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4. FLEXÃO SIMPLES
Para o estudo das estruturas em concreto armado devemos estudar os esforços internos
gerados pelas cargas, neste primeiro momento iremos estudar a flexão.

4.1 TIPOS DE FLEXÃO

a) Flexão Pura: Quando não há esforço cortante atuando na seção, ou seja só atua o
momento fletor. Como na região central do exemplo abaixo.

Figura 9 – Exemplo flexão pura.

Fonte: Arquivo pessoal.

b) Flexão Simples: Quando há esforço cortante atuando na seção em conjunto com o


momento fletor. Como no exemplo abaixo.

Figura 10 – Exemplo flexão simples.

Fonte: Arquivo pessoal.

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Os elementos usualmente submetidos à flexão simples são as vigas e as lajes.

c) Flexão Composta: Quando há esforço normal atuando na seção em conjunto com o


momento fletor. Como no exemplo abaixo.

Figura 11 – Exemplo flexão composta.

Fonte: Arquivo pessoal.

Os elementos usualmente submetidos à flexão composta são os pilares.

4.2 ESTÁDIOS DE DEFORMAÇÃO

Para que se possa analisar o desempenho de uma seção de concreto aplica-se um


carregamento até a ruptura. As diversas fases pelas quais passa a seção de concreto, ao
longo do carregamento, dá-se o nome de estádios. Distinguem-se basicamente três fases
distintas: estádio I, estádio II e estádio III.

a) Estádio I

Esta fase corresponde ao início do carregamento. As tensões normais que surgem são de
baixa magnitude e dessa forma o concreto consegue resistir às tensões de tração. Tem-se
um diagrama linear de tensões, ao longo da seção transversal da peça. Levando-se em
consideração a baixa resistência do concreto à tração, se comparada com a resistência à
compressão, percebe-se a inviabilidade de um possível dimensionamento neste estádio. É
no estádio I que é feito o cálculo do momento de fissuração, que separa o estádio I do
estádio II. Conhecido o momento de fissuração, é possível calcular a armadura mínima, de
modo que esta seja capaz de absorver, com adequada segurança, as tensões causadas por
um momento fletor de mesma magnitude. Portanto, o estádio I termina quando a seção
fissura.

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Figura 12 – Comportamento da seção de concreto no estádio I.

Fonte: PINHEIRO (2015).

b) Estádio II

Neste nível de carregamento, o concreto não mais resiste à tração e a seção se encontra
fissurada na região tracionada. A contribuição do concreto tracionado é desprezada. No
entanto, a parte comprimida ainda mantém um diagrama linear de tensões, permanecendo
válida a lei de Hooke. Basicamente, o estádio II serve para a verificação da peça em serviço.
Como exemplos, citam-se o estado limite de abertura de fissuras e o estado limite de
deformações excessivas. Com a evolução do carregamento, as fissuras caminham no
sentido da borda comprimida, a tensão na armadura cresce, podendo atingir o escoamento
ou não. O estádio II termina com o inicio da plastificação do concreto comprimido.

Figura 13 – Comportamento da seção de concreto no estádio II.

Fonte: PINHEIRO (2015).

c) Estádio III

No estádio III, a região comprimida encontra-se plastificada e o concreto dessa região está
na iminência da ruptura. Admite-se que o diagrama de tensões seja da forma parabólico-
retangular, também conhecido como diagrama parábola-retângulo. É no estádio III que é
feito o dimensionamento estrutural, situação que se denomina “cálculo na ruptura” ou
“cálculo no estádio III”.

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Figura 14 – Comportamento da seção de concreto no estádio III.

Fonte: PINHEIRO (2015).

O diagrama parábola-retângulo é formado por um trecho retangular, para deformação de


compressão variando de 2 ‰ até 3,5 ‰, com tensão de compressão σcd = 0,85*fcd, e um
trecho no qual a tensão varia segundo uma parábola do segundo grau.

A Norma Brasileira permite, para efeito de cálculo, que se trabalhe com um diagrama
retangular equivalente com altura do diagrama é igual a 0,8x. A tensão limite é σcd =
0,85*fcd.

Figura 15 - Diagramas parábola-retângulo e retangular equivalente.

