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Arte Brasileira

Prof. Francisco Ponciano Vieira


Prof.ª Carla Carvalho

2012
Copyright © UNIASSELVI 2012

Elaboração:
Prof. Francisco Ponciano Vieira

Revisão, Diagramação e Produção:


Centro Universitário Leonardo da Vinci – UNIASSELVI

Ficha catalográfica elaborada na fonte pela Biblioteca Dante Alighieri


UNIASSELVI – Indaial.

709.81
V658a Vieira, Francisco Ponciano
Arte brasileira / Francisco Ponciano Vieira e Carla Carvalho.
Indaial : Uniasselvi, 2012.
218 p. : il

ISBN 978-85-7830- 564-2

1. Arte brasileira.
I. Centro Universitário Leonardo da Vinci
II. Núcleo de Ensino a Distância III. Título
Apresentação
Caro(a) acadêmico(a)!

Seja bem-vindo aos estudos referentes à Arte Brasileira. Caminharemos


juntos, de mãos dadas, com o objetivo de auxiliá-lo (a) no propósito de
compreensão dos processos de transformações ocorridos na Arte Brasileira.
Para isso, essa disciplina vai abordar as relações entre as culturas indígena,
africana e europeia, que se articulam na constituição dos processos de
formação da cultura brasileira.

É importante considerar que seu curso é uma licenciatura, por isso sua
formação precisa ter foco na ação do professor, entendendo que a docência em
arte se constitui uma profissão complexa. Pensamos assim, pois ao professor
de arte é necessário compreender os processos técnicos, culturais e históricos
da arte, além de compreender como os seres humanos se relacionam com
a arte. Nesse sentido, este Caderno de Estudos relacionará os conteúdos
históricos às reflexões acerca do ensino da arte.

Numa sociedade como a nossa, formada por multiculturas, o projeto


que exibimos pretende ser o estimulador de uma visão relacional que articula
elementos próprios do interior da cultura existente em nosso país aos contextos
que bebemos, na medida em que fomos colonizados por europeus. Adotamos
para a apresentação dessa temática a linha do tempo, com o objetivo de
subsidiar você, leitor, a refletir sobre a diversidade cultural aqui existente.

É importante considerar que a arte é expressão do ser humano nas


suas relações com a sociedade, com os outros seres humanos e com ele mesmo.
Nesse processo, que é dialético e dinâmico, é que o ser humano constitui suas
formas de ver e perceber o mundo. Ressaltamos essa consideração, pois o
que apresentaremos são produções artísticas marcadas pelos contextos
culturais aos quais estavam inseridas no momento de sua criação, bem como
pela história vivida nesse período. Ao ler o que aqui registramos, lembre-se
sempre disso: a arte é marcada histórica e culturalmente.

Também traçaremos um perfil acerca da Arte Moderna, no Brasil. Seu


marco inicial é sinalizado pela Semana de Arte Moderna de 1922, importante
movimento modernista. Neste evento, diversos artistas, de diferentes
segmentos e movimentos, se reúnem e apresentam ao público uma nova
forma de expressão, como meio de romper com os padrões antigos.

III
Desejamos a você uma boa viagem pela Arte Brasileira. Acreditamos
que, à medida que você conhecer um pouco mais sobre a história da Arte
Brasileira, estará conhecendo mais sobre sua história, seu jeito de ver e pensar
sobre o Brasil e, nesse processo, sobre você mesmo.

Vamos começar!

Prof. Francisco Ponciano Vieira


Profª. Carla Carvalho

UNI

Você já me conhece das outras disciplinas? Não? É calouro? Enfim, tanto


para você que está chegando agora à UNIASSELVI quanto para você que já é veterano, há
novidades em nosso material.

Na Educação a Distância, o livro impresso, entregue a todos os acadêmicos desde 2005, é


o material base da disciplina. A partir de 2017, nossos livros estão de visual novo, com um
formato mais prático, que cabe na bolsa e facilita a leitura.

O conteúdo continua na íntegra, mas a estrutura interna foi aperfeiçoada com nova
diagramação no texto, aproveitando ao máximo o espaço da página, o que também
contribui para diminuir a extração de árvores para produção de folhas de papel, por exemplo.

Assim, a UNIASSELVI, preocupando-se com o impacto de nossas ações sobre o ambiente,


apresenta também este livro no formato digital. Assim, você, acadêmico, tem a possibilidade
de estudá-lo com versatilidade nas telas do celular, tablet ou computador.
 
Eu mesmo, UNI, ganhei um novo layout, você me verá frequentemente e surgirei para
apresentar dicas de vídeos e outras fontes de conhecimento que complementam o assunto
em questão.

Todos esses ajustes foram pensados a partir de relatos que recebemos nas pesquisas
institucionais sobre os materiais impressos, para que você, nossa maior prioridade, possa
continuar seus estudos com um material de qualidade.

Aproveito o momento para convidá-lo para um bate-papo sobre o Exame Nacional de


Desempenho de Estudantes – ENADE.
 
Bons estudos!

IV
UNI

Olá acadêmico! Para melhorar a qualidade dos


materiais ofertados a você e dinamizar ainda mais
os seus estudos, a Uniasselvi disponibiliza materiais
que possuem o código QR Code, que é um código
que permite que você acesse um conteúdo interativo
relacionado ao tema que você está estudando. Para
utilizar essa ferramenta, acesse as lojas de aplicativos
e baixe um leitor de QR Code. Depois, é só aproveitar
mais essa facilidade para aprimorar seus estudos!

V
VI
Sumário
UNIDADE 1 - OS PRIMÓRDIOS DA ARTE NO BRASIL ............................................................. 1

TÓPICO 1 - A PRÉ-HISTÓRIA ............................................................................................................. 3


1 INTRODUÇÃO ..................................................................................................................................... 3
2 PERÍODO PRÉ-HISTÓRICO ............................................................................................................. 4
2.1 REGISTROS NATURALISTAS ...................................................................................................... 6
2.2 REGISTROS GEOMÉTRICOS ........................................................................................................ 7
2.3 TÉCNICAS UTILIZADAS NAS INSCRIÇÕES RUPESTRES .................................................... 8
3 VESTÍGIOS DE OCUPAÇÕES HUMANAS NA PRÉ-HISTÓRIA ............................................ 10
LEITURA COMPLEMENTAR ............................................................................................................... 14
RESUMO DO TÓPICO 1 ....................................................................................................................... 16
AUTOATIVIDADE ................................................................................................................................. 17

TÓPICO 2 - AS CULTURAS MARAJOARA E SANTARÉM .......................................................... 19


1 INTRODUÇÃO ..................................................................................................................................... 19
2 A CULTURA MARAJOARA ............................................................................................................... 20
3 CULTURA SANTARÉM ...................................................................................................................... 23
LEITURA COMPLEMENTAR ............................................................................................................... 26
RESUMO DO TÓPICO 2 ....................................................................................................................... 28
AUTOATIVIDADE ................................................................................................................................. 29

TÓPICO 3 - INFLUÊNCIAS INDÍGENAS NA ARTE ...................................................................... 31


1 INTRODUÇÃO ..................................................................................................................................... 31
2 ARTE INDÍGENA ................................................................................................................................. 32
2.1 ARTE CERAMISTA ......................................................................................................................... 33
2.2 A ARTE DE TECER TRAMAR E TRANÇAR .............................................................................. 35
2.3 ARTE PLUMÁRIA .......................................................................................................................... 36
2.4 ARTE DAS MÁSCARAS ................................................................................................................ 37
2.5 ARTE DA PINTURA CORPORAL ............................................................................................... 38
LEITURA COMPLEMENTAR ............................................................................................................... 39
RESUMO DO TÓPICO 3 ....................................................................................................................... 42
AUTOATIVIDADE ................................................................................................................................. 43

TÓPICO 4 - REFLEXÕES ACERCA DO ENSINO DA ARTE ......................................................... 45


1 INTRODUÇÃO ..................................................................................................................................... 45
2 A SELEÇÃO DE CONTEÚDOS ......................................................................................................... 46
3 SOBRE O ENSINO DA ARTE ............................................................................................................ 47
LEITURA COMPLEMENTAR ............................................................................................................... 49
RESUMO DO TÓPICO 3 ....................................................................................................................... 51
AUTOATIVIDADE ................................................................................................................................. 52

UNIDADE 2 - OS PORTUGUESES NO BRASIL .............................................................................. 53

TÓPICO 1 - A ARTE NO BRASIL COLÔNIA ................................................................................... 55

VII
1 INTRODUÇÃO ..................................................................................................................................... 55
2 INÍCIO DA ARTE COLONIAL ......................................................................................................... 56
3 AS FORTIFICAÇÕES ........................................................................................................................... 59
4 AS CONSTRUÇÕES RELIGIOSAS .................................................................................................. 61
LEITURA COMPLEMENTAR ............................................................................................................... 63
RESUMO DO TÓPICO 1 ....................................................................................................................... 65
AUTOATIVIDADE ................................................................................................................................. 66

TÓPICO 2 - A OPULÊNCIA DO BARROCO ..................................................................................... 67


1 INTRODUÇÃO ..................................................................................................................................... 67
2 O BARROCO NO BRASIL ................................................................................................................. 68
2.1 IGREJAS BARROCAS ..................................................................................................................... 69
2.2 ALEIJADINHO ................................................................................................................................ 72
LEITURA COMPLEMENTAR ............................................................................................................... 76
RESUMO DO TÓPICO 2 ....................................................................................................................... 80
AUTOATIVIDADE ................................................................................................................................. 81

TÓPICO 3 - OS HOLANDESES NO BRASIL .................................................................................... 83


1 INTRODUÇÃO ..................................................................................................................................... 83
2 OS HOLANDESES NO NORDESTE ................................................................................................ 83
LEITURA COMPLEMENTAR ............................................................................................................... 88
RESUMO DO TÓPICO 3 ....................................................................................................................... 92
AUTOATIVIDADE ................................................................................................................................. 93

TÓPICO 4: O LEGADO DA CULTURA AFRICANA PARA O BRASIL ...................................... 95


1 INTRODUÇÃO ..................................................................................................................................... 95
2 A CULTURA AFRICANA .................................................................................................................... 95
LEITURA COMPLEMENTAR ............................................................................................................... 103
RESUMO DO TÓPICO 4 ....................................................................................................................... 104
AUTOATIVIDADE ................................................................................................................................. 105

TÓPICO 5 - REFLEXÕES ACERCA DO MULTICULTURALISMO E O ENSINO


DA ARTE ............................................................................................................................ 107
1 INTRODUÇÃO ..................................................................................................................................... 107
LEITURA COMPLEMENTAR ............................................................................................................... 110
RESUMO DO TÓPICO 5 ....................................................................................................................... 113
AUTOATIVIDADE ................................................................................................................................. 114

UNIDADE 3 - RUMO À CONSTRUÇÃO DE UMA IDENTIDADE NACIONAL ..................... 115

TÓPICO 1 - A FAMÍLIA REAL NO BRASIL ...................................................................................... 117


1 INTRODUÇÃO ..................................................................................................................................... 117
2 A CHEGADA DA CORTE .................................................................................................................. 117
3 A MISSÃO ARTÍSTICA FRANCESA ............................................................................................... 118
3.1 OUTROS ARTISTAS ESTRANGEIROS NO BRASIL ................................................................. 122
3.2 NEOCLASSICISMO ........................................................................................................................ 126
3.3 ARTISTAS BRASILEIROS .............................................................................................................. 128
3.3.1 Augusto Müller .......................................................................................................................... 128
3.3.2 Pedro Américo de Figueiredo e Melo ..................................................................................... 129
3.3.3 Victor Meirelles .......................................................................................................................... 132
3.3.4 José Ferraz de Almeida Júnior ................................................................................................. 133
3.3.5 Antônio Diogo da Silva Parreiras ............................................................................................ 135
3.3.6 Eliseu D’Angelo Visconti ......................................................................................................... 136

VIII
4 ECLETISMO .......................................................................................................................................... 139
LEITURA COMPLEMENTAR ............................................................................................................... 143
RESUMO DO TÓPICO 1 ....................................................................................................................... 145
AUTOATIVIDADE ................................................................................................................................. 146

TÓPICO 2 - MODERNISMO NO BRASIL ......................................................................................... 147


1 INTRODUÇÃO ..................................................................................................................................... 147
2 SEMANA DE ARTE MODERNA ...................................................................................................... 148
3 NACIONALISTAS: PAU-BRASIL, VERDE-AMARELISMO E ANTROPOFAGISMO ......... 156
3.1 O MOVIMENTO PAU-BRASIL ..................................................................................................... 157
3.2 VERDE- AMARELISMO ................................................................................................................ 158
3.3 ANTROPOFAGISMO ..................................................................................................................... 159
LEITURA COMPLEMENTAR ............................................................................................................... 160
RESUMO DO TÓPICO 2 ....................................................................................................................... 162
AUTOATIVIDADE ................................................................................................................................. 163

TÓPICO 3 - FORMAÇÃO DE GRUPOS ARTÍSTICOS PÓS DÉCADA DE 1930 ...................... 165


1 INTRODUÇÃO ..................................................................................................................................... 165
2 FORMAÇÃO DE SOCIEDADES, CLUBES E GRUPOS ............................................................... 165
2.1 NÚCLEO BERNARDELLI ............................................................................................................. 166
2.2 CLUBE DOS ARTISTAS MODERNOS ......................................................................................... 168
2.3 GRUPO SANTA HELENA ............................................................................................................. 170
LEITURA COMPLEMENTAR ............................................................................................................... 172
RESUMO DO TÓPICO 3 ....................................................................................................................... 176
AUTOATIVIDADE ................................................................................................................................. 177

TÓPICO 4 - MOVIMENTOS ARTÍSTICOS: MODERNISMO E PÓS-MODERNISMO ........ 179


1 INTRODUÇÃO ..................................................................................................................................... 179
2 MODERNISMO .................................................................................................................................... 180
2.1 ABSTRACIONISMO ....................................................................................................................... 180
2.2 CONCRETISMO .............................................................................................................................. 182
2.3 NEOCONCRETISMO ..................................................................................................................... 183
2.4 TACHISTAS ...................................................................................................................................... 184
2.5 NOVO REALISMO ......................................................................................................................... 186
2.6 O SURREALISMO ........................................................................................................................... 187
2.7 PINTURA INGÊNUA E PRIMITIVA ........................................................................................... 189
2.8 POP ART ........................................................................................................................................... 190
3 PÓS-MODERNISMO .......................................................................................................................... 193
LEITURA COMPLEMENTAR ............................................................................................................... 196
RESUMO DO TÓPICO 4 ....................................................................................................................... 202
AUTOATIVIDADE ................................................................................................................................. 203

TÓPICO 5 - O ENSINO DA ARTE MODERNA E CONTEMPORÂNEA BRASILEIRA .......... 205


1 INTRODUÇÃO ..................................................................................................................................... 205
LEITURA COMPLEMENTAR ............................................................................................................... 211
RESUMO DO TÓPICO 5 ....................................................................................................................... 215
AUTOATIVIDADE ................................................................................................................................. 216
REFERÊNCIAS ......................................................................................................................................... 217

IX
X
UNIDADE 1

OS PRIMÓRDIOS DA ARTE NO BRASIL

OBJETIVOS DE APRENDIZAGEM
A partir do estudo desta unidade, você estará apto(a) a:

• compreender a Pré-História brasileira;

• conhecer as culturas Marajoara e Santarém como antigas civilizações bra-


sileiras;

• perceber a influência indígena na Arte Brasileira.

• sistematizar reflexões acerca do ensino da Arte Brasileira numa perspecti-


va histórica.

PLANO DE ESTUDOS
Esta unidade está dividida em quatro tópicos. No final de cada um deles,
você encontrará atividades que o(a) levarão a exercitar os conhecimentos
adquiridos.

TÓPICO 1 – A PRÉ-HISTÓRIA

TÓPICO 2 – AS CULTURAS MARAJOARA E SANTARÉM

TÓPICO 3 – INFLUÊNCIAS INDÍGENAS NA ARTE

TÓPICO 4 – RELAÇÕES COM O ENSINO DA ARTE

Assista ao vídeo
desta unidade.

1
2
UNIDADE 1
TÓPICO 1

A PRÉ-HISTÓRIA

1 INTRODUÇÃO

Olá! Seja bem-vindo(a) à disciplina de Arte Brasileira. Nosso foco de


discussão desse Caderno de Estudos será a Arte Brasileira, compreendendo-a
como elemento da cultura, articulada a um momento histórico com características
próprias que a identificam e a diferenciam de outras produções humanas.

Você já se perguntou por que o ser humano, em determinado momento,


começou a desenhar nas paredes? Por que em determinado momento o ser humano
começou a fazer arte?

Bem, é na relação do ser humano com os outros homens e com o local


em que vive que o homem percebe sua existência e constitui o que chamamos de
cultura. A arte é parte da cultura e resultado da relação do sujeito com o contexto
cultural e histórico em que vive, com a relação com as outras pessoas e com ele
mesmo.

Partindo desse indicador, podemos compreender que, seja qual for a


produção artística à qual nos referimos nesse caderno, ela é produto das condições
sociais, culturais e tecnológicas de seu tempo. Assim, num processo dialético é que
o ser humano se constitui, à medida que compreende o mundo, os outros homens
e a si mesmo.

Bem, lá nos primórdios, os pioneiros da arte eram pessoas que não


compreendiam e explicavam o que viviam como explicamos hoje, pois a ciência
e a religião não haviam sido constituídas. Assim, toda e qualquer relação do
ser humano com a natureza era inexplicável e, por isso, complexa. Para Peixoto
(2003, p. 53), a arte é um “produto humano complexo e completo”, que envolve “a
elaboração de uma certa compreensão do mundo e a abstração para tomá-la como
conteúdo da obra”.

Afinal, por que estou iniciando nosso texto falando sobre isso?

Podemos identificar registros da arte no Brasil antes mesmo de Pedro


Álvares Cabral aportar em terras brasileiras, em 1500. Quando ele aqui chegou,
percebeu que nosso território já tinha sido desbravado por grupos nômades e
seminômades, tempos atrás.
3
UNIDADE 1 | OS PRIMÓRDIOS DA ARTE NO BRASIL

Os fósseis e as inscrições rupestres são os testemunhos da existência de


nossos antecessores, pois eles deixaram impressos nas paredes das cavernas,
grutas, pedras, registros simbólicos com motivos naturalistas e geométricos,
muitos retratando seu cotidiano.

Philip Baxter Meggs (1942-2002) em seu livro A History of Graphic Design


afirma que a Pré-História serviu de palco para o nascimento da comunicação visual,
pois os desenhos primitivos, num sentido mais amplo, eram desenvolvidos como
forma utilitária e ritualística. Ele aponta que o foco do desenho, neste período, era
a comunicação e não o começo das belas artes, como a concebemos.

Este período da História da Humanidade não foi documentado por nenhum


registro escrito, por isso denominou-se Pré-História, pois antecede a escrita. O que
conhecemos destas antigas civilizações origina-se das pesquisas e estudos realizados
por arqueólogos, paleantólogos, antropólogos e pesquisadores. Eles reconstituiem
essas culturas através da análise de seus vestígios que o tempo não apagou como as
inscrições rupestres, fragmentos de objetos e utensílios, fósseis etc.

UNI

O fim do período Pré-Histórico acontece com a descoberta da escrita,


originando a era denominada de História. Esta passagem da Pré-História à História não
ocorre abruptamente e equivalente nos vários continentes e, sim, de forma inconstante
e desigual. Foram as grandes navegações que propiciaram a propagação da escrita além
fronteiras. Tomando como exemplo o Brasil, em relação a outros países, pode-se dizer que
o período Pré-Histórico se prolongou até sua colonização, em 1531.

2 PERÍODO PRÉ-HISTÓRICO
Percebendo a história da humanidade, verifica-se que, já em tempos
remotos, os povos da pré-história, mesmo sem conhecer a escrita, retratavam os
acontecimentos através de inscrições rupestres.

Analisando a trajetória humana no Brasil, observamos que há indícios da


existência de povos acerca de 11,5 mil anos, considerado período Pré-Histórico
até a colonização pelos portugueses, em 1500. Prova desta presença são as
manifestações que o tempo não apagou como as inscrições rupestres, fósseis e
pedaços de artefatos.

As pinturas desenvolvidas pelo homem na Pré-História, mesmo sendo


impossível aos arqueólogos interpretá-las de forma exata, são consideradas
representações simbólicas que retratam cenas da vida cotidiana e eventos
cerimoniais.
4
TÓPICO 1 | A PRÉ-HISTÓRIA

Também deduz-se que, muitos dos ágrafos desenvolvidos pelos primitivos


eram meios utilizados para se comunicarem com entidades superiores e também
elaborarem reproduções idealizadas da natureza, muitas vezes para garantir uma
boa caça e, consequentemente, a sua sobrevivência.

Sabemos que não foi com a intenção de “fazer obra de arte” que o
homem da idade da pedra pintou ou modelou com as próprias mãos,
formas naturais, mas, sim, para assegurar a reprodução da caça, atraí-la
às armadilhas, ou ainda para se apoderar da força dos animais ferozes;
o artista primitivo era um feiticeiro cujos desenhos tinham um valor
encantatório, e se ele dedicava tanta atenção à verdade viva era para
dar às formas o maior valor de reprodução possível, transmitindo-lhes
a virtude da própria criatura. (BAZIM, 1976, p. 9).

Para ele, considerado “primitivo” nestas manifestações, a imagem já não


era um simulacro; provida das mesmas qualidades vivas que o ser reproduzido, a
imagem é uma operação mágica através da qual o homem manifesta o seu poder
na ordem cósmica.

Essas manifestações artísticas, conforme pintura rupestre (Figura 1)


encontrada no sítio Boqueirão da Pedra Furada, no Parque Nacional da Serra da
Capivari, no Piauí (Figura 2), atualmente, são consideradas verdadeiras obras de
arte devido ao seu valor cultural para a humanidade.

FIGURA 1 – PINTURA RUPESTRE (PI) FIGURA 2 – SÍTIO BOQUEIRÃO (PI)

FONTE: TIRAPELI, Percival. Arte FONTE: TIRAPELI, Percival. Arte Brasileira: arte
Brasileira: arte indígena do pré- indígena do pré-colonial à contemporânea.
colonial à contemporânea. São Paulo: São Paulo: Nacional, 2007. p. 13.
Nacional, 2007. p. 12.

5
UNIDADE 1 | OS PRIMÓRDIOS DA ARTE NO BRASIL

As pesquisas científicas de antigas culturas que existiram no Brasil,


a partir das descobertas realizadas no sudeste do Piauí, abrem uma
perspectiva nova tanto para a historiografia como para a Arte Brasileira.
Esses fatos nos permitem ver mais claramente que a história de nosso
país está ligada à história do mundo todo, e que as nossas raízes são
muito mais profundas do que o limite inicial de uma data, no tão
próximo século XV. (PROENÇA, 1999, p. 189).

O homem da Pré-História deixou impresso nas paredes das cavernas, grutas,


rochedos, pedra, leitos dos rios os mais variados temas que se tornaram registros
simbólicos de pessoas, animais, plantas e objetos, podendo ser classificados em
motivos naturalistas (figurativos) e geométricos.

UNI

É importante compreendermos o que aconteceu e como aconteceu essa história,


pois somos resultado desse processo, está em nós marcada a história da humanidade. De
alguma maneira, nossa história se entrelaça a histórias desses homens e mulheres que
naquela época elaboraram os primeiros registros artísticos no Brasil.

E
IMPORTANT

É no decurso do esforço de várias ciências, unindo seus conhecimentos através


de pesquisas científicas, que temos o conhecimento do modo de vida das civilizações Pré-
Históricas. Uma delas é a Arqueologia, que é a ciência que estuda os vestígios materiais
deixados pelo homem como objetos, armas, moradias, adornos e as próprias inscrições
rupestres, como veremos a seguir, nos registros naturalistas e geométricos!

2.1 REGISTROS NATURALISTAS


Nos registros naturalistas há predominância de formas humanas isoladas
ou em grupos bem como representações de animais e plantas. Estas imagens
aparecem em cenas de guerra, luta, caça, coito e trabalhos coletivos. As pessoas,
em algumas situações, são retratadas usando armas como lanças e bastões, cestas
e outros utensílios.

Os animais e as plantas, conjuntamente com o homem, muitas vezes, fazem


parte das mesmas composições. Nessas representações, ora são retratados sozinhos
ora em combates com outros animais ou com o próprio homem. Os animais cuja
representação é mais frequente são os veados, as onças, os peixes e os pássaros.

Nas Figuras 3 e 4, podem ser vistas as inscrições rupestres encontradas em


sítios arqueológicos dentro do Parque Nacional Serra da Capivara (PI).
6
TÓPICO 1 | A PRÉ-HISTÓRIA

FIGURA 3 – CAPIVARA PIAUÍ

FONTE: Disponível em: <http://autogestnacabeca.blogspot.com/2007/09/so-


raimundo-nonato-piaubrasil.html>. Acesso em: 15 maio 2008.

FIGURA 4 – CERIMONIAL. PIAUÍ

FONTE: Disponível em: <http://autogestnacabeca.blogspot.com/2007/09/so-


raimundo-nonato-piaubrasil.html>. Acesso em: 15 maio 2008.

2.2 REGISTROS GEOMÉTRICOS


As inscrições rupestres sinalizadas com motivos geométricos destacam-se
pela diversidade de elementos e formas geométricas.

Alguns grupos utilizavam, por exemplo, desenhos trabalhando com


modelos não figurativos representando pontos, linhas, traços espirais, cruzes,
círculos e outros elementos geométricos em diferentes tamanhos e combinações.
A Figura 5 mostra elementos geométricos, em forma de círculos concêntricos em
variadas modalidades pintadas nas paredes de um sítio arqueológico na Bahia.
7
UNIDADE 1 | OS PRIMÓRDIOS DA ARTE NO BRASIL

FIGURA 5 – PINTURAS RUPESTRES COM MOTIVOS GEOMÉTRICOS (GOIÁS)

FONTE: PROENÇA, Graça. Descobrindo a História da Arte. São Paulo: Ática, 2006. p. 12.

UNI

“O estudo da arte de um povo tem a finalidade de enriquecer o conhecimento


individual de cada um, através do aprimoramento do gosto e da sensibilidade, estabelece
“uma ponte entre o espiritual e o material”. É importante conhecer os períodos da arte em
que aconteceram fatos novos, o porquê e qual a sua contribuição para a vida moderna.”
(HARRES, 1979, p. 11).

2.3 TÉCNICAS UTILIZADAS NAS INSCRIÇÕES RUPESTRES


Muitos sítios arqueológicos apresentam as duas técnicas de representação
gráfica mais utilizada pelo homem primitivo: a pintura e a gravura. A gravura
se dá pelo processo de abrasão, ou seja, pela raspagem das pedras deixando as
formas das figuras em baixo relevo.

Para pintar, o homem pré-histórico se valia de elementos naturais, nos quais


imprimia, como nas paredes das rochas e cavernas, imagens que eram decalcadas.
Estas se fixam quando os elementos eram retirados.

Segundo a obra de Calabria e Martins (1997, p.16), para pintar, o homem pré-
histórico “produzia suas tintas misturando terra (geralmente avermelhada por ser
rica em minérios) com carvão, sangue e gorduras de animais.” Também utilizava
as mãos e, possivelmente, outros artefatos como pincéis rudimentares (como tocos
de madeira, osso), “conforme alguns objetos encontrados por arqueólogos.”
8
TÓPICO 1 | A PRÉ-HISTÓRIA

As Figuras 6 e 7 são dois exemplos distintos de técnicas utilizadas pelo


homem pré-histórico. Na primeira, localizada no sítio Caldeirão do Deolindo – que
é um depósito natural de água, um caldeirão – dentro do Parque Nacional Serra
da Capivara (PI), encontramos a utilização da técnica por abrasão. Já na Figura 7,
outro sítio arqueológico dentro do Parque Nacional Serra da Capivara (PI), pode-
se observar a utilização de tintas produzidas por elementos naturais.

FIGURA 6 – TÉCNICA POR ABRASÃO

FONTE: Disponível em: <http://www.fumdham.org.br/pinturas.asp>. Acesso


em: 15 maio 2008.

FIGURA 7 – TÉCNICA POR PINTURA

FONTE: Disponível em: <http://www.fumdham.org.br/pinturas.asp>. Acesso


em: 15 maio 2008.

9
UNIDADE 1 | OS PRIMÓRDIOS DA ARTE NO BRASIL

UNI

O parque Nacional Serra da Capivara, situado no estado do Piauí, foi declarado


como sendo Patrimônio Natural da Humanidade devido ao seu valor natural e cultural.
Nele encontra-se uma importante diversidade biológica situada numa das últimas áreas do
semiárido. Também concentram-se, aproximadamente, 912 sítios arqueológicos, quase que,
na sua totalidade, de pinturas e gravuras rupestres.

3 VESTÍGIOS DE OCUPAÇÕES HUMANAS NA PRÉ-HISTÓRIA


No Brasil, encontram-se importantes sítios arqueológicos que denotam a
presença humana há aproximadamente 11,5 mil anos a.C. Um desses importantes
sítios arqueológicos está localizado no município de São Raimundo Nonato, João
Costa, Brejo do Piauí e Coronel José Dias, numa região situada no sudeste do
Estado do Piauí, denominada Parque Nacional Serra da Capivara.

Lá, encontram-se vestígios de pinturas e gravuras rupestres. Estes registros,


provavelmente, são de autoria de povos que se valiam das cavernas das regiões
pelas quais passavam para se protegerem.

Anterior à descoberta de um fóssil humano com traços negroides na Lapa


Vermelha – entre Lagoa Santa e Pedro Leopoldo, na região metropolitana de Belo
Horizonte – pela equipe franco-brasileira coordenada pelos arqueólogos franceses
Anette Laming e André Prous, pensava-se que aqui todos os antigos habitantes
descendiam da raça mongol, característica dos índios atuais.

A ilustração do mapa mostra a entrada do homem pré-histórico nas


Américas, que se deu pelo Estreito de Bering, há poucos milhares de anos.

FIGURA 8 – ENTRADA DO HOMEM

FONTE: Disponível em: <www1.folha.uol.com.br/folha/sinapse/ult1063u219.shtml>.


Acesso em: 23 maio. 2008.

10
TÓPICO 1 | A PRÉ-HISTÓRIA

FIGURA 9 – LUZIA

FONTE: PROENÇA, Graça. A História da Arte. São Paulo: Ática,


2006. p. 10.

1 – Sibéria. Ela ocupa 58% da área da Federação Russa. E é lá, na aldeia de


Oymyakon, que é considerado o lugar habitado mais frio do planeta.

2 – Estreito de Bering. É um estreito entre o Cabo Dezhnev, o ponto extremo


oriental do continente asiático e o Cabo Prince of Wales, o extremo ocidental do
continente americano, com cerca de 85 km de largura e uma profundidade de
30-50 m.

3 – Novo México. O modelo “Clóvis first” (Clóvis primeiro) diz que tribos com
características mongoloides atravessaram o estreito de Bering há, no máximo,
12 mil anos. A primeira cultura identificada nessa leva é a do sítio arqueológico
de Clóvis, no Novo México, que produziu pontas de lança características.

4 – Sítio arqueológico no Pará. Monte Alegre, Pará. Nessa região, foram


encontrados, em 1996, os mais antigos artefatos e pinturas já vistos na Amazônia.

5 – Lapa Vermelha (MG). O modelo dos dois componentes biológicos, proposto


por Walter Neves, diz que um povo mais antigo, com traços semelhantes aos dos
atuais africanos e australianos, chegou à América há cerca de quinze mil anos. É
a essa população que pertenceria Luzia, a mulher de 11,5 mil anos encontrada
no sítio arqueológico de Lapa Vermelha, perto de Lagoa Santa (MG). Milênios
depois, talvez há 10 mil anos, os ancestrais dos atuais indígenas teriam chegado
ao continente.

FONTE: Adaptado de: LOPES, José Reinaldo. O antropólogo em busca do inesperado. Disponível
em: <http:// www1.folha.uol.com.br/folha/sinapse/ult1063u219.shtml>. Acesso em: 23 maio 2008.

11
UNIDADE 1 | OS PRIMÓRDIOS DA ARTE NO BRASIL

UNI

Paleontólogos, arqueólogos e antropólogos afirmam que a ossada mais antiga de


um ser humano já encontrado na América é o crânio de Luzia, atualmente exposto no Museu
Nacional do Rio de Janeiro (Figura 8). Ao reconstituírem seu crânio, embasados em estudos
e testes e com o auxílio de aparelhos sofisticados como a tomografia computadorizada, a
datação a partir do carbono, esses pesquisadores observaram que Luzia morreu entre 20
e 25 anos. Possuía características negroides: sua face era alongada com queixo saliente,
as maçãs do rosto destacadas, nariz largo e achatado e o seus olhos arredondados, muito
parecidos com os aborígines africanos e australianos.

No mapa exposto na Figura 10, há vários registros de seres humanos


que viveram aqui há pelo menos 11,5 mil anos. Veja abaixo os principais sítios
arqueológicos no Brasil:

FIGURA 10 – SÍTIOS ARQUEOLÓGICOS

FONTE: VEJA. São Paulo: Abril, n. 1612, ago. 1999. p. 23.

12
TÓPICO 1 | A PRÉ-HISTÓRIA

FIGURAS 11 E 12 – PINTURAS RUPESTRES E RASPADOR

FONTE: Disponível em: <http://www.geocities.com/latrinchera2000/


articulos/America.html>. Acesso em: 15 maio 2008.

1 – Lapa Vermelha, Minas Gerais. Luzia foi identificada nesse sítio arqueológico
em 1975. É o mais antigo crânio humano conhecido em todo o continente
americano.

2 – Santana do Riacho, Minas Gerais. Há apenas 60 quilômetros de Lapa Vermelha,


concentram-se vários esqueletos humanos contemporâneos e também pinturas
rupestres e ferramentas pré-históricas.

3 – Vale do Peruaçu, Minas Gerais. Conta com pinturas rupestres datadas entre 11
mil e 12 mil anos, algumas com três cores e desenhos elaborados.

4 – Monte Alegre, Pará. Nessa região, foram encontrados em 1996 os mais antigos
artefatos e pinturas já vistos na Amazônia.

5 – Abrigo do Sol, Mato Grosso. Sítio arqueológico localizado em 1987 na beira do


Rio Guaporé, composto principalmente de ferramentas de pedra lascada.

6 – Serra da Capivara, Piauí. Um dos mais importantes sítios arqueológicos do


mundo, que tem mais de 25.000 pinturas rupestres e vestígios de ocupação
humana. Para saber mais sobre este museu a céu aberto acesse: http://www.
fumdham.org.br/parque.asp.
13
UNIDADE 1 | OS PRIMÓRDIOS DA ARTE NO BRASIL

7 – Rio Uruguai, Rio Grande do Sul. Sítio arqueológico localizado nos anos 80 com
restos de ferramentas de pedra e animais já extintos.

FONTE: VEJA. São Paulo: Abril, n. 1612, ago. 1999. p. 24.

TURO S
ESTUDOS FU

Caro(a) acadêmico(a), para aprofundar seus conhecimentos sobre o tema,


sugerimos a leitura de TIRAPELI (2007), ou a consulta dos sites: www.museu-goeldi.br/ -
Museu Paraense Emílio Goeldi, Belém do Pará, PA.
www.mae.usp.br/ - Museu de Arqueologia e Etnologia da Universidade de São Paulo, SP.
www.fundaj.gov.br/docs/indoc/muhne-p.html - Museu do Homem do Nordeste, Recife, PE.
www.fundaj.gov.br/docs/iesam/muhno-p.html - Museu do Homem do Norte, Manaus, AM.
www.iphan.gov.br – Instituto do Patrimônio Histórico e Artístico Nacional, Iphan.
http://www.fumdham.org.br – Fundação Museu do Homem Americano
www.lagoasanta.com.br/homem - Site sobre o Homem de Lagoa Santa

LEITURA COMPLEMENTAR

A ARTE DA PRÉ-HISTÓRIA BRASILEIRA

Graça Proença

O Brasil possui valiosos sítios arqueológicos em seu território, embora nem


sempre tenha sabido preservá‑los. Em Minas Gerais, por exemplo, na região que
abrange os municípios de Lagoa Santa, Vespasiano, Pedro Leopoldo, Matosinhos
e Prudente de Moraes, existiram grutas que traziam, em suas pedras, sinais de
uma cultura pré‑histórica no Brasil. Algumas dessas grutas, como a chamada Lapa
Vermelha, foram destruídas por fábricas de cimento que se abasteceram do calcário
existente em suas entranhas. Além dessas cavernas já destruídas, muitas outras
encontram‑se seriamente ameaçadas.

Das grutas da região, a única protegida por tombamento do IPHAN (Instituto


do Patrimônio Histórico e Artístico Nacional) é a gruta chamada Cerca Grande. Ela
é considerada importante monumento arqueológico por causa de suas pinturas
rupestres e de fósseis descobertos em seu interior, indicadores de antigas culturas
existentes em nosso país.
 
Naturalismo e Geometrismo: as duas faces da arte rupestre no Brasil

No sudeste do Estado do Piauí, município de São Raimundo Nonato, há


um importante sítio arqueológico onde, desde 1970, diversos pesquisadores vêm
trabalhando.
14
TÓPICO 1 | A PRÉ-HISTÓRIA

Em 1978, uma missão franco‑brasileira coletou uma grande quantidade de


dados e vestígios arqueológicos. Esses cientistas chegaram conclusões esclarecedoras
a respeito de grupos humanos que habitaram a região por volta do ano 6000 a.C., ou
talvez numa época mais remota ainda. Segundo as pesquisas, os primeiros habitantes
da área de São Raimundo Nonato – provavelmente caçadores‑coletores, nômades e
seminômades – utilizavam as grutas da região como abrigos ocasionais. A hipótese
mais aceita, portanto, é a de que esses homens foram os autores das obras pintadas
e gravadas nas grutas da região.

Os pesquisadores classificaram essas pinturas e gravuras em dois grandes


grupos: obras com motivos naturalistas e obras com motivos geométricos. Entre as
primeiras predominam as representações de figuras humanas que aparecem ora
isoladas, ora participando de um grupo, em movimentadas cenas de caça, guerra
e trabalhos coletivos. No grupo dos motivos naturalistas, encontram‑se também
figuras de animais, cujas representações mais frequentes são de veados, onças,
pássaros diversos, peixes e insetos

As figuras com motivos geométricos são muito variadas: apresentam


linhas paralelas, grupos de pontos, círculos, círculos concêntricos, cruzes, espirais
e triângulos.

A partir do estudo dos vestígios arqueológicos encontrados em São


Raimundo Nonato, os estudiosos levantaram a hipótese da existência de um estilo
artístico denominado Várzea Grande.

Esse estilo tem como característica a utilização preferencial da cor vermelha,


o predomínio dos motivos naturalistas, a representação de figuras antropomorfas e
zoomorfas (com corpo totalmente preenchido e os membros desenhados com traços)
e a abundância de representações animais e humanas de perfil. Nota‑se também a
frequente presença de cenas em que participam numerosas personagens, com temas
variados e que expressam grande dinamismo.

As pesquisas científicas de antigas culturas que existiram no Brasil, a partir


das descobertas realizadas no sudeste do Piauí, abrem uma perspectiva nova tanto
para a historiografia como para a Arte Brasileira. Esses fatos nos permitem ver mais
claramente que a história de nosso país está ligada à história do mundo todo, e que
as nossas raízes são muito mais profundas do que o limite inicial de uma data, no
tão próximo século XV
FONTE: PROENÇA, Graça. História da Arte. São Paulo: Ática, 1999. p. 187.

15
RESUMO DO TÓPICO 1
Neste tópico, você teve oportunidade de estudar importantes conteúdos
acerca dos primórdios da Arte Brasileira. Veja, a seguir, alguns itens:

 O período da Pré-História no Brasil tem seu início com os primeiros indícios


de vida humana, como as inscrições rupestres, espalhadas por muitos sítios
arqueológicos e os fósseis encontrados como o de Luzia, o mais antigo que foi
datado em 11,5 mil anos a.C. Tem seu final com o descobrimento do Brasil pelos
portugueses, em 1500.

 As pinturas desenvolvidas pelo homem na Pré-História, mesmo sendo impossível


aos arqueólogos interpretá-las de forma exata. São consideradas representações
simbólicas que retratam cenas da vida cotidiana e eventos cerimoniais.

 O homem da Pré-História deixou impresso nas paredes das cavernas grutas,


rochedos, pedra, leitos dos rios os mais variados temas que se tornaram registros
simbólicos de pessoas, animais, plantas e objetos, podendo ser classificados em
motivos naturalistas (figurativos) e geométricos.

 Nos registros naturalistas, há predominância de formas humanas isoladas ou


em grupos bem como representações de animais e plantas.

 As inscrições rupestres sinalizadas com motivos geométricos se destacam pela


diversidade de elementos e formas geométricas.

 Muitos sítios arqueológicos apresentam as duas técnicas de representação


gráfica mais utilizada pelo homem primitivo: a pintura e a gravura.

 Para a pintura, eram usados elementos naturais nos quais o homem primitivo
imprimia, nas paredes das rochas e cavernas, imagens que eram decalcadas. A
gravura se dava pelo processo de abrasão, ou seja, pela raspagem das pedras
deixando as formas das figuras em baixo relevo.

16
AUTOATIVIDADE

O período da Pré-História no Brasil tem seu início com os primeiros


indícios de vida humana, como as inscrições rupestres, espalhadas por
muitos sítios arqueológicos, e os fósseis encontrados como o de Luzia, o mais
antigo, que foi datado em 11,5 mil anos a.C. Este período tem seu final com o
descobrimento do Brasil pelos portugueses, em 1500. Para melhor fixar esta
fase da história da humanidade, desenvolva um painel com imagens, com
registros desta fase, identificando local, data e assunto. Também comente sobre
o papel desempenhado pela Arte durante o período Pré-Histórico.

Bom Trabalho!

Assista ao vídeo de
resolução desta questão

17
18
UNIDADE 1
TÓPICO 2

AS CULTURAS MARAJOARA E SANTARÉM

1 INTRODUÇÃO

Antes mesmo de Cabral descobrir o Brasil, em 1500, aqui, já havia arte.


Estas manifestações artísticas foram habilmente desenvolvidas pelos povos que
aqui viveram no considerado período pré-histórico brasileiro. “Sabemos da
existência deles por meio de vestígios arqueológicos: fragmentos de ossos e de
objetos, desenhos e pinturas gravados em rochas.” (PROENÇA, 2006, p. 10).

Muito dos seus legados estão espalhados pelo Brasil e no mundo, em


museus, entidades que desenvolvem pesquisas e nas mãos de colecionadores
privados. São peças que chamam a atenção pela complexidade de manufatura e
beleza.

Estas antigas civilizações deixaram suas marcas impressas no tempo


através de suas produções artísticas. É através do estudo iconográfico dessas
manifestações que podemos perceber seu modus vivendi.

Embora os ameríndios desenvolvessem coisas em comum, sabe-se que cada


cultura possuía talentos distintos materializados em artefatos de arte segundo suas
necessidades cotidianas e ritualísticas.

Abordaremos duas das diversas culturas indígenas que existiram em


tempos remotos: a Marajoara e a Santarém.

UNI

Foram encontrados restos arqueológicos indicando a existência de outros


povos mais adiantados, como a cultura Marajoara e Tapajônica, anteriores aos indígenas
que habitavam o Brasil na época de seu descobrimento, em 1500. Os que aqui habitavam,
neste período, foram considerados muito atrasados e de cultura rudimentar comparados aos
que os antecederam.

19
UNIDADE 1 | OS PRIMÓRDIOS DA ARTE NO BRASIL

2 A CULTURA MARAJOARA
No período pré-cabralino, entre os séculos V e XIV, na ilha de Marajó, ao
redor do delta do Rio Amazonas, nasceu a cultura marajoara. Esta cultura se deu
através de várias tribos indígenas que ali se estabeleceram. Não se sabe ao certo a
origem destes povos, porém muitos pesquisadores apontam como sendo a junção
de grupos nômades que saíram de outros pontos das Américas, como a Central, e
que aqui se instalaram.

Há muitas suposições sobre a verdadeira origem da cerâmica marajoara.


Muitos pesquisadores apontam que, na ilha de Marajó – ocupação que se deu por
volta do século I ao século XIV, conforme pesquisas arqueológicas – sucederam
cinco fases de apropriação por tribos distintas umas das outras, a nível cultural
e organizacional. Em ordem cronológica de tomada, as fases que se sucederam
foram: Ananatuba, Mangueiras, Formiga, Marajoara e Aruã.

A fase marajoara é considerada a quarta segundo ordem de ocupação da


ilha de Marajó e também a mais avançada. Este período, a quarta fase marajoara,
denominou-se também como policrônico, pois ele se caracteriza pela ação dos
índios de realizarem muitas atividades conjuntamente, todos fazem parte de um
sistema.

A cultura marajoara, além da cultura Santarém, é considerada como uma


das mais avançadas, ricas e interessantes. Deve-se isto, principalmente, por causa
da criação e produção de cerâmica de vários tipos, como os vasos, estatuetas,
pratos, tangas, urnas funerárias, bancos, potes, brinquedos e outros artefatos,
conforme Figuras 13, 14 e 15.

FIGURA 13 – VASO (1), ESTATUETA (2) E PRATO (3) MARAJOARA

FONTE: Disponível em: <http://www.marajoara.com/iconografia.html>. Acesso em: 15 maio 2008.

20
TÓPICO 2 | AS CULTURAS MARAJOARA E SANTARÉM

FIGURA 14 – TANGA E URNA FUNERÁRIA

FONTE: ZANINI, Walter, org. História Geral da Arte no Brasil. São Paulo: Instituto
Walther Moreira Salles, 1983. 2 v., il. p. 36.

FIGURA 15 – BANCO

FONTE: ZANINI, Walter, org. História Geral da Arte no Brasil. São


Paulo: Instituto Walther Moreira Salles, 1983. 2 v., il. p. 37.

Mas as peças que são mais conhecidas, devido a sua diversidade de formas e
texturas, são os vasos. Estes atendiam a vários propósitos, como uso doméstico (de
porte mais simples) e os cerimoniais e funerários (com decorações mais apuradas).

Na confecção das peças, para obterem resistência na liga da argila, os


índios realizavam combinações como outros elementos acrescentando cinzas,
ossos, cascalhos e conchas.

Após a modelagem os artefatos eram pintados manualmente, e utilizados


pigmentos de várias tonalidades, principalmente o vermelho, encontrado em
muitas peças. Em seguida, eram cozidas a céu aberto. Muitos objetos, na sua
finalização, eram envernizados, deixando-os com um aspecto brilhante.

Nos exemplares encontrados, do conjunto de obras das cerâmicas


marajoaras, foram catalogadas uma variedade de técnicas, aproximadamente
quinze, denunciando um dos mais intrincados e refinados estilos ceramistas da
América Latina do período pré-colonial.

