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1.

Introdução
Antes de começar a escrever eu tinha uma visão diferente
da profissão de escritor. Imaginava uma pessoa esperando
a inspiração, sentada sozinha diante de um computador,
bebendo uísque. Esperando a inspiração chegar.
Mas isso é inviável. É difícil escrever uma história sem
saber o que vai acontecer. Mais difícil ainda fazer isso e
ainda conseguir escrever uma história boa.
É complicado fazer uma história de sucesso sem planos.
Para isso, você tem que saber o que planejar.
O que muita gente não sabe é que histórias não são apenas
cenas que vão se desenrolando ao bel prazer do escritor.
Existe um ritmo específico, um padrão na forma como nós
contamos histórias.
Nós precisamos nos identificar com o personagem antes
de vê-lo arriscar tudo. Precisamos vê-lo fraquejar antes
de vencer. Caso contrário, a emoção da vitória é menor.
O papel do escritor -- ou pelo menos do bom escritor -- é
provocar emoções no leitor.
Então eu fui atrás de descobrir a resposta da pergunta que
muito escritor se faz: como escrever uma história de
sucesso?
Eu li mais de dez livros de teoria literária. Assisti
palestras. Li dezenas de posts em blogs, em português,
inglês, espanhol. Por três anos eu corri atrás do máximo
de informação possível sobre o assunto.
E eu descobri uma coisa.
Existe uma estrutura para criar histórias de sucesso. Se
essa estrutura for seguida, as histórias ficam com um ritmo
interessante. Elas fazem mais sentido. Elas ressoam com
algo no subconsciente do leitor, a nossa parte que espera
algumas certas características em histórias.
Ao longo das próximas páginas, você vai ver quais
características são essas. Vai reconhecê-las. Vai aprender
a identificar esses elementos em vários livros e filmes.
A base da teoria desse livro
Eu já escrevo há algum tempo. Escrever paga parte das
minhas contas. Mas não fiquei famoso ainda.
Eu não sou a pessoa mais indicada para ensinar como
escrever livros de sucesso, você pode estar pensando.
Você tem razão.
Mas nenhuma das teorias deste livro é minha.
Eu apresento neste ebook uma coletânea resumida das
teorias que coletei em três anos de pesquisa. Eu condensei
em cerca de 50 páginas as teorias que estão destiladas em
muitos livros e vídeos.
Mas não pense que o conteúdo é raso. Eu quis evitar o
problema de livros que enrolam pra chegar ao ponto. Eu
tentei colocar o máximo de informação possível por
página, com exemplos para ajudar a entender o que estou
falando.
Aqui você vai entender toda a base da teoria a um preço
acessível e em português, sem ter que ler milhares de
páginas antes de começar a escrever seu livro.
E se depois de ler isso tudo você quiser se aprofundar
mais, no final do livro você vai encontrar sugestões de
outros livros para ler.
2. O que você vai encontrar
neste livro
Eu li muitos livros pra reunir as informações que
apresento aqui. Livros de autores famosos e dos seus
editores. Livros de agentes responsáveis por grandes
obras de sucesso.
Você vai encontrar aqui uma coletânea das técnicas
apresentadas. E pra quem quiser se aprofundar mais, no
final deste livro eu apresento quais são os melhores livros
pra continuar estudando estrutura de roteiro.
No capítulo 3, eu dou um resumo da estrutura dos quatro
atos. Logo em seguida, no capítulo 4 eu dou exemplos de
histórias de sucesso que usam essa estrutura.
No capítulo 5, explico por que é importante usar a teoria
que eu apresento neste livro.
No capítulo 6, veremos um resumo rápido de cada etapa
importante do roteiro. Os quatro Atos, os 3 Pontos de
Virada entre eles, o Incidente Inicial, e os dois momentos
que os teoristas chamam de Pontos de Aperto.
É importante entender por alto cada etapa para ter uma
visão geral, e depois ir mais a fundo em cada elemento.
Depois, nos próximos 10 capítulos (7 ao 16), vamos ver
a fundo cada etapa do roteiro em ordem. Você vai
entender o que vai naquela parte, que tipo de drama
estamos tentando criar, e como o personagem reage. Em
cada um, vou usar exemplos de histórias famosas para
deixar mais fácil de entender.
No capítulo 17, eu faço considerações sobre os capítulos
anteriores, respondo às dúvidas mais comuns e dou dicas
que ajudam a planejar seu roteiro e ficar um passo mais
próximo de criar uma história de sucesso.
E por fim, no capítulo 18, apresento sugestões de outros
livros para ler caso queira se aprofundar ainda mais na
teoria que apresento aqui.
Ao longo do livro eu vou usar termos como "aventura" e
"conflito". Isso não significa que essa técnica funciona
apenas para histórias de aventura e ação. O conflito
central de um roteiro pode ser bem abrangente, desde um
milionário numa armadura voadora enfrentando terroristas
até uma dona de casa de meia idade lutando pela
conquista do amor da vida dela.
O mesmo vale para a aventura do livro. Ela nada mais é
do que o protagonista sendo retirado do seu meio e
colocado no conflito que citamos acima, onde ele precisa
enfrentar desafios maiores do que está acostumado pra
conseguir o que deseja.
Também vou usar termos como "herói". Neste livro, ele
significa o mesmo que "protagonista". É o personagem
principal que a história acompanha do começo ao fim.
Então, vamos começar.
3. A Estrutura dos Quatro Atos
Procurar padrões nas histórias não é algo novo.
Estudiosos perceberam os padrões na forma de contar
histórias há muitos séculos. Você já deve ter ouvido falar
do Aristóteles e sua teoria de que toda história tem
começo, meio e fim.
Isso pode parecer óbvio, mas toda a teoria de histórias
que temos hoje foi construída em cima disso.
Para pra pensar. Toda história que você já leu ou assistiu
tem começo, meio e fim. No começo, os conceitos e
personagens são introduzidos. Então alguma coisa
acontece.
No meio da história, o protagonista enfrenta os problemas,
sem conseguir vencer. Busca informações, busca meios de
conseguir o que quer.
Enfim a história segue para um desfecho, e termina com
um confronto final que responde a pergunta que a história
levantou.
Foi só com a chegada da indústria do cinema que nosso
modelo de histórias ficou ainda mais bem definido. Os
custos eram muito mais altos, então precisavam entender
melhor como é que se escreve uma história que agrada o
público. Ou seja, como é que se faz uma história de
sucesso.
Dessa necessidade surgiu a estrutura dos quatro atos.
Os quatro atos da história
Imagina que você corta sua história em quatro pedaços de
tamanhos aproximadamente iguais.
Cada pedaço é 25% da sua história. Vamos chamar os
pedaços de Ato 1, Ato 2, Ato 3 e Ato 4.
No Ato 1, os personagens são introduzidos. Os
ingredientes estão lá, mas o conflito central ainda não está
a todo vapor. Então algo acontece, forçando o
protagonista a enfrentar alguma coisa. Esse é o começo da
história.
No Ato 2, o protagonista agora está preso ao conflito
central. Mas ele ainda precisa se entender e preparar. Ele
foi jogado de surpresa em algo que ele não esperava
(ninguém espera um grande desafio), e acaba reagindo
mais do que indo atrás da solução. Até que ele tem um
ponto de virada onde deixa de ser a vítima.
No Ato 3, o protagonista agora está ativamente lutando
para resolver o conflito. Ele ainda não tem sucesso, mas
já sabe o que quer e quem (ou o que) ele está enfrentando.
As ações dele e do antagonista vão levar a história em
direção à conclusão final.
Os atos 2 e 3 são o meio da história.
E no Ato 4, os caminhos do protagonista e antagonista se
cruzam de uma forma explosiva onde o conflito central da
história vai ser resolvido de uma forma ou de outra. O fim
está próximo. Não há mais escapatória.
Na virada entre cada ato, temos um momento marcante que
vai levar a história numa nova direção e aumentar a tensão
ainda mais. Eu vou falar melhor desses pontos no futuro,
mas é importante prestar atenção que eles existem.
Acontecem mais ou menos em 25%, 50% e 75% da
história.
Mas antes de seguirmos adiante, preciso esclarecer o
ponto mais importante para quem vai estudar estrutura de
roteiro.
A estrutura é um guia, e não uma fórmula
fixa que restringe o autor
Quando as pessoas pensam em estrutura de roteiro, elas
pensam em fórmulas prontas. Pensam em algo tão restrito
que todas as histórias vão ficar iguais. Pensam nos livros
mais fracos do Dan Brown.
A estrutura dos quatro atos não é uma camisa de força
literária.
Ninguém vai segurar sua mão e te dizer o que vai
acontecer na sua história ou como você deve escrever.
Depois que você conhecer a teoria apresentada neste
livro, vai ver que ela não te diz o que escrever. Só dá
guias de quando certas coisas devem acontecer e porquê.
A estrutura ainda é tão aberta que você vai se beneficiar
sem limitar sua criatividade. Os quatro atos são usados
em qualquer tipo de história, seja ela de aventura,
romance, drama, suspense, etc.
O que é sugerido aqui são elementos tão básicos numa
história que você irá encontrá-los até em algumas
histórias escritas há mais de 1000 anos.
4. Exemplos da estrutura de
quatro atos
O modelo dos quatro atos é tão popular que é difícil
encontrar uma história que não se encaixe nesse padrão.
