais só são necessários em caso de exame clínico duvidoso. São eles:
 Hemograma (leucositose, hematócrito)  Eletrólitos e glicemia (não contribui no diagnóstico)
 Amilase sérica (em 50% dos casos)  Dosagem de fosfato sérico
 Acidose metabólica (achado precoce e constante)  Dímero-D
 Enzimas de destruição tecidual

Radiografia simples de abdome.


 Fase inicial: diagnóstico de exclusão.
 Fase tardia:
 Distensão e edema de alças
 Presença de gás na parede intestinal, em ramos da v. porta e na cavidade peritonial

Arteriografia.
Consiste no exame padrão-ouro para o diagnóstico da isquemia mesentérica aguda na fase precoce. Deve ser
indicada para todo paciente com suspeita clínica antes da LE. Cada causa de isquemia apresenta achados
característicos:
Embolia arterial Trombose arterial Isquemia não-oclusiva
 Oclusão da AMS e seus ramos  Porção inicial da artéria  Tronco e ramos da artéria
 Colateral pobre mesentérica superior cheia de mesentérica superior normais
contraste  Múltiplas estenoses
 Tromboêmbolos  Oclusões segmentares
 Espasmo difuso
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Embora a arteriografia seja o exame ideal para identificar pacientes com isquemia mesentérica aguda na sua
fase inicial, a maioria dos pacientes já se encontra na fase avançada da doença. Por esta razão, considera-se que a
arteriografia seja um exame de importância irrelevante do ponto de vista diagnóstico do abdome agudo vascular.

LINHAS GERAIS DE TRATAMENTO


O tratamento do abdome agudo vascular se baseia em três princípios:
 Ressuscitação e tratamento de suporte
 Correção da causa vascular
 Ressecção do intestino necrosado

ABDOME AGUDO O BSTRUTIVO


O abdome agudo obstrutivo é aquele tipo de condição clínica caracterizada por dor abdominal decorrente de
uma obstrução intestinal, geralmente associada à parada de eliminação de gases e fezes. O sintoma cardinal no
abdome agudo obstrutivo é a cólica intestinal, demonstrando o esforço das alças para vencer o obstáculo que está
impedindo o trânsito intestinal normal.

EPIDEMIOLOGIA
 75% dos casos de obstrução intestinal são causadas por aderências entre alças, provenientes de cirurgias
abdominais prévias;
 15% dos pacientes submetidos à laparotomias serão admitidos em serviços de urgência com quadros
obstrutivos. Desses, 3% necessitarão de intervenção cirúrgica para lise das aderências;
 Aproximadamente, 40% dos pacientes laparotomizados vão apresentar quadro obstrutivo em 10 anos.
 A principal causa de obstrução no adulto são as bridas e aderências (pós-cirúrgicas), sendo também a principal
causa de obstrução no delgado. As hérnias parietais vêm logo em seguida.

ETIOLOGIA
 Causas abdominais:  Causas extra-abdominais:
 Obstrução pilórica;  Tabes dorsal
 Hérnia estrangulada;  Compressão da raiz nervosa
 Bridas;  Fibromialgia
 Áscaris;
 Corpos estranhos;
 Cálculo biliar;
 Volvo;
 Intussuscepção.
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QUADRO CLÍNICO E CARACTERÍSTICAS DA DOR


A dor é visceral, localizada em região periumbilical, nas obstruções de delgado, e hipogástrica, nas obstruções de cólon,
intercalada com períodos livres de dor no início da evolução. Os episódios de vômito surgem após a crise de dor, inicialmente
reflexos, e são progressivos, na tentativa de aliviar a distensão das alças obstruídas. O peristaltismo está aumentado, exacerbado, e é
chamado de peristaltismo de luta.
Este é mais bem caracterizado quando se ausculta o abdome no momento da crise dolorosa e se manifesta por uma cascata
de ruídos. Quanto mais alta for a obstrução, mais precoces, frequentes e intensos serão os vômitos, menor a distensão abdominal e
mais tardia a parada da eliminação de gases e fezes. Quanto mais baixa a obstrução, maior a distensão abdominal, mais precoce a
parada de eliminação de flatos e fezes, e, devido ao supercrescimento bacteriano no segmento obstruído, os vômitos, que são tardios,
adquirem aspecto fecaloide.
Febre normalmente não está presente. A desidratação é acentuada pelas perdas provocadas pelo vômito, sendo pior nas
obstruções mais altas.
Com o progredir da doença, ocorre o comprometimento da vascularização do segmento obstruído, surgindo irritação do
peritônio parietal, manifesta por dor somática, contínua e contratura da parede abdominal, o que geralmente indica sofrimento de alça.

DIAGNÓSTICO
Na abordagem inicial, mais importante do que diagnosticar a causa da obstrução, é responder a três questões:
se a obstrução é parcial ou completa, se é alta ou baixa e se há necrose ou não.
Obstrução alta Obstrução baixa
 Causa proximal à válvula íleo-cecal  Causa distal à válvula íleo-cecal
 Leucocitose  Leucocitose
 Febre  Febre
 Taquicardia  Taquicardia
 Dor abdominal, geralmente em cólica na região  Dor abdominal, geralmente em cólica. Dor na região
periumbilical (obstrução de delgado) hipogástrica (obstrução de cólon).
 Obstipação  Parada de eliminação de gases e fezes
 Náuseas  Náuseas prolongadas
 Vômitos precoces e frequentes  Vômitos mais tardios ou ausentes

Exame clínico.
Em resumo, o diagnóstico do abdome agudo obstrutivo é clínico.
 História clínica. Durante a anamnese, é importante tomar conhecimento sobre histórico de hérnia, cirurgia
prévia, presença de dor em cólica e parada na eliminação de gases, podendo ter vômitos ou não (a depender se
a obstrução é alta ou baixa). É necessário avaliar os seguintes fatores de evolução do abdome obstrutivo:
 Intensificação das cólicas
 Distensão abdominal mais acentuada
 Vômitos de característica fecaloide (obstrução baixa)
 Exame físico do abdome:
o Inspeção: Abdome distendido: sugere obstrução do intestino delgado; Peristalse visível: sugere obstrução intestinal
avançada e traduz luta intestinal. Portanto, a inspeção é um passo importante para o diagnóstico do abdome agudo
obstrutivo, assim como é importante para abdome agudo vascular, mas diferentemente do abdome agudo
inflamatório (em que a inspeção é pouco significativa).
o Ausculta: deve sempre ser realizada antes da palpação. Diferentemente das demais modalidades de abdome
agudo, a ausculta é essencial para o diagnóstico de abdome agudo obstrutivo.
 Ruídos hidroaéreos aumentados nas crises dolorosas (se manifestam como uma cascata de ruídos);
 Ruídos peristálticos sincrônicos: parte média da obstrução do intestino delgado;
 Ruídos hiperativos (borborigmos) e de timbre metálico podem estar presentes na fase inicial.
o Palpação: deve ser realizada com o paciente em repouso, confortável e em decúbito dorsal. É necessário observar
hérnias incisionais e periumbilicais; espasmo involuntário que caracteriza o abdome em tábua; Hipersensibilidade
pequena e vaga sugere obstrução não-complicada de vísceras ocas. De um modo geral, a maior importância da
palpação na avaliação do abdome agudo obstrutivo se faz no achado de dor à palpação difusa, indicativo de
necrose de alça intestinal.
o Percussão: timpanismo acentuado: quando próximo à linha média indica ar aprisionado dentro das alças intestinais
distendidas.
 Exame proctológico: o toque retal deve ser realizado na maioria dos pacientes com abdome agudo devido à
hipersensibilidade difusa ser inespecífica. A ausência de fezes ao toque retal é o sinal propedêutico mais
importante que justifica a importância do exame proctológico, indicando ampola retal vazia.

OBS5: Em resumo, o achado de distensão abdominal à inspeção é um sinal semiológico importante para o diagnóstico clínico de
abdome agudo obstrutivo; contudo, a ausência deste sinal não exclui a possibilidade do seu diagnóstico. Outro elemento semiológico
importante para seu diagnóstico é a peristalse visível (mas o que não é frequentemente possível na prática médica). Contudo, sem
dúvida alguma, a ausculta abdominal é o passo propedêutico mais importante para o diagnóstico do abdome agudo obstrutivo,
diferentemente das demais modalidades. Através dela, podemos identificar ruídos metálicos e ruídos hidroaéreos aumentados.
Contudo, a ausência deste padrão de ausculta também não exclui o diagnóstico de abdome agudo obstrutivo. O timpanismo à
percussão também é um aspecto semiológico importante na propedêutica diagnóstica do abdome agudo obstrutivo, justificando a
distensão de alças intestinais. Podemos encontrar também o sinal de dor à palpação abdominal difusa, caracterizando necrose de
alça intestinal.
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OBS6: Existe mais um elemento que, somado a todos os outros apresentados na OBS5, confirma o diagn‡stico de abdome
agudo obstrutivo: presen€a de sinais sistêmicos sugestivos de choque, que pode confirmar a presen€a de necrose de al€a
intestinal e a repercuss•o hemodin…mica. Este achado tamb‚m ‚ comum no abdome agudo vascular. Contudo, enquanto que
no abdome agudo obstrutivo h† um tempo de evolu€•o mais prolongado para a instala€•o da necrose, o vascular ‚
caracterizado pela instala€•o r†pida da necrose (de 6 – 12 horas, evoluindo para um quadro mais grave).

Personificando um exemplo cl„nico cl†ssico de abdome obstrutivo, seria aquele paciente com distens•o
abdominal, parada na elimina€•o de fezes, com ou sem vŒmitos, com dor tipo c‡lica e toque retal demonstrando
ausƒncia de fezes na ampola retal. Todos estes achados estabelecem o diagn‡stico cl„nico de abdome agudo obstrutivo.

Exames laboratoriais.
Os exames laboratoriais s•o inespec„ficos, prestando-se mais para avaliar as condi€‰es cl„nicas do paciente,
al‚m de orientar a corre€•o dos distŠrbios hidroeletrol„ticos e metab‡licos. De um modo geral, os objetivos dos exames
laboratoriais s•o:
 Complementar a impress•o cl„nica;
 Contribuir para determinada hip‡tese diagn‡stica;
 Avaliar o estado geral do doente;
 Caracterizar a existƒncia de infec€•o;
 Intensidade de um sangramento;
 Refletir as repercuss‰es sistƒmicas.

 Hemograma:
 Fornece informa€‰es sobre ocorrƒncia de anemia e suas caracter„sticas;
 Fornece evidƒncias da gravidade atual ou potencial de um abdome agudo;
 Solicitado mais de uma vez, no decorrer do quadro de abdome agudo, para avaliar a evolu€•o do processo
patol‡gico.
 Exames de urina:
 Pode revelar informa€‰es Šteis;
 Presen€a de bilirrubina: processo obstrutivo de vias biliares;
 Hiperbilirrubinemia: urina com cor de ch† que produz espuma quando agitada;
 HematŠria: pode indicar presen€a de c†lculos urin†rios.
 Exame de fezes:
 Sangramento gastrintestinal n•o ‚ comum em abdome agudo;
 Exame de sangue oculto nas fezes devem ser realizados;
 Teste positivo: indica les•o de mucosa que pode ser respons†vel pela obstru€•o do intestino grosso.
 Hiperamilasemia: pode indicar obstru€•o intestinal;
 Outros exames: coagulograma, eletr‡litos s‚ricos, creatinina;

Exames de imagem.
Os exames de imagem devem responder as seguintes perguntas: Existe obstru€•o? Qual o n„vel que ocorre?
Qual a etiologia? H† estrangulamento?
 Radiografia simples do tórax:
 Avalia€•o pr‚-operat‡ria;
 Condi€‰es supradiafragm†ticas que simulam abdome agudo.

 Radiografia simples do abdome:


 Incidƒncias: Ortost†tica e decŠbito lateral sugerem obstru€•o intestinal;
 As principais altera€‰es: Distens•o das al€as e presen€a de n„veis hidroa‚reos; Aerobilia; Opacidade;
Cole€‰es abscessos; Presen€a de corpos estranhos.
 Distens•o gasosa ‚ a regra nas obstru€‰es e sugere „leo paral„tico, obstru€•o intestinal mec…nica e/ou
pseudo-obstru€•o. Quanto mais dilatada a al€a mais distal a obstru€•o intestinal;
 Contra-indica€‰es: Gr†vidas; Pacientes Inst†veis (laparotomia obrigat‡ria); Dor inespec„fica e branda.

 Radiografia com contraste (exame de trânsito intestinal):


 N•o faz parte da rotina diagn‡stica, pois s‡ ‚ solicitado apenas em condi€‰es espec„ficas: em caso de
dŠvida diagn‡stica. Deve ser feito com contraste hidrossolŠvel (com iodo).
 Na ausƒncia de evidencia cl„nica de perfura€•o intestinal, solicitar Enema Baritado para identificar o
n„vel de obstru€•o do intestino grosso ou reduzir um v‡lvulo de sigmoide.
 Tr…nsito intestinal: ‚ poss„vel identificar al€as intestinais dilatadas, com dilui€•o e lentid•o da progress•o
do meio de contraste mudan€a abrupta do calibre e do relevo mucoso. Em bridas, observam-se al€as
regulares afilando-se progressivamente; Em neoplasias, observam-se contornos irregulares e
assim‚tricos.
 Contra-indica€‰es: suspeita de perfura€•o intestina e estrangulamento de al€a.

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OBS : De modo especial, devemos destacar a import…ncia da radiografia para o diagn‡stico de abdome agudo
obstrutivo. Ela chega a configurar o exame mais importante para seu diagn‡stico. Por meio deste simples exame,
podemos confirmar todos os achados cl„nicos. Sua f†cil disponibilidade eleva ainda mais seu valor propedƒutico. Os
sinais radiogr†ficos mais importantes para o diagn‡stico s•o: n„veis hidroa‚reos, distens•o gasosa de al€a, sinal de
empilhamento de moedas (decorrente do edema de mucosa intestinal), etc. Estes sinais surgem devido ‹ presen€a de
um obst†culo mec…nico ‹ progress•o do bolo fecal em n„vel intestinal (o que nos remete ao fato de que, no „leo
paral„tico, estes sinais n•o est•o presentes, estabelecendo o diagn‡stico diferencial).
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OBS : ˆ importante ressaltar que, em um indiv„duo normal, n•o ‚ comum a presen€a de ar (‹ radiografia simples) em
al€as do intestino delgado. O ar s‡ deve estar presente no estŒmago (bolha g†strica) e no c‡lon (devido ‹ presen€a de
bact‚rias produtoras de gases). A ausƒncia de ar no intestino delgado ‚ explicada pela r†pida passagem deste elemento
gasoso deglutido em dire€•o ao c‡lon gra€as ‹ eficiência do peristaltismo, impossibilitando a sua visualiza€•o ‹
radiografia. Portanto, a presen€a de ar no intestino delgado ‚ sinŒnimo de algum fator que promova uma resistƒncia ao
peristaltismo ou que obstrua a passagem do conteŠdo intestinal.

Radiografia simples de abdome mostrando volvo de sigmoide. O c‡lon sigmoide


encontra-se dilatado e delimitado por linhas convergentes (paredes) para um ponto
Šnico (tor€•o mesent‚rica), com densidade de partes moles na pelve, determinando
cl†ssico “padr•o em gr•o de caf‚” ou em “U invertido”.

Obstru€•o baixa por adenocarcinoma de sigmoide. Radiografia do abdome em …ntero-


posterior, decŠbito dorsal. Observa-se dilata€•o acentuada do ceco/ascendente (seta
branca) e do transverso (ponta da seta branca). O reto cont‚m pequena quantidade de
g†s (ponta da seta negra).

Enema opaco mostrando acometimento do c‡lon sigmoide por divert„culos. Nota-se a


grande altera€•o da anatomia tubular o intestino resultante da presen€a dos
divert„culos, inflama€•o, espessamento da parede e redu€•o do calibre (c„rculo).

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 Ultrassonografia: Para o abdome agudo obstrutivo, a USG tem pouco valor diagn‡stico, principalmente devido
‹ presen€a abundante de g†s na via digestiva. As suas principais indica€‰es s•o:
 Na obstru€•o intestinal sem grande distens•o;
 Na suspeita de invagina€•o intestinal;
 Pode contribuir mostrando a imagem de “pseudo-rim”.

 Tomografia Computadorizada:
 Melhor qualidade diagn‡stica;
 Aprimorada com uso de contraste oral e venoso;
 Avalia€•o panor…mica de toda cavidade abdominal (outros diagn‡sticos);
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 ˆ um bom exame para avalia€•o de estrangulamento de al€a (ver OBS );
 Util na diferencia€•o de oclus•o mec…nica e „leo paral„tico (dilata€•o de al€as sem despropor€•o).
 Diferen€a em obstru€•o mec…nica e „leo paral„tico: Na mec…nica h† maior dilata€•o de al€as, maior
evidƒncia de n„veis hidroa‚reos, e “empilhamento de moedas”.

Obstru€•o intestinal por bridas: (A) distens•o de al€as do


delgado (setas); (B) zona de transi€•o de calibre de al€a de
„leo distal (local da obstru€•o).

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OBS : Embora a TC seja um bom exame para avaliar a presen€a de al€a estrangulada, a melhor forma de identificar
esta situa€•o (que caracteriza uma condi€•o de urgƒncia m‚dica) ‚, de fato, o exame f„sico. Por meio dele, devemos
atentar para uma palpa€•o dolorosa difusa com defesa abdominal, toque retal com sangue e presen€a de sinais
sistƒmicos de choque. Por esta raz•o, a requisi€•o de TC para fins diagn‡sticos de estrangulamento de al€a ‚
praticamente invi†vel diante da import…ncia propedƒutica do exame f„sico nestas situa€‰es.

 Endoscopia. Quase nunca ‚ solicitada para um paciente com abdome agudo obstrutivo.
o Proctossigmoidoscopia: indicada em qualquer paciente com suspeita de obstruۥo do intestino grosso,
fezes com sangue macrosc‡pico e massa retal;
o Colonoscopia: na verdade, s‡ possui uma import…ncia: pode reduzir um volvo de sigmoide atrav‚s de
descompress•o mec…nica terapƒutica. N•o tem, contudo, import…ncia diagn‡stica.

 Videolaparoscopia. Inicialmente, h† indica€•o de laparotomia formal em pacientes com obstru€•o intestinal por
aderƒncia. Contudo os cirurgi‰es devem adquirir novas habilidades laparosc‡picas para lidar com essas
condi€‰es intra-abdominais agudas, uma vez que a distens•o de al€as limita a manipula€•o das pin€as
laparosc‡picas, sob o risco de aumentar a morbidade do paciente por perfura€•o de al€a. A principal import…ncia
da videolaparoscopia ‚ a possibilidade de diferenciar uma obstru€•o intestinal simples de uma obstru€•o
estrangulada, permitindo um melhor planejamento do tipo cirŠrgico a ser feito.

LINHAS GERAIS DE TRATAMENTO


O tratamento do abdome agudo obstrutivo inicialmente ‚ cl„nico, com descompress•o g†strica atrav‚s de sonda
nasog†strica, hidrata€•o venosa vigorosa e antibi‡tico de largo espectro. Nos casos de obstru€•o parcial, ocorre
melhora em 75% dos casos em 24h apenas com tratamento cl„nico, indicando-se cirurgia se n•o ocorrer melhora ap‡s
48h. Nos casos de obstru€•o completa, o tratamento cl„nico prepara o paciente para a cirurgia, que deve ser imediata,
principalmente se h† sinais de estrangulamento de al€a.
Independente do grau de obstru€•o, o achado de sinais sistƒmicos sugestivos de choque indica, fortemente, a
presen€a de necrose de al€a intestinal, sendo esta uma indica€•o absoluta de interven€•o cirŠrgica.
As medidas de controle pr‚-operat‡rio s•o:
 Analg‚sicos parenterais para al„vio da dor
 Sonda nasog†strica em pacientes prov†veis de serem operados e naquele com hematƒmese ou vŒmito copioso.
 Sonda urin†ria em paciente com hipoperfus•o sistƒmica
 Autoriza€•o informada para opera€•o
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ABDOME AGUDO PERFURATIVO


O abdome agudo perfurativo consiste na condi€•o dolorosa aguda do abdome secund†ria a perfura€‰es por
processos de natureza traum†tica, inflamat‡ria ou neopl†sica do trato gastrointestinal ou, ent•o, decorrente da ingest•o
de corpos estranhos.

ETIOLOGIA
O abdome agudo perfurativo ‚ considerado uma das causas mais frequentes de cirurgia abdominal de urgƒncia.
Suas principais causas s•o:
 “lcera p‚ptica (causa mais comum)  Ameb„ase
 Neoplasia gastro-intestinal perfurada  Divert„culos do c‡lon
 Febre tifoide  Perfura€•o de v„sceras

FISIOPATOLOGIA
De forma resumida, a sua fisiopatologia est† relacionada com a perfura€•o visceral decorrente de inflama€•o
crŒnica do trato digestivo, de les•o por corpos estranhos ou por les•o neopl†sica. Esta perfura€•o causa
extravasamento de secre€•o e, posteriormente, peritonite qu„mica. Em cerca de 12 horas, a peritonite qu„mica torna-se
bacteriana, aparecendo sinais de infecۥo.

QUADRO CLÍNICO E CARACTERÍSTICAS DA DOR


A dor tem início súbito, geralmente dram†tico, j† come€ando de forma intensa e difusa (embora tamb‚m
possa ser localizada), rapidamente atingindo seu pico. O seu in„cio sŠbito diferencia este quadro doloroso do
apresentado pelo abdome agudo inflamat‡rio. Geralmente, a dor exprime um car†ter t•o alarmante que faz com que o
paciente busque, imediatamente, ajuda m‚dica.
Os pacientes costumam saber, precisamente, a hora exata do in„cio do sintoma. O problema adv‚m do
extravasamento de secre€•o contida no trato gastrointestinal para a cavidade peritoneal, o que ‚ traduzido por
peritonite.
A dor tipo som†tica ‚ decorrente da irrita€•o qu„mica do peritŒnio, sendo que, quanto menor o pH, maior a
irrita€•o. Tanto ‚ que, o exame cl„nico demonstra silƒncio abdominal e rigidez muscular involunt†ria. A temperatura ‚
normal, e n†usea e vŒmito podem estar presentes.

DIAGNÓSTICO

Exame clínico.
 História clínica: durante a anamnese, ‚ importante questionar sobre: Identifica€•o do paciente; Queixa
principal; Manifesta€‰es cl„nicas mais importantes; Hist‡ria pr‚via de Šlceras p‚pticas, neoplasias; Opera€ao
Abdominal previa; Uso de medicamentos (especialmente anti-inflamat‡rios).
 Exame físico:
o Inspeção: presen€a de abaulamentos ou retra€‰es.
o Palpação: dor ‹ palpa€•o superficial e profunda de todo o abdome, resistƒncia abdominal involunt†ria
(abdome “em t†bua”).
o Ausculta: RHA diminu„dos ou ausentes (silƒncio abdominal).
o Percussão: ausƒncia de macicez hep†tica e timpanismo no hipocŒndrio direito (sinal de Jobert).
10
OBS : Do ponto de vista cl„nico, os sinais f„sicos mais importantes para o diagn‡stico do abdome agudo perfurativo ‚ o
abdome em t†bua ‹ inspe€•o e o sinal de Jobert ‹ percuss•o. Contudo, a ausƒncia destes sinais n•o exclui o
diagn‡stico desta situa€•o. De outro ponto de vista, a presen€a do sinal de Jobert n•o ‚ um sinal patognomŒnico do
abdome agudo perfurativo: podemos encontrar situa€‰es em que o c‡lon distendido invade a regi•o do hipocŒndrio
direito, interpondo-se entre o f„gado e a parede abdominal, simulando um hipertimpanismo nesta regi•o (e, desta forma,
ao inv‚s de sugerir o diagn‡stico de abdome agudo perfurativo, remete ‹ suspeita de abdome agudo obstrutivo).
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OBS : Portanto, o sinal de Jobert n•o ‚ espec„fico para abdome agudo perfurativo. Diferentemente do achado de
abdome em t†bua ‹ inspe€•o – logicamente, se este achado estiver associado ao quadro doloroso, de origem sŠbita e
intensa.

Exames de imagem.
 Radiografia simples de abdome e tórax. Pode ser considerado o exame complementar ‹ cl„nica mais
importante para diagn‡stico de abdome agudo perfurativo. Ele revela pneumoperitŒnio, sendo o exame de
imagem de escolha.
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Arlindo Ugulino Netto – CIRURGIA ABDOMINAL– MEDICINA P7 – 2010.2

Radiografia de tórax mostrando pneumoperitônio facilmente identificado em cúpula


diafragmática direita e, em menor proporção, na esquerda.

 Ultrassonografia: pode ser dificultado devido à presença de ar na cavidade abdominal.

 Tomografia: pode não ser mais importante que a radiografia de abdome no caso de abdome agudo perfurativo.

Exame laboratorial.
Os exames laboratoriais de nada valem para confirmar o diagnóstico de abdome agudo perfurativo, uma vez que
a maioria dos exames são pouco específicos. De qualquer forma, dispomos:
 Leucograma  Transaminases
 Dosagem de ureia  Amilase
 Creatinina  Coagulograma
 Eletrólitos  Contagem de plaquetas
 Gasometria arterial  Exame de urina.
 Bilirrubina

TRATAMENTO
As perfurações viscerais costumam ser divididas em altas (gastroduodenal e delgado proximal), e baixas
(delgado distal e cólon). Para todas elas, de uma forma geral, o tratamento é cirúrgico, através da rafia (síntese) simples
da perfuração ou da ressecção da víscera (realizando anastomose primaria ou estomia, logo depois).
O retardo no tratamento, a idade avançada e as doenças sistêmicas associadas contribuem para a maioria das
mortes. Portanto, o prognóstico é tanto pior quanto maior o tempo de perfuração.

ABDOME AGUDO HEMORR‰GICO


O abdome agudo hemorrágico é caracterizado pela dor decorrente da ruptura de vísceras abdominais. A ruptura
espontânea de vísceras parenquimatosas e a ruptura vascular não são situações comuns, sendo o abdome agudo
hemorrágico mais frequentemente associado ao trauma, pós-operatório e complicações pós-procedimentos (biópsias
hepáticas, por exemplo).

ETIOLOGIA
 Gravidez ectópica rota;
 Ruptura espontânea de vísceras parenquimatosas (baço, fígado, etc.);
 Ruptura vascular espontânea (ruptura de aneurisma de aorta abdominal);
 Cisto ovariano hemorrágico;
 Necrose tumoral;
 Endometriose;
 Pós-operatório.

QUADRO CLÍNICO E CARACTERÍSTICAS DA DOR


Nos quadros de abdome agudo hemorrágico, além da dor súbita, chama a atenção o rápido comprometimento
hemodinâmico, com palidez intensa e hipovolemia acentuada. Apesar da forte dor, não se encontra contratura muscular
no hemoperitônio. Os exames mostram queda progressiva dos níveis hematimétricos.
A ruptura de aneurisma de aorta abdominal acomete geralmente pacientes idosos do sexo masculino, população
na qual a incidência do aneurisma é maior. A aterosclerose é a causa principal, mas trauma, infecção (sífilis) e arterites
são causas possíveis. A sede mais comum do aneurisma é a aorta abdominal, estando quase todos abaixo das artérias
renais. O risco de ruptura aumenta com o tamanho do aneurisma, sendo baixo nos inferiores a 5 cm (50% dos
aneurismas que atingem 6 cm se rompem em 1 ano).

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Arlindo Ugulino Netto – CIRURGIA ABDOMINAL– MEDICINA P7 – 2010.2

A apresenta€•o cl†ssica ‚ a dor abdominal difusa, intensa, associada a hipotens•o e massa abdominal puls†til.
Antes da ruptura, o aneurisma passa por um processo de distens•o aguda (dito expans•o), o que leva ao estiramento do
plexo nervoso perivascular, gerando dor intensa nos flancos ou no dorso.

DIAGNÓSTICO
O local mais comum de ruptura ‚ no retroperitŒnio, e o hematoma que se forma cont‚m a hemorragia por
algumas horas. O diagn‡stico do abdome agudo hemorr†gico pode ser confirmado com a associa€•o entre os achados
clínicos (principalmente, sinais sistƒmicos, como os sinais de hipovolemia) e a ultrassonografia.
Contudo, diante da suspeita cl„nica, n•o ‚ necess†rio realizar exames, indicando-se laparotomia imediata
(“nenhum paciente com aneurisma roto pode sobreviver se n•o for operado”).

LINHAS GERAIS DE TRATAMENTO


Antes do tratamento, ‚ sempre importante ponderar a possibilidade de gravidez ect‡pica rota na mulher em
idade f‚rtil. O tratamento ‚ a cirurgia imediata, mas a arteriografia pode ser terapƒutica.
A mortalidade p‡s-operat‡ria atinge 50%, e complica€‰es comuns s•o insuficiƒncia renal aguda, isquemia
colŒnica e isquemia de membros inferiores.

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Arlindo Ugulino Netto – CIRURGIA ABDOMINAL– MEDICINA P7 – 2010.2

MED RESUMOS 2012


NETTO, Arlindo Ugulino.
CIRURGIA ABDOMINAL _________

APENDICITE

Apendicite é uma inflamação do apêndice intestinal, uma bolsa em forma de verme do intestino grosso. A
apendicite é a emergência cirúrgica mais comum, e a intervenção cirúrgica precoce melhora seus resultados. Cerca de
8% das pessoas nos países ocidentais têm apendicite em algum momento de suas vidas, com uma incidência máxima
entre 10 e 30 anos.

EMBRIOLOGIA E ANATOMIA
O apêndice, o íleo e o cólon ascendente derivam todos do intestino médio. O apêndice aparece primeiro na 8ª
semana de gestação como uma bolsa para fora do ceco e gradualmente gira para uma localização mais medial. A artéria
apendicular, um ramo da artéria ileocólica, supre o apêndice. O exame histológico do apêndice indica que a sua
submucosa apresenta folículos linfoides, o que leva à especulação de que o apêndice deve ter uma função imunológica
importante, ainda que indefinida, no início do desenvolvimento. Em adultos, o apêndice não tem nenhuma função
conhecida.

O comprimento do apêndice varia de 2 a 20cm, e o comprimento médio em adultos é de 9cm. A base do


apêndice localiza-se na convergência da tênia ao longo da face inferior do ceco, e essa relação anatômica facilita a
identificação do apêndice na cirurgia. A ponta do apêndice, entretanto, pode situar-se em uma variedade de locais: a
localização mais comum é retrocecal, mas dentro da cavidade peritoneal. Ela é pélvica em 30% e retroperitoneal em 7%
da população.

HIST†RICO
Em 1996, Reginald Fitz, de Boston, identificou corretamente o
apêndice como a causa primária de inflamação no quadrante inferior
direito. Ele cunhou o nome apendicite e recomendou tratamento cirúrgico
precoce da doença. Richard Hall relatou a primeira sobrevivência de um
paciente após a remoção de um apêndice perfurado.
Em 1889, Chester McBurney descreveu dor migratória
característica, bem como localização ilíaca da dor ao longo de uma linha
oblíqua a partir da espinha ilíaca superior anterior até o umbigo.
McBurney descreveu uma incisão que divide o músculo no quadrante
inferior direito para retirada do apêndice em 1894.
A taxa de mortalidade da apendicectomia diminui drasticamente
com o uso de antibióticos de amplo espectro na década de 1940. A
apendicectomia laparoscópica foi relatada primeiro pelo ginecologista Kurt
Semm, em 1982, mas só ganhou aceitação ampla nos últimos anos.

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FISIOPATOLOGIA
Acredita-se que a obstrução da luz do apêndice seja a principal causa de apêndice aguda. Isso pode dever-se a
fazes espessadas (fecalito e apendicolito), hiperplasia linfoide, matéria vegetal ou sementes, parasitos ou uma
neoplasia. A luz do apêndice é pequena com relação a seu comprimento, e essa configuração pode predispor a
obstrução de alça fechada.
A obstrução da luz apendicular contribui para o supercrescimento bacteriano, e a secreção continuada de muco
causa distensão intraluminal e maior pressão da parede. A distensão luminal produz a sensação de dor visceral
experimentada pelo paciente como dor periumbilical. O dano subsequente da drenagem venosa e linfática leva à
isquemia mucosa. Esses achados em combinação promovem um processo inflamatório localizado que pode evoluir para
gangrena e perfuração. A inflamação do peritônio adjacente dá origem à dor localizada no quadrante inferior direito.
Raramente, ocorre perfuração livre do apêndice na cavidade peritoneal, que pode ser acompanhada de peritonite e
choque séptico.

MICROBIOLOGIA
A flora no apêndice normal é muito semelhante à do cólon, com uma variedade de bactérias aeróbicas e
anaeróbicas facultativas. A natureza polimicrobaiana da apendicite perfurada está bem estabelecida: Escherichia coli,
Streptococcus viridians e espécies de Bacteroides e Pseudomonas são frequentemente isolados.

DIAGN†STICO
O diagnóstico da apendicite deve se basear nos seguintes pilares:
 História clínica
 Exame físico
 Estudos laboratoriais
 Estudos por imagem
 Laparoscopia diagnóstica

HISTÓRIA CLÍNICA
A apendicite precisa ser considerada no diagnóstico diferencial de quase todo paciente com dor abdominal
aguda. No caso da apendicite, a apresentação típica começa com dor epigástrica e/ou periumbilical (decorrente da
ativação dos neurônios aferentes viscerais gerais), seguida por anorexia e náusea. A dor localiza-se, então, no
quadrante inferior direito conforme o processo inflamatório evolui para envolver o peritônio parietal sobrejacente do
apêndice. Esse padrão clássico de dor migratória é o sintoma mais confiável de apendicite aguda.
Surge febre, seguida pelo desenvolvimento de leucocitose. Essas características clínicas podem variar. Por
exemplo, nem todos os pacientes tornam-se anoréxicos. Embora a maioria dos pacientes com apendicite desenvolva um
íleo adinâmico e ausência de movimentos intestinais no dia da apresentação, pacientes ocasionais podem ter diarreia.
Outros podem apresentar-se com obstrução do intestino delgado relacionada com a inflamação regional contígua.

EXAME FÍSICO
Os pacientes com apendicite aguda tipicamente parecem doentes e ficam restritos ao leito. É comum febre alta
(~38ºC). O exame do abdome revela sons intestinais reduzidos e sensibilidade focal com retraimento voluntário. A
localização exata da sensibilidade é diretamente sobre o apêndice, que é mais comumente no ponto de McBurney
(localizado a um terço da distância ao longo da linha traçada da espinha ilíaca superior anterior até o umbigo).
A irritação peritoneal pode ser desencadeada no
exame físico pelos achados de retraimento voluntário e
involuntário, percussão, ou sensibilidade de rebote.
Qualquer movimento, inclusive tosse (sinal de Dunphy),
pode causar aumento da dor. Outros achados podem
incluir dor no quadrante inferior direito durante a palpação
do quadrante inferior esquerdo (sinal de Rovsing), dor
com rotação interna do quadril (sinal do obturador,
sugerindo um apêndice pélvico) e dor na extensão do
quadril direito (sinal do iliopsoas, típico de um apêndice
retrocecal).
Caso o apêndice perfure, a dor abdominal torna-se
intensa e mais difusa, e o espasmo muscular abdominal
aumenta, produzindo rigidez. O paciente pode parecer
doente e exige um breve período de ressuscitação com
líquido e antibióticos antes da indução anestésica.

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ESTUDOS LABORATORIAIS
A contagem de leucócitos é elevada, com mais de 75% de neutrófilos na maioria dos pacientes. Uma contagem
de leucócitos completamente normal e diferencial é encontrada em cerca de 10% dos pacientes com apendicite aguda.
Uma contagem de leucócitos alta (> 20000/ml) sugere apendicite complicada com gangrena e perfuração. A urinálise
pode também ser útil na exclusão da pielonefrite ou nefrolitíase.

ESTUDOS RADIOLÓGICOS
O uso indiscriminado de radiografia simples de abdome na
avaliação dos pacientes com dor abdominal aguda é injustificado, pois
em raríssimos casos, sugerem ou alteram o diagnóstico. Elas podem
ser uteis para a detecção de cálculos ureterais, obstrução do intestino
delgado ou úlcera perfurada, mas tais condições raramente são
confundidas com apendicite.
Entre os pacientes com dor abdominal, a ultrassonografia tem
uma sensibilidade de cerca de 85% e uma especificidade de mais de
90% para o diagnóstico de apendicite aguda. Os achados sonográficos
compatíveis com apendicite aguda incluem um apêndice de 7mm ou
mais no diâmetro ântero-posterior, uma estrutura luminal não
compreensível e de parede espessada vista em secção cruzada, sendo
comumente referida como lesão em alvo, ou a presença de um
apendicolito. A ultrassonografia tem vantagens de ser uma modalidade
não invasiva que não exige preparação do paciente e que evita
exposição à radiação ionizante. As desvantagens da ultrassonografia
incluem acurácia dependente do operador e dificuldade na
interpretação das imagens por outros que não o operador.
A tomografia computadorizada (TC) é comumente usada na avaliação de pacientes adultos com suspeita de
apendicite aguda. Técnicas melhoradas de imagem, incluindo o uso de cortes de 5mm, têm resultado em maior acurácia
da TC, que tem uma sensibilidade de cerca de 90% e uma especificidade de 80 a 90% para o diagnóstico de apendicite
aguda entre pacientes com dor abdominal. Achados clássicos incluem um apêndice distendido com mais de 7mm de
diâmetro e espessamento circunferencial da parede, que pode dar a aparência de um halo ou alvo. Conforme a
inflamação evolui, pode-se ver gordura periapendicular retorcida, edema, líquido peritoneal, fleimão ou abscesso.

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Entretanto, no quadro de dor no quadrante inferior direito típica e sensibilidade com sinais de inflamação em um
paciente jovem, a TC é desnecessária, despende tempo valioso e expõe o paciente aos riscos de reação alérgica ao
contraste, nefropatia, pneumonite por aspiração e radiação ionizante. Além disso, a morbidade da apendicite aguda
excede muito aquela de uma apendicectomia negativa. Assim, a estratégia tem sido estabelecer um limiar baixo o
suficiente para remoção do apêndice de modo a minimizar os casos de apêndices esquecidos.

LAPAROSCOPIA DIAGNÓSTICA
Embora a maioria dos pacientes com apendicite venha a ser acuradamente diagnosticada com base na história,
exame físico, estudos laboratoriais e, se realmente necessário, técnicas de imagem, existe um pequeno número no qual
o diagnóstico permanece indefinível. Para esses pacientes, a laparoscopia diagnóstica pode proporcionar tanto um
exame direto do apêndice como uma pesquisa da cavidade abdominal para outras possíveis causas de dor.

DIAGN†STICOS DIFERENCIAIS
O diagnóstico diferencial da apendicite pode incluir quase todas as causas de dor abdominal. Tanto é que, uma
regra útil, é sempre lembrar da apendicite como uma das primeiras hipóteses diagnósticas a serem excluídas em caso
de pacientes com abdome agudo. Entretanto, o diagnóstico de apendicite é particularmente difícil na pessoa muito jovem
e no idoso.
 Em neonatos, achados não focais como letargia, irritabilidade a anorexia podem estar presentes nos estádios
iniciais, com vômito, febre e dor aparente conforme a doença evolui. O ultrassom é útil na avaliação de
apendicite e outras emergências abdominais agudas, como estenose pilórica, em neonatos.
 Em crianças idade pré-escolar, o diagnóstico diferencial inclui intuscepção, diverticulite de Meckel e
gastroenterite aguda. A intuscepção pode ser diferenciada pela natureza em cólica da dor, com períodos sem
dor, e ausência de peritonite. A diverticulite de Meckel é relativamente incomum, mas sua apresentação dolorosa
localiza-se, tipicamente, na região periumbilical. Na gastroenterite, a sensibilidade abdominal focal e sinais
peritoneais são incomuns.
 Em crianças em idade escolar, a gastroenterite em geral apresenta-se com dor abdominal e diarreia sem febre
ou leucocitose. O mais comum simulador de apendicite nessa população é a linfadenite mesentérica, que pode
ser causada por uma ampla variedade de infecções entéricas. A ultrassonografia pode ser útil na identificação de
linfonodos aumentados na região do mesentério ileal, em conjunto com espessamento da parede ileal e um
apêndice normal. A doença inflamatória intestinal também é considerada em crianças, particularmente, se existir
uma história de episódios recidivantes de dor abdominal.
 Em adultos, é importante considerar outras condições inflamatórias regionais, como pielonefrite, colite e
diverticulite. A dor e a sensibilidade da pielonefrite são tipicamente localizadas no flanco e são acompanhadas
por febre e contagem de leucócitos alta, bem como por piúria. A colite em geral é acompanhada de diarreia, e a
localização da dor tipicamente esboça a trajetória do cólon. O início da diverticulite do lado direito é tipicamente
insidioso, piorando em um período de dias, e envolve uma área maior do abdome inferior direito do que a
apendicite. A TC é útil para identificar os divertículos inflamados e o aumento do espessamento da parede cecal
que acompanhada esse diagnóstico.
 O diagnóstico diferencial de apendicite em mulheres em seus anos reprodutivos é amplo e responde pela
incidência mais alta de diagnósticos falso-positivos nesse grupo. A patologia pélvica que pode imitar a apendicite
aguda inclui doença inflamatória pélvica (DIP), abscessos tubo-ovarianos, cisto do ovário rompido ou torção
ovariana e gravidez ectópica, entre outros. Essas condições são tipicamente distinguidas da apendicite aguda
pela ausência de sintomas gastrointestinais. O ultrassom pélvico é especialmente útil nessas pacientes devido
às suas altas sensibilidade e especificidade para o diagnóstico de patologia pélvica. Se um apêndice normal
também for visto, é improvável a apendicite.
 A apendicite no idoso pode ser difícil de diagnosticar porque muitos pacientes demoram em procurar assistência
e apresentam-se de forma atípica. Febre é incomum, a contagem de leucócitos pode ser normal e muitos
pacientes idosos com apendicite não experimentam dor no quadrante inferior direito. Por esta razão, a TC
tornou-se uma ferramenta valiosa na avaliação de dor abdominal entre pacientes idosos e seu uso encurtou a
protelação pré-operatória.

ALGORITMO DIAGN†STICO
Os pacientes nos quais o diagnóstico de apendicite está sendo considerado, devem passar uma avaliação
cirúrgica: médicos experientes diagnosticam apendicite acuradamente com base em uma combinação de anamnese,
exame físico e estudos laboratoriais em cerca de 80% das vezes.
Os pacientes com alta probabilidade de apendicite não complicada submetem-se à cirurgia. Os pacientes com
suspeite de ter abscesso apendicular submetem-se a estudos por imagem adicionais, tipicamente ultrassonografia para
crianças ou TC para adultos.

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A etapa seguinte na avalia€•o dos pacientes nos quais se acredita que a probabilidade de apendicite ‚ baixa, ‚
determinada pela probabilidade e gravidade dos diagn‡sticos alternativos sob considera€•o. Muitos desses pacientes
receber•o alta com uma visita de acompanhamento planejada ou telefonema no dia seguinte. A maioria dos pacientes
idosos com dor abdominal submete-se a TC antes da alta em fun€•o das altas taxas de prevalƒncia de patologia
cirŠrgica nessa popula€•o de pacientes.
Acredita-se que os pacientes restantes tƒm uma probabilidade intermediária de ter apendicite. As mulheres em
idade reprodutiva podem submeter-se a ultrassonografia p‚lvica ou TC dependendo do grau de suspei€•o da patologia
p‚lvica. Ap‡s os estudos de imagem serem completados, o paciente ‚ reexaminado para determinar se a dor e a
sensibilidade se localizaram no quadrante inferior direito. Se o diagn‡stico continuar incerto nesse ponto, os pacientes se
submetem a laparoscopia diagn‡stica, especialmente em mulheres f‚rteis, s•o admitidos para observa€•o e reexame,
ou recebem alta com acompanhamento no dia seguinte.

TRATAMENTO DA APENDICITE
A maioria dos pacientes com apendicite aguda ‚ tratada por remo€•o cirŠrgica imediata do apƒndice.
Antibi‡ticos pr‚-operat‡rios cobrem a flora colŒnica aer‡bica e anaer‡bica. Para pacientes com apendicite n•o
perfurada, uma dose Šnica pr‚-operat‡ria de antibi‡ticos reduz as infec€‰es p‡s-operat‡rias da ferida e a forma€•o de
abscesso intra-abdominal. Para pacientes com apendicite perfurada ou gangrenosa, continuamos com antibi‡ticos
intravenosos no per„odo p‡s-operat‡rio at‚ o paciente estar afebril.
V†rios estudos randomizados prospectivos tƒm comparado a apendicectomia laparosc‡pica e a cirurgia aberta.
De uma forma geral, os pacientes obesos tƒm menos dor e menor permanecia hospitalar ap‡s apendicectomia
laparosc‡pica versus aberta. Os pacientes tratados por laparoscopia tƒm escores de qualidade de vida melhorados em 2
semanas ap‡s a cirurgia e taxas mais baixas de readmiss•o. Em compara€•o com a apendicectomia aberta, a
abordagem laparosc‡pica envolve custos mais elevados da sala de cirurgia, mas estes s•o compensados, algumas
vezes, por per„odos de interna€•o mais curtos. Para os pacientes nos quais o diagn‡stico continua incerto ap‡s
avalia€•o pr‚-operat‡ria, a laparoscopia diagn‡stica ‚ Štil porque permite que o cirurgi•o examine o restante do abdome,
inclusive a pelve, ‹ procura de anormalidades. ˆ comum cirurgi‰es realizarem laparoscopia em mulheres f‚rteis,
pacientes obesos e casos de incerteza diagn‡stica; de outro modo, a abordagem ‚ determinada pela preferƒncia do
paciente.
 Apendicectomia aberta: em geral, ‚ realizada com mais facilidade por uma incis•o transversa no quadrante
inferior direito (Davis-Rockey) ou uma incis•o obl„qua (McArthur-McBurney). Nos casos com um grande fleim•o
ou incerteza diagn‡stica, uma incis•o de linha m‚dia subumbilical pode ser usada. Para casos n•o complicados,
preconiza-se uma incis•o transversa sobre o ponto de McBurney. Ap‡s entrar no peritŒnio, o apƒndice inflamado
‚ identificado por sua consistƒncia firme e liberado no campo. O mesoapƒndice ‚ dividido entre pin€as e fios. A
base do apƒndice ‚ esqueletizada em sua jun€•o com o ceco. Um fio absorv„vel pesado ‚ colocado em torno da
base do apƒndice, e a amostra ‚ clampeada ou dividida. Uma sutura em bolsa de tabaco absorv„vel ou uma
sutura em “Z” ‚ colocada na parede cecal e o coto apendicular ‚ invertido em uma prega na parede do ceco.

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 Apendicectomia laparoscópica: oferece a vantagem da laparoscopia diagnóstica combinada com o potencial


de recuperação mais curta e incisões que são menos conspícuas. Após uma injeção do anestésico local, coloca-
se uma porta de 10mm no umbigo, seguida de uma porta de 5mm na região da linha média suprapúbica e uma
porta de 5mm a meio caminho entre as duas primeiras portas e para a esquerda do músculo reto abdominal.
Com o paciente na posição de Trendelenburg, esquadra-se suavemente o íleo terminal medialmente e seguimos
a tênia do ceco caudal para localizar o apêndice. Depois de retirado, o apêndice é colocado em uma bolsa de
amostra e removido com a porta pela ferida umbilical.

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Os pacientes com perfuração do apêndice podem estar muito doentes e exigem várias horas de ressuscitação
com líquido antes da indução segura da anestesia geral. Antibióticos de amplo espectro direcionados contra aeróbios e
anaeróbios do intestino são iniciados precocemente na fase de avaliação e ressuscitação. Geralmente, inicia-se com
uma laparoscopia diagnóstica; dependendo da facilidade de completar esta tarefa, decide-se sobre converter ou não
para uma apendicectomia aberta. Entretanto, a literatura preconiza que para tratamento cirúrgico de apendicite perfurada
com peritonite, deve-se fazer incisões maiores (como a longitudinal mediana infra-umbilical) para lavagem da cavidade
peritoneal; em casos de peritonite difusa, deve-se fazer uso de laparotomia paramediana xifo-pubiana. Qualquer pus
encontrado durante a dissecção é aspirado e enviado para a cultura de coloração Gram.
No que diz respeito ao abscesso apendicular, os pacientes que se apresentam tardiamente no curso da
apendicite com massa, dor e febre, podem beneficiar-se de um período de tratamento não operatório e a permanência
geral no hospital. Os pacientes com abscessos grandes, de mais de 4 a 6cm de diâmetro, e especialmente os pacientes
com abscesso e febre alta, beneficiam-se da drenagem do abscesso.
1
OBS : Se um apêndice de aparência normal for identificado no momento da cirurgia, ele deve ser removido? Há uma
falta de consenso sobre este ponto; entretanto, é difícil saber como muitos pacientes se beneficiam desta prática,
embora a remoção do apêndice acrescente pequena morbidade ao procedimento. Grandes serviços optam por remover
o apêndice e realizar uma pesquisa completa para outras causas dos sintomas do paciente, examinando-se,
especificamente, o intestino delgado a procura de divertículo de Meckel e doença de Chron, o mesentério à procura de
linfadenopatia e a pelve em busca de abscessos, torção ovariana e hérnias.

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MED RESUMOS 2012


NETTO, Arlindo Ugulino; CORREIA, Luiz Gustavo.
CIRURGIA ABDOMINAL _________

COLELITÍASE
(Professor Felipe Rocha)

Etimologicamente, colelitíase significa doença da vesícula biliar causada por pedras. Portanto, a colelitíase nada
mais é que a presença de cálculos dentro da vesícula biliar. É considerada a doença mais frequente do consultório do
cirurgião abdominal.

ANATOMIA E FISIOLOGIA DO T RATO BILIAR


Antes de estudarmos os aspectos patogênicos da colelitíase, devemos entender algumas características
anatômicas e fisiológicas da vesícula e das vias biliares. Tal conhecimento se faz importante não só para a continuidade
deste Capítulo, como também para os Capítulos subsequentes, que também fazem referência a patologias do trato biliar.

ANATOMIA APLICADA DAS VIAS BILIARES


A vesícula biliar é um órgão em formato
piriforme (de pêra), que se encontra aderido à
superfície inferior do fígado, em um sulco que
separa os lobos direito e esquerdo do fígado.
Apresentando 7-10 cm de comprimento, situa-se
na fossa da vesícula biliar, situada na face
visceral do fígado. A relação entre a vesícula
biliar e o duodeno é tão intima que, durante as
dissecações cadavéricas, podemos perceber tal
estrutura intestinal tingida da coloração verde.
Contém cerca de 50 mL de bile, quando
totalmente distendida. Quanto à anatomia in situ,
a vesícula biliar apresenta o corpo anteriormente
ao duodeno e, seu colo e o ducto cístico, situam-
se imediatamente superiores ao duodeno. Seu
revestimento peritoneal circunda completamente
o fundo, e liga seu corpo e colo ao fígado.
 Fundo: Corresponde à extremidade larga do
órgão, projetando-se da margem inferior do
fígado e, geralmente, está localizada na
extremidade da 9ª cartilagem costal distal na
linha médio-clavicular.
 Corpo: É a porção que toca a face visceral do
fígado, o colo transverso e a parte superior do
duodeno.
 Colo: É estreito e afilado, fazendo uma curva em forma de S e une-se ao ducto cístico.
 Ducto cístico: O ducto cístico (3-4 cm de comprimento) une o colo da vesícula biliar ao ducto hepático comum. A superfície
interna do colo apresenta uma prega espiral em sua mucosa, que ajuda a manter o ducto cístico aberto; assim, a bile pode
ser facilmente desviada para a vesícula biliar quando a extremidade distal do ducto colédoco é fechada pelo esfíncter do
ducto colédoco e/ou esfíncter hepatopancreático; ou a bile pode passar para o duodeno quando a vesícula se contrai. O
ducto cístico segue entre as lâminas do omento menor, geralmente paralelo ao ducto hepático comum, ao qual se une para
formar o ducto colédoco. O seu revestimento peritoneal não é completo na maioria das vezes, porém, ocasionalmente,
quando isto acontece haverá uma predisposição ao infarto por torção. Em 75% das pessoas, o ducto cístico penetra no ducto
comum em um ângulo. No restante, ou seja, nos 25%, ocorre paralelo ao ducto hepático, ou se enrola em torno dele, antes
se unir ao ducto comum.
 Ducto colédoco: É formado na margem livre do omento menor, pela união entre os ductos císticos e hepático comum. O
comprimento varia de 5-15 cm, dependendo do local onde o ducto cístico se une ao ducto hepático comum, que é bastante
variável. Transita descendo posteriormente à parte superior do duodeno e situa-se em um sulco na face posterior da cabeça
do pâncreas. No lado esquerdo da parte descendente do duodeno, o ducto colédoco se une com o ducto pancreático,
seguindo-se obliquamente onde se unem para formar a ampola hepatopancreática (de Vater). A extremidade distal desta
ampola abre-se no duodeno na papila maior do duodeno. Em sua extremidade distal, o ducto colédoco apresenta um
esfíncter, que quando contraído impede o transito da bile em direção à ampola e no duodeno.

