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Como despertar o prazer da leitura

e escrita através da fanfic


Explore o gênero digital previsto pela BNCC e inspire-se com um projeto
que usou séries para engajar os alunos na produção de um fanzine
POR:
Débora Garofalo, Raquel Zandonadi
18 de Dezembro | 2018

Em um mundo que a internet está cada vez mais presente, despertar a leitura e a escrita na escola ganhou novos desafios!
Não queremos apenas que nossos alunos sejam passivos de informações. Queremos formar leitores críticos, que desconfiem
de informações que circulem sem fontes confiáveis, que desejam participar e também produzir.

LEIA MAIS Como usar os gêneros digitais em sala de aula

Um exemplo desta nova relação com a leitura e a escrita são os gêneros digitais, como o trailer honesto, e-zine, detonado,
pastiche, ciberpoema e as fanfictions. Nossa conversa de hoje é sobre histórias ficcionais publicadas em plataformas digitais
por fãs dos mais diversos interesses: obras literárias, séries televisivas, games, histórias em quadrinhos e/ou personalidades.
Esses fãs leem e escrevem histórias criadas nessa plataforma, a partir do universo dos seus ídolos.

LEIA MAIS Conheça seis gêneros digitais sugeridos pela BNCC

Criar uma história ficcional de um assunto de interesse da turma ou estudante tem um potencial enorme de desenvolver
habilidades de leitura e escrita, além de uma poderosa ferramenta para ser trabalhada em sala de aula. No gênero, as
narrativas são recriadas a partir do enredo oficial e, com isso, os alunos têm a oportunidade de desenvolver uma nova trama
ou prolongar a narrativa com a qual mantêm uma relação de fã.

Palavras de quem já fez


Raquel Zandonadi é professora de Língua Portuguesa da rede municipal de ensino da Praia Grande (SP) e vencedora nacional
do Prêmio Professores do Brasil, na categoria Ensino Fundamental II. Ela fez um trabalho motivador com os seus alunos
dentro do gênero digital a partir da série espanhola “La Casa de Papel”, disponível na Netflix. “Como os jovens se tornam
cada vez mais virtuais e cada vez mais leem e escrevem nesse ambiente, a proposta visou colaborar para que as práticas de
ensino não fiquem alheias à diversidade de linguagens e culturas do mundo tecnológico”, conta Raquel. Por isso, a
professora faz um trabalho que direciona os adolescentes a pensarem os gêneros textuais como práticas sociais dentro desse
universo jovem e digital. “Isso colabora para que os
alunos desenvolvam habilidades linguísticas e discursivas e
que desenvolvam, como consequência, uma
postura crítica e analítica diante dessa diversidade de
textos que a internet oferece”,
relata.
A seguir, a professora Raquel compartilha o passo a passo da atividade realizada por ela: 

Como fazer uma fanfic com a sua turma

1) Eleja o objeto cultural que será fonte para a produção das fanfictions. No caso, a escolha foi feita
pelos alunos: a série “La Casa de Papel”. Possibilitar que a turma possa trabalhar com seus temas de
interesse ajuda no engajamento com a atividade.

2) Explore as narrativas em gêneros diversos. Antes do início do trabalho com a série escolhida, decidi
abordar questões gerais sobre narrativas com o intuito de apurar o olhar dos alunos quanto aos elementos
que compõem essa tipologia. Para isso, elenquei narrativas de gêneros diversos: canção, conto, crônica e
longas-metragens e fomos desenvolvendo, em cotejo, a análise.
3) Analise com a turma o objeto escolhido como tema para a produção. Depois de assistir os três
primeiros episódios da série espanhola escolhida pela turma, fiz uma atividade em grupo sobre as
características dos personagens. Previamente montei um painel com as fotos dos principais personagens.
Abaixo delas, deixei uma fita dupla-face colada e distribuí para os grupos três adjetivos impressos. Eles
deveriam debater em grupo e escolher para qual dos personagens atribuiriam cada um dos adjetivos,
justificando a escolha.  Foram à frente da sala, colaram a característica na fita dupla face e fizeram a
explanação. 

