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Sebenta de Atletismo

Corridas de Meio-fundo e Fundo

1. Introdução
As corridas de meio-fundo (MF) e fundo (F) são modalidades desportivas com grande
impacto social e com elevado prestígio internacional e nas quais Portugal atingiu um
nível de relevo.
Salienta-se a primeira medalha de ouro olímpica do desporto português obtida pelo
multicampeão Carlos Lopes na prova de maratona dos Jogos Olímpicos de Los Angeles,
em 1984. Este êxito foi o corolário de outros resultados desportivos de relevo entre os
quais se evidenciam a medalha de prata na corrida de 10.000 metros obtida também
por Carlos Lopes nos Jogos Olímpicos de Montreal em 1976 bem como a sua primeira
vitória no campeonato do mundo de corta-mato em 1976. Outros atletas voaram bem
alto no panorama desportivo internacional antes da medalha de ouro olímpica de
Carlos Lopes: António Leitão (medalha de bronze nos 5.000 metros dos JO de Los
Angeles), Rosa Mota (campeã europeia na maratona em Atenas, 1982).
O meio-fundo e fundo do Atletismo Português estão enriquecidos com os resultados
de uma plêiade de atletas, entre os quais, se salientam: Carlos Lopes e Rosa Mota,
obviamente pelas suas medalhas de ouro olímpicas na maratona, Fernanda Ribeiro
(nos 10.000 metros foi campeã olímpica em Atlanta - 1996, medalha de bronze nos JO
de Sidney – 2000, campeã do mundo em Gotemburgo – 1995 e campeã da Europa em
Helsínquia - 1994), Manuela Machado (campeã do mundo de maratona em
Gotemburgo, em 1995), António Leitão, Aurora Cunha (várias vezes campeã do mundo
de estrada), Paulo Guerra (campeão europeu de corta-mato em 1994, e medalha de
bronze no campeonato do mundo de corta-mato em 1999), Rui Silva (na prova de 1500
metros, medalha de bronze nos JO de Atenas, 2004, campeonato do mundo de
Helsínquia, 2005 e campeão do mundo nos 1500m em pista coberta em Lisboa, 2001).
Outros atletas de meio-fundo e fundo atingiram o patamar de excelência e honraram a
história desportiva nacional.

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A capacidade competitiva no meio-fundo e fundo dos atletas portugueses, extensível a
outros países europeus, tem vindo a ser progressivamente reduzida pela emergência
dos campeões africanos do Quénia e Etiópia mas também pela dificuldade de
encontrar jovens talentosos na formação. Temos de aceitar que a qualidade
competitiva de Carlos Lopes, Fernando Mamede, Rosa Mota, Manuela Machado e
Fernanda Ribeiro não se encontra fácil ao virar da esquina.
Urge redimensionar o Atletismo Português, sem importações ad hoc como fizemos
com o sprinter Obikwelu, mas com efetivos programas de deteção de talentos a nível
nacional aproveitando o trabalho desenvolvido em todo o país ao nível do desporto
escolar, aprofundando-o. Criar as condições sociais para o correto enquadramento
técnico desses jovens é o passo mais difícil, sem dúvida, mas o mais importante para
fazer o meio-fundo e fundo português renascer das cinzas.

2. A corrida de duração numa perspetiva filogenética


O Homo Sapiens é único, entre os primatas, na sua capacidade para a corrida de
endurance.
A postura bípede e a plena locomoção bípede são comportamentos-chave que os
humanos desenvolveram e lhes permitiram derivar bem cedo das outras linhagens de
primatas. Embora a passada bipedal inclua a marcha e a corrida, pensou-se que a
corrida não desempenhou um papel importante na evolução humana já que os
humanos, tal como os macacos, são fracos sprinters quando comparados com muitos
quadrúpedes. No entanto, os humanos desenvolveram uma elevada capacidade de
corrida de endurance graças a diversos fatores muitos dos quais deixaram traços no
próprio esqueleto. As evidências fósseis sugerem que a corrida de endurance é uma
capacidade desenvolvida pelo género Homo, originada há cerca de 2 milhões de anos e
pode ter tido uma importância instrumental na forma corporal humana (Bramble &
Lieberman, 2004).
Os nossos antecessores Australopithecus já andavam habitualmente há 4,4 milhões de
anos. No entanto, poucos autores estudaram a influência da corrida na evolução
humana.
No que diz respeito à corrida humana, deveremos considerar os princípios básicos
biomecânicos que fazem a distinção entre os padrões da passada na marcha e na

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corrida em todos os mamíferos, incluindo os bípedes humanos. Estas diferenças estão
bem caracterizadas. A marcha usa um "pêndulo invertido", em que o centro de massa
"avança" sobre a perna relativamente esticada durante a fase de apoio,
intercambiando a energia potencial e cinética eficientemente a cada passo. O custo
metabólico de transporte (CMT) para a marcha humana, bem como a de
outros mamíferos, é uma curva em forma de U, na qual a velocidade ótima
(cerca 1.3m/s) é em grande parte uma função do comprimento da perna.
A maioria dos humanos altera voluntariamente da marcha para a corrida quando a
marcha atinge uma velocidade de 2.3-2.5 m/s, o que corresponde intimamente à
intersecção das curvas CMT para marcha e corrida em humanos. A estas velocidades
mais elevadas, a execução torna-se menos dispendiosa na corrida que na marcha, pois
existe a vantagem de um mecanismo de "massa-mola" que troca as energias cinética e
potencial de um modo muito diferente (Figura 1).
Figura 1. Comparação entre marcha e corrida (Adaptado de Bramble & Liberman, 2004)

Os tendões ricos em colagénio e os ligamentos existentes na perna armazenam


energia da deformação elástica durante a parte inicial da fase de apoio para de seguida
libertar a energia durante a fase propulsora subsequente.
Para utilizar estas fontes de forma eficaz, as pernas irão fletir mais na corrida do que
na marcha: flexão e, em seguida, extensão do joelho e tornozelo durante a fase de
apoio.

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A rigidez dos membros inferiores em relação à massa do corpo em humanos é
semelhante à de outros mamíferos corredores.
A velocidade de corrida de endurance (CE) em atletas de elite varia entre 2.3 a 6.5 m/s.
A velocidade média de endurance em corredores de recreação varia entre 3.2 a 4.2
m/s. Do ponto de vista evolucionista, as velocidades da CE em humanos são
excecionais quando comparadas com outros primatas não humanos. Outros primatas,
como os chimpanzés, podem desenvolver elevadas velocidades mas em distâncias
curtas. Nenhum primata além do homem apresenta a capacidade para prolongar a
corrida.
Humanos treinados podem correr diariamente 10 km e corridas mais longas, como a
maratona, são realizadas por milhares de sujeitos em todo o mundo e por vezes várias
vezes durante um ano. Estas distâncias são difíceis, senão impossíveis, de atingir por
qualquer outro primata mas comparáveis àquelas obtidas por outros mamíferos em
espaços abertos. Os cães de caça africanos viajam em média 10 km por dia e lobos e
hienas viajam em média 14 e 19 km/d, respetivamente. Não quer dizer que os
humanos podem ultrapassar e capacidade de endurance de outras espécies. Alguns
cavalos e cães de trenó podem correr mais de 100 km em um dia enquanto puxam um
ser humano. No entanto, a capacidade de endurance do homem é extraordinária
malgrado a sua ancestralidade primata.
O único fator que penaliza a corrida humana é o custo energético da mesma. O custo
energético de corrida ajustada à massa corporal é cerca de 50% superior ao custo
energético de corrida de um mamífero típico, incluindo outros primatas (Taylor et al.,
1982). O bipedismo e a verticalidade de deslocamento oneram o gasto energético
durante a corrida.
Os humanos exibem muitas especializações músculo-esqueléticas para o bipedismo.
A análise estrutural e fisiológica subjacente à capacidade para a corrida de endurance
entre os mamíferos revela algumas características do género Homo que evoluíram nos
últimos 2 milhões de anos e que potenciam os humanos com uma superior capacidade
de suster no tempo uma corrida de endurance. Os humanos são os únicos primatas
capazes de suster uma corrida prolongada. Uma das características estruturais que se
acredita facilitar a eficiência energética durante a corrida de endurance são os tendões
fibrosos e alongados (e.g. tendão de Aquiles) que prendem feixes musculares curtos

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aos ossos das pernas e pés e que podem gerar força de forma económica. Os tendões
funcionam como molas que armazenam energia. Esta eficiência energética é pouco
visível na marcha mas pode poupar cerca de 35% do custo metabólico da corrida
(Alexander, 1991).
O arco plantar do pé também pode ser uma adaptação à corrida de endurance que
funciona como uma mola que reaproveita cerca de 17% da energia gerada durante a
fase de sobrecarga (excêntrica) da passada na corrida (Alexander, 1991). Para o arco
plantar ser uma mola efetiva, a articulação társica transversa deve restringir a rotação
entre o retro-pé e o tarso anterior permitindo o alongamento passivo dos ligamentos
plantares durante o apoio do pé médio.
Adaptações adicionais à corrida de endurance nos humanos (comparando com outros
primatas mais baixos e mamíferos quadrúpedes) incluem:
- Pernas longas facilitando o aumento do comprimento da passada; contudo, pernas
longas oscilantes aumentam o custo energético da corrida em proporção ao momento
de inércia da massa dos membros inferiores. Redução da massa dos membros distais
tem pouco efeito na bioenergética da marcha mas produz substanciais poupanças
metabólicas durante a corrida de endurance, aproximadamente proporcional ao
quadrado da distância da massa a partir da anca (Bramble & Liberman, 2004).
Redistribuindo 3.6 kg dos tornozelos para a anca, por exemplo, diminuiria o custo
metabólico da corrida humana a baixa velocidade (2.6 m/s) em 15% (Myers & Steudel,
1985). Pode-se especular que como os corredores africanos do Quénia e Etiópia
apresentam pernas mais longas e leves que esse fator é um dos muitos que poderão
contribuir para o seu domínio nas corridas de meio-fundo e fundo. No entanto, não
podemos avaliar a performance desportiva pela valorização exclusiva de um único
fator.
A frequência de passo é relativamente baixa em humanos o que reduz a força
necessária para oscilar as pernas pesadas (30% da massa corporal nos humanos
comparada aos 18% nos chimpanzés)
- Pés relativamente pequenos com tornozelos curtos (comparando com outros
primatas não humanos); o pé humano é somente 9% do total da massa da perna
enquanto no chimpanzé corresponde a 14%. Dedos curtos, nomeadamente o dedo
grande do pé.

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- Fibras musculares de contração lenta; grande músculo gluteus maximus. A elevada
percentagem de fibras de contração lenta pode ter sido originada em humanos a partir
de uma mutação do gene ACTN3 (Yang et al., 2003).
- Modificações estruturais na anca e ombros que gerem forças de contrabalanço que
permitem transições suaves entre passos;
- Glândulas sudoríferas, reduzido pêlo corporal e uma forma alongada corporal que
facilita a dissipação do calor;
- Respiração bocal.
Uma variedade de fatores genéticos e envolvimentais pode determinar a capacidade
de corrida de endurance entre os indivíduos. Um recente exemplo é um estudo
reportando um polimorfismo no gene que codifica a alfa-actinina 3 estava presente
com significativa alta frequência em atletas de endurance de elite e centenários
quando comparados com atletas de elite de potência e não centenários (Fiuza-Luces et
al., 2011). Um outro exemplo diz respeito ao nível de testosterona experienciada pelo
feto em desenvolvimento. Um ratio baixo entre o comprimento do segundo dedo
(dedo indicador) e o quarto dedo (dedo anelar), o qual há longo tempo sabia-se estar
associado com níveis relativamente elevados de testosterona fetal, foi recentemente
associado com uma superior capacidade para a corrida de endurance (Manning et al.,
2007).
Outras características foram desenvolvidas pelos antecessores do homo sapiens que
concorreram para a melhoria da funcionalidade na corrida de endurance: articulação
sacroilíaca estabilizada, tórax estreito, pélvis estreita, etc.

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Figura 2. Comparação dos contributos da amplitude de passada (a) e da frequência da passada (b) para a
velocidade de corrida em humanos e em mamíferos quadrúpedes. Uma passada é um ciclo completo de
dois passos para os humanos. Comparados com quadrúpedes de tamanho similar, os humanos têm uma
relativamente maior amplitude de passada e uma relativamente mais baixa frequência de passada no
âmbito das velocidades de corrida de endurance. Humanos aumentam a velocidade dentro da corrida
de endurance aumentando primeiramente a amplitude não a frequência (Adaptado de Bramble &
Liberman, 2004).

2.1. Existirá alguma conexão entre o cérebro e a capacidade de endurance?


Em relação aos outros primatas o cérebro humano é maior e pode ter desempenhado
um papel importante no desenvolvimento da capacidade de endurance. Estudos entre
espécies verificaram que existe uma correlação positiva entre o tamanho do cérebro e
taxa metabólica basal máxima. O que poderá significar isso? Uma razão pode estar
relacionada com as exigências cerebrais provocadas pela corrida de endurance que
deve ser vista como um complexo sistema de referências topográficas de ataque e
fuga e de memorização das fontes de comida e água. A corrida de endurance e de
velocidade também são marcadamente instrumentais na luta dos nossos
predecessores pela sobrevivência.
Portanto, a corrida de endurance aliada a uma elevada capacidade cognitiva
apresentava lógicas vantagens no processo de sobrevivência dos antecessores

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humanos. O sistema nervoso controla todos os aspetos do movimento humano, seja
este extremamente curto em duração (movimentos dos olhos) seja uma corrida
prolongada no tempo. A planificação da locomoção e dos restantes comportamentos
(e.g. estratégias de caça) contribuíram para a expansão do córtex cerebral nos
humanos.
Por isso, o exercício não só fortifica as células do músculo-esquelético como também
estimula e reforça as células cerebrais. Está bem estabelecido que os exercícios de
endurance podem estimular o crescimento das células cerebrais e melhorar as funções
cognitivas. A corrida estimula a produção de fatores neurotróficos, muito
especialmente o fator neurotrófico derivado do cérebro, BDNF (Brain Derived
Neurothrophic Factor) o qual promove o crescimento dos dendritos, o fortalecimento
das sinapses e mesmo a produção de novas células nervosas a partir das células
satélite em algumas regiões do cérebro (Kobilo et al. 2011). Os mecanismos celulares e
moleculares pelos quais a expressão do BDNF é aumentada pelo exercício
desempenham um papel importante na regulação do metabolismo energético através
de ações desencadeadas em diversos sítios do sistema nervoso (Noble et al., 2011).
O desenvolvimento do cérebro está filogeneticamente relacionado com a melhoria dos
sistemas de controlo da vida dos nossos predecessores, nomeadamente na recolha,
armazenamento e proteção dos recursos alimentares.
O exercício retarda o decréscimo de força muscular e de endurance através da
Hormesis. Este conceito corresponde a um processo evolucionário conservado, pelo
qual uma pequena dose de um estímulo stressante ativa uma resposta adaptativa que
aumenta a resistência da célula ou organismo a um nível de stresse de moderado a
severo (Calabrese et al., 2007).
O exercício, nos animais jovens, induz a produção de superóxido e óxido nítrico nas
células musculares, e as subsequentes espécies reativas (ROS) estimulam diversos
fatores de transcrição (AP-1, HSF-1 e NF-κB) os quais induzem a expressão de enzimas
antioxidantes e chaperonas proteicas (Jackson & McArdle, 2011). O efeito cito-
protetor aumentado das proteínas permanece muito para lá do período do exercício,
prolongando no tempo a resiliência das células musculares. A importância da
sinalização genética mediada pelos ROS nos benefícios induzidos pelo exercício físico é
suportada pelos dados que demonstram que o tratamento com antioxidantes

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(vitaminas E e C) anula a capacidade do exercício em ativar o PGC-1α (co-ativador
transcricional que regula os genes envolvidos no metabolismo energético) e aumentar
a sensibilidade à insulina nas células musculares (Ristow et al., 2009). O stresse
oxidativo provocado na célula durante o exercício pode também desencadear a
biogénese mitocondrial, um processo mediado pela PGC-1α, um importante regulador
no crescimento e divisão das mitocôndrias (Wright ey al., 2007). O exercício de
endurance desenvolve respostas citoprotetoras em todos os grandes organelos
celulares produzindo, além disso, outros fatores que contribuem para o crescimento e
resiliência das células adjacentes como o IFG-1 e o fator vascular-endotelial de
crescimento celular (Olfert et al., 2009).
Esta capacidade adaptativa é afetada pelo processo de envelhecimento. Em ratos
muito velhos verificou-se que o exercício de endurance não promovia o aumento das
enzimas antioxidantes e das chaperonas proteicas bem como da biogénese
mitocondrial; no entanto, essa deficiência pode ser parcialmente compensada por
alguma capacidade antioxidante constitutiva (talvez por efeito hormético em relação a
estímulos anteriores).
Em humanos, o exercício pode atrasar a emergência da atrofia muscular. Vários
estudos comprovaram que o exercício de endurance produz claros benefícios no
sistema cardiovascular mesmo quando iniciado tarde no decurso da vida.

2.2. Fatores neurotróficos induzidos pelo exercício de endurance que medeiam os


efeitos anti-envelhecimento no cérebro
As células do cérebro são claramente respondentes ao exercício físico. Estudos em
animais e humanos suportam a hipótese que o exercício induz a expressão de fatores
neurotróficos os quais promovem a plasticidade estrutural e funcional dos neurónios e
a sua resistência à lesão e doença (Gomez-Pinilla, 2008; Zoladz & Pilc, 2011).
Estudos recentes em humanos verificaram que o declínio na performance cognitiva
estava relacionada com a redução do BDNF circulante e que o treino de endurance
pode elevar os níveis de BDNF, aumentar o tamanho do hipocampo e melhorar a
memória de sujeitos idosos (Erickson et al, 2011). Dois mecanismos pelos quais a
expressão do BDNF é induzida pela corrida de endurance são a atividade sináptica
mediada pelo fator de transcrição de ativação CREB (Cyclic AMP response element-

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binding protein) e a ativação do fator de transcrição NF-κB mediado pelo stresse
energético. CREB pode ser considerado um sensor de stresse porque não só induz a
expressão do BDNF mas também a expressão de múltiplos genes que codificam
proteínas que protegem os neurónios contra o stresse oxidativo, incluindo a enzima
APE1 reparadora do ADN (Yang et al., 2010).
Múltiplas vias de sinalização intercelular evoluíram e coordenam a resposta adaptativa
do cérebro ao exercício. Por exemplo, para lá do BDNF, o exercício também induz a
expressão do fator 2 de crescimento do fibroblasto (FGF2) e VEGF (fator de
crescimento do endotélio vascular) no cérebro (Gomez-Pinilla et al., 1998; Favel et al.,
2003). FGF2 pode proteger os neurónios contra o stresse oxidativo e lesão metabólica
e excitotóxica (por libertação excessiva de glutamato que pode induzir morte
neuronal) e também promover o crescimento dos astrócitos, um tipo de célula glial
que providencia suporte metabólico aos neurónios. FGF2 também promove a
proliferação de células progenitoras dos neurónios e pode, conjuntamente com o
BDNF, desempenhar um papel na neurogénese induzida pelo exercício (Bull & Bartlett,
2005). Acresce que foi verificado que a corrida aumenta a expressão do VEGF e
potencia a angiogénese no hipocampo de roedores (Kerr et al., 2010) o que aumentará
o aporte de nutrientes às células cerebrais.
Durante o exercício físico de endurance verifica-se o aumento da utilização de energia
pelo músculo ativo e coração. No entanto, o cérebro pela sua ação coordenadora
nunca pode ver o seu suporte energético comprometido. O cérebro é “egoísta” e faz
uma partilha energética aos outros tecidos sempre a partir da supressão das suas
necessidades.
O BDNF é um regulador pivô do metabolismo energético e mediador de muitas
respostas adaptativas diferentes do cérebro e restante corpo ao exercício de
endurance. Vários estudos, revistos por Mattson (2012) comprovam a importância do
BDNF.
- Níveis reduzidos de BDNF provocam, em ratos, hiperfagia e desenvolvimento de
obesidade e diabetes. A expressão aumentada do BDNF pode mediar, em parte, o
aumento da sensibilidade à insulina que ocorre como resposta ao exercício de
endurance. Esta última possibilidade é consistente com estudos que evidenciaram que

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a infusão de BDNF no cérebro pode reduzir a glicose plasmática e melhorar a diabetes
em ratos.
- A expressão do BDNF hipotalâmico pode induzir a formação de células castanhas no
tecido adiposo branco.
- As adaptações cardiovasculares à corrida de endurance podem envolver também a
sinalização do BDNF no sistema nervoso.
- BDNF melhora o tónus parassimpático e aumenta a variabilidade da frequência
cardíaca.
Os humanos exibem uma série de adaptações à corrida de endurance que incluem
aspetos da anatomia músculo-esquelética e fisiologia, regulação cardiovascular e
eficiência metabólica. Um fascinante aspeto da evolução da capacidade para a corrida
de endurance é a aparente co-evolução das vias de sinalização que regulam a
neuroplasticidade e as adaptações periféricas ao exercício. A sinalização do BDNF e o
seu recetor trkB parecem estar ligados à seleção de fenótipos ligados à corrida de
endurance.
Por isso a corrida de endurance coloca em jogo uma série de mecanismos adaptativos
sistémicos que têm no cérebro o centro fundamental de controlo. Quando alguns
dizem que a corrida é pouco complexa em termos neurais devem atentar na riqueza
das interconexões que ela promove.

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Referências

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3. Bases científicas da corrida de duração
A performance na corrida de duração está condicionada por uma série de fatores:
- Consumo máximo de oxigénio (VO2max)
- Economia de corrida
- Limiar anaeróbio e endurance
- Altitude
- Idade
- Género
- Perfil fibrilar
- Condições anatómicas, etc.

3.1. VO2max
A capacidade humana de desenvolver esforços prolongados está diretamente
relacionada com os sistemas oxidativos de produção de energia – metabolismo
oxidativo, cujo conceito-chave fisiológico é o consuma máximo de oxigénio (VO2max).
O VO2max corresponde à taxa máxima de captação, transporte e utilização de
oxigénio durante exercício que se prolongue no tempo e que envolva grandes massas
musculares.
Para Ekblom (1986), o VO2max corresponde ao mais elevado pico de consumo de
oxigénio que um sujeito pode obter durante um exercício dinâmico, solicitando
grandes massas musculares, durante poucos minutos e em condições normais ao nível
do mar.
O consumo de oxigénio está diretamente relacionado com o Débito Cardíaco (Volume
Sistólico x Frequência Cardíaca), com o conteúdo arterial de oxigénio e com a
capacidade extrativa do músculo (diferença arteriovenosa). Portanto, o VO2max está
condicionado pelo débito cardíaco máximo e pela máxima capacidade de extração de
oxigénio pelo músculo. Um terceiro fator a ter em conta diz respeito à capacidade de
difusão do oxigénio pelos tecidos que nos indica a eficiência da transferência do
oxigénio desde o capilar até à mitocôndria.
Além dos fatores cardiorrespiratórios e musculares o VO2max depende também de
diversos fatores relacionados com o envolvimento. Assim, em altitude, a diminuição da

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pressão parcial de oxigénio no ar atmosférico afeta o VO2max, reduzindo-o tanto mais
quanto mais elevada é a altitude a que o exercício é desenvolvido.
O conceito VO2max é muitas vezes assimilado como Potência Máxima Aeróbia (PMA).
Embora sejam correspondentes, o primeiro é um conceito fisiológico enquanto o
segundo é um conceito ergonómico. A PMA corresponde à capacidade de trabalho
atingida ao nível do VO2max. Enquanto o VO2max se exprime em L.min -1 (consumo
absoluto) ou ml.kg-1.min-1 (consumo relativizado ao peso corporal), a PMA exprime-se
em km.h-1, m.s-1, watt.kg-1, etc.
A capacidade de utilização do oxigénio em repouso não difere entre sujeitos treinados
e sedentários. Em esforço, o sujeito treinado pode atingir o dobro do VO2max de um
sedentário. No quadro 1 podemos verificar as diferenças ao nível do consumo de
oxigénio a diferentes intensidades de trabalho entre sujeitos treinados e destreinados.

Tabela 1. Indicadores fisiológicos e ergonómicos de sujeitos treinados e não treinados (Adaptado de


Savard et al., 1987)
Sujeitos Intensidade Intensidade VO2 Tempo Total
Trabalho Relativa (L.min-1) Trabalho Trabalho
(watts) (%) (min) (kg)
Destreinados 175 77 2.40 118 5.890
Treinados 175 59 2.43 400 19.700
Treinados 225 78 3.20 134 8.800

Em repouso o homem consome cerca de 250 ml de O2 por minuto; em exercício um


sujeito saudável pode aumentar esse consumo cerca de 10 vezes, enquanto um atleta
altamente treinado pode atingir um consumo cerca de 20 vezes superior ao valor basal
(Brooks & Fahey, 1984).
O caminho que o oxigénio percorre desde o ar atmosférico até à mitocôndria é
constituído por uma série de patamares, cada um dos quais pode representar um
potencial fator condicionante do fluxo de oxigénio. Assim o VO 2max está limitado pela
capacidade do sistema cardiovascular de transportar o oxigénio desde os pulmões até
aos músculos ativos, e é determinado pelo débito cardíaco máximo, o conteúdo
arterial de oxigénio e a máxima diferença arteriovenosa de oxigénio, que indicia a
capacidade extrativa do músculo e a expressão funcional do mesmo.

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Os fatores que podem limitar o VO2max podem ser de origem Central (capacidade de
difusão pulmonar, débito cardíaco máximo e capacidade sanguínea de transporte de
oxigénio) e Periférica (características do músculo-esquelético). Para Ekblom (1986), O
VO2max está condicionado por fatores neurais (comando simpático), fatores
hemodinâmicos (bombeamento cardíaco, distribuição periférica de sangue,
processamento intracelular) e fatores do envolvimento (dinâmica pulmonar, condições
de pressão parcial dos gases).

3.1.1. Fatores Centrais


. Capacidade de difusão pulmonar

A quantidade de oxigénio que entra nos pulmões e o nível de difusão alvéolo-capilar


condicionam a disponibilidade de oxigénio. A funcionalidade pulmonar pode
comprometer a capacidade aeróbia mesmo de atletas treinados. As diferenças de
aptidão ventilatória são nítidas entre sujeitos de diferente condição física e aptidão
atlética como poderemos ver pelo quadro 2.

Tabela 2. Capacidades cardiovasculares e pulmonares determinadas durante exercício máximo em


estudantes colegiais e atletas olímpicos (Savard et al., 1987)
FACTORES CONTROLE ESTUDANTES ESTUDANTES ATLETAS
Após Acamação Após Treino OLÍMPICOS

VO2max (L.min-1) 3.30 2.43 3.91 5.38

Ventilação Máx. (L.min-1) 191 201 197 219

Coeficiente Transf. O2 96 83 86 95
-1
(ml.min /mmHg)
Conteúdo Arterial O2 21.9 20.5 20.8 22.4
(Vol%)
Déb. Card. Máx. (L.min-1) 20.0 14.8 22.8 30.4
Volume Sistólico (ml) 104 74 120 167
F.C. máx (bat.min-1) 192 197 190 182
Diferença Arteriovenosa O2 16.2 16.5 17.1 18.0
(Vol%)

18
Embora os fatores circulatórios e extrativos sejam fundamentais o VO2max também
pode ser condicionado pela funcionalidade pulmonar. Alguns estudos em sujeitos
saudáveis demonstraram que a saturação do oxigénio do sangue arterial permanece
alta (sempre acima dos 90%), quer em sedentários quer em atletas de elite, mesmo
durante esforços máximos, o que sugerirá que nem a ventilação nem o fluxo sanguíneo
pulmonar se constituirão como fatores limitativos do VO2max (Maughan, 1992). No
entanto, Dempsey et al. (1984) demonstraram que atletas de endurance de elite estão
mais sujeitos à dessaturação arterial de oxigénio que indivíduos normais. Como os
atletas altamente treinados, em relação a sujeitos destreinados, apresentam elevados
valores de débito cardíaco (40 contra 25 L.min -1) isso pode induzir uma diminuição do
tempo de trânsito dos eritrócitos nos capilares pulmonares e consequentemente
provocar dessaturação. Em atletas muito bem treinados, atingindo altos débitos
cardíacos, o tempo de trânsito capilar pode ser demasiado curto, pelo menos em
alguns capilares, obstando por isso á obtenção do equilíbrio entre gases (Maughan,
1992). No entanto tal facto parece estar mais relacionado com afeções e dificuldades
respiratórias. Assim, enquanto um grupo de atletas com o desenvolvimento do
exercício dessaturava ( 87%) o grupo de controle, sem deficiências respiratórias,
apresentava uma saturação arterial de O2 da ordem dos 92% (7). Os atletas que
dessaturavam apresentavam uma pCO2 relativamente mais elevada, uma ligeira
redução na ventilação alveolar, uma mais ampla diferença tensional de oxigénio entre
a artéria e o alvéolo (Dempsey et al., 1984). Embora as diferenças sejam pouco nítidas
podem ao nível do esforço máximo induzir diferenças de performance. No mesmo
estudo, o VO2max foi melhorado (de 70 para 75 ml.kg-1.min-1) nos atletas que
dessaturavam, induzindo uma situação de hiperoxigenação (variando a pO 2 de 21 para
26%) nos gases inspirados. Estas considerações ganham especial acuidade em atletas
mais idosos, já que a capacidade elástica dos pulmões vai-se reduzindo com a idade,
afetando a capacidade máxima respiratória. De igual forma o trabalho dos músculos
que controlam a respiração torna-se menos eficiente, e pode atingir um custo
metabólico que pode atingir os 12 - 16 % do VO2max.
No entanto, em situações normais a capacidade máxima do pulmão em transferir
oxigénio para o sangue está longe de ser saturada (Dempsey et al., 1988). Segundo
Savard et al. (1987) o limite máximo de transferência pulmonar de oxigénio quer em

19
sedentários quer em atletas de endurance é de 90 - 100 ml.kg-1.min-1, o que excede em
muito a capacidade de utilização periférica de O2.
De igual forma aos outros sistemas fisiológicos relacionados com o VO2max, o sistema
pulmonar apresenta um expressivo grau de treinabilidade.

Tabela 3. Solicitações dos sistemas de controlo pulmonar (Dempsey et al., 1988)


Repouso Exercício Ex. Máximo * Ex. Máximo *
Moderado Não Treinado Treinado

VO2 (l.min-1) 0.3 1 3 5

CvO2 (ml.100mg-1) 15 11 6 <2

PvCO2 (mmHg) 46 52 65 > 75-80

Ventilação Alveolar 5 25 90 140


Fluxo Sang. Pulmonar 5 11 20 27
* O exercício máximo corresponde ao VO2max

Não são só os músculos efetores de movimento que desenvolvem as suas aptidões


aeróbias; tomando como exemplo o diafragma (principal músculo respiratório)
verificamos que o treino de endurance aumenta a sua capacidade oxidativa (Tamaki,
1987), o que se vai refletir numa superior resistência à fadiga.

. Débito cardíaco
Segundo Cerretelli e DiPrampero (1987) o contributo do Débito Cardíaco Máximo para
o VO2max varia entre 70 e 85%. Isto evidencia a importância deste fator e justifica a
tese da limitação central advogada por Hill nos anos 20. A quantidade de sangue
bombeada pelo coração na unidade de tempo está dependente de uma série de
fatores, tais como: retorno venoso, frequência cardíaca, volume de ejeção sistólica,
etc.. Em atletas muito bem treinados o volume sistólico pode atingir o dobro dos
sedentários, ultrapassando 200 ml (Astrand & Rodahl, 1986). Dadas as pequenas
variações de frequência cardíaca máxima entre sujeitos treinados e não treinados,
vários estudos demonstram a importância do volume de ejeção sistólica no VO2max. É
um facto comprovado que os sujeitos treinados em relação aos destreinados

20
apresentam um volume sistólico maior, quer em exercício máximo quer em exercício
submáximo (Hermansen, 1973; Saltin, 1990).
Nota: Enquanto o músculo-esquelético aumenta a sua força de contração pelo
recrutamento seletivo de fibras de superior capacidade contráctil, o miocárdio
aumenta a sua força contráctil à custa de contrações mais vigorosas de cada uma das
suas fibras (Brooks & Fahey, 1984). O aumento da inotropia (aumento de força
contrátil) do miocárdio apoia-se na eficácia da Bomba de Cálcio e na sua ação direta
sobre a miosina-ATPase. Como alguns dados indiciam que a capacidade contráctil do
miocárdio é quase idêntico ante e pós-treino, parece ser o volume diastólico final o
fator determinante nos limites do VO2max (Saltin & Gollnick, 1983). Os dados em
humanos são exíguos e não permitem esclarecer as dimensões da variabilidade da
contractilidade do miocárdio como adaptação crónica.
O aumento do volume sistólico dos sujeitos treinados está relacionado com a
capacidade do coração em ceder oxigénio. Segundo Savard et al. (1987) a capacidade
do miocárdio em ceder O2 é de 50-60 ml.kg-1.min-1 em sedentários e muito superior
(80-100 ml.kg-1.min-1) em atletas fundistas. Interessa também salientar que é
necessário ter músculos treinados para induzir um ótimo volume sistólico (Saltin &
Gollnick, 1983). Vários estudos longitudinais evidenciaram que o aumento no VO2max
induzido pelo treino resulta primeiramente do aumento do débito cardíaco e só depois
da diferença arteriovenosa.

. Capacidade sanguínea de transporte de oxigénio


O VO2max está também condicionado pela capacidade que o sangue apresenta de
transportar oxigénio. Assim, como adaptação crónica aos esforços prolongados
estimula-se por um lado o aumento do volume plasmático com implicações positivas
em relação ao retorno venoso e ao volume sistólico e por outro estimula-se a
eritrogénese com aumento subsequente da taxa de concentração de hemoglobina
(Hb) que é o elemento principal de transporte de oxigénio no sangue.
Hemoglobina
A percentagem de Hb condiciona diretamente a quantidade de oxigénio que chega aos
tecidos bem como o VO2max, já que este é aumentado quando se eleva artificialmente
a Hb circulante (Ekblom, 1986). Estes dados são reforçados por outros estudos (Buick

21
et al., 1980) que verificaram melhorias significativas no VO2max, quer em sedentários
quer em atletas de endurance, a partir do aumento da contagem eritrocitária. Os
aumentos concomitantes da contagem eritrocitária, do hematócrito e da percentagem
de hemoglobina, todos concorrem para o aumento do VO2max, como podemos
verificar no quadro que se segue.

Tabela 4. Análise em exercício de variáveis hematológicas, transporte e consumo máximo de O2,


de seguida à reinfusão autóloga de 1000 ml e 1500 ml de sangue (Gledhill et al., 1981)
Pós-reinfusão
Variáveis Controle 1000 ml 1500 ml
Hb (g. 100 ml-1) 16.0 ± 0.2 17.2 ± 0.1 17.6 ± 0.1
Hct (%) 45.6 ± 0.3 49.2 ±0.3 50.5 ± 0.2
CaO2 (ml.100 ml-1) 20.0 ± 0.6 21.3 ±0.2 22.0 ± 0.4

VO2max (L.mim-1) 5.04 ± 0.21 5.24 ±0.22 5.38 ± 0.25

Para existir uma redução do VO2max é forçoso que a concentração de hemoglobina


seja inferior a 11 g/100 ml (Gledhill et al., 1981). É normal encontrar em maratonistas
de elite baixos níveis de hemoglobina (pseudoanemia dilucional) e tal facto não
invalida que eles desenvolvam prestações desportivas aeróbias de alto nível.
Quanto à potenciação eritrocitária e aumento da volémia também devem existir
limites, acima dos quais se perde funcionalidade, no primeiro caso devido à excessiva
viscosidade e no segundo por acentuada diluição.
Embora os eritrócitos sejam, sem dúvida, os principais determinantes da viscosidade
sanguínea, parece que os valores máximos para a frequência cardíaca, volume sistólico
e débito cardíaco não são diferentes após perda sanguínea (Hb = 121 g/l) ou após
reinfusão (Hb = 144 g/l), quando comparados com a situação normal (Hb = 138 g/l), e
malgrado as diferenças ao nível do VO2max (15).

Nível de saturação da Hb
A capacidade de saturação da hemoglobina em oxigénio relaciona-se diretamente com
a pO2, pH, temperatura, pCO2 e 2,3 Difosfoglicerato (2,3-DPG). Mesmo durante
exercício físico máximo a saturação arterial de O2 permanece cerca de 95%. Os atletas

22
de endurance apresentam normalmente um nível de saturação menor que outros
atletas e mesmo sedentários. Tal facto está em concordância com uma menor
percentagem na concentração de hemoglobina que caracteriza estes fundistas que
assim determina um menor conteúdo arterial de oxigénio; estas são adaptações
normais e fisiológicas conotadas com o aumento de rendimento em esforços
prolongados.

Tabela 5. Valores médios e amplitude do índice de saturação de oxigénio (SO2), hemoglobina (Hb) e
conteúdo arterial de oxigénio (CaO2), durante exercício físico exaustivo (Sutton, 1992)
Amostra n VO2max SO2 Hb CaO2
(ml.kg-1.min-1) (g.L-1) (ml.L-1)
Jovens 18 38 94 (92-96) 158 (149-169) 200 (188-218)

sedentários
Jovens 18 52 94.5 (92-96) 159 (151-163) 201 (191-208)

treinados
Atletas 8 74 93 (89-95) 151 (147-162) 188 (179-204)

endurance

O conteúdo arterial de oxigénio é o produto da saturação arterial de oxigénio e da


hemoglobina, e será tanto maior quanto maior for a massa eritrocitária.

