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ResumoResumo

de Trauma Abdominal 0

Trauma Abdominal

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Resumo de Trauma Abdominal 1

1. Introdução
O abdome pode ser fonte de sangramento importante que não é rapidamente
identificado, popularmente denominado sangramento "oculto". Diferentemente do
sangramento externo, aquele que ocorre nas cavidades do corpo não é visualizado e,
em suas fases iniciais, pode não apresentar sinais e sintomas evidentes, como a irritação
peritoneal e dor. A demora no diagnóstico da lesão abdominal é a maior vilã visto que
20 a 50% das mortes relacionadas ao trauma abdominal poderiam ser evitadas com um
diagnóstico rápido e preciso.

2. Anatomia do Abdome
Para o diagnóstico e tratamento do trauma abdominal, é de fundamental
importância que se valorizem os aspectos anatômicos desse segmento corpóreo.

A maioria dos autores divide a parede externa do abdome nas regiões anterior,
lateral (flanco) e posterior (dorso).

O abdome anterior é definido como a área compreendida entre a linha entre os


dois mamilos superiormente, os ligamentos inguinais e a sínfise púbica inferiormente, e
as linhas axilares anteriores lateralmente. A parede anterior é a menos espessa das
paredes externas, portanto é a que pode ser penetrada mais facilmente, sobretudo por
ferimentos penetrantes.

A transição toracoabdominal é a área localizada abaixo da linha transmamilar,


anteriormente, a linha infraescapular, posteriormente, e arcos costais, superiormente.

O flanco tem seus limites nas linhas axilares anterior e posterior bilateralmente,
desde o sexto espaço intercostal até as cristas ilíacas. Os flancos e a parede posterior
são progressivamente mais espessos e, portanto, menos vulneráveis aos ferimentos
penetrantes do que a parede anterior.

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O dorso está localizado na região posterior e tem como limites as linhas axilares
posteriores, as pontas das escápulas e as cristas ilíacas.

Internamente o abdome possui a cavidade peritoneal, o espaço retroperitoneal


e a cavidade pélvica. A cavidade peritoneal é dividida em duas regiões, a superior e a
inferior.

A região superior da cavidade peritoneal contém o diafragma, o fígado, o


estômago, o baço e o cólon transverso. Essa região também pode ser denominada
abdome intratorácico, o qual é revestido pelo gradil costal. A região inferior da cavidade
abdominal contém o intestino delgado, parte do cólon ascendente e descendente, o
sigmóide e, no sexo feminino, os órgãos reprodutores. O espaço retroperitoneal fica
atrás do envoltório peritoneal da cavidade peritoneal e contém a aorta, a veia cava,
quase todo o duodeno, o pâncreas, os rins, os ureteres, a face posterior do cólon
ascendente e descendente e as estruturas retroperitoneais da cavidade pélvica.

Figura 1: Anatomia da pelve.

FONTE: Adaptada de ATLS, 9ª ed, 2016, pág 124

3. Mecanismos de Trauma
O traumatismo do abdome pode ser fechado (contusão abdominal), ocasionado
por forças de desaceleração/ transmissão de choque pela parede abdominal, ou aberto
(penetrante ou ferida abdominal), geralmente ocasionado por lesões por Projéteis de
Arma de Fogo (PAF) ou arma branca.

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- Trauma fechado: Na contusão abdominal, os órgãos mais frequentemente


acometidos são baço (40 a 55%) e o fígado (35 a 45%). Envolvimento do delgado
(5 a 15%) e hematomas em retroperitônio também são observados. Os
mecanismos mais comuns que produzem lesões abdominais são compressão,
esmagamento, cisalhamento e lesões por desaceleração. A compressão e o
esmagamento produzem lesão direta em órgãos parenquimatosos. A
compressão abdominal também pode provocar aumento súbito da pressão
abdominal, ocasionando ruptura de vísceras ocas ou até mesmo de parede
abdominal. O cisalhamento ocorre quando forças em direções opostas aplicadas
no mesmo órgão produzem lesões. A desaceleração súbita também lesa órgãos
abdominais, principalmente porque as diferentes estruturas desaceleram em
velocidades diferentes, gerando cisalhamento.