A estimulação parassimpática causa contrações da vesícula biliar e relaxamento dos esfíncteres na ampola
hepatopancreática. Entretanto, esta resposta é estimulada pela colecistocinina produzida pelas paredes duodenais em
resposta a uma refeição gordurosa.

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Arlindo Ugulino Netto – CIRURGIA ABDOMINAL– MEDICINA P7 – 2010.2

FISIOLOGIA APLICADA DO TRATO BILIAR


A bile ‚ um fluido produzido pelo f„gado (produz cerca de um litro de bile por dia) e armazenado na ves„cula
biliar (que tem capacidade de armazenar 20 - 50 ml de bile). Atua na digest•o de gorduras (atrav‚s da a€•o da l„pase
pancre†tica, uma enzima produzida pelo p…ncreas), de determinados microorganismos para evitar a putrefa€•o de
alguns alimentos e na absor€•o de subst…ncias nutritivas da dieta ao passarem pelo intestino.
A bile ‚ caracterizada por ser alcalina e amarga contendo †gua, bicarbonato de s‡dio, c†lcio, sais biliares,
pigmentos, colesterol e bilirrubina, entre outros compostos. Ela ‚ produzida em uma taxa de 500 a 1.500 mL/dia pelos
hepat‡citos e c‚lulas dos ductos.
ˆ v†lido relembrarmos algumas caracter„sticas histol‡gicas do trato biliar. Primeiramente, devemos ter em mente
que o epit‚lio mucoso dos ductos biliares varia desde cub‡ide nos canal„culos a colunar nos ductos principais. No que se
refere ‹ ves„cula biliar, sua mucosa ‚ dotada de cristas proeminentes nas ocasi‰es de colabamento, j† quando a
ves„cula se encontra distendida, tais cristas se tornam achatadas. A musculatura lisa predomina nas paredes dos ductos
biliares, ainda que em pouca quantidade, enquanto que a termina€•o do ducto comum ‚ envelopada por um complexo
mŠsculo-esfinct‚rico.
Entre as refei€‰es, a bile ‚ armazenada na ves„cula biliar, onde se concentra em taxas de at‚ 20% por hora.
Trƒs s•o os fatores que regulam o fluxo biliar: secreção hormonal, contração da vesícula biliar e resistência do
esfíncter do colédoco.
 Contração da vesícula biliar: No estado de jejum, a press•o no ducto biliar ‚ de 5 a 10 cm de †gua, e a bile
produzida no f„gado ‚ ent•o desviada para dentro da ves„cula biliar. Logo ap‡s a refei€•o, a ves„cula biliar se
contrai, o esf„ncter relaxa e a bile ‚ empurrada para dentro do duodeno em esguichos, ‹ medida que a press•o
ductal supera de forma intermitente a resistƒncia esfinct‚rica. Para se ter id‚ia, durante a contra€•o da ves„cula
biliar, sua press•o chega a 25 cm de †gua, e a do ducto biliar comum ‚ de 15 a 20 cm de †gua.
 Secreção hormonal: A colecistocinina (CCK) ‚ o principal est„mulo fisiol‡gico para a contra€•o p‡s-prandial da
ves„cula biliar e o relaxamento do esf„ncter. Sua libera€•o ocorre pela mucosa do intestino delgado a partir do
contato com gorduras ou produtos lipol„ticos da luz intestinal. Deste modo, o fluxo biliar, durante uma refei€•o ‚
aumentado pela secre€•o da CCK, VIP, secretina e ainda o retorno de sais biliares pela circula€•o ƒntero-
hep†tica.

ETIOPATOGENIA
Para entender a forma€•o destes c†lculos, ‚ necess†rio compreender fenŒmenos f„sico-qu„micos que regem a
fisiopatologia da doen€a. A bile normal, como vimos, apresenta uma propor€•o fisiol‡gica de colesterol, sais biliares e
c†lcio. Contudo, para que os c†lculos de colesterol (que s•o os mais frequentes) se formem, ‚ necess†rio que a bile
esteja supersaturada de colesterol.
Portanto, para que haja a forma€•o dos c†lculos, ‚ necess†rio que a bile esteja supersaturada de um
determinado composto – saturada o suficiente para proporcionar a forma€•o de cristais. A precipita€•o destes cristais ‚
o fator determinante para forma€•o do c†lculo, propriamente dito.

CÁLCULOS DE COLESTEROL
Representam cerca de 75% dos c†lculos de ves„cula biliar, sendo o Fatores de risco para cálculos de colesterol
tipo mais comum deste ‡rg•o. Alguns fatores de risco s•o descritos como  Sexo feminino
sendo de grande import…ncia para o desenvolvimento deste tipo de c†lculo  Multiparidade
(tabela ao lado). Pelo exposto, podemos perceber que todos estes fatores  Uso de anticoncepcionais orais
tƒm um ponto convergente comum: o componente hormonal da mulher,  Obesidade
 Gravidez
fator de grande import…ncia e comum aos fatores de risco dos c†lculos de
colesterol.
Os c†lculos biliares de colesterol resultam da secre€•o hep†tica de bile supersaturada com colesterol.
Fisiologicamente, a secre€•o sais biliares e de colesterol dentro da bile est•o interligadas. Macroscopicamente, s•o
duros, facetados e de coloraۥo amarelada.
O sal biliar dilui o colesterol a partir da membrana do hepat‡cito, durante a passagem dentro do canal„culo biliar.
Em n„veis de d‚bito mais elevados de sais biliares, diminui a quantidade de colesterol, em rela€•o ao sal biliar que entra
na bile. Isto significa que, durante o fluxo biliar baixo (por exemplo, o jejum), a capacidade de fixaۥo da bile para o
colesterol ‚ mais saturada que durante o fluxo biliar alto. De fato, quase metade das pessoas ocidentais apresenta bile
supersaturada com colesterol pela manh• ap‡s o jejum noturno.
Conforme dito anteriormente, a ocorrƒncia da doen€a liti†sica biliar de colesterol requer a supersatura€•o de
colesterol da bile, mas esta, por si s‡, n•o ‚ suficiente. O colesterol ‚ insolŠvel e na bile, deve ser transportado dentro de
micelas de sais biliares e ves„culas de fosfolip„dios (lecitina). Quando a quantidade de colesterol na bile excede a
capacidade de liga€•o destas micelas, os cristais de colesterol come€am a se precipitar, a partir das ves„culas de
fosfolip„dios. Para a forma€•o do c†lculo biliar, os fatores pronucleadores (imunoglobulina, glicoproteina do muco,
fibronectina) parecem ser mais importantes que os fatores anti-nucleadores (glicoproteina, apolipoprot‚ina). Portanto, as
varia€‰es nestas prote„nas podem ser o fator critico que determinam quais dos muitos indiv„duos com bile saturada
desenvolvem c†lculos biliares. Conclui-se que:
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Arlindo Ugulino Netto – CIRURGIA ABDOMINAL– MEDICINA P7 – 2010.2

 Sem dŠvida, a bile deve se apresentar supersaturada com colesterol;


 A supersatura€•o com colesterol n•o quer dizer, obrigatoriamente, que o individuo evoluir† para a forma€•o de
c†lculos, pois, existem outros fatores que regulam este processo;
 Quando ocorre a precipita€•o do colesterol, com forma€•o de cristais, se forma o c†lculo.

A imagem ao lado mostra o aspecto macrosc‡pico dos c†lculos de colesterol.


Note que eles se mostram amarelados, endurecidos e facetados.

CÁLCULOS DE BILIRRUBINATO DE CÁLCIO


Os cálculos bilirrubina, tamb‚m denominados de pigmento ou de bilirrubinato de cálcio (que ‚ um sal de
bilirrubina) por apresentarem predomin…ncia de tais compostos, contribuem com apenas 25% da incidƒncia dos c†lculos
biliares nos EUA. Embora sejam significativamente menos frequentes que os c†lculos de colesterol, os c†lculos de
bilirrubina apresentam um mecanismo etiopatogƒnico particular.
S•o compostos por uma mistura de bilirrubina (geralmente, a forma n•o-conjugada), c†lcio, pol„meros complexos
de bilirrubina, †cidos biliares e outras subst…ncias ainda desconhecidas. Contudo, sua caracter„stica especial est†
relacionada com a presen€a de bact‚rias na bile, cujo crescimento leva ao aumento da concentra€•o de bilirrubina n•o-
conjugada (tamb‚m chamada de bilirrubina indireta), que n•o ‚ hidrossolŠvel, fazendo com que haja supersatura€•o da
bile, precipita€•o de cristais de bilirrubina e forma€•o dos c†lculos em Šltima an†lise.
De fato, sabe-se que alguns pacientes com c†lculos de bilirrubina apresentam concentra€‰es aumentadas de
bilirrubina não-conjugada em suas biles. Al‚m disso, exames de varredura demonstraram que, aproximadamente, 90%
dos c†lculos de pigmento apresentam compostos de densas misturas entre bact‚rias e glicoc†lice bacteriano, o que
evidencia a tese que as bact‚rias tƒm um papel prim†rio na forma€•o do c†lculo biliar de pigmento. Estudos ainda
pregam a id‚ia que a presen€a de bact‚rias tamb‚m explica o porquƒ destes pacientes apresentarem maior frequƒncia
de sepse quando comparado aos que apresentam c†lculos de colesterol. Podemos ainda citar que a pr‡pria infec€•o
bacteriana parece contribuir para a desconjuga€•o da bilirrubina, por conta da a€•o da β-glicuronidase bacteriana.
Morfologicamente, s•o demonstrados como sendo
pigmentados em negro a castanho-escuro, com 2 a 5 mm de Fatores de risco para cálculos de bilirrubina
di…metro, e amorfos. Quanto ao seu aspecto, se mostram como  Cirrose hep†tica
c†lculos arenosos e quebradi€os, ocorrendo, principalmente, nos  Estase biliar (ducto comum estenosado,
acentuadamente dilatados)
pacientes com fatores de risco particulares (tabela ao lado). No geral,
 Hem‡lise crŒnica (principalmente, os que
analisando os fatores de risco para este tipo de c†lculo, podemos apresentam anemia falciforme)
concluir que o elemento fisiopatol‡gico comum para a gƒnese de tais
c†lculos ‚ o distúrbio metabólico da bilirrubina.
Conclu„mos as seguintes caracter„sticas de tais c†lculos:
 S•o formados por bilirrubina e c†lcio;
 Requerem o crescimento bacteriano, que parece estar implicado no desenvolvimento da bilirrubina n•o-
conjugada (indireta lipossolŠvel).

Na imagem ao lado, podemos visualizar a morfologia dos c†lculos de pigmento.


Percebemos a sua coloraۥo escurecida, com aspecto arenoso e facilmente
quebradi€o, como podemos visualizar alguns peda€os desgarrados.

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Arlindo Ugulino Netto – CIRURGIA ABDOMINAL– MEDICINA P7 – 2010.2

QUADRO CL…NICO
O quadro clínico dos pacientes com colelitíase á bastante variável, ocorrendo desde as formas assintomáticas
(que é a mais comum, em 80-90% dos casos) a sintomáticas (10-20%). A colelitíase é dita sintom…tica quando o
paciente apresenta dor visceral tipo c‡lica no quadrante superior direito (c‡lica biliar). A dor é caracterizada como
sendo uma dor visceral em cólica por apresentar períodos de atenuação e de exacerbação intercalados.
A icterícia é extremamente rara na colelitíase (< 10% dos pacientes cursam com icterícia), e pode estar presente
quando o paciente cursa com colecistite aguda ou coledocolitíase.
Se o paciente apresentar histórico deste tipo de dor, associado a exames complementares que afirmam a
presença de cálculos na vesícula biliar (como o ultrassom), podemos confirmar o diagnóstico de colelitíase sintomática.

DIAGN†STICO
O diagnóstico da colelitíase, seja assintomática (a partir
de um achado ocasional) ou sintomática (por indicação a partir
da suspeita clínica) é obtido através da ultrassonografia
abdominal (USG).
A USG é um exame que possibilita o diagnóstico em
cerca de 95% dos casos, com alta sensibilidade e ainda mais alta
especificidade (é um exame mais específico pois, uma vez
encontrados cálculos biliares através da USG, as chances deste
exame ser falso positivo são muito pequenas).
Em 5% dos casos, o cálculo pode não ser visto pela
USG, gerando um resultado falso-negativo. Estas ocasiões
geralmente ocorrem devido à presença de microcálculos
(menores do que 0,05cm). Para eles, o melhor método
diagnóstico passa a ser a ultrassonografia endosc‡pica
(portanto, a USG endoscópica é o padrão-ouro para o
diagnóstico da microlitíase biliar).
1
OBS : Embora a literatura ainda seja pouco clara quanto a isso, afirma-se que existe uma tendência que os cálculos
maiores que 2cm e os cálculos pequenos produzam mais sintomas, inclusive espasmódicos, do que os cálculos
intermediários.

C OMPLICA•‚ES DA C OLELIT…ASE
A colelitíase pode evoluir para algumas complicações, dentre as quais, três se destacam: colecistite aguda,
coledocolitíase e câncer da vesícula biliar.
 A colecistite aguda é o termo que define a inflamação, de caráter agudo, da vesícula biliar. Pode evoluir para o
abdome agudo inflamatório.
 A coledocolitˆase é a situação em que o cálculo migra através do ducto cístico até o ducto colédoco,
obstruindo-o, de maneira parcial ou total.
 O cálculo, em longo prazo, determinará alterações celulares e da própria mucosa da vesícula biliar, predispondo
ao aparecimento do c‰ncer da vesˆcula biliar. Portanto, a colelitíase é reconhecidamente um fator de risco para
a evolução do câncer de vesícula biliar e, partindo deste pressuposto, ela passa a ser classificada como uma
complicação do cálculo de vesícula.

C ONDUTA E T ERAPIA
A conduta e a terapêutica a ser instituída no paciente com colelitíase, leva em conta, primeiramente, o fato do
paciente se apresentar sintomático ou assintomático. Deste modo, a descrição da conduta e terapia será abordada de
maneira distinta a seguir, seguindo o critério dos sintomas.

TRATAMENTO DO PACIENTE ASSINTOMŠTICO


A literatura demonstra que a colelitíase assintomática deve ser observada clinicamente (conduta
conservadora). Isso porque observou-se, estatisticamente, que a maioria dos pacientes assintomáticos com cálculos não
desenvolve, em longo prazo, sintomas que façam jus ao tratamento cirúrgico da colelitíase.
Contudo, existem grupos de pacientes com colelitíase que, mesmo sendo assintomáticos, devem ser submetidos
à terapia cirúrgica. Nestas ocasiões, o objetivo cirúrgico será o de prevenir complicações do quadro inicial e eventuais
morbidades e mortalidade, tratando-o sob a forma de colecistectomia profil…tica. Existem cinco critérios a serem
2
analisados para se indicar ou não a colecistectomia profilática (ver OBS ):
1. C…lculos > do que 2,0 cm;
2. Vesˆcula biliar calcificada (“Vesˆcula em porcelana”);
3. Diabetes Mellitus;
4. Estados de imunodepressão;
5. C…lculos < do que 0,5 cm.

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Arlindo Ugulino Netto – CIRURGIA ABDOMINAL– MEDICINA P7 – 2010.2

OBS2: Deste modo, os trabalhos mostram que os pacientes que apresentem os crit‚rios 1 ou 2 ou 5 citados anteriormente merecem
ser tratados cirurgicamente por colecistectomia profil†tica. O item 1 ‚ justificado pelo fato que, os c†lculos com di…metro acima de 2,0
cm apresentam uma alta probabilidade de impactar-se na bolsa de Hartmann e, consequentemente, causar a colecistite aguda, uma
doen€a com maiores complica€‰es e que pode afetar a mortalidade do paciente. Al‚m disto, estudos prospectivos em pacientes com
c…ncer de ves„cula biliar demonstram que tais pacientes apresentavam, em sua maioria, c†lculos acima de 2,0 cm de di…metro. Desta
maneira, o tamanho do c†lculo se relaciona ao risco de evoluir para o c…ncer de ves„cula biliar. A presen€a do item 2, por si s‡, j† ‚
um fator de preocupa€•o por parte do cirurgi•o. A “ves„cula em porcelana” ‚ uma les•o pr‚-neopl†sica, pois, constatou-se de que os
pacientes com esta altera€•o tƒm risco 10x maior de evolu„rem para o c…ncer de ves„cula biliar, quando comparado com a popula€•o
em geral. O item 5 tamb‚m deve ser considerado como indicativo de cirurgia profil†tica, pois, s•o mais vulner†veis ‹ migra€•o
atrav‚s do trato biliar e impacta€•o na papila duodenal, podendo causar pancreatite aguda, uma complica€•o s‚ria da coledocolit„ase
cujo risco de ‡bito ‚ muito elevado. Os itens 3 e 4, isoladamente, n•o s•o indicativos sistem†ticos de cirurgia profil†tica. Isso porque o
diabetes mellitus e as doen€as que cursam com estados de imunosupress•o s•o mais bem tratadas atualmente, gra€as ao
desenvolvimento de novos f†rmacos, e a sua prescri€•o cirŠrgica não é obrigatória, diferentemente dos itens 1, 2 e 5.

TRATAMENTO DO PACIENTE SINTOMÁTICO


Uma vez sintom†tico, indiscutivelmente, o paciente
deve ser submetido ‹ cirurgia. A cirurgia assistida por v„deo
(videolaparoscopia) ‚ o tratamento de elei€•o dos pacientes
com colelit„ase sintom†tica, procedendo-se da
colecistectomia. Atualmente, salvo em casos de
indisponibilidade da aparelhagem, n•o se concebe mais a n•o
utiliza€•o desta ferramenta cirŠrgica.
A colecistectomia por via convencional (incis•o
subcostal de Kocher) somente ‚ indicada nos servi€os
hospitalares em que n•o disp‰e de aparelhos
videolaparosc‡pica e/ou cirurgi•o n•o estar apto por
realiza€•o deste artif„cio. Fora estas condi€‰es, a realiza€•o
da cirurgia convencional pode ser considerada uma les•o
corporal, pass„vel de processo jur„dico, uma vez que a cirurgia
laparosc‡pica tem mŠltiplos benef„cios, quando comparado ‹
convencional.
Aliado ao procedimento cirŠrgico, podemos ainda
dispor da colangiografia intraoperat‡ria (que ser† descrita
adiante) e representa uma importante ferramenta para o
diagn‡stico intraoperat‡rio de v†rias situa€‰es cl„nicas.
Quanto ao procedimento videolaparosc‡pico, se faz importante a descri€•o de sua estat„stica quanto ‹s
complica€‰es. Em outras palavras, comparativamente, o procedimento videolaparosc‡pico causa mais les‰es de …mbito
iatrogƒnico do que a cirurgia por via aberta. Por‚m, em cirurgi‰es com treinamento nesta modalidade, assim como
experientes, o risco de complica€‰es ‚ menor do que 1%.
A colangiografia intraoperatória ‚ um artif„cio diagn‡stico em que se procede da radiografia de toda a via biliar
durante o ato cirŠrgico. A sua indica€•o ‚ seletiva, e somente ocorre nas ocasi‰es em que se tem algum fator cl„nico-
laboratorial que aponte a migra€•o de um c†lculo atrav‚s do canal biliar (causando a coledocolit„ase). Isto ‚ importante
pois o tratamento da colelit„ase ‚ completamente diferente da terapia da coledocolit„ase. Abaixo, s•o listados os
principais fatores a serem analisados para se indicar a colangiografia intra-operat‡ria:
 Hist‡ria cl„nica de icter„cia colest†tica. Nessas ocasi‰es, os pacientes apresentam dor abdominal tipo c‡lica e,
durante as crises, ocorre icter„cia (mucosas conjuntivas amareladas), colŠria (urina escura) e acolia fecal (fezes
esbranqui€adas).
 Eleva€•o de bilirrubina (acima de 3mg/dL), fosfatase alcalina e/ou gama-GT (estes dois Šltimos s•o marcadores
bioqu„micos de les•o canalicular, respons†veis por indicar que o c†lculo migrou atrav‚s do canal).
 Hist‡ria de colangite que ‚ suscitada pela presen€a de febre e calafrios durante a crise, com ou sem icter„cia.
 Hist‡ria de pancreatite.
 Ultrassom com dilata€•o das vias biliares.

Na imagem, percebemos falha de enchimento de contraste, correspondendo ‹


coledocolit„ase. Caso esta paciente fosse submetida a terapƒutica cirŠrgica,
sem realiza€•o da colangiografia intraoperat‡ria, a chance de apresentar, no
p‡s-operat‡rio, um quadro de colangite s‚ptica seria muito alto. Por conta
disto, se faz necess†ria a an†lise intraoperat‡ria.

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Arlindo Ugulino Netto – CIRURGIA ABDOMINAL– MEDICINA P7 – 2010.2

MED RESUMOS 2012


NETTO, Arlindo Ugulino; CORREIA, Luiz Gustavo.
CIRURGIA ABDOMINAL _________

SÍNDROME DE MIRIZZI
(Professor Felipe Rocha)

A síndrome de Mirizzi (SM) é considerada uma complicação


rara da colelitíase de longa duração (ocorre em 0,05% a 2,70% dos
pacientes com cálculos de vesícula biliar).
Nesta situação, ocorre uma estenose parcial da via biliar
(acometendo, principalmente, o ducto hepático comum). Tal
estreitamento é decorrente da compressão mecânica (por cálculos
de grande volume que foram impactados no infundíbulo da vesícula
biliar ou no ducto cístico) ou por inflamação da via biliar (também
decorrente da irritação por cálculos).
Portanto, o que define a SM é a estenose parcial da via biliar,
na forma de uma obstrução benigna do ducto hepático comum,
causada por um cálculo impactado e/ou processo inflamatório da
região do infundíbulo da vesícula biliar. A SM caracteriza-se por:
 Ducto cístico com trajeto paralelo ao ducto hepático comum.
 Cálculos impactados no ducto cístico ou infundíbulo da
vesícula biliar.
 Obstrução mecânica do ducto hepático comum por cálculos
ou secundário a inflamação.
 Icterícia contínua ou intermitente e colangite recorrente.

FISIOPATOLOGIA

O aspecto fisiopatológico da SM já é algo conhecido.


Teorias demonstram que a vesícula biliar, nesta ocasião, se
apresenta com um processo inflamatório crônico. Esta
inflamação, por sua vez, é quem ocasiona aderências à parede
do canal biliar comum.
O efeito final do que acabamos de relatar,
ocasionalmente, é a fístula colecistocoledoceana (comunicação
anômala entre a vesícula biliar e a via biliar principal). Esta fístula
é algo que pode acontecer na SM, mas não é uma condição sine
qua non da SM, pois o que define a SM é a estenose parcial do
ducto hepático comum.
O processo inflamatório pode ainda desempenhar um importante papel na formação de aderências com
estruturas vizinhas, mais frequentemente com o ducto biliar comum, duodeno e cólon.

CLASSIFICA•„O

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Arlindo Ugulino Netto – CIRURGIA ABDOMINAL– MEDICINA P7 – 2010.2

QUADRO CL…NICO
A SM determina um quadro clínico de difícil diagnóstico. Na maioria das vezes, os pacientes se queixam de
crises de cólica biliar por repetição, de longa data. Geralmente, os pacientes têm história de 10 anos de cálculos de
vesícula biliar. Portanto, não existe um quadro clínico-laboratorial específico para SM. No entanto, cerca de 80% dos
pacientes apresentam: icterícia, dor abdominal e alterações das provas de função hepática.
Desta forma, temos:
 Anamnese:  Sinais e sintomas:
 Colelitíase de longa data  Dor abdominal em HCD e/ou epigástrio
 Episódios de icterícia obstrutiva  Icterícia
 Passado de colecistite aguda e/ou  Náuseas e vômitos
colangite  Colúria
 Febre

DIAGN†STICO
O diagnóstico intra-operatório da SM ocorre na maioria das vezes. O diagnóstico pré-operatório é difícil, sendo
necessário um elevado índice de suspeita para evitar lesões da árvore biliar.
O exame padrão ouro para SM é a colangio-RNM. Além dela, outros exames também podem fornecer o
diagnóstico ao médico: a colangiografia intra-operatória, USG de abdome (sugere o diagnóstico) e TC de abdome são
exames que podem ser utilizados também.
Portanto, para o seu diagnóstico, podemos lançar mão:
 Colangioressonância: é o exame padrão-ouro para a SM, sendo o exame mais útil. Ela pode demonstrar com precisão a
presença de dilatação biliar, o grau de obstrução, a localização intra ou extra luminal dos cálculos, identificar e avaliar o grau
de inflamação ao redor da vesícula. Pode revelar alterações anatômicas como fístulas e mal-formações.
 Ultra-sonografia e Tomografia Computadorizada de Abdome: Podem sugerir o diagnóstico de SM ao revelar cálculo(s)
fixo(s) na área do infundíbulo, próximo à junção do ducto cístico com o colédoco, e dilatação das vias biliares acima do local
da compressão.
 CPRE: Pode revelar compressão ou estreitamento do ducto hepático comum. É um método que tem a vantagem de ser
também utilizado como terapêutico. Além da remoção dos cálculos da via biliar, a CPRE permite a colocação de stents que
servem para drenagem das vias biliares e identificação do ducto biliar comum durante ato operatório.

Colangio-RNM evidenciando falha de enchimento na via biliar de um paciente com


síndrome de Mirizzi.

Ultrassonografia do trato biliar. Cálculo impactado no infundíbulo da vesícula


biliar (seta larga) e dilatação do ducto hepático comum (seta pequena).

CPRE mostrando ducto hepático comum e vias biliares intra-


hepáticas dilatadas com colédoco normal e defeito de
enchimento na junção do ducto cístico com colédoco.

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Arlindo Ugulino Netto – CIRURGIA ABDOMINAL– MEDICINA P7 – 2010.2

TRATAMENTO
O tratamento da SM é, sem dúvida, eminentemente cirúrgico em todas as situações. A via preferencial de
acesso também é por videolaparoscopia. A via aberta também pode ser utilizada quando não se tem como acessar a
vesícula por videolaparoscopia.
Os princípios gerais da cirurgia são:
 Dissecção cuidadosa das estruturas biliares
 Remoção completa dos cálculos do trato biliar
 Identificação do ducto hepático comum
 Colangiografia intra-operatória sempre que possível, principalmente quando não existe diagnóstico pré-
operatório definido.

Embora a terapêutica de escolha seja a cirurgia por videolaparoscopia, podemos destacar algumas
particularidades na técnica a depender da classificação:
 Csendes Tipo I: colecistectomia e remoção dos cálculos biliares é o tratamento de escolha. O processo
inflamatório crônico pode dificultar a exposição do trígono de Calot, levando a lesões iatrogênicas. Por isso, uma
colecistectomia parcial pode ser uma alternativa segura. Pode-se associar CPRE pós-operatória caso exista
dificuldade técnica de remoção dos cálculos do colédoco.
 Csendes Tipo II e III: por conta do processo inflamatório, a dissecção ao nível do ducto cístico e exposição do
trígono de Calot podem levar a abertura do orifício fistuloso deixando pouco tecido para uma boa sutura. Por isso
é proposta a técnica de Sandblom (que consiste na coledocoplastia com sutura da parede da vesícula
remanescente no orifício fistuloso, sem causar estreitamento do ducto seguida da introdução do dreno de Kehr
no ducto hepático comum acima da área reparada).
 Csendes Tipo IV: normalmente é necessário uma hepaticojejunostomia em Y de Roux ou
coledocoduodenostomia látero-lateral.

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Arlindo Ugulino Netto – CIRURGIA ABDOMINAL– MEDICINA P7 – 2010.2

MED RESUMOS 2012


NETTO, Arlindo Ugulino; CORREIA, Luiz Gustavo.
CIRURGIA ABDOMINAL _________

COLECISTITE AGUDA
(Professor Felipe Rocha)

O termo colecistite aguda, como a pr‡pria nomenclatura j† sugere, ‚ a inflama€•o aguda da ves„cula biliar, com
ou sem infecۥo associada (diferentemente da apendicite aguda, situaۥo em que a infecۥo deve estar presente). Pela
conceitua€•o premeditada, o fato de o paciente apresentar somente o quadro inflamat‡rio da ves„cula ‚, por si s‡, um
fator que determina o quadro de colecistite aguda.
A colecistite ‚ causada, principalmente, pela colelit„ase vesicular (80 a 90% dos casos) e, em algumas ocasi‰es,
podem ser causadas por colecistite alitiásica, que s•o as colecistites que ocorrem na ausƒncia de c†lculos da ves„cula
biliar (representam, em m‚dia, 20% dos casos). Portanto, a presen€a de c†lculos na ves„cula n•o ‚ uma condi€•o sine
qua non para desenvolver a colecistite.

ETIOPATOGENIA
A etiopatogenia da doen€a ‚ bastante vari†vel, sendo a impacta€•o do c†lculo na bolsa de Hartmann e
obstru€•o do ducto c„stico a mais frequente (80% dos casos). Por‚m, a obstru€•o do ducto c„stico tamb‚m pode ocorrer
nas neoplasias (c…ncer das vias biliares e ves„cula biliar).
A oclus•o da art‚ria c„stica, por sua vez, corresponde a forma etiopatogƒnica mais comum da colecistite
aliti†sica. Ou seja, o suprimento arterial da ves„cula biliar ‚ interrompido, com consequente isquemia local, necrose e
processo inflamat‡rio crŒnico.
ˆ v†lido ainda ressaltar que, ocasionalmente, a infec€•o bacteriana prim†ria da ves„cula biliar (alimentos com
bact‚rias) pode cursar com colecistite aguda e necrose local.
Em resumo, abaixo s•o divididos os principais efeitos etiopatogƒnicos, divididos pelas formas liti†sicas e n•o-
liti†sicas que podem cursar com colecistite aguda:
 Formas litiásicas
 Obstru€•o do ducto c„stico por c†lculo
 Obstru€•o do ducto c„stico por Neoplasia

 Formas não-litiásicas
 Interrup€•o do suprimento arterial favorecido pela art‚ria c„stica
 Infec€•o bacteriana local

QUADRO CL…NICO _____


O quadro cl„nico do paciente com colecistite aguda ‚ bastante t„pico. A principal queixa do paciente ‚ de dor
abdominal aguda no quadrante superior direito, dor que ‚ persistente. Por vezes, podem ainda apresentar a dor
referida na região escapular direita por irrita€•o do nervo frƒnico, o que j† ‚ indicativo de abdome agudo. Durante a
descri€•o do hist‡rico da doen€a atual (HDA), o paciente comumente associa n†useas e vŒmitos com o quadro
doloroso.
Durante o exame físico geral, podemos, eventualmente (em cerca de 10%), perceber icter„cia leve. O exame
do abdome ‚ algo bastante significativo para tais pacientes. Durante a palpa€•o superficial, o paciente se queixa de dor
na regi•o da ves„cula (ponto c„stico). Na percuss•o, do mesmo modo, o paciente queixa de dor durante tal manobra.
O sinal semiol‡gico de Murphy tamb‚m est† frequentemente presente. ˆ um sinal que avalia a condi€•o da
ves„cula biliar. O examinador dever† buscar o ponto c„stico e, durante a inspira€•o profunda, o examinador mant‚m a
palpa€•o. O sinal ‚ obtido quando o paciente interrompe a inspira€•o, de maneira sŠbita, por conta de hipersensibilidade
na regi•o subcostal direito. O paciente refere que “n•o consegue respirar” durante tal manobra, ao passo que o sinal ‚
positivo n•o quando ocorre dor e sim quando existir a interrup€•o da inspira€•o.
Aspectos semiológicos da colecistite aguda
Queixa Dor abdominal aguda, localizando-se no QSD, persistente.
Principal Dor referida para regi•o escapular direita, indicativo de abdome agudo.
HDA Associado ao quadro doloroso, que ‚ abrupto e sŠbito, o paciente pode apresentar n†useas, vŒmitos e outras
altera€‰es sintomatol‡gicas.
Exame Físico Pode demonstrar algumas altera€‰es importantes para diferenciar o grau da colecistite aguda. Na forma inicial, o
Geral paciente se mostra com estado geral regular. Nas formas infecciosas, como a colecistite enfisematosa, sinais de
choque s‚ptico podem estar presentes (taquicardia, oligŠria, hipotens•o). Pode haver icter„cia devido ‹ inflama€•o
da ves„cula, embora seja rara (10% - 50%).
Exame Físico Sensibilidade aumentada ‹ palpa€•o e percuss•o
Segmentar Sinal de Murphy presente (interrup€•o da inspira€•o profunda durante a palpa€•o do ponto c„stico)
119
Arlindo Ugulino Netto – CIRURGIA ABDOMINAL– MEDICINA P7 – 2010.2

1
OBS : Clinicamente, podemos diferenciar a colelit„ase de uma colecistite aguda. A primeira situa€•o ‚ caracterizada por
uma c‡lica biliar na forma de uma dor visceral, em que n•o h† irradia€•o para o dorso ou para a esc†pula, sem
caracterizar sinais de abdome agudo. J† na colecistite, como vimos anteriormente, o quadro cl„nico t„pico ‚ caracterizado
por dor persistente no QSD do abdome com irradia€•o por irrita€•o do nervo frƒnico, causando dor referida na regi•o
escapular direita, caracterizando o abdome agudo.

COLECISTITE ALITIÁSICA
O perfil do paciente com a colecistite aliti†sica ‚ completamente diferente do paciente que apresenta a forma
liti†sica, que est† em sua residƒncia ou em algum ambulat‡rio cl„nico-cirŠrgico, por conta do quadro cl„nico abrupto,
sŠbito. Na colecistite aliti†sica, o paciente, geralmente, est† internado com alguma outra doen€a. Conforme descrito
anteriormente, ‚ causada, principalmente pela obstru€•o da art‚ria c„stica, por ƒmbolo ou vasoespasmo. Al‚m disto,
outras situa€‰es s•o associadas:
 Pacientes v„timas de trauma;
2
 Diab‚ticos (ver OBS );
 Nutri€•o parenteral total;
 Colagenoses, como a poliarterite nodosa.
2
OBS : ˆ v†lido lembrar que o diabetes mellitus pode cursar com as formas liti†sicas e n•o-liti†sicas da colecistite aguda.
Na presen€a de DM, mesmo diante de um quadro de colecistite aguda liti†sica, a avalia€•o cl„nica e a conduta
terapƒutica podem mudar.

EXAMES LABORATORIAIS _____


As altera€‰es laboratoriais que podem ocorrer na colecistite aguda s•o v†rias, por‚m, com pouqu„ssima
import…ncia. Na verdade, a Šnica evidƒncia laboratorial significativa para a colecistite aguda ‚ a hiperbilirrunemia,
funcionando como um verdadeiro “divisor de †guas”. Ou seja, quando o seu valor estiver acima de 4,0 mg/dL,
possivelmente, a possibilidade de uma eventual migra€•o do c†lculo para o ducto comum ‚ muito grande. Tal situa€•o
4
indicaria a realiza€•o de uma colangiografia intraoperat‡ria (como veremos mais adiante, na OBS ).
Quando os valores est•o aumentados, mas abaixo de 4,0 mg/dL, este aumento ‚ mais caracterizado pelo
quadro inflamat‡rio da pr‡pria ves„cula biliar, sem necessariamente ter ocorrido a migra€•o do c†lculo.
Os dados laboratoriais abaixo citados s•o inespec„ficos, podendo ocorrer em v†rias outras doen€as. A eleva€•o
da amilase, por exemplo, n•o ‚ patognomŒnico da pancreatite aguda, podendo ocorrer em outros processos
inflamat‡rios do aparelho digestivo.
 Aumento na contagem de leuc‡citos: 10-15.000/microlitro;.
 Eleva€•o leve de Bilirrubinas (2-4mg/dl);
 Eleva€•o de fosfatase alcalina;
 Eleva€•o de Amilase

DIAGN†STICO POR IMAGEM _____


O espectro cl„nico n•o ‚ capaz de confirmar o diagn‡stico de colecistite aguda, mas apenas leva a uma suspeita
cl„nica (diferentemente da apendicite aguda, cujo diagn‡stico ‚ eminentemente cl„nico). Portanto, s•o necess†rios
exames que confirmem a hip‡tese que foi suspeitada clinicamente.
O exame mais importante para isto ‚ a USG de abdome, sendo o Šnico exame necess†rio na maioria das
vezes. Por vezes, a USG pode se demonstrar negativa ou inconclusiva, mesmo diante do espectro cl„nico suspeito de
colecistite aguda. Nestas ocasi‰es, o manejo diagn‡stico ‚ obtido atrav‚s da cintilografia da vesícula biliar (alta
sensibilidade). N•o se faz este exame em todos os pacientes por algumas inconveniƒncias de sua realiza€•o. Por ser
caro, de dif„cil repeti€•o, dependente de radiof†rmaco (podendo induzir rea€‰es de hipersensibilidade) somente ‚
indicado em situa€‰es que a USG n•o se pode diagnosticar.

ULTRASSONOGRAFIA
Os sinais sugestivos de colecistite aguda ‹ ultrassonografia s•o:
 Espessamento da parede da vesícula biliar ‚ o achado
ultrassonogr†fico mais importante a ser avaliado nas ocasi‰es de
colecistite aguda: halo hiperecogƒnico (esbranqui€ado). Este achado ‚
algo comum entre a USG de pacientes com colecistite aguda e c…ncer de
ves„cula biliar, diferenciando-se a partir da cl„nica. Caso o paciente
apresente cl„nica sugestiva de colecistite aguda, o mesmo deve ser
operado. Por‚m, se o paciente apresente sintomas mais sugestivos de
c…ncer de ves„cula (icter„cia e prurido), a conduta ser† diferente. Na
imagem ao lado, podemos perceber pela seta nŠmero 1, um
espessamento da parede da ves„cula biliar, transparecendo na forma de
um halo hiperecogƒnico, que ‚ o sinal ultrassonogr†fico mais fidedigno.
A ves„cula (distendida) ‚ representada pela seta nŠmero 2.

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Arlindo Ugulino Netto – CIRURGIA ABDOMINAL– MEDICINA P7 – 2010.2

 Distensão da vesícula (demonstrada na figura anterior pela seta número 2) e espessamento da parede.
 Presença do cálculo é um achado a ser avaliado na ultrassonografia, porém, sua ausência não afasta o
diagnóstico de colecistite aguda.
 Líquido pericolecístico

C OMPLICA•‚ES _____
A colecistite aguda, eventualmente, pode evoluir para algumas complicações que contribuem em aumentar o
índice de morbimortalidade, necessitando-se de uma compreensão por parte dos médicos.
 Empiema (presença de pus na vesícula biliar);
 Perfuração, podendo causar coleperitônio (bile na cavidade peritoneal, causando um quadro importante de
abdome agudo);
 Gangrena (cientificamente conhecida por Colecistite Enfisematosa);
 Fístula colecistoentérica, que consiste na comunicação anômala entre a vesícula biliar e um segmento
digestivo (colon, duodeno, estômago);
 Íleo biliar: obstrução intestinal por um cálculo biliar que migrou a partir de uma fístula colecistoentérica (não
existe íleo biliar sem que haja fístula colecistoentérica; o contrário não é verdadeiro).

COLECISTITE ENFISEMATOSA
A colecistite enfisematosa é a inflamação aguda da vesícula biliar e do tecido perivesicular pela infecção por
germe anaeróbio (Clostrídeo). É, na maioria dos casos, um tipo de colecistite alitiásica (porém, não é sempre este tipo de
colecistite, pois, eventualmente, pode haver a presença de cálculos). É mais comum em homens (fugindo a regra da
epidemiologia da colecistite) e em pacientes diabéticos.
O quadro clínico demonstra dor súbita e rapidamente progressiva no
quadrante superior direito. Associado, existem sinais e sintomas sistêmicos:
hipotensão arterial, desidratação, perda de peso, recém-operado, taquicardia,
extremidades frias, oligúria, ou seja, sinais de choque séptico. É uma doença que
evolui, clinicamente, com uma grande rapidez, de maneira abrupta. No exame físico,
podemos palpar uma massa inflamatória no quadrante superior direito, designada
como plastrão (epíplon, alça intestinal). Nos exames laboratoriais, percebemos um
aumento progressivo e acentuado dos leucócitos, apresentando níveis acima de
30.000. No R-X de abdome, podemos visualizar enfisema em torno da vesícula biliar,
que é o que confirma o diagnóstico da colecistite enfisematosa. O fato de o paciente
apresentar sinais sistêmicos já é indicação para a terapêutica cirúrgica
(colecistectomia de emergência), mesmo na ausência da radiografia de abdome.

TRATAMENTO _____
A maioria dos casos de colecistite aguda resolve-se espontaneamente, sem requererem um tratamento
específico (diferentemente da apendicite aguda, por exemplo). Contudo, diante de dados que revelam que uma parcela
dos pacientes (mesmo que pequena) não apresentam resolução espontânea, a cirurgia deve ser indicada para qualquer
paciente, principalmente quando avaliamos o risco-benefício, pois, além de ser um procedimento pouco invasivo,
apresenta excelente resultado estético e pós-operatório.
Diante de um paciente com quadro clínico de colecistite aguda, se faz necessário a avaliação de alguns fatores
que podem implicar na mudança da história natural (que é a de resolução espontânea). Ou seja, o provável dos
pacientes com colecistite aguda é o de evoluir com melhora espontânea do quadro. Porém, em algumas situações, esta
espontaneidade de cura pode não ocorrer. Tais fatores são descritos abaixo:
 Resolução da obstrução biliar: Caso o cálculo impacte na bolsa de Hartmann, causando obstrução do ducto
cístico, permanecendo fixo nesta mesma estrutura, a chance de cura espontânea é praticamente nula.
 Extensão da infecção bacteriana secundária, ou seja, além da impactação e colecistite aguda, o calculo
também determinou o quadro infeccioso por toda a vesícula biliar, o mais provável é que o paciente não
consiga uma resolução espontânea.
 A idade também é um fator importante, pois, pacientes com idade superior a 60 anos possui uma menor
probabilidade de resolução espontânea, o mesmo pensamento é válido para o diabetes mellitus e estados de
imunodepressão.

A conduta preferida, atualmente, é a realização de colecistectomia por vídeolaparoscopia em todos os


3
pacientes, a menos que existam contraindicações específicas à cirurgia (ver OBS ).
Conforme foi dito anteriormente, por vezes, alguns pacientes podem apresentar evolução espontânea do quadro
inflamatório da vesícula biliar. Porém, ainda que esta situação seja possível, a indicação terapêutica não é observacional
ou expectante e sim cirúrgica. O advento da cirurgia assistida por vídeo (videolaparoscopia) é a principal justificativa de
indicação cirúrgica, pois, as incisões são mínimas, os erros cometidos são poucos, dentre outros.

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Arlindo Ugulino Netto – CIRURGIA ABDOMINAL– MEDICINA P7 – 2010.2

3
OBS : A única contraindicação absoluta para a realização da cirurgia de vesícula por vídeo é o câncer de vesícula
biliar. A realização da cirurgia videolaparoscópica na vigência desta condição aumenta o risco de disseminação do
tumor e da eventual infecção. Esta condição é facilmente perceptível aos exames e, quando presente, contraindica-se a
cirurgia e nos remete a necessidade de investigar melhor tal situação através de colangioressonância, para verificar se o
espessamento da parede da vesícula é realmente importante, se há vegetações, etc.

Pacientes com doenças concomitantes graves (ICC, IC-4, IC com galope, IC com b4) não devem ser
submetidos à cirurgia. Para eles, a terapia cirúrgica é postergada, devendo ser tratados com antibióticos e hidratação,
pois, seguindo a história natural, podem melhorar. Nestas ocasiões (inclusive nos diabéticos) se faz necessária a
colecistostomia percutânea (drenagem externa da vesícula biliar com auxílio da USG ou TC).
Na maioria das vezes, a colecistectomia é um procedimento de urgência (podendo ser realizada entre 6 a 24
horas depois de diagnosticada a colecistite). Em 10% dos pacientes, a colecistectomia passa a ser um procedimento
emergencial, que deve ser procedido em até 6 horas depois do diagnóstico. A colecistectomia de emergência deve ser
indicada quando houver situações clínicas de gravidade maior, tais como:
 Colecistite enfisematosa
 Situações que cursem com febre alta e calafrios
 Leucocitose acentuada acima de 15.000/microL (progressão supurativa)
 Condições de colecistite alitiásica com complicações (empiema, perfuração, gangrena)
 Diabetes descompensado

OBS4: Assim como na colelitíase, podemos lançar mão da colangiografia intraoperatória para as ocasiões em que se tem algum
fator clínico-laboratorial que aponte a migração de um cálculo através do canal biliar (causando a coledocolitíase). Isto é importante
pois o tratamento da colelitíase é completamente diferente da terapia da coledocolitíase. Abaixo, são listados os principais fatores a
serem analisados para se indicar a colangiografia intra-operatória:
 História clínica de icterícia colestática: dor abdominal tipo cólica, icterícia, colúria (urina escura), acolia fecal (fezes
esbranquiçadas);
 Elevação de bilirrubina (acima de 4mg/dL), fosfatase alcalina e/ou gama-GT
 História de colangite (presença de febre e calafrios durante a crise, com ou sem icterícia).
 História de pancreatite.
 Ultrassom com dilatação das vias biliares.

OBS5: Para a realização do procedimento cirúrgico, se faz necessário o


amplo conhecimento anatômico da região a ser abordada. Em especial, a
região do triângulo cisto-hepático (triângulo de Calot), que é um
espaço anatômico delimitado pelo ducto cístico (lateralmente), hepático
comum (medialmente) e pela borda anterior do hilo hepático
(superiormente). É neste espaço triangular onde a maioria das variações
anatômicas das vias biliares acontece, bem como as principais
complicações iatrogênicas da cirurgia de vesícula (o que é ainda mais
comum na colecistite aguda devido ao edema local), e deve ser
devidamente identificado durante a cirurgia de vesícula. A artéria
hepática direita geralmente se dirige posteriormente ao ducto biliar
hepático comum e entra no triângulo de Calot.

PROGN†STICO
 Mortalidade global: cerca de 5%;
 Fatores de risco (pioram o prognóstico):
o Idade > 65 anos;
o Diabetes Mellitus;
o Complicações cardiovasculares ou pulmonares secundárias.

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MED RESUMOS 2012


NETTO, Arlindo Ugulino; CORREIA, Luiz Gustavo.
CIRURGIA ABDOMINAL _________

COLEDOCOLITÍASE
(Professor Felipe Rocha)

Coledocolitíase ‚ a nomenclatura utilizada para definir a presen€a de c†lculos na


via biliar principal. A sua incidƒncia global leva em conta os pacientes que j† apresentam
colelit„ase, deste modo, 15% destes pacientes evoluem para a coledocolit„ase. Ocorre que,
um determinado c†lculo, por raz‰es ainda desconhecidas, migra pelo ducto c„stico para
dentro da via biliar principal, consequentemente, ocorrer•o manifesta€‰es diversas.

ETIOPATOGENIA
A etiopatogƒnese, como sabemos, consiste no estudo das causas da entidade
nosol‡gica em estudo e as formas como os fatores etiol‡gicos podem desenvolver a doen€a.
Seguindo este racioc„nio, a coledocolit„ase pode ser classificada em prim†ria e
secund†ria, a depender da forma de instala€•o e desenvolvimento.
 Primária: ˆ caracterizada pelo desenvolvimento do c†lculo na pr‡pria via biliar
principal, independentemente da existƒncia ou n•o do c†lculo na ves„cula biliar.
 Secundária: ˆ aquela forma em que os c†lculos migraram a partir, inicialmente, da
ves„cula biliar para dentro da via biliar principal. ˆ o tipo etiopatogƒnico mais
frequente.

COLEDOCOLITÍASE PRIMÁRIA
A coledocolit„ase prim†ria ‚ a que se caracteriza pela forma€•o do c†lculo na via biliar principal, sendo a forma
menos comum de aparecimento. Existe uma teoria que esclarece como se forma estes c†lculos e, qual a import…ncia
dos agentes bacterianos em sua gƒnese. O primeiro evento que ocorre, seguindo esta teoria, ‚ a obstrução parcial do
ducto biliar principal, com estase do conteúdo dentro desta via biliar. Desta maneira, podemos suscitar a hip‡tese
que o col‚doco j† apresenta uma altera€•o anatŒmica e/ou funcionar (col‚doco “doente”), e deve ser retirado.
Para que se forme o c†lculo prim†rio, se faz necess†rio que ocorra o crescimento bacteriano (infecção) e a
supersaturação da bile. Devido ao fato de o crescimento bacteriano estar envolvido, os c†lculos mais comuns da
coledocolit„ase prim†ria ser•o compostos de bilirrubinato de c†lcio, e apresentar•o colora€•o marrom, por‚m, n•o-
facetados, arenosos e quebradi€os.

COLEDOCOLITÍASE SECUNDÁRIA
Esta forma de apresenta€•o ‚ caracterizada pela presen€a de c†lculo na via biliar principal oriundo da pr‡pria
ves„cula. Portanto, ‚ uma complica€•o secund†ria da colelit„ase. A etiopatogenia secund†ria ‚ a forma mais comum de
coledocol„tase. Nesta situa€•o, os c†lculos de colesterol s•o mais comuns.

Na imagem ao lado, podemos perceber a morfologia dos c†lculos mais comuns


da coledocolit„ase secund†ria (e, portanto, os c†lculos mais comuns das vias
biliares). Perceba que, pela sua morfologia facetada e amarelada, provavelmente
s•o c†lculos de colesterol. ˆ v†lido ressaltar que o termo facetado ‚ destinado
aos c†lculos que se apresentam com uma morfologia prism†tica, apresentando
formas irregulares e pontiagudas.

QUADRO CL…NICO
O quadro cl„nico da coledocolit„ase ‚ bastante t„pico. A dor de localização no hipocôndrio direito e
epigástrio, contínua (o que n•o caracteriza uma dor tipo c‡lica, como ocorre na colelit„ase), com irradiação para o
dorso. O vômito ‚ outro sinal de grande valia (diferentemente da colelit„ase).
Conforme foi descrito anteriormente, a coledocolit„ase, na maioria das vezes, ‚ secund†ria ao c†lculo que j† se
faz presente na ves„cula biliar. Deste modo, ‚ comum o hist‡rico de pacientes que referem epis‡dios dolorosos
anteriores, por‚m, com caracter„sticas semiol‡gicas distintas: dor tipo c‡lica no hipocŒndrio direito. Al‚m disto, ‚
importante uma sensibilidade cl„nica, por parte do m‚dico, pois, a dor do c†lculo renal, muito frequentemente, tamb‚m
se apresenta irradiada para o dorso.
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No exame f„sico, a icter„cia pode estar presente ou n•o, sendo visualizada em 10 a 50% dos pacientes (portanto,
diferentemente do que se pode imaginar, a icter„cia n•o ‚ um sinal frequente na coledocolit„ase). Contudo, por si s‡, a
coledocolit„ase pode levar a icter„cia (diferentemente da colelit„ase, que s‡ cursa com icter„cia se houver colecistite
aguda). Algo importante a ser dito ‚ que a icter„cia destes pacientes ‚ do tipo flutuante, ou seja, ocorre em decorrƒncia
da posi€•o do c†lculo (as duas principais causas de icter„cia flutuante s•o: coledocolit„ase e tumor de papila).

EXAMES LABORATORIAIS
Associado aos achados cl„nicos, devemos avaliar pelos menos trƒs par…metros laboratoriais principais, tais
como:
 Bilirrubina: geralmente, est† elevada (BT > 3,0mg/dl);
 Marcadores de colestase: Fosfatase Alcalina e Gama-GT.

Contudo, tais par…metros apresentam apenas valores preditivos de uma estase biliar consequente a uma
obstru€•o por c†lculo. N•o s•o respons†veis por diagnosticar a coledocolit„ase (uma vez que tumores de vias biliares e
de p…ncreas tamb‚m podem alterar estes resultados) – contudo, quanto mais fatores preditivos o paciente tiver, maiores
s•o as possibilidades de um eventual diagn‡stico de coledocolit„ase. Desta maneira, estes marcadores s•o uteis para se
avaliar a possibilidade de uma poss„vel colangite associada.

DIAGN†STICO
O pontap‚ inicial para o diagn‡stico ‚ a avalia€•o cl„nica do paciente, conforme vimos em t‡picos anteriores. A
principal queixa ‚ a de dor cont„nua, por vezes, com irradia€•o para o dorso. Esta avalia€•o, at‚ este ponto, ainda ‚ algo
emp„rico. A realiza€•o de exames de imagem ‚ algo indispens†vel e imprescind„vel para o diagn‡stico da
coledocolit„ase.
V†rias modalidades de exames de imagem j† foram testadas para o diagn‡stico de coledocolit„ase. Abaixo,
ser•o referidas quais foram tais modalidades e, porventura, sua capacidade em diagnosticar a coledocolit„ase.

