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RELATÓRIO HITE - UM PROFUNDO ESTUDO SOBRE A

SEXUALIDADE FEMININA
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Thays Bieberbach

Resumo: O livro de Shere Hite foi um sucesso no mundo todo, publicado e


traduzido em 17 países, censurado em alguns como no Brasil, que só teve a sua
venda liberada em 1978 com uma tarja preta dizendo "venda proibida para
menores de 18 anos". Para compreendermos o sucesso editorial da pesquisa
realizada pela Hite, precisamos conhecer a mudança que o sexo teve ao longo dos
três últimos séculos, esse artigo busca de maneira breve explicar essa mudança e
apresentar algumas respostas das mulheres entrevistadas.
Palavras chaves: Hite, Pesquisa, Sexo, Orgasmo

Chorei quando li o questionário pela primeira vez.


Venho mentindo sobre tantas coisas há tanto tempo;
eu já havia compreendido isso, mas quis responder
ao questionário para poder dizer tudo por escrito.
Você certamente está ajudando a muitas mulheres, e
a publicação dos resultados ajudará muitas outras,
que, como eu, poderão ler uma verdade que não
puderam dizer a si mesmas. 1

O livro de Shere Hite foi um sucesso no mundo todo, publicado e


traduzido em 17 países, censurado em alguns como no Brasil, que só
teve a sua venda liberada em 1978 com uma tarja preta dizendo "venda
proibida para menores de 18 anos". No primeiro capítulo analisamos o

1Hite, Shere. O relatório Hite - Um profundo estudo sobre a sexualidade feminina.


São Paulo: Círculo do Livro S/A. p. 27
contexto nacional pelo qual os Estados Unidos e o Brasil passaram nas
décadas de 1960 e 1970. Mas para compreendermos esse sucesso
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editorial da pesquisa realizada pela Hite, precisamos conhecer a
mudança que o sexo teve ao longo dos três últimos séculos, é muito
tempo, mas seremos breves nas explicações.
O estudo da sexualidade nos séculos XIX e XX tem duas
perspectivas, uma delas é a biológica e a outra é a antropológica, a
biológica focava mais no funcionamento do corpo e a antropológica no
comportamento humano. No decorrer do século XIX, ela deixou de
focar apenas nas doenças sexualmente transmissíveis e passou a se
dedicar ao prazer e satisfação sexual. Para Michel Bozon 2, em
Sociologia da Sexualidade, a primeira fase da sexologia tinha um
vocabulário muito específico que dificultava o acesso da população em
geral, e como diz Foucault 3, a "vontade de saber" fez com que muitas
disciplinas voltadas ao corpo surgissem, mas isso só foi possível
quando o deixamos de pensar o sexo apenas para reprodução. O sexo
passou a ser preocupação do estado por questões demográficas, as
mulheres e as crianças passaram a ser os principais alvos das

2 BOZON, Michel. Sociologia da sexualidade. Rio de Janeiro. Editora FGV, 2004, p.


51
3 FOUCAULT, Michel. História da sexualidade I: a vontade de saber. 4ª Ed. Rio de

Janeiro: Grall, 1985.


discussões4. Com o surgimento da pílula anticoncepcional, o controle
da natalidade foi fundamental para pensar o sexo de uma forma mais
3
individual, através do prazer.
Foi na metade do século XX que muitos pesquisadores dedicados
ao estudo da sexualidade surgem, como o Alfred Kinsey, Masters e
Johnson e a Hite. Kinsey procurou mostrar que várias práticas
consideradas pervertidas, eram praticadas pela grande maioria dos
casais da sociedade.
Como falado anteriormente, em um primeiro momento os
conhecimentos sobre o sexo eram restritos aos livros médicos, já na
segunda fase dos estudos da sexualidade, com os vários relatórios que
começaram a ser publicados durante o século XX, os estudos passaram
a ser divulgados para o público em geral pela grande mídia.