21
UNIDADE 1 | OS PRIMÓRDIOS DA ARTE NO BRASIL

No século passado e neste, arqueólogos descobriram uma miríade


de cacos das peças cerâmicas produzidas por este povo. Dentre eles,
peças inteiras de raríssima beleza e durabilidade. Transformadas em
verdadeiras obras de arte pela cultura contemporânea, essas peças
encontram-se em museus, instituição de pesquisa e com colecionadores
particulares, no Brasil e no exterior. Elas são o principal elemento de
comunicação e informação desse povo, ao expressarem através de suas
formas icônicas seus valores e modos de vida. (JESUS, 2008).

Segundo Graça Proença (2006, p. 90), “a cultura dessa fase sofreu um lento,
mas constante declínio, até desaparecer completamente por volta de 1350, talvez
absorvida por outros povos que chegaram à ilha. Porém, deixaram um rico legado
que conta a sua história.”
A arqueóloga brasileira Cristiana Barreto, que levou uma exposição para
o museu Britânico, no ano de 2001, intitulada Unknown Amazon ou “Amazônia
Desconhecida” desejava, com esta manifestação, derrubar mitos.

Ela pretendia mostrar pesquisas recentes que relatavam sobre a ocupação


na Amazônia por civilizações sofisticadas distribuídas em cidades avançadas como
as tribos que ocuparam a ilha de Marajó e as tribos dos índios Tapajós.

Em uma das perguntas elaboradas pela BBC de Londres, em que Cristiane


Barreto é questionada sobre o passado indígena e a crença de que nossos índios
atuais pertenciam a antigas culturas que viviam em condições muito “primitivas”,
ela responde:

Nossa história vai ser reescrita e já está sendo reescrita. Já existem


manuais escolares onde se colocam esses achados e essas teorias, que
começam a ser comprovadas, de verdadeiras civilizações amazônicas.
Ao longo da história do Brasil, sempre houve mitos das cidades
perdidas da Amazônia, muitas lendas, e o fato de isso nunca ter sido
comprovado acabou criando uma decepção e até um complexo de
inferioridade nos brasileiros. Porque os países andinos têm os Incas,
até a Bolívia tem culturas mais avançadas, o México, com as culturas
Astecas e pré-Astecas. Nós não. Sempre tivemos aqueles indiozinhos,
com uma cultura material muito pobre, vivendo em pequenas aldeias
isoladas no meio da floresta. Com certeza, essa história vai ter de ser
reescrita agora. Vamos ter de entender que essa visão do índio pobre
brasileiro é decorrência do contato com o europeu. Os índios tinham
uma população muito maior e eram muito mais sofisticados em termos
de cultura material, antes do europeu chegar. O efeito do contato foi
brutal. (BARRETO, 2001).

Os vestígios da diversificada cultura dos povos que, há muito, habitaram


a ilha de Marajó, e sua expressiva arte ceramista que nos foi deixada como legado,
são provas contundentes de uma civilização avançada que existiu no passado e
que ainda não foi totalmente compreendida pelo homem.

22
TÓPICO 2 | AS CULTURAS MARAJOARA E SANTARÉM

NOTA

Para ler a entrevista na íntegra da arqueóloga brasileira Cristiana Barreto,


concedida a BBC de Londres, sobre as avançadas civilizações que habitaram a Amazônia
acesse o site: <http://www.bbc.co.uk/portuguese/noticias/2001/011005_amazonia.shtml>.
Ou para saber mais sobre a cultura marajoara acesse: <http://www.marajoara.com/>.

3 CULTURA SANTARÉM
Denominou-se cultura Santarém todos os fragmentos culturais deixados
próximos à junção do Rio Tapajós com o Amazonas séculos atrás.

Cabe dizer que os tapajós produziram artefatos utilizando diversos


materiais como: sementes, madeiras, algodão, cipós, folhas, etc., porém foram os
materiais não orgânicos como a cerâmica que resistiram, em maior quantidade, à
ação do tempo.

Alguns historiadores nomeiam a cultura santanense de tapajônica,


em virtude de sua localização próxima às margens do rio de mesmo nome. É
considerada por muitos pesquisadores uma das maiores culturas das Américas.

Seus objetos, confeccionados em cerâmica, possuem características


marcantes e muitos nos fazem lembrar, a arte chinesa antiga e o estilo barroco
devido a sua característica rebuscada e cheia de formas simbólicas.

Muitas peças possuem formas zoomórficas, outras mesclam imagens


humanas ou a junção das duas em complexas combinações em que são misturadas
técnicas de pintura, desenho e ornamentos em relevo.

Também podemos encontrar, em seu legado, as cariátides (Figuras 16 e17),


que são formas humanoides que se fixam na parte superior de vasos e outras peças.

Os vasos de cariátides foram assim denominados por Frederico Barata


(1950) em função de um dos seus componentes – as pequenas figuras
modeladas que sustentam uma vasilha sobre suas cabeças relembrando
os elementos clássicos da arquitetura grega. Eles são compostos por três
partes distintas superpostas (Figura X e Y). A primeira é um recipiente
semiesférico, com boca circular, borda direta e base arredondada,
apresentando incisões contornando a parte externa, localizadas próximas
à borda, e apêndices zoomorfos e antropozoomorfos [...]. A segunda
parte do recipiente é formada por três figuras antropomorfas modeladas
– as “cariátides” – que fazem a ligação entre o recipiente e a base [...]. A
terceira parte do vaso é a base, que possui forma anelar. São decoradas
com tratamento plástico, algumas vezes representando rostos, figuras
zoomorfas ou elementos não reconhecíveis. (GUAPINDAIA, 2004).

23
UNIDADE 1 | OS PRIMÓRDIOS DA ARTE NO BRASIL

FIGURA 16 – VASO DE CARIÁTIDES

FONTE: ZANINI, Walter, org. História Geral da Arte no Brasil. São Paulo:
Instituto Walther Moreira Salles, 1983. 2 v., il. p. 38.

FIGURA 17 – VASOS DE CARIÁTIDES 1

FONTE: Disponível em: <http://www.historiaehistoria.com.br/


materia.cfm?tb=historiadores&id=16>. Acesso em: 23 maio 2008.

A estátua, Figura 18, e os vasos de gargalo, Figura 19, também compõem


esta coleção de obras, nas quais, destacam-se formas muito variadas antropomorfas
e zoomorfas.

24
TÓPICO 2 | AS CULTURAS MARAJOARA E SANTARÉM

FIGURA 18 – ESTÁTUA ANTROPOMORFA

FONTE: TIRAPELI, Percival. Arte Brasileira – Arte Indígena do


Pré-colonial à Contemporaneidade. São Paulo: Nacional,
2007. p. 40.

FIGURA 19 – VASO DE GARGALO

FONTE: ZANINI, Walter, org. História Geral da Arte no Brasil. São


Paulo: Instituto Walther Moreira Salles, 1983. 2 v., p. 38.

A decoração das estatuetas na cerâmica Santarém inclui pinturas


corporais, cabelos trançados e arrumados com faixas, adornos
auriculares, pulseiras e tornozeleiras, mostrando uma pessoa
ornamentada para uma ocasião especial. Elas são na maioria femininas
e, possivelmente, estão relacionadas ao papel social de algumas
mulheres importante entre os Tapajó. De fato, as informações históricas
relatam a existência de um grupo de pessoas de status diferenciado
entre os Tapajós e dentro deste grupo, mulheres que exerciam papéis
destacados nessa sociedade, como a “princeza” (sic) Maria Moaçara.
(Apud GUAPINDAIA, 2004).

À procura por vestígios de civilizações que há muito habitaram a Amazônia,


os arqueólogos começam suas buscas no início no século XVIII e continuam até os
dias de hoje.

25
UNIDADE 1 | OS PRIMÓRDIOS DA ARTE NO BRASIL

Nos estudos e escavações, realizados próximos à junção do Rio Tapajós


com o Amazonas, foram encontrados fragmentos de um povo que se denominou
Santarense e ou Tapajônico. Os segredos de sua expressiva cultura, hoje expostos
em museus brasileiros e estrangeiros, e que aos poucos surgem das escavações,
incluindo a arte ceramista, atestam que ali viveu uma civilização extremamente
avançada para a época.

UNI

“Ignoramos como a arte começou, tanto como desconhecemos como teve


início a linguagem. Se aceitamos que a arte significa o exercício de atividades tais como a
edificação de templos e casas, a realização de pinturas e esculturas, nenhum povo existe no
mundo sem arte”. (GOMBRICH, 1950, p. 39).

LEITURA COMPLEMENTAR

LINGUAGEM VISUAL

Denise Schaan

Antropólogos acreditam que a arte pré-histórica era usada para comunicar


ideias, crenças, filiação social, mitologias e cosmologias. A decoração dos objetos teria
tido um papel social importante, veiculando informação. Nestes contextos, a arte
pré-histórica pode ser vista como um tipo de linguagem. Em vez de ser verbalizada
ou escrita, a arte pré-histórica é essencialmente uma linguagem visual.

A arte Marajoara é conhecida por sua cerâmica, apesar do fato de que as


populações amazônicas devem ter usado outros materiais, tais como madeira, ossos
e fibras para expressar suas ideias artisticamente. Estas ideias se tornam visuais
através de desenhos geométricos que lembram a fauna local.

Animais como serpentes, lagartos, jacarés, escorpiões, e tartarugas são


representados através de espirais, triângulos, retângulos, círculos concêntricos
e ondas, entre outros signos, utilizando-se de técnicas variadas. O estudo destes
ícones e o seu lugar no conjunto da representação permite a identificação dos temas
zoomórficos, possivelmente seres sobrenaturais ou mitológicos. Denise Schaan
caracteriza esses desenhos como uma linguagem iconográfica.

Iconografia e Rituais

Por volta do ano de 400 depois de Cristo, sociedades hierárquicas e regionais


emergiram na Ilha de Marajó. Sob o domínio dos caciques, a nova forma de
organização social passou a ser legitimada por rituais, durante os quais os pajés
faziam a ponte entre o mundo terreno e aquele dos espíritos e dos antepassados.
26
TÓPICO 2 | AS CULTURAS MARAJOARA E SANTARÉM

Por essa ponte transitavam símbolos e imagens frequentemente concebidos durante


transes alucinógenos. Nascia a arte Marajoara.

O imaginário coletivo tornava-se visual na forma de desenhos que nos


lembram labirintos, espirais, triângulos, círculos, retângulos, tridentes e faces.
Com temática estreitamente relacionada à fauna local, os desenhos na cerâmica se
constituíam em uma linguagem iconográfica, onde seres míticos eram representados
de uma maneira lógica, coerente e harmoniosa, independente de técnicas, formas e
superfícies. A vivência coletiva legitimava uma arte que nascia da necessidade de se
visualizar e comunicar emoções, sentimentos, verdades, tradição, posições sociais,
história. Como em qualquer sociedade que não conhece a escrita, tal arte teria a
função de armazenar e socializar conhecimento.

A sociedade Marajoara e sua cultura desapareceram nas primeiras décadas


da dominação europeia, pois aquelas populações não resistiram às doenças, guerras
e missionização. No entanto, deixaram-nos como legado sua cerâmica e os antigos
aterros onde moravam, realizavam suas cerimônias e enterravam seus mortos.

Graças ao uso da cerâmica nos rituais funerários, sua arte sobreviveu


até nossos dias. Não por acaso, sua atualidade se mantém porque veicula uma
cosmologia construída sobre um tempo circular, que, assim como seus desenhos,
nos ensina que o começo está sempre irremediavelmente ligado ao fim – este sim,
nada além de um ponto de partida.

FONTE: Adaptado de: SCHAAN, Denise. Linguagem Visual. Disponível em: <http://www.
marajoara.com/iconografia.html>. Acesso em: 23 maio 2008.

27
RESUMO DO TÓPICO 2
Neste tópico, acerca da Arte Brasileira, você teve oportunidade de estudar
os seguintes itens:

 Antes mesmo de Cabral “descobrir” o Brasil, em 1500, aqui já havia presença


humana, período considerado como Pré-história brasileira. Estas antigas
civilizações deixaram suas marcas impressas no tempo, através de suas
produções artísticas. É através do estudo iconográfico dessas manifestações que
podemos perceber seu modus vivendi.

 Embora os ameríndios desenvolvessem coisas em comum, sabe-se que cada


cultura possuía talentos distintos materializados em artefatos de arte, segundo
suas necessidades cotidianas e ritualísticas. Foram abordadas duas das diversas
culturas indígenas que aqui existiram em tempos remotos: a Marajoara e a
Santarém.

 A cultura marajoara, além da cultura Santarém, é considerada como uma das


mais avançadas, ricas e interessantes. Considere-se, para isto, sua criação e
produção de cerâmica de vários tipos como os vasos, estatuetas, pratos, tangas,
urnas funerárias, bancos, potes, brinquedos, entre outros artefatos.

 Alguns historiadores nomeiam a cultura Santanense de tapajônica, em virtude


de sua localização, próxima às margens do rio de mesmo nome. Ela é considerada
por muitos pesquisadores como sendo uma das maiores culturas das Américas.
Seus objetos, confeccionados em cerâmica, possuem características marcantes
e muitos fazem lembrar a arte chinesa antiga e o estilo barroco, devido à sua
característica rebuscada e cheia de formas simbólicas.

28
AUTOATIVIDADE

Embora os ameríndios desenvolvessem coisas em comum, sabe-se


que cada cultura possuía talentos distintos materializados em artefatos de
arte segundo suas necessidades cotidianas e ritualísticas. Foram abordadas,
neste caderno, duas das diversas culturas indígenas que existiram em tempos
remotos: a Marajoara e a Santarém. Como forma de complementar e aprofundar
seus estudos, pesquise sobre outra cultura que existiu no Brasil no período
pré-histórico e desenvolva um texto sobre ela. Aproveite a oportunidade para
discutir, em sala, sobre o assunto!

Bom Trabalho!

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UNIDADE 1
TÓPICO 3

INFLUÊNCIAS INDÍGENAS NA ARTE

1 INTRODUÇÃO
Pesquisadores relatam que, anteriormente à chegada dos estrangeiros à
América, estima-se que aqui havia cem milhões de índios em todo o continente. No
Brasil, acredita-se que este número chegou a cinco milhões de nativos, espalhados e
divididos em muitas tribos, classificadas de acordo com os distintos troncos linguísticos
a que pertenciam. Enfim, entre estes havia uma grande diversidade cultural.

Cada povo indígena tem uma maneira própria de expressar suas obras,
por isto dizemos que não existe arte indígena e sim artes indígenas. As
artes indígenas diferem-se muito das demais produzidas em diferentes
localidades do globo, uma vez que manuseiam pigmentos, madeiras,
fibras, plumas, vegetais e outros materiais de maneira muito singular.
(DESVENDAR, 2008).

Podemos considerar que a habilidade dos índios em transformar peças


cerimoniosas e do seu cotidiano em artefatos cheios de significado, de valores
estéticos e sociais, faz com que se dê a continuidade de sua identidade cultural.

O homem, segundo o julgamento de sua civilização, costumeiramente,


classifica os artefatos indígenas como sendo arte, mas, para os índios, são
manifestações da vida tribal. Para eles, “[...] os mais simples objetos usados no dia
a dia – redes, potes, cestos, etc. – devem ser feitos com muito capricho e perfeição.
Desse modo, os objetos são belos porque são bem-feitos, e não por serem obras
artísticas.” (PROENÇA, 2006, p. 90).

UNI

Ao chegar nas Américas, no século XVI, o homem branco, pensando que


estava avistando terras da Índia, ao aportar suas naus em território brasileiro, deparou-se
com nativos ao qual nominou-os de índios. Mesmo descobrindo que não estavam na Índia,
a denominação para estes que aqui se encontravam permanece até hoje.

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UNIDADE 1 | OS PRIMÓRDIOS DA ARTE NO BRASIL

2 ARTE INDÍGENA

Os indígenas têm uma cultura vasta e nós absorvemos muito do seu legado
– a arte, na culinária, nos utensílios decorativos e na língua. Mesmo sendo uma
terra povoada por índios, a língua que prevaleceu foi a dos colonizadores lusitanos.

A Arte indígena é uma manifestação da cultura do seu cotidiano. Ela é


reflexo da vida e da natureza, e surge como encarnação de força e elo com o mítico,
o espiritual como atributo divino e se faz presente nos rituais, nos gestos, nos
adereços, nos artefatos.

Os costumes das diferentes tribos brasileiras foram, aos poucos, sendo


transformados pelo contato com o colonizador e com os escravos
africanos. Há muitos casos de escravização de indígenas, mas sua
aculturação deu-se também por meio dos casamentos com portugueses,
que dispunham de poucas mulheres europeias no Brasil, e pela atuação
de grupos religiosos, principalmente os jesuítas.” (KURY, 2001, p.106).

Os indígenas possuiam crenças, valores, hábitos e costumes antagônicos aos


dos portugueses. Devido a esta antítese, quando os lusitanos iniciaram seu processo
de colonização, os ameríndios do Brasil viveram séculos de desestruturação
cultural.

Atualmente, restam, no Brasil, poucas comunidades indígenas que vivem


restritas a um pedaço de terra.

Pode-se imaginar o susto que os índios levavam quando viram um


português todo vestido, malcheiroso – os banhos eram raros –, peludos
e barbados. Os índios tinham o hábito de se lavar e de perfumar e colorir
o corpo com unguentos e tintas, que embelezam e ainda afastavam os
insetos. Além disso, os primeiros habitantes do Brasil achavam os pelos
antiestéticos. Por natureza, eles têm poucos pelos, e os que aparecem
são raspados. (KURY, 2001, p.109)

Naquela época, para os filósofos europeus, os pelos do corpo tinham um


signo de virilidade e, quando se depararam com os imberbes que aqui viviam,
concluíram que era mais uma demonstração de sua inferioridade. “Homens
sem pelos, segundo esses pensadores europeus, seriam incapazes de dominar a
natureza e de construir cidades modernas e prósperas como as europeias.” (KURY,
2001, p.109)

O primeiro contato que os portugueses tiveram, ao aportar em terras


brasileiras, foi com os índios tupis-guaranis e é deles que incorporamos várias
palavras ao nosso idioma como: açaí, abacaxi, ananás, caipira, carioca, catapora,
jararaca, jenipapo, paca, perereca, peteca, saci, sambaqui, tapioca, urucum, etc.
Além disso, exemplos são os ingredientes e pratos que são utilizados na nossa
culinária, como a farinha de mandioca, canjica, pamonha, paçoca, pirão, etc.

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TÓPICO 3 | INFLUÊNCIAS INDÍGENAS NA ARTE

Abordaremos, a seguir, algumas das mais importantes e ricas manifestações


indígenas, consideradas para nossa cultura como arte: a ceramista, o trançado, a
tecelagem, a plumária, as máscaras e a pintura corporal.

UNI

Três fatores eram usados na sua arte instintivamente: a simetria, o ritmo e a


acentuação formal. A simetria era usada na decoração de seus corpos, em que, quase sempre,
um lado é igual ao outro; o ritmo é o desenho regular geométrico, usado na cerâmica e
trançados de palha, e a acentuação formal é o volume acentuado pela expressão da forma
na escultura. (HARRES, 1979, p. 22).

2.1 ARTE CERAMISTA


Os índios valeram-se de diversos materiais para desenvolverem seus
utensílios como: sementes, madeiras, algodão, cipós, folhas, etc., porém foram os
materiais não orgânicos como a argila – e alguns com outros elementos misturados
em sua composição como: cinzas, cascalhos, ossos e conchas – que resistiram, em
maior quantidade, à ação do tempo.

Devido à alta umidade e temperatura da região amazônica, os artefatos


confeccionados com matérias orgânicas raramente se conservam nos
sítios arqueológicos. Os artefatos confeccionados em argila e rochas são
os que melhor resistem a essas condições climáticas. Por isso, a maioria
do material arqueológico em sítios amazônicos se compõe de artefatos
cerâmicos e líticos. (GUAPINDAIA, 2004).

Devido ao seu grau de complexidade e sofisticação, e pela diversidade de


técnicas utilizadas, os artefatos de argila contam muito do cotidiano indígena,
demonstrando seus costumes, valores e crenças.

Há uma diversidade de tipos de objetos cerâmicos em que cada tribo


imprimia um estilo, transformado-os em uma linguagem ímpar. Podemos analisar
as Figuras 20, 21 e 22 respectivamente: urna funerária antropomorfa, marajoara,
exposta no Museu Paraense Emílio Goeldi, Belém, PA; vaso da tribo Tukuna,
exposto no Museu de Arqueologia e Etnografia da Universidade de São Paulo,
MAE, São Paulo, SP; Urna funerária antropomorfa – com tampa representando
a cabeça (encimada por ave) – subtradição Guarita, procedente do lago de Silves,
AM, col. Museu Goeldi, Belém.

33
UNIDADE 1 | OS PRIMÓRDIOS DA ARTE NO BRASIL

FIGURA 20 – URNA MARAJOARA

FONTE: TIRAPELI, Percival. Arte Brasileira – Arte indígena do pré-


colonial à contemporaneidade. São Paulo: Nacional, 2007. p. 12.

FIGURA 21 – VASO TUKUNA

FONTE: TIRAPELI, Percival. Arte Brasileira – Arte indígena do pré-


colonial à contemporaneidade. São Paulo: Nacional, 2007. p. 10.

FIGURA 22 – URNA GUARITA

FONTE: ZANINI, Walter, org. História Geral da Arte no Brasil.


São Paulo: Instituto Walther Moreira Salles, 1983. 2 v., il. p. 39.

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TÓPICO 3 | INFLUÊNCIAS INDÍGENAS NA ARTE

Outros exemplares também compõem este acervo, como as panelas


zoomórficas desenvolvidas pelos índios Waurá (Figura 23) e as exóticas bonecas
elaboradas pelos índios Karajás (Figura 24).

FIGURA 23 – PANELAS WAURÁ

FONTE: Disponível em: <http://raizculturablog.files.wordpress.


com/2008/03/6.jpg>. Acesso em: 25 maio 2008.

FIGURA 24 – BONECA DOS ÍNDIOS KARAJÁS

FONTE: ZANINI, Walter, org. História Geral da Arte no Brasil. São


Paulo: Instituto Walther Moreira Salles, 1983. 2 v., il. p. 61.

2.2 A ARTE DE TECER TRAMAR E TRANÇAR

É através de matéria-prima encontrada em grande quantidade na natureza


que os índios desenvolviam seus artefatos. Utilizavam, para tecer, tramar e trançar,
muitos elementos naturais como plantas, fibras, raízes, folhas, cipós, sementes,
cascas e palhas.

Desta manufatura, surgiam produtos admiráveis, com formas, texturas,


tamanhos, desenhos, cores múltiplas como: cestarias, peneiras, redes ou maqueiras,
vestimentas, máscaras, entre outros objetos.

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UNIDADE 1 | OS PRIMÓRDIOS DA ARTE NO BRASIL

Na Figura 25, em ordem crescente, exemplos de artefatos produzidos pelas


tribos indígenas como: espremedor de mandioca da tribo Tipiti Baniwa, Amazonas;
rede tecida com fios de buriti e fios de algodão, da tribo Kamaiurá, Mato Grosso;
Abano feito de duas maneiras de trançado, da tribo Ciuci, Amazonas. Todos estes
objetos, atualmente, estão expostos no Museu Paraense Emílio Goeldi.

FIGURA 25 – ENTRE TRAMAS E TRANÇAS

FONTE: PROENÇA, Graça. Descobrindo a História da Arte. São Paulo: Ática, 2006. p. 92-93.

2.3 ARTE PLUMÁRIA


A arte plumária é uma das formas de expressão indígena mais admirada
e conhecida por todos. Ela não é desenvolvida para nenhum meio utilitário, mas
única e exclusivamente como busca da beleza e adorno.

Dois estilos marcantes são produzidos pelos índios brasileiros na


elaboração de obras a partir das penas e plumas: das tribos dos cerrados, que
desenvolvem peças majestosas e grandes; e das tribos silvícolas, que produzem
artefatos delicados.

São diversas as peças desenvolvidas com as penas e plumas e utilizadas na


confecção de adereços como diademas, colares, pulseiras, tornozeleiras, saias, entre
outras peças. Na Figura 26, diadema de penas multicolorida da tribo Mekranoti,
Pará; colar de penas de tucano, sautá e anambé-azul da tribo Kaapor, Maranhão;
manto de 1,2 metros de altura e trançado com fibras naturais entrelaçados com
penas da ave guará.

O diadema e o colar estão expostos no Museu Paraense Emílio Goeldi e


o manto, datado do século XVII, está exposto no Departamento de Etnografia do
Museu da Dinamarca.

36
TÓPICO 3 | INFLUÊNCIAS INDÍGENAS NA ARTE

FIGURA 26 – ARTE PLUMÁRIA

FONTE: PROENÇA, Graça. Descobrindo a História da Arte. São Paulo: Ática, 2006. p.
90-93.

2.4 ARTE DAS MÁSCARAS


As máscaras estão associadas às artes do corpo como forma suprema de lhe
conferir expressividade dramática. Há um tempo, elas são o artefato produzido
pelo índio comum e a figura viva, visível do sobrenatural que incorporam.

Simbolicamente, elas representam a personificação do sobrenatural. Pode-


se vê-las sendo utilizadas pelos índios nas danças cerimoniosas e outras vezes,
estáticas, inertes. Nos dois casos, é a encarnação maligna dos espíritos do mal.

São sempre os homens que se mascaram, afirmando também, nesse campo,


a hegemonia do seu mando e até se servindo das máscaras para reafirmá-lo.

As máscaras, Figura 27, podem ser confeccionadas utilizando-se diversos


materiais como palhas, cabaças, couros, troncos de árvores e também, muitas
vezes, são pintadas.

FIGURA 27 – MÁSCARAS

FONTE: ZANINI, Walter (org.). História Geral da Arte no Brasil. São Paulo: Instituto
Walther Moreira Salles, 1983. 2 v., il. p. 79.

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UNIDADE 1 | OS PRIMÓRDIOS DA ARTE NO BRASIL

2.5 ARTE DA PINTURA CORPORAL


Para os índios, frequentemente, o corpo humano serve de base física para
as suas manifestações artísticas e ritualísticas. Eles se embelezam revestindo
seus corpos de tintas no cotidiano ou para alguma cerimônia como casamentos,
enterros, guerras ou caça.

Na arte da pintura corporal, são utilizados vários pigmentos extraídos do


urucum – que gera o vermelho – do suco de jenipapo – que origina a tintura negro
esverdeada – ou ainda da tabatinga – que dá vida ao branco.

Também utilizam uma base de óleo vegetal que facilita a aplicação das
tintas, conferem vida mais longa, reavivam as cores e reluzem seus corpos.

Os índios pintam quase todas as partes do corpo, como o rosto, os braços,


as pernas, o ventre e as costas. Valem-se de formas geométricas em composições e
cores diversificadas que variam de uma cultura para outra.

Na Figura 28, observamos algumas dessas expressões.

FIGURA 28 – PINTURA CORPORAL

FONTE: TIRAPELI, Percival. Arte Brasileira – Arte indígena do pré-colonial à


contemporaneidade. São Paulo: Nacional, 2007. p. 15-17.

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TÓPICO 3 | INFLUÊNCIAS INDÍGENAS NA ARTE

UNI

“Desde que os europeus desembarcaram em nossas terras, os primeiros


habitantes do Brasil viveram séculos de desagregação de suas culturas. Os povos indígenas
eram muito diferentes dos portugueses... Viviam da coleta de produtos da floresta, da caça e
da pesca. Sua vida era, desse modo, essencialmente ligada à existência das matas. O tipo de
economia que os portugueses criaram no Brasil foi muito mais destrutivo que a economia
indígena.”

LEITURA COMPLEMENTAR

ÍNDIOS DO BRASIL

Introdução

Historiadores afirmam que, antes da chegada dos europeus à América,


havia, aproximadamente, 100 milhões de índios no continente. Só em território
brasileiro, esse número chegava cinco milhões de nativos, aproximadamente. Estes
índios brasileiros estavam divididos em tribos, de acordo com o tronco linguístico
ao qual pertenciam: tupi-guaranis (região do litoral), macro-jê ou tapuias (região
do Planalto Central), aruaques (Amazônia) e caraíbas (Amazônia).

Atualmente, calcula-se que apenas 400 mil índios ocupam o território


brasileiro, principalmente em reservas indígenas demarcadas e protegidas pelo
governo. São cerca de 200 etnias indígenas e 170 línguas. Porém, muitas delas não
vivem mais como antes da chegada dos portugueses. O contato com o homem branco
fez com que muitas tribos perdessem sua identidade cultural.

A sociedade indígena na época da chegada dos portugueses

O primeiro contato entre índios e portugueses em 1500 foi de muita estranheza


para ambas as partes. As duas culturas eram muito diferentes e pertenciam a mundos
completamente distintos. Sabemos muito sobre os índios que viviam naquela época,
graças a Carta de Pero Vaz de Caminha (escrivão da expedição de Pedro Álvares
Cabral ) e também aos documentos deixados pelos padres jesuítas.

Os indígenas que habitavam o Brasil em 1500 viviam da caça, da pesca e


da agricultura de milho, amendoim, feijão, abóbora, bata-doce e principalmente
mandioca. Esta agricultura era praticada de forma bem rudimentar, pois utilizavam a
técnica da coivara (derrubada de mata e queimada para limpar o solo para o plantio).

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UNIDADE 1 | OS PRIMÓRDIOS DA ARTE NO BRASIL

Os índios domesticavam animais de pequeno porte como, por exemplo,


porco do mato e capivara. Não conheciam o cavalo, o boi e a galinha. Na Carta de
Caminha é relatado que os índios se espantaram ao entrar em contato pela primeira
vez com uma galinha.

As tribos indígenas possuíam uma relação baseada em regras sociais,


políticas e religiosas. O contato entre as tribos acontecia em momentos de guerras,
casamentos, cerimônias de enterro e também no momento de estabelecer alianças
contra um inimigo comum.

Os índios faziam objetos utilizando as matérias-primas da natureza. Vale


lembrar que índio respeita muito o meio ambiente, retirando dele somente o
necessário para a sua sobrevivência. Desta madeira, construíam canoas, arcos e
flechas e suas habitações (ocas). A palha era utilizada para fazer cestos, esteiras,
redes e outros objetos. A cerâmica também era muito utilizada para fazer potes,
panelas e utensílios domésticos em geral. Penas e peles de animais serviam para
fazer roupas ou enfeites para as cerimônias das tribos. O urucum era muito usado
para fazer pinturas no corpo.

A organização social dos índios

Entre os indígenas não há classes sociais como a do homem branco. Todos


têm os mesmo direitos e recebem o mesmo tratamento. A terra, por exemplo,
pertence a todos e quando um índio caça, costuma dividir com os habitantes de
sua tribo. Apenas os instrumentos de trabalho (machado, arcos, flechas, arpões)
são de propriedade individual. O trabalho na tribo é realizado por todos, porém
possui uma divisão por sexo e idade. As mulheres são responsáveis pela comida,
crianças, colheita e plantio. Já os homens da tribo ficam encarregados do trabalho
mais pesado: caça, pesca, guerra e derrubada das árvores.

Duas figuras importantes na organização das tribos são o pajé e o cacique. O


pajé é o sacerdote da tribo, pois conhece todos os rituais e recebe as mensagens dos
deuses. Ele também é o curandeiro, pois conhece todos os chás e ervas para curar
doenças. Ele que faz o ritual da pajelança, onde evoca os deuses da floresta e dos
ancestrais para ajudar na cura. O cacique, importante na vida tribal, faz o papel de
chefe, pois organiza e orienta os índios. 

A educação indígena é bem interessante. Os pequenos índios, conhecidos


como curumins, aprendem desde pequenos e de forma prática. Costumam observar
o que os adultos fazem e vão treinando desde cedo. Quando o pai vai caçar, costuma
levar o indiozinho junto para que este aprenda. Portanto a educação indígena é bem
prática e vinculada a realidade da vida da tribo indígena. Quando atinge os 13/14
anos, o jovem passa por um teste e uma cerimônia para ingressar na vida adulta.

Os contatos entre indígenas e portugueses

Como dissemos, os primeiros contatos foram de estranheza e de certa


admiração e respeito. Caminha relata a troca de sinais, presentes e informações.
40
TÓPICO 3 | INFLUÊNCIAS INDÍGENAS NA ARTE

Quando os portugueses começam a explorar o pau-brasil das matas, começam a


escravizar muitos indígenas ou a utilizar o escambo. Davam espelhos, apitos, colares
e chocalhos para os indígenas em troca de seu trabalho.

O canto que se segue foi muito prejudicial aos povos indígenas. Interessados
nas terras, os portugueses usaram a violência contra os índios. Para tomar as terras,
chegavam a matar os nativos ou até mesmo transmitir doenças a eles para dizimar
tribos e tomar as terras. Esse comportamento violento seguiu-se por séculos,
resultando no pequeno número de índios que temos hoje.

A visão que o europeu tinha a respeito dos índios era eurocêntrica. Os


portugueses achavam-se superiores aos indígenas e, portanto, deveriam dominá-
los e colocá-los ao seu serviço. A cultura indígena era considera pelo europeu como
sendo inferior e grosseira. Dentro desta visão, acreditavam que sua função era
convertê-los ao cristianismo e fazer os índios seguirem a cultura europeia. Foi assim,
que aos poucos, os índios foram perdendo sua cultura e também sua identidade.

Canibalismo

Algumas tribos eram canibais como, por exemplo, os tupinambás que


habitavam o litoral da região sudeste do Brasil. A antropofagia era praticada, pois
acreditavam que ao comerem carne humana do inimigo estariam incorporando a
sabedoria, valentia e conhecimentos. Desta forma, não se alimentavam da carne de
pessoas fracas ou covardes. A prática do canibalismo era feita em rituais simbólicos.

Religião Indígena

Cada nação indígena possuía crenças e rituais religiosos diferenciados.


Porém, todas as tribos acreditavam nas forças da natureza e nos espíritos dos
antepassados. Para estes deuses e espíritos, faziam rituais, cerimônias e festas. O
pajé era o responsável por transmitir estes conhecimentos aos habitantes da tribo.
Algumas tribos chegavam a enterrar o corpo dos índios em grandes vasos de
cerâmica, onde além do cadáver ficavam os objetos pessoais. Isto mostra que estas
tribos acreditavam numa vida após a morte.

Principais etnias indígenas brasileiras na atualidade e população estimada

Ticuna (35.000), Guarani (30.000), Caiagangue (25.000), Macuxi (20.000),


Terena (16.000), Guajajara (14.000), Xavante (12.000), Ianomâmi (12.000), Pataxó
(9.700), Potiguara (7.700). 

FONTE: Adaptado de: ÍNDIOS do Brasil. Disponível em: <http://www.suapesquisa.com/indios/>.


Acesso em: 23 maio 2008.

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RESUMO DO TÓPICO 3
Neste tópico você pôde estudar importantes aspectos da arte indígena. A
seguir, são apresentados, resumidamente, os principais itens estudados:

 Ao chegar às Américas, no século XVI, o homem branco, pensando que estava


avistando terras da Índia, ao aportar suas naus em território brasileiro, deparou-
se com nativos ao qual nominou-os de índios. Mesmo descobrindo que não
estavam na Índia a denominação para estes que aqui se encontravam permanece
até hoje.

 Os indígenas têm uma cultura vasta e nós absorvemos muito do seu legado na
arte, na culinária, nos utensílios decorativos e na língua. Mesmo sendo uma
terra povoada por índios, a língua que prevaleceu foi a do colonizador lusitano
– o português.

 A arte indígena é uma manifestação do cotidiano da cultura. Ela é reflexo da vida


e da natureza e surge como encarnação de força e elo com o mítico, o espiritual,
como atributo divino e se faz presente nos ritos, nos gestos, nos adereços, nos
artefatos.

 São muitas as manifestações, consideradas pela nossa cultura como artística, que
o índio nos legou como a arte: ceramista, do trançado, da tecelagem, plumária,
das máscaras e da pintura corporal.

42
AUTOATIVIDADE

Para fixar os conteúdos estudados neste tópico, desenvolva um texto


sobre o modo de vida das populações indígenas no Brasil atual.

Inicialmente, leia o Caderno de Estudos e procure mais alguns


materiais relacionados ao tema escolhido, incluindo os textos disponibilizados
em jornais, revistas, livros e em artigos da internet, anotando as referências,
marcando as páginas das quais você está extraindo as frases ou as ideias.
Esboce um rascunho, preocupando-se com a introdução, o desenvolvimento
e com a conclusão.

Bom Trabalho!

Assista ao vídeo de
resolução desta questão

43
44
UNIDADE 1
TÓPICO 4

REFLEXÕES ACERCA DO ENSINO DA ARTE

1 INTRODUÇÃO
Você deve estar se perguntando: por que saber essas informações pode
contribuir com a sua formação na docência em arte. Bem, primeiramente é
relevante você, como professor de arte, compreender as relações históricas e
culturais implicadas no processo de elaboração da arte.

Nesse caso, é importante para o professor de arte ter um olhar histórico para
a produção artística. Ainda é relevante que o professor compreenda essa produção
mergulhada em seu contexto cultural, pois arte é parte da cultura humana. É
importante que você, em preparação para ser professor de arte, seja uma pessoa
com repertório artístico e cultural, para que possa articular esses conceitos com
seus alunos. Destacamos aqui, ainda, que é importante, para o professor dessa
disciplina, articular com seus alunos conceitos históricos, pois estes fazem parte
dos conceitos fundamentais para o ensino da arte na atualidade.

Ao discutir com seus alunos a arte desenvolvida na pré-história, você


pode relacionar a experiência de vida de cada um deles, articulando o que nós,
como seres humanos, realizamos no desenvolvimento de nossas habilidades e no
processo de elaboração da linguagem.

Quando crianças, nós desenhamos nas paredes, no chão ou em qualquer


objeto. Nesse processo, a criança elabora sua percepção dos objetos que a cercam.
Ela percebe e domina o seu corpo, à medida que se constitui como ser humano.
Nesse lindo e mágico processo, nos descobrimos capazes de fazer coisas e construir
nossa história. Nesse processo é que o ser humano elabora a linguagem, abstrai o
mundo e se comunica com os outros seres humanos.

Nesse contexto, podemos refletir com nossos alunos que está marcada
em nós a história da humanidade que se repete. Pode-se explicar aos alunos
que só podemos hoje desenhar com o mouse de um computador porque nossos
antepassados, em algum momento, começaram a desenhar em paredes nas
cavernas. Que mágico isso, não? Você já parou para pensar o que existe de
tecnologia e desenvolvimento de linguagem entre a pintura de uma parede e um
mouse de computador? Bem, é nesse campo que estamos trabalhando.

45
UNIDADE 1 | OS PRIMÓRDIOS DA ARTE NO BRASIL

UNI

Ao se referir às contribuições do ensino da arte em suas diversas disciplinas –


crítica de arte, história da arte e estética –, Eisner nos alerta que “o que a arte proporciona é
uma contribuição ampla ao desenvolvimento e às experiências humanas” (EISNER, 1997, p. 89).

2 A SELEÇÃO DE CONTEÚDOS
Segundo a reflexão anterior, podemos considerar que a arte amplia o
desenvolvimento às experiências humanas. Esse é nosso foco de interesse. No
entanto, para que isso aconteça é importante compreender que a arte tem conteúdos
próprios e que estes precisam ser considerados no processo de planejamento de
nossas aulas.

Na organização de suas aulas, o professor, juntamente com a equipe


pedagógica de sua escola, amparado pelos documentos legais da rede em que
atua, deveria realizar o processo de seleção e organização dos conteúdos das suas
aulas. Nesse processo, o professor precisa ter claro o que deseja ensinar e onde
deseja chegar com seus alunos, compreendendo quais conceitos são fundamentais
para o processo do ensino-aprendizagem em cada série em que atua.

Segundo Peixoto (2003), na sociedade se articulam três níveis de arte: a


arte elitista, a arte para as massas e a arte popular. A primeira exige do apreciador
e do artista no processo de produção um domínio dos códigos refinados para a
sua apreciação. A segunda é produzida pela indústria cultural e seu processo
de produção e distribuição tem como objetivo o consumo. Por fim, na terceira
podemos considerar que tem como valor a representação e a satisfação solidária
de uma coletividade. A partir de Peixoto, observamos que nesse caderno você vai
encontrar subsídios interessantes para refletir sobre a produção artística brasileira
e que, no processo de seleção e organização de conteúdos para seus alunos, esses
aspectos precisam ser considerados.

Uma boa aula de arte precisa possibilitar ao aluno compreender a


diversidade da arte produzida em seu país, para poder ler o que está ao seu
redor. Nesse sentido, é importante que nesse processo o professor articule esses
três níveis de arte, percebendo que, ao fazer isso, está possibilitando ao seu aluno
compreender a dinâmica da nossa sociedade em relação à produção artística.

Observe ainda que nessa primeira parte do caderno estamos trazendo


conceitos históricos relevantes para a compreensão da arte brasileira. No entanto,
essa produção artística não está desarticulada do restante do mundo. Ora, nesse
sentido é possível e necessário que o professor articule, em sua seleção e organização
de conteúdos, elementos da arte brasileira, da arte mundial e da arte local, para
que o aluno estabeleça sentido com sua vida e perceba que estamos inseridos num
mundo dinâmico e dialético.
46
TÓPICO 4 | RELAÇÕES COM O ENSINO DA ARTE

UNI

“Arte fora sem um contexto histórico é arte sem memória”. (SMITH, 2005, p. 25)

3 SOBRE O ENSINO DA ARTE


Com cada faixa etária é relevante refletir elementos mais complexos dos
conceitos desenvolvidos pelo ser humano em relação à arte. As crianças pequenas,
por exemplo, têm seu foco de atenção muito mais no fazer, na experiência, do que
os conceitos históricos, por exemplo. Em relação a isso, observe que rico pode ser
um trabalho voltado à pesquisa acerca da arte pré-histórica brasileira, ou ainda,
sobre as culturas Marajoara e Santarém e todo o rico conjunto de produções da arte
indígena brasileira.

Observe que interessante será, para as crianças, conhecer esse universo!


Mesmo com os pequenos é possível apresentar imagens de arte e trazer conceitos
históricos. Observe que interessantes são essas culturas. Mesmo com recursos
tecnológicos tão restritos, sua produção artística foi tão sofisticada. Podemos aqui
perceber que no seio de um grupo cultural há formas diferenciadas de desenvolver
meios para se fazer arte.

Nesse processo de conhecer a arte dos povos primitivos é importante ter


em mente que todas as pessoas têm direito de conhecer o patrimônio artístico do
local em que nasceram. Portanto, perceber que a dinâmica do ensino da arte deve
levar ao ensino da arte sem preconceitos acerca dessa ou daquela manifestação
artística. É mais significativo as crianças perceberem a diversidade cultural e,
nesse contexto, poderem criar critérios de análise e pontos de reflexão. O ensino
da história da arte deve possibilitar isso.

Segundo Soucy (2005), é importante considerar que a educação pode


dialeticamente dialogar e servir a interesses de diferentes classes sociais. Dessa
forma, ensinar a arte indígena é tão importante quanto conhecer as escolas
modernistas brasileiras, pois elas possibilitam a crianças e jovens compreenderem
a dinâmica diversa da cultura e da arte.

Aqui estamos trazendo reflexões mais significativas acerca do ensino da


história da arte. No entanto, as metodologias contemporâneas da arte consideram
que no ensino da arte na atualidade se articulam conceitos e reflexões que partem
de três eixos: a leitura da obra de arte, a contextualização histórica e o fazer
artístico (BARBOSA, 1996). Essa proposta, disseminada e idealizada no Brasil pela
professora Ana Mae Barbosa, é resultado de um conjunto de mudanças ocorridas
no ensino da arte no Brasil a partir de 1987. Nesse período, iniciou no Brasil uma
preocupação em expor crianças e jovens a obras de arte, para que tivessem acesso
à arte, e não apenas às técnicas artísticas.
47
UNIDADE 1 | OS PRIMÓRDIOS DA ARTE NO BRASIL

Perceba que a partir disso, então, podemos compreender que, ao levar


essas imagens e conceitos para as crianças e jovens, é relevante explorar elementos
relacionados à leitura das imagens, para que os estudantes possam ter contato com
a obra de arte, seja original ou por meio de imagens. Nesse sentido, você poderá
dinamizar a leitura, para que os estudantes sejam provocados a ler as imagens.
Ainda é relevante que você, com seus alunos, articule formas deles compreenderem
o contexto histórico e cultural em que foram produzidas e relacione esses
conhecimentos à atualidade. Por fim, mas não necessariamente nessa ordem, é
relevante, segundo Barbosa (1996), que as crianças tenham a possibilidade de
experimentar as diversas linguagens, e com isso o fazer artístico, com dinâmicas
que desafiem os estudantes na elaboração desses saberes.

Ao professor cabe compreender os níveis de desenvolvimento de seus


alunos, para que possa elaborar a melhor proposta de ensino para cada faixa
etária. Lembremos sempre que as crianças pequenas têm um modo intuitivo de
estar e perceber o mundo, portanto o foco de seu interesse está mais ligado ao fazer
artístico, à experiência do corpo com a materialidade.

À medida que crescem, começam a elaborar a linguagem e com isso passam


a ter intenção simbólica no que produzem. Percebem que podem se comunicar
usando a linguagem, e a dominam até o momento em que se apropriam desta
e começam a perceber a organização e as regras sociais. Quando o sujeito já se
apropriou da linguagem, já a domina, começa a compreender a organização e as
regras sociais e passa a elaborar sua forma, sua poética pessoal. Em cada faixa
etária a complexidade de atividades e propostas se diferencia. Essa é a beleza de
ser professor, perceber o humano que está em cada um de seus alunos.

UNI

“Em resumo, desenvolvemos a ideia de que a arte tem conteúdos específicos a


oferecer, algo inerente às artes.” (EISNER, 1997, p. 78).

48
TÓPICO 4 | RELAÇÕES COM O ENSINO DA ARTE

LEITURA COMPLEMENTAR

QUATRO LETRAS A: A LÍNGUA DO MUNDO

Antes mesmo de saber escrever, o homem expressou e interpretou o mundo


em que vivia pela linguagem da arte.

A caverna, com sua umidade rochosa, foi o ateliê do homem pré-histórico.


Diante dos mistérios do que lhe era desconhecido, o artista retirava-se para ficar a
sós na caverna. Por dias e dias, nela habitava, desvendando, pelo fazer das mãos e
pela força imaginante, o que não compreendia, mas sonhava compreender.

A caverna foi a casa na qual o artista se sentia seguro enquanto criava; pois
“a casa abriga o devaneio, a casa protege o sonhador, a casa permite sonhar em paz”,
como disse o filósofo francês Gaston Bachelard (1884-1962). Nela, pelos olhos de seu
próprio ser sensível, o artista ia concebendo o seu mundo por imagens.

Na caverna, enveredando por seus corredores, os primeiros artistas fizeram


graffiti, usando como suporte as formas das estruturas rochosas. Dissolvendo pigmentos
na boca e soprando-os em jatos como se fossem spray, eles pintaram, e traço a traço
desenharam a expressão dos movimentos dos mamutes, bisões e outros animais.