ULTRASSONOGRAFIA DE ABDOME
ˆ um artif„cio de imagem que depende, diretamente, do examinador e
das condi€‰es anatŒmicas da regi•o a ser estudada. Possui pouca
sensibilidade de diagn‡stico de coledocolit„ase.
O funcionamento da USG depende de ondas sonoras que, ao
atravessarem uma determinada regi•o, s•o re-captadas pelo transdutor. Na
procedƒncia da USG para avalia€•o do ducto col‚doco, a sua visualiza€•o ‚
algo dif„cil, pois, entre o transdutor e o ducto biliar, existe uma grande
quantidade de al€as intestinais (duodeno, colo transverso). Estas al€as
intestinais apresentam g†s – um p‚ssimo condutor de feixes de ultrassom, o
que torna o exame praticamente imposs„vel de obter um diagn‡stico. Conclui-
se que ‚ um exame pouco sens„vel, que pode determinar falso-negativo.
Embora a USG n•o seja o exame de escolha para a visualiza€•o do c†lculo de ducto col‚doco, eventualmente, a
sua visualiza€•o pode ser concedida. Conforme vimos anteriormente, existem algumas condi€‰es de podem dificultar o
exame, podendo, torn†-lo imposs„vel de visualizar a coledocolit„ase. Por‚m, na situa€•o ao lado, pela USG, podemos
notar a presen€a do c†lculo no ducto coled‡co e, digo mais, podemos tamb‚m medir o di…metro do mesmo e a extens•o
da via biliar principal. O c†lculo emite uma sombra acŠstica – sinal ultrassonogr†fico essencial para o diagn‡stico.

OBS1: Historicamente e estatisticamente, a USG ‚ um exame de pouca sensibilidade no diagn‡stico de coledocolit„ase. Contudo, boa
parte das descri€‰es de quadros cl„nicos de coledocolit„ase se faz associada a achados ultrassonogr†ficos. Nas situa€‰es em que o
paciente possui cl„nica de coledocolit„ase e, ao mesmo tempo, a USG mostrando c†lculo na via biliar principal, n•o se faz necess†rio
que se proceda da Colangio-RNM.

ECOENDOSCOPIA
No diagn‡stico da coledocolit„ase, independentemente
do tamanho do c†lculo ou do di…metro coledociano, a
ecoendoscopia ‚ teste diagn‡stico mais acurado do que a
CPRE para a detec€•o de c†lculo na via biliar principal
(dependendo, logicamente, do examinador).

124
Arlindo Ugulino Netto – CIRURGIA ABDOMINAL– MEDICINA P7 – 2010.2

TOMOGRAFIA DE ABDOME
A Tomografia Computadorizada (TC) de abdome ‚ um exame pouco
sens„vel para o diagn‡stico de coledocolit„ase. Seguindo o seu racioc„nio qu„mico-
f„sico, a visualiza€•o de c†lculos por TC depende, exclusivamente, da natureza
deste c†lculo.
A visualiza€•o de c†lculos por este artif„cio somente ‚ poss„vel, caso o
mesmo apresente †reas de calcifica€•o (radiopacos), uma vez que a TC ‚ um
exame radiol‡gico. Por‚m, a maioria dos c†lculos de ves„cula e de col‚doco n•o
s•o calcificados. Podemos, por exemplo, comparar sobre a utilidade da TC em
diagn‡stico de c†lculos renais. De maneira totalmente distinta aos c†lculos de
ves„cula e de col‚doco, os c†lculos renais, mais frequentemente, s•o calcificados, o
que torna este exame o de escolha para o diagn‡stico de nefrolit„ase.

COLANGIO-RESSONÂNCIA NUCLEAR MAGNÉTICA


Indiscutivelmente, a Colangio-RNM ‚ o exame de escolha (padr•o-ouro)
para o diagn‡stico de coledocolit„ase. ˆ um exame de alta sensibilidade e
especificidade e, por ser n•o invasivo, passa a ser o exame de elei€•o para o
diagn‡stico.
A RNM ‚, portanto, o exame de escolha para o diagn‡stico de
coledocolit„ase. No exame demonstrado na figura ao lado, podemos visualizar o
c†lculo na parte distal do col‚doco.

COLANGIOPANCREATOGRAFIA RETRÓGRADA POR ENDOSCOPIA (CPRE)


Neste exame, atrav‚s do aparelho endosc‡pico, se localiza a papila maior do duodeno e, atrav‚s dela, se faz a
canulaۥo por cateter, com a finalidade de injetar contraste na via biliar principal. Por ser um exame invasivo, o custo-
benef„cio ‚ algo a ser avaliado durante a sua indica€•o, pois, o custo, por vezes, pode superar o benef„cio. De fato, a
CPRE n•o ‚ mais o exame de escolha para diagn‡stico de coledocolit„ase, sendo superado pela Colangio-RNM
Atualmente, a sua indica€•o ainda ‚ algo a ser cogitado pelos cirurgi‰es nas ocasi‰es em que sua procedƒncia
j† pode instituir ao paciente uma terapia, como a retirada de c†lculos impactados na ampola de Vater. Em outras
palavras, isto significa dizer que a CPRE pode j† conceder ao paciente uma terapia definitiva para sua condi€•o cl„nica.

A CPRE ‚ utilizada nas ocasi‰es em que a Colangio-RNM ainda deixa dŠvidas.


Somente ‚ realizada em grandes centros do Sudeste, como S•o Paulo. Na imagem,
podemos visualizar a utiliza€•o do eletrocaut‚rio em torno da papila maior do
duodeno. Uma das principais complica€‰es no p‡s-operat‡rio ‚ a pancreatite aguda,
por conta do edema de papila. Conclui-se que sua utiliza€•o para diagn‡stico ‚ muito
ineficaz e com muitos riscos e, sua indica€•o para diagn‡stico depende dos
resultados da Colangio-RNM e, obviamente, se o local j† disponibiliza este tipo de
exame.

TRATAMENTO
Antes de se indicar qual a terapia a ser institu„da, alguns fatores devem ser analisados:
 Número e tamanho do(s) cálculo(s): A terapia designada para tratamento de 1 (um) c†lculo de ducto col‚doco ‚ totalmente
distinta de condi€‰es em que se tem mŠltiplos c†lculos (a exemplificar, mais de 10 c†lculos). Nos exames de imagem, ‚ de
grande import…ncia a descri€•o do nŠmero e tamanho dos c†lculos, assim como o di…metro do ducto biliar comum, pois, s•o
vari†veis que ajustar a terapƒutica cirŠrgica.
 Diâmetro do ducto biliar comum (2 cm): Partindo-se do princ„pio que o ducto biliar comum tem, em m‚dia, 2 cm de
diâmetro, qualquer c†lculo que se apresente com di…metro al‚m deste valor apresentar† uma maior dificuldade terapƒutica.
O ducto col‚doco tem, em m‚dia, 0,6 cm. O aumento de seu di…metro para al‚m deste valor ‚ algo a ser considerado, pois,
em pacientes jovens, isto significa dizer que o ducto col‚doco j† se apresenta dilatado. Presume-se que esta dilata€•o refere
a uma condi€•o em que o ducto col‚doco est† “doente”, consequente a uma diminui€•o de sua motilidade. Nesta ocasi•o, a
retirada simples do c†lculo n•o ser† a terapƒutica mais correta para o caso, requerendo uma nova comunica€•o entre a
ves„cula biliar e o duodeno.
 Experiência local com laparoscopia de vias biliares: Nos Šltimos 10 anos, a cirurgia por videolaparoscopia sofreu v†rias
transforma€‰es. Atualmente, ‚ a cirurgia de elei€•o para, praticamente, todas as condi€‰es cirŠrgicas do trato digestivo. Por
apresentar um car†ter invasivo muito aqu‚m (abaixo) da cirurgia aberta, recupera€•o p‡s-operat‡ria r†pida, poucos efeitos
p‡s-operat‡rios (praticamente, n•o ocorre „leo paral„tico), ela passou a ser empregada como terapia de elei€•o para,
praticamente, todas as cirurgias da via biliar. A experiƒncia ‚ algo fundamental para que a cirurgia assistida por v„deo
(videolaparoscopia) apresente benef„cios sobre a cirurgia convencional (por via aberta).
 Experiência local com esfincterotomia (papilotomia) endoscópica: Papilotomia endosc‡pica (feita por meio de CPRE) ‚
um artif„cio que visa a abertura da papila maior do duodeno e a sŠbita retirada dos c†lculos no interior do ducto col‚doco.
 Presença ou ausência de vesícula in situ (isto ‚: ves„cula n•o retirada)

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Arlindo Ugulino Netto – CIRURGIA ABDOMINAL– MEDICINA P7 – 2010.2

OBS2: Em quest‰es de Concursos PŠblicos, a descri€•o de um caso cl„nico compat„vel com a coledocolit„ase pode apresentar o
termo “servi€o sem experiƒncia em videolaparoscopia”. Caso a descri€•o do referido caso, de nada conste sobre a videolaparoscopia,
o estudante deve subentender que a videolaparoscopia j† ‚ algo rotineiro daquele servi€o.
OBS3: A papilotomia endosc‡pica ‚ algo pouco rotineiro nos estados do Nordeste. Desta maneira, os servi€os do Sudeste, como S•o
Paulo e Rio de Janeiro j† apresentam certa experiƒncia nesta modalidade terapƒutica. Por isto, a terapia a ser institu„da tamb‚m deve
levar em conta se a regi•o consta ou n•o de um servi€o com experiƒncia na papilotomia endosc‡pica por CPRE.

O tratamento da coledocolit„ase depende da fase em que o diagn‡stico ‚ feito: pr‚-operat‡rio (isto ‚, com
ves„cula in situ), intra-operat‡rio (durante a cirurgia de via biliar) ou p‡s-operat‡rio (ap‡s uma eventual retirada da
ves„cula).

DIAGN•STICO PRŽ-OPERAT•RIO DE COLEDOCOLIT•ASE COM VES•CULA “IN SITU”


Nesta situa€•o, o paciente tem coledocolit„ase e tal situa€•o foi diagnosticada no pr‚-operat‡rio atrav‚s da
Colangio-RNM. Atrav‚s deste artif„cio de imagem, devemos avaliar todas aquelas vari†veis que podem influenciar na
terapƒutica a ser institu„da, tais como:
 Tamanho dos c†lculos;
 NŠmero dos c†lculos;
 Di…metro da via biliar.

Al‚m disso, dois outros fatores devem ser avaliados: (1) se h† experiƒncia local com laparoscopia; e (2) se h†
experiƒncia local com papilotomia endosc‡pica por CPRE.
O tratamento da coledocolit„ase com diagn‡stico pr‚-operat‡rio depende, portanto, de todas estas vari†veis.
Para entendƒ-lo, tomemos dois exemplos distintos:
1 2
Exemplo Exemplo . Paciente com cl„nica suspeita de Exemplo . Tomando como base um paciente que
coledocolit„ase e, ao se proceder da Colangio-RNM, apresenta cl„nica suspeita de coledocolit„ase e, ao
podemos visualizar os achados abaixo, duas se proceder da Colangio-RNM, podemos visualizar
condutas podem ser adotadas. os achados abaixo, duas condutas podem ser
 C†lculo menor do que 2,0 cm; adotadas.
 Menos que 2 c†lculos;  C†lculo(s) > 2,0cm;
 Di…metro da via biliar < 2,0 cm  Mais de 2 c†lculos;
 Di…metro do col‚doco > 2,0cm;
 Estenose do ducto biliar proximal ao
esf„ncter de Oddi.
Tratamento Diante destas vari†veis, seria necess†rio apenas  Deriva€•o biliodigestiva: De acordo com as
retirar o c†lculo, sem que seja necess†rio alterar a caracter„sticas acima referidas, a terapia ‚
via biliar. Para isso, devemos considerar as cirŠrgica. Por‚m, diferentemente do caso do
1
seguintes situa€‰es: Exemplo , nesta ocasi•o devemos drenar a
 Caso o servi€o apresente experi•ncia local via biliar, pois, o seu ducto col‚doco j† est†
em videolaparoscopia: Nesta situa€•o, o “doente”. Dois procedimentos cirŠrgicos
procedimento de escolha ‚ a colecistectomia podem ser institu„dos: Hepaticojejunostomia
por videolaparoscopia + coledocolitotomia com em Y de Roux ou Anastomose
ou sem drenagem a Kehr e, associado, pode- col‚docoduodenal.
se proceder da colangiografia e/ou USG intra- o Hepaticojejunostomia em Y de Roux: ˆ
4
operat‡ria (ver OBS ). um procedimento que pode ser procedido
 Caso o servi€o apresente experi•ncia local por videolaparoscopia ou por acesso
com papilotomia endosc‡pica: CPRE com convencional. ˆ uma cirurgia que visa
papilotomia endosc‡pica pr‚-operat‡ria e manter a drenagem hep†tico-jejunal o
colecistectomia laparosc‡pica. Como podemos mais fisiol‡gico poss„vel.
visualizar, nesta ocasi•o, s•o realizados dois o Anastomose coledocoduodenal: ˆ o
procedimentos cirŠrgicos. Caso o servi€o tenha procedimento de elei€•o em pacientes
experiƒncia em CPRE e videolaparoscopia, com alto risco cirŠrgico ou em idosos.
devemos optar pela videolaparoscopia, pois,
em somente um procedimento cirŠrgico a Assim como vimos no exemplo anterior, a
terapia ‚ estabelecida. deriva€•o biliodigestiva deve ser tentada por via
 Servi€o sem experi•ncia local com CPRE e laparosc‡pica caso haja experiƒncia local para tal
videolaparoscopia: Nesta situa€•o, a procedimento. Caso contr†rio, deve ser tentada por
terapƒutica cirŠrgica ser† acessada por via via convencional.
aberta (convencional). A coledocolitotomia com Contudo, de uma forma geral, estas cirurgias e
ou sem drenagem a Kehr, associada ‹ anastomoses n•o devem ser realizadas em
colecistectomia ser† a cirurgia a ser realizada. pacientes idosos ou com alto risco cirŠrgico. Para
eles, devemos abreviar o procedimento, realizando
apenas uma anastomose col‚doco-duodenal.

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4
OBS : A colangiografia intra-operatória é um artifício diagnóstico em que se procede da radiografia de toda a via bilia
durante o ato cirúrgico. A sua indicação é feita nas ocasiões em que se tem algum fator clínico-laboratorial que aponte
que ocorreu uma migração cálculo através do canal biliar (coledocolitíase). Isto é importante pois o tratamento da
colelitíase é diferente por completo da terapia da coledocolitíase. Abaixo, são listados os principais fatores a serem
analisados para se indicar a colangiografia intra-operatória:
 História clínica de icterícia colestática. Nessas ocasiões, os pacientes apresentam dor abdominal tipo cólica e, durante as
crises, ocorre icterícia (mucosas conjuntivas amareladas) e/ou colúria (urina escura) e/ou acolia fecal (fezes esbranquiçadas);
 Elevação de bilirrubina total (acima de 3mg/dL), Fosfatase alcalina e/ou Gama-GT (marcadores bioquímicos de colestase
indicam que o cálculo migrou através do canal);
 História de colangite que é suscitada pela presença de febre e calafrios durante a crise, com ou sem icterícia;
 História de pancreatite.
 Ultrassom com dilatação das vias biliares.

DIAGNÓSTICO INTRA-OPERATÓRIO DE COLEDOCOLITÍASE


Esta situação é comum nos casos em que o cirurgião não suspeitou de coledocolitíase durante o pré-operatório.
O diagnóstico, nestas ocasiões, se faz pela colangiografia intra-operatória (geralmente solicitada quando se observa os
4
parâmetros destacados na OBS ).

Exemplo Exemplo3. Tomando como base um paciente que não foi Exemplo4. Tomando como base um paciente que não foi
diagnostico pré-operatoriamente e, ao se proceder da diagnostico pré-operatoriamente e, ao se proceder da
colangiografia intra-operatória, podemos notar: colangiografia intra-operatória, podemos notar:
 Cálculo < 2,0 cm;  Cálculo maior do que 2,0 cm;
 Menos que 2 cálculos;  Mais do que 2 cálculos;
 Diâmetro da via biliar < 2,0 cm  Diâmetro da via biliar > 2,0 cm

Tratamento  Serviço apresenta experiência em  Serviço apresenta experiência em


videolaparoscopia: esta é a conduta de eleição, videolaparoscopia: realizar colecistectomia,
que é a exploração biliar laparoscópica. coledocolitotomia e procedimento de drenagem:
 Caso o serviço não tenha experiência em Hepatico-jejunostomia em Y de Roux (para
videolaparoscopia: A conduta passa a ser a paciente jovem) ou Anastomose
coledocolitotomia por via aberta, com drenagem a colédocoduodenal (para paciente idoso) por via
Kehr por via convencional. laparoscópica.
 Caso o serviço não tenha experiência em
CPRE com papilotomia endoscópica pós-operatória videolaparoscopia: realizar o mesmo
geralmente não é utilizada, pois não existem garantias de procedimento, mas por via aberta.
bons resultados, diferentemente da situação em que o
diagnóstico é pré-operatório. Esta opção seria a última Não realizar CPRE.
indicação.

COLEDOCOLITÍASE PÓS-COLECISTECTOMIA (PÓS-OPERATÓRIO)


O diagnóstico de coledocolitíase também pode ser obtido somente no pós-operatório, após a retirada da vesícula biliar. Nesta
ocasião, devemos conhecer o tempo de pós-operatório, dividindo em terapia distinta de acordo com esta cronologia. Se a
coledocolitíase ocorrer em até 2 anos à cirurgia, a conduta será diferente se a mesma ocorreu após 2 anos da colecistectomia.
Tecnicamente, o procedimento cirúrgico apresentará mais dificuldades, pois, como o paciente já foi submetido a um procedimento
cirúrgico prévio, quase de certeza, haverá bridas, aderências, alterações anatômicas, etc. É válido ressaltar que a colecistectomia não
será necessária, uma vez que vesícula já teria sido retirada.
 Litíase residual de colédoco (até 2 anos da cirurgia): com este intervalo de tempo, há uma alta probabilidade
de litíase residual, caracterizando uma coledocolitíase secundária (pois o cálculo facetado e duro de colesterol
é mais comum, decorrente de cálculos da vesícula biliar que migraram). A conduta de escolha (de eleição) é a
CPRE com papilotomia ou esfincterotomia endoscópica (única situação em que a CPRE é a primeira
escolha), se o cálculo apresentar tamanho inferior a 2cm, for único e a via biliar com dilatação menor que 2cm.
Pelo pressuposto que o paciente já não tem mais vesícula biliar, tal procedimento endoscópico será mais bem
tolerado do que uma nova cirurgia. A única contra-indicação absoluta para a sua realização é o fato de o serviço
de cirurgia não apresentar experiência para a CPRE, quando sua indicação é proscrita. Nessas situações,
indica-se a exploração de via biliar laparoscópica ou aberta. Podendo-se ainda realizar a exploração de via biliar
pelo trajeto do dreno de Kehr (colangiografia intra-operatória). Quando o cálculo for maior que 2cm e a via biliar
estiver muito dilatada, devemos proceder com coledocolitotomia mais procedimento de drenagem (a técnica
varia de acordo com a operabilidade do paciente).
 Coledocolitíase primária (após 2 anos da cirurgia): em decorrência deste intervalo de tempo, há uma alta
probabilidade de ser uma coledocolitíase primária (até porque o cálculo de pigmento marrom é mais comum
neste grupo). A conduta é a de proceder da coledocolitotomia associada a procedimento de drenagem
2
biliar. A derivação também segue o Exemplo , variando de acordo com a operabilidade do paciente. Podemos
usar, como terceira opção, a exploração da via biliar através do dreno de Kehr se o diagnóstico da
coledocolitíase ocorreu em até 12 semanas depois da cirurgia (tempo em que fica instalado o dreno).

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FLUXOGRAMAS PARA T RATAMENTO DA C OLEDOCOLIT…ASE

TRATAMENTO COM DIAGNÓSTICO PRÉ-OPERATÓRIO DE COLEDOCOLITÍASE (VESÍCULA IN SITU)

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TRATAMENTO COM DIAGNÓSTICO INTRA-OPERATÓRIO DE COLEDOCOLITÍASE

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TRATAMENTO COM DIAGNÓSTICO PÓS-OPERATÓRIO DE COLEDOCOLITÍASE

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DISCUSS„O DE CASOS

C ASO 1. M.R.R, 33 anos, é atendido em pronto-atendimento do Hospital João Pessoa, com queixa principal de dor
intensa no hipocôndrio direito, com irradiação para o dorso. Com queixas de vômitos foram solicitados exames
laboratoriais. BB: 6,0 mg/dL; Fosfatase alcalina: 600; Gama-GT: 1.000. A USG abdominal convencional demonstrou
dilatação de via biliar. Qual seriam a próxima conduta e a terapia?
Pelos exames laboratoriais, já podemos predizer que o paciente apresenta uma estase biliar. A paciente,
provavelmente, apresenta coledocolitíase. Porém, somente temos certeza de sua clínica, que é compatível com
a coledocolitíase. A USG não demonstrou muitas coisas a respeito do cálculo, daí que, o próximo passo é a
requisição da Colangio-RNM. Através deste exame, devemos analisar tamanho e diâmetro dos cálculos, assim
como a integridade da via biliar.
Na Colangio-RNM, podemos visualizar:
 Cálculo único de 1,5 cm de diâmetro
 Via biliar de 1,0

Pelas características clínicas e radiológicas, a terapia é eminentemente cirúrgica. Como a paciente apresenta
vesícula in situ, devemos optar pela terapia que mais é experiência do serviço. Na questão, não foi mencionado
se o serviço não apresenta experiência em videolaparoscopia, consequentemente, subentendemos que o
mesmo apresenta. A terapêutica a ser instituída é por videolaparoscopia, procedendo-se da: colecistectomia por
videolaparoscopia + coledocolitotomia com ou sem drenagem
Em serviços de ponta, a melhor conduta poderia ser por videolaparoscopia: colecistectomia por vídeo +
coledocolitotomia com ou sem drenagem a Kehr + colangiografia intra-operatório e/ou USG intra-operatória. Ou,
poderíamos realizar a CPRE pré-operatória + colecistectomia por videolaparoscopia, caso o serviço tivesse
experiência nesta área.

C ASO 2. A.E, 75 anos. É atendido no pronto-atendimento do Hospital Campina Grande com queixa de dor no hipocôndrio
direito, com irradiação para o dorso. Nos antecedentes cirúrgicos, percebemos que o mesmo foi submetido a uma
colecistectomia há 6 anos. FA, BT, Gama-GT elevados. No exame físico, icterícia flutuante. O cirurgião de imediato
indicou uma Colangio-RNM, que indicou a presença de cálculo de 1,5 cm, com via biliar de 1,5 cm. O cirurgião optou por
conduta cirúrgica (convencional). No ato operatório, o cirurgião se depara com um cálculo arenoso, quebradiço,
fragmentável.
O diagnóstico neste caso é a de coledocolitíase primária. Seguindo-se das características etiopatogênicas,
provavelmente, o paciente apresenta uma estase biliar. Por isto, a conduta passa a ser de derivação
biliodigestiva (opetar apenas pela anastomose colédoco-duodenal devido à idade do paciente).

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MED RESUMOS 2012


NETTO, Arlindo Ugulino.
CIRURGIA ABDOMINAL _________

ICTERÍCIA OBSTRUTIVA
(Professor Marcelo Gonçalves)

A palavra icter„cia significa amarelo, amarelento, atrav‚s das varia€‰es do latim icterus, que, por sua vez, tem
origem no radical grego ikteros. A icterícia cl„nica ‚ caracterizada pela condi€•o de colora€•o amarelada do plasma,
pele e mucosas, determinada pelo acŠmulo dos pigmentos biliares.
A icter„cia pode ser evidenciada na esclera, pele, l„ngua e outros locais ricos em elastina devido ‹ grande
capacidade de impregna€•o do pigmento biliar. Em um est†gio mais avan€ado, a urina, a l†grima e at‚ mesmo o suor
podem se apresentar amarelados devido ao acŠmulo de bilirrubina conjugada.
H† v†rias formas de classificar a icter„cia. Podemos classific†-la quanto ao local de instala€•o do processo
patol‡gico, como por causas intra ou extra-hep†ticas; ou mesmo classific†-la de acordo com o processo fisiopatol‡gico
desta condi€•o, como icter„cia hemol„tica, hepatocelular, do rec‚m-nascido e a icter„cia obstrutiva. ˆ sobre este tema
que abordaremos agora, realizando, antes, uma nova revis•o sobre as vias biliares necess†ria para entender o aspecto
fisiopatol‡gico da icter„cia obstrutiva.

VIAS B ILIARES E METABOLISMO DA BILIRRUBINA

ANATOMIA DAS VIAS BILIARES


A via biliar extra-hep†tica se inicia na
confluƒncia dos ductos hep†ticos direito e esquerdo,
formando o ducto hep†tico comum, e se encerra ao
n„vel da ampola de Vater. O ducto hep†tico comum tem
3 – 5 cm e recebe o ducto c„stico, pequeno conduto que
liga a luz da ves„cula ao restante da via biliar. Quando
ocorre a fus•o entre estes dois ductos, tem-se a
forma€•o do ducto col‚doco, que varia de 5 – 7 cm de
comprimento.
O ducto col‚doco pode ser dividido em pelo
menos quatro por€‰es: (1) uma que est† acima do
duodeno, chamada de supra-duodenal; (2) uma que
est† por tr†s do duodeno, chamada de retro-duodenal;
(3) outra que est† dentro do p…ncreas, chamada de
intra-pancreática; (4) e, por fim, outra pequena por€•o
localizada dentro da ampola de Vater, que n•o possui
uma nomenclatura espec„fica, mas que conflui,
juntamente ao ducto pancre†tico principal, para
desembocar na papila principal (ou maior) do duodeno
(papila de Vater).
A ves„cula biliar ‚ um ‡rg•o em formato piriforme (de pƒra), que se encontra aderido ‹ superf„cie inferior do
f„gado, em um sulco que separa os lobos direito e esquerdo do f„gado. Apresentando 7-10 cm de comprimento, situa-se
na fossa da ves„cula biliar, na face visceral do f„gado. Ela pode ser dividida em fundo, corpo e colo, sendo esta regi•o
respons†vel por ligar a ves„cula ao ducto c„stico. No colo da ves„cula, existe uma regi•o em forma de bolsa denominada
de infundíbulo (bolsa de Hartmann), local frequente da localiza€•o de c†lculos.

METABOLISMO DA BILIRRUBINA
Um breve relato sobre o metabolismo dos pigmentos biliares revela a produۥo de bilirrubina como produto final
da degradaۥo do grupo heme, componente da hemoglobina, e, em menor parte, formada a partir da degradaۥo de
outros complexos prot‚icos (catalase, mioglobina e citocromo P-450). O grupamento heme ‚ novamente quebrado,
resultando em ferro (carreado por via s‚rica na forma livre) e nŠcleos pirr‡licos (anel porfir„nico). Este anel porfir„nico
sofre uma oxida€•o, formando a biliverdina, que sofre uma redu€•o, formando a bilirrubina livre (n•o-conjugada).
A bilirrubina livre ‚ transportada por prote„nas na corrente sangu„nea, principalmente pela albumina, at‚ o f„gado,
onde ‚ recolhida pelos hepat‡citos atrav‚s de sistemas prot‚icos, transportadores de membrana (prote„nas X e Y) num
processo chamado captaۥo.
Ap‡s sua entrada na c‚lula, a bilirrubina ‚ conjugada por a€•o de enzimas microssomais (UDP
glicuroniltransferase) com o †cido glicurŒnico e forma um composto mais polar e hidrossolŠvel (bilirrubina conjugada) o
qual, por sua vez, ‚ excretado atrav‚s do p‡lo biliar do hepat‡cito, em „ntimo contato com os canal„culos biliares.
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Arlindo Ugulino Netto – CIRURGIA ABDOMINAL– MEDICINA P7 – 2010.2

A bilirrubina conjugada passa, então, a formar um complexo lipídico-micelar, que é excretado no duodeno
através do ducto biliar principal, e será desconjugado e reduzido, no cólon, por ação das glicuronidases bacterianas,
formando os urobilinogênios. Estes são excretados nas fezes (na forma de estercobilina, dando a coloração escura das
fezes), em sua maioria, porém uma pequena parte é reabsorvida e volta ao fígado pelo sistema porta, constituindo o
ciclo enteroepático da bilirrubina. Desta fração que retorna ao hepatócito, parte é desviada para os rins, onde sofre
oxidação e é excretada na forma de urobilina pela urina (dando a coloração amarelo-esverdiada da urina).

OBS1: Note que, a bilirrubina não-conjugada, devido a sua baixa hidrossolubilidade, necessita de processo fisiológico que a torne
hidrossolúvel. No microssoma hepático, sob a ação da enzima bilirrubina-uridino difosfo-glicuronil transferase, a bilirrubina é
conjugada ao ácido glicurônico, levando a formação de mono e diglicuronídios de bilirrubina (hidrossolúveis). Após deixar a célula
hepática, a bilirrubina conjugada (agora, hidrossolúvel) é conduzida através das vias biliares e excretada no tubo digestivo. No cólon,
a bilirrubina conjugada sofre ação bacteriana e, sob ação da enzima betaglicuronidase, transforma-se em urobilinogênio.
OBS2: Pacientes que apresentam distúrbios na primeira fase do metabolismo da bilirrubina (desde a sua formação até a sua chegada
no fígado) apresentarão uma hiperbilirrubinemia indireta, manifestando icterícia, mas sem colúria e sem acolia fecal (pois a bilirrubina
ainda é metabolizada no fígado e consegue chegar ao intestino e ao rim, sendo excretada por estes dois sistemas). Diferentemente
disso, problemas relacionados à excreção da bilirrubina conjugada no hepatócito ou à liberação da bile pelas vias biliares (o que
define a chamada icterícia obstrutiva) manifestam-se clinicamente através da icterícia com colúria (urina escura) e acolia fecal (fezes
pálidas), o que caracteriza a síndrome colestática.

CLASSIFICA•„O E ETIOLOGIA
A partir do conhecimento do ciclo metabólico da
bilirrubina, definem-se as icterícias em pré-hepáticas (de
produção ou de captação), hepáticas (de conjugação) e
pós-hepáticas (de excreção). As seguintes condições
aumentam a bilirrubina:
 Icterícia pré-hepática: fatores que causem
hiperprodução de bilirrubina (hiperbilirrubinemia indireta):
hemólise e shunt.
 Icterícia hepática: fatores que comprometam as funções
do transporte e conjugação do hepatócito: causas
hepatocanaliculares (Ex: hepatite alcoólica, hepatite viral,
hepatite por drogas, etc.).
 Icterícia colestática: fatores que impeçam a excreção
através das vias biliares intra ou extra-hepáticas: causas
obstrutivas (icterícia obstrutiva), causas familiares
hereditárias (síndrome de Dubbin-Johson e de Rotor),
etc.

Portanto, as icterícias de excreção podem ser


devidas a problemas mecânicos/anatômicos sobre a via
biliar principal, constituindo o grupo das icterícias
obstrutivas.

133
Arlindo Ugulino Netto – CIRURGIA ABDOMINAL– MEDICINA P7 – 2010.2

A colestase é a situação em que a bile, produzida pelo fígado, falha em alcançar o duodeno, e isto pode ser
devido a distúrbios do fluxo existente entre o hepatócito e a ampola de Vater ou relacionado a problemas de produção e
excreção da bile (Figura 1). Há várias causas conhecidas de colestase (seja ela intra ou extra-hepática) acometendo
sítios anatômicos distintos, tais como:
 Hepatócitos e canalículos: Drogas, hepatites virais, estrogênios.
 Ductos interlobulares: Cirrose biliar primária (CBP), sarcoidose, colangite esclerosante primária (CEP), rejeição crônica do
aloenxerto.
 Ductos intra-hepáticos principais: CEP, cálculos intra-hepáticos, colangiocarcinoma, parasitas.
 Ducto hepático comum: Carcinoma da vesícula biliar
 Ducto biliar comum: Atresia extra-hepática, estenoses traumáticas, CEP, cistos de colédoco, parasitas, hemobilia,
colangiocarcinoma.
 Região periampular: Cálculos, tumores de cabeça de pâncreas, pancreatite crônica, neoplasias periampulares, anomalias da
junção biliopancreática.

3 2
OBS : Como vimos a propósito da OBS , a colestase é caracterizada por icterícia, colúria e acolia fecal (síndrome
colestática). Contudo, note que a colestase não é uma situação inerente à icterícia obstrutiva. A síndrome colestática
pode ocorrer devido a problemas em duas condições diferentes: distúrbios na passagem da bile pela via biliar
(caracterizando a própria colestase obstrutiva) ou na excreção da bile pelos hepatócitos depois da sua conjugação (isto
é: distúrbios que acontecem após a conjugação e a excreção da bilirrubina para dentro dos canalículos biliares intra-
hepáticos). As doenças hereditárias ou familiares (síndrome de Dubin-Johson e síndrome do Rotor) e doenças
hepatocelulares caracterizam esta segunda situação, em que o paciente apresenta colestase, mas sem possuir um
defeito anatômico na sua via biliar propriamente dita (colestase não-obstrutiva).
4
OBS : Portanto, um paciente com colestase pode apresentar ou não obstrução da via biliar e, para diferenciar as duas
situações, podemos lançar mão da ultrassonografia (principal exame a ser solicitado). Por meio dela, podemos
identificar uma via biliar dilatada, caracterizando problemas na excreção da bile através das vias biliares. Caso contrário,
sugere distúrbios na excreção da bilirrubina conjugada em nível hepático. A diferenciação destas duas condições se faz
importante do ponto de vista terapêutico.
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OBS5: Em resumo, toda vez em que há suspeita de obstrução da via biliar (com dilatação da mesma), duas principais hipóteses
diagnósticas devem ser primeiramente avaliadas: coledocolitíase (cálculos na via biliar) ou tumores da via biliar (principalmente
tumores periampulares). As principais causas extra-hepáticas de colestase estão resumidas na seguinte tabela:

Causas extra-hepáticas de colestase


Causas intrínsecas às vias biliares Causas extrínsecas às vias biliares
 Coledocolitíase (causa mais comum)  Carcinoma do pâncreas
 Carcinoma do ducto biliar  Carcinoma da ampola de Vater
 Carcinoma da vesícula  Carcinoma metastático
 Estenoses benignas pós-operatórias (iatrogênica)  Pancreatite - (aguda e crônica)
 Colangite esclerosante  Cistos pancreáticos
 Anomalias congênitas  Pâncreas anular
 Parasitose  Linfoma
 Hipernefrose
OBS: Desta forma, toda vez que um paciente apresentar  Fibrose retroperitoneal
icterícia, colúria e acolia fecal associados à ultrassonografia com
dilatação, devemos levantar, inicialmente, estas hipóteses
diagnósticas.

DIAGN†STICO CL…NICO E LABORATORIAL DA ICTER…CIA O BSTRUTIVA


O diagnóstico definitivo da icterícia obstrutiva se faz através da ultrassonografia, que auxilia a diferenciar uma
causa obstrutiva de uma causa hepática de colestase. Contudo, a apresentação clínica do paciente e dos dados
laboratoriais são fundamentais para nos guiar a estabelecer hipóteses diagnósticas.

DADOS CLÍNICOS
 Identificação do paciente: pela faixa etária do paciente, podemos sugerir hipóteses específicas.
 Instalação paulatina ou súbita: geralmente, a coledocolitíase (causa principal de icterícia obstrutiva) é
caracterizada pelo aparecimento de dor súbita e icterícia de rápida progressão. Depois disso, o paciente passa a
desenvolver icterícia flutuante (as duas principais causas de icterícia flutuante são: coledocolitíase e tumor de
papila).
 Presença de dor em hipocôndrio direito, febre com calafrios e icterícia (tríade de Charcot): caracterizam
colangite.
 Curva da icterícia: para avaliar se a icterícia é predominantemente progressiva ou flutuante e intermitente.
 Síndrome colestática: icterícia, colúria e acolia fecal.
 Tempo de acolia e eventual associação com prurido (muito comum na síndrome colestática).
 Antecedente.
 Exame físico: importante por identificar um paciente hepatopata
(figura ao lado): eritema palmar, flappings, telangiectasias,
aranhas vasculares, ginecomastia, implantação de pêlos em
formato ginecóide, ascite, sinais de encefalopatia, etc. Esta
3
identificação se faz importante pois, como vimos na OBS , o
principal diagnóstico diferencial da icterícia obstrutiva é a
colestase por causas intra-hepáticas.

Durante a avaliação clínica do paciente, devemos saber


identificar sinais e sintomas que, em conjunto, possam caracterizar
síndromes que cursam com icterícia obstrutiva, tais como:
 Síndrome de Bard-Pic. Estudo clínico realizado em 1888
seguido de autopsias de sete pacientes com tumor na cabeça do
pâncreas caracterizou esta síndrome, que consiste em:
 Icterícia obstrutiva.
 Tumor na cabeça do pâncreas
 Vesícula biliar palpável

 Síndrome de Courvoisier-Terrier: estudo clínico realizados em


1890 seguido de autopsias de pacientes ictéricos caracterizou
esta síndrome (que deu nome ao sinal semiológico), concluindo
pelos seguintes achados:
 Icterícia Obstrutiva.
 Tumor periampular (qualquer um deles).
 Vesícula Biliar distendida, palpável (ou impalpável, se
envolvida em fibrose, como na litiase biliar) e indolor.

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Arlindo Ugulino Netto – CIRURGIA ABDOMINAL– MEDICINA P7 – 2010.2

6
OBS : Embora sejam semiologicamente semelhantes, a síndrome de Courvoisier-Terrier diferencia-se da síndrome de
Bard-Pic pois ela não apresenta, obrigatoriamente, um tumor na cabeça do pâncreas (o que caracteriza a síndrome de
Bard-Pic). Contudo, na maioria dos casos, pacientes com Courvoisier-Terrier apresentam tumor na cabeça do pâncreas
(uma vez que este é um dos tumores periampulares mais comuns).
7
OBS : Uma informação importante se faz sobre a apresentação clínica da colangite. A colangite aguda é caracterizada
pela tríade de Charcot (dor em HD, icterícia e febre com calafrios). Já a colangite aguda supurativa, quadro complicado
da colangite aguda, é caracterizada pela pêntade de Reynolds (tríade de Charcot + alterações no nível de consciência +
hipotensão). Esta diferenciação se faz importante pois o tratamento inicial da colangite aguda pode ser clínico, através
do uso de antibióticos que cubram germes gram-negativos e anaeróbios, enquanto que o tratamento da colangite aguda
supurativa deve ser feito através de drenagem urgente da via biliar.

EXAMES LABORATORIAIS
Diante de um paciente com icterícia, é prudente solicitar todos os exames relacionados ao fígado e à via biliar,
no intuito de confirmar as hipóteses levantadas durante a avaliação clínica.
 Bilirrubina (total e frações): o paciente só desenvolve escleras amareladas se ele apresenta pelo menos 2,5mg/dl
de bilirrubina; icterícia na pele só se desenvolve quando a bilirrubina ultrapassa 6mg/dl. Contudo, muito antes
destes eventos, já é possível detectar alterações nos marcadores de lesão canalicular ou de lesão hepatocitária.
 Marcadores de lesão hepatocitária: alanina aminotransferase (ALT ou TGP) e aspartato aminotransferase (AST
ou TGO). Quando estes marcadores estão acima de 500, possivelmente a causa é hepatite viral (se não houver
dilatação das vias biliares).
 Marcadores de lesão canalicular ou obstrução da via biliar: Fosfatase alcalina, 5-nucleotidase e Gama-GT. Estes
marcadores são as primeiras enzimas canaliculares a se alterarem em um exame laboratorial. A Gama-GT é
mais sensível, mas é pouco específica (pode se alterar, por exemplo, caso o paciente tenha feito uso de álcool
até a última semana). O mesmo problema tem a fosfatase alcalina, que também é produzida mediante
alterações ósseas, placentárias e intestinais. Contudo, de uma forma geral, estes marcadores se alteram antes
mesmo da bilirrubina e do TGO e TGP.
 Marcadores de função hepática: Albumina/Glob e coagulograma.
 Tempo de ativação de protrombina (TAP)
 Colesterol
 PCR: embora seja inespecífica, é bastante sensível para qualquer processo inflamatório.
 Marcadores sorológicos:
 VHA (Anti- VHA - IgM e IgG)
 HB (HBS Ag, HBe Ag, Anti - HBs, Anti - HBc - IgM e IgG, Anti - HBe)
 VHC (Anti - VHC)

DIAGN†STICO R ADIOL†GICO DE I CTER…CIA O BSTRUTIVA


Diante de um paciente
ictérico, com dados clínicos de
acolia fecal e colúria, apresentando
enzimas hepáticas alteradas e
predomínio de bilirrubina
conjugada, poderíamos afirmar que
ele apresenta colestase. Contudo,
devemos lançar mão de exames
radiológicos complementares para
definir se a causa da colestase é
intra ou extra-hepática, condições
tratadas de formas extremamente
diferentes.
De uma forma geral,
devemos seguir conforme mostra o
fluxograma ao lado. De acordo com
ele, se o paciente se mostra
ictérico, com enzimas hepáticas
alteradas e hiperbilirrubinemia
conjugada, sem apresentar fatores
epidemiológicos ou sinais de
hepatopatia, devemos proceder
com ultrassonografia de fígado e
vias biliares.

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Arlindo Ugulino Netto – CIRURGIA ABDOMINAL– MEDICINA P7 – 2010.2

A ultrassonografia ‚ mais importante ainda se, al‚m da icter„cia e do predom„nio de bilirrubina direta, o paciente
apresentar dor, prurido e altera€‰es da gama-GT e fosfatase alcalina, uma vez que as chances de estarmos diante de
um paciente com icter„cia obstrutiva s•o muito grandes. A USG de f„gado ‚ importante para afastar doen€as hep†ticas
(altera€‰es na ecogenicidade hep†tica, presen€a de nodula€‰es, hipertrofia de lobo direito, ascite, etc.). A USG de via
biliar, por sua vez, ‚ importante para avaliar a presen€a de dilata€•o na via biliar (o normal ‚ 0,6 – 0,9cm). Depois de
feito este exame, temos dois caminhos a trilhar:
 Se a USG n•o mostrar dilata€•o das vias biliares, podemos realizar parar por a„ com a nossa investiga€•o
diagn‡stica e iniciar o acompanhamento cl„nico do paciente, uma vez que a doen€a ‚ hep†tica e tratada
clinicamente. Contudo, em caso de dŠvidas ‹ USG (uma vez que este ‚ um exame que depende da habilidade
do examinador) ou na impossibilidade de realiz†-la, podemos solicitar uma colangio-resson…ncia, um exame de
resson…ncia capaz de desenhar a via biliar. Se a colangio-RNM n•o demonstrar dilata€•o da via biliar, confirma-
se que o diagn‡stico como uma afec€•o do pr‡prio f„gado.
 Se a USG mostrar dilata€•o do ducto intra-hep†tico ou das vias biliares, temos a suspeita de uma colestase
obstrutiva, em que o problema passa a ser cirŠrgico, uma vez que as principais hip‡teses diagn‡sticas a serem
sugeridas s•o: coledocolit„ase ou tumor de via biliar. Diante destas suspeitas (ou mesmo em caso de dŠvidas ‹
USG), devemos sugerir uma colangio-RNM.

Al‚m da colangio-RNM, outros exames podem ser solicitados, tais como:


 Colangiopancreatografia retr‡grada endosc‡pica (CPRE): consiste no estudo da via biliar atrav‚s de um exame
radiol‡gico contrastado por endoscopia e cateterismo da papila maior do duodeno. O maior inconveniente deste
exame ‚ presen€a de morbi-mortalidade j† descrita em alguns trabalhos na literatura. Por esta raz•o, a colangio-
RNM deve ser feita de preferƒncia por ser menos invasivo e n•o apresentar morbidade ou mortalidade; contudo,
a CPRE, al‚m de ser um exame diagn‡stico, pode ser terapƒutico, permitindo a retirada de um c†lculo, abertura
da papila maior, bi‡psia, coleta de secre€•o, etc.
 Colangiografia trans-parieto-hep†tica (CTPH): exame de escolha para avalia€•o radiogr†fica de les‰es ou
obstru€‰es em vias hep†ticas altas. Neste exame, a pun€•o ‚ realizada no f„gado para inje€•o do contraste.
 Ultrassonografia endosc‡pica (USE): exame realizado por um ultrassom acoplado ‹ ponta de um endosc‡pio.
Quando instalado na segunda por€•o do duodeno, permite a avalia€•o desta regi•o e das vias biliares. Permite
ainda a coleta de secre€•o e de bi‡psia.

Imagem de uma colangio-RNM mostrando a obstru€•o da via biliar ao n„vel do in„cio do


conduto hep†tico comum. ˆ um exame bastante Štil cujo meio de contraste ‚ o pr‡prio
hidrogƒnio da via biliar (onde ‚ mais abundante que os demais tecidos).

Imagem mostrando CPRE. Nela, podemos observar o endosc‡pio alcan€ando a segunda


porۥo do duodeno, cateterizando a papila e aplicando o contraste na via biliar. Nota-se um
sinal de subtra€•o no ducto hep†tico, imagem sugestiva de tumor de via biliar. Este paciente,
associada a imagem, apresenta aumento de bilirrubuna, icter„cia, colŠria, acolia fecal e
aumento laboratorial de fosfatase alcalina e gama-GT.

Imagem de colangio-RNM com reconstruۥo de via biliar. Note as estruturas


determinadas pelas setas, mostrando toda anatomia da via biliar extra-hep†tica.
Neste exame, podemos identificar um sinal arredondado na via chamado de sinal do
menisco, caracter„stico de coledocolit„ase.

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ULTRASSONOGRAFIA
A ultrassonografia ‚ importante para avaliar se existe ou n•o dilata€•o da via biliar. Em alguns casos, ele pode
ser suficiente para o diagn‡stico da causa da obstru€•o (como na presen€a de c†lculos); contudo, ela ‚ pouco sens„vel a
outras causas de obstru€•o, como tumores (sendo necess†rio, diante desta suspeita, a solitica€•o de outros exames,
como a colangio-RNM). Na ocasi•o em que a USG aponta a presen€a de c†lculo na via biliar, ‚ desnecess†rio solicitar a
colangio-RNM, e j† podemos retir†-lo com cirurgia laparosc‡pica ou com a CPRE.

COLANGIO -RESSONÂNCIA (COLANGIO -RNM)


ˆ um exame importante para diagnosticar a causa da eventual obstru€•o, sendo mais espec„fica que a USG. Por
esta raz•o, ‚ solicitada quando a USG n•o foi capaz de selar o diagn‡stico e quando se deseja apenas identificar a
causa da obstru€•o (quando se quer realizar alguma conduta terapƒutica, opta-se pela CPRE).

COLANGIOPANCREATOGRAFIA RETRÓGRADA ENDOSCÓPICA (CPRE)


ˆ um exame importante pois, al‚m de
diagnosticar, serve como m‚todo terapƒutico,
principalmente para a retirada de c†lculos da ampla de
Vater, coleta de secre€‰es, etc. Contudo, por ser um
exame mais invasivo e por estar relacionada com
certos „ndices de morbi-mortalidade, sua requisi€•o s‡
‚ feita quando se tem o intuito de tratar – caso
contr†rio, isto ‚, quando se quer apenas diagnosticar,
opta-se pela colangio-RNM.
Em resumo, a CPRE pode realizar todos os
procedimentos relacionados na tabela ao lado.
Contudo, cada um tem um grau de dificuldade
espec„fico.

As principais intercorrƒncias j† registradas com a utiliza€•o da CPRE est•o listadas logo abaixo. Por estas
raz‰es, todo endoscopista que realiza CPRE deve ter um cirurgi•o acompanhando-o.
 Complica€•o (8%)
 Pancreatite (1- 7%)
 Hemorragia (0,75 – 2,5%)
 Colangite (1,5%)
 Perfura€•o (1%)
 Mortalidade (0,3%)

Aspecto do colangiocarcinoma (tumor periampular), obstruindo vias biliares (setas) em exame de


colangiografia endosc‡pica.

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Arlindo Ugulino Netto – CIRURGIA ABDOMINAL– MEDICINA P7 – 2010.2

CPRE mostrando falha de enchimento da via biliar distal sem imagem típica de cálculo. A
hipótese diagnostica neste caso é o colangiocarcinoma.

Correção de estenose cicatricial biliar (lesão iatrogênica pós-cirúrgica) por passagem de


prótese via CPRE. A prótese pode ser de plástico (que deve ser trocada a cada 3 meses) ou
a metálica (de maior durabilidade).

Imagem de CPRE mostrando múltiplos cálculos em via biliar. Na ocasião, foi


realizada papilotomia para retirada dos mesmos.

OUTROS EXAMES RADIOGRÁFICOS DIAGNÓSTICOS

Colangiografia trans-parieto-hepática (CTPH).


Exame utilizado para avaliação radiográfica de lesões ou obstruções em vias hepáticas altas. Neste exame, a
punção é realizada no próprio fígado para injeção do contraste.

CTPH mostrando obstrução na altura da confluência dos ductos hepáticos, o que


seria impossível de ser visto através da CPRE. Para sua realização, faz-se uma
punção da via biliar intra-hepática acima da obstrução e injeta-se de contraste.

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Arlindo Ugulino Netto – CIRURGIA ABDOMINAL– MEDICINA P7 – 2010.2

Ultrassonografia endoscópica (USE).


É um exame realizado com aparelho de ultrassom acoplado à ponta de um endoscópio. É considerado o método
referencial para o diagnóstico de pequenos cálculos vesiculares e coledoceanos.

Imagem mostrando pequeno cálculo em via biliar distal que não foi visualizado
previamente pela colangio-RNM.

Radiografia simples de abdome.


O R-x simples de abdome pode auxiliar no diagnóstico na presença dos seguintes achados:
 Calcificação em hipocôndrio direito
 Vesícula em porcelana (calcificação da vesícula biliar que responde como um fator de risco para vesícula)
 Presença de cálculo na via biliar (sendo mais comum na coledocolitíase do que na colelitíase)
 Aerobilia (presença de ar dentro da via biliar)
 Colecistite enfisematosa

Radiografia de paciente pós-CPRE em que, após a papilotomia endoscópica,


observa-se a entrada de ar na via biliar (aerobilia), como é possível ver na
marcação das setas amarelas.

Radiografia simples de paciente mostrando ar dentro da vesícula biliar e


presença de cálculo no duodeno, que passou através de uma fístula criada entre
a vesícula e o duodeno depois de um processo inflamatório crônico, o que
permitiu a entrada de ar na vesícula. Depois da obstrução por este cálculo, o ar
ficou impedido de sair. A aerobilia associada à fístula da víscula ao duodeno
chama-se de síndrome de Bouveret.

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Arlindo Ugulino Netto – CIRURGIA ABDOMINAL– MEDICINA P7 – 2010.2

Colecistograma oral (Teste de Graham).


Exame realizado com a utilização de iodo em que se dá 10 a 12 comprimidos deste íon na véspera do exame.
Há, com isso, impregnação do iodo na mucosa da vesícula, servindo como um contraste. Este teste dificilmente é
realizado atualmente, pois depende muito da função hepática do paciente, da bexiga, da presença de intolerância a iodo,
etc. Além disso, a imagem gerada é ruim, sem haver comparação justa com a colangio-RNM.
As principais características do colecistograma oral são:
 Funcionamento da vesícula e resposta à ingesta de lipídios (prova de Boyden).
 Pouca nitidez da via biliar principal
 Uso de medicamentos altera a função da vesícula e mascara o teste
 Não opacificação
 Obstrução cística
 Colecistite
 Incapacidade de eliminar
 Problemas técnicos

Colangiografia endovenosa.
 Bilirrubinemia acima de 3mg\dl contraindica o exame
 Serve para avaliação da árvore biliar, mas tem pouca nitidez
 Dificuldade na visualização de cálculos pequenos
 Vantagem: não é necessária vesícula biliar funcionante

Colangiografia intra-operatória.
É um artifício diagnóstico em que se procede da radiografia de toda a via biliar durante a colecistectomia. A sua
indicação é seletiva, e somente ocorre nas ocasiões em que se tem algum fator clínico-laboratorial que aponte a
migração de um cálculo através do canal biliar (causando a coledocolitíase), tais como: história de icterícia, de
pancreatite, de alteração na via biliar, enzimas alteradas, etc.
Portanto, a colangiografia intra-operatória está restrita para aqueles pacientes dos quais se suspeita, além da
presença de colecistite ou colelitíase, uma eventual coledocolitíase. Isto é importante pois o tratamento da colelitíase é
completamente diferente da terapia da coledocolitíase.

Colangiografia pelo Kehr.


O dreno de Kehr (ou dreno em T) pode ser utilizado nos casos pós-operatórios de coledocolitíase quando a
CPRE não se mostrava disponível. Como este dreno apresenta um orifício exposto na pele para drenagem da bile,
podemos injetar contraste para avaliar a presença de cálculos residuais.

Manometria da via biliar.


Podemos observar o comportamento da pressão dentro da via biliar de um paciente com icterícia obstrutiva, mas
cuja causa não foi encontrada. Muito provavelmente, o quadro é decorrente de uma hipertonia da abertura da papila
maior do duodeno, dificultando a saída da bile. A contração do esfíncter da papila é facilmente reconhecida através da
manometria.

Tomografia computadorizada.
É um exame útil para os casos em que se tem como principal hipótese diagnóstica o tumor nas vias biliares.
Através dela, além de calcular a extensão tumoral, podemos procurar pela presença de metástases, ascite,
carcinomatose, invasão vascular ou de outros órgãos. Pode ser útil em serviços que não dispõem de colagio-RNM.