Ele foi criado analisando as histórias que contávamos
desde tempos antigos, e atualizado para nossas
expectativas modernas.
Esse padrão é tão importante que na indústria do cinema o
seu roteiro nem é levado a sério se não seguir o formato à
risca.
Talvez a melhor forma de entender essa estrutura seja com
exemplos. Vamos ver agora o exemplo de dois filmes bem
populares.
Filme: Homem de Ferro
Esse filme da Marvel fez um grande sucesso nos cinemas,
e é um bom exemplo dos quatro atos.
Ato 1: Somos apresentados aos personagens e suas vidas
cotidianas. Tony é capturado por terroristas. Ele e outro
engenheiro criam uma armadura para escaparem. O ato 1
termina com Tony se tornando o Homem de Ferro e
escapando do cativeiro. O engenheiro que o ajudou se
sacrifica, mas antes de morrer pede que Tony mude de
vida.
A partir desse ponto Tony não é mais o mesmo. Ele agora
está envolvido numa história que o arranca da vida
cotidiana.
Ato 2: Tony tem conflitos com seu sócio, que não quer que
ele mude o rumo da empresa (surge o antagonista). Ele vai
aprimorando a armadura enquanto tenta se acostumar com
a ideia do Homem de Ferro. Como é comum no Ato 2,
Tony ainda não está no controle, não está acostumado com
a armadura.
Ato 3: A virada do Ato 2 pro 3 acontece com Tony Stark
aprendendo a usar a armadura. Ele não é apenas mais
alguém aprendendo, agora ele está no controle. Ele
começa a realmente agir agora, e vai até o Oriente Médio
usar suas habilidades paro bem. Os conflitos com o sócio
pioram.
São as ações dos dois, Tony e seu sócio Obadiah, que
levam a história rumo ao desfecho.
Ato 4: Obadiah estava construindo uma armadura própria,
mas precisava do gerador do Stark para usá-la. Ele rouba
o gerador do peito do Tony e o deixa pra morrer. A tensão
foi elevada ao máximo agora. O clímax do conflito
acontece com um belo combate entre herói e antagonista, e
a história segue rumo a uma conclusão.
Apesar do resumo curto, dá pra ver que o filme usa uma
estrutura de quatro atos. E que a identidade de cada ato é
diferente dos outros. Em cada um, o protagonista está
diferente.
Vamos analisar outro filme.
Filme: Matrix
Outro filme de grande sucesso, Matrix bateu alguns
recordes de bilheteria quando foi lançado. Analisando o
filme, podemos ver também os quatro atos acontecendo,
com momentos de virada bem marcados entre eles.
Ato 1: Os personagens importantes são introduzidos. Neo
conhece Trinity, que o leva cada vez mais próximo a
descobrir o que é a Matrix. Ele tem contatos com os
agentes, mas só entra de vez na história principal quando
encontra Morpheus.
A virada para o Ato 2 é muito bem marcada. Aqui, a
escolha que o personagem tem que fazer é bem explícita.
Pílula vermelha ou azul?
Ato 2: Neo agora entende onde se meteu, mas não acredita
que é o escolhido. Ele está reagindo em vez de tomar as
rédeas da história. Ele treina com Morpheus (vê a
semelhança com o treinamento no Homem de Ferro?).
O Ato 2 termina com outro momento importante no filme.
A nave deles é atacada. Um dos membros da equipe trai o
Morpheus. A situação piora, a tensão aumenta.
Ato 3: Agora Neo precisa tomar uma atitude. Temos a
mudança de reativo para proativo. Ele vai atrás de
informações por conta própria e até tem um conflito com o
agente smith. E essa mudança de atitude dele culmina na
decisão de arriscar tudo para salvar Morpheus dos
agentes.
Novamente podemos ver que o Ato 4 chega quando os
dois lados do conflito tomaram atitudes que levam a
história a um ponto sem volta.
Ato 4: A tensão, que tinha sido elevada Ato a Ato, chega
ao clímax. Temos um grande confronto para resgatar
Morpheus, e então Neo e Agente Smith se enfrentam cara
a cara na batalha definitiva entre herói e vilão da história.
5. Por que usar essa estrutura
de roteiro
Muitos autores, mesmo sem conhecer a estrutura de quatro
atos, criam algo muito parecido com essa estrutura. Isso
acontece porque esse é o modelo básico de histórias que
crescemos consumindo desde pequenos. E nossos pais
antes de nós, e os pais deles. E assim por muitas e muitas
gerações.
Ter o conhecimento desse modelo de roteiro torna muito
mais fácil criar uma história que vai agradar as pessoas.
Bem mais fácil do que chegar numa estrutura parecida
depois de passar por várias revisões do material original.
Histórias precisam conquistar as pessoas, e elas fazem
isso entregando as emoções certas nos momentos certos.
Não chegamos a essa estrutura de forma arbitrária. Um
grande conflito com o antagonista mais perto do começo
não teria tanto impacto, por exemplo. Assim como o
personagem já tomar as rédeas e vencer assim que se
depara com um grande conflito não é realista.
A estrutura dos quatro atos tem sido usada há décadas com
tudo quanto é história de sucesso. Se você também almeja
sucesso pra sua história, independente do gênero, seria
sabotagem não usar também.
Não me entenda errado. Escrever uma história ainda vai
ser difícil. É um trabalho longo e demorado. Mas fica
mais fácil quando você sabe o que está tentando construir,
em vez de fazer tudo às cegas.
Esta estrutura é a ferramenta de qualidade que você vai
usar para construir algo de valor.
Então abra sua mente e deixe as dúvidas de lado por
enquanto. Mesmo que você prefira escrever sem planejar
nada antes, pelo menos vai ter uma ideia do que verificar
depois de escrever tudo.
Pra quem gosta de planejar, já vai saber o que precisa
elaborar antes de começar.
Mas lembre-se: escrever histórias de sucesso não é um
trabalho fácil. Estruturas ajudam, mas não existem
fórmulas mágicas. Então lembre-se sempre de praticar
bastante.
6. Todas as etapas do roteiro
Nós já vimos anteriormente algumas das etapas do roteiro.
Quatro Atos, três Pontos de Viradas entre cada um. Citei a
existência do Incidente Inicial e os dois Pontos de Aperto.
Esses 10 momentos são os suportes que sustentam uma
história de sucesso.
Vamos revisar cada um e explicar seu papel no roteiro
como um todo.
Ato 1
A história começa no ato 1. Aqui somos apresentados ao
personagem antes dele ser capturado pelo conflito central.
Nós vimos Neo antes de conhecer a Matrix; Tony Stark
antes de construir a armadura; Rose antes de conhecer e se
apaixonar pelo personagem do Leonardo DiCaprio em
Titanic.
Incidente Inicial
As pessoas ficariam entediadas de ver 25% da história
sem nada de importante acontecendo. Durante o Ato 1, tem
que acontecer algo que já vai começar a tirar as coisas
dos eixos e dar pistas do conflito que está por vir. Esse é
o incidente inicial.
É neste ponto que Neo vai começar descobrir sobre a
existência da Matrix, ou que Rose vai conhecer Jack.
Aqui, as coisas começam a sair dos eixos.
O Primeiro Ponto de Virada
O Incidente Inicial vai tirando as coisas dos eixos cada
vez mais, até que no final do Ato 1 alguma coisa acontece
que vai fazer o protagonista se envolver de vez no conflito
central. É neste momento que o leitor vai perceber pra
onde vai a história.
No Ponto de Virada pode estar bem explícito que uma
mudança vai acontecer, como Neo aceitando a pílula que
vai levá-lo a conhecer um novo mundo. Também pode ser
menos direto, como Rose desistindo do suicídio e
confiando em Jack.
Ato 2
O ponto de virada pode acontecer de várias formas, mas
ele sempre acaba jogando o protagonista em um "novo
mundo", e tendo um conflito crescente para encarar. Mas
os personagens em roteiros são como nós: quando
encaramos algo novo ficamos perdidos, sem saber o que
fazer.
Neste ato o protagonista está reagindo. Está explorando
suas opções, tentando entender as coisas. Ele ainda não
está no controle dos acontecimentos. Rose deixa Jack
guiá-la enquanto ela vai explorando aquele novo
relacionamento. Tony Stark aprende a usar a armadura.
O Primeiro Ponto de Aperto
Não podemos deixar o conflito central da história ser
esquecido pelo leitor ou espectador. Para isso, em algum
ponto no meio do Ato 2 temos o primeiro ponto de aperto.
Este é o momento em que somos lembrados do problema
que está crescendo.
Em Titanic, vemos Cal e seu ciúmes por Rose estar
passando tanto tempo com Jack. Em Homem de Ferro,
vemos Obadiah resistindo à nova direção que Tony quer
dar para a empresa. No Senhor dos Anéis, Frodo e seus
amigos são atacados pelos cavaleiros negros.
O Segundo Ponto de Virada
Na metade da história, temos o ponto de virada do Ato 2
pro 3. Aqui vemos uma mudança na atitude do
protagonista. Ele deixa de só explorar e reagir, e começa
a tomar as rédeas da situação.
Em Titanic, Rose decide se entregar para Jack, e fica nua
para ser pintada por ele no quarto, e ainda por cima o
navio bate no iceberg. Em Matrix, Morpheus é raptado
pelos agentes e Neo não pode mais ficar indeciso.
Ato 3
O protagonista agora chega no Ato 3 com uma nova
atitude, o que leva a novos problemas e uma tensão maior.