As publicações resultantes das pesquisas sexuais


estiveram entre as mais lidas dos Estados Unidos.
Na lista de best-sellers publicada pela revista People
Magazine e Caderbooks, o Relatório Kinsey
masculino figurou como o 4º livro mais lido dos
Estados Unidos em 1948. Em 1953 o relatório
Kinsey feminino alcançou a terceira posição. As
publicações dos pesquisadores Master & Johnson e
da historiadora Shere Hite também tiveram grande
êxito. O livro "A resposta sexual humana" de MAster
4 FOUCAULT, M. Op. cit. p. 110
& Johnson alcançou a incrível posição de segundo
livro mais lido dos Estados Unidos em 1966, e "O
relatório hite" alcançou a nona colocação em 1976. 5
4
Divulgar essas pesquisas fez o sexo ser questão central nos
relacionamentos, entender essas diferenças de como a sexualidade era
vista no cotidiano do casal, é essencial em nossa pesquisa, porque tanto
a Revista Realidade no Brasil, quanto o Relatório Hite nos Estados
Unidos, estão inseridos nesse contexto e até os dias atuais são usadas
em pesquisas como legitimadoras de novas verdades.
Shere Hite se formou em História Americana e fez doutorado em
História pela Universidade da Columbia e foi editora do projeto
feminista de sexualidade da "National Organization for Women
(NOW)"6 entre 1972 e 1976.
Ficou mundialmente conhecida pela publicação do livro "O
Relatório Hite, um profundo estudo sobre a sexualidade feminina", esse
livro é feito com respostas de 3.000 longos questionários

5SENA, Tito. Os relatórios Kinsey, Masters & Johnson, Hite: As sexualidades


estatísticas em uma perspectiva das ciências humanas. Tese de doutorado
Programa de Pós graduação Interdisciplinar em Ciências Humanas. Centro de
Filosofia de Ciências Humanas. UFSC. Florianópolis, 2007.

6 “National Organization of Women” (NOW), é a maior organização feminista dos


Estados Unidos e possui diversos projetos. Para saber mais acesse:
http://now.org/, ela lutava pela igualdade de direitos, contra todos os tipos de
violência contra as mulheres e o fim da discriminação no mercado de trabalho.
desenvolvidos por ela, foram distribuídos cerca de 100 mil pelo país,
mas apenas 3 mil voltaram respondidos, importante dizer que esses
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formulários eram anônimos. As respostas foram reunidas de acordo
com o assunto e das confissões feitas pelas mulheres que responderam
o questionário. Os depoimentos estão inseridos como foram feitos e
conseguimos observar através deles os questionamentos que as
mulheres tinham sobre a própria normalidade e como essa pesquisa foi
um grito de libertação a essas mulheres. Os depoimentos eram
detalhados e explícitos e o que mais chocou a sociedade da época é que
a maioria das mulheres não alcançava o orgasmo, assim como no
padrão sexual "normal" a mulher deveria estar à disposição do homem
e sair satisfeita quando ele oferecesse algo a mais (posições diferentes,
sexo oral). A falta de orgasmo é prejudicial a saúde das mulheres, a
autora defende uma reestruturação da sexualidade, problematizá-la,
pois é um modelo sexual que explora as mulheres, impedindo desse
modo que as mulheres consigam a plenitude sexual. Hite afirma que
não são as mulheres que tem problemas e sim a sociedade.

Não é a sexualidade feminina que tem um problema


(uma disfunção) -, é a sociedade que é problemática
na sua definição de sexo e no papel subordinado
que essa definição confere às mulheres.
Compartilhar a nossa sexualidade oculta, contando
como nos masturbamos, é um primeiro passo para
trazer a nossa sexualidade à luz do dia e para
redefinir as relações físicas e o sexo como os
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conhecemos. (HITE, 1976, p.36)

Ela queria mesmo desconstruir a ideia de que a sexualidade é um


instinto natural do homem e que ele é mais disposto ao sexo que a
mulher, e que a busca dessa satisfação é natural, mesmo que seja
através de uma violência. Ela queria que o sexo deixasse de ser uma
obrigação e as mulheres não se sujeitassem a isso. O medo da
anormalidade que as mulheres sentiam do próprio corpo, não estava
ligado apenas ao fato da ausência de orgasmos, mas em como consegui-
los.