Somos seres simbólicos, seres de linguagem.

Mais do que uma reprodução dos animais selvagens reais, os desenhos das
pinturas da arte rupestre nos falam da sensibilidade visual e da capacidade de
abstração do homem pré-histórico. No fazer criador de projetar imagens, o artista
pré-histórico formou imagens que, no dizer de Bachelard, “cantam a realidade”,
pois para este filósofo da criação artística, a “imaginação não é a faculdade de
formar imagens da realidade; é a faculdade de formar imagens que ultrapassam
a realidade”. São imagens poéticas que expressam sua percepção daquele mundo
orientada por sua imaginação.

As imagens retidas nas paredes da caverna revelam um conhecimento que o


homem construiu daquele mundo. Para isso, o artista teve de criar além da realidade
imediata um mundo outro, de imagens dos animais selvagens. Nesse ato criador,
apropriou-se simbolicamente daquele mundo, capturando na representação visual algo
que era dos animais selvagens, dando-lhes novos significados em formas simbólicas.
Na criação, o artista tornou conhecido e compreensível não só para ele criador da
imagem, mas para todos do grupo, que depois a olhavam, o mistério dos animais
que caçava e aos quais sua vida estava ligada.

Esse conhecimento, que é estético, mesmo nos parecendo hoje tão natural,
veio antes da palavra. As imagens pintadas não se referiam somente ao que era
visível naquele mundo, mas também ao invisível como instrumento de magia.
Como tal, ofereciam-se à experiência coletiva, como um modo de conhecimento a
toda a coletividade, orientando o pensamento e a ação de todos naquele mundo.
49
UNIDADE 1 | OS PRIMÓRDIOS DA ARTE NO BRASIL

As obras dos artistas pré-históricos manifestam a vocação inventiva


do homem e da sua mente criadora para interpretar a realidade. O desejo de
compreender e apropriar-se dela leva o homem a tentativas de interpretação através
da capacidade mental se simbolizar.

Mais do que o Homo sapiens, o homem é um animal simbólico, como definiu


o filósofo alemão Ernst Cassirer (1874-1945). Somos seres simbólicos, e isso faz com
que sejamos capazes de inventar e criar símbolos, ordenando e interpretando o
mundo por meio de sistemas de representação.

Cada indivíduo, como um ser simbólico que é, realiza o ato de simbolizar


utilizando sistemas de representação para elaborar e objetivar seus pensamentos e
sentimentos com o intuito de compreender o que se passa no mundo.

Como seres simbólicos, nossa autocriação e transformação cultural nos


desenvolveram como seres de linguagem. Nós, humanos, somos capazes de conceber
e manejar linguagens que nos permitem ordenar o mundo e dar-lhe sentido.

Desde as pinturas nas cavernas e as palavras do homem primitivo até às


fórmulas e equações que levaram o homem moderno a visitar a Lua e hoje navegar
na internet, há um percurso de invenções que o homem efetuou e vem efetuando por
meio de sistemas de representação do mundo, sistemas simbólicos, ou seja, linguagens.

FONTE: MARTINS, Mirian Celeste; PICOSQUE, Gisa e GUERRA, Maria Terezinha Telles. Didática do
ensino da arte: a língua do mundo: poetizar, fruir e conhecer arte. São Paulo: FTD, 1998, p. 34-36.

50
RESUMO DO TÓPICO 4
Nesse tópico acerca do ensino da arte você teve a oportunidade de estudar
os seguintes itens:

• A arte é resultado da relação do ser humano com a sociedade em que está


inserido, com os outros seres humanos e com ele mesmo.

• A criança desenha nas paredes, no chão ou em qualquer objeto, e nesse processo


elabora sua percepção dos objetos que a cercam, percebe e domina o seu corpo
à medida que se constitui como ser humano.

• Na seleção e organização dos conteúdos, o professor precisa ter claro o que


deseja ensinar e onde deseja chegar com seus alunos, compreendendo quais
conceitos são fundamentais para o processo de ensino-aprendizagem em cada
série em que atua.

• Segundo Peixoto (2003), na sociedade se articulam três níveis de arte: a arte


elitista, a arte para as massas e a arte popular.

• Uma boa aula de arte precisa possibilitar ao aluno compreender a diversidade


da arte produzida em seu país, para poder ler o que está ao seu redor.

• É relevante o ensino dos conceitos históricos com as crianças em todas as faixas


etárias, porém em níveis de complexidade diferenciados.

• É importante ter em mente que todas as pessoas têm direito de conhecer o


patrimônio artístico do local em que nasceram.

• As metodologias contemporâneas da arte consideram que no ensino da arte na


atualidade se articulam conceitos e reflexões que partem de três eixos: a leitura da
obra de arte, a contextualização histórica e o fazer artístico. (BARBOSA, 1996).

51
AUTOATIVIDADE

Apresentamos alguns indicadores que podem ser levados em conta


quando pensamos na relevância desses conteúdos dessa unidade para o ensino
da arte. Busque conhecer alguns projetos educativos que utilizaram como tema
norteador a arte pré-histórica ou a arte indígena. Diante desses, elabore um
breve texto refletindo sobre a relevância desses conteúdos e conceitos para a
aprendizagem das crianças.

52
UNIDADE 2

OS PORTUGUESES NO BRASIL

OBJETIVOS DE APRENDIZAGEM

A partir do estudo desta unidade, o(a) acadêmico(a) estará apto(a) a:

• compreender a arte no período do Brasil Colônia;

• identificar a Arte Barroca no Brasil;

• analisar a permanência dos holandeses no nordeste;

• perceber a influência africana para a cultura brasileira.

• sistematizar reflexões acerca do ensino da arte brasileira numa perspectiva


histórica e multicultural.

PLANO DE ESTUDOS
Esta unidade está dividida em cinco tópicos. No final de cada um deles, você
encontrará atividades que o(a) levarão a exercitar os conhecimentos adqui-
ridos.

TÓPICO 1 – A ARTE NO BRASIL COLÔNIA

TÓPICO 2 – A OPULÊNCIA DO BARROCO

TÓPICO 3 – OS HOLANDESES NO BRASIL

TÓPICO 4 – O LEGADO DA CULTURA AFRICANA PARA O BRASIL

TÓPICO 5 – REFLEXÕES ACERCA DO MULTICULTURALISMO E O


ENSINO DA ARTE

Assista ao vídeo
desta unidade.

53
54
UNIDADE 2
TÓPICO 1

A ARTE NO BRASIL COLÔNIA

1 INTRODUÇÃO
Caro(a) acadêmico(a), seja bem-vindo à segunda unidade de nossa
disciplina. Nesta unidade daremos continuidade à viagem pela história da
Arte Brasileira. Conheceremos como nossa arte e nossa cultura se constituíram
diversamente, a partir das experiências trazidas pelos europeus e africanos. Esse
processo não é tranquilo, mas sim, uma complexa estrutura de embates culturais
e sociais.

Muito antes dos portugueses aportarem suas caravelas em terras brasileiras,


em 1500, aqui – período considerado pré-histórico - já havia habitantes, os índios.
Este período que antecede a “descoberta do Brasil pelos europeus” designa-se Pré-
História – a denominação se dá pelo fato de a escrita ainda não ter surgido.

Mesmo que tardia se comparada ao que se sucedeu no continente europeu,


a Pré-História, esta fase se prolongou até o período Pré-Colonial: fase do pau-brasil,
que compreende 1500 a 1530. Neste ínterim, apenas algumas expedições aportaram
à nova terra para inspeção, fiscalização e exploração dos nossos recursos naturais,
principalmente o pau-brasil, que possuía grande valor comercial – sua seiva, de
cor avermelhada, produzia um corante muito utilizado para tingir tecidos.

A arte do período colonial brasileiro teve seu florescer no século XVI com a
instalação das primeiras vilas em que foram construídas fortificações e igrejas – já
com alguns traços deste estilo, com o intuito de resguardar a terra e manter a fé
cristã entre os colonizadores e promover a catequização dos aborígenes.

Com o avanço e povoamento da colônia, principalmente no interior


do Brasil, e o seu desenvolvimento dado pela ação extrativista, algumas vilas
tornaram-se importantes cidades, refletindo o poder econômico da Coroa.

Do século XVI ao XIX, muitos acontecimentos sócio-político-econômicos se


desenrolaram, fazendo surgir uma cultura artística efervescente, com influências
advindas principalmente da Europa. Porém, paralelamente a esses acontecimentos,
planta-se uma semente do que pode ser considerado um início tímido de uma
cultura autóctone que germinará no início do século XX.

A Arte colonial no Brasil compreende as artes plásticas e a arquitetura, que


estão presentes em construções militares, civis e religiosas, no litoral e no interior
do país.

55
UNIDADE 2 | OS PORTUGUESES NO BRASIL

UNI

É preciso salientar que alguns autores citam que houve uma arte baseada no
estilo Rococó no período do Brasil colônia. Outros apontam que o Rococó surgiu como um
desdobramento do Barroco. Assim como outros estilos, como o gótico, que se fez presente de
forma isolada e factual em algumas das construções desenvolvidas no período colonial. O certo
é que a abordagem da presença do estilo Rococó no Brasil, que teve sua origem na França (final
do século XVII), não é clara e precisa, e está envolta por muitas lacunas. Para efeitos de estudo,
vamos nos ater a enfocar o estilo que mais marcou o período colonial – o Barroco.

2 INÍCIO DA ARTE COLONIAL


O período colonial compreende a chegada dos primeiros lusitanos em
terras brasileiras para sua colonização em 1530 – em que o Brasil permaneceu sob
o poder socioeconômico, político e cultural – e o da sua idependência em 1822,
proferida por Dom Pedro I.

Tudo começou em 1530, quando D. João III, o Rei de Portugal, com medo
de perder as terras para invasores, principalmente franceses, enviou expedições
para iniciar a apropriação de terras brasileiras.

Em 1532, o fidalgo Martin Afonso de Sousa, que comandou a primeira


diligência, fundou a vila de São Vicente, no litoral paulista. Nela, iniciou uma
ocupação local como o de plantio da cana-de-açúcar, Figuras 29 e 30, juntamente
com o primeiro engenho desta mesma cultura, tornando-se a principal fonte de
riqueza deste país, por muito tempo.

Martin Afonso impôs a lei e a ordem bem como a cultura e os costumes da


corte de Portugal nas capitanias. Começa-se, então, a colonização em uma terra
sem dono e habitada por selvagens.

FIGURA 29 – FRANS POST. USINA DE AÇÚCAR, SÉC. 17. DESENHO, 14,2 CM X 28,2 CM

FONTE: TIRAPELI, Percival. Arte Brasileira: arte colonial barroco e rococó. São
Paulo: Companhia Editora Nacional, 2007. p. 12.

56
TÓPICO 1 | A ARTE NO BRASIL COLÔNIA

FIGURA 30 – FRANS POST. ENGENHO, SÉC. 17. DESENHO

FONTE: Disponível em: <http://www.novomilenio.inf.br/santos/h0133o.


htm>. Acesso em: 20 jul. 2008.

Posteriormente, houve a necessidade de ampliação da ocupação das terras e


o Brasil entra numa nova fase, das capitanias hereditárias (1530-1549). São enviados
para cá os primeiros ocupantes europeus, muitos aventureiros, mercenários,
degredados e escravos, embora também viessem religiosos, artilheiros e judeus
cristianizados que fugiam da inquisição.

Para Portugal, seu maior interesse era de explorar o novo território, rico em
recursos naturais. Para isso teria que ocupá-lo. Mas para não perder a identidade
portuguesa e evitar que os europeus que aqui desembarcaram, esquecessem suas
próprias raízes religiosas e culturais, enviou mensageiros para pregar e ensinar,
impondo sua cultura e sua fé a todos que aqui estavam, inclusive aos índios.

A Arte Colonial, no Brasil, compreende as artes plásticas e a arquitetura,


que estão presentes em construções militares, civis e religiosas, no litoral e no
interior do país. (Figuras 31 e 32).

FIGURA 31 – CASARIO COLONIAL, SÉCULO 18. PARATY, RJ

FONTE: TIRAPELI, Percival. Arte Brasileira: arte colonial barroco e


rococó. São Paulo: Companhia Editora Nacional, 2007. p. 12 e 50
(respectivamente).

57
UNIDADE 2 | OS PORTUGUESES NO BRASIL

FIGURA 32 – CASA DE CÂMARA E CADEIA, 1766. ATUAL MUSEU DAS


BANDEIRAS E ARQUIVO HISTÓRICO DE GOIÁS, GO

FONTE: TIRAPELI, Percival. Arte Brasileira: arte colonial barroco e rococó.


São Paulo: Companhia Editora Nacional, 2007. p. 12 e 50 (respectivamente).

A Igreja Católica, incluindo os jesuítas, beneditinos e franciscanos se


encarregaram da responsabilidade de difundir as manifestações artísticas.
Porém, tudo sempre dentro do que eles achavam que era permitido e fortemente
espelhados na fé cristã.

Ao governo couberam as construções militares para a defesa do território


como as fortificações, as bases, os quartéis, as delegacias, etc.

Muitas edificações eram enviadas, pedra por pedra, de Portugal, como


carga de retorno das embarcações que iam daqui carregadas de nossas
riquezas naturais. Essa arquitetura colonial, apenas montada aqui,
permaneceu, por muito tempo, como uma expressão direta da arte
portuguesa. E mesmo os artesãos que aqui trabalhavam tinham as
obras europeias como modelo e os europeus como mestres. (GARCEZ;
OLIVEIRA, 2006, p. 30).

É neste início que se percebem as primeiras manifestações artísticas dos


portugueses no Brasil, que estão evidenciadas principalmente na arquitetura das
fortalezas, nas construções religiosas e pela decoração de seus interiores.

UNI

A primeira capital do Brasil foi Salvador, instituída no período colonial, em 1549.


Posteriormente, a partir de 1763, foi nomeada a cidade do Rio de Janeiro. Só em 1960, Brasília
passa a ser a capital do país.

58
TÓPICO 1 | A ARTE NO BRASIL COLÔNIA

3 AS FORTIFICAÇÕES

Como forma de defender suas terras de invasores e do próprio índio, Portugal


investe em fortificações espalhadas por vários pontos do Brasil, principalmente
na costa litorânea. Atualmente, há um número expressivo de exemplares destas
construções que resistiram ao tempo e à ação do homem.

No litoral de São Paulo, encontram-se algumas fortificações, sendo que,


uma delas, o forte de São João, em Bertioga, foi a primeira construção deste tipo
no Brasil, datada de 1530 (Figura 33). Esta fortaleza, em 1537, assistiu Hans Staden
servir aos portugueses.

FIGURA 33 – DETALHES DA FORTALEZA DE SÃO JOÃO, BERTIOGA/SP

FONTE: Disponível em: <http://www.guiadariviera.com.br/potencialDaRegiao.aspx>.


Acesso em: 10 jun. 2008.

Staden era um marinheiro alemão que sobreviveu a um naufrágio e foi


parar no litoral de Santa Catarina, de onde seguiu para a capitania de São Vicente,
no litoral paulista. Estabeleceu-se no forte de São João, em Bertioga e como
artilheiro lutou e defendeu a colônia em vários combates, inclusive foi capturado
pelos índios, conseguindo, mais tarde, escapar.

Por sua bravura e de volta à Europa, recebeu reconhecimento do Rei de


Portugal. Também narrou e escreveu sobre sua viagem ao Brasil, relatando os
costumes dos nativos sul-americanos com extraordinário detalhamento, sendo
considerada a primeira descrição feita para o grande público.

Mas é a primeira capital do Brasil, Salvador (Bahia), fundada em 1549,


que abriga o maior número desses tipos de edificações. Muitas dessas obras estão
posicionadas ao redor da Baía de Todos os Santos.

Um exemplar desse tipo de fortaleza é o Forte Monte Serrat (Figura 34)


que teve o início de sua construção datada de 1583. Também é considerado por
muitos a mais bela edificação militar do período colonial brasileiro, por suas linhas
e formas harmoniosas.

59
UNIDADE 2 | OS PORTUGUESES NO BRASIL

FIGURA 34 – FORTE MONTE SERRAT, SALVADOR, BA

FONTE: Disponível em: <http://www.visiteabahia.com.br/visite/salvador/cultural/fortes/


iindex.php?id=14>. Acesso em: 20 jul. 2008.

Na ilha de Santa Catarina, atual Florianópolis, devido ao seu posicionamento


estratégico para as rotas do sul e também com o intuíto de dominar as terras e de
protegê-la dos invasores, principalmente dos espanhóis, foi elaborado um sistema
defensivo com fortificações.

Foram construídas várias edificações militares espalhadas em pontos


estratégicos do seu litoral como o Forte de Santana do Estreito, que foi erguido por
volta de 1761. Outras três edificações foram levantadas formando um triângulo:
Forte São José da Ponta Grossa (Figura 35), Forte de Santa Cruz de Anhatomirim
(Figura 36) e Forte Santo Antônio de Ratones (Figura 37).

FIGURA 35 – FORTE SÃO JOSÉ DA PONTA FIGURA 36 – FORTE SANTA CRUZ


GROSSA DE ANHATOMIRIM

FONTE: Arquivo pessoal do autor FONTE: Arquivo pessoal do autor

FIGURA 37 – FORTE SANTO ANTÔNIO DE RATONES

FONTE: Arquivo pessoal do autor

60
TÓPICO 1 | A ARTE NO BRASIL COLÔNIA

Atualmente, todas as fortalezas da ilha estão em ótimo estado de conservação


e constituem o maior conjunto de edificações do Brasil.

Porém, às margens do rio Guaporé, na fronteira com a Bolívia, na Rondônia,


está localizada a maior edificação deste tipo: o Real Forte do Príncipe da Beira
(Figura 38).

Ela teve sua construção iniciada em 1776 sob orientação do Marquês de


Pombal, baseada nas políticas de expansões portuguesas e como forma de coibir a
entrada de invasores, principalmente dos espanhóis, na região da Amazônia.

FIGURA 38 – REAL FORTE DO PRÍNCIPE DA BEIRA, RO

FONTE: Disponível em: <http://www.skyscrapercity.com/showthread.php?t=336461>. Acesso


em: 20 jul. 2008.

As fortificações espalhadas por todo o Brasil ajudam a resgatar e a contar


a nossa história. Elas são o testemunho tangível deixado pelo homem sobre suas
batalhas, muitas vezes vitoriosas, outras nem tanto.

Assim como as construções religiosas que revelam muito do poder da


coroa portuguesa em terras brasileiras, como veremos a seguir!

4 AS CONSTRUÇÕES RELIGIOSAS
As primeiras manifestações artísticas dos portugueses no Brasil foram
principalmente na arquitetura de caráter religioso católico, como os templos,
conventos, seminários e escolas de catequese e de artes e ofício.

Há muitas divergências em apontar qual foi a primeira igreja erguida


no Brasil e sua data de construção. Algumas fontes apontam que foi a Igreja do
Outeiro da Glória em Porto Seguro, na Bahia, outras apontam como sendo a Igreja
Nossa Senhora da Misericórdia também em Porto Seguro.

Porém, para Garcez e Oliveira (2006, Encarte) eles mencionam, em seu


livro, que a primeira igreja a ser construída no Brasil foi a de Cosme e Damião, em
1535, na cidade de Igarassu, Pernambuco (Figura 39).

61
UNIDADE 2 | OS PORTUGUESES NO BRASIL

FIGURA 39 – IGREJA DE COSME E DAMIÃO, 1535. IGARASSU, PE

FONTE: GARCEZ, Lucília; OLIVEIRA, Jô. Explicando a Arte Brasileira.


Rio de Janeiro, 2006. p. Encarte.

FIGURA 40 – CAPELA SÃO GONÇALO DO AMARANTE, 1626.


JACAREPAGUÁ, RJ

FONTE: Disponível em: <http://www.cariocalegal.blogger.com.br/>.


Acesso em: 9 jun. 2008.

Muitas igrejas também eram erguidas por pessoas comuns para demonstrar
fé e também consquistar prestígio político e social, como foi o caso da capela de
São Gonçalo do Amarante, Figura 40.

Na época em que Martim Correa de Sá foi governador da cidade do Rio de


Janeiro, seu irmão, Gonçalo de Sá, senhor de engenho na várzea de Jacarepaguá,
nos idos do século XVI, mandou construir a capela São Gonçalo do Amarante em
dedicação ao mesmo santo, 1626.

No início deste período, em muitas construções, embora de forma mais


simples, a influência dos padrões culturais e artísticos europeu era total tanto que
partes dos retábulos, e às vezes retábulos inteiros, eram trazidos diretamente de
Portugal para ornar os primeiros altares, dominados ainda por padrões clássicos.

62
TÓPICO 1 | A ARTE NO BRASIL COLÔNIA

No decorrer dos séculos XVII e XVIII, os padrões do Barroco, importados


principalmente de Portugal, foram tomando conta das construções religiosas
brasileiras. Desse movimento, resultaram várias obras-primas, as quais
abordaremos a seguir.

UNI

Muitos autores afirmam que o estilo Barroco no Brasil, mesmo sendo fortemente
influenciado por Portugal, imprimiu em sua linguagem características particulares.
Diferentemente da conjuntura econômica, pela qual a Europa estava passando, de muita
pompa e luxo, no Brasil, o clima era diverso: vivia-se uma realidade de pobreza, escassez e
violência, em que ainda se perseguiam os índios e escravizavam os negros.

LEITURA COMPLEMENTAR

A ARTE MISSIONEIRA (1549-1800)

Hilda Höber Harres

Introdução

A arte missioneira, ou arte feita nas Missões no Brasil, era possibilitada pelas
ideias inovadoras dos Jesuítas. Entre estas estavam a arquitetura e objetos feitos pelos
índios. Os primeiros jesuítas vieram com o governador Tomé de Sousa, em 1549.
Eram em número de seis, e entre estes estavam o Padre Manuel da Nóbrega, que logo
fundou o colégio dos Meninos de Jesus, na Bahia.

Esse governador logo começou a construção da cidade de Salvador, a primeira


capital da Colônia. Instalaram a Câmara, a Igreja, o casario dos colonos. Assim, os
jesuítas logo começaram seu apostolado entre os indígenas, pois a sua finalidade aqui
no Brasil era a pacificação dos indígenas, pela catequese, e, mesmo assim, ainda havia
algumas divergências entre os colonos e índios.

Em 1553, trouxeram novos jesuítas, com o segundo governador D. Duarte da


Costa. Entre estes estavam o Padre Manuel da Nóbrega e José de Anchieta. Só com o
terceiro governador, Mem de Sá, foi possível uma harmonia entre índios e colonos.
Os objetivos da catequese, então, eram reforçar as ideias de bons costumes, através
da religião e do ensino da Arte.

Arte missioneira

Iniciou-se através das escolas dos jesuítas, pelos seus ensinos pacientes do
canto, da arte teatral, da tecelagem e de aulas de escultura em pedra e madeira. Eram
trabalhos simples, alguns chegaram até ser conservados nos interiores das igrejas,
63
UNIDADE 2 | OS PORTUGUESES NO BRASIL

como peças decorativas. São constituídos de imagens de santos, os mais diversos,


alguns de caracteres toscos, outros mais trabalhados e ricamente decorados, herança
do gosto português.

Os jesuítas, aos poucos, foram fixando os índios nas Missões, através de festas
pomposas em que empregavam os artifícios da representação e da música. Assim,
iam abrindo escolas perto das igrejas e aproximando os índios dos colonos. Havia,
nestas missões, mais de trinta mil índios.

Arquitetura primitiva jesuítica

A arquitetura jesuítica de 1500 é constituída de choupanas para índios e, no


século XVI, existiam também alguns poucos edifícios de pedra e cal. Usavam a cantaria
para adorno, como pedras polidas, sendo estas de arenita e itacolomita (pedra sabão).
Usavam frontispícios, soleiras, cornija e vergas.

Os prédios primitivos eram com telhado de vegetal (palha) e, para as paredes,


usavam pau a pique ou seja, pau e terra, isto é, barro armado com madeira. Das
construções civis, ressaltam-se as casas grandes das fazendas. Eram compostas de
senzalas ao redor, a capela, a cozinha e aposentos para hóspedes. Nas cidades, os
casarões tinham de sete a onze janelas, com a porta no meio.

Havia também casas pequenas de muito fundo, de duas águas e pouca frente.
As esculturas de monumentos vinham geralmente de Portugal (Lisboa). Eram de
mármore rosado chamado Lioz, que até bem pouco tempo era importado.

No século XVIII os engenheiros, geralmente, vinham de Portugal. O restante do


pessoal era chamado de mestre de obras, que preparava o desenho ou planta. Ainda
havia os pedreiros e rebocadores, os marceneiros e os imaginários (os escultores).

As construções antigas só as conhecemos através de gravuras de mestres da


época, pois nada se conservou com o tempo.

Porém, dos séculos XVI a XVIII, conservaram-se algumas igrejas até hoje, e
em alguns arquivos ainda se encontram plantas provenientes da época. As obras das
Missões foram projetadas por arquitetos da época e não foram obras de indígenas.

Características de uma igreja jesuítica

Temos, em São Paulo, uma igreja construída em adobe. Possui uma nave
central única e, ao seu lado esquerdo, um corredor e duas sacristias, que estão ao lado
da Capela-mor, sendo que o arco cruzeiro é o único elemento de pedra talhada. Esta
igreja é a de São Miguel, 1622.

FONTE: HARRES, Hilda Höber. História da Arte Brasileira: da pré-história à 1ª Bienal. Porto Alegre:
Sagra, 1979. p. 29.

64
RESUMO DO TÓPICO 1
Neste tópico, amigo(a) acadêmico(a), você viu que:

 Operíodo colonial compreende a chegada dos primeiros lusitanos em terras


brasileiras para sua colonização em 1530 – período em que o Brasil permaneceu
sob o poder socioeconômico, político e cultural – e o da sua idependência em
1822, proferida por Dom Pedro I.

 A Arte do período colonial brasileiro teve seu florescer no século XVI, com a
instalação das primeiras vilas e foram construídas fortificações e igrejas – já com
alguns traços deste estilo, com o intuito de resguardar a terra e manter a fé cristã
entre os colonizadores e promover a catequização dos aborígenes.

 Como forma de defender as terras de invasores e do próprio índio, Portugal


investe em fortificações espalhadas por vários pontos do Brasil, principalmente
na região litorânea. Atualmente, há um número expressivo de exemplares destas
construções que resistiram ao tempo e à ação do homem.

 As primeiras manifestações artísticas dos portugueses no Brasil foram


principalmente na arquitetura de caráter religioso católico como os templos,
conventos, seminários e escolas de catequese e de artes e ofícios.

65
AUTOATIVIDADE

Brasil foi descoberto em 1500, porém só foi colonizado algum tempo


depois. Esta fase, entre a descoberta e a colonização, a denominamos período
Pré-Colonial. Neste ínterim, apenas algumas expedições aportaram à nova
terra para inspeção, fiscalização e exploração dos nossos recursos naturais,
principalmente o pau-brasil, que possuía grande valor comercial. Com base na
Leitura Complementar e na assertiva acima, responda: quais as datas e os fatos
que marcaram o início e o final do período considerado colonial? Também
identifique que tipo de arte era desenvolvido no Brasil Colônia.

Bom Trabalho!

66
UNIDADE 2 TÓPICO 2

A OPULÊNCIA DO BARROCO

1 INTRODUÇÃO
O surgimento do movimento Barroco aconteceu na Itália, Roma, no final do
século XVI e logo se expandiu por toda a Europa e América Latina. Caracterizou-
se por ser um movimento estilístico filosófico que teve sua manifestação inicial nas
artes plásticas e na literatura. Logo atingiu o teatro, a música e a arquitetura, sendo
considerado, até, um estilo de vida.

Devido ao humanismo, o período Renascentista e, principalmente, à


Reforma – revolução espiritual que rompeu estruturas e doutrinas eclesiásticas
– a Igreja Católica teve seu poder enfraquecido, o que a levou a organizar a
Contrarreforma.

A Contrarreforma foi um meio pelo qual a Igreja Católica conseguiu reaver


sua soberania, frear o avanço protestante e conquistar seu prestígio e poder. Com
a Contrarreforma, tomou iniciativas importantes que visavam reafirmar e difundir
sua doutrina, como o Concílio de Trento, em 1545.

Garcez e Oliveira (2006, p. 29) afirmam que “[...] as novas invenções, as


grandes navegações, as turbulências políticas e religiosas causavam muita agitação
intelectual, e tudo se refletia numa atitude mais ousada nas artes, o que configurou
um estilo turbulento.”

É neste cenário de mudanças econômicas, sociais e fervor religioso


carregado de alegorias e contradições, ornamentação e rebuscamento, que nasceu
o Barroco.

O equilíbrio entre razão e emoção, características da escultura


renascentista, desapareceu com o predomínio do Barroco, que escolheu
a dramaticidade das expressões e o dinamismo dos movimentos como
elementos básicos de seu espírito. Essas peculiaridades da pintura
e escultura barroca se concretizaram através da predominância de
linhas curvas, excesso de dobras nas vestes e a utilização do dourado.
(CALÁBRIA; MARTINS, 2000, p. 121).

Este estilo se expande por muitas áreas da Arte e “[...] os seus princípios
levaram os músicos, escritores, pintores, escultores a produzir obras cheias de
movimento, ornamentação e emoção contraditórias.” (GARCEZ; OLIVEIRA, 2006,
p. 42). Porém, na arquitetura e decoração de interiores, principalmente no Brasil e
em construções religiosas, ele vai mostrar toda a sua opulência.

67
UNIDADE 2 | OS PORTUGUESES NO BRASIL

2 O BARROCO NO BRASIL

O prenúncio do Barroco chega no Brasil através dos colonizadores,


principalmente portugueses. Ele foi iniciado pelos missionários, religiosos, leigos
e também pelos jesuítas que usaram o novo estilo como forma de catequização.

Sua introdução na nova colônia deu-se por volta do início do século XVII,
período em que a população de suas vilas cresciam e se expandiam, inclusive para
o interior. Seu final é impreciso; alguns pesquisadores mencionam o século XVIII,
porém outros apontam que este estilo adentra o século XIX por mais duas décadas.

O Barroco no Brasil foi formado por uma complexa teia de influências


europeias e locais, embora em geral coloridas pela interpretação portuguesa do
estilo. É preciso lembrar que o contexto econômico em que o Barroco se desenvolveu
na colônia era completamente diverso daquele que lhe dava origem na Europa.
Aqui, o ambiente era de pobreza e escassez, com tudo ainda por fazer. Por isso, o
Barroco brasileiro já foi acusado de pobreza e incompetência quando comparado
com o Barroco europeu, de caráter erudito, cortesão, sofisticado e sobretudo branco,
apesar de todo ouro nas igrejas, pois muita coisa é de execução tecnicamente tosca,
feita por mão escrava ou morena. Mas esse rosto impuro, mestiço, é que o torna tão
único e inestimável. (PELOGGIO, 2006).

O estilo Barroco se expande por várias áreas: na literatura, que teve seu
maior expoente, Bento Teixeira, com o poema épico Prosopopeia (1601), também o
poeta Gregório de Matos e o orador sacro Padre Antônio Vieira.

Nas artes plásticas, muitas retratadas de forma ilusionista, poder-se-ia


citar José Joaquim da Rocha, José Patrício da Silva Manso, Padre Jesuíno do Monte
Carmelo, frei Ricardo do Pilar e Caetano da Costa Coelho.

Na música, Antônio Teixeira, que musicou várias obras do judeu Antônio


José da Silva, e juntos trabalharam em óperas como “As variedades de Proteu”.

Na escultura, ligada à produção de imagens de santos, podemos mencionar


Agostinho de Jesus, Manuel Inácio da Costa e Antônio Francisco Lisboa, o
Aleijadinho, um dos mais conhecidos representantes brasileiros do período
Barroco.

Mas é na construção e decoração de grandiosas igrejas que aflora a arte


barroca em toda a sua exuberência e plenitude. Arquitetos, escultores e pintores
foram convocados para transformar igrejas em verdadeiras exibições artísticas,
cujo esplendor tinha o propósito de converter ao catolicismo todas as pessoas.

Na área da arquitetura esta escola despontou esplendorosamente por


muitos pontos do Brasil, porém, há, visivelmente, uma distinção muito grande
entre as partes enriquecidas pelo comércio de açúcar e pela mineração, que foi o
caso de Minas Gerais, Rio de Janeiro, Bahia e Pernambuco.

68
TÓPICO 2 | A OPULÊNCIA DO BARROCO

Nestas regiões, “encontramos igrejas com trabalhos em relevo feitos em


madeira – as talhas – recobertas por finas camadas de ouro, com janelas, cornijas
e portadas decoradas com detalhados trabalhos de escultura”. (PROENÇA, 1999,
p. 196)

Nas regiões em que este comércio não despontou como Goiás, Mato
Grosso, São Paulo e até o Rio Grande do Sul “[...] a arquitetura teve outra feição.
Aí as igrejas apresentam talhas modestas e trabalhos realizados por artistas menos
experientes e famosos do que os que viviam nas regiões mais ricas da época.”
(PROENÇA, 1999, p. 196).

2.1 IGREJAS BARROCAS

É na construção e decoração das igrejas que emerge a arte barroca.


Conjuntamente, os arquitetos, escultores e pintores transfomaram esses templos
religiosos em verdadeiras exibições artísticas, cujo esplendor tinha o propósito de
converter ao catolicismo todas as pessoas.

Suas fachadas, muitas vezes austeras, escondem o esplendor que há no seu


interior. Outras já arrebatam com suas torres majestosas, seus recortes que causam
um ar dramático, seus pináculos, medalhões e anjos na entrada.

Mas, de ambas as formas, muitas delas possuem o seu interior ornados


por colunas com suas curvas graciosas. Nos altares, os retábulos com elaboradas
pinturas ornamentais. Também pode-se ver nichos e reentrâncias na composição
do altar que são destinados a abrigar as imagens dos santos.

A igreja de Nossa Senhora da Glória do Outeiro, Figura 41, localizada no


Rio de Janeiro, bairro da Glória, erguida entre 1714 e 1739, segundo site “roteiro
do brasil”, ela é tida como a primeira igreja do Brasil a ser construída com fachada
em estilo Barroco. “Tem painéis de azulejos e três altares de feição rococó. Foi o
lugar de batismo de integrantes da Família Real durante o Império, incluindo Dom
Pedro II e a princesa Isabel. ”

69
UNIDADE 2 | OS PORTUGUESES NO BRASIL

FIGURA 41 – IGREJA DE NOSSA SENHORA DA GLÓRIA DO OUTEIRO, RJ

FONTE: Disponível em: <http://oglobo.globo.com/rio/mat/2008/01/23/apos_dois_anos_de_


restauracao_outeiro_da_gloria_sera_reinaugurado-328170250.asp>. Acesso em: 10 jul. 2008.

Também podemos apreciar monumentais igrejas deste estilo nos estados


do Rio de Janeiro, Minas Gerais e Goiás.
Os jesuítas ensinaram aos índios e negros o alfabeto, a religião
e a trabalhar o barro, a madeira e a pedra. O índio é muito hábil na
imitação, mas, também muito primário e rústico na execução. O negro
adapta-se mais facilmente e é exuberante no desenho, na arte, no talhe e
nas lavras. Sob direção dos religiosos e de mestres, vindos além-mar, o
índio e o negro esculpiram muitos trabalhos, que são a base ao enxerto
da arte Barroca, em auge na Europa. (ARTE COLONIAL, 2008).

Há vários exemplares da arte Barroca no Brasil como a Capela Dourada da


Igreja da Ordem Terceira de São Francisco de Assis da Penitência, no Recife, estado
de Pernambuco, construída entre 1696 e 1724 (Figura 42). Esta igreja é considerada
um dos mais belos exemplos de transposição da talha borroca portuguesa no Brasil.

Visualizando a foto, percebemos que nas duas primeiras imagens acima e


a esquerda “.....o Barroco vibra com toda a força no dourado da talha de madeira
que veste a nave, nas imagens do altar principal, na iluminação natural que realça
o claro-escuro das paredes e do teto.” (POESIA, 1984).

Na sequência, o altar principal mostra toda a força do Barroco nos entalhes


dourados e de formas rebuscadas bem como na pintura marmorizada em tom de azul.

70
TÓPICO 2 | A OPULÊNCIA DO BARROCO

No alto e à direita, aparece a imagem de Nossa Senhora da Conceição


posicionada no altar principal. Abaixo e no canto esquerdo balaústre dos balcões
laterais da igrejas decorados com entalhe todo dourado de formas retorcidas e
anjos sentados. Na sequência, balaustrada enfeitada com formas que reproduzem
o desenho do chão.

Abaixo e à direita, “[...] o teto executado em perspectiva pelo pintor


português Caetano da Costa Coelho, num magistral trabalho de luz e sombra que
mostra a ascensão do santo padroeiro da igreja” e, por último, imagem do Cristo
alado com “[...] a face atormentada que domina a cena do sonho de São Francisco
de libertá-lo do sofrimento da cruz.” (POESIA, 1984).

FIGURA 42 – IGREJA DA ORDEM TERCEIRA DE SÃO FRANCISCO DE ASSIS DA PENITÊNCIA,


RECIFE, PE

FONTE: Disponível em: <http://www.starnews2001.com.br/aleijadinho/ordem-terceira.html>.


Acesso em: 15 jul. 2008.

A seguir, é apresentada também a Igreja de São Francisco – edificação


datada de 1708 Salvador, BA – considerada uma das mais ricas e suntuosas do
país (Figura 43). De fachada austera, causa deslumbramento pela decoração de seu
interior, que é toda recoberta por ouro.Na decoração de talha dourada, está presente
a combinação de vários materiais nobres como o ouro, a azulejaria portuguesa e
a madeira. Também foram desenvolvidas molduras de forma rebuscada e com
entalhe dourado, que envolvem painéis que abrigam pinturas religiosas. Esta arte
também está presente nas colunas espiraladas revestidas de folhagens.

71
UNIDADE 2 | OS PORTUGUESES NO BRASIL

[...] os painéis de azulejos portugueses que reproduzem a lenda do


nascimento de São Francisco e sua renúncia aos bens materiais. A nave
central, cortada por outra menor, forma uma cruz. As pinturas têm
forma de estrelas, hexágonos e octógonos e exaltam Nossa Senhora.
Na sacristia, estão reunidos dezoito painéis a óleo sobre a vida de São
Francisco. Os dois púlpitos laterais são talhados com folhas de videira,
pássaros e frutos colhidos por meninos e recobertos de ouro. (POESIA,
1984)

FIGURA 43 – IGREJA DE SÃO FRANCISCO, 1708. SALVADOR, BA

FONTE: TIRAPELI, Percival. Arte Brasileira: arte colonial Barroco e rococó. São Paulo: Companhia
Editora Nacional, 2007. p. 64-65.

Neste turbilhão de acontecimentos, uma cultura autóctone local – aquela


que é oriunda da terra natal sem importação – já se insinuava, mesmo que
despretenciosamente, pois ela só vai germinar plenamente no século XX.

2.2 ALEIJADINHO
Antônio Francisco Lisboa, o Aleijadinho, foi um dos maiores artistas do
período colonial. Nasceu por volta de 1738, em Vila Rica (atual Ouro Preto), filho
de um arquiteto português e de uma escrava negra.

Foi um exímio artista da arte sacra, cujo trabalho era pautado na escultura
sacra, e buscou e interpretou as referências do estilo Barroco tão bem e de forma
tão particular que em muitas obras deixou impresso o seu estilo. Considerado
extraordinário pela sua capacidade de esculpir madeira, transformando-a em
verdadeiras obras de arte, também se notabilizou como arquiteto.

Um dos exemplos de sua máxima perfeição é o Santuário do Bom Jesus de


Matosinhos, em Congonhas do Campo, Minas Gerais (Figura 44). Esse santuário é
composto por uma igreja “em cujo adro estão esculturas de pedra-sabão de doze
profetas: Isaías, Jeremias, Baruque, Ezequiel, Daniel, Oseias, Jonas, Joel, Abdias,
Habacuque, Amós e Naum.” (PROENÇA, 2006).

72
TÓPICO 2 | A OPULÊNCIA DO BARROCO

Estes profetas (Figuras 44, 45 e 46) estão dispostos em vários pontos do


adro da igreja e em posições e gestos diferentes, porém coordenáveis entre si. “O
resultado disso é muito interessante, pois o observador tem a forte impressão
de que as figuras de pedra estão se movendo, gesticulando e dirigindo-se aos
ouvintes.” (PROENÇA, 2006).

FIGURA 44 – ADRO DO SANTUÁRIO DE BOM JESUS DE MATOSINHOS, MG

FONTE: Arquivo pessoal do autor

FIGURA 45 – PROFETA FIGURA 46 – PORMENOR

FONTE: Disponível em: <http://flickr.com/photos/elisfrigini/2274330905/>.


Acesso em: 25 jul. 2008.

Outro exemplo de sua máxima genialidade é o projeto desenvolvido para a


igreja de São Francisco, em Ouro Preto, Minas Gerais (Figura 47). No portal, acima
da porta de entrada, foram incrustados, em pedra sabão, arcanjos e fitas (Figura 48).

A porta de entrada ostenta medalhões e arabescos, tudo é muito elaborado.


No seu interior, observa-se uma profusão de detalhes marcantes (Figura 49):

O templo, belo, repleto de detalhes, o altar colado à parede, como primeiro


degrau de um trono magnífico, no qual se avultam as imagens dos santos,
deslumbrantes, douradas, ricas. Não se vê a mesa do sacrifício: ela praticamente

73
UNIDADE 2 | OS PORTUGUESES NO BRASIL

não existe: é, o degrau do trono. Uma balaustrada separa o povo do altar: para as
damas da nobreza, frizas e camarotes, como num teatro, as chamadas “tribunas”.
(LETTERI, 2006).

FIGURA 47 – IGREJA FIGURA 48 – PORMENOR FIGURA 49 – INTERIOR

FONTE: PROENÇA, Graça. Descobrindo a História da Arte. São Paulo: Ática, 2006. p. 121.

Ao observarmos as obras do Aleijadinho, logo percebemos toda a sua


genialidade. Ele imprime força, dramaticidade e personalidade nas feições e nas
gestualidades de suas esculturas (Figuras 50, 51 e 52).

Quando observamos bem as obras do Aleijadinho, compreendemos a


força do seu gênio e da sua arte. As características próprias do Barroco
adquirem em seus trabalhos uma feição particular. Observe que os olhos
são expressivos, espaçados e amendoados. Têm um ar oriental. As maçãs
do rosto não são arredondadas, como em geral se apresentam nos anjos
Barrocos. O nariz é reto e alongado, o que dá muita força às fisionomias.
Os lábios estão entreabertos, trazendo uma ideia de movimento e vida
à figura. O queixo é pontiagudo e o pescoço é alongado, conferindo
elegância e altivez à imagem esculpida. As dobras das vestes indicam
movimento e energia. (GARCEZ; OLIVEIRA, 2003. p. 54).

FIGURA 50 – NOSSO SENHOR DA PACIÊNCIA

FONTE: LUCÍLIA, Garcez; OLIVEIRA, Jô. Explicando a Arte


Brasileira. Rio de Janeiro: Ediouro, 2003. p. 55.

74
TÓPICO 2 | A OPULÊNCIA DO BARROCO

FIGURA 51 – CRISTO CARREGANDO A CRUZ.FLAGELAÇÃO

FONTE: PROENÇA, Graça. Descobrindo a História da Arte. São


Paulo: Ática, 2006. p. 121.

FIGURA 52 – CRISTO NA CRUCIFICAÇÃO

FONTE: PROENÇA, Graça. Descobrindo a História da Arte. São Paulo:


Ática, 2006. p. 121.

Antônio Francisco Lisboa, o Aleijadinho, sofreu por toda a sua vida de


uma misteriosa doença que lhe atrofiou os membros e o deformou. Morreu cego,
totalmente debilitado e pobre, em 1814.

Mesmo sem os dedos e rastejando, esta condição não o impediu de levar seu
trabalho adiante e desenvolver belíssimas obras que encantam e fascinam até hoje.

75
UNIDADE 2 | OS PORTUGUESES NO BRASIL

LEITURA COMPLEMENTAR

O BARROCO NO BRASIL

O Barroco no Brasil é um tema que atrai o estudioso de nosso passado e está


longe de ter sido suficientemente explorado em todos os seus ângulos. Foi esquecido,
abandonado e dilapidado. Hoje, volta-se o interesse público para este remanescente
da nossa era colonial. Agora, percebe o alcance da incúria a que foram relegados os
monumentos artísticos coloniais, vêm eles sendo estudados sob os mais variados
aspectos, numa ânsia de revalorizar nosso patrimônio cultural dos três primeiros
séculos após a Descoberta.

Mas não seria justo carregar demasiado nas recriminações porquanto


razões houve, que conviria analisar e estudar, tanto para o descuido como para a
revivescência do interesse pelo Barroco.

O Barroco testemunha a nossa primitiva arrancada colonial proporcionada


pela riqueza criada com a produção de açúcar, fumo e madeiras nos séculos XVI,
XVII, XVIII, e com o predomínio da mineração do ouro durante todo o século XVIII
e princípio do XIX . Após uma estagnação que durou século e meio, reinicia-se
agora a arrancada com novo surto, definitivo e em crescente ascensão, que de novo
estimula o ânimo e o entusiasmo de nosso povo.

A arte barroca, no Brasil, vem sendo estudada com afinco, com as construções
religiosas da orla marítima e de Minas Gerais. Mas existem manifestações de arte
barroca menos exuberantes, modestas mesmo, em Goiás, Mato Grosso, São Paulo
e, na costa sul, até o Rio Grande do Sul. Tais construções, embora sem o brilho e
a magnificência das de Minas Gerais, Rio de Janeiro, Bahia e Pernambuco, foram
expressões artísticas que ocorreram no século XVIII, tendo forçosamente alguma
representação barroca, já que este estilo era o reinante na época.

Existem várias questões a serem feitas para o entendimento do que


representou o Barroco e como ele foi implantado no Brasil-colônia:

O que é o Barroco? Como chegamos a esta expressão artística? Por que sua
manifestação é quase totalmente religiosa? Quais os acontecimentos ocorridos
no mundo ocidental relacionados com o Barroco durante os dois séculos de
sua predominância? Qual a razão de sua decadência? Por que foi esquecido e
desprezado? Quais os elementos de nossa história que influíram na construção
religiosa barroca? E finalmente, o mais importante: quais os elementos psicológicos
que motivaram as grandiosas ou modestas criações da arte religiosa barroca?

A resposta a estas questões permitirá o desenvolvimento de um esboço


histórico do Barroco no Brasil. Este bem compreendido, como um todo, consegue-se
perquirir o que, na época, se passou na alma de nossos ancestrais para proporcionar
fundos que permitissem tão abundante construção de igrejas barrocas. Estas, hoje

76
TÓPICO 2 | A OPULÊNCIA DO BARROCO

redescobertas, causam admiração, encorajando-nos a preservar o que restou de todo


este acervo de nossa cultura.