Fonte: PINHEIRO (2015).

Onde:

d = altura útil, distância do da fibra mais comprimida de concreto até o centro de gravidade
da armadura tracionada.

x = posição da linha neutra, distância da borda mais comprimida do concreto ao ponto em


que as deformações e tensões são nulas. A linha que separa a região comprimida da região
tracionada.

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4.3 EQUAÇÕES DE EQUILÍBRIO

Figura 16 - Distribuição de tensões de compressão segundo os diagramas parábola-retângulo e


retangular simplificado.

Fonte: BASTOS (2015).

a) Equilíbrio de Forças Normais

Considerando que na flexão simples não ocorrem forças normais solicitantes, e que a força
resultante das tensões de compressão no concreto deve estar em equilíbrio com a força
resultante das tensões de tração pode-se escrever:

𝑅𝑐𝑐 = 𝑅𝑠𝑡

F
Tomando da Resistência dos Materiais que σ = , a força resultante das tensões de
A
compressão no concreto, considerando o diagrama retangular simplificado, pode ser escrita
como:

Rcc
σcd =
Ac

Rcc = σcd ∗ 𝐴𝑐

onde:

σcd = máxima tensão de cálculo resistida pela fibra mais comprimida (0,85*fcd);

Ac = área de concreto comprimido.

Considerando a área de concreto comprimido (Ac) correspondente ao diagrama retangular


simplificado com altura 0,8x fica:

Rcc = 0,85 ∗ fcd ∗ (0,8𝑥 ∗ 𝑏𝑤)

Rcc = 0,68 ∗ bw ∗ x ∗ fcd

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e a força resultante das tensões de tração na armadura tracionada:

Rst
σsd =
As

Rst = σsd ∗ 𝐴𝑠

Rst = fyd ∗ 𝐴𝑠

com

σsd = tensão de cálculo na armadura tracionada (fyd);

As = área de aço da armadura tracionada.

b) Equilíbrio de Momentos Fletores

Considerando o equilíbrio de momentos fletores na seção, o momento fletor solicitante deve


ser equilibrado por um momento fletor resistente, proporcionado pelo concreto comprimido e
pela armadura tracionada. Assumindo valores de cálculo, por simplicidade de notação
ambos os momentos fletores devem ser iguais ao momento fletor de cálculo Md , tal que:

𝑀𝑠𝑜𝑙𝑖𝑐 = 𝑀𝑟𝑒𝑠𝑖𝑠𝑡 = 𝑀𝑑

As forças resistentes internas, proporcionadas pelo concreto comprimido e pela armadura


tracionada, formam um binário oposto ao momento fletor solicitante, podendo ser escrito:

𝑀𝑑 = 𝑅𝑐𝑐 ∗ 𝑍

𝑀𝑑 = 𝑅𝑠𝑡 ∗ 𝑍

onde:

𝑅𝑐𝑐 ∗ 𝑍 = momento interno resistente, proporcionado pelo concreto comprimido;

𝑅𝑠𝑡 ∗ 𝑍 = o momento interno resistente, proporcionado pela armadura tracionada.

Com Z = d – 0,4x, temos:

𝑀𝑑 = 𝑅𝑐𝑐 ∗ 𝑍

𝑀𝑑 = 0,68 ∗ bw ∗ x ∗ fcd ∗ (d − 0,4x)

𝑀𝑑 = 𝑅𝑠𝑡 ∗ 𝑍

𝑀𝑑 = (fyd ∗ 𝐴𝑠) ∗ (𝑑 − 0,4𝑥)

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𝑀𝑑
𝐴𝑠 =
𝑓𝑦𝑑 ∗ (𝑑 − 0,4𝑥)

4.4 DOMÍNIOS E DEFORMAÇÃO

Ao analisarmos o diagrama tensão deformação da peça de concreto armado, podemos


observar que o estado limite último de flexão no concreto armado é atingido quando:

a) A deformação de encurtamento (compressão) do concreto (εcu) atinge 3,5 ‰, ou 0,35%


ou 0,0035. Quando excede 3,5 ‰ a ruptura ocorre por esmagamento do concreto.

b) A deformação de alongamento (tração) do aço (εs) atinge 10 ‰ ou 1% ou 0,01. Quando


excede 10 ‰ a ruptura ocorre por alongamento excessivo do aço.