- Trauma penetrante: Um dos aspectos importantes a ser considerado no trauma


penetrante é a energia cinética envolvida na gênese da lesão, uma vez que,
dependendo da velocidade dos projéteis, podem surgir diferentes lesões. As
armas brancas possuem baixa energia cinética e a sua área de ação fica limitada
ao seu tamanho. Já os projéteis de arma de fogo possuem maior velocidade e a
sua área de ação é maior, pois produzem lesão à medida que penetram o tecido.
Os objetos penetrantes produzem lesões por corte ou laceração e, dependendo
da sua velocidade, pode ocorrer a formação de cavidades.

4. Avaliação
História: No paciente instável hemodinamicamente, o ponto mais importante da
avaliação é verificar se existem evidências de sangramento abdominal que exija
intervenção cirúrgica imediata. Se esse for o caso, o doente deverá ser operado o mais
rápido possível. Nos pacientes hemodinamicamente estáveis ou que responderam bem
à reposição volêmica inicial, pode-se fazer um exame mais detalhado do abdome, que
se inicia com história clínica, principalmente em relação ao conhecimento do
mecanismo de trauma, e exame físico. Em relação ao trauma penetrante é importante

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saber qual foi o tipo de arma usado para causar a lesão: se era arma branca ou de fogo.
O tamanho da arma branca pode indicar a provável extensão da lesão, o tipo de arma
de fogo fornece dados sobre a velocidade e o tamanho do projétil, que se relacionam à
extensão do ferimento. A distância entre o agressor e a vítima também vai influenciar
na gravidade da lesão.

Exame físico

- Inspeção: O exame físico deve iniciar-se pela inspeção do abdome, todas as suas
faces devem ser examinadas: a anterior, as laterais, a posterior, o períneo e
também o gradil costal à procura de sinais de trauma da região abdominal
intratorácica. Sinais sugestivos de trauma abdominal são escoriações, abrasões,
lacerações e ferimentos penetrantes. Outros sinais são hematomas, equimoses,
abaulamentos, retrações e evisceração.

- Ausculta: Apesar de outras lesões que não envolvam a cavidade peritoneal,


como lesão medular e trauma do terço inferior do tórax, alterarem a dinâmica
do movimento intestinal, essa técnica permite correlacionar o trauma com as
possíveis complicações visto que a presença de líquidos, como sangue, urina e
conteúdo gastrintestinal no peritônio, podem alterar o peristaltismo
ocasionando diminuição dos ruídos hidroaéreos.

- Percussão: Pode produzir reação dolorosa caso haja irritação peritoneal. Quando
a percussão for timpânica, ela é capaz de revelar a presença de gás que pode
estar no peritônio ou em distensão do estômago ou do cólon. Quando o
peritônio estiver repleto de líquido, a percussão pode ser maciça.

- Palpação: A palpação pode revelar dor localizada ou difusa, superficial ou


profunda, evidenciar a irritação peritoneal, mostrar bloqueios de alças
intestinais que formam plastrão e avaliar o tamanho de um útero gravídico.

- Avaliação da pelve: Avaliar instabilidade, realizar exame da uretra, períneo e


reto além de exame vaginal e de glúteos.

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Medidas auxiliares do exame físico

- Sondagem gástrica: Visam aliviar uma possível dilatação gástrica, remover


conteúdo gástrico e descomprimir estômago antes de realizar o lavado
peritoneal diagnóstico. Está contraindicada a sondagem nasogástrica em
pacientes com suspeita de fratura de base de crânio devendo ser feita inserida
pela boca de modo a evitar que adentre o cérebro.

- Sondagem vesical: Visa aliviar a retenção, identificar sangramentos, monitorizar


débito urinário e descomprimir bexiga antes do lavado peritoneal. A hematúria
macroscópica é uma indicação de trauma ao trato geniturinário, incluindo o rim,
ureteres e bexiga, contudo sua ausência não exclui a possibilidade. É obrigatória
a realização de uretrograma retrógrado se o paciente tiver instabilidade pélvica,
sangue no meato, incapacidade de urinar espontaneamente, hematoma escrotal
ou equimose perineal.