O Barroco, longe de ser uma arte em decadência, como se acreditava até o


fim do século XIX, revelou-se aos olhos dos que o estudaram sob um novo enfoque,
como manifestação surpreendente de arte criadora, original e consentânea com a
evolução do mundo ocidental dos séculos XVII e XVIII. Deve-se a Wolfflin esta
reviravolta sobre o conceito do Barroco. Este estudioso suíço publicou em 1888,
quando tinha apenas 24 anos de idade, um livro intitulado “Renascença e Barroco”.
Esta obra pioneira desencadeou a febre do conhecimento Barroco, que passou a atrair
a atenção dos estudiosos de História da Arte em todo o mundo. Desses estudos
veio o interesse nacional pelas nossas construções barrocas que se revelaram de
inestimável valor artístico.

Para melhor compreensão do fenômeno artístico entre nós, convém situá-


lo no contexto da evolução das manifestações de arte no mundo ocidental. Assim,
poderemos compreender melhor as implicações psicológicas responsáveis pelo seu
desenvolvimento em nosso meio.

Num renovado exemplo do sir transit gloria mundi, o Barroco, testemunho


dos desvarios da fortuna colonial, era substituído pela sobriedade; por isso mesmo
foi condenado como arte decadente e de mau gosto; julgamento que mal disfarçava
a decepção e a inveja das gerações subsequentes pela opulência imaginária dos
ancestrais que testemunharam, viveram e sofreram, na exaltação e na miséria, o
ciclo do ouro no Brasil-colônia .

A configuração socioeconômica do Brasil colonial foi propícia ao


desenvolvimento do Barroco ligado à religião católica. Existem, entretanto,
construções civis com as características do Barroco, sobretudo cadeias, fortes e
chafarizes e algumas moradias das autoridades da coroa ou potentados da época,
sem falar nos inúmeros detalhes arquitetônicos de residências em cidades mais
prósperas, tais como Recife, Salvador, Rio de Janeiro e Ouro Preto.

Para análise das reações emocionais ligadas às construções barrocas, vamos


nos cingir às igrejas. Estas constituem a grande maioria destas construções e têm em
comum a intenção religiosa, adequada ao nosso estudo. O Barroco nas construções
civis é a representação do estilo vigente na época, subordinado aos recursos da
metrópole ou dos cidadãos.

A análise das reações psicológicas que determinaram estas construções teria


que ser a análise da riqueza de cada um e das usuais consequências das relações
humanas em comunidade – vaidade, ostentação, competição, inveja; estas levaram
ao esforço de execução de requintes arquitetônicos em beneficio de construções
mais vistosas e confortáveis, que se destacaram do comum das moradias simples,
mais consentâneas com as condições frugais da vida ambiente.

A palavra “Barroco” era usada pelos portugueses para designar as pérolas


naturais de formas bizarras, irregulares, diferentes das conhecidas pérolas esféricas.
77
UNIDADE 2 | OS PORTUGUESES NO BRASIL

A arte barroca é também conhecida como o “estilo da Contrarreforma”, já


que seu aparecimento coincide com o período da efervescência religiosa que deu
origem ao Concílio de Trento, em 1545.

O Barroco é o característico de um largo período da história do mundo


ocidental durante o qual surgiram tantos estilos diversos quantos foram os grupos
sociais que produziram obras de arte. Este conceito de Hauser esclarece o significado
de vários qualificativos do Barroco, tais como plateresco, jesuítico ou estilo D. João
V e rococó, que são manifestações específicas de determinadas épocas, todas dentro
do conceito geral do Barroco.

O Barroco exprime o imponderável, visando ao infinito, pois nem os tetos


das igrejas limitam o espaço, quando decorados com pinturas que os projetam para
as nuvens, representando a assunção da Virgem, a ascensão do Senhor ou a corte
celeste.

Esta imponderabilidade tem seu complemento nos elementos de sustentação


que se multiplicam graciosamente, sem nada sustentar; nos arcos que se curvam e
torcem como se fossem maleáveis; na pintura com iluminação artificial e de caráter
ilusionista; enfim, um mundo plástico criado com o objetivo de enaltecer o Altíssimo,
numa glória e exaltação religiosas que bem indicam a reação da Contrarreforma
dentro de uma religião necessitada de renovação saneadora. Mas afinal, o que é o
Barroco? E como é representado artisticamente?

Ele foi a expressão artística de duzentos anos de atividades construtivas, e sua


manifestação teve que representar as emoções dos povos e das civilizações da época.
O Barroco, na sua expressão religiosa, tem o característico geral de uma aspiração
ao infinito. É suntuoso, porque assim exalta a glória de Deus; é redundante, porque
reforça a expressão dessa glória; é cheio de formas esvoaçantes, que exprimem a
espiritualização da fé.

Dentro dessa aspiração, manifestou-se com riqueza espantosa onde houve


recursos, sobretudo o ouro que amparava suas pretensões; e foi modesto, pobrezinho,
humilde onde, mesmo a míngua de recursos, deixou sua marca nesta ou naquela
composição que exprimiu tudo o que a veneração modesta do fiel pôde oferecer
a seu Deus. São todas expressões do Barroco, com cambiantes ligadas à situação
social das comunidades. Se o suntuoso representa o Barroco na sua plenitude áurea,
o modesto exprime o mesmo Barroco que, por sua vez, é a sua linguagem de fé.

O Brasil, sendo colônia riquíssima pela cultura e comércio do açúcar e pela


mineração, teria que produzir um Barroco rico na sua representação máxima, em
talha polimorfa recamada do mais fino ouro brasileiro. Aí estão as construções de
Minas Gerais, Rio de Janeiro, Bahia e Pernambuco.

Por exemplo, as igrejas barrocas com sua arquitetura imponente, com volutas
imensas, cornijas, janelas, portadas com linhas características onde predominam a
curva e a simetria de ornatos. O encanto das torres com suas cúpulas esféricas, e às
vezes sobrepostas, e suas pináculas.
78
TÓPICO 2 | A OPULÊNCIA DO BARROCO

Em meio a esse turbilhão de formas de sustentação e de enfeites, anjos,


cariátides, pelicanos e grifos completam o conjunto como chamas esvoaçantes de
ouro, que exaltam a efígie de Cristo e dos santos de sua corte celestial. Entre os
altares, quadros a óleo ou talha decorativa, num movimento contínuo, envolvendo
os fiéis que, olhando para cima, veem o próprio céu no além representado no forro
pintado: a porta celestial para o infinito, para a companhia dos anjos, da Virgem,
dos apóstolos e do próprio Deus.

FONTE: BARROCO NO BRASIL. Disponível em: <http://www.geocities.com/Barroco_brasil/


brasil01.html>. Acesso em: 18 jul. 2008.

79
RESUMO DO TÓPICO 2
Neste tópico, caro(a) acadêmico(a), você teve oportunidade de estudar os
seguintes itens referentes à Arte Brasileira:

 O prenúncio do Barroco chega no Brasil através dos colonizadores portugueses,


por volta de início do século XVII. Ele foi iniciado pelos missionários, religiosos,
leigos, que usaram o novo estilo como forma de catequisação.

 Seu final é impreciso: alguns pesquisadores mencionam o século XVIII porém,


outros apontam que este estilo adentra o século XIX por mais duas décadas.

 O estilo Barroco se expande em várias áreas como: literatura, música, artes


plásticas, escultura, mas é na construção e decoração de grandiosas igrejas que
aflora a arte barroca com toda a sua exuberância e plenitude.

 Antônio Francisco Lisboa, o Aleijadinho, foi um dos maiores artistas do período


colonial. Nasceu por volta de 1738, em Vila Rica (atual Ouro Preto), filho de um
arquiteto português e de uma escrava negra.

 Foi um exímio artista da arte sacra, na qual seu trabalho era pautado, e buscou
e interpretou as referências do estilo Barroco tão bem e de forma tão particular
que em muitas obras deixou impresso o seu estilo.

 Ao observarmos as obras do Aleijadinho, logo percebemos toda a sua


genialidade. Ele imprime força, dramaticidade e personalidade nas feições e nas
gestualidades de suas esculturas.

80
AUTOATIVIDADE

O prenúncio do Barroco chega ao Brasil através dos colonizadores


portugueses, no início do século XVII. Ele foi iniciado pelos missionários,
religiosos, leigos e também pelos jesuítas que usaram o novo estilo como forma
de catequização. Ao longo do tempo, este estilo se expande por muitas áreas da
Arte e “os seus princípios levaram os músicos, escritores, pintores, escultores a
produzir obras cheias de movimento, ornamentação e emoção contraditórias.”
(GARCEZ; OLIVEIRA, 2006, p. 42). Porém, é na arquitetura e decoração de
interiores, principalmente no Brasil e em construções religiosas, que ele vai
mostrar toda a sua opulência. Para melhor fixar esta fase da história da Arte
Brasileira, desenvolva um painel de imagens com registros de construções
deste período, identificando local, data e nomeando-as. Também comente sobre
o que é arte barroca.

Bom Trabalho!

Assista ao vídeo de
resolução desta questão

81
82
UNIDADE 2
TÓPICO 3

OS HOLANDESES NO BRASIL

1 INTRODUÇÃO
No início de sua colonização, o Brasil sofreu frequentes invasões,
principalmente dos franceses, ingleses e holandeses. Estes últimos, em 1624,
conseguiram se infiltrar e permaneceram no nordeste do país até 1654.

Em sua estada, no nordeste brasileiro, os holandeses influenciaram não só


na política e na economia como também na arte e na cultura. Trouxeram a primeira
missão artística que tinham como objetivo retratar suas conquistas e mostrá-las
à Europa. Muitas dessas obras elaboradas por esta missão foram representadas
através de mapas artisticamente desenhados.

O Conde Maurício de Nassau chega no Brasil em 1637 e se estabelece no


Recife, a serviço da Companhia das Índias Ocidentais. Em sua comitiva, vieram
médicos, arquitetos, geógrafos, escritores, cientistas e pintores.

Estes artistas, trazidos por Nassau, foram os precursores na representação


das paisagens e cenas da vida brasileira de forma desvinculada da religiosa.

UNI

O Rio de Janeiro foi capital do país por quase dois séculos, até a inauguração de
Brasília, em 1960. A cidade tem um imensurável patrimônio histórico e hoje é considerada
a “capital cultural do Brasil”. Seus oitenta museus, instalados em palácios ou mansões que
pertenceram a colecionadores de arte, são uma viagem à parte. (ROTEIRO DO BRASIL).

2 OS HOLANDESES NO NORDESTE
Os holandeses influenciaram não só a política e a economia, mas também
a Arte e a cultura na região do nordeste brasileiro. Na ânsia de retratar tudo que
viam e também suas conquistas para mostrá-las ao continente Europeu, a missão
artística – primeira no Brasil – desenvolveu vários mapas.
83
UNIDADE 2 | OS PORTUGUESES NO BRASIL

“Os mapas, além de informações geográficas e náuticas exatas, eram


artisticamente ornamentados com desenhos de brasões, alegorias, animais e, neste
caso, com paisagens.” ( TIRAPELI, 2007, p. 45)

Analisando atentamente a Figura 53, percebemos uma profusão de detalhes


em que vemos construções, vegetações, animais, humanos, etc.

Na Figura 54, vemos posicionado no canto esquerdo, ao alto, desenhos de


brasões e o nome da capitania conquistada por Maurício de Nassau.

Ainda nesta mesma figura, logo ao lado, posicionada à direita e no alto,


identificação do mapa e as esquadras que simbolizam quatro batalhas entre os
holandeses e os luso-espanhóis.

Seguindo, na Figura 54, as três imagens mostram índios, capelas, engenhos,


parte da flora de Pernambuco, naus, entre outros elementos.

FIGURA 53 – GEORGES MARC GRAVE. MAPA DO PERNAMBUCO, ITAMARACÁ, PARAÍBA E


RIO GRANDE, 1647. GRAVURA AQUARELADA, 42CMX104 CM. ACERVO DO
ITAMARATY, BRASÍLIA, DF

FONTE: TIRAPELI, Percival. Arte Brasileira: arte moderna e contemporânea figuração,


abstração e novos meios. São Paulo: Nacional, 2007. p. 44.

84
TÓPICO 3 | OS HOLANDESES NO BRASIL

FIGURA 54 – PORMENOR DO MAPA DO PERNAMBUCO, ITAMARACÁ, PARAÍBA E RIO GRANDE,


1647

FONTE: TIRAPELI, Percival. Arte Brasileira: arte colonial Barroco e rococó. São Paulo: Companhia
Editora Nacional, 2007. p. 45.

Com a chegada do Conde Maurício de Nassau no Brasil, em 1637, muita


coisa mudou. Homem culto e letrado, também admirador da arte quando se
estabeleceu no Recife, a serviço da Companhia das Índias Ocidentais, trouxe em
sua comitiva médicos, arquitetos, geógrafos, escritores, cientistas e pintores.

Holandeses, flamengos, alemães, os chamados pintores de Nassau, por


não serem católicos, puderam facilmente dedicar-se a temas profanos, o
que não era permitido aos portugueses. Em consequência disso, foram os
primeiros artistas no Brasil e na América a abordar a paisagem, os tipos
étnicos, a fauna e a flora como temática de suas produções artísticas,
livre dos preconceitos e das superstições que era de praxe se encontrar
nas representações pictóricas que apresentavam temas americanos.
Foram verdadeiros repórteres do século XVII. (ARTE HOLANDESA,
2008).

Os artistas trazidos por Nassau foram os precursores na representação das


paisagens e cenas da vida brasileira de forma disvinculada da religiosa. Podemos
citar dois nomes de artistas importantes trazidos por Nassau: Frans Post (1612-
1680) e Albert Eckhout (1610-1666).

O Holandês Post, que ingressou no Brasil aos 24 anos de idade, foi


considerado o primeiro europeu a pintar as paisagens do Brasil, no período
colonial. Sua primeira obra realizada foi “A Ilha de Itamaracá, 1637, Figura 55.

Mas também retratou outros temas como natureza morta, retratos porém,
pois seu forte foi a paisagem tema que lhe rendeu notoriedade e muito dinheiro
(Figura 56).

85
UNIDADE 2 | OS PORTUGUESES NO BRASIL

FIGURA 55 – POST. VISTA DE ITAMARACÁ, 1637. ÓLEO SOBRE


TELA, 63,5X89,5CM

FONTE: GARCEZ, Lucília; OLIVEIRA, Jô. Explicando a Arte Brasileira.


Rio de Janeiro, 2006. p. 36.

FIGURA 56 – POST. VISTA DA CIDADE MAURÍCIA E DO RECIFE, 1657.


ÒLEO SOBRE TELA, 46X83 CM, COLEÇÃO PARTICULAR

FONTE: BEUTTENMÜLLER, Alberto. Viagem pela arte brasileira. São Paulo:


aquariana, 2002. p. 24.

As pinturas realizadas pelo artista holandês Eckhout constituem importante


documento no resgate da fauna, da flora e da gente brasileira, pois são registros do
período colonial, época em que não havia a fotografia (Figuras 57, 58 e 59).

FIGURA 57 – ECKHOUT. DANÇA DOS TAPUIAS, 1641. OST, 168X294 CM.


MUSEU NACIONAL DA DINAMARCA, COPENHAGUE

FONTE: BEUTTENMÜLLER, Alberto. Viagem pela arte brasileira. São Paulo:


aquariana, 2002. p. 25.

86
TÓPICO 3 | OS HOLANDESES NO BRASIL

FIGURA 58 – ECKHOUT. GUAMAIACUGUARA (BAIACU DE ESPINHO),


1660. BIBLIOTECA JAGIELLONSKA, CRACÓVIA, POLÔNIA

FONTE: APOLINÁRIO, Maria Raquel. História. São Paulo: Moderna, 2005.


p. 183.

FIGURA 59 – ECKHOUT. NATUREZA-MORTA, S/D. ÓLEO SOBRE


TELA, 90CMX90CM. ACERVO MUSEU NACIONAL DA
DINAMARCA

FONTE: TIRAPELI, Percival. Arte Brasileira: arte colonial barroco e


rococó. São Paulo: Companhia Editora Nacional, 2007. p. 46.

Vários outros artistas de diferentes nacionalidades deixaram seus registros


no e sobre o Brasil na arquitetura, na pintura, na literatura, na música, etc. Muitos
trazidos pelos próprios portugueses, outros vieram através da companhia de
Maurício de Nassau.

Também aportaram aqui artistas que vieram de forma deliberada


vislumbrados pela formação de uma camada da sociedade abastada – ávida para
ser retratada – pela luminosidade e também pela natureza exuberante que aqui
encontraram.

87
UNIDADE 2 | OS PORTUGUESES NO BRASIL

UNI

A cultura brasileira é a soma do resultado da mescla de elementos culturais dos


índios, dos negros e dos brancos, principalmente portugueses.

LEITURA COMPLEMENTAR

A CRIAÇÃO DO MITO DO BRASIL HOLANDÊS



Gabriel Passetti

A conquista

A invasão holandesa se deu entre os anos de 1630 e 1654, com dois grandes
períodos de guerras: 1630-1635 e 1645-1654, quando os portugueses finalmente
reconquistaram o centro econômico de sua principal colônia.

O senso comum e os discursos dos guias turísticos mostram, mesmo que


indiretamente, a ideia de que o Brasil poderia ser bem diferente se a colonização
holandesa tivesse funcionado. Não existiria um “Brasil” coeso, mas com certeza
este “Brasil holandês” teria algumas bases sociais e econômicas bem diferentes do
“Brasil português”.

A visão deste “Brasil melhor” que é tanto difundida, é influenciada pelo


fato de o governador da colônia holandesa ter sido o Conde Maurício de Nassau.

A tomada do nordeste brasileiro pela WIC (Companhia Holandesa das


Índias Ocidentais) deu-se após diversos anos de estudos, em que grande parte
da comunidade judaica local colaborou com os invasores, devido às perseguições
sofridas junto aos católicos.

Também foram utilizados alguns espiões nos barcos que para cá vieram, que
registraram a geografia do local e levaram indígenas à Europa. Havia dois interesses
fortemente ligados na decisão holandesa de dominar as colônias sul-americanas
dos portugueses.

O primeiro deles era o fato de a Holanda ter se tornado inimiga de Portugal,


após este ser vassalo da Espanha, o outro, financeiro, visto que a produção e o
comércio de açúcar eram extremamente lucrativos e os holandeses já dominavam
as transações comerciais deste produto.

Após a morte do infante D. Henrique em 1580, houve uma grave crise na


linha de sucessão ao trono português, visto que o jovem Rei ainda não havia deixado
herdeiros. Após muita discussão internacional e uma tentativa de golpe, finalmente
88
TÓPICO 3 | OS HOLANDESES NO BRASIL

o Rei de Espanha, Felipe II (Felipe I de Portugal) assumiu o trono fazendo com que
Portugal se tornasse inimigo consequentemente da Holanda, por esta ser inimiga
da Espanha.

A Holanda tinha diversos investimentos no Brasil com empréstimos a


senhores de engenho e intensas ligações comerciais com a venda de açúcar e de
pau-brasil. Em 1621, foi criada a Companhia das Índias Ocidentais, de capital
aberto na Bolsa de Valores de Amsterdã, e nos mesmos moldes da já importante
Companhia das Índias Orientais. Quem presidia a WIC (sigla em flamengo) era o
Conselho dos XIX.

Primeiramente tentou-se conquistar a cidade de Salvador, capital


administrativa da colônia portuguesa, porém com a derrota optou-se por Olinda e
Recife, centros econômicos. Em 1630, uma frota composta de 56 navios, com 3.780
tripulantes e 3.500 soldados chegou a Olinda. Rapidamente dominaram esta vila e
pouco tempo depois a de Recife.

Matias de Albuquerque, governador português de Pernambuco à época,


levantou acampamento em Arraial de Bom Jesus com a intenção de organizar a
defesa. Tal centro de defesa foi importantíssimo quando, em 1631, chegou uma
frota hispano-portuguesa de 23 navios para o contra-ataque. Em parte a tal contra-
ofensiva foi triunfante, visto que os navios desembarcaram em Alagoas e seus
efetivos conseguiram forçar os holandeses a abandonar e incendiar Olinda para
defenderem somente Recife.

Porém, a política expansionista holandesa não foi freada aí, visto que no
mesmo ano estes partiriam para tentar, sem sucesso, a conquista da Paraíba e do
Rio Grande do Norte. Tal conquista, porém, foi concretizada em 1635, quando o
domínio holandês no Brasil, ou o “Brasil Holandês” chegou ao Rio Grande do
Norte. Até junho do mesmo ano, excetuavam-se somente o Arraial de Bom Jesus
e o Forte de Nazaré nesta conquista, porém neste mês caíram estes dois últimos
focos de resistência.

A chegada de Maurício de Nassau

Em 1637 pode ser considerado um marco na história da colonização holandesa


no Brasil, pois neste ano chegou seu mais famoso e importante administrador, o
Conde Maurício de Nassau (João Maurício de Nassau-Siegen).

Nassau marcou época como governador tentando realizar uma política


conciliatória entre holandeses e portugueses, além de oferecer liberdade restrita
de credo para católicos e judeus. Entretanto, isto não impossibilitou uma crescente
onda antissemita baseada em diversos preconceitos religiosos e no poder social e
econômico que os judeus adquiriram com o tempo.

A política do Conde também trouxe diversos avanços culturais e estruturais


ao Recife. A ciência foi incentivada, criou-se uma política de higiene e sanitarismo
público. Foram construídos jardim botânico, zoológico, museu artístico e um plano
89
UNIDADE 2 | OS PORTUGUESES NO BRASIL

urbanístico para a Cidade Maurícia, baseado no urbanismo holandês, tendo em


vista a especificidade da cidade pernambucana com seu complexo sistema de rios,
e as semelhanças com diversas e importantes cidades holandesas situadas também
neste contexto geográfico.

O governador combateu a oligarquia local dos senhores de engenho,


incentivando o crescimento da burguesia, classe que o financiava a partir da Holanda.
Deste modo, foram combatidas a monocultura e a fome. Todo o interior, entretanto,
ainda era tomado pelos portugueses que tinham o conhecimento da produção da
cana-de-açúcar e consequentemente a economia em suas mãos, enquanto o poder
institucionalizado estava nas mãos dos holandeses.

Com a conquista assegurada, o governo holandês ofereceu aos imigrantes


e aos senhores de engenho portugueses que não fugiram para a Bahia diversos
incentivos fiscais e empréstimos para a reconstrução dos engenhos arrasados pela
guerra, com gado morto e escravos fugidos.

Considerações finais

A ocupação holandesa do nordeste brasileiro é vista como um passado


que não deveria ter sido encerrado pela reconquista de 1645-1654, pois a política
holandesa teria formado um Brasil mais forte economicamente e, desde o seu início,
urbano. Esta visão é superficial: para negá-la, bastaria observar-se o desenvolvimento
das colônias holandesas nas Antilhas, por exemplo.

A política holandesa restringia ainda mais as possibilidades econômicas


do Nordeste do que a portuguesa, bem como limitava o plano social, com a crise
entre brancos e judeus, negros e índios. Assim, durante os 24 anos de dominação
foi criada uma grande segregação religiosa-racial.

No entanto, não devemos deixar de lado os pontos positivos da política


holandesa, e principalmente do Conde Maurício de Nassau. Com sua base urbana,
trabalhou para impedir o poder dos senhores de engenho e das oligarquias agrárias,
incentivando assim a transformação da sociedade pernambucana de agrária para
urbana. Além disso, foram muitos os esforços em melhorias para a população local,
que viu em Nassau um governante que os ajudou com suas políticas de combate à
fome e à monocultura.

A comunidade judaica na América até os nossos dias cita orgulhosa os tempos


de colônia em Pernambuco, onde desfrutava de liberdade religiosa impensável na
época para os padrões europeus e católicos.

Se podemos falar de algum erro do governo holandês, que acabou por gerar
a revolta e perda de Pernambuco, foi de não ter incentivado mais os holandeses
a acessar a terra. Deste modo, os portugueses, apesar de dominados, tinham a
economia em suas mãos, autêntica base do projeto econômico da Companhia
Holandesa das Índias Ocidentais.

90
TÓPICO 3 | OS HOLANDESES NO BRASIL

Criou-se um mito com relação ao governo de Nassau para a população


do Recife e região, algo como um herói nacional. Ignora-se o fato de Nassau ser
um governante a mandos da mercantilista, ou capitalista, Companhia das Índias
Orientais. Suas políticas muitas vezes foram feitas para impedir uma guerra civil e
a instabilidade social na colônia. O incentivo à colonização da Ilha de Antonio Vaz
se deu principalmente após a superlotação da cidade do Recife, e Nassau, vivendo
na colônia, podia muito melhor do que o Conselho dos XIX perceber que, se não
fosse ampliada a área habitável da colônia, em breve uma insurreição nasceria.

O alemão Maurício de Nassau representava somente uma tendência, que ia


inclusive contra o pensamento de grande parte dos comandantes da WIC, que tinham
um pensamento muito mais semelhante ao português, buscando uma exploração
interligada com o sistema colonial. Foi inclusive esta diferença que proporcionou a
saída prematura de Nassau do governo colonial holandês no Brasil.

Obviamente, Nassau também fora um incentivador da cultura e gastou


muitas vezes dinheiro próprio para criar locais onde havia um incentivo à cultura
e à ciência, como foi o caso do jardim botânico e do zoológico, por exemplo. Gastou
do seu próprio bolso para finalizar a obra da ponte juntando o Recife à Cidade
Maurícia, mas, mais uma vez, devemos observar que este fato se deu também para
incentivar a cidade por ele planejada e para conter a lotação habitacional que estava
tornando insustentável o modo de vida e a própria urbanização do Recife.

A colonização holandesa foi, portanto, urbana e burguesa, diferindo assim


da instalada pelos portugueses, extremamente agrária. Não podemos afirmar se
uma ou a outra seria melhor para o desenvolvimento, pois só podemos observar o
produto de uma delas e é superficial ao fazer paralelismos com o desenvolvimento
de colônias holandesas em outros locais. O máximo que podemos afirmar é que,
de 1630 a 1654, parte da América do Sul viveu sobre outro sistema social que foi
combatido e derrotado por problema internos dele próprio e pela classe social
dominante do sistema econômico-social que havia sido desmantelado.

Dúvidas permanecem em aberto, principalmente porque a pesquisa que


realizei não foi muito extensa. Apenas busquei levantar os principais pontos sobre
a permanência dos holandeses no Brasil e discutir um pouco a criação do mito de
Maurício de Nassau e seu governo em Pernambuco.

FONTE: PASSETTI, Gabriel. A criação do mito do Brasil Holandês. Disponível em: <http://www.
duplipensar.net/artigos/2007s1/criacao-do-mito-do-brasil-holandes.html>. Publicado em:
13 abr. 2007. Acesso em: 1 ago. 2008.

91
RESUMO DO TÓPICO 3
Neste tópico, caro(a) acadêmico(a), você teve oportunidade de estudar os
seguintes itens acerca da Arte Brasileira:

 No início de sua colonização, o Brasil sofreu frequentes invasões, principalmente


dos franceses, ingleses e holandeses. Estes últimos, em 1624, conseguiram se
infiltrar e permaneceram no nordeste do país até 1654.

 O Conde Maurício de Nassau chega no Brasil em 1637 e se estabelece no Recife, a


serviço da Companhia das Índias Ocidentais. Em sua comitiva, vieram médicos,
arquitetos, geógrafos, escritores, cientistas e pintores.

 Os artistas trazidos por Nassau foram os precursores na representação das


paisagens e cenas da vida brasileira de forma disvinculada da religiosa. Podemos
citar dois nomes de artistas importantes trazidos por Nassau: Franz Post (1612-
1680) e Albert Eckhout (1610-1666).

92
AUTOATIVIDADE

Os artistas trazidos por Nassau foram os precursores na representação


das paisagens e cenas da vida brasileira, de forma desvinculada da religiosa.
Podemos citar dois nomes de artistas importantes trazidos por Nassau: Franz
Post (1612-1680) e Albert Eckhout (1610-1666). Reúna desenhos desenvolvidos
neste período, por artistas diversos, e elabore um texto abordando a importância
destes registros para a história.

Bom Trabalho!

Assista ao vídeo de
resolução desta questão

93
94
UNIDADE 2
TÓPICO 4

O LEGADO DA CULTURA AFRICANA


PARA O BRASIL

1 INTRODUÇÃO
Os negros aportaram no Brasil na primeira metade do século XVI, como
escravos. Eles vieram devido às necessidades dos colonizadores e donos de
fazendas de açúcar que precisavam de mão de obra barata para trabalharem em
seus canaviais.

Primeiramente, tentaram escravizar os ameríndios mas, pela sua índole de


liberdade, estes não se ajustaram ao trabalho servil: contínuo e forçado. Tiraram,
então, os negros da África e fizeram-nos escravos.

Aqui chegaram trazidos pelos navios negreiros e foram despejados


nas senzalas. Mesmo tolhidos de seus direitos de liberdade de todas as formas,
pelos senhores de engenho, imprimiram sua cultura na raiz de nossa terra. “A
escravatura roubou ao negro o corpo, mas não conseguiu roubar sua alma.”
(BEUTTENMÜLLER, 2002, p. 20).

UNI

O termo afro-brasileiro designa tanto pessoas com ascendência africana quanto


objetos e cultura oriundos da vinda de negros escravos africanos para o Brasil.

2 A CULTURA AFRICANA
Os negros pisaram no solo brasileiro na condição de escravos trazidos nos
porões dos navios negreiros, no período em que o Brasil estava sendo colonizado
pelos portugueses, por volta de 1532 e este regime de servidão perdurou por mais
de 300 anos (Figura 60).

A escravidão já havia sido abolida mundialmente e estes reflexos se deram


no Brasil gradualmente. Seu final foi com a promulgação da Lei Áurea, em 13 de
maio de 1888.
95
UNIDADE 2 | OS PORTUGUESES NO BRASIL

FIGURA 60 – RUGENDAS. NEGROS NO PORÃO, 1821-35. LITOGRAFIA, 15,4X25,5 CM

FONTE: Disponível em: <http://www.dulcehelenabriza.com.br/figuras_livro.php>. Acesso


em: 25 jul. 2008.

UNI

RUGENDAS (Johann Moritz), pintor e desenhista alemão (Augusburg, 1802 –


Weilheim, 1858). Contratado como desenhista da expedição científica do barão de Langsdorff,
chegou ao Brasil em 1821. Pintou e anotou aspectos de regiões brasileiras, suas paisagens,
costumes, tipos. Sua obra, editada no Brasil (1940) com o título de Viagem pitoresca através
do Brasil, reúne cem pranchas da edição original (1835) e mais dez inéditas. (ENCICLOPÉDIA
KOOGAN-HOUAISS – RUGENDAS).

Os portugueses já faziam o uso da prática do tráfico de negros, como


escravos, para trabalharem em seus canaviais. Então, decidiram estender esta ação
para o Brasil. Aqui, desembarcaram negros de vários pontos do continente africano
trazidos da Costa do Marfim, Angola, Congo, Moçambique, Gana, Benim, Nigéria
entre outras regiões. Já neste período, eles representavam a maioria da população
e constituíram a principal força de trabalho.

A seguir, Figura 61 e 62, desenhos datados de 1834-39, desenvolvidos por


Jean-Baptiste Debret em sua estada de estudos comportamentais, no Brasil.

Nestas representações, Debret expõe momentos do cotidiano brasileiro em


que o escravo aparece realizando serviços domésticos.

96
TÓPICO 4 | O LEGADO DA CULTURA AFRICANA PARA O BRASIL

FIGURA 61 – O JANTAR NO BRASIL, 1834-39

FONTE: APOLINÁRIO, Maria Raquel. História: da formação do feudalismo à


colonização europeia na América. São Paulo: Moderna, 2005. p. 155.

FIGURA 62 – UMA SENHORA BRASILEIRA EM SEU LAR, 1834-39

FONTE: APOLINÁRIO, Maria Raquel. História: da formação do feudalismo à


colonização europeia na América. São Paulo: Moderna, 2005. p. 155.

Os motivos pelos quais os portugueses adotaram a prática da escravidão


foram muitos. Os índios foram a primeira tentativa dos portugueses de obter mão-
de-obra escrava, porém, além dos ameríndios não se adaptarem ao regime escravo,
isto causou muitas guerras para os portugueses.

Outro motivo foi o lucro que Portugal obtinha pelo tráfico de negros, pois
eles eram fortes e também constituíam um tipo de mão de obra barata para os
senhores de engenho.

Os negros eram tratados de maneira desumana, tanto nos canaviais (século


XVI) como nas minas de ouro (século XVIII).

97
UNIDADE 2 | OS PORTUGUESES NO BRASIL

Trabalhavam muito (de sol a sol), recebendo apenas trapos de roupa e


uma alimentação de péssima qualidade. Passavam as noites nas senzalas
(galpões escuros, úmidos e com pouca higiene) acorrentados para evitar
fugas. Eram constantemente castigados fisicamente, sendo que o açoite
era a punição mais comum no Brasil Colônia. (ESCRAVIDÃO, 2008).

Duas obras de Jean-Baptista Debret de 1834-39 (Figuras 63 e 64) denunciam


os castigos aplicados aos negros.

FIGURA 63 – FEITOR AÇOITANDO NEGRO FIGURA 64 – MERCADO DE ESCRAVOS

FONTE: Disponível em: <http://terceiraom3.wordpress.com/2007/10/04/debret-e-os-escravos/>.


Acesso em: 1 ago. 2008.

UNI

DEBRET (Jean Baptiste), pintor e desenhista francês (Paris, 1768 – id., 1848),
membro da missão de artistas franceses, solicitada por Dom João VI, que chegou ao Brasil
em 1816. Foi nomeado professor de pintura histórica da Academia de Belas-Artes (1820).
Regressando à França, em 1831, publicou em Paris, de 1834 a 1839, Viagem pitoresca e
histórica ao Brasil, uma série de gravuras sobre aspectos, paisagens e costumes do Brasil, de
valor fundamental para nossa história do começo do séc. XIX. (ENCICLOPÉDIA KOOGAN-
HOUAISS - DEBRET).

Quando chegaram ao Brasil, foram forçados a seguirem os costumes dos


brancos. Foram tolhidos em todas as suas manifestações artísticas, culturais e
religiosas. Mesmo assim, driblando as regras que lhe impunham, conseguiram se
adaptar e não perderam sua identidade cultural.

A partir do século XVI, com o tráfico negreiro, essa religiosidade chega


as Américas, arrancada de sua terra natal e os escravos obrigados a
viver em lugares hostis, os quais são subordinados e ultrajados em sua
cultura e  religião pelos seus senhores. Mas os escravos mantiveram
secretamente suas tradições e crenças como uma forma de suportar as
dores do trabalho forçado, a separação familiar por mais de três séculos.
Os costumes e as práticas religiosas dos nativos africanos assimilaram
elementos de outras crenças e culturas, como a indígena e a cristã, que
subsistiram e deram origem a novos cultos. (RELIGIOSIDADE, 2008).

98
TÓPICO 4 | O LEGADO DA CULTURA AFRICANA PARA O BRASIL

Obrigados a adotarem o catolicismo como religião, eles não desistiram da


sua crença religiosa e conseguiram escondê-la e adaptá-la de modo próprio a haver
uma identidade com o cristianismo.

Da mistura com o cristianismo, resultaram várias outras religiões como


o Candomblé, a Umbanda, o Vodu que são reverenciadas em vários pontos do
Brasil, principalmente na Bahia (Figura 65).

FIGURA 65 – O CANDOMBLÉ

FONTE: VALENTINI, R. Lucy; VILELA, P. Célia Maria; ORDOÑEZ, Marlene.


Cultura e Sociedade do século IX até o século XVII. São Paulo: Ibep,
2004. p. 297.

Então, pode-se dizer que uma das primeiras influências negras no Brasil foi
a religião. Porém, em outras áreas também observamos interferências de origem
dessa cultura, como na música, bem como nos instrumentos musicais, na culinária,
no esporte e na língua portuguesa.

O Brasil é um país de uma musicalidade variada, embora haja uma


influência marcante dos ritmos africanos. Utilizando-se vários instrumentos
musicais dessa cultura, como o tambor, atabaque, afoxé, berimbau, entre outros,
nasceram ritmos como o maxixe, o carimbo, o maracatu, a lambada e o samba –
este último é referência brasileira mundialmente conhecida (Figura 66).

O samba é uma dança que tem a contribuição dos negros na sua formação.
De ritmo forte, animado e contagiante, esta dança era de tradição originalmente
ritualística, “[...] quando eram segurados pequenos recipientes de ervas aromáticas
em cada uma das mãos e eram aproximadas do nariz do dançarino cuja fragrância
o excitava”. (ORIGEM DO SAMBA – GUIA PELOURINHO).

99
UNIDADE 2 | OS PORTUGUESES NO BRASIL

Ao contrário do que muitos pensam, o samba não é um ritmo vindo da


África, nem de origem indígena, como já foi publicado em periódicos de
dança de salão. Ele é legitimamente brasileiro, com grande influência da
cultura negra e indígena, mas também com características de músicas
europeias da época. Mais do que um ritmo, o samba tornou-se a própria
identidade musical brasileira. Sua história é controvertida, os registros
são precários, mas sabe-se que, a partir de 1870, por influência e mistura
do lundu, polca, habanera, tango (brasileiro), maxixe (reprimido e
excomungado pelos padrões burgueses da época), ritmos percussivos
de origem africana como o batuque, começaram a aparecer músicas
já muito próximas do que hoje conhecemos por samba. (REVISTA
ELETRÔNICA SOBRE DANÇA – FALANDO DE DANÇA, 2008).

Tido como referência nacional e mundial, o Samba impulsiona o mercado


do turismo, principalmente o do Rio de Janeiro, nos períodos de sua comemoração.
O IPHAN – Instituto do Patrimônio Histórico e Artístico Nacional registrou o
Samba carioca como Patrimônio do Brasil.

FIGURA 66 – O SAMBA

FONTE: Disponível em: <http://www.apenasbahia.blogger.com.br/>. Acesso em: 1


ago. 2008.

A culinária brasileira é uma mescla de elementos originários da cozinha


indígena, portuguesa e africana. Podemos sinalizar como pratos tipicamente
africanos o vatapá, a moqueca, o acarajé e a feijoada – esta considerada a comida
tipicamente brasileira, do seu dia a dia.

Também no esporte, observamos a herança da cultura africana que veio


do período colonial, a capoeira. Esta arte marcial era praticada pelos negros como
elemento de defesa pessoal já no período colonial.

Ela foi desenvolvida cheia de gingado para confundir quem a visse,


principalmente os senhores de engenhos, fazendo-os pensar que era um tipo de
dança. Os desenho a seguir, de Augustus Earle (Figura 67) e de J. M. Rugendas

100
TÓPICO 4 | O LEGADO DA CULTURA AFRICANA PARA O BRASIL

(Figura 68) – este último descrevendo a prática da capoeira no Brasil no seu livro
Voyage pittoresque et historique dans le Brasil. Paris: Engelmann et Cie, Paris, 1834 –
ilustram a capoeira.

Os negros tem ainda um outro folguedo guerreiro muito mais violento,


a capoeira: dois campeões se precipitam um sobre o outro procurando
dar com a cabeça no peito do adversário que desejam derrubar.  Evita-
se o ataque com saltos de lado e paradas igualmente hábeis; mas
lançando-se um contra o outro mais ou menos como bodes, acontece-
lhes chocarem-se fortemente cabeça contra cabeça, o que faz com que
a brincadeira não raro degenere em briga e que as facas entrem em
jogo ensanguentando-a. (CENTRO DE REFERÊNCIA DA CAPOEIRA
CARIOCA).

FIGURA 67 – AUGUSTUS EARLE. NEGROS LUTANDO NO BRASIL, 1822.


BIBLIOTECA NACIONAL DA AUSTRÁLIA

FONTE: Disponível em: <http://www.centroreferenciacapoeiracarioca.net/


fotos.php>. Acesso em: 1 ago. 2008.

FIGURA 68 – J. M. RUGENDAS. JOGAR CAPOEIRA OU DANÇA DA GUERRA,


1834. PARIS: ENGELMANN ET CIE, PARIS, 1834

FONTE: Disponível em: <http://www.centroreferenciacapoeiracarioca.net/


fotos.php>. Acesso em: 1 ago. 2008.

101
UNIDADE 2 | OS PORTUGUESES NO BRASIL

No nosso vocabulário, encontramos muitas palavras que foram herdadas


dos africanos como: angu, banana, banguela, caçula, cachaça, cachimbo, cafuné,
camundongo, dengo, Exú, fubá, jiló, miçanga, moleque, quitanda, xingar, entre
muitas outras.

Portugal trouxe para o Brasil toda a sua imperiosa cultura – a língua, a


religião, os costumes e as leis, mas não pôde controlar completamente
a sociedade colonial. A ela, somou-se a contribuição de índios e negros,
que foram transformando – e colorindo – a língua, a religião e os
costumes. (VALENTINI et al., 2004, p. 295).

Os africanos ajudaram a formar e a delinear a cultura e o espírito do Brasil. É


inegável a sua contribuição na construção de uma identidade brasileira em seus vários
âmbitos, como na religião, na música, na dança, na arte, na culinária e na língua.

UNI

Segundo dados do senso desenvolvido pelo IBGE, os autodeclarados pretos


representam uma grande parcela da população brasileira. Se comparado com outros países,
o Brasil possui o maior contingente populacional de origem africana, fora da África. Tomando
por base a genética, estudos também apontam que a população brasileira possui um grau
elevado em sua carga genética de ascendência africana, podendo representar uns 80%. Esta
concentração de afro-brasileiros e afrodescendentes se dá, em maior grau, no estado da Bahia.

102
TÓPICO 4 | O LEGADO DA CULTURA AFRICANA PARA O BRASIL

LEITURA COMPLEMENTAR

A ESCRAVIDÃO DOS NEGROS NO BRASIL

Marlene Sapelli

Quando falamos de escravidão de negros no Brasil, muitas vezes não temos


ideia do número de pessoas envolvidas e lembramos, quase sempre, da Princesa
Isabel como a boa senhora que libertou os escravos. Há muito mais coisas a se saber
sobre essa questão.

Em torno de 10 milhões de negros foram trazidos da África para serem


escravizados no Brasil. Quando aqui chegavam, muitas vezes, chegavam a trabalhar
20 horas por dia.

Quando um dono de terras comprava negros para escravizar, mandava


marcá-los a ferro e fogo com suas iniciais, sobre a nádega ou sobre o peito, em geral.

Os negros não concordavam com o que acontecia. Alguns tinham coragem


e rebelavam-se. Tivemos várias rebeliões de negros escravos. Muitos fugiam e se
juntavam a outros fugitivos e muitas vezes formavam quilombos. O mais famoso
dos quilombos foi o de Palmares que chegou a ter 50.000 habitantes.

No Quilombo de Palmares a propriedade era comunitária e procuravam


plantar de tudo um pouco para que ninguém passasse fome, pois, não tinham
como objetivo o lucro. As tropas portuguesas invadiram o quilombo e mataram
seus habitantes.

Um dos líderes dos negros nessa luta foi Zumbi, que teve a cabeça cortada.
Alguns negros para não continuarem escravos, chegavam a se suicidar. Os negros
eram proibidos de praticar suas cerimônias religiosas e de falar seus dialetos de
origem.

Várias leis foram feitas para libertar os escravos. Temos como exemplos a
Lei do Ventre Livre (ficariam libertos os que nascessem a partir daquela data); a Lei
do Sexagenário (ficariam livres os que já tivessem 60 anos de idade; isso era difícil
porque em geral não viviam tanto), dentre outras. Quando a princesa Isabel assinou
a Lei Áurea já tínhamos libertado, em torno de 95% dos negros.

Houve muito sofrimento, separação das pessoas da mesma família, muitas


mortes. Hoje, ainda não podemos dizer que superamos essa história. Há, ainda,
muito preconceito em relação aos negros e muitos tipos ainda de escravidão.

FONTE: SAPELLI, Marlene. Escravidão dos negros no Brasil. Disponível em: <http://www.
olhoscriticos.com.br/modules/smartsection/item.php?itemid=13>. Acesso em: 1 ago. 2008.

103
RESUMO DO TÓPICO 4
Neste tópico, você pôde estudar os seguintes aspectos relacionados à
Arte Brasileira:

Os negros aportaram no Brasil na primeira metade do século XVI como escravos.


Eles vieram devido às necessidades dos colonizadores e donos de fazendas


de açúcar, que precisavam de mão de obra barata para trabalharem em seus
canaviais.

A escravidão já havia sido abolida mundialmente e estes reflexos se deram no


Brasil gradualmente. Seu final foi com a promulgação da Lei Áurea, em 13 de


maio de 1888.

Quando chegaram ao Brasil, foram forçados a seguirem os costumes dos brancos.


Foram-lhes tolhidas todas as suas manifestações artísticas, culturais e religiosas.


Mesmo assim, driblando as regras que lhes impunham, conseguiram adaptar-se
e não perderam sua identidade cultural.

Pode-se dizer que uma das primeiras influências negras no Brasil foi a religião.

Porém, em outras áreas também observamos interferências de origem dessa


cultura, como na música, nos instrumentos musicais, na culinária, no esporte e
na língua portuguesa.

104
AUTOATIVIDADE

Portugal trouxe para o Brasil toda a sua imperiosa cultura – a língua,


a religião, os costumes e as leis – mas não pôde controlar completamente a
sociedade colonial. A ela, somou-se a contribuição de índios e negros, que
foram transformando – colorindo – a língua, a religião e os costumes. Com base
na frase de Valentini (2004, p. 295), cite características culturais de Portugal, da
África e Indígena que o Brasil absorveu.

Assista ao vídeo de
resolução desta questão

105
106
UNIDADE 2
TÓPICO 5

REFLEXÕES ACERCA
DO MULTICULTURALISMO
E O ENSINO DA ARTE

1 INTRODUÇÃO
Caro(a) acadêmico(a), lendo nosso caderno até aqui, você já percebeu que
podemos afirmar que a Arte Brasileira é um complexo de relações multiculturais.
O Brasil é um berço de diversas culturas que se relacionam e se entrecruzam em
complexas redes no interior da cultura chamada brasileira.

Você pode perceber que no contexto da cultura existem lutas de grupos que
coexistem no interior daquilo que chamamos de Brasil. Bem, a nossa arte registra
essa dinâmica e é ela mesma parte desse processo dinâmico e complexo. Afirmamos
isso, pois a arte demonstra de alguma forma as lutas de classes e etnias que aqui
convivem. Podemos com isso refletir porque equivocadamente aprendemos que a
arte de origem europeia é mais importante do que a arte produzida pelos indígenas
ou pelos negros.

À medida que se negligencia determinados saberes, damos voz a outros


saberes, e com isso deixamos de aprender muito sobre determinadas culturas.
Somos parte de um processo cultural marcado por pessoas que demonstram por
meio da arte o que vivem e no que acreditam.

Essas reflexões são relevantes para o contexto da escola. Vivemos alguns


momentos nos quais elevamos determinadas manifestações culturais como as
melhores ou piores, por vezes ainda romantizamos a produção deste ou daquele
grupo, sem considerar as relações que estão imbricadas nesse processo.