As deformações nos materiais componentes das vigas e lajes de concreto armado


submetidas à flexão simples encontram-se nos domínios de deformação 2, 3 ou 4, conforme
definidos na NBR 6118 (2014) item 17.2.2.

Figura 17 – Domínios de deformação.

Fonte: Arquivo pessoal.

Domínio 2: O aço está sob deformação máxima (εs = 10 ‰) e o concreto sob deformação
(εc < 3,5 ‰), ou seja, sob a deformação de 10 ‰ a tensão na armadura corresponde à
máxima permitida no aço (fyd), portanto, a armadura tracionada é econômica, isto é, a
máxima tensão possível no aço pode ser implementada nessa armadura, e o concreto não
trabalha na sua capacidade máxima, pois a deformação estará abaixo ou igual aos 3,5 ‰ .
Na questão relativa à segurança, no caso de ocorrer ruptura, esta será com “aviso prévio”,
porque como a armadura continuará escoando além dos 10 ‰, a fissuração na viga será
intensa e ocorrerá antes de uma possível ruptura por esmagamento do concreto na região
comprimida. A intensa fissuração será visível e funcionará como um aviso aos usuários de
que a viga apresenta um problema sério, alertando-os, de modo que sejam tomadas
medidas visando à evacuação do local, antes que a ruptura venha a ocorrer.

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Posição da linha neutra para o limite entre o domínio 2 e o domínio 3

Figura 18 – Posição da linha neutra no limite entre o domínio 2 e o domínio 3.

Fonte: Arquivo pessoal.

0,0035 0,01
=
𝑥23 𝑑 − 𝑥23

0,01 ∗ 𝑥23 = 0,0035 ∗ (𝑑 − 𝑥23)

0,01 ∗ 𝑥23 = 0,0035 ∗ 𝑑 − 0,0035 ∗ 𝑥23

0,01 ∗ 𝑥23 + 0,0035 ∗ 𝑥23 = 0,0035 ∗ 𝑑

0,0135 ∗ 𝑥23 = 0,0035 ∗ 𝑑

0,0035 ∗ 𝑑
𝑥23 =
0,0135

𝑥23 = 0,259 ∗ 𝑑

Quando a posição da linha neutra ultrapassar 0,259*d os materiais da seção de concreto


armado terão uma deformação de acordo com o domínio 3.

Domínio 3: A deformação de encurtamento do concreto na fibra mais comprimida


corresponde a 3,5 ‰. A deformação de alongamento na armadura tracionada varia entre
εyd (deformação de início de escoamento do aço) e 10 ‰, ou seja εyd ≤ εs ≤ 10 ‰, o que
significa que a armadura escoa certo valor. Isso implica que, assim como no domínio 2, a
armadura também é econômica no domínio 3. Neste domínio, portanto, tanto o concreto
comprimido quanto o aço tracionado são aproveitados ao máximo, diferentemente do
domínio 2, onde o concreto tem deformações de encurtamento menores que a máxima (εc <
3,5 ‰). A ruptura no domínio 3 é também chamada com “aviso prévio”, pois a armadura, ao
escoar, acarretará fissuras visíveis na viga, antes que o concreto alcance a ruptura por
esmagamento.

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Posição da linha neutra para o limite entre o domínio 3 e o domínio 4

Figura 19 – Posição da linha neutra no limite entre o domínio 3 e o domínio 4.

Fonte: Arquivo pessoal.

0,0035 𝜀𝑦𝑑
=
𝑥34 𝑑 − 𝑥34

𝜀𝑦𝑑 ∗ 𝑥34 = 0,0035 ∗ (𝑑 − 𝑥34)

Para o aço CA-50, εyd = 2,07 ‰ logo:

0,00207 ∗ 𝑥34 = 0,0035 ∗ 𝑑 − 0,0035 ∗ 𝑥34

0,00207 ∗ 𝑥34 + 0,0035 ∗ 𝑥34 = 0,0035 ∗ 𝑑

0,00557 ∗ 𝑥34 = 0,0035 ∗ 𝑑

0,0035 ∗ 𝑑
𝑥34 =
0,00557

𝑥34 = 0,628 ∗ 𝑑, 𝑝𝑎𝑟𝑎 𝐶𝐴 − 50

Para o aço CA-60, εyd = 2,48 ‰ logo:

0,00248 ∗ 𝑥34 = 0,0035 ∗ 𝑑 − 0,0035 ∗ 𝑥34

0,00248 ∗ 𝑥34 + 0,0035 ∗ 𝑥34 = 0,0035 ∗ 𝑑

0,00598 ∗ 𝑥34 = 0,0035 ∗ 𝑑

0,0035 ∗ 𝑑
𝑥34 =
0,00598

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𝑥34 = 0,585 ∗ 𝑑, 𝑝𝑎𝑟𝑎 𝐶𝐴 − 60

Quando a posição da linha neutra ultrapassar 0,628*d para elementos com aço CA-50 e
0,585*d para elementos com aço CA-60, os materiais da seção de concreto armado terão
uma deformação de acordo com o domínio 4.

Domínio 4: A deformação de encurtamento do concreto na fibra mais comprimida está com


o valor máximo de 3,5 ‰, e a armadura tracionada não está escoando, pois sua deformação
é menor que a de início de escoamento (εyd). A armadura resulta, portanto, antieconômica,
pois não aproveita a máxima capacidade resistente do aço. Diz-se então que a armadura
está “folgada” e a seção é chamada superarmada.

As vigas não podem ser projetadas à flexão simples no domínio 4, pois além da questão
econômica, a ruptura, se ocorrer, será do tipo “frágil”, ou “sem aviso prévio”, onde o concreto
rompe (esmaga) por compressão, causando o colapso da viga antes da intensa fissuração
provocada pelo aumento do alongamento na armadura tracionada. Segundo a ABNT NBR
6118:2014 a “ruptura frágil está associada a posições da linha neutra no domínio 4, com ou
sem armadura de compressão.”

Como conclusão podemos afirmar que as vigas e lajes devem ser projetadas à flexão
simples nos domínios 2 ou 3, e não podem ser projetadas no domínio 4. Para
complementar essa análise, é importante observar que a ABNT NBR 6118:2014 no item
14.6.4.3 apresenta limites para a posição da linha neutra que visam dotar as vigas e lajes de
ductilidade, afirmando que quanto menor for a relação x/d (x = posição da linha neutra, d =
altura útil da viga), maior será a ductilidade. Os limites são:
𝑥
≤ 0,45, 𝑝𝑎𝑟𝑎 𝑐𝑜𝑛𝑐𝑟𝑒𝑡𝑜𝑠 𝑐𝑜𝑚 𝑓𝑐𝑘 ≤ 50 𝑀𝑃𝑎
𝑑

𝑥
≤ 0,35, 𝑝𝑎𝑟𝑎 𝑐𝑜𝑛𝑐𝑟𝑒𝑡𝑜𝑠 𝑐𝑜𝑚 𝑓𝑐𝑘 > 50 𝑀𝑃𝑎
𝑑

BIBLIOGRAFIA

ASSOCIAÇÃO BRASILEIRA DE NORMAS TÉCNICAS. NBR 6118:2014 - Projeto de


estruturas de concreto - Procedimento. Rio de Janeiro, ABNT, 2014.

BASTOS, P. S. S. Notas de Aula Concreto Armado 1 – Flexão Normal Simples - Vigas.


Bauru: UNESP, 2015. Disponível em:
<http://wwwp.feb.unesp.br/pbastos/concreto1/FlexaoSimples.pdf>. Acesso em: 18 fev. 2018.

CARVALHO, R. C.; FIGUEIREDO FILHO, J. R. Cálculo e Detalhamento de


Estruturas Usuais de Concreto Armado: Segundo a NBR 6118:2014. 4. ed. São Carlos:
EdUFSCar, 2013.

PINHEIRO, L. M. Fundamentos do concreto e projeto de edifícios. São Carlos: USP,


2007. Disponível em:
<http://coral.ufsm.br/decc/ECC1006/Downloads/Apost_EESC_USP_Libanio.pdf>. Acesso
em: 18 fev. 2018.

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