- Radiografias: É recomendado o raio x de tórax em AP, principalmente se


suspeita de lesão em região toracoabdominal. Pacientes instáveis e com
ferimentos penetrantes não necessitam de Raio X, pacientes estáveis devem
fazer buscando excluir um hemotórax ou pneumotórax associado, ou para
determinar a presença de ar intraperitoneal.

- Avaliação ultrassonográfica direcionada para o trauma: Permite a identificação


de líquido nas cavidades peritoneal e pericárdica de forma mais simples e menos
invasiva, com sensibilidade semelhante às da LPD e da tomografia
computadorizada. Por ser um método não invasivo, pode ser repetido quantas
vezes for necessário. O FAST pode ficar prejudicado em pacientes obesos,
portadores de enfisema de subcutâneo na parede abdominal e torácica e
submetidos a procedimentos cirúrgicos prévios no abdome. Recomenda-se
realizar o primeiro exame e um novo exame de controle 30 minutos após o
primeiro. Dessa forma, um eventual sangramento que ocorra nesse intervalo de
tempo pode ser identificado com segurança.

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- Lavagem peritoneal diagnóstica: Método capaz de detectar a presença da lesão


abdominal em uma variedade de situações, incluindo o trauma abdominal
fechado. As indicações de LPD são para todos os doentes portadores de
alterações hemodinâmicas que apresentam problemas para a avaliação
abdominal. É um método invasivo, razoavelmente rápido, que não pode ser
repetido, não permite avaliação de retroperitôneo e pode ser feito em pacientes
instáveis. As contraindicações relativas referentes à realização da LPD são:
presença de cirurgias abdominais prévias, obesidade mórbida, cirrose avançada
e coagulopatia. A única contraindicação absoluta para a realização da LPD é a
indicação de laparotomia já estabelecida

- Tomografia computadorizada: É o método considerado de "maior


especificidade" quando comparada aos outros exames de imagem. Além dessa
vantagem, a TC também é um bom método para diagnóstico de lesões
retroperitoneais, e também apresenta a capacidade de não somente identificar
a lesão abdominal, como também quantificá-la quanto ao grau de
comprometimento orgânico. Entretanto, a TC só é recomendada para doentes
estáveis hemodinamicamente já que a transferência é normalmente demorada.

- Exames contrastados: Não recomendado para doentes hemodinamicamente


instáveis. São normalmente utilizados para identificação de lesões em órgãos
específicos. São eles, Uretrografia (ruptura uretral), Cistografia (ruptura de
bexiga intra ou extraperitoneal), urografia excretora (lesões de sistema urinário,
se indisponibilidade de TC) e estudo contrastado de aparelho digestivo (lesões
retroperitoneais de órgãos específicos).

- Exames laboratoriais: Amostras de sangue e urina podem ser coletadas e


auxiliar no diagnóstico e tratamento do traumatizado, uma vez que provém
resultados de tipagem sanguínea, dosagens de hemoglobina, hematócrito,
leucócitos, eletrólitos, uréia e creatinina, lactato, amilasemia e, na mulher, teste
de gravidez. Os níveis plasmáticos de amilase há muito tempo são reconhecidos
por indicarem possível lesão pancreática e/ou de víscera oca. A detecção de

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hematúria grosseira e macroscópica está intimamente relacionada à presença


de lesão abdominal. A gasometria arterial é um exame que fornece informações
sobre a oxigenação, a presença ou não de acidose e a diferença de bases.

5. Manejo do Trauma Abdominal


● Trauma contuso: Em pacientes estáveis, despertos, sem lesões em outros sistemas
o exame físico é suficientemente sensível para diagnóstico de lesão intra-abdominal
grave; Realizamos LPD ou FAST se o exame físico não for confiável, quando o abdome
pode ser uma das fontes de sangramento e com hipotensão ou choque no
politrauma sem uma causa aparente. Se no exame físico o doente tiver irritação
peritoneal, é indicada laparotomia exploradora. Se não houver irritação, mas houver
distensão e escoriações abdominais e o indivíduo tiver instável, é indicada a cirurgia
exploratória. Se houver estabilidade, é indicada a TC de abdome. Em pacientes que
realizaram a TC e houve evidência de lesões de baixo grau, recomenda-se
tratamento conservador com observação constante e se, durante o internamento
em UTI, o paciente apresentar queda de mais que 3g/Dl ou leucocitose recomenda-
se laparotomia exploradora, se não, alta hospitalar. O fluxograma com maior
detalhes se encontra abaixo.