Quando vimos uma obra do Mestre Didi (Deoscóredes Maximiliano dos Santos),
vimos nesse artista contemporâneo a nós, isto é, que vive em nosso tempo, um grito de
seu povo, de sua origem negra. Ainda o artista, escultor, escritor é um representante da
cultura afro-brasileira que traz em sua obra os mitos e tradições Yoruba.

107
UNIDADE 2 | OS PORTUGUESES NO BRASIL

FIGURA 69 – PEPEYE – O GRANDE PATO

FONTE: Disponível em: <africasaberesepraticas.blogspot.com>. Acesso em: 19 maio


2012.

Quando apreciamos uma obra como esta, podemos perceber a integração


entre a cultura africana e a cultura que se forma no Brasil, assim, brasileira.
Mestre Didi, que também é sacerdote, traz para nós, apreciadores de sua obra, a
integração que há entre sua forma de ver a natureza, o homem e a religião. Essas
relações somente são possíveis porque Mestre Didi vive e convive na relação com
pessoas e numa sociedade que possibilitaram a ele determinadas experiências.
Assim, sua obra é parte desse coletivo que o constitui, que o transforma. Suas
experiências religiosas e sua luta por seu povo estão marcadas em sua obra, seja
pela materialidade desta, seja pelos conceitos.

Essas reflexões são relevantes para o contexto do ensino da arte, pois nelas
poderemos trazer à tona, com nossos alunos, as dinâmicas existentes entre a obra do
artista e o contexto em que ele vive. Essas relações precisam ainda ser articuladas à
vida de nossos alunos, para que possam perceber que existe, sim, uma ligação com
o que estudam no contexto da história da arte e suas vidas. Ora, a obra de Mestre
Didi dialoga com as obras de Rugendas (Figura 68) ou ainda de Earle (Figura 67),
que em seus tempos registraram como a cultura africana foi constituindo uma
identidade no Brasil. Podemos ainda relacioná-las a obras de diversos artistas que
existem perto de você, que moram na sua cidade.

Observe que aqui apontamos uma sugestão a você, futuro professor de


arte: articule obras de momentos históricos diferentes para que, junto com seus
alunos, construa percursos de apreciação e compreensão estético/artísticos.

Observe que no capítulo anterior nos dedicamos a refletir sobre a


contribuição da cultura indígena para a arte e cultura brasileira. Aqui não é
diferente quando nos referimos à cultura africana. Nesse sentido, as reflexões
que apresentamos aqui podem, sim, ser articuladas a diversas culturas, pois,

108
TÓPICO 5 | REFLEXÕES ACERCA DO MULTICULTURALISMO E O ENSINO DA ARTE

guardadas suas diferenças, por muito tempo as culturas indígena e africana foram
colocadas em segundo plano na escola. Estas questões precisam ser vistas quando
discutidas na escola, para que as cogitações acerca da arte não sejam como meras
contribuições estéticas. Observe como pode ser rico um planejamento no qual os
alunos descendentes das mais diversas culturas se sintam partícipes do processo
de constituição de uma nação.

Segundo Mason (2001), é importante que o ensino da arte promova a


diversidade cultural, pois esta é uma característica do ensino pós-moderno.
“Uma arte-educação pós-moderna, que é eclética e pluralista em sua aceitação de
todos os estilos e formas de arte, tem ramificações enormes para a prática atual.
Assim, nesse processo o ensino da arte é aberto a incluir as artes populares, as
novas tecnologias e as tradicionais técnicas artísticas, como a pintura, a escultura,
a gravura, entre outras”. (2001, p. 13).

O multiculturalismo é entendido por Mason (2001) como uma tentativa de


resposta à questão do ajuste inadequado entre a equidade social e a diversidade
cultural. Assim, a autora acredita que o ensino deve estar articulado ao debate
público da política e da educação.

De alguma forma, vivemos em um contexto no qual a perspectiva


eurocêntrica dos conteúdos escolares marca o processo de seleção e organização
dos currículos escolares. Dar voz à diversidade cultural é marca do ensino da arte
na contemporaneidade, pois esse é um debate do contexto da arte, por isso não
pode estar à parte de seu ensino. Quando nos referimos à diversidade cultural,
estão implícitas não somente as questões étnicas, mas também questões de gênero
e sexualidade. Busque saber mais sobre isso!

Nesse contexto, “educação multicultural é definida como a visão de que a


variação cultural deve ser representada e transmitida no sistema escolar para que
as crianças aceitem-na em qualquer sociedade”. (Mason, 2001, p. 47).

Compreende-se que nesse processo é necessária a documentação dos


artistas e suas obras, dificuldade atual de nosso sistema quando pensamos, por
exemplo, na Lei nº 10.639, que em 2003 tornou a temática afro-brasileira obrigatória
nos currículos do Ensino Fundamental e Médio, assim buscando, de alguma forma,
equacionar, pelo menos, parte desse problema. (MEC, 2011). Sabemos que não é
a promulgação de uma lei que pode resolver essa problemática, mas ela explicita,
traz à tona reflexões sérias que precisam ser consideradas no processo de ensino.

No Brasil, uma das primeiras autoras a abordar questões referentes à


diversidade cultural em relação ao ensino da arte foi a professora Ana Mae Barbosa,
que, em seu livro A imagem no ensino da arte, registra que: “[...] deve exercer o
princípio democrático de acesso à informação de todas as classes sociais, propi­
ciando-se na multiculturalidade brasileira uma aproximação de códigos culturais
dos diferentes grupos” (1994, p. 33). O racismo é uma das características mais
importantes da multiculturali­dade e indica a influência dos fatores econômicos e
sociais que promovem uma diversidade distinguida pela divisão de classes.
109
UNIDADE 2 | OS PORTUGUESES NO BRASIL

UNI

Apresentamos aqui breve reflexão acerca do multiculturalismo, da diversidade


cultural, compreendendo a relevância dessa discussão no contexto escolar. Assim, você, como
professor, deve assumir o compromisso de, na relação e no processo da seleção de conteúdos e
organização de suas aulas, comprometer-se com o reconstrutivismo social, assim percebendo
que os conteúdos de arte podem incluir uma análise da sociedade, de seus jeitos de ser e fazer
cultura. Nesse sentido, conseguiremos desenvolver a consciência crítica entre os alunos e
aspecto defendido por diversos educadores, dentre eles Paulo Freire, que advoga o processo de
conscientização, entendendo a educação como um ato político educativo.

LEITURA COMPLEMENTAR
MULTICULTURALISMO

Definição

Hibridismo, diversidade étnica e racial, novas identidades políticas e


culturais: estes são termos diretamente relacionados ao  multiculturalismo. Se a
diversidade cultural acompanha a história da humanidade, o acento político nas
diferenças culturais data da intensificação dos processos de globalização econômica
que anunciam, segundo os analistas, uma nova fase do capitalismo, denominada
por autores como Ernest Mandel de “capitalismo tardio”, e por outros, como Daniel
Bell, de “sociedade pós-industrial”.

A despeito das querelas acerca das origens dessa nova fase, o fato é que
as discussões acerca do multiculturalismo acompanham os debates sobre o pós-
modernismo e sobre os efeitos da pós-colonização na cena contemporânea, o que
se verifica de forma mais evidente a partir dos anos 1970, sobretudo nos Estados
Unidos. A globalização do capital e a circulação intensificada de informações, com
a ajuda de novas tecnologias, longe de uniformizar o planeta (como propalado
por certas interpretações fatalistas), trazem  a afirmação de identidades locais e
regionais, assim como a formação de sujeitos políticos que reivindicam, com base em
garantias igualitárias, o direito à diferença. Mulheres, negros (ou afro-americanos),
homossexuais, populações latino-americanas (“hispanos” ou chicanos) e migrantes
em geral se fazem presentes como atores políticos com a marcação de diferenças
de gênero, culturais e étnicas. A cultura torna-se instrumento de definição de
políticas de inclusão social - as “políticas compensatórias” ou as “ações afirmativas”
- que tomam os  diversos setores da vida social. Cotas para minorias, educação
bilíngue, programas de apoio aos grupos marginalizados, ações antirracistas e
antidiscriminatórias são experimentados em toda parte.

No campo das artes, o multiculturalismo assume formas variadas, ainda que


tenha sempre caráter engajado e intervencionista, definido em função da experiência
social do artista: sua origem, pertencimento de classe, opção sexual etc. Arte e vida,
110
TÓPICO 5 | REFLEXÕES ACERCA DO MULTICULTURALISMO E O ENSINO DA ARTE

imbricadas desde as vanguardas históricas - no dadaísmo, por exemplo - tornam-


se agora termos inseparáveis: a vida é que dita os contornos da arte, que pode ser
negra, gay, feminista, chicana etc.

Os artistas falam de um lugar, que é o dos não wasp [white anglo-saxon


protestant/anglo-saxão branco protestante]: as mulheres falam da condição feminina,
assim como os afrodescendentes, os hispânicos, os índios etc. Nos Estados Unidos
- onde o multiculturalismo é definido e teorizado por intelectuais de origem
terceiro-mundista, atuantes nas universidades norte-americanas -, as relações entre
produção artística e política se estreitam na década de 1970. Basta lembrar a criação,
em 1969, da Art Workers Coalition - AWC [Coalizão dos Trabalhadores de Arte], em
Nova York, e do simpósio organizado pela revista Artforum, “O artista e a política”.
Protestos contra a Guerra do Vietnã, defesa dos direitos civis e do direito do artista
em relação ao modo de exibição dos seus trabalhos são tópicos de uma pauta mais
extensa formulada pela AWC. Uma das exigências dos membros da coalizão - entre
eles, a crítica Lucy Lippard e os artistas Takis (1925), Hans Haacke (1935) e Carl
Andre (1935) - é a presença de um porto-riquenho no conselho de qualquer museu
e galeria que exiba arte porto-riquenha.

Esse cenário sofre reconfigurações significativas sob o impacto do movimento


feminista, que redesenha os contornos de parte da produção artística e da crítica de
arte. A Women Artists in Revolution (WAR), formada com base na AWC, e o Conselho
de Artistas Mulheres de Los Angeles, 1971, na defesa de uma crítica feminista da
história da arte, entre outros, introduzem  questões nos debates sobre arte que
influenciam novas produções. A instalação O Jantar, 1974-1979, de Judy Chicago
(1939), por exemplo, tenta recuperar “uma história simbólica das realizações e lutas
das mulheres”. Tentativas de tematizar as necessidades e desejos das mulheres
aparecem em obras como Deus Dando à Luz, 1968, de Monica Sjoo, 1942. Críticas às
ortodoxias de críticos, curadores, museus e galerias se fazem visíveis em trabalhos
como A Morte do Patriarcado/A Lição de Anatomia de A.I.R., 1976, de Mary Beth Edelson,
também autora da série Grandes Deusas, 1975.

O cruzamento das identidades feminina e negra é explorado em diversas


obras. Nas performances de Adrian Piper (1948), por exemplo, a artista adota uma
identidade andrógina e culturalmente ambígua, como em Eu Sou a Localização #2, de
1975, inspirada nas discussões levadas pelo feminismo e pelo movimento negro,
este também muito presente na arte contemporânea, sobretudo na literatura (Toni
Morrison e Cornel West, por exemplo) e na música (o hip hop e o rap).

No campo das artes visuais, o graffiti surge como meio privilegiado de


expressão dos jovens pobres, em geral negros, das periferias de Nova York. Se boa
parte dessa produção não tem autoria definida, alguns nomes se notabilizam no
gênero, por exemplo, o de Jean-Michel Basquiat (1960-1988). Original de uma família
haitiana, Basquiat enraíza sua arte na experiência da exclusão social, no universo dos
migrantes e no repertório cultural dos afro-americanos. Sua arte enfatiza as ligações
do graffiti com o hip hop e com o mundo underground dos pichadores.

111
UNIDADE 2 | OS PORTUGUESES NO BRASIL

O Movimento Chicano, 1965-1975, originário da luta contra a discriminação


dos imigrantes mexicanos nos Estados Unidos, deve ser lembrado pelo seu ativismo
artístico, revelando novos artistas e promovendo a criação de centros culturais
“mexicano-americanos” e hispânicos. Diversos artistas - norte-americanos de origem
hispânica ou migrantes radicados nos Estados Unidos - trazem os debates sobre
a diversidade cultural e produção de identidades para as obras que realizam. A
chamada arte gay conhece maior notoriedade em função do impacto da Aids no
mundo artístico de Nova York e da atuação de grupos como o Act-Up e o Gran Fury,
nas décadas de 1980 e 1990.

Os efeitos dos debates sobre o multiculturalismo no Brasil mereceriam uma


discussão à parte, dada a sua complexidade. País de raízes mestiças, e que não
constitui historicamente minorias que se organizam como comunidades apartadas
do conjunto - os migrantes assimilam a sociedade nacional -, o Brasil parece ficar à
margem dessas discussões até a década de 1980, data do fortalecimento e visibilidade
das chamadas minorias étnicas, raciais e culturais. A pressão dos novos atores sociais
reverbera diretamente no texto da Constituição de 1988, considerada um marco em
termos da admissão do nosso pluralismo étnico. Os efeitos dessas formas renovadas
de engajamento podem ser observados no campo da produção artística, sobretudo
da literatura (fala-se em “escrita feminina”, em “vozes negras”,  homoerótico
etc.). Na música jovem, das periferias urbanas, define-se o espaço de uma cultura
negra: o funk, o rap, o hip hop. O campo das artes visuais recebe o impacto dessas
problemáticas - a experiência das minorias aparece tematizada em um ou outro
artista -, ainda que pareça difícil localizar aí uma produção de cunho multicultural
com contornos definidos.

FONTE: Multiculturalismo: texto extraído da Enciclopédia Itaú Cultural Artes Visuais.


Disponível em:<http://www.itaucultural.org.br/aplicexternas/enciclopedia_ic/index.
cfm?fuseaction=termos_texto&cd_verbete=3186>. Acesso em: 22 jan. 2012.

112
RESUMO DO TÓPICO 5
Neste tópico, caro(a) acadêmico (a), você teve oportunidade de estudar os
seguintes itens acerca do ensino da arte brasileira:

• A arte brasileira é um complexo de relações multiculturais e o Brasil é um berço


de diversas culturas.

• A arte registra essa dinâmica de lutas de grupos que coexistem na sociedade e


é ela mesma parte desse processo dinâmico e complexo. A arte demonstra, de
alguma forma, as lutas de classes e etnias que aqui convivem.

• Observamos que a seleção dos conteúdos de arte tem uma perspectiva


eurocêntrica, que precisa ser transformada.

• O ensino da arte deve promover a diversidade cultural, pois esta é uma


característica do ensino pós-moderno, que é eclético e pluralista.

• A Lei nº 10.639, de 2003, tornou a temática afro-brasileira obrigatória nos


currículos do Ensino Fundamental e Médio.

113
AUTOATIVIDADE

Para Paulo Freire, a educação é um processo político. Por meio dela


podemos reforçar ou promover as mudanças sociais, num processo de
conscientização. Pesquise mais sobre o assunto e elabore um texto sobre a
relevância de um planejamento de arte considerar a diversidade cultural.

114
UNIDADE 3

RUMO À CONSTRUÇÃO DE UMA


IDENTIDADE NACIONAL
OBJETIVOS DE APRENDIZAGEM

A partir do estudo desta unidade, o(a) acadêmico(a) estará apto(a) a:

• compreender a importância da vinda da família real para o Brasil;

• perceber a importância da Missão Francesa para as Artes;

• reconhecer as características do Movimento Modernista e pós-modernista;

• conhecer o contexto histórico do surgimento do Modernismo no Brasil.

• refletir sobre as implicações pedagógicas acerca do ensino da arte moder-


na e contemporânea brasileira.

PLANO DE ESTUDOS
Esta unidade está dividida em quatro tópicos. No final de cada um deles,
você encontrará atividades que levarão a exercitar os conhecimentos adqui-
ridos.

TÓPICO 1 – A FAMÍLIA REAL NO BRASIL

TÓPICO 2 – MODERNISMO NO BRASIL

TÓPICO 3 – FORMAÇÃO DE GRUPOS ARTÍSTICOS PÓS DÉCADA DE 1930

TÓPICO 4 – MOVIMENTOS ARTÍSTICOS: MODERNISMO E PÓS-MO-


DERNISMO

TÓPICO 5 – O ENSINO DA ARTE MODERNA E CONTEMPORÂNEA


BRASILEIRA

Assista ao vídeo
desta unidade.

115
116
UNIDADE 3
TÓPICO 1

A FAMÍLIA REAL NO BRASIL

1 INTRODUÇÃO

Caro(a) acadêmico(a), estamos chegando na reta final de nossos estudos.


Entramos na terceira unidade de estudo. Nela, discutiremos influências europeias
com a vinda da Família Real ao Brasil, com isso a constituição do modernismo e do
que chamamos de pós-modernismo na arte. Importante salientar que nosso estudo
não consegue abranger com detalhes toda a arte brasileira, pois o Brasil é um país
de imenso território, com características muito específicas, pois fomos colonizados
por diversas culturas. Vamos lá?

No período das guerras napoleônicas, na Europa, o príncipe regente Dom


João VI (1816-1826), pelo fato de ter apoiado os ingleses e não querer se submeter
à França, achou como saída transferir-se para o Brasil.

Aportou em solo nacional, em 1808, toda a Corte lusitana, aproximadamente


15 mil pessoas, deixando para trás, do outro lado do oceano, um reino pobre e
abandonado.

No Brasil, o Rei de Portugal começou um processo de reestruturação e


modernização. As transformações foram muitas e profundas e em todas as áreas:
política, econômica, social e cultural.

UNI

Durante trezentos anos, o Brasil viveu isolado, fechado. A única janela, mesmo
assim restrita ao Nordeste, foram os artistas de Maurício de Nassau, nos anos 1630. Desde
a primeira metade do século XVII não havia acesso ao Brasil para artistas, viajantes ou
naturalistas. Isso durou até a abertura dos portos, em 1808. (Jornal O Globo, segundo
caderno. Brasil Imperial a cores, pág. 8. Domingo, 10 de fevereiro de 2008).

2 A CHEGADA DA CORTE
A corte portuguesa, ao chegar ao Brasil, em 1808, abriga-se no Convento
do Carmo, no Rio de Janeiro. De colônia, o Brasil se eleva ao posto de metrópole,
sendo agora Reino Unido de Portugal, Brasil e Algarves, ganhando, assim, um
novo status político.
117
UNIDADE 3 | RUMO À CONSTRUÇÃO DE UMA IDENTIDADE NACIONAL

Em virtude do acontecido, as transformações, neste período, foram muitas


e profundas e em todas as esferas: política, econômica, social e cultural. O Rei de
Portugal começou um processo de reestruturação e modernização do Brasil para
suprir não só as necessidades da Corte bem como as da própria população que
estava em expansão.

Dentre as suas várias iniciativas, destacam-se a reforma da Biblioteca Real,


autorização da importação de livros, abertura de academias literárias e científicas.
Também criou o teatro São João, o Museu Nacional, o Jardim Botânico, o
Observatório Astronômico, o Banco do Brasil, a Imprensa Régia e a Escola Médica.
Concedeu o livre comércio, o funcionamento dos portos às nações amigas, das
fábricas e das tipografias e investiu em saúde pública.

Mais tarde, em 1820, pressionado pelos liberais, D. João VI regressou para


Portugal com toda a sua família e só permaneceu em solo brasileiro D. Pedro I
(1798-1834), o príncipe herdeiro, que galgou o título de Regente.

No dia 7 de setembro do ano de 1822, D. Pedro I, pressionado por Portugal


a regressar, decidiu não aceitar e declara a independência do Brasil, tornando-se
seu imperador.

3 A MISSÃO ARTÍSTICA FRANCESA


D. João VI, em 1816, com o intuito de fomentar a cultura e a modernização
do Brasil, importou mão de obra francesa. A esta ação denominou-se missão
artística francesa, organizada e liderada pelo museólogo, crítico e connoisseur
Joachin Lebreton (1760-1819). Na ocasião, vários artistas franceses desembarcam
em solo brasileiro para desenhar, esculpir, pintar e realizar projetos arquitetônicos.

Grandes artistas da Missão Francesa se evidenciaram como o escultor


Auguste Marie Taunay (1768-1824), o arquiteto Auguste-Henri-Victor Grandjean
de Montigny (1776-1850) e o pintor Jean-Baptiste Debret (1768-1848). Estes
desenvolveram muitos desenhos, retratando usos e costumes do povo brasileiro,
como mostram as Figuras 69, 70 e 72.

118
TÓPICO 1 | A FAMÍLIA REAL NO BRASIL

FIGURA 69 – NICOLAS-ANTOINE TAUNAY. MORRO DE SANTO


ANTÔNIO, 1816. MUSEU DE BELAS-ARTES, RJ

FONTE: PROENÇA, Graça. Descobrindo a História da Arte. São Paulo:


Ática, 2006. p. 139-140.

FIGURA 70 – DEBRET. COROAÇÃO DE DOM PEDRO I, IMPERADOR DO


BRASIL (SÉC. XIX). MUSEU DE BELAS-ARTES, RJ

FONTE: PROENÇA, Graça. Descobrindo a História da Arte. São Paulo: Ática,


2006. p. 139-140.

Montigny projetou o pórtico da escola Nacional de Belas-Artes, em


1826, construída em mármore e ornamentos em terracota, aproximadamente
12,00x9,60x1,10 m. Atualmente, o pórtico adorna a entrada do Jardim Botânico do
Rio de Janeiro, RJ, Figura 71.

119
UNIDADE 3 | RUMO À CONSTRUÇÃO DE UMA IDENTIDADE NACIONAL

FIGURA 71 – PÓRTICO DA ESCOLA NACIONAL DE BELAS-


ARTES, 1826

FONTE: TIRAPELI, Percival. Arte Brasileira: arte imperial do


neoclássico ao ecletismo. São Paulo: Nacional, 2008. p. 13-19.

FIGURA 72 – DEBRET. LAVADEIRAS DO RIO DAS LARANJEIRAS (DETALHE),1826.


AQUARELA, 16,6X22,3 CM. MUSEUS CASTRO MAYA/IPHAN. RIO DE
JANEIRO, RJ

FONTE: TIRAPELI, Percival. Arte Brasileira: arte imperial do neoclássico ao


ecletismo. São Paulo: Nacional, 2008. p. 13-19.

Podemos ressaltar outros nomes como os do paisagista Nicolas-Antoine


Taunay (1755-1830), o do gravador Charles Simon Pradier (1786-1848) e os dois
irmãos pintores e também escultores Marc Ferrez (1788-1850) e Zéphirin Ferrez
(1797-1851).

As Figuras 73 e 74 mostram, respectivamente, o desenho de Charles Simon


Pradier, que retratou D. João VI e a escultura de Marc Ferrez, que esculpiu a figura
de D. Pedro I.

120
TÓPICO 1 | A FAMÍLIA REAL NO BRASIL

FIGURA 73 – CHARLES PRADIER. RETRADO DE D. JOÃO VI


[s.d.], MUSEU NACIONAL DE BELAS ARTES, RIO DE
JANEIRO, RJ

FONTE: Disponível em: <http://www.pr.gov.br/mon/exposicoes/


missao_francesa.htm>. Acesso em: 8 ago. 2008.

FIGURA 74 – MARC FERREZ. BUSTO DE D. PEDRO I. BRONZE


FUNDIDO. MUSEU NACIONAL DE BELAS ARTES,
RIO DE JANEIRO, RJ

FONTE: Disponível em: <http://www.pr.gov.br/mon/exposicoes/


missao_francesa.htm>. Acesso em: 8 ago. 2008.

121
UNIDADE 3 | RUMO À CONSTRUÇÃO DE UMA IDENTIDADE NACIONAL

Todos desenvolveram seus trabalhos pautados na arte europeia – na ocasião


estava em voga o estilo neoclássico – que promovia o retorno aos padrões da arte
clássica. Este estilo, gradualmente, se impôs ao establishment barroco da colônia.

Outra ação do príncipe regente D. João VI foi a criação da Escola Real das
Ciências, Artes e Ofícios, em 1816. Porém, impulsionada pela missão artística
francesa ela foi transformada, em 1826, na Academia Imperial de Belas Artes. Mais
tarde, com a proclamação da República, em 1889, ela foi nomeada Escola Nacional
de Belas Artes.

Esta seria a primeira escola profissionalizante do Brasil que também ajudou


a difundir e intensificar a europeização de sua cultura pelo Brasil, metrópole de
Portugal. Também se tornou um elo fundamental na evolução das artes brasileiras,
proporcionando aos nossos artistas um circuito acadêmico de ensino, inexistente,
então, até em Portugal.

UNI

O site intitulado Rede da Memória Virtual Brasileira contém informações


da Escola Real das Ciências, Artes e Ofícios e seus personagens. Acessem. Seu endereço
eletrônico é: <http://catalogos.bn.br/redememoria/missfrancesaper.html>.

3.1 OUTROS ARTISTAS ESTRANGEIROS NO BRASIL


Vieram ao Brasil muitos outros artistas, além daqueles oriundos da Missão
Francesa. Alguns atraídos pela luminosidade natural e abundante dos trópicos e
também pela crescente burguesia rica que queria ser retratada. Outros financiados
pelos governos de países distintos ou pelos nobres.

Podemos ressaltar dois artistas que contribuíram para registrar as


paisagens (Figuras 75 e 76) do Brasil naquela época: o austríaco Thomas Ender
(1793-1875) que veio financiado pela Missão Austríaca e o alemão Johann Moritz
Rugendas (1802-1868), que veio como desenhista, financiado pela missão do barão
de Langsdorff (1774-1852), em 1821.

122
TÓPICO 1 | A FAMÍLIA REAL NO BRASIL

FIGURA 75 – ENDER. VISTA DA ILHA DE PAQUETÁ, 1817-21. AQUARELA

FONTE: Disponível em: <http://www.bbc.co.uk/portuguese/especial/1435_


mostraalemanha/page3.shtml>. Acesso em: 8 ago. 2008.

FIGURA 76 – ENDER. VISTA DO RIO DE JANEIRO, 1817-21. AQUARELA

FONTE: Disponível em: <http://www.bbc.co.uk/portuguese/especial/1435_


mostraalemanha/page3.shtml>. Acesso em: 8 ago. 2008.

As seis figuras a seguir (77, 78, 79, 80, 81 e 82) mostram uma pequena parte
do trabalho de Rugendas, desenvolvido no Brasil, e que retratou paisagens, pessoas
e situações no início do século XIX. Todas com o uso da técnica da litografia.

123
UNIDADE 3 | RUMO À CONSTRUÇÃO DE UMA IDENTIDADE NACIONAL

FIGURA 77 – NEGRA E NEGRO

FONTE: Jornal O Globo, segundo caderno. Brasil Imperial a


cores, p. 8. Domingo ,10 de fevereiro de 2008.

FIGURA 78 – PUNIÇÃO PÚBLICA

FONTE: Jornal O Globo, segundo caderno. Brasil Imperial a cores, p.


8. Domingo,10 de fevereiro de 2008.

O resultado dessa pesquisa, com mais de duzentas imagens, foi publicado


no livro Viagem pitoresca através do Brasil em 1835, Paris.

FIGURA 79 – NEGROS DAS NAÇÕES BENGUELA, ÂNGOLA,


CONGO E MONJOLO

FONTE: Jornal O Globo, segundo caderno. Brasil Imperial a


cores, p. 8. Domingo, 10 de fevereiro de 2008.

124
TÓPICO 1 | A FAMÍLIA REAL NO BRASIL

FIGURA 80 – CABANA DE ÍNDIOS

FONTE: Jornal O Globo, segundo caderno. Brasil Imperial a cores, p. 8.


Domingo, 10 de fevereiro de 2008.

FIGURA 81 – INDUMENTÁRIA DO RIO DE JANEIRO

FONTE: Jornal O Globo, segundo caderno. Brasil Imperial a cores, p. 8.


Domingo, 10 de fevereiro de 2008.

125
UNIDADE 3 | RUMO À CONSTRUÇÃO DE UMA IDENTIDADE NACIONAL

FIGURA 82 – NEGRO E NEGRA DA BAHIA

FONTE: Jornal O Globo, segundo caderno. Brasil Imperial a cores, p.


8. Domingo, 10 de fevereiro de 2008.

UNI

A fotografia contribui muito como meio para consolidar a imagem da criação de


uma nação que entrava na era industrial. Com o incentivo de Dom Pedro II, que era fotógrafo,
o final do império foi todo documentado em fotos que retratavam as construções dos portos,
das ferrovias e as instalações das primeiras indústrias. Outros fotógrafos documentaram as
transformações das cidades, como Marc Ferrez, e as condições de trabalho dos escravos e
dos imigrantes recém-chegados. (TIRAPELI, 2008, p. 30).

3.2 NEOCLASSICISMO
Em meados do século XVIII, um novo estilo predominou na pintura, na
escultura e na arquitetura europeia – o Neoclassicismo ou Academicismo. Este
estilo surgiu como reação ao Barroco e Rococó e se caracterizou pelo desejo de
recriar as formas artísticas da Antiguidade greco-romana e que se manteve até o
início do século XIX.

Na arquitetura estilo neoclássico, conforme mostra a Figura 83, havia muitos


elementos característicos, como “cântaros, píncaros, acrotérios, áticos triangulares
com tímpanos em relevos, guirlandas de rosas, colunas dóricas, cornijas gregas,
pilastras, janelas estreitas, o uso do mármore castanho-claro, frontões, platibandas,
escadarias e, nas fachadas, festões em relevo de massa, com motivos florais.”
(HARRES, 1979, p. 51).
126
TÓPICO 1 | A FAMÍLIA REAL NO BRASIL

FIGURA 83 – PRÉDIO NEOCLÁSSICO, SÉCULO XIX. PELOTAS, RS

FONTE: HARRES, Hilda Höber. História da Arte Brasileira. Porto Alegre: Sagra, 1979. p. 51.

Os artistas neoclassicistas queriam expressar as virtudes cívicas, o dever, a


honestidade e a austeridade, temas que se opunham diretamente à frivolidade da
aristocracia retratada no Barroco e Rococó.

O artista neoclássico inspirava-se na arte grega antiga, buscava uma arte


ideal de beleza, de formas harmônicas. Se o modelo tivesse defeitos,
o artista os corrigia para que as proporções ficassem harmônicas. Os
neoclássicos pintavam temas históricos, batalhas e retratos. Seguiam
regras rigorosas. Não podiam usar de imaginação e criatividade para
copor novas ideias. (BEUTTENMÜLLER, 2002, p. 37).

A passagem de um estilo para o outro nunca acontece abruptamente. Ela


se dá gradativamente, e não foi diferente aqui no Brasil. O Neoclasicismo foi um
movimento que iniciou nas primeiras décadas do século XIX, e não se deu de
forma espontânea aqui no Brasil. Ele foi dirigido pela chegada da Missão Artística
Francesa. Porém, o estilo Barroco ainda permaneceria em em algumas áreas da
arte até o final déste século.

Os artistas que frequentavam a Academia seguiram os padrões trazidos


pela Missão Artística Francesa: a beleza perfeita é um conceito ideal;
portanto, não existe na natureza. Assim, o artista não deve imitar
a realidade, mas tentar criar a beleza ideal por meio da imitação dos
clássicos, notadamente dos gregos, que mais se aproximaram da
perfeição criadadora.... Os artistas da Academia seguiam, então, rígidos
princípios para o desenho, o uso das cores e a escolha dos temas –
mitológicos, religiosos e históricos. (PROENÇA, 2006, p. 162)

127
UNIDADE 3 | RUMO À CONSTRUÇÃO DE UMA IDENTIDADE NACIONAL

3.3 ARTISTAS BRASILEIROS


Quando a Academia e Escola de Belas Artes abriu suas portas, oferecendo
curso em 1826, Manuel de Araújo Porto Alegre (1806-1879) foi um de seus primeiros
alunos. Este artista gaúcho desenvolveu habilidades principalmente no desenho e
na pintura, trabalhando, retratando temas de paisagens e caricaturas. Quase trinta
anos depois ele se tornou diretor desta Escola.

Muitos outros artistas que frequentaram a Academia Imperial de Belas Artes


se destacaram nesta época como Augusto Müller (1815-1883), Pedro Américo de
Figueiredo e Melo (1843-1905), Victor Meirelles (1832-1903), José Ferraz de Almeida
Júnior (1850-1899), Antônio Diogo da Silva Parreiras (1860-1937), Eliseu D’Angelo
Visconti (1866-1944) entre outros.

3.3.1 Augusto Müller


O alemão Augusto Müller (1815-1883) veio para o Rio de Janeiro ainda
criança, radicando-se no Brasil. Destacou-se na Academia Imperial de Belas Artes
e foi o primeiro artista brasileiro a obter o prêmio de viagem à França, em 1850.

Seu trabalho tem abrangências em retratos, paisagens, natureza morta


e pintura histórica. Na sequência, duas obras suas: um retrato da Baronesa de
Vassouras, Figura 84, e uma paisagem da enseada de Botafogo, Figura 85.

FIGURA 84 – MÜLLER. BARONESA DE VASSOURAS [s. d.], ÓLEO


SOBRE TELA, 150X94 CM. MUSEU IMPERIAL, RIO DE
JANEIRO, RJ

FONTE: PROENÇA, Graça. Descobrindo a História da Arte. São Paulo:


Ática, 2006. p. 144-161.

128
TÓPICO 1 | A FAMÍLIA REAL NO BRASIL

FIGURA 85 – VISTA DA ENSEADA DE BOTAFOGO, 1835-40. ÓLEO SOBRE TELA,


106X139 CM. COLEÇÃO MÁRIO PIMENTA CAMARGO

FONTE: Disponível em: <http://www.itaucultural.org.br/aplicExternas/enciclopedia_


IC/index.cfm?fuseaction=artistas_obras&cd_verbete=1185&cd_idioma=28555>.
Acesso em: 15 ago. 2008.

3.3.2 Pedro Américo de Figueiredo e Melo


Pedro Américo de Figueiredo e Melo (1843-1905) se destacou na Academia
Imperial de Belas Artes com um excelente pintor que, por conta de sua dedicação,
galgou um prêmio do Imperador. Este reconhecimento lhe rendeu uma pensão
para ir aperfeiçoar seus conhecimentos na Europa.

Embora tenha retratado a família real e temas bíblicos, ele ficou mais
conhecido por suas pinturas históricas do Brasil. Como o artista Víctor Meireles,
Pedro Américo era minucioso em seus estudos preliminares de pintura.
Preocupava-se em estudar todos os detalhes como tipos físicos, roupas, acessórios,
armas e vegetação.

A famosa obra de Pedro Américo, “O Grito do Ipiranga”, de 1888, que


está exposta na Figura 86, recebeu severas críticas por suas ambiguidades. Se
repararmos o quadro, todas as informações convergem para o centro, destacando
o grupo de D. Pedro I, que se inclina para o lado esquerdo. Por sua postura estática
e rígida, em relação aos outros integrantes, obriga o observador a direcionar seu
olhar para o futuro imperador.

129
UNIDADE 3 | RUMO À CONSTRUÇÃO DE UMA IDENTIDADE NACIONAL

FIGURA 86 – PEDRO AMÉRICO. INDEPENDÊNCIA OU MORTE, 1888. ÓLEO SOBRE


TELA, 760X415 CM. MUSEU PAULISTA, SÃO PAULO

FONTE: PROENÇA, Graça. Descobrindo a História da Arte. São Paulo: Ática, 2006. p.
144-161.

Também a indumentária dos personagens que compõe o capacete dourado


e a farda branca e vermelha da Guarda de Honra eram usadas apenas em datas
festivas. Por isso, a escolta de D. Pedro I jamais poderia estar usando-as durante
uma viagem penosa. A verdade é que o futuro imperador, em sua incursão ao
grito de independência, não estava acompanhado da Guarda de Honra, como
demonstra o quadro, e sim por milicianos. Estes não passavam de civis armados
que usavam roupas comuns.

Para atender a vontade geral do povo, Pedro Américo força as leis da


perspectiva e inclui em sua obra o famoso riacho. Em seu livro, Filho (2005, p. 61)
aponta que, de acordo com o ponto de vista escolhido, a corrente teria de passar
alguns metros atrás de quem observa o painel. Mas ele a colocou em primeiro plano
para consagrar na pintura o riachinho cujo nome ficou associado à emancipação
do país.

Há outras incongruências no quadro. Por exemplo, a subida da serra


entre Santos e São Paulo exigia o uso de mulas. Era essa a montaria de
D. Pedro e sua comitiva. O pintor colocou-o em cavalos de raça, fruto
de suas investigações nas cavalariças da nobreza europeia. Só D. Pedro
montou um cavalo mestiço, originário do Rio Grande do Sul. A ideia
ali contida foi enaltecer a figura nacionalista do Imperador. Em sua
investigação prévia do local da proclamação, Pedro Américo avistou
a famosa casa e resolveu incluí-la na composição. Estudos posteriores
realizados pelo Departamento do Patrimônio Histórico comprovaram
que a casa foi construída por volta de 1860. Portanto, não existia à época
da Independência. (FILHO, 2005, p. 61).

130
TÓPICO 1 | A FAMÍLIA REAL NO BRASIL

As Figuras 87 e 88 mostram dois momentos do quadro “O Grito do Ipiranga,


1888, também conhecido como “Independência ou Morte. A representação de D.
Pedro I levantando sua espada no momento do grito “Independência ou Morte”. Em
outro momento dois soldados tirando as insígnias das mangas dos seu uniformes
que antes representava Portugal e como forma de juramento e fidelidade à nova
pátria, o Brasil.

FIGURA 87 – DETALHE DE D. PEDRO I

FONTE: PROENÇA, Graça. Descobrindo a História da Arte.


São Paulo: Ática, 2006. p. 144-161.

FIGURA 88 – DETALHE DE DOIS SOLDADOS

FONTE: PROENÇA, Graça. Descobrindo a História da Arte. São


Paulo: Ática, 2006. p. 144-161.

131
UNIDADE 3 | RUMO À CONSTRUÇÃO DE UMA IDENTIDADE NACIONAL

3.3.3 Victor Meirelles


Victor Meirelles (1832-1903), natural de Florianópolis, capital do estado
de Santa Catarina, foi morar no Rio de Janeiro no ano de 1847, para estudar na
Academia Imperial de Belas Artes.

Ligado ao neoclassicismo, diversas de suas pinturas abordaram o tema


histórico como a “Primeira missa no Brasil”, de 1860, Figura 89, e Batalha de
Guararapes, pintada em 1879, Figura 90. Ao longo de sua carreira sentiu as mais
diferentes sensações da existência humana. Provou o louvor do reconhecimento e
morreu no esquecimento.

O artista ocupou a cadeira de pintura na Academia e, em seguida, recebeu


diversas encomendas do governo brasileiro, como a Batalha de Guararapes.

Para executar esta obra, partiu para Pernambuco, local do encontro,


onde demorou três meses estudando o assunto sob todos os aspectos:
indumentárias, paisagens local, personagens e armamentos. A
meticulosidade com que estudou aspectos do sítio da batalha e o rigor
histórico do levantamento de trajes e armas da época dão-lhe uma
conotação que fica entre o apuro do registro realista e o amor ao passado
romântico. (FILHO, 2005, p. 58).

O seu quadro a Primeira Missa, é uma de suas obras mais conhecidas no


Brasil e no Mundo.

FIGURA 89 – VICTOR MEIRELLES. PRIMEIRA MISSA NO BRASIL, 1860.


ÓLEO SOBRE TELA, 268X356 CM. MUSEU NACIONAL DE
BELAS ARTES, RIO DE JANEIRO, RJ

FONTE: TIRAPELI, Percival. Arte Brasileira: arte imperial do neoclássico


ao ecletismo. São Paulo: Nacional, 2008. p. 23-24.

132
TÓPICO 1 | A FAMÍLIA REAL NO BRASIL

FIGURA 90 – VICTOR MEIRELLES. BATALHA DE GUARARAPES


(DETALHE), 1879. MUSEU NACIONAL DE BELAS ARTES, RIO
DE JANEIRO, RJ

FONTE: TIRAPELI, Percival. Arte Brasileira: arte imperial do neoclássico


ao ecletismo. São Paulo: Nacional, 2008. p. 23-24.

3.3.4 José Ferraz de Almeida Júnior


Outro célebre aluno que frequentou a Academida Imperial de Belas Artes
foi o precoce pintor José Ferraz de Almeida Júnior (1850-1899). Em muitas de suas
obras, soube estabelecer uma ponte entre a veracidade intimista e o rigor formal
característico do academicismo, padrão dominante no Brasil.

Muitos autores sinalizam José Ferraz como sendo o precursor em abordar


assuntos regionalistas em suas obras, temas estes mais naturalistas, que até
este momento não eram desenvolvidos na academia brasileira de Belas Artes, e
também por suprimir de sua composição toda a monumentalidade características
do neoclassicismo.

Em suas obras, representadas nas Figuras 91 e 92, procurou destacar o


personagem simples e anônimo. Interpretou com poesia as cenas mais humildes
e simples da vida caipira. Em suas composições, procurou enfatizar, além do
personagem, as suas vestes, as suas expressões fisionômicas e corporais, as suas
moradias, os seus instrumentos de trabalho, os seus objetos de uso domésticos
bem como suas preocupações.

As características mais constantes de sua obra, que permanece desde as


primeiras até as últimas, é o sentido exato da composição, tendo a geometria como
sua grande aliada. Sempre que pode, combina e afirma ortogonais exatas. ( FILHO,
2005, p. 63).

133
UNIDADE 3 | RUMO À CONSTRUÇÃO DE UMA IDENTIDADE NACIONAL

FIGURA 91 – JOSÉ FERRAZ DE ALMEIDA JÚNIOR. O DERRUBADOR


BRASILEIRO, 1879. ÓLEO SOBRE TELA, 227X182 CM.
MUSEU NACIONAL DE BELAS ARTES, RIO DE JANEIRO,
RJ

FONTE: TIRAPELI, Percival. Arte Brasileira: arte imperial do neoclássico


ao ecletismo. São Paulo: Nacional, 2008. p. 25-60.

FIGURA 92 – JOSÉ FERRAZ DE ALMEIDA JÚNIOR. ALMOLAÇÃO


INTERROMPIDA, 1894. ÓLEO SOBRE TELA, 200X140
CM. PINACOTECA, SÃO PAULO, SP

FONTE: TIRAPELI, Percival. Arte Brasileira: arte imperial do


neoclássico ao ecletismo. São Paulo: Nacional, 2008. p. 25-60.

134
TÓPICO 1 | A FAMÍLIA REAL NO BRASIL

3.3.5 Antônio Diogo da Silva Parreiras

Parreiras (1860-1937) foi um pintor, desenhista, decorador e escritor, cujo


fascínio pelas matas o fazia passar meses nas florestas, pintando-as. Muitas vezes,
costumava reunir cenas de um romance às suas paisagens. Foi considerado um dos
pintores que desenvolveu mais quadros retratando temas históricos. Ele também
pintava nus.

No quadro que pintou retratando Iracema, Figura 93, à maneira


impressionista, percebe-se uma índia solitária em destaque no plano central. Ela
está de costas para o mar, chorando a perda de seu amor, homem português que
retorna ao seu país. A representação gráfica de seu corpo é elaborada segundo os
cânones europeus e sua pele confunde-se com a cor das areias como se fosse sua
extensão.

A Figura 94 mostra uma de suas obras cujo tema é paisagem intitulada


“Canto da Praia, pintada em 1886.

FIGURA 93 – PARREIRAS. IRACEMA, 1909. ÓLEO SOBRE TELA,


250x160. MUSEU DE ARTE DE SÃO PAULO, SP

FONTE: MANGE, Marilyn Diggs. Arte Brasileira para Criança. São Paulo:
Martins, 1998. p. 40.

FIGURA 94 – PARREIRAS. CANTO DA PRAIA, 1886. ÓLEO SOBRE TELA,


55,4X99,4 CM. ARTE DE SÃO PAULO, SP

FONTE: GARCEZ, Lucília; OLIVEIRA, Jô. Explicando a Arte Brasileira.


Rio de Janeiro: Ediouro, 2006. p. 87

135
UNIDADE 3 | RUMO À CONSTRUÇÃO DE UMA IDENTIDADE NACIONAL

3.3.6 Eliseu D’Angelo Visconti

O Italiano Visconti (1866-1944) veio para o Brasil ainda criança, passando


grande parte de sua vida entre Rio de Janeiro e Paris.

Começou a pintar no estilo acadêmico, porém, em sua primeira viagem


de estudos a Paris, trouxe ideias dos impressionistas, adaptando-as em suas
telas. Também permeou por outros estilos e foi considerado um dos pioneiros no
desenvolvimento de um design moderno.

Influenciado pelo estilo Art Nouveau, introduzido no Brasil entre o final


do século XIX e início do século XX, criou diversas peças como vasos, brasões,
cerâmicas, tecidos, vitrais, luminárias, ex-libris, selos, logotipos, etc. Analise as
Figuras 95, 96 e 97.

FIGURA 95 – CARTAZ DO PANO DE BOCA DO CASSINO


ANTÁRTICA

FONTE: Disponível em: <http://www.eliseuvisconti.com.br/


apres_pioneiro_design.htm>. Acesso em: 20 ago. 2008.

FIGURA 96 – CERÂMICA AZUL - c. 1900

FONTE: Disponível em: <http://www.eliseuvisconti.com.br/apres_


pioneiro_design.htm>. Acesso em: 20 ago. 2008.

136
TÓPICO 1 | A FAMÍLIA REAL NO BRASIL

FIGURA 97 – BAS DE PORTIERE

FONTE: Disponível em: <http://www.eliseuvisconti.com.


br/apres_pioneiro_design.htm>. Acesso em: 20 ago. 2008.

Ele renovou a pintura brasileira, utilizando outras técnicas, sendo


considerado como um pré-modernista, com Oréadas, de 1899 (Figura 99).

Um outro grande exemplo de uma de suas criações pré-modernista é


Gioventù, de 1898, (Figura 98). Ele reproduz em sua obra o mito e o erotismo da
mulher enaltecido na época da Belle Époque: juventude, esplendor de vida, nudez
casta e ingênua.

Esse quadro apresenta uma jovem, cuja delicadeza é envolvida pelo


esfumato, assim como a linearidade e o ambiente. O nu se eleva a
qualquer coisa de etéreo. A pintura teve grande repercussão nos meios
intelectuais, pois foi premiada em 1900 com a medalha de prata. Cabe
ainda notar que a Exposição desse ano, dedicada à eletricidade, foi
também consagrada ao art nouveau. O tratamento caligráfico, linear,
sinuoso e movimento desse estilo parecia emergir do mundo natural,
notadamente vegetal. Todo esse empenho em encontrar mediações entre
situações extremas respondia àquela busca de ternura que verificamos
nessa tela. (FILHO, 2005, p. 66)

FIGURA 98 – VISCONTI. GIOVENTÙ, 1898. ÓLEO SOBRE


TELA, 65X49 CM. MUSEU NACIONAL DE
BELAS ARTES, RIO DE JANEIRO, RJ

FONTE: FILHO, Duílio Battistoni. Pequena História das Artes


no Brasil. São Paulo: Átomo, 2005. p. 67-68.