Parece bem claro que as mulheres também têm


direito ao orgasmo durante o sexo, como parte
natural e integrante. No entanto, agora que se
popularizou a ideia de que as mulheres também têm
de ter prazer no sexo, esse novo "direito" se
converte às vezes numa opressão. As mulheres são
levadas a sentir que têm de ter orgasmos mais para
agradar o homem do que para agradar a si mesmas.
(HITE, 1976, p. 84)

Essa e outras questões analisaremos a partir de alguns


depoimentos das mulheres que escolhemos dos questionários
respondidos por mais de 3 mil mulheres anônimas.
Na primeira parte falaremos sobre orgasmo, Hite, pergunta às
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mulheres como o corpo delas se comporta antes, durante e depois o
orgasmo, e qual o sentimento que as mulheres tinham logo após sentir
ou não o orgasmo. Importante ressaltar que escolhemos perguntas
parecidas com as da Revista Realidade, para fazer a análise
comparativa.
Na década de 1970, enquanto o relatório estava sendo
formulado, o orgasmo feminino era discutido como algo importante,
mas não tão importante e intenso quanto o orgasmo masculino.

Tabela 1: O orgasmo
Você sente vergonha de ter um orgasmo alguém? Só com alguém
pouco íntimo ou sempre?
Embora a maioria não "Sim, é embaraçoso pensar que ele está ali, me
sentisse vergonha com espiando enquanto estou completamente
um parceiro descontrolada. Também fico embaraçada
constante, uma boa quando ele fica assim."
parcela das mulheres "Sim, mas talvez seja porque aprendemos que
se sentia os movimentos convulsivos e a perda de
envergonhadas. controle do corpo são coisas feias. Talvez,
teoricamente, não sejam feios, ao contrário."
"Sim, tenho vergonha até de expressar a
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minha satisfação por qualquer coisa que ele
faz em mim. Fico especialmente envergonhada
de pedir a quantidade de estímulo que preciso
para ter um orgasmo."
Fonte: Relatório Hite, 1976, p. 102/103

Algumas mulheres dependendo da forma que são estimuladas se


mexem bastante durante o orgasmo, outras não. Os movimentos são
rígidos e deixam o corpo tenso e a preocupação que elas sentem em
parecer estranhas na frente do parceiro, faz com que não consigam
relaxar e não tenham orgasmo: "Nunca tive um orgasmo com alguém
porque tenho medo de que eles possam achar ofensivo. Sinto que a
outra pessoa ficaria completamente fria se me visse daquele jeito".

Tabela 2: Depois do orgasmo


Como se sentem as mulheres depois do orgasmo? Satisfeitas?
Saciadas? Relaxadas? Sonolentas?
Sente-se terna e amada, "Varia, mas quando a consciência me volta
querendo ficar junto ao (depois das contrações), sinto um amor
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parceiro. apaixonado pelo meu amante, às vezes a ponto
de chorar"

"Uma sensação de proximidade e alívio, e uma


afeição intensa pelo meu parceiro sexual."
Sente-se forte, bem "Saciada. Eu poderia conseguir qualquer coisa."
esperta, energética,
viva. "Sinto um formigamento quente, uma sensação
suprema de saúde, vitalidade e poder."

"O orgasmo é magnífico - é ausência de


pensamento, pura sensação física -
formigamento, tensão, calor, força - meu corpo
fica vivo e poderoso!"
Fonte:Relatório Hite, 1976, p. 109/110

Há vários níveis de excitação, alguns levam ao orgasmo mais fácil


que outros.

Tabela 3: Orgasmos múltiplos


Porque as mulheres não percebem a sua capacidade de ter
orgasmos? Por que não percebem que o estado de excitação é
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contínuo?
Frequentemente "Embora fique vagamente insatisfeita com um
parecia haver uma orgasmo, nunca tentei ter mais."
rejeição inconsciente
da possibilidade de ter "Tenho vontade de ter uns 20, mas como meu
mais de um orgasmo. marido só parece querer um, tenho de me
adaptar a ele."