Ele precisa tomar as ações para encarar o problema, ou
começar a conter os danos do conflito.
No Ato 3, Tony Stark dominou a armadura e vai ao
Oriente Médio enfrentar terroristas. Rose e Jack precisam
agir rápido para sobreviver ao acidente que ameaça matar
a todos eles.
A tensão só cresce.
O Segundo Ponto de Aperto
Em roteiros, nada pode ser fácil. Quanto mais drama e
desafios, mais o leitor vai torcer pelo protagonista. Então
não podemos deixar que seja fácil para que ele seja
proativo. A tensão tem que aumentar.
No meio do Ato 3, temos um novo encontro com o
antagonista da história ou alguém que representa o perigo
dele. E desta vez o perigo tem que ser maior. Gandalf vai
cair em direção à morte certa. Jack vai ser preso enquanto
o navio continua a afundar. O sócio de Tony Stark vai
criar sua própria armadura.
O Terceiro Ponto de Virada
O terceiro Ato termina com a última grande virada no
roteiro. As ações do protagonista e antagonista vão levá-
los a uma cena que vai mudar o rumo da história.
O terceiro ponto de virada é um evento que vai colocar os
dois lados do conflito em rota de colisão. Agora não tem
como fugir, o fim está próximo de um jeito ou de outro.
Neo toma a decisão de partir para invadir o prédio cheio
de agentes e resgatar Morpheus. Obadiah rouba o reator
do peito do Tony Stark e usa a armadura para o mal. O fim
está próximo.
Ato 4
Nos outros três Atos o roteiro criou problemas e elevou a
tensão. No Ato 4 tudo é elevado a níveis explosivos antes
das coisas se resolverem. Como consequência do último
Ponto de Virada, protagonista e antagonista estão em rota
de colisão.
Toda a promessa do roteiro é agora posta em prática. Na
história de amor, o casal precisa lutar para ficar junto.
Numa história de bem versus mal, esse é o momento de
vencer o mal de uma vez por todas.
Agora que entendemos o papel de cada etapa do roteiro, é
hora de vermos a fundo como cada uma funciona. Temos
que ver como colocar a teoria em prática e com o que
temos de tomar cuidado.
7. Ato I - O Mundo Cotidiano
Os primeiros 25% da sua história são o Ato 1. Este é o
momento de instalação de todos os detalhes da sua
história na mente do leitor. Mas não pense que essa é uma
parte tranquila do seu roteiro.
O ato 1 precisa fazer várias coisas de uma vez só.
Ele precisa apresentar o protagonista no mundo cotidiano
e mostrar tudo que ele tem a perder com o conflito central
que vai acontecer depois. Precisa colocar o protagonista
nesse conflito, mostrar o antagonista, e ainda por cima
conquistar o leitor. Não podemos esquecer que é no
começo da história que a pessoa decide se vai continuar a
ler ou não.
Mas é importante ressaltar que o Ato 1 apenas introduz os
assuntos, sem revelar tudo por completo.
Se o antagonista for aparecer neste ato, a ideia é só
mostrar parte do perigo dele, ou uma mera pista de
problemas futuros.
Dar pistas de problemas futuros, aliás, é uma ótima
pedida neste Ato. É muito fácil cometer o erro de achar
que mostrar o cotidiano significa mostrar o personagem
acordando, tomando café da manhã, conversando com a
família.
Não é bem isso.
Você vai sim mostrar como é o mundo cotidiano do
protagonista, mas as coisas já tem que estar saindo dos
eixos antes do Ato 2 chegar.
Quando conhecemos Rose em Titanic, a relação dela com
Cal já não está boa. No começo do Senhor dos Anéis, já
temos vários elementos quebrando o cotidiano, como um
anel mágico e comportamentos estranhos do tio do Frodo.
Essas amostras de problemas que estão por vir são
chamadas de ganchos.
É importante colocar ganchos no começo da história,
porque isso vai fisgar o leitor. É o que vai fazer ele
continuar virando as páginas até que o conflito central da
história comece de vez.
Nós precisamos, inclusive, de um grande gancho no Ato 1.
É o que chamamos de Incidente Inicial. Vamos ver mais
sobre ele no próximo capítulo.
Mas se é pra tirar o personagem do mundo cotidiano,
porque começamos com ele lá? Existem dois bons
motivos.
O primeiro deles é que isso cria empatia entre o leitor e o
protagonista. É no começo da história que vemos como
temos pontos semelhantes entre nós. Em Matrix, Neo
trabalha num escritório, igual a dezenas de milhões de
outras pessoas no mundo todo.
O segundo motivo é que isso mostra a vida que o
personagem tem a perder se as coisas derem errado. E pra
ser emocionante, muita coisa vai ameaçar dar errado ao
longo da história.
Você precisa lembrar desses dois motivos, porque eles
são os maiores objetivos no ato 1.
Você precisa criar empatia com o protagonista, e mostrar
tudo que ele tem a perder. Na verdade, pode até nos
mostrar tudo que o protagonista já está perdendo por
causa do conflito principal que está surgindo.
É graças ao Ato 1 que entendemos tudo que Frodo está
abrindo mão ao sair numa aventura perigosa pelo mundo.
Ele deixou pra trás o conforto da casa onde cresceu, suas
muitas refeições por dia. Deixou pra trás alguns amigos, a
menina que ele gostava.
E nós sentimos o pesar dele, porque todos nós já tivemos
momentos na vida em que fomos forçados a sair da nossa
zona de conforto. É isso que constrói a empatia entre
leitor e protagonista.
Lembre-se disso: criar empatia, começar a mostrar o
perigo.
E o primeiro grande gostinho do perigo vem com o
Incidente Inicial…
8. O Incidente Inicial
Eu ressaltei a importância do Ato 1 não ser apenas uma
sequência de cenas pacatas do cotidiano, você se lembra?
Então, a melhor forma de fazer isso é já começar a
introduzir elementos do conflito central antes do
protagonista estar envolvido com ele (ou antes do conflito
começar, dependendo da história).
Tudo começa a dar errado com o Incidente Inicial.
Antes de vermos a fundo esse elemento, eu preciso
ressaltar que você tem que tomar cuidado pra não
confundir o Incidente Inicial com o Primeiro Ponto de
Virada.
O Primeiro Ponto de Virada é o assunto do próximo
capítulo. Ele é o que vai fechar o Ato 1 de uma forma que
o protagonista fique preso ao conflito central da história.
Ele não pode mais fugir do conflito sem perder algo.
Já o Incidente Inicial, que vamos tratar aqui, é um pouco
mais sutil. Ele vai introduzir o conflito na história, mas
sem amarrar o protagonista nesse conflito ainda.
O papel desse elemento de roteiro é mostrar para o leitor
que tem alguma coisa acontecendo. É um pequeno
gostinho do delicioso prato que vai ser servido no
decorrer da história.
Este é o momento em que as coisas começam a sair dos
eixos, mas o problema introduzido só se torna o conflito
central quando chegamos no Ponto de Virada entre o Ato 1
e Ato 2.
A maior função do Incidente Inicial no seu roteiro é servir
como um grande gancho para fisgar o leitor. Você quer que
seu público continue virando as páginas pra saber o que
vai acontecer a seguir, e você faz isso mostrando que tem
algo pra acontecer.
A segunda função é mostrar que há um problema
crescendo e que a história não vai ficar para sempre
acompanhando o mundo cotidiano do personagem. Como
o conflito central ainda não está em ação no Ato 1, é o
Incidente Inicial que vai ter o papel de fazer a tensão
começar a crescer na história.
Como este é um elemento mais sutil, ele é diferente das
outras partes do roteiro em relação à sua posição na
história. Ele não tem um momento específico para
acontecer, com exceção do fato de ter que acontecer no
Ato 1.
O momento do Incidente Inicial vai depender muito da sua
história e o ritmo que você quer dar pra ela.
Você tem a liberdade de posicionar este elemento de
roteiro mais cedo ou mais tarde no seu Ato 1, de acordo
com o ritmo que quiser impor na história. Eu recomendo
que você não deixe o Incidente Inicial muito perto do final
do Ato 1. Ele ficaria muito perto do Ponto de Virada, e
também demoraria muito pra fisgar o leitor.
Quando o Incidente Inicial vem bem cedo, a história já
pega um ritmo tenso desde o começo. Isto é o mais
recomendado para histórias que dependem muito da
tensão ou ação.
Alguns filmes, como O Homem de Ferro, já começam
usando isso logo na primeira cena (Tony Stark sendo
atacado e capturado).
Já quando ele vem mais tarde você tem mais tempo para
desenvolver o protagonista e outros personagens no
"mundo cotidiano" antes das coisas começarem a sair dos
eixos. Isso é recomendado para histórias que dependem
muito mais dos personagens ou que tenham um ritmo mais
cadenciado.
O perigo de colocar este elemento do roteiro mais distante
do começo da história é que você corre o risco de não ter
fisgado o leitor o bastante para fazê-lo continuar lendo.
Você precisa decidir onde vai colocar o Incidente Inicial
no seu Ato 1, pesando os prós e contras de colocá-lo mais
cedo ou mais tarde. Se estiver na dúvida e não souber
onde colocar, eu recomendaria um pouco antes da metade
do Ato 1. Este é um ponto seguro que não é nem muito
cedo e nem muito tarde.