3.1.2. Fatores periféricos


. Características do músculo-esquelético
Composição Muscular

O indivíduo com uma alta percentagem de fibras do Tipo I (slow twitch), apresenta
uma superior aptidão metabólica oxidativa, pese embora o facto de que o treino
contínuo e sistemático potencia de igual forma o perfil oxidativo dos outros tipos de
fibras (Essén-Gustavsson & Henriksson, 1984). O VO2max está relacionado com o perfil
fibrilar do sujeito. Nunca um maratonista poderia atingir elevadas performances
específicas se apresentasse elevadas percentagens de fibras de contração rápida do
tipo IIb. Em relação às fibras de contração rápida IIa, verifica-se que os corredores de

23
meio-fundo e fundo de elite apresentam uma superior concentração que corredores
de menor nível.

Perfil enzimático muscular


O VO2max depende em certa medida dos mecanismos enzimáticos oxidativos. O
aumento do potencial oxidativo intramuscular está relacionado com o aumento da
atividade das enzimas-chave do Ciclo de Krebs e da Fosforilação Oxidativa (e.g.
succinato desidrogenase, citocromo oxidase) (12). As adaptações enzimáticas são
rapidamente reversíveis e mais que fatores determinantes na melhoria do VO2max
constituirão fatores locais de controlo correlacionados com a eficácia metabólica
(Saltin, 1990).

Mioglobina
É o pigmento intracelular fixador do oxigénio. Quanto maior a percentagem deste
substrato maior é a quantidade de oxigénio em reserva, donde deriva a facilitação para
a sua utilização metabólica, sendo no entanto uma reserva negligenciável durante o
exercício físico intenso que promova o VO2max.

Perfil mitocondrial
Dentro das fibras musculares as mitocôndrias são os locais onde o O 2 é consumido na
etapa final da cadeia de transporte dos eletrões. O tamanho, número e localização das
mitocôndrias interferem diretamente na taxa do metabolismo oxidativo. Segundo
Svedenhag e Sjodin (1985) o aumento da massa mitocondrial devido ao treino
concerne, nos jovens, fundamentalmente ao número de mitocôndrias, enquanto nos
mais velhos assenta no tamanho das mesmas. De igual forma interessa verificar que
são as mitocôndrias sarcolemais, em relação às intermiofibrilares, que sofrem maior
aumento percentual já que lhes estão cometidas várias funções determinantes para o
processo energético intracelular. Ou seja (Hoppeler et al., 1992):
- Metabolização dos lípidos de baixo poder de difusão
- Manutenção da integridade da membrana
- Fornecimento de ATP para as bombas de cálcio

24
A superior aptidão funcional e energética das mitocôndrias sarcolemais assenta na sua
menor distância de difusão para os capilares.
Importa referir que não existe uma relação direta entre o aumento do número e
tamanho das mitocôndrias e o VO2max; em teoria aumentando para o dobro o número
de mitocôndrias aumentar-se-ia para o dobro os locais de captação de O2. Contudo
estudos em humanos detetaram reduzidos aumentos do VO2max (20 a 40%) malgrado
aumentos de 2.2 vezes nas enzimas mitocondriais (Saltin et al., 1977). Esta constatação
colabora na tese da limitação central do VO2max.
Então, por que razão o treino de endurance aumenta a massa mitocondrial?
- - Para aumentar a taxa de oxidação dos ácidos gordos, poupando assim o
glicogénio muscular e a glicose sanguínea
- - Diminuindo a concentração de lactato durante o exercício obstará à
acentuação da acidose intracelular afetando menos as propriedades contrácteis do
músculo-esquelético.
Assim o aumento massa mitocondrial estará menos relacionada com o aumento do
VO2max e mais com o aumento da endurance e da eficiência metabólica que lhe está
conotada.

Densidade Capilar
O VO2max está condicionado quer pelo número de capilares quer pela densidade
capilar. O aumento da densidade capilar permitirá um aumento do tempo de trânsito
do sangue no capilar e desta forma melhorar a eficiência das trocas energéticas entre
o músculo e a corrente sanguínea. Dentro das adaptações periféricas parece que a
capilarização (aumento da densidade capilar e da relação capilar/fibra) é a mais
importante e a melhor relacionada com o VO2max.
Segundo Saltin (1990) embora o aumento da capilarização e o consequente aumento
do tempo de trânsito capilar possam ter uma ligeira correlação com o VO 2max, parece
que este tipo de adaptação está mais relacionada com os fenómenos correlativos ao
treino de endurance, fundamentalmente o aumento da captação celular de ácidos
gordos livres, e a consequente melhoria da eficácia energética muscular.

25
Capacidade de difusão periférica (Diferença arteriovenosa)
A capacidade de difusão determina a quantidade de oxigénio que é transportado
desde a rede capilar até à mitocôndria. A partir do momento que exista uma baixa pO 2
celular relativamente à pO2 sanguínea, estão criadas as condições para manter a força
de difusão aumentando assim a condutância do oxigénio. As alterações no VO 2max
refletem a evolução da diferença arteriovenosa que baixa quando baixa o conteúdo
arterial de oxigénio. Há uma forte ligação entre o conteúdo arterial de O 2, a diferença
arteriovenosa e o VO2max (Maughan, 1992). Sem dúvida que sem um gradiente de
difusão periférico o consumo de oxigénio não aumentará. Assim o VO 2max estará
dependente da interação entre o transporte de O2 e captação mitocondrial. A lógica
deste raciocínio é insuficiente para nos elucidar acerca de qual dos fatores limita o
VO2max.

3.1.3. OUTROS FACTORES CONDICIONANTES DO VO2max


Comando neural
Em última análise é o sistema nervoso que comanda o organismo durante o exercício
físico. Este controle determina a solicitação seletiva da massa muscular que se vai
implicar no VO2max.
Parece comprovar-se que o sistema nervoso promove o recrutamento diferencial dos
músculos em diferentes estádios. Por exemplo, durante o exercício de bicicleta, cada
músculo contribui com uma percentagem variável da força de pedalagem em função
da potência desenvolvida. No caso do quadríceps a sua contribuição começa no início
de exercício, enquanto o gluteus maximus (um extensor da coxa) vai-se envolvendo
progressivamente em função do aumento da intensidade do exercício. De igual forma,
dentro de cada músculo denota-se a eficácia do controle neural. Por exemplo, no
vastus lateralis o recrutamento seletivo é o mecanismo determinante na potência
desenvolvida (Green & Patla, 1992).
O sistema nervoso simpático implica-se na redistribuição do fluxo sanguíneo quando a
capacidade de bombeamento cardíaco é ultrapassada pelas exigências da massa
muscular ativa. O músculo-esquelético pode consumir pelo menos 300 ml.kg-1.min-1 de
oxigénio; como somente 10 kg de massa muscular é suficiente para em exercício
promover o VO2max, se maior quantidade de massa muscular for ativada o comando

26
simpático induzirá uma ação vasoconstritora (através da ação de barorecetores) que
permitirá responder à vasodilatação solicitada pela massa muscular de novo implicada
e assim manter a pressão sanguínea.

Massa Muscular Ativa


Corresponde à percentagem de massa muscular com participação direta e
fundamental no exercício. Parece que o ser humano não está constituído para poder
fazer exercício simultaneamente com braços e pernas, pelo menos do ponto de vista
da capacidade de bombeamento cardíaco (Saltin, 1990).
Existe uma dada percentagem de massa muscular que propicia o VO 2max. Saltin

(1990) concluiu que numa pessoa normal sedentária, com um Débito Cardíaco de 18 a
22 L.min-1, cerca de 7 a 9 kg de massa muscular em exercício são suficientes para
promover a capacidade total de bombeamento cardíaco. Ou seja 1/3 ou 1/4 da massa
muscular total de um sujeito sedentário pode consumir 2.5 a 4 L.min-1, o equivalente
ao VO2max.
Em humanos destreinados o VO2max é atingido na corrida. E em treinados e
destreinados o VO2max é significativamente menor no exercício de bicicleta do que na
corrida. Astrand e Saltin (1961) encontraram os seguintes valores de VO2max, para
dois tipos de exercício:
- 2 Pernas (corrida) - 4.69 L.min-1
- 2 Pernas (bicicleta) - 4.47 L.min-1
O VO2max obtido pela combinação do trabalho de braços e pernas é bem menor do
que seria suposto pela adição dos consumos máximos separados (Hermansen,1973):
- 2 Pernas (12-15 kg de massa muscular) = 4.71 L.min-1
- 2 Pernas + 2 braços (17-22 kg de massa muscular) = 4.82 L.min-1
Uma massa muscular nitidamente superior induz uma pequena variação no aumento
do VO2max. Tal facto deve-se à ação do sistema regulador neural (barorecetores)
durante o exercício que promove uma vasoconstrição nos músculos das pernas para
permitir uma tensão sanguínea ajustada à massa muscular acrescida; isto acontece
independentemente do aumento dramático de vários metabolitos vasodilatadores,
tais como lactato e K + (Savard et al., 1987). O quadro que se segue evidencia o que
acabamos de explanar.

27
Tabela 6. Picos de consumo de oxigénio e débito cardíaco durante exercício exaustivo
realizado com diferentes frações de massa muscular . Adaptado de Saltin (1990).
Variável 1 Perna 2 Pernas 2 Pernas +2 braços
Pico do VO2 Pulmonar (L.min-1) 2.86 3.29 3.36

Pico de Débito Cardíaco (L.min-1) 18.4 19.9 20.5

Idade
O avanço da idade afeta negativamente o VO2max, quer pela diminuição da frequência
cardíaca máxima (diminuição da velocidade de condução dos estímulos bioelétricos do
miocárdio) quer pela diminuição do volume de ejeção sistólica. No entanto, o declínio
do VO2max será tanto menos acentuado quanto mais ativo se mantiver o sujeito. De
igual forma, em qualquer idade, a passagem da situação de sedentário para
fisicamente ativo melhora o VO2max e as restantes variáveis relacionadas com a
funcionalidade fisiológica.

3.1.4. Limitação Central ou Periférica do VO2max?


Em síntese podemos dizer que a tese da Limitação Central apoia-se no facto de que
existe um Débito Cardíaco Máximo, finito e não modificável independentemente da
quantidade da massa muscular solicitada. A tese da Limitação Periférica assevera que
existe uma capacidade máxima de difusão do oxigénio entre os tecidos, e que é
expressa pela diferença entre a tensão capilar de oxigénio e a tensão de oxigénio no
sangue venoso.
Estes modelos explicativos não são antagónicos mas sim complementares, pois
podemos deparar com uma situação em que um inadequado fluxo muscular de sangue
pode reduzir a pO2 capilar e consequentemente limitar o gradiente de difusão de
oxigénio (Sutton, 1992).
Nos exercícios envolvendo uma grande percentagem de massa muscular, e em
situações de normalidade, o VO2max é normalmente limitado pela cedência de
oxigénio aos músculos em exercício e menos pela capacidade dos mesmos em utilizar
o oxigénio. A capacidade de utilização periférica de O2 ultrapassa em muito a
capacidade de captação e transporte dos sistemas a montante do músculo. Savard et
al. (1987) estabeleceram o limite máximo de consumo muscular de oxigénio em 150 -
200 ml.kg-1.min-1 para sedentários e 200 - 300 ml.kg-1.min-1 para fundistas. Constata-se
28
assim que os fatores periféricos são menos limitativos que os centrais para atingir
elevados valores de VO2max.
Cada etapa da via metabólica do oxigénio pode concorrer como fator limitativo do
VO2max.
Assim:
- A redução na capacidade de transporte em qualquer das etapas previsivelmente
reduzirá o VO2max
- A redução da pO2 no ar inspirado em altitude diminuirá o VO2max
- A redução do nível da hemoglobina na anemia reduzirá o VO2max
- A redução do débito cardíaco com betabloqueadores cardioseletivos resultará na
diminuição do VO2max
- Em algumas situações a provisão de substratos poderá afetar negativamente o
VO2max (e.g. doença de McArdle).
No entanto, em situações normais, num exercício, ao nível do mar, solicitando grande
percentagem de massa muscular, é a capacidade do sistema cardiorrespiratório (i.e.,
coração, pulmões, sangue) de transportar O2 para os músculos e não a capacidade
mitocondrial de o consumir o fator que limita o VO2max.
Importa salientar que o VO2max, por si só, pode não ser o indicador mais idóneo para
determinar a performance em esforços prolongados. No entanto, um indicador
relacionado com o VO2max – a vVO2max (velocidade a que é atingido o máximo
consumo de oxigénio), parece ter elevado poder preditivo em relação à corrida de
endurance. Assim, McLaughlin et al (2010) compararam diversas variáveis fisiológicas
relacionadas com a performance nos esforços de endurance – VO2max, %VO2max ao
limiar láctico e economia de corrida, e o pico da velocidade no tapete rolante como
preditores da performance numa corrida de 16 km. Verificaram que em sujeitos bem
treinados, heterogéneos no VO2max e performance na corrida, a vVO2max era o
melhor preditor da performance na corrida pois integra quer a potência máxima
aeróbia quer a economia de corrida.

29
Referências

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30
3.2. Economia de Corrida
A resistência aeróbia está dependente duma série de indicadores fisiológicos tais como
o consumo máximo de oxigénio (VO2max), a utilização fraccional do VO2max, o limar
anaeróbio e a economia de corrida. Antes de analisar a economia de corrida, definida
como a relação entre o consumo de oxigénio (VO2) e a velocidade de corrida, interessa
relativizar a importância de outros fatores no concernente à performance em esforços
prolongados.
O VO2max, embora seja um indicador importante no concernente à performance
durante exercícios prolongados, não é o mais importante, já que em fundistas de elite
não existe uma relação direta entre o VO2max e a performance nas provas longas
(Rodrigues dos Santos, 1995). Como o VO2max é uma medida extrema de potência
aeróbia, teremos de encontrar nos indicadores submáximos a possibilidade de
discriminar fundistas de diferentes níveis performativos.
Os indicadores respiratórios, circulatórios e metabólicos determinados a intensidades
submáximas são muito mais sensíveis aos estímulos de treino que os indicadores
máximos. Corredores com níveis competitivos diferentes podem apresentar VO 2max
idênticos.
Entre todos os indicadores submáximos parece ser o Limiar Anaeróbio (Lan) o mais
adequado para medir a condição funcional de um atleta implicado em esforços de
longa duração. Um estudo (Powers et al., 1983) detetou que em fundistas treinados e
experientes com VO2max similares, o limiar anaeróbio pode determinar uma grande
porção da variância da performance numa corrida de 10 km. Embora, para este tipo de
prova tenha sido estabelecido que o índice de correlação entre a performance e o Lan
é muito maior (r=.94; p < 0.001) que com a economia de corrida (r=.51; p > 0.15) (17),
este indicador vai aumentando de importância em função da distância a percorrer,
fundamentalmente por causa das implicações energéticas.
A economia de corrida (Ec), como indicador submáximo apresenta grande importância
funcional e discriminativa. Como as reservas energéticas do organismo são limitadas
(principalmente os carbohidratos) e as diferenças entre sujeitos não são grandes,
independentemente das diferenças de performance, parece que as adaptações
metabólicas e mecânicas induzidas pelo treino são, em sujeitos com o mesmo alto
nível de treino, os fatores discriminativos a nível performativo.

31
A Ec é tipicamente definida como o gasto energético para uma dada velocidade
submáxima de corrida, e é determinada pela mensuração do consumo estacionário de
oxigénio e o quociente respiratório. Tomando a massa corporal em consideração,
corredores com uma boa Ec utilizam menos energia e por isso menos oxigénio que
corredores com uma pobre Ec à mesma velocidade. Existe uma forte associação entre
a Ec e a performance na corrida de duração, com a Ec sendo uma melhor preditor para
a performance que o VO2max em corredores de elite com VO2max similares. A Ec é
tradicionalmente medida em tapete rolante em condições laboratoriais, e, embora isso
não seja o mesmo que a corrida no terreno, dá uma boa indicação de quão económico
é um corredor e como a Ec se altera no decurso do tempo. No sentido de verificar se
as alterações da Ec são reais ou aparentes, é necessário respeitar as condições de
standardização da avaliação para evitar ou atenuar os erros de avalaição: (i) calçado
utilizado, (ii) momento do teste, (iii) status nutricional, (iv) condições de saúde. Sob
condições controladas, a Ec é um teste estável capaz de detetar relativamente
pequenas alterações induzidas pelo treino ou outras intervenções. Quando se estuda a
Ec entre ou dentro de grupos é importante levar em conta a massa corporal. Como o
consumo de oxigénio (VO2) durante o exercício submáximo, em grela, não aumenta
linearmente com a massa corporal, tem-se recomendado reportar a Ec com uma
pot~encia de 0.75 em relação à massa corporal (e.g. x ml O2. Kg-0.75.min-1 em vez de x
ml O2. Kg-1. min-1).
Um número de fatores fisiológicos e biomecânicos parece influenciar a Ec em
corredores de elite altamente treinados. Incluem-se adaptações metabólicas dentro do
músculo tais como o aumento das mitocôndrias e das enzimas oxidativas, a capacidade
de o músculo armazenar e libertar energia elástica aumentando a dureza dos músculos
e tendões, e uma mais eficiente mecânica conduzindo a menor perda de energia
provocada pelas forças de travagem e excessiva oscilação vertical.
Enquanto num grupo heterogéneo de corredores o VO2max está altamente
correlacionado com a performance, num grupo homogéneo essa correlação diminui, e
a economia de corrida (além de outros indicadores submáximos) ganha altos níveis de
correlação com a performance (Daniels & Daniels, 1992).
Ainda não estamos de posse de técnicas que nos permitam medir com acuidade o
trabalho mecânico desenvolvido por um corredor. A eficiência de corrida tem sido

32
frequentemente avaliada pelo cálculo da economia de corrida. Esta foi definida
(Cavanagh & Williams, 1982; Daniels & Daniels, 1992) como a taxa de consumo de
oxigénio (VO2) correspondente a uma dada velocidade submáxima de corrida (vsub).
Por seu lado Margaria et al. (1963) calcularam o custo energético da corrida dividindo
o VO2 a uma dada velocidade submáxima por essa velocidade, exprimindo a Ec em ml
O2.kg-1.m-1. Este estudo permitiu verificar que o custo energético da corrida era
independente da velocidade, para velocidades inferiores a 6 m.s-1.
Vários estudos comprovaram que um sujeito treinado pode suportar uma mesma
intensidade de carga com um custo energético mais baixo, e isso dependendo do grau
das adaptações metabólicas e mecânicas provocadas pelos estímulos de treino (Bunc
et al., 1986; Stuart et al., 1981).
Um estudo (Di Prampero et al., 1986) comprovou, em maratonistas, que a velocidade
máxima aeróbia teórica (Vamax) estava relacionada com o VO2max, a fração máxima do
VO2max sustentável (F) e a economia de corrida (Ec), segundo a seguinte equação:
Vamax = F. VO2max. Ec-1
A variabilidade da velocidade à maratona (vMar) explicada pela Va max, em função do
índice de correlação, é maior do que a calculada através de qualquer regressão simples
entre a vMar e o VO2max, F. VO2max ou VO2max.Ec-1. No entanto esta última
conjugação apresenta superior índice de correlação do que as outras. Embora a
economia de corrida por si só apresente pouco valor preditivo quanto à performance
na maratona, quando conjugada com o VO2max o índice de correlação já é bem nítido
(r2=0.63) (Di Prampero et al., 1986). No entanto em esforços mais curtos a força
preditiva da Ec é bem menor ou quiçá despicienda. Lacour et al. (1990), estudando as
performances de especialistas de 800, 1500, 3000 e 5000 metros, a partir da equação
Vamax = (VO2max-VO2maxrepouso) x Ec-1, encontraram que nem a Ec nem o VO2max
(neste caso com exceção dos 3000m) estavam relacionados com a velocidade média
obtida nas performances nas distâncias estudadas.
Quer-nos parecer que a importância da Ec só se manifesta quando as exigências
metabólicas e energéticas se impõem. Ser económico em esforços muito prolongados
é um meio eficaz de poupança energética e de defesa contra a fadiga induzida pela
depleção das reservas de carbohidratos.

33
São muitos os fatores que afetam a economia de corrida; idade, treino, amplitude e
frequência da passada, peso do calçado, vento e resistência do ar (incluindo a menor
densidade encontrada em altitude) são todos fatores que se demonstrou afetar o VO2
a intensidades submáximas de corrida.
Para evidenciar a expressão complexa da Ec, vamos esclarecer as múltiplas
interdependências estabelecidas entre a Ec e os fatores que a podem condicionar:

3.2.1. Diferenças entre géneros


Comparações inter-sexos permitem verificar que enquanto os homens apresentam um
VO2max mais elevado e Limiar Anaeróbio superior, as mulheres apresentam uma
superior economia de corrida e uma superior capacidade de correr a maratona
utilizando uma superior proporção do seu VO2max (11). Esta constatação é reforçada
por Bourdin et al. (1993) que defendem que as mulheres são ligeiramente mais
económicas que os homens em virtude de resposta mais eficaz aos estímulos de
treino. Estas considerações conflituam com o estudo de Daniels et al. (1986) que entre
corredores de elite constataram que os homens apresentam uma superior economia
de corrida que as mulheres. Conflituando com estes dados, Helgerud (1994) verificou
que, a velocidades semelhantes, as mulheres tinham, em média, um consumo de
oxigénio 10-12 ml.Kg-0.75. min-1 que os homens. Neste estudo verificou-se que com
performances similares à maratona os homens apresentavam o VO2max cerca de 10%
superior às mulheres.
Padilla et al. (1992) verificaram que para um mesmo VO2max os homens apresentam
uma superior velocidade máxima sustentável em condições aeróbias. Assim a
disparidade de performances entre os géneros é devida quer ao VO 2max quer à
relação estabelecida entre o VO2max e a Ec, já que os custos energéticos da corrida
não se diferenciam entre homens e mulheres fundistas como poderemos verificar na
tabela 7.

34
Tabela 7. Características físicas e fisiológicas de meio-fundistas de ambos os sexos. Adaptado de Bourdin
et al. (1993)
Idade Altura Massa Corp VO2max Cc
-1 -1 -1 -1
(anos) (cm) (kg) ml.kg .min mlO2.kg .m
Homens 23.7 3.4 178 5.6 63.5 6.1 71.3 4.5 0.181 0.009
(n = 27)
Mulheres 23.9 4.1 164.2 6.7 51.3 5.8 63.5 5.0 0.179 0.010*
(n = 14)
* diferença não significativa; Cc – custo energético da corrida

Daniels & Daniels (1992), em meio-fundistas e fundistas de elite, comprovaram que os


homens, em termos absolutos, são mais económicos que as mulheres, mas quando os
resultados são expressos em ml.kg -1.km-1 não existem diferenças entre sexos a
similares intensidades relativas (%VO2max) de corrida.

3.2.2. Relação da Economia de Corrida e a Massa Corporal


Parece que a massa corporal é o fator que melhor se relaciona negativamente com a
Ec. Padilla et al. (1992) observaram que em corredores de elite existe uma relação
inversa entre a Ec e a massa corporal. Estes resultados também foram constatados por
Bergh et al. (1991) ao verificarem, em 134 atletas de endurance de ambos os sexos,
que nem o consumo submáximo de oxigénio nem o VO2max aumentavam
proporcionalmente à massa corporal. Bourdin et al. (1993) comprovaram que o custo
energético da corrida aumentava (consequentemente a Ec diminuía), à medida que a
massa corporal aumentava.
Outros fatores podem interferir com a eficiência da corrida. Ferretti et al. (1991)
obtiveram, em pigmeus, um custo energético de corrida muito baixo (0.156 ml O 2.kg-
1
.m-1), especulando que algumas destrezas técnicas não exploradas pelos caucasianos
são postas em prática pelos pigmeus.
As condicionantes biomecânicas relacionadas com a economia de corrida não são
fáceis de validar. Assim Williams et al. (1987) não conseguiram encontrar, em
maratonistas, qualquer relação entre o comprimento da passada e a Ec. Põe-se a
hipótese de que uma superior aptidão mecânica e consequentemente melhor eficácia
energética durante a corrida terá a ver com uma mais eficaz reutilização da energia

35
elástica armazenada no músculo durante a fase de alongamento (excêntrica), no
momento do contacto com o solo na fase de apoio.

3.2.3. Nível de treino e Economia de Corrida


Embora os vários estudos compulsados apresentem resultados conflituais, parece que
os anos de treino de corrida melhoram a eficácia energética diminuindo as exigências
de oxigénio para uma dada velocidade de corrida. No entanto, parece que o treino
desenvolvido a intensidades submáximas, como o característico dos maratonistas e
ultramaratonistas, é mais eficaz para melhorar EC, diminuindo o custo energético, do
que o treino dos meio-fundistas que apresenta uma grande proporção de treino
desenvolvido a velocidades elevadas. Esta tese foi confirmada por Daniels & Daniels
(1992) em estudo que comparou fundistas com meio-fundistas. No entanto, em função
do conflito entre os vários estudos, não será absurda a tese de que a Ec está mais
dependente de fatores anatómicos e genéticos que produzem um estilo mais
económico que estará relacionado com o sucesso nas provas mais longas.
Podemos acrescentar a seguinte reflexão. O treino da corrida prolongada vai provocar
uma superior eficácia metabólica, melhorando o perfil oxidativo fibrilar, potenciando a
participação dos ácidos gordos livres no apoio energético ao exercício submáximo.
Como as gorduras necessitam de mais oxigénio para a sua combustão, podemos estar
perante uma situação em que a não variação do VO2 para uma dada velocidade
submáxima de corrida corresponda à maior participação dos ácidos gordos o que em
última instância corresponde a um metabolismo mais eficaz e económico.

3.2.4. Alteração da Economia de Corrida induzida pela Idade


A Ec diminui com a idade. Mas mais do que uma influência direta da idade, a Ec
diminui pelas relações estabelecidas entre a idade e a massa corporal. Assim o
aumento ponderal provocado pela idade é um fator determinante na deterioração da
Ec.

36
3.2.5. Economia de Corrida e Temperatura Corporal
Embora o exercício desenvolvido em condições hipertérmicas possa diminuir a
eficiência mecânica e energética durante a corrida, Bailey e Pate (1991) sugerem que
as adaptações induzidas pelo treino, principalmente o aumento do volume plasmático,
podem contrabalançar os eventuais efeitos deletérios da temperatura sobre a Ec.

3.2.6. Economia de Corrida, Frequência Cardíaca e Ventilação


Um estudo (Pate et al., 1992) envolvendo 167 corredores de distâncias longas
determinou que ambas as variáveis estavam positiva e significativamente
correlacionadas com o consumo de oxigénio, indicando que uma melhor Ec estava
associada com frequências cardíacas e ventilações mais baixas.

3.2.7. Perfil fibrilar muscular e Economia de Corrida


Embora as exigências metabólicas para gerar energia nas fibras de contração rápida
sejam mais elevadas, Williams e Cavanagh (1987) em 31 fundistas treinados não
observaram diferenças nos tipos de fibras musculares em sujeitos apresentando, boa,
média e fraca economia de corrida. Conflituando com estes resultados Bosco et al.
(1987) encontraram uma correlação significativa (r = 0.60; p < 0.01) entre a
percentagem de fibras de tipo II e o consumo de oxigénio por unidade de distância
percorrida a intensidade submáxima. A escassez de estudos implica o cuidado na
validação destes dados.

3.2.8. Economia de Corrida e Condições do Envolvimento (vento e resistência do ar)


A baixa ou moderada velocidade de corrida (2.27 – 4.77 m.s-1) nenhuma diferença na
Ec foi encontrada entre a corrida em laboratório e no terreno. No entanto a
velocidades superiores (4.47 e 5.37 m.s-1) em condições de acalmia atmosférica, as
exigências aeróbias da corrida aumentavam 7.1% no terreno comparando com o
laboratório (Morgan & Craib, 1992). As implicações práticas deste estudo são
comprovadas pelos benefícios energéticos que os corredores têm quando correm na
esteira de outros corredores. Assim correr 1 ou 2 metros atrás doutro corredor pode
poupar 6 e 3%, respetivamente, do gasto energético (Morgan & Craib, 1992).

37
3.2.9. Economia de Corrida e Altitude
Embora os estudos acerca da Ec em altitude sejam escassos parece que as exigências
aeróbias são mais baixas em altitude do que ao nível do mar malgrado um maior
esforço ventilatório. Isto parece estar relacionado com a menor exigência energética
do esforço em altitude devido à menor densidade do ar, tornado o "corpo mais leve".

3.2.10. Alterações da Economia de Corrida provocadas pela Fadiga


Embora teoricamente se aceite que possa existir uma deterioração da Ec após um
esforço prolongado, e que a diminuição da eficácia mecânica e metabólica será tanto
mais evidente quanto mais prolongado e intenso for o esforço, os resultados dos
vários estudos compulsados são conflituais, e que nos deve pôr, de momento, alguma
reserva acerca da validação da fadiga como condicionante da Ec.

Podemos concluir, verificando, que malgrado a importância da Ec na performance nos


esforços prolongados, os meios de investigação, de momento, não nos permitem ter
certezas absolutas, pois este indicador depende de diversas variáveis e que serão
sempre validáveis em função da condição global de cada sujeito. Um facto importa
salientar: a melhoria da eficiência energética que acompanha o treino da corrida de
duração tem efeitos positivos na melhoria da economia de corrida. Que esta consiga
discriminar os fundistas de elite é questão à qual levantamos algumas dúvidas. No
entanto, Lucia et al. (2008), ao avaliarem fisiologicamente Tadesse Zerisenay, campeão
do mundo de corta-mato, verificaram que este atleta apresentava uma economia de
corrida muito baixa o que promovia uma utilização muito eficiente do oxigénio pelos
músculos ativos.
Embora a economia de corrida possa ser um fator muito importante, pensamos que a
performance nas corridas de duração não pode ser estimada pela consideração de
uma só variável.

38
Referências

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39
3.3. Limiar Anaeróbio e Endurance
Embora o VO2max seja um indicador fiável da capacidade máxima do sistema aeróbio
em fornecer energia aos músculos ativos, pode falhar como indicador da capacidade
de suster, no tempo, uma dada intensidade submáxima de exercício. Assim, a
performance em esforços de duração intermédia (> 3 min) e de duração longa é
melhor predita por outros indicadores que não o VO2max. Na realidade, verificou-se
que em meio-fundistas e fundistas com idênticos valores de consumo máximo de
oxigénio as diferenças na performance estavam relacionadas com uma elevada
endurance – capacidade de manter no tempo a mais elevada fração do VO2max, e a
capacidade de manter a máxima intensidade de exercício com a mais baixa
concentração de lactato (Rodrigues dos Santos, 2005).
Assume, assim, importância o indicador Limiar Anaeróbio (Lan) que estabelece o
patamar crítico a partir do qual o aumento da velocidade de corrida induz uma
acentuada, rápida e não linear aumento da lactatemia. .
Enquanto ao nível da máxima potência aeróbia (VO2max) se solicitam ao máximo os
mecanismos oxidativos de fornecimento de energia com importante contributo dos
mecanismos glicolíticos anaeróbios, ao nível do Lan verifica-se um equilíbrio entre o
oxigénio requerido pelos músculos ativos e aquele que lhe chega pelo sistema
cárdiocirculatório. Não ultrapassando a intensidade do Lan consegue-se prolongar a
corrida num estado estacionário e sem acumulação exponencial de lactato muscular e
sanguínea. Enquanto, ao nível do VO2max se verifica a máxima solicitação dos
mecanismos oxidativos com significativa participação dos mecanismos anaeróbios de
cedência de energia, no Lan, a cedência energética é fundamentalmente oxidativa, ou
seja, aeróbia.
O Lan pode ser determinado de forma não invasiva pela análise de gases respirados ou
de forma invasiva através da medição das alterações do lactato sanguíneo. Os
protocolos para a medição do Lan variam com a modalidade desportiva. Os corredores
podem ver determinado o seu Lan através de provas laboratoriais em tapete-rolante
ou no terreno. Hoje, modernos aparelhos de medição (e.g. K4) conseguem medir in
situ quer o VO2max quer o Lan ventilatório. O Lan metabólico, mais fiável que o
ventilatório é medido, em laboratório ou terreno, através das medições do lactato
sanguíneo.

40
Importa referir que diferentes protocolos (sistemas operativos que jogam com
patamares de esforço que diferem em tempo, intensidade e incremento de
intensidade) promovem diferentes Lan. Malgrado as diferenças que possam surgir na
determinação do Lan pela utilização de diferentes protocolos, o que importa é que o
protocolo que foi utilizado num momento inicial seja igual nos outros momentos de
avaliação.
Em relação ao Lan, existe um conceito complementar – o MaxLass que corresponde ao
limiar de intensidade em que se verifica a concentração máxima estável de lactato
sanguíneo. O problema na determinação do MaxLass prende-se com a duração dos
patamares (30 min) que podem induzir desvios nos substratos energéticos oxidados. O
MaxLass é atingido quando a concentração sanguínea de lactato não aumenta mais do
que 1 mmol/L nos últimos 20 min de um exercício constante com duração de 25-30
min (Snyder et al., 1994). Uma concentração de 4 mmol/L parece ser o valor médio
correspondente ao MaxLass (Heck et al., 1985).
O limiar anaeróbio é o indicador, quando considerado individualmente, que maior
valor preditivo apresenta em relação à corrida de média e longa duração. A sua força
preditiva advém-lhe do facto de que está intimamente relacionado com o VO2max, a
economia de corrida e a endurance (percentagem do VO2max utilizada num esforço
prolongado).
Durante o exercício, o VO2max está limitado pela capacidade do sistema
cardiorrespiratório fornecer oxigénio aos músculos ativos. Isto é evidenciado por: (i)
quando o aporte de oxigénio é alterado (por doping sanguíneo, hipoxia ou beta-
bloqueio), o VO2max é alterado concomitantemente; (ii) o aumento do VO2max com o
treino resulta em primeiro lugar do aumento do débito cardíaco (não do aumento da
diferença arteriovenosa de O2); e (iii) quando uma pequena quantidade de massa
muscular experimento um aumento da perfusão durante o exercício, apresenta uma
capacidade extremamente elevada para consumir oxigénio.
Por isso, o aporte de O2 e não a capacidade de extração de O2 pelo músculo, é visto
como o principal fator limitante para o VO2max durante o exercício. No entanto, as
adaptações metabólicas no músculo-esquelético são críticas para a melhoria da
performance da endurance submáxima. O treino de endurance promove o aumento da
atividade das enzimas mitocondriais, as quais melhoram a performance potenciando a

41
oxidação de gorduras e reduzindo a concentração de ácido láctico para uma dado VO2
(Basset & Howley, 2000). O VO2max é uma importante variável que estabelece o limite
superior da performance em endurance (um atleta não pode prolongar muito no
tempo um exercício acima de 100% VO2max). A economia de corrida e a utilização
fraccional do VO2max também afetam a performance em esforços de endurance. A
velocidade ao limiar láctico integra estas três variáveis e é o melhor preditor fisiológico
para a performance na corrida de duração (Bassett & Howley, 2000).
Como se pode verificar através na tabela 8, o nível competitivo na corrida de duração
(e.g. maratona) é claramente explicitado por diversos indicadores fisiológicos e de
performance.

Tabela 8 . Características físicas e fisiológicas de maratonistas de diferente nível (Sjodin & Svedenhag,
1985)
a significativamente diferente dos corredores de elite (p < 0.01); b significativamente diferente dos
corredores de elite (p < 0.05); c significativamente diferente dos bons corredores (p < 0.01); d
significativamente diferente dos bons corredores (p < 0.05)
Variáveis Grupo Elite Grupo Bom Grupo Médio
(n = 12) (n = 16) (n = 7)

Idade (anos) 25.5 ± 1.3 29.9 ± 1.9 35.9 ± 1.9

Peso (kg) 65.8 ± 2.0 67.0 ± 2.0 70.9 ± 3.1

Fibras Tipo I (%) 76.0 ± 4.8 63.7 ± 5.2 56.0 ± 4.4 a

Anos de treino 7.0 ± 1.3 4.1 ± 0.5 b 2.4 ± 0.9 a

Maratonas realizadas 4.9 ± 1.5 4.3 ± 1.2 0.7 ± 0.4


b
Km/semana 145 ± 9 115 ± 6 57 ± 10 a,c
-1 -1 a a,c
VO2max (ml.kg .min ) 71.8 ± 1.2 65.6 ± 1.2 58.7 ± 1.9

VO2-15 km/h (ml.kg-1.min-1) 45.4 ± 0.7 48.6 ± 0.6 b 51.4 ± 1.6 a,d

VO2-15 km/h (%VO2max) 63.5 ± 0.8 74.3 ± 1.1 a 87.7 ± 1.7 a,c

VO2Maratona (% VO2max) 80.0 ± 1.0 80.4 ± 0.7 71.0 ± 2.7 a,c

Vel. à Maratona (% Vel às 4 mmol/L de lactato) 92.8 ± 0.8 92.1 ± 0.6 84.8 ± 2.1 a,c

VO2 Lactato 4 mmol/L (% VO2max) 87.9 ± 0.8 88.3 ± 0.6 84.8 ± 1.5 b,c

Velocidade às 4 mmol/l lactato (m.s-1) 5.37 ± 0.05 4.85 ± 0.05 a 4.04 ± 0.05 a,c

Tempo Médio à Maratona 2h21' 2h37' a 3h24' a,c

Diversos indicadores são passíveis de discriminar os maratonistas em função do seu


nível competitivo. Importa esclarecer que, os melhores maratonistas da atualidade
diferenciam-se da elite caracterizada no quadro anterior. Os melhores tempos atuais à

42
maratona cifram-se abaixo das 2h05 o que corresponderá a diferentes adaptações
fisiológicas. Os corredores de elite atuais conseguem correr a intensidades mais
próximas do seu VO2max.
Na tabela 9 poder-se-ão verificar as diferenças de alguns indicadores fisiológicos e de
performance de corredores portugueses em relação aos estudados por Sjödin &
Svedenhag (1985). As diferenças verificadas derivam do superior nível competitivo das
amostras selecionadas por Rodrigues dos Santos (1995) que correspondiam à elite
portuguesa de meio-fundo e fundo. De forma complementar apresentam-se também
os dados referentes aos velocistas portugueses.