"Tenho sorte se consigo ter pelo menos um com


alguém e geralmente não da nem para tentar
querer outro. Na maioria das vezes não tenho
nenhum e morro de fome."
Algumas mulheres nem "Tenho várias contrações juntas. Isso é um
sabiam que era orgasmo?"
possível ter mais de
um, e confundiram a "A noite passada eu me masturbei. Nunca soube
ideia com a de bem se eu tinha 'orgasmos múltiplos' ou não.
orgasmos múltiplos. Mas na noite passada eu tive. OU foram
simplesmente 'contrações' ou 'convulsões'
múltiplas, ou isso é a mesma coisa? Aconteceu
em menos de um minuto, mas seja lá o que for,
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aconteceu quatro ou cinco vezes, sendo que o
primeiro foi o mais forte."
Fonte:Relatório Hite, 1976, p. 111/112

Percebemos pelas respostas que as mulheres desconhecem o que


é orgasmo múltiplo, a ideia do homem só ter um orgasmo, fazia com
que muitas mulheres se sentissem estranhas, culpadas e problemáticas
por querer mais de um orgasmo. A questão não é uma obrigação em
querer mais de um orgasmo, mas sobre conhecer o próprio corpo e a
capacidade sexual que ele tem, podendo dessa forma fazer as escolhas
e não aceitar o que os outros falam que é normal por falta de
conhecimento.

Tabela 4: Orgasmo através da manipulação clitoridiana


Emoções ligadas ao estímulo clitoridiano
Você se sente “Acho que nunca pedi o que queria. Limitava-me
constrangida em a pensar que alguns caras sabiam e outros não,
pedir estímulo do e era emocionante quando sabiam. Sempre me
clitóris? Você sente apavorou a idéia da mulher controladora e/ou
que seu parceiro está castradora. Para mim era uma lei sagrada não
se sacrificando por deixar um cara se sentir inexperiente (um fruto
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você? da minha relação com meus amigos intelectuais
e com meu psicanalista), e sugerir que ele
fizesse alguma coisa a mais ou diferente
poderia parecer ou insinuar que ele não era
experiente. O movimento das mulheres ajudou-
me a ser franca. Hoje peço o que quero em todos
os tipos de situação: igreja, trabalho,
supermercado, governo... e na cama.”

“Sim! Ele está sempre no lugar errado! E fico


constrangida demais de lhe mostrar o lugar
exato. Engraçado, não fico embaraçada de fazer
qualquer coisa que o homem peça ou que nos
ocorra, mas fico embaraçada de dizer ‘um
pouco mais para a direita’ ou ‘mais para cima’
ou ‘ faz carinho na minha bunda’.”
Seus parceiros são “Os homens não estão informados. Todos devem
bem informados? São ler o mesmo livro. Naturalmente, a passividade
sensíveis à das mulheres contribui para isso.”
estimulação que você
deseja? “Incutiu-se na cabeça dos homens que eles são
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especialistas em sexo, e além do mais, que
qualquer coisa que dê prazer a eles também da
prazer a nós e nos sacia. A maioria dos homens
na primeira vez que dormiu comigo, parecia
agir assim: ‘Vem cá minha querida, deixa eu te
mostrar’. Quanta presunção!”
Fonte:Relatório Hite, 1976, p. 231/232/233

Muitas mulheres quando responderam as perguntas relacionadas


às emoções ligadas ao clitóris, se sentiram culpadas em sentir
necessidades de serem estimuladas ali. Muitas não pensaram que o
estímulo do clitóris podia levar ao orgasmo, muitas pensavam que era
apenas para excitação, e a ideia de serem estranhas ou anormais por
sentirem essa necessidade era frequente. Apenas os parceiros
regulares chegavam a ter alguma boa informação sobre o corpo e os
estímulos femininos, mitos não compreendiam que os corpos eram
diferentes de mulher para mulher e o que as excitava e as fazia gozar
também era diferente. Muitas mulheres criticaram os manuais de sexo
que os companheiros liam e achavam que tudo era mecânico. Muitos
dos homens que as estimulavam através do clitóris não se saiam bem,
alguns por se sentirem desajeitados, constrangidos ou ofendidos.
Algumas mulheres criticaram o fato de que quando o homem fazia sexo
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oral nelas, parecia uma obrigação fazerem nele também.