137
UNIDADE 3 | RUMO À CONSTRUÇÃO DE UMA IDENTIDADE NACIONAL

FIGURA 99 – VISCONTI. ORÉADAS, 1899. ÓLEO SOBRE TELA,


200X108 CM. MUSEU NACIONAL DE BELAS ARTES,
RIO DE JANEIRO, RJ

FONTE: FILHO, Duílio Battistoni. Pequena História das Artes no


Brasil. São Paulo: Átomo, 2005. p. 67-68.

A moda nas artes plásticas brasileiras era um transplante tardio dos


estilos consagrados pelas Exposições Internacionais de Paris, que em
1855 haviam sacramentado a Pintura Histórica romântica; em 1867, o
Realismo burguês; em 1878, o Impressionismo; em 1889, o Simbolismo,
e em 1900, o Art Nouveau. (NOSSO SÉCULO, 1980, p. 225)

Muitos artistas incorporaram estes estilos repassando-os em suas produções,


porém, a arte, neste período, ainda não deixara de ser imposta pelos movimentos
que aconteciam na Europa, influenciando diretamente nossos pintores.

UNI

A Art Nouveau pode ser considerada como a busca de uma nova arte como
meio de substituir o Neoclassicismo que ainda perdurava na Europa. No Brasil esta passagem
foi rápida, difundindo-se mais em São Paulo e no Rio de Janeiro. Foram empregadas,
principalmente na arquitetura, formas mais curvas, com motivos florais, geométricos e
vegetais, e a combinação de ferro e vidro. Também foram desenvolvidos vários objetos
como vasos, brasões, cerâmicas, tecidos, vitrais, luminárias, ex-líbris, selos, logotipos, etc.

138
TÓPICO 1 | A FAMÍLIA REAL NO BRASIL

4 ECLETISMO

No Brasil, o estilo eclético começa a se fazer presente em edificações do Rio


de Janeiro, no final do século XIX, e logo se estende por outras regiões como São
Paulo, Belém, Pernambuco, Rio Grande do Sul, entre outras.

Um evento marca a sua introdução no Brasil: o fim do Império, ocasionado


pela Proclamação da República, em 1889. Este fato, junto com a vontade do
Brasil em romper com o elo que tinha com Portugal e se mostrar ao mundo como
“um novo país”, contribui para que, aos poucos, o estilo eclético vá ganhando a
arquitetura urbana.

Este gênero pode-se denominá-lo como sendo a reunião de elementos de


outros estilos, como as linhas curvas do barroco, as paredes lisas e ornadas pelo
tênue dourado do rococó e as colunas e arcos romanos típicos do neoclassicismo
(Figuras 100 e 101).

FIGURA 100 – MUSEU DA POLÍCIA CIVIL, 1912. RIO DE JANEIRO, RJ

FONTE: Disponível em: <http://pt.wikipedia.org/wiki/Estilo_ecl%C3%A9ctico>.


Acesso em: 8 ago. 2008.

139
UNIDADE 3 | RUMO À CONSTRUÇÃO DE UMA IDENTIDADE NACIONAL

FIGURA 101 – EDIFÍCIO ELYM ATUAL TUMELERO, 1922-23. RIO


GRANDE DO SUL, POA

FONTE: Disponível em: <http://pt.wikipedia.org/wiki/Estilo_


ecl%C3%A9ctico>. Acesso em: 8 ago. 2008.

No período Imperial, a cidade de São Paulo era pobre. Ela começou


a prosperar no final do século XIX, e a se equiparar com o Rio de Janeiro na
arquitetura. Neste período, os grandes fazendeiros, principalmente os barões do
café, buscam arquitetos para construírem suas casas seguindo o estilo europeu.

A influência francesa na arquitetura brasileira durou aproximadamente de


1816 até a Segunda Guerra Mundial e se manifestou sob a forma de quatro
estilos distintos: o neoclássico, o eclético, o Art Déco ou Art Nouveau e o
moderno. De acordo com Carlos Lemos, arquiteto e professor titular da
Faculdade de Arquitetura e Urbanismo da USP, no Rio de Janeiro, essa
influência foi mais forte na época do império e em São Paulo começou a
partir do estilo eclético (século XIX), patrocinado principalmente pelos
barões do café. Lemos afirma que essa inspiração trouxe para o Brasil muito
mais do que uma estética de fachada, mas um modo de morar à francesa, em
que, pela primeira vez, as construções eram divididas em alas totalmente
independentes – de dormir, de estar e de serviço. “Essa é, com certeza, a
maior contribuição da arquitetura francesa ao Brasil. Conceito utilizado até
hoje na maioria dos projetos”, afirma. (REVISTA FRANÇA-BRASIL).

Podemos perceber traços do ecletismo em várias construções, como nos


Teatros municipais das cidades do Rio de Janeiro e São Paulo, como no Edifício
das Barcas, também no Rio de Janeiro, e no Mercado Municipal de Manaus,
respectivamente apresentadas nas Figuras 102, 103 e 104.

140
TÓPICO 1 | A FAMÍLIA REAL NO BRASIL

FIGURA 102 – TEATRO MUNICIPAL DO RIO DE JANEIRO, RJ

FONTE: Arquivo pessoal do autor

FIGURA 103 – TEATRO MUNICIPAL DE SÃO PAULO, SP

FONTE: Arquivo pessoal do autor

O emprego de ferro fundido para as estruturas de construções como as


do Theatro José de Alencar, em Fortaleza, dos mercados de Manaus e do
Ver-o-Peso, em Belém do Pará, e da Estação da Luz, em São Paulo, são
exemplos significativos daquela nova maneira industrial de construção
civil. (TIRAPELI, 2008, p. 31).

141
UNIDADE 3 | RUMO À CONSTRUÇÃO DE UMA IDENTIDADE NACIONAL

FIGURA 104 – EDIFÍCIO DAS BARCAS (DETALHE), INÍCIO DO


SÉCULO XX. RIO JANEIRO, RJ

FONTE: TIRAPELI, Percival. Arte Brasileira: arte imperial do


neoclássico ao ecletismo. São Paulo: Nacional, 2008. p. 30-33.

Ramos de Azevedo (1851-1929) pode ser considerado um dos grandes nomes


da arquitetura que desenvolveu obras de influência europeia, principalmente
francesa, em São Paulo. A ele da-se o crédito da construção de mais de 500
edificações espalhadas pela capital paulista, entre prédios públicos, edifícios
privados e particulares. Algumas dessas construções são o Mercado Municipal, a
Pinacoteca do Estado, o Liceu de Artes e Ofícios, entre outras.

UNI

A Semana de Arte Moderna pouca influência teve sobre nossa arquitetura. Os


arquitetos que dela participaram não tinham o mínimo conhecimento do que se fazia de
moderno pelo mundo em matéria de racionalismo estrutural. O grosso de nossos arquitetos
seguia as regras clássicas de composição, ensinadas por seus mestres antiquados, nos cursos
de formação arquitetônica ministrados nas poucas escolas do país. (FILHO, 2005, p. 85).

142
TÓPICO 1 | A FAMÍLIA REAL NO BRASIL

LEITURA COMPLEMENTAR

A MISSÃO ARTÍSTICA FRANCESA

Lúcia Maria Bastos Pereira das Neves

Passaram-se, assim, dez anos – de 1816 a 1826 – antes que se concretizasse


o objetivo principal da Missão Artística Francesa. Tal fato pode ser explicado, em
primeiro lugar, pela morte, em 1817, de seu principal mecenas, o Conde da Barca, e
pelas discussões travadas em torno do contrato da Missão; em segundo, pelas intrigas
tecidas pelo consul francês Maler no Rio de Janeiro, que não via com bons olhos a
presença de artistas franceses simpatizantes de Bonaparte, embora, nenhum, deles
fosse visado pela polícia; e, finalmente, por uma relativa hostitlidade dos artistas
portugueses em relação aos franceses.

Planta da Academia Imperial de Belas Artes.


Gravura - Jean Baptiste Debret. Viagem pitoresca e histórica ao Brasil. Vol. 3.

De qualquer modo, os artistas franceses puderam contar com a real e graciosa


proteção do governo real. Segundo Afonso Taunay, além do pagamento da pensão
anual, a Corte enviava diariamente “maçãs, legumes, cereais, cerveja, vinhos do
Porto e Madeira” para seu sustento. Dessa forma, apesar dos percalços, a Missão
Artística Francesa ganhou espaço, sendo responsável pela introdução de novos ares e
de uma nova cultura das belas artes, a partir do desenvolvimento do neoclassicismo,
sobretudo, na cidade do Rio de Janeiro, e por uma série de obras urbanísticas e de
grandes monumentos. Além disso, seus membros executaram diversos trabalhos
para a família real, relacionados às datas e fatos comemorativos da monarquia.
Após as exéquias de D. Maria I, seguiram-se as cerimônias de aclamação de D. João
VI (1817) e as da vinda da futura imperatriz (1817) – a princesa Leopoldina – que
envolveram a criação de uma série de obras de arquitetura efêmera, como arcos
de triunfo, obeliscos e ornamentos para a cidade; assim como, mais tarde, ocorreu
com os festejos para a aclamação e coroação de Pedro I em 1822.

Alguns dos artistas franceses permaneceram no Brasil, mesmo após a


Independência. Se Lebreton faleceu em 1819, Debret aqui ficou por quinze anos,
enquanto Grandjean de Montigny veio a morrer no Rio de Janeiro, com a idade de
74 anos, em março de 1850. O primeiro, além de converter-se em pintor oficial do
143
UNIDADE 3 | RUMO À CONSTRUÇÃO DE UMA IDENTIDADE NACIONAL

Primeiro Reinado, deixou uma série de desenhos, guardados também no acervo da


Biblioteca Nacional, que retratam o cotidiano, a paisagem, a fauna, a flora e os modos
de vida daquela época. Esses desenhos, anos mais tarde, foram publicados na obra
Viagem pitoresca e histórica ao Brasil. Já Grandjean de Montigny preocupou-se com
a paisagem urbanística do Rio de Janeiro e destacou-se na construção de prédios
urbanos, elaborando ainda o projeto da primeira sede da praça do Comércio, obra
concluída em 1820, e que hoje abriga a Casa França-Brasil.

A historiografia acerca da Missão Artística Francesa não deixa de apresentar


opiniões distintas. Para alguns, ela deve ser criticada, pois não possibilitou a construção
de uma arte nacional; para outros, entretanto, promoveu o desenvolvimento das
artes, ao introduzir traços eruditos na cultura artística largamente vernácula do
Império do Brasil que surgia. Talvez mais importante do que tais polêmicas seja
reconhecer que esses indivíduos, com seus trabalhos, em alguns casos, transferiram
saberes; em outros, criaram uma memória da monarquia brasileira; e, sobretudo,
contribuíram para o ingresso do Império nascente numa certa senda de civilização,
em que o país real, o dos escravos e misérias, era redesenhado sob a aparência de
um país ideal, de acordo com o modelo da civilização francesa.

Palácio de São Cristóvão, atualmente Museu Nacional do Rio de Janeiro.


Gravura - Jean Baptiste Debret. Viagem pitoresca e histórica ao Brasil. Vol. 3.

FONTE: NEVES, Lúcia Maria Bastos Pereira das. Disponível em: <http://catalogos.bn.br/
redememoria/missfrancesa.html>. Acesso em: 20 ago. 2008.

144
RESUMO DO TÓPICO 1

Neste tópico, caro(a) acadêmico(a), você teve oportunidade de estudar


importantes aspectos acerca da Arte Brasileira, cujos itens você pode ler a seguir:

A corte portuguesa ao chegar ao Brasil, em 1808. De colônia o Brasil se eleva ao


posto de metrópole, ganhando assim um novo status político.

Neste período, as transformações foram muitas e profundas e em todas as


esferas: política, econômica, social e cultural. O Rei de Portugal começou um


processo de reestruturação e modernização do Brasil.

D. João VI, em 1816, com o intuito de fomentar a cultura e a modernização


do Brasil, importou mão de obra francesa. A esta ação denominou-se missão


artística francesa.

Grandes artistas da Missão Francesa se evidenciaram, como o pintor Jean-


Baptiste Debret, o escultor Auguste Marie Taunay e o arquiteto Auguste-Henri-


Victor Grandjean de Montigny.

Dois artistas contribuíram para registrar a traçar um perfil do Brasil naquela


época: o austríaco Thomas Ender e o alemão Johann Moritz Rugendas.

Em meados do século XVIII, um novo estilo predominou na pintura, na escultura


e na arquitetura europeia, o Neoclassicismo ou academicismo. Este estilo surgiu


como reação ao Barroco e Rococó e se caracterizou pelo desejo de recriar as
formas artísticas da Antiguidade greco-romana, manteve-se até o início do
século XIX.

Muitos artistas se destacaram no período do Brasil Império, como Manuel de


Araújo Porto Alegre, Augusto Müller, Pedro Américo de Figueiredo e Melo,


Victor Meirelles, José Ferraz de Almeida Júnior entre outros.

As artes plásticas brasileiras ainda eram um transplante tardio dos estilos que

se consagravam em Paris, como o romantismo, o indianismo, o realismo, o


impressionismo e a Arte Nouveau.

Com o fim do Império, pela Proclamação da República em 1889, começa a se


fazer presente um novo estilo, o Eclético.

A este gênero podemos denominar como sendo a reunião de elementos de outros


estilos, como as linhas curvas do barroco, as paredes lisas e ornadas pelo tênue
dourado do rococó e as colunas e arcos romanos típicos do neoclassicismo.

145
AUTOATIVIDADE

Segundo a opinião de Maria Izabel Branco Ribeiro, “embora muito


divulgado pelas ilustrações e fotografias publicadas em revistas, o artista
pioneiro do Art-Nouveau no Brasil foi Eliseu Visconti que, em 1901, expôs
no Rio de Janeiro pinturas, desenhos e peças de artes decorativas, fruto
dos anos de estudos com o artista Eugène Grasset, em Paris. (VISCONTI –
APRESENTAÇÃO)

Também Leonardo Visconti Cavalleiro sustenta que o estilo Art-


Nouveau funcionou como intermediário entre a indústria e a arte, conforme
percepção de Visconti, que realizou os primeiros ensaios de introdução da
arte decorativa na indústria, situando-se como precursor desse estilo na arte
brasileira. (VISCONTI – APRESENTAÇÃO).

Outro nome a destacar a importância deste artista para as artes


brasileiras é Paulo Herkenhoff: Eliseu Visconti pode ser considerado o pai do
desenho industrial no Brasil. Afiliado a Art Nouveau, desenhou padrões para
papel de parede e executou objetos, como louça, criou capas de revistas, selos,
ex-líbris, fez decoração do Teatro Municipal de Rio de Janeiro e da Biblioteca
Nacional. Seus cartazes estão entre os primeiros do gênero com valor artístico
no Brasil. (VISCONTI – APRESENTAÇÃO).

Percebendo a importância de Eliseu Visconti no cenário das artes


plásticas como precursor da Art Nouveau, pesquise sobre sua biografia.
Também selecione obras e objetos desenvolvidos por Eliseu Visconti, bem
como de outros artistas brasileiros que se valeram das referências da Art
Nouveau, e descreva quais as características mais importantes que identificam
este estilo e aponte-as nas imagens selecionadas.

Uma boa fonte de pesquisa é o site http://www.eliseuvisconti.com.br/,


que aborda vida e obra deste grande artista brasileiro.

Bom Trabalho!

Assista ao vídeo de
UNI resolução desta questão

É importante salientar que, até o final do século XIX e início do século XX, a
arte plástica brasileira ainda era um transplante tardio dos estilos que se consagravam em
Paris como: o romantismo, o realismo, o impressionismo e a Arte Nouveau. Muitos artistas
brasileiros incorporaram estes estilos repassando-os em suas produções.

146
UNIDADE 3
TÓPICO 2

MODERNISMO NO BRASIL

1 INTRODUÇÃO

O século XX inicia depurando os reflexos oriundos de várias mudanças


ocorridas no Brasil do século passado desencadeando muitas transformações. A
essas metamorfoses podemos citar a descoberta do Brasil, em 1500, e o seu processo
de colonização entre 1530-1808.

O período Imperial que se iniciou em 1808, com a vinda da família Real


Portuguesa para o Brasil, e, consequentemente, de D. João VI, promoveu uma
grande reestruturação e modernização no país. Com o intuito de fomentar a cultura
institui a vinda da Missão Artística Francesa em 1816.

Um marco para o país, pois a esta ação é que se credita a revolução no


panorama das belas artes. Logo, o Brasil se vê independente, em 1822, e, em seguida,
ocorre a Proclamação da República, 1889, culminando com o fim do imperialismo.

Estes acontecimentos, principalmente a vinda da Missão Artística Francesa


e a criação da Escola Real de Ciências Artes e Ofícios, que só foi funcionar em
1826, intitulada Academia Imperial de Belas Artes – passando posteriormente a se
chamar Escola Nacional de Belas Artes, atual Escola de Belas Artes da Universidade
Federal do Rio de Janeiro – constituiram-se o embrião na formação de uma classe
artística brasileira.

Estas mudanças alteraram, também, de forma profunda, o âmbito político,


social e cultural do Brasil, agora República (de 1889 a 1930 é conhecido como a
República Velha), apontando para um desenvolvimento e modernização do país.

Na primeira década do século, a efervescência da vida literária e


mundana do Rio de Janeiro contagiava o Brasil com a onda de progresso
que a República vinha conhecendo. As crises de transição haviam
passado, a economia prosperava e nas grandes cidades multiplicavam-
se lojas, confeitarias, salões elegantes e vaudeviles. (NOSSO SÉCULO,
1980, p. 208).

Neste momento da história, o Brasil tenta romper definitivamente com o elo


que tinha com Portugal. Desejava mostrar ao mundo que havia se transformado
em um “novo país” e também buscava por uma identidade nacional, estimulando
o espírito patriota.

O advento da fotografia, por volta de 1839, também fez alterar a relação


homem e arte. A arte, até um dado momento da história, percorria certa linearidade
147
UNIDADE 3 | RUMO À CONSTRUÇÃO DE UMA IDENTIDADE NACIONAL

temporal e estilística em que se percebiam as suas categorias de classificações. Até


então, ela era o único registro visual realístico, porém, com a fotografia, houve
uma nova relação entre o homem, a história e o instante captado por esta nova
tecnologia.

Neste âmbito, aos poucos, o artista vai se desligando do registro realista,


pois, a fotografia livra-o dessa “preocupação” e caminha para experimentar outros
estilos. E mais, ele é inserido neste cenário conturbado, cheio de mudanças que o
modernismo se estabelece.

UNI

O ápice do movimento modernista no Brasil se deu com a Semana de Arte


Moderna em 1922, ocorrida em São Paulo. Diferentemente do que vinha acontecendo
no passado, os conceitos de tempo e de desenvolvimento no tempo, que antes pareciam
longos, lineares, contínuos foram reduzidos para ímpetos e fragmentos curtos, fugazes,
múltiplos e simultâneos.

2 SEMANA DE ARTE MODERNA

O modernismo brasileiro pode ser considerado um movimento cultural


que se deu no início no século XX e foi diretamente influenciado pelo movimento
europeu. Ele ressoou intensamente sobre a cena artística e em toda a sociedade
brasileira. O ápice desse movimento se deu com a Semana de Arte Moderna, em
1922, ocorrida em São Paulo.

O pintor, ilustrador e caricaturista brasileiro Di Cavalcanti (1897-1976)


desenvolveu o catálogo de divulgação da exposição da Semana de Arte Moderna
(Figura 105). Veja na Figura 106, outra obra deste artista.

148
TÓPICO 2 | MODERNISMO NO BRASIL

FIGURA 105 – DI CAVALCANTI. DESENHO NA CAPA DO


CATÁLOGO DA EXPOSIÇÃO DA SEMANA DE
ARTE MODERNA DE 1922

FONTE: BEUTTENMÜLLER, Alberto. Viagem pela arte brasileira.


São Paulo: Aquariana, 2002. p. 51.

FIGURA 106 – DI CAVALCANTI. PIERROT, 1924. ÓELO SOBRE


TELA, 30X22 CM

FONTE: VIVEIROS, Ricardo. Da Arte do Brasil. São Paulo: Clemente


& Gramani, 2006. p. 119.

Este movimento é uma reação ao academicismo, parnasianismo,


romantismo, realismo, naturalismo e simbolismo, que aconteciam entre o final do
século XIX e início do Século XX, e teve como intuito o rompimento com estes
modelos rígidos de expressão.
149
UNIDADE 3 | RUMO À CONSTRUÇÃO DE UMA IDENTIDADE NACIONAL

No âmbito cultural, este período representou um verdadeiro cruzamento


e confronto de ideias, sinalizado pela coexistência de várias tendências artísticas
– tanto literárias quanto plásticas – a serem superadas concomitantemente com
novidades de linguagens e estéticas que participavam de uma nova forma de
pensar, uma nova ideologia. A intenção era fazer os artistas percorrerem caminhos
novos e mais livres de criação. As novas vanguardas estéticas surgiam e o mundo
se espantava com as novas linguagens desprovidas de regras. Alvo de críticas e
em parte ignorada, a Semana não foi bem entendida em sua época. O capitalismo
crescia no Brasil, consolidando a República e a elite paulista, esta totalmente
influenciada pelos padrões estéticos europeus mais tradicionalistas.

A Semana de Arte Moderna teve como objetivo mostrar ao público a


renovação que propunham no meio artístico e cultural. Apresentaram neste evento
pinturas, esculturas, música, literatura, arquitetura, etc..

As enormes modificações que a tecnologia e a fabricação em massa,


que se avolumaram com a crescente urbanização geral das sociedades
durante o século XIX, não podiam deixar de afetar as artes. O próprio
movimento de secularização do estado e da sociedade, iniciado com a
Revolução Francesa de 1789 e aprofundado com a Revolução de 1848,
fez com que novos rumos temáticos e estéticos fossem buscados pelos
artistas e pelos literatos. (EDUCATERRA: VOLTAIRE, 2005).

As mudanças políticas, econômicas e sociais, ocorridas em âmbito mundial


e também nacional, dialogavam com as diversas transformações que a cultura
sofreu. Estas mutações ajudaram na construção da história do país e no despertar
de uma renovação da arte e de seus conceitos.

Esta ação teve como característica a liberdade do fazer artístico com forte
pesquisa em outras fontes de informação, abrindo campo para as experimentações
e novas formas de expressão.

Stangos (1994, p. 8) menciona, em sua obra, que a experimentação passou a


ser um método de trabalho tanto para as tendências “racionais” da Arte Moderna
quanto para as “irracionais”. E o autor ainda enfatiza que essas duas atitudes,
aparentemente irreconciliáveis, a “racional” e a “irracional”, estavam unidas numa
frente comum, dado que ambas eram inspiradas e motivadas por fortes paixões
antitradicionais e antiautoritárias.

A ênfase na experimentação, por um lado, e a frequente aplicação de um
enfoque sistemático (embora tivesse normalmente um ponto de partida
arbitrário e intuitivo), por outro, eram quase certamente inspiradas por
novos e importantes avanços nas ciências físicas. [...] Simplesmente,
as novas ideias científicas estavam no ar (através dos veículos de
comunicação de massa, etc.) e, independentemente de serem ou não
entendidas, ajudaram a canalizar a atividade imaginativa para novas
direções, além de encorajarem a experimentação mesmo quando eram
interpretadas de forma totalmente errônea. (STANGOS, 1994, p. 8).

150
TÓPICO 2 | MODERNISMO NO BRASIL

Embora tenha tido influências europeias, os artistas abordavam em suas


produções temas nacionalistas, incluindo, em suas obras, personagens negros,
mulatos, índígenas, caipiras e também temas sobre a economia, a política e a
sociedade.

Aquilo a que se chamou genericamente arte moderna, refletindo


outras atitudes análogas na sociedade, tornou-se uma força libertadora
explosiva no início do século, contra a opressão de pressupostos com
frequência cegamente aceitos até então. Na pintura, essa tendência
principiou com os impressionistas, mas já por volta de 1910 adquirira
tamanho ímpeto que até mesmo os impressionistas se viram em posição
de retaguarda, não mais na vanguarda. A importância atribuída
à noção de vanguarda (e que praticamente se tornou sinônimo de
“experimental”) era tão grande que, à primeira vista, esse parecia ser o
único padrão de avaliação para a arte. (STANGOS, 1994, p. 7).

Neste período surgiu o movimento modernista brasileiro denominado o


grupo dos cinco. Estes eram compostos pelas artistas plásticas Tarsila do Amaral
(1886-1973) e Anita Catarina Malfatti (1889-1964) e os poetas e escritores Oswald de
Andrade (1890-1954), Mário de Andrade (1893-1945) e Paulo Menotti del Picchia
(1892-1988).

Eles defendiam a ideologia da Semana de Arte Moderna e tomaram a


frente deste movimento, embora a artista Tarsila do Amaral não tenha participado
da semana de 1922, pois estava na Europa. Veja, a seguir, duas de suas obras deste
período (Figuras 107 e 108).

FIGURA 107 – TARSILA DO AMARAL. RETRATO DE OSWALD DE


ANDRADE, 1922. ÓLEO SOBRE TELA, 61X42 CM
(Coleção particular)

FONTE: Disponível em: <http://musicapoesiabrasileira.blogspot.


com/2007/03/tarsila-do-amaral-vida-e-obra.html>. Acesso em: 15 ago. 2008.

151
UNIDADE 3 | RUMO À CONSTRUÇÃO DE UMA IDENTIDADE NACIONAL

FIGURA 108 – TARSILA DO AMARAL. AUTORRETRATO, 1923. ÓLEO


SOBRE TELA

FONTE: Disponível em: <http://www.bbc.co.uk/portuguese/


especial/539_tarsila/index.shtml>. Acesso em: 20 ago. 2008.

Na Semana de Arte Moderna apareceram vários outros artistas ligados ao


movimento modernista, que expunham seus trabalhos propondo uma nova forma
de expressão, tanto artística quanto literária, como o pintor e poeta Vicente do
Rego Monteiro (1899-1970), o escultor ítalo-brasileiro Victor Brecheret (1894-1955),
a pintora e desenhista Zina Aita (1900-1967), os artistas plásticos John Louis Graz
(1891-1980) e Ferrignac (1892-1958) entre outros.

UNI

Segundo Jacob Klintowitz, em relato ao Jornal da Tarde, de 2 de dezembro


de 1982, falando sobre a exclusão do nome do renomado artista plástico Eliseu Visconti
da semana de arte moderna: “[...] os principais artistas modernos não foram convidados a
participar. Naquela época, como agora, sobravam as questões pessoais, o desconhecimento
e a disputa de poder e projeção, o que serve para explicar a ausência, ao menos como
homenagem, do grande pintor Eliseu Visconti, a quem devemos, em boa parte, a
modernidade de nossa pintura”. A injustiça seria parcialmente reparada cinquenta anos
depois, quando Willys de Castro incluiu uma tela de Visconti no Cartaz Comemorativo do
Cinquentenário da Semana de Arte Moderna. (Disponível em: <http://www.eliseuvisconti.
com.br/bio_maturidade.htm>. Acesso em: 20 ago. 2008).

A Figura 109 mostra a obra do artista Vicente do Rego Monteiro, e as


Figuras 110 e 111 expõem duas esculturas de Victor Brecheret.
152
TÓPICO 2 | MODERNISMO NO BRASIL

FIGURA 109 – VICENTE DO REGO. CENÁRIO PARA O BAILADO DA


LUA-LACI, 1921. MUSEU DE ARTE CONTEMPORÂNEA DA
USP. SÃO PAULO, SP

FONTE: TIRAPELI, Percival. Arte Brasileira: arte moderna e


contemporânea, figuração, abstração e novos meios. São
Paulo: Nacional, 2008. p. 21.

FIGURA 110 – BRECHERET. TOCADORA DE FIGURA 111 – BRECHERET. BAILARINA,


GUITARRA, 1923. BRONZE, 1920. BRONZE, ALTURA 38
ALTURA 75 CM. PINACOTECA CM. FUNDAÇÃO ESCULTOR
DO ESTADO DE SÃO PAULO VICTOR BRECHERET

FONTE: PROENÇA, Graça. Descobrindo a


FONTE: PROENÇA, Graça. Descobrindo a
História da Arte. São Paulo: Ática, 2006. p. 205.
História da Arte. São Paulo: Ática, 2006. p. 205.

Mas Lasar Segall e Anita Malfatti são considerados os pioneiros a expressar


em seus trabalhos uma pintura moderna. Lasar Segall, em 1913, expunha em São
Paulo suas telas expressionistas de intenso conteúdo dramático. As Figuras 112 e
113 mostram duas de suas criações.

153
UNIDADE 3 | RUMO À CONSTRUÇÃO DE UMA IDENTIDADE NACIONAL

FIGURA 112 – SEGALL. MENINO COM LAGARTIXA, 1924. ÓLEO


SOBRE TELA, 98X61 CM. MUSEU LASAR SEGALL, SÃO PAULO, SP

FONTE: PROENÇA, Graça. Descobrindo a História da Arte. São


Paulo: Ática, 2006. p. 199.

FIGURA 113 – SEGALL. DUAS AMIGAS, 1913. ÓLEO SOBRE TELA,


85X79CM. MUSEU LASAR SEGALL, SÃO PAULO, SP

FONTE: PROENÇA, Graça. Descobrindo a História da Arte. São


Paulo: Ática, 2006. p. 199.

154
TÓPICO 2 | MODERNISMO NO BRASIL

Mais tarde, em 1917, a revolucionária Anita Malfatti – recém chegada,


no Brasil, de viagem de estudos à Alemanha e Estados Unidos – traz inovações,
introduzindo uma pintura denominada “fauve”. Ela expõe seus trabalhos com
influências nitidamente cubistas, expressionista e futurista, causando escândalo.

A arte moderna tendia à militância política. Procurava cantar as glórias


da tecnociência como no caso do Futurismo Italiano, ou, pelo contrário,
procurava denunciar o cenário caótico da modernidade urbana do
capitalismo industrial, como nas cores fortes do cubismo e do fauvismo
ou na cinzenta deformação da realidade do expressionismo alemão.
(XAVIER, 2003).

A pintura futurista, que também era influenciada pelo cubismo e


expressionismo, tinha como conceito o desprezo ao passado como forma de
dar subsídios para o artista retratar algo original, inovador, futurista. Para isso,
utilizava-se de cores muito vivas e trabalhava-se com contrastes e sobreposições,
dando a sensação de dinamismo, deformação e, às vezes, de desmaterialização da
obra.

Duas criações marcam as transformações temáticas e formais desse período:


“A mulher de cabelos verdes” (Figura 114) e o Homem Amarelo (Figura 115), de
Anita Malfatti. “Sua obra contou com o apoio de um grupo entusiasta de literatos
e artistas que, mais tarde, desencadeariam o movimento modernista no país”.
(ABRIL CULTURAL, 1976, p. 51).

FIGURA 114 – MALFATTI. A MULHER DE CABELOS VERDES,


1915. ÓLEO SOBRE TELA, 61X51CM. COLEÇÃO
PARTICULAR

FONTE: PROENÇA, Graça. Descobrindo a História da Arte. São


Paulo: Ática, 2006. p. 200-201.

155
UNIDADE 3 | RUMO À CONSTRUÇÃO DE UMA IDENTIDADE NACIONAL

FIGURA 115 – MALFATTI. O HOMEM AMARELO, 1915. ÓLEO SOBRE


TELA, 61X51 CM. COLEÇÃO MÁRIO DE ANDRADE/
INSTITUTO DE ESTUDOS BRASILEIROS – IEB/USP,
SÃO PAULO, SP

FONTE: PROENÇA, Graça. Descobrindo a História da Arte. São


Paulo: Ática, 2006. p. 200-201.

UNI

A Arte Moderna se refere a uma nova abordagem da arte em um momento


no qual não mais era importante que ela representasse literalmente um assunto ou
objeto (através da pintura e da escultura) – o advento da fotografia fez com que houvesse
uma diminuição drástica na demanda por certos meios artísticos tradicionais, a pintura
especialmente. Ao invés disso, e é aí que a ideia de moderno começa a tomar forma, os
artistas passam a experimentar novas visões, através de ideias inéditas sobre a natureza, os
materiais e as funções da arte e, com frequência, caminhando em direção à abstração. A
noção de arte moderna está estreitamente relacionada com o modernismo.

3 NACIONALISTAS: PAU-BRASIL, VERDE-AMARELISMO E


ANTROPOFAGISMO
Passada a euforia e o escândalo que a Semana de Arte Moderna provocou,
o Modernismo começa a cristalizar-se em doutrinas estéticas. Surgindo os
movimentos nacionalistas: Pau Brasil, verde-amarelismo e Antropofagismo.

Estas ações se formaram pela junção das artes plásticas adeptas da ideologia
que apregoavam os movimentos literários através dos seus manifestos.

Estes literatos propunham uma exaltação patriótica, junto com os artistas


modernos formando, assim, um dos períodos mais nacionalistas da arte brasileira.
156
TÓPICO 2 | MODERNISMO NO BRASIL

UNI

O realismo ou nacionalismo era uma corrente que buscava atacar a arte


acadêmica, cujas raízes nasceram com a vinda da Missão Francesa para o Brasil. Nesta
busca por uma identidade nacional, predominam, na pintura, os estilos sobrerrealistas e
pós-cubistas. Outras tendências da arte europeia também serviram de fontes para o artista
nacional, como o futurismo, o expressionismo, o surrealismo e o cubismo. Alguns dos artistas
que beberam desta fonte: Di Cavalcanti, Tarsila do Amaral, Lasar Segall, Victor Brecheret,
Cícero Dias, Vicente do Rego Monteiro e Anita Malfatti.

3.1 O MOVIMENTO PAU-BRASIL


O Movimento Pau-Brasil (aproximadamente entre 1924-1930) tomou como
base a publicação do “Manifesto da Poesia Pau-Brasil”, escrito por Oswald de
Andrade e ilustrado por Tarsila do Amaral. Duas obras de Tarsila deste período,
Figuras 116 e 117.

FIGURA 116 – TARSILA DO AMARAL. A FEIRA, 1924. ÓLEO SOBRE TELA.


MUSEU DE ARTE CONTEMPORÂNEA DA USP. SÃO
PAULO, SP

FONTE: NOSSO SÉCULO: 1910-30. São Paulo: Abril Cultural, 1981. p. 235.

157
UNIDADE 3 | RUMO À CONSTRUÇÃO DE UMA IDENTIDADE NACIONAL

FIGURA 117 – TARSILA DO AMARAL, 1924. ÓLEO SOBRE


TELA, 142X126 COM. MUSEU DE ARTE
CONTEMPORÂNEA DA USP. SÃO PAULO, SP

FONTE: TIRAPELI, Percival. Arte Brasileira: arte moderna e


contemporânea, figuração, abstração e novos meios.
São Paulo: Nacional, 2008. p. 17.

Este manifesto, de forte inspiração nos movimentos de vanguarda europeus,


tinha como intuito apresentar uma oposição ao primitivismo, buscando em sua
essência uma poesia mais ingênua. Ele propunha uma redescoberta do mundo
e do Brasil, exaltando o seu progresso e o momento presente. Simultaneamente,
rechassava a linguagem retórica e vazia.

O primitivismo, a “simplicidade alcançada” e a crítica ao “nacionalismo


postiço” eram o programa do Grupo Pau-Brasil, que se inclinava
politicamente para a esquerda, evoluindo para o Movimento
Antropofágico, lançado pela Revista Antropofagia, em 1928. (NOSSO
SÉCULO, 1981, p. 238).

O movimento contou também com a participação do jornalista, político e


escritor Alcântara Machado (1901-1935), do poeta e diplomata Raul Bopp (1898-
1984), do mecenas Paulo Prado (1869-1943) e o poeta, romancista, crítico de arte
Mário de Andrade (1893-1945).

3.2 VERDE- AMARELISMO


No mesmo período em que surgiu o movimento Pau-Brasil, nasceu, em São
Paulo, em 1926, a tendência estética Verde-Amarelismo. Esta corrente se manteve até
próximo do início da Revolução de 1930. Nacionalista e conservadora, esta corrente
teve como mentores o jornalista Plínio Salgado (1895-1975), o ítalo-brasiliero poeta
escritor e pintor Paulo Menotti Del Picchia (1892-1988) e o advogado, professor
jornalista Cândido Mota Filho (1897-1977). Futuramente, este movimento dará
origem ao Grupo da Anta, em 1927, desaguando, posteriormente, no integralismo.

Plínio Salgado (1895-1975) não se cansará de atacar o cosmopolitismo dos


antropófagos: “Imitamos os touristes, apreciando a nossa terra e a nossa gente com
os olhos de curiosidade com que Martius colecionava borboletas(...)”. (NOSSO
SÉCULO, 1981, p. 238).
158
TÓPICO 2 | MODERNISMO NO BRASIL

UNI

O integralismo é uma corrente política tradicionalista baseada nas ideologias


fascistas europeias adaptadas para o Brasil.

3.3 ANTROPOFAGISMO
O Movimento Antropofágico, que abarca literatos e artistas plásticos,
baseou-se na obra de Tarsila do Amaral, intitulada “Abaporu”, originando o
Manifesto Antropófago de Oswald de Andrade, publicado em 1928.

Ele pode ser considerado um desdobramento mais profundo do movimento


Pau-Brasil, sendo um contraponto aos questionamentos levantados pela Semana de
Arte Moderna, em 1922.

Este movimento tinha como filosofia a deglutição da cultura estrangeira


como forma de resultar numa cultura nacional. Seu lema era não negar a cultura
estrangeira, porém, não imitá-la, criando uma autêntica.

Esta ação resultou em uma oxigenação, uma renovação na pintura brasileira


em que Tarsila do Amaral, em seus trabalhos, retrata temas fortemente brasileiros,
nos quais aparece a fauna e a paisagem nacional.

Tarsila do Amaral destacou-se por esta serie de trabalhos antropofágicos


(Figuras 118 e 119). Seu símbolo maior de produção é a obra intitulada “O Abaporu
(homem antropófago, em tupi-guarani).

FIGURA 118 – TARSILA DO AMARAL. ABAPORU, 1928.


ÓLEO SOBRE TELA, 85X37 CM. COLEÇÃO
PARTICULAR, ARGENTINA

FONTE: BEUTTENMÜLLER, Alberto. Viagem pela arte


brasileira. São Paulo: Aquariana, 2002. p. 50-55.

159
UNIDADE 3 | RUMO À CONSTRUÇÃO DE UMA IDENTIDADE NACIONAL

FIGURA 119 – TARSILA DO AMARAL. ANTROPOFAGIA, 1929. ÓLEO


SOBRE TELA, 126X142 CM. COLEÇÃO PARTICULAR

FONTE: BEUTTENMÜLLER, Alberto. Viagem pela arte brasileira. São


Paulo: Aquariana, 2002. p. 50-55.

Tarsila pintou muitas figuras e plantas tropicais e misturou o Cubismo,


que aprendeu na França, com a perspectiva de Cézanne e mais tarde instaurado
na França por Picasso e Braque, em 1907. “O Cubismo foi o meu serviço militar”,
dizia Tarsila. (BEUTTENMÜLLER, 2002, p. 54).

Posterior a essas iniciativas progressistas surgiram outros movimentos,


grupos e salões de arte, tentando ajustar a sincronicidade de nossa arte com as
vanguardas internacionais.

LEITURA COMPLEMENTAR

O MODERNISMO NO BRASIL: PRIMEIRA FASE (1922 - 1930)

A Semana de Arte Moderna (1922) é considerada o marco inicial do


Modernismo Brasileiro. A Semana ocorreu entre 13 e 18 de fevereiro de 1922, no Teatro
Municipal de São Paulo, com participação de artistas de São Paulo e do Rio de Janeiro.

O evento contou com apresentação de conferências, leitura de poemas,


dança e música. O Grupo dos Cinco, integrado pelas pintoras Tarsila do Amaral e
Anita Malfatti e pelos escritores Mário de Andrade, Oswald de Andrade e Menotti
Del Picchia, liderou o movimento, que contou com a participação de dezenas
de intelectuais e artistas, como Manuel Bandeira, Di Cavalcanti, Graça Aranha,
Guilherme de Almeida, entre muitos outros.

Os modernistas ridicularizavam o parnasianismo, movimento artístico


em voga na época, que cultivava uma poesia formal. Propunham uma renovação
radical na linguagem e nos formatos, marcando a ruptura definitiva com a arte
tradicional. Cansados da mesmice na arte brasileira e empolgados com inovações
que conheceram em suas viagens à Europa, os artistas romperam as regras
preestabelecidas na cultura.
160
TÓPICO 2 | MODERNISMO NO BRASIL

Na Semana de Arte Moderna, foram apresentados quadros, obras literárias


e recitais inspirados em técnicas da vanguarda europeia, como o dadaísmo, o
futurismo, o expressionismo e o surrealismo, misturados a temas brasileiros. Os
participantes da Semana de 1922 causaram enorme polêmica na época. Sua influência
sobre as artes atravessou todo o século XX e pode ser entendida até hoje.

A primeira fase do Modernismo

O movimento modernista no Brasil contou com duas fases: a primeira foi de 1922
a 1930 e a segunda de 1930 a 1945. A primeira fase caracterizou-se pelas tentativas de
solidificação do movimento renovador e pela divulgação de obras e ideias modernistas.

Os escritores de maior destaque dessa fase defendiam estas propostas:


reconstrução da cultura brasileira sobre bases nacionais; promoção de uma revisão
crítica de nosso passado histórico e de nossas tradições culturais; eliminação definitiva
do nosso complexo de colonizados, apegados a valores estrangeiros. Portanto, todas
elas estão relacionadas com a visão nacionalista, porém crítica, da realidade brasileira.

Várias obras, grupos, movimentos, revistas e manifestos ganharam o cenário


intelectual brasileiro, numa investigação profunda e, por vezes, radical de novos
conteúdos e de novas formas de expressão. Entre os fatos mais importantes, destacam-
se a publicação da revista Klaxon, lançada para dar continuidade ao processo de
divulgação das ideias modernistas, e o lançamento de quatro movimentos culturais:
o Pau-Brasil, o Verde-Amarelismo, a Antropofagia e a Anta.

Esses movimentos representaram duas tendências ideológicas distintas,


duas formas diferentes de expressarem o nacionalismo.

O Movimento Pau-Brasil defendia a criação de uma poesia primitivista,


construída com base na revisão crítica de nosso passado histórico e cultural e na
aceitação e valorização das riquezas e contrastes da realidade e da cultura brasileira.

A Antropofagia, a exemplo dos rituais antropofágicos dos índios brasileiros,


nos quais eles devoram seus inimigos para lhes extrair força, Oswald propõe a
devoração simbólica da cultura do colonizador europeu, sem com isso perder nossa
identidade cultural.

Em oposição a essas tendências, os movimentos Verde-Amarelismo e Anta,


defendiam um nacionalismo ufanista, com evidente inclinação para o nazifascismo.

Dentre os muitos escritores que fizeram parte da primeira geração do


Modernismo, destacamos Oswald de Andrade, Mário de Andrade, Manuel
Bandeira, Alcântara Machado, Menotti del Picchia, Raul Bopp, Ronald de Carvalho
e Guilherme de Almeida.

FONTE: Brasil Escola. Disponível em: <http://www.brasilescola.com/literatura/o-modernismo-no-


brasil.htm>. Acesso em: 20 ago. 2008.

161
RESUMO DO TÓPICO 2

Neste tópico, caro(a) acadêmico(a), você teve oportunidade de estudar


importantes aspectos referentes à Arte Brasileira, dos quais passamos os itens
que seguem:

 O modernismo brasileiro pode ser considerado um movimento cultural que


se deu no início do século XX e foi diretamente influenciado pelo movimento
europeu. Ele ressoou intensamente sobre a cena artística e em toda a sociedade
brasileira.

 Este movimento é uma reação ao academicismo, parnasianismo, romantismo,


realismo, naturalismo e simbolismo, que aconteciam entre o final do século XIX
e início do Século XX, e teve como intuito o rompimento com estes modelos
rígidos de expressão.

 O ápice do movimento modernista no Brasil deu-se com a Semana de Arte


Moderna, em 1922, ocorrida em São Paulo.

 Diferentemente do que vinha acontecendo no passado, os conceitos de tempo e


de desenvolvimento no tempo, que antes pareciam longos, lineares, contínuos,
foram reduzidos para ímpetos e fragmentos curtos, fugazes, múltiplos e
simultâneos.

 Neste período, houve a formação do que se denominou o grupo dos cinco. Estes
eram compostos pelas artistas plásticas Tarsila do Amaral (1886-1973) e Anita
Catarina Malfatti (1889-1964) e os poetas e escritores Oswald de Andrade (1890-
1954), Mário de Andrade (1893-1945) e Paulo Menotti del Picchia (1892-1988).
Eles defendiam a ideologia da Semana de Arte Moderna e tomaram a frente
deste movimento.

 Outros artistas também se destacaram, como o pintor e poeta Vicente do Rego


Monteiro (1899-1970), o escultor ítalo-brasileiro Victor Brecheret (1894-1955), a
pintora e desenhista Zina Aita (1900-1967), os artistas plásticos John Louis Graz
(1891-1980) e Ferrignac (1892-1958) entre outros.

 Passada a euforia e o escândalo que a Semana de Arte Moderna provocou, o


Modernismo começa a cristalizar-se em doutrinas estéticas como os movimentos
nacionalistas Pau-Brasil, Verdeamarelismo e Antropofagismo.

162
AUTOATIVIDADE

Tarsila do Amaral foi considerada como uma das pintoras de mais


representatividade da primeira fase do movimento modernista brasileiro.
Também pintou uma das obras mais valorizadas em um leilão, que foi
arrematada no valor de US$ 1,5 milhão de dólares, pelo colecionador argentino
Eduardo Costantini, em 1995. A obra intitulada “Abaporu”, de 1928, foi
presenteada ao escritor Oswaldo de Andrade, que também serviu de inspiração
para o movimento antropofágico, nas artes plásticas.

Tendo em vista a importância desta artista de grande repercussão no


período modernista brasileiro, desenvolva um texto sobre sua vida e obra.
Neste texto, analise a linha do tempo de sua produção artística e procure obras
que retratem fases distintas de sua vida. O site oficial da artista plástica Tarsila
do Amaral é: <http://www.tarsiladoamaral.com.br/index.htm#>.

Bom Trabalho!

Assista ao vídeo de
resolução desta questão
UNI

No decorrer dos anos 30 e 40, o Modernismo alçou voos, expandindo-se


também fora do eixo São Paulo e Rio de Janeiro, consagrando-se em outros Estados. Em
1932, na Bahia, o artista José Guimarães promoveu a primeira exposição de pintura moderna
de Salvador. Nos anos 40, ficariam famosos nomes como o do baiano Mário Cravo Júnior
e os dos pernambucanos Lula Cardoso Aires e Augusto Rodrigues. Em 1938, a revolução
artística chega ao Rio Grande do Sul, deflagrada por Carlos Scliar. Em Fortaleza, surgem, em
1941, Antônio Bandeira e Aldemir Martins. Em Minas, destacar-se-ão Lígia Clark e Mary Vieira.
(NOSSO SÉCULO, 1980, p. 272).