Exame tomográfico mostrando neoplasia de vesícula biliar.

Exame tomográfico mostrando neoplasia da cabeça do pâncreas.

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Arlindo Ugulino Netto – CIRURGIA ABDOMINAL– MEDICINA P7 – 2010.2

Cintilografia Hepatocelular.
Constitui outro exame que praticamente não é mais
utilizado. Era realizado antigamente para diagnosticar
colecistite. Suas principais características são:
 Baseado na excreção do isótopo ativo
 Suspeita de colestase
 Função vesícula biliar
 Dúvida em outros métodos
 Depende
 do fluxo sanguíneo
 do fluxo biliar
 da função hepática
 Praticamente não é mais utilizado

Coledoscópio Flexível.
Exame em que se faz, por meio deste aparelho, a realização de uma endoscopia da via biliar através do acesso
promovido pela punção trans-hepática (CTPH). Pode ser realizado ainda pela colangiografia intra-operatória.

Videolaparoscopia.
A videolaparoscopia serve como última opção diagnóstica a ser utilizada ou quando acontece como achado
ocasional ao se realizar outro procedimento cirúrgico. Embora não avalie a via biliar por dentro, serve para avaliar
condições extrínsecas a ela.

FLUXOGRAMA DE AVALIAÇÃO DIAGNÓSTICA DA ICTERÍCIA

TRATAMENTO
É do ponto de vista terapêutico que se faz importante diferenciar se a colestase que o paciente apresenta é por
causas obstrutivas, de fato, ou por distúrbios hepáticos (hereditários ou degenerativos). De um modo geral, as causas
hepáticas são tratadas clinicamente; já as causas obstrutivas, muito possivelmente, devem ser tratadas cirurgicamente,
uma vez que, as principais causas de icterícia obstrutiva são tumores nas vias biliares e coledocolitíase.

C OMPLICA•‚ES DA I CTER…CIA O BSTRUTIVA


 Dilatação da via biliar  Colecistite
 Colangite  Pancreatite
 Cirrose biliar secundária  Processo inflamatório em via biliar (podendo
 Neoplasia causar estenoses sequenciais da via)

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MED RESUMOS 2012


NETTO, Arlindo Ugulino; ELOY; Yuri Leite.
CIRURGIA ABDOMINAL _________

ABSCESSOS HEPÁTICOS
(Professor Cássio Virgílio)

Os abscessos e cistos hepáticos são patologias cada vez menos comuns, cujo tratamento, cada vez mais, deixa
de ser cirúrgico por vias clássicas e agressivas para dar lugar ao tratamento cirúrgico percutâneo. Não que o abscesso
não deva ser tratado cirurgicamente, mas pelo contrário: todo abscesso necessita de drenagem até que se prove o
contrário e, desta forma, o seu tratamento ainda é cirúrgico, mudando apenas a via de acesso.
Abscesso hepático é definido como uma coleção purulenta instalada no parênquima hepático, resultante de
complicação infecciosa intra ou extra-abdominal. Por esta razão, pode-se dizer que ele caracteriza um evento
secundário a ocorrência de um processo infeccioso intra-abdominal (colecistite, apendicite, etc.) e extra-abdominal (por
exemplo, infecção dentária, urinária, etc.).
Consistem em uma patologia responsável por 20/100.000 internações em hospital de grande porte nos EUA.
Estudos demonstraram que houve uma mudança brusca na etiologia dos abscessos hepáticos, em que as infecções das
vias biliares foram substituídas gradativamente pelos tumores das vias biliares.

EPIDEMIOLOGIA E FISIOPATOLOGIA
Até meados do século passado, a principal causa de abscessos hepáticos era a apendicite aguda e, com isso, a
principal via de chegada do agente bacteriano ao fígado era hematogênica via circulação portal. Atualmente, devido à
maior disponibilidade de medicamentos antibióticos e métodos diagnósticos e terapêuticos mais modernos, a principal
causa passou a ser a obstrução biliar gerada por tumores. Nesta situação, instala-se um quadro de icterícia obstrutiva
que evolui para um processo infeccioso, como a colangite, a qual evolui para a formação de um abscesso hepático.
Além disso, ainda houve uma mudança da segunda a terceira década para quinta a sétima de vida, explicado
principalmente pela mudança da etiologia, isto é, antigamente era ocasionada por apendicite, que acomete pacientes
mais jovens, enquanto que os tumores são incidentes em pacientes de idade mais avançada. Quanto a predileção pelo
sexo, antigamente era mais frequente em homens, contudo, tendências atuais a igualdade.
Em cerca de 20% das vezes sem foco inicial aparente, ou seja, não se sabe qual é a infecção primária desse
paciente.

ETIOPATOGENIA
O principal fator etiológico dos abscessos hepáticos é a infecção bacteriana. Entre as principais envolvidas,
podemos incluir as bactérias convencionais gram-negativas como E. coli, Klebisielas, Streptococcus sp. Além disso,
outros agentes também podem estar envolvidos como amebas e micobactérias.
1
OBS : Como já foi citado anteriormente, a principal causa de abscessos hepáticos eram processos infecciosos intra-
abdominais, especialmente a apendicite, por isso a principal via de disseminação para o tecido hepático era a via
hematogênica portal, também denominada de pileflebítica. Entretanto atualmente a apendicite não é mais a principal
etiologia infecciosa intra-abdominal, mas sim a colangite pela icterícia obstrutiva, com isso, favorecendo a disseminação
biliar. Contudo, excluindo-se as doenças das vias biliares e considerando o abdome como um todo, a principal causa
seria a ser a diverticulite, em substituição a apendicite, como causa de abscessos hepáticos.

Entre outras causas menos comuns podemos citar: embolização transarterial, ablações e infecções em órgãos
próximos ao fígado gerando uma disseminação por contigüidade.

FATORES DE RISCO
 Neoplasias obstrutivas das vias biliares (por favorecerem à colangite e imunodepressão)
 Cirrose hepática
 Diabetes
 Outras imunodeficiências

QUADRO CL…NICO
Nos pacientes com suspeita de abscessos hepáticos alguns sinais e sintomas, embora inespecíficos, são de
grande importância para a suspeita diagnóstica e orientação quanto à solicitação de exames complementares
pertinentes a esta patologia.

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Arlindo Ugulino Netto – CIRURGIA ABDOMINAL– MEDICINA P7 – 2010.2

Com isso, um dos sinais mais frequente ‚ a febre com calafrios, estando presente em cerca de 90% dos casos,
al‚m disso, dor em QSD, com irradiação para ombro (sinal de Kehr), queda do estado geral (devido a duas doen€as
instaladas que levam a este estado – neoplasia e infec€•o crŒnica ou aguda), hiporexia, perda de peso, icterícia,
palidez cutâneo mucosa, hepatomegalia dolorosa e ainda sinais e sintomas da doença foco (ou seja, pacientes
com hist‡ria de diverticulite podem queixar-se de plastr•o na fossa il„aca esquerda; em casos de tumor de p…ncreas, o
mesmo pode apresentar-se ict‚rico e com ves„cula biliar palp†vel, caracterizando sinal de Courvoisier-Terrier, sendo
este um sinal de neoplasia periampolar, isto ‚: localizada na cabe€a do p…ncreas, papila do duodeno e col‚doco terminal
no duodeno).
Portanto, em resumo, destacamos os seguintes sinais e sintomas:
 Febre com calafrios (‚ o mais frequente  Perda de peso
sinal: 90%)  Icter„cia, palidez cut…neo mucosa
 Dor em QSD, com irradia€•o para ombro  Hepatomegalia dolorosa
(sinal de Kehr)  Sinais e sintomas da doen€a foco
 Queda do estado geral
 Hiporexia
2
OBS : A síndrome de Mirizzi, como vimos em cap„tulos anteriores, ‚ uma rara complica€•o da colelit„ase em que o
paciente vai apresentar uma compress•o extr„nseca das vias biliares por edema do infud„bulo da ves„cula, causando
icter„cia. Entretanto na neoplasia de cabe€a de p…ncreas, o paciente apresenta uma icter„cia mais acentuada, condi€•o
que ‚ rara nesta s„ndrome. Al‚m disso, nesta s„ndrome devido a colecistite aguda, a ves„cula ‚ dolorosa a palpa€•o,
diferentemente da neoplasia da cabe€a de p…ncreas em que a palpa€•o da ves„cula ‚ indolor.
3
OBS : Pode-se dizer que os pacientes com cistos hep†ticos evoluem, frequentemente, com a tríade de Charcot (febre
com calafrios, icter„cia e dor tipo c‡lica em hipocŒndrio direito), principalmente quando a causa ‚ biliar. Entretanto, nos
casos mais avan€ados da doen€a, o paciente pode evoluir para a pêntade de Reynolds, em que al‚m da tr„ade de
Charcot, o paciente vai apresentar sinais de choque (hipotens•o, sudorese, etc.) e altera€‰es no n„vel de consciƒncia.
4
OBS : A hepatomegalia dolorosa consiste em um sinal cl„nico que deve ser investigado com cautela, pois nem sempre o
mesmo reflete patologias origin†rias no f„gado ou vias biliares. Por exemplo, pacientes portadores de insuficiƒncia
card„aca direita (ICC) apresentam redu€•o do retorno venoso e, com isso, o paciente apresentar† uma estase venosa,
que ‚ transferida para os pulm‰es, veia cava inferior e, desta, para as veias supra-hep†ticas, levando a uma estase
venosa intra-hep†tica com consequente crescimento do parƒnquima hep†tico e distens•o da c†psula de Glisson,
tornando o f„gado doloroso ‹ palpa€•o. Neste caso, a ves„cula tamb‚m pode se mostrar distendida e com paredes
espessadas.

DIAGN†STICO

CLÍNICO
O diagn‡stico desses pacientes est† baseado na hist‡ria cl„nica, com coleta dos sinais e sintomas sugestivos e
exame f„sico criterioso e detalhado.
Na hist‡ria cl„nica, se faz necess†rio pesquisar a presen€a de doen€as anteriores, principalmente aquelas
relacionadas com abscesso hep†tico como diverticulite, paciente cirr‡ticos que desenvolveram carcinoma hepatocelular
e realizaram o tratamento com abla€•o, entre outras condi€‰es que predisp‰em ao desenvolvimento de abscesso
hep†tico.

LABORATORIAL
Nos exames laboratoriais as altera€‰es mais expressivas s•o visualizadas no hemograma onde percebe-se uma
leucocitose, geralmente superior a 20.000/dl. De um modo geral, podemos destacar:
 Leucocitose, geralmente superior a 20.000/dl
 Eleva€•o da fosfatase alcalina, gamaglutamil transferase, AST, ALT
 Anemia
 Hemocultura positiva em 60% dos casos
 Hipoalbuminemia

Assim analisando os exames laboratoriais, pode-se dizer certamente que existe um quadro infeccioso com
altera€‰es da fun€•o hep†tica.
5
OBS : Os principais marcadores de les•o hep†tica e canalicular s•o AST e ALT (que identificam sofrimento e les•o dos
hepat‡citos) e a fosfatase alcalina e gama GT (que analisam o poder de excre€•o da ves„cula biliar). A fun€•o hep†tica
propriamente dita pode ser analisada atrav‚s do seu poder de s„ntese, avaliando a concentra€•o de albumina e o
6
coagulograma (ver OBS ).

144
Arlindo Ugulino Netto – CIRURGIA ABDOMINAL– MEDICINA P7 – 2010.2

OBS6: O fígado para produzir os fatores da coagulação necessita de vitamina K, que estruturalmente caracteriza-se por ser
lipossolúvel, e para ser absolvida é necessária a presença de gordura, ou seja, bile. Com isso na icterícia obstrutiva haverá uma
deficiência na absorção de vitamina K, de modo que o paciente pode apresentar sinais de coagulação ineficiente. Assim na realização
de cirurgias de icterícia obstrutiva, deve-se avaliar a coagulação do paciente, e caso esteja alterada é pertinente a administração de
vitamina K. Entretanto nos casos mais avançados de icterícia obstrutiva, pode levar a destruição do parênquima hepático e assim a
administração de vitamina K não traria nenhum benefício para o paciente. Outro exemplo comum é nos pacientes hepatopatas
crônicos, não há uma deficiência de vitamina K, mas sim na produção dos fatores de coagulação. Por esta razão, nestes pacientes é
pertinente a administração de fatores de coagulação mais precoce.

EXAMES DE IMAGEM
Os exames de imagem são importantes para a avaliação da morfologia hepática. Entre os principais exames
solicitados são:
 Radiografia simples do abdome: pode trazer informações importantes como, elevação da cúpula
diafragmática, colo abaixado, mostrando assim sinais indiretos de hepatomegalia. Raramente estabelece o
diagnóstico, entretanto nas infecções por germes produtores de gás, percebe-se a presença de nível hidroaéreo,
derrame pleural no hemitórax direito.
 USG: é um exame muito utilizado, entretanto, é operador-dependente. Além disso, caso o paciente esteja com
dor, pode ser difícil a avaliação ultrassonográfica. A presença de gás pode interferir na avaliação correta do
abscesso.
 TC e RNM: constituem exames padrão-ouro para observar abscesso hepático.

Ressonância contrastada mostrando abscesso multifacetado, mostrando a


presença de gás (o que é uma indicação absoluta da cirurgia).

Ressonância mostrando a presença de dois abscessos hepáticos em fase mais


precoce.

TRATAMENTO
Como já foi citado anteriormente, o tratamento dos abscessos hepáticos é cirúrgico. Entretanto, o tratamento
cirúrgico que nos referimos não inclui somente o ato da abertura abdominal em si, ou seja, retirada da lesão. Implícito ao
tratamento cirúrgico, estão as medidas clínicas pré e pós-operatórias que são de grande importância. Desta forma,
temos:
 Suporte clínico: no pré-operatório, devemos providenciar hidratação do paciente, correção dos distúrbios da
coagulação e da anemia, normalização dos distúrbios hidroeletrolíticos. Todas estas medidas tem como objetivo
compensar o paciente, para que o mesmo tenha melhores condições de realizar o procedimento cirúrgico com
menor risco de complicações.
 Antibioticoterapia: deve-se indicar a antibioticoterapia, em largo espectro, por via endovenosa por 14 a 21 dias
e complementado até 28 a 42 dias via oral.
 Tratamento: o principal fator de tratamento para o abscesso é a drenagem, que pode ser realizada por via
percutânea ou cirúrgica, através de laparoscopia ou laparotomia. A escolha do procedimento a ser realizado
depende dos seguintes fatores:
 Localização: os abscessos que estão localizados póstero-superiormente apresentam grandes riscos de
lesão do parênquima pulmonar em uma abordagem percutânea e, com isso, nestes casos, o melhor
procedimento é a laparoscopia ou laparotomia.
 Número de abscessos: para pacientes que apresentam quatro ou mais abscessos localizados em áreas
diferentes do fígado, a laparotomia seria a melhor escolha, devido ao risco de inserir agulha em
diversos pontos diferentes, com risco de lesão de outros órgãos, para a drenagem do abscesso.
 Diante da presença de septações, estado geral do paciente e presença de outras condições que
indiquem a cirurgia, devemos evitar a drenagem percutânea e utilizar a laparoscopia.

145
Arlindo Ugulino Netto – CIRURGIA ABDOMINAL– MEDICINA P7 – 2010.2

MED RESUMOS 2011


ELOY; Yuri Leite; NETTO, Arlindo Ugulino.
CIRURGIA ABDOMINAL _________

CISTOS HEPÁTICOS
(Professor Cássio Virgílio)

Os cistos hep†ticos s•o neoplasias geralmente benignas, com conteŠdo l„quido, presentes em 2,5 a 5% dos
indiv„duos e, que na maioria das vezes, n•o trazem nenhum preju„zo ao paciente. Em cerca de 90% dos casos, s•o
diagnosticados acima dos 40 anos tendo uma discreta prevalƒncia no sexo feminino (♀1,5:1♂).

CLASSIFICA•„O
Os cistos hep†ticos ainda podem ser classificados em: (1) cisto simples solitário, sendo este o mais frequente;
(2) doença hepática policística; (3) cistos neoplásicos, quando diagnosticados devem ser sempre operados; e (4)
cistos parasitários, sendo estes raros, tendo uma maior prevalƒncia na regi•o Norte (AmazŒnia, mais especificamente).
1
OBS : A diferen€a entre o cisto e um pseudocisto ‚ a presen€a de revestimento epitelial nos primeiros. Este tipo de
revestimento ‚ ausente no pseudocisto.

CISTOS SIMPLES
S•o os mais frequentes e s•o revestidos por epit‚lio cub‡ide de camada Šnica. Cerca de 85% dos casos s•o
descobertos de forma acidental, j† que a maioria s•o assintom†ticos. Ara estes pacientes assintom†ticos n•o ‚
necess†ria nenhuma medida terapƒutica, somente o acompanhamento cl„nico.

QUADRO CLÍNICO
Na presen€a de sintomas, os principais s•o: distens•o abdominal ou efeito massa com sinais compressivos.
Assim um cisto de grande volume, pediculado, localizado no lado direito do f„gado pode chegar a comprimir o duodeno,
quando do lado esquerdo pode comprimir o estŒmago e com isso, o paciente vir a apresentar saciedade precoce,
dificuldade de esvaziamento g†strico. Raramente o paciente pode ter um sangramento no interior do cisto, ocorrendo
sua distens•o e o paciente referir dor.

DIAGNÓSTICO
O diagn‡stico ‚ feito por meio da USG, atrav‚s da qual ‚ visualizada uma
massa anec‡ide, com paredes finas e lisas, ausƒncia de septa€‰es internas. A
presen€a de septa€‰es ‚ indicativo de cisto neopl†sico e, com isso, sempre que
for visualizado, deve-se intensificar a investiga€•o atrav‚s da TC e RNM,
podendo identificar, por exemplo, dois cistos simples, pr‡ximos um do outro,
podendo simular uma neoplasia. Entretanto caso seja cisto Šnico com septa€‰es
o paciente deve ser operado o mais r†pido poss„vel. De forma geral na TC e RNM
os cistos simples se apresentam como uma massa avascular. Deve-se investigar
sorologia parasit†ria e na maioria das vezes os exames laboratoriais s•o normais.

TRATAMENTO
O tratamento s‡ est† indicado para aqueles pacientes que se apresentam com cistos de grandes volumes em
que h† presen€a de sintomas compressivos ou dolorosos. Assim o tratamento pode ser realizado atrav‚s dos seguintes
m‚todos:
 Aspiração percutânea: ‚ realizada naqueles pacientes que s•o inoper†veis, ou seja, pacientes idosos que n•o
suportam um procedimento mais agressivo. Com isso esse paciente passar† cerca de 3 a 4 anos sem refazer o
cisto.
 Aspiração e esclerose: ap‡s a aspira€•o injeta-se †lcool absoluto, que promove uma rea€•o inflamat‡ria.
Nenhum desses tratamentos com aspira€•o ‚ definitivo, j† que o „ndice de recidiva est† em torno de 80%.
 Fenestração ou deroofing: ‚ um tratamento definitivo, mais utilizado para este tipo de cisto, ou seja, resseca-
se somente a parte exposta e retira-se o l„quido. O material retirado ‚ enviado para o exame somente para a
confirmaۥo de sua benignidade.
 Raramente ressecção: n•o ‚ um procedimento realizado rotineiramente. Pode ser realizado somente quando
h† dŠvida se o cisto ‚ simples ou neopl†sico.

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Arlindo Ugulino Netto – CIRURGIA ABDOMINAL– MEDICINA P7 – 2010.2

D OEN•A H EP‰TICA P OLIC…STICA


É uma doença de transmissão autossômica dominante, com
sede em genes PDK1 e PDK2. É comum sua associação com doença
cística renal e pancreática. Cerca de 25% aparecem aos 30 anos, 80%
acima dos 60 anos, sendo mais freqüentes em mulheres.

QUADRO CLÍNICO
Nesses pacientes podem ocorrer sinais e sintomas
compressivos, pois na maioria das vezes são múltiplos cistos e seu
crescimento leva a compressão de estruturas vizinhas, causando
sintomas específicos. Pode levar a compressão da vascularização
portal, levando a hipertensão portal, apesar disso, na maioria das vezes
há preservação da função hepatocelular.

CLASSIFICAÇÃO
 Tipo I - Até 10 cistos, menores que 10 cm.
 Tipo II - Envolvimento difuso, porém preservando áreas de
parênquima normal.
 Tipo III - Envolvimento global do fígado. Nestes casos o paciente
pode apresentar-se com um fígado pesando até 20kg, ocupando
quase que totalmente a cavidade abdominal. O tratamento mais
adequado para estes pacientes se baseia na realização de
transplante.

TRATAMENTO
 Aspiração.
 Aspiração com esclerose.
 Fenestração ou deroofing: Durante a realização do tratamento do paciente, especialmente na fase I, é
importante informar ao mesmo que o tratamento é paliativo, pois o paciente pode apresentar milhares de outros
cistos não visualizados durante o exame de imagem por estarem comprimidos pelos cistos maiores. Com isso, o
tratamento desses pacientes é feito através da realização de fenestrações entre os cistos maiores, diminuindo o
tamanho do fígado, descomprimindo o parênquima hepático e realizando, posteriormente, a aspiração. Devido à
descompressão, os cistos que anteriormente estavam impossibilitados de crescer, podem dilatar e, ao longo de
5 a 10 anos, pode ser necessário repetir o procedimento.
 Transplante Hepático: Naqueles pacientes do tipo 3, onde há o envolvimento de todo o parênquima hepático.

NEOPLASIAS C…STICAS
Representam menos de 5 % de todos os cistos hepáticos, podem ser benignos (cistoadenoma) ou malignos
(cistoadenocarcinoma). Cerca de 90% dos casos acometem mulheres na 5ª década de vida. Como foi dito anteriormente
apresentam septos ou loculações nos exames de imagem, sendo estes altamente sugestivos.
O tratamento é ressecção ou enucleação. Na ressecção a cirurgia é realizada com margem, enquanto que na
enucleação há somente a retirada da massa tumoral.

CISTOADENOMA
É uma neoplasia rara revestidas por células cubóides e colunares atípicas,
podendo encontrar em seu interior projeções polipóides e papilares. Podem ser
serosos ou mucinosos, os serosos raramente evoluem de forma maligna, ao contrário
dos mucinosos que na maioria das vezes se malignizam.
Pode ser encontrado como uma grande massa cística (10-20 cm). Em seu
interior apresenta líquido mucinoso, presente geralmente em mulheres > 40 anos e
possuem um crescimento muito lento.
Na maioria das vezes esses pacientes são assintomáticos, o diagnóstico é
feito através de exames de imagem (USG, TC e RNM). Deve-se fazer diagnóstico
diferencial com cistos simples. Além disso, o cistoadenoma pode evoluir para o
cistoadenocarcinoma, por isso o tratamento desses pacientes é sempre a ressecção
completa da lesão, sendo totalmente contraindicada à realização de fenestrações.

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Arlindo Ugulino Netto – CIRURGIA ABDOMINAL– MEDICINA P7 – 2010.2

MED RESUMOS 2012


CORREIA, Luiz Gustavo; ELOY; Yuri Leite; NETTO, Arlindo Ugulino.
CIRURGIA ABDOMINAL

TUMORES DO INTESTINO DELGADO


(Professor Marcelo Gonçalves)

Os tumores do intestino delgado (ID) apresentam incidƒncia relativamente baixa, podendo ser considerados uma patologia
rara. Por conta disto, o seu diagn‡stico n•o ‚ obtido de forma precoce. Na maioria das vezes, j† na ocasi•o do diagn‡stico, o paciente
apresenta complica€‰es do pr‡prio tumor e/ou neoplasia avan€ada.
Os tumores do intestino delgado podem ou n•o estar associados a complica€‰es, que podem se caracterizar por desordens
gen‚ticas e/ou inflamat‡rias. Apesar disso, podem ocorrer espontaneamente, em indiv„duos previamente sadios.

EPIDEMIOLOGIA
De todos os tumores malignos que podem ocorrer no trato gastrointestinal, os tumores do intestino delgado
representam, apenas, uma parcela de 5%. Sua incidƒncia global ‚ vari†vel. Na Europa, alcan€a valores de 1:100.000
habitantes. Enquanto que, nos EUA, sua incidƒncia ‚ de 3,9/100.000, tendo uma maior incidƒncia em negros, fato este
ainda n•o explicado cientificamente.
Quanto ao sexo mais acometido, os homens apresentam uma leve prevalƒncia em rela€•o ‹s mulheres
a
(1,5H:1M). A idade de acometimento est† relacionada com indiv„duos de idade mais avan€ada, geralmente entre a 6 e
a
7 d‚cadas de vida. Podem estar relacionados com mecanismos gen‚ticos ou de forma espor†dico.
Os tumores que acometem o ID podem se apresentar de 40 tipos histol‡gicos diferentes. A maioria dos tumores
malignos do ID s•o os tumores metast†ticos oriundos de outros s„tios.
Dentre os outros tipos mais comuns podemos citar: tumores epiteliais, end‡crinos e n•o-epiteliais. Os tumores
epiteliais s•o representados pelo carcinoma, adenocarcinoma, carcinoma mucinoso, carcinoma indiferenciado. Dentre os
tumores end‡crinos: tumor carcin‡ide (tumor neuroend‡crino), tumor estromal gastrointestinal (GIST). J† os n•o-
epiteliais, destacam-se: leiomiomas, hemangiomas, fibromas, linfoma, leiomiossarcoma, dentre outros.

TIPOS HISTOL†GICOS

TUMORES BENIGNOS EPITELIAIS


Dentre os tumores benignos epiteliais, o mais comum ‚ o adenoma, com localiza€•o mais comum no duodeno e
no jejuno (‚ um tumor de localiza€•o mais alta). Pode evoluir para a forma maligna (o adenocarcinoma), resultado da
degeneraۥo irritativa do adenoma. Dentre os adenomas que apresentam uma maior capacidade de malignizaۥo,
podemos citar o adenoma viloso.
V†rias outras les‰es benignas representam correspondentes ao adenoma, como os papilomas, p‡lipos
adenomatosos, adenopapilomas, adenomas papilares, adenoma pediculado, p‡lipos pediculados, s‚sseis ou piriformes.
Os p‡lipos pediculados constituem um tipo de tumor benigno de origem epitelial. Eles degeneram, sangram e
obstruem menos do que os p‡lipos s‚sseis, mas ainda assim, os pediculados s•o diagnosticados por sangramento
gastrointestinal e/ou obstru€•o intestinal (intussuscep€•o, caracterizado pelo enluvamento de al€a distal, geralmente
associada ‹ rigidez da al€a proximal, com isso os movimentos perist†lticos constantes promovem a invagina€•o).
Os estudos epidemiol‡gicos demonstram que a ordem de prevalƒncia dos tumores benignos epiteliais nas
por€‰es do ID ‚: „leo, duodeno e, em Šltimo lugar, jejuno.
As les‰es benignas s•o encontradas em cerca de 0,3% das necropsias – 15 vezes maior que a incidƒncia
operat‡ria. Isto refor€a a tese que, apesar de serem tumores frequentes do ID, s•o les‰es relativamente raras.

TUMORES BENIGNOS NÃO-EPITELIAIS


A respeito dos tumores benignos n•o epiteliais, v†rios s•o os
subtipos deste tipo de tumor: leiomiomas (2˜ tumor benigno mais Incidência dos tumores benignos não-epiteliais
comum), lipomas, hemangiomas, fibromas (s•o menos comuns) e  Leiomioma (30-35%)
neurofibromas. Excetuando-se os lipomas e os neurofibromas, que s•o  Adenoma (20-22%)
mais frequentes no „leo, todo o restante incide mais no jejuno.  Lipoma (15%)
O diagn‡stico ‚ dado, principalmente, durante o ato operat‡rio  Hemangioma (12%)
e/ou complica€•o do pr‡prio tumor (abdome agudo obstrutivo,  Fibroma (6%)
hemorragia digestiva). O diagn‡stico diferencial de les•o maligna ou  Outros (14%).
benigna s‡ ‚ feito atrav‚s do exame an†tomo-patol‡gico.
Os leiomiomas e leiomiossarcomas s•o muito confundidos com o tumor estromal gastrointestinal (GIST),
devendo-se proceder da avalia€•o da pe€a operat‡ria para an†lise imuno-histoqu„mica. O lipoma ‚ um tumor mais
comum nos homens e no „leo.
O hemangioma ‚ mais frequente em sua forma mŠltipla, localizando-se geralmente no jejuno. Est† comumente
associada com a S„ndrome de Rendu-Osle-Weber, que ‚ uma telangiectasia hemorr†gica heredit†ria.
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Arlindo Ugulino Netto – CIRURGIA ABDOMINAL– MEDICINA P7 – 2010.2

TUMORES MALIGNOS
O tumor maligno prim†rio do ID mais comum ‚, sem dŠvida, o adenocarcinoma, com estat„stica de 30-50%.
Aproximadamente 25-30% s•o representados pelos tumores neuroend‡crinos (carcinoides), com maior prevalƒncia em
idosos; 15-20% s•o linfomas; 11% s•o sarcomas (leiomiossarcoma).
Os tumores malignos localizam-se, preferencialmente, no „leo (em 50% das ocasi‰es), seguido do duodeno
(25%) e jejuno (25%). Levando em conta o tipo histol‡gico do tumor maligno, existem algumas preferƒncias. No caso
dos adenocarcinomas, sua localiza€•o mais comum no duodeno e no jejuno proximal (devido ‹ maior exposi€•o da
regi•o aos †cidos biliares, apresentando maior efeito irritativo). O adenocarcinoma pode apresentar o subtipo
pancreatobiliar, que ‚ o que se localiza na papila maior do duodeno, caracterizando uma obstru€•o da via biliar e,
consequentemente, causando icter„cia (obstrutiva). Tem um comportamento pior quando comparado ‹ outra
classifica€•o, que ‚ a forma intestinal, apesar de seu diagn‡stico ser realizado mais precocemente, associado
principalmente aos sinais cl„nicos (icter„cia).
Diferentemente do adenocarcinoma, os carcinoides e linfomas desenvolvem-se, preferencialmente, no „leo.
Contudo, o adenocarcinoma pode se apresentar no „leo caso haja doen€as inflamat‡rias intestinais associadas (tais
como a doen€a de Crohn e a retocolite ulcerativa – as duas principais doen€as inflamat‡rias intestinais). Os pacientes
com doen€a inflamat‡ria intestinal apresentam chances 100x mais altas de desenvolverem neoplasias no ID.
Os tumores malignos podem ocorrer ainda por conta da dissemina€•o de doen€a metast†tica oriunda de outros
s„tios anatŒmicos. De fato, os tumores metast†ticos s•o os tumores malignos mais comuns deste ‡rg•o (dentre os
prim†rios e n•o-prim†rios). Pode ocorrer por invas•o direta e/ou dissemina€•o peritoneal (c‡lon, ov†rio, Štero e
estŒmago), ou mesmo por dissemina€•o hematogƒnica (pulm•o, mama e melanoma, principalmente).

ETIOPATOGENIA
Conforme vimos anteriormente, os tumores de intestino delgado s•o pouco prevalentes. V†rias foram ‹s
explica€‰es suscitadas para designar a justificativa desta baixa susceptibilidade. As principais hip‡teses levantadas
est•o listadas logo abaixo:
 Presen€a de maior conteŠdo l„quido e menos irritativo
 Tr…nsito r†pido, com menor exposi€•o a agentes carcinogƒnicos
 Poucas bact‚rias, com menor convers•o de †cidos biliares
 Presen€a de benzopireno hidroxilase (respons†vel pela detoxifica€•o, degradando agentes carcinogƒnicos)
 Maior quantidade de tecido linf‡ide e IgA secret‡ria
 Frequentes em pacientes imunossuprimidos e an‚rgicos
 R†pida prolifera€•o das c‚lulas da mucosa

Observa€‰es cl„nicas que atestam a resistƒncia do delgado


 O c…ncer g†strico, de alto poder invasivo, poucas vezes envolve o duodeno.
 A recorrƒncia do c…ncer ap‡s a gastrojejunostomia acontece cinco vezes mais no coto g†strico que no jejunal.
 O „leo terminal resiste ‹s neoplasias invasivas do ceco e as recorrƒncias do tumor em anastomoses ileoc‡licas
s•o 20 vezes menores que nas uni‰es coloc‡licas.

FATORES DE RISCO
N•o existem, ao certo, fatores ambientais bem definidos que possam sugerir a sua participa€•o da
etiopatogƒnese dos tumores de intestino delgado. Alguns autores exp‰em teorias que visam explicar a participa€•o da
carne vermelha, enlatados, †lcool e fumo, por‚m, nada ainda foi comprovado cientificamente. Al‚m disto, atividades
ocupacionais j† foram, praticamente, descartadas como etiologia dos tumores do delgado. Os fatores protetores
defendidos por v†rios cientistas s•o cobalamina e folato, mas n•o se tem nenhum estudo que comprove sua efic†cia.
Algo de grande valor a ser adicionado ‚ o fato que os tumores do intestino delgado podem advir,
concomitantemente, com s„ndromes gen‚ticas neopl†sicas associadas.
 Peutz-Jeghers: P‡lipos hamartomatosos e pigmenta€•o mucocut…nea ao longo de todo o comprimento do
intestino delgado. Ocorrendo na terceira d‚cada de vida, geralmente, acometem o jejuno, mas podem acometer
todo o trato gastrointestinal. Seu potencial de malignidade ‚ consider†vel, embora algumas literaturas afirmem
que os p‡lipos hamartomatosos s•o benignos.
 Síndrome de Gardner e Polipose adenomatosa familiar: S•o caracterizados pela presen€a de p‡lipos
colŒnicos que podem evoluir para as formas malignas (como o Adenocarcinoma) e benignas (Adenoma).
 Doença de Crohn: ‚ uma doen€a inflamat‡ria que est† associada principalmente ao adenocarcinoma que
acomete o „leo.
 Doença celíaca: Linfoma e Adenocarcinoma
 Neurofibromatose: Adenocarcinoma

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Arlindo Ugulino Netto – CIRURGIA ABDOMINAL– MEDICINA P7 – 2010.2

APRESENTA•„O C L…NICA
Os tumores do intestino delgado, geralmente, cursam com diagnóstico tardio, pois, o tempo médio entre o início
dos sintomas e a suspeita clínica é longo. Com isso esses pacientes apresentam sinais e sintomas inespecíficos. Na
ocasião do diagnóstico, muitas vezes, o paciente já apresenta neoplasia localmente avançada ou, a suspeita diagnóstica
é feita através das complicações tumorais. Apesar de ser diagnosticada tardiamente, quando os tumores se localizam no
duodeno (por obstruírem a papila maior do duodeno, e nesta ocasião, ocorrerem sintomas de colestase), dão sintomas
mais precocemente.
O diagnóstico intra-operatório é feito quando o paciente apresenta como complicação tumoral a obstrução
intestinal, com isso, gerando um quadro de abdome obstrutivo. Assim durante o procedimento cirúrgico observa-se a
presença do tumor.

SINAIS E SINTOMAS
Os pacientes com tumor de intestino delgado, eventualmente, apresentam quadro clínico bastante inespecífico.
O quadro mais voltado ao câncer é o de perda de peso, anemia ferropriva (pela perda de peso), hemorragia, perfuração,
dentre outros. Abaixo são citados os principais sinais e sintomas:
 Dor abdominal insidiosa – tipo c‡lica
 Perda peso
 Anemia ferropriva: se relaciona principalmente com os
pequenos sangramentos constantes desses pacientes,
levando a anemia. Com isso, deve-se suspeitar de pacientes
com anemia persistente e não responsivos ao tratamento
clínico.
 Icterˆcia
 Altera€•o h…bito intestinal
 Hemorragia
 Perfura€•o – 20%, que é mais comum nos linfomas
 Obstru€•o.
 Massa palp…vel: já significa câncer localmente avançado, na maioria das vezes, irressecável
 Sˆndrome carcin‡ide: presente nos tumores Neuroendócrinos, pela liberação de aminas vasoativas, rubor,
taquicardia, diarréia, tosse, sinais de ICC direita, etc.
 M… absor€•o
 Febre e suores
 Tumores malignos – mais sintomáticos

Sintomas e sinais que suscitam quadros sindrƒmicos especˆficos.


SINTOMA PRESENTE/SINAL TIPO DE S•NDROME
Melena + Icterícia Carcinoma de ampola
Diarréia + Rubor Tumor neuroendócrino metastático
Febre + diarréia + perda de peso Linfoma
Obstrução intestinal Lipoma
Intussuscepção + pigmentação por melanina Síndrome de Peutz-Jeghers
Sangramento do TGI e Perfuração Pode ocorrer em qualquer tipo de tumor

DIAGN†STICO
Para o diagnóstico dos tumores de intestino delgado, são válidas algumas considerações:

CL•NICO
É importante considerar o diagn‡stico em casos de alterações abdominais inespecíficas e anemia crônica não
especificada, com perda de peso associada. Deve-se realizar uma investigação clínica mais criteriosa possibilitando
assim o diagnóstico precoce. Além disso, como foi visto, a suspeita clínica pode ser estabelecida por quadros obstrutivos
graves, presença de complicações, além disso, a associação com síndromes genéticas e doenças inflamatórias, que
podem sugerir a presença de massa tumoral.

EXAMES COMPLEMENTARES

Testes Usuais
 EDA: A endoscopia digestiva alta (EDA) é mais útil para as lesões altas
 Colonoscopia: colonoscopia pode ser um artifício de diagnóstico de lesões em segmentos mais distais do
intestino, estendendo-se até aproximadamente 15 cm distais do íleo.

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Arlindo Ugulino Netto – CIRURGIA ABDOMINAL– MEDICINA P7 – 2010.2

 Trânsito intestinal: tr…nsito intestinal (com contraste baritado) por radiografia din…mica pode demonstrar sinal
de subtra€•o na parede do intestino delgado. Permite al‚m da visualiza€•o do lŠmen a avalia€•o da superf„cie
mucosa, obtendo uma informaۥo mais acurada.
 USG abdominal: ‚ um exame com pouqu„ssima utilidade para o diagn‡stico de tumores intestinais, uma vez
que o ar ‚ um p‚ssimo condutor dos feixes sonoros. A USG endosc‡pica caracteriza uma imagem de alta
resolu€•o da parede do TGI, predizendo a invas•o vascular, podendo ser utilizada para avalia€•o principalmente
das trƒs por€‰es iniciais do duodeno. Al‚m disso, permite a realiza€•o da bi‡psia, avaliar a origem da les•o, ou
seja, se est† restrita a parede ou invadindo ‡rg•os adjacentes.
 Tomografia Computadorizada: Baixo custo, n•o-invasiva; Por‚m, ‚ pouco sens„vel. “til para avalia€•o de
met†stases linfonodais, dentre outros. ˆ necess†rio que se fa€a duplo-contraste (venoso+oral), permitindo que
seja avaliado tamb‚m o tr…nsito intestinal.
 Ressonância Nuclear Magnética: ˆ limitada, somente ultrapassa a acur†cia de TC nas ocasi‰es em que se
tem suspeita de comprometimento do canal biliar (tumores de papila). Nestas ocasi‰es, ‚ o padr•o-ouro
(Colangio-RNM).
 Enteroscopia (que ‚ a endoscopia do intestino delgado) e a cápsula endoscópica s•o artif„cios de imagem
que podem tamb‚m ser procedidos. A c†psula endosc‡pica ‚ um exame que tem por finalidade a an†lise dos
segmentos do intestino delgado que n•o s•o vistos pela EDA usualmente. Seu mecanismo ‚ bastante moderno:
o paciente ingere uma c†psula que, por sua vez, apresenta um chip em seu interior que emite ondas de
radiofreqüência para um conector, que ‚ acoplado na cintura do paciente, gerando imagens.
 PET-CT: ‚ o exame que deve avaliar, principalmente, linfomas, les‰es metast†ticas, tumores neuroend‡crinos,
etc.
 Cintilografia: Al‚m de todos os exames citados acima, podemos ainda proceder de outro artif„cio diagn‡stico
que ‚ a cintilografia, cuja principal finalidade ‚ a avalia€•o de sangramento do TGI. Outra op€•o nos casos de
hemorragia ‚ a realiza€•o da angiografia, podendo nesses casos realizar a condutas terapƒuticas para suprimir
o sangramento.

ENTEROSCÓPIO
A figura ao lado mostra um enterosc‡pio de duplo-bal•o que se assemelha ao
aparelho que procede da endoscopia digestiva alta. A principal diferen€a ‚ o fato que o
enterosc‡pio tem dois bal‰es. Um dos bal‰es ‚ primeiramente insuflado, no intuito de se
“enluvar” o intestino delgado, ao passo que, ap‡s esta a€•o, se faz poss„vel a avalia€•o das
al€as do intestino delgado. Suas principais a€‰es terapƒuticas s•o:
 Polipectomia
 Ressec€•o endosc‡pica
 Dilata€•o nos casos de estenose
 Coloca€•o de Pr‡tese
 Remo€•o corpo estranho (CE)
1
OBS : A S„ndrome de Gardner ‚ um transtorno gen‚tico que cursa
com a associa€•o entre adenocarcinoma, mŠltiplos p‡lipos
adenomatosos, osteomas do cr…nio, fibromas, dentre outros. A
imagem ao lado demonstra uma visualizaۥo por enteroscopia da
s„ndrome de Gardner (a). Percebe-se que, por interm‚dio deste
exame, podemos realizar a polipectomia, sendo esta, uma das
principais indica€‰es terapƒutica.
2
OBS : Na imagem (b), podemos visualizar a camada subepitelial do
linfoma T enterop†tico. Na imagem b, podemos entender que, em
casos de dŠvidas de que se trata ou n•o de les•o, podemos proceder
da inje€•o de contraste e avalia€•o de †reas esbranqui€adas.

CÁPSULA ENDOSCÓPICA
A c†psula endosc‡pica ‚ uma modalidade de diagn‡stico dos tumores de
intestino delgado, apresentando algumas vantagens, indica€‰es e contra-indica€‰es.
Sua principal finalidade ‚ a de fornecer ondas de radiofreq•ƒncia a um aparelho que ‚
conectado ao paciente e, ap‡s 24h, o m‚dico dever† analisar as imagens fornecidas.
Suas principais vantagens s•o:
 Possibilidade de revis•o de imagens
 Preferƒncia do paciente, quando h† recusa a realiza€•o de EDA e colonoscopia.
 Exame seguro
 Clareza das imagens
 Possibilidade de exame completo do intestino delgado

151
Arlindo Ugulino Netto – CIRURGIA ABDOMINAL– MEDICINA P7 – 2010.2

Contra-Indicações a realização da Cápsula Endoscópica.


Absolutas Relativas
 Obstru€•o e suboclus•o intestinal  DistŠrbios da degluti€•o
 Pseudo-obstru€•o intestinal  Divert„culo de Zenker
 Diverticulose intestinal extensa  Gastroparesia, principalmente, em pacientes com
 Crian€as menores que 10 anos diabetes mellitus
 Estenose pil‡rica
 Cirurgia gastrointestinal pr‚via
 Gesta€•o
 Marcapasso

USG ENDOSCÓPICA
Nas les‰es subepiteliais, a US endosc‡pica ‚ um exame que permite avaliar condi€‰es que diferenciam se o
tumor tem caracter„sticas de malignidade. Sua principal utilidade, al‚m da percep€•o de fatores que j† podem indicar a
les•o como sendo maligna, ‚ de guiar a bi‡psia por agulha. Conforme podemos visualizar na imagem “a”, durante a
endoscopia digestiva alta, pode-se notar um abaulamento da parede do intestino. Nesta situaۥo, procede-se da USG
endosc‡pica. Em “b”, percebemos que a les•o tem por caracter„stica ser de natureza c„stica, que ‚ prov†vel de
benignidade. E, em “c”, observamos a agulha sendo guiada por US endosc‡pica, livrando-a de vasos que, caso
rompidos, pode gerar complica€‰es graves.

Na presen€a de US-endosc‡pica, podemos analisar algumas caracter„sticas do tumor e, a partir delas, indicar
determinadas terapias, que podem ser cirŠrgicas e/ou expectantes.

152
Arlindo Ugulino Netto – CIRURGIA ABDOMINAL– MEDICINA P7 – 2010.2

UGS – Mucosa e Submucosa.


A visualiza€•o de tumores localizados na mucosa ou submucosa deve analisar os achados ultrassonogr†ficos,
que v•o guiar o tipo de terapia:
 Hipoec‡ico: Nestas situa€‰es, devemos analisar o tamanho da tumora€•o.
 Tumor menor ou igual a 2 cm, a conduta ‚ a polipectomia;
 Tumor maior do que 2 cm, a conduta ‚ a enuclea€•o (retirada do p‡lipo com uma margem
m„nima de seguran€a).
 Hiperec‡ico: Do mesmo modo que o anterior, o tamanho que guia a conduta.
 Tumor menor ou igual a 2 cm, com caracter„stica c„stica, a conduta ‚ observa€•o cl„nica;
 Tumor maior ou igual a 2 cm, a conduta ‚ a biopsia por profundidade e definir qual ‚ o tipo
histol‡gico.

Muscular Pr‡pria.
A presen€a de tumores localizados na muscular pr‡pria, do mesmo modo que a anteriormente citada, leva em
conta o tamanho para definir a conduta:
 Maior do que 2 cm: A conduta, indiscutivelmente, ‚ a cirurgia;
 Menor do que 2 cm: A conduta, nesta ocasi•o, ‚ a bi‡psia e, orienta€•o para seguimento por EDA de 6
em 6 meses;

TRATAMENTO
O princ„pio geral do tratamento dos tumores de intestino delgado (enterectomia) ‚ a ressec€•o com margens
cirŠrgicas (de, no m„nimo, 5 cm). Associado ‹ ressec€•o, podemos ainda proceder de outros procedimentos cirŠrgicos,
que levar•o em conta algumas caracter„sticas dos tumores (como localiza€•o, tipo histol‡gico, tamanho).
A linfadenectomia locorregional ‚ indicada de acordo com o tipo histol‡gico e estadiamento cirŠrgico da
neoplasia. Alguns tumores, tais como, leimiossarcoma, adenocarcinoma requerem que o cirurgi•o proceda desta
modalidade cirŠrgica. J† os tumores do tipo GIST n•o requerem a retirada dos linfonodos. Al‚m do grau histol‡gico, a
linfadenectomia tamb‚m ‚ indicada quando houver dŠvidas sobre o tipo histol‡gico do tumor.
A polipectomia endosc‡pica ‚ indicada quando o p‡lipo apresentar tamanho menor do que 2 cm.
A gastroduodenopancreatectomia ‚ indicada nos tumores periampulares (junto ‹ papila maior do duodeno, por
exemplo). Nesta situa€•o, retira-se, al‚m do duodeno, a cabe€a pancre†tica, devido ‹ impossibilidade de se estabelecer
uma margem de seguran€a adequada. Da mesma forma os tumores localizados no „leo distal, n•o poss„vel estabelecer
uma margem segura, por isso, al‚m do „leo realiza-se a hemicolectomia direita. Depois disso ‚ feita a anastomose
„leo-c‡lica.

Na figura ao lado, podemos visualizar em “A”,


a presen€a f„sica do tumor na regi•o
periampular. Nesta ocasi•o, procedemos da
gastroduodenopancreatectomia. Com isto, ‚
necess†ria uma reconstru€•o visualizada na
figura “B”. A reconstru€•o ‚ feita com a uni•o
da por€•o restante do p…ncreas ao jejuno
(pacreaticojejunostomia), al‚m da uni•o da
via biliar ao jejuno (deriva€•o b„lio-digestiva).

3
OBS : Em algumas ocasi‰es, ocorre confus•o diagn‡stica em casos de leimiossarcoma e leimioma. Para diferencia€•o,
podemos proceder da avalia€•o imunohistoqu„mica. A avalia€•o histopatol‡gica transoperat‡ria n•o ‚ algo rotineiro,
pois, a cirurgia, geralmente, ‚ de urgƒncia por conta das complica€‰es.
4
OBS : Em casos de dŠvidas quanto ao aspecto histopatol‡gico, o cirurgi•o deve proceder de uma cirurgia mais radical,
realizando-se uma ressec€•o intestinal ampliada, que englobe o mesent‚rio e linfonodos.
5
OBS : Nas ocasi‰es de tumores irressec†veis, o procedimento de deriva€•o pode ser necess†rio. Esta “ponte” passa
a ser uma cirurgia paliativa, que visa ‹ alimenta€•o do paciente e, consequentemente, uma amplia€•o do tempo de vida.
6
OBS : O mau progn‡stico dessas neoplasias est† relacionado com o estadio avan€ado quando diagnosticadas. Entre
50% a 80% j† apresentam met†stases ‹ dist…ncia na ocasi•o do diagn‡stico. A quimioterapia e a radioterapia tƒm valor
terapƒutico pouco significativo.

153
Arlindo Ugulino Netto – CIRURGIA ABDOMINAL– MEDICINA P7 – 2010.2

TUMORES METASTÁTICOS
Conforme foi visto anteriormente, o diagnóstico das neoplasias de intestino delgado não é feito precocemente.
Desta maneira, é muito comum a presença de tumores metastáticos já na ocasião do diagnóstico. A conduta para os
tumores metastáticos, preferencialmente é conservadora. A terapia cirúrgica, que é paliativa, somente deve ser indicada
quando houver complicações obstrutivas e/ou hemorrágicas.

ADENOCARCINOMA
Conforme foi visto em tópicos anteriores, o adenocarcinoma, geralmente, é uma evolução de um tumor epitelial
benigno, que é o adenoma. Alguns autores, na tentativa de se estabelecer o tempo de evolução da forma benigna para a
maligna, descreveram que os principais trials demonstram um tempo de evolução de cerca de 5-10 anos. É um tipo de
tumor que ocorre tem maior frequência em indivíduos idosos, com uma maior predileção para o sexo masculino.
Quanto a sua incidência, os locais mais prevalentes são duodeno e jejuno proximal, explicados pelo papel da
secreção biliar. Geralmente, são encontrados associados a algumas doenças já conhecidas, Doença de Crohn, polipose
adenomatosa familiar, Síndrome de Gardner.
É um tumor que tem tendência a enviar metástase precoce, principalmente por via linfática. Apesar disso, pode
implantar células tumorais para o peritônio, cursando com carcinomatose peritoneal. A disseminação por contigüidade
para órgãos próximos, ou ainda hematogênica, pode ocorrer, de modo que os principais são fígado e pulmão.

QUADRO CLÍNICO
O quadro sintomatológico ocorre a depender de sua localização. Quando presente no íleo, as manifestações
clínicas caracterizam um abdome agudo obstrutivo. Ou seja, os pacientes se queixam de dor e náuseas e, ao exame
físico, notamos uma distensão abdominal. Em outros casos, a suspeita de tumor do intestino delgado é dada nas
ocasiões de acompanhamento de pacientes com Doença de Crohn, por exemplo, e, ao exame de rotina, apresentou
tumoração visível em exames de imagem.

DIAGNÓSTICO
A tomografia computadorizada com contraste é um bom artifício de imagem para o diagnóstico dos tumores de
intestino delgado.

PATOLOGIA
Na maioria das ocasiões, o adenocarcinoma, na ocasião do diagnóstico, demonstra-se moderadamente ou bem
diferenciados.

ESTADIAMENTO
 T1. Lâmina própria ou submucosa Estadiamento do adenocarcinoma.
 T2. Tumor atinge níveis após a submucosa (muscular própria)  Estadio 0. T1N0M0
 T3. Subserosa ou tecido perimuscular (em até 2 cm de invasão)  Estadio 1. T1/2N0M0
 T4. Invasão maior do que o nível de T3, ou seja, já se invade a serosa  Estadio 2. T3/4N0M0
 N1. Linfonodos presentes  Estadio 3. TxN1M0
 M1. Metástases presentes  Estadio 4. TxNxM1

METÁSTASES
Por serem malignos, apresentam uma alta probabilidade de metastatização. Dentre os quais, destacam-se as
metástases linfáticas e, em raras ocasiões, por via hematogênica e contigüidade.
 Metástases linfáticas
 Metástases hematogênica: Fígado, Osso e Pulmão
 Metástases por contiguidade: Pode ocorrer a instalação no peritônio e, consequentemente, ocorrer a
carcinomatose peritoneal.

TRATAMENTO
A terapia cirúrgica é o tratamento de eleição para o intestino delgado, uma vez que, a radioterapia e a
quimioterapia ainda se mostram ineficazes para o tratamento definitivo do adenocarcinoma. Associado ao tratamento
cirúrgico, também é prudente que se realize o esvaziamento linfonodal total, por conta do alto risco de disseminação
linfática neste tipo histológico de tumor. Os principais tipos de cirurgia são descritos abaixo:
 Duodenectomia
 Duodenopancreatectomia
 Enterectomia
 Hemicolectomia direita
 Ressecção endoscópica: É uma modalidade cirúrgica efetiva nos pacientes que apresentam tumores restritos
a mucosa, menores do que 2 cm

154
Arlindo Ugulino Netto – CIRURGIA ABDOMINAL– MEDICINA P7 – 2010.2

TRATAMENTO DO ADENOCARCINOMA

 T1, T2: Cirurgia (caso se tenha tamanho menor que 2 cm, pode-se
proceder da ressecção endoscópica), associada à Linfadenectomia
 T3, T4 ou N1: Cirurgia (não se pode proceder da ressecção endoscópica),
Quimioterapia adjuvante e Linfadenectomia radical.
 M1: A cirurgia, nesta ocasião, não é mais curativa e sim paliativa (que é
àquela que visa o controle dos sintomas)

PROGNÓSTICO
Os fatores prognósticos dependem de algumas condições do próprio tumor e, eventualmente, dos pacientes.
Desta maneira, são listados abaixo, os fatores que podem influenciar no tempo de sobrevida livre de doença:
 Margens cirúrgicas
 Diferenciação celular: Quanto mais bem diferenciado for o tumor, melhor será o prognóstico.
 Profundidade de invasão tumoral: Obviamente, a profundidade de invasão tumoral tem efeito inverso ao
tempo de sobrevida livre da doença.
 Idade ao diagnóstico (> 75 anos): Idosos e indivíduos com idade avançada apresentam pior prognóstico.
 Localização: O duodeno é mais frequente; porém, quando se localiza no íleo, pior será o prognóstico.
 Linfonodos: Único fator independente de pior prognóstico (preditor de recorrência e metástase).