Tabela 5: A ambigüidade da “Revolução Sexual”


O que você pensa da revolução sexual?
Algumas mulheres, “Acho que basicamente a revolução sexual é boa.
embora achando a Minhas únicas dúvidas são: 1) um
revolução sexual boa desenvolvimento quase inevitável de sentimento
de um modo geral, de culpa nos que não estiverem ‘por dentro’. Tais
preocupavam-se com reações eventualmente podem diminuir, mas
seus efeitos nas filhas sinto pelos que sofrem com isso. 2) Também me
preocupa que os jovens não estejam preparados
para isso. Incluiria nesse grupo os que têm entre
oito e vinte anos e foram ou serão influenciados
ao mesmo tempo pelo comportamento
tradicional e pelo novo. Sua educação
tradicional e o nível de experiência corrente não
são suficientes para ajudá-los na decisão que
inevitavelmente terão que tomar. O ponto de
vista tradicional diz ‘não’ e a nova revolta diz
‘sim’. Eles não experiência e freqüentemente não
podem aceitar sua própria decisão devido à
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guerra entre o antigo e o novo ponto de vista.”
Muitas das respostas “Existe mesmo uma? Pouco notei. Dificilmente é
refletem fortes um revolução o fato de se falar muito dobre sexo.
reações a chamada Muitos dos ‘libertos’ não são liberados. A
revolução sexual. maioria dos homens pouco ouvir falar de clitóris.
Muitas mulheres Constantemente rapazes estão tentando trepar e
acham que não houve moças estão sendo feridas em seus sentimentos –
uma revolução real. o que é que mudou? As mulheres estão indo mais
para a cama do que era de costume – nada de
revolucionário, só um modo diferente de
manipular um problema que continua a não ser
compreendido”

“Apenas palavras. A ‘revolução sexual’ tem sido


estimulada pela propaganda e pela ética da
competição e do consumo, etc. Abriu um novo
mercado. Minissaias não são uma revolução”
O x da questão – “Penso que, basicamente, a ‘revolução sexual’
declarar o sexo empurra muitas mulheres para terem mais sexo
saudável e necessário e com mais homens do que realmente querem.
a mulher ‘livre’ para Atualmente, já que as mulheres supostamente
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praticá-lo – foi acabar gostam tanto de sexo quanto os homens, elas são
com o direito de a consideradas ‘quadradas’ ou ‘frígidas’ se não
mulher não fazer o querem correr para a cama, etc. Não acho que o
sexo. As mulheres comportamento dos homens em relação as
perderam o direito de mulheres tenha mudado; eles ainda se sentem
dizer não? ameaçados por mulheres agressivas e podem
curtir o sexo numa boa com uma mulher
sensual, mas não querem necessariamente uma
relação firme com ela.’
Fonte:Relatório Hite, 1976, p. 316-319

A maioria das mulheres que responderam as perguntas foram


educadas para serem ‘moças direitas’ e ‘de família’. Muitas não
conseguiam enxergar a revolução sexual como algo positivo ou
realmente eficaz, a preocupação com as filhas e as gerações futuras era
levantada, o conflito do antigo com o novo pensamento, como se
comportar nesse embate.

