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Platão - Fedro
Platão - Fedro
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Esse texto é resultado parcial do projeto de pesquisa “A Função Epistemológica da Me-
mória em Platão e Aristóteles”, financiado pelo Fundo de Apoio à Pesquisa e pelo Progra-
ma UNISC de Iniciação Científica – ambos da Universidade de Santa Cruz do Sul.
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Docente do Departamento de Ciências Humanas – Universidade de Santa Cruz do Sul
(ronie@dhum.unisc.br)
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HAVELOCK. p. 16.
“Este conocimiento, oh rey, hará más sabios a los egipcios y más me-
moriosos, pues se há inventado como um fármaco {phármakon} de la
memoria y de la sabiduría.” Pero él [Thamus] le dijo: “Oh artificiosísimo
Theuth! A unos les es dado crear arte, a otros juzgar qué de daño o pro-
vecho aporta para los que pretenden hacer uso de él. Y ahora tú, preci-
samente, padre que eres de las letras, por apego a ellas, les atribuyes po-
deres contrarios a los que tienen. Porque es olvido lo que producirán em
las almas de quienes las aprendan, al descuidar la memoria, ya que, fián-
dose de lo escrito, llegarán al recuerdo desde fuera, a través de caracteres
ajenos, no desde dentro, desde ellos mismos y por sí mismos. No es,
pues, um fármaco {phármakon} de la memoria lo que has hallado, sino
um simple recordatorio. Aparencia de sabiduría es lo que proporcionas a
tus alumnos, que no verdad. Porque habiendo oído muchas cosas sin
aprenderlas, parecerá que tienen muchos conocimientos, siendo, al con-
trario, em la mayoría de los casos, totalmente ignorantes y dificiles, ade-
más, de tratar porque han acabado por convertirse em sabios aparentes
em lugar de sabios de verdad.”
somente um sinal exterior que pode ser utilizado como um meio para sua reali-
zação – parece ser esse o sentido de considerá-la como um “recordatório”, como
um meio através do qual a Anamnese é possível – um meio “hipomnemático”.
Mas isso significa admitir a existência de um certo caráter “anamnético” da es-
crita! Isto é, ela parece poder vir a ser um instrumento em acordo com os ter-
mos da retórica filosófica – o que parece contrariar aquela crítica baseada no
seu estatuto ontológico.
Entretanto, para que a escrita possa ser um instrumento adequado à re-
tórica filosófica, torna-se necessário que ela não seja compreendida como uma
instância autárquica. Pois se ela parece possuir sua razão de ser em si mesma,
isto implica em que não se pode considerá-la um instrumento para remeter a
alma para um significado que não se encontra no próprio texto. Seu caráter de
objeto parece fazer com que ela seja percebida como um ser que não requer
um complemento que a justifique e funcione como seu sustentáculo. A Anamne-
se requer, pelo contrário, um instrumento que deixe evidente sua dependência
com relação àquilo que é superior e em si mesmo; ela demanda um meio que
faça com que a alma passe ‘através dele’ e ainda que tal passagem seja promo-
vida ‘por meio dele’. A escrita, ao contrário, parece produzir o efeito de deter a
alma no estágio em que ela se encontra.
O fato de que a escrita possa ser considerada, eventualmente e em cir-
cunstâncias não especificadas, como retoricamente adequada e, ao mesmo
tempo, parecer impedir a realização da Anamnese estabelece um impasse com
respeito ao juízo que Platão faz sobre ela. Aparentemente, ambas as posições
podem ser atribuídas a ele – ou, se quisermos ser mais cuidadosos, as duas
encontram-se presentes no mito de Theuth e Thamus.
Um passo adiante seria reconhecer a ambigüidade (não de Platão mas)
das funções da própria escrita: ela nada acrescenta à retórica verdadeira mas, já
que ela existe de maneira artificial, é possível que, em determinadas circunstân-
cias, ela possa vir a ser retoricamente útil – ainda que, pelo seu caráter de obje-
to, ela possua uma tendência a se passar por autárquica. A ambigüidade encon-
tra-se em que a escrita pode desempenhar duas funções absolutamente distin-
tas com respeito à Anamnese: obstruí-la ou promovê-la.
4
DERRIDA. p. 46.
5
Com relação à metáfora do pai, DERRIDA. Capítulo 2: “O Pai do Lógos”. Com relação à
metáfora do capital, “A República”(506a-d).
Não nos parece adequado, dessa forma, atribuir a Platão a tese de que a
oralidade seja, sem mais, superior à escrita. O juízo de valor acerca da eficiência
retórica de um discurso, reiteramos, deve ser efetuado com base no ideal da
retórica filosófica e incide sobre cada discurso em particular – e não sobre os
gêneros oral e escrito. Pelo seu estatuto ontológico peculiar, a escrita tende a
ser menos eficiente aos propósitos daquele ideal. Embora isso não a torne, em
definitivo, retoricamente inferior à oralidade.
O diálogo platônico é a forma como se conjulgou o caráter de objeto da
escrita – seu estatuto ontológico – com os requisitos da retórica filosófica.
Referências Bibliográficas