MORTALIDADE COMPARADO COM A LOCALIZAÇÃO DO TUMOR E SEXO


 Mortalidade em 1-2 anos: 30-60% dependendo estadiamento;
 Sobrevida 5 anos: 30,5% (ACS)
 Duodeno: 39%
 Jejuno/íleo: 46%
 Homens: 40%
 Mulheres: 52%
 Média sobrevida: 19,7 meses (ACS)
 Localizada: 50,1 meses
 Disseminação local: 22,2 meses
 Metástase: 8,6 meses

LEIMIOSSARCOMA
Sem dúvida, é o tipo de sarcoma mais comum do intestino delgado. A principal manifestação clínica nesta
ocasião é o sangramento e, em raras vezes, pode evoluir com a oclusão intestinal, perfuração e/ou abscesso. Ao
contrário do adenocarcinoma, o leimiossarcoma raramente evolui com metástases hepáticas e implantes peritoneais.

TRATAMENTO
O tratamento de eleição, assim como o adenocarcinoma, é a ressecção local ou enterectomia segmentar. A
quimioterapia ou radioterapia podem ser utilizadas como terapêutica adjuvante, porém, os resultados demonstram que
são pouco eficazes.

SOBREVIDA
A sobrevida de cinco anos em torno de 35% a 50% para os casos submetidos à ressecção radical. Quando não
há ressecção menos que 50% dos pacientes ultrapassam cinco anos.

TUMOR ESTROMAL G ASTROINTESTINAL (GIST)


É um tumor com maior prevalência, em termos estatísticos, no estômago (60-70%). Além deste, o intestino
delgado também pode ser acometido pelo tumor estromal gastrointestinal (GIST), suscitando dados estatísticos de 20-
30%. O GIST é um tumor originado de uma mutação das células intersticiais de Cajal (células que conferem motilidade à
musculatura propiciam o peristaltismo), fazendo parte do grupo dos tumores estromais do tubo digestivo, de origem não-
epitelial.
Apesar de serem taxados como tumores malignos, nem sempre os GIST são malignos, fato este que é
comprovado pelos estudos epidemiológicos que demonstram uma faixa de apenas 30% deles como sendo malignos. Um
dos principais diagnóstico diferencial deste tumor é com o leiomioma. Devemos lembrar também que os leiomiomas são
tumores benignos, de musculatura lisa, prevalentes no esôfago e, que apresentam actina positivo e C-KIT negativo na
imunohistoquímica.

155
Arlindo Ugulino Netto – CIRURGIA ABDOMINAL– MEDICINA P7 – 2010.2

PATOLOGIA
Nos GIST, ocorre uma prolifera€•o imatura das c‚lulas epiteli‡ides ou fusiformes a partir da camada muscular da
parede do trato gastrointestinal O diagn‡stico ‚ obtido atrav‚s da an†lise, pela imunohistoqu„mica, da muta€•o do C-KIT,
que est† presente em 95% dos pacientes com GIST.

MARCADORES TUMORAIS DO GIST


 C-kit (95%)
 CD34 (70%)
 Actina (40%)
 PS100 (5%)
 Desmina (2%)

ESTADIAMENTO
 T1. Menor do que 2 cm
 T2. 2 a 5 cm
 T3. 5 a 10 cm
 T4. Maior do que 10 cm
 N1. Linfonodos presentes
 M1. Met†stases presentes

TRATAMENTO
Antes da descri€•o do tratamento deste tipo de tumor, ‚ valido que saibamos que 10-30% dos casos, na ocasi•o
do diagn‡stico, j† apresentam met†stases ‹ distancia ou doen€a irressec†vel. Nestas situa€‰es, o tratamento passa a
ser cl„nico, com uso de quimioterapia (Imatinib). Quando n•o se tem doen€a irressec†vel e met†stases, a conduta ‚
cirŠrgica, atrav‚s da ressec€•o sem linfadenectomia e, associado ao tratamento, ‚ prudente que se fa€a o estudo
gen‚tico.

FATORES PROGÓSTICOS DO GIST


ACHADOS TUMORAIS BENIGNO MALIGNO
Tamanho <5 cm >5 cm
Celularidade Baixa Alta
Pleomorfismo Nuclear Ausente / m„nim Proeminente
Necrose Ausente Presente
Mitose <0-1 / campo 1-5 / campo
Infiltração Ausente Invade estruturas adjacentes
Metástase Ausente Presente
Mutação C-KIT Ausente Freq•entemente presente

LINFOMAS
Os linfomas de intestino delgado podem se apresentar de duas maneiras distintas: (1) linfoma do tipo ocidental e
(2) variedade mediterr…nea. O linfoma do tipo ocidental ‚ caracterizado pela presen€a de tumores prim†rios de c‚lulas
linf‡ides, que cursam com les‰es localizadas e restritas a um segmento do „leo. Por ser bastante localizada, a terapia a
ser implementada nestes tumores ‚ de car†ter cirŠrgico. J† a variedade mediterr…nea ‚ o que envolve difusamente todo
o intestino delgado, sendo mais agressivo. O comprometimento se d† mais no „leo, seguido do jejuno e duodeno.

QUADRO CLÍNICO
Clinicamente podem estar associados a surtos de oclus•o intestinal (intussuscep€•o), m†-absor€•o, perda
ponderal e dor abdominal. Geralmente, a maioria dos pacientes apresenta febre noturna, com perda de peso e calafrios.
Laboratorialmente percebe-se a presen€a da 5-hidroxiindolacetico urina

ESTADIAMENTO CLÍNICO ANN ARBOR


 TIPO I. Comprometimento de um grupo de linfonodos ou um ‡rg•o extra-nodal;
 TIPO II. Comprometimento de 2 ou mais grupos de linfonodos com ou sem comprometimento de um ‡rg•o extra-
nodal, por‚m envolvendo apenas 1 dos lados do diafragma;
 TIPO III. Comprometimento de 2 ou mais grupos de linfonodos com ou sem comprometimento de um ‡rg•o
extra-nodal, envolvendo ambos os lados do diafragma;
o A: Sem sintomas presentes em B
o B: Se presen€a de “sintomas B” (febre, sudorese noturna, perda > 10% peso corp‡reo em 6 meses)
 TIPO IV. Comprometimento de v†rios ‡rg•os extra-nodais (f„gado, pulm•o, medula ‡ssea).

156
Arlindo Ugulino Netto – CIRURGIA ABDOMINAL– MEDICINA P7 – 2010.2

7
OBS : Associado aos tipos I, II, III, IV podemos ainda evidenciar:
 E: Comprometimento de órgãos extra-nodais
 X (bulky): Se tumoração > 10 cm ou com 1/3 do diâmetro torácico

TRATAMENTO
Para os linfomas do tipo ocidental, a terapia de eleição é a ressecção cirúrgica. Para as lesões irressecáveis, a
terapia passa a ser quimioterapia e/ou radioterapia. Para os linfomas do tipo mediterrâneo, a terapia de eleição é a
quimioterapia, sendo a cirurgia uma indicação nas situações em que a doença é localizada (muito raramente).

TUMOR NEUROEND†CRINO C ARCINOIDE


É um tumor raro, com bom prognóstico. Sua taxa de
sobrevida global em cinco anos é de até 50%. Com uma
predominância no íleo distal e apêndice, apresentando metástases
em tumores maiores do que 2 cm (90%). A síndrome carcinóide
está presente em apenas 10%, pois, depende, quase
exclusivamente, da lesão metastática do fígado.
A síndrome carcinoide é produto da liberação de uma
grande quantidade de substâncias vasoativas (como a histamina e
a serotonina) na circulação sistêmica. Os sintomas aparecem
quando os tumores estão maiores ou com metástases (hepáticas,
principalmente). Os tumores carcinoides com menos de 1cm
raramente causam metástase e síndrome carcinoide. O quadro
clínico é representado por manifestações causadas pela produção
e excreção repentina de aminas vasoativas em nível sistêmico,
causando: rubor facial, broncoespasmo, diarreia, dor abdominal e
taquicardia.

DIAGNÓSTICO
Para o diagnóstico deste tipo de tumor, devemos
requisitar a dosagem da cromogranina A e sinaptofisina.
Além destes, a cintilografia também pode ser requisitada
em casos de dúvidas sobre outras implantações tumorais.

TRATAMENTO
 Ressecção cirúrgica representa a melhor opção
terapêutica.
 Tratamento clínico para casos avançados e
sintomáticos: antagonista dos inibidores de
serotonina (análogos da somatostatina).

157
Arlindo Ugulino Netto – CIRURGIA ABDOMINAL– MEDICINA P7 – 2010.2

MED RESUMOS 2012


ELOY, Yuri Leite; NETTO, Arlindo Ugulino.
CIRURGIA ABDOMINAL

CIRURGIA BARIÁTRICA
(Professor Marcelo Gonçalves)

A cirurgia bariátrica nos últimos anos está sendo cada vez mais realizada. Entretanto nem sempre suas
indicações são pertinentes às necessidades do paciente, sendo utilizada erroneamente para fins estéticos. Com isso seu
estudo se torna de grande importância na disciplina de cirurgia abdominal. Portanto, este capítulo tem os seguintes
objetivos:
 Mostrar a importância do controle das comorbidades do obeso.
 Identificar os pacientes candidatos ao tratamento cirúrgico.
 Mostrar as diversas opções de técnicas cirúrgicas.
 Mostra a importância de um acompanhamento multidisciplinar.

EPIDEMIOLOGIA
Estatísticas norte-americanas mostram que sua população em geral,
com o decorrer dos anos está ficando mais obesa. Esse aumento ocorre em
todos os graus de obesidade, ou seja, desde os indivíduos com sobrepeso,
até aqueles com obesidade mórbida.
Estudos brasileiros demonstraram que cerca de 40% da população
encontra-se acima do peso ideal. Estima-se que 1% da população encontra-
se em um grau de obesidade grave, com índice de massa corporal acima de
2
40 kg/m .

FISIOPATOLOGIA
Tendo a obesidade como uma doença crônica, assim como a
maioria dos processos patológicos, ela também possui uma
fisiopatologia. Esta é muito simples de ser entendida. Está baseada no
balanço do gasto energético, ou seja, os indivíduos acima do peso
ideal são aqueles que ingerem uma carga calórica superior as
necessidades metabólicas do organismo. Além disso, existem aqueles
pacientes que se alimentam pouco, entretanto o organismo tem uma
carga energética baixa. Com isso, todo o alimento que é ingerido tende
a ser armazenado levando ao ganho de peso.
Além desse componente metabólico citado acima, estudos
revelaram que existem aproximadamente 100 genes relacionados com
os mecanismos que predispõe ou não os pacientes a obesidade.

C O-M ORBIDADES RELACIONADAS ‹ OBESIDADE


 Diabetes  Insuficiência Venosa Crônica
 Hipertensão arterial  Incontinência Urinária
 Apnéia do sono  Gravidez
 Artropatia  Hormônios Sexuais
 Dislipidemia  Qualidade de Vida
 Hiperuricemia  Baixa auto-estima
 Síndrome Metabólica  Licença Médica
 Refluxo gastroesofágico  Custos
 Esteatose Hepática  Mortalidade

SÍNDROME METABÓLICA
Umas das co-morbidades mais comuns em pacientes obesos é o desenvolvimento de diabetes tipo 2, assim,
quanto maior a massa corporal maiores serão as chances do paciente desenvolver esta doença. Além disso, a diabetes
tipo 2 faz parte de um conjunto de fatores que culmina no diagnóstico de síndrome metabólica, doença que envolve
obesidade central, hipertensão arterial, diabetes tipo 2, esteatose hepática, elevação dos TG e redução do HDL, tendo
assim um aumento consideravel para ocorrência de eventos cardiovasculares.
Para que o paciente seja portador dessa síndrome é necessário que esteja presente dois ou mais dos seguintes
critérios:
158
Arlindo Ugulino Netto – CIRURGIA ABDOMINAL– MEDICINA P7 – 2010.2

 Obesidade central (88cm mulher, 102cm homem)


 PA  130/85mmHg
 Glicemia > 100mg/dL
 Triglicérides >150mg/dL
 HDLcol <40mg/dL p/homem e <50mg/dL p/ mulher

O gráfico abaixo mostra a relação entre a síndrome metabólica e ocorrência de eventos cardiovasculares. Nota-
se que ao longo dos anos, os indivíduos que são portadores dessa síndrome tem um risco de morte cardiovascular
aumentado em relação aqueles pacientes que não são portadores dessa doença.
Assim pode-se dizer que quanto mais critérios o paciente apresenta maiores serão as chances de ocorrência de
eventos cardiovasculares.

TRATAMENTO CLÍNICO X CIRÚRGICO


Devido à presença de diversas co-morbidades associadas ao paciente obeso, e dificuldade na realização do
tratamento clínico, inerente às elevadas taxas de ocorrência de recidivas, foi introduzido para a redução das co-
morbidades o tratamento cirúrgico.
O gráfico abaixo comprova o que foi dito acima. Ele faz uma comparação entre o tratamento clínico e cirúrgico
ao longo de 14 anos, mostrando que a perda de peso com o tratamento clínico foi discreto quando comparado com o
tratamento cirúrgico.
Com isso o procedimento cirúrgico está indicado quando o risco da cirurgia é menor quando comparado com os
riscos de morte devido a obesidade, isso ocorre principalmente naqueles pacientes onde o índice de massa corporal
2
está acima de 40kg/m . Assim podemos dizer que o tratamento cirúrgico é a melhor escolha para aumento da
expectativa de vida, redução das co-morbidades nos pacientes obesos.

159
Arlindo Ugulino Netto – CIRURGIA ABDOMINAL– MEDICINA P7 – 2010.2

…NDICE DE MASSA C ORPORAL (IMC)

Atrav‚s do „ndice de massa corporal (IMC), pode-se estimar a adiposidade e consequentemente, se uma
pessoa est† acima do peso ideal. A vantagem do uso do IMC ‚ que seu c†lculo ‚ simples, r†pido e n•o requer nenhum
equipamento especial, por‚m, devido a sua simplicidade e por n•o levar em conta o bi‡tipo de cada um, n•o pode ser
considerado um meio livre de erros. O IMC tamb‚m n•o pode distinguir as propor€‰es de mŠsculos, gordura, ossos e
†gua no corpo.

CLASSIFICAÇÃO ÍNDICE DE MASSA CORPORAL


2
Hiperobesidade IMC ≥ 60 kg/m
2
Superobesidade IMC 50 a 59.9 kg/m
2
Obesidade Severa (Grau III) IMC ≥ 40 kg/m
2
Obesidade Moderada (Grau II) IMC 35 a 39.9 kg/m
2
Obesidade Leve (Grau I) IMC 30 a 34.9 kg/m
2
Sobrepeso IMC 25 a 29.9 kg/m
2
Peso Normal IMC 18.5 a 24.9 kg/m
2
Peso Baixo IMC < 18.5 kg/m

ASPECTOS CIR‡RGICOS GERAIS

INDICAÇÕES CIRÚRGICAS
Como foi dito anteriormente nem todos os pacientes s•o candidatos e realiza€•o de cirurgia bari†trica. As
principais indica€‰es para a realiza€•o do procedimento cirŠrgico s•o:
 Grau de obesidade acentuado
 Resistƒncia ao tratamento cl„nico
 Presen€a de doen€as associadas
 Risco cirŠrgico aceit†vel
 Compreens•o das implica€‰es da opera€•o

Indicações Gerais.
De acordo com o Conselho Federal de Medicina as principais indica€‰es cl„nicas para a realiza€•o da cirurgia
s•o:
 Pacientes com „ndice de massa corporal superior a 40, com dois anos de tratamento cl„nico sem sucesso.
Entretanto n•o ‚ necess†rio seguir de forma espec„fica, principalmente em rela€•o ao tempo de tratamento
cl„nico. Assim pacientes com IMC > 40, sem tratamento cl„nico anterior, devem passar por avalia€•o de um
endocrinologista para pesquisa dos poss„veis resultados de um tratamento cl„nico, caso o mesmo seja invi†vel
pode ser indicado a cirurgia;
 Pacientes com obesidade grau II, com presen€a de co-morbidades, ou seja, pacientes hipertensos, diab‚ticos,
portadores da s„ndrome metab‡lica, s„ndrome da apneia do sono;
 A idade indicada para o tratamento est† entre 18 e 70 anos de idade.

Específicas.
Al‚m dessas, existem outras indica€‰es especiais que fogem a faixa et†ria proposta anteriormente, ou seja, s•o
aqueles pacientes com idade entre 16 e 18 anos. Geralmente a indica€•o de cirurgia ‚ feita pelo endocrinologista, que
relata ineficiƒncia do tratamento cl„nico, aparecimento de co-morbidades, presen€a de s„ndromes gen‚ticas. Outra
indica€•o especial s•o os pacientes com obesidade grau I (IMC entre 30 e 35) e portadores de DM tipo 2
descompensada e com poss„vel les•o de ‡rg•os alvos.

Idosos.
A cirurgia bari†trica ‚ uma t‚cnica que pode ser utilizada em pacientes com at‚ 70 anos de idade. Assim, para
os pacientes com 60 anos a cirurgia tamb‚m pode ser realizada, entretanto deve-se analisar o risco-benef„cio desses
pacientes. Al‚m disso, deve-se inform†-lo que a perda de peso nesses casos n•o ser† t•o expressiva como ocorre em
pacientes mais jovens, sendo necess†ria somente para o controle das co-morbidades. Assim os principais objetivos s•o:
melhora na qualidade de vida e controle das co-morbidades, mas n•o obrigatoriamente aumento da sobrevida.

Adolescentes.
Para realiza€•o da cirurgia em adolescentes existem alguns crit‚rios que indicam o procedimento cirŠrgico.
Lembrando que a indica€•o da cirurgia nessa faixa et†ria de pacientes ‚ uma decis•o multidisciplinar, ou seja, que

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Arlindo Ugulino Netto – CIRURGIA ABDOMINAL– MEDICINA P7 – 2010.2

envolve psicólogos e psiquiatras, endocrinologistas, familiares e o próprio paciente. Além disso, deve-se ter uma
autorização judicial. Assim temos:

2
 IMC > 40 Kg/m + co-morbidade
 99,5º do percentil correspondente a idade
 Seis meses de programa de perda de peso não responsivo
 Acompanhamento médico e psicológico
 Programa Multidisciplinar:
 Suporte pediátrico na equipe
 Síndromes genéticas
 Prader Willi: síndrome associada a hiperfagia
 Indicação multidisciplinar

EQUIPE MULTIDISCIPLINAR
 Nutricionista  Intensivista
 Psicólogo  Clinico Geral
 Fisioterapeuta  Anestesista
 Educador Físico  Dentistas
 Cirurgião do aparelho Digestivo  Enfermagem
 Cardiologista/ Pneumologista  Presença da Família

Apesar de ser recomendada a participação de toda essa equipe, sabe-se que a maioria dos serviços médicos
não dispõe das especialidades, ou o paciente não tem condições econômicas de fazer esse acompanhamento.
Entretanto o consenso de 2005 de cirurgia bariátrica recomenda que estejam presentes pelo menos: (1) cirurgião, (2)
clínico ou cardiologista, (3) psiquiatra e/ou psicólogo(a) e (4) nutricionista.
Após a realização da cirurgia o paciente deve passar por uma reeducação alimentar, que deve ser acompanhado
com uma nutricionista experiente. Muitos desses pacientes já estão em processo de reeducação alimentar antes do
procedimento cirúrgico, daí a importância da nutricionista.
O acompanhamento com psicólogo ou psiquiatra é de extrema importância, principalmente na orientação quanto
aos resultados do tratamento, pois na maioria das vezes não atende as esperanças do paciente, já que este espera
resultados imediatos. Com isso é necessário um acompanhamento sobre as alterações da pele (flacidez) que poderão
ocorrer, indicando a prática de exercícios físicos e reeducação alimentar. Apesar disso, muitos pacientes insatisfeitos
com os resultados, que não passaram por um acompanhamento psicológico, insistem pela realização de uma cirurgia
plástica precoce ou passam a ter um padrão alimentar irregular desenvolvendo dentro de poucos anos o quadro de
obesidade grave.

TÉCNICA CIRURGICA
A escolha da técnica cirúrgica deve ser feita levando em consideração alguns parâmetros que estão associadas
a cada paciente.
 IMC;
 Idade;
 Sexo: o sexo é importante, pois o padrão alimentar da mulher é difere do homem.
 Distribuição da gordura corporal;
 Presença da Síndrome Metabólica: existe uma técnica específica para esses pacientes.
 Padrão alimentar;
 Doença do refluxo e hérnia de hiato: nesses casos deve-se tratar a doença de refluxo do paciente.
 Nível intelectual: grau de entendimento do paciente, ou seja, entender que após o procedimento cirúrgico
poderão ocorrer algumas alterações fisiológicas, entre as mais comuns a diarréia.
 Expectativa do paciente: apesar disso, um dos parâmetros mais importantes é a expectativa do paciente, isto é,
o que o paciente espera após a realização da cirurgia quanto ao seu padrão alimentar, emagrecimento, relações
sociais e familiares, acompanhamento clínico etc.

CONTRA-INDICAÇÕES ESPECÍFICAS
 Ausência de um tratamento clínico anterior
 Incapacidade em seguir um acompanhamento
 Desordens psiquiátricas não estabilizadas: daí a importância de uma avaliação psiquiátrica antes do
procedimento cirúrgico.
 Drogas
 Descompensação clínica

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Arlindo Ugulino Netto – CIRURGIA ABDOMINAL– MEDICINA P7 – 2010.2

 Falta de cuidado pr‡prio


 Estrutura familiar: para que tenha um acompanhamento p‡s-cirŠrgico bem realizado
 Falta de entendimento da indica€•o e dos cuidados no p‡s-operat‡rio.

TˆCNICAS CIR‡RGICAS
Atualmente as t‚cnicas utilizadas na cirurgia bari†trica est•o baseadas em dois princ„pios: (1) o primeiro deles ‚
na redu€•o do estŒmago (t‚cnica restritiva), tendo como intuito a saciedade precoce do paciente, e o (2) desvio intestinal
(t‚cnicas mal-absortivas), em que o alimento n•o ser† totalmente absolvido pelo paciente. Apesar disso, a mais utilizada
‚ a (3) t‚cnica mista, ou seja, no paciente ‚ realizado tanto uma redu€•o do estŒmago (promovendo uma saciedade
precoce) como desvio intestinal (reduzindo a absorۥo).

EVOLUÇÃO DA CIRURGIA BARIÁTRICA


Os primeiros procedimentos utilizados para o tratamento da obesidade foram:
 Mal Absortivos: o primeiro m‚todo foi introduzido em 1954, que era realizada uma deriva€•o jejuno-ileal. Tinha
como principal objetivo a redu€•o absortiva ao longo do trajeto do intestino delgado. Entretanto esse m‚todo
deixou de ser utilizado, pois os pacientes cursavam com desnutri€•o grave, fezes gordurosas, diarr‚icas e de
odor f‚tido, insuficiƒncia hep†tica, hipovitaminose, perda de peso acentuada.
 Métodos Restritivos: S•o m‚todos que consistem na coloca€•o de pr‡teses estomacais reduzindo seu volume,
com isso, o paciente cursa com saciedade precoce. Entretanto dependendo dos h†bitos alimentares do paciente,
principalmente aqueles pacientes que ingerem alimentos constantemente, o procedimento cirŠrgico n•o ter†
grandes efeitos, por isso, ‚ importante mesmo com a cirurgia a mudan€a dos h†bitos alimentares nesses
pacientes. Consiste em uma t‚cnica pouca utilizada, j† que 20% desses pacientes ter•o que realizar a cirurgia
mista.
 Métodos Mistos: os m‚todos mistos vieram como uma alternativa aceit†vel para o tratamento da obesidade
grave. Esse m‚todo est† baseado na realiza€•o de uma t‚cnica restritiva associada ‹ mal-absortiva, evitando
assim efeitos colaterais exacerbados de ambos os procedimentos. Os procedimentos mistos correspondem a
cerca de 80 a 95% das cirurgias utilizadas no tratamento da obesidade. Ela ‚ realizada com uma redu€•o
acentuada do estŒmago, deixando-o com um volume pr‡ximo a 30 ml, e posteriormente realiza-se o desvio
intestinal em Y de Roux.

Os procedimentos aceitos pelo CFM ser•o citados logo a seguir.

TÉCNICAS MAL-ABSORTIVAS
As t‚cnicas descritas adiante s•o mistas, j† que, durante a realiza€•o do procedimento h† um componente
restritivo e mal-absortivo. Entretanto est•o inclu„das em “t‚cnicas mal-absortivas”, pois o seu principal mecanismo de
perda de peso (efetividade da cirurgia) ocorre principalmente devido ‹ deriva€•o Bilio-pancre†tica que ‚ realizada,
promovendo a m†-absor€•o. Com isso as principais t‚cnicas discutidas abaixo s•o as deriva€‰es bilio-pancre†ticas
(BDP) de Scopinaro e Duodenal Switch.

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Cirurgia de Scopinaro.
É um procedimento misto, utilizado para o tratamento daqueles pacientes que necessitam de uma perda de peso
considerável, geralmente são pacientes de classes sociais mais altas e mais esclarecidas quanto às intenções cirúrgicas
e seus resultados, e estrutura familiar adequada. Esse procedimento tem como conforto para o paciente, principalmente
por não haver a necessidade de mudança dos hábitos alimentares. Em relação aos efeitos colaterais podemos destacar
o excesso de evacuações diárias (6 a 8).
Na cirurgia de Scopinaro é realizada uma redução acentuada do estômago, deixando-o com uma capacidade
volumétrica em torno de 200 a 500 ml, e depois disso, é realizada uma derivação jejuno-ileal, com aproximadamente 50
a 100 cm de comprimento.

Técnica Duodenal Switch.


É uma técnica mista com maior componente mal-absortivo, sendo semelhante à cirurgia de Scopinaro. No
primeiro tempo realiza-se uma gastrectomia vertical, e posteriormente uma derivação bilio-pancreática com transposição
duodenal. Nela o volume gástrico fica em torno de 150 ml, e a alça comum (derivação) tem em torno de 50 a 100 cm. A
gastrectomia vertical é mais fisiológica por haver preservação do piloro.

TÉCNICAS RESTRITIVAS
Como já foi explicado anteriormente o seu mecanismo está relacionado unicamente com redução do volume
gástrico com isso produzindo nesses pacientes uma sensação de saciedade precoce.

Balão intragástrico.
É uma técnica restritiva que é utilizada no tratamento de pacientes com obesidade
que não há indicação de realização de cirurgia, ou ainda, naqueles pacientes com obesidade
grave, com presença de co-morbidades. Pode-se colocar o balão por 6 meses para controle
dessas doenças e melhorar as condições cirúrgicas do pacientes. Outra indicação comum são
aqueles pacientes previamente normais, entretanto, devido à necessidade de uso crônico de
corticóide, tornaram-se obesos, com isso, pode-se utilizar o balão intra-gástrico, o mesmo se
aplica a gestantes que após o parto não conseguem retornar ao peso normal.
A introdução do balão é feito através de endoscopia. O balão permanece no interior
do estômago por um período não superior a 6 meses. Durante esse tempo é indispensável o
acompanhamento do paciente com uma nutricionista e psicólogo para normalização do
padrão alimentar e estabilização de suas condições emocionais ansiedade em relação aos
resultados cirúrgicos, estética, depressão etc.

Gastroplastia Vertical Bandada ou Técnica de Mason.


É uma técnica desenvolvida por Mason em 1982, em que é realizado um grampeamento vertical do estômago, e
colocação de um anel (bandagem com Marlex). Forma-se, assim, um reservatório proximal de 15 a 20 ml, dando ao
paciente uma saciedade precoce. Entretanto para o sucesso desse procedimento e necessário que o paciente tenha um
acompanhamento com nutricionista para a normalização dos hábitos intestinais.

Banda Gástrica Ajustável (LAGB).


A banda gástrica é uma prótese de silicone que é colocada na porção proximal do estômago, que forma uma
pequena bolsa que tem cerca de 15 a 20 ml de volume. Essa banda é conectada através de um tubo a um dispositivo
plástico ou de mentral que é colocado sob a pele do paciente que, por meio deste, pode controlar a quantidade de
alimento que deve ou não seguir ao longo do TGI.
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Arlindo Ugulino Netto – CIRURGIA ABDOMINAL– MEDICINA P7 – 2010.2

Desta forma podemos injetar água destilada para insuflar a banda gástrica conferidno uma maior tensão, ou
esvaziar o receptáculo para aliviar a obstrução à passagem de alimento. A colocação da banda gástrica é feita por
vídeolaparoscopia. A perda de peso, fica em torno de 20 a 30% em média e depende da cooperação do paciente.
Assim como na técnica de Mason, esses pacientes necessitam de um acompanhamento com nutricionista para
normalização dos hábitos intestinais e se necessário acompanhamento com psicólogo psiquiatra para evitar variações

emocionais durante o tratamento pós-cirúrgico, ou seja, ansiedade, depressão etc.

Gastrectomia em Manga (“sleeve”) ou Gastrectomia Vertical.


Apesar da presença de complicações no intra-operatório, caracteriza-se por ser uma cirurgia mais rápida e não
há necessidade intensa de reposição de vitaminas ou proteínas, já que o trânsito intestinal está integro. Além disso,
pode ser o primeiro tempo de outras cirurgias principalmente em pacientes com obesidade grave, como é o caso da
cirurgia de Duodenal Switch. Entretanto não se pode estabelecer do prognóstico desses pacientes, pois devido a um
padrão alimentar indevido o estômago pode dilatar e o paciente voltar a ganhar peso.

TŽCNICAS MISTAS
As técnicas mistas, como já foram explicadas, são aquelas que se utilizam do componente restritivo e mal-
absortivo, sendo as técnicas mais utilizadas atualmente. Entretanto um dos efeitos colaterais é a ocorrência da síndrome
de dumping (síndrome pós-gastrectomia), que é caracterizada por um conjunto de sinais e sintomas associados à
passagem rápida de alimentos do estômago para o intestino podendo ser classificada em precoce e tardia.
O dumping precoce, que ocorre cerca de 30 a 60 minutos após a refeição, é ocasionada pelo esvaziamento
gástrico acelerado do conteúdo hiperosmolar (ricos em açúcar) para o intestino delgado. Isso leva ao desvio do líquido
intra-vascular para o lúmen do intestino delgado, levando à distensão desse órgão e aumento dos movimentos
peristálticos. Dessa forma o paciente pode apresentar como sintomas a distensão abdominal, desidratação, tonturas,
diarréia, taquicardia, dor abdominal tipo cólica etc. Esses alimentos ricos em açúcar no lúmen do intestino delgado

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promovem osmoticamente a passagem de água para esse compartimento de modo que, o paciente fique desidratado,
hipotenso, taquicárdico, mal-estar.
No dumping tardio, geralmente os sintomas ocorrem cerca de 1 a 3 horas após as refeições. Nesses casos há
uma grande concentração inicial de carboidratos ao intestino delgado, havendo rápida absorção de glicose. Com isso
haverá uma resposta hiperinsulínica, que é responsável pela futura hipoglicemia apresentada pelo paciente.
Entretanto, a síndrome de Dumping muitas vezes é vista como um fator de ajuda no combate a obesidade, pois
os sinais e sintomas apresentados por esses pacientes podem ser minimizados com uma ingesta alimentar balanceada,
rica em fibras, vitaminas e legumes.

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Arlindo Ugulino Netto – CIRURGIA ABDOMINAL– MEDICINA P7 – 2010.2

Derivação Gástrica em Y-de-Roux.


A deriva€•o (bypass) g†strica caracteriza-se por ser uma
cirurgia mista onde o componente restritivo ‚ mais observado,
quando comparado com o mal-absortivo, j† que as enzimas
digestivas ir•o atuar sobre o alimento. A t‚cnica utilizada
obedece ao seguintes passos:
1. Grande parte do estŒmago, todo o duodeno e jejuno
proximal s•o isolados do restante do TGI;
2. Faz-se uma anastomose do jejuno distal ao coto g†strico
remanescente (gastric pouch);
3. O bloco estômago-duodeno-jejuno proximal ‚ ent•o
comunicado a uma porۥo mais distal do jejuno (jejuno-
jeunostomia) para que as secre€‰es g†stricas e
duodenais alcancem o bolo alimentar.

Na figura ao lado podemos observar que houve uma


grande reduۥo da funۥo estomacal, deixando somente uma
pequena bolsa g†strica, com exclus•o intestinal de 150 cm e uma
al€a comum de 350 cm. Al‚m disso, h† uma exclus•o total do
duodeno. Nesses pacientes a m†-absor€•o ocorre principalmente
dos seguintes compostos: carboidratos, lip„dios, ferro, c†lcio,
vitamina A, D, E, K, •cido F‡lico, Zinco.
Essa cirurgia tamb‚m provoca no paciente algumas
altera€‰es neuroend‡crinas importantes.
o Ghrelina: no momento da incis•o do estŒmago para sua exclus•o do tr…nsito intestinal, ocorre uma perda da
atua€•o da Ghrelina, hormŒnio produzido no fundo g†strico, que tem como fun€•o estimular a fome do paciente.
Quando os n„veis de glicose est•o baixos, ocorre uma maior secre€•o desse hormŒnio, estimulando a
alimenta€•o. Assim ap‡s o procedimento cirŠrgico, cerca de 48 a 72 horas, o paciente ainda n•o sente fome,
sendo assim necess†rio a estimular a alimenta€•o para que n•o ocorra perdas nutricionais importantes.
o Peptídeo Inibitório Gástrico (GIP): como foi dito anteriormente nessa cirurgia ocorre uma exclus•o total do
duodeno, devido ‹ anastomose em Y de Roux. Com isso n•o haver† a produ€•o do hormŒnio GIP, que ‚
secretado pela presen€a f„sica do alimento no duodeno. Esse hormŒnio ‚ respons†vel pela estimula€•o, s„ntese
e reserva de lip„dios.
o GLP- 1 e PYY: a anastomose em Y de Roux promove a presen€a precoce do alimento nas por€‰es m‚dia do
„leo, determinando a estimula€•o e secre€•o dos hormŒnios GLP-1 e PYY, respons†veis pela redu€•o do
apetite. Al‚m disso, estes hormŒnios estimulam as c‚lulas betas, reduzindo o metabolismo lip„dico e glic„dico.
1
OBS : Atualmente, observa-se com frequƒncia na m„dia e outros meios de comunica€•o a chamada “cirurgia de
Diabetes”. Essa cirurgia nada mais ‚ que a Derivação Gástrica em Y-de-Roux, entretanto suas indica€‰es somente
para o tratamento para o diabetes ainda ‚ controversa e n•o regulamentada pelo CFM. Essa cirurgia ‚ de escolha
principalmente por reduzir o metabolismo dos lip„dios e ainda, promover uma estimula€•o das c‚lulas beta pancre†ticas.
2
OBS : A interposição ileal ‚ outro procedimento semelhante, entretanto, ainda experimental, n•o sendo aprovado pelo
CFM. Sua t‚cnica ‚ caracterizada pela transposi€•o do „leo para o estŒmago, com isso, o alimento n•o passa pelo
duodeno, inibindo a secre€•o de GIP, e devido a sua presen€a precoce no ID, leva a secre€•o precoce de GLP-1 e PYY.
Essa t‚cnica foi utilizada no apresentador Fausto Silva (o “Faust•o”), como tratamento para obesidade.

Derivação Gástrica com Anel de Silicone.


ˆ uma t‚cnica desenvolvida por Mathias A. L. Fobi (1986),
caracterizada por uma gastrectomia vertical, formando uma pequena bolsa
estomacal com desvio e Y de Roux. Al‚m disso, realiza-se uma
gastrostomia, pois caso haja complica€‰es o paciente pode ser alimentado
por esta via. E por Šltimo ainda introduz um anel de silicone no estŒmago.

Este anel atualmente s‡ deve ser colocado em pacientes super e


hiperobesos. As restri€‰es a utiliza€•o do anel foram feitas principalmente
devido ‹ ocorrƒncia de complica€‰es como, eros•o do anel para o interior
do estŒmago, migra€•o de anel e vŒmitos constantes.

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Arlindo Ugulino Netto – CIRURGIA ABDOMINAL– MEDICINA P7 – 2010.2

Operação de Fobi-Capella.
ˆ uma t‚cnica desenvolvida por Rafael e Joseph F. Capella (1991) e nela realiza-se uma Gastroplastia e
Deriva€•o G†strica em Y-de-Roux (RYGBP). ˆ a t‚cnica mais utilizada atualmente.
Em 1994 essa mesma
t‚cnica passou a ser realizada
por vídeolaparoscopia por
Wittgrove & Clark. Estudos
demonstraram que os resultados
tanto da cirurgia convencional
como da laparosc‡pica s•o
idƒnticos. Entretanto, por via
laparosc‡pica, o paciente
apresentar† menor desconforto,
recupera€•o mais r†pida, menos
riscos de desenvolver h‚rnia
incisional, etc. Contudo, ‚
necess†rio que o cirurgi•o seja
treinado em procedimento
laparosc‡pico e bari†trica para
realizaۥo desta operaۥo.

BENEF…CIOS DA CIRURGIA B ARI‰TRICA

PERDA PONDERAL PÓS-OPERATÓRIA


Tratamento Emagrecimento Complicações metabólicas
Cl„nico 5 – 10% ---------------
Cirurgia Restritiva 25 – 30% +
Cirurgia Mista 35 – 40% +++
Cirurgia M†-absortiva 40 – 45% ++++

Com isso caso o paciente n•o tenha um acompanhamento regular, ou seja, acompanhamento com nutricionista,
ou suplementa€•o alimentar caso seja necess†rio, deve-se preferir por uma t‚cnica mista, em que as necessidades de
controle p‡s-operat‡rio s•o menores.

MELHORA DAS CO-MORBIDADES


 Diabetes  Insuficiƒncia Venosa CrŒnica
 Hipertens•o arterial  Incontinƒncia Urin†ria
 Apn‚ia do sono  Gravidez
 Artropatia  HormŒnios Sexuais
 Dislipidemia  Qualidade de Vida
 Hiperuricemia  Auto-Estima 
 Pseudotumor Cerebral  Licen€a M‚dica 
 Refluxo gastroesof†gico  Custos 
 Esteatose Hep†tica  Mortalidade 

RESULTADOS
Uma revis•o sistem†tica dos melhores trabalhos publicados realizado em 2006 pode concluir de forma geral os
resultados da utilizaۥo da cirurgia como tratamento de escolha para pacientes obesos. Assim concluiu-se que:
– “Todos os procedimentos cirŠrgicos bari†tricos apresentam perda de peso duradoura a m‚dio prazo.”
– “BPD e RYGBP com anel, mais efetivas do que LAGB e RYGBP sem anel a m‚dio prazo.”

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Arlindo Ugulino Netto – CIRURGIA ABDOMINAL– MEDICINA P7 – 2010.2

TAXAS DE REMISSÃO DO DIABETES TIPO 2


Praticamente todas as cirurgias controlam o diabetes tipo 2, umas precocemente e outras mais tardiamente. As
que levam a um controle mais rápido e efetivo são aquelas que promovem uma exclusão do duodeno e chegada do
alimento mais rápido ao íleo. Com isso, podemos dizer que as técnicas restritivas controlam menos a diabetes do que as
má-absortivas. Dessa forma é importante fazer as seguintes considerações sobre as principais técnicas cirúrgicas em
relação ao controle do DM tipo 2:
 Banda Gástrica: Não é a melhor escolha para controle da diabetes, tendo uma taxa de remissão em torno de
47,9%, e tardio.
 Técnica de Mason: intermediário com 73,2% de remissão
 Bypass Gástrico em Y de Roux: imediato com 83,7% de remissão
 Derivação Bileo-Pancreática: imediato com 98,9% de remissão

C ONSIDERA•‚ES P †S -CIR‡RIGICAS

REGRAS PARA COMER


As Sete Regras de Kral (2001):
1. Comer lentamente em ambiente calmo
2. Progredir dieta: líquidos ‣ purês ‣ sólidos
3. Definir pequenas porções
4. Mastigar bem antes de deglutir
5. Parar de comer imediatamente quando sentir estômago cheio
6. Nunca beber junto com comida
7. Beber depois de uma hora da refeição

ACOMPANHAMENTO AMBULATORIAL
 Medicação:  Exames Bioquímicos:
 Multivitamínico com Zinco  Hemograma
 Ferro e Ácido Fólico  Ferro
 Cálcio e Vitamina D  Ferritina
 Vitamina B1 e B12  Transferrina
 Vitamina B 12
 Ácido Fólico
 Proteinograma
 Cálcio
 Paratormônio
 Vitamina D (1,25-OH)

ACOMPANHAMENTO NUTRICIONAL
 Acompanhamento nutricional Pré operatório  Monitoramento nutricional Pós operatório
 Prevenção de carências  Consistência, volume e qualidade
 Melhor cicatrização  Modificação de hábitos alimentares
 Menor tempo de internação hospitalar  Suplementação
 Biodisponibilidade de nutrientes

TERAPIA NUTRICIONAL NO PÓS OPERATÓRIO


 Fracionamento das refeições  Dieta hipocalórica, hiperprotéica
 Líquidos: 2 litros/dia  Suplementação de macro e micronutrientes
 Mastigação exaustiva  Explicar ao paciente a Síndrome de Dumping

RISCOS E COMPLICAÇÕES
 Queda de cabelo (eflúvio telógeno)  Osteopenia / Osteoporose
 Anemia (deficiência. Fe/vit B12)  Wernicke-Korsakoff (deficiência vitamina B1)
 Deficiência vitamina lipossolúvel (A, D, E, K)  Guillain-Barré
 Hipogeusia (deficiência. Zinco)  Litíase biliar (emagrecimento rápido)
 Deficiência Oligoelementos. (ácido. fólico)  Litíase renal (desidratação)
 Hipoproteinemia (cirurgia. mal absortiva)

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COMPLICAÇÃO NUTRICIONAL TARDIA: DEFICIÊNCIA DE NUTRIENTES


 Prote„na
 Ferro
 Vitaminas do Complexo B
 C†lcio e Vitamina D

INCIDÊNCIA DE DEFICIÊNCIAS NUTRICIONAIS x TÉCNICAS CIRÚRGICAS

DÉFICIT RESTRITIVAS DISABSORTIVAS


Prote„na 5 – 30% 25 – 40%
++
Ca ------------------- 5 – 10%
Anemia 20 – 35% 18 – 54%
Vitamina B12 ------------------ 26 - 70%
Folato ------------------ 9 - 35%
Ferro 10 – 20% 20 - 49%

MORTALIDADE PÓS-OPERATÓRIA
 Geral: 0,5 a 1,0%, Miller (2004) = 0,3%, Christou (2004): Ap‡s cirurgia: 0,6% Sem cirurgia: 6,0%.
 Causas: Choque s‚ptico e Embolia pulmonar
 Morbidade: 10%

C ONCLUS„O
 A cirurgia bari†trica ‚ importante no controle das co-morbidades do obeso.
 Nem todos s•o candidatos ao tratamento cirŠrgico.
 As op€‰es cirŠrgicas s•o individualizadas.
 ˆ necess†rio acompanhamento multidisciplinar pr‚ e p‡s-cirŠrgico.

169
Arlindo Ugulino Netto – CIRURGIA ABDOMINAL– MEDICINA P7 – 2010.2

MED RESUMOS 2012


CORREIA, Luiz Gustavo; NETTO, Arlindo Ugulino.
CIRURGIA ABDOMINAL

DOENÇA DIVERTICULAR DO CÓLON


(Professor Felipe Rocha)

O divertículo é um termo utilizado na medicina


para caracterizar uma evaginação, semelhante a uma
bolsa, produzida em órgão tubular. A sua localização mais
comum é o intestino grosso. A presença de divertículos é
denominada diverticulose, uma condição que tende a se
manifestar após a meia-idade. Quando os divertículos se
inflamam, a condição é denominada diverticulite.
Os divertículos podem ser adquiridos ou
congênitos e afetar tanto o intestino delgado quanto o
cólon. De forma análoga ao descrito para os divertículos
esofágicos, os divertículos congênitos são herniações de
toda a espessura da parede intestinal, enquanto que os
divertículos adquiridos, muito mais frequentes, consistem
em herniações da mucosa e submucosa através da
camada muscular, mais comumente em pontos de menor
resistência (tais quais os pontos de entrada das artérias
retas colônicas). Deste modo, os divertículos adquiridos
também podem ser denominados de pseudodivertículos
(ou falsos divertículos), pois, somente apresentam o
componente histológico mucoso e submucoso da parede
colônica, distintamente, portanto, dos divertículos
verdadeiros (em que todas as camadas histológicas são
herniadas). Os divertículos adquiridos, na maioria das
vezes, também são divertículos de pulsão, pois, ocorrem
por conta do aumento da pressão intraluminal.
Portanto, em resumo, temos que a doença
diverticular do cólon (ou diverticulose) é uma entidade
nosológica caracterizada pela simples presença de, no
mínimo, um divertículo intestinal. Quando o divertículo
intestinal sofre algum tipo de alteração inflamatória, passa
a ocorre um processo denominado de Diverticulite, tema
do próximo capítulo.

A imagem ao lado representa um corte transversal do abdome


inferior. Nela, podemos evidenciar que determinados segmentos
intestinais não apresentam fibras e/ou camadas musculares. E,
nestes, é possível visualizar a penetração de vasos através da falha
muscular. Esta localização é a mais comumente afetada pelos
divertículos de pulsão e, de modo quase obrigatório, também se faz
necessário que a pressão intraluminal seja elevada, para o seu
desenvolvimento. Percebam que ocorre uma herniação da mucosa
e submucosa e, portanto, formam-se pequenos sáculos que são
conhecidos por divertículos. Tal como é demonstrado na
representação, por vezes, os divertículos podem apresentar em seu
interior um conteúdo fecal (como um fecalito) e, provavelmente,
ocorrerá o desenvolvimento do processo inflamatório do divertículo,
conhecido por diverticulite.

EPIDEMIOLOGIA
A prevalência da doença diverticular é elevada em populações de países industrializados, com cifras de
incidência de 50% na população ocidental. Nos países asiáticos, a sua incidência passa a ser mínima e, partindo-se
deste dado estatístico, podemos sobressaltar a importância da dieta na gênese da doença.

170
Arlindo Ugulino Netto – CIRURGIA ABDOMINAL– MEDICINA P7 – 2010.2

A doença diverticular do cólon (DDC) é uma patologia comum e frequente em pacientes idosos, atingindo a
marca estatística de 65% de acometimento de indivíduos acima de 80 anos. Já nos adultos, a sua incidência não é
frequente, atingindo cerca de 10% da população adulta com 40 anos de idade. Na população geral, a quantidade de
idosos está superando a de adultos, jovens e crianças e, por conta disto, podemos ainda definir que a DDC é uma
doença frequente na população, não levando em conta vieses estatísticos, tais como: idade, sexo, doenças mórbidas,
etc.

ETIOPATOGENIA E FISIOPATOLOGIA
Conforme foi descrito em outros Capítulos, a etiopatogenia diz respeito ao estudo das causas que desencadeiam
um mecanismo fisiopatológico da doença. Três fatores podem definir a etiopatogenia da DDC:
 Defeitos na parede colônica, em locais onde os vasos penetram na musculatura;
 Pressão intraluminal alta;
 Deficiência de fibras na dieta.

Um aumento da pressão intracolônica força a camada mucosa e submucosa do cólon, promovendo a sua
herniação através de pequenas fendas na camada muscular, por onde penetram as artérias. Uma dieta pobre em fibras
vegetais é o principal fator de risco para desenvolver os divertículos. A paucidade de fibras aumenta a pressão
intracolônica, por reduzir o volume do bolo fecal. Com um lúmen menor, as paredes colônicas podem se tocar em alguns
pontos, criando compartimentos de alta pressão durante os movimentos de peristalse (o fenômeno da segmentação).
Uma dieta rica em fibras, por outro lado, reduz a incidência desta patologia.
O sigmóide é a região de menor calibre do cólon e, pela lei de Laplace (Pressão = k . Tensão/Raio), é o
segmento de maior pressão intraluminal (enquanto que o ceco é o de maior tensão na parede). O sigmóide, portanto, é a
região mais acometida do intestino (95% dos casos) e, em menor frequência, no cólon direito.

Na imagem ao lado, podemos evidenciar os vasos arteriais atravessando a parede


intestinal nos locais de falha anatômica das fibras musculares. A partir dos defeitos
da parede colônica, ocorre uma herniação da mucosa e submucosa da espessura
mural do cólon, atribuída, principalmente, por conta do aumento da pressão
intraluminal. Podemos ainda visualizar que, o divertículo formado em C possui uma
espessura muito fina e, por conta disto, sua perfuração é algo rotineiro nos
pacientes com DDC.

QUADRO CL…NICO
O quadro clínico é assintomático na maioria das vezes (em 80% dos casos). Em 20% dos casos, sintomas
gastrointestinais podem estar presentes: dor abdominal, diarreia e constipação.
O quadro clínico, ainda que nos sintomáticos, não define a DDC, pois, a maioria dos pacientes com esta
entidade nosológica também apresenta distúrbios de motilidade (dismotilidade) colônica associados, com sintomatologia
semelhante à descrita anteriormente. Geralmente, os sintomas das complicações são específicos para a DDC e,
portanto, são os que definem, clinicamente, a doença. Dentre as complicações, as mais frequentes são: sangramento
digestivo baixo (evacuação com sangue) e Diverticulite. Os sintomas de alarme são: sangramento, mudança no hábito
intestinal, emagrecimento e anemia.

EXAMES COMPLEMENTARES
A DDC não é passível de diagnóstico, puramente, clínico. Os exames complementares são requisitos
obrigatórios para o seu diagnóstico. Na literatura, ainda não é descrito o exame padrão-ouro para o diagnóstico da DDC
e, por conta disto, tanto o enema opaco quanto a colonoscopia podem ser requisitados para a confirmação do
diagnóstico.
 Enema opaco: O enema opaco é um artifício de diagnóstico que representa, amiúde, radiografia do cólon com
duplo contraste (ar e bário). É o mais indicado nas ocasiões de check up, principalmente, em indivíduos jovens.

171
Arlindo Ugulino Netto – CIRURGIA ABDOMINAL– MEDICINA P7 – 2010.2

 Colonoscopia: Endoscopia digestiva do cólon. É indicado, principalmente, nas suspeitas de DDC em


indivíduos idosos, pois também possibilita o diagnóstico diferencial com câncer de intestino.

Na imagem, podemos visualizar a DDC de todo o cólon (sigmoide, transverso,


parte do cólon direito). Em cada área com radioopacidade de formato circular,
próximo à parede intestinal, representa divertículos intestinais.

Na imagem, podemos visualizar a presença de divertículos no cólon


esquerdo, na forma de projeções saculares preenchidas por contraste. Em
pacientes jovens (abaixo de 40 anos), a doença é limitada ao cólon esquerdo
e, distintamente, nos pacientes idosos, a distribuição da DDC é mais difusa
(acometendo vários segmentos intestinais).

A colonoscopia é um artifício de diagnóstico que possibilita a visualização


dos divertículos pela visão interna. Percebam algumas falhas da mucosa,
que correspondem ao local dos divertículos. Apesar de ser um exame
importante para o diagnóstico de DDC, o examinador deve ter muita cautela
na sua procedência, pois, eventualmente, podem ocorrer perfurações por
iatrogenia.

TRATAMENTO _____
O tratamento é conservador, orientando-se ao paciente quanto à importância da ingestão de fibras (medidas
dietéticas) e, eventualmente, tratamento sintomático (tais como, analgésicos, laxantes, dentre outros).
O tratamento cirúrgico somente é indicado nas complicações e, quando realmente for necessária. Na maioria
das vezes, a exploração cirúrgica não é necessária para a terapêutica das complicações, sendo restrita à minoria dos
casos.