163
164
UNIDADE 3
TÓPICO 3

FORMAÇÃO DE GRUPOS ARTÍSTICOS PÓS


DÉCADA DE 1930

1 INTRODUÇÃO
Neste momento da história, a profunda crise mundial deflagrada pelo crash
da Bolsa de Nova York traz para o Brasil graves consequências. O café e a borracha
tiveram quedas de preços, houve o fechamento de muitas fábricas e indústrias,
juntamente com demissões em massa. Com todos estes acontecimentos e mais a
revolução de 1930, o país sofre profundas transformações políticas, econômicas e
sociais.

O movimento artístico inserido neste cenário conturbado altera-se


substancialmente. Se antes, nos idos anos 20, a arte assistiu à falência de vários
estilos entre eles o academicismo, a década de trinta consolida a revolução artística
iniciada pela Semana de Arte Moderna.

Os artistas que fomentavam a arte, antes quase que na sua totalidade


de classe burguesa, agora também abriam espaços para o proletariado. Estes,
geralmente imigrantes e descendentes de origem humilde, juntavam-se por
afinidades estéticas para discutir arte.

Dessa reunião de artistas, em algumas situações, originavam-se as


sociedades, clubes e grupos, que também abriam caminhos, promovendo
exposições e salões de arte e proferindo debates, divulgando suas ideias.

2 FORMAÇÃO DE SOCIEDADES, CLUBES E GRUPOS


Neste período da história acontece uma abertura maior ao acesso à Arte,
de maneira que ela passa de um núcleo nitidamente aristocrático, de formação
europeia e cosmopolita, a grupos formados por artistas vindos da classe operária,
muitos imigrantes e ou descendentes.

Ao longo dos anos, começou a proliferar a formação de sociedades, clubes


e grupos, cada qual com suas particularidades, que ajudaram a fomentar e a
divulgar cada vez mais a Arte no Brasil.

165
UNIDADE 3 | RUMO À CONSTRUÇÃO DE UMA IDENTIDADE NACIONAL

2.1 NÚCLEO BERNARDELLI

No Rio de Janeiro, criou-se o Núcleo Bernardelli, em 1931, tendo como


objetivo inicial a democratização (nas classes sociais) do ensino de arte na Escola
Nacional de Belas-Artes.

Vários artistas deste grupo se destacaram por desenvolverem uma pintura


realizada ao ar livre, com trabalhos que retratavam as paisagens e os subúrbios.

Algumas personalidades foram presidentes deste Núcleo como: Edson


Motta (1910-1981), Joaquim Tenreiro (1906-1992), Quirino Campofiorito (1902-
1993), José Pancetti (1904-1958) e Milton da Costa (1915-1988). Estes dois últimos
artistas têm suas obras ilustradas nas Figuras 120 e 121.

O Núcleo reunia jovens artistas de poucos recursos econômicos que


ali buscavam a orientação e o estímulo de colegas mais experientes,
como Bruno Lechowsky, Manuel da Assunção Santiago e Quirino
Campofiorito. A preocupação com a técnica, mais que com a vanguarda,
marcou a atuação desses jovens. (NOSSO SÉCULO, 1980, p. 275).

FIGURA 120 – PANCETTI. FIGURAS A BEIRA MAR, 1946. ÓLEO SOBRE


TELA, 33X41 CM

FONTE: Disponível em: <http://www.apm.org.br/fechado/ec_


picacoteca.aspx?idGaleria=159&>. Acesso em: 20 ago. 2008.

166
TÓPICO 3 | FORMAÇÃO DE GRUPOS ARTÍSTICOS PÓS DÉCADA DE 1930

FIGURA 121 – MILTON DA COSTA. RODA, 1942. ÓLEO SOBRE TELA.


COLEÇÃO GILBERTO CHATEAUBRIAND, MAM, RIO
DE JANEIRO, RJ

FONTE: Disponível em: <http://www.bndes.gov.br/cultura/espaco/


galeria_infancia.asp>. Acesso em: 20 ago. 2008.

Apareceram também a Sociedade Pró-Arte Moderna (SPAM) e o Clube dos


Artistas Modernos (CAM).

A Sociedade Pró-Arte Moderna (SPAM) foi um dos primeiros clubes,


surgido com a finalidade de manter e divulgar a vanguarda. Ela foi fundada
em 1932, por artistas intelectuais de classe média, tendo como integrantes Anita
Malfatti, Víctor Brecheret, Mário de Andrade, Sérgio Milliet, Tarsila do Amaral e
Lasar Segall. Estes dois últimos são representados por duas obras nas Figuras 122
e 123.

FIGURA 122 – TARSILA DO AMARAL. OPERÁRIOS, 1933. ÓLEO SOBRE


TELA, 150X205 M. ACERVO ARTÍSTICO-CULTURAL DOS
PALÁCIOS DO GOVERNO DO ESTADO, SÃO PAULO

FONTE: GRAÇA, Proença. Descobrindo a História da Arte. São Paulo:


Ática, 2006. p. 204.

167
UNIDADE 3 | RUMO À CONSTRUÇÃO DE UMA IDENTIDADE NACIONAL

FIGURA 123 – LASAR SEGALL. NAVIO DOS EMIGRANTES, 1939-


41. ÓLEO COM AREIA SOBRE TELA, 230X275 CM.
MUSEU LASAR SEGALL/IPHAN, SÃO PAULO, SP

FONTE: TIRAPELLI, Percival. Arte Brasileira: arte moderna e


contemporânea – Figuração, abstração e novos meios. São Paulo:
Cia Nacional, 2006. p. 64.

No ano seguinte de sua existência, eles promoveram sua primeira exposição


de Arte Moderna, apresentando obras de associados, juntamente com outros
nomes ilustres, como Picasso e Brancusi.

2.2 CLUBE DOS ARTISTAS MODERNOS


Outros clubes surgiram como Clube dos Artistas Modernos (CAM), 1932,
liderado por por Flávio de Carvalho (1899-1973) e com a participação de Carlos
Prado ((1908-1992), Antônio Gomide (1895-1967) – Figura 124 e Di Cavalcanti
(Figuras 125 e 126). “Este clube promoveu exposições pioneiras (como a de
desenhos feitos por doentes mentais), conferências (como a de Tarsila sobre “Arte
Proletária”), concertos e debates.” (NOSSO SÉCULO, 1980, p. 271).

FIGURA 124 – ANTÔNIO GOMIDE. PAISAGEM URBANA, 1930. ÓELO SOBRE TELA,
63.5X139 CM

FONTE: VIVEIROS, Ricardo. Da Arte do Brasil. São Paulo: Clemente e Gramani, 2006.
p. 38.

168
TÓPICO 3 | FORMAÇÃO DE GRUPOS ARTÍSTICOS PÓS DÉCADA DE 1930

Em 1937, essas iniciativas progressistas seriam retomadas em São Paulo,


com o surgimento dos grupos dos Salões de Maio e Santa Helena. O
primeiro foi organizado pelo pintor Quirino da Silva e pelo crítico
Geraldo Ferraz, com a colaborção de Flávio de Carvalho. Os Salões de
maio procuravam a sincronização de nossa arte com as vanguardas
internacionais. Do II Salão de Maio (1938) participaram, entre outros, Di
Cavalcanti, Alfredo Volpi, Lasar Segall, Brecheret e grandes nomes da
arte moderna internacional. (NOSSO SÉCULO, 1980, p. 271).

FIGURA 125 – DI CAVALCANTI. TRIO, 1937. ÓLEO SOBRE TELA,


91X71 CM

FONTE: VIVEIROS, Ricardo. Da Arte do Brasil. São Paulo:


Clemente e Gramani, 2006. p. 117.

FIGURA 126 – DI CAVALCANTI. FESTA NO SUBÚRBIO, 1938.


PASTEL SOBRE PAPEL, 41X27 CM

FONTE: VIVEIROS, Ricardo. Da Arte do Brasil. São Paulo:


Clemente e Gramani, 2006. p. 117.

169
UNIDADE 3 | RUMO À CONSTRUÇÃO DE UMA IDENTIDADE NACIONAL

UNI

No período de 1930 a 1940, aparecem novos valores, como a obras de Cândido


Portinari, que realizou várias exposições com sucesso, refletindo em sua obra “O povo e a
Terra” e na fase dos “Retirantes”, a miséria do povo do Nordeste. Desde 1940 e na primeira
Bienal de São Paulo (1951) vem aparecendo pintores novos expressionistas, tais como:
Pancetti, Iberê Camargo, Milton da Costa, Antônio Bandeira, Marcier, Inimá Paula, e o escultor
Mário Cravo, entre outros. (HARRES, 1979, p. 111).

2.3 GRUPO SANTA HELENA


O grupo mais importante desta época foi o Santa Helena, que surgiu em
meados da década de 1930, que se formou de maneira natural e espontânea tendo
como precursores Francisco Rebollo Ganzales (1902-1980) e pelo pintor Mário
Zanini (1907-1981).

Esta associação se iniciou quando Francisco Rebollo Gonsales, descendente


de espanhóis, alugou uma sala e o pintor Mário Zanini, logo depois, alugou outra.
Os espaços, que se situavam na praça da Sé, centro Paulista, logo passaram a ser o
ponto de reunião dos integrantes que compactuavam da mesma ideia.

Segundo depoimento de Francisco Rebolo Gonsales em que ele fala do


Grupo Santa Helena: “Éramos meia dúzia de amigos cujo traço comum era não
gostar dos acadêmicos e querer a pintura verdadeira, que não fosse anedótica ou
narrativa, a pintura pela pintura.” (NOSSO SÉCULO: 193 0-45, 1980, p. 271).

Também havia uma preocupação em retratar em suas telas temas nacionais


como o cotidiano e os problemas oriundos das desigualdades sociais conforme
obras de Rebolo, Figura 127 e de Zanini, Figura 128.

170
TÓPICO 3 | FORMAÇÃO DE GRUPOS ARTÍSTICOS PÓS DÉCADA DE 1930

FIGURA 127 – REBOLO GANSALES. LAVADEIRAS, 1937. ÓLEO


SOBRE MADEIRA, 35X39 CM. COLEÇÃO
PARTICULAR

FONTE: TIRAPELI, Percival. Arte Brasileira – Arte Moderna e


Contemporânea: figuração, abstração e novos meios. São Paulo:
Nacional, 2008. p. 27.

FIGURA 128 – MÁRIO ZANINI. MENINO COM CABRAS, S/D.


ÓLEO SOBRE EUCATEX, 28X33 CM

FONTE: Disponível em: <http://www.pinturabrasileira.com/obras_


det.asp?in=&a=’’&al=&la=&tema=’’&tec=&ano=&cod=1302>.
Acesso em: 20 ago. 2008.

UNI

Moderno é o nome de um movimento com características particulares que


nasce na Europa, com variados desdobramentos por quase todos os países do Ocidente, e
que entrou em crise a partir da década de 1950. A partir daí, foi sendo substituído por um
conjunto de manifestações que, cada qual dotada de peculiaridades, foram, na falta de um
nome melhor, reunidas sob a etiqueta simples e genérica de arte contemporânea. (FARIAS,
2002, p. 13).

171
UNIDADE 3 | RUMO À CONSTRUÇÃO DE UMA IDENTIDADE NACIONAL

LEITURA COMPLEMENTAR

MODERNISMO NO BRASIL

Inaldo Antônio Prati

O Brasil passava por profundas modificações sociais, políticas e econômicas


no início do século. Entretanto, no terreno artístico não caminhava com a mesma
velocidade. Ainda eram admirados os pintores ligados ao século passado e o
parnasianismo de Olavo Bilac e Coelho Neto, indiferentes às rupturas que a Europa
e os Estados Unidos por essa época imprimiam à arte. Por outro lado, havia um
grande número de jovens artistas em contato com as mudanças que a arte estrangeira
sofria e paralelamente, influenciados pelo nacionalismo, já presente na nossa arte
desde o final do século anterior (com os temas mais associados ao Romantismo).

A primeira mostra de arte não acadêmica realizada no Brasil foi feita por um
estrangeiro, Lasar Segall, em 1913, nas cidades de São Paulo e Campinas. Entretanto,
apesar do pioneirismo de Segall, suas exposições não causaram grande repercussão,
provavelmente por ter sido muito prematura para a arte brasileira. A exposição
de Anita Malfatti parece ter sido o estopim para a reunião desses artistas ansiosos
por mudanças. Posteriormente, o encontro de alguns dos principais futuros líderes
Modernistas com a arte de Brecheret, recém voltado da Europa, também teve grande
importância no surgimento da chama Modernista.

Em 1922, possivelmente através de uma sugestão de Di Cavalcanti, a Semana


de Arte Moderna seria realizada, marco do Modernismo brasileiro. Reunindo
diversas atividades como leituras de poemas, espetáculos de dança e exposição
de artes plásticas o evento iria sacudir São Paulo dos anos 20. Buscava que a arte
brasileira estivesse tão atualizada quanto a internacional, nada devendo àquela em
qualidade e, ao mesmo tempo, conservasse as características nacionais. Mesmo não
tendo a repercussão que posteriormente foi atribuída a ela, o evento foi bastante
significativo por reunir artistas talentosos ansiosos por renovações.

Logo após sua realização, importantes artistas que dela participaram


partiam para a Europa, enquanto outros nomes fundamentais dessa fase de nosso
modernismo chegavam do continente. É o caso de Lasar Segall, que vinha fixar-se no
Brasil, trazendo grandes contribuições e de Tarsila do Amaral, uma das pioneiras em
concretizar os ideais da Semana de Arte Moderna, aliando a brasilidade a elementos
das vanguardas europeias.

A partir de 1924, começam a surgir as divisões do Movimento Modernista,


principalmente a partir do pau-brasil (Oswald de Andrade, Tarsila do Amaral,
entre alguns membros) e do verde-amarelo (Menotti del Picchia e Plínio Salgado,
como alguns dos representantes). A valorização do caráter nacional era importante
para as duas correntes, entretanto o pau-brasil não abria mão da atualização da
arte brasileira, tomando como parâmetro as produções internacionais, enquanto o
172
TÓPICO 3 | FORMAÇÃO DE GRUPOS ARTÍSTICOS PÓS DÉCADA DE 1930

verde-amarelo era mais apegado às tradições e cauteloso em relação aos movimentos


vanguardistas estrangeiros. Divergências políticas, ideológicas e sociais profundas
acabariam por afastar cada vez mais essas duas correntes do modernismo brasileiro.

A Antropofagia, inspirada no quadro Abaporu de Tarsila do Amaral e


liderada por Oswald de Andrade e Raul Bopp – com seus objetivos de rompimento
com a arte e a história anteriores ao movimento e seu objetivo de “devorar" as
culturas estrangeiras, assimilando delas o que fosse considerado importante pelo
grupo brasileiro – e o Grupo da Anta – reafirmando a cultura brasileira, afastando-
se das influências estrangeiras e posteriormente desdobrando-se no Integralismo
– acabariam por polarizar ainda mais a discussão modernista brasileira.

À década de 30 coube sedimentar e oficializar as conquistas modernistas.


Movimentos artísticos europeus, principalmente o Expressionismo e o Cubismo
inspiravam então artistas como Cândido Portinari, Guignard e Bruno Giorgi.
Dois outros importantes nomes dessa fase modernista como Ismael Nery e Cícero
Dias (Cícero principalmente em suas primeiras obras) eram mais pautados pelo
Surrealismo. O poder público passa a apoiar o Modernismo e se São Paulo tinha
sido o principal foco difusor dos primeiros tempos do Modernismo, agora caberia
ao Rio de Janeiro esse papel.

A passagem de Le Corbusier e Frank Lloyd Wright pelo Brasil (1929 e


1931) chama a atenção dos artistas para as possibilidades da integração das artes,
renovando a arquitetura brasileira, nela incluindo a nova pintura, escultura,
paisagismo e decoração. A temática social passaria ser grande fonte de inspiração
para a geração Modernista dessa década e a técnica, que tinha assumido uma posição
secundária durante os anos 20, volta a ser valorizada.

Surgiam importantes focos como o Núcleo Bernardelli (1931-1940) no Rio


de Janeiro, preocupado em democratizar o ensino de artes plásticas e apontando
para um Modernismo moderado. Em São Paulo surgiria a Sociedade Pró- Arte
Moderna (SPAM), em 1932, reunindo artistas e promovendo uma série de atividades
divulgando seus trabalhos. Ainda em São Paulo surgiria o Clube dos Artistas
Modernos (CAM), dissidência da SPAM, bastante ativo e irreverente, próximo ao
espírito das primeiras épocas modernistas. Em 1934 dissolve-se a SPAM e o CAM e
após um período relativamente morno de três anos surgem dois diferentes grupos:
O Salão de Maio e a Família Artística Paulista.

A Família Artística Paulista, que vinha de reuniões no atelier do Santa


Helena, marca uma grande diferenciação no Modernismo brasileiro: ao invés dos
intelectuais que lideravam suas primeiras manifestações, esse grupo reunia artistas
de origem proletária, que costumavam exercer profissões artesanais e com forte
tradição italiana (devido à imigração intensa em São Paulo no período), cultivando
temas mais intimistas e cotidianos.

173
UNIDADE 3 | RUMO À CONSTRUÇÃO DE UMA IDENTIDADE NACIONAL

Enquanto o Salão de Maio buscava ainda a sincronia com movimentos


artísticos estrangeiros contemporâneos e desprezava a valorização técnica da
Família Artística Paulista, este último procurava repensar o modernismo desde
1922, separando os legados benéficos daquilo considerado radical. Encerra suas
atividades em 1940. O Modernismo até então, salvo alguns esforços de artistas
isolados, permanecia restrito ao eixo Rio-São Paulo. Em 1944, uma exposição
modernista em Minas Gerais, patrocinada pela prefeitura da capital do estado na
gestão de Juscelino Kubitschek, marcaria o início do Modernismo nesse estado.

Minas Gerais então passaria a ser extremamente importante para o


movimento no período, produzindo grandes artistas. 1944 também marcou o início
do Modernismo baiano, seguido pelo Paraná e Recife (este último em 1948). O
Ceará já desde 1941 abrigava manifestações Modernistas. Entretanto, é importante
lembrar que o Modernismo brasileiro surgiu com a intenção de ser um movimento
de vanguarda, numa época em que na Europa estava havendo um refluxo e uma
tendência contrária, a de volta à ordem.

Enquanto a Europa procurava romper com o peso da arte passada e o


abstracionismo era extremamente valorizado, no Brasil o Modernismo assumia
mais a função de promover uma atualização da arte brasileira capaz de ajudar
na consolidação da identidade nacional e não abria mão do figurativismo. As
vanguardas europeias tinham caráter universal , enquanto o Modernismo brasileiro
buscava expressar as particularidades nacionais, assimilando para isso aquilo que
lhe interessava nas propostas de arte Moderna que chegavam do velho continente.

A partir principalmente de meados da década de 40 e o pós-guerra uma


arte não figurativa começa a ser praticada e valorizada por artistas brasileiros.
Principalmente na década de 50 o abstracionismo surge como forte expressão
modernista. Inspirados no neoplasticismo, construtivismo, na Bauhaus e no artista
americano Max Bill começam as primeiras manifestações do Movimento Concreto
em São Paulo e no Rio de Janeiro.

O abstracionismo calculado matematicamente, o antirromantismo, a


integração das artes e o racionalismo eram valorizados pelos concretistas. Em São
Paulo surge o grupo Ruptura, liderado por Waldemar Cordeiro, mais ortodoxos e
contrário à subjetividade. No Rio de Janeiro, em torno de Ivan Serpa, surge o Grupo
Frente, menos homogêneo que o paulista e mais baseado na liberdade de criação.

A I Exposição Nacional de Arte Concreta intensifica as divergências entre os


grupos das duas cidades. Surge então o neoconcretismo, originado principalmente
a partir do grupo carioca, contrário à rigidez concretista dos paulistas e mais
preocupado com a expressão. A experimentação passa a ser de extremo valor para
os neoconcretos. Destacam-se os neoconcretos Lygia Clark e Hélio Oiticica como
artistas de grande contribuição para a discussão do papel da arte e do artista,
permanecendo como importantes figuras de vanguarda nacional, mesmo após a
dissolução do movimento.

174
TÓPICO 3 | FORMAÇÃO DE GRUPOS ARTÍSTICOS PÓS DÉCADA DE 1930

Um abstracionismo mais lírico também marcou presença na década de 50,


bem como a influência do expressionismo abstrato norte-americano. Manabu Mabe
foi um dos artistas nipo-brasileiros mais receptivos à essas tendências. Os anos
60 marcam o fim do Modernismo Brasileiro, sendo extremamente diversificada a
produção artística no país nas décadas seguintes.

FONTE: PRATI, Inaldo Antônio. Diponível em: <http://www.coladaweb.com/artes/modernismobr.


htm>. Acesso em: 20 ago. 2008.

175
RESUMO DO TÓPICO 3
Neste tópico você viu que:

Se antes, nos idos anos 20, a arte assistiu à falência de vários estilos entre eles

o academicismo, a década de 30 consolida a revolução artística iniciada pela


Semana de Arte Moderna.

Neste período da história acontece uma abertura maior ao acesso a arte onde

ela passa de um núcleo nitidamente aristocrático, de formação europeia e


cosmopolita, a grupos formados por artistas vindos da classe operária, muitos
imigrantes e ou descendentes.

Estes artistas se juntavam por afinidades estéticas para discutir arte e é desses

encontros que surgiram as sociedades, clubes e grupos como: Núcleo Bernardelli,


em 1931, Clube dos Artistas Modernos, em 1932, e o mais importante o Grupo
Santa Helena, meados da década de 1930.

176
AUTOATIVIDADE

Faça uma leitura atenta do texto de Inaldo Antônio Prati intitulado “O


Modernismo no Brasil”, e desenvolva um paper a partir deste frase, do autor
supra citado:

“Enquanto a Europa procurava romper com o peso da arte passada


e o abstracionismo era extremamente valorizado, no Brasil o Modernismo
assumia mais a função de promover uma atualização da arte brasileira
capaz de ajudar na consolidação da identidade nacional e não abria mão do
figurativismo.”

Como sugestão, inicialmente, leia o Caderno de Estudos e procure


mais algumas matérias relacionadas ao tema escolhido, incluindo os textos
disponibilizados em jornais, revistas, livros e em artigos da internet, não se
esquecendo de anotar a referência completa de cada um deles e, se estiver
pensando em fazer citações, marcar inclusive as páginas de onde você está
extraindo as frases ou as ideias. Depois comece a esboçar um rascunho do
trabalho, sem se preocupar muito com a parte gráfica. Preocupe-se com a
introdução, o desenvolvimento e com a conclusão.

Bom Trabalho!

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178
UNIDADE 3
TÓPICO 4

MOVIMENTOS ARTÍSTICOS: MODERNISMO E


PÓS-MODERNISMO

1 INTRODUÇÃO

O movimento modernista nasceu na Europa e se difundiu no Brasil no início


do século XX. Tomou corpo com a Semana de Arte Moderna, em 1922, ocasião em
que vários artistas, de várias áreas – plástica, literária e arquitetura – desenvolveram
seus trabalhos, divulgando uma nova estética como a expressionista, a cubista, a
naturalista, etc.

Ao longo dos anos começaram a proliferar vários movimentos, como o


Pau-Brasil, o Verde Amarelismo, o Antropofagismo. Cada um deles possuía suas
particularidades e ajudou a fomentar e a divulgar cada vez mais a arte no Brasil.

Também apareceram sociedades, clubes, grupos e agremiações, que se


formavam por afinidades estéticas e ideológicas para produzir e discutir arte.

Nesta profusão de acontecimentos, várias estéticas brotam, muitas vezes


ao mesmo tempo, porém, desenvolvidas por artistas distintos. Estes profissionais,
muitas vezes, não se ativeram a uma única forma de expressão e experimentaram
vários movimentos ao longo de sua carreira.

Além dos movimentos já citados anteriormente, a exemplo do


expressionismo desenvolvido inicialmente por Lasar Segall, o cubismo praticado
também por Tarsila do Amaral em uma de suas fases de criação, a pintura
nacionalista, difundida por Di Cavalcanti dentre outros, a futurista impressa em
algumas obras de Anita Malfatti, surgiram, no cenário nacional, outros tipos de
manifestações.

O pós-modernismo, comumente chamado de arte contemporânea, é um


produto da sociedade pós-industrial. Ele propõe algo de novo na pesquisa de
formas, diferente do que já se propunha no modernismo. Ele busca outros caminhos
de produções artísticas, valendo-se de materiais diferenciados para elaborar suas
composições, tendo como referência a entropia.

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UNIDADE 3 | RUMO À CONSTRUÇÃO DE UMA IDENTIDADE NACIONAL

2 MODERNISMO
Além dos movimentos já citados, podemos abordar algumas outras
correntes estéticas que foram importantes no cenário da arte brasileira, como o
abstracionismo, o concretismo, o neoconcretismo, os Tachistas, o novo realismo, o
surrealismo, a pintura ingênua, os primitivos, dentre outros movimentos.

2.1 ABSTRACIONISMO

O crítico francês Leon Degand (1907-1958) organizou a primeira exposição


inaugural no Museu de Arte Moderna de São Paulo (MASP) intitulada “Do
Figurativismo ao Abstracionismo”, em 1949. Este evento, juntamente com a mostra
do designer gráfico e de produto, arquiteto, pintor, escultor Max Bill (1908-1994), em
1950, no mesmo museu e a 1ª bienal realizada em 1951, ajudaram na divulgação da
arte abstracionista, fazendo surgir vários artistas que se utilizavam desta estética
em seus trabalhos.

A pintura abstracionista tem como características a fuga à realidade


objetiva. O artista, em suas obras, não representa as formas realisticamente, mas,
sim, do mundo subjetivo. Eles se expressam representando imagens que podem
parecer dramáticas ou sensíveis, dependendo da forma e da intensidade do uso da
cor. Estas formas podem ser classificadas como formais, quando são figuras mais
geométricas, ou informais, quando as imagens são mais livres.

Alguns artistas se expressaram utilizando os conceitos abstracionistas, a


exemplo de Waldemar Cordeiro (1925-1973), Geraldo de Barros, Alfredo Volpi
(1896-1988), Iberê Camargo (1914-1994), Flávio Siró (1928), Loio Pérsio (1927-2004),
Mário Cravo (1923).

As obras mostradas nas Figuras 129 e 130, de Alfredo Volpi, sinalizam


uma forma geométrica abstracionista. Este, a partir de elementos muito simples da
realidade, compunha imagens coloridas bastante agradáveis visualmente.

Na verdade, o que importa para o artista é trabalhar com as cores.


Veja como ele cria com elas uma combinação interessante e como as
linhas do desenho dão à pintura uma impressão de textura – a ilusão
de que, se passarmos a mão sobre sua superfície, sentiremos saliências
e reentrâncias. (PROENÇA, 2006, p. 209).

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TÓPICO 4 | MOVIMENTOS ARTÍSTICOS: MODERNISMO E PÓS-MODERNISMO

FIGURA 129 – VOLPI. FACHADA COM BANDEIRINHAS, 1950


(DETALHE). DIMENSÕES: 73X1,16 CM. COLEÇÃO
PARTICULAR

FONTE: PROENÇA, Graça. Descobrindo a História da Arte. São


Paulo: Ática, 2006. p. 209.

FIGURA 130 – VOLPI. BANDEIRAS E MASTROS, 1950 (DETALHE).


DIMENSÕES 72,2X1,47 CM. COLEÇÃO PARTICULAR

FONTE: PROENÇA, Graça. Descobrindo a História da Arte. São


Paulo: Ática, 2006. p. 209.

Embora Iberê Camargo, ao longo de sua carreira, tenha trabalhado em


seus estudos com figuras de representações e de correntes estéticas variadas, há
exemplo das formas abstratas mais livres, expostos nas Figuras 131 e 132, não é
correto afirmar que ele tenha se filiado a alguma corrente ou movimento, assim
como aconteceu com muitos artistas.

FIGURA 131 – IBERÊ CAMARGO. ASCENSÃO, 1973. ÓLEO


SOBRE TELA, 57X40 CM

FONTE: VIVEIROS, Ricardo. Da Arte do Brasil. São Paulo:


Clemente & Gramani, 2006. p. 82.

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UNIDADE 3 | RUMO À CONSTRUÇÃO DE UMA IDENTIDADE NACIONAL

FIGURA 132 ­– IBERÊ CAMARGO. ANDAMENTO I, 1973. ÓLEO SOBRE TELA,


130X184 CM

FONTE: VIVEIROS, Ricardo. Da Arte do Brasil. São Paulo: Clemente &


Gramani, 2006. p. 82.

2.2 CONCRETISMO
Os primeiros concretistas que apareceram em São Paulo mostrando suas
experiências por volta de 1954 procuraram associar a arte abstrata geométrica à
tecnologia e ao desenho industrial.

Alguns artistas foram precursores, como Waldemar Cordeiro, Ivan Serpa


(1923-1973), Lígia Clark (1920), Hermelindo Fiaminghi (1920), Lígia Pape (1929),
Hélio Oiticica (1937-1980) e Luiz Sacilotto (1924-2003). A seguir, são apresentadas,
nas Figuras 133 e 134, obras de Cordeiro e Sacilotto.

FIGURA 133 – WALDEMAR CORDEIRO. IDÉIA INVISÍVEL, 1955. TINTA


E MASSA SOBRE AGLOMERADO, 60X61 CM

FONTE: GARCEZ, Lucília; OLIVEIRA, Jô. Explicando a Arte Brasileira.


Rio de Janeiro: Ediouro, 2006. p. 136

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TÓPICO 4 | MOVIMENTOS ARTÍSTICOS: MODERNISMO E PÓS-MODERNISMO

FIGURA 134 – LUIZ SACILOTTO. CONCREÇÃO, 1952. ÓLEO SOBRE


TELA, 50X70 CM.COLEÇÃO RICARDO AKAGAWA, SÃO
PAULO

FONTE: Disponível em: <http://www.lehman.cuny.edu/ciberletras/v17/


cluver.htm>. Acesso em: 20 ago. 2008.

2.3 NEOCONCRETISMO
O neoconcretismo surgiu como uma forma de reação aos conceitos dos
concretistas. Eles abriram novos caminhos dentro do nacionalismo, dentro de uma
nova expressividade e enfatizavam que “a arte não é um mero objeto, isto é, é mais
que um objeto, tem sensibilidade expressiva, além do mero geometrismo puro.
(HARRES, 1979, p. 122).

Os precursores deste movimento foram os artistas Lígia Clark e Hélio


Oiticica. Outros se destacaram como Ubi Bava (1915-1988), Aluísio Carvão (1920-
2001), Almicar de Castro (1920-2002), Arcanjo Ianelli (1920-2001), Hércules Barsotti
(1914).

Lygia Clark, como mostra a Figura 135, desenvolve uma arte como
interatividade e participação, em que os planos articulados possibilitam diversos
arranjos. E Hélio Oiticica, com seus “Parangolés” (Figura 136), antecipa, em alguns
aspectos, o que hoje viria a ser chamado de “instalação”.” (GARCEZ; OLIVEIRA,
2006, p. 137).

FIGURA 135 – LYGIA CLARK. BICHO, 1961. AÇO, 31X21 CM.


COLEÇÃO GILBERTO CHATEAUBRIAND

FONTE: GARCEZ, Lucília; OLIVEIRA, Jô. Explicando a Arte


Brasileira. Rio de Janeiro: Ediouro, 2006. p. 137-138.

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UNIDADE 3 | RUMO À CONSTRUÇÃO DE UMA IDENTIDADE NACIONAL

FIGURA 136 – HÉLIO OITICICA. PARANGOLÉS, 1964. TÉCNICA MISTA

FONTE: GARCEZ, Lucília; OLIVEIRA, Jô. Explicando a Arte Brasileira. Rio


de Janeiro: Ediouro, 2006. p. 137-138.

2.4 TACHISTAS

Já o movimento tachista procurou romper com o paradígma do extremo


geométrico dos artistas concretos e dos neoconcretos.

Menos que um movimento pictórico com traços facilmente


reconhecíveis, o tachismo remete a uma tendência artística que finca
raízes na Europa no período após a Segunda  Guerra Mundial (1939-
1945). O termo – que vem de tache, mancha em francês - foi criado pelo
crítico Michel Tapié (1909-1987) no livro Un art autre [Uma arte outra]
para tentar definir o novo estilo de pintura que recusa qualquer tipo
de formalização, rompendo com as técnicas e modelos anteriores. Arte
informal (no sentido de “sem forma”) é outra designação corrente para
o tachismo, vez por outra também associado à noção de abstração lírica.
(ENCICLOPÉDIA ITAÚ CULTURAL – TACHISMO, 2005).

Alguns pintores participaram deste movimento aplicando a estética deste


movimento em suas obras. Entre estes, poder-se-ia citar Manabu Mabe (1924-1997),
Tomie Othake (1913), cujas obras são mostradas nas Figuras 137 e 138, Flávio Shiró
(1928), Iberê Camargo, Danilo di Prete (1911-1984), Tikashi Fukushima (1920),
Emanoel Araújo (1940), Wega Neri (1912-2007), Antônio Bandeira (1922-1967),
entre outros.

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TÓPICO 4 | MOVIMENTOS ARTÍSTICOS: MODERNISMO E PÓS-MODERNISMO

FIGURA 137 – MANABU MABE. SEM TÍTULO, 1965. ÓLEO SOBRE TELA,
150X150 CM. ACERVO BANCO CHAASE-MANHATTAN

FONTE: Disponível em: <http://www.galerianobrega.com.br/>.


Acesso em: 20 ago. 2008.

FIGURA 138 – TOMIE OTHAKE. SEM TÍTULO, 1959. ÓLEO


SOBRE TELA, 100X70 CM

FONTE: GARCEZ, Lucília; OLIVEIRA, Jô. Explicando a Arte


Brasileira. Rio de Janeiro: Ediouro, 2006. p. 138.

UNI

É importante salientar que muitos artistas não se filiaram ou se fixaram a uma


única corrente ou movimento estético. Diversos profissionais percorrendo, ao longo de suas
trajetórias artísticas, por várias experiências estéticas.

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UNIDADE 3 | RUMO À CONSTRUÇÃO DE UMA IDENTIDADE NACIONAL

2.5 NOVO REALISMO


O Novo Realismo apareceu numa posição contra a abstração. Sua
característica principal era a retomada das formas figurativas, retratando fatos e
momentos históricos do regionalismo local.

É neste período que Cândido Portinari pinta telas históricas (entre 1947
e 1954), como a de “Tiradentes”, a “Chegada de D. João VI ao Brasil” e
a “A Primeira Missa no Brasil”. Outro nome, que pintou mulatas, tendo
como fundo das telas paisagens do Rio de Janeiro, foi Di Cavalcanti.
(HARRES, 1979, p. 129).

Outros artistas difundiram este movimento como Emiliano Augusto Di


Cavalcanti, Vicente do Rego Monteiro (1899-1970), Mário Gruber (1927), Marcello
Grassmann (1925), Aldemir Martins (1922-2006), Cândido Portinari (1903-1962),
Renina Katz (1925), Lívio Abramo (1903-1992), estes três últimos artistas com obras
expostas nas Figuras 139, 140 e 141.

FIGURA 139 – CÂNDIDO PORTINARI. A PRIMEIRA MISSA NO BRASIL, 1948.

FONTE: HARRES, Hilda Höber. História da Arte Brasileira: Da pré-história à 1ª bienal e arte de
vanguarda. Porto Alegre: Sagra, 1979. p. 130.

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TÓPICO 4 | MOVIMENTOS ARTÍSTICOS: MODERNISMO E PÓS-MODERNISMO

FIGURA 140 – RENINA KATZ. RETIRANTES, 1948-56. GRAVURA SOBRE PAPEL,


41,1X31,8 CM

FONTE: GARCEZ, Lucília; OLIVEIRA, Jô. Explicando a Arte Brasileira. Rio de


Janeiro: Ediouro, 2006. p. 135.

FIGURA 141 – LÍVIO ABRAMO. OS OPERÁRIOS, 1935. GRAVURA SOBRE


PAPEL

FONTE: HARRES, Hilda Höber. História da Arte Brasileira: Da pré-história a


1ª bienal e arte de vanguarda. Porto Alegre: Sagra, 1979. p. 131.

2.6 O SURREALISMO
O Surrealismo é uma pintura fantasiosa que busca sua temática no
inconsciente, nos sonhos, nos delírios. É a representação da realidade fora da
lógica, descompromissada com o real. Influenciado pelas teorias psicanalíticas de
Sigmund Freud, enfatiza a relevância do inconsciente no processo criativo.

Ismael Nery (1900-1934), como obra na Figura 142, foi um dos mais
representativos pintores ligado ao surrealismo no Brasil. Podemos citar outros
artistas que se valeram de elementos do surrealismo para desenvolver seus
trabalhos, como Tarsila do Amaral, Cícero Dias, a escultora Maria Martins, entre
outros. É importante lembrar que o surrealismo influenciou muitos escritores
brasileiros, como Aníbal Machado e Mário Pedrosa.
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UNIDADE 3 | RUMO À CONSTRUÇÃO DE UMA IDENTIDADE NACIONAL

FIGURA 142 – ISMAEL NERY- FIGURA SURREALISTA COM


PERSONAGEM MASCULINO DEITADO, SD  NANQUIM
E GRAFITE S/ PAPEL, 21,7 X 16,2 CM (ACERVO
DO MUSEU DE ARTE CONTEMPORÂNEA DA
UNIVERSIDADE DE SÃO PAULO)

FONTE: Disponível em: <http://www.mac.usp.br/mac/templates/


projetos/seculoxx/modulo2/modernismo/artistas/nery/obras.htm>.
Acesso em: 20 mar. 2012.

FIGURA 143 - MARIA MARTINS - O IMPOSSÍVEL LLL (1946) ACERVO


DO MUSEU DE ARTE MODERNA DE NOVA YORK

FONTE: Disponível em: <http://editora.cosacnaify.com.br/


blog/?tag=maria-martins>. Acesso em: 20 mar. 2012.

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TÓPICO 4 | MOVIMENTOS ARTÍSTICOS: MODERNISMO E PÓS-MODERNISMO

2.7 PINTURA INGÊNUA E PRIMITIVA


Segundo Beuttenmüller (2002, p. 71), há uma diferença entre arte ingênua
e arte primitiva. A primeira, considerada ingênua, é desenvolvida por um artista
que, ao longo do tempo, teve um estudo sobre as técnicas aplicadas nas artes
plásticas, porém, prefere abordar o tema ingênuo. Já a segunda, a arte primitiva, é
desenvolvida por um artista que é considerado autodidata.

O autor Beuttenmüller (2002, p. 71) ainda menciona que o pintor primitivo


gosta de temas rurais, paisagens do campo, boiadas, além de temas folclóricos,
como bumba meu boi, etc. O pintor ingênuo gosta de pintar paisagens que existem
apenas na sua imaginação. É lírico e pinta um mundo cheio de paz e harmonia,
cheio de flores, um mundo utópico.

Uma artista considerada ingênua é a Djanira da Mota e Silva (1914-1979).


Suas obras, uma delas representada na Figura 144, apresenta personagens variados
como negros, índios, mulatos, operários, mineiros, pescadores, santos católicos e
orixás africanos.

FIGURA 144 – DJANIRA DA MOTA E SILVA. O CIRCO, 1955. GUACHE SOBRE


PAPEL, 33X47 CM

FONTE: GARCEZ, Lucília; OLIVEIRA, Jô. Explicando a Arte Brasileira. Rio de


Janeiro: Ediouro, 2006. p. 124.

Um artista primitivo é Antônio Batista de Souza – Antonio Poteiro nasceu


em Santa Cristina da Pousa, Província do Minho/Portugal, 10 de outubro de 1925.
É escultor, pintor e ceramista autodidata. Chegou ao Brasil ainda criança e, depois
de morar em diversos estados, radicou-se em Goiânia.

FONTE: Disponível em: <http://www.pinturabrasileira.com/artistas_bio.asp?cod=113&in=1>.


Acesso em: 20 mar. 2012.

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UNIDADE 3 | RUMO À CONSTRUÇÃO DE UMA IDENTIDADE NACIONAL

Leitor das Sagradas Escrituras, suas obras registram diversas passagens


bíblicas, cenas dos lugares onde vive e sente: a natureza, as pessoas, o cotidiano,
deixando em sua obra certo sentido político. Marcado pela simplicidade, seus traços
primitivos nasceram primeiramente na cerâmica, posteriormente na pintura, que
realiza diretamente sobre a tela, sem esboços.

2.8 POP ART


A Pop Art surgiu na Inglaterra, na década de 50, e se difundiu nos Estados
Unidos, no início dos anos 60. Também considerada modernista, ela se constitui
basicamente como sendo uma arte de protesto e zombaria do cotidiano e da
sociedade de consumo.

Little (2006, p. 131) aborda que a Pop Art, devido ao seu interesse nos mass
media, marketing e publicidade, pode também ser considerada como uma forma
precoce de expressão Pós-Modernista.

Seguindo a linha de pensamento de Little (2006, p. 131), ela também


explora o culto da celebridade e o modo como um indivíduo pode ser consumido,
ou ser deixado para trás, pela sua própria imagem. A perda de um original e a
sua substituição por cópias é uma preocupação central na arte pós-modernista, da
qual o Pop foi um precursor.

Através da utilização de materiais como tinta acrílica, látex, poliéster e


fazendo composições com objetos do dia a dia como fotos, ilustrações, garrafas,
latas etc, os artistas deste movimeno desenvolveram seus trabalhos, geralmente
muito coloridos.

Representavam, assim, os componentes mais ostensivos da cultura


popular, de poderosa influência na vida cotidiana na segunda metade
do século XX. Era a volta a uma arte figurativa, em oposição ao
Expressionismo abstrato que dominava a cena estética desde o final da
segunda guerra. Sua iconografia era a da televisão, da fotografia, dos
quadrinhos, do cinema e da publicidade. (HISTÓRIA DA ARTE – POP
ART). 

Pela sua característica inusitada de apresentar objetos do cotidiano em


tamanho real ou em grandes dimensões, transformando o real em hiper-real,
causou grande impacto sobre o público, na época.

Um ícone da arte pop é o americano Andy Wharol (1927-1987). No Brasil,


dentre outros, podemos citar alguns representantes desta estética como Arthur
Bispo do Rosário (1909-1989) Marcelo Nitsche, Antônio Henrique do Amaral e
Humberto Espíndola.

Arthur Bispo do Rosário, diagnosticado “esquizofrênico, foi um artista


controverso, em seu tempo, na história das artes plásticas brasileira. Desenvolveu
obras tendo como suporte de criação objetos descartados pela sociedade, conforme

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TÓPICO 4 | MOVIMENTOS ARTÍSTICOS: MODERNISMO E PÓS-MODERNISMO

mostram as Figuras 145 e 146. “O procedimento criar a partir do refugo foi comparado
a procedimentos das vanguardas do século XX, caso do francês Marcel Duchamp e
seus famosos ready-mades.” (COUTINHO, 2008, p. 12).

FIGURA 145 – ANTONIO POTEIRO- NOSSA SENHORA - CERÂMICA

FONTE: Disponível em: <http://artepopularbrasil.blogspot.com/2011/01/


antonio-poteiro.html>. Acesso em: 20 mar. 2012.

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UNIDADE 3 | RUMO À CONSTRUÇÃO DE UMA IDENTIDADE NACIONAL

FIGURA 146 – ARTHUR BISPO DO ROSÁRIO. OBRA MULTIFACETADA,


SEM DATA. MONTAGEM COM DIVERSOS MATERIAIS EM
SUPORTE DE MADEIRA E PAPELÃO. MUSEUS BISPO
DO ROSÁRIO, RJ

FONTE: Disponível em: <http://diariodonordeste.globo.com/


materia.asp?codigo=535643>. Acesso em: 20 ago. 2008.

UNI

Moderno é o nome de um movimento com características particulares, que


nasce na Europa, com variados desdobramentos por quase todos os países do Ocidente, e
que entrou em crise a partir da década de 1950. A partir daí, foi sendo substituído por um
conjunto de manifestações que, cada qual dotada de peculiaridades, foram, na falta de um
nome melhor, reunidas sob a etiqueta simples e genérica de arte contemporânea. (FARIAS,
2002, p. 13).

192
TÓPICO 4 | MOVIMENTOS ARTÍSTICOS: MODERNISMO E PÓS-MODERNISMO

3 PÓS-MODERNISMO

O pós-modernsimo é um produto da sociedade pós-industrial. Este


movimento se desenvolveu a partir das críticas ao modernismo. Sua estética assume
diferenças importantes se comparadas ao que se vinha produzindo anteriormente,
incluindo as estéticas modernistas.

Poder-se-ia dizer que os próprios critérios-chave da estética moderna, do


novo, da ruptura e da vanguarda são desconsiderados pelo Pós-Moderno. Já não
é preciso inovar nem ser original, e a repetição de formas passadas é não apenas
tolerada como encorajada.

Segundo Little (2006, p. 231), diferentemente do modernismo, o pós-


modernismo dá pouca (ou nenhuma) importância ao inconsciente como fonte
da autenticidade criativa e pessoal. Little também expõe que os pós-modernistas
valorizam a arte, não pela sua universalidade e intemporalidade, mas por ser
imperfeita, pouco culta, acessível, disponível, local e temporária.

Duas obras do pós-modernismo desenvolvidas pelos artistas Cacildo


Meirelles (Figura 147) e Miguel Rio Branco (1946) – Figura 148.

FIGURA 147 – CILDO MEIRELLES. ZERO CRUZEIRO, 1974-78. LITO OFFSET


SOBRE PAPEL, 6,5X15,5 CM

FONTE: GARCEZ, Lucília; OLIVEIRA, Jô. Explicando a Arte Brasileira. Rio de


Janeiro: Ediouro, 2006. p. 148-150.

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UNIDADE 3 | RUMO À CONSTRUÇÃO DE UMA IDENTIDADE NACIONAL

FIGURA 148 – MIGUEL RIO BRANCO. SEM TÍTULO, SEM DATA,


FOTOGRAFIA EM CORES SOBRE PAPEL, 24,1X35,6
CM

FONTE: GARCEZ, Lucília; OLIVEIRA, Jô. Explicando a Arte


Brasileira. Rio de Janeiro: Ediouro, 2006. p. 148-150.

Os pós-modernistas propõem a busca do novo na pesquisa de formas


percorrendo outros caminhos de produções e utilizando materiais mais ecléticos
para elaborar suas composições, conforme obras de Nelson Leiner (1947-1952) e
Abraham Palatink (1928), apresentadas nas Figuras 149 e 150. Há uma mudança de
conceito tanto social quanto filosófica, despertando, no interlocutor, uma proposta
de reflexão, inserido no nosso tempo e espaço temporal.