Tabela 9 . Características biométricas e fisiológicas de velocistas, meio-fundistas e fundistas do atletismo


português (Rodrigues dos Santos, 1995)
Variáveis Velocistas Meio-fundistas Fundistas
(n = 10) (n = 10) (n = 10)

Idade (anos) 23.3 ± 3.4 24.8 ± 3.7 30.0 ± 3.1

Peso (kg) 70.4 ± 6.6 62.0 ± 2.7 58.4 ± 3.2

Altura (cm) 177.9 ± 4.9 173.3 ± 3.6 169.7 ± 3.9

VO2max (L.min-1) 4.0 ± 0.4 4.2 ± 0.3 4.4 ± 0.3

VO2max (ml.kg-1.min-1) 56.9 ± 4.8 68.1 ± 5.2 76.8 ± 4.8

vVO2max (km.h-1) 20.0 ± 2.3 23.8 ± 1.1 24.2 ± 1.5

FCmáx (bat.min-1) 193.4 ± 10.2 186.3 ± 9.6 182.1 ± 3.8


-1 -1
VO2-16 km/h (ml.kg .min ) 48.6 ± 3.4 45.0 ± 8.5 50.6 ± 5.8

VO2-16 km/h (%VO2max) 85.9 ± 8.3 67.3 ± 8.0 66.0 ± 7.6

VO2Lan (% VO2max) 81.9 ± 7.0 86.6 ± 7.6 89.9 ± 6.0


-1
Vel. ao Lan (km.h ) 15.8 ± 1.9 20.0 ± 1.6 21.6 ± 2.1

Lactatemia máxima após prova (mmol.L-1) 9.5 ± 1.5 7.8 ± 2.7 7.6 ± 2.1

43
Referências

Bassett DR Jr, Howley ET (2000) Limiting factos for maximal oxygen uptake and determinants of
endurance performance, Med Sci Sports Exerc, 32(1):70-84
Heck H, Mader A, Hess G, Mucke S, Muller R, Hollmann W (1985) Justification of the 4 mmol/L lactate
threshold. Int J Sports Med, 6(3):117-130
Rodrigues dos Santos JA (2005) Estudo comparativo, fisiológico, antropométrico e motor entre meio-
fundistas e fundistas portugueses de atletismo. Rev Port Med Desp, 23:67-78
Sjödin B, Svedenhag J (1985) Applied physiology of marathon running. Sports Med, 2(2):83-99
Snyder AC, Woulfe T, Welsh R, Foster C (1994) A simplified approach to estimating the maximal lactate
steady state. Int J Sports Med, 15(1):27-31

44
3.4. Efeitos do treino em altitude na performance na corrida de endurance
O treino em altitude tem sido utilizado pelos corredores de endurance para melhorar a
sua prestação competitiva ao nível do mar. A aclimatização a ambientes caracterizados
pela hipoxia promovem uma série de adaptações metabólicas e cardiorrespiratórias
que influenciam a captação, transporte e utilização do oxigénio. Embora as
adaptações induzidas pela permanência em altitude tenham um claro efeito sobre a
performance desportiva quando praticada nessa mesma altitude, o transfere dos
eventuais efeitos positivos do treino e permanência em altitude para a performance ao
nível do mar continua a apresentar resultados equívocos.
Apesar das dúvidas, muitos corredores de elite continuam a gastar tempo e dinheiro
com o treino em altitude, motivados pela posição individual de muitos treinadores e
pelos resultados de muitos estudos não devidamente controlados.
Os trabalhos científicos focalizaram-se na otimização de alguns indicadores que
beneficiam com a aclimatização ao treino de altitude e que incluem o aumento da
concentração da hemoglobina sanguínea, elevação da capacidade de tamponamento
da acidose e na melhoria das propriedades bioquímicas do músculo-esquelético.
Contudo nem todos os mecanismos induzidos pela aclimatização à altitude são
benéficos para a performance desportiva em esforços de endurance; o débito cardíaco
e o fluxo sanguíneo ao músculo-esquelético diminuem, e existem evidências que a
hipoxia deprime a função imune e aumenta a lesão tecidular provocada pelo stresse
oxidativo. Estes efeitos negativos podem afetar quer a performance quer a saúde dos
atletas que recorrem com frequência à hipoxia como meio de potenciar o seu
potencial oxidativo muscular.
Muitos estudos focaram os benefícios da aclimatização à altitude na melhoria da
performance em esforços de endurance quando do regresso ao nível do mar. Mas
poucos evidenciaram os efeitos negativos dessa aclimatização. A permanência em
altitude reduz a intensidade absoluta de treino (10), diminui o volume plasmático (11),
reduz a hematopoiese e aumenta a hemólise (12), aumenta o comando simpático com
acentuação da depleção do glicogénio muscular (13) e aumenta o trabalho dos
músculos respiratórios aquando do regresso ao nível do mar (14). Outros problemas
podem surgir como a doença da montanha aguda, edema pulmonar, arritmias
cardíacas e hipoxia cerebral (15).

45
Em geral o treino em altitude melhora a performance em altitude mas as dúvidas
subsistem acerca dos efeitos positivos desse tipo de treino quando se compère ao
nível do mar.
As vantagens e desvantagens do treino em altitude foram sumarizadas por Bailey &
Davies (1997).
Vantagens:
- Aumento da mobilização dos ácidos gordos livres
- Aumento da hemoglobina
- Aumento da capilaridade
- Aumento da atividade enzimática oxidativa
- Aumento do volume mitocondrial

Desvantagens:
- Aumento da ventilação
- Redução do débito cardíaco
- Redução do fluxo sanguíneo
- Imunossupressão
- Aumento do stresse oxidativo e lesão tecidular
- Aumento da desidratação
- Jet lag (Alteração dos ritmos biológicos normais pela deslocação para a altitude)
- Redução da intensidade de treino
- Doença da montanha aguda
- Queimadura solar devido ao aumento da radiação ultravioleta (290-320 nm)
- Depleção do glicogénio por acentuação da mediação catecolaminérgica
- Aumento da hemólise.
Mais recentemente estabelecerem-se novas rotinas de treino que utilizam situações
de hipoxia, natural ou induzida para promover os efeitos positivos do treino em
altitude tentando minimizar os efeitos negativos. O treino intermitente em hipoxia
consiste em breves períodos de exposição a hipoxia severa (através de exposição a
altitude, casas de azoto, tendas hipóxicas, aparelhos de respiração indutores de
hipoxia respiratória) (Hinckson et al., 2005) seja em repouso ou em exercício com a
intenção de estimular a produção de eritropoietina (Eckardt et al., 1989). Outra

46
abordagem consiste em viver a altitude alta/moderada para aumentar o volume
eritrocitário e treinar a baixa altitude para permitir intensidades de treino elevadas.
Viver alto/treinar baixo é uma estratégia de treino que teoricamente resolve alguns
problemas provocados por viver alto e treinar alto. A estratégia de viver baixo e treinar
alto claramente acentua o stresse imposto pelas cargas de treino. As adaptações da
expressão genética induzidas pelo treino suplementar em hipoxia evidenciam uma
resposta específica do músculo à hipoxia (Vogt & Hoppeler, 2010). Quando as
alterações da expressão genética induzidas pelo treino em hipoxia se traduzem pela
melhoria na performance é matéria fruto de resultados conflituais.
O debate acerca dos benefícios destas estratégias em relação a treinar e viver ao nível
do mar continua em aberto.
Quando de forma natural ou artificial se consegue aumentar a hemoglobina e o
volume eritrocitário verifica-se quer o aumento do conteúdo arterial de O2 quer o
VO2max. Práticas de doping sanguíneo são ilegais e perigosas mas contribuem
efetivamente para o aumento do rendimento em exercícios prolongados que solicitem
os mecanismos oxidativos.

Tabela 10. Efeitos da reinfusão autóloga de 1000 ml e 1500 ml de sangue (Gledhill, 1982)
Pós-reinfusão

Variáveis Controle 1000 ml 1500 ml

Hb (g. 100 ml-1) 16.0 ± 0.2 17.2 ± 0.1 17.6 ± 0.1

Hematócrito (%) 45.6 ± 0.3 49.2 ±0.3 50.5 ± 0.2

CaO2 (ml.100 ml-1) 20.0 ± 0.6 21.3 ±0.2 22.0 ± 0.4


-1
VO2max (l.min ) 5.04 ± 0.21 5.24 ±0.22 5.38 ± 0.25

A reintrodução de sangue do mesmo sujeito, previamente recolhido e armazenado,


promove não só o aumento de alguns indicadores hematológicos mas também a
melhoria o rendimento máximo aeróbio.

47
Referências

Bailey DM, Davies B (1997) Physiological implications of altitude training for endurance performance at
sea level: a review. Br J Sports Med, 31:183-190
Hinckson EA, Hopkins WG, Edwards JS, Pfitzinger P, Hellemans J (2005) Sea-level performance in runners
using altitude tents: a field study. J Sci Med Sport, 8:451-457
Eckardt KU, Boutelier U, Kurtz A, Schopen M, Koller EA, Bauer C (1989) Rate of erythropoietin formation
in humans in response to acute hypobaric hypoxia. J Appl Physiol, 66:1785-1788
Gledhill N (1982) Blood doping and related issues: a brief review. Med Sci Sports Exerc, 14(3):183-189
Vogt M, Hoppeler H (2010) Is hypoxia training good for muscles and exercise performance? Prog
Cardiovasc Dis, 52(6):525-533

48
4. Métodos de treino de corrida
A corrida de duração também conhecida por corrida de endurance ou corrida
prolongada é um fenómeno cultural que se expressa numa dupla vertente – corrida de
lazer e corrida de competição. Como base desta duas modalidades temos a corrida
como meio de educação/desenvolvimento que deve ser integrada nas atividades
humanas desde muito cedo e ter continuidade no âmbito das aulas de educação física
na escola.
O treino da corrida de duração visa essencialmente:
- Maximizar a potência máxima aeróbia (VO2max) permitindo que mais energia esteja
disponível para suportar o exercício.
- Elevar o limiar láctico permitindo que esforços mais intensos sejam mantidos com um
mínimo de fadiga
- Aumentar a eficiência de movimento na modalidade desportiva praticada, originando
menores perdas energéticas durante a competição e tornando menos stressantes as
sessões de treino mais exigentes em intensidade
- Reforço psicológico no sentido de controlar as vicissitudes do treino e competição
- Aprender a repousar, permitindo que o treino árduo e exaustivo seja equilibrado com
a recuperação adequada.
As várias corridas do Atletismo, incluindo as de velocidade, são controladas por
diferentes fontes energéticas. Uma corrida de curta duração e máxima intensidade é
fundamentalmente suportada pelos mecanismos anaeróbios de cedência energética
enquanto uma maratona é essencialmente aeróbia.
De seguida apresenta-se a tabela com a caracterização energética das várias corridas
do Atletismo.

49
Tabela 4.1. Caracterização energéticas das várias corridas atléticas
Fonte de energia dominante Qualidade Dominante Especialidade

Anaeróbia Aláctica Velocidade 100 m


Anaeróbia Láctica Resistência de Velocidade 200 e 400m
Anaeróbia Láctica e Aeróbia Potência Máxima Aeróbia + 800 m
Resistência de Velocidade
Aeróbia Potência Máxima Aeróbia 1.500 e 3.000 m
Aeróbia Endurance (acima do Lan) 5.000 e 10.000 m
Aeróbia Endurance (abaixo do Lan) Maratona

As diferentes fontes de energia apresentam as seguintes potências de cedência


energética e reservas de energia (tabela 4.2).

Tabela 4.2. Taxa máxima de produção de ~ P a partir de diferentes substratos e quantidades disponíveis
no músculo de um homem normal (Hultman & Harris, 1988)
Taxa energética Quantidade disponível
(mmol.s-1.kg-1) (mmol.kg-1 músculo)

ATP, PCr →ADP, Cr 2.6 26


Glicogénio → lactate 1.4 60-75 (total 240)
Glicogénio → CO2 0.51 – 0.68 3-100
Glicose → CO2 0.22 -
Ácidos gordos →CO2 0.24 -?

A tabela 4.3 complementa a anterior.

Tabela 4 3. Taxa máxima de produção de ~ P a partir de diferentes substratos e quantidades disponíveis


num homem com 70 kg; massa muscular estimada em 28 kg (Hultman & Harris, 1988)
Taxa energética Quantidade disponível
-1
(mol.min ) (mol)

ATP, PCr →ADP, Cr 4.4 0.67


Glicogénio → lactate 2.35 1.6 (Total 6.7)
Glicogénio → CO2 0.85 – 1.14 84
Glicose → CO2 0.37 19
Ácidos gordos →CO2 0.40 4.000

50
A intensidade relativa de cada tipo de corrida promove diferentes taxas de solicitação
energética. Logicamente, quanto mais curta e intensa a corrida maior será a exigência
energética.

Tabela 4.4. Taxa de utilização de ~ P e quantidade utilizada em eventos de corrida (Hultman & Harris,
1988)
Taxa energética Quantidade utilizada
(mol.min-1) (mol)

Repouso 0.07
100 m 2.6 0.43
400 m 2.3 1.72
800 m 2.0 3.43
1.500 m 1.7 6.0
Maratona 1.0 150.0

NOTA IMPORTANTE: Um fator importante que deve ser levado em consideração


aquando da elaboração das propostas de treino tem a ver com o nível do atleta.
Enquanto as adaptações fisiológicas que ocorrem de seguida ao treino de endurance
em sujeitos sedentários ou atletas recreativos estão bem compreendidas, as
adaptações ao treino de atletas de endurance altamente treinados permanecem com
muitas dúvidas. Enquanto melhorias significativas na performance na corrida de
endurance e nos respetivos indicadores fisiológicos são evidentes na sequência de
treino submáximo em sedentários e atletas de recreação, o simples aumento do
volume de treino submáximo, em atletas de endurance altamente treinados, não
parece produzir melhorias na performance nem em alguns indicadores fisiológicos
(e.g. VO2peak, atividade enzimática oxidativa). Para atletas com elevado nível de
treino a melhoria da performance em endurance só é conseguida através de treino de
elevada intensidade, por exemplo treino intervalado de elevada intensidade. Alguns
estudos verificaram que em atletas com elevado nível de treino, a aplicação de
estímulos de treino intervalado de elevada intensidade não alterava a atividade das
enzimas glicolíticas e oxidativas embora melhorasse significativamente (p<0.05) a
performance em endurance. Um dos mecanismos que pode justificar esta melhoria
assenta no aumento da capacidade de tamponamento da acidose intramuscular como

51
contraponto às alterações do pH induzidas pelas fortes cargas lácticas. Como calcular
os estímulos-carga para o Treino Intervalado de Elevada Intensidade?
No capítulo dos métodos de treino referente ao treino intervalado daremos a
resposta.

A corrida de endurance ou corrida aeróbia faz apelo a vários tipos de resistência que
Dietrich Harre (1991) sumarizou da seguinte forma:
Resistência de Curta Duração - evidenciada em esforços que medeiem entre 45
segundos e 2 minutos. No caso do Atletismo podemos integrar aqui as provas de 400
m, 400 MB e 800 metros

Resistência de Média Duração - evidenciada em esforços que medeiem entre 2 e 8


minutos (1.500 m, 3.000 m, 3.000 MObs)

Resistência de Longa Duração (RLD), que se subdivide em:

RLD 1 - evidenciada em esforços que medeiem entre 8 e 30 minutos (5.000 e 10.000


metros)

RLD 2 - evidenciada em esforços que medeiem entre 30 e 90 minutos (10.000 m e


meia-maratona)

RLD 3 - evidenciada em esforços que excedam os 90 minutos (maratona e


ultramaratonas)

A estruturação do treino de Resistência está dependente da integração de vários


fatores:

. Volume da carga

. Intensidade da carga

. Densidade da carga

. Complexidade da carga

. Compromisso carga-recuperação

. Objetivos do treino (geral, especial ou de competição)

. Dominantes psicológicas e volitivas

Os vários tipos de treino de Resistência estão dependentes da forma de organização da


carga. As duas formas primordiais da organização das cargas põem a ênfase na

52
duração (cargas extensivas) ou na intensidade (cargas intensivas). A estrutura da
carga (extensiva ou intensiva) determina o sentido das adaptações pretendidas. A
rapidez das adaptações bem como a estabilização das mesmas é determinada pela
organização das cargas, em jogos coerentes entre intensidade e volume.
Emergindo desta bipolaridade organizacional podemos classificar da seguinte forma os
vários métodos de treino da corrida:

4.1. Métodos de carga de duração


Neste caso particular a carga estabelecida é mais ou menos prolongada no tempo e
não existem pausas durante o esforço. A intensidade (em termos absolutos) é
moderada e a duração da carga deve ser superior a 30 minutos, e assim contribuir para
a potenciação de uma das vertentes mais importantes da Resistência Aeróbia, que é o
metabolismo lipolítico, cuja máxima eficácia energética só acontece a partir dos 20-30
minutos de corrida. Pode ir até várias horas de duração este tipo de treino, e depende
da especialidade em vista. As exigências das cargas em duração são muito diferentes
entre um especialista dos 5.000 metros e um ultramaratonista.
De uma forma geral visa:
- Melhoria da captação, transporte e consumo de oxigénio
- Melhoria da regulação cardíaca e circulatória
- Aumento da capilarização
- Aumento do metabolismo muscular (e.g. aumento de atividade das enzimas
oxidativas)
- Melhoria da endurance (capacidade de correr numa fração do VO2max o mais
elevada possível)
- Melhoria da economia de corrida (superior eficiência energética para uma dada
velocidade de corrida submáxima)
- Melhoria do processamento energético (e.g. potenciação do metabolismo aeróbio
com superior suporte da lipólise)
- Desenvolvimento de qualidades psíquicas e volitivas (educação da vontade)
- Retardamento da fadiga central (SNC) para um dado nível de esforço.

53
4.1.1 Métodos contínuos
- Velocidade constante
- Duração longa (10 a 40 km)
- Terreno variado sem grandes desníveis
Variante extensiva (130-150 p.p.m.)
Variante intensiva (150-170 p.p.m.).
Cada atleta deve utilizar este método em função da sua particularidade competitiva.
Os especialistas de distâncias curtas devem utilizá-lo em forma aligeirada (método
extensivo) e não devem ultrapassar 1 h. Os especialistas das distâncias médias e longas
utilizá-lo-ão com a intensidade adequada à sua especialidade (+ extensivo ou +
intensivo) e com duração variável.

4.1.1.1. Corrida contínua lenta


Este tipo de corrida deve ser fundamentalmente usado para recuperação ativa entre
unidades de treino de grande intensidade ou na fase de recuperação após lesão ou
surmenage.
Nota: Por vezes identifica-se a corrida contínua lenta com o Jogging. No entanto, este
método de treino originário da Nova Zelândia, assenta, pelo menos nas suas fases
iniciais, na conjugação de períodos de corrida lenta com marcha. Arthur Lydiard
treinador nova zelandês e Bill Bowerman treinador norte-americano que com ele
contactou, popularizaram este método, cuja génese está relacionada com a
reabilitação de doentes com afeções cardíacas e com as tentativas consequentes de
perda de peso, mas que depois se transformou numa prática inerente a uma certa
filosofia de vida. Foi assim criado The Jogger).

4.1.1.2. Corrida contínua média


Este tipo de corrida também denominada endurance fundamental solicita um esforço
em que a frequência cardíaca varia entre as 140 - 160 pulsações por minuto; estes
valores são referidos para adultos jovens. Temos de levar em consideração que a
caracterização dum esforço deve estar relativizada à frequência cardíaca máxima
(FCmáx). A FCmáx teórica de um sujeito está condicionada pela idade. A fórmula que a
determina é a seguinte:

54
FCmáx (teórica) = 220 - idade (±10)
Assim entre um idoso com 70 anos e um jovem com 10 anos as frequências cardíacas
básicas para o denominado trabalho de endurance são completamente diferentes. A
endurance fundamental deve ser trabalhada entre 65 e 80% da frequência cardíaca
máxima. No entanto, é importante reter que sujeitos bem treinados podem fugir da
lógica biológica determinada pela fórmula acima indicada. Conhecem-se, sujeitos bem
treinados com 60 anos de idade que conseguem atingir, em esforço máximo,
frequências cardíacas de 184 batimentos por minuto.

4.1.1.3. Corrida contínua rápida


Também denominada de endurance ativa, é um método fundamental para o treino da
resistência específica para provas longas (5.000 metros a maratona), e para um adulto
jovem, solicita uma frequência cardíaca a variar entre as 160 - 180 pulsações por
minuto.

4.1.2. Métodos Alternados


Nestes métodos continua a verificar-se o prolongamento ininterrupto da carga (dentro
do tempo pré-estabelecido), mas agora esta caracteriza-se por alterações periódicas
da intensidade. Procura-se assim potenciar não só os mecanismos aeróbios como a
partir de trechos corridos a velocidades superiores potenciar, de igual forma, os
mecanismos anaeróbios. A velocidade é modificada periodicamente segundo critérios
antecipadamente estabelecidos. Por exemplo correr 60 min, segundo o critério de
1000m a 140 p.p.m. seguidos de 500m a 180 p.p.m., o que permite contrair uma dívida
de oxigénio que será paga no regresso à intensidade mais reduzida. A dinâmica do
esforço permite fazer variar a FC entre as 120 e 180 pulsações por minuto.
- Duração da carga: 30 min a 2 h
- Local: terrenos de toda a espécie (bosques, praias, prados, pisos moles ou duros,
planos, subidas (rampas), descidas, ondulações, enfim grande variedades de acidentes
naturais)
- FC: entre 120 e 180 p.p.m.
- Critério técnico: alternância de intensidades
- Objetivo: Capacidade aeróbia e anaeróbia

55
4.1.2.1. Fartlek tradicional
Também denominado Fartlek Sueco, é um método de treino originário dos países
nórdicos, e embora tendo sido utilizado desde os inícios do século XX de forma não
controlada, só a partir dos anos 30 e 40 sofre um processo de sistematização levado a
cabo por Gosse Holmer e continuado por Gosta Olander. É um método com certo
suporte científico e com resultados frutuosos em termos de preparação de atletas de
meio-fundo e fundo.
O atleta Herb Elliot treinado por Percy Wells Cerutty utilizou este método de treino
para a consecução das suas medalhas olímpicas e recordes mundiais.
No espírito original este tipo de treino consistia na conjugação controlada de corridas a
grande velocidade, corridas lentas e períodos de marcha vigorosa. Os períodos de
velocidade elevada eram determinados pela vontade do atleta em função quer da sua
capacidade de recuperação quer do seu estatuto motivacional.
Este tipo de treino requer atletas autodisciplinados. Para os atletas denominados
"sornas" este tipo de treino não é efetivo, pois tenderão a espaçar em demasia os
períodos de intensificação do esforço.
Hoje em dia o Fartlek conjuga a alternância da corrida rápida com a corrida lenta de
recuperação. Pode-se criar uma variante com uma corrida de base de intensidade
média, seguida de acelerações em distâncias diversas e com um período de
recuperação ligeiro (e.g. 1 min) até entrar outra vez no regime de intensidade média.
Este tipo de treino deve ser realizado na natureza, de preferência em relva, terra ou
saibro, em ambiente não poluído e profusamente oxigenado, como bosques ou
florestas que visem fugir dos limites espaciais da pista. A extensão temporal deste tipo
de treino pode variar entre os 30 minutos e as 2 horas, e é determinada pelos
objetivos pretendidos.

4.1.2.2. Fartlek orientado


Este método de treino, similar ao anterior põe a ênfase no controle dos esforços a
partir duma organização antecipada. Aqui o atleta não é deixado ao seu livre arbítrio, e
são-lhe antecipadamente designados os períodos de corrida lenta e rápida,
acelerações, etc.. É um método que resolve satisfatoriamente os défices motivacionais
de alguns atletas. Assim o espaço de treino deve ser visualmente controlado pelo

56
treinador (sempre que possível), e as intensificações podem ser determinadas quer
pelo aumento da velocidade quer pelas alterações do percurso (subidas e descidas)
dentro de uma velocidade constante.

4.1.2.3. Variantes de Fartlek


A partir das duas variantes tradicionais desenvolveram-se propostas que visam dar
uma resposta mais ajustada às exigências de cada especialidade ou tipo de prova.
Assim Giorgio Rondelli famoso treinador de atletas de elite, entre os quais se salientam
Alberto Cova e Franco Panetta, propõe as seguintes divisões para o Fartlek:

. Fartlek curto

. Fartlek médio

. Fartlek longo

Tabela 4.5. Propostas de Fartlek para vários tipos de corrida


a) Fartlek curto: de 15" a 1' de variação; com recuperação ao
800 ritmo da resistência aeróbia do atleta (corrida média e /ou lenta)
b) Fartlek médio: de 1'30" a 2', o tempo de recuperação é o
a mesmo ao ritmo da resistência aeróbia
c) Fartlek longo: de 3' a 4', recuperação de 2' a 3', sempre ao
1.500 m ritmo da resistência aeróbia
a) Fartlek curto: de 30" a 1' de variação; com recuperação ao
3.000 m ritmo da potência aeróbia do atleta
b) Fartlek médio: de 1'30" a 2', o tempo de recuperação é o
a mesmo ao ritmo da potência aeróbia
c) Fartlek longo: de 3' a 4', recuperação de 2' a 3', sempre ao
5.000 m ritmo da potência aeróbia
a) Fartlek curto: de 30" a 1' de variação; com recuperação ao
ritmo da potência aeróbia do atleta
10.000 m b) Fartlek médio: de 1'30" a 2', o tempo de recuperação de 1' a 2'
ao ritmo da potência aeróbia
c) Fartlek longo: de 3' a 4', recuperação de 1' a 2', sempre ao
ritmo da potência aeróbia
a) Fartlek curto: de 30" a 1' de variação; com recuperação ao
ritmo da potência aeróbia
Maratona b) Fartlek médio: de 1'30" a 2', o tempo de recuperação de 1' a 2'
ao ritmo da potência aeróbia
c) Fartlek longo: de 3' a 5', recuperação de 1' a 3', sempre ao
ritmo da potência aeróbia

Nota: Importa referir que os valores atrás referidos dizem respeito a atletas de elite.
Assim para estes, o ritmo de resistência aeróbia corresponde a velocidades de corrida
57
variando entre 3'45" - 4'/Km, enquanto a potência aeróbia se situará entre os 3'30"-
3'20"/Km ou ainda mais rápido. Para os maratonistas, Rondelli propõe para o Fartlek
Curto fases de recuperação a altas velocidades, ou seja 3'5"-3'10", o que vai induzir
uma intensidade muito próximo da Potência Máxima Aeróbia.
Como podemos reparar, as propostas de Rondelli inserem-se no denominado Fartlek
Orientado, em que os valores dos estímulos fortes e dos estímulos de recuperação são
pré-determinados pelo treinador. Este tipo de trabalho aproxima-se, e por vezes, imita
as regras estabelecidas para o treino fracionado.

4.2. Métodos Fracionados


Existe uma certa dificuldade em sistematizar os vários métodos de treino, já que a
partir do momento original, as adaptações introduzidas pelos treinadores na sua
prática diária por vezes desvirtuam a filosofia e justificação iniciais de cada método de
treino. No meu entender, sempre que alternamos períodos de trabalho e períodos de
recuperação (parcial ou completa, ativa ou passiva) estamos perante os métodos
fracionados ou repetitivos, que podem assumir características muito diversas.
De uma forma geral, todo o tipo de treino deve ter em atenção a dinâmica da carga.
Esta está condicionada por vários fatores:
- Volume da carga. Dependente da duração dos estímulos e frequência dos mesmos.
- Intensidade da carga. Dependente da intensidade dos estímulos, densidade e
complexidade dos mesmos.
- Tipo de exercício. Exercício geral, especial, específico e de competição.
- Forma de execução. Este fator tem a ver com a qualidade de execução do atleta. O
domínio da técnica e a sua eficaz aplicação são fundamentais para evitar sincinesias
(esforços parasitas).
- Ciclo de trabalho (Dinâmica). Isto é, a sucessão dos exercícios durante a sessão de
treino, microciclo e também a diversidade das variações. Trata-se da organização do
treino.
- Perfil psíquico e intelectual. Diz respeito às exigências mentais que permitem a
concentração máxima no treino e a averiguação consciente dos seus efeitos que em si
quer nos outros.

58
Os métodos fracionados são originários dos Estados Unidos que assim ultrapassaram
os limites do treino de duração cuja génese encontramos na Inglaterra do século XIX.
Com a fracionação da distância de competição e a consecução de múltiplas repetições
dessa distância fracionada, intercaladas de um intervalo de recuperação, pretendeu-se
aumentar a intensidade média do treino, o que teve como resultado o domínio do
panorama internacional pelos americanos nos dois primeiros decénios do século XX.
Entre os vários métodos de treino fracionados salientam-se os seguintes:

4.2.1. Rampas
São um meio de treino muito utilizado pelos meio-fundistas e fundistas, embora
outros especialistas de distâncias mais curtas as utilizem de igual forma. O treino de
rampas acontece como derivação do Fartlek, já que este, desenvolvido em plena
natureza, propicia a experimentação de vários tipos de subidas e descidas.
Assim Goesta Olander um dos precursores do Fartlek sistematizou o treino de Rampas,
utilizadas posteriormente (anos 60) pelos treinadores Arthur Lydiard (Nova Zelândia) e
Percy Wells Cerutty (Austrália)
As potencialidades deste tipo de treino advêm-lhe da capacidade de desenvolver
simultaneamente várias componentes:
- Capacidade e Potência Lácticas
- Forma natural de musculação (importante para os músculos que protegem o joelho)
- Desenvolvimento das qualidades psicológicas devido à dificuldade deste tipo de
treino
- Melhoria da velocidade de movimento nas descidas
Alguns autores argumentam com o aperfeiçoamento da técnica de corrida. No nosso
entender este tipo de trabalho afeta negativamente a técnica de corrida, e tanto mais
quanto mais íngreme for a rampa. Assim este tipo de trabalho tem objetivos muito
específicos relacionados com a Potência Muscular e deve ser sempre completado com
exercícios técnicos de corrida (em descontração).
O treino de rampas é extremamente exigente, e somente atletas suficientemente
treinados e já perfeitamente potenciados por outros métodos, é que devem ter acesso
a esta forma de treino.

59
Existem 3 formas de treino de rampas. Uma natural, ou seja a inclusão no Fartlek de
terrenos que propiciem subidas e descidas, e duas formas mais organizadas.

Rampas Longas - com distâncias variando entre os 200 e 1.000 metros e com uma
inclinação não muito acentuada. O princípio organizacional a utilizar será o Método
das Repetições (3 a 10) e a recuperação será ativa em marcha ou trote ligeiro até ao
início da rampa. Esta dominante é mais aeróbia pelo que relevará menos da
intensidade e mais da duração.

Rampas Curtas - com distâncias variando entre os 20 e 100 metros e com uma
inclinação mais acentuada que na modalidade anterior. As repetições poderão variar
entre 6 e 8, e o intervalo deverá ser nitidamente mais longo no sentido de propiciar
uma recuperação eficiente para manter a intensidade de execução nas repetições
subsequentes. Esta dominante é mais anaeróbia, com uma forte componente
muscular, pelo que se pode constituir como um ótimo meio de treino de força
acoplado ao treino de resistência e/ou velocidade.

Nota: As rampas podem ser utilizadas quer na vertente ascendente quer descendente.
Enquanto na vertente ascendente podemos utilizar as inclinações que quisermos, na
vertente, descendente

4.2.2. Treino Intervalado


O Treino Intervalado evidencia com clareza a assimilação de novas propostas sobre a
base original que deu origem ao denominado Interval-training.
Originariamente, o Treino Intervalado é o resultado da evolução dos métodos
fracionados americanos que a escola finlandesa continua por intermédio de Hannes
Kolehmainen e Lauri Pihkala, cujo expoente máximo foi o campeão Paavo Nurmi, que
ficou conhecido pelo "finlandês voador" em virtude da sua excelência competitiva
(ganhou 9 medalhas olímpicas e bateu 22 recordes mundiais). A evolução do método é
conseguida pelos investimentos nos anos 30 do Dr. Waldemar Gerschler que
conjuntamente com Roskman permitiu os êxitos de Rudolf Harbig que em 1939 fez aos
800 metros o fantástico tempo de 1'46".6. Mais tarde Toni Nett com um trabalho de

60
sistematização de todos os métodos de treino conhecidos, publica várias obras que se
espalham por todo o mundo. Assim permite a emergência na Checoslováquia de Emil
Zatopek, um verdadeiro deus dos estádios, que entre outros êxitos retumbantes
conseguiu nos Jogos Olímpicos de Helsínquia as medalhas de ouro nos 5.000 10.000
metros e maratona.
Mais tarde, em 1952, a investigação científica permitiu a fundamentação teórica do
treino intervalado. Herbert Reindell, professor de Cardiologia do Instituto de Educação
Física da Universidade de Friburg de parceria com os seus colaboradores Helmut
Roskamm e Josef Keul completam a nível fisiológico os investimentos práticos de
Gerschler.
A noção nuclear do Treino Intervalado passa a ser o INTERVALO que se constitui como
a pedra de toque das adaptações positivas induzidas pelo estímulo de treino. Reindell
afirma que "no intervalo o repouso não pode ser completo. Todos os vasos sanguíneos
dos músculos abrem-se durante a corrida, a fim de dar aos mesmos o oxigénio
necessário. Após o esforço a tensão sanguínea diminui, o sangue fica nos músculos e a
quantidade que vai para o cérebro é insuficiente quando a circulação não é mantida,
resultando num estado de lipotimia. Uma vez terminado o esforço deve continuar-se a
fazer movimentos leves, para que a passagem para o estado de repouso se faça
progressivamente. Assim, bem antes do organismo regressar à calma, deve o atleta
reiniciar o trabalho intenso, isto é fazer novo esforço". O conceito de lipotimia está
hoje ultrapassado já que sabemos que quer durante o repouso quer durante esforço
físico intenso a quantidade de sangue a chegar ao cérebro é similar.

Tabela 4.6. Fluxo sanguíneo corporal em repouso e exercício


Região do corpo Fluxo sanguíneo em repouso Fluxo sanguíneo em
exercício
ml.min-1 % DC ml.min-1 % DC
Pulmões 6.000 100 30.000 100
Cérebro 840 14 840 3
Miocárdio 240 4 1.200 4
Hepato-esplânquica 1.680 28 450 1
Rins 1.380 23 360 1
Músculo 1.200 20 26.400 88
Pele * 480 8 600 2
Outros 180 3 150 1
* temperatura ambiente de 25 ˚ C

61
Assim as regras atualizadas por Gerschler e Reindell preconizam:
- Aumento da intensidade de cada estímulo
- Utilização variada de distâncias de 100, 200, 300 e 400 metros
- Diminuição do número de repetições (Emil Zatopek chegava a realizar 60
repetições de 200 e 400 metros, as distâncias usuais)
- Controle cardíaco do esforço durante o intervalo (estabelecendo a
denominada pausa lucrativa).
Assim nasceu o Interval-Training.
Antes de avançarmos gostaríamos de contrariar o conceito de lipotimia avançado por
Reindell. De posse de outros instrumentos de investigação científica é-nos hoje
permitido verificar que a quantidade de sangue que chega ao cérebro em exercício é a
mesma que durante o repouso, significando esta inalterabilidade a importância do
comando cerebral em todas as funções e atividades humanas. Podemos apreciar esta
conclusão no quadro anterior.
Todos os métodos intervalados assentam no princípio dos “intervalos” que se definem
pela alternância metódica das fases de carga e de recuperação. Neste método o novo
estímulo deve ser aplicado numa situação de recuperação incompleta. Os métodos
intervalados distinguem-se, entre si, pelos diferentes arranjos do volume e
intensidade, bem como dos períodos de recuperação, que conjuntamente vão
determinar as adaptações que se pretendem.
Existem várias formas de classificar o treino que jogas com os intervalos. Importa
referir que alguma literatura considera “intervalo” quer o período de recuperação quer
o próprio estímulo-carga.

4.2.2.1. Método dos intervalos curtos (curta duração da carga)


Duração das cargas individuais de 15 segundos a 2 minutos. Intensidade de esforço de
média a elevada (70 a 90% em relação à intensidade máxima do momento). A pausa
deve ter uma duração que permita recuperar para as 120-130 pulsações por minuto.

4.2.2.2. Método dos intervalos médios (média duração da carga)


Duração da carga entre 2 a 8 minutos. Intensidade de esforço 90 a 100% da capacidade
máxima do momento. Intervalos que permitam recuperar até às 120 p/min.

62
4.2.2.3. Método dos intervalos longos (longa duração da carga)
Duração dos estímulos de 8 a 15 minutos. Intensidades elevadas (90 a 100%) para a
distância requerida.

No nosso entender, os métodos intervalados atrás citados não têm muita lógica pois
chamar intervalo à carga leva a desvalorizar a lógica do intervalo, ou seja da
recuperação. De que forma conseguimos intensificar significativamente a carga
quando estabelecemos períodos de esforço de 15 minutos? Qual o valor do intervalo
aquando duma duração do estímulo desta ordem?
Na lógica do treno intervalado, pretende-se selecionar estímulos mais curos que a
competição, para visar uma intensidade que supere claramente a intensidade de
competição. O problema da eficácia deste tipo de trabalho prender-se-á depois com o
volume dos estímulos.
O treino intervalado deve ser estabelecido no respeito pelos seguintes fatores (DTRIA):
D – Distância do estímulo
T – Tempo para cumprir o estímulo
R – Número de repetições do estímulo
I – Intervalo entre estímulos
A – Ação durante o intervalo.

