Você está na página 1de 5

Universidade de Brasília

Instituto de Ciências Humanas (ICH)


Departamento de História (HIS)
História da África – 1°/2020 – Código: 139351 - Turma A
Docente: Estevam C. Thompson
Discente: Ana Maria Sousa Braga Vieira - Matricula 190097493
“Diásporas Africanas no Brasil”

INTRODUÇÃO

O presente ensaio tem como principal objetivo fazer uma reflexão acerca da relação
de corpos, cultura e religião de africanos no Brasil e como elas eram subjugadas perante o
poderio do homem branco. Tendo em vista as prerrogativas abordadas por Slenes em seu texto,
bem como os aspectos estruturados no texto de João José Reis, James Sweet e minhas reflexões
sobre a temática no contexto social e cultural do Brasil na época.

No que diz respeito à diáspora de africanos no Brasil, é possível dizer que existem várias teses
com demasiadas visões acerca da cultura, da vivência e das práticas religiosas destes. Em seus
textos, os autores refutam algumas teses clássicas, como a de que escravos eram preguiçosos e
não gostavam de trabalhar. Também é possível analisar a forma com que os senhores detinham
domínio sobre a sociedade escrava, tomando posse não apenas de seus trabalhos braçais, mas
de suas entidades religiosas e práticas como a de adivinhação. Usando destas para benefício
próprio. Além disso, importante ressaltar que os escravos detinham de sua própria representação
cultural e social, porém, para isso, necessitavam de estar dentro de uma constituição familiar,
casando entre si e obtendo uma família e lugar para morar.
Também é possível neste ensaio, perceber que, mesmo com as muitas maneiras de dominações,
os africanos não deixavam de acreditar em suas crenças e também detinham de suas próprias
instituições, mesmo que não fossem perfeitas. Que eles não eram de um todo ignorantes sobre
onde estavam e que detinham de grande capacidade de organização e planejamento dos
escravos, como a revolta dos malês pode mostrar. O sucesso dos malês em constituir uma
comunidade religiosa relativamente coesa e atraente deve ter inspirado muitas conversões, não
havendo fronteira entre religião e rebelião.
DESENVOLVIMENTO

Acerca da vinda de alguns escravos para o Brasil no século XIX, Slenes nos diz que:
“A grande maioria desses africanos provém da região da atual Angola e do “Congo-
Norte”, onde predomina sociedades falantes das línguas bantu. Praticamente todas
essas sociedades “se estruturam em torno da família concebida como linhagem: isto,
é, como um grupo de parentesco que traça sua origem a partir de ancestrais comuns,”
(SLENES: 1999, 143)

Também faz uso de pesquisas com bases em dados de estatística (SLENES: 1999, 142), além
de fontes culturais afim de analisar a história desses escravos e suas constituições familiares no
Brasil. Em seu texto, o autor também contesta o mito de que escravos não trabalhavam, que
eram preguiçosos. Aponta para um desmonte acerca do olhar do branco sobre o lar negro. Para
isso, ele recolheu dados de famílias em Campinas de 187, no qual a maioria das mulheres acima
de 15 anos eram casadas, mostrando que o imagético da mulher escrava promíscua não era bem
sucedida pelo menos no campo a qual ele pesquisava. Além disso, das famílias escravas pelo
menos um de seus filhos menores de 10 anos conviva com eles, por fazendo uma porcentagem
maior que a metade.
Segundo o autor, “80% dos cativos adultos (acima de 15 anos) nas regiões do Rio de Janeiro,
São Paulo e Sul de Minas Gerais provinham da África. A herança cultural dos escravizados é
trazida, portanto, por desterrados da África” (SLENES: 1999, 142). É importante ressaltar que
segundo sua tese, existia no Brasil um projeto disciplinar feito pelos senhores de escravos, que
procurava controlar o comportamento sexual, seja abusando ou impedindo os escravos de terem
relações com outras pessoas. Na arquitetura escravista, os escravos eram divididos por sexo em
pavilhões, aglomerados nas senzalas. Quando casavam, conferiam acesso a um espaço próprio,
mesmo que só um pequeno pedaço dentro da própria senzala. “O casamento traria vantagens
emocionais e psicológicas, entretanto, essas só poderiam ser analisadas no contexto da vida
material e cultural” (SLENES:1999, 149).
De maneira geral, é possível perceber que haviam diferentes formas de tratamento entre
escravos e senhores brancos, e até mesmo entre os próprios africanos. Na leitura dos textos, fica
claro que à época, alguns africanos podiam até mesmo prejudicar um dos seus para benefício
próprio, outros, detinham de uma vontade de inverter os papeis na estrutura de dominação com
um suposto plano de escravização dos mulatos, que segundo estes, não faziam parte de sua
estrutura racial. Como mostra Reis em seu texto, a rebelião mais conhecida como “Revolta”
dos malês não foi uma explosão espontânea, pelo contrário, foi muito bem organizada, e revela
grande capacidade de organização e planejamento dos escravos. Isso por si só já desmonta a
tese de que africanos escravos não tinham inteligência ou liderança para demandar um projeto
em benefício dos seus objetivos e pensamentos. Além do planejamento sólido e a articulação
da rebelião no final de 1834, membros centrais da rebelião revelaram pouco a respeito de sua
organização quando capturados. Isso demonstra que existia entre estes uma forte rede de
comunicação, no qual até mesmo indivíduos do interior foram participar da revolta. José Reis
mostra que esses indivíduos sabiam o que estavam acontecendo, não estavam perdidos dentro
do país ou desconectados do que acontecia mundo afora e que existia uma conexão entre a
rebelião e a expansão do Islã entre os escravos na Bahia.