CONCLUSÃO
Ao longo desse texto percebemos que apesar de todas as
tentativas de tornar o sexo algo restrito aos consultórios médicos, às
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confissões e condenado ao desaparecimento, fazendo crer que os atos
"ilícitos" só eram possíveis em locais rentáveis como a prostituição, não
tiveram o efeito esperado pelo patriarcado e sociedade da época. Foi
durante o século XX que a sexualidade passou a ser pesquisada e
divulgada à população pelas grandes mídias. O Relatório Hite usou de
depoimentos pessoais e anônimos de várias regiões dos Estados
Unidos.
Essa pesquisa marcou época nos Estados Unidos. O Relatório
Hite, revoltou muitas pessoas conservadoras e homens por dizer que as
mulheres, principalmente as casadas, não tinham orgasmos, ou sequer
sabiam o que era exatamente. O relatório exibiu um modelo de sexo
que explorava as mulheres, em que elas tinham que se submeter a tudo
o que os homens queriam, acreditando que se eles tinham prazer e se
excitavam daquela forma, as mulheres também deveriam ter as
mesmas sensações.
A revolução sexual dos anos 60 foi uma resposta às mudanças
sociais de longo prazo que afetaram a estrutura das famílias, em que o
papel da mulher passou a ser questionado. Até o final da Segunda
Guerra Mundial, acreditava-se que quanto maior a taxa de natalidade,
melhor era para a nação, mais pessoas, mais riquezas, mais forte as
forças militares, maior o número de consumidores, porém com o
surgimento da pílula anticoncepcional, esse paradigma foi quebrado.
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Com o desenvolvimento de políticas públicas e dos direitos
humanos, a família grande e numerosa deixou de ser uma reserva
econômica, quando a criança ajudava na renda, deixando de estudar e
indo trabalhar para juntar dinheiro para seus pais na velhice. Criar
uma criança era caro e ter famílias com 5, 6 filhos deixou de ser uma
preocupação. O casamento como forma de direito de propriedade,
começou a existir para “garantir” a paternidade, mas a partir do
momento que essa preocupação em ter filhos deixa de existir, o
casamento já não tem tanta importância e não é tão necessário,
permitindo dessa forma às mulheres uma liberdade sexual, porém, essa
mudança no papel da mulher na sociedade, fez com o que o status que
tinha antes, diminuísse, na medida em que ter filhos, foi deixando de
ser prioridade. Ao mesmo tempo, essa liberdade fez surgir novas
possibilidades de independência feminina. Assim como para os
escravos depois da abolição, a independência era algo mais fácil de
falar do que de se praticar. (HITE, 1976), elas não tiveram as mesmas
oportunidades de educação e emprego que os homens, isso as manteve
como dependentes deles e de uma forma mais intensa, até mesmo fora
do casamento, porque o casamento ainda mostrava uma segurança.
O movimento feminista da segunda fase nos anos de 1960 e 1970
buscou e ainda busca tornar a mulher realmente independente e livre,
potencializando a mulher.
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Quando questionamos no segundo e no terceiro capítulo se a
revolução sexual, realmente existiu é porque levantamos a questão de
que essa revolução sexual deu o direito às mulheres de fazer sexo sem
casamento e poligâmico. Porém, essa liberdade não deu de verdade
uma liberdade real para que elas pudessem explorar a sua sexualidade.
Não é possível decretar que as mulheres sejam sexualmente livres,
quando não são economicamente livres (HITE, 1976), é como colocar
as mulheres numa posição mais vulnerável, de propriedade e de fácil
acesso.

REFERÊNCIAS

HITE, Shere. O relatório Hite - Um profundo estudo sobre a


sexualidade feminina. São Paulo: Círculo do Livro S/A.

BOZON, Michel. Sociologia da sexualidade. Rio de Janeiro. Editora


FGV, 2004

FOUCAULT, Michel. História da sexualidade I: a vontade de saber. 4ª


Ed. Rio de Janeiro: Grall:1982

SENA, Tito. Os relatórios Kinsey, Masters & Johnson, Hite: As


sexualidades estatísticas em uma perspectiva das ciências humanas.
Tese de doutorado Programa de Pós graduação Interdisciplinar em
Ciências Humanas. Centro de Filosofia de Ciências Humanas. UFSC.
Florianópolis, 2007
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