4.2.2.4. Método intervalado extensivo


É o método que por excelência põe em jogo a noção de pausa lucrativa que não
permite a recuperação completa.
D – 14” a 90”
T – Visando 60 a 80% da capacidade máxima
R – Muitas repetições (ênfase no volume)
I – Pausa relativamente curta. Em geral de 45” a 90” (treinados) e 60” a 2’ (iniciados)
A – Trote ou marcha rápida.

Apresenta-se de seguida um exemplo para atletas bem treinados.


Distância-Andamento-Pausa-Repetições
100m – 15 a 14” – 60 a 45” – 20 a 40

63
200m – 35 a 29” – 90 a 45” – 20 a 30
300m – 58 a 48” – 90 a 45” – 16 a 20
400m – 72 a 60” – 120 a 60” – 16 a 20
500m – 110 a 80” – 120 a 60” – 12 a 20

4.2.2.5. Método intervalado intensivo


Atendendo a que a intensidade se situa entre 80-90% (por vezes 95%) da capacidade
máxima de rendimento, a duração dos estímulos deve ser relativamente curta.
D – 60 a 90”
T – Que permita uma intensidade entre 80 a 90% da intensidade máxima possível
R – As repetições devem estar relacionadas com a intensidade. Quanto maior a
intensidade menor o número de repetições e vice-versa. Deve-se atingir um elevado
grau de fadiga pois cada estímulo faz apelo aos mecanismos anaeróbios o que vai
acentuar a acidose intramuscular
I – A pausa deve ser relativamente longa devido à elevada intensidade do estímulo.
Respeita-se, no entanto, o princípio da pausa lucrativa, ou seja, com recuperação
incompleta. Atletas bem treinados entre 90 e 180 segundos. Iniciados entre 2 a 4
minutos.
A – A pausa deve alternar trote e marcha. A FC não deve baixar as 110-120 p.p.m.

Justificações fisiológicas para este tipo de treino:


- Melhoria da resistência de curta duração (45” a 2’)
- Grande débito de oxigénio
- Elevada solicitação dos mecanismos anaeróbios
- Elevada acidose o que promove uma resposta compensatório potenciando os
mecanismos de tamponamento.
Este tipo de trabalho não pode ser realizado frequentemente. Deve ser escolhido
como meio eficaz de elevar o patamar aeróbio/anaeróbio, preparando as competições.
Este trabalho melhora rapidamente a performance do atleta mas também esgota
rapidamente as reservas energéticas, metabólicas, neuronais, psíquicas do atleta.

64
Exemplos para atletas bem treinados

Distância-Andamento-Pausa-Repetições
100m – 13,5 a 12,5” – 3 a 1,5’ – 8 a 12
200m – 28 a 26” – 3,5 a 2,5’ – 10
300m – 48 a 42” – 4 a 3’ – 10
400m – 66 a 58” – 5 a 3’ – 8 a 10
500m – 90 a 75” – 5 a 3’ – 6 a 8
600m – 120 a 90” – 5 a 3’ – 4 a 6

Apresentamos atrás uma reflexão acerca da influência do nível de treino dos


corredores na responsividade aos vários estímulos de treino. Em atletas de endurance
com elevado nível de treino, as melhorias da performance não são conseguidas através
do aumento do volume de treino mas sim da intensidade do mesmo.
Como selecionar os estímulos de treino intervalado intensivo para uma atleta de
levado nível?
- Determinar a velocidade a que o VO2max é atingido (vVO2max). Depois, noutro
momento, determinar o tempo até à exaustão a essa velocidade crítica. Depois
selecionam-me estímulos (intervalos de trabalho) que correspondam a frações (50 a
70%) do tempo até à exaustão à vVO2max (Laursen & Jenkins, 2002).
É necessário levar em consideração que a determinação do VO2max em laboratório
não é tão precisa como no terreno. Mesmo no terreno, o transporte do aparelho de
medição das trocas de gases cria dificuldades de estimar a vVO2max.

4.3. Métodos Repetitivos


A duração dos estímulos varia em função da especialidade. A intensidade deve
aproximar-se da máxima (95 – 100%) capacidade de rendimento para uma dada
distância. As pausas devem ser muito longas, não respeitando o princípio da pausa
lucrativa (entre 3 a 45’). As repetições variam em função da intensidade e
especialidade. Devem, no entanto, ser poucas para manter elevados níveis de
intensidade.

65
Qualidades desenvolvidas:
- Velocidade
- Força
- Resistência de velocidade (100-m, 200-m, 400-m)
- Resistência específica de competição numa dada distância

Estímulos de treino (em função da especialidade visada – velocidade, meio-fundo ou


fundo ou da intencionalidade pretendida. Por exemplo, um fundistas pode
perfeitamente treinar a velocidade como complemento do seu treino de base):
Velocidade – 30-m, 50-m, 60-m, 80-m
Resistência de Velocidade – 100-m, 150-m, 200-m, 300-m
Resistência específica à competição (Média) – 200-m, 400-m, 600-m, 800-m
Resistência específica à competição (Longa) – 1000-m, 1200-m, 1600-m, 2000-m,
3000-m, 5000-m

Formas de organização do treino fracionado


- Contínuo
- Ins and outs
- Progressivos
- Regressivos
- Alternados
- Com resistência, etc.

Perguntas cruciais:
- Como organizar o treino de um dado especialista?
- Será que os fundistas necessitam de esforços máximos em distâncias reduzidas?
- Qual o limite dos estímulos máximos de treino dos velocistas?
- Existem variações em função do momento da época?
- Quais as diferenças, na organização do treino, entre atletas consagrados e iniciados?

66
4.3.1. Corridas de Ritmo
São muito importantes a partir dos 400 metros. Visam obter o ritmo próprio de cada
corrida em função das capacidades do atleta. As corridas de ritmo antecedem as
corridas na distância de competição, ao ritmo de competição. Existem dois tipos de
corrida de ritmo – Ritmo-resistência e Ritmo-competição.

4.3.1.1. Corridas de Ritmo-Resistência


São especialmente úteis para o treino de meio-fundo e fundo. Os estímulos-carga
(distância) podem ser superiores ou inferiores aos da competição. Por exemplo, um
especialista de 1.500 metros, pode treinar o ritmo resistência com estímulos de 1.000
metros com uma intensidade ligeiramente superior à passagem aos 1000 metros em
competição ou então selecionar estímulos de 2.000 metros com intensidade inferior à
da competição na distância de competição (85 a 95%).
Outro exemplo:
Um corredor de 800 metros a valer 2’.
Treino de ritmo-resistência com estímulos inferiores à competição:
200-m para 30” ou 28”
400-m para 60” ou 56”
Treino de ritmo-resistência com estímulos superiores à competição:
1000-m para 2’40”/2’45”
1200-m para 3’30”
Repetições – variando de acordo com a especialidade.
Pausas - 3 a 5’.
Estímulos para o treino de Ritmo-Resistência em função de cada especialidade:

67
Tabela 4.7. Propostas para o treino de ritmo-resistência para vários tipos de corrida
Distâncias 400-m 800-m 1500-m 5.000-m
10.000-m
Curtas 200-m 200-m 300-m 1.000-m
400-m
Médias 300-m 400-m 800-m 2.000-m
1.000-m 3.000-m
Longas 500-m 1.000-m 2.000-m 5.000m
600-m 1.200-m

Para a maratona podem-se utilizar os 5.000-m e os 10.000-m como distâncias médias.


As distâncias curtas não devem ser inferiores a 1.000-m. As longas? Variam. Talvez
competições de estrada e meias-maratonas ou treinos de 30 km de vez em quando.

4.3.1.2. Corridas de Ritmo-Competição


Com estes estímulos pretende-se dar ao atleta a noção do ritmo específico pretendido
para cada prova. É determinado pelo nível do atleta e deve ser escrupulosamente
respeitado. As superações deixam-se para a competição, no entanto com plena
consciência dos limites individuais. Por exemplo, numa prova longa podemos integrar
pelotões com ritmos que parecem fáceis mas que não estão de acordo com as nossas
capacidades do momento. Para evitar falências precoces, mesmo em competição
devemos ir com todos os “avisadores” despertos.
Intensidade – Devem-se visar os 100% previstos para a prova.
EX: Um corredor de 400-m que vise 48” faria uma distribuição teórica de 12” por cada
100-m. No entanto, tendo em conta que os primeiros 200-m são mais rápidos dever-
se-ia visar fazê-los em menos de 24” e os 300-m em menos de 36”.

Duração da pausa – Deve ser longa para permitir uma recuperação eficaz, mas
depende do tipo de prova. Entre 8 a 12 minutos.

Repetições – Não é conveniente um grande número de repetições (3 - 5) pois afeta o


ritmo pretendido. Este é um treino que visa a qualidade e não o volume.

68
Competição e Controlo
Comporta percursos de competição ou de controlo (e.g. 30 km para a maratona). A
dosagem dos estímulos deve corresponder às exigências específicas de cada
especialidade, respeitando as distâncias e as velocidades, salientando a eficácia técnica
e a eventual tática, devendo fazer apelo às qualidades volitivas do atleta. A
periodicidade destes estímulos de treino deve ser criteriosamente selecionada para se
evitar a usura excessiva e para funcionarem eficazmente como critério de mensuração
das adaptações. A atualização do processo de treino faz-se com estes tipos de provas.

4.3.2. Forma de organização dos métodos em série


O treino atual, para evitar a monotonia deve diversificar os métodos de treino
explorando variações. O músculo e o organismo adaptam-se rapidamente às rotinas de
treino. Para alargar as capacidades adaptativas de um dado atleta temos de “acordar”
o seu corpo com estímulos diferenciados.

EX:
10 x 200-m a 36” c/ 45” int (Int. 3’)
10 x 200-m a 32” c/ 50” int (Int. 3’)
10 x 200-m a 32” c/ 55” int (Int. 3’)
10 x 200-m a 34” c/ 45” int. etc.

Nota: Como cada método ou variante de treino determina uma dada e específica
adaptação, para que o atleta desenvolva adaptações multivariadas deve ser sujeito a
estímulos diversos que o potenciem no sentido da mais elevada performance possível.

Apresentamos um exemplo para uma atleta que vale:


10.000 m – 27’30”
5.000 m – 13’20”
3.000 m – 7’45”
1.500 m – 3’37”5/10
1.000 m – 2’20”
400 m – 52”

69
Os estímulos para os vários métodos adequados ao seu nível desportivo são:

Tabela 4.8. Estímulos-tipo visando os vários métodos de treino de corrida


Método de Intervalado Intervalado Método
Duração Extensivo Intensivo Repetitivo

Intensidade 70-90% 60-80% 80-95% 95-100%


4, 54 m/s 6,16 m/s 6,43 m/s 6,56 m/s
75% 80% 90% 95%

Volume 10000-m 2x 5 x 1000-m 2 x 1500-m


(10 x 400-m)

Pausa Sem pausa 45-90” 3-5’ 10-20’


repetições de 60”
5’ séries

Duração 36’40” 65” rep 2’35” rep 3’49” rep


21’40” total 12’55” total 7’38” total

Na figura abaixo retirada de Laursen (2010) pode-se verificar que o fenótipo aeróbio
do músculo-esqulético pode ser desenvolvido por duas vias: (i) através de estímulos de
elevada intensidade que activam a AMPK (Adenosina monofosfato quinase), ou (ii)
através de estímulos de elevado volume de treino que ativam a via da CaMK (Cálcio-
calmodulina quinase). Ambas as vias interferem na modulação do PGC-1α (regulador
chave do metabolismo energético e da biogénse mitocondrial) e que vai promover:
- aumento da percentagem de fibras Tipo I
- aumento da biogénse mitocondrial
- aumento da capacidade oxidativa das gorduras
- aumento do GLUT4
- aumento da concentração muscular de glicogénio.

70
71
Referências

Dietrich H (1991) Teoria del Entrenamiento Deportivo. Stadium Books


Hultman E, Harris RC (1988) Carbohydrate metabolism. In: Principles of Exercise Biochemistry.
Poortmans JR (ed). Med Sport Sci. Basel, Karger, vol 27, pp 78-119
Laursen PB (2010) Training for intense exercise performance: high-intensity or high-volume training?
Scand J Med Sci Sports, 20 (Suppl. 2):1-10
Laursen PB, Jenkins DG (2002) The scientific basis for high-intensity interval training. Optimizing training
programs and maximizing performance in highly trained endurance athletes. Sports Med, 32(1):53-73

72
5. Qual a razão do êxito dos corredores de meio-fundo e fundo do Quénia e Etiópia?
Desde os JO de 1968, no México, os corredores Quenianos e Etíopes, têm vindo a
dominar os eventos atléticos de meio-fundo e fundo, dominando quer as provas de
pista, estrada e corta-mato. Carlos Lopes, foi dos poucos caucasianos que se conseguiu
intrometer neste domínio africano. Vários fatores têm sido levantados para explicar o
sucesso destes atletas:
- Predisposição genética
- Desenvolvimento de um elevado consumo máximo de oxigénio como resultado da
marcha e corrida extensiva em idades jovens
- Hemoglobina e hematócrito relativamente altos
- Desenvolvimento de uma boa economia/eficiência metabólica baseada no
somatótipo e características dos membros inferiores
- Composição fibrilar muscular e perfil enzimático oxidativo
- Dieta Queniana tradicional
- Viver e treinar em altitude
- Motivação para conseguir sucesso económico

No sentido de tentar discriminar a importância de cada um destes fatores e outros


eventualmente importantes apresentamos o seguinte estudo de revisão.

6. Análise das diferenças entre corredores Africanos e Caucasianos de meio-fundo e


fundo. Revisão da literatura (Rodrigues dos Santos JA & Amorim TP, 2012)
Resumo
O êxito competitivo dos corredores de meio-fundo e fundo provenientes do Leste de
África tem sido motivo de muita especulação. Várias razões têm sido aduzidas para
justificar a excelência competitiva desses atletas, entre as quais se salientam um
especial traço genético favorável ao rendimento desportivo nas corridas de duração e
as condições ambientais específicas que potenciam esses atletas desde o seu
nascimento. Seleção genética versus determinismo do envolvimento tem sido o tema
recorrente para diversos estudos que procuram a razão fundamental para o êxito
desportivo dos corredores Africanos de elite.

73
Este estudo pretendeu fazer uma revisão atualizada dos vários contributos que nos
permitam fazer alguma luz sobre os fatores eventualmente discriminadores entre os
corredores de meio-fundo e fundo Africanos e Caucasianos. Tentamos abordar o êxito
desportivo dos corredores Leste Africanos através de dois tipos de enfoque: biológico
(genético, antropométrico, fisiológico, morfológico) e sócio-ambiental (características
do envolvimento, perfil do treino e recuperação, nutrição, estilo de vida, perfil
psicológico e emocional).
Da análise dos vários estudos verificamos que a genética não discrimina os corredores
de meio-fundo e fundo Africanos dos seus pares Caucasianos. Também os indicadores
fisiológicos apresentam reduzida capacidade discriminativa. Parece existirem traços
antropométricos característicos dos corredores negros – menor perímetro e maior
comprimento da perna – que podem corresponder a vantagens biomecânicas para a
corrida, mas que não suficientes, por si só, para justificar a excelência competitiva dos
corredores Africanos de elite.
Das condicionantes ambientais e sociais, verifica-se que as características do
envolvimento (altitude, temperatura), a alimentação e o estilo de vida não são a razão
das diferenças verificadas no perfil competitivo dos corredores negros e brancos.
Diferenças no perfil de treino e recuperação bem como as características psicológicas e
emocionais dos corredores Africanos, parecem poder justificar o domínio dos
corredores negros Africanos de meio-fundo e fundo nas principais competições
desportivas internacionais.

Palavras-chave: corrida, genética, altitude, fisiologia, antropometria, rendimento

6.1. Introdução
A performance competitiva no meio-fundo e fundo a nível internacional tem sido
dominada pelos atletas de origem africana que arrecadam a maioria das medalhas nos
principais eventos desportivos a nível mundial.
Na realidade, a análise dos resultados nos Campeonatos do Mundo e Jogos Olímpicos,
nas últimas décadas, permite-nos verificar a supremacia dos atletas Africanos no meio-
fundo e fundo, principalmente os provenientes do Leste Africano. Quenianos e Etíopes
apresentam uma supremacia notável em todas as distâncias que medeiam entre os

74
800 metros e a maratona, embora atletas provenientes de países vizinhos (e.g. Eritreia,
Tanzânia, etc.) também atinjam resultados de bom nível.
Tomando como referência a evolução performativa dos corredores Quenianos nas
várias provas de meio-fundo e fundo (800m, 1.500m, 5.000m, 10.000m e 3.000mObs)
entre os anos de 1964 e 1994, verificamos um crescendo seguro na afirmação
competitiva deste país. Em 1964 tinham somente dois atletas no Top-20 mundial, que
passaram para onze em 1974, 10 em 1984 e 33 em 1994 (5).
Embora, hoje em dia, a elite Queniana esteja bem acompanhada por outros países
africanos, em especial a Etiópia, importa salientar que, até 1997, 75% dos êxitos dos
corredores Quenianos tinham como berço a tribo Kalenjin que corresponde somente a
10% da população do Quénia ou seja cerca de 3 milhões de indivíduos. Os corredores
dessa tribo, entre 1987 e 1997, ganharam 40% dos títulos nas principais provas
internacionais (32). A tabela 1 dá-nos uma imagem clara da excelência competitiva dos
corredores de meio-fundo e fundo provenientes da tribo dos Kalenjin.

Tabela 6.1. Países mais medalhados nas provas de 800 aos 10.000m nos Jogos Olímpicos de
1964 a 1996, com exclusão dos JO de 1976 e 1980. Adaptado de Manners (32)
População Medalhas Totais Ouro
Kalenjin 26 8
USA 10 3
Grã-Bretanha 8 1
Quénia Não-Kalenjin 7 4
Marrocos 7 3
Alemanha (Leste e Oeste) 6 1

Se às medalhas ganhas pelos atletas da tribo Kalenjin juntarmos as ganhas pelos outros
atletas Quenianos, então a excelência desportiva do Quénia, nas corridas
internacionais de meio-fundo e fundo, é ainda mais marcante.
Em virtude do locus específico de tantos êxitos desportivos, vários autores tentaram
descortinar os fundamentos em que assentavam. Levantaram-se várias hipóteses para
justificar a supremacia performativa dos corredores do Leste Africano, apontando-se
os fatores genéticos, envolvimento geográfico, treino, estilo de vida e determinantes
sociais.

75
Com este estudo de revisão pretendemos aprofundar a razão ou razões que
eventualmente justifiquem as diferenças competitivas que hoje em dia diferenciam os
atletas Africanos dos Caucasianos.

6.2. Condicionantes biológicas


6.2.1. Genéticas
Entre os fatores que vulgarmente se apontam para justificar a supremacia competitiva
dos meio-fundistas e fundistas do Leste Africano, ganha especial realce o fator
genético. Uma especial predisposição genética dos corredores africanos para a corrida
de duração não é comprovada pela investigação científica, embora o reduzido número
de estudos não permita posições conclusivas.
Os únicos estudos genéticos disponíveis comprovam a diversidade e variabilidade
(46)
genética entre os vários campeões Africanos , o que deve levar a ter mais cuidado
em estabelecer uma abusiva correlação entre um traço genético único e a excelência
performativa no meio-fundo e fundo.
O gene humano ACTN3 codifica a proteína α-actinina-3, um componente da
(34)
maquinaria contráctil das fibras rápidas do músculo-esquelético . Em 1999, foi
identificado um polimorfismo comum no gene ACTN3 (R577X) que resultava na
ausência de α-actinina-3 em mais de 1 bilião de pessoas em todo o mundo, malgrado
esse gene ter sido bem conservado durante a evolução humana (37). Estudos genéticos
replicando em ratos a deficiência no gene ACTN3 permitiram verificar que as fibras de
contração rápida ganhavam propriedades contrácteis e metabólicas idênticas às fibras
de contração lenta (37). Daí especulou-se sobre as eventuais vantagens competitivas em
esforços de endurance dos sujeitos que apresentavam esse polimorfismo. Temos
(26)
dúvidas acerca da linearidade dessa relação pois Kohn et al. , verificaram uma
superior percentagem de fibras Tipo IIa em corredores Africanos enquanto os
corredores Caucasianos tinham maior percentagem de fibras Tipo I.
(54)
Contudo, Yang et al. , ao estudarem a frequência do polimorfismo R577X (alelo
funcional R e alelo não-funcional X) do gene ACTN3 numa variedade de populações
Africanas, tentando determinar a sua influência na excelência performativa dos
corredores de meio-fundo e fundo do Leste Africano, verificaram que a deficiência da
proteína α-actinina-3 não tinha grande influência na performance dos atletas

76
Africanos. Não foram encontradas diferenças significativas na frequência do genótipo
R577X entre os atletas e o grupo controlo.
(31)
Também Lucia et al. , ao compararem o polimorfismo genético de corredores de
elite da Eritreia (7 atletas) e Espanhóis (9 atletas), verificaram amplas similitudes: dois
sujeitos de cada grupo não apresentavam polimorfismo R557X; 3 de cada grupo
apresentavam deficiência parcial em α-actinina-3, enquanto 2 Eritreus e 4 Espanhóis
(31)
apresentavam completa deficiência em α-actinina-3. Embora, neste estudo a
percentagem dos atletas da Eritreia (28,6%) com manifestação de polimorfismo R557X
seja significativamente menor que a dos Espanhóis (44,4%), será abusivo tirar ilações
diretas entre uma especial capacidade para a corrida de endurance e o perfil genético
já que o número amostral é muito reduzido.
(47)
Reforçando estes dados, Scott et al. verificaram que os atletas Etíopes de elite não
se distinguiam da restante população em relação ás características mitocondriais. Estes
autores sugerem que a excelência desportiva dos corredores Etíopes estará, talvez,
mais relacionada com polimorfismos do genoma nuclear que nos polimorfismos do
ADN mitocondrial. Esta hipótese não é corroborada por outros estudos. Na procura de
um traço genético indutor de vantagens performativas no meio-fundo e fundo, Moran
(35)
et al. estudaram o cromossoma Y que é um cromossoma que embora pobre em
genes poderá ter alguma influência na performance física no sexo masculino;
levantaram a hipótese que o sucesso dos corredores de endurance Etíopes se podia
relacionar com os haplogrupos do cromossoma Y que, segundo o seu estudo, estão
distribuídos de forma diferente do resto da população. No entanto, reconhecem que
os corredores Etíopes não podem ser considerado um grupo distinto em relação aos
haplogrupos que possuem, reconhecendo a necessidade estudos com outras
populações.
A dificuldade de encontrar na genética a razão do êxito dos corredores de meio-fundo
e fundo Africanos leva-nos a procurar outros fatores que justifiquem a sua
superioridade competitiva.

77
6.2.2. Antropométricas
As dimensões corporais podem condicionar a performance no meio-fundo e fundo, já
que estão implicadas na economia de corrida, um dos fatores relacionados com a
(40)
performance na corrida de duração . Qualquer aumento de peso supérfluo onera
energeticamente a corrida, reduzindo a performance para uma dada distância. O
aumento de peso afeta mais os indiciadores fisiológicos submáximos que os máximos.
Ao nível do VO2max não se verificam diferenças significativas entre a situação de peso
excessivo e peso normal (16); é lógico que a consideração de peso excessivo se refere a
valores ligeiramente superiores aos valores de normalidade ponderal já que em atletas
de elite são normais pequenas variações de massa corporal após os períodos de
(21)
descanso entre épocas competitivas. Num estudo de Goran et al. , comparando
crianças obesas com crianças normoponderais, verificou-se que as primeiras, devido
ao peso acrescido que têm de transportar apresentavam valores superiores de
VO2max (1.56±0.40 L.min-1) em relação às segundas (1.24±0.27 L.min-1), mas quando
se relativizavam os dados ao peso corporal, as crianças normoponderais apresentavam
valores superiores de VO2max (44.2±3.2 contra 32.0±4.1 ml.kg-1.min-1). Reforçando o
estudo de Cureton et al. (16), quando se relativizavam os consumos de oxigénio à massa
magra, as diferenças deixavam de ser significativas entre o grupo obeso e
normoponderal, 59.2±4.9 e 57.9±5.8 ml.kg -1.min-1, respetivamente. Quer isto significar
que o excesso de peso corporal condiciona menos o consumo máximo absoluto de
oxigénio e mais o relativo; pensamos que embora esta asserção seja verdadeira para
sujeitos sedentários já não o será tanto para sujeitos treinados, principalmente em
corrida, em que 2 ou 3 kg a mais em relação ao peso de competição alteram todos os
parâmetros cinemáticos e dinâmicos do movimento.
Noakes (36), verificou que o ratio altura/peso dos Africanos era superior. Enquanto, um
corredor Europeu de 10.000m com uma altura de 182 cm pesa 72 kg, um Africano,
com a mesma altura pesará por volta dos 64 kg. Pensamos que a relação do peso com
a altura é um fator muito importante na corrida de duração.
A tabela 2, permite-nos ter uma panorâmica sobre o perfil biométrico de corredores
de meio-fundo e fundo, comparando Africanos com Caucasianos.

78
Tabela 6.2. Valores médios (±DP) de Peso e Altura de corredores Africanos e Caucasianos
Estudo Peso Altura
(kg) (cm)
Caucasianos Africanos Caucasianos Africanos
(52)
Weston et al. 69.1 ± 5.7 ** 59.4 ± 6.0 181 ± 9 ** 172 ± 5
(53)
Weston et al. 64.9 ± 3.0 61.4 ± 7.0 178.3 ± 5.3 ** 172.4 ± 5.3
(26)
Kohn et al. 67.8 ± 6.6 * 59.6 ± 7.4 182 ± 8 * 172 ± 6
(23)
Harley et al. 70 ± 6 * 60 ± 6 180 ± 7 * 167 ± 4
(33)
Marino et al. 76.6 ± 9.3 * 59.3 ± 4.4 183.4 ± 6.5 * 167.4 ± 4.4
(31)
Lucia et al. 60.5 ± 7.8 57.2 ± 3.3 172 ± 6 174 ± 8
Prommer et al. (38) 66.5 ± 6.3 57.2 ± 7.0
* p<0.01 ** p<0.05

A partir da tabela anterior, podemos inferir que, de uma maneira geral, os corredores
Africanos são mais leves e mais baixos que os seus pares Caucasianos. Esta asserção é
(26) (33)
válida para a não-elite e para a elite estudada por Marino et al. , embora o não
seja para a elite estudada por Lucia et al. (31).
(30)
Num estudo de Larsen et al. ficou comprovado que as populações Quenianas,
quando comparadas com as Caucasianas, apresentam menor massa corporal e
membros inferiores mais longos, sejam as que vivem nas cidades sejam as que vivem
nas aldeias. As condições antropométricas de base dos Africanos estudados, definem
condições biomecânicas diferenciadas que podem contribuir positivamente para a
performance motora no meio-fundo e fundo.
(33)
Importa referir que enquanto no estudo de Marino et al. os corredores de elite
Quenianos se diferenciam claramente dos seus pares Alemães, em relação ao peso e
(31)
altura, o estudo de Lucia et al. , comparando os corredores de elite da Eritreia com
os seus pares Espanhóis, não verificou diferenças com significado estatístico em
relação a estes dois indicadores.
Portanto, podemos constatar que a altura e peso, por si só, não são indicadores
suficientemente robustos para distinguir a elite da não elite, e os corredores Africanos
dos Caucasianos, embora a tendência seja para os Africanos serem mais baixos e mais
leves.
Em relação à percentagem de massa gorda e índice de massa corporal (IMC) a tabela 3
compulsa vários estudos.

79
Tabela 6.3. Valores médios (±DP) da percentagem de gordura e IMC de corredores Africanos e
Caucasianos
Estudo Massa Gorda IMC
2
(%) (kg/m )
Caucasianos Africanos Caucasianos Africanos
Weston et al. (52) 12.4 ± 2.8 11.6 ± 2.7
(53)
Weston et al. 12.1 ± 3.3 12.1 ± 3.7
(11)
Bosch et al. 11.1±1.4 11.8±1.4
Kohn et al. (26) 20.5 ± 1.1 20.1 ± 1.5
(23)
Harley et al. 12.8 ± 4.6 11.2 ± 1.8 21.6 ± 1.5 21.4 ± 1.6
(33)
Marino et al. 5.3 ± 0.3 5.1 ± 0.2
Lucia et al. (31) 20.5 ± 1.7 * 18.9 ± 1.5
Prommer et al. (38) 20.4 ± 0.9 * 18.5 ± 0.9
* p<0.05

(52)
No estudo de Weston et al. , embora os corredores Africanos sejam mais leves e
mais baixos que os seus pares Caucasianos, apresentam um Índice de Massa Corporal
(IMC) idêntico (Tabela 3). A similitude do IMC deve ser desvalorizada já que ser mais
leve, independentemente da altura, é um fator muito importante na corrida de
duração quanto mais não seja porque as forças de reação ao solo são mais reduzidas
nos corredores mais leves. Este fator pode ser um requisito importante para manter a
resiliência a treinos intensos e prolongados que é uma das características dos fundistas
(14)
de elite. Segundo Coetzer et al. , os corredores Africanos de elite treinam mais
quilómetros a intensidades elevadas que os seus concorrentes caucasianos. A menor
massa corporal que os caracteriza pode estar diretamente correlacionada com uma
(7)
menor incidência de traumas e lesões músculo-esqueléticas que lhes permite a
manutenção, época após época, desse tipo de treino em qualidade.
Na análise dos vários estudos que comparam corredores de meio-fundo e fundo
Africanos e Caucasianos, devemos atentar no nível competitivo das amostras. Assim, o
IMC parece ser um fator suficientemente diferenciador, entre corredores Africanos e
Caucasianos, ao nível da elite (31, 38) mas já não ao nível da não-elite (23, 26).
Na análise da composição corporal, podemos verificar que não existem diferenças
significativas entre Africanos e Caucasianos em relação à percentagem de massa
(31)
gorda, embora Lucia et al. tenham constatado que o somatório de 6 pregas de

80
adiposidade subcutânea era significativamente (p<0.05) maior nos corredores
Espanhóis que nos Eritreus.
A partir da tabela 3, podemos claramente diferenciar a elite da não elite. Não se pode
ser elite no meio-fundo e fundo internacional com percentagens de massa gorda
(8)
superiores a 10%. A elite africana estudada por Billat et al. apresenta percentagens
de massa gorda, variando entre 6 e 7%, valores idênticos aos verificados por Rodrigues
(40)
dos Santos , na elite portuguesa de meio-fundo e fundo. Estranhamos, no entanto,
(33)
os valores apresentados por Marino et al. que são, no nosso entender,
exageradamente baixos.
Entre os parâmetros antropométricos mais marcantes a diferenciar Africanos dos
(31)
Caucasianos salientam-se as dimensões da perna. Assim, verificou-se que os
corredores Eritreus tinham pernas mais compridas (44.1±3.0 vs 40.6±2.7 cm; p<0.05) e
com menor circunferência máxima (30.9±1.5 vs 33.9±2.0; p<0.01) que os corredores
(53)
espanhóis. Em relação ao volume da massa magra da coxa, Weston et al.
encontraram valores médios de 2152 ± 770 e 2568 ± 295 cc para Africanos e
Caucasianos, respetivamente, o que aponta para a tendência de formas corporais mais
reduzidas nos corredores Africanos, características essas que parecem estender-se a
outras populações. Tal foi comprovado por Aandstad et al. (1), num estudo comparativo
entre crianças Tanzanianas e Norueguesas (9 – 10 anos de idade), em que verificaram
que as primeiras são significativamente (p<0.001) mais leves e mais baixas que as
segundas, o que parece indiciar um biótipo específico africano que pode ter
implicações biomecânicas para a corrida de duração.
Parecem existir condições ecológicas e fenotípicas de base que determinam diferenças
antropométricas entre Africanos e Caucasianos; se essas diferenças são determinantes
para estabelecer diferentes níveis de prestação competitiva em provas de corrida de
meio-fundo e fundo, é facto difícil de esclarecer.
Sem podermos ser conclusivos, tudo indica que valores mais baixos de massa gorda,
aliados a algumas características antropométricas (maior comprimento e menor
circunferência da perna), apresentam boa correlação com a performance na corrida de
duração e podem discriminar positivamente a elite Africana de meio-fundo e fundo da
elite Caucasiana.

81
As condicionantes ecológicas de desenvolvimento das populações podem determinar
algumas das diferenças antropométricas verificadas entre Africanos e Caucasianos.
Assim, o perfil de ingestão nutricional, aliado à taxa de atividade física usual, de alguns
grupos étnicos Africanos pode ser crucial no desenvolvimento da composição corporal.
Por exemplo, a alimentação da tribo Kalenjin, da qual saíram alguns dos melhores
meio-fundistas e fundistas da história desportiva recente, é fundamentalmente
vegetariana. Cerca de 90% dos alimentos têm origem vegetal com um aporte reduzido
(15% do aporte calórico total) de gorduras (12). Naturalmente, os regimes vegetarianos
induzem uma menor acumulação de gordura corporal, no entanto, o esforço
recorrente de muitos corredores de meio-fundo e fundo em manterem pesos
corporais mais competitivos, podem induzir práticas nutricionais deficitárias em
(41)
energia com a consequente redução da massa gorda . Uma coisa é certa, quando
falamos de elite internacional do meio-fundo e fundo, não podemos encontrar
percentagens de massa gorda elevadas, já que todo o peso supérfluo (e.g. reservas de
massa gorda) onera energeticamente o esforço de corrida afetando diretamente a
performance.
Dos vários estudos compulsados parece que somente o IMC diferencia
antropometricamente a elite Africana da Caucasiana. Que essa diferenciação tenha
força suficiente para justificar a excelência competitiva dos Africanos, é algo que nos
suscita dúvidas.

6.2.3. Fisiológicas
Os fatores fisiológicos críticos para a performance na corrida de duração são o
consumo máximo de oxigénio (VO2max), a utilização fraccional do VO2max (ou seja a
capacidade de suster no tempo uma elevada percentagem do consumo máximo de
oxigénio) e a economia de corrida (entendida como a capacidade de correr de forma
energeticamente eficiente).
As exigências fisiológicas das mais elevadas performances no meio-fundo e fundo são
salientadas pelas intensidades médias para cada especialidade: a meia-maratona é
corrida a 80% do VO2max, os 10.000m a 90%, os 5.000m a 95% e os 3.000m a 100%.
Portanto, no meio-fundo e fundo a competição ao mais elevado nível assenta em
elevadíssimas exigências aeróbias; correr a 80% do VO2max requer uma frequência

82
(24)
cardíaca cerca de 88% da FCmáx , situação que é mantida por mais de 2 horas em
maratonistas de elite.
Somente, seres excecionalmente dotados e com elevado nível de treino são capazes
de desenvolver, de forma “natural”, as intensidades requeridas pelas performances
acima descritas. Tentemos verificar se estas capacidades intrínsecas dos corredores de
elevado nível conseguem diferenciar os Caucasianos dos Africanos.

6.2.3.1. Consumo Máximo de Oxigénio


De uma forma geral, os corredores de meio-fundo e fundo apresentam consumos
máximos de oxigénio elevados; no entanto, este indicador fisiológico não parece ser
suficientemente discriminador da qualidade competitiva dos sujeitos. Em relação a
este indicador temos de considerar duas vertentes: a fisiológica e a ergonómica. Assim,
não só devemos considerar o VO2max (indicador fisiológico) como também a vVO2max
(indicador ergonómico) e que corresponde à velocidade de corrida a que é atingido o
máximo consumo de oxigénio, este sim um indicador verdadeiramente discriminador
no meio-fundo e fundo (40).
A tabela 4 permite-nos verificar o VO2max e a Potência Máxima Aeróbia de várias
amostras de corredores Africanos e Caucasianos.