Antes da gente seguir adiante, eu só preciso te lembrar
que o Incidente Inicial não precisa ser o único gancho
para fisgar o leitor. Você pode ter vários ganchos no
decorrer do Ato 1. Em muitas histórias isso é até
recomendado, mas sem exageros. O Incidente Inicial é
apenas o maior dos ganchos que você vai ter.
Depois de planejar onde as coisas vão começar a dar
errado, é hora de seguir adiante para o Primeiro Ponto de
Virada.
9. Primeiro Ponto de Virada:
O Portal Sem Retorno
Nós vimos que o Ato 1 começa no mundo cotidiano, e
depois algo vai criar um problema crescente. Mas chega
um momento em que precisamos amarrar o personagem ao
conflito central da história de uma forma que ele não
possa simplesmente virar as costas e ir para casa. Nossa
ferramenta para isso é o Primeiro Ponto de Virada.
Alguns teoristas chamam esse ponto de "O Portal Sem
Retorno". Uma vez que o protagonista tenha passado por
ele, não dá mais pra desistir sem pagar o preço.
Pensa comigo. Que graça teria criar um grande conflito na
sua história, se o personagem pudesse simplesmente falar
"não quero saber de problemas, vou pra casa" e a história
acabasse aí?
Eu te respondo. Não teria graça nenhuma.
Se o leitor não souber por quê seu protagonista está
passando por todo o sufoco do conflito central, a empatia
vai ser quebrada na mesma hora. O leitor vai achar que
seu personagem é idiota ou masoquista.
O papel do Primeiro Ponto de Virada é colocar o
protagonista no conflito central, de uma forma que ele não
possa mais desistir sem perdas.
Agora é mais fácil entender também o papel do Ato 1,
porque é o no começo da história que você vai mostrar o
que é que o protagonista tem pra perder. E ele tem que
entrar no Ato 2 com alguma ameaça pairando sobre as
coisas que ele tem a perder.
É por isso que ele não pode simplesmente desistir. Por
causa da ameaça.
Ameaça é um termo bem genérico aqui, ok? Pode ser uma
ameaça bem óbvia, como em Duro de Matar, onde
terroristas têm a esposa do protagonista de refém. Ou uma
ameaça mais abstrata, como o medo de não conseguir
conquistar seu grande amor. Talvez simplesmente uma
ameaça à sua própria segurança física.
O que importa é que o personagem entre no Ato 2 preso
ao conflito central da história. Que desistir (ou não
participar) tenha um custo.
Por isso eu repito. O Primeiro Ponto de Virada é o Portal
Sem Retorno. É o momento em que tudo muda. Desse
ponto em diante é que começa a verdadeira história do seu
livro (ou filme). E ela agora vai até o fim.
A Importância desse ponto
Se você só puder dar a devida atenção a um elemento de
roteiro em todo o seu livro, eu diria pra dar atenção a este
momento. O Primeiro Ponto de Virada é o momento mais
importante de toda a sua história. Até mais do que o final.
Tudo antes desse momento é a construção da sua história.
E o que acontece por todo o resto da história é uma
resposta ao que acontece aqui.
Sem conflito não há história, e é aqui que o conflito
central começa de verdade. O protagonista pode não ter
percebido o problema antes, mas agora não tem como
fugir.
O Primeiro Ponto de Virada arranca o protagonista da sua
zona de conforto. Tira dele coisas que ele se importa.
Ameaça outras coisas. Cria um problema do qual não dá
pra fugir, ou não é fácil fugir.
Se o protagonista tinha planos durante o Ato 1, eles
acabaram de mudar. Se ele tinha desejos, agora uma
barreira se colocou entre ele e o que ele quer.
Se o antagonista já tinha aparecido no Ato 1, ele também
acabou de mudar. Qualquer que seja o problema que ele
tenha com o protagonista, o problema acabou de ficar
maior ou mais real.
Muito do que eu falei pro seu personagem principal
também vale para o antagonista. Ele também não pode
simplesmente fugir do conflito central sem abrir mão de
alguma coisa.
Ao contrário do Incidente Inicial, você não tem muita
margem pra mudar o Primeiro Ponto de Virada de
posição. Ele tem que chegar mais ou menos aos 25% da
sua história.
Caso a sua história seja muito longa, é aceitável adiantar
ele até uns 20%. Mas nunca fuja muito dessa margem de
20 a 25%. Muito antes disso, e você vai fazer o
protagonista passar pelo Portal antes de ter criado a
empatia com o leitor. Muito depois disso, e você vai ter
ficado tempo demais no mundo cotidiano, e os leitores
vão ter largado seu livro de tanto tédio.
No mundo de roteiros de cinema, isso é tão importante
que muitos roteiros são simplesmente jogados no lixo se o
ponto de virada não estiver nessa posição. Se você não
concorda, guarda um pouco seus argumentos que eu volto
a falar um pouco mais disso no capítulo 17.
Analisando Exemplos
O Primeiro Ponto de Virada é tão importante na história
que eu vou querer analisar com você mais alguns
exemplos que podemos ver de filmes e livros.
No filme Colateral, um taxista está levando um assassino
por aí enquanto ele comete seus assassinatos. Em um
ponto da história, um cadáver cai sobre o teto do táxi.
Esse é o Incidente Inicial, não o ponto de virada. Nesse
momento, o taxista poderia sair do carro e ir pra polícia
sem abrir mão de nada.
É só aos 24% do filme que o assassino algema o taxista
no carro e diz que vai contratar os serviços dele para mais
outros assassinatos ao longo da noite. Se ele cooperar, vai
receber 600 dólares e sair ileso. Se não, é morto. A partir
desse ponto, tudo muda. O taxista não pode mais
simplesmente desistir e ir pra casa. Seus planos foram
cancelados, seus medos mudaram, e a ameaça surgiu.
Agora começou a história de verdade.
No livro O Código Da Vinci, o Incidente Inicial chega
bem cedo. Nós vemos o problema já começar nas
primeiras páginas, com o personagem Robert Langdon
sendo chamado para investigar um assassinato misterioso.
Mas até esse ponto, não havia nada impedindo Langdon de
decidir que estava cansado de investigar e que iria para
casa assistir vídeos de gatinhos no YouTube.
Entre os capítulos 24 e 26 (aproximadamente 25% do
livro), temos uma sequência onde descobrimos que
alguém está tentando matar o protagonista, e que a
mensagem no rosto da Monalisa o amarra pessoalmente ao
conflito. Agora a coisa mudou de figura. Não é apenas
mais um trabalho, agora existe um perigo real. Langdon
não pode decidir não participar, e existe uma ameaça
grave de perda se ele falhar.
Finalizando
Se você parar para analisar qualquer história de sucesso,
seja livro ou filme, você vai encontrar um Primeiro Ponto
de Virada entre 20 e 25%. Mesmo que o autor não esteja
usando a estrutura de quatro atos.
Você precisa de conflito para ter uma história. E se o
conflito for irrelevante, a história vai ser fraca. Então não
importa se o autor planejou isso ou chegou lá depois de
reescrever o roteiro várias vezes, ele sempre vai ter
alguma coisa que vai iniciar o conflito e amarrar o
protagonista a ele.
Mas essa estrutura é tão livre que cabe a você decidir
como e por que isso acontece.
O Primeiro Ponto de virada pode ser uma única cena.
Pode ser uma sequência de cenas. Pode ser explícito e
óbvio, como Neo escolhendo a pílula vermelha. Pode ser
mais sutil, como um casal se apaixonando. A ameaça que
ele traz pode ser ao protagonista, pode ser a algo que ele
gosta. Talvez seja o perigo de não atingir seus sonhos.
O que importa é que ele tem que acontecer. Se você quer
que o leitor se importe com o que vai acontecer nos três
próximos atos, você precisa de um bom Primeiro Ponto de
Virada.
E depois que ele acontece, começamos a história de
verdade no Ato 2…
10. Ato 2: Reagindo à virada
Se você escreveu um bom Ponto de Virada, o protagonista
acabou de ser tirado da sua zona de conforto de forma
inesperada. O Ato 2 foca na reação do herói ao que
aconteceu, e isso muitas vezes inclui sua relutância em
aceitar que as coisas mudaram.
O que você faria se tudo mudasse ao seu redor de
repente? Se alguém estivesse vindo pra te pegar. Se o seu
maior sonho tivesse acabado de ser destruído. Se tivesse
perdido alguém que ama?
Você ia imediatamente partir para a ação e tomar as
rédeas da situação? Ia ser o herói que salta pro meio das
chamas? Você ia tomar a melhor decisão que resolve tudo
de uma vez?
Eu provavelmente não.
A maioria das pessoas também não, eu acredito. As
pessoas buscam abrigo, conselhos, respostas. As pessoas
fogem. Se protegem. Buscam informações. Procuram um
lugar seguro pra entender o que está acontecendo e tentar
colocar os pensamentos em ordem.
É sobre isso que o Ato 2 trata. Isso e mais.
É claro que a reação exata do protagonista depende do
tipo de história e o que aconteceu no Primeiro Ponto de
Virada. Cada gênero vai exigir algo diferente. Mas o que
importa aqui é que o herói da história não vai estar em
condições de já começar a resolver os problemas. Ou
talvez nem tenha entendido (ou percebido) ainda os
problemas.
No Ato 2, o herói vai estar reagindo ao ponto de virada.
Mesmo que seja uma reação instintiva.