172
Arlindo Ugulino Netto – CIRURGIA ABDOMINAL– MEDICINA P7 – 2010.2

MED RESUMOS 2012


CORREIA, Luiz Gustavo; NETTO, Arlindo Ugulino.
CIRURGIA ABDOMINAL

DIVERTICULITE
(Professor Felipe Rocha)

A diverticulite é conceituada como sendo uma infecção com inflamação, geralmente, de, pelo menos, um Œnico
divertículo no cólon. Conforme foi visto no Capítulo anterior, o divertículo é um sáculo com paredes finas. E, por conta
disto, eventualmente, podem ocorrer complicações da Diverticulite, delas, as mais importantes são: peridiverticulite e
abscesso:
 Perid iverticulite: Ocorre quando há perfuração puntiforme do divertículo com infecção na parede do cólon ou
tecido peridiverticular (ao redor do divertículo).
 Abscesso peridiverticular: Coleção de pus ao redor do divertículo perfurado. A Peridiverticulite e o abscesso
peridiverticular são complicações que podem ser tratados em regime conservador, pois, o organismo já fez o
papel terapêutico.
 Peritonite generalizada: Macroperfuração do divertículo com contaminação fecal da cavidade peritoneal.
Obviamente, esta complicação pode evoluir para uma peritonite infecciosa, requerendo uma terapêutica mais
aguda e radical (cirúrgica). O diagnóstico de peritonite generalizada é puramente clínico. Sobressai a dor
abdominal difusa, defesa involuntária em todo abdome, hipersensibilidade difusa generalizada.
 Fístula Colovesical : Partindo-se do princípio que a fístula é uma comunicação anômala entre dois territórios que
antes, não se comunicavam, a fístula colovesical é a comunicação anômala entre a bexiga e o intestino grosso.
Nesta situação, a bexiga, por sua relação anatômica, passa a ser acometida juntamente ao intestino grosso e,
com isto, ocorre uma ponte inflamatória entre ambos. Desta forma, o paciente apresenta pneumatúria (presença
de gases ao urinar) e/ou fecalúria (eliminação de urina com fezes). Muito provavelmente, caso o paciente não seja
tratado adequadamente (por cirurgia), poderá evoluir para uma sepse urinária e, eventualmente, o óbito.

M ANIFESTA•‚ES C L…NICAS
O quadro clínico da Diverticulite aguda é semelhante ao da apendicite aguda, porém, de localização contrária, no
quadrante inferior esquerdo. A principal queixa é a dor abdominal contínua ou espasmódica no QIE, podendo ser
acompanhada de febre, constipação ou diarréia.
No exame físico, durante a palpação superficial, o paciente se queixa de hipersensibilidade no QIE e, durante a
palpação profunda, pode-se notar uma massa palpável no QIE (plastrão, que é dada pelo acúmulo de epíplon e material
inflamatório).
1
OBS : A obstrução intestinal também pode ser uma manifestação clínica da Diverticulite. De tamanha verdade, alguns
pacientes somente apresentam abdome agudo obstrutivo como manifestação inicial da inflamação diverticular. Por isto,
se faz necessário o diagnóstico diferencial com câncer de intestino grosso.

D IAGN†STICO
Os sinais e sintomas que ocorrem na diverticulite somente sugerem o diagnóstico. Sua confirmação depende,
indubitavelmente, da realização de exames propedêuticos (Tomografia Computadorizada e/ou USG).

TOMOGRAFIA COMPUTADORIZADA (TC)


A TC de abdome é o exame considerado padrão-ouro para o diagnóstico de Diverticulite. Deve ser realizado com
a utilização de contraste retal, para sensibilizar o exame, demonstrando uma falha de enchimento. Pela TC, também
podemos avaliar a presença de complicações da Diverticulite. O abscesso peridiverticular transparece como sendo uma
imagem com nível hidroaéreo.
2
OBS : A colonoscopia deve ser evitada na crise de Diverticulite. A utilização do
colonoscópio é algo proscrito, pois, a própria manipulação intestinal e ar
injetado durante o exame pode induzir uma série de complicações ao paciente.

ULTRASSONOGRAFIA
Apesar de não ser considerada como padrão-ouro, a ultrassonografia
(USG) pode ser utilizada para a avaliação das alças intestinais. É um exame
pouco específico e de baixa sensibilidade. Na imagem ao lado, evidenciamos
um borramento do intestino, compatível com a presença de divertículos.

173
Arlindo Ugulino Netto – CIRURGIA ABDOMINAL– MEDICINA P7 – 2010.2

TRATAMENTO
A diverticulite, diferentemente da DDC, requer uma terapia efetiva. Contudo, na maioria dos casos, a terapia
conservadora é o tratamento de escolha, inicialmente. Somente 25% dos pacientes com Diverticulite necessitam de
terapêutica cirúrgica.

TRATAMENTO CONSERVADOR
O tratamento conservador deve ser o manejo inicial do paciente com Diverticulite. É o tratamento mais utilizado,
com taxa de remissão dos sintomas em 3 a 4 dias após inicio da terapia. Este deve constar dos seguintes passos:
 Hidratação venosa
 Internação hospitalar: No pronto-atendimento, é prudente que se indique a internação hospitalar.
 Antibióticos de largo espectro (que cubra Gram-negativos e anaeróbios)
 Dieta pobre em fibras (diferentemente da diverticulose, a utilização de fibras piora os sintomas, além de
estimular o processo inflamatório por estimular a peristalse).

TRATAMENTO CIRÚRGICO
A cirurgia é utilizada em 25% dos casos. Apresenta as seguintes indicações:
 Peritonite generalizada
 Falha do tratamento clínico conservador (3-4 dias), que é a principal indicação cirúrgica.
 Diverticulite de repetição, que ocorre, principalmente, em pacientes jovens. Nesta ocasião, uma segunda
Diverticulite já é um fator que indique a cirurgia, pois, caso não seja corrigida, outra inflamação do divertículo
pode gerar a peritonite generalizada. Alguns autores consideram apenas a partir do terceiro episódio.
 Abscesso Peridiverticular: No caso de abscesso peridiverticular, a conduta inicial deve ser a drenagem
percutânea guiada por TC ou USG (obviamente, se o serviço hospitalar dispuser desta técnica). Em casos de
hospitais que não dispõem da drenagem percutânea, a terapia passa a ser cirúrgica diretamente.
 Drenagem Percutânea por TC ou USG: Caso o paciente melhore, somente se faz este procedimento,
não requerendo a cirurgia. Ou seja, esta é a situação do paciente que não deve somente ser submetido
ao tratamento conservador, pois, a presença do abscesso impede a remissão dos sintomas.
 Cirurgia: É a terapia escolhida para o abscesso peridiverticular nas situações em que o serviço não
dispõe de drenagem percutânea. É válido lembrar que a terapêutica cirúrgica é dotada somente da
drenagem, não realizando a construção intestinal, pois, o pus poderia espalhar sobre o peritônio.
 Fístula Colovesical (ponte inflamatória entre o intestino e a bexiga)

Para o tratamento cirúrgico, a videolaparoscopia é a via de escolha. É contraindicada em duas situações: (1)
caso o serviço não tenha experiência em cirurgia por vídeo e/ou (2) paciente se apresenta com instabilidade
hemodinâmica (PA: 80x40 mmHg; FC: 140bmp). Durante a abordagem vídeolaparoscópica, introduz-se certa quantidade
2
de CO e, com isto, existe um risco elevado de arritmias e parada cardiorrespiratória na mesa cirúrgica (pela
instabilidade hemodinâmica promovida pelo pneumoperitônio).
Para a maioria dos casos, a retossigmoidectomia com anastomose primária é a conduta de eleição. Nas
ocasiões em que não se possa proceder da reconstrução primária, deve-se intervir cirurgicamente através da
retossigmoidectomia com fechamento do coto retal e colostomia (cirurgia de Hartmann). Explica-se esta mudança
terapêutica nas seguintes condições, em que se tem acúmulo de material bacteriano na cavidade peritoneal (que
influencia na cicatrização).
 Peritonite difusa
 Diverticulite perfurada com peritonite
 Abscesso Peridiverticular

Retossigmoidectomia com anastomose primária


Consiste na retirada do sigmoide seguida da anastomose
entre o coto proximal e o reto. Suas indicações são:
 Diverticulite de repetição
 Diverticulite com falha na terapia conservadora
 Ausência de peritonite difusa, diverticulite
perfurada ou abscesso peridiverticular.

174
Arlindo Ugulino Netto – CIRURGIA ABDOMINAL– MEDICINA P7 – 2010.2

Retossigmoidectomia com fechamento do coto retal e colostomia (cirurgia de Hartmann)


É uma cirurgia feita em dois
tempos. Procede-se, inicialmente, da
cirurgia de Hartmann por
videolaparoscopia, de modo que o paciente
passa a apresentar uma colostomia no
quadrante inferior esquerdo e, após um
período curto de tempo (2 a 3 meses),
procede-se da reconstrução intestinal com
anastomose primária. Suas indicações são:
 Peritonite difusa
 Diverticulite perfurada com
peritonite
 Abscesso peridiverticular

PROGN†STICO
A mortalidade é baixa, ocorrendo em 5% dos casos, principalmente, em pacientes jovens. Geralmente, a
presença de comorbidades associadas (diabetes mellitus, doenças cardiopulmonares, imunodepressão) induz ao
aumento dos índices de mortalidade. Caso a diverticulite não seja trada de modo adequado, ou seja, quando o médico
prescreve cefalotina (não cobre gram-negativos e anaeróbios) ou, até mesmo, induz a dieta normal pode ocorrer uma
piora dos sintomas e o óbito.

175
Arlindo Ugulino Netto – CIRURGIA ABDOMINAL– MEDICINA P7 – 2010.2

MED RESUMOS 2012


NETTO, Arlindo Ugulino; ELOY, Yuri Leite.
CIRURGIA ABDOMINAL _________

DOENÇA HEMORROIDÁRIA
(Professor Felipe Rocha)

“Hemorroidas”, na realidade, n•o ‚ um termo que


define uma doen€a, mas sim, tecidos normais que existem
na regi•o anorretal. Por defini€•o, as hemorroidas s•o coxins
de tecido conjuntivo e vascular que fazem parte da anatomia
normal do reto e canal anal. Tais estruturas exercem uma
funۥo fundamental: proporcionar um amortecimento contra
o traumatismo causado pelas fezes durante a evacuaۥo.
Esta funۥo desempenhada por esses tecidos vasculares e
conjuntivos ocorre devido ao ingurgitamento sangu„neo dos
vasos, formando os coxins e diminuindo o trauma provocado
fezes durante o ato evacuat‡rio.
As hemorroidas podem ser divididas em dois
componentes, levando em consideraۥo sua origem
anatŒmica e localiza€•o com rela€•o ‹ linha pect„nea (linha
de transi€•o entre o epit‚lio da pele da regi•o anal e o
epit‚lio do canal anal, sendo revestida, portanto, por um
epit‚lio transicional). Assim temos:
 Hemorroidas internas: constituem o chamado plexo hemorroid†rio interno, formado por ramos da art‚ria il„aca
interna. Est•o localizadas acima da linha pect„nea e s•o revestidas com mucosa retal ou transicional.
 Hemorroidas externas: constituem o plexo hemorroid†rio externo, que se origina da art‚ria pudenda externa,
ramo da art‚ria il„aca externa. ˆ localizado abaixo da linha pect„nea sendo formado pelo epit‚lio do anoderma
(epit‚lio dessa regi•o ‚ pr‡prio da regi•o anal), ricamente inervado.
1
OBS : De acordo com o que foi discutido at‚ agora, podemos dizer que o termo hemorr‡ida n•o pode ser considerado
como uma doen€a, j† que faz parte da fisiologia normal do canal anal. Portanto, as patologias relacionadas com as
hemorroidas devem ser denominadas de doenças hemorroidárias, seja ela interna ou externa.

ETIOPATOGENIA
Uma das principais causas de doen€a hemorroid†ria interna est† relacionada principalmente ao esfor€o
evacuat‡rio crŒnico, condi€•o caracter„stica da mulher idosa, por exemplo. Apesar disso, nem sempre o esfor€o
evacuat‡rio crŒnico (que por sua vez, ‚ o principal fator etiopatogƒnico quando considera a popula€•o como um todo)
estar† presente como elemento etiopatogƒnico. Como por exemplo, podemos citar pacientes jovens do sexo masculino,
cuja causa principal da doen€a hemorroid†ria pode ser uma press•o de repouso aumentada dentro do canal anal, tendo
como fator causal exerc„cio perineal (ciclismo ou esportes que fazem com que o indiv„duo permane€a muito tempo
sentado, aumentando a press•o de repouso).
2
OBS : Diferentemente da doen€a hemorroid†ria interna, nas patologias que envolvem as hemorroidas externas n•o se
identificam fatores precipitantes ou desencadeantes. De fato, a constipa€•o crŒnica ‚ um fator
desencadeante/precipitante da doen€a hemorroid†ria interna, pelo esfor€o evacuat‡rio crŒnico. Contudo, o mesmo n•o
pode ser dito para a doen€a hemorroid†ria externa, cujos fatores etiopatogƒnicos n•o s•o conhecidos ou bem
notificados.

FISIOPATOLOGIA
Na fisiopatologia da doen€a hemorroid†ria interna ‚ preciso que, al‚m do ingurgitamento sangu„neo (que
representa nada mais que a fun€•o normal das hemorroidas), esse ingurgitamento se torne crŒnico e esteja associado a
uma perda de sustenta€•o, isto ‚, flacidez do tecido conectivo que fixa os coxins vasculares que est•o dispostos e
mantidos em posi€•o anatŒmica normal. Com isso, esses coxins vasculares perdem o suporte conjuntivo e a doen€a
hemorroid†ria se manifesta, ocorrendo assim os sinais e sintomas da doen€a.
Com rela€•o ‹ fisiopatologia da doen€a hemorroid†ria externa, podemos destacar, principalmente, a forma€•o
de trombos. Com isso, a depender se a doen€a hemorroid†ria for interna ou externa, ambas diferem quanto ‹
etiopatogenia e fisiopatologia.

176
Arlindo Ugulino Netto – CIRURGIA ABDOMINAL– MEDICINA P7 – 2010.2

A doen€a hemorroid†ria ainda pode ser classificada,


anatomicamente (nesta classificaۥo, pode-se usar o termo
“hemorroida”) em:
 Doença Hemorroidária Interna (hemorróida interna): acomete
as hemorroidas internas (acima da linha pect„nea). ˆ a mais
comum.
 Doença Hemorroidária Externa (hemorroida externa):
acomete as hemorroidas externas (abaixo da linha pect„nea).
N•o necessita de fator predisponente (at‚ porque ainda ‚
incerto) e, geralmente, aparece como uma complicaۥo da
doen€a hemorroid†ria.
 Doença Hemorroida Mista: interna e externa.

QUADRO CL…NICO
Considerando a doen€a hemorroid†ria como sendo uma patologia em que ocorre uma fragiliza€•o do tecido de
sustenta€•o do plexo hemorroid†rio que, por sua vez, se encontra cronicamente ingurgitada, podemos dizer que
clinicamente se manifesta como varizes anais. Essas varizes, no entanto, sofrer•o um trauma constante devido ‹
passagem das fezes. Com isso, tomando como base essas altera€‰es os principais sintomas associados ‹ doen€a
hemorroid†ria, temos:
 Sangramento: ocorre justamente devido ao trauma do bolo fecal sobre o vaso ingurgitado (varizes), sendo este
o principal sintoma. Esse sangramento se manifesta como vermelho-vivo, identificando que o sangramento est†
ocorrendo na por€•o final do canal anal (sangramento de sa„da). Estes pacientes referem presen€a de sangue
nas vestes „ntimas, durante a higieniza€•o anal ou gotejando no vaso durante o ato evacuat‡rio. Essa
3
caracteriza€•o ‚ importante para sua diferencia€•o com rela€•o ao sangramento do c…ncer de reto (ver OBS ).
 Descarga Mucosa: ocorre quando a doen€a hemorroid†ria passa a secretar muco, e sua simples presen€a na
regi•o perianal pode causar prurido.
 Complicações da doença hemorroidária: a doen€a hemorroid†ria pode se manifestar clinicamente atrav‚s de
uma complicaۥo.
 Prolapso: ‚ a exterioriza€•o do “mamilo hemorroid†rio” atrav‚s do …nus (durante o esfor€o evacuat‡rio). Tal
manifesta€•o ‚ caracter„stica da doença hemorroidária interna, variando em graus, a depender da
apresenta€•o e intensidade do prolapso. Essa classifica€•o ‚ feita durante o exame proctol‡gico.
o 1º Grau: ausƒncia de prolapso durante o esfor€o evacuat‡rio.
o 2º Grau: prolapso com redu€•o espont…nea, sem necessidade de redu€•o manual.
o 3º Grau: prolapso requer redu€•o manual;
o 4º Grau: prolapso encarcerado, imposs„vel a redu€•o manual, pois j† est† permanentemente para fora.
3
OBS : O sangramento decorrente da obstru€•o tumoral do c‡lon ‚ semiologicamente diferente do sangramento causado
pela doen€a orificial (doen€a hemorroid†ria e fissura anal). Ambas as situa€‰es podem caracteriza-se por sangue
vemelho-vivo. Contudo, na doen€a orificial, o paciente refere que as primeiras fezes aparecem normais (sem sangue) e,
ao final da evacua€•o, aparece o sangramento. J† na doen€a obstrutiva do c‡lon por tumor, o sangue (geralmente, em
pouca quantidade) vem misturado com as fezes.
4
OBS : A gradua€•o do prolapso (para as hemorroidas internas) ‚ de extrema import…ncia, pois ‚ ela que vai nortear a
indica€•o do tratamento cirŠrgico e ainda indicar a melhor conduta terapƒutica para esse paciente.
5
OBS : Note que, na sintomatologia cl†ssica da doen€a hemorroid†ria, n•o h† dor. Isso ocorre porque, habitualmente, a
doen€a hemorroid†ria n•o causa dor; no m†ximo, pode provocar um incŒmodo. Quando a doen€a hemorroid†ria est†
associada ‹ dor, em cerca de 70% dos casos, diz-se que ela apresenta uma complica€•o em desenvolvimento
(trombose hemorroid†ria).

DIAGN†STICO

CLÍNICO
O diagn‡stico da doen€a hemorroid†ria ‚ feito eminentemente pela avalia€•o cl„nica, n•o necessitando de
exames mais complexos. Ou seja, o diagn‡stico deve levar em considera€•o o quadro cl„nico apresentado pela paciente
e o exame proctol‡gico. O exame proctol‡gico est† dividido nas seguintes etapas:
 Inspeção: pode-se observar a presen€a da doen€a hemorroid†ria externa que, na maioria das vezes, j† se
apresenta com complica€‰es, e o prolapso hemorroid†rio. O prolapso pode ser visto quando ‚ solicitado ao
paciente para realizar esfor€o evacuat‡rio, podendo apresenta exterioriza€•o do mamilo hemorroid†rio.
 Anuscopia: ‚ a vis•o do canal anal atrav‚s de um aparelho espec„fico para este fim. Quando visualiza o canal
anal, podem-se visualizar os mamilos hemorroid†rios internos e o prolapso mucoso (mucosa que perdeu a
sustentaۥo).
177
Arlindo Ugulino Netto – CIRURGIA ABDOMINAL– MEDICINA P7 – 2010.2

DIAGNÓSTICO DIFERENCIAL
A doen€a hemorroid†ria ‚ uma das causas mais comuns de sangramento anal, devendo sempre ser levada em
considera€•o em pacientes cuja principal queixa ‚ o sangramento pelo anus. Apesar disso, existem outras situa€‰es e
entidades nosol‡gicas que podem cursar com tal achado cl„nico, devendo ser feito o diagn‡stico diferencial, para que
n•o ocorra iatrogenias. As principais doen€as que deve ser feito diagn‡stico diferencial s•o:
 Doen€a intestinal inflamat‡ria;  Doen€a diverticular;
 C…ncer colorretal: nesses casos a doen€a  “lcera retal;
hemorroid†ria pode se apresentar como uma  Fissura anal;
3
manifesta€•o cl„nica do c…ncer (ver OBS ).  Prolapso retal.
 P‡lipos adenomatosos de reto: les‰es benignas
do reto
6
OBS : Por isso, todos os pacientes com queixas de sangramento anal devem ser submetidos a um minucioso exame
proctol‡gico, podendo atrav‚s deste diferenciar a doen€a hemorroid†ria dos dois principais diagn‡sticos diferenciais:
c…ncer de colorretal e p‡lipos adenomatosos.

TRATAMENTO
Para o estabelecimento de uma terapƒutica adequada para os pacientes portadores da doen€a hemorroid†ria, ‚
necess†rio avaliar diversos crit‚rios, inclusive o risco-benef„cio desses pacientes. Com isso, antes do tratamento dessa
entidade nosol‡gica devemos sempre lembrar:
 Grau dos sintomas e do prolapso: a doen€a hemorroid†ria em alguns pacientes n•o traz nenhum preju„zo ou
incomodo a sua vida social e profissional e, com isso, teoricamente n•o necessita de tratamento. Mas, se esses
sintomas causam alterações de qualidade de vida, o pr‡prio paciente solicita resolu€•o da sua doen€a.
 Resposta ao tratamento conservador: como toda doen€a benigna que o tratamento pode ser cl„nico; claro que
ter† como par…metro uma resposta ao tratamento conservador.
 Associação com outras afecções anorretais: o paciente pode ter unicamente a doen€a hemorroid†ria, ou
ainda, por exemplo, ser portador da doen€a hemorroid†ria associada a uma fistula perianal (cujo tratamento ‚
eminentemente cirŠrgico).

Assim as op€‰es terapƒuticas para a doen€a hemorroid†ria podem ser basicamente trƒs, levando em
considera€•o os par…metros citados acima:
 Conservador: em cerca de 80 – 90% dos casos o tratamento ‚ conservador. A doen€a hemorroid†ria pode ser
tratada conservadoramente corrigindo-se o h†bito intestinal, orientando o paciente para adotar medidas
diet‚ticas suficientes para que o coxim hemorroid†rio se recupere, ou seja, reduzindo sua flacidez.
 Não-Cirúrgico: consiste na coloca€•o de uma ligadura el†stica
 Cirúrgico: est† baseado na hemorroidectomia.

CONSERVADOR
O tratamento conservador desses pacientes est† baseado em medidas diet‚ticas sobre orienta€‰es m‚dicas,
sendo estas medidas suficientes para a resolu€•o da maioria dos casos de doen€a hemorroid†ria interna de 1 e 2˜ grau.
Essas medidas est•o baseadas na elimina€•o de alimentos constipantes e ingest•o de alimentos laxativos (ou
seja, trabalhar o h†bito intestinal). Al‚m disso, priorizar ingest•o aumentada de l„quidos para favorecer o h†bito intestinal
e diminuir aquele esfor€o evacuat‡rio crŒnico.
Outra medida importante ‚ o est„mulo aos exerc„cios (caminhar) que v•o diminuir o tempo do ato evacuat‡rio.
Al‚m disso, deve-se evitar permanecer sentado no vaso por tempo prolongado, pois tal h†bito pode causar uma press•o
maior na regi•o dos vasos da bacia e contribui para o ingurgitamento venoso, o que tende a piorar a doen€a
hemorroid†ria.

NÃO-CIRÚRGICO
Nos pacientes portadores de doen€a hemorroid†ria de 2˜ grau, em que os sintomas – sangramentos e prolapso
– est•o interferindo na qualidade de vida do paciente, uma alternativa ao tratamento conservador, ‚ a realiza€•o da
ligadura el†stica. Pode tamb‚m ser o tratamento para o 3˜ grau, por‚m n•o ‚ a melhor indica€•o, sendo a melhor
indica€•o o procedimento cirŠrgico.
A ligadura elástica consiste no grampeamento das hemorroidas (coxins vasculares doentes), ou seja,
apreendidas 1-2 cm acima da linha pect„nea e trazidas para dentro do aparelho de ligadura el†stica (que faz parte do
material de exame do consult‡rio). A seguir s•o ligadas com anel de el†stico na base da hemorr‡ida. O anel prende e
gera uma necrose da doen€a hemorroid†ria por isquemia e, posteriormente, o paciente vai eliminar atrav‚s das fezes.

178
Arlindo Ugulino Netto – CIRURGIA ABDOMINAL– MEDICINA P7 – 2010.2

Dessa forma o tratamento est† baseado na necrose do mamilo hemorroid†rio que est† causando sangramento.
O tecido hemorroid†rio sofre necrose e queda com 7 - 10 dias, com cicatriza€•o e fixa€•o do tecido conectivo
(mecanismo de funcionamento da ligadura el†stica).
A principal complica€•o da ligadura el†stica ‚ a dor. Caso o anel seja colocado em uma doen€a hemorroid†ria
externa, ou em posi€•o que seja abaixo da linha pect„nea, cujo epit‚lio de revestimento ‚ muito inervado, o paciente
pode referir dor intensa naquela regi•o.
7
OBS : Em resumo, sobre o que foi discutido at‚ o momento sobre o tratamento da doen€a hemorroid†ria, temos: o
tratamento de escolha para os graus 1 e 2 ‚ o conservador. Uma alternativa para esse tratamento, nos casos de falha
ou intensifica€•o dos sintomas de modo que interfira na qualidade de vida do paciente, ‚ o tratamento com ligadura
elástica (a cirurgia n•o constitui alternativa para pacientes com estes graus). J† com rela€•o ao 3˜ grau, a melhor
escolha ‚ o tratamento cirŠrgico, entretanto, caso este n•o possa ser realizado (recusa do paciente, principalmente)
pode ser feita a ligadura el†stica. Contudo, para estes pacientes os pacientes com grau 3 ou 4, a melhor op€•o ‚
cirúrgica. Por isso, essa terapƒutica ‚ sempre de segunda escolha quando se leva em considera€•o doen€a
hemorroid†ria de 3˜ grau.

TRATAMENTO CIRÚRGICO
O tratamento cirŠrgico nesses casos est† baseado na hemorroidectomia, ou seja, excis•o do tecido
hemorroid†rio e fixa€•o da mucosa anorretal. Percebe-se que todas as formas de tratamento, seja n•o-cirŠrgico
(ligadura el†stica) ou cirŠrgico, envolvem a fixa€•o da mucosa anorretal, pois, ‚ essa mucosa que, quando fixada, vai
evitar que ocorra o prolapso, prevenindo assim os sangramentos da doen€a hemorroid†ria.
As principais indicações do tratamento cirŠrgico s•o as hemorroidas internas de 3˜ e 4˜ grau, doen€a
hemorroid†ria mista, ou quando existir uma trombose hemorroid†ria controlada clinicamente requerendo interven€•o de
urgƒncia.

Técnicas Cirúrgicas.
 Técnica de Milligan-Morgan: ‚ feita por via aberta, sendo esta a t‚cnica a mais realizada em todo mundo. Nela
o cirurgi•o opera e deixa uma ferida, que vai cicatrizar em torno de duas semanas. Apesar de apresentar mais
desconforto, tem um menor risco de complica€•o, sendo uma boa op€•o terapƒutica para pacientes nos graus 3
e 4.
 Técnica de Fergunson: t‚cnica fechada.
 Anopexia mecânica: tratamento cirŠrgico mais recente (cinco anos), por‚m, com „ndice de aceita€•o
satisfat‡rio. Consiste no tratamento da doen€a hemorroid†ria sem ressec€•o do tecido hemorroid†rio. Para a
realiza€•o desta t‚cnica, utiliza-se um grampeador. O grampeador ‚ colocado no interior do canal anal atrav‚s
de uma sutura circular, depois disso, se faz um disparo, e o grampo vai reposicionar a mucosa retal prolapsada.
Pode tratar a doen€a hemorroid†ria de 2˜, 3˜ e 4˜ graus (doen€as hemorroid†rias em que h† prolapso). Contudo,
a melhor indica€•o para essa t‚cnica ‚ a doen€a hemorroid†ria de 3˜ grau, pois a de 2˜ grau pode ser tratada
com sucesso pela ligadura el†stica – que n•o ‚ um procedimento cirŠrgico, trazendo maior conforto ao paciente
– e na de 4˜ grau, o prolapso ‚ t•o acentuado que esse tratamento n•o ‚ t•o eficiente, de modo que, a cirurgia
permanece sendo a melhor opۥo.
8
OBS : Quem escolhe a op€•o terapƒutica entre a anopexia mec…nica e a cirurgia (hemorroidectomia) ‚ o paciente, pois,
a anopexia n•o causa dor no p‡s-operat‡rio, ‚ menos invasivo, menos agressivo, tendo um retorno ‹s atividades di†rias
mais precocemente. Al‚m disso, a anopexia mec…nica ‚ o tratamento da doen€a hemorroid†ria sem ressec€•o do tecido
hemorroid†rio, sendo esta uma caracter„stica diferencial importante, j† que, tanto na ligadura el†stica quanto na cirurgia
o tecido hemorroid†rio ‚ removido, enquanto que na Anopexia ocorre somente reposicionamento da mucosa retal
prolapsada. Esse reposicionamento interrompe o fluxo sangu„neo de retorno ao plexo hemorroid†rio, e com isso, o plexo
hemorroid†rio vai deixar de existir, uma vez que, ela depende da estase venosa para manifestar a doen€a. Por‚m, tem
algumas complica€‰es como: infec€•o, acidente na coloca€•o do grampeador – por isso o cirurgi•o deve ter uma
experiƒncia pr‚via nesse tipo de procedimento.
9
OBS : Para a doen€a hemorroid†ria externa, o tratamento de escolha ‚ o conservador. Isso ocorre, pois, na forma
externa, dificilmente o paciente desenvolve sintomas, e quando apresenta, ‚ decorrente de alguma complica€•o.

C OMPLICA•‚ES

TROMBOSE HEMORROIDÁRIA
Consiste no prolapso hemorroid†rio com trombose e edema, ou seja, no interior do mamilo hemorroid†rio
prolapsado ocorreu uma trombose (coagulo endurecido), edema e processo inflamat‡rio. Nesses casos o principal
sintoma do paciente ‚ a dor, devido ao intenso processo inflamat‡rio que ocorre nessa regi•o. ˆ uma situa€•o de
urgƒncia devido ‹ dor apresentada por esses pacientes. Na trombose hemorroid†ria externa, ocorre a forma€•o de
trombo no mamilo hemorroid†rio externo.
179
Arlindo Ugulino Netto – CIRURGIA ABDOMINAL– MEDICINA P7 – 2010.2

Quadro clínico.
O principal sintoma, como foi dito, ‚ a dor anal intensa e aguda
regi•o perianal. No exame f„sico podemos visualizar mamilo
hemorroid†rio prolapsado e trombosado com intenso edema local, caso
seja uma trombose hemorroid†ria interna.
Nos casos de trombose hemorroid†ria externa podemos
visualizar um n‡dulo em regi•o perianal doloroso com trombo local. Com
isso, na trombose hemorroid†ria externa n•o h† prolapso, j† que, a
doen€a ‚ externa. J† na doen€a hemorroid†ria interna, h† o prolapso
irredut„vel e forma-se o trombo acompanhado do processo inflamat‡rio.
Dessa forma, conclui-se que, s‡ haver† trombose hemorroid†ria interna,
se houver prolapso do mamilo hemorroid†rio, ou seja, doen€a de 2˜, 3˜ e
4˜ grau.

Tratamento.
 Trombose hemorroidária interna
Devido ‹ intensidade dos sintomas, pode-se imaginar que o paciente deveria ser submetido ‹ cirurgia de
urgƒncia. Por‚m o processo inflamat‡rio, acompanhado de dor e edema ‚ t•o intenso, que n•o h† como diferenciar o
que ‚ tecido normal ou patol‡gico. E nessas situa€‰es na tentativa de realiza€•o de um procedimento cirŠrgico, poder†
ocorrer a retirada inadvertida de excesso de tecido, deixando o paciente completamente sem mucosa anal, evoluindo
para uma estenose cicatricial de canal anal, sendo necess†ria algumas vezes cirurgia de reconstru€•o do canal anal.
Dessa forma o tratamento de escolha ‚ conservador e o tratamento cirŠrgico (hemorroidectomia) ser†
postergado. Assim, a trombose hemorroid†ria interna, consiste em uma das indica€‰es para realiza€•o de procedimento
cirŠrgico, mas n•o de emergƒncia, somente ap‡s o controle adequado do processo inflamat‡rio do paciente e redu€•o
do edema, ou seja, ap‡s o tratamento conservador.
O tratamento inicial conservador proposto para esses pacientes ‚ repouso absoluto, banho de assento,
coloca€•o de calor local na regi•o anorretal e perineal, utiliza€•o de pomadas anest‚sicas locais associadas ou n•o a
antiinflamat‡rios. Depois disso, deve ser procedido o tratamento cirŠrgico definitivo – hemorroidectomia (uma semana
depois, 10 a 15 dias ou at‚ mesmo um mƒs depois).
Apesar disso, existem situa€‰es que mesmo na admiss•o, o paciente necessita ser operado nas primeiras 24 a
48 horas. Uma dessas condi€‰es ‚ a dor intensa, n•o suportada pelo paciente, ou ainda, se nas primeiras 24 a 48 horas
o tratamento conservador n•o obteve resultados satisfat‡rios.

 Trombose hemorroidária externa


Nessa situa€•o formou-se um trombo dentro da hemorr‡ida externa. Nesse caso, o tratamento pode ser
conservador ou ainda, pela excis•o do co†gulo sob anestesia local, procedimento chamado de trombectomia - incisar o
co†gulo sobre anestesia local e fazer uma express•o local.
ˆ realizado no consult‡rio ou no pronto-socorro quando o paciente ‚ admitido na sala de urgƒncia, n•o sendo
um procedimento t•o doloroso. Nos casos tardios, em que o paciente permanece mais de 1 semana com o trombo
impacto no mamilo hemorroid†rio, o tratamento ‚ conservador. Assim a trombectomia ‚ o tratamento da urgƒncia da
trombose hemorroid†ria externa.

LINHAS GERAIS DE TRATAMENTO


Em resumo, temos:
Grau de prolapso Conduta
Hemorroida interna - 1˜ Grau Conservadora (crioterapia ou fotocoagula€•o)
Conservadora
Hemorroida interna - 2˜ Grau
2— op€•o: Ligadura el†stica
1— op€•o: Cirurgia
Hemorroida interna - 3˜ Grau
2— op€•o: Ligadura el†stica
Hemorroida interna - 4˜ Grau
Cirurgia
Doen€a hemorroid†ria mista
Doen€a hemorroid†ria externa Conservador
1— op€•o: Conservadora seguida de cirurgia
Trombose hemorroid†ria interna
2— op€•o: Cirurgia (em caso de dor intensa)
Trombose hemorroid†ria externa Trombectomia

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Arlindo Ugulino Netto – CIRURGIA ABDOMINAL– MEDICINA P7 – 2010.2

MED RESUMOS 2012


ELOY; Yuri Leite; NETTO, Arlindo Ugulino.
CIRURGIA ABDOMINAL _________

FISSURA ANAL
(Professor Felipe Rocha)

Fissura anal nada mais é que a presença de


uma ferida ou de uma úlcera na região do canal anal.
Esta úlcera pode se desenvolver de forma aguda ou
crônica. E essa diferenciação pode ser feita
clinicamente.

FISIOPATOLOGIA
Na fissura anal aguda pode-se perceber a
presença de uma úlcera rasa na margem anal
associada a um processo inflamatório com ausência de
sinais inflamatórios crônicos. Já na fissura anal crônica
a úlcera se estende da linha pectínea ao canal anal,
tendo assim um diâmetro maior. Dessa forma tanto na
fissura anal aguda, como na crônica, existem úlceras, e
o que as diferencia é o componente inflamatório e
fibrótico.

FISSURA ANAL AGUDA


A fissura anal aguda é provocada principalmente pelo traumatismo local causado pela passagem das fezes.
Além disso, temos os fatores agravantes como à constipação intestinal crônica e cirurgias anorretais prévias. Como por
exemplo, paciente com antecedente de hemorroidectomia, e no pós-operatório queixou-se de dor após a evacuação.
Com isso, provavelmente esse paciente é portador de uma fissura anal aguda, pois houve uma manipulação do canal
anal, gerando uma fissura.

FISSURA ANAL CRÔNICA


É a forma de fissura mais comum. Em sua fisiopatologia, podemos perceber a presença de hipertonia
esfincteriana. Sobre isso é importante salientar que não existe fissura anal crônica sem hipertonia esfincteriana. Essa
hipertonia provoca uma isquemia do canal anal.
O esfíncter anal interno envolve a região anorretal em sua porção mais alta, sendo de controle involuntário. Esse
músculo possui um tônus que é controlado de acordo com os mecanismos e reflexos da defecação, não tendo nenhuma
influência voluntária. Naqueles pacientes com hipertonia esfincteriana, ocorre um processo de isquemia na mucosa do
canal anal logo abaixo, pois, o músculo hipertônico dificulta o fluxo sanguíneo para o canal anal. Esse elemento é muito
importante na gênese da fissura, pois a isquemia do canal anal determina uma degeneração e atrofia da mucosa. Com
isso, haverá formação de uma úlcera que vai cicatrizar, devido a própria hipertonia.
Assim a hipertonia é o elemento fisiopatológico mais importante da fissura anal crônica que, inexiste na fissura
anal aguda.
Se existe a hipertonia que determine isquemia e formação de úlcera, será estabelecido um ciclo vicioso, de
modo que o paciente desenvolve dor anal durante a evacuação; esta dor prolonga a hipertonia esfincteriana involuntária
(sendo este um mecanismo de defesa) gerando uma isquemia do canal anal, que irá alimentar a úlcera; a úlcera faz com
que o paciente tenha dor durante o ato evacuatório, estimulando ainda mais a hipertonia e isquemia.
Por isso que a fissura anal crônica não pode ser tratada com antiinflamatório, ela necessita de uma medida que
encerre a hipertonia esfincteriana. Deste modo, a fissura anal crônica só deve ser tratada com a correção da hipertonia
esfincteriana.

QUADRO CL…NICO

SINTOMATOLOGIA
 Dor anal à evacuação: 90% dos casos a manifestação clínica do paciente é a dor anal, típica ao evacuar.
 Pode ocorrer sangramento anal: contudo não é um sinal de grande importância como constitui na doença
hemorroidária.

181
Arlindo Ugulino Netto – CIRURGIA ABDOMINAL– MEDICINA P7 – 2010.2

EXAME PROCTOLÓGICO
 Inspeção: durante a inspe€•o pode-se encontrar uma Šlcera na margem anal (posterior, anterior, lateral), mas
principalmente na linha m‚dia posterior, sendo esta a localiza€•o mais comum. Se a inspe€•o evidenciar al‚m
da Šlcera, a tr„ade cl†ssica – composta por: fissura, plicoma sentinela (pele da região perianal que sofreu
processo inflamatório com fibrose - fica uma pele exuberante) e papila hipertrófica – pode-se estabelecer
o diagn‡stico de fissura anal crŒnica. Ent•o a partir disso, compreende-se que ‚ imposs„vel estabelecer um
diagn‡stico de fissura crŒnica apenas com a anamnese, sendo necess†ria a realiza€•o do exame f„sico com os
achados descritos acima.
 Anuscopia: orif„cio interno da f„stula no canal anal.
1
OBS : O diagn‡stico proctosc‡pico de uma f„stula
interna pode ser dif„cil. ˆ muito Štil injetar uma
solu€•o com corante na abertura externa da f„stula.
Segundo a regra de Goodsall-Salmon, localiza-se a
desembocadura da fistula interna, estabelecendo
uma linha imagin†ria horizontal na altura do anus, em
que tamb‚m se encontra a sa„da externa.

DIAGN†STICO DIFERENCIAL
 Doença inflamatória intestinal (doença de Crohn, retocolite): Ambas as patologias podem cursar com fissura
anal. Entretanto diferem clinicamente, pois, ocorrem com maior frequƒncia na regi•o lateral ou anterior diferente
da fissura anal aguda e crŒnica (cuja localiza€•o mais frequente ‚ mediana posterior).
 Doenças sexualmente transmissíveis: herpes, AIDS, e mais uma s‚rie de doen€as que est•o relacionadas
com a pr†tica do sexo anal e que podem causar les•o nesta estrutura.

TRATAMENTO

FISSURA ANAL AGUDA


Em geral, o tratamento da fissura anal aguda ‚ conservador, e consiste em:
 Tratamento medicamentoso (antiinflamat‡rio)
 Banho de assento
 Repouso

FISSURA ANAL CRÔNICA

Conservador.
O tratamento conservador deve estar voltado para o relaxamento do esf„ncter anal interno. Por isso, nesses
pacientes podem-se administrar relaxantes musculares. Estes relaxantes podem ser medicamentos ou outras
subst…ncias que promovam um relaxamento da musculatura hipertŒnica que causa isquemia, Šlcera, quebrando o ciclo
vicioso.
Assim a hipertonia esfincteriana ‚ o elemento fisiopatol‡gico, propedƒutico, cl„nico e farmacol‡gico mais
importante da fissura anal crŒnica.
Pode-se tratar a hipertonia esfincteriana com Nitrato, bloqueando o canal de c†lcio e melhorando a hipertonia e
a fissura – apresenta boa resposta. A droga mais utilizada ‚ o Isordil– (t‡pico).
Outra droga para o tratamento ‚ o Diltiazem (bloqueador do canal de c†lcio), tendo uma vantagem sobre o
nitrato, que ‚ a ausƒncia da cefal‚ia como efeito colateral. Com isso, a melhor droga para o tratamento evitando efeitos
colaterais ‚ Diltiazem. Como terceira op€•o, temos a Toxina Botulínica, entretanto, ‚ um tratamento caro.
Cerca de 40 – 60% dos casos cicatrizam, ou seja, na maioria das vezes apresenta uma boa reposta ao
tratamento conservador.

Cirúrgico.
O tratamento cirŠrgico est† indicado quando o paciente n•o obteve uma resposta adequada ao tratamento
conservador (o que ‚ raro). Com isso, realiza-se a esfincterotomia interna lateral, em que se secciona o mŠsculo na
regi•o linha lateral para diminuir a continƒncia do esf„ncter, n•o tendo nenhuma rela€•o com a fissura.
182
Arlindo Ugulino Netto – CIRURGIA ABDOMINAL– MEDICINA P7 – 2010.2

MED RESUMOS 2012


CORREIA, Luiz Gustavo; NETTO, Arlindo Ugulino.
CIRURGIA ABDOMINAL

PANCREATITE AGUDA
(Professor Marcelo Gonçalves)

A pancreatite aguda é um processo inflamatório de caráter agudo, com envolvimento variável de tecidos
peripancreáticos e/ou sistemas orgânicos. Ou seja, a pancreatite aguda estende-se além do próprio pâncreas,
manifestando sinais e sintomas em órgãos extra-pancreáticos. A pancreatite crônica, geralmente, não representa uma
evolução direta da forma aguda e, o pâncreas se encontra sob a morfologia de fibrose e/ou necrose.

EPIDEMIOLOGIA
A pancreatite aguda (PA) é uma doença relativamente frequente, apresentando estatística de 1 a 5 casos para
cada 10.000 admissões nos EUA. Na maioria das vezes, o diagnóstico de pancreatite aguda é dado de maneira precoce.
Porém, em 40% das vezes, não se consegue obter o diagnóstico clínico e, portanto, o diagnóstico nestas pessoas ocorre
através de autópsias, pelo médico-legista.
No que se refere a sua evolução, a pancreatite aguda pode apresentar um espectro de comprometimento
variável, desde a forma leve, até a forma mais grave. Isto é importante, pois, a mortalidade na forma leve de pancreatite
aguda alcança os índices de 10%. Já a forma grave, quando existe necrose pancreática, apresenta mortalidade entre 20
e 40% e, nas ocasiões em que se tem contaminação do tecido pancreático, a mortalidade alcança níveis numéricos de
50%. Geralmente, o óbito do paciente com pancreatite aguda ocorre em decorrência da falência de múltiplos órgãos.

CLASSIFICA•„O
A PA pode ser classificada em forma (1) leve e (2) grave. As duas formas apresentam mecanismos distintos de
terapia, assim como o quadro clínico é mais severo na forma grave.
 PA leve: Não evolui com complicações.
 PA grave: É a forma que evolui com complicações.
o Coleção líquida aguda
o Necrose pancreática, por falta de fluxo sanguíneo
o Pseudocistos agudos
o Abscesso pancreático, que é uma evolução dos pseudocistos, onde se tem uma infecção bacteriana

A pancreatite aguda é dita grave, quando o paciente, na ocasião do atendimento, apresenta-se com insuficiência
orgânica. Além disto, também se faz importante a aplicação dos critérios de Ranson (maior ou igual a 3) e APACHE
(maior ou igual a 8).
 PAS < 90mmHg
 PaO2 < 60 mmHg
 Cr > 2 mg/dL
 Oligúria > 500mL/24h
 Complicações locais (Pseudocistos, abscesso, necrose, coleção líquida)

ETIOLOGIA
A PA pode ser causada por várias etiologias. Destas, a ingesta de
álcool e a doença calculosa biliar são as mais importantes. Por conta disto,
durante o atendimento em um pronto-socorro de determinada paciente com
suspeita de pancreatite aguda, se faz necessária, a avaliação
ultrassonográfica (para excluir cálculos biliares) e análise dos hábitos de
alcoolismo. Abaixo, são listadas as principais causas de PA.
 Cálculo biliar: o cálculo impacta na ampola de Vater e, com isto,
ocorre uma obstrução do ducto pancreático e da via biliar comum.
 Etilismo: o álcool produz um espasmo do esfíncter pancreático com
lesão súbita dos ácinos pancreáticos, e ainda faz com que o suco
pancreático tenha muita proteína e pouco bicarbonato. Com isto, as
proteínas obstruem ainda o ducto pancreático.
 Hipertrigliceridemia
 Hipercalcemia
 Hereditária
183
Arlindo Ugulino Netto – CIRURGIA ABDOMINAL– MEDICINA P7 – 2010.2

 Traumatismo
 Isquemia
o Hipotensão
o Ateroembolismo
o Vasculites
 Obstrução do ducto pancreático
o Neoplasia
o Cisto
o Pâncreas divisum
o Estenose ampular
o Fibrose Cística
 Causas infecciosas (virais, parasitas, bacterianas, fúngicas);
 Medicação (terapia AIDS, diuréticos, drogas para DII,
imunossupressores, antiinflamatórios, AINS, ATB)
 Idiopática (geralmente, causada por microcálculos não vista
na USG)

FISIOPATOLOGIA
Tudo se inicia a partir de um fator desencadeante. Este, por sua vez, induz a lesão da célula acinar. Com a lesão
destas estruturas pancreáticas, ocorre a liberação, intrapancreática, de enzimas. Estas, consequentemente, passam a
digerir o próprio pâncreas. A base inicial é a ativação do tripsinogênio em tripsina, que ativa as enzimas do pâncreas
exócrino e promove a com autodigestão. São ativadas, portando, uma cadeia extensa de enzimas:
 Ativação da Cinina-Kalicreína: Edema, infiltração.
 Ativação da Quimiotripsina: Edema, lesão vascular.
 Ativação da Elastase: Lesão vascular, hemorragias.
 Ativação da P-A: Necrose, coagulação.
 Lipase: Esteatonecrose.

FORMAS LEVES
 Edema e infiltração intralobular, com migração de células inflamatórias, sem comprometimento significante das
células acinares.
 Pouca consequência circulatória.

FORMAS GRAVES
 Comprometimento de ácinos, com destruição hemorrágica, com isto, existe uma acentuada inflamação e
ativação de citocinas.
 Síndrome da Resposta Inflamatória Sistêmica.
 Síndrome da Disfunção de Múltiplos Órgãos: A grosso modo, ocorre, inicialmente, um sequestro de líquidos.
Com isto, ocorre uma hipoperfusão esplâncnica, com isquemia. A bactéria intra-intestinal, aproveitando a
diminuição da circulação, com aumento da permeabilidade, ultrapassa os limites teciduais e cai na circulação
(translocação bacteriana). Estas, por sua vez, tendem a disseminar para o pâncreas, pois, o mesmo em necrose
funciona como meio de crescimento bacteriano. Em 10-20% dos casos, ocorre uma disfunção de múltiplos
órgãos que pode evoluir para o óbito.
1
OBS : Alguns fatores são importantes para predizer a possibilidade de o paciente evoluir para a forma mais grave da
pancreatite aguda.
 Causa e tempo
 Fatores pró-inflamatórios x inflamatórios
 Apoptose x necrose
 Resposta imunológica
 Polimorfismo genético de mediadores inflamatórios

O principal manejo clínico do paciente na fase inicial da pancreatite é a hidratação, aliada às medidas intensivas.
A indicação cirúrgica se relaciona com o quadro clinico do paciente. Nas síndromes compartimentais do abdome, a
indicação cirúrgica é importante (peritoniostomia).

184
Arlindo Ugulino Netto – CIRURGIA ABDOMINAL– MEDICINA P7 – 2010.2

DIAGN†STICO
 Dor abdominal característica em faixa, associada às náuseas e vômitos;
 Amilase ou lipase aumentada em 3 vezes o limite;
 Alterações características na tomografia computadorizada de abdome.

CLÍNICO
Não existem sinais e sintomas específicos de pancreatite. As manifestações clínicas, geralmente, são
multivariadas.

Sinais e sintomas Incidência


Dor 90% - 100%
Náusea e vômitos 75% - 85%
Íleo paralítico 70% - 80%
Febre 60% - 80%
Dor em barra 50%
Distensão abdominal 50%
Choque Hipovolêmico 40% - 60%
Insuficiência respiratória 20% - 45%
(atelectasia, derrame pleural)
Icterícia 20%
Disúria e oligúria 20%
Hemorragia digestiva 7%

De um modo geral, temos:


 Taquicardia e Hipotensão
 Atelectasia e derrame pleural
 Distúrbios Neurológicos
 Dor Abdominal, ascite e RHA diminuídos.
 Sinal de Grey-Turner: Equimose nos flancos
 Sinal de Cullen: Equimose periumbilical
 Massa Abdominal: Principalmente, quando ocorre coleção líquida pancreática
 Nódulos tecido celular subcutâneo, tromboflebite, patologias associadas

EXAMES LABORATORIAIS
 Hemograma: Leucocitose (não quer dizer que seja infecção, mas pode aumentar em decorrência da resposta
inflamatória sistêmica), queda do hematócrito, hiperglicemia (pela resposta ao trauma);
 Insuficiência renal (aumento de uréia e creatinina)
 Provas hepáticas
 Aumento da bilirrubina
 Amilase: Pico com 24 de amilase e, persiste por 5 dias. A amilase possui, além do pâncreas, outras fontes de
produção, tais como: fígado, delgado, trompa, glândulas salivares e tumores. Portanto, não é um marcador
específico para pâncreas, mas sua sensibilidade é alta. Uma amilase muito elevada ou muito baixa não dita a
gravidade da pancreatite. Pode ainda ser encontrada normal na pancreatite alcoólica (principalmente, na
pancreatite crônica) e hipertrigliceridemia. No pâncreas, a isoamilase P é produzida de maneira especifica.
Portanto, o ideal seria a sua dosagem, não é disponível na rede hospitalar. A amilase é importante para o
diagnóstico de PA quando sua dosagem é 3x além do normal, aliada ao histórico e exame físico.
 Lipase: Apresenta pico em 24h, persistindo por até 7 dias. Sua produção é unicamente pancreática, com maior
sensibilidade em relação à amilase. A sua manutenção de aumento, além dos 7 dias, sugere que o processo
inflamatório é continuo, com Pseudocistos e/ou obstrução.
 Proteína-C-Reativa: A proteína C reativa é um marcador que pode ser utilizado de maneira isolada. O valor
normal é de até 10mg/L. Quando seu valor estiver acima de 150 mg/L, o examinador deve desconfiar de necrose
pancreática. Portanto, a proteína-C-reativa pode ditar a gravidade do paciente, diferentemente da amilase.

EXAMES DE IMAGEM
 Radiografia de tórax (evidencia derrame pleural, SARA, atelectasia pulmonar) e abdome (pneumoperitônio,
opacificação do pâncreas)
 US (avaliar via biliar, cálculos da vesícula biliar)

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Arlindo Ugulino Netto – CIRURGIA ABDOMINAL– MEDICINA P7 – 2010.2

 Tomografia computadorizada († o padr•o-ouro): Visualiza líquido e necrose pancreático. Não é útil até 48h
de evolução da pancreatite aguda. As suas indicações são:
o Dúvida
o Hiperamilasemia e critérios clínicos de gravidade como distensão, dor abdominal, hipertermia e
leucocitose;
o Ranson > 3 ou APACHE II >8;
o Pacientes com deterioração clínica a despeito de tratamento conservador inicial por 72 horas;
o Deterioração clínica aguda após melhora inicial.
 RNM: Não é um exame importante para o diagnóstico, a não ser que se queira avaliar a via biliar através da
colangio-RNM.
 An…lise de cristais: Endoscopia digestiva alta e coleta de líquido duodenal para exame microscópico.

CRITˆRIOS PROGN†STICOS

CRITŽRIOS DE RANSON
Pancreatite Aguda.
Na admiss•o
- Idade > 55 anos; 1 PONTO
- Leucocitose >16.000/mm3; 1 PONTO
- Glicose > 200 mg/dl; 1 PONTO
- LDH >350 UI/L; 1 PONTO
- TGO > 250 UI/L; 1 PONTO
Durante as 48h iniciais
- Redução Htc mais de 10%; 1 PONTO Fatores de Risco Letalidade
- Aumento da uréia >10mg/dL; 1 PONTO
0–2 <1%
- Cálcio <8 mg/dL; 1 PONTO
- PaO2 < 60 mmhg; 1 PONTO 3–4 ≈ 15%
- BE mais negativo que - 4; 1 PONTO 5–6 ≈ 40%
- Estimativa de perda líquida 6 litros; 1 PONTO >6 ≈ 100%

 Acima de 3: pancreatite aguda grave


 Abaixo de 3: pancreatite aguda leve

Pancreatite Aguda biliar.