O catolicismo era religião oficial desde a Constituição de 1824. Estrangeiros podiam exercer
seus rituais religiosos privadamente, mas as religiões escravas eram ilegais. Ou seja, o Islã era
uma religião exclusivamente africana que unia escravos e libertos, com potencial de unir
também vários grupos étnicos que não faziam parte da religião católica. Isso demonstra que os
africanos estavam intrinsecamente interligados através das suas práticas religiosas, firmando
uma aliança entre malês e demais africanos.

Acerca do que foi discorrido até aqui, pode-se dizer que

“Em resumo, o racismo os preconceitos culturais e a ideologia do trabalho da época


predispunham os viajantes europeus e os brasileiros “homens de bem” a verem os
negros, que aparentemente não seguiam suas regras na vida íntima, como
desregrados.” (SLENES: 1999, 141)

Segundo Sweet, quando os africanos se tornaram propriedade humana, não sendo mais senhores
dos seus próprios destinos sociais e políticos, a adivinhação transformou-se para acomodar-se
à nova condição de escravizados no mundo atlântico. Da mesma forma, a desordem social era
uma característica comum da escravidão e, sem dúvida, muitos indivíduos ou a comunidade
como um todo procuraram os adivinhos para indagar e buscar explicações no mundo espiritual.
A própria escravidão exigia uma explicação, assim como todas as epidemias ou os períodos de
fome que geralmente acompanhavam a experiência. Nas recém-formadas comunidades de
escravos na diáspora, os africanos tentaram utilizar a adivinhação para forjar o mesmo balanço
comunitário que os adivinhos ajudaram a criar nas suas sociedades de origem. Os senhores
aceitavam essa prática e utilizavam-se dela para controlar os seus escravos. Justamente porque
esses rituais eram amplamente respeitados entre os escravos, as adivinhações eram quase
sempre aceitas como válidas dentro dessa comunidade, ainda que frequentemente envolvesse
africanos e seus descendentes. Utilizando-se de supostas invocações por parte do mundo dos
espíritos, os adivinhos investigavam através de “conselhos” afim de relevar a culpa ou a
inocências dos suspeitos. No Brasil, rituais e práticas centro-africanas distintas mantiveram-se,
inclusive quando adaptações foram necessárias para atender às demandas de uma sociedade
escravocrata. (Sweet: 2016, 181-182).

CONCLUSÃO

Tendo em vista tudo o que foi disposto acima, pode-se dizer que a diáspora africana no Brasil
dispôs de diversos pontos de vista, no qual estes eram vistos desde simples corpos sem posse
alguma sobre si a revoltos que detinham de inteligência suficiente para demandar uma grande
revolta. No que diz respeito aos textos lidos, acredito que as vivências escravas dentro do Brasil
detêm de demasiados preconceitos e racismo exacerbado por parte da sociedade branca. Além
disso, pode-se dizer segundo as análises, que escravos que constituíam família viviam de
melhor forma que aqueles que eram sozinhos. De maneira geral, a classe escrava era tratada
como seres animalescos, enfiados em lugares apertados e frequentemente mal construídos,
trancados quando não mais eram necessários. Mas, quando juntos, poderiam se converter em
grandes alianças e grupos em prol de objetivos iguais ou aproximados, fazendo com que
ocorressem grandes rebeliões e revoltas, como foi a revolta dos Malês. Portanto, é possível
dizer que a família, a cultura, os modos de vidas e as instituições africanas poderiam ser postas
a prova e aproveitadas pelos brancos, mas isso não fazia com que eles deserdassem das suas
próprias origens e linhagens.
BIBLIOGRAFIA

SLENES, Robert W. “Esperanças e recordações: condições de cativeiro, cultura centro-


africana e estratégias familiares”, Na senzala uma flor: Esperanças e recordações na
formação da família escrava – Brasil, Sudeste, século XIX (Rio de Janeiro: Nova Fronteira,
1999), 131 236.

REIS, João José. “Um califado baiano? Os malês e a rebelião”, Rebelião Escrava no Brasil:
a história do levante dos malês, 1835 (São Paulo: Brasiliense, 1986), 136-155.

SWEET, James. “Coisa para branco não ver’: manifestações religiosas centro-africanas
no Brasil do século XVII”, in LIBERATO, Carlos;

CANDIDO, Mariana; LOVEJOY, Paul; SOULODRE - LA FRANCE, Renée. “Laços


Atlânticos: África e africanos durante a era do comércio transatlântico de escravos”
(Luanda: Ministério da Cultura, 2016), 175-187.

Você também pode gostar