Se o amor da vida dele o rejeitou, ele vai se recolher na
sua tristeza. Vai tentar entender o que aconteceu. Vai tentar
conquistar seu amor de volta. Ou vai simplesmente
mandar ela se ferrar e vai sair da cidade para festejar.
Se alguém está tentando matar o herói ou seus entes
queridos, ele vai entrar em modo de defesa. Se esconder.
Talvez procurar a polícia. Tentar trancar todas as portas e
janelas de casa e ficar quieto no escuro.
Como eu falei, a reação exata depende da história e do
seu personagem. Mas o importante é que ele esteja
reagindo ao início do conflito. Neste momento da
história, o protagonista não tem todas as informações (ou
coragem, ou poder, ou equipamento, ou sabedoria) para
resolver o problema de verdade.
Se o Ato 1 cumpriu seu papel, você já criou uma empatia
do leitor com o herói. Já mostrou o que ele tem a perder
se falhar. Com essas duas coisas, o leitor já está fisgado.
E agora você pode fazer ele sofrer.
Você tem até os 50% da sua história para desenvolver o
conflito que o Primeiro Ponto de Virada disparou. Se você
quiser fazer o herói já começar a resolver as coisas,
segura a onda. Ainda é muito cedo.
Você precisa fazer o leitor sentir o peso do conflito antes
que ele possa começar a ser resolvido.
Se o herói já tentar resolver, ele vai falhar. Se ele fizer
planos, eles não vão dar certo. O antagonista vai parecer
estar ficando mais forte, chegando mais perto. O problema
parece aumentar.
O protagonista vai enfrentar seus demônios interiores. A
tensão aumenta. E com todas as derrotas e sofrimentos, ele
vai aprender mais sobre si mesmo (ou sobre o problema
que enfrenta).
No Código Da Vinci, por exemplo, vemos o herói Robert
Langdon apenas reagindo ao que descobriu no ponto de
virada. Ao mesmo tempo vemos de outro ponto de vista os
policiais tentando capturá-lo. Langdon vai correndo atrás
das informações para descobrir o que está acontecendo e
por quê. E as ações dele tornam ele mais suspeito pra
polícia. Ou seja, perigo aumentando. O problema se
eleva.
Vamos ver um outro exemplo. No livro Ender's Game, o
protagonista está na escola de batalha e ele entrou para o
Exército Salamandra, do personagem Bonzo. O que ele faz
até os 50% do livro é reagir a essas duas coisas. Ele
aprende a lutar em jogos de guerra de gravidade zero. Ele
faz amigos e inimigos como consequência de ter entrado
pro Exército Salamandra. E todas essas ações dele vão
aumentando a tensão até ele e Bonzo não aguentarem mais
se odiar.
No Ato 2, você vai construir cenas que reforçam o perigo,
enquanto também mostram a dificuldade que é resolver o
problema. Você vai construir uma tensão crescente até o
Segundo Ponto de Virada, aos 50% da história, em que
novos elementos são introduzidos para permitir que o
problema comece a ser resolvido.
E no meio disso tudo, a gente ainda insere um Ponto de
Aperto pra relembrar ao leitor do perigo que o antagonista
representa.
Vamos ver esses dois pontos com mais detalhes.
11. O Primeiro Ponto de Aperto
O Ato 2 vai levar o personagem dos 25% aos 50% da
história, enquanto ele reage aos problemas. O foco é o
herói da história. Mas não podemos deixar o leitor
esquecer do antagonista. Para isso temos a ferramenta do
Ponto de Aperto.
O Ponto de Aperto é uma lembrança ou demonstração dos
perigos do antagonista, ou do conflito principal. Ele
acontece no meio do Ato 2 (aproximadamente aos 32,5%
da história, se você gostar de matemática).
Mas fazemos isso sem ser pelas reações do protagonista.
Ele já vai passar o Ato 2 sofrendo as consequências do
conflito. Não é disso que se trata o Ponto de Aperto.
Nesse momento nós temos que mostrar em primeira mão o
perigo. O leitor tem que ver o problema com seus
próprios olhos, e não pelas reações do herói.
Se sua história tiver um vilão, ele vai aparecer agora. Ou
seus capangas aparecem. Se a história não tem um vilão,
mas tem agentes que aumentam a tensão (como policiais
perseguindo o herói), eles aparecem agora. Talvez outros
representantes do conflito, como uma família que
desaprova o relacionamento; o diretor da escola que é
contra o novo método de ensino; ou até mesmo os
demônios interiores do protagonista, numa história mais
intimista.
O Ponto de Aperto é um truque de ritmo. Ele existe pra
dar uma quebrada na sequência de cenas da história e
reforçar o perigo que existe.
Numa história de sequestro, podemos ver o sequestrador
com reféns. Numa história como Star Wars, podemos ver
Darth Vader interrogando a Leia. Talvez a gente veja a
polícia bolando uma nova forma de capturar nosso herói.
Numa história de amor, por exemplo, podemos dizer que o
Primeiro Ponto de Virada foi o herói ser abandonado pela
mulher que ele ama. O antagonista aqui pode ser a própria
amada, e a força antagonística é o desinteresse dela por
ele. Ele passa o Ato 2 tentando entender o que aconteceu,
se recompôr, e conquistá-la de volta. Mas precisamos
quebrar o ritmo. Ver o problema sem ser pelos olhos dele,
pra gente se lembrar do antagonismo em primeira mão. O
Ponto de Aperto nessa história poderia ser, por exemplo,
vermos uma cena da amada do herói, feliz num parque de
diversões, nos braços de outro.
O Primeiro Ponto de Aperto não precisa ser complexo.
Não precisa nem que o protagonista esteja presente. Pode
ser só isso, vermos a mulher amada do protagonista feliz
sem ele. Mas essa lembrança do problema em primeira
mão reforça o momento que ele está passando no Ato 2. É
um mecanismo de roteiro que ajuda a reforçar a empatia
que criamos no Ato 1.
Mas você pode usar esse Ponto de Aperto para mais
coisas.
Você pode fazer o Ponto de Aperto introduzir novas
informações na história. Podem ser informações apenas
para o leitor, talvez até já dando dicas do que vem no
futuro. Podem também ser informações para o
protagonista. Nesse caso, é ainda mais material para
alimentar a virada dele no final do Ato 2.
Como é uma ferramenta de ritmo, é importante que o
Ponto de Aperto aconteça bem próximo do meio do Ato 2.
Se vier muito cedo, está muito perto do Primeiro Ponto de
Virada. Se vier muito tarde, o ritmo do Ato 2 pode ter
ficado muito lento, e vai ficar muito próximo do Segundo
Ponto de Virada.
Se você gosta de se planejar com antecedência, já pode
preparar este Ponto de Aperto para ter ligação com o
outro Ponto de Aperto que fazemos no meio do Ato 3.
Mas antes disso temos que fechar o Ato 2.
12. Segundo Ponto de Virada:
De Vítima Para Guerreiro
O personagem não pode reagir para sempre. Chega um
momento em que ele tem que começar a querer tomar as
rédeas da própria história e mudar as coisas.
No meio da história, as coisas mudam.
O Segundo Ponto de Virada acontece aos 50% da sua
história. Ele marca a mudança do Ato 2 para o Ato 3, e a
mudança de mentalidade do protagonista. De vítima dos
acontecimentos, ele passa a ser o guerreiro lutando de
verdade pela resolução do problema.
Esse ponto de virada é o meio da sua história. Ele é
também chamado em algumas teorias de "O Momento da
Verdade". Neste momento, muitas vezes entram novas
informações. Novos conhecimentos. Novos poderes ou
equipamentos.
O Segundo Ponto de Virada não precisa mudar o núcleo
da história, mas ele vai mudar o entendimento do leitor do
que está acontecendo. O herói vai sair do modo de reação
e vai partir para o modo de ataque.
Você só tem que tomar cuidado para não fazer isso
acontecer de forma repentina demais. O Ato 2 tem que ser
construído para que o personagem vá acumulando tudo
que precisa para finalmente mudar de atitude.
Você pode guardar uma última informação para esse
momento, se quiser. E fazer esse ponto de virada
acontecer ao mesmo tempo que sua história tem um plot
twist. Muitas histórias fazem isso, apesar de não ser
necessário.
O que você construiu no segundo ato é o que vai culminar
na mudança que é o meio da história, com ou sem a
chegada de uma nova informação.
É neste ponto que em Titanic a Rose vai se entregar de
vez ao novo relacionamento. Ela vai até o quarto do Jack,
ficar nua para que ele a pinte como "as garotas francesas"
do caderno de desenhos dele.
É neste ponto que, em Homem de Ferro, Tony Stark vai
perceber que finalmente dominou a armadura, e vai usá-la
para começar a deter criminosos. Ele vai partir pro
ataque.
É no meio da história, em Código da Vinci, que Robert
Langdon vai parar de correr às cegas. Ele define um
objetivo e vai atrás do professor Teabing, que pode ter a
solução de todo o mistério.
É a partir dessa virada que o protagonista vai se tornar
mais proativo. E as consequências dessa mudança de
atitude vão guiar os acontecimentos do Ato 3.
13. Ato 3: O Ataque
O herói da história não é chamado de herói à toa. Mas até
esse momento o protagonista ainda não estava sendo tão
heroico. Mas é a semelhança que vemos no Ato 1, e a
reação bem humana que ele tem no Ato 2 que prende o
leitor e cria a empatia dele com o herói.