Tabela 6.4. Valores médios (±DP) do VO2max e vVO2max em corredores de meio-fundo e fundo
Africanos e Caucasianos
Estudos VO2max vVO2max
(ml.kg-1.min-1) (km.h-1)
Caucasianos Africanos Caucasianos Africanos
(52)
Weston et al. 65.2 ± 7.2 61.9 ± 5.9 22.4 ± 1.2 21.3 ± 1.9
Kohn et al. (26) 68.2 ± 4.5 68.8 ± 5.9 22.0 ± 0.9 21.6 ± 1.1
(23)
Harley et al. 68.9 ± 4.3 66.7 ± 5.4 21.5 ± 1.4 21.4 ± 1.2
(33)
Marino et al. 64.3 ± 3.0 62.6 ± 3.5 20.8 ± 1.2 21.2 ± 0.8
Prommer et al. (38) 70.7 ± 3.7 71.5 ± 5.0
(31)
Lucia et al. 77.8 ± 6.1 * 73.8 ± 5.6 23.1 ± 0.7 23.3 ± 0.5
* Diferença estatisticamente significativa (p<0.05)

(31)
Somente no estudo de Lucia et al. se verificaram diferenças significativas (p<0.05)
ao nível do VO2max, entre corredores Africanos e Caucasianos, evidenciando os

83
corredores espanhóis um VO2max médio mais elevado, embora expressem um menor
nível competitivo que os atletas Eritreus. Estes dados reforçam as considerações atrás
expressas e reduzem a utilidade do VO2max como fator discriminador entre corredores
de nível idêntico. A vVO2max que diferencia o nível competitivo dos corredores de
(8, 40) (31)
outros estudos não diferenciou as elites Espanhola e Eritreia , embora o nível
competitivo dos dois grupos seja muito diferente.
Os dados recolhidos indicam que o VO2max não diferencia corredores Africanos e
(26, 52) (29) (31)
Caucasianos não-elite e elite . O estudo de Lucia et al. comprova que um
VO2max mais elevado não significa uma superior prestação competitiva. Estes estudos
(44)
são corroborados por Saltin et al. que não verificaram, ao nível do VO2max,
diferenças significativas entre os melhores corredores Escandinavos e Quenianos, quer
em altitude quer ao nível do mar. No entanto, alguns corredores Quenianos atingiram
consumos máximos de oxigénio da ordem dos 85 ml.kg -1.min-1, valor não conseguido
por nenhum dos corredores Escandinavos (44). É lógico que os corredores Escandinavos
não se aproximam, competitivamente falando, dos corredores Quenianos.
Importa salientar que os corredores de meio-fundo e fundo de elite apresentam
usualmente valores médios de VO2max superiores a 70 ml.kg-1.min-1 (9, 31, 38, 40)
. Quer
isto dizer que a elite do meio-fundo e fundo apresenta uma elevada capacidade de
captação, transporte e utilização muscular de oxigénio, só que este indicador não
diferencia, na elite, o nível competitivo dos corredores sejam Africanos ou
(38)
Caucasianos. Para reforçar esta ideia, o estudo de Prommer et al. confirmou que a
similitude fisiológica das amostras não tem correspondência com o valor performativo
das mesmas que favorece claramente os Quenianos que com valores médios aos
10.000m de 28min29s±27s se distinguem claramente dos alemães com 30min39s±24s.
Nos estudos de Weston et al. (52, 53) e Kohn et al. (26), o nível performativo das amostras
selecionadas era baixo, com os atletas a conseguirem tempos médios aos 10.000m,
acima dos 32 min. Como fator de comparação apresentamos os recordes do mundo e
olímpico dos 10.000 m femininos: 29’31”.78 (Wang Junxia – China) e 29’54”.66
(Tirunesh Dibaba – Etiópia). Pensamos que a análise das diferenças entre corredores
Africanos e Caucasianos é ecologicamente mais válida quando estudamos as elites.
Tendo em conta a variabilidade dos dados recolhidos, pensamos que não é ao nível

84
dos indicadores máximos fisiológicos que radica a diferença entre os corredores de
elite Africanos e Caucasianos do meio-fundo e fundo.

6.2.3.2. Cinética do Lactato e Limiar Anaeróbio


A superior capacidade performativa dos corredores Africanos quando comparados
com corredores Caucasianos tem sido associada às menores concentrações de lactato
plasmático a intensidades de corrida submáximas (52) e máximas (23).
Estudos prévios determinaram a relação entre a fadiga muscular e a performance e a
acumulação de lactato. Atletas que apresentam uma menor concentração de lactato
plasmático para uma dada intensidade submáxima de esforço, parecem estar mais
capacitados para resistir à fadiga por um período de tempo mais longo (51). Tal facto foi
(52)
verificado no presente estudo de revisão a partir dos dados de Weston et al. que,
num patamar de intensidade de corrida correspondente a 92% da vVO2max,
verificaram que os corredores Africanos atingiam lactatemias mais baixas (7.2 ± 4.8
versus 11.1 ± 3.5 mmol/L; p=0.06) e um superior tempo até à fadiga (7’56” ± 3’45”
versus 3’57” ± 2’05”; p<0.01).
No entanto, a intensidades máximas os resultados são conflituais (Tabela 5). Enquanto
Saltin et al. (44) constaram que o pico de lactato era similar para corredores Quenianos
e Escandinavos quer em altitude quer ao nível do mar, o que foi corroborado por
(52) (23)
Weston et al. , o estudo de Harley et al. evidenciou um pico de lactato
significativamente mais elevado nos Caucasianos. As razões destas discrepâncias
podem-se prender a condicionantes metodológicas.

Tabela 6.5. Valores médios (± DP) de lactatemia em corredores Africanos e Caucasianos após prova
máxima de esforço
Lactato plasmático após prova de esforço máxima
-1
(mmol.L )
Caucasianos Africanos
(52)
Weston et al. 11.6 ± 2.9 10.5 ± 2.5
(23)
Harley et al. 12.3 ± 2.7 8.8 ± 2.0 *
(44) #
Saltin et al. 10.0 ± 0.8 8.0 ± 0.7
(44) ##
Saltin et al. 9.8 ± 0.5 9.3 ± 0.9
* Diferença significativa (p<0.05); # Altitude de ~ 2.000m; ## Nível do mar

85
Embora em teste máximo de corrida os resultados sejam conflituais e não possam
determinar um padrão que diferencie claramente corredores Africanos e Caucasianos,
ao nível do exercício submáximo parece que os resultados são mais conclusivos.
(14)
Coetzer et al. , associaram o domínio dos atletas negros nas provas longas de
corrida às menores concentrações de lactato durante o exercício submáximo. Vários
estudos comprovam que para uma mesma intensidade de corrida os atletas Africanos
(52)
evidenciam uma menor concentração de lactato plasmático. Weston et al.
verificaram, em corredores Africanos e Caucasianos, concentrações idênticas de
lactato plasmático a intensidades de corrida de 72 e 80% da vVO2max; no entanto, a
intensidades superiores (88 e 92% da vVO2max), os corredores Africanos
(44)
apresentavam uma lactatemia significativamente menor. Também Saltin et al. ,
observando várias amostras de corredores Quenianos e Escandinavos constataram
uma menor (p<0.05) concentração de lactato plasmático a intensidades submáximas
(23)
de corrida nos corredores do Quénia. Também, Harley et al. verificaram que
corredores Africanos comparados com os seus pares Caucasianos, tinham
tendencialmente (p=0.07) uma lactatemia mais baixa para uma velocidade de corrida
de 16 km.h-1 (2.4±0.7 versus 3.8±2.4 mmol.L-1).
Quererá isto significar que os corredores negros apresentam uma superior clearence
ou uma menor produção de lactato durante o exercício? Os dados disponíveis não nos
permitem esclarecer esta questão.
Embora, uma menor concentração de lactato plasmático em intensidades submáximas
de corrida parece discriminar positivamente os corredores Africanos, outros
indicadores conotados com a cinética do lactato parecem apontar para a similitude
(23)
entre Africanos e Caucasianos. Assim, Harley et al. não verificaram diferenças no
conteúdo muscular de transportadores monocarboxilato (MCT) entre corredores
negros e brancos. Os MCT facilitam o transporte de lactato através da membrana
plasmática (influxo ou efluxo consoante o tipo de fibra) e parecem desempenhar um
papel importante na homeostasia do lactato.
O limiar anaeróbio (Lan) é um indicador submáximo que expressa a capacidade
aeróbia de um indivíduo. É um indicador que consegue discriminar com maior robustez
(40) (31)
o nível competitivo de maratonistas . O estudo de Lucia et al. , conflitua com
(40, 50)
outros estudos ao verificar que os atletas com superior nível performativo

86
apresentam um limiar anaeróbio ventilatório inferior. Corredores Eritreus e Espanhóis
atingem o Lan ventilatório a 62.4 ± 8.0 e 67.5 ± 10.2% do VO 2max e a velocidades de
15.0 ± 0.9 e 16.6 ± 0.7 km/h, respetivamente. Em termos de velocidade as diferenças
são significativas (p<0.01). O Lan é uma variável com forte poder preditivo no meio-
(25, 50) (31)
fundo e fundo mas, o estudo de Lucia et al. inverte os dados de outras
investigações, pois os corredores com melhor prestação competitiva são os que
apresentam um Lan inferior. Neste caso os dados fisiológicos não têm correspondência
com o nível de performance competitiva como se pode comprovar pelos resultados
obtidos nos Campeonatos do Mundo de Corta-Mato (2004 e 2005), por alguns dos
(31)
atletas que integraram o estudo de Lucia et al. . Em 2004 os eritreus obtiveram as
seguintes classificações: 6º, 9º, 22º, 29º e 74º e o único espanhol participante do
estudo classificou-se em 33º. Em 2005, os eritreus conseguiram 2º, 15º, 17º e 20º
enquanto os espanhóis se colocaram em 24º e 68º. Como podemos verificar as
diferenças de nível competitivo são muito grandes entre os grupos. Quer isto dizer que
superiores indicadores fisiológicos nem sempre correspondem a superior performance
competitiva que está condicionada por outros fatores, tais como os volitivos e
motivacionais.
Numa linha de análise que reforça a não correspondência entre os vários indicadores e
(52)
a performance na corrida, Weston et al. , verificaram que a 80% da vVO2max, os
corredores Africanos apresentavam concentrações médias de lactato de 2.9±2.5
mmol.L-1, enquanto os corredores Caucasianos 4.4±2.0 mmol.L-1. Os valores médios
superiores de lactato plasmático a 80% da Potência Máxima Aeróbia (vVO 2max),
embora sem significado estatístico, têm, no nosso entender claro significado
fisiológico, pois nesta intensidade de esforço a amostra de corredores Africanos não
atinge o patamar das 4 mmol/L de lactato, enquanto os corredores Caucasianos, em
média, o ultrapassa. Quanto mais elevada a intensidade de exercício para se atingir o
patamar das 4 mmol/L de lactato, maior é a capacidade aeróbia de um atleta. Quer
isto significar que o limiar anaeróbio dos corredores Africanos é atingido a um patamar
superior de esforço. Isso reflete-se no tempo até à fadiga a 92% da PMA que é
significativamente (p<0.01) superior nos corredores Africanos. O que é de estranhar é
que estes indicadores fisiológicos que claramente evidenciam uma superior
capacidade aeróbia dos corredores Africanos não se reflitam claramente na

87
performance já que os tempos aos 10.000 m são similares. Mais uma vez, se verifica
que o nível competitivo da amostra pode comprometer a robustez das conclusões.
(31) (52) (11)
Conflituando com Lucia et al. e corroborando Weston et al. , Bosch et al.
verificaram que corredores negros apresentavam um limiar anaeróbio ventilatório
superior ao de corredores brancos (82.7±7.7 vs. 75.6±6.2% VO 2max), embora não se
verificassem diferenças significativas em relação ao VO2max. Estes dados têm, no
entanto, de ser lidos com cuidado já que o nível performativo da amostra é muito
baixo (maratonistas com tempos de prova superiores a 2h30).
A conflitualidade dos vários estudos aponta para a dificuldade de tentar discriminar
corredores Africanos e Caucasianos a partir da análise de indicadores fisiológicos.

6.2.3.3. Economia de Corrida e utilização fraccional do VO 2max


A economia de corrida é expressa como o consumo submáximo de oxigénio
(15)
estabilizado a uma dada velocidade de corrida submáxima. Costill et al. afirmaram
que o sucesso na corrida de maratona era determinado, em grande parte, pelo
VO2max, economia de corrida e capacidade de utilizar uma elevada fração do VO2max
durante a maratona. A economia de corrida é uma variável fortemente relacionada
com a performance nas corridas de meio-fundo e fundo. Esta deve ser entendida como
o custo energético obtido a velocidades de corrida submáximas e apresenta uma
grande importância funcional, podendo ser um fator discriminativo entre elite e não
elite (39).
Parece existir uma tendência para os corredores de meio-fundo e fundo Leste
Africanos serem mais económicos a correr; tal facto parece estar relacionado com
(19)
características anatómicas e antropométricas específicas . Esta asserção é
(52)
contrariada pelo estudo de Weston et al. no qual se pode verificar que a
intensidades de corrida de 72, 80 e 88% da vVO2max, não existem diferenças
significativas em relação aos custos energéticos da corrida entre Africanos e
Caucasianos, o que pode estar relacionado com o baixo nível performativo da amostra.
(31)
Na elite, Lucia et al. verificaram que a economia de corrida é o indicador que
melhor diferencia positivamente os corredores Eritreus dos Espanhóis. Podemos
verificar que para qualquer das velocidades estudadas (17, 19 e 21 km/h), os
corredores Eritreus consomem menos oxigénio quer em termos absolutos quer

88
quando os valores são expressos em percentagem do VO2max. Interessantemente,
quando os valores são considerados como percentagem da vVO 2max, as diferenças
deixam de ser significativas. Quer isto significar que embora a funcionalidade motora
seja idêntica para cada um dos patamares de esforço, o stresse fisiológico induzido é
(53)
significativamente menor nos corredores Eritreus. Weston et al. , ao comparar
corredores Africanos e Caucasianos com idêntico perfil competitivo, verificaram que os
primeiros gastavam 47.3±3.2 e os segundos 49.9±2.4 ml.kg -1.min-1, correndo à
velocidade de 16 km.h-1, avançando que os Africanos eram significativamente (p<0.05)
mais económicos, o que justificava as diferenças ao nível da elite. Entendemos que
esta especulação é abusiva já que o nível performativo da amostra selecionada por
Weston et al. (53) é baixo e, relativizando o consumo de oxigénio a 16 km.h-1 ao pico de
VO2, que era significativamente maior (p<0.01) nos corredores Caucasianos, essas
diferenças são esbatidas. Não podemos extrapolar para a elite dados referentes à não-
elite.
(31)
O estudo de Lucia et al. permite-nos especular que a superior economia de corrida
da elite Africana é devida, menos a fatores fisiológicos ou bioquímicos e mais a fatores
antropométricos e biomecânicos. Estes autores verificaram que o hemograma
(Eritrócitos, Hematócrito e Hemoglobina) é idêntico para os corredores Eritreus e
Espanhóis, o que evidencia uma capacidade de transporte de oxigénio idêntica.
Também, Saltin et al. (44) verificaram que o custo energético da corrida era menor nos
corredores Quenianos quando comparados com Escandinavos e que essa diferença se
acentuava quando os valores de consumo eram relativizados ao peso corporal de
forma diferente valorizando a massa magra (ml.kg -0.75.min-1). Como o consumo de
oxigénio (VO2) durante o exercício submáximo não aumenta, geralmente, de forma
linear com a massa corporal, foi recomendado relacionar a economia de corrida a 0.75
da massa corporal (45). Como a elite Africana treina mais quilometragem a intensidades
correspondentes ao VO2max é de aceitar a tese de que estão mais desenvolvidos em
relação à potência muscular e assim mais aptos a reduzir a quantidade de energia
(45)
perdida pelas forças de travagem o que se poderá refletir positivamente na
economia de corrida.
Embora tudo aponte para que os corredores Africanos sejam mais económicos que os
seus pares Caucasianos, torna-se difícil isolar um fator que por si só justifique a

89
superior performance dos corredores Africanos de meio-fundo e fundo. As diferenças
serão multifatoriais entre as quais se salienta a capacidade de a elite Africana em
manter elevadas percentagens do VO2max enquanto correm (11) o que não tem nada a
ver com o genoma mas sim com a qualidade do treino.

6.2.3.4. Mecanismos de Termorregulação


Os elevados desempenhos físicos característicos dos corredores de meio-fundo e
fundo estão fortemente condicionados pela eficiência dos mecanismos de controlo da
temperatura corporal. Mais de 2/3 da energia química armazenada nos músculos é
transformada em calor irrecuperável que necessita ser eliminado já que o corpo
humano tem uma reduzida capacidade de armazenamento de calor. Num estudo
(33)
conduzido por Marino et al. verificou-se que enquanto a taxa de sudação era
idêntica entre Caucasianos e Africanos em temperaturas moderadas (15º C), era
significativamente superior nos Caucasianos (p<0.01) quando a corrida era
desenvolvida em ambiente quente (35º C). Podemos assim especular que o
mecanismo de termorregulação é mais eficiente nos corredores Africanos, pelo menos
em ambientes quentes, o que pode parcialmente contribuir para a melhoria da
(33)
performance no calor verificada no estudo de Marino et al. . No entanto, não
(55)
devemos valorizar estes dados em demasia já que Yousef et al. , estudando uma
amostra alargada de brancos e negros não verificaram diferenças significativas entre
raças, em relação à temperatura rectal, temperatura da pele, frequência cardíaca e
taxa de sudação quando se exercitaram, no deserto, a 40% da máxima potência
aeróbia. Embora, alguns dados apontem para uma melhor adaptação ortostática ao
(48)
exercício em situações agressivas de calor de sujeitos negroides que caucasóides ,
não podemos inferior que essa superior capacidade termorreguladora é razão
suficiente para justificar as superiores performances dos corredores Africanos.

90
6.2.4. Caracterização fibrilar e enzimática
Verificamos que ao nível fisiológico os fatores que diferenciam os corredores Africanos
dos seus pares Caucasianos nem sempre são fáceis de encontrar e valorizar; vejamos o
que se passa ao nível da composição muscular.
Em relação à distribuição fibrilar os resultados não são concordantes. Weston et al. (52)
encontraram 49.0 ± 17.3% de fibras Tipo I nos corredores Africanos e 67.1 ± 17.5% nos
Caucasianos, o que indicia uma tendência para os corredores Caucasianos terem uma
superior percentagem de fibras de contração lenta. Esta asserção é corroborada pelo
estudo de Kohn et al. (26) que verificaram que atletas Caucasianos, comparados com os
seus pares de etnia Xhosa, têm uma percentagem significativamente superior (p<0.05)
de fibras Tipo I, enquanto os atletas Xhosa evidenciavam uma maior percentagem
(p<0.05) de fibras de Tipo IIa; em relação à percentagem de fibras Tipo IIx não havia
(23)
diferenças significativas. Conflituando com estes dados, Harley et al. verificaram
percentagens inferiores de fibras Tipo I em corredores brancos (49±16%) quando
comparados com os seus pares negros (56±17%). Os corredores brancos apresentavam
também maior percentagem de fibras Tipo IIa (49±18% versus 39±15%). No entanto,
os corredores negros tendiam a estar mais potenciados com fibras Tipo IIx (5±12%
(43)
versus 1±2%). Para dificultar a questão, Saltin et al. não verificaram diferenças
significativas entre corredores Quenianos e Escandinavos em relação às percentagens
dos vários tipos de fibras, enquanto Coetzer et al. (14) constaram que atletas negros Sul-
Africanos apresentavam uma percentagem de fibras Tipo I, cerca de 50% superior aos
atletas brancos do mesmo país. A diversidade fibrilar entre atletas brancos e negros
não permite detetar um padrão específico para cada grupo étnico. O que a
investigação permite verificar é que o treino é um forte detonador de adaptações que
(43)
muitas vezes alteram a influência da matriz genética. Nesse sentido, Saltin et al.
verificaram que o treino de endurance aumentava em 10-20% o número de capilares
do músculo gastrocnemius dos corredores o que permitia uma melhor eficiência
metabólica muscular. O treino continuado aumenta o ratio fibra/capilar potenciando
as adaptações periféricas relacionadas com o rendimento em esforços prolongados.
Também a superior atividade enzimática oxidativa (Citrato Sintetase; p=0.02 e 3-
(52)
Hidroxiacil-CoA Desidrogenase; p<0.01) verificada em corredores Africanos pode
ser circunstancial e estar mais relacionada com o treino e menos com o genótipo. A

91
partir deste estudo podemos constatar que o treino de endurance potencia a atividade
enzimática oxidativa (CS), e reduz ou mantém atividade enzimática glicolítica (PFK). Os
corredores Africanos exibem um superior perfil enzimático oxidativo, o que não está
relacionado com a percentagem de fibras Tipo I, que é tendencialmente superior na
amostra caucasiana (52).
Embora o treino consiga induzir adaptações estruturais e funcionais importantes, as
condições de base são determinantes para a consecução de elevadas performances.
(2)
Assim, Ama et al. , verificaram que sujeitos Caucasianos sedentários, quando
comparados com os seus pares Africanos, apresentavam uma percentagem superior
de fibras Tipo I (8%; p<0.01) e uma percentagem mais baixa de fibras Tipo IIa (6.7%;
p<0.05). Podemos especular que uma amostra de corredores emergente duma
população geneticamente potenciada em fibras Tipo IIa estará mais capacitada a
tornar-se elite no meio fundo e fundo internacional já que acreditamos que o pool de
fibras Tipo IIa está diretamente relacionado com o rendimento nos esforços de meio-
fundo e fundo (27). Embora, o nível competitivo dos grupos não fosse muito diferente,
(26)
Kohn et al. verificaram que os corredores do grupo étnico Xhosa apresentavam,
quando comparados com os seus pares Caucasianos, valores significativamente
superiores (p<0.05) na percentagem de fibras Tipo IIa, o que tinha correspondência
com as isoformas de cadeia pesada de miosina do mesmo tipo de fibras. Em relação ao
(52) (26)
perfil enzimático, e conflituando com o estudo de Weston et al. , Kohn et al.
verificaram valores médios semelhantes em relação às enzimas CS e 3-HAD para
ambos os grupos (Caucasianos e Xhosa), mas com diferenças significativas em relação
à enzima LDH (p<0.01) e diferença tendencial (p=0.07) para a enzima PFK. Alguns
dados apontam para uma superior atividade do metabolismo glicolítico nos corredores
africanos mas a extrema variabilidade inter-individual não nos permite definir um
padrão fenotípico claro para os atletas Africanos e Caucasianos. Amostras diferentes
dão resultados diferentes. Também é importante a escala de análise. Por exemplo, o
(26)
estudo de Kohn et al. verifica que, em termos absolutos, os atletas Xhosa
apresentam uma superior atividade da LDH, mas a análise das isoformas desta enzima
permitem-nos determinar o perfil mais oxidativo ou mais glicolítico das amostras. Os
atletas Xhosa têm maior percentagem de fibras Tipo IIa, normalmente caracterizadas
(3)
por superior atividade das enzimas LDH e PFK que as fibras Tipo I . Analisando as

92
(26)
isoformas da LDH, Kohn et al. verificaram que os atletas Xhosa apresentavam
valores significativamente superiores de LDH4-5 e inferiores de LDH1-2. As isoformas
LDH4-5, também denominadas musculares, parece que favorecem a conversão de
piruvato em lactato, enquanto as LDH1-2, denominadas cardíacas, promovem a reação
(17)
inversa . A superior atividade das fracções 4-5 da LDH nos corredores Xhosa pode
prender-se com a superior intensidade de treino que determina adaptações
(26)
fenotípicas específicas. No entanto, os dados de Kohn et al. são contrariados pelos
(43)
de Saltin et al. que verificaram em atletas Quenianos valores mais elevados das
isoenzimas 1-2 da LDH quando comparados com atletas escandinavos. Os mesmos
autores verificaram que o treino em altitude promovia a conversão da LDH 4-5 em LDH1-
2. Embora a conflitualidade entre os estudos compulsados se possa dever às diferenças
do nível performativo das amostras selecionadas, julgamos que também ao nível da
caracterização fibrilar e enzimática não podemos estabelecer um padrão diferenciador
entre corredores Africanos e Caucasianos.

6.3. Condicionantes ambientais


6.3.1. Características do envolvimento
O determinismo do envolvimento (environmental determinism) tenta justificar a
performance desportiva em função das condições ecológicas vividas por um dado
grupo humano. Em relação à performance física não aceitamos a relação absoluta de
causa-efeito entre o meio onde se nasceu e viveu e o êxito desportivo já que muitos
atletas de elite migram cedo dos seus países de origem para outros onde vão afirmar o
seu potencial desportivo.
No caso dos corredores do Leste Africano, acreditou-se que o facto de nascerem e
viverem em altitude lhes determinava condições favoráveis únicas para o rendimento
físico aeróbio. Se a altitude fosse o único fator determinante na performance aeróbia,
outros países com populações a viverem em altitude deveriam criar campeões no
meio-fundo e fundo com a proficiência demonstrada pelos países do Leste Africano. O
simples facto de viver em altitude pode induzir adaptações crónicas mais
(42)
potenciadoras do metabolismo glicolítico que do oxidativo. Rosser & Hochachka ,
verificaram que sujeitos Peruanos que viviam nos Andes a 3.300m de altitude
apresentavam a mesma área de secção transversa dos vários tipos de fibras, idênticos

93
aos de indivíduos a viverem a 700m de altitude. Somente a atividade enzimática nas
fibras Tipo I diferenciava significativamente (p<0.0001) os grupos; os sujeitos que
viviam em alta altitude tinham uma menor (-19%) atividade da enzima aeróbia malato-
(42)
desidrogenase e maior (+28.1%) da lactato-desidrogenase . Parece que a hipoxia
crónica induzida pela vivência em altitude muito elevada reduz a funcionalidade
mitocondrial potenciando a glicolítica mesmo em fibras de características
fundamentalmente aeróbias. O determinismo biológico da altitude é anulado pela
verificação científica. Também as condições específicas de desenvolvimento humano
podem determinar características adaptativas diversas. Assim, comprovou-se que
sujeitos Peruanos vivendo em altitude apresentavam dificuldades nas respostas
cerebrovasculares à hipoxia e hipocapnia enquanto a circulação cerebral de sujeitos
Etíopes, vivendo em altitudes idênticas, não era sensível à hipoxia, o que evidenciava
uma superior adaptação dos habitantes Etíopes à altitude (13).
(38)
Prommer et al. verificaram que corredores Quenianos de elite que viviam em
altitude (2.090 m) possuíam uma massa total de hemoglobina similar à de corredores
alemães, massa essa que se reduzia quando vinham viver para o nível do mar. Estes
dados são reforçados pelo estudo de Beall et al. (6) que verificaram que nativos Etíopes
vivendo a 3.530 metros de altitude apresentavam uma concentração média de
hemoglobina de 15.9 e 15.0 g/dl, para homens e mulheres, respetivamente, e com
uma saturação média de hemoglobina de 95.3%; estes dados permitem concluir que,
apesar da dramática descida da pressão parcial de oxigénio do ar inspirado pelos
nativos Etíopes vivendo em altitude, estes apresentavam concentrações de
hemoglobina e saturações de oxigénio similares ás populações vivendo ao nível do
mar. Mesmo que existam adaptações corporais específicas a uma dada geografia, elas
são sensíveis às alterações do envolvimento denotando uma certa plasticidade que
reajustam o organismo às condições específicas de cada local.
(42) (43)
Reforçando o estudo de Rosser & Hochachka , Saltin et al. verificaram que
sujeitos a viver e treinar em altitude (2000 m) apresentavam o mesmo perfil de
distribuição fibrilar que sujeitos a viver e treinar ao nível do mar: fibras Tipo I 60-70%,
Tipo IIa 30-40% e Tipo IIb <6%. Em termos enzimáticos, parece que a adaptação ao
treino em altitude provoca um aumento das isoformas 1-2 da enzima lactato
desidrogenase em detrimento das isoformas 3-4, potenciando assim a conversão de

94
(43)
lactato em piruvato e consequentemente a funcionalidade aeróbia . Quer isto dizer
que as diferenças que caracterizam os corredores Africanos que vivem em altitude são
esbatidas ou mesmo anuladas quando os corredores Caucasianos vão viver para a
altitude.
Verificou-se, em estudos com crianças Quenianas, que aquelas que tinham de
percorrer longas distâncias para a escola, apresentavam um VO2max 30% superior ao
(44)
daquelas crianças que viviam perto da escola . Portanto, os esforços recorrentes de
corrida dessas crianças eram a razão da sua potenciação aeróbia. O treino é um aspeto
essencial no desenvolvimento de potencialidades intrínsecas a cada sujeito, já que Bale
(5)
& Sang comprovaram que 14 dos 20 corredores Quenianos de elite que
entrevistaram, nunca correram para a escola, só que treinaram com qualidade quando
chegaram ao Atletismo. Esse é mais um estereótipo conceptual que a experiência não
comprova, já que o treino “natural” dessas crianças pode ser perfeitamente
substituído pelo treino “orientado” a que têm acesso nos clubes escolares ou
federados. Importa também reter que hoje em dia a maioria dos corredores de elite
Africanos raramente vivem nos seus países de origem e são deslocados, desde muito
cedo, e num processo de nomadização seletiva, para os locais que permitam um
melhor desenvolvimento das suas capacidades atléticas, fundamentalmente através da
melhoria das condições sociais.
Embora o treino em altitude que caracteriza alguns dos meio-fundistas e fundistas
Africanos possa ter efeitos positivos ao nível da eritrogénese, esta razão não parece
ser determinante para fazer a discriminação entre a elite Africana e Caucasiana.
Importa salientar que corredores Quenianos, em altitude (2000m), atingem um
VO2max de 68±1.4 ml.kg-1.min-1, enquanto ao nível do mar conseguem 79.9±1.4 ml.kg-
1
.min-1 (44)
, facto que evidencia a adaptação às condições específicas do novo
envolvimento. De igual forma, corredores Africanos e Caucasianos, quando ascendem
do nível do mar para a altitude experimentam uma redução inicial de suprimento de
oxigénio, induzindo uma situação temporária de hipoxia tecidular que afeta quer a
treinabilidade quer a performance em esforços de endurance (10).
A diáspora que caracteriza os “trabalhadores da corrida” do leste Africano faz-lhes
perder algumas condições de base e ganhar outras adaptadas aos seus novos

95
envolvimentos, pelo que a tese do determinismo “envolvimental” não tem robustez
suficiente para justificar a excelência competitiva desses corredores.

6.3.2. Perfil de Treino e Recuperação, Alimentação/Nutrição


Muitas das diferenças verificadas entre corredores Africanos e Caucasianos são
circunstanciais. De uma forma geral, quando são feitas correções em relação à mais
reduzida massa corporal, a capacidade de correr a um superior nível de esforço, não
pode ser justificada por diferenças verificadas ao nível do VO2max, ventilação máxima,
economia de corrida e limiar anaeróbio (14, 31).
(31)
O superior rendimento competitivo dos corredores Eritreus , que tem como base o
menor stresse sistémico para uma dada carga de esforço submáxima (a nível máximo,
em laboratório, as diferenças entre grupos esbate-se, beneficiando, inclusive, os
Espanhóis), pode ter algo a ver com o perfil de treino (carga + recuperação), que
diferencia os grupos. Na caracterização do treino dos corredores Eritreus salienta-se o
facto de realizarem menor volume de treino semanal, menos sessões de treino por
semana e de dormirem mais horas que os seus pares Espanhóis, o que permite uma
melhor recuperação entre treinos de elevada intensidade que são em maior número
nos corredores de elite. Na alta competição todos os pormenores contam mesmo
aqueles que por vezes parecem menos importantes. O tempo de sono é de crucial
importância para uma melhor adaptação às cargas. O treino não é só estímulo-carga; a
recuperação é fundamental para a regeneração eficaz de todos os sistemas orgânicos,
desregulados temporariamente pelas cargas intensas características dos atletas de
elite. Treinar em intensidade é condição sine qua non para elevar o nível competitivo
de um atleta, mas isso só se consegue se o organismo for capaz de recuperar
convenientemente. Os corredores Eritreus, tendencialmente, treinam menos, não
fazem trabalho de força com pesos, que entendemos não se justificar em corredores
de meio-fundo e fundo e que pode ser substituído por outro tipo de trabalho
funcionalmente mais importante (e.g. correr na areia, rampas, etc.), e descansam
mais. Como sabemos que normalmente treinam, maior percentagem do tempo total
de treino em intensidades muito elevadas, que os corredores Caucasianos, tudo
aponta para uma eficaz conjugação de treino de maior intensidade e superior tempo
de recuperação. Talvez aí residam algumas das razões que diferenciam os grupos

96
(31) (14)
estudados por Lucia et al. . Os dados de Coetzer et al. , permitem verificar que
embora os corredores Africanos e Caucasianos, tenham volumes de treino similares,
diferenciavam-se pelo facto de os atletas africanos apresentarem uma maior
percentagem de treino a intensidades superiores a 80% do VO2max (36±18% contra
(36)
14±7%). Estas considerações são reforçadas pelas verificações de Noakes que
verificou que as principais diferenças entre os corredores Africanos e Europeus
radicavam no perfil do treino. Assim, enquanto os Africanos dedicavam cerca de 1/3
do volume total de treino para trabalhar a intensidades variando entre 80 e 100% do
VO2max, os Europeus somente dedicavam cerca de 10%. Corroborando estes dados,
(8)
Billat et al. verificaram que em corredores Quenianos de 10.000-m, aqueles que
treinavam com intensidades de corrida superiores apresentavam um VO 2max mais
elevado e superior performance que os corredores que treinavam a intensidades de
corrida mais baixas.
Pelo menos para a elite, parece que a qualidade de treino tem alguma robustez
discriminativa entre corredores Africanos e Caucasianos.
A análise da componente nutricional pode-nos trazer alguma luz discriminativa entre
corredores Africanos e Caucasianos. Os corredores Quenianos estudados por Fudge et
al. (20), apresentavam uma ingestão elevada de carbohidratos (67.3±7.8%), reduzida de
gorduras (17.4±3.9%) e equilibrada de proteínas (15.3±4.0%) o que contrataste
parcialmente com o perfil de ingestão nutricional da elite Portuguesa de meio fundo e
fundo: carbohidratos (51.1±16.2%), gorduras (30.8±12.6%) e proteínas (17.6±5.0%) (49).
Uma grande disponibilidade de carbohidratos permitirá uma mais eficaz recuperação
das reservas musculares e hepáticas de glicogénio que é o substrato energético por
excelência para os corredores de elite de meio-fundo e fundo. No entanto, algumas
particularidades devem-nos fazer refletir sobre o comportamento nutricional de alguns
(20)
corredores. Fudge et al. verificaram que, em períodos de treino intenso, alguns
corredores Quenianos apresentavam um balanço energético negativo, i.e., ingeriam
menos calorias de que as que gastavam. Ora tal prática pode conduzir à redução da
massa corporal que combinado com a elevada ingestão de carbohidratos pode ter
efeitos positivos sobre o custo energético da corrida. No entanto, tal prática pode, no
longo termo, produzir efeitos adversos na saúde e rendimento dos atletas. Tais
(41)
práticas restritivas são comuns em meio-fundistas e fundistas e devem merecer

97
correção por parte dos responsáveis do processo de treino. Defendemos que a
nutrição não faz um atleta de elite mas pode constituir-se como obstáculo a que um
atleta de elite manifeste a sua excelência. Malgrado as diferenças verificadas, não
podemos colocar no perfil de ingestão nutricional a razão do superior potencial
performativo dos corredores Africanos.

6.3.3. Estilo de vida


Em relação às adaptações induzidas pelo perfil de treino ou atividade nas fases de
desenvolvimento auxológico que antecedem a competição, importa salientar que
enquanto os jovens urbanos Quenianos apresentam o mesmo VO2max relativo que os
jovens Dinamarqueses não treinados, os jovens da mesma idade do Quénia rural
atingem, um VO2max relativo, 30% superior que os seus pares urbanos ou
dinamarqueses (44). Estes autores concluem que um período de juventude fisicamente
ativa, combinada mais tarde com um treino de elevada intensidade, conduz à superior
capacidade aeróbia aliada a uma boa economia de corrida que fazem o sucesso dos
corredores Quenianos.
Pensamos que estes fatores não justificam, por si só, a superior valia competitiva dos
corredores Quenianos, no entanto, o declínio competitivo no meio-fundo e fundo nas
sociedades ocidentais pode estar relacionado com a tendência para a hipocinesia e
obesidade que caracteriza os seus adolescentes. O perfil de atividade dos jovens das
zonas rurais do Quénia e Etiópia, que têm nos longos estímulos de marcha e corrida
que fazem parte da sua vida diária, uma forma de treino natural, pode ser um fator
básico para uma melhor aptidão aeróbia e uma melhor resiliência à fadiga. No
entanto, estas características podem ser obtidas através de um processo de treino
sistemático e bem orientado.

6.3.4. Perfil Psicológico e Emocional


O êxito dos atletas negros em várias modalidades desportivas criou a perceção
generalizada da sua superioridade atlética que é potenciada pelos meios de
comunicação de massas (18). Cria-se, assim, um ambiente psicológico e social favorável
aos atletas Africanos em detrimento dos atletas Caucasianos. A ameaça dos
estereótipos que afirmam a superioridade negra nas corridas de meio-fundo e fundo

98
funciona como efeito bloqueador para os atletas brancos e age positivamente sobre os
atletas negros (4). As atitudes para com os estereótipos reinantes, assentes em aspetos
cognitivos, afetivos e comportamentais, podem dar vantagens competitivas aos atletas
Africanos.
Correr rápido, conseguem-no as elites de todos os países; correr rápido quando
importa e controlar bem o stresse competitivo é uma característica de alguns atletas
(32)
Africanos com especial relevo para os corredores provenientes da tribo Kalenjin .
Algumas características do processo de desenvolvimento ontológico da tribo Kalenjin
podem, em parte, explicar o êxito dos seus corredores. Desde o berço que os jovens
vivem debaixo de pressão de afirmação social que atinge provavelmente o zénite na
circuncisão, momento chave na passagem à adultícia que pode levar ao banimento da
(32)
tribo no caso de demonstração de medo e acentuada cedência à dor . A superação
desta prova iniciática promove uma resiliência emocional única que pode reverter
positivamente para o controlo da ansiedade pré-competitiva.
Também o fator exemplo pode ser decisivo na criação de um ambiente de forte
(28)
emulação e autossuperação. Segundo La Torre et al. , a oportunidade de os jovens
talentos de treinarem com atletas experientes repletos de sucesso, pode ser um fator
determinante para a diferença. No nosso entender, este processo de treino em grupo
pode ter vantagens e inconvenientes. Um processo precoce de treino de elevada
intensidade pode bloquear o nível de progressão de atletas jovens. Contudo, tal
processo pode funcionar como um meio de seleção natural permitindo a
“sobrevivência” competitiva dos mais aptos geneticamente. Temos de assumir com
clareza e coragem que a alta competição é assunto para muito poucos.
Um fator pode ser especialmente importante na competição de alto nível – a vontade
de ganhar. Segundo o fisiologista Tim Noakes, todos os corredores de meio-fundo e
fundo de nível internacional apresentam, virtualmente, a mesma condição física, pelo
que a luta pelas medalhas pode estar apoiada no empenhamento neurológico
(36)
correspondente a uma superior vontade de ganhar . No entanto, desde sempre o
desporto foi um campo fértil para a criação de estereótipos que, quando não
convenientemente resolvidos pelos treinadores se fixam como verdadeiras ameaças
psicológicas (stereotype threat) inibindo os atletas de expressar a totalidade das suas
(4) (22)
competências atléticas . Também Hamilton postula que a vantagem dos Atletas

99
Africanos, hoje em dia, radica mais em aspetos psicológicos que fisiológicos já que os
atletas do Leste Africano desenvolveram uma aura de invencibilidade que os potencia
mentalmente enquanto reduz a capacidade mental competitiva dos seus pares
Caucasianos.