Na admiss•o
- Idade >70 anos; 1 PONTO
- Leucocitose >18.000/mm3; 1 PONTO
- Glicose > 220 mg/dl; 1 PONTO
- LDH >400 UI/L; 1 PONTO
- TGO > 250 UI/L; 1 PONTO
Durante as 48h iniciais
- Redução Htc mais de 10%; 1 PONTO
- Aumento da uréia > 4mg/dL; 1 PONTO
- Cálcio <8 mg/dL; 1 PONTO
- BE mais negativo que - 5; 1 PONTO
- Estimativa de perda líquida 4 litros; 1 PONTO

CRITŽRIO DE GLASGOW
 55 anos
 Hiperglicemia
 Leucocitose > 15.000
 Uréia > 15mmol
 PO2 < 60mmHg
 Cálcio < 2 mmol/l
 Albumina < 3,2 g/l
 DHL >600 iu/L
 AST/ALT > 100 UI/l

 Acima de 3: pancreatite aguda grave


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Arlindo Ugulino Netto – CIRURGIA ABDOMINAL– MEDICINA P7 – 2010.2

APACHE II
 Avaliação de pacientes graves em UTI
 Consta de 12 variáveis fisiológicas, dados clínicos e laboratoriais;
 Interpretação complexa;
 Vantagem avaliação em 24 horas;
 Considera-se grave quando > 8 pontos.

Sensibilidade Especificidade
Ranson 75% 68%
APACHE II 75% 92%

BALTAZAR
Os critérios de Baltazar são ditados como sendo critérios tomográficos. E, sua requisição somente é procedida
para os casos de pancreatite aguda grave.

TRATAMENTO
A terapia para a pancreatite aguda apresenta alguns objetivos principais:
 Limitar as complicações sistêmicas (reposição de líquido e suporte nutricional)
 Prevenir a necrose pancreática (antibióticoprofilaxia)
 Prevenir a infecção pancreática (melhora do estado nutricional, a partir da dieta)
 Medidas de suporte clínico
 Diagnosticar complicações
 Identificação e tratamento da causa

Portanto, o tratamento será dotado das seguintes etapas:


 Suporte nutricional;
 Analgesia;
 Reposição vigorosa de líquido;
 Controle hidroeletrolítico e ácido-básico;
 Antibioticoterapia (imipenen, cipro/metro, cefotaxima): apenas para pancreatite grave.
 Anti-secretores (bloqueadores H2, anticolinérgicos, glucagon e somatostatina)
2
OBS : Os anti-secretores (Somatostatina e octreotide) são responsáveis por inibirem a secreção pancreática. Com isto,
possibilitam uma diminuição da lesão dos ácinos pancreáticos pelo conteúdo enzimático pancreático. Além disto,
também induz uma inibição da estimulação do sistema imune. O efeito adverso seria a capacidade de induzir uma
potente ação vasoconstrictora da área esplâncnica, que podem aumentar as áreas de necrose. Apesar de seus efeitos
positivos, os ensaios randomizados demonstram que não há modificação na taxa de mortalidade em seu uso e, nem
sequer, há evidencia de um beneficio que possa aconselhar a utilização nos casos de pancreatite moderada e/ou grave.
3
OBS : São critérios de admissão em UTI:
 Pancreatite Aguda Grave
 Pacientes de risco (idosos, obesos, necessidade de reposição contínua de volume);
 Pacientes com área de necrose pancreática significativa

187
Arlindo Ugulino Netto – CIRURGIA ABDOMINAL– MEDICINA P7 – 2010.2

PANCREATITE AGUDA LEVE


O tratamento clínico da pancreatite aguda leve é dotado da reposição hídrica, não necessitando a requisição da
TC. Em dois dias, ocorre uma melhora clínica do paciente e, já se é possível determinar o retorno da dieta. Caso a causa
seja biliar, a conduta é cirúrgica, com a colecistectomia com colangiografia intra-operatória. Dieta somente por 2 dias e,
após 2 dias, a dieta é retomada: liquida, liquida-pastosa e pastosa.

PANCREATITE AGUDA GRAVE


Na pancreatite aguda grave, é necessário que o paciente seja exposto aos cuidados intensivos, com equipe
multidisciplinar. A utilização de antibioticoprofilaxia é obrigatória neste caso. Deve-se ainda indicar a TC e,
eventualmente, a CPRE (quando o paciente tem colangite com pancreatite aguda grave). Algumas evidencias clínicas
são importantes a serem descritas a respeito da pancreatite aguda grave:
 Pancreatite Aguda Grave pode evoluir para síndrome da disfunção múltipla de órgãos (DMOS);
 Reposição agressiva de volume
 Critérios relacionados com a volemia: (sequestro de líquidos, déficit de base, queda hematócrito
 Marcadores sanguíneos podem sugerir gravidade (PCR, IL-6, procalcitonina)

Antibioticoprofilaxia.
A infecção é a principal causa de morte na pancreatite severa. 70% dos pacientes são acometidos por infecções
bacterianas após a terceira semana (tempo para desenvolver a translocação). A maioria (mais que 75%) apresenta flora
monomicrobianas por Gram-negativos entéricos (E. coli, Pseudomonas, Klebsiella, Enterococcus). Eventualmente,
também podem ocorrer infecções por Gram positivos e fungos bem menos freqüentes mais têm aumentado com
antibioticoprofilaxia profilático de amplo espectro.
 30%-50% das PA necrotisantes desenvolvem infecção;
 A infecção tem início de 2-3 semanas após início da doença;
 Mortalidade maior nos pacientes com necrose infectada
 Não há justificativa para profilaxia em pacientes sem necrose.

Profilaxia para fungos.


 Uso de ATB profilático tem sido associado com aumento de infecção por Cândida;
 A infecção fúngicas traduz uma mortalidade mais alta;
 Estudos não mostram evidências para apoiar a profilaxia.

Desinfecção do tubo digestivo.


Conforme foi dito anteriormente, a fonte de infecção é o tubo digestivo, através do mecanismo de translocação.
Portanto, a desinfecção do tubo digestivo, na teoria, poderia resultar em uma diminuição das taxas de infecção. Nos
estudos e na prática, tem uma eficácia muito baixa.

Dieta.
A dieta é procedida através da sonda nasoenteral (o ideal é que seja através da endoscopia, colocando-a no
duodeno ou jejuno proximal). Se em 5-7 dias ocorrer distensão abdominal, a dieta deverá ser indicada através da via
parenteral. A dieta enteral diminui a translocação bacteriana, melhora o fluxo dos enterócitos, com preservação da
mucosa e da imunidade. A inibição da translocação, portanto, é através da dieta. Alem disto, também se pode utilizar
glutamina e probióticos.
 Recomenda-se o uso de nutrição enteral em preferência a NPT em pacientes com pancreatite grave.
 A nutrição enteral deve ser iniciada após a ressuscitação inicial, por sonda naso-entérica se possível
 Só se recomenda a NPT após falha da tentativa da nutrição enteral depois de um período de tentativa de uns 5-7
dias.

Cirurgia.
A cirurgia é indicada nas situações em que se tem necrose ou abscesso infectado. O diagnóstico é dado a partir
da TC ou resultado da cultura por punção aspirativa por agulha fina. Portanto, o procedimento de escolha é o
desbridamento aberto (nos casos de abscessos). As técnicas minimamente invasivas somente são indicadas em casos
selecionados. Já para a necrose, a cirurgia é a necrosectomia. A cirurgia deve ser o mais tardiamente possível.
4
OBS : Pancreatite aguda com icterícia obstrutiva (icterícia, coluria e acolia fecal): Provável causa biliar. Nesta
ocasião, é prudente a realização de exames laboratoriais e US.
 CPRE de urgência dentro 24 - 72h: pancreatite aguda + icterícia obstrutiva (colangite).
 Se CPRE não pode ser realizada: métodos alternativos de drenagem da via biliar.

188
Arlindo Ugulino Netto – CIRURGIA ABDOMINAL– MEDICINA P7 – 2010.2

PROTOCOLO

DIAGNÓSTICO
Em caso de suspeite de PA, deve-se seguir a avaliaۥo dos seguintes fatores:
 Hist‡ria
 Exame F„sico
 Laborat‡rio (Hemograma, Creatinina, glicemia, amilase, lipase, DHL, TGO, Na, K, AP)
 US abdome

ESTADIAMENTO
 Leve
 Grave: 3 ou mais crit‚rios de Ranson presentes, 8 ou mais pontos de APACHE II ou insuficiƒncia org…nica.

CONDUTA
 Leve
 Analgesia, Dieta, hidrata€•o, observa€•o
 Grave
 Transferir para UTI
 APACHE II na admiss•o
 Imipenen 500mg IV 8/8 h/ ou Alternativa: Ciprofloxacino 400mg IV 12/12h + Metronidazol 500mg IV 8/8h
 Discutir caso com DIPA (infectologistas)
 Profilaxia para Trombose Venosa Profunda: Enoxaparina 40mg 1/dia
 Hidrata€•o de acordo com o peso di†rio e albuminemia.
 Sonda vesical de demora de trƒs vias para medir press•o intra-abdominal.
 Sonda para Tonometria da mucosa g†strica
 Tomografia Computadorizada de Abdome e Pelve, com contraste VO e IV ap‡s 48 e 72 h da interna€•o
 Apresentando insuficiƒncia respirat‡ria, acrescentar TC de T‡rax. Se apresentar Insuficiƒncia Renal, TC
sem contraste.
 Evolu€•o favor†vel: manter conduta
 Evolu€•o Desfavor†vel (instabilidade cardiovascular, piora do padr•o respirat‡rio, „leo prolongado,
sepse, complica€‰es abdominais como peritonite, hemorragia): aguardar 72h e indicar cirurgia se
continuar com quadro cl„nico desfavor†vel.
 Se continuar evolu€•o desfavor†vel, ap‡s 10 a 14 dias, PAF da necrose pancre†tica guiada por TC. Se
positiva indicar cirurgia. Se negativa, insistir em conduta conservadora por mais sete dias.

TRATAMENTO CIRÚRGICO
 Incis•o mediana
 Necrosectomia digital
 Lavagem da cavidade.
 Drenagem ampla.
 Fechamento em plano Šnico.
 Programar nova Cirurgia em 48 a 72 horas, independente da evolu€•o, se restar necrose; ou se necess†rio
 UTI = Favor†vel – conduta cl„nica
 Desfavor†vel – Nova abordagem cirŠrgica.

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Arlindo Ugulino Netto – CIRURGIA ABDOMINAL– MEDICINA P7 – 2010.2

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Arlindo Ugulino Netto – CIRURGIA ABDOMINAL– MEDICINA P7 – 2010.2

MED RESUMOS 2012


CORREIA, Luiz Gustavo; NETTO, Arlindo Ugulino.
CIRURGIA ABDOMINAL

PANCREATITE CRÔNICA
(Professor Marcelo Gonçalves)

A pancreatite crônica é uma condição inflamatória crônica e esclerosante, progressiva. Pode manifestar
insuficiência endócrina (diabetes mellitus) e/ou insuficiência exócrina (esteatorreia). A taxa de mortalidade é tão
acentuada quanto na aguda.

ETIOLOGIA
A principal causa da pancreatite crônica é a ingesta
crônica de álcool, em cerca de 75% dos casos. Alguns estudos
demonstram que a ingesta de 100 a 150 g de etanol/dia já é um
fator que risco para o desenvolvimento da pancreatite crônica. O
restante, ou seja, os 25% da etiologia corresponde aos seguintes
fatores:
 Causa biliar (rara)
 Tropical (associada à desnutrição, sendo, pois, mais
frequente na África)
 Hiperparatireoidismo
 Hiperlipidemia e hipertrigliceridemia
 Trauma (direto por acidente ou por manipulação)
 Hereditário
 Pâncreas divisum
 Idiopática
 Drogas, auto-imune

FISIOPATOLOGIA
O etanol, conforme dito anteriormente, é a principal causa
de pancreatite crônica. Os efeitos fisiopatológicos do alcoolismo
que podem suscitar uma doença do pâncreas são:
 Espasmo do esfíncter de Oddi
 Efeitos metabólicos do álcool
 Suco pancreático alterado, mais viscoso, com menos
líquido (diminuição de bicarbonato, com mais proteínas)
 Aumento da permeabilidade dos ductos
 Hipofluxo pancreático
1
OBS : Outros dados fisiopatológicos suscitam a hipótese que outras condições clínicas também podem estar
relacionadas com a gênese da doença pancreática crônica. Dentre as quais, podemos citar, o hiperparatireoidismo, cuja
precipitação do cálcio está ligada diretamente à pancreatite crônica. A precipitação deste íon promove a formação de
cálculos calcificados, promovendo, em longo prazo, uma doença crônica pancreática.

Existem, basicamente, três teorias que tentam explicar os mecanismos de desenvolvimento da doença
pancreática crônica. Obviamente, cada uma delas, em especifico, também tem relações com fatores ambientais e
genéticos.
 Teoria tóxico-metabólica: Nela, ocorre uma lesão direta dos ácinos pancreáticos, consequentemente, ocorrendo
uma série de alterações metabólicas.
 Teoria da obstrução ductal
 Teoria de Necrose-fibrose

CLASSIFICAÇÃO
 Pancreatite crônica inflamatória: Não se sabe ao certo o mecanismo etiopatogênico. Geralmente, está
relacionada às causas auto-imunes.
 Pancreatite crônica obstrutiva: Algum fator etiológico promove uma obstrução do ducto pancreático.
 Pancreatite crônica calcificante: É o subtipo mais frequente da pancreatite crônica, cujo mecanismo
etiopatogênico seria a calcificação difusa do parênquima pancreático.
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Arlindo Ugulino Netto – CIRURGIA ABDOMINAL– MEDICINA P7 – 2010.2

2
OBS : Além do comprometimento in situ, a pancreatite crônica também pode evoluir com o comprometimento de órgãos
extra-pancreaticos, tais como: obstrução da via biliar, duodenal, colônica.

MANIFESTA•‚ES CL…NICAS
A principal manifestação clínica da PC é a dor epigástrica, ocorrendo em cerca de 60% dos indivíduos com esta
patologia. A dor ocorre na forma de um episodio de agudização da PC, em que se faz presente um processo inflamatório
crônico desencadeador.

ANAMNESE E HISTÓRIA CLÍNICA


 75% dos casos, ocorre perda de peso;
 Insuficiência exócrina (quando ocorre destruição de 90% do parênquima pancreático, desenvolvendo-se a
esteatorreia);
 Insuficiência endócrina (DM);
 Náuseas, vômitos e icterícia

EXAME FÍSICO
 Emagrecimento,
 Massa palpável (quando se é possível percebê-la, provavelmente, o paciente apresenta pseudocistos e, caso
seu tamanho seja superior a 5 cm, indica-se a cirurgia)

EXAMES COMPLEMENTARES

LABORATORIAIS
 Dosagem de enzima pancreática (Amilase) não é um exame de boa sensibilidade para o diagnóstico de
pancreatite crônica. Somente é indicada nas ocasiões em que se têm as exacerbações agudas. É válido
relembrar que a produção é diminuída quando o individuo apresenta pancreatite alcoólica.

 Teste de função pancreática exócrina, somente é positivo quando ocorre lesão de, no mínimo, 90% do pâncreas
o Secretina e colecistocinina
o Quimiotripsina fetal

 Teste direto da capacidade secretória (avaliação do DM)


o 70% calcificada
o 30% não calcificada
o Curvas anormais de tolerância a glicose
o Reserva pequena

 Provas indiretas

 Marcadores

IMAGEM
 R-X simples de abdome: É um exame de sensibilidade de
25% nos casos avançados, com visualização de calcificação
pancreática
 Duodenografia hipotônica: observação se existe estenose
duodenal
 US com Doppler colorido: a principal causa de trombose da
veia esplênica e insuficiência porta segmentar é a
pancreatite crônica, daí a sua indicação para o diagnóstico
de tais condições.
 TC
 Colangio-RNM: É importante para avaliação dos ductos
biliares principais, porém, os ductos acessórios do pâncreas
não são tão bem vistos, tais como ocorre pela CPRE.
 USE
 CPRE
 Biópsia guiada

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Arlindo Ugulino Netto – CIRURGIA ABDOMINAL– MEDICINA P7 – 2010.2

3
OBS : A CPRE, além de diagnóstico, também é útil para outras funções:
 Diagnóstico diferencial entre Neoplasia e Pseudocistos
 Tratamento de estenose
 Estudo do ducto biliar comum
 Avaliação de cálculos e irregularidade ductal
 Esfincteroplasia
o Extração de cálculos
o Litotripsia prévia
o Prótese

TRATAMENTO

 Pancreatite crônica e dor, a conduta passa a ser a avaliação pancreática através de exames de imagem.
 Caso não se tenha alguma complicação, a conduta é clínica, através da prescrição de analgésicos, enzimas
pancreáticas, antidepressivos, bloqueadores da secreção ácida (rinetidina, cimetidina), abstinência e dieta
hipolipídica. Caso, o tratamento clínico para as situações em que não se tem complicações não surtir efeito, é
prudente associar ao uso de narcóticos (analgésico com maior capacidade de ação). Caso persista-se sem
resposta, a conduta passa a ser CPRE (na tentativa de desobstruir, passar alguma prótese, dentre outros). Caso
não se resolve, a conduta passa a ser ablação de plexos nervosos com álcool absoluto por USG-guiada ou TC-
guiada. Caso não seja possível resolver, a avaliação do ducto será de grande valia para a próxima conduta.
Caso o ducto tenha diâmetro maior que 7 mm, a conduta é drenagem cirúrgica. Caso seja maior que 7 mm, a
conduta é a ressecção pancreática com derivação pancreaticointestinal.
 Complicações: Tratamento mais conveniente com a complicação

CLÍNICO
 Nutricional
 Interrupção da ingesta de álcool
 Tratamento da diabetes
 Tratamento da dor (analgesia): A dor é causada por conta da infiltração do gânglio celíaco e obstrução. É tratada
por analgésicos, além de enzimas (somatostatina e dieta). Caso não se resolva, pode-se proceder do bloqueio
do gânglio celíaco com esteróides (através de punção guiada por TC ou US-endoscópica). Caso não resolva, o
próximo passo é a descompressão cirúrgica.
 Tratamento da insuficiência pancreática: É importante a utilização de carboidratos, hipolipídica, hipoprotéica.
Além da reposição de pancrelipase e triglicerídeos de cadeia média.
 Na agudização, considerar o tratamento como se fosse uma pancreatite aguda

193
Arlindo Ugulino Netto – CIRURGIA ABDOMINAL– MEDICINA P7 – 2010.2

TRATAMENTO CIRÚRGICO
O tratamento cirúrgico da pancreatite crônica é baseado nos seguintes pontos:
 Derivações
 Ressecções: retirada do segmento pancreático destruído
 Bloqueio do plexo celíaco através de alcoolização

Derivações.
 Puestow:consiste em drenar o ducto pacreático
principal diretamente no intestino, através de
uma anastomose do tipo pancreato-jejunostomia,
de modo que todo o ducto pancreático seja
aberto para dentro da luz do instestino delgado.
Logo em seguida, restabelecer a anastomose
jejunojejunal (ver figura ao lado).

 Duval (1920), pancreatojejunostomia distal


 Partington and Rochelle
 Frey

Ressecção.
É indicada para dilatação. As
técnicas que podem ser utilizadas são:
 Whipple: procedimento clássico
descrito que inclui:
duodenectomia, pancreatectomia
cefálica e colecistectomia, sguida
de anastomoses gastrojejunal,
pancreatojejunal, coledocojejunal
e enteroenteroanastomose à
Braun, indicada para pancreatite
de cabeça do pâncreas.
 Transverso & Longmire
 Pancreatectomia caudal
 Beger

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Arlindo Ugulino Netto – CIRURGIA ABDOMINAL– MEDICINA P7 – 2010.2

MED RESUMOS 2012


ELOY; Yuri Leite; NETTO, Arlindo Ugulino.
CIRURGIA ABDOMINAL

CÂNCER DE PÂNCREAS
(Professor Felipe Rocha)

O c…ncer de p…ncreas tem uma prevalƒncia que est† em torno de 29.200 casos/ano, com uma mortalidade de
28.900 mortes. De acordo com esta estat„stica pode-se perceber que este tipo de c…ncer tem uma elevada taxa de
mortalidade, sendo classificada como a terceira causa de morte por c…ncer em homens. Acometem com maior
frequƒncia homens da ra€a branca, entre a 5— e 6— d‚cadas de vida.
Entre os fatores de risco para sua ocorrƒncia, temos:
 Tabagismo;
 Fatores diet‚ticos: ingesta de carne vermelha e gorduras;
 Pancreatite CrŒnica;
 Gastrectomia pr‚via;
 Hist‡ria familiar.

C ONSIDERA•‚ES A NATƒMICAS
A anatomia do p…ncreas ‚ complexa devido a sua intima rela€•o
com ramos arteriais do mesent‚rio. Entretanto atualmente, j† ‚ poss„vel
ter um estudo detalhado desses vasos, ou seja, atrav‚s da ingest•o de
contraste, e visualizaۥo pela radiologia.
O p…ncreas ‚ uma gl…ndula acess‡ria do sistema digestivo. Est†
localizado transversalmente na parede posterior do abdome,
posteriormente ao estŒmago, entre o duodeno ‹ direita e o ba€o ‹
esquerda. O p…ncreas ‚ classificado como uma gl…ndula mista pois tem
uma secre€•o ex‡crina (o suco pancre†tico, que auxilia na digest•o) e
uma secre€•o end‡crina (representada pelos hormŒnios insulina e
glucagon, secretados pelas ilhotas de Langerhans).
Anatomicamente o p…ncreas ‚ dividido em cabe€a, colo, corpo e cauda. A cabe€a ‚ a parte expandida da
gl…ndula que est† localizada no quadrante superior direito, ‚ circundada pela curva em “C” do duodeno. Al‚m disso a
cabe€a possui uma proje€•o inferior, chamada de processo uncinado, que estende-se medialmente para esquerda,
posteriormente aos vasos mesent‚ricos.

PATOLOGIA
O tipo histol‡gico mais comum ‚ o Adenocarcinoma ductal em cerca de 80% dos casos, assim como os outros
c…nceres do trato digestivo. Al‚m disso, outros tumores que podem acometer essa gl…ndula incluem o carcinoma de
c‚lulas das ilhotas pancre†ticas, acometendo sua fun€•o end‡crina, e os cistoadenocarcinomas.
Com rela€•o a sua localiza€•o cerca de 2/3 dos casos estar•o localizados na cabe€a e 1/3 dos casos no corpo e
cauda. As vias de dissemina€•o mais comuns s•o: extens•o local na gl…ndula, linfonodos regionais, met†stase ‹
dist…ncia, sendo mais comum para o f„gado.

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Arlindo Ugulino Netto – CIRURGIA ABDOMINAL– MEDICINA P7 – 2010.2

Embora a disseminação por linfonodos regionais ocorra com freqüência, a mais importante em relação ao câncer
de pâncreas é a extensão local da própria glândula.

DIAGN†STICO

ACHADOS CLÍNICOS
Embora não possa ser estabelecido o diagnóstico de câncer de pâncreas somente através do exame clínico, é
de extrema importância a avaliação dos sinais e sintomas do paciente, para que possa ser estabelecida uma hipótese
concreta. Com isso, levando em consideração o tipo e localização mais comum temos:

 Cabeça do Pâncreas
 Icterícia progressiva: icterícia que se inicia nas mucosas, e se dissemina por todo o corpo. A icterícia
nesses casos ocorre devido à obstrução do ducto colédoco, com isso, ocasionando uma
hiperbilirrubinemia direta, ou conjugada, ou ainda, icterícia colestática.
 Colúria e acolia fecal: consiste na presença de urina escurecida e fezes esbranquiçadas, decorrente de
seu aumento no sangue e eliminação pela urina, e ausência no intestino, onde seguiria para ser
metabolizada e dar coloração característica as fezes.
 Perda de peso;
 Dor abdominal;
 Dor lombar: importante salientar que cerca de cerca de 25% dos casos dos pacientes com câncer de
pâncreas não tem dor abdominal, mas sim lombar. Com isso, dor lombar associada a um quadro de
icterícia, as chances desse paciente possuir um tumor de pâncreas está em torno de 90%.
 Sinal de Courvoisier: vesícula biliar palpável, indolor, em um paciente ictérico. Esse achado
corresponde a 98% de chances de ocorrer um tumor de cabeça de pâncreas. Apesar disso, não é um
achado específico do tumor de cabeça de pâncreas, podendo ocorrer em outras patologias. Entretanto é
importante para a propedêutica a ser adotada nesses pacientes com icterícia.

 Corpo e cauda do pâncreas


 Dor abdominal ou lombar: é o sinal mais importante nesses pacientes, principalmente dor de origem
inexplicada.
 Perda de peso;
 Icterícia: < 10% dos pacientes, já que o tumor não obstrui a secreção pancreática e biliar.
 Tromboflebite migratória: é uma manifestação paraneoplásica, caracterizada pela migração de
trombos tumorais.

 Síndromes Clínicas
 Síndrome Clínica Dolorosa e Ictérica;
 Síndrome Clínica Dolorosa: confunde-se com quadros neurocirúrgicos e ortopédicos;
 Síndrome Clínica Dolorosa e Consumptiva (perda de peso)
1
OBS : É importante salientar que somente através da avaliação clínica é possível identificar um paciente com icterícia
colestática. Entretanto, somente pela avaliação clínica é impossível dizer se o paciente é portador de icterícia obstrutiva,
sendo necessária nesses casos a presença de um USG de vias biliares mostrando dilatação. Isso é importante para
diferenciação de icterícia obstrutiva e colestática. Apesar disso, toda icterícia obstrutiva é uma icterícia colestática,
porém, nem toda icterícia colestática é obstrutiva (pois pode ser causada por distúrbios na excreção da bilirrubina do
hepatócito para o ducto biliar, como ocorre na síndrome de Rotor).

ACHADOS LABORATORIAIS
 Elevação de bilirrubinas: justificada pela obstrução do ducto colédoco, levando a uma hiperbilirrubinemia
conjugada.
 Elevação de fosfatase alcalina: Ocorre devido a obstrução do fluxo da vesícula biliar.
 CA 19-9: marcador tumoral mostrando níveis elevados. Entretanto esse marcador tumoral não é específico,
podendo estar presente em outras doenças benignas do pâncreas. Apesar disso, esse marcador tumoral tem um
importante valor diagnóstico, quando associado aos outros achados laboratoriais, e principalmente exame
clínico.

DIAGNÓSTICOS DE IMAGEM

TC de Abdome com contraste.


Em um paciente com exame físico suspeito é o primeiro exame a ser solicitado, ou seja, paciente da raça branca
com sinal de Courvoisier positivo para completar a hipótese diagnóstica, com o diagnóstico propriamente dito,
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Arlindo Ugulino Netto – CIRURGIA ABDOMINAL– MEDICINA P7 – 2010.2

realizamos a TC. Exame f†cil de ser realizado, barato, e que traz informa€‰es importantes. Os principais achados desses
exames s•o:
 Massa pancre†tica na cabe€a do p…ncreas em 95% dos casos
 Sinal do duplo ducto: sinal importante, que ‚ a dilata€•o do ducto col‚doco e pancre†tico ao mesmo tempo.
 Avalia€•o da ressecabilidade – avalia se o tumor ‚ ressec†vel ou n•o.

Imagem mostrando tumor na cabe€a do p…ncreas envolvendo a veia mesent‚rica


superior. Al‚m de dar informa€•o do diagn‡stico, tamb‚m informa a
ressecabilidade.

CPRE.
ˆ importante apenas quando houver uma suspeita diagn‡stica de tumor de papila ou quando n•o houver a
confirma€•o atrav‚s da TC, a respeito do tumor de p…ncreas. Atualmente n•o ‚ mais considerado o melhor exame, por
ser um exame invasivo e apresentar complica€‰es.

PET-Scan.
Exame recente, que consiste em uma tomografia com emiss•o de p‡sitron, que atrav‚s da administra€•o de
r†diofarmaco, marcam celulas com produto metab‡lico da glicose. O r†diofarmaco faz o mapeamento completo das
c‚lulas cancer„genas. ˆ um exame muito importante para o estadiamento, por‚m n•o tem a mesma import…ncia do
ponto de vista diagn‡stico.

Ultrasom Endosc‡pico.
Utilizado em casos de tumores iniciais, em fase precoce. Na ponta do endosc‡pio existe uma agulha que tem
como fun€•o principal a realiza€•o de pun€•o (biopsia) de tumores na cabe€a do p…ncreas.

DIAGN†STICO DIFERENCIAL
Como foi visto, os tumores do p…ncreas (cabe€a) cursam com icter„cia e, com isso, todas as situa€‰es
neopl†sicas que possam levam a icter„cia fazem o diagn‡stico diferencial com tumor de cabe€a de p…ncreas. Assim
temos:
 Pancreatite Crƒnica – principal diagn‡stico diferencial. Cerca de 80% dos casos n•o ‚ poss„vel diferenciar uma
pancreatite crŒnica de um tumor da cabe€a do p…ncreas, e a conduta em ambos os casos ser† a cirurgia, j† que
nenhum exame ‚ capaz de estabelecer o diagn‡stico diferencial.
 Tumor de col†doco distal;
 Tumor de papila;
 Tumor de duodeno.

TRATAMENTO
Na presen€a de tumores na cabe€a do p…ncreas n•o h† necessidade de realiza€•o de bi‡psia, pois a TC ‚ um
exame de especificidade elevada para concluir essa condi€•o. Com isso nesses pacientes j† pode ser indicada a
ressec€•o padronizada (duodenopancreatectomia). Entretanto somente 20% desses pacientes s•o candidatos ao
procedimento cirŠrgico, pois ‚ importante salientar que a cirurgia visa aumentar a sobrevida do paciente, uma vez que o
c…ncer de p…ncreas, praticamente, n•o tem cura.
Estudo realizado no hospital dos EUA mostrou que, de 3080 admiss‰es hospitalares, apenas 2015 tinham
neoplasia da cabe€a de p…ncreas e foram para a terapia cl„nica-cirŠrgica. Destes:
 478 conseguiram retirar o tumor,
 464 foi poss„vel fazer apenas um bypassed, ou seja, uma deriva€•o biliodigestiva,
 418 uma explora€•o com biopsia,
 196 uma laparoscopia e
 419 n•o foram poss„veis fazer nenhuma conduta, mostrando que a doen€a tem um progn‡stico muito grave.

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Arlindo Ugulino Netto – CIRURGIA ABDOMINAL– MEDICINA P7 – 2010.2

Modelo de como ‚ realizada a cirurgia. Faz-se a


ressec€•o de todo o duodeno, cabe€a do p…ncreas e
parte do estŒmago; sendo necess†rio fazer uma tr„plice
derivaۥo: uma anastomose biliodigestiva, anastomose
gastrojejunal e pancreatojejunal.

TRATAMENTO ADJUVANTE
Sendo poss„vel fazer um tratamento cirŠrgico, deve-se associar um tratamento adjuvante, ou seja, associar com
a quimioterapia (QT). Outra indica€•o de quimioterapia ‚ paciente com doen€a metast†tica, na tentativa de prolongar
sua sobrevida.

TRATAMENTO PALIATIVO
Na impossibilidade de realizaۥo de um tratamento definitivo, ou seja, curativo, deve-se realizar uma conduta
paliativa, ou seja, redu€•o dos sinais e sintomas apresentados por esse paciente. Nos pacientes, ict‚ricos, deve-se
corrigir a icter„cia, pois, esse excesso pode levar a deposi€•o renal, levando o paciente a um quadro de insuficiƒncia
renal. Al‚m disso, deve-se corrigir a obstru€•o das vias biliares e com isso, diminuindo os n„veis plasm†ticos de sais
biliares e assim, reduzindo o prurido apresentado por esses pacientes.
A cirurgia a ser realizada nesses casos ‚ a derivação biliodigestiva: anastomose hep†tico-jejunal em Y de
Roux. A anastomose gastrojejunal s‡ ‚ realizada quando se tem uma obstru€•o duodenal confirmada atrav‚s de uma
endoscopia ou exame contrastado. Assim anastomose gastrojejunal n•o ‚ a conduta universal, somente nos casos
selecionados de c…ncer de p…ncreas.
Em casos de risco cirŠrgico muito alto, impossibilitando a realiza€•o o procedimento cirŠrgico, n•o deve ser feita
a anastomose col‚doco-duodenal devido ‹ proximidade do tumor do duodeno, podendo o tumor invadir a anastomose e
comprometer o procedimento cirŠrgico. Com isso, nessas situa€‰es de risco alto, deve-se colocar uma pr‡tese na via
biliar por via endosc‡pica.

PROGNÓSTICO
 Cerca de 20% dos pacientes que fizeram ressec€•o do tumor ter•o uma boa sobrevida de cinco anos.
 Tem-se sobrevida mediana de 18 meses aqueles pacientes realizam o procedimento padr•o.
 Sobrevida m‚dia ap‡s terapia paliativa, ou seja, deriva€•o da biliodigestiva, est† em torno de 7 meses.
 A sobrevida total, levando em considera€•o todos os pacientes portadores de c…ncer de p…ncreas, em 5 anos
est† em torno de 10% dos casos.
 Estudos demonstraram que existe uma rela€•o progn‡stica, de sobrevida dos pacientes de acordo com o tipo
histol‡gico do tumor. O de pior progn‡stico ‚ o adenocarcinoma de p…ncreas e o “melhor” s•o os tumores da
papila e das c‚lulas das ilhotas pancre†ticas.

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MED RESUMOS 2012


ELOY; Yuri Leite; NETTO, Arlindo Ugulino.
CIRURGIA ABDOMINAL

TUMORES DA AMPÔLA DUODENAL


(Professor Felipe Rocha)

Com relação ao tumor da papila de Váter, o adenocarcinoma corresponde cerca de 2/3 dos casos, ou seja, a
maioria dos tumores da papila duodenal é representada pelo adenocarcinoma. Mas, em cerca de 1/3 dos casos o tumor
pode ser benigno, isto e, um simples adenoma.
Os tumores de papila correspondem a cerca de 10% dos
pacientes que causam obstrução biliar distal - aspecto de muita
importância, devido à confusão diagnóstica entre colecodolitíase e
o tumor de papila, principalmente em pacientes jovens.

QUADRO CL…NICO
 Icterícia: não é tão comum como no tumor de pâncreas.
A icterícia padrão desses pacientes não é progressiva,
mas sim, flutuante, causada pela necrose tumoral que se
desprende da parede da papila intermitentemente e libera
a passagem da bile e melhorando a icterícia; depois, o
tumor retorna a crescer, causando icterícia novamente
 Sangramento digestivo alto: manifestado como melena.
Isso ocorre, devido ao sangramento tumoral constante,
com isso o paciente relata fezes enegrecidas. É um
sintoma importante que não ocorre no tumor de cabeça
do pâncreas.
 Sintomas Dispépticos: os sintomas dispépticos
associados a icterícia, remete a colecodolitíase, sendo
assim um diagnóstico diferencial importante ser feito.

DIAGN†STICO
Diferentemente do tumor de pâncreas a tomografia não é importante para estabelecer o diagnóstico, nesses
casos ela somente sugere o diagnóstico. O exame que confirma o diagnostico é a CPRE, pois, na endoscopia pode-se
visualizar a papila e permitindo a realização de uma biópsia, que demonstrará a presença do adenocarcinoma. Então, no
tumor de papila, durante a avaliação propedêutica, é fundamental a realização da biópsia, enquanto no tumor de cabeça
de pâncreas, não há necessidade, pois a tomografia é diagnóstica.
1
OBS : O tumor de papila pode invadir a via biliar ou o pâncreas. Isto é importante, o tumor de papila com crescimento
para o interior do pâncreas é uma condição relativamente comum.

TRATAMENTO
Nos casos de tumoração benigna (adenoma) deve-se fazer somente uma ressecção local. Já nos casos de
adenocarcinoma, deve-se realizar a mesma cirurgia utilizada para o tumor de cabeça de pâncreas, ou seja, Gastro
duodenopancreatectomia (Cirurgia De Whiplle). Nos pacientes com adenocarcinoma metastático, a cirurgia para fins
curativos está contra-indicada, devendo somente realizar a desobstrução das vias biliares, que consiste no tratamento
paliativo.

PROGN†STICO
O prognóstico de tumor de papila, diferentemente do tumor de cabeça de pâncreas, é muito bom, inclusive
curável. A sobrevida em 5 anos é cerca de 50%. Quando diagnosticado precocemente é curável. Nos casos de
metástase hepática, à sobrevida mediana é de 1 ano.
2
OBS : Quando se refere ao prognóstico de um tumor qualquer, deve-se sempre pensar em sobrevida em 5 anos.
Quando o paciente apresenta uma sobrevida superior a 5 anos, considera-se que esse paciente tem chance de cura.

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Arlindo Ugulino Netto – CIRURGIA ABDOMINAL– MEDICINA P7 – 2010.2

MED RESUMOS 2011


ELOY; Yuri Leite; NETTO, Arlindo Ugulino.
CIRURGIA ABDOMINAL

TUMORES DE CÉLULAS DAS ILHOTAS PANCREÁTICAS


(Professor Felipe Rocha)

As células das ilhotas pancreáticas são responsáveis pela produção de hormônios, insulina e glucagon. Esses
tumores podem ser classificados levando em consideração dois aspecto principais, (1) funcionantes ou não
funcionantes, e (2) malignos ou benignos. Epidemiologicamente registrou-se que a maioria desses tumores são
funcionantes, ou seja, produtores de hormônios, e benignos.

TUMORES F UNCIONANTES
Dos tumores funcionantes beninos, o mais importante é o insulinoma. O insulinoma é o tumor produtor de
insulina, e, além disso, é o mais freqüente. Em 75% dos casos é benigno.
O insulinoma, ainda pode ser considerado uma manifestação de doença pancreática multifocal. Isso ocorre, por
exemplo, em doenças em que há vários corpos no pâncreas de tumores produtores de insulina e de outros hormônios, e
o insulinoma é uma manifestação dessa doença. Entre as doenças mais comuns temos: adenomatose, nesidioblastose e
a neoplasia Endócrina Múltipla tipo I (MEN-1 - adenoma de paratireóide, adenoma hipofisário e tumor de células das
ilhotas).

QUADRO CL…NICO
Esses pacientes vão apresentar sinais e sintomas de hiperinsulinemia, ou seja, sintomas de hipoglicemia. Os
sinais e sintomas nesses pacientes caracterizam a tríade de Whiplle, que consiste em: presença de sintomas de
hipoglicemia em jejum, (2) ocorrendo com glicemia menor que de 50mg/dl e (3) com administração de injeção de glicose,
há melhora dos sinais e sintomas.

DIAGN†STICO
O quadro clínico com tríade de Whiplle não confirma o diagnóstico, mas apenas sugere, sendo necessária a
realização de outros exames.
O exame que deve ser feito é o teste diagnóstico, ou seja, realiza-se uma dosagem de insulina do plasma, e
através dela faz-se uma relação da insulina e glicose. Se essa relação for maior que 0,3, podemos diagnosticar o
insulinoma.
Níveis elevados de insulina ocorrem devido à própria condição tumoral, mas não necessariamente a insulina
sérica estará elevada. Com isso, podemos dizer que níveis normais de insulina não afasta o diagnóstico de insulinoma.

DIAGN†STICO T OPOGR‰FICO
Após realizado o diagnóstico de insulinoma, deve-se localizar o tumor. É um tumor de difícil localização, devido
ao seu tamanho, muitas vezes menor que 1 cm. Com isso, o método mais utilizado é a ultrassonografia intra-
operatória, ou seja, durante a cirurgia realiza-se uma ultrassonografia do pâncreas e localiza-se o tumor (nódulo). A
USG intraoperatória só deve ser indicada com teste prévio, ou seja, relação da insulina plasmática e glicose maior que
0,3.

TRATAMENTO
Se a doença é benigna em 75% dos casos não é necessário ressecar todo o pâncreas: faz-se apenas uma
enucleação guiada por um ultrassom. Assim deve-se realizar a USG intra-operatória e, no local, realiza-se a enucleação.
Nos casos em que não pode ser realizada a cirurgia ou que a cirurgia não será curativa, como ocorre nos casos
de insulinoma maligno, em que há metástase para o fígado, deve-se priorizar o tratamento farmacológico. O
tratamento está baseado em melhorar as crises de hipoglicemia do paciente com insulinoma maligno. A mais utilizada é
a Estreptozotocina.

200
Arlindo Ugulino Netto – CIRURGIA ABDOMINAL– MEDICINA P7 – 2010.2

MED RESUMOS 2012


NETTO, Arlindo Ugulino.
CIRURGIA ABDOMINAL

TUMOR DE VESÍCULA BILIAR


(Professor Marcelo Gonçalves)

O c…ncer de ves„cula biliar ‚ um tipo relativamente incomum de c…ncer, muito embora seja o tumor mais comum
do trato biliar e o quinto c…ncer mais comum do trato gastrointestinal.
Em resumo, a incidƒncia de c…ncer da ves„cula biliar n•o ‚ bem conhecida, por‚m aumenta com a idade em
ambos os sexos. A presen€a de c†lculos ‚ considerada um fator de risco importante para o c…ncer da ves„cula. O
diagn‡stico prediz mau progn‡stico com sobrevida em cinco anos, variando de 3 a 5% na maioria das s‚ries. A
sobrevida m‚dia para pacientes que n•o s•o submetidos ‹ ressec€•o varia entre dois e seis meses.

FATORES ETIOL†GICOS
Os principais fatores etiol‡gicos que tamb‚m podem ser determinados como fatores de risco para o tumor de
ves„cula biliar s•o:
 C†lculos biliares (80%): ‚ o principal fator de risco relacionado com o tumor de ves„cula biliar. Leva cerca de 10 a 15 anos
para que ocorra a evolu€•o desde a les•o da mucosa pelos c†lculos, metaplasia de mucosa, displasia e, por fim,
adenocarcinoma.
 Pacientes portadores de colecistite crŒnica e colecistite de repeti€•o s•o aqueles que enquadram o principal grupo
de risco para neoplasia de via biliar.
 A ves„cula em porcelana (impregna€•o de c†lcio na parede da ves„cula decorrente da inflama€•o crŒnica da
ves„cula biliar) tamb‚m est† relacionada com uma maior propens•o para o desenvolvimento de tumor de ves„cula
biliar.
 Fatores ‚tnicos: os principais grupos raciais expostos a maiores riscos para desenvolver tumor de ves„cula biliar s•o: „ndios
do sudoeste americano, japoneses, nativos do Alasca, mexicanos, bolivianos.
 Agentes carcinogƒnicos: nitrosaminas.
 Retocolite ulcerativa: ligada com maiores riscos para c…ncer de intestino, tumor de ves„cula biliar e de via biliar.
 Presen€a de tumores benignos: p‡lipos que antecedem a forma€•o do adenocarcinoma.
 F„stula colecistoent‚rica: passagem anŒmala entre a ves„cula e o duodeno (ou jejuno) decorrente de uma inflama€•o crŒnica
da ves„cula biliar.
 Implanta€•o alta do ducto pancre†tico: isso predisp‰e o refluxo de suco pancre†tico para a ves„cula, funcionando como um
importante fator de risco para o c…ncer de ves„cula biliar.

ASPECTOS PATOL†GICOS
O tumor de ves„cula biliar ‚ o mais comum de todo o sistema biliar. Sua principal forma de apresenta€•o se faz
na forma de espessamento da parede da ves„cula biliar com a forma€•o de massa na luz da ves„cula. Seu principal fator
de etiol‡gico ‚ a colelitíase, principalmente quando c†lculos maiores do que 2cm est•o presentes.
Seu comportamento e principais caracter„sticas podem ser resumidos da seguinte forma:
 A irrita€•o crŒnica da parede da ves„cula causada pelo c†lculo predisp‰e ao aparecimento de inflama€•o, que
evolui com metaplasia, displasia e, por fim, a neoplasia. Esta ‚ uma das principais raz‰es que obrigam a
realiza€•o da colecistectomia diante de uma colelit„ase (al‚m do maior risco de pancreatite, coledocolit„ase,
colangite, abscesso hep†tico, etc.).
 P‡lipos maiores do que 1cm apresentam maior propens•o (88%) a desenvolver neoplasia de ves„cula biliar (os
p‡lipos com menos de 1cm n•o s•o tumorais e, geralmente, s•o formados por colesterol). Por esta raz•o, diante
do achado de p‡lipos biliares com mais de 1cm, tem-se a indica€•o absoluta para a realiza€•o da
colecistectomia. Diferentemente disto, p‡lipos menores que 0,5cm devem ser acompanhados; para p‡lipos com
dimens‰es 0,5-1cm e que tiverem associa€•o com colelit„ase, tamb‚m deve-se retirar a ves„cula.
 Cerca de 80% dos casos de tumores s•o sincrŒnicos (isto ‚: existƒncia de dois ou mais tumores
simultaneamente neste ‡rg•o) devido ‹ irrita€•o difusa que os c†lculos provocam na ves„cula.
 A regi•o do fundo da ves„cula ‚ o s„tio mais comum de desenvolvimento do c…ncer.
 Cerca de 88% dos pacientes morrem no primeiro ano de vida. Isso geralmente ocorre devido ao diagn‡stico
tardio. Na maioria das vezes, o paciente interpreta o quadro como uma dispepsia ou “pedra” na ves„cula.
 Podem apresentar trƒs padr‰es de apresenta€•o:
 Massa: ‚ o padr•o mais comum (40 – 65%): mostra-se como uma les•o de realce heterogƒneo pela presen€a de
necrose.
 Espessamento focal ou difuso (20 – 30%): se mostra como espessamento da parede da ves„cula (estabelece
diagn‡stico diferencial com colecistite devido ‹ presen€a de linfonodomegalias no hilo hep†tico confirmadas pelo
exame de congela€•o intra-operat‡rio).
 Lesão intraluminal (15 – 25%): les•o menos comum causada por tumores localizados e bem diferenciados.

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Arlindo Ugulino Netto – CIRURGIA ABDOMINAL– MEDICINA P7 – 2010.2

TUMORES MALIGNOS DA VESÍCULA BILIAR


Do ponto de vista patol‡gico, 99% dos tumores de ves„cula s•o malignos, sendo o carcinoma a sua forma mais
comum. Como vimos anteriormente, representa o 5˜ tumor mais comum do trato gatrointestinal e o mais comum da via
biliar. Suas principais caracter„sticas s•o:
 ˆ respons†vel por 2% das cirurgias dos ductos biliares.
 Cerca de 0,4 a 2,4% das colecistectomias apresentam tumor da ves„cula mostrado pelo estudo an†tomo-
patol‡gico p‡s-operat‡rio.
 ˆ mais comum na 7— d‚cada de vida.
 Enquanto que o tumor na via biliar ‚ mais comum no sexo masculino, o tumor de ves„cula ‚ mais comum no
sexo feminino (2:1 a 6:1)
 De todos os pacientes que s•o submetidos a uma cirurgia envolvendo a ves„cula, cerca de 1 a 3% apresentam
tumor de ves„cula.
 Do ponto de vista histo-patol‡gico, a forma mais comum ‚ o adenocarcinoma (80 – 95%), seja na forma
infiltrante (mais agressivo) ou vegetante (com aspecto em couve-flor). A maior parte da parcela restante dos
tumores de ves„cula ‚ compreendida pelo carcinoma indiferenciado (7%).
 Formas de dissemina€•o: por contiguidade (para o f„gado), por via linf†tica (para linfonodos peri-hilares) e
peritoneal (promovendo uma carcinomatose peritoneal).

TUMORES BENIGNOS
Representam cerca de 1% dos tumores de ves„cula biliar, sendo a maioria deles se apresentando na forma de
aglomerados de colesterol, que formam p‡lipos. Geralmente, quando menores que 0,5cm, n•o s•o preocupantes, e
podem ser observados clinicamente. Quando maiores que 0,5cm e menores 1cm, devem ser observados e, quando
associados † colelit„ase, devem ser retirados junto da ves„cula (colecistectomia). Quando s•o maiores que 1cm, muito
provavelmente, est•o relacionados com o adenocarcinoma de ves„cula biliar, e a ves„cula deve ser retirada.
Os tumores benignos da ves„cula podem ser classificados segundo a an†lise an†tomo-patol‡gica em:
 Origem epitelial: papiloma (respons†veis por 1 a 8,5% das colecistectomias), adenoma ou cisto-adenoma.
 Origem conjuntiva: miomas, fibromas, mixomas.

QUADRO CL…NICO
A sintomatologia do tumor na ves„cula biliar ‚ semelhante ao quadro de colecistite aguda: normalmente o
paciente se apresenta apenas com uma queixa de c‡lica biliar, simulando uma colecistite aguda (o que dificulta o
diagn‡stico precoce). Portanto, de uma forma geral, temos:
 Dor em hipocŒndrio direito e epig†strio (79%)
 Perda de peso (56%)
 Icter„cia (48%): decorrente da compress•o direta da ves„cula sobre a via biliar, invas•o dos linfonodos do hilo
hep†tico e compress•o da via biliar por eles ou por invas•o direta das vias biliares por continuidade. A icter„cia
obstrutiva causa o quadro de colestase (icter„cia, colŠria e acolia fecal).
 Anorexia (40%)
 N†useas, vŒmitos e febre (a presen€a de febre nos remete a duas hip‡fises: abscesso de ves„cula ou de f„gado
e colangite aguda);
 Dura€•o dos sintomas: cerca de 2 a 4 meses.

DIAGN†STICO
Diante de um paciente ict‚rico, devemos solicitar hemograma, bilirrubina total e fra€‰es, gama-GT, fosfatase,
TGO, TGP e coagulograma. Se estes exames se mostrarem alterados e o paciente apresentar dor, prurido e acolia fecal,
mesmo sem fatores de risco epidemiol‡gicos para v„rus, alcoolismo, drogas ou sinais de insuficiƒncia hep†tica, devemos
proceder com ultrassonografia de fígado e vias biliares. Se este determinar dilata€•o de vias biliares, tem-se o
diagn‡stico de icter„cia obstrutiva por colestase extra-hep†tica.
Portanto, a USG de f„gado e via biliar deve ser o primeiro exame a ser requisitado diante de uma suspeita cl„nica
de icter„cia obstrutiva. A pr‡pria USG pode mostrar dados que remetem ‹ neoplasia de ves„cula biliar (massa dentro da
ves„cula, espessamento da parede) que, quando presente, devemos proceder com a tomografia para estadiamento.
Por vezes, o paciente apresenta toda a cl„nica sugestiva de colecistite e a pr‡pria USG mostra ind„cios de
inflama€•o de ves„cula, o que indica a cirurgia. Nestes casos, o diagn‡stico de c…ncer de ves„cula ‚ intraoperat‡rio, e
pode ser necess†rio ampliar a cirurgia que inicialmente seria feita pra tratar a colecistite.
De um modo geral, o diagn‡stico do tumor na ves„cula biliar ‚ obtido com a associa€•o dos seguintes fatores:
 Exame físico: sinais sugestivos de icter„cia obstrutiva, hepatomegalia e ascite, nodula€‰es hep†ticas (como
sinal de neoplasia avan€ada).

202
Arlindo Ugulino Netto – CIRURGIA ABDOMINAL– MEDICINA P7 – 2010.2

 USG: primeiro exame a ser solicitado. Se este determinar dilata€•o dos ductos hep†ticos, sugerimos o
diagn‡stico de colestase extra-hep†tica. Em caso de dŠvida, devemos solicitar outros exames, como os que
ser•o citados logo adiante.
 Colangio-RNM
 Tomografia: exame essencial para estadiamento do c…ncer de ves„cula
 CPRE: indicada para a passagem de pr‡tese e desobstru€•o da via biliar em casos de tumor irressec†vel de
ves„cula biliar como medida paliativa.
 Colangiografia transparieto-hepática (CTPH): tem a fun€•o de diagnosticar e drenar a via biliar em casos
de obstru€•o do hilo hep†tico pela ves„cula, incapacitando o efeito da CPRE.
 Ultrassonografia endoscópica (USE): dificilmente indicada.
 Punção por agulha fina: pode ser uma op€•o utilizada para a realiza€•o de bi‡psia em pacientes com
les‰es aparentemente irressec†veis.
 Angio-RNM ou angio-CT: podem ser requisitadas em caso de dŠvida de uma potencial invas•o da veia
porta ou da art‚ria hep†tica.
 Dosagem do CA 19-9: se este marcador estiver muito elevado, significa dizer que a neoplasia se encontra
em est†gio avan€ado. Contudo, seu aumento n•o ‚ espec„fico para tumor de ves„cula. Portanto, n•o serve
como um par…metro diagn‡stico, mas sim, de progn‡stico e seguimento (se ap‡s a cirurgia este marcador
voltar a aumentar, ‚ sinal de recidiva tumoral).