É a primeira metade da história que vai cimentar a relação
entre humano e personagem.
Aí chega o Ato 3, onde finalmente vemos o protagonista
brilhar.
Enquanto o Ato 2 foi sobre reagir aos eventos, o terceiro
ato é um ataque proativo para resolver os problemas.
Você pode até ter mostrado o personagem principal
tentando resolver as coisas antes, mas sem sucesso. Ele
ainda não tinha coragem, ou conhecimento, ou
equipamento, ou poderes. Isso ainda mostra o quão
perigoso é o problema, e como é difícil resolvê-lo.
A tensão aumenta porque o Ato 2 mostrou como o herói
precisa se tornar ainda melhor para conseguir superar os
desafios.
O problema que o protagonista enfrenta na história pode
ser um inimigo, um sentimento, uma situação, etc. O que
quer que seja, no Ato 3 eles vão se enfrentar mais
diretamente. O herói vai bolar um plano mais eficaz,
recrutar aliados, demonstrar coragem e iniciativa. Ele vai
se tornar melhor. Vai mudar de andarilho para guerreiro.
Então vai começar a atacar.
Se você imaginou cenas emocionantes na sua cabeça,
cenas onde o herói age de forma heroica e inspiradora,
este é o momento no roteiro para incluir essas cenas.
Além de enfrentar o conflito central da história, aqui é
onde o protagonista precisa também começar a superar
seus demônios interiores. Insegurança, problemas com
álcool, dificuldade de se comprometer com
relacionamentos, etc. Exemplos de demônios interiores
não faltam. O herói vai começar a superá-los nesta parte
do roteiro, porque ele não pode ficar só na defensiva.
Sua missão no Ato 3 vai ser mostrar o herói partindo pro
ataque.
Ele não vai vencer no primeiro ataque (senão a história
acaba), mas a cada ataque ele vai obter mais resultados
positivos. Mais confiança. Mais informação. Mais
recursos.
Isso vai fazer com que o antagonista também reaja de
forma mais agressiva. Vamos mostrar isso com o Segundo
Ponto de Aperto no meio do ato 3.
A tensão vai crescer cada vez mais como resultado das
ações de ambos os lados, até chegarmos ao Terceiro (e
último) Ponto de Virada. A última grande guinada na
história, que vai colocar ambos os lados em rota de
colisão. No ato 4, a história vai seguir numa direção em
que a resolução do conflito não pode mais ser adiada ou
evitada.
Antes de seguir adiante, vamos ver alguns exemplos do
Ato 3 em outras histórias.
Em O Código Da Vinci, eu comentei que Langdon decide
ir atrás do Professor Teabing no meio da história. No Ato
3, ele enfrenta o perigo para atingir esse objetivo e
conseguir as informações que ele quer. Nós vemos
Langdon tomando o controle das suas ações.
Em Matrix, nós temos um exemplo interessante. A
informação que leva à mudança de atitude no personagem
(Oráculo diz que ele não é o escolhido) é falsa. Daí em
diante vemos Neo usando o que aprendeu para enfrentar
seus inimigos e sair vivo. Ele entende que "a colher não
existe", prepara planos, arranja um monte de armas
maneiras e toma a iniciativa de invadir o prédio onde seus
inimigos estão. Neo está no controle do seu próprio
destino.
Como o herói não pode atacar sem sofrer consequências,
vamos dar uma olhada no Segundo Ponto de Aperto.
14. Segundo Ponto de Aperto
Quando você acha que as coisas estão indo bem demais
pro personagem, é hora de dar aquela cutucada pra ele
sentir o perigo de novo.
O Segundo Ponto de Aperto é, assim como o primeiro, um
momento de colocar o perigo (e o antagonista) em
primeiro plano. Mas dessa vez a ameaça tem que ser
maior, mais cruel, mais forte.
Porque não é só o herói da história que partiu pro ataque
com mais força. O antagonista viu que está sendo atacado
e vai reagir à altura. Isso vai fazer a tensão crescer ainda
mais. Todo mundo está sendo levado aos seus limites.
O Segundo Ponto de Aperto não vai ter muito a função de
revelar novas informações, como você podia fazer no
primeiro. Você pode fazer, mas não é o foco. Dessa vez, o
ponto de aperto precisa bater com mais força na sua outra
função: a de lembrar ao leitor o que está em jogo.
Vamos ver alguns exemplos:
No filme Alien, o ponto de aperto mostra a morte do
Capitão Dallas. A morte dele deixa a equipe sem um líder,
mostrando o que pode acontecer com cada um deles e
aumentando ainda mais o caos da tripulação que tenta
sobreviver.
Em Jogos Vorazes, a garota Rue é morta na frente da
Katniss. Isso não só reforça o perigo do jogo que ela está
participando, como causa uma reação forte nos leitores.
Se você entendeu o primeiro e conseguiu escrever um bem
marcante, também consegue fazer o mesmo com o
segundo. Lembrando sempre de aumentar o nível.
Mas o segundo Ponto de Aperto pode ter consequências
maiores na história.
Em muitas histórias, esse pode ser o momento em que o
herói sai motivado para enfrentar o problema com ainda
mais ânimo.
Você já deve ter visto isso em filmes. O momento em que
o herói ataca com todas as suas forças e a vitória parece
estar ao alcance. Parece que tudo vai dar certo e as coisas
vão se resolver.
Mas isso não vai durar.
Logo depois, o Terceiro Ponto de Virada vai puxar o
tapete sob seus pés.
15. Terceiro Ponto de Virada

Depois de toda a ação do Ato 3, a tensão entre


protagonista e antagonista cresceu até o limite. Mas a
história precisa de uma nova virada para seguir rumo ao
final.
Lembra de tudo que aprendemos no Primeiro Ponto de
Virada? Que alguma coisa precisava prender o
protagonista ao conflito central de uma forma que ele não
pudesse desistir sem perder alguma coisa?
Para que o final tenha impacto, a história precisa de uma
nova grande virada. Algo precisa mudar para que a
história siga para o final de uma forma inevitável.
No decorrer do Ato 4, a situação tem que estar de uma
forma que você saiba que a história vai acabar. O leitor
tem que olhar pro que está acontecendo e pensar "ou vai
ou racha".
O responsável por essa mudança é o Terceiro Ponto de
Virada.
Assim como os outros dois pontos, este Ponto de Virada é
bem livre e pode ser abstrato. A natureza específica dele
não importa. Pode ser uma decisão, uma nova ameaça,
uma nova informação. É difícil descrever com o que este
ponto se parece, porque ele pode ser qualquer coisa
mesmo.
Numa história de amor, pode ser o momento em que o
protagonista finalmente abandona o emprego desgastante
que custou o casamento dele e afastou a família.
Numa história de sequestro, pode ser o momento em que o
herói finalmente consegue chamar a polícia, e agora só
precisa ficar vivo até eles chegarem. A gente sabe que
neste tipo de história o herói vai ter que resolver o
problema sozinho antes dos policiais chegarem, mas
mesmo assim a vinda da polícia faz a história seguir para
o fim. A vinda dos policiais coloca um timer para a
resolução, de uma forma ou de outra.
O que quer que seja, tem que mudar a direção da história
para que ela siga para o fim.
Ao contrário dos outros Pontos de Virada, este não
precisa ter um grande impacto narrativo. Você vai
encontrar histórias em que este momento é marcado por
um plot twist no roteiro, mas não é necessário. Em outras
histórias, pode ser um simples suspiro de amor. Mas ele
precisa colocar os dois (ou mais) lados em rota de
colisão de uma forma que o conflito vá acabar e a história
tenha resolução.
Sem essa mudança importante, o final não vai ter tanto
impacto.
Se a história não tiver mudado, o leitor pode se perguntar
por que o herói está arriscando tudo agora em vez de,
talvez, buscar mais informação ou mais poder.
Uma coisa que alguns teoristas insistem é que este é o
último momento em que você pode acrescentar novas
informações na história. Que depois dele (durante o Ato
4), você vai apenas resolver os conflitos e problemas que
já foram iniciados. Faz sentido, mas você pode ficar livre
para ignorar este conselho específico. Nem toda história
faz assim.
O que quer que tenha mudado no Terceiro Ponto de
Virada, o leitor tem que poder sentir o cheiro do final
chegando. Mesmo que o leitor não saiba dizer como vai
terminar. Aliás, é até bom que quem está acompanhando a
história não consiga prever como ela vai terminar.
Depois deste ponto, o conflito vai atingir o seu auge
máximo e então vai diminuir. Se o herói já estava em
modo guerreiro, agora vai ser um guerreiro mártir que dá
tudo de si. Ele conquistou seus demônios interiores, tem
tudo (ou quase) que precisa, e vai fazer seu ataque final.
Isso vai ser o Ato 4.
Mas antes de falarmos dele, quero falar de um truque de
roteiro que você vai encontrar em muitas histórias.
A calmaria antes da tempestade
O Terceiro Ponto de Virada vai seguir adiante para o Ato
4 e o clímax da história, com as resoluções finais cheias
de emoção.
Estas cenas do último ato vão ser as mais impactantes da
sua história (assim esperamos). Mas existe uma técnica de
roteiro para aumentar ainda mais o impacto delas.
Essa técnica é chamada por alguns de "Calmaria Antes da
Tempestade". Pra quem segue a Jornada do Herói (que se
encaixa bem com a estrutura dos quatro atos), este pode
ser o momento chamado de "Na Barriga da Baleia". Mas o
nome não importa.