100
4. Conclusão
A abordagem reducionista e segmentar em Desporto é sempre um meio fértil de
geração de mal-entendidos e juízos enviesados. A performance do meio-fundo e fundo
não pode ser esclarecida através de um simples indicador. As abordagens,
antropométrica, bioquímica e fisiológica da performance no meio-fundo e fundo, não
nos dão dados suficientemente robustos que nos permitam justificar as diferenças
competitivas entre corredores de meio-fundo e fundo Africanos e Caucasianos. Se
tivéssemos de selecionar os fatores que mais podem contribuir para as diferenças
performativas que separam os corredores Africanos dos Caucasianos, teríamos de
eleger o perfil do treino e as expressões psicológicas e emocionais dos atletas.

101
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104
7. Classificação dos vários tipos de corrida
As corridas do Atletismo integram várias especialidades cuja especificidade evidencia a
diversidade e riqueza pedagógica e desportiva destas formas culturais de movimento
desportivo.
As corridas atléticas dividem-se:
- Corridas de Velocidade
. Velocidade curta: de 60 a 200 m
. Velocidade prolongada. De 200 a 400 m
- Corridas longas ou de duração
. Meio-fundo curto: 800 a 3.000 m
. Meio-fundo longo: 3.000 a 10.000 m
. Fundo curto: até 20 km (podemos incluir aqui a meia-maratona)
. Grande fundo: de 25 km até à Maratona
- Corridas com obstáculos
. De barreiras: 100 MB (mulheres); 110 MB e 400 MB (homens)
. De obstáculos
- Corridas de estafetas: 4 x 100m e 4 x 400 m
As corridas do Atletismo integram as provas normalmente realizadas no programa
olímpico bem como outras fora desse programa. Por exemplo, hoje em dia começam a
proliferar as ultramaratonas que colocam desafios inauditos às capacidades físicas e
volitivas dos participantes. As ultramaratonas são provas especiais com distâncias
variáveis e graus de dificuldade diferenciados. Salienta-se o êxito do corredor
português Carlos Sá que na ultramaratona de Badwater de 2013 nos Estados Unidos,
correu os 217 km da prova, debaixo de condições climatéricas excecionais
(temperaturas a rondar os 50 graus centígrados), chegou em primeiro lugar.

105
8. Bases mecânicas da corrida
A) PASSADA
1. Ações no solo
a) Amortecimento-receção
Esta fase realiza-se por toda a planta do pé embora possam existir
diferentes tipos de receção. Plantar-anterior, plantar-medial e plantar-posterior. Os
nossos antecessores que corriam descalços faziam o amortecimento através de um
apoio plantar-anterior. A evolução técnica dos sapatos desportivos provocou uma
alteração significativa do padrão biomecânico da passada.
b) Apoio
Deve ser o mais curto possível e corresponde à passagem do bloco
bacia-tronco na vertical do apoio.
c) Impulsão
Esta fase resulta da extensão dos vários segmentos dos membros
inferiores (anca, coxa, perna e pé) e determina quer a amplitude de passada quer a
frequência dos apoios.
d) Suspensão
Esta fase sucede à impulsão, é determinada pela dinâmica da impulsão e
corresponde a uma fase não motora de aparente descanso. O membro inferior livre
vem à frente tanto mais fletido (pé-perna, perna-coxa, coxa-bacia) quanto mais
poderosa for a impulsão.
B) AÇÃO BRAÇOS-OMBROS
O movimento de oscilação antero-posterior, executa-se de forma
sensivelmente paralela ao eixo de corrida. Oscilações dos braços-ombros com
tendência interna (aproximação do plano sagital corpo) são frequentes em muitos
corredores. Os ombros deverão estar flexíveis acompanhando o movimento
equilibrador dos braços. O ângulo braço-antebraço deverá manter-se entre os 60 e 90
graus.

106
9. Estudo comparativo, fisiológico, antropométrico e motor entre meio-fundistas e
fundistas Portugueses de Atletismo
Resumo
O presente estudo pretendeu fazer a análise comparativa entre meio-fundistas
(especialistas de 800, 1500, 3000 e 5000 m) e fundistas (10.000 m, ½ maratona e
maratona) portugueses quanto aos seguintes parâmetros: Consumo máximo de
oxigénio (VO2max), velocidade máxima no patamar do VO2max (vVO2max), Economia
de Corrida (consumo de oxigénio à velocidade de 16 km.h-1), Limiar Anaeróbio
Ventilatório (Lan), Cinética do Lactato, Somatótipo, Composição Corporal e Força
Explosiva dos Membros Inferiores. A amostra foi constituída por 10 meio-fundistas e
10 fundistas que independentemente das diferenças de nível competitivo poder-se-á
considerar de elite. Foi realizado um teste progressivo até à exaustão em tapete
rolante para determinação dos indicadores respiratórios e metabólicos. Os resultados
permitem verificar que os fundistas apresentam valores médios superiores de VO 2max
relativo (p<0.0001), consumo de oxigénio ao Lan (p<0.001) e Lan.% VO2max (p<0.05) e
valores médios inferiores (p<0.0001) no Squat Jump, Counter Mouvement Jump e
Potência Mecânica. A análise do Somatótipo e da Composição Corporal permite
verificar a similitude entre fundistas e meio-fundistas. Malgrado o pico de lactatemia
ter sido atingido mais cedo nos meio-fundistas, a cinética do lactato parece ser
idêntica. A Economia de Corrida não permite diferenciar as subamostras bem como a
vVO2max. O presente estudo indica que a integração num mesmo grupo de
especialistas de meio-fundo curto (800 e 1500 m) e meio-fundo longo (3000 e 5000 m)
parece ter sido incorreta já que os especialistas de 3.000m e 5.000m apresentam
características similares dos fundistas. Pensamos que tal facto derivará do perfil de
treino e do perfil competitivo fora das competições de pista. Outros estudos se
justificam para corroborar esta última asserção.

Palavras-chave: meio-fundistas, fundistas, vVO2max, VO2max, economia de corrida,


limiar anaeróbio ventilatório, lactato, somatótipo, composição corporal, potência
muscular, SJ, CMJ

107
Introdução
As corridas de meio-fundo e fundo em Portugal apresentam uma expressão
competitiva de elevado nível como é atestado pela excelência dos resultados
internacionais. No entanto a pesquisa científica interna, neste campo, é escassa,
salientando-se os estudos provenientes da Universidade do Porto no campo fisiológico
(45,46) caracterização do treino (39), controle do treino (14,47) e treino com jovens
(42).
É ponto assente na literatura científica o estabelecimento da importância de algumas
variáveis fisiológicas na performance competitiva no meio-fundo e fundo salientando-
se o consumo máximo de oxigénio (VO2max) (49), o Limiar Anaeróbio (Lan) (47) e a
Economia de Corrida (Ec) (15).
Também está bem estabelecido que as exigências metabólicas variam em função da
intensidade e duração do esforço (1), pelo que o processo continuado de treino
induzirá adaptações crónicas que se refletirão inequivocamente a vários níveis.
Assim o presente estudo pretendeu fazer a caracterização comparativa de meio-
fundistas e fundistas portugueses, a vários níveis (fisiológico, antropométrico e motor),
tentando descriminar os indicadores que melhor diferenciam os dois tipos de atletas.

Metodologia
A amostra foi constituída por 10 especialistas em provas de meio-fundo (800, 1.500,
5.000) e 10 especialistas em provas de fundo (10.000 metros, meia-maratona e
maratona), pertencendo à elite competitiva do Atletismo Português cujas
características biométricas e idade se apresentam no quadro 1.

Tabela 9.1. Caracterização biométrica dos meio-fundistas e fundistas

Amostra Idade Peso Altura


(anos) (kg) (cm)
Meio-fundistas (n = 10) 24.8 ± 3.7 62.0 ± 2.7 173.3 ± 3.6
Fundistas (n = 10) 30.0 ± 3.1 58.4 ± 3.2 169.7 ± 3.9

Foi realizada uma prova de esforço em tapete rolante (Erich Jaeger-Laufergotest), após
um período de 12 horas de descanso e sem aquecimento prévio. Utilizamos um teste
progressivo e contínuo até à exaustão, com uma inclinação estabilizada de 2%, a partir

108
da velocidade inicial de 8 km/hora e com incrementos de carga (2 km/hora) em cada 2
minutos.
Indicadores respiratórios- foram recolhidos através dum sistema móvel automático
EOS-Sprint (Erich Jaeger GmbH & Co, versão XT/AT JK), e analisados através dum
computador JVC, modelo GD-H3214VCW. O cálculo do Lan foi feito através do método
dos equivalentes respiratórios (20,56). A frequência cardíaca foi medida através dum
eletrocardiógrafo (Servomed, SMS 182, Hellige). A lactatemia foi medida a partir do
sangue capilar [(La)s] por um aparelho (2300 STAT, L-Lactate Analyser, YSI-

Incorporated, modelo 2300-L SN91L034499), e em quatro momentos (repouso e 3, 5 e


10 minutos após teste). Os indicadores antropométricos foram obtidos através do
protocolo proposto pelo International Working Group on Kinanthropometry, descrito
por Ross e Marfell-Jones (43) e Borms (2). A determinação do somatótipo foi efectuada
de acordo com a técnica antropométrica de Heath e Carter e o cálculo das
componentes baseou-se nas equações propostas por Ross e Marfell-Jones (43). Para a
estimação da composição corporal, impossibilitados de utilizar métodos mais
sofisticados (27), utilizamos a medição de várias pregas de adiposidade subcutânea
para a determinação da Densidade Corporal (26), sendo a percentagem de Gordura
determinada pela fórmula de Siri (48). A força explosiva dos membros inferiores (Squat
Jump, Counter Mouvement Jump e potência mecânica -15"), foi obtida através da
fórmula proposta por Bosco et al. (4) a partir dos dados obtidos no Ergojump Digitime
1000 (Digitest Finland).

Procedimentos Estatísticos
A análise dos resultados foi antecedida de estudos exploratórios prévios às
diferentes distribuições de valores por forma a testar a normalidade bem como a
presença de out-liers. O estudo da cinética do lactato foi efetuado a partir da Anova
de Medidas Repetidas Fatorial. Para pesquisar diferenças entre os grupos recorreu-se
à Anova Multifatorial, bem como ao teste de Schiffé e intervalos de confiança para as
médias. Utilizou-se a análise da Função Discriminante para verificar a diferença nos
vetores de médias no caso do somatótipo e da composição corporal. As análises
foram efetuadas nos “packages” Statview e SPSS. O nível de significância foi mantido
em 5%.

109
Resultados
Os resultados deste estudo permitem diferenciar os meio-fundistas dos fundistas em
relação ao VO2max relativizado ao peso corporal. Os dados da FCmax e da vVO 2max
não diferenciam os dois grupos de forma estatisticamente significativa (quadro 2).

Tabela 9.2. Valores médios (± SD) de VO2max, FCmáx e vVO2max de após prova de esforço máxima
Amostra FCmax vVO2max VO2max
-1 -1 -1 -1 -1
(bat.min ) (km.h ) L.min ml.kg .min
Meio-fundistas 186.3 ± 9.6 23.8 ± 1.1 4.2 ± 0.3 68.1 ± 5.2
Fundistas 182.1 ± 3.8 24.2 ± 1.5 4.4 ± 0.3 76.8 ± 4.8*
* diferença significativa (p<0.0001)

Os dados referentes à Ec, expressos pelo consumo de oxigénio e frequência cardíaca à


velocidade de 16 km.h-1 não permitem diferenciar os meio-fundistas dos fundistas
(quadro 3). O desvio-padrão expressivo quanto aos valores médios da FC dos meio-
fundistas denota a labilidade deste indicador.

Tabela 9. 3. Valores médios (± SD) de Ec-16


Amostra VO2-16 VO2-16 FC-16 FC-16
(ml.kg-1.min-1) (%VO2max) (bat.min-1) (% FCmax)
Meio-fundistas 45.0 ± 8.5 67.3 ± 8.0 154.3 ± 15.7 82.8 ± 6.1
Fundistas 50.6 ± 5.8 66.0 ± 7.6 150.7 ± 7.9 82.9 ± 3.6

O Lan diferencia os meio-fundistas dos fundistas em relação aos indicadores


respiratórios. Não existem diferenças significativas quanto à velocidade atingida ao
Lan. De referir que somente em 7 meio-fundistas foi possível estabelecer o Lan.

Tabela 9.4. Valores médios (± SD) de Lan


Amostra n vLan Limiar Anaeróbio
(km.h-1) VO2 % VO2max
(ml.kg-1.min-1)
Meio-fundistas 7 20.0 ± 1.6 60.2 ± 3.6 86.6 ± 7.6
Fundistas 10 21.6 ± 2.1 69.0 ± 5.5 * 89.9 ± 6.0 **

*diferença significativa (p<0.0001)


** diferença significativa (p<0.05)

Os dados concernentes à cinética do lactato, embora sem diferenciações com


significado estatístico, permitem verificar que os meio-fundistas atingiram o pico de
lactatemia mais cedo que os fundistas. O perfil de remoção assemelha-se idêntico em
ambas as subamostras.

110
Tabela 9.5. Valores médios ± (SD) de lactatemia após prova de esforço máxima
Amostra n Lactatemia
3' 5' 10'
Meio-fundistas 10 7.8 ± 2.7 7.6 ± 2.9 6.8 ± 2.8
Fundistas 10 7.0 ± 1.5 7.6 ± 2.1 6.6 ± 2.3

A análise estatística do somatótipo permite-nos verificar a homogeneidade corporal


das amostras já que não existem diferenças significativas. Os valores obtidos estão de
acordo com o perfil adaptativo específico aos esforços prolongados.

Tabela 9.6. Valores médios ± (SD) das componentes do somatótipo


Amostra Somatótipo
Endo Meso Ecto
Meio-fundistas 1.5 ± 0.3 3.1 ± 1.1 3.5 ± 1.0
Fundistas 1.4 ± 0.2 3.5 ± 0.6 3.4 ± 0.8

Os valores de composição corporal reforçam os dados do somatótipo evidenciando


quer a similitude das amostras quer os baixos níveis de gordura corporal que são o
resultado lógico das adaptações ao tipo de esforço desenvolvido.

Tabela 9.7. Valores médios ± (SD) da composição corporal


Amostra Gordura M. Magra
% (kg) (kg)
Meio-fundistas 7.3 ± 1.5 4.5 ± 1.1 57.5 ± 2.0
Fundistas 7.3 ± 1.1 4.3 ± 0.7 54.1 ± 2.8

Os dados inerentes à Força Explosiva dos Membros Inferiores diferenciam claramente


os dois grupos. Especialistas de provas mais longas apresentam valores inferiores de
força explosiva.

Tabela 9.8. Valores médios ± (SD) do SJ, CMJ, Potência Mecânica


Amostra SJ CMJ Potência Mec-15"
-1
(cm) (cm) (joules.s )
Meio-fundistas 29.8 ± 6.1 31.9 ± 6.6 36.7 ± 11.9
Fundistas 24.9 ± 4.5* 25.8 ± 3.9* 32.7 ± 14.0*
*diferença significativa (p<0.0001)

111
Discussão

A partir dos 800 m os mecanismos aeróbios começam a ganhar importância crescente


(12,21,36). Esta prova caracteriza bem a derivação metabólica, pois, sendo
essencialmente dependente do metabolismo glicolítico (21), o metabolismo aeróbio já
contribui com 35-40% para a formação de ATP.
O presente estudo comprova que os especialistas de provas mais longas apresentam
um VO2max mais elevado, quando relativizado ao peso corporal, o que está de acordo
com as adaptações específicas exigidas pelas provas mais extensas e é corroborado
por outros estudos (6,18,23,33). Em virtude da expressiva componente glicolítica na
consecução do VO2max, parece que este indicador se correlaciona melhor com o meio-
fundo do que com o fundo (7), o que este estudo não permitiu evidenciar. O VO 2max
vai perdendo força preditiva quando se avança das provas mais curtas para as mais
longas (49), no entanto, os fundistas de elite apresentam elevados valores de VO2max.
Segundo Davies e Thompson (19) existe uma elevada correlação entre o VO 2max e a
performance nos esforços prolongados. No entanto, dentro de um mesmo grupo
parece que a correlação é muito fraca. Assim, Conley e Krahenbuehl (15) encontraram
em 12 especialistas de 10.000 m de elite uma correlação muito fraca (r = - 0.12) entre
o VO2max e a performance nessa prova. Alguns dados individuais do presente estudo
permitem verificar a constatação destes últimos autores. Assim o sujeito H da nossa
subamostra de fundistas apresenta um VO2max de 69.8 ml.kg-1.min-1 e tem a melhor
marca à maratona de 2h08'31", enquanto o sujeito E apresenta um VO2max de 80
ml.kg-1.min-1 e a sua melhor marca à maratona é de 2h21'. A excelência competitiva
aliada a consumos relativamente baixos é confirmada por outros estudos. Assim,
Costill et al. (17) mediram em Clayton (2h08'33" à maratona) um VO2max de 69.7
ml.kg-1.min-1. Também Stahl (4º na maratona do campeonato do mundo) apresentou
um VO2max de 66.8 ml.kg-1.min-1 (49). Os presentes dados permitem supor que as
diferenças verificadas quanto ao VO2max relativo, e não verificáveis quanto ao VO2max
absoluto, entroncam no peso corporal mais reduzido dos fundistas. Também a
vVO2max não discrimina os dois grupos. Este indicador parece ser fortemente
discriminador dentro dum mesmo grupo (38). No presente estudo o sujeito H atingiu
um VO2max de 69.8 ml.kg-1.min-1 a 26 km.h-1, enquanto o sujeito D conseguiu 81.4

112
ml.kg-1.min-1 a 22 km.h-1. Para Noakes et al. (38) a velocidade atingida ao VO2max
(vVO2max) parece ser o melhor preditor laboratorial da performance em maratonistas.
A heterogeneidade da nossa amostra inviabiliza a força discriminadora deste indicador.
Pensamos que a consecução de uma amostra mais alargada e homogénea permitiria
corroborar o estudo destes últimos autores.
Os dados sobre a frequência cardíaca permitem evidenciar uma certa bradicardia
funcional em ambos os grupos embora mais evidente nos fundistas o que pode estar
relacionado com a idade média mais elevada deste grupo. As adaptações crónicas
induzidas pelos esforços prolongados propiciam uma nítida economia de trabalho do
miocárdio. Tal ficar-se-á a dever, segundo Brooks e Fahey (9), a uma menor libertação
de catecolaminas e diminuição da sensibilidade dos recetores suprarrenais, que se
refletirá na diminuição da frequência cardíaca, quer como resposta ao esforço
submáximo quer ao esforço máximo. No entanto, a labilidade deste indicador não nos
permite retirar, com segurança, indicações mais profundas.
A Ec indicia-nos o potencial metabólico e mecânico de um atleta para desenvolver
esforços prolongados. É um indicador submáximo que ao contrário do VO 2max, vai
evoluindo durante a época e nas várias épocas (51), consubstanciando uma melhor
rentabilização de todos os sistemas orgânicos. Nos meio-fundistas e fundistas os
indicadores de economia de corrida são importantes, e tanto mais quanto mais longa
for a prova (49), embora a variabilidade entre os sujeitos possa ser grande (16,52).
Vários estudos encontraram correlação entre a economia de corrida e a performance
em provas longas de corrida. Conley e Krahenbul (15) comprovaram que, em atletas
com VO2max variando dentro de margens estreitas, a economia de corrida a diferentes
velocidades estava correlacionada de forma significativa com a performance na prova
de 10.000 m. Os dados acerca do custo energético da corrida, que em última análise
vão caracterizar o nível de economia de corrida, são contraditórios. Assim Bourdin et
al. (5) encontraram uma correlação muito forte (r = 0.72) entre o peso corporal e o
custo energético de corrida, facto que é contrariado por DiPrampero et al. (24) que
não encontraram nenhuma relação entre o custo energético da corrida e as seguintes
variáveis (consideradas individualmente ou combinadas): idade, peso corporal,
estatura, duração e intensidade do treino. A análise dos nossos resultados confirma
este último estudo já que a diferença média de pesos das nossas amostras (cerca de 4

113
kg) não se reflete em diferenças significativas na Ec. Embora todo o peso supérfluo
onere energeticamente a corrida, os nossos dados indiciam que em sujeitos muito
bem treinados as diferenças de peso não se reflectem na Ec.
Noakes et al. (38) encontraram, para fundistas de nível inferior aos da nossa amostra,
um valor médio de VO2-16 (consumo de oxigénio à velocidade de 16 km-h-1) de 50.3 ±
3.2 ml.kg-1.min-1 (74.9 ± 10.9 % do VO2max). As diferenças ao nível da performance em
relação à nossa amostra são abismais, o que se expressa claramente na Ec.
O Lan é um ótimo indicador da capacidade aeróbia. Quanto mais elevado o Lan maior
é a intensidade de trabalho que pode ser desenvolvida em equilíbrio metabólico.
Segundo Sjodin e Svedenhag (49), o índice de correlação do Lan com a performance na
maratona é muito elevado (r =.92). O Lan é tão mais elevado quanto mais elevado é o
nível de performance do atleta. Tal foi comprovado por Jousselin (32) com
especialistas de 1.500, 5.000 e 10.000 metros.
Os presentes dados permitem verificar que os indicadores ventilatórios do Lan
diferenciam claramente os fundistas dos meio-fundistas. Em sequência, os fundistas
apresentam uma tendência para desenvolverem superior capacidade de trabalho
neste patamar. Num estudo (10) foram detetados valores médios de Lan de 82.8 ± 3.9
% do VO2max para os meio-fundistas e 86.7 ± 1.8 % para maratonistas, o que vem
corroborar os nossos dados. Outros estudos (11, 23, 34) detetaram valores de Lan
superiores aos nossos; no entanto, os dados respiratórios apresentam insuficiente
força discriminatória pois os fundistas de Jousselin e Stephan (34) atingiram um Lan a
94.8 ± 2.9% VO2max o que correspondia a uma velocidade de 19.2 ± 0.2 km. h-1; os
fundistas da nossa amostra com valores médios de 89.9 ± 6.0 VO 2max atingiram
velocidades de 21.6 ± 2.1 km.h-1. No entanto, devido a eventuais erros de cálculo
inerentes à determinação do Lan por métodos ventilatórios, devemos ler os resultados
com muito cuidado evitando inter-verificações arrojadas com outros estudos.
A análise individual de alguns dos nossos resultados permite-nos dar alguma força à
afirmação de que quanto maior é o nível do sujeito, mais elevado é o seu Lan.

114
Tabela 9.9. Análise individual de alguns indicadores fisiológicos em 3 sujeitos do presente estudo
VO2max Ec-16 Ec-20 Lan vLan Marca à
-1 - -1
ml.kg .min %VO2max %VO2max % VO2max km.h Maratona
1

Sujeito H 69.8 57.6 77.9 96.6 24 2h08'31"


Sujeito I 73.4 62.1 83.9 94.3 22 2h11'18"
Sujeito C 68.9 81.7 94.9 85.3 20 2h17'23"
-1 -1
Nota: Incluímos neste quadro não só a Ec a 16 km.h , como aos 20 km.h que, em função do nível dos
nossos fundistas, ainda é um indicador submáximo

A relação do Lan com o nível competitivo dos atletas é comprovada por outros estudos
(40,49,53).
O estudo da concentração sanguínea de lactato pós-esforço, indica-nos em certa
medida a expressão glicolítica do exercício. Existe um tempo de difusão do lactato
entre os músculos ativos onde é formado e a corrente sanguínea, onde é usualmente
medido. Embora Gollnick e Hermansen (28) afirmem que são necessários 5 a 7
minutos para se equilibrar a taxa muscular e sanguínea de lactato, Roth (44) salienta a
possibilidade de ao fim de 2 minutos se poder atingir o pico de lactatemia, o que está
de acordo com os resultados deste estudo no concernente aos meio-fundistas.
As nossas amostras não se diferenciam quanto a este indicador, embora a
variabilidade inter-individual tenha sido manifesta. Um estudo levado a efeito com
velocistas (46) verificou concentrações sanguíneas de lactato muito mais elevadas em
patamares de esforço mais reduzidos. Como é a potência do trabalho desenvolvido
que determina a formação de lactato (22,29,31), e como as nossas amostras atingiram
elevados patamares de esforço, os valores baixos de lactatemia pós-esforço indiciam
uma grande capacidade de remoção de lactato que se caracteriza como adaptação
altamente específica nos especialistas de meio-fundo e fundo. Como o efluxo de
lactato do músculo para o sangue é feito por transporte facilitado, a menor expressão
de lactatemia após esforço máximo nas nossas amostras pode estar relacionada com
elevada percentagem de fibras Tipo I (22,54), superior potencial enzimático oxidativo
(16, 54) e grande eficácia dos shuttles de lactato (8).
A análise do somatótipo não consegue discriminar os meio-fundistas dos fundistas.
Assume-se como lógica a similitude das nossas amostras quanto a este indicador. Os
valores baixos de endomorfismo e relativamente elevados de ectomorfismo estão de
acordo com outros estudos (30,50,55) e determinam um perfil adaptativo específico.
Carter e Heath (13) encontraram para meio-fundistas e fundistas olímpicos valores de
115
endomorfia e ectomorfia similares aos das nossas amostras. A atenuação da
componente mesomorfa é resultante natural da especialização que acarreta uma
redução da massa muscular acentuando a linearidade corporal.
Os dados da composição corporal confirmam as similitudes do somatótipo entre os
fundistas e meio-fundistas do presente estudo. Os valores mais elevados de massa
magra dos meio-fundistas assentam no facto de serem mais altos e pesados, e não em
diferenciações quanto aos valores de massa gorda. Os nossos dados são confirmados
por outros estudos (10,18,27,35,41), embora um estudo (1) tenha detetado superiores
percentagens de gordura corporal em fundistas (9.9% ± 2.1) quando comparados com
meio-fundistas (8.6% ± 3.1). Embora a nossa amostra demonstre uma certa
homogeneidade, a percentagem de gordura tem tendência a diminuir em função do
aumento da distância competitiva (6,25).
Existe uma relação direta entre o perfil fibrilar de um atleta e a sua capacidade de
desenvolver esforços explosivos (37). A correspondência entre o potencial contráctil e
o tipo de atividade desenvolvida está bem estabelecida e é verificável no presente
estudo. Os indicadores de força explosiva conseguem discriminar claramente as
subamostras de meio-fundo e fundo. Os valores mais baixos dos fundistas radicam nas
adaptações específicas decorrentes de grandes volumes de treino de corrida contínua.
Bosco (3) em maratonistas encontrou valores idênticos aos dos nossos fundistas.
Este estudo, embora com um reduzido número amostral corresponde a atletas de
elevado nível mundial o que se reflete nos seguintes indicadores: Ec, vVO2max, vLan.
Como conclusão podemos afirmar que os meio-fundistas e os fundistas são
diferenciados pelo VO2max (relativo), Lan e Força Explosiva dos Membros Inferiores.
As características corporais são idênticas bem como a forma como regulam a cinética
do lactato durante e após esforço.
No entanto, após exploração dos dados individuais, constatamos que incluir num
mesmo grupo de meio-fundo, especialistas de 800, 1.500 e 5.000 m foi incorreta, pois
os dados dos especialistas de 5.000m aproximam-nos dos fundistas e são claramente
diferentes dos que caracterizam os especialistas de 800 e 1.500m.
Acresce que a separação entre meio-fundistas e fundistas é por vezes artificial já que o
quadro competitivo, com muitas provas de estrada, atenua alguma da especificidade
determinada pelas provas de pista.

116
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119
10. Physiological and jumping performance alterations induced by a dramatic
increase of running volume. A case study
Abstract
Objective: This study aimed to verify how a severe increase in running volume induced
new alterations in several physiological and performance indicators, in previously well-
trained subjects in endurance running.
Methods: Three subjects (PL: 26 years, 169.5 cm; HP, 27 years, 167.9 cm; MC, 27
years, 180.7 cm) running daily between 10-12 km.day-1, increased running volume to
prepare the participation in a 100-km military ultramarathon with 10-12 training
sessions per week, totalizing 200-260 km (35.8 ± 6.2 km.day-1). The following
parameters were assessed: VO2max, Running Economy, Ventilatory Threshold (VT),
Squat Jump (SJ), Counter Movement Jump (CMJ), 15” Repeated Jump (15” RJ), and
Body mass.
Results: Absolute VO2max didn’t change (4.6 ± 0.17 to 4.6 ± 0.2 L.min-1). Relative
VO2max improved clearly (61.7 ± 2.5 to 66.7 ± 2.4 ml. kg -1. min-1). Oxygen
consumption at 16 km.h-1 showed a slight decrease (42.8 ± 3.3 to 41.5 ± 2.5 ml.kg -1 .
min-1) decreasing markedly when related to VO2max (69.4 ± 4.6 to 62.2 ± 3.1%).
Maximum heart rate experimented slight variations. Energetic cost at VT increased
differently among subjects (53.5 ± 4.6 to 56.5 ± 3.8 ml.kg -1.min-1); when related to
VO2max VT decrease in two subjects. The velocity attained at VT remained the same
(18 km.h-1). Body mass was sharply reduced (72.6 ± 6.4 kg to 69.2 ± 5.5 kg). Jump
performance decreased 7.7% for SJ (33.8 ± 2.8 to 31.3 ± 2.9 cm), 10.4% for CMJ (35.6 ±
2.4 to 31.9 ± 0.9 cm), and 17.7% for 15” RJ (25.6 ± 1.4 for 21.1 ± 2.5 W.kg-1).
Conclusion: This study demonstrated that well endurance trained subjects show
further physiological and motor alterations when training volume is dramatically
increased, which represent the specific adaptation to the new training level.

Key words: endurance training, VO2max, running economy, ventilatory threshold, SJ,
CMJ

120
Resumen
Objetivo: Estudio de las alteraciones fisiológicas y de rendimiento en sujetos
aeróbicamente entrenados después de un dramático aumento en el volumen de
carrera.
Métodos: Tres soldados (PL: 26 años, 169.5 cm; HP, 27 años, 167.9 cm; MC, 27 años,
180.7 cm) que entrenan diariamente entre 10-12 km.día-1, aumentaran el volumen de
carrera para preparar la participación en un ultramarathon militar (100 km) con 10 - 12
sesiones de entrenamiento por semana, totalizando 200 - 260 km (35.8 ± 6.2 km.día-1).
Fueran avaluados los siguientes parámetros: VO2max, economía de carrera, umbral
ventilatorio (VT), peso corporal, salto sin contra-movimiento (SJ), salto en contra-
movimiento (CMJ) y teste de 15” de saltos repetidos (15”RJ).
Resultados: VO2max absoluto no cambió (4.6 ± 0.17 a 4.6 ± 0.2 L.min -1). VO2max
relativo mejoró (61.7 ± 2.5 a 66.7 ± 2.4 ml.kg-1 . min-1) así como la economía de carrera
relacionada al VO2max (69.4 ± 4.6 a 62.2 ± 3.1%). La frecuencia cardíaca máxima
experimentó pequeñas variaciones. El coste energético en el VT aumentó de forma
diferente entre los sujetos (53.5 ± 4.6 a 56.5 ± 3.8 ml.kg-1.min-1); cuando se relativizó
con el VO2max, el VT disminuyó en dos sujetos. La velocidad conseguida al umbral
ventilatorio no cambió (18 km.h-1). El peso corporal se redujo acentuadamente (72.6 ±
6.4 kg a 69.2 ± 5.5 kg). El rendimiento de salto disminuyó 7.7% en el SJ (33.8 ± 2.8 a
31.3 ± 2.9 cm), 10.4% en el CMJ (35.6 ± 2.4 a 31.9 ± 0.9 cm), y 17.7% en el 15” RJ (25.6
± 1.4 a 21.1 ± 2.5 W.kg-1).
Conclusión: Sujetos entrenados aeróbicamente experimentan nuevas alteraciones
fisiológicas y motoras cuando el volumen de carrera es aumentado dramáticamente;
estos cambios representan una adaptación específica para el nuevo nivel de
entrenamiento.

Palabras clave: entrenamiento aeróbico, VO2max, economía de carrera, umbral


ventilatorio, SJ, CMJ

121
Introduction
Long-distance running is a powerful stressor with multiple implications. Volume,
intensity and frequency are the main parameters to be considered for training
adaptations (Rodrigues dos Santos, 2005).
While for middle- and long-distance runners training intensity assumes paramount
importance corresponding to 20% of the training sessions (Seiler, 2010), for
ultramarathon runners the main focus for training is the adaptation to sustain large
volumes of running and not training intensity. Lower energy cost of running plus
running regularity (i.e. the adequate rate for each individual to accomplish ultra-long-
distance events) is the main characteristics to be developed by ultramarathon runners.
Hoffman (2010), have stated that the average times of the fastest runners over a 161-
km ultramarathon didn’t change over the past two decades for any age group or either
sex. While maximum oxygen consumption (VO2max) improvement usually demands
high-intensity stimuli (Esfarjani and Laursen, 2007) it seems that high-volume low-
intensity training improve better sub-maximal physiological indicators (e.g. running
economy) (Seiler, 2010). This is corroborated by Billat et al. (2002) who showed in well
trained athletes that short periods of high intensity endurance workouts can improve
VO2max without changing running economy. VO2max improvement is difficult to
achieve in very well endurance trained subjects.
While, in elite endurance runners, performance improvement can be achieved after
hard training without changes in VO2max (Legaz-Arrese et al., 2005), in less skilled or
less trained runners higher running performance is usually accompanied by VO2max
improvement. Enoksen et al. (2011) verified in well-trained middle distance runners
that VO2max didn’t change after both high-volume low intensity and low-volume high
intensity interventions; however low-volume high-intensity workouts were more
effective for performance improvement (VO2max velocity and lactic threshold
velocity).
It seems that in well trained subjects, ventilatory threshold is few sensitive to
endurance training (Hoogeveen, 2000) and is not affected by age (Lenti et al., 2011),
however mechanical fatigue can impair the ventilatory response to exercise (Millet,
2009). Strength deterioration induced by continuous training can negatively affect the

122
ventilatory threshold (Koutedakis et al., 1992). So, alterations in jumping capability can
function as an index for strength deterioration induced by long-lasting running.
High running intensities are necessary to improve running performance in events until
10 km (Iaia & Bangsbo, 2010); however performance improvement in ultra-endurance
events can be achieved by low-intensity long-lasting workouts which have a positive
effect on running economy (Scrimgeour et al., 1986). It seems that mean weekly
running hours is one of the best predictors for 100-km running race time (Knechtle et
al., 2010).
Small increments in training volume are not able to induce measurable changes in both
performance and physiological indicators (Gjovaag and Dahl, 2008) then, stabilizing
training intensity, it is supposed that only huge increments of training volume are able
to induce significant changes in several physiological and performance indicators. This
type of studies is scarce in the literature.
While VO2max, anaerobic threshold, economy of motion, and fractional utilization of
oxygen uptake correlate highly with endurance performance (Laursen and Rhodes,
2001) for ultra-endurance events these indicators can be not the more reliable.
So, this study sought to verify the physiological and performance changes after 17
weeks of severe increase in training volume, in active subjects preparing for
participation in a 100-km running race.

Methods
Participants
With institutional ethics approval (Scientific Council of the Faculty of Sport – University
of Porto) three soldiers from the Portuguese Army Elite Corps (Special Forces),
provided written informed consent and voluntarily participated. Participant’s age and
height were as follows: P.L. (26 years; 169.5 cm); H.P. (27 years; 167.9 cm), and M.C.
(27 years; 180.7 cm). These subjects were not typical athletes but very active elite
soldiers with running as a fundamental part of their physical military preparation and
with more than 5 years of running training. They participated regularly in orienting
military races with sporadic participations in road running civil races. They had
periodically medical screenings showing no health constraints. During the last year
prior to the study they usually run 10-12 km, daily.

123
The participants can be considered as non-elite performers (average rate 4 min/km at
half-marathon) very far from middle- and long-distance elite runners’ performance
(average rate ≤ 3 min/km at half-marathon).

Training protocol
With the objective to compete in a military ultramarathon (100-km) subjects realized
10-12 training sessions per week, totalizing 200 - 260 km. Average daily running
volume was 35.8 ± 6.2 km. Effort’s intensity was controlled by thoracic frequency
counter. Low to moderate running pace was selected (130 - 160 beats per minute
corresponding to 70 - 85% maximum heart rate) for continuous uniform running with 2
fartlek sessions per week (10 accelerations of 300m) inducing heart rates close to the
maximum. They practiced twice a day on Tuesday, Wednesday, Thursday, Friday and
Saturday; only one workout on Sunday (the longest one); also one workout on Monday
(the shortest one). Every four weeks was conducted a performance test (30 km) which
improved over the time (week 4 – 2h00; week 8 – 1h57; week 12 – 1h55). Performance
test was preceded by a resting day. In the last week before testing volume training was
half reduced maintaining the usual intensity.
Noted that with the exception of fartlek training sessions, the continuous uniform
running sessions were conducted at intensities below to those the subjects were
previously accustomed. The fundamental training goal was the completion of an
ultramarathon (100-km) with the adequate pace to avoid over exertion and getting the
best performance possible.