● Trauma penetrante: Na avaliação abdominal com ferimento penetrante devem-se


levar em conta todos os aspectos já abordados anteriormente, além da análise e do
estudo da lesão. Nos doentes com ferimento abdominal penetrante e instabilidade
hemodinâmica, a laparotomia já está indicada. Nos doentes hemodinamicamente
estáveis, devem-se considerar o tipo, a extensão e a trajetória da lesão. Em
ferimentos por arma branca em que não haja presença de penetração peritoneal,
pode-se examinar o ferimento com assepsia, antissepsia, anestesia local e até
ampliação cirúrgica da lesão, para verificar a sua profundidade. Do contrário, se
constatada a penetração peritoneal, indica-se a laparotomia exploradora. Nas
vítimas de ferimento abdominal por projétil de arma de fogo, a incidência de lesões
significativas pode chegar a 90% e, por esse motivo, prefere-se a indicação rotineira

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de laparotomia exploradora. Na vítima de trauma penetrante com alteração


hemodinâmica, a laparotomia deve ser realizada o mais rápido possível, mesmo sem
exames radiológicos, pois deve-se interromper o sangramento o quanto antes. Os
ferimentos penetrantes de flanco e de dorso podem não penetrar na cavidade
peritoneal e também não produzir lesão de órgãos ou estruturas retroperitoneais,
uma vez que essas paredes são espessas. Em doentes inicialmente assintomáticos,
pode-se usar o exame físico seriado ou a TC com triplo contraste (endovenoso, oral
e retal). De qualquer modo, a laparotomia exploradora ainda é um recurso que pode
ser usado com segurança para pacientes com ferimentos tanto de parede anterior
quanto de flanco e dorso.
Fluxograma 1: Manejo do trauma abdominal contuso.

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Fluxograma 2: Manejo do ferimento por arma branca em trauma abdominal penetrante.

- Indicações de laparotomia: Em determinadas circunstâncias a laparotomia deve


ser prontamente indicada no adulto. São elas:
Trauma abdominal Ferimento penetrante
fechado com Trauma abdominal Ferimento penetrante por PAF, que
hipotensão e sinais fechado com FAST ou de abdome com compromete a
claros de sangramento LPD positivos hipotensão cavidade peritoneal ou
abdominal estruturas
retroperitoneais
Lesão do trato
Ferimento penetrante
gastrointestinal, de
com lesão do reto,
Evisceração bexiga intraperitoneal, Ruptura de diafragma
estômago ou tratos
digestivos ou urinário de pedículo renal e
parenquimatosa grave

Pneumoperitônio ou
pneumorretroperitônio
Peritonite

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6. Diagnósticos Específicos
Lesões diafragmáticas: As lesões de diafragma representam cerca ele 3% ele todas as
lesões abdominais. Podem ocorrer igualmente nos dois lados, no entanto, nos serviços
de emergência existe incidência maior de lesões no lado esquerdo. Em geral, as lesões
por ferimentos penetrantes são pequenas e raramente provocam herniação logo após
a lesão. Na maioria das vezes, são encontradas durante a laparotomia exploradora. Já
as lesões resultantes de trauma fechado são maiores, variando de 5 a 10 cm. Ocorrem
mais frequentemente na região póstero-lateral do lado esquerdo e produzem herniação
mais facilmente, a qual pode ser identificada na radiografia de tórax. Os achados da
radiografia são: elevação ou borramento do hemidiafragma, apagamento do contorno
do diafragma, sombra gasosa e sombra gástrica na projeção torácica. Caso não exista a
hérnia, a radiografia de tórax pode ser considerada normal. O tratamento da lesão
diafragmática deve ser feito por laparotomia e sutura da lesão com pontos separados
em "U''. Caso haja necessidade, pode-se drenar a cavidade pleural com dreno de tórax
tubular multiperfurado sob selo d’água do lado da lesão. A lesão diafragmática também
pode ser tratada por videolaparoscopia, em casos selecionados. As complicações
agudas mais comuns da lesão diafragmática traumática são: deiscência de sutura,
paralisia do hemidiafragma devido à lesão traumática ou iatrogênica do nervo frênico,
insuficiência respiratória, empiema ou abscesso subfrênico. Complicações mais tardias
são: a hérnia estrangulada e perfurada de vísceras abdominais e a obstrução intestinal
recorrente.