A técnica é a seguinte: pouco antes do Terceiro Ponto de
Virada, tem uma calmaria na história.
O Ato 3 é mais ativo do que o 1 e o 2, porque o herói está
em modo de ataque. Conectar isso direto no Ato 4 pode
deixar o leitor anestesiado, sem a pausa pra respirar antes
de novas emoções.
Pode ser interessante usar o final do Ato 3 para dar uma
(pequena) pausa nas emoções. Talvez todo o esforço do
protagonista durante esse ato tenha dado um pequeno
respiro pra ele, quem sabe.
Durante esse momento mais lento, o leitor vai se acalmar.
Vai deixar as altas emoções para trás. E quando o Ato 4
chegar, trazendo um furacão de emoções e conflitos, isso
vai ter um impacto ainda maior.
Se quiser usar essa técnica, o importante é colocar
algumas poucas cenas mais calmas antes do Terceiro
Ponto de Virada. Cuidado pra não ter calmaria demais, ou
o leitor pode perder a motivação de continuar virando as
páginas pra saber o que acontece a seguir.
Nem mesmo na calmaria os problemas podem ser
esquecidos de vez.
Depois seguimos para o Ato 4, onde vamos enfrentar de
uma vez por todas todos os problemas que criamos e
pioramos durante toda a história.
16. Ato 4: A Batalha Final
O Ato 4 é o momento pelo qual todos nós estávamos
esperando. O fim está próximo. Nós chegamos perto do
grande tesouro, estamos vendo o X que marca o local.
Agora só falta cavar.
Desde os 75% da história, os personagens (e os leitores!)
estão numa montanha russa de emoções. Todos os
conflitos criados durante o livro agora se entrelaçam e
precisam ser resolvidos.
O protagonista vai finalmente encarar o antagonista numa
batalha final (seja concreta ou abstrata) pela resolução do
conflito central.
Quanto o Ato 4 acabar, a questão levantada pela história
precisa ter sido resolvida. O conflito tem que ter seu fim,
de uma forma ou de outra.
O leitor tem que sair satisfeito.
Este ato tem uma identidade diferente dos outros. Ele é, ao
mesmo tempo, o mais agitado e o mais calmo. Isso
acontece porque ele tem diferentes momentos conforme
ele vai acontecendo.
A sequência de momentos no último ato é Clímax,
Momento Climático, Resolução.
Clímax
O Clímax é a sequência de cenas que vem logo no começo
deste ato. É a construção da batalha final, o começo e o
meio dela. Ele vai terminar no Momento Climático, que
vem a seguir.
É quando a montanha russa de emoções faz sua última
subida (a maior das subidas), dá uma paradinha, e então
desce em alta velocidade rumo ao final.
É a parte que vai fazer o leitor passar da hora de dormir,
enquanto continua a ler e segura o livro bem firme. A
parte que vai fazer o espectador no cinema se segurar com
força no banco de tanta tensão.
O ideal é que seja uma sequência de cenas emocionantes
onde a situação fica pior rápido, com uma ou mais brigas
entre protagonista e antagonista.
Vamos ver exemplos:
No filme Homem de Ferro 3, o Clímax é o momento em
que o Homem de Ferro usa todas as suas armaduras para
enfrentar o vilão Extremis numa luta de vida ou morte
para salvar sua amada e o presidente.
No filme Matrix, o Clímax é quando Neo e Trinity
invadem o prédio onde Morpheus está preso. A ação
escala até o ponto em que Neo enfrenta um agente e
sobrevive.
Já o filme Whiplash nos apresenta um Clímax onde o
protagonista, um baterista de jazz, se apresenta diante de
uma grande plateia num evento de música. E a coisa piora
ainda mais quando o seu antigo mentor anuncia que vão
tocar uma música que ele nunca treinou antes. Ele toca
mal, sai do palco e depois volta.
E se o Clímax é a batalha final, ele termina no Momento
Climático, que é quando essa batalha termina com um dos
lados vitoriosos.
Momento Climático
A batalha final do Clímax tem que terminar com um bang.
Com o momento mais marcante dela, que vai resolver o
conflito de uma vez por todas.
É o momento final da descida da montanha russa, quando
a ela vai fazer a última curva e se tornar uma reta, e temos
certeza que vamos morrer.
Pense nos filmes e livros que já assistiu ou leu. O
momento mais emocionante da batalha final é sempre o
fim dela. É quando o casal finalmente se beija. O herói dá
o último golpe no vilão. O policial e o bandido rolam na
luta pela arma e ela dispara. O juiz bate o martelo e
anuncia "inocente".
Este é o Momento Climático.
Ele não é longo. Nem uma cena inteira. Ele é uma fração
de uma cena, uma resolução.
Mas é o momento mais importante do Ato 4.
Se o Clímax fez o leitor prender a respiração, é no
Momento Climático que ele suspira de alívio. Toda a
emoção que você colocou em jogo é liberada.
Vamos retomar os exemplos anteriores de Clímax para
vermos os Momentos Climáticos.
Em Homem de Ferro 3, depois de toda a luta com as
armaduras, parece que Tony vai perder. E quem termina o
conflito? Sua amada Pepper, que surge das chamas bem na
hora de salvar Tony e acabar com o vilão.
Em Matrix, a batalha parece terminar com a morte de
Neo… mas então ele volta à vida como O Escolhido. Ele
facilmente derrota os agentes e acaba com Smith, dando
um golpe vital no conflito e deixando finalmente o
espectador voltar a respirar.
E em Whiplash, o Momento Climático é quando o
protagonista pega de novo suas baquetas e começa a
improvisar um fantástico solo de bateria que surpreende
todo mundo.
Depois que a batalha foi vencida (ou perdida), seguimos
para os últimos momentos da história.
A Resolução
O final da história é sempre um momento agridoce. Você
chegou ao fim. Escalou a montanha e plantou sua bandeira.
Mas isso também significa que a jornada está terminada.
A Resolução é o momento de despedida no final da
história. Se despedir dos personagens que acompanhou
por vários capítulos, dos lugares que conheceu, das
histórias que vivenciou.
A sua história, que dissemos que começa de verdade no
Primeiro Ponto de Virada, termina "de verdade" no fim do
Clímax. A Resolução é o resto, o momento pós-conflito.
Uma sequência de poucas cenas onde você vê um pouco
das consequências da história na vida dos personagens ou
no mundo ao redor.
Este não é apenas o fim desta história, mas o começo de
um novo capítulo na vida dos personagens. E é
interessante ver como esse novo capítulo vai ser.
Como o nome diz, a Resolução é também o momento onde
as coisas são resolvidas. Serve para resolver os últimos
assuntos inacabados que a história pode ter deixado.
Mas o mais importante é que a Resolução te permite
escolher e guiar a emoção com a qual o leitor vai sair da
sua história. Esta é a última cena que o leitor vai ter para
se lembrar, então faça valer.
Por que usar uma resolução?
Se toda história acabasse assim que o Momento Climático
acontece, muitos autores teriam leitores insatisfeitos
reclamando.
Por quê? Porque depois de toda essa emoção elevada, as
pessoas precisam de um breve momento para respirar com
calma e se recuperar. A montanha russa precisa de um
momento andando devagar em linha reta antes de parar e
deixar as pessoas saírem.
Elas querem saber como a história mudou o personagem.
Querem uma prévia de como a nova vida dele vai ser
depois de tudo que aconteceu.
E ao dar isso para o leitor, você vai deixar aquela última
lembrança pra fechar a história com chave de ouro.
17. Considerações Finais
Depois de ler tudo isso, dê uma respirada. Se achar que
algo ficou mal entendido, experimente reler o capítulo que
você teve dificuldades.
A estrutura de quatro atos não é tão complicada quanto
parece, mas são muitos termos para assimilar de uma vez.
Também não é tão limitadora quanto pode parecer.
Neste capítulo você vai encontrar vários tópico curtos,
onde vou tentar esclarecer possíveis dúvidas, resolver
questões em aberto e deixar dicas para aproveitar melhor
o conteúdo deste livro.
Essa estrutura parece rígida demais
À primeira vista, eu acredito que ela pode passar essa
impressão mesmo. Mas depois de assimilar tudo, eu
acredito que uma coisa fica mais clara: a estrutura tenta
dizer em que momento as coisas vão acontecer, mas não o
quê tem que acontecer.
A maior parte do liberdade criativa do escritor é
exercitada definindo o que acontece em cada parte da
história. Essa é também a pergunta que o leitor se faz a
cada página.
"E agora, o que acontece?"
A resposta dessa pergunta está 100% nas suas mãos. A
estrutura não vai te limitar.
Quer que o herói seja derrotado no final? Vá em frente.
Quer decidir exatamente como acontece o Clímax? Fique
à vontade.
As técnicas apresentadas aqui dizem mais respeito à
ordem em que as coisas vão acontecer, e em que momento
acontecem. E boa parte disso faz sentido.
Faz sentido que você introduza o personagem antes de
colocá-lo para sofrer consequências de uma tragédia. Faz
sentido que ele primeiro busque a solução do problema
antes de começar a solucioná-lo.
E o mais importante é que, em última instância, você está
livre para quebrar qualquer regra que quiser. A história é
sua.
Eu preciso seguir todas essas regras?
A resposta aqui é complicada. Sim e não.