Nutrition
Throughout the duration of the study, participants were requested to maintain their
usual dietary diversity, increasing ad libitum energy and carbohydrate intake.

Parameters evaluated
The following parameters were evaluated at the beginning and the end of the study
after a compulsory 48 h rest.
Physiological: A treadmill test with a 2% slope was conducted, with continuous running
protocol, 8 km.h-1 initial speed with 2 km.h-1 increments every two minutes, until

124
exhaustion. Respiratory parameters were measured with an EOS-Sprint System (Erich
Jaeger GmbH & Co, model XT/AT JK) and analyzed by a computer model JVC GD-H
3214VCW.
The following parameters were selected:
VO2max (L . min-1); relative VO2max (ml.kg-1.min-1); Ventilatory Threshold (VT)
obtained by ventilatory equivalent (Davis, 1985); Running economy expressed by
oxygen consumption at 16 km.h-1 (VO2-16) and as percentage of VO2max at that speed
(VO2-16.%VO2max); velocity attained at VO2max (vVO2max). Heart rate was measured
with a heart-rate monitor (Servomed, SMS 182, Hellige). Body mass (SECA Robusta 813
High Capacity Digital Floor Scale) and height (CHARDER HM 200 P Portstad Portable
Stadiometer) were also measured.
Motor Testing: Lower limb explosive power was assessed with the Ergojump Digitime
1000 developed by Bosco et al. (1983). Each subject was assessed for Squat Jump (SJ),
Counter Movement Jump (CMJ) and 15” Repeated Jump (15” RJ) following the
procedures established by Bosco et al. (1983).

Results
Body mass and jumping performance data are shown in Table10.1. Mean body mass
reduction (72.5 ± 6.6 kg for 69.1 ± 5.5 kg) is related to the explosive power
deterioration expressed by 7.7% decrease in SJ (33.8 ± 2.8 to 31.3 ± 2.9 cm), 10.4% in
CMJ (35.6 ± 2.4 to 31.9 ± 0.9 cm), and 17.7% in 15” RJ (25.6 ± 1.4 for 21.1 ± 2.5 W . kg-
1
).

Table 10.1. Body mass and jumping performance changes induced by training
Variables P.L. H.P. M.C.
Start End Start End Start End
Body mass (kg) 68.5 66.5 69.3 65.5 80.0 75.5
Squat Jump (cm) 36.6 34.6 31.0 30.1 33.9 29.1
Counter Movement Jump (cm) 37.9 32.7 33.2 31.2 35.8 31.9
-1
15” Repeated Jump (W . kg ) 27.2 18.2 25.3 22.2 24.4 22.9

Physiological and performance variables are shown in Table 10.2. While absolute
VO2max and vVO2max remained quite stable, relative VO2max suffered marked

125
improvements. Maximum heart rate was characterized by slight variability. The energy
cost of running (VO2-16) decreased slightly, however when related to VO2max the
decrease was accentuated. Oxygen consumption at ventilatory threshold had different
individual behaviours while the velocity at VT remained unchanged.

Table 10.2. Physiological changes induced by training


Variables P.L. H.P. M.C.
Start End Start End Start End
VO2max (L . min-1) 4.5 4.6 4.5 4.4 4.8 4.8
VO2max (ml . kg-1. min-1) 64.4 69.0 61.1 66.8 59.5 64.2
vVO2max (km . h-1) 22 22 20 20 22 22
Maximum Heart Rate (bpm) 187 189 182 184 191 190
VO2-16 (ml . kg-1. min-1) 43.6 41.5 45.6 44.0 39.2 39.0
VO2-16 (%VO2max) 67.7 60.1 74.6 65.8 65.8 60.7
VO2-VT (ml . kg-1. min-1) 58.8 58.9 51.6 58.4 50.2 52.1
VO2-VT (%VO2max) 91.3 85.4 84.5 87.4 84.4 81.2
vVO2-VT (km . h-1) 18 18 18 18 18 18
RERmax 1.17 1.18 1.20 1.19 1.24 1.23

126
Discussion
The main result of this study is the marked reduction of body mass and the explosive
power deterioration provoked by the long-lasting running workouts. Explosive power
deterioration is probably related to the reduction in maximal strength eventually
related to the loss of muscle mass. These chronic adaptations are in accordance with
the acute power reduction verified after a 10-km running race (Gómez et al., 2002).
Lower-limbs explosive power decrease verified in our study albeit the negative effect
on jumping performance wasn’t reflected in running performance perhaps due to the
increased mechanical efficiency provoked by alterations in gait pattern (Eriksson et al.,
2011) or higher metabolic efficiency (Millet et al., 2011) induced by long-lasting
workouts.
Endurance training imposes an overall stress with reflection in the cardiac phenotype
plasticity probably involving, besides genetic determinants, factors like length,
duration, type, intensity and age of initiation of the training stimulus (Levine, 2008).
Endurance training promotes rapid cardiovascular changes (cardiac output and systolic
volume) that are measurable after 10 days of training (Mier et al., 1997); however in
well-trained subjects further physiological increments seem to be difficult to achieve.
Our results (Table 2) show that VO2max (L . min-1), vVO2max (velocity at VO2max) and
Maximum Heart Rate [HRmax]) were insensitive to training and suffered minor
changes without physiological significance. These results are in accordance with Legaz-
Arrese et al. (2005) who stated that hard training in young subjects improves
performance without changes in VO2max.
Relative VO2max (ml . kg-1. min-1) experimented substantial increases (PL 7.1%; HP
9.3% and MC 7.8%) which were directly related to the marked reduction in body
weight. Absolute VO2max (L . min-1) improvement in well trained individuals demands
training stimuli higher than 95% do VO2max (Midgley and McNaughton, 2006). The
two fartlek sessions per week with intensities close to VO2max included in the
microcycle seem not be sufficient to induce significant improvements in absolute
VO2max or maximum aerobic power expressed as the velocity attained at VO2max
(vVO2max). Partially conflicting with these data, Saunders et al. (2010) in well-trained
distance runners found 1.4% increase in VO2max (L . min -1) after 17 weeks of
endurance training. The differences can be related to the reduced number of high

127
intensity training stimuli realized in our study. To improve absolute VO2max and
vVO2max high-intensity low volume loads are preferable to low-intensity high volume
loads (Enoksen et al., 2011). As the training protocol in this study putted the emphasis
in low-intensity workouts the lack of improvements are justified.
The slight changes in HRmax have no physiological significance. In well trained subjects
endurance training doesn’t change HR at different exercise intensities (Hoogeveen,
2000).
Running economy depends on metabolic and biomechanical adaptations. In this study,
the metabolic cost of running at 16 km. h-1 decreased slightly but when related to
VO2max improved markedly (-10.3%) what can be linked to physiological adaptations
and/or greater mechanical efficiency of running (Fletcher at al., 2010). It seems that
heavy strength training improves running economy (Guglielmo et al., 2009), however
Dumke et al. (2010) stated that increasing volume training decreases muscle power
and increases tendon stiffness improving running economy. This last sentence is in
accordance with our data which demonstrated running economy improvement with a
significant reduction of muscle power. Besides higher mitochondrial oxidative capacity,
performance in ultra-endurance events is mainly related to running economy (Millet et
al., 2011) what corroborates the most significant physiological adaptation verified in
this study. It seems that running economy improves independently from running
intensity when running volume is significant (Enoksen et al., 2011), what was the main
characteristic of the training protocol in this study. Long-distance running training
promotes alterations of the movement pattern in order to reduce the mechanical cost
of running (Millet et al., 2000; Eriksson et al., 2011) delaying fatigue. It seems that,
until a certain level, improvement in running economy is related with running volume
more than intensity (Billat et al., 2002).
Oxygen consumption at ventilatory threshold (VT) increased differently among
subjects corroborating data from Hoogeveen (2000). When related to VO2max, VT
increased in one subject and decreased in the other two what can be attributed to the
individual changes in VO2max or to different individual sensibility to alterations in
anaerobic contribution to exercise (Hoogeveen, 2000). These alterations can also be
attributed to the emphasis putted on the low intensity of running. Contrary to
untrained subjects, in trained athletes VT doesn’t differ much following endurance

128
training (Hoogeven, 2000). Adding, in endurance runners significant differences in
training volume are expressed by similar ventilatory thresholds (Kilding et al., 2006).
Both studies are completely uncorroborated by our data. Combining strength and
endurance training VT was improved (García-Pallarés et al., 2009); strength
deterioration verified in this study can be the reason for the absence of VT
improvement in two subjects. Ultra-endurance training seems to deteriorate anaerobic
ventilatory threshold when pace running training is lower than usually.

129
Conclusion
This study concluded that subjects with a good level of endurance training adapt to a
dramatic increase in running volume improving their relative VO2max and running
economy which are directly related to the marked decrease in body mass with a
corresponding deterioration of lower limb explosive power. These adaptations were
reflected in slight but continuous improvements on running performance. Training
experienced by the subjects spurred their adaptive capacity conducting them to a new
level of conditioning with improvement of some capabilities and impairment of others.
The laboratory protocol chosen seem to be not the more accurate to elucidate about
small physiological changes eventually attained in this study.
Subjects enlisted in long-lasting workouts must introduce complementary strength
training to attenuate muscle mass reduction and the deterioration of strength levels.

We thank to the General Commandant of the Northern Region of the Portuguese Army
(Porto) and to the Commandant of the Special Forces - C.I.O.E. (Lamego)

130
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132
11. Alterações da glicemia induzidas por uma corrida de endurance em jejum
Resumo
Introdução: O jejum aconteceu de forma natural na filogénese do homem e foi o
processo responsável pelo desenvolvimento dos genes da obesidade que permitiram o
armazenamento de energia para os períodos de redução ou ausência de alimentos. A
massa gorda que é hoje considerada o inimigo público número 1 (o número dos
obesos e com excesso de peso já ultrapassa o número daqueles que vivem em
condições de severa restrição alimentar), pode ser combatida pelo exercício físico
prolongado que induz gastos energéticos suplementares que podem contribuir para a
redução dos excessos ponderais. Foi concluído que o exercício em jejum promove uma
superior mobilização das gorduras, com concentrações mais elevadas de ácidos gordos
livres, glicerol e β-hidroxibutirato (Dohm et al., 1986). No entanto, o exercício pode
acentuar a hipoglicemia derivada de uma noite em jejum, induzindo eventuais
situações de falácia orgânica ou acentuada sensação de fadiga.
Objetivo: Verificar o comportamento da glicemia antes e após 1 hora de corrida em
jejum.
Material e Métodos: Foi analisado o sangue periférico venoso de 23 sujeitos
praticantes de corrida, com diversos níveis de treino e com idades variando entre os 23
e 57 anos. A intensidade de corrida foi escolhida por cada sujeito em função das suas
possibilidades, tendo-lhes sido solicitado que corressem a uma intensidade
subjetivamente considerada como moderada. Foi solicitado aos sujeitos que tivessem
um tempo de jejum de pelo menos 12 horas o que, segundo as declarações pessoais,
foi respeitado. Os sujeitos percorreram uma distância média de 12.064 ± 2.104 metros,
com a amplitude variando entre 8.600 – 15.330 metros. Foi feita a estatística descritiva
e as diferenças entre os dois momentos pelo teste t de medidas emparelhadas.
Resultados: Os valores médios da glicemia antes e depois de 1 hora de corrida em
jejum, foram de 68,97±9,3 mg/dl e 74,33±31,8 mg/dl, respetivamente. As diferenças
verificadas não foram significativas (p=0,180). No entanto as respostas individuais
foram muito diversas: 4 sujeitos passaram de normoglicemia para hipoglicemia; 5
sujeitos estavam normoglicémicos e assim continuaram; 3 sujeitos estavam
normoglicémicos e aumentaram significativamente a glicemia; 6 sujeitos estavam
hipoglicémicos e passaram a normoglicémicos; 2 sujeitos estavam hipoglicémicos e

133
subiram a taxa sanguínea de glucose continuando, no entanto, hipoglicémicos; 3
sujeitos estavam hipoglicémicos e acentuaram a hipoglicemia.
Conclusão: A partir das verificações deste estudo concluímos que as alterações
induzidas pelo exercício em jejum na taxa de glucose plasmática apresentam uma
grande variabilidade e que as situações de hipoglicemia verificadas não correspondem
a situações de falência física ou psicológica durante o exercício.

Palavras-Chave: Jejum, Exercício, Glicemia, Corrida de Endurance

134
Introdução
O jejum aconteceu de forma natural na filogénese humana e foi o processo
responsável pelo desenvolvimento dos genes da obesidade que permitiram o
armazenamento de energia para os períodos de redução ou ausência de alimentos.
Se para os nossos antecessores o armazenamento corporal de energia constituiu um
mecanismo fundamental para a sobrevivência da espécie, nos dias de hoje, a
sedentarização da vida humana, aliada ao fácil acesso a alimentos de elevado
conteúdo calórico, conduz à sobrealimentação e ao cortejo de morbilidades que lhe
está associada, entre as quais se salientam o excesso de peso e a obesidade, grandes
responsáveis pela emergência de doenças como a hipertensão, diabetes mellitus tipo
2, osteoartrite e as letais doenças do foro cardiovascular.
A massa gorda que é hoje considerada o inimigo público número 1 (o número dos
obesos e com excesso de peso já ultrapassa o número daqueles que vivem em
condições de severa restrição alimentar), pode ser combatida, entre outras formas,
pelo exercício físico prolongado que induz gastos energéticos suplementares que
podem contribuir para a redução dos excessos ponderais.
Na procura da melhor forma de exercitação, vários autores estudaram a resposta do
organismo a várias situações nutricionais. Foi concluído que o exercício em jejum
promove uma superior mobilização das gorduras, com concentrações mais elevadas de
ácidos gordos livres, glicerol e β-hidroxibutirato (Dohm et al., 1986). Após jejum
noturno verificou-se um aumento da taxa de turnover de corpos cetónicos durante
exercício prolongado (Fery & Balasse, 1983) o que indicia o aumento da β-oxidação
mitocondrial e lipólise induzida pelo exercício.
No entanto, o exercício pode acentuar a hipoglicemia derivada de uma noite em jejum,
induzindo eventuais situações de falácia orgânica ou acentuada sensação de fadiga.
Por isso, resolvemos levar a efeito um estudo, no sentido de verificar o
comportamento da glicemia após exercício prolongado e o seu efeito sobre o estado
de compatibilidade psicológica com o exercício.

135
Objetivo
Verificar as alterações da glicemia induzidas por 1 hora de corrida de intensidade
fraca/moderada em jejum, em sujeitos com diferentes níveis de treino, tentando
despistar eventuais estados de falência orgânica e/ou incompatibilidade psicológica
com tal tipo de esforço.

Material e Métodos
Foi analisado o sangue periférico venoso de 23 sujeitos praticantes de corrida, com
diversos níveis de treino e com idades variando entre os 23 e 57 anos.
O estudo respeitou os Princípios da Declaração de Helsínquia e foi aprovado pelo
Comité de Ética do Conselho Científico da Faculdade de Desporto da Universidade do
Porto. Todos os sujeitos deram consentimento assinado depois de esclarecidos sobre
todos os procedimentos do protocolo.
A intensidade de corrida foi escolhida por cada sujeito em função das suas
possibilidades, tendo-lhes sido solicitado que corressem a uma intensidade
subjetivamente considerada como moderada. Foi solicitado aos sujeitos que tivessem
um tempo de jejum de pelo menos 12 horas o que, segundo as declarações pessoais,
foi respeitado.
Os sujeitos percorreram uma distância média de 12.064 ± 2.104 metros, com a
amplitude variando entre 8.600 – 15.330 metros.

Resultados e Discussão
O exercício em jejum representa um desafio metabólico para o músculo-esquelético, já
que vai desviar dos carbohidratos para as gorduras e proteínas uma parte fundamental
do suporte energético. Sabendo-se que os carbohidratos são essenciais para o suporte
energético a algumas funções orgânicas cruciais, a significativa redução do glicogénio
hepático e glucose sanguínea após jejum, determina a importância das adaptações que
se têm de verificar durante o exercício.
Quando o organismo não tem um aporte normal de carbohidratos vê-se obrigado a ir
buscá-los às reservas endógenas através da gliconeogénese e a melhorar a eficácia
metabólica dos outros substratos com função energética.

136
Na tabela 11.1 podemos verificar que 1 hora de corrida em jejum não alterou de forma
estatisticamente significativa (p=0,180) a taxa plasmática de glucose o que está de
acordo com o estudo de Nieman et al. (1987). No entanto, parece que a resposta
normal ao exercício é o aumento da glucose plasmática quer em situação de jejum
quer em situação pós-prandial (Dohm et al., 1986), o que poderá estar relacionado
com o esforço homeostático do organismo que faz maior apelo à gliconeogénese para
manter taxas adequadas de glucose plasmática para suporte aos processos
metabólicos dos órgãos glicose-dependentes.

Tabela 11.1. Média, desvio-padrão e valores mínimo e máximo do total da amostra antes e depois de 1
hora de corrida em jejum.
Antes Depois
Glicemia (mg/dl) 68.97 ± 9.3 74.33 ± 31.8 *
(44.61-94.45) (33.85-104.62)
* Não significativo (p=0.180)

No entanto, a partir da análise detalhada da tabela 11.2 podemos verificar as respostas


individuais quer ao jejum quer ao exercício, determinando um quadro de diversidade
que tem a ver com a alteração da transcrição genética relacionada com o metabolismo
lipídico (Pilegaard et al., 2003) e que sugere que as diferenças individuais do perfil
genético podem desempenhar um papel fundamental na resposta adaptativa aos
desafios metabólicos.

137
Tabela 11.2. Valores individuais da glicemia antes e após 1 hora de corrida em jejum.
Sujeito Antes Depois
1 84.76 57.99
2 84.76 84.76
3 62.45 66.91
4 71.38 62.45
5 53.53 40.15
6 57.99 40.15
7 66.91 93.68
8 44.61 57.99
9 76.92 76.92
10 67.69 92.31
11 80.00 83.08
12 70.77 104.62
13 67.69 80.00
14 52.31 33.85
15 49.23 70.77
16 68.69 103.04
17 94.45 85.87
18 74.42 77.28
19 77.28 103.04
20 71.56 54.38
21 65.83 74.42
22 71.56 62.97
23 71.56 103.04

Assim, a partir dos valores de referência laboratorial de normalidade glicémica pós-


prandial (70-110 mg/dl), verificamos a extrema variabilidade das respostas quer ao
jejum noturno quer ao exercício, tendo-se verificado que:
- 4 Sujeitos passaram de normoglicemia para hipoglicemia.
- 5 Sujeitos estavam normoglicémicos e assim continuaram.
- 3 Sujeitos estavam normoglicémicos e aumentaram significativamente a glicemia.

138
- 6 Sujeitos estavam hipoglicémicos e passaram a normoglicémicos.
- 2 Sujeitos estavam hipoglicémicos e subiram a taxa sanguínea de glucose
continuando, no entanto, hipoglicémicos.
- 3 Sujeitos estavam hipoglicémicos e acentuaram a hipoglicemia.
Importa referir que os sinais subjetivos de adaptação à prova nos permitiram concluir
que todos os sujeitos terminaram a prova num estado de cansaço normal, sem sinais
de falência orgânica e com boa disposição psíquica e isto malgrado a verificação de
várias situações de hipoglicemia.
É de aceitar como normal o facto de que o tempo de endurance a intensidades
elevadas seja reduzido numa situação de jejum. Pequignot et al. (1980) comprovaram
que o tempo de endurance a pedalar no ciclo-ergómetro a 80% do VO2max após 15
horas de jejum experimentava uma redução significativa (p=0,025) quando se
comparava com uma situação de alimentação normal. Também Dohm et al. (1986)
verificaram que o tempo de endurance até à exaustão, num exercício a 70% do
VO2max, se reduzia após 23 horas de jejum.
Pelo estudo de Dohm et al. (1986) comprovamos a importância dos primeiros 30
minutos de exercício em jejum na superior mobilização e utilização das gorduras, já
que neste período verificaram-se concentrações plasmáticas mais elevadas de ácidos
gordos livres, glicerol e β-hidroxibutirato que na situação pós-prandial, diferenças que
se deixavam de verificar com a continuidade do exercício. No entanto temos de levar
em conta a elevada intensidade (70-75% do VO2max) do exercício que, em jejum,
induziu uma subida, significativamente maior, de lactato sanguíneo quando
comparada com a situação pós-prandial, o que colide com os resultados de Zoladz et
al. (2005), que comprovaram que o exercício em jejum promovia uma redução quer do
lactato sanguíneo quer do quociente respiratório. Parece-nos que a elevação do
lactato no estudo de Dohm et al. (1986) está relacionado com a elevação das
catecolaminas plasmáticas induzida pelo exercício em jejum e que ou intensificaram a
mobilização dos mecanismos gliconeogénicos disponibilizando glucose para oxidação
intramuscular ou acentuaram, paralelamente à oxidação dos ácidos gordos livres, a
mobilização do glicogénio muscular.
Para que o exercício em jejum seja fundamentalmente suportado pela energia
derivada da oxidação mitocondrial das gorduras tem de ser de baixa intensidade, já

139
que Bergman & Brooks (1999) comprovaram que, enquanto o exercício prolongado de
baixa intensidade (<50% VO2max) em jejum se caracteriza por uma superior oxidação
lipídica, se o exercício for de intensidade superior essa incidência aumentada no
metabolismo lipídico já não se verifica. Esta constatação comporta algumas ilações
relacionadas com a melhor forma de perder o peso supérfluo armazenado nos
adipócitos sob a forma de gordura.
Embora não se possam fazer extrapolações diretas entre os animais de laboratório e o
homem algumas ilações se podem retirar com o estudo em animais. Assim, Dohm et
al. (1983) comprovaram que um jejum de 24 horas depleciona o glicogénio hepático,
baixa a concentração de glucose plasmática, diminui os níveis do glicogénio muscular e
aumenta as concentrações plasmáticas de ácidos gordos livres e β-hidroxibutirato. Os
ratos em jejum evidenciaram, durante o exercício, uma baixa na concentração de
glucose plasmática, elevação na concentração de ácidos gordos livres e β-
hidroxibutirato e redução na taxa de depleção do glicogénio muscular quando
comparados com ratos alimentados ad libitum. Como os ratos que se exercitaram em
jejum foram capazes de continuar a correr mesmo quando a glucose plasmática
desceu abaixo dos níveis em que os ratos alimentados atingiram a exaustão, deduziu-
se que não foi a baixa da glucose plasmática a causadora da exaustão. Pensamos que a
superior capacidade de trabalho dos ratos em jejum se prendeu com a também
superior capacidade de utilizar o metabolismo lipídico que julgamos está potenciado
em relação ao homem.
Pensamos que para o exercício em jejum aumentar a utilização dos ácidos gordos
livres e poupar as reservas de glicogénio não pode ser de elevada intensidade, já que
aumentando esta acima de determinados valores o ambiente hormonal desencadeado
não é de molde a favorecer a lipólise. O aumento do tempo de endurance que se
verificou em ratos em jejum no estudo de Dohm et al. (1983) não é provável que se
verifique em humanos, já que a situação de jejum normalmente provoca, em
humanos, a redução do tempo de endurance (Dohm et al., 1986).
Os sujeitos do nosso estudo, embora terminassem os 60 minutos de corrida sem sinais
de exaustão, evidenciavam glicemias muito diversas o que indica que não é a taxa de
glucose sanguínea que determina a capacidade de suportar em jejum um dado esforço
prolongado. A responsividade individual, julgamos estar dependente das

140
características genéticas individuais mas também do nível de treino dos sujeitos que
não controlamos. Pensamos que quanto mais treinado estiver um sujeito maior a sua
capacidade de extrair energia do metabolismo das gorduras, desenvolver os
mecanismos conotados com a gliconeogénese e manter glicemias estáveis em jejum,
pelo que se abre caminho a estudos que comparem as adaptações metabólicas ao
exercício em jejum em função do nível de treino dos sujeitos.
A partir das verificações deste estudo podemos concluir que, as alterações induzidas
por 1 hora de corrida em jejum na concentração da glucose plasmática, apresentam
uma grande variabilidade individual que não foi impeditiva que todos os sujeitos
terminassem o esforço sem sinais visíveis de falência física ou psicológica.

141
Bibliografia

BERGMAN, Bryan C. & BROOKS George A. (1999), Respiratory gas-exchange ratios during graded
exercise in fed and fasted trained and untrained men. Journal of Applied Physiology, Vol. 86, nº 2, p.
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ZOLADZ, J.A.; KONTUREK, S.J.; DUDA, K.; MAJERCZAK, J.; SLIWOWSKI, Z.; GRANDYS, M. et al. (2005),
Effect of moderate incremental exercise, performed in fed and fasted state on cardio-respiratory
variables and leptin and ghrelin concentrations in young healthy men. Journal of Physiology and
Pharmacology, Vol. 56, nº 1, p. 63-85.

142
12. Alterações agudas induzidas por uma corrida de 50 Km em alguns parâmetros
hematológicos, bioquímicos e urinários em sujeitos com diferentes níveis de treino.
Resumo
O presente estudo pretendeu verificar as alterações de vários indicadores urinários e
hematológicos (hemograma), bem como de vários marcadores bioquímicos em 7
militares do corpo especial do exército português (Rangers) após uma corrida de 50
km. A análise dos dados obtidos permitiu-nos verificar que independentemente do
nível de treino, um esforço desta magnitude produziu alterações nítidas em muitos dos
parâmetros estudados. Em termos urinários verificou-se o aparecimento de
proteinúria, cetonúria e bilirrubinúria em todos os sujeitos; nos sujeitos menos
treinados verificou-se ainda o aparecimento de hemoglobina e urobilinogénio. No
estudo do hemograma verificou-se um aumento significativo (p<0.05) da hemoglobina,
potenciado pelo aumento da contagem eritrocitária e do hematócrito. A fórmula
leucocitária foi alterada, fundamentalmente à custa dum aumento significativo de
neutrófilos (p<0.05) e um ligeiro decréscimo da contagem de linfócitos. Em relação aos
marcadores bioquímicos, com exceção da glucose, todos os outros parâmetros (ureia,
creatinina, colesterol, triglicerídeos, transaminase glutâmico-oxalacética (GOT),
transaminase glutâmico-pirúvica (GPT), creatina-quinase (CK), aldolase, cortisol)
sofreram aumentos significativos (p<0.05). Quando comparamos os dados em função
do nível de treino, verificamos nos sujeitos menos treinados aumentos mais nítidos do
número de leucócitos, fundamentalmente à custa do aumento do número de
neutrófilos, dramáticos aumentos na taxa de concentração de CK e GOT e ligeira
diminuição da taxa plasmática de aldolase que reflete a mobilização mais tardia desta
enzima nos sujeitos menos treinados, cujo pico máximo de concentração foi atingido
48 horas após o exercício enquanto os sujeitos mais treinados atingiram o pico máximo
24 horas após a corrida. Alguns eletrólitos séricos (ferro, cálcio, fósforo) aumentam de
forma significativa (p<0.05) enquanto outros (sódio, potássio, cloro) aumentam de
forma ligeira. Embora a diminuição da concentração plasmática destes iões possa
derivar da redução do volume plasmático induzido pela sudação e défice hídrico, o
exercício por si pode alterar a homeostasia eletrolítica. O magnésio demonstrou um
ligeiro decréscimo indicando superior captação pelo músculo em atividade. Este ião
joga um papel importante no processo de contração muscular. Podemos concluir que

143
malgrado as alterações induzidas por um exercício deste grau de severidade afetar
todos os sujeitos, o comportamento de alguns indicadores permite discriminar os
sujeitos em função do seu nível de treino.

Palavras chave: exercício prolongado, ultramaratona, nível de treino, análise da urina,


hemoglobina, eritrócitos, leucócitos, linfócitos, CK, GOT, GPT, aldolase, ureia,
creatinina, cortisol, glucose

144
Introdução
As alterações sistémicas induzidas pelos esforços prolongados estão condicionadas
por uma série de factores - volume e intensidade do esforço, nível de treino, sexo,
idade e estatuto nutricional - exteriormente condicionados pelas condições
climatéricas.
Vários indicadores têm sido estudados após corrida prolongada. Assim, em relação à
eficiência circulatória, verificou-se a diminuição do volume plasmático induzida por
desidratação (Reinhart et al.,1983; Maughan et al.,1985); em relação ao hemograma a
resposta normal é o aumento do hematócrito (Van Rensburg et al.,1986; Aroca e
Barbero,1991), e ligeiros mas significativos aumentos de hemoglobina e da massa
eritrocitária (Maughan et al.,1985), embora esforços muito prolongados possam
induzir a perda de eritrócitos (Reinhart et al.,1983); no entanto, os resultados são
conflituais já que um estudo (Gonin,1985) não evidenciou alterações significativas quer
no hematócrito, massa globular vermelha e hemoglobina, após ultramaratona. A
corrida prolongada provoca modificações da função renal expressas na redução quer
do fluxo plasmático renal quer da taxa de filtração glomerular (Poortmans,1991) o que
é refletido pelos aumentos das concentrações plasmáticas de creatinina (Gonin,1985;
Van Rensburg,1986) e ureia (Gonin,1985). Uma resposta habitual ao esforço
prolongado é o aumento das enzimas séricas (Niemela et al.,1984; Van Rensburg et
al.,1986; Apple e Rhodes,1988; Farber et al.,1991) que indicia, em função do grau, a
extensão da lesão tecidular quer muscular quer hepática. Quanto à solicitação dos
substratos energéticos, que está condicionada pelo estado nutricional (Gonin,1985),
um estudo verificou a diminuição dos triglicerídeos plasmáticos (Farber et al.,1991) e
outro o aumento da glucose sanguínea (Van Rensburg et al.,1986). Em relação ao
capital eletrolítico após esforço prolongado verificaram-se aumentos da concentração
plasmática de sódio (Reinhart et al.,1983; Van Rensburg et al.,1986), magnésio e cálcio
(Gonin,1985; Van Rensburg et al.,1986) e diminuições de potássio (Van Rensburg et
al.,1986) e ferro (Gonin,1985; Van Rensburg et al.,1986; Aroca e Barbero,1991). Em
relação à função imune, o exercício físico prolongado induz o aumento da contagem
dos leucócitos (Aroca e Barbero,1991) fundamentalmente à custa de um nítido
aumento dos neutrófilos (Gonin,1985; Benoni et al.,1995) já que os linfócitos tendem a
diminuir após esforços muito prolongados (Gonin). Em termos urinários as alterações

145
mais marcantes dizem respeito ao normal aumento de albumina e acetona pós-esforço
(Gonin,1985; Eichner,1988). Uma quantidade muito significativa de atletas
empenhados em esforços de longa duração desenvolve hematúria (Gonin,1985;
Eichner,1988).
Os estudos compulsados permitem-nos verificar que a corrida prolongada está
correlacionada com várias alterações biológicas tanto mais expressivas quanto maiores
a intensidade e duração da mesma.
O propósito deste estudo foi analisar as respostas induzidas por uma corrida de 50 km,
no respeitante a vários indicadores hematológicos, bioquímicos e urinários entre
sujeitos com diferente nível de treino.

Material e Métodos
Sujeitos
Sete soldados das forças de elite do exército português (Operações Especiais), cujas
características estão inscritas na tabela 12.1, fizeram uma prova de controlo de 50 km,
como forma de preparação e seleção para a participação numa corrida de
ultramaratona (100 km).

Tabela 12.1. Características antropométricas, VO2max e média dos tempos aos 50-km, dos sujeitos do
presente estudo (n=7)
Indicadores Valores médios ± desvio padrão
Idade (anos) 26.0 ± 1.8
Altura (cm) 172.0 ± 4.3
Peso (kg) 68.1 ± 3.5
Gordura (%) 9.9 ± 1.0
VO2max (ml.kg-1.min-1) 67.5 ± 2.2
Tempo aos 50-km 3h50' ± 17'

Condições da prova
A prova realizou-se entre as 9 e as 13 horas, em condições climatéricas favoráveis, sem
vento, e com temperaturas variando entre os 20 e os 25 graus centígrados. Não foi
medida a humidade do ar.

146
Condição nutricional
A alimentação dos sujeitos era a normal nos refeitórios militares, tendo sido
aconselhado o reforço de carbohidratos complexos (espaguete, arroz e massas
alimentícias). Como reforço nutricional somente tomavam um comprimido por dia de
um multivitamínico (Centrum®). Durante o esforço cada sujeito ingeriu 1.500 ml de
água glicosada (concentração de 6%), que foi ingerida em pequenas quantidades por
diversas vezes a partir do 5º km e de 5 em 5 km. Malgrado a ingestão sistemática de
fluido verificou-se uma perda de peso em todos os sujeitos que variou entre 1,5 e 2 kg.

Nível de treino
Todos os sujeitos estavam integrados num programa de treino especial visando a
participação numa ultramaratona (100 km), e anteriormente eram participantes
habituais nas provas militares de corrida de orientação, com treino específico nessa
modalidade. Os sujeitos 1, 2, 3, 4 e 5 tinham estado sujeitos a um protocolo de treino
similar ao abaixo apontado entre os meses de Janeiro a Junho (inclusive) do ano
anterior, enquanto os sujeitos 6 e 7 tinham somente 3 meses de treino específico de
longa duração. Estes sujeitos apresentavam um nível inferior de treino específico como
se comprova pelos tempos aos 50-km que foram os piores de toda a amostra (4h12' e
4h17'). O tempo gasto na corrida variou entre 3h35' e 4h17'.

Protocolo habitual de treino


Duplo treino diário completando entre 30 a 45 km por dia. Cada microciclo
comportava entre 10-12 sessões de treino, com 1 dia de descanso, totalizando cerca
de 250 km de corrida. A intensidade de esforço, controlada por cárdio-frequencímetro
(Polar Vantage NV), alternava entre 130 - 160 bpm para todos os sujeitos, com 2
sessões semanais de fartlek induzindo frequências cardíacas perto das máximas. De
duas em duas semanas era realizada uma prova de controle (30 km). A prova foi
realizada após um dia de descanso.

147
Variáveis biológicas estudadas
Hemograma que foi medido pelo analisador hematológico automático S890 Coulter
Counter. Ureia, Creatinina, Glucose, Colesterol, Triglicerídeos, SGOT, SGPT, Creatina
Quinase (CK), Aldolase, Cálcio e Fósforo foram analisados num aparelho Hitachi 705.
Sódio, Potássio e Cloretos foram analisados num fotómetro de chamas Korning 480.
Ferro e Magnésio foram determinados por técnica manual. A análise urinária foi feita
num aparelho Ureton RL 9. As variáveis foram medidas num primeiro momento 2
horas após o pequeno-almoço normal (sumo, pão com doce a manteiga e café com
leite), 15 minutos antes da corrida e imediatamente após a corrida. Foram recolhidas
amostras de sangue venoso periférico (5 ml) da veia antecubital em tubos contendo
etilenodiaminotetracetato (EDTA) e analisadas dentro de 6 horas.

VO2max
Foi avaliado através da realização de teste em tapete rolante, com protocolo de
esforço contínuo, com inclinação de 2% e uma velocidade inicial de 8 km.h-1, com
incrementos de 2 km.h-1 em cada 2 minutos até à exaustão. Os parâmetros
respiratórios foram medidos com um aparelho EOS-Sprint System (Erich Jaeger GmbH
& Co, model XT/AT JK) e analisados por um computador JVC, model GD-H3214VCW.

Composição corporal
Par a determinação da percentagem de gordura corporal foi utilizado o protocolo
proposto pelo International Working Group on Kinanthropometry, descrito por Ross e
Marfell-Jones (1983). A predição da densidade corporal, a partir das pregas de
adiposidade subcutânea, foi estimada pela equação de Durnin e Womersley (1974). A
percentagem de gordura corporal foi calculada pela equação de Siri (1961)

148
Resultados
Indicadores Urinários
A tabela 12.2 evidencia, em cada sujeito, as alterações induzidas pelo esforço em
alguns parâmetros urinários. Como podemos verificar as alterações são muito diversas
evidenciando-se a presença urinária de proteínas, bilirrubina e acetona e a ausência de
glicose em todos os sujeitos, evidenciando-se ainda nos sujeitos menos treinados (6 e
7) a presença de hemoglobina e urobilinogénio.

Tabela 12.2 Indicadores urinários antes e após a corrida de 50-km


Indicadores Sujeito 1 Sujeito 2 Sujeito 3 Sujeito 4 Sujeito 5 Sujeito 6 Sujeito 7
Densidade a. 1025 a. 1028 a. 1018 a. 1026 a. 1011 a. 1022 a. 1025
b. 1026 b. 1031 b. 1022 b. 1034 b. 1035 b. 1023 b. 1025
Cor a. amarela a. amarela a. amarela a. amarela a. amarela a. amarela a. amarela
b. am. escu b. amarela b. am. escu b. am. esc b. amarela b. am. escu b. am. escu
Aspeto a. límpido a. límpido a. límpido a. límpido a. límpido a. límpido a. turvo
b. lig. turvo b. límpido b. límpido b. límpido b. turvo b. límpido b. turvo
Reação pH a. 6 a. 7 a. 6 a. 7 a. 6 a. 6 a. 5
b. 6 b. 7 b. 6 b. 7 b. 5 b. 6 b. 5
Proteínas a. não a. não a. não a. não a. não a. não a. não
b. contém b. contém b. contém b. contém b. contém b. contém b. contém
Glicose a. não a. não a. não a. não a. não a. não a. não
b. não b. não b. não b. não b. não b. não b. não
Acetona a. não a. não a. não a. não a. não a. não a. não
b. contém b. contém b. contém b. contém b. contém b. contém b. contém
Bilirrubina a. não a. não a. não a. não a. não a. não a. não
b. contém b. contém b. contém b. contém b. contém b. contém b. contém
Urobilinogénio a. não a. não a. não a. não a. não a. não a. não
b. não b. não b. não b. não b. não b. contém b. contém
Hemoglobina a. não a. não a. não a. não a. não a. não a. não
b. não b. não b. não b. não b. não b. contém b. contém
a. antes da corrida
b. depois da corrida

Quanto à análise microscópica do sedimento da urina a expressão dos dados permite


verificar a diversidade das alterações individuais, com a tendência para aumentar o
número de células (eritrócitos, leucócitos e epiteliais) e a emergência de alguns
fenómenos individualizados.