Lesões duodenais: O duodeno apresenta uma face peritoneal e outra retroperitoneal,


além disso, ele está em íntima relação com o pâncreas, os vasos mesentéricos e todas
as estruturas do hilo hepático. Ele também possui a papila de Vater por onde
desembocam o colédoco e o ducto de Wirsung. Assim, os ferimentos de duodeno são
frequentemente acompanhados de lesões associadas graves. O mecanismo mais
comum de produção de lesão duodenal é a compressão direta do abdome. Em adultos
isso pode acontecer com colisões frontais, quando o motorista não está usando o cinto
de segurança e lesa o abdome. Em crianças, os golpes de guidão de bicicleta, queda de

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objetos pesados sobre o epigástrio também podem provocar estas lesões. A lesão
isolada do duodeno pode provocar poucos sintomas na fase inicial. Essa lesão pode
sangrar e cair na cavidade gástrica, exteriorizando-se pela sonda gástrica. A radiografia
simples de abdome ou a TC também podem mostrar ar no retroperitônio, levantando a
suspeita de lesão de duodeno. O diagnóstico de certeza pode ser feito com radiografia
contrastada do tubo digestivo ou TC com contraste oral e endovenoso. O segredo para
o tratamento das lesões duodenais está na exposição adequada desse segmento de
intestino, que é conseguida com dissecção cuidadosa e ampla. A lesão particular do
duodeno que deve ser comentada é o hematoma duodenal. Embora possa ocorrer em
adultos, ele é mais frequente em crianças e resulta da compressão súbita sobre o
epigástrio. A instalação do quadro ocorre aproximadamente 48 horas após o trauma. O
doente queixa-se de dificuldade para comer e de vômitos associados a dor no epigástrio.
O tratamento do hematoma duodenal sem lesões associadas é um procedimento em
que se coloca sonda gástrica e aplica-se nutrição parenteral total. Habitualmente o
hematoma é reabsorvido entre 5 e 7 dias. Caso isso não ocorra, pode-se esperar até 15
dias para indicar cirurgia com objetivo de esvaziar o hematoma.

Lesões pancreáticas: O objetivo inicial do tratamento da lesão pancreática é o controle


do sangramento e a contenção da contaminação bacteriana, sendo que as complicações
são mais frequentes quando existe lesão de seu ducto principal. O diagnóstico da
depende do mecanismo de trauma e da indicação ou não de laparotomia. Nos
ferimentos abdominais penetrantes por PAF que serão submetidos a laparotomia, o
diagnóstico de lesão pancreática será feito no intra-operatório. Nos doentes que não
apresentam indicação inicial de laparotomia deve-se suspeitar de lesão pancreática
quando o doente apresentar sinais de trauma da parede anterior do abdome associado
a fraturas de vértebras torácicas baixas. Dor epigástrica é outro sinal importante. O
aumento da amilase sérica não é um bom indicador de lesão pancreática (sensibilidade
de 50 a 85% e especificidade de O a 80%). Deve-se repetir a dosagem de amilase ao
longo do tempo de observação clínica, caso permaneça elevada e houver aparecimento
de sintomas abdominais, deve-se prosseguir na investigação com TC,
colangiopancreatografia retrógrada ou laparotomia exploradora. As lesões médias e

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pequenas, sem lesão do ducto principal, compreendem mais da metade das lesões
pancreáticas. O tratamento delas deve ser feito com hemostasia e drenagem. Caso
ocorra fístula pancreática, ela fecha em média em torno de trinta dias, somente com a
drenagem. As lesões pancreáticas distais, proximais e de cabeça de pâncreas associadas
a lesões de duodeno, via biliar e papila devem ser tratadas cirurgicamente. Para doentes
hemodinamicamente instáveis, pode-se fazer essa cirurgia em duas etapas. Na primeira,
realizam-se hemostasia e ressecção e na segunda executa-se a reconstrução. Nos
doentes estáveis hemodinamicamente, é possível operar em um só tempo, porém,
como se trata ele cirurgia de emergência, pode ser útil realizar o procedimento com
duas equipes, uma para ressecção e outra para reconstrução.