Tem como característica a busca pela “multiplicidade, a fragmentação,


a desreferencialização e a entropia – que, com a aceitação de todos os estilos e
estéticas, pretende a inclusão de todas as culturas como mercados consumidores.

FIGURA 149 – NELSON LEINER. A GRANDE PARADA, SEM DATA.


INSTALAÇÃO

FONTE: GARCEZ, Lucília; OLIVEIRA, Jô. Explicando a Arte Brasileira.


Rio de Janeiro: Ediouro, 2006. p. 151-153.

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TÓPICO 4 | MOVIMENTOS ARTÍSTICOS: MODERNISMO E PÓS-MODERNISMO

FIGURA 150 – ABRAHAM PALATNIK. APARELHO CINECROMÁTICO, 1958. OBJETO


CINÉTICO, 112X74,5X20 CM

FONTE: GARCEZ, Lucília; OLIVEIRA, Jô. Explicando a Arte Brasileira. Rio de


Janeiro: Ediouro, 2006. p. 151-153.

Nas artes plásticas deste período, podemos citar como forte influência
o Neo-Expressionismo, que resgata os meios tradicionais de expressão, como a
pintura em que há uma tendência figurativa, embora também seja forte a presença
do abstracionismo e da arte conceitual.

Ao mesmo tempo em que crescem as manifestações a favor da arte


conceitual, surge uma profusão de outros meios que, juntamente com as novas
tecnologias, são usados pelos artistas para expressarem suas ideias. Exemplo disto
é a fotografia (que se eleva à categoria de arte) a minimal art, a art cinética, o grafite,
as instalações, a arte postal, a arte ambiental, a performance, entre outras estéticas.

Grafite (pintura por meio de spray em lugares públicos), instalações


(disposição de elementos no espaço com a intenção de estabelecer
uma relação com o espectador), arte postal (que se utiliza do meio
postal para a criação e a divulgação), arte ambiental (que modifica e se
relaciona com elementos da paisagem natural, principalmente por meio
da escultura e da instalação) e performance (execução momentânea de
uma ação espontânea ou teatral que pode envolver a participação do
público). (GARCEZ; OLIVEIRA, 2006, p. 141).

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UNIDADE 3 | RUMO À CONSTRUÇÃO DE UMA IDENTIDADE NACIONAL

LEITURA COMPLEMENTAR

AS “RAZÕES” DA PÓS-MODERNIDADE

Leandro Chevitarese

Frederic Jameson considera os anos 60 como o início da pós-modernidade,


entendida por ele como lógica cultural do capitalismo tardio. Mas apenas a partir
da década de 70 o debate em torno do tema torna-se mais inflamado. As raízes da
discussão encontram-se na crise cultural que se faz sentir, principalmente, a partir
do pós-guerra. O desencanto que se instala na cultura é acompanhado da crise de
conceitos fundamentais ao pensamento moderno, tais como “Verdade”, “Razão”,
“Legitimidade”, “Universalidade”, “Sujeito”, “Progresso”, etc. O efeito da desilusão
dos sonhos alimentados na modernidade se faz presente nas três esferas axiológicas
por ela mesma diferenciadas: a estética, a ética e a ciência. Tal efeito apresenta-se
nos mais diversos campos de produção cultural, tais como a literatura, a arte, a
filosofia, a arquitetura, a economia, a moral, etc.

Surgem questões que se tornam alvo de intenso debate na atualidade:
estaríamos essa “crise cultural”, vivendo uma crise da modernidade? Seria a crise o
anúncio de um obituário, que nos convidaria a falar em “pós-modernidade”, como
superação ou ruptura com a modernidade? Poderia a noção de “pós-modernidade”
servir para caracterizar a cultura contemporânea?

Em 1979, Jean-François Lyotard publica La Condition Postmoderne, no qual
apresenta o problema da legitimação do conhecimento na cultura contemporânea.
Para Lyotard, “o pós-moderno, enquanto condição da cultura nesta era [pós-
industrial], caracteriza-se exatamente pela incredulidade perante o metadiscurso
filosóficometafísico, com suas pretensões atemporais e universalizantes”. Por outro
lado, Habermas prefere compreender a modernidade como um “projeto inacabado”,
sugerindo que “deveríamos aprender com os desacertos que acompanham o projeto”.

Será que “dizer que somos pós-modernos dá um pouco a impressão de que
deixamos de ser contemporâneos de nós mesmos”? Mas se ainda reivindicarmos
nossa “condição moderna”, como tratar de todas as mudanças que marcam a cultura
contemporânea, e que a tornaram tão estranha a certas noções fundamentais à
modernidade?

O que pretendo, aqui, é investigar brevemente a aplicação do conceito
de “pós-modernidade” à cultura contemporânea e as possíveis “razões” dessa
aplicação. Articula-se, logo de início, uma problemática: se a pós-modernidade,
como o próprio termo sugere, caracteriza-se em primeira instância como uma
reação (ou rejeição) à modernidade, seria ela o triunfo do irracionalismo, ou a pós-
modernidade pressupõe, em última análise, algum conceito de “razão”, para além
de seu relativismo epistêmico mais superficial? Caso a resposta seja positiva, quais
são “As ‘razões’ da pós-modernidade”?

196
TÓPICO 4 | MOVIMENTOS ARTÍSTICOS: MODERNISMO E PÓS-MODERNISMO

O termo “pós-modernidade” encontra-se ligado à significação de


“modernidade”, até por que não faria sentido ser “pós” alguma coisa que não se sabe
o que é. O “pós-moderno” representa alguma espécie de reação ou afastamento do
“moderno”. Contudo, não basta apenas a análise do conceito de modernidade, pois
o próprio prefixo “pós” articula problemáticas situadas em diversas áreas. Krishan
Kumar chama à atenção que o prefixo “pós”, de “pós-modernidade”, é ambíguo:
pode significar um novo estado de coisas, no sentido do que vem depois; ou pode
ser usado como o post de post-mortem, sugerindo fim, término.

Será então necessário ressaltar primeiro as perspectivas fundamentais da
própria “modernidade”, para então estabelecermos em que sentido podemos falar
de uma “posterioridade” na “pós-modernidade”.

No início do século XX, Max Weber já caracterizava o advento da modernidade
como um processo crescente de “racionalização intelectualista”, intimamente ligado
ao progresso científico, que leva ao “desencantamento do mundo”. Vejamos o que
Habermas nos diz, comentando Weber: Max Weber caracterizou a modernidade
cultural, mostrando que a razão substancial expressa em imagens de mundo
religiosas e metafísicas se divide em três momentos, os quais apenas formalmente
(mediante a forma de fundamentação argumentativa) ainda podem ser mantidos
juntos. Uma vez que as imagens de mundo se desagregam e os problemas legados
se cindem entre os pontos de vista específicos da verdade, da justeza normativa, da
autenticidade ou do belo, podendo ser tratados, respectivamente como questão de
conhecimento, como questão de justiça e como questão de gosto, ocorre nos tempos
modernos uma diferenciação de esferas de valor: ciência, moral e arte.

O conjunto de ideias e perspectivas que caracterizam a modernidade parece
constituir um grande sonho que a humanidade elaborou para si mesma, ou ainda um
audacioso projeto da Razão como libertadora. O Discurso iluminista de emancipação
pela revolução, ou pelo saber, sustenta essa confiança na capacidade da Razão.

Habermas chama a atenção para o que ele denomina projeto da modernidade, e
que tem sido amplamente discutido na atualidade, como demonstra David Harvey:
Embora o termo “moderno” tenha uma história bem mais antiga, o que Habermas
chama de projeto da modernidade entrou em foco durante o século XVIII. Esse
projeto equivalia a um extraordinário esforço intelectual dos pensadores iluministas
“para desenvolver a ciência objetiva, a moralidade e a lei universais e a arte
autônoma nos termos da própria lógica interna destas”. A ideia era usar o acúmulo
de conhecimento gerado por muitas pessoas trabalhando livre e criativamente em
busca da emancipação humana e do enriquecimento da vida diária.

A aplicação ampla da racionalidade na organização social prometia a segurança
de uma sociedade estável, democrática, igualitária (incluindo o fim de estados
teocráticos, de perseguições sociais produzidas pela superstição, de abusos de poder
por parte dos governantes, etc). A possibilidade de domínio científico representava
o aceno de uma ambicionada segurança, que nos afastaria dos infortúnios ligados a
imprevisibilidade do mundo natural (desde condições climáticas e de relevo, a doenças
físicas e mentais): a natureza deveria submeter-se ao poder da Razão humana.

197
UNIDADE 3 | RUMO À CONSTRUÇÃO DE UMA IDENTIDADE NACIONAL

Estes foram sonhos demasiadamente caros para a humanidade, pelos quais


se permitiu a hipervalorização do conhecimento objetivo e científico. O que Ken
Wilber, por exemplo, prefere chamar de desastre da modernidade: “uma patologia,
que logo permitiu que uma poderosa ciência monológica colonizasse e dominasse
as outras esferas (a estético-expressiva e a religiosa-moral)”.

Naturalmente, o investimento cultural na racionalidade universal e na ciência
(que os protegeriam do caos e da aleatoriedade) exigiu uma restrição da liberdade
individual. Harvey observa que “há a suspeita de que o projeto do Iluminismo estava
fadado a voltar-se contra si mesmo e transformar a busca de emancipação humana
num sistema de opressão universal em nome da libertação humana”.

A expectativa quanto aos frutos da ciência foi dolorosamente interrompida
por eventos que marcaram profundamente a sociedade atual. O principal deles foi,
sem dúvida, a catástrofe da Segunda Guerra Mundial e a insuportável lembrança
de acontecimentos como Auschwitz e Hiroshima: “cortada ao meio pela guerra
fria, cética em relação à construção ‘comunitária’ que lhe propõem tecnocratas e
políticos, a Europa dos anos 50 deixou de acreditar no futuro”.

A ciência perdeu boa parte da aura de autoridade que um dia possuiu. De
certa forma, isso provavelmente é resultado da desilusão com os benefícios que,
associados à tecnologia, ela alega ter trazido para a humanidade. Duas guerras
mundiais, a invenção de armas de guerra terrivelmente destrutivas, a crise ecológica
global e outros desenvolvimentos do presente século poderiam esfriar o ardor até
dos mais otimistas defensores do progresso por meio da investigação científica
desenfreada.

Já não parece claro que a investigação científica possa “garantir” o que
quer que seja. Além disso, a dúvida sobre os “benefícios” trazidos pela tecnologia
torna-se cada vez mais cotidiana, doméstica, principalmente à medida em que
se intensifica a dependência a esta mesma tecnologia crescente (incluindo, por
exemplo, a dependência cada vez maior de aparelhos eletrodomésticos, automóveis,
computadores, etc – sem os quais, para muitos, tornou-se “impossível” viver).

Na medida em que as expectativas criadas não se puderam realizar
efetivamente, surgiram a frustração, o relativismo e o niilismo. Mas a própria
exigência de radicalidade crítica da modernidade já trazia consigo a “armadilha da
dúvida”: (...) as sementes de niilismo estavam no pensamento iluminista desde o
início. Se a esfera da razão está inteiramente desagrilhoada, nenhum conhecimento
pode se basear em um fundamento inquestionado, por que mesmo as noções mais
firmemente apoiadas só podem ser vistas como válidas “em princípio” ou até
“ulterior consideração”. De outro modo elas reincidiriam no dogma e se separariam
da própria esfera da razão que determina qual validez está em primeiro lugar.

Esta é uma tese que considero particularmente importante: o Desencanto
na Cultura, entendido como perda de horizontes, sensação de caos, incerteza e
relatividade, é algo que desde o início da modernidade encontrava-se embrionário,
implícito nas próprias exigências críticas da Razão – o que gostaria de chamar de “a
198
TÓPICO 4 | MOVIMENTOS ARTÍSTICOS: MODERNISMO E PÓS-MODERNISMO

outra face da moeda iluminista”. Mas se não há mais otimismo quanto aos rumos da
cultura moderna, esse desencanto vem acompanhado da rejeição a tudo que é tido
como opressivo, da desconfiança a todo discurso que pretenda dizer ‘o que são as
coisas’, ‘o que devemos fazer’, ‘como sentir’. É a dúvida quanto às possibilidades de
fundamentação racional, a suspeita quanto às narrativas globalizantes, que caminha
lado a lado do clamor por liberdade. A pós-modernidade configura-se como uma
reação cultural, representa uma ampla perda de confiança no potencial universal do
projeto iluminista.

FONTE: CHEVITARESE, L. As ‘Razões’ da Pós-modernidade. In: Analógos. Anais da I SAF-PUC. RJ:


Booklink, 2001.

Para aprofundar seus conhecimentos sobre Arte Brasileira, sugerimos os


seguintes sites para pesquisa:

ARNALDO POESIA. GALERIA BARROCO.


Disponível em: <http://www.starnews2001.com.br/aleijadinho/ordem-terceira.
html>. Acesso em: 15 jul. 2008.

ARNALDO POESIA. ALEIJADINHO/BARROCO.


Disponível em: <http://www.starnews2001.com.br/Aleijadinho/barroco_
brasileiro.html>. Acesso em: 20 jul. 2008.

ARTE COLONIAL. Disponível em: <http://www.historiadaarte.com.br/


artecolonial.html>. Acesso em:10 jul. 2008.

ARTE HOLANDESA. Disponível em: <http://www.historiadaarte.com.br/


arteholandesa.html>. Acesso em: 15 jul. 2008.

BARRETO, Cristina. Amazônia desconhecida em exposição no Museu Britânico.


Disponível em: <http://www.bbc.co.uk/portuguese/noticias/2001/011005_
amazonia.shtml>. Acesso em: 23 maio 2008>.

CENTRO DE REFERÊNCIA DA CAPOEIRA CARIOCA. Disponível em: <http://


www.centroreferenciacapoeiracarioca.net/fotos.php>. Acesso em: 1 ago. 2008.

DESVENDAR. 2008. Disponível em: <http://www.desvendar.com/especiais/


indio/arte.asp>. Acesso em: 1 jun. 2008.

EDUCATERRA: VOLTAIRE. 2005.


Disponível em: <http://educaterra.terra.com.br/voltaire/cultura/2005/11/17/001.
htm>. Acesso em: 10 ago. 2008.

ENCICLOPÉDIA ITAÚ CULTURAL – TACHISMO, 2005


Disponível em: <http://www.itaucultural.org.br/aplicexternas/enciclopedia_ic/
index.cfm?fuseaction=termos_texto&cd>. Acesso em: 1 ago. 2008.

199
UNIDADE 3 | RUMO À CONSTRUÇÃO DE UMA IDENTIDADE NACIONAL

ENCICLOPÉDIA KOOGAN-HOUAISS – DEBRET.


Disponível em: <http://www.pitoresco.com/brasil/debret/debret.htm>. Acesso
em: 1 go. 2008.

ENCICLOPÉDIA KOOGAN-HOUAISS – RUGENDA.


Disponível em: <http://www.pitoresco.com/brasil/debret/debret.htm>. Acesso
em: 1 ago. 2008.

ESCRAVIDÃO. Disponível em: <http://www.historiadobrasil.net/escravidao/>.


Acesso em: 15 jul. 2008.

GEOCITIES – Barroco no Brasil.


Disponível em: <http://www.geocities.com/barroco_brasil/brasil01.html>. Acesso
em: 18 jul. 2008.

GUAPINDAIA, Vera. Os Tapajós: Arqueologia e História.


Disponível em: <http://www.historiaehistoria.com.br/materia.
cfm?tb=historiadores&id=16>.Acesso em: 23 Jun. 2008.

HISTÓRIA DA ARTE – POP ART. Disponível em: <http://www.historiadaarte.


com.br/popart.html>. Acesso em: 20 ago. 2008.

ITAÚ CULTURAL, 2005.


Disponível em: <http://www.itaucultural.org.br/aplicExternas/enciclopedia_IC/
index.cfm?fuseaction=marcos_texto&cd_verbete=3754>. Acesso em: 20 ago. 2008.

ITAÚ CULTURAL – SECRETARIA DE EDUCAÇÃO DO ESTADO DO RIO DE


JANEIRO, 2008. Disponível em: <http://www.passeiweb.com/na_ponta_lingua/
sala_de_aula/historia/historia_da_arte/barroco/hist_arte_barroco_3_brasil>.
Acesso em: 10 jun. 2008.

JESUS, Luiz Roberto Vieira. A Arte Marajoara na Época de sua Reprodutibilidade


Técnica. Disponível em: <http://www.ufpa.br/decom/roberto.pdf>. Acesso em: 15
jun. 2008.

LETTERI, 2006 – Disponível em: <http://letteri.blogger.com.br/2006_09_01_


archive.html>.
Acesso em: 25 jul. 2008.

LOPES, José Reinaldo. O antropólogo em busca do inesperado.


Disponível em: <http://www1.folha.uol.com.br/folha/sinapse/ult1063u219.shtml>.
Acesso em: 23 maio. 2008.

R. MARTINS, Simone; H. IMBROSI, Margaret. Arte Pré-Histórica.


Disponível em: <http://www.historiadaarte.com.br/arteprehistorica.html>. Acesso
em: 15 maio 2008.

200
TÓPICO 4 | MOVIMENTOS ARTÍSTICOS: MODERNISMO E PÓS-MODERNISMO

REVISTA FRANÇA-BRASIL
Disponível em: <http://www.netflash.com.br/alliance/Apoio/diplomacia10-
arquiteturabr.htm>. Acesso em: 8 ago. 2008.

RELIGIOSIDADE. Disponível em: <http://ileifa.com.br/index.php?option=com_


content&task=view&id=31&Itemid=59>. Acesso em: 25 jul. 2008.

REVISTA ELETRÔNICA SOBRE DANÇA – FALANDO DE DANÇA, 2008


Disponível em: <http://falandodedanca.blogspot.com/2008/01/dia-nacional-do-
samba.html>. Acesso em: 1 ago. 2008.

REVISTA ELETRÔNICA, 2005.


Disponível em: <http://www.propp.ufu.br/revistaeletronica/edicao2005_2/h/
as_fortificacoes.pdf>. Acesso em: 25 jul. 2008.

ROTEIRO DO BRASIL.
Disponível em: <http://www.roteirosdobrasil.tur.br/estado_rj_riodejaneiro.html>.
Acesso em: 25 jul. 2008.

SUA PESQUISA. Índios do Brasil. Disponível em: <http://www.suapesquisa.


com/indios/>. Acesso em: 23 maio 2008.

XAVIER, Charles Odevan. A Arte Pós-Moderna, 2003. Disponível em: <http://www.


midiaindependente.org/pt/blue/2003/12/269255.shtml>. Acesso em: 20 ago. 2008.

WIKIPEDIA – AFRO-BRASILEIRO. Disponível em: <http://pt.wikipedia.org/


wiki/Afrodescendente>. Acesso em: 25 jul. 2008.

WIKIPEDIA – ARTE MODERNA – Disponível em: <http://pt.wikipedia.org/wiki/


Arte_moderna>. Acesso em: 15 ago. 2008.

WIKIPÉDIA – BARROCO – Disponível em: <http://pt.wikipedia.org/wiki/


Barroco>.
Acesso em: 18 jul. 2008.

WIKIPEDIA – SEMANA DE ARTE MODERNA. Disponível em: <http://


pt.wikipedia.org/wiki/Semana_de_Arte_Moderna>. Acesso em: 20 ago. 2008.

WIKIPEDIA – PÓS-MODERNISMO. Disponível em: <http://pt.wikipedia.org/


wiki/P%C3%B3s-modernismo>. Acesso em: 15aAgo. 2008.

VISCONTI – APRESENTAÇÃO
Disponível em: <http://www.eliseuvisconti.com.br/apres_pioneiro_design.htm>.
Acesso em: 20 ago. 2008.

201
RESUMO DO TÓPICO 4
Neste tópico, caro(a) acadêmico(a), você estudou vários itens sobre a Arte
Brasileira, os quais, a seguir, são apresentados resumidamente:

O movimento modernista nasceu na Europa e se difundiu no Brasil no início do


século XX. Tomou corpo com a Semana de Arte Moderna, em 1922, ocasião em que
vários artistas, de várias áreas – plástica, literária e arquitetura – desenvolveram
seus trabalhos divulgando uma nova estética como a expressionista, a cubista,
a naturalista, etc.

Além dos movimentos já citados anteriormente, como o expressionismo,


desenvolvido inicialmente por Lasar Segall, o cubismo praticado também por


Tarsila do Amaral em uma de suas fases de criação, a pintura nacionalista
difundida por Di Cavalcanti dentre outros, a futurista impressa em algumas obras
de Anita Malfatti, surgiram no cenário nacional outros tipos de manifestações
como abstracionismo, concretismo, neoconcretismo, tachistas, novo realismo,
surrealismo, pintura ingênua e primitiva, pop art, etc.

O pós-modernismo é um produto da sociedade pós-industrial. Este movimento se


desenvolveu a partir das críticas ao modernismo. Sua estética assume diferenças


importantes se comparadas ao que se vinha produzindo anteriormente,
incluindo as estéticas modernistas.

A arte pós-modernista tem como característica a busca pela “multiplicidade, a


fragmentação, a desreferencialização e a entropia – que, com a aceitação de todos


os estilos e estéticas, pretende a inclusão de todas as culturas como mercados
consumidores.

202
AUTOATIVIDADE

Ao mesmo tempo em que crescem as manifestações a favor da arte


conceitual, surge uma profusão de outros meios que, juntamente com as novas
tecnologias, são usados pelos artistas para expressarem suas ideias, como, por
exemplo:

 grafite – que é a pintura por meio de spray, desenvolvida em lugares públicos;


 instalações – que é a disposição de elementos no espaço, com a intenção de
estabelecer uma relação com o espectador;
 arte postal – que se utiliza do meio postal para a criação e a divulgação;
 arte ambiental – que modifica e se relaciona com elementos da paisagem
natural, principalmente por meio da escultura e da instalação;
 performance – que é a execução momentânea de uma ação espontânea ou
teatral que pode envolver a participação do público.

Com base no texto que cita várias manifestações artísticas como grafite,
instalações, arte postal, arte ambiental, performance, pesquise sobre cada uma
e indique artistas brasileiros que se valem dessas formas de expressão para se
manifestar artisticamente.

Bom Trabalho!

203
204
UNIDADE 3
TÓPICO 5

O ENSINO DA ARTE MODERNA E


CONTEMPORÂNEA BRASILEIRA

1 INTRODUÇÃO

Por que estudar a Arte Brasileira? Você já deve ter se perguntado sobre
isso. Bem, penso que esse livro foi dedicado a esse tema, por isso, para que tenha
sentido a você, futuro professor de arte, é preciso ter claro a relevância da arte
brasileira para a constituição de nossa sociedade. Nesse sentido, precisamos
compreender que a arte é parte do desenvolvimento do ser humano no mundo.
Assim faz parte do desenvolvimento da cultura e do processo de conhecimento
pessoal, social e cultural.

Conhecer nossa arte é uma forma de nos conhecermos, conhecermos as


pessoas que nos cercam e conhecermos a dinâmica da sociedade na qual estamos
inseridos. Para que isso aconteça, precisamos compreender que a arte é um produto
histórico e cultural. Histórico, porque é marcado pelo seu tempo, pelas condições
técnicas e conceituais presentes num determinado tempo. Cultural, porque é
marcado por uma geografia, pelas relações sociais, formas de ser e viver de um
determinado grupo que, por conta disso, estrutura uma obra dessa ou daquela
forma.

Conhecer a arte numa perspectiva histórica nos possibilita olhar para o


que os artistas contemporâneos produzem hoje e possamos, por meio de suas
obras, compreender melhor o nosso tempo. Talvez esse seja o motivo pelo qual
é importante que compreendamos a arte numa perspectiva histórica. Isso não
significa que a arte deva ser ensinada de forma linear, mas que é necessário
localizar histórica, social, geográfica e culturalmente a arte. A Arte Moderna é, de
alguma forma, reflexo e reflexão dos sujeitos que viveram naquela época.

Após as referências europeias serem tão fortemente impostas como cânones


para a arte brasileira, era necessário um momento no qual se desse voz aos artistas
brasileiros que buscaram, nas temáticas brasileiras, elementos para suas obras.
Ainda é importante considerar que no ensino da Arte Moderna é importante que
você, professor, discuta com seus alunos o processo de transformação ocorrido
naquela época e porque não apenas que os artistas modernistas são famosos, mas
de fato quais as contribuições de suas produções para a arte brasileira. Lembre-
se de que a relação com a arte deve ser estabelecida pela arte, sua relevância no
contexto em que foi produzida e para o que vivemos hoje. Não é a fama que mais
importa, mas a arte e seu sentido e significados para as pessoas.
205
UNIDADE 3 | RUMO À CONSTRUÇÃO DE UMA IDENTIDADE NACIONAL

Com isso, nosso foco de trabalho não deverá ficar apenas na biografia
dos artistas, mas sim nas suas produções artísticas, em que aspectos estilísticos e
estéticos de suas obras se diferenciam e deixam sua marca. Lembre-se: conhecer a
arte é conhecer e experimentar uma experiência estética ímpar.

Quando falamos em Arte Contemporânea estamos falando, essencialmente,


de nosso tempo, desses últimos anos. Décadas que caracterizam meados e final do
século XX e início do século XXI.

Eu, você, nossos alunos, fazemos parte desse mundo. Quando paramos para
pensar no que vivemos hoje, podemos perceber um mundo cheio de fragilidades,
de incertezas, de transformações. Vivemos num mundo pós-primeira e segunda
guerras mundiais, vivemos outras tantas guerras que fragilizam nações.

Em nosso tempo, o conhecimento foi e é produzido em uma velocidade


nunca antes pensada pelo ser humano. A tecnologia nos coloca num mundo
sem fronteiras, onde se circula com muito mais facilidade. Hoje, o ser humano
vive um momento ímpar, em relação às facilidades e possibilidades do mundo
moderno... Diante disso, achamos soluções para determinadas doenças. Os seres
humanos vivem mais tempo, menos crianças morrem nos primeiros anos de
vida... Em contrapartida, as diferenças sociais e culturais se acirram e colocam os
humanos em condições desiguais. Poderíamos ficar elencando diversas questões
que caracterizam nosso tempo e, por isso, são temas da Arte Contemporânea não
só no Brasil, mas no mundo.

O Brasil não é um país isolado do resto do mundo, assim como sua cidade
também não é. De alguma forma, por meio das condições que vivemos, as pessoas
que aqui vivem transpiram temas que também são discutidos em outros locais
do mundo. Por isso, podemos citar Tolstoi quando este afirma que, “para ser
universal, comece por pintar e conhecer a sua aldeia”. Se quisermos entender o
mundo contemporâneo, ou pós-moderno, devemos conhecer a arte das pessoas
que vivem nesse tempo. Conhecer o que se faz ao seu redor. Com isso, poderemos
aos poucos ampliar nossas relações com a arte local e nacional.

Canton (2001) em seu livro “Novíssima Arte Brasileira: um guia de


tendências”, apresenta uma diversidade de categorias que, segundo ela, marcam
as produções contemporâneas brasileiras. A autora fez um mapeamento de temas
de obras que foram expostas no MAC–USP (Museu de Arte Contemporânea–SP),
durante alguns anos, e identificou alguns temas que estavam presentes nessas
obras. A autora formaliza essa discussão numa pequena coleção intitulada: “Temas
da Arte Contemporânea, vale a pena conhecer”.

Citaremos algumas características, para que você possa compreender e


articular em suas aulas. Lembre-se: para saber mais, procure o livro da autora,
pois aqui apresentamos apenas algumas características.

206
TÓPICO 5 | O ENSINO DA ARTE MODERNA E CONTEMPORÂNEA BRASILEIRA

Segundo Canton (2001), a Arte Contemporânea não nega sua relação com o
passado, pois uma característica da arte de nosso tempo é deixar clara sua herança,
suas referências, assim os artistas contemporâneos rejeitam a ideia de originalidade
absoluta e compreendem que sua obra bebe na fonte de outros artistas. Citam suas
fontes de forma direta ou indireta.

Um tema indicado por Canton (2009) é o “Tempo e a memória”. Nele, a


autora indica que um elemento importante para compreendermos e pensarmos
na vida contemporânea é o tempo, a falta de tempo ou a velocidade com a qual
o tempo passa. A autora apresenta diversos artistas que se articulam a essa
discussão, considerando relações entre o aqui e agora, a fragilidade humana
diante da temporalidade, que afeta noções históricas e espaciais. Ainda, a autora
articula a importância da memória que se tornou agente de resistência, a partir das
experiências que enfocam as memórias pessoais que se contrapõem à distância de
tecnologias que tendem a anular a privacidade. Interessante ver isso e refletir sobre
nossa sociedade e a constituição dos sujeitos.

Observe isso na obra de José Rufino, artista nascido em João Pessoa, na


Paraíba. Seu nome de nascimento é José Augusto de Almeida. Ele usa o nome do
avô paterno para “penetrar na memória simbólica do patriarca de uma família
paraibana de latifundiários”.

Segundo Canton (2009a, p. 37), “nesse jogo de identidades e de tempo,


Rufino constrói instalações que remetem à memória familiar, à tradição de uma
sociedade agrária anacrônica, repleta de regras e formalidade”.

Perceba que nesse contexto, ao analisarmos a obra do artista, emergimos


num contexto histórico específico, que se relaciona ao contexto mais amplo da
história brasileira. Com isso, transitamos entre tempos e memórias vividos por
pessoas e que se materializam nas obras e nas nossas leituras. A obra que segue é
parte de um vasculhamento pessoal, de família, que se constitui na série “Cartas
de areia”.

207
UNIDADE 3 | RUMO À CONSTRUÇÃO DE UMA IDENTIDADE NACIONAL

FIGURA 150: JOSÉ RUFINO - DA SÉRIE DE DESENHOS CARTAS DE AREIA


- 2000

FONTE: Disponível em: <http://www.joserufino.com/site/cartas-de-


areia-2/>. Acesso em: 20 mar. 2012.

Outros autores podem se articular a pesquisas estéticas que envolvam


esse tema. Procure! Suas obras podem auxiliar você a planejar uma aula bastante
criativa.

Outra temática trazida à tona por Canton é “Corpo, Identidade e Erotismo”.


Talvez falemos sobre esse tema em nossas conversas informais. No entanto, talvez
não nos damos conta do quanto são marca de nosso tempo as questões acerca do
corpo, da constituição identitária dos sujeitos e a relação com o erotismo.

Para Canton, o ser humano contemporâneo apresenta “uma insegurança


generalizada ligada à busca idealizada de uma identidade estável e fixa”. (2009b,
p. 15).

Quando paramos para pensar nisso, percebemos que em nosso tempo


é difícil falar em uma identidade única, que demarque o todo do sujeito. Neste
contexto estão marcadas diversas pesquisas estéticas que refletem sobre o humano,
na sua relação consigo mesmo, na relação com os outros humanos, no qual o
processo de alteridade marca sua constituição de identidade. O corpo pode ser,
neste sentido, o espaço das experiências, pois por ele passam as relações do ser
humano.

208
TÓPICO 5 | O ENSINO DA ARTE MODERNA E CONTEMPORÂNEA BRASILEIRA

Ainda há nesse campo, ligado ao corpo, à identidade, a relação dos sujeitos


com o erotismo, e uma presente desconfiança da entrega amorosa. Veja quantos
conceitos estão aqui presentes. Diversos artistas pesquisam nesses campos, que
se articulam e se distanciam. Rodrigo Braga é um artista pernambucano que
manipula imagens que causam desconforto e, mesmo sabendo que são imagens
manipuladas, o espectador reage a elas, pois percebe incisões no corpo do artista.
Veja a série Fantasia de compensação, do ano de 2004.

FIGURA 151: RODRIGO BRAGA - FANTASIA DE COMPENSAÇÃO, 2004. FOTOGRAFIA

FONTE: Disponível em: <http://www.olhave.com.br/perspectiva/?p=326>. Acesso em: 20 mar. 2012.

Outra temática abordada por Canton é a relação entre espaço e lugar,


compreendendo que se diferenciam, no entanto se articulam. O espaço é uma
palavra utilizada genericamente e lugar a uma noção mais específica de espaço.

Aqui, em especial, a autora aponta as obras que discutem o espaço


territorializado da arte e com isso ampliam as compreensões de lugar físico e
simbólico da arte. A autora aponta que na contemporaneidade os espaços da arte
se transformam e esta passa a ocupar espaços nunca antes pensados. É o caso
das obras que ocupam os espaços públicos, e com isso as relações entre público e
privado se diferenciam (CANTON, 2009c).

Ainda é possível conhecer artistas que se apropriam dos espaços, assim


como os que se apropriam de objetos dos espaços. Você está diante de um conjunto
lindo de pesquisas que podem ser realizadas com seus alunos. Veja a obra de
Renata Pedrosa, que construiu uma obra num espaço público que tinha a função
de se ajustar e descansar o corpo.
209
UNIDADE 3 | RUMO À CONSTRUÇÃO DE UMA IDENTIDADE NACIONAL

FIGURA 152 - RENATA PEDROSA - NA LINHA, RUA ÁLVARES PENTEADO - SÃO PAULO, 2001

FONTE: Disponível em: <http://bia-trajetoriasdoser.blogspot.com/2011/06/arte-


contemporanea-no-espaco-publico.htm>. Acesso em: 20 mar. 2012.

Ainda é possível encontrar em Canton (2009d) uma reflexão sobre as


questões das Políticas e Micropolíticas, enfocando produções artísticas que
relacionam um novo paradigma das discussões políticas na atualidade. Com isso,
após a queda do Muro de Berlim não conseguimos mais organizar, ou dividir, o
mundo entre direita e esquerda.

Veja, esse acontecimento é recente e nos coloca um novo olhar para os


sistemas políticos no mundo. Com isso, as noções de política se transformam
e os artistas passam a substituir essas noções por noções de micropolíticas, nas
quais as atitudes passam a ser focadas em questões mais específicas e cotidianas.
Ganham espaço para discussões, como: o gênero, a fome, a impunidade, o direito,
a educação, ecologia, moradia, entre outros. Todas essas discussões fazem parte do
nosso viver. (CANTON, 2009d).

Marco ainda com um quinto tema, “Narrativas enviezadas”, no qual


a autora indica produções artísticas que contam histórias não lineares. Nesse
sentido, “no lugar de começo-meio-fim tradicional, elas se compõem a partir de
tempos fragmentados, sobreposições, repetições, deslocamentos” (CANTON,
2009e, p. 15). Portanto, percebemos que os artistas narram, mas não resolvem as
tramas. Algumas por eles vividas, outras por eles contadas, outras observadas, que
se relacionam ou não.

Por que compreender a Arte Contemporânea? Para entender de seu tempo!


Não esqueça, quando você der voz à Arte Contemporânea em sala de aula, você
estará dando voz aos seus alunos, ao que pensam, do que vivem, do que observam,
das suas tramas, das suas facilidades e problemas. Conheça, busque! Esta disciplina
é apenas um espaço/tempo que tem como intenção provocar em você o desejo de
conhecer. Conhecer mais sobre arte!

210
TÓPICO 5 | O ENSINO DA ARTE MODERNA E CONTEMPORÂNEA BRASILEIRA

LEITURA COMPLEMENTAR

ARTE CONTEMPORÃNEA
Kátia Canton

Já dizia o crítico brasileiro Mario Pedrosa que “arte é o exercício experimental


da liberdade”. Eis uma ótima definição, sobretudo se entendermos que o conceito
de liberdade depende de um contexto para se definir. O que é considerado um ato
ou um pensamento de liberdade em um determinado momento histórico não o é
necessariamente em outro. Em se tratando de arte, então, é importante que prestemos
atenção nos sinais dos tempos e em seus significados.

Bem, e qual é o significado da arte? Para começar, podemos dizer que ela
provoca, instiga, estimula nossos sentidos, de forma a descondicioná-los, isto é, a
retirá-los de uma ordem preestabelecida, sugerindo ampliadas possibilidades de viver
e de se organizar no mundo. Como escreve o poeta Manoel de Barros: “Para apalpar
as intimidades do mundo é preciso saber: / a) que o esplendor da manhã não se abre
com faca / b) o modo como as violetas preparam o dia para morrer / c) por que é que as
borboletas de tarjas vermelhas têm devoção por túmulos / d) se o homem que toca de
tarde sua existência num fagote tem salvação (...) Desaprender 8 horas por dia ensina
os princípios (...) / As coisas não querem mais ser vistas por / pessoas razoáveis:/ Elas
desejam ser olhadas de azul - / que nem uma criança que você olha de ave”.

A arte ensina justamente a desaprender os princípios do óbvio que é atribuído


aos objetos, às coisas. Ela parece esmiuçar o funcionamento das coisas da vida,
desafiando-as, criando para elas novas possibilidades. Ela pede um olhar curioso, livre
de “pré-conceitos”, mas cheio de atenção. Os jovens já têm essa disponibilidade, mas
é preciso estimular seu convívio com arte para facilitar e aprimorar essa percepção.

Agora, ao mesmo tempo em que se nutre da subjetividade, há outra


importante parcela da compreensão da arte, que é constituída de conhecimento
objetivo, envolvendo a história - da arte e dos homens -, para que, com esse material,
se possa estabelecer um grande número de relações. Para contar essa história, a
arte precisa ser plena de verdade, refletindo o espírito do tempo, com a visão, o
pensamento e o sentimento das pessoas em seus momentos.

Parece complicado? Pois pensar na arte como um conhecimento vivo, um


tecido onde se costuram diariamente fios que compõem a vida, é uma forma de
entender por que razão a maneira de encará-la também se modifica no decorrer dos
contextos sócio-históricos. É mais que desejável, então, que os jovens se acostumem
a pensar também sobre a arte de seu próprio tempo.

Arte moderna e vanguardas

De modo geral, podemos afirmar que a arte moderna, que se iniciou a


partir da segunda metade do século 19 e abarcou todo o século 20, teve como mola
propulsora o conceito de vanguarda. E o que isso significa?
211
UNIDADE 3 | RUMO À CONSTRUÇÃO DE UMA IDENTIDADE NACIONAL

O termo vem do francês “avant-garde”, que quer dizer “à frente da guarda”.


É um termo de guerra, que pressupõe duas ideias básicas: a de se estar “à frente”,
isto é, de fazer algo novo, e a de “guarda”, que se liga à luta, à ruptura. Eram esses
os desejos dos artistas modernos. As bases de todos os movimentos que eles criaram,
independente de suas singularidades, estão ligadas às noções de novo e de ruptura.

Buscando criar obras cada vez mais inovadoras e que pudessem romper com
a ordem vigente é que os artistas modernos elaboraram seus movimentos. Afinal
de contas, esses artistas pertenceram a uma era tremendamente intensa, que, no
rastro da Revolução Industrial, urbanizou cidades, promoveu espantosas inovações
tecnológicas, mas também produziu duas guerras mundiais, além da Revolução
Russa, que acabaram por separar o mundo em blocos capitalista e socialista.
Era preciso que a arte se tornasse tão inovadora e radical quanto a própria vida.

Uma das invenções do século 19 e que teve um impacto fenomenal sobre a arte
foi a fotografia. Ela liberou os artistas, até então incumbidos de registrar em suas telas
pessoas, paisagens e fatos históricos para a posteridade. A fotografia poderia cumprir
essa função, dando ao artista mais liberdade para criar, pesquisar e experimentar.

No Modernismo, diversos projetos uniam artistas em diferentes movimentos,


muitas vezes endossados por manifestos - textos que os explicavam e validavam. A
opção pelo novo manifestou-se de maneiras muito diversas e particulares, ampliando
enormemente as possibilidades artísticas que o século 20 trouxe para o mundo ocidental.

No Impressionismo, por exemplo, os artistas queriam se liberar da


representação realista e cheia de regras impostas pelas academias de belas-artes.
No Cubismo, a fragmentação das imagens projetava simbolicamente a própria
fragmentação do mundo da industrialização. Na arte abstrata, procurava-se uma
síntese que transcendesse uma realidade de guerras, destruições e desigualdades.

O que os unia era um posicionamento diante das mudanças trazidas


pela sociedade industrial. Impressionismo, Pós-Impressionismo, Fauvismo,
Expressionismo, Simbolismo, Cubismo, Futurismo, Surrealismo, Minimalismo...
Todos buscavam liberdade e autonomia para a obra de arte.

A cena contemporânea

Com o passar do tempo, no entanto, a arte moderna sofreu um desgaste. Por


um lado, ela tornou-se tão experimental que acabou por afastar-se do público, que
passou a achar suas manifestações cada vez mais estranhas e de difícil compreensão.
Isso aconteceu particularmente a partir dos anos 60 e 70, em Nova York, para onde
se transferiu a vanguarda artística dos centros europeus depois da Segunda Guerra,
e onde várias noções modernas foram radicalizadas.

No movimento minimalista, criado ali, o lema era “Menos é Mais”; a arte não
deveria ter autoria, nem passado ou futuro, apenas a ação do momento presente. “O
que se vê é o que se tem”, diziam os minimalistas. “Não há nada por trás das formas.”

212
TÓPICO 5 | O ENSINO DA ARTE MODERNA E CONTEMPORÂNEA BRASILEIRA

Em meio a isso, as pessoas sentiam falta de histórias e da possibilidade de


serem arrebatadas de emoção pelas obras de arte. Por outro lado, a noção do novo,
fundamental para a vanguarda, também se tornou algo improvável, sobretudo num
mundo repleto de informações e estímulos.

Com a mudança global que se delineia a partir dos anos 80, torna-se mais
gritante ainda a necessidade de uma modificação no conceito de arte. Mais do que
isso: torna-se necessário que a arte se modifique para sobreviver. E é aí que sai de
cena a arte moderna e sobe ao palco a contemporânea.

Para começar, a organização prévia do mundo entre capitalismo e socialismo


entra em colapso com o fim do regime socialista soviético e a queda do muro
de Berlim (1989). As novas realidades políticas provocam um fluxo geográfico
internacional, fazendo com que os deslocamentos humanos instaurem uma nova
noção de identidade e de nacionalidade.

A virtualização produz uma profunda modificação na maneira como


as pessoas se relacionam. A relação tempo e espaço, que antes obedecia a uma
proporcionalidade, agora é instável.

Se os estímulos de informação proliferam sem limites temporais ou espaciais,


tornando-se muitas vezes excessivos, a memória torna-se um bem maior. Para o
cientista russo e Prêmio Nobel, Ilya Prigogine, “o fim da humanidade seria uma
sociedade que perdeu sua memória”. Prigogine aponta para uma valorização cada
vez maior da memória como um bem ao qual muitas pessoas terão pouco acesso
num futuro em que tudo é descartável.

A importância dada à moda, às aparências e à “atitude”, aliada a uma


tecnologia sofisticada de cirurgias, implantes, aparelhos de ginástica e substâncias
químicas, além das possibilidades genéticas que se abrem com os sequenciamentos
cromossômicos, fazem do corpo um campo de experimentações futurísticas. A
busca pela originalidade, que caracterizava a vanguarda modernista do século 20,
é substituída pela atitude de busca de reconhecimento, de celebridade. Transfere-
se o alvo das preocupações da produção para o produtor, da obra para o autor.

Tanta coisa acontece rápida e simultaneamente que afeta nossa capacidade


de lidar com a memória, a afetividade, o corpo, a identidade, enfim. Esses, então,
passam a ser os grandes assuntos a serem tratados pelos artistas contemporâneos,
espécies de radares de seu próprio momento histórico. A arte abstrata continua a
existir, mas é na figuração, nas narrativas, nas imagens ligadas à própria história
de vida do artista e às micropolíticas referentes ao mundo em que vive que está o
grande foco da arte contemporânea.

Se fosse convidada a reformular o ensino da arte no momento contemporâneo,


eu substituiria o estudo dos movimentos que caracterizaram a era moderna por
esses grandes temas que acompanham a produção e o pensamento dos artistas
contemporâneos, permitindo que a arte continue a fazer sentido e a ecoar nossa essência.

213
UNIDADE 3 | RUMO À CONSTRUÇÃO DE UMA IDENTIDADE NACIONAL

Trabalhando nos sintomas desse cenário, grandes nomes internacionais


parecem confirmar essa tendência. Cindy Sherman fotografa-se, assumindo
identidades variadas. A francesa Louise Bourgeois, com mais de 80 anos de idade,
é uma das mais radicais artistas da atualidade, construindo universos escultóricos
que mesclam autobiografia e erotismo. O norte-americano Mathew Barney cria em
seus filmes uma mitologia miscigenada, misturando tempos e espaços.

No Brasil, Adriana Varejão pinta fachadas de azulejaria portuguesa


sangrando como se em carne viva, criando um potente comentário sobre a história
colonial e seus rastros de sofrimento. Ernesto Neto constrói com náilon, espuma e
enchimentos, verdadeiras metáforas de nossos órgãos e peles.

Em meio a múltiplas possibilidades de usos de materiais, espaços e tempos,


a arte contemporânea não separa a rua e o museu. O coreógrafo Ivaldo Bertazzo
mescla tradições étnicas milenares com o gestual urbano de crianças e jovens de
favelas brasileiras. O músico Naná Vasconcelos utiliza com precisão sons do corpo e
voz de milhares de pessoas e afirma que Villa-Lobos é um “genuíno músico popular,
já que consegue fazer ecoar os sons do povo, ainda que de forma sinfônica”.

Felizmente, a arte contemporânea tem a liberdade de apontar suas heranças


e sua história sem precisar ir ao grau zero da originalidade e está cada vez mais
infiltrada nas peles da vida. Assim ela permanece pulsando.

Kátia Canton é PhD em Artes pela Universidade de Nova York, docente e curadora
de arte do Museu de Arte Contemporânea da Universidade de São Paulo, autora
de vários livros, entre eles “Retrato da Arte Moderna”.

FONTE: Disponível em: <http://marcusneme.arteblog.com.br/3107/SOBRE-ARTE-


CONTEMPORANEA-Katia-Canton>. Acesso em: 20 mar. 2012.

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RESUMO DO TÓPICO 5
Nesse tópico você aprendeu que:

• A arte é parte do desenvolvimento do ser humano no mundo, com isso, no


desenvolvimento da cultura e de nosso processo de conhecimento pessoal,
social e cultural.

• É relevante o ensino da arte numa perspectiva histórica.

• Uma perspectiva histórica para o ensino da arte nos possibilita olhar para o que
os artistas contemporâneos produzem hoje e possamos, por meio de suas obras,
compreender melhor o nosso tempo.

• O ensino da arte não precisa e não deve ser realizado de forma linear.

• É importante o ensino da Arte Moderna e Contemporânea, articulando conceitos


e fundamentos para a compressão da arte.

• O ensino da arte contemporânea possibilita um olhar para a atualidade.

• Canton apresenta cinco temas fundamentais na arte contemporânea:

- Tempo e memória.
- Corpo, identidade e erotismo.
- Espaço e lugar.
- Das políticas às micropolíticas.
- Narrativas enviezadas.

215
AUTOATIVIDADE

A partir do que você leu sobre o ensino da Arte Brasileira, escreva


um texto articulando a relevância do ensino da arte brasileira no Ensino
Fundamental. Elabore três argumentos e defenda-os.

Assista ao vídeo de
resolução desta questão

216
REFERÊNCIAS
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