149
Tabela 12.3 Exame microscópico do sedimento antes e após a corrida de 50-km
Indicadores Sujeito 1 Sujeito 2 Sujeito 3 Sujeito 4 Sujeito 5 Sujeito 6 Sujeito 7
Eritrócitos/ a. 0 -1 a. 0 a. 0 - 1 a. 1 - 2 a. 1 - 2 a. 0 - 1 a. 0
campo de 40 b. 2 b. 1 - 2 b. 3 - 4 b. 3 - 4 b. 4 - 5 b. 8 - 9 b. 4 - 5
Leucócitos/ a. 1 - 2 a. 1 - 2 a. 0 a. 1 - 2 a. 0 a. 1 - 2 a. 0
campo de 40 b. 3 - 4 b. 3 - 4 b. 2 - 3 b. 9 - 10 b. 2 - 3 b. 6 - 7 b. 2 -3
Células a. raras a. raras a. 0 a. 0 a. 0 a. raras a. 0
Epiteliais b. algumas b. algumas b. algumas b. algumas b. algumas b. algumas b. algumas
Cilindros por a. - a. - a. - a. - a. - a. - a. -
campo de 10 b. 1 - 2; b. - b. - b. - b. - b. 1 - 2; b. -
hialinos hialinos
Cristais a. - a. - a. - a. - a. - a. - a. -
b. - b. oxalato b. - b. - b. - b. - b. -
de cálcio
Outros a. - a. - a. - a. - a. - a. - a. -
b. - b. - b. filamen b. - b. - b. - b. -
tos de
muco
a. antes da corrida
b. depois da corrida

Hemograma
Após a corrida verificou-se um aumento significativo (p<0.05) da concentração de
hemoglobina, a que corresponderam ligeiros aumentos quer do hematócrito quer da
massa eritrocitária.
Os valores do hemograma obtidos antes e após a corrida estão expressos na tabela
12.4.

Tabela 12.4. Alterações do hemograma após uma corrida de 50 km


Indicadores Antes Após
Hemoglobina (g/dL) 14.6 ± 0.8 15.1 ± 0.9 *
12
Eritrócitos (x 10 /L) 4.8 ± 0.3 4.9 ± 0.3
Hematócrito (%) 43.8 ± 3.6 45.3 ± 2.7
Volume Corpuscular Médio (%) 91.1 ± 3.6 91.1 ± 3.1
Hemoglobina Corpuscular Média (%) 30.7 ± 1.3 30.5 ± 1.5
Concentração Média Hemoglobina (%) 33.7 ± 1.1 33.5 ± 0.7
* estatisticamente significativo (p < 0.05)

150
Fórmula Leucocitária
Os resultados, apresentados na tabela 12.5, demonstram que a alteração da fórmula
leucocitária assentou fundamentalmente no significativo (p<0.05) aumento dos
neutrófilos. No entanto, verificou-se o decréscimo dos linfócitos e eosinófilos,
enquanto os monócitos subiram ligeiramente.
De salientar que o significativo aumento das células leucocitárias evidencia a dimensão
do esforço desenvolvido.

Tabela 12.5. Alterações da fórmula leucocitária após uma corrida de 50 km


Indicadores Antes Após
9
(x 10 /L)
Leucócitos 5.4 ± 1.3 16.4 ± 4.7 *
Neutrófilos 2.8 ± 0.6 14.2 ± 4.8 *
Eosinófilos 0.17 ± 0.11 0.04 ± 0.11
Linfócitos 2.2 ± 0.8 1.8 ± 0.7
Monócitos 0.25 ± 0.17 0.34 ± 0.16
* estatisticamente significativo (p < 0.05)

Pela análise dos valores individuais (tabela 12.6) verificamos que os sujeitos menos
treinados (6 e 7), sofreram alterações mais nítidas (leucocitose e neutropenia)
indiciando um estado mais saliente de imunodepressão pós-esforço.

Tabela 6. Alterações dos valores individuais (e percentagem de variação) dos leucócitos e neutrófilos
após a corrida de 50 km
Indicadores
(x 109/L) 1 2 3 4 5 6 7
Leucócitos
Antes 5.1 7.8 4.0 4.1 6.0 5.1 6.0
Após 13.3 17.0 11.5 11.8 15.8 22.3 23.0
Variação (160%) (117%) (188%) (188%) (163%) (337%) (283%)
Neutrófilos
Antes 2.4 3.0 1.9 2.3 3.1 3.1 3.8
Após 10.6 14.5 9.8 10.3 12.2 21.2 20.7
Variação (341%) (383%) (415%) (347%) (293%) (583%) (444%)

151
Bioquímica
A tabela 12.7. evidencia que com exceção da glicose todos os indicadores estudados
apresentaram alterações significativas (p<0.05).

Tabela 12.7. Alterações da Química do Sangue após uma corrida de 50 km


Indicadores Antes Após
Ureia (mmol/L) 7.1 ± 1.6 9.2 ± 2.5 *
Creatinina (mcmol/L) 89.0 ± 3.6 139.7 ± 22.6 *
Glucose (mmol/L) 5.3 ± 0.7 4.6 ± 0.7
Colesterol (mmol/L) 4.1 ± 0.5 4.5 ± 0.6 *
Triglicerídeos (mmol/L) 1.0 ± 0.1 1.4 ± 0.3 *
GOT (mckat/L) 17.0 ± 2.9 37.5 ± 17.9 *
GPT (mckat/L) 16.5 ± 3.9 21.1 ± 3.5 *
CK (U/L) 100.2 ± 24.9 712.5 ± 860.5 **
Aldolase (U/L) 1.1 ± 0.2 2.8 ± 0.8 *
Cortisol (µg/dL) 23.6 ± 6.0 49.1 ± 4.4 *
* estatisticamente significativo (p < 0.05)
** não significativo em virtude da amplitude do desvio-padrão

Na tabela 12.8 podemos verificar a magnitude das diferenças individuais quanto às


alterações induzidas pelo esforço na taxa de concentração de glucose plasmática. As
diferenças nas variações individuais são marcantes, com sujeitos a aumentar e outros a
diminuir a concentração plasmática deste substrato energético, e malgrado todos
terem recebido a mesma quantidade de bebida.

Tabela 12.8. Alterações individuais da glucose sanguínea após uma corrida de 50 km


Sujeitos
Glicose 1 2 3 4 5 6 7
(mmol/L)
Antes 6.16 4.77 5.49 6.11 3.89 5.44 5.49
Após 4.16 4.27 5.94 4.77 4.88 4.94 3.61

A análise das alterações individuais da taxa de concentração das enzimas plasmáticas,


permite-nos verificar que os 2 sujeitos com menor nível de treino apresentam,
imediatamente após o esforço, uma superior expressão da CK e da GOT, um aumento
menos expressivo da concentração de Aldolase e aumentos similares de GPT.

152
Tabela 12.9. Valores individuais das alterações das enzimas plasmáticas após uma corrida de 50 km
Indicadores 1 2 3 4 5 6 7
CK (U/L) Antes 79 138 116 72 108 113 76
Após 205 261 240 337 294 2520 1131
Aldolase (U/L) Antes 1.0 1.3 1.1 1.1 1.5 1.3 0.8
Após 3.0 3.5 2.5 4.4 2.9 1.9 1.9
GOT (mckat/L) Antes 14 20 17 21 13 16 18
Após 25 33 23 33 24 69 56
GPT (mckat/L) Antes 14 18 19 23 14 11 17
Após 19 21 23 28 17 19 21

O comportamento temporal das várias enzimas permite-nos verificar que os picos de


concentração plasmática estão condicionados, pelo menos em parte, pelo nível de
treino dos sujeitos.

Tabela 12.10. Evolução temporal da taxa plasmática de várias enzimas em 3 sujeitos com diferentes
níveis de treino
Enzimas Após-esforço Após 24 h Após 48 h Após 72 h
CK
Sujeito 4 * 337 486 236 209
Sujeito 6 ** 2520 2763 1541 1212
Sujeito 7 ** 1131 2444 1400 -
Aldolase
Sujeito 4 4.4 4.5 3.8 2.6
Sujeito 6 1.9 18.5 18.2 16.0
Sujeito 7 1.9 16.7 17.1 -
GOT
Sujeito 4 33 37 27 28
Sujeito 6 69 161 129 111
Sujeito 7 56 121 125 -
GPT
Sujeito 4 28 21 27 22
Sujeito 6 19 27 40 54
Sujeito 7 21 35 37 -
* 15 meses de treino ** 3 meses de treino

A expressão das alterações permite verificar diferenças entre sujeitos com diferentes
níveis de treino. O estudo do comportamento dos indicadores enzimáticos em três
sujeitos (Tabela 12.10), um, dois e três dias após esforço indica picos diferenciados no
tempo.

153
Tabela 12.11. Alterações eletrolíticas plasmáticas após uma corrida de 50 km
Indicadores Antes Após
Ferro (mcmol/L) 15.3 ± 3.6 23.2 ± 3.3 *
Cálcio (mmol/L) 2.31 ± 0.1 2.46 ± 0.1 *
Fósforo (mmol/L) 1.04 ± 0.13 1.37 ± 0.23 *
Magnésio (mmol/L) 0.86 ± 0.07 0.78 ± 0.08
Sódio (mEq/L) 140.8 ± 2.4 145.5 ± 6.7
Potássio (mmol/L) 4.4 ± 0.3 4.8 ± 0.4
Cloretos (mmol/L) 101.2 ± 1.8 104.8 ± 4.6
* significativo (p<0.05)

A tabela 12.11 permite-nos verificar as alterações de alguns eletrólitos plasmáticos;


embora somente o ferro, cálcio e fósforo tenham sofrido alterações significativas
(p<0.05) todos os outros sofreram variações menos salientes que podem mesmo assim
ter significado fisiológico como é o caso do potássio.

154
Discussão
Os efeitos agudos dos esforços intensos prolongados têm sido suficientemente
estudados, e têm conduzido a resultados por vezes conflituais, que estão dependentes
de uma série de fatores tais como duração e intensidade do esforço, condições
climatéricas, nível de treino dos sujeitos, idade e perfil da dieta antes e durante o
exercício.
No presente estudo a análise dos indicadores urinários permite-nos verificar que
independentemente do estado de treino, o esforço foi suficientemente agressivo para
provocar manifesta disfunção renal. A verificação de proteinúria, cetonúria e
bilirubinúria em todos os sujeitos reforça a qualificação anterior. Embora para alguns
autores (Poortmans, 1991; Eichner, 1988) a presença de proteínas na urina esteja mais
dependente da intensidade do esforço que do volume do mesmo, os presentes
resultados permitem concluir que a extensão temporal do esforço pode ser um fator
determinante na emergência de proteinúria. A nossa conclusão é reforçada por Reid et
al. (1987) que verificaram em 98 corredores o advento de proteinúria em 35% dos
sujeitos após a meia-maratona e em 69% dos sujeitos após a maratona. A presença
urinária de proteínas de grande peso molecular (>160.000 daltons) indicia o aumento
da permeabilidade do rim, situação que acontece somente em situações patológicas
ou transientemente patológicas como no caso do exercício físico intenso e prolongado
(Poortmans, 1991). A urina está livre de proteínas 1 a 2 dias após uma maratona
(Poortmans, 1985); tal facto foi verificado no sujeito 3 do presente estudo que no dia a
seguir à corrida não apresentava proteínas na urina.
A presença de acetona na urina em todos os sujeitos é um sinal claro de cetose
sistémica (cetonemia e cetonúria) induzida pela severidade do exercício. Enquanto o
acetoacetato e o -hidroxibutirato são prontamente oxidados nos tecidos extra-
hepáticos, a acetona é de difícil oxidação in vivo (Mayes, 1990); daí o seu
aparecimento na urina ser indiciador de uma alta taxa de oxidação de ácidos gordos no
fígado.
Em situações fisiológicas um sujeito adulto destrói por hora entre 1-2 x 108 eritrócitos
o que provoca um turnover diário aproximado de 6 g de hemoglobina (Murray, 1990).
A destruição da hemoglobina induz, a partir da porção porfirina do Heme liberta de
ferro, a formação diária de 250-350 mg de bilirrubina (1 g de hemoglobina liberta 35

155
mg de bilirrubina) (Murray, 1990). A bilirrubina é segregada na bile, na sua forma
conjugada, sendo reduzida em urobilinogénio pelas bactérias intestinais. Em condições
normais, nenhum dos metabolitos provocados pela destruição eritrocitária aparece na
urina.
A presença de bilirrubina na urina de todos os sujeitos do presente estudo indica uma
hemólise extensiva que ultrapassou a capacidade hepática de excreção de bilirrubina.
Em situações normais existem somente traços de urobilinogénio na urina. A presença
significativa desta substância na urina dos sujeitos menos treinados (6 e 7) indica uma
evidente destruição sanguínea. De igual forma uma forte agressão hepática pode
interferir com o ciclo intra-hepático do urobilinogénio e induzir a sua excreção urinária
(Murray, 1990).
Os mesmos sujeitos desenvolveram hemoglobinúria o que indicia uma severa
destruição eritrocitária (talvez fundamentalmente provocada por hemólise plantar,
embora se possa especular acerca da eventual participação da fricção mecânica
intravascular para o break down eritrocitário). Poortmans (1991) põe a hipótese de
que o aparecimento de hemoglobina na urina também pode estar relacionada com a
saturação do sistema de transporte da hemoglobina livre, formada em excesso
durante o exercício severo e prolongado (complexo haptoglobina-hemoglobina livre), o
que vai provocar a precipitação da hemoglobina no sistema excretório em virtude do
seu baixo peso molecular (65.000) lhe permitir ultrapassar as barreiras impostas pelo
glomérulo e túbulos do nefrónio. O estudo de Reid et al. (1987) comprovou a presença
de sangue na urina em 22% dos sujeitos que terminaram uma maratona. Puseram a
hipótese de tal facto ser devido a sangramento glomerular.
Os nossos resultados permitem-nos pensar que o treino atenua a destruição
eritrocitária mesmo em condições de carga severa. Parece que o nível de treino atenua
a denominada pseudonefrite atlética, embora alguns indicadores de agressão
sistémica possam aparecer na urina qualquer que seja o nível de treino.
Imediatamente após um esforço prolongado é usual acontecer uma situação de
hemoconcentração com reflexo em vários indicadores hematológicos que será tanto
mais evidente quanto menos eficaz for o processo de hidratação durante o esforço. Em
muitos atletas o aporte hídrico durante o esforço é menos determinado por
estratégias pessoais de hidratação e mais determinado pelo comando hipotalâmico da

156
sede. Como este processo está retardado em relação ao défice hídrico, acontece com
naturalidade uma situação de desidratação tendo como reflexo a hemoconcentração.
Neste estudo, de todos os indicadores do hemograma somente a percentagem de
hemoglobina sofreu alterações significativas (p<0.05); o ligeiro aumento do
hematócrito não apresenta significado estatístico (p=0.256). Os sujeitos do presente
estudo demonstraram à partida um hematócrito baixo, o que está de acordo com as
adaptações crónicas induzidas pelos esforços prolongados e que podem ter origem no
aumento do volume plasmático (Hallberg & Magnusson, 1984) ou na hemólise
intravascular (Miller et al.,1988) induzida pelas sucessivas cargas de esforço. O ligeiro
aumento do hematócrito poderá estar relacionado com a hemoconcentração induzida
pelo exercício (Eichner, 1988). Embora Reinhart et al. (1983) não tenham verificado
alterações do hematócrito após uma ultramaratona, e Nagel et al.(1992) tenham
verificado uma ligeira diminuição do hematócrito durante um esforço prolongado,
vários estudos comprovam o aumento do hematócrito como resposta normal a este
tipo de exercício, que é normalmente acompanhado pela elevação da concentração de
hemoglobina e contagem eritrocitária (Nuviala et al.,1992; Van Rensburg et al.,1986;
Jurimae et al.,1989).
A ativação das células imunocompetentes é a resposta aguda natural induzida pelo
exercício físico intenso (Farber et al.,1991). O exercício físico prolongado induz uma
leucocitose progressiva, que está relacionada com o aumento do cortisol que se supõe
atuar no processo de desmarginação dos leucócitos do pool marginal (Aroca &
Barbero, 1991). O presente estudo permitiu-nos verificar uma marcada alteração da
fórmula leucocitária fundamentalmente determinada pelo significativo aumento dos
neutrófilos (p<0.001), evidenciando-se um comportamento tendencial para o aumento
dos monócitos (p=0.079) e para a diminuição do número de linfócitos (p=0.089). Estes
dados são em parte contrariados pelo estudo de Rama et al. (1994) que após uma
ultramaratona (100-km) verificaram um aumento muito saliente (+226%) de leucócitos
e um aumento, embora menor (+46%) de linfócitos. Pensamos que o tipo de esforço
(intensidade e duração) determina a especificidade da resposta. Esta suposição é
suportada pelo estudo de Gleeson et al.(1995). Os nossos dados são reforçados pelo
estudo de Nagel et al. (1992) que verificaram após esforços de longa duração
(contínuos ou intermitentes) uma marcada alteração da fórmula leucocitária

157
determinada pelo aumento dos neutrófilos e numa clara diminuição dos linfócitos que
baixavam até à 8ª hora de exercício, com ambos os tipos de esforço. Também Shinkai
et al.(1993), imediatamente após um triatlo, verificaram uma redução da resposta
proliferativa linfocitária. De igual forma o estudo de Nieman et al.(1995), após 2 horas
e meia de corrida em tapete rolante, reforça em parte os nossos dados; verificaram
um marcado aumento de neutrófilos, ligeiros aumentos de monócitos e eosinófilos e
manutenção dos valores de linfócitos. Pensamos poder concluir que o prolongamento
de esforço em exercício exaustivo induz uma situação de linfopenia, tanto mais
saliente quanto mais prolongado for o esforço.
Pela análise individual dos nossos dados verificamos que a leucocitose é tanto mais
saliente quando mais baixo o nível de treino dos sujeitos, e que a alteração da fórmula
leucocitária é feita à custa duma mais saliente alteração da percentagem de
neutrófilos, já que as alterações intra-individuais das outras subpopulações
leucocitárias não permitiram discriminações em função do nível de treino.
Não foram detetadas alterações significativas na taxa de concentração plasmática de
glucose, embora as diferenças individuais permitam verificar respostas muito
diferenciadas. A ingestão de soluções glicosadas durante o esforço previne, quase
sempre, a emergência de situações de hipoglicemia (Nagel et al.,1992; Nieman &
Nehlsen-Cannarella, 1992; Jurimae et al.,1989). Embora exista consenso geral acerca
dos benefícios, quanto à performance em atividades de endurance, da ingestão de
carbohidratos durante o esforço, a análise dos resultados individuais permite verificar
que a suplementação glucídica durante o esforço não evita, em alguns sujeitos, a baixa
de glucose, indiciando tal facto um aumento da taxa de oxidação deste substrato
(Costill, 1988).
O aumento do nível de concentração das enzimas séricas indicia alterações na
permeabilidade da membrana celular, e está normalmente correlacionado com lesão
celular consequente ao exercício (Apple & Rhodes, 1988). As enzimas plasmáticas
(GOT, Aldolase e CK) sofreram um aumento significativo (p<0.05), o que está de acordo
com os dados de outros estudos (Rama et al.,1994; Nuviala et al.,1992; Soeder et
al.,1989). Quanto à GPT verificamos o seu aumento significativo (p<0.05), o que é
corroborado pelo estudo de Soeder et al.(1989); no entanto outros estudos (Nuviala et
al.,1992; Magazanik et al.,1974), não verificaram alterações significativas desta enzima

158
após uma corrida de maratona. Alguns estudos sugerem que o pico máximo de
atividade desta enzima só é atingido algumas horas após o exercício físico prolongado
(Holzhausen et al.,1994; Taylor et al.,1987). O significado do aumento desta enzima
imediatamente após o esforço pode-se prender com o tempo médio de esforço
(3h50min 17min) que permitiu o detonar do processo de acumulação plasmática. Em
relação à GPT o pico máximo foi atingido após o esforço no sujeito com melhor nível
de treino (sujeito 4), enquanto nos sujeitos menos treinados (sujeitos 6 e 7) o pico
máximo foi atingido 2 ou 3 dias após. A análise da GPT pós-esforço não diferenciava os
sujeitos em função do nível de treino, e poderia erroneamente indiciar que a corrida
de 50-km consubstanciava um stresse idêntico para os sujeitos com diferentes níveis
de treino em relação à célula hepática; no entanto a procura, no tempo, do pico
máximo permite verificar (relacionando a GPT com a lesão hepática (Nagel et
al.,1992)), que a agressão do tecido hepático foi mais saliente nos sujeitos menos
treinados. Importa referir que além da extensão temporal do treino do sujeito 4,
acresce que no ano anterior não só tinha realizado igual teste (50 km), como tinha
realizado uma ultramaratona de 100 km. A análise dos resultados indicia um efeito
protetor do treino anterior. Como vimos na tabela 9, um melhor nível de treino atenua
a expressão da lesão tecidular evidenciada pela acumulação plasmática da CK. Embora
Niemela et al.(1984) tenham verificado que a velocidades de corrida estabilizadas o
aumento da CK relacionava-se positivamente com a extensão da prova, o presente
estudo permite verificar que o nível de treino é um fator importante quanto à
expressão plasmática desta enzima. É de salientar que malgrado as diferentes
expressões quantitativas o pico de concentração máxima da CK é atingido 24 horas
pós-esforço nos 3 sujeitos mais estudados, facto que parece não estar relacionado com
o nível de treino.
Em relação à Aldolase e GOT o pico, no sujeito mais treinado, foi atingido 24 horas
depois, enquanto nos sujeitos com menor nível de treino o pico parece ter sido
atingido entre as 24 e 48 horas após esforço. Podemos verificar que a Aldolase, nos
sujeitos menos treinados, apresenta alterações menos salientes imediatamente depois
da corrida sofrendo bruscos aumentos 24 horas depois. O aumento da concentração
plasmática desta enzima no sujeito mais treinado é menos saliente e mais precoce no
tempo.

159
Podemos afirmar que, independentemente da enzima estar conotada com o
metabolismo dos nucleótidos de purina (CK), com o metabolismo glicolítico (Aldolase)
ou mesmo com o metabolismo dos aminoácidos (GOT, GPT), qualquer uma delas
indicia com clareza o grau de agressão provocada por uma corrida de 50-km; no
entanto, a medição logo após o esforço é redutora e pode induzir conclusões erradas.
É importante salientar a lentidão do processo de clearence das várias enzimas o que é
corroborado por outros estudos (Rodrigues dos Santos, 2001) e que está conotada
com o grau de agressão tecidular.
No estudo da função renal verificamos um aumento significativo (p<0.05) quer da
ureia quer da creatinina, o que pode ser causado quer pelo aumento do turnover
destes produtos de degradação quer pela diminuição do fluxo sanguíneo renal e
consequente diminuição da taxa de filtração glomerular. O aumento plasmático destes
indicadores permite verificar a diminuição da funcionalidade do rim. Durante o
exercício prolongado a taxa de eliminação renal de ureia e creatinina reduz-se para 40
a 50% da taxa de repouso (Poortmans, 1991). Os dados do presente estudo estão de
acordo com outros estudos (Rama et al.,1994; Nagel et al.,1992).
Embora Neviackas e Bauer (1981) tenham verificado, após maratona, que um processo
de reidratação, até ao peso anterior à prova, fez regressar aos valores iniciais os
eletrólitos séricos, é lógico que a depleção hídrica que acompanha o exercício
prolongado é acompanhada por alterações na taxa de concentração plasmática de
vários iões que apresentam vários significados fisiológicos. Pastene et al. (1996) não
verificaram diferenças significativas no volume plasmático após maratona e malgrado
uma diminuição de peso corporal de cerca de 2 kg. Tal ficar-se-ia a dever ao aporte de
água produzida pelo metabolismo e pela libertação da água armazenada com o
glicogénio muscular e hepático.
Os valores plasmáticos de Sódio, Cloro e Potássio não aumentaram de forma
significativa após a corrida. As alterações plasmáticas destes iões, após esforços
prolongados, apontam normalmente para ligeiros aumentos, e não dependem do nível
de condição física dos sujeitos (Holtzhausen et al.,1994); a razão para tal poderá não
estar somente dependente da diminuição do volume plasmático (Rama et al.,1994).
Holtzhausen et al.(1994) verificaram ligeiros aumentos da concentração plasmática de
sódio e potássio, quer em atletas normais quer em atletas que colapsaram após uma

160
corrida de 56-km. Segundo Nagel et al.(1992), parece que o aumento plasmático dos
iões responsáveis pelo processo de despolarização/repolarização muscular só acontece
nos primeiros momentos de um exercício prolongado. Numa ultramaratona a
concentração de potássio sobe nas primeiras 4 horas de exercício e depois mantém-se
estável até ao término do exercício (24 horas) (Nagel et al., 1992), embora dentro de
valores considerados de normalidade laboratorial. O estudo de Schmidt et al.(1989)
demonstrou ligeira diminuição da concentração de sódio não se tendo verificado
alterações significativas na concentração de potássio, após a realização de uma
maratona. Dentre os vários eletrólitos parece que o sódio e o cloro são os que se
relacionam mais fortemente com a diminuição do volume plasmático (Cohen &
Zimmerman, 1978). Parece que por forte ação hormonal (aldosterona) mesmo durante
exercício intenso e prolongado o organismo tende a aumentar a taxa de reabsorção
glomerular de sódio no sentido de manter a osmolaridade do meio, bem como atenuar
a diminuição do volume plasmático (Schmidt et al.,1989). A hipercalemia pode estar
relacionada com alterações da função muscular (Gonin, 1985). Parece que altas
concentrações plasmáticas de potássio estão correlacionadas com a diminuição da
força contráctil muscular e a emergência de fadiga (Sjogaard, 1990). As pequenas
variações de potássio verificadas no presente estudo não permitem indiciar situações
de fadiga por deplecção do potássio intracelular. Podemos especular que a
hipercalemia verificada pode estar relacionada com a mobilização do potássio intra-
eritrocitário que Lijnen et al. (1989) verificaram que diminui após maratona em
corredores lentos e não em corredores rápidos. Quanto a estes eletrólitos, outros
estudos com provas mais longas apresentam também resultados conflituais. Assim,
após corrida de 100 km, enquanto Rama et al.(1994) detetaram aumentos
significativos de Na+ e K+, Gonin (1985) encontrou como resposta normal a diminuição
da concentração plasmática deste iões. Pensamos que os cuidados nutricionais
específicos podem ser a causa destas diferenças. Vários estudos não evidenciaram
alterações da concentração plasmática de potássio após maratona (Lijen et al.,1989;
Whiting et al.,1984) e ultramaratona (McKennie et al.,1982); no entanto, os resultados
de outros estudos contrariam os resultados atrás expostos. Assim, Nelson et al.(1989)
verificaram elevação significativa no potássio sérico após maratona corrida em
ambiente frio, enquanto Reher et al.(1992) verificaram um aumento de 5% (4.2-4.4

161
mmol.L-1) após ultramaratona (67 km) e Rocker et al.(1989) encontraram um aumento
de 0,58 mmol.L-1 após maratona. Os dados destes autores corroboram os nossos. A
conflitualidade dos resultados dos vários estudos quererá menos significar alterações
metodológicas e mais a expressão da variabilidade individual, que também foi
verificada no estudo de Whiting et al. (1984).
Os dados deste estudo permitem verificar um significativo (p<0.05) aumento da
concentração plasmática de cálcio e fósforo e uma tendência para a diminuição de
magnésio (p=0.076).
Em esforços mais prolongados e biomecanicamente mais agressivos foram detetados
aumentos significativos de cálcio e magnésio plasmáticos (Van Rensburg et al.,1986).
Embora a resposta habitual após esforços prolongados pareça ser a diminuição da taxa
plasmática de magnésio (Lijnen et al.,1989; Buchman et al.,1988; Cohen &
Zimmerman, 1978; Haralambie, 1975), é difícil esclarecer a dinâmica do magnésio após
exercício prolongado, pois está dependente das trocas entre o plasma e outros
compartimentos (músculo, eritrócitos, etc.). Lijnen et al.(1989) sugerem que a baixa de
magnésio plasmático durante a maratona não deve ser atribuída à captação pelo
eritrócito, excreção urinária ou perda pelo suor, mas sim à captação pelos adipócitos
de magnésio vertido nos fluidos extracelulares. Outra justificação poderá prender-se
com uma superior captação de magnésio pelos músculos ativos (Buchman et al.,1988).
A diminuição verificada no presente estudo (9%) embora sem significado estatístico
corresponde à tendência verificada noutros estudos e poderá corresponder,
fundamentalmente, a uma solicitação muscular aumentada deste ião determinante
para o processo de contração muscular.
A concentração de cálcio plasmático varia dentro de margens muito estreitas.
Buchman et al. (1988) não verificaram alterações significativas no cálcio plasmático
após maratona. O aumento médio verificado no presente estudo (10,6%) pode
significar por um lado, a diminuição da excreção urinária, por outro uma transiente
supressão da função osteoblástica (Malm et al.,1993), ou ainda a quebra da
homeostasia das células musculares ativas induzida pela severidade do exercício.
Assim, o aumento do cálcio plasmático pode significar quer uma acentuada proteólise
e afectação da captação intracelular de cálcio (Belcastro, 1993) quer o aumento da
captação muscular de ácidos gordos livres. Segundo Armstrong (1990) a presença de

162
ácidos gordos de cadeia longa, promove a rutura do retículo sarcoplasmático e
membrana sarcolemal, diminuindo o potencial de captação de cálcio, aumentando a
permeabilidade da membrana para o efluxo deste eletrólito. Quer-nos parecer que
uma subida tão nítida do cálcio plasmático quer significar a acção sinérgica dos vários
mecanismos atrás apontados aliados à óbvia hemoconcentração verificada.
O cortisol, uma hormona de stresse, normalmente sobe como resposta ao exercício
intenso e prolongado (Galbo & Gollnick, 1984). Os dados do presente estudo apontam
claramente para um aumento do cortisol, que é um verdadeiro mediador catabólico, e
são plenamente confirmados por outros estudos (Shinkai et al.,1993; Nagel et al.,1992;
Jurimae et al.,1989; Van Rensburg et al.,1986), respeitantes a esforços similares. Os
dados conseguidos não nos permitiram verificar diferenças entre os sujeitos em função
do respectivo nível de treino, embora tenham sido denotadas grandes variações
individuais na concentração plasmática do cortisol como resposta ao exercício
prolongado. Viru et al.(1992) num estudo bem controlado (2 horas de ciclo-ergómetro
a 60% da potência individual) detetaram em atletas de endurance e em não treinados
variações plasmáticas de cortisol muito irregulares. No entanto Nagel et al. (1992)
durante uma ultramaratona (24 horas) verificaram que o aumento da taxa plasmática
de cortisol não aumentou linearmente no decurso do esforço. Durante as primeiras
horas o cortisol manteve-se dentro dos valores basais, somente sofrendo alterações
significativas a partir da 8ª hora de corrida. No entanto, parece que a resposta típica ao
exercício prolongado de endurance é o aumento significativo do cortisol, que está
fortemente correlacionado com alterações do sistema imunológico (Nieman et
al.,1995; Haq et al.,1993), e que tem um efeito preponderante na mobilização das
gorduras e proteínas, poupando os carbohidratos e mantendo a euglicemia (Tharp,
1975).
Parece que as alterações da concentração do ferro sérico após esforço prolongado
variam em função do sujeito. Gonin (1985) após corrida de 100-km verificou aumentos
e diminuições da concentração de ferro sérico. Essas variações poderão estar
dependentes de uma série de fatores: hemólise intravascular, hemólise plantar,
sudação, ferimentos gastrointestinais, perdas urinárias, depleção de haptoglobina, etc.
Embora Van Rensburg et al. (1986) tenham detetado, após triatlo, uma diminuição na
concentração de ferro sérico outros autores detetaram uma subida após exercício

163
prolongado (Haralambie, 1975). O aumento da concentração do ferro plasmático em
todos os sujeitos da nossa amostra, indicia que a duração do esforço é o fator
determinante nas alterações da homeostasia férrica. O ferro sérico aumentou após
exercício moderado de 10 minutos de ciclo-ergómetro a 150 pulsações por minuto
(Benoni et al., 1995). Durante 10 dias de corrida intervalada intensiva (duplo treino
diário) verificou-se um ligeiro aumento da concentração sérica de ferro entre o 1º e 6º
dia, embora no 10º dia os níveis tenham baixado de 19.2±2.6 para 13.6±2.3 µmol.L -1
(Miller et al., 1988). Conflituando com os nossos resultados, Nagel et al. (1992)
verificaram, no decurso de uma corrida de 24 horas, uma diminuição progressiva do
ferro sérico até às 16 horas de prova, verificando-se depois uma subida até às 24
horas. Pensamos que são necessários mais estudos que conjuguem a intensidade e
duração do exercício e as alterações séricas não só do ferro, como da transferrina e
ferritina.
Contrariamente a alguns estudos que verificaram uma baixa da concentração
plasmática de triglicerídeos após triatlo (Juriame et al., 1989) e maratona (Sherman et
al., 1986), e aos dados de Van Rensburg et al. (1986) que não verificaram alterações, os
nossos resultados demonstram um aumento significativo (p<0.05). O nosso estudo é
comprovado com os resultados de Goodyear et al.(1990) que comprovaram o
aumento dos triglicerídeos plasmáticos após maratona. O estudo de Nagel et al. (1992)
verifica uma diminuição progressiva de triglicerídeos no decurso de uma
ultramaratona de 24 horas. O nível do decréscimo estava relacionado com o tempo de
exercício. A diminuição da concentração de triglicerídeos plasmáticos estará
relacionada com a duração do esforço (Jurimae et al., 1989). Também Niemela et al.
(1984) no decurso de uma ultramaratona (24 horas) somente às 12 horas de esforço
detetaram uma diminuição da taxa plasmática de triglicerídeos, quando às 6 horas de
exercício já se tinha verificado um aumento (cerca de 19 vezes o valor basal) da taxa
plasmática de ácidos gordos livres. Parece que o metabolismo lipídico somente nos
períodos muito avançados de um esforço prolongado faz apelo ao suporte energético
dos triglicerídeos exógenos. Durante um esforço prolongado o aumento transitório da
taxa plasmática de triglicerídeos pode ser o resultado da estimulação lipolítica no
adipócito mediada pela hormona lipase-sensitiva; a subsequente diminuição poderá
ser o reflexo duma superior atividade da lipase lipoproteica no músculo esquelético

164
que após depleção ou abaixamento dos níveis de substratos endógenos promoverá
uma superior utilização pelo músculo dos substratos exógenos. A taxa de concentração
de colesterol total plasmático subiu após os 50-km de prova. Este aumento é
corroborado por Niemela et al.(1984), mas contrariado por Goodyear et al.(1990) que
após maratona (feminina) verificaram uma ligeira diminuição do colesterol plasmático
total a que correspondeu um ligeiro aumento da fração HDL e uma significativa
(p<0.05) diminuição da fração LDL.
Como parece que mesmo em atletas bem hidratados no decurso do exercício
prolongado as variações do volume plasmático são nítidas (Maughan et al.,1985), a
alteração de alguns indicadores plasmáticos estará em certa medida relacionada com a
hemoconcentração. No entanto, Pastene et al. (1996) contrariam esta posição,
evidenciando que o volume plasmático, durante o exercício, tende a ser mantido,
dentro de certos limites, à custa de várias fontes endógenas.
As principais conclusões deste estudo evidenciam em todos os sujeitos:
- a emergência de proteinúria, cetonúria e bilirrubinúria
- o aumento claro de várias células (eritrócitos, leucócitos e epiteliais) no sedimento da
urina
- aumento da concentração plasmática de hemoglobina
- leucocitose pronunciada, fundamentalmente determinada pelo aumento da
contagem de neutrófilos
- aumento do break down das reservas proteicas como é comprovado pelo aumento
da taxa plasmática de ureia
- o aumento da creatinina indicia alteração da função renal com afetação da taxa de
filtração glomerular
- o aumento severo das enzimas séricas evidenciam forte destruição tecidular quer
hepática quer muscular (rabdomiólise)
- o aumento do cortisol aponta para uma superior produção hepática de glucose,
libertação de aminoácidos pelos tecidos periféricos e aumento da taxa de
gliconeogénese; este aumento poderá estar também relacionado com o estado
transitório de imunodepressão subsequente ao exercício
- o aumento de ferro plasmático indicia uma severa destruição eritrocitária

165
Malgrado o reduzido número de sujeitos do presente estudo com nível de treino mais
reduzido (2), a discrepância de comportamento de alguns indicadores sugere que a
agressão sistémica nos sujeitos menos treinados é mais marcada. Tal pode ser
sugerido pelos sinais mais evidentes de imunodepressão (aumentos mais nítidos de
leucócitos e neutrófilos) e taxas superiores de agressão tecidular (muscular e hepática)
como pode ser visto pelos aumentos dramáticos das várias enzimas séricas, a que
acresce o tempo dilatado do processo de recuperação. Estudos ulteriores terão de
controlar com maior eficácia a taxa de desidratação, e com maior número de sujeitos
estender no tempo a análise do processo de recuperação.

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