Lesões de vísceras ocas

- Estômago e intestino delgado: Ocorrem mais frequentemente por ferimentos


penetrantes do que por trauma fechado, sendo que nas vítimas de ferimentos
penetrantes de abdome, o intestino delgado é o órgão mais lesado. Já o trauma
fechado produz lesão por explosão. No estômago, essa lesão ocorre mais na face
anterior, próximo à grande curvatura. No intestino delgado, as lesões ocorrem
quando é criado um segmento de intestino que fica em alça fechada, com
aumento súbito de pressão. Nos ferimentos penetrantes de abdome, indica-se
rotineiramente a laparotomia exploradora e essas lesões são encontradas
durante a exploração. Porém, existem alguns sinais que podem ou não estar
presentes como exteriorização de sangue pela sonda gástrica, pneumoperitônio
no raio X e irritação peritoneal. Os sinais de lesão de intestino delgado são mais
sutis, destacando-se apenas a irritação peritoneal. A LPD, com exame
laboratorial do lavado, apresenta boa sensibilidade para identificação dessas
lesões. O FAST pode identificar líquido livre e ar na cavidade peritoneal. A TC com
duplo e triplo contraste pode não identificar a lesão de intestino delgado, o
achado mais frequente deste método é líquido livre na cavidade peritoneal, sem
lesão de víscera parenquimatosa associada. Sinais indiretos de lesão de intestino
delgado são espessamento de parede intestinal e de mesentério. O tratamento
dessas lesões é cirúrgico. As complicações das lesões de estômago e de intestino

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delgado são raras. As mais comuns são sangramento, formação de abscesso


intraperitoneal e fístula. Um grave problema que acompanha as ressecções de
delgado é a síndrome do intestino curto. Caso o cólon esteja íntegro, são
necessários 50 a 60 cm ele delgado para que seja possível nutrição via oral. Se o
intestino delgado remanescente for menor, outras modalidades de tratamento
devem ser empregadas.

- Cólon: No exame físico do doente vítima de ferimento penetrante ou de trauma


fechado de abdome, o toque retal com sangue é sugestivo de lesão ele cólon.
Mais comumente no trauma contuso, quando não existe indicação absoluta de
laparotomia, a TC com triplo contraste pode identificar lesão de cólon.
Geralmente, as lesões de cólon são identificadas na laparotomia exploradora. O
tratamento será cirúrgico. Na cirurgia de controle de dano, o cólon pode ser
fechado temporariamente com sutura manual ou mecânica, realizando-se a
colostomia no momento oportuno durante as reoperações. As causas de óbito
em doentes portadores de lesões de cólon são agudas e tardias. A causa aguda
mais comum é o sangramento que obviamente não decorre da lesão do cólon.
Já a causa tardia mais comum é decorrente da lesão de cólon, a sepse. As
complicações infecciosas mais comuns são o abcesso intra-abdominal e a
infecção de ferida.

- Reto: As lesões ele reto são por ferimentos penetrantes por projétil de arma de
fogo (80%), trauma fechado (10%) e o restante por via anal. Realiza-se a suspeita
ou o diagnóstico desta lesão em vítimas de ferimentos penetrantes de abdome
inferior, nádega e períneo. O exame mais simples é o toque retal, que pode
mostrar a presença de sangue, porém deve-se lembrar que o exame negativo
não exclui a lesão. A retossigmoidoscopia é o exame que pode mostrar o local e
a extensão da lesão. Em doentes hemodinamicamente normais, o exame pode
ser feito como parte da avaliação inicial. Em doentes hemodinamicamente
instáveis, a prioridade é o controle do sangramento com cirurgia, e em seguida
realiza-se o exame com o retossigmoidoscópio. O tratamento das lesões de reto
depende do mecanismo de trauma e da extensão e localização da lesão. Para as