Nas minhas pesquisas para escrever esse livro, encontrei
histórias que quebram estas regras de uma forma ou de
outra.
Quebrar a regra não é um problema… se você souber o
que está fazendo. Ou se for famoso, o que é uma licença
para quebrar regras e ignorar práticas populares.
Quando o escritor é iniciante e está escrevendo sem
conhecimento de qualquer teoria, ele vai acabar
quebrando várias regras estruturais e é capaz do livro não
ficar legal. Mas isso é porque ele fez tudo às cegas, sem
saber o motivo de ter feito as cenas da forma que fez.
Quando o escritor é experiente, algumas vezes ele quebra
as regras de roteiro. Mas ele faz sabendo por que está
fazendo isso.
Se você viola uma parte da estrutura que tinha o objetivo
de criar empatia com o leitor, precisa substituir isso por
alguma outra coisa que vai criar empatia. Não fazer isso
vai resultar num livro onde o leitor não se importa com o
protagonista, e a história não vai ser boa.
Ignore as regras que quiser. A criatividade é sua. Apenas
não se esqueça de cumprir os objetivos de cada parte da
história, seja da forma recomendada neste livro ou da sua
própria forma.
A estrutura de quatro atos é apenas uma forma mais fácil
(e clássica) de atingir os objetivos que um livro deve
atingir, nos momentos certos.
Por que 25% para cada ato?
Se esse valor parece meio arbitrário, é porque é mesmo.
Mas a ideia por trás disso é evitar que um único ato acabe
dominando a maior parte da história.
Se todos os atos tiverem tamanhos aproximadamente
iguais, a evolução do personagem (e da história) parece
mais natural. Não parece que ficou parado numa única
etapa por muito tempo e depois passou correndo por
outra.
É claro que o valor de 25% por ato não precisa ser
seguido às últimas consequências. Não precisa cortar
algumas páginas dos seus capítulos para se encaixar na
estrutura, por exemplo.
Isso é um guia, não uma fórmula rígida. Existe a
possibilidade de aumentar um pouco um ato, diminuir
outro. Só evite fugir muito disso, pra não cair no problema
de desequilíbrio que citei acima.
Como prólogos e epílogos entram na
estrutura?
Nenhum capítulo pode fugir da estrutura de 4 atos. Se é
parte da história, de uma forma ou de outra, tem que estar
dentro de um dos atos ou seus pontos de virada.
Prólogos, como vem no começo, são parte do Ato 1. Eles
podem servir como um dos ganchos. O filme Homem de
Ferro, por exemplo, tem uma abertura que começa quase
como um prólogo. Ele já abre com o Incidente Inicial,
depois a história volta pra mostrar como as coisas
chegaram até ali.
Epílogos, como acontecem no final da história, são parte
do Ato 4. Mais especificamente, na etapa de Resolução.
Muitos livros usam o epílogo como uma forma de mostrar
o que aconteceu depois da história. Geralmente depois
que já se passaram alguns dias, meses ou anos.
Se for usá-los no seu livro, não esqueça de contar
prólogos e epílogos no total de cenas para calcular o
tamanho de cada ato.
Eu vi sites/livros falando que são 3 atos!
Uma coisa complicada ao estudar estrutura de história é
que existem diferentes teorias para a estrutura dos quatro
atos. A maioria delas é 95% semelhante, mas alguns
termos podem variar.
A mais popular é a versão usada no cinema. É a que
chama cada parte de 25% de um Ato, ou seja, quatro atos.
É usada também por parte dos escritores de romances, e é
base para os termos usados neste livro.
Existe também a nomenclatura mais usada na literatura,
que está saindo de uso. Ela se refere a apenas 3 atos, e
não 4. Mas não deixe se enganar. Ela ainda divide o livro
em quatro pedaços de 25% cada. A diferença é que ela
chama as duas parte do meio de "primeira metade do ato
2" e "segunda metade do ato 2".
Eu sei, não faz muito sentido.
Eles juntam o Ato 2 e Ato 3 como se fossem um ato
grandão dividido ao meio. Isso é só pra encaixar na teoria
do Aristóteles de que histórias tem 3 partes: começo,
meio e fim.
Não importa se você chama de 4 atos, ou de 3 atos com
um dos atos tendo 2 partes. Se está dividindo em quatro
blocos de 25% cada, está falando da estrutura de quatro
atos.
Dica: Como planejar suas cenas bem fácil
Quando você conhece essas técnicas e quer planejar sua
história ao redor dos quatro atos, existe uma forma bem
simples de planejar todas as suas cenas.
O segredo é planejar primeiro os Pontos de Virada e
Pontos de Aperto. Esses são momentos marcantes que
também servem como pilastras que suportam toda a
estrutura. Planeje que evento vai fazer seu personagem
entrar no conflito central, que virada vai acontecer no
meio da história, e por aí vai.
Depois disso, a maioria das suas outras cenas vai ser uma
preparação para chegar em um dos Pontos que você já
planejou, ou então consequências logo depois de um dos
pontos.
Se você planejar duas cenas levando a cada Ponto de
Virada ou Ponto de Aperto, e depois mais duas cenas
continuando as consequências de cada ponto, você já vai
ter 10 cenas planejadas. Mais uma cena por cada Ponto, já
são 15 cenas no total. Se seu livro tiver umas 36 cenas
(valor médio), você já vai ter planejado quase metade
delas sem muito esforço.
Depois é só preencher as lacunas com cenas de transição
e desenvolvimento.
Dica: Não se esqueça de todo o resto
necessário a uma boa história
Quando eu escrevi meu primeiro livro (que decidi nunca
publicar), eu foquei tanto em atender a estrutura dos
quatro atos que esqueci de outras coisas que são
importantes numa boa história.
Personagens, conflitos, temas, mensagens morais,
diálogos. Todos esses e outros são elementos importantes
para uma história ser boa e fazer sucesso.
A estrutura dos quatro atos não é a solução para tudo. Ela
vai prover o esqueleto sobre o qual você vai montar os
outros elementos que uma história precisa. Sem esse
esqueleto, o resto da história não se sustenta. Mas se for
só o esqueleto, vai ser uma história que o leitor sente que
está faltando algo.
Escrever é um trabalho complexo, que precisa de prática
e planejamento. Pense nas várias áreas e sempre esteja
pronto para reescrever e melhorar alguma coisa.
Agora ponha as mãos na massa e comece a escrever seu
livro!
18. Referências e Livros
Recomendados
A maior parte da teoria usada neste livro foi baseada em
dois livros em inglês muito populares na comunidade
internacional de escritores.
O primeiro deles é Story Engineering, do Larry Brooks.
Larry é um coach de escritores. Ele é pago para ajudar
escritores rejeitados por editoras a reescreverem e
melhorarem seus livros até conseguirem um acordo com
uma editora.
Por essa profissão, ele tem uma boa ideia do que faz uma
história agradar o público, e como planejar para atingir
esse objetivo.
O segundo livro é Structuring Your Novel, da autora K.
M. Weiland. Além de já ter publicado vários livros, ela
também trabalha ajudando outros escritores a planejarem
e revisarem suas histórias.
Você pode reparar que os dois livros que usei como base
são de pessoas que trabalham ajudando outros escritores.
Esse foi o fator decisivo na minha escolha dos livros. Se a
pessoa trabalha ajudando outras a criarem boas histórias,
e tem sucesso no trabalho, ela é boa nisso e sabe do que
está falando.
Existem escritores (alguns até populares) que publicaram
livros de como escrever. Mas por nunca terem que ajudar
outras pessoas, eles nunca tiveram que descobrir o que fez
com os que os livros deles fizessem sucesso. É sério,
existem autores com vários livros publicados que não são
capazes de olhar para trás e entender o método que eles
mesmos usam para atingir seus objetivos.
Então escolhi livros de quem não só sabe criar uma boa
história, mas também sabe ensinar aos outros como fazer
isso.
Outros livros que podem ser interessantes
On Writing, do Stephen King.
Outlining Your Novel, da K. M. Weiland.
Save The Cat, do Blake Snyder.
Naked, Drunk and Writing, de Adair Lara.
Tradução de termos
Como não existem muitos livros de teoria literária em
português, os termos que usei aqui foram traduzidos e
adaptados de livros em inglês.
Além disso, existem diferentes versões da estrutura de 4
atos (algumas até chamam de 3 atos, apesar de dividir em
4 partes, como falei no capítulo anterior). Por causa disso,
os termos variam entre um autor e outro.
Na falta de consenso em inglês, eu acabei alterando alguns
termos ao trazê-los para a nossa língua.
Caso você queira ler material em inglês, deixei abaixo
uma tradução dos meus termos em português para os
termos mais populares em inglês.
Ato: Act. Essa foi fácil.
Incidente Inicial: Inciting Incident, ou Major Hook.
Primeiro Ponto de Virada: First Plot Point.
Pontos de Aperto: Pinch Points.
Segundo Ponto de Virada: Second Plot Point, ou
Midpoint.
Terceiro Ponto de Virada: Third Plot Point, ou Second
Plot Point caso a teoria chame o ponto aos 50% de
Midpoint. Sim, eu sei que isso pode confundir entre uma
teoria e outra. Algumas até chamam os três pontos de
First Plot Point, Midpoint, e Third Plot Point, sem nunca
ter um ponto chamado de Second.
Clímax: Climax. Outra fácil.
Momento Climático: Climatic Moment.
Resolução: Resolution, ou Denouement.

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