Apesar de todos estes par…metros diagn‡sticos que podem ser utilizados, o diagn‡stico pr‚-operat‡rio acontece
em menos de 20% dos pacientes. Geralmente, o diagn‡stico acontece de surpresa, durante o intra-operat‡rio ou com
diagn‡stico an†tomo-patol‡gico (depois da retirada da mesma). Destes pacientes com diagn‡stico intra-operat‡rio, cerca
de 50 – 75% j† apresenta comprometimento linfonodal e/ou invas•o hep†tica pelo tumor – o que n•o acontece na maior
parte dos casos com diagn‡stico p‡s-operat‡rio pelo an†tomo-patol‡gico.

ESTADIAMENTO
Podemos estadiar o tumor de ves„cula por meio de duas classifica€‰es diferentes.

Estadio Extensão da lesão


I Intramucosa
II Mucosa e muscular
III Mucosa, muscular e serosa
IV Mucosa, muscular, serosa e g…nglios c„sticos
V F„gado ou qualquer outro ‡rg•o

Tumor
Tis Carcinoma in situ
T1 Invas•o de mucosa e muscular
T1a Invade mucosa
T1b Invade muscular
T2 Invas•o de serosa
T3 Perfura a serosa e invade ‡rg•o adjacente (f„gado < 2cm)
T4 Invade f„gado (> 2cm) e mais um ‡rg•o adjacente
Gânglios linfáticos
N0 Ausƒncia de met†stases ganglionares
N1 Invas•o de g…nglio cel„aco e g…nglios h„lares
N2 Invas•o de g…nglios cel„acos, periportais, periduodenais, peripancre†ticos, a‡rticos, mesent‚rios
Metástases à distância
M0 Sem invas•o de ‡rg•os a dist…ncia
M1 Invas•o de ‡rg•os ‹ dist…ncia (incluindo met†stases hep†ticas por contiguidade) e linfonodos interaortocava

TRATAMENTO
Apenas 10 – 30% dos pacientes s•o candidatos ‹ ressec€•o cirŠrgica. Para o restante, podemos lan€ar m•o
apenas de medidas paliativas. A quimioterapia e radioterapia apresentam impacto muito pouco expressivo.
Os pacientes candidatos a cirurgia e que apresentam chances de cura s•o, principalmente, aqueles cujo
diagn‡stico foi obtido atrav‚s da an†lise an†tomo-patol‡gica ap‡s a ressec€•o da mesma. Quando o tratamento ‚
institu„do para os casos iniciais, a sobrevida ‚ de quase 100% em 5 anos. Quanto maior a invas•o, menor ‚ a sobrevida.

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Arlindo Ugulino Netto – CIRURGIA ABDOMINAL– MEDICINA P7 – 2010.2

A cirurgia é a única opção com possibilidade curativa. A via deve ser laparotômica (nenhum trabalho mostra que
a laparoscopia é válida para o tratamento do câncer de vesícula). Devemos levar em consideração ainda que a presença
de linfonodos acometidos entre a aorta e a veia cava representa metástase (M1), e o tratamento deve ser paliativo.
Desta forma, temos:
Estadio Conduta
Estadio I ou T1a Colecistectomia simples
Estadio II ou T1b Colecistectomia com linfadenectomia regional e ressecção do leito (hepatectomia)
Estadio III ou IV / T2 ou T3 Ressecção ampliada
Estadio V / T4 / M1 Paliação cirúrgica, trans-parietal ou endoscópica (CPRE)

Portanto, se o paciente foi submetido a uma colecistectomia e o exame anátomo-patológico indicou tumor com
invasão intra-mucosa, podemos considerar o paciente como tratado. Entretanto, se o tumor ultrapassou a camada
muscular, devemos voltar ao ato operatório e proceder com a linfadenectomia e ressecção do leito (área hepática onde
repousa da vesícula).
Se o paciente apresenta invasão
de mucosa, muscular e serosa, devemos
submetê-lo a uma ressecção ampliada,
que consiste na retirada da vesícula,
linfadenectomia e retirada de todo o
segmento hepático onde está localizada
a vesícula (segmentos hepaticos IV e V).
Paciente portador de câncer de
vesícula com estádio V, T4 ou M1
(estadios avançados, que demonstram
metástase ou acometimento de
linfonodos interaortocava) deve ser
submetido a uma paliação cirúrgica, que
consiste na derivação cirúrgica ou
endoscópica do fluxo biliar (caso o
paciente apresente icterícia obstrutiva).
Caso o paciente não apresente icterícia
obstrutiva, não deve ser indicado para
nenhum tipo de tratamento.
1
OBS : Em caso de hepatectomias mais extensas, podemos deixar até 30% de massa hepática que o órgão ainda é
capaz de regenerar (cerca de 85% em 1 mês).

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Arlindo Ugulino Netto – CIRURGIA ABDOMINAL– MEDICINA P7 – 2010.2

MED RESUMOS 2012


NETTO, Arlindo Ugulino.
CIRURGIA ABDOMINAL

C’NCER DOS DUCTOS BILIARES


(Professor Marcelo Gonçalves)

Os colangiocarcinomas (ou carcinomas de vias biliares, tipo


histológico mais comum dos tumores da via biliar) é conhecido a mais de
um século, tendo sido descrito por Musser em 1889, que relatou 18 casos
de câncer das vias biliares extra-hepáticas. Em 1936, Stewart e
colaboradores publicaram uma revisão de 306 casos de tumores primários
das vias biliares extra-hepáticas descritos na literatura mundial. Já os
tumores de vias biliares intra-hepáticas e peri-hilares foram descritos mais
recentemente, tendo Altemeier e colaboradores descrito três casos de
adenocarcinomas primários dos ductos biliares intra-hepáticos em 1957, e
em 1965, Klatskin descreveu 13 casos de pacientes que apresentavam
câncer na confluência dos ductos hepáticos, estimulando o interesse por
esses tumores incomuns, que após essa publicação passaram a ser
denominados tumores de Klatskin. Desde então os colangiocarcinomas têm
sido motivo de preocupação aos cirurgiões.

EPIDEMIOLOGIA
Os tumores das vias biliares representam tumores raros, com incidência de 1 a 2 casos por 100000 habitantes
(marcadamente inferior à incidência da vesícula). Há aproximadamente 4000 novos casos/ano nos EUA (no Brasil, as
estatísticas são muito pouco confiáveis).
Representam apenas 2% de todos os tumores malignos, tendo uma maior prevalência entre a 6ª e a 7ª décadas
de vida. A incidência é similar em ambos os sexos, um pouco maior em homens.

CLASSIFICA•„O
O colangiocarcinoma pode ser classificado de duas formas:
 Quanto “ altura do c‰ncer:
Basicamente, podemos como tumor de via biliar intra-hepático e extra-
hepático. Da porção extra-hepática, podemos dividir em terço proximal
(entre os ductos hepáticos e a confluência do ducto cístico com o ducto
hepático comum), terço médio (que se estende desde a confluência do
ducto cístico com o hepático até o início da porção pancreática do
colédoco) e distal (porção pancreática do colédoco e junção hepato-
duodenal).
A localização mais comum dos tumores da via biliar é a localização
superior (terço proximal) da porção extra-hepática. Quando o tumor se
localiza na confluência dos ductos hepáticos, tem-se o tumor de
Klatskin.

 Quanto “ obstru€•o biliar (para os tumores de ter€o proximal ou Tumor de Klatskin):

I – Obstrução do ducto hepático comum, proximal à sua confluência com o


cístico (sem invadir a confluência dos ductos hepáticos).
II – Ducto hepático comum e confluência dos ductos hepáticos.
IIIa – Obstrução da confluência e do ducto hepático direito.
IIIb – Obstrução da confluência e do ducto hepático esquerdo.
IV – Obstrução dos ductos hepáticos comum, direito e esquerdo ou obstrução
dos ductos hepáticos direito e esquerdo e do colédoco.

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Arlindo Ugulino Netto – CIRURGIA ABDOMINAL– MEDICINA P7 – 2010.2

FATORES PREDISPONENTES
 Colangite esclerosante: est† relacionada com a retocolite ulcerativa (representando um fator predisponente tanto
para o tumor de ves„culo biliar, ductos biliares e c…ncer colorretal).
 Lit„ase intra-hep†tica (c†lculo nas vias biliares intra-hep†ticas).
 Dilata€•o c„stica das vias biliares.
 Cisto de col‚doco (doen€a de Caroli)
 Retocolite ulcerativa
 Infec€•o crŒnica por Giardia lamblia

PATOLOGIA
O tipo histol‡gico mais comum dos tumores das vias biliares ‚ o carcinoma que, quando localizado na via biliar,
‚ designado como colangiocarcinoma. ˆ caracterizado por evolu€•o lenta e pode ser classificado a partir das seguintes
apresenta€‰es: esquirroso (difuso na via biliar, que dificilmente causa estenose da mesma em fases precoces),
estenosantes (que promovem estenose da via biliar logo na fase precoce de instalaۥo) e papilares (caracterizado pela
forma€•o de papilas e vegeta€‰es).
A maioria dos casos de tumor das vias biliares ‚ de localiza€•o extra-hep†tica (apenas 10% dos casos s•o intra-
hep†ticos e quando assim localizados, est•o associados principalmente ‹ lit„ase intra-hep†tica). Cerca de 40 – 60% dos
casos localizam-se no ter€o proximal da via biliar (tumor de Klatskin) e menos de 10% ‚ multifocal (isto ‚ sincrŒnico,
diferentemente do tumor de ves„cula biliar, em que cerca de 80% s•o sincrŒnicos). Isto significa que: se h† um tumor em
ter€o distal de via biliar, muito dificilmente haver† outro tumor simult…neo em outra parte da via.
Mais de 1/3 dos casos j† apresentam met†stases linfonodais ao diagn‡stico (isto ‚: em boa parte dos casos,
quando o paciente se mostra ict‚rico decorrente de obstru€•o do fluxo biliar por tumor, este j† se disseminou por via
1
linf†tica). Al‚m disso, pode ocorrer infiltra€•o ductal e invas•o precoce de ‡rg•os adjacentes (ver OBS ).
1
OBS : Dos tumores periampulares (representados pelo colangiocarcinoma, tumor de cabe€a de p…ncreas, tumor de
ampola e tumor de duodeno), o de pior progn‡stico ‚ o da cabe€a do p…ncreas, sendo imediatamente seguido do
colangiocarcinoma.

C ONCEITOS
Alguns conceitos cl†ssicos sobre o colangiocarcinoma ca„ram por terra, principalmente no que diz respeito ao
seu diagn‡stico: com a maior disponibilidade de m‚todos diagn‡sticos mais avan€ados (colangio-RNM, CPRE, CTPH,
USE), seu diagn‡stico est† cada vez mais poss„vel. Al‚m disso, do ponto de vista curativo, a cirurgia tornou-se o
procedimento padr•o, sendo capaz de curar o paciente se realizada com a t‚cnica adequada. Contudo, o tumor ainda ‚
considerado raro.
Diante do exposto, podemos destacar o seguinte quadro comparativo entre os conceitos cl†ssicos e atuais sobre
o colangiocarcinoma.

Conceitos clássicos Conceitos atuais


 Les•o rara  Les•o rara
 Dif„cil diagn‡stico  Avan€o nos m‚todos diagn‡sticos
 Dif„cil confirma€•o histol‡gica  Melhor capacidade para realiza€•o de bi‡psias
 Ressec€•o curativa muito rara  Aperfei€oamento t‚cnico (cirurgia)
 Drenagem externa era a conduta preferida  Tratamento cirŠrgico ‚ a conduta preferida

C•NCER DA VIA BILIAR P ROXIMAL


A via biliar proximal ‚ o s„tio mais frequente de instala€•o
tumoral para esta estrutura. O c…ncer, nesta localidade (chamado
de tumor de Klatskin), cresce para as vias biliares intra-hep†ticas e
pode invadir o parƒnquima hep†tico (principalmente o segmento I,
representado pelo lobo caudado, onde repousa a via biliar principal).
Geralmente, este tumor invade as estruturas do hilo
hep†tico, como a via porta e a art‚ria hep†tica. Por esta raz•o, ‚ um
tumor de baixa ressecabilidade.
A sintomatologia espec„fica causada por um tumor nesta
localidade tamb‚m recebeu o epŒnimo de síndrome de Klatskin, e
4
est† devidamente exposta na OBS .

206
Arlindo Ugulino Netto – CIRURGIA ABDOMINAL– MEDICINA P7 – 2010.2

QUADRO CL…NICO
O principal sinal provocado pelo colangiocarcinoma é a icterícia. A icterícia de portadores de tumor da via biliar
não é acompanhada de dor súbita em hipocôndrio direito nem de colangite. Geralmente, caracteriza-se por uma icterícia
obstrutiva de caráter progressivo, associada a perda de peso e poucos sintomas de dor. Nestes casos, o paciente
demora a procurar ajuda médica.
De um modo geral, a sintomatologia causada pelo colangiocarcinoma é caracterizada por:
 Colestase: icterícia (progressiva) + colúria + acolia fecal
 Dor abdominal
 Prurido
 Febre (pode estar relacionada à colangite ou à abscesso hepático)
 Perda de peso
 Sinais de doença avançada
 Quadro relacionado aos fatores de risco: retocolite associada, parasitoses, litíase intra-hepática.
2
OBS : A icterícia característica do colangiocarcinoma é de evolução progressiva, como vimos anteriormente.
Diferentemente da coledocolitíase e do tumor de papila de duodeno, que provocam icterícia flutuante.
3
OBS : Durante a avaliação clínica do paciente, devemos saber identificar sinais e sintomas que, em conjunto, possam
caracterizar síndromes que cursam com icterícia obstrutiva, tais como:
 Síndrome de Bard-Pic. Estudo clínico realizado em 1888 seguido de autopsias de sete pacientes com tumor na
cabeça do pâncreas caracterizou esta síndrome, que consiste em:
 Icterícia obstrutiva.
 Tumor na cabeça do pâncreas
 Vesícula biliar palpável
 Síndrome de Courvoisier-Terrier: estudo clínico realizados em 1890 seguido de autopsias de pacientes
ictéricos caracterizou esta síndrome (que deu nome ao sinal semiológico), concluindo pelos seguintes achados:
 Icterícia Obstrutiva.
 Tumor periampular (qualquer um deles).
 Vesícula Biliar distendida, palpável (ou impalpável, se envolvida em fibrose, como na litiase biliar) e
indolor.
Embora sejam semiologicamente semelhantes, a síndrome de Courvoisier-Terrier diferencia-se da síndrome de Bard-Pic
pois ela não apresenta, obrigatoriamente, um tumor na cabeça do pâncreas (o que caracteriza a síndrome de Bard-Pic).
Contudo, na maioria dos casos, pacientes com Courvoisier-Terrier apresentam tumor na cabeça do pâncreas (uma vez
que este é um dos tumores periampulares mais comuns).
4
OBS : A síndrome de Klatskin, por sua vez, é caracterizada por:
 Icterícia obstrutiva (crescente e total)
 Presença de tumor na convergência dos ductos hepáticos
 Acolia fecal
 Vesícula vazia (pois o tumor está localizado antes do ducto cístico)
 Sem colangite
 Acomete mais o sexo masculino (o feminino é mais acometido por tumor de vesícula biliar)

DIAGN†STICO
Diante de um paciente ictérico, devemos solicitar hemograma, bilirrubina total e frações, gama-GT, fosfatase,
TGO, TGP e coagulograma. Se estes exames se mostrarem alterados devemos proceder com ultrassonografia de
fígado e vias biliares. Se este determinar dilatação de vias biliares, tem-se o diagnóstico de icterícia obstrutiva por
colestase extra-hepática.
Portanto, a USG de fígado e via biliar deve ser o primeiro exame a ser requisitado diante de uma suspeita clínica
de icterícia obstrutiva. A própria USG pode mostrar dados que remetem à neoplasia de vesícula biliar (massa dentro da
vesícula, espessamento da parede) que, quando presente, devemos proceder com a tomografia para estadiamento.
De um modo geral, o diagnóstico do tumor na via biliar é obtido com a associação dos seguintes fatores:
 Exame físico: sinais sugestivos de icterícia obstrutiva, hepatomegalia e ascite, nodulações hepáticas (como sinal de
neoplasia avançada).
 Ultrassonografia (USG): primeiro exame a ser solicitado. Permite a visualização da dilatação da árvore biliar intra e
extra-hepática. Contudo, é pouco específica para avaliar a presença do tumor em via biliar ou da massa hepática (devido
à presença de alças e outros órgãos por sobre a topografia da via). A associação da USG com a tomografia é essencial
para o diagnóstico.
 Tomografia: consiste na melhor opção para diagnóstico e estadiamento. Ela permite observar a dilatação da árvore biliar
(intra e extra-hepática) e pode mostrar o efeito massa, ascite e carcinomatose peritoneal. Em 30% dos casos, podemos
observar pela TC dilatação da via biliar sem visualização da massa. Para estes pacientes, devemos indicar uma colangio-
RNM.

207
Arlindo Ugulino Netto – CIRURGIA ABDOMINAL– MEDICINA P7 – 2010.2

 Ressonância nuclear magnética: permite avaliar, de maneira precisa, a dilatação da via biliar (intra e extra-hepática).
Para avaliar o tumor, é semelhante à tomografia. Contudo, tem vantagens por poder ser associada à colangio-RNM e à
angio-ressonância, permitindo uma avaliação mais acurada das estruturas do hilo hepático e os tumores em via biliar
proximal (Klatskin).
 Colangiografia (CPRE): é o melhor exame para diagnóstico e programação cirúrgica (pois permite a biópsia do tumor ou
escovado da lesão). A positividade, entretanto, é baixa (no máximo, 62% de sensibilidade). É praticamente substituído
pela colangio-RNM e deve ser utilizada quando se tem dúvida diante dos demais exames. Portanto, no que diz respeito à
CPRE, é necessário ressaltar os seguintes pontos:
 A CPRE não é fundamental para o diagnóstico.
 Não é necessária para o estadiamento.
 A CPRE só deve ser usada como medida pré-operatória para tratar icterícia em pacientes inoperáveis do ponto
de vista clínico (com sinal de metástase) ou para tratar colangite antes de submeter o paciente à cirurgia.
 Em casos irressecáveis, a melhor opção é a cirurgia, e não a CPRE. Contudo, a cirurgia está mais associada à
morbidade. A segunda opção poderia ser a endoscopia, por ser um procedimento mais rápido. Contudo, se o
paciente apresenta boa condição clínica, o melhor a se fazer é a cirurgia.
 Ultrassonografia endoscópica (USE): aumenta o poder da avaliação, pois determina o ponto em de invasão do tumor
de via biliar. Além disso, ela permite a realização de biópsia para confirmação histológica.
 Dosagem do CA 19-9: se este marcador estiver muito elevado, significa dizer que a neoplasia se encontra em estágio
avançado. Contudo, seu aumento não é específico para tumor de via biliar (pode estar aumentado, por exemplo, no tumor
vesícula biliar, como vimos no Capítulo anterior, e no tumor do câncer de pâncreas). Portanto, não serve como um
parâmetro diagnóstico, mas sim, de prognóstico e seguimento (se após a cirurgia este marcador voltar a aumentar, é sinal
de recidiva tumoral).
 Bioquímica do sangue: caracteriza uma icterícia obstrutiva.

T RATAMENTO Tipo Conduta


Atualmente, se o tumor é
ressecável, a melhor opção para Ressecção local
resultados curativos é a cirurgia. Caso +
contrário, a possibilidade de o tratamento
Drenagem biliodigestiva
surtir efeito é muito baixa. Em resumo, os
+
objetivos da cirurgia são, basicamente,
Linfadenectomia
dois: (1) ressecção completa do tumor
Tipo I
com margens livres; (2) restabelecimento
do trânsito biliar.
O tratamento do tumor de vias Ressecção local
+
biliares é dividido em duas modalidades:
Linfadenectomia
o curativo e o paliativo. O tratamento
+
cirúrgico é a única forma terapêutica
Ressecção do lobo caudado
curativa. Já o tratamento paliativo, por Tipo II
sua vez, pode ser realizado por Hepatectomia
endoscópio, por drenagem percutânea (direita para o IIIa / esquerda para o IIIb)
ou por cirurgia. O tratamento paliativo +
tem por objetivo a drenagem biliar para Ressecção da via biliar
alivio dos sintomas (colangite). +
O resumo do tratamento, a Linfadenectomia
depender do tipo de colangiocarcinoma, +
Tipo IIIa ou IIIb
está disponível na tabela ao lado. Ressecção do lobo caudado

FATORES PROGNÓSTICOS
Os seguintes fatores determinam
um pior ou melhor prognóstico: Tratamento paliativo
 Ressecção completa com (drenagem transparieto hepática)
margens livres é sinal de bom
prognóstico Tipo IV
 A presença de invasão vascular, Tumor em Ressecção local + Drenagem biliodigestiva +
múltiplos nódulos ou linfonodos terço médio Linfadenectomia
comprometidos são sinais de pior
Tumor em Duodenopancreatectomia
prognóstico. Caso contrário,
terço distal (mesma cirurgia para tumor de cabeça do pâncreas)
temos condições de bom
Doença irressecável Quimiorradioterapia, quimioterapia
prognóstico.
Doença metastática ou medidas de suporte

208
Arlindo Ugulino Netto – CIRURGIA ABDOMINAL– MEDICINA P7 – 2010.2

5
OBS : Para os pacientes com bilirrubina total alta (principalmente acima de 10mg/dl), com colangite e com m†s
condi€‰es cl„nicas, pode ser necess†ria uma drenagem pr‚-operat‡ria, que pode ser feita tanto por CPRE como por
colangio-transparieto-hep†tica (CTPH).

TRATAMENTO PALIATIVO CIRÚRGICO x TRATAMENTO PALIATIVO ENDOSCÓPICO


Estudos foram realizados para tentar comprovar qual seria o melhor m‚todo terapƒutico paliativo para o
paciente: endosc‡pico ou cirŠrgico. Os resultados est•o dispon„veis na tabela abaixo:
Anastomose cirúrgica Prótese implantada por CPRE
Sucesso da drenagem 94% 95%
Diminuição da colestase 92% 92%
Mortalidade 14% 3% (p<0,01)
Complicações 29% 1% (p<0,02)
Tempo de internação 26 dias 20 dias
Icterícia 2% 36%
Obstrução gástrica 7% 17%

Portanto, atrav‚s da cirurgia, obtemos resultados bons em longo prazo; contudo, a morbidade e mortalidade s•o
maiores quando comparadas ‹ endoscopia. Portanto, se o paciente se apresentar muito ruim do ponto de vista cl„nico, ‚
mais prudente optar, inicialmente, pela endoscopia paliativa. Caso contr†rio, a melhor op€•o continua sendo a cirurgia.

C ONSIDERA•‚ES F INAIS
A cirurgia ‚, atualmente, o Šnico tratamento potencialmente curativo dos carcinomas de vias biliares; mas,
infelizmente, a maioria dos pacientes se apresenta com doen€a avan€ada, frequentemente irressec†vel. De fato, ao
diagn‡stico, cerca de 80 – 90% dos pacientes s•o candidatos apenas ‹ palia€•o. Dos 10 – 20% candidatos ‹ cirurgia,
apenas 50% ser•o submetidos ‹ ressec€•o; a outra metade ser† submetida ‹ drenagem bilio-digestiva.
Em resumo, a conduta terapƒutica para com o paciente portador de colangiocarcinoma de Klatskin deve
obedecer ao seguinte organograma:
 Diagn‡stico geralmente feito na fase avan€ada da doen€a. Nesta situa€•o, o tratamento em geral ‚ paliativo,
atrav‚s da drenagem biliar por cirurgia, via endosc‡pica e percut…nea. A drenagem endosc‡pica apresenta
resultado superpon„vel ao cirŠrgico com melhor qualidade de vida e menor custo. ˆ poss„vel tratamento da via
biliar e duodeno.
 Em caso de Tumor de Klatskin tipo I, o tratamento curativo consiste em ressec€•o local, drenagem biliodigestiva
e linfadenectomia (o mesmo tratamento do tumor de ter€o proximal). Para palia€•o, o tratamento endosc‡pcio ‚
prefer„vel.
 Para tumor de Klatskin tipo II (que invade a confluƒncia dos ductos hep†ticos), a melhor op€•o curativa ‚ a
ressec€•o local, associada ‹ linfadenectomia e ressec€•o do lobo caudado. No que diz respeito ‹ palia€•o, pode
ser tanto endosc‡pica como por colangiotransparieto-hep†tica (CTPH).
 Para o tratamento curativo do tumor de Klatskin tipo IIIa, devemos realizar hepatectomia direita associada ‹
ressecۥo da via biliar, linfadenectomia e ressecۥo do lobo caudado. Para o tratamento curativo do tumor de
Klatskin tipo IIIb, devemos realizar hepatectomia esquerda associada ‹ ressec€•o da via biliar, linfadenectomia e
ressecۥo do lobo caudado.
 Para tratamento paliativo do tumor de Klatskin tipo III ou IV, a melhor op€•o ‚ a drenagem hep†tica.
 A associa€•o da drenagem endosc‡pica e transparieto hep†tica devem ser avaliadas a cada caso.
 Para doen€as metast†ticas ou irressec†veis, devemos proceder com quimioterapia e medidas de suporte.

PERSPECTIVAS
 Desenvolvimento de novas drogas.
 Radioterapia intraoperat‡ria para margem ex„gua.
 O ideal ‚ realizar diagn‡stico mais precoce.

209
Arlindo Ugulino Netto – CIRURGIA ABDOMINAL– MEDICINA P7 – 2010.2

MED RESUMOS 2012


NETTO, Arlindo Ugulino.
CIRURGIA ABDOMINAL _________

CÂNCER COLORRETAL
(Professor Cássio Virgílio)

Representando a neoplasia maligna mais comum do tubo digestivo, o câncer colorretal (CCR) teve sua
incidƒncia aumentada nos Šltimos anos, principalmente em †reas consideradas de baixo risco (pa„ses em
desenvolvimento). V†rios fatores podem estar envolvidos, como o envelhecimento da popula€•o, sedentarismo e h†bitos
alimentares pouco saud†veis. Estima-se em cerca de meio milh•o o nŠmero de ‡bitos por esta doen€a a cada ano, com
tendƒncia a queda na mortalidade nos Šltimos anos.
Moynihan (1908) j† afirmava que “cirurgia oncol‡gica ‚ quase sempre do ‡rg•o e drenagem linf†tica”. Esta
citaۥo se faz importante a partir do fato em que estudamos o adenocarcinoma e o carcinoma espinocelular Рneoplasias
cuja met†stase linf†tica ‚ extremamente comum. J† os sarcomas costumam disseminar-se por via hematogƒnica. Tais
dados s•o importantes principalmente no que diz respeito ‹ abordagem terapƒutica do CCR.

EPIDEMIOLOGIA
ˆ a quarta neoplasia maligna mais comum no mundo (superada pelos tumores de pulm•o, mama e pr‡stata) e a
segunda causa de morte por c…ncer nos Estados Unidos. Nos homens, ‚ o quarto tipo de c…ncer mais frequente (depois
de pulm•o, estŒmago e pr‡stata) e, no sexo feminino, ‚ superado apenas pelos c…nceres de mama e colo de Štero. Tem
incidƒncia maior entre a 6— e 7— d‚cadas de vida.
No Brasil, o CCR ‚ a quinta neoplasia maligna mais diagnosticada (ocupando segundo lugar na regi•o Sudeste)
e a quarta causa de morte por c…ncer. Segundo os dados brasileiros do INCA, em 2008, observou-se uma incidƒncia em
homens de 12.490 (13/100.000) e em mulheres de 14.500 (15/100.000). Muito embora estes dados n•o sejam
extremamente fidedignos, uma vez que a notifica€•o dos casos no Brasil n•o corresponde ‹ incidƒncia real
(principalmente aqueles que morrem pelo c…ncer e nem sequer s•o diagnosticados).

ETIOLOGIA
Ainda ‚ incerta a etiologia da maioria do CCR. O que se conhece s•o os fatores possivelmente associados, tais
como:
 Fatores diet‚ticos
 O consumo de fibras diminui a incidƒncia.
 Dieta rica em gordura animal aumenta a incidƒncia
 O a€Šcar mascavo tem menos influƒncia do que o a€Šcar
industrializado
 Adenoma: todo adenocarcinoma de intestino deriva de um
adenoma. Existem trƒs tipos de adenoma que merecem destaque:
o adenoma tubular (menor risco de malignidade), adenoma tŠbulo-
viloso (risco intermedi†rio) e o adenoma viloso (risco maior de
degenera€•o maligna). Portanto, todo p‡lipo intestinal deve ser
diagnosticado por colonoscopia ainda na sua fase de adenoma.
 Tamanho do p‡lipo: tamb‚m est† relacionado com o c…ncer: um
adenoma de 0,5cm dificilmente degenera; diferentemente
daqueles com mais de 2cm, dos quais 20% apresentam uma
degeneraۥo maligna.
 Doen€a intestinal inflamat‡ria: em especial, a retocolite ulcerativa e
a doen€a de Crohn.
 Polipose adenomatosa familiar: doen€a recessiva transmitida
geneticamente e caracterizada pela presen€a de milhares de
p‡lipos intestinais. Todos os portadores devem ser submetidos a
uma colectomia total quando alcan€am a faixa dos 30 anos.
 C…ncer colŒnico heredit†rio n•o familiar

S•o condi€‰es heredit†rias frequentemente associadas a CCR: a


polipose adenomatosa familiar (PAF); o c…ncer colorretal heredit†rio sem
polipose (HNPCC), tamb‚m denominada s„ndrome de Lynch; s„ndrome do
carcinoma colorretal heredit†rio; polipose juvenil familiar; s„ndrome do
adenoma plano e s„ndrome de Peutz-Jeghers.

210
Arlindo Ugulino Netto – CIRURGIA ABDOMINAL– MEDICINA P7 – 2010.2

Como vimos anteriormente, além dos fatores genéticos e ambientais, acredita-se que processos inflamatórios
também possam estar envolvidos na gênese do CCR. Nesse sentido, destacam-se as doenças inflamatórias intestinais.
Na doença de Crohn, o risco é menor do que na colite ulcerativa (estimado em mais de 40% após 25 anos de doença),
porém maior do que o da população geral.
A incidência de CCR esporádico, ou seja, aquele não associado a fatores hereditários, parece aumentar com a
idade, aparecendo mais frequentemente após a sexta década de vida, sendo que até 90% de todos os casos ocorrem
em pacientes com mais de 50 anos. A influência da idade no prognóstico, entretanto é controversa na literatura, podendo
sofrer influências do estado de saúde do paciente, sendo que muitos estudos relatam maior sobrevida em indivíduos
com menos de 40 anos. O retossigmoide é o sítio primário em cerca de 65% dos casos em idosos.
Até 85% dos tumores malignos dos cólons ainda são diagnosticados tardiamente, em estádios avançados da
doença em pacientes sintomáticos. Medidas de rastreio para identificação precoce tumor poderiam diminuir este número,
principalmente em pacientes com alto risco, permitindo maiores chances de cura. São considerados indivíduos com risco
mais elevado para desenvolvimento de CCR: idade acima de 50 anos, portadores de doença inflamatória intestinal,
história pessoal ou familiar de tumores benignos ou malignos de cólon, bem como parente em primeiro grau com CCR
sem defeito genético herdado.

PATOLOGIA
Aproximadamente 95% dos CCR são adenocarcinomas, podendo ser classificado como bem diferenciado,
moderadamente diferenciado e indiferenciado.
Nos últimos 50 anos, houve um aumento na frequência de localização do CCR no cólon direito em relação ao
cólon esquerdo, sigmoide e reto. Essa constatação ressalta a importância do uso de métodos diagnósticos que
envolvam todo o cólon e não apenas o retossigmoide.

QUADRO CL…NICO
O quadro clínico clássico do câncer de intestino está relacionado com a obstrução intestinal. A localização
anatômica do câncer determina a sintomatologia do paciente. Dentre outros fatores que justificam esta afirmativa,
podemos citar dois: a diferença entre o calibre da luz ao longo do cólon e a consistência das fezes em regiões diferentes
do cólon. Alterações nestas duas características podem auxiliar na estimativa clínica da topografia da lesão. Contudo, de
1
um modo geral, o CCR desenvolve sintomas característicos de obstrução intestinal baixa (ver OBS ).
 Diferença entre o calibre do cólon: o cólon direito é mais calibroso que o esquerdo.
 As fezes ainda são líquidas no lado direito do cólon, enquanto que, no lado esquerdo, elas já se apresentam
sólido-pastosas.
1
OBS : O ponto de referência para classificar a altura da obstrução intestinal é a válvula íleo-cecal (e não o ângulo de
Treitz, que determina a altura e classificação da hemorragia digestiva). Portanto, causas proximais à válvula promovem
uma obstrução abdominal alta, como tumores no intestino delgado; causas distais à válvula íleo-cecal promovem
obstrução baixa, como os tumores de intestino grosso.
2
OBS : Clinicamente, há diferenças entre a obstrução intestinal alta e baixa. Destas diferenças, podemos destacar três
principais:
 A obstrução intestinal alta é caracterizada por uma área de distensão de alça bem longa (pois inclui o intestino delgado e o
grosso), fazendo com que o indivíduo desenvolva uma parada de eliminação de gases e fezes, antecedendo, muitas vezes, a
dor. Já na obstrução baixa, o indivíduo inicia o quadro doloroso (dor em cólica) apresentando, ainda, eliminação de gases e
fezes (inclusive, há alguns pacientes que desenvolvem a chamada diarréia reflexa na vigência de uma obstrução intestinal
baixa).
 Na obstrução intestinal baixa, como há um número menor de alças a serem distendidas (existindo, praticamente, só o
intestino grosso) e um comprimento menor, ocorrem distensões abdominais bem mais exuberantes. O contrário ocorre na
obstrução intestinal alta em que o comprimento de alça a ser distendido é bem maior, diminuindo o grau de distensão.
 Os vômitos são muito mais frequentes na obstrução alta do que na obstrução baixa.

Obstrução alta Obstrução baixa


 Causa proximal à válvula íleo-cecal  Causa distal à válvula íleo-cecal
 Dor abdominal, geralmente em cólica na região  Dor abdominal, geralmente em cólica. Dor na região
periumbilical (obstrução de delgado) hipogástrica (obstrução de cólon).
 Obstipação  Parada de eliminação de gases e fezes
 Náuseas  Náuseas prolongadas
 Vômitos precoces e frequentes  Vômitos mais tardios ou ausentes

Em resumo, quanto mais alta for a obstrução, mais precoces, frequentes e intensos serão os vômitos, menor a distensão
abdominal e mais tardia a parada da eliminação de gases e fezes. Quanto mais baixa a obstrução, maior a distensão
abdominal, mais precoce a parada de eliminação de flatos e fezes, e, devido ao supercrescimento bacteriano no
segmento obstruído, os vômitos, que são tardios, adquirem aspecto fecaloide.

211
Arlindo Ugulino Netto – CIRURGIA ABDOMINAL– MEDICINA P7 – 2010.2

3
OBS : No caso de uma obstru€•o intestinal baixa, podemos classific†-la como obstru€•o em al€a aberta ou fechada, a
depender da competƒncia da v†lvula „leo-cecal. Na obstru€•o intestinal baixa com v†lvula „leo-cecal continente, quando
h† uma obstru€•o distal no intestino grosso, haver† dilata€•o e poss„vel rompimento da parte mais dilatada e fina do
intestino – o ceco. Diferentemente do que ocorre na presen€a de uma v†lvula „leo-cecal incontinente e que permite o
refluxo do material obstru„do para o intestino delgado. Nesta situa€•o, muito dificilmente ocorrer† o rompimento do ceco.

Portanto, como nos referimos anteriormente, um paciente que apresenta c…ncer ou qualquer outro tipo de
obstru€•o em c‡lon direito (que apresenta maior calibre e fezes l„quidas), dificilmente apresentar† sinais ou sintomas de
obstru€•o intestinal. Diferentemente do que ocorre no c‡lon esquerdo (†rea de menor calibre e presen€a de fezes
s‡lidas), regi•o mais propensa a desenvolver obstru€•o.

OBSTRUÇÃO DO CÓLON DIREITO


Em detrimento do que foi explicado anteriormente, a obstru€•o do c‡lon direito promove uma sintomatologia
mais tardia e, dificilmente, desenvolve sinais de obstruۥo.
Os principais sinais de tumores que se desenvolvem no c‡lon direito s•o:
4
 Diarréia decorrente da m† absor€•o de †gua (ver OBS ).
 Anemia decorrente de sangue oculto nas fezes (resultado de um sangramento pequeno, mas constante)
 Massa palpável
4
OBS : Fisiologicamente, a maior parte da absor€•o de †gua di†ria acontece no c‡lon direito: cerca de 1,5 a 2L de †gua
chegam a este segmento diariamente, enquanto que nas fezes apenas 100 a 200mL s•o perdidos. Portanto, uma les•o
em c‡lon direito prejudica, principalmente, a absor€•o de †gua, predispondo ‹ diarr‚ia (que ‚ bem menos frequente na
presen€a de les‰es em c‡lon esquerdo).
5
OBS : Todo paciente com mais de 45 anos que desenvolva apendicite deve passar por uma investigaۥo de neoplasia
de c‡lon direito – cerca de 5 a 10% destes pacientes apresentam associa€•o precisa com o c…ncer de c‡lon. Isso ‚
importante pois, com o passar da idade, o apƒndice torna-se cada vez menor e com menos tecido linf†tico. De fato, o
revestimento linf†tico do apƒndice ‚ praticamente inexistente em idosos e imunodeprimidos. Como a camada linf†tica do
apƒndice regride com o passar dos anos, a luz desta estrutura torna-se cada vez maior, o que dificulta o aparecimento
de apendicite em faixas et†rias mais velhas (a apendicite ‚, sabidamente, uma doen€a de indiv„duos jovens: 2— e 3—
d‚cadas de vida). Portanto, pacientes mais velhos com apendicite provavelmente apresentam associa€•o com c…ncer.

OBSTRUÇÃO DO CÓLON ESQUERDO


Neste caso, a sintomatologia de causas obstrutivas no lado esquerdo aparece de forma mais precoce. Esta
sintomatologia caracteriza-se por:
 Alterações do ritmo intestinal: ‚ comum per„odos de diarr‚ia intercalados por per„odos de constipa€•o.
 Dor em cólica.
6
 Sangramento discreto, mas vis„vel (ver OBS ).
 Distensão abdominal extensa e difusa.
6
OBS : O sangramento decorrente da obstru€•o tumoral do c‡lon ‚ semiologicamente diferente do sangramento causado
pela doen€a orificial (doen€a hemorroid†ria e fissura anal). Ambas as situa€‰es podem caracteriza-se por sangue
vemelho-vivo. Contudo, na doen€a orificial, o paciente refere que as primeiras fezes aparecem normais (sem sangue) e,
ao final da evacua€•o, aparece o sangramento. J† na doen€a obstrutiva do c‡lon por tumor, o sangue (geralmente, em
pouca quantidade) vem misturado com as fezes.

OBSTRUÇÃO DO RETO
Clinicamente, caracteriza-se por:
 Sangramento
 Elimina€•o de muco
 Tenesmo (sensa€•o de evacua€•o incompleta)

DIAGN†STICO
O diagn‡stico do CCR pode ser facilmente obtido atrav‚s da associa€•o entre os seguintes passos:
 História: devemos investigar o paciente, partindo de sua idade (mais idosos), no que diz respeito ao hist‡rico de
anemia e aspecto das fezes.
 Exame físico: a palpa€•o do hipocŒndrio direito pode determinar um tumor em c‡lon direito, enquanto que o
toque retal pode determinar a presen€a de c…ncer no reto ou, at‚ mesmo, no c‡lon esquerdo.
 Pesquisa de sangue oculto: ‚ um procedimento utilizado, mundialmente, como screening.
212
Arlindo Ugulino Netto – CIRURGIA ABDOMINAL– MEDICINA P7 – 2010.2

 Exame proctológico: que inclui inspe€•o, palpa€•o (toque retal), anuscopia e retosigmoidoscopia flex„vel.
 Enema opaco: foi, por anos, o Šnico meio diagn‡stico para tumores n•o alcan€ados pelo toque retal ou pela
retossigmoidoscopia r„gida at‚ que, em 1967, Welin descreveu o duplo contraste, com b†rio e ar. O enema
opaco se faz importante principalmente naquelas les‰es de colo esquerdo com estenose n•o-obstrutiva.
 Colonoscopia invasiva (padrão) e virtual: ‚ considerada por muitos autores como um exame complementar
ao enema opaco, tendo a grande vantagem em rela€•o a este de permitir bi‡psia da les•o suspeita e
estadiamento. Pode ser feita no modo virtual (feita por tomografia e reconstruۥo 3D). Contudo, a colonoscopia
virtual n•o consegue identificar les‰es mais planas ou com menos de 0,5cm e nem mostra a cor (enquanto que o
colonosc‡pio tradicional consegue). Pacientes com CCR, mesmo os de localiza€•o distal, precisam ser
avaliados em todo o c‡lon (atrav‚s de colonoscopia), pois, al‚m de ter havido um aumento na incidƒncia de
7
tumores ‹ direita em rela€•o ao retossigmoide, existe a possibilidade de tumores sincrŒnicos (ver OBS ).
Portanto, a colonoscopia invasiva tradicional consiste no exame padr•o-ouro para CCR, pois, al‚m de fornecer o
diagn‡stico, permite a bi‡psia e, muitas vezes, tratamento.
 TC de abdome: serve n•o s‡ para o diagn‡stico, como contribui com o estadiamento das les‰es.

OBS7: Pacientes que desenvolvem CCR apresentam uma chance de 2 a 4% de desenvolverem outro tumor em outra localizaۥo do
intestino grosso. Do ponto de vista diagn‡stico, estes tumores podem ser classificados como sincrômico ou metacrômico. Se o
diagn‡stico das les‰es ocorrer em um per„odo inferior a 6 meses, diz-se que os tumores s•o sincrŒmicos (ao mesmo tempo). J† se o
intervalo de diagn‡stico entre os dois tumores for superior a 6 meses, classificam-se como metacrŒmicos. Portanto, tumores s•o ditos
sincrŒnicos quando se apresentam simultaneamente ao diagn‡stico ou no ato operat‡rio, descartando-se obviamente a possibilidade
de les‰es por contiguidade. Tumores metacrŒnicos s•o encontrados no seguimento dos pacientes j† submetidos ‹ ressec€•o
cirŠrgica, excluindo-se evidentemente a possibilidade de les•o n•o diagnosticada ‹ ‚poca do diagn‡stico (quando seria sincrŒnica) ou
de recidiva do tumor operado. P‡lipos sincrŒnicos ocorrem em at‚ 18 a 27% dos casos. No caso de tumores malignos, essa
frequƒncia ‚ de 1,5 at‚ 8%. Neoplasias metacrŒnicas s•o encontradas no seguimento de at‚ 0,6 a 8% dos pacientes.
OBS8: A informaۥo trazida pela OBS7 se faz importante pois, quando diagnosticamos um tumor em qualquer localidade do intestino
grosso do paciente, significa dizer que temos a obriga€•o de procurar por tumores em todo o restante do c‡lon dele. Al‚m disso,
depois que um paciente apresentou c…ncer e foi curado, ele deve ser submetido, durante o resto da vida, a colonoscopias a cada 3 –
5 anos, a depender da literatura pesquisada.

Por ser o exame padr•o-ouro, a colonoscopia deve ser o primeiro exame a ser solicitado. Como a
retosigmoidoscopia invasiva faz parte do exame proctol‡gico, ela tamb‚m deve ser solicitada.
A realiza€•o inicial de bi‡psia por retossigmoidoscopia pode agilizar o diagn‡stico, com 25 a 35% dos tumores
sendo acess„veis para o retossigmoidosc‡pio r„gido. No entanto, para uma avalia€•o mais completa do c‡lon, com
elevada acur†cia e inclusive com possibilidade de remo€•o de pequenos p‡lipos, o mais indicado ‚ a realiza€•o de
colonoscopia.
O aspecto da les•o ‹ retossigmoidoscopia ou colonoscopia ‚ caracter„stico, com a borda distal de colora€•o
vinhosa ou avermelhada, podendo tomar as formas ulcerada, anelar ou polip‡ide. A bi‡psia da les•o deve incluir tanto o
centro como a periferia da les•o.
Exames laboratoriais podem ser importantes para avalia€•o das condi€‰es cl„nicas do paciente, como o
hemograma para quantifica€•o da anemia devida a sangramento intestinal crŒnico, ou no seguimento. Neste caso, s•o
utilizados mais frequentemente marcadores tumorais como o antígeno carcinoembrionário (CEA) e o CA 19-9, que
s•o, na verdade, pouco espec„ficos, alterando-se tamb‚m em doen€as inflamat‡rias, alcoolismo e tabagismo, existindo
tamb‚m tumores que n•o expressam ant„genos. Logo, n•o servem para diagn‡stico e sim para seguimento do paciente,
com uma dosagem inicial na avalia€•o pr‚-operat‡ria e mensura€‰es peri‡dicas no p‡s-tratamento. Enzimas hep†ticas
tamb‚m s•o Šteis na pesquisa de met†stases para o f„gado.

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OBS : O único marcador tumoral utilizado na medicina com valor diagnóstico é o PSA (para câncer de próstata). A
maioria deles, assim como o CEA, serve apenas para seguimento e prognóstico.

DISSEMINA•„O TUMORAL
O CCR dissemina-se por contiguidade (invasão de tecidos vizinhos), implante no peritônio ou órgãos intra-
abdominais e pelas vias linfática e hematogênica. Portanto, em resumo, temos:
 Disseminação hematogênica: mais comum para o sistema porta (fígado e pulmão) e, mais raramente, para cérebro e ossos.
 Disseminação linfática: linfonodos paracólicos, linfonodos intermediários e linfonodos principais.
 Disseminação por continuidade: para órgãos contínuos (o que exige a retirada cirúrgica de uma margem colônica mínima de
5cm)
 Disseminação por contiguidade: invasão de órgãos vizinhos.
 Implantação: peritôneo, ovários e cicatriz cirúrgica.

Os principais órgãos envolvidos em metástases são o fígado (75%), pulmões (15%), ossos (5%) e sistema
nervoso central (5%). O adenocarcinoma é o tipo histológico mais frequente, encontrado em até 90 % dos casos

ESTADIAMENTO
O estadiamento tem implicações prognósticas, sendo as classificações mais utilizadas a de DUKES modificada
em 1974 (por Gunderson e Sosin) e o sistema TNM, podendo-se usar também a de Astler e Coller. Os principais exames
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utilizados para estadiamento são (ver OBS ):
 TC de abdômen e tórax
 US abdominal e transretal
 PET-CT
 Colonoscopia
 Enema
 Laparoscopia
 Urografia e cistoscopia não são mais utilizadas (pois os mesmos dados obtidos por elas podem ser facilmente demonstrados
pela tomografia).

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OBS : Em resumo, podemos ter o diagnóstico do CCR facilmente obtido pela colonoscopia e biópsia. O estadiamento
pode ser estabelecido pela associação da colonoscopia e tomografia de tórax e abdome (para avaliar fígado, pulmão e
linfonodos). O CEA deve ser dosado para seguimento do paciente.

TRATAMENTO
O tratamento do CCR ainda é eminentemente cirúrgico, com as terapias adjuvantes pouco alterando a
mortalidade e contribuindo para melhora da qualidade de vida. A sobrevida global em cinco anos de pacientes
submetidos a tratamento cirúrgico gira em torno de 50%.
Há intenção curativa quando se promove a remoção completa do tumor primário, órgãos ou estruturas
adjacentes comprometidos, com margem circunferencial e radial histologicamente livres (ressecção em bloco).
Tratamento radio e quimioterápicos podem apresentar vantagens nos estádios II e III. As tabelas abaixo apresentam as
diretrizes do National Cancer Institute – U.S. National Institutes of Health para tratamento do CCR.

Tratamento do câncer de cólon segundo seu estadiamento


Excisão local ou polipectomia
Estágio 0: Tis, N0, M0
Ressecção colônica se necessário
Estágio I: T1, N0, M0; T2, N0, M0 Ressecção colônica
Estágio IIA: T3, N0, M0
Ressecção colônica + quimioterapia
Estágio IIB: T4, N0, M0
Estágio IIIA: T1, N1, M0; T2, N1, M0
Estágio IIIB: T3, N1, M0; T4, N1, M0 Ressecção colônica + quimioterapia
Estágio IIIC: qualquer T, N2, M0
Ressecção colônica + quimioterapia;
Estágio IV: qualquer T ou N, M1
Ressecção de metástases isoladas

Tratamento do câncer de reto segundo seu estadiamento


Excisão local ou polipectomia
Estágio 0: Tis, N0, M0
Ressecção da parede retal se necessário
Radioterapia
Estágio I: T1, N0, M0; T2, N0, M0 Retossigmoidectomia anterior + Radioterapia + quimioterapia
Estágio IIA: T3, N0, M0
Estágio IIB: T4, N0, M0 Retossigmoidectomia anterior em bloco + Radioterapia + quimioterapia
Estágio IIIA: T1, N1, M0; T2, N1, M0
Estágio IIIB: T3, N1, M0; T4, N1, M0 Retossigmoidectomia anterior em bloco + Radioterapia + quimioterapia
Estágio IIIC: qualquer T, N2, M0
Retossigmoidectomia anterior + ressecção de metástases
Estágio IV: qualquer T ou N, M1
isoladas + radioterapia + quimioterapia

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TRATAMENTO CIRÚRGICO DO CCR DE CÓLON DIREITO


De um modo geral, o
tratamento cirúrgico das lesões
localizadas no cólon direito exige uma
hemicolectomia direita, com
retirada de pelo menos 20cm de íleo
terminal. A retirada da artéria cólica
direita se faz necessário, ligando-se o
seu pedículo bem próximo à artéria
mesentérica superior. Por vezes, a
retirada da artéria cólica média
também é necessária.
A reconstrução pode ser feita
através da anastomose entre o íleo
terminal remanescente e o cólon
transverso. Tal anastomose pode ser
término-terminal, látero-lateral ou
término-lateral.

TRATAMENTO CIRÚRGICO DO CCR DE CÓLON ESQUERDO


Da mesma forma, o
tratamento cirúrgico para lesões
neoplásicas de cólon esquerdo exige
a hemicolectomia esquerda, com
retirada da artéria mesentérica
inferior. Quanto menos manusearmos
o tumor, melhor para diminuir a
disseminação celular.
Importante é, durante a
cirurgia, ligar a veia mesentérica
primeiramente (para evitar a
disseminação hematogênica de
células tumorais) e só depois ligar a
artéria.
Durante a cirurgia de cólon
esquerdo, deve-se redobrar a atenção
ao ureter, evitando lesões.
A reconstrução pode ser feita por anastomose primária entre o cólon transverso e o reto (se possível),
restabelecendo o transito intestinal. Contudo, podemos lançar mão da colostomia.

TUMORES EM AMBOS OS CÓLONS


Pacientes que apresentam tumores nos dois cólons (ascendente e descendente) devem ser submetidos à
colectomia total. Se o paciente apresentar uma válvula íleo-cecal continente e uma boa condição clínica, pode ser
submetido a uma reconstrução com anastomose primária, entre o íleo terminal e o reto, restabelecendo o fluxo. Caso
contário, isto é, se o paciente se mostar descompensado clinicamente e/ou com válvula íleo cecal incontinente, ele deve
ser submetido à colostomia.

CÂNCER RETAL
Os princípios para o tratamento cirúrgico do câncer retal são:
 Margem de pelo menos 1,5cm e excisão total do meso-reto.
 Linfadenectomia.
 Atenção redobrada para a artéria sacral média.
 Preservação esfincteriana se o paciente apresentar força de contração normal à manometria. Caso contário, isto
é, se o paciente não mostrar capacidade de contração esfincteriana, ele pode apresentar incontinência fecal.
Estudos mostraram que a qualidade de vida de pacientes com colostomia é melhor do que aqueles que
apresentam incontinência. Portanto, a preservação esfincteriana deve ser realizada para os casos bem
selecionados.
 Disfunção sexual: o paciente pode apresentar tanto disfunção erétil como ejaculação retrógrada
 A sobrevida é boa; o que pode mudar é a qualidade de vida.

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PROGN†STICO E S EGUIMENTO
O prognóstico do CCR está intimamente relacionado ao estádio da doença, chegando a 90% de chance de cura
no estádio I, correspondente à categoria A de Dukes, e sendo menor que 5% para pacientes com tumores em estádio IV,
ou categoria D de Dukes.
Apesar do fato de o adenocarcinoma de cólon provocar metástases linfáticas comumente, o câncer de colorretal
é, no geral, um prognóstico bom devido a sua natureza menos agressiva. Além disso, o intestino grosso representa uma
região onde a quimioterapia é efetivamente funcionante, principalmente quando associada à cirurgia.
No seguimento de tais pacientes, a colonoscopia seriada é imprescindível, dada a frequência variável de
adenomas e tumores sincrônicos e metacrônicos.

C ONSIDERA•‚ES F INAIS
A colonoscopia é o melhor método para o diagnóstico de lesões sincrônicas, sendo importante sua realização no
pré-operatório para a programação cirúrgica do paciente com CCR, o que pode inclusive influenciar a sobrevida.
Além disso, os principais fatores prognósticos que influenciam a sobrevida de doentes com CCR são o estágio
de Dukes, o grau de diferenciação do tumor e a extensão da ressecção cirúrgica. A idade não é fator isolado relevante,
dependendo muito mais de variáveis clínicas.

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