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lesões pequenas intraperitoneais, produzidas por arma branca, pode-se realizar


sutura em dois planos sem necessidade de drenagem ou de colostomia. Para as
lesões maiores, produzidas por projétil de arma de fogo, com perda de
substância, e lesões extraperitoneais, recomenda-se desbridamento das bordas
da ferida, sutura em dois planos, drenagem da região próxima ao ferimento,
realização de colostomia em alça para desvio de trânsito intestinal e lavagem do
cólon distal à colostomia.

Lesões de órgãos sólidos

- Fígado: O fígado é o maior órgão do corpo humano e, por esse motivo, é


provavelmente o órgão do abdome mais frequentemente traumatizado. O
tratamento pode ser tanto não-cirúrgico, quanto cirúrgico a depender do tipo de
lesão, seu tamanho e localização. A maioria dos ferimentos do fígado é de
pequena gravidade, graus I e II, e por vezes não requer nenhum tratamento ou
são tratados apenas com suturas simples, eletrocauterização ou aplicação de
agentes hemostáticos tópicos. Por sua vez, as lesões mais complexas que
apresentam sangramento abundante durante a laparotomia podem representar
um grande desafio para o cirurgião.

- Baço: Dentre os órgãos abdominais, o baço é o órgão mais lesado por trauma
abdominal contuso. Atualmente, existe uma tendência à preservação do baço
sempre que possível. Os que apresentam lesão esplênica associada a lesão de
vísceras ocas ou a lesões de outros órgãos que necessitam de tratamento
cirúrgico devem ser operados imediatamente. Os doentes que apresentam lesão
esplênica isolada ou lesão esplênica associada a outras lesões de órgãos
parenquimatosos que não necessitam de tratamento cirúrgico podem ser
candidatos a tratamento não-operatório. Caso durante a cirurgia exista lesão
esplênica importante com sangramento ativo em doente instável
hemodinamicamente realiza-se a esplenectomia o mais rápido possível para
controlar o sangramento. Além do estado hemodinâmico, outros fatores devem
ser considerados, tais como a idade, o estado clínico do doente, seu nível de

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consciência, a necessidade de laparotomia por outras indicações, o nível da


hemoglobina, a extensão da lesão do baço, a presença de lesões associadas, a
disponibilidade de recursos de monitoração do doente em terapia intensiva e a
disponibilidade de sangue e de radiologia intervencionista. Geralmente o
tratamento não-operatório exige a monitoração cuidadosa. Após a realização da
tomografia computadorizada que classifica a lesão, devem-se fazer repouso
absoluto no leito, hidratação endovenosa, suporte nutricional, controle
hemodinâmico, controle de hemoglobina e hematócrito, de preferência em
unidade de terapia intensiva pelo menos nas primeiras 72 horas. Desde que o
doente permaneça estável e com trânsito intestinal normal, pode-se aumentar
a dieta até que ela seja geral e inicia-se a movimentação cuidadosa do doente.
Na maioria dos casos, o doente permanece internado por uma semana. Após um
período variável de observação clínica, o paciente pode receber alta, no entanto
deve permanecer em repouso relativo sem realização de esforços físicos,
trabalho pesado ou atividades esportivas. Em qualquer momento de dúvida ou
insegurança, o tratamento não-operatório pode ser interrompido e a cirurgia
realizada.

Referências bibliográficas

1. Colégio Americano de Cirurgiões. ATLS: Suporte Avançado de Vida no Trauma. 10ª


edição. Chicago: Copyright, 2018.
2. Gama Rodrigues, J.J.; Machado, M.C.C.; Rasslan, S. Clínica Cirúrgica FMUSP. São
Paulo: Editora Manole, 2008.
3. TOWNSEND C.D., BEUCHAMP R.D., EVERS B.M., MATTOX K.L. Sabiston: Tratado de
Cirurgia, A Base da Prática Cirúrgica Moderna. 18ª ed. Rio de Janeiro: Elsevier, 2010

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