Depois, perguntei ao restante da sala se concordavam com tais atributos, possibilitando um momento de debates
sobre a construção das personagens e retomada das ações da trama para as justificativas. As justificativas deveriam refletir
sobre a maneira de ser que cada personagem demostrou nos episódios – tanto em suas atitudes quanto na maneira de se
relacionar com outros personagens. Por fim, aqueles que desejassem acrescentar algo poderiam trocar alguma das
características coladas no painel pelos colegas e justificar a mudança.

4) Trabalhe com as referências do objeto escolhido. Todas as referências do seriado foram transformadas em
trabalhos. Usamos, por exemplo, o tema resistência, a cor vermelha predominante na paleta de cores da trama, a máscara
de Salvador Dali usada pelos assaltantes, os apelidos dos personagens, a música “Bella ciao”... O intuito foi aprofundar a
análise do enunciado para que os alunos pudessem fazer uma compreensão profunda da construção do enredo e, a partir
disso, perceber as brechas narrativas para compor suas histórias.

5) Explore a plataforma de publicação e a experiência dos próprios alunos com o gênero. Depois de expor questões
sobre o gênero fanfiction (como características e origem), pedi aos que já conheciam as plataformas que falassem de suas
experiências. Em seguida, apresentei aos alunos a plataforma que seria usada: a spirit fanfiction. Para isso, fiz prints das
páginas e montei uma apresentação em power point, já que não havia o acesso pela internet da escola. Nesse momento,
pedi que os alunos criassem, em casa, um perfil na plataforma.
6) Planeje a produção textual. Converse sobre possibilidades de fanfics a partir do objeto-tema. Anotamos as
sugestões dos alunos na lousa para termos um panorama das possibilidades. Na sequência, elaborei uma espécie de roteiro
para que pudessem planejar suas narrativas. Essa atividade funcionaria como um “projeto de dizer”, no qual poderiam
particularizar as ações que os tornariam criadores dos seus discursos, mas também poderiam ajudá-los na construção de
uma autoria. Nesse “projeto de dizer” deveria conter: Título, sinopse da história, personagens da série que apareceriam,
personagens novos (nesse caso, deveriam descrever esse personagem com características físicas e psicológicas, sua relação
com os personagens já existentes, alguma habilidade que teriam, qual ocupação tinham antes de entrar para a trama e que
papel desempenhariam na narrativa), lugares onde se passariam a história (sugeri que usassem imagens no planejamento,
para que visualizassem o lugar antes de escrever sobre ele) e ideias para os cinco primeiros capítulos. Pedi que fizessem esse
roteiro no caderno para que pudessem consultá-lo sempre que necessário.
7) Reúna os materiais produzidos pela turma. Para finalizar o projeto e com o intuito de mostrar à comunidade
escolar o trabalho findado, montamos um fanzine com todo o material produzido (você pode conferir a capa do fanzine no
abre deste texto). Os alunos trabalharam de acordo com suas habilidades: um grupo ficou incumbido de fazer a edição dos
conteúdos, das fanfics selecionadas e da capa; outros grupos organizaram os conteúdos mais relevantes para a revista;
outros fizeram memes, charges, quiz e caça-palavras. Queríamos colocar no papel o que tinha sido feito, em diálogo, na sala
de aula, e o que estava na web.
O trabalho da professora Raquel ampliou o repertório dos alunos quanto às referências culturais e histórias,
além de enriquecer a compreensão deles sobre o gênero. Isso deu suporte para que a leitura e escrita fluísse
para a construção da fanfic. Elaborando e testando hipóteses, eles puderam apurar o olhar crítico.

E você, querido professor, como atua para despertar a leitura e a escrita com seus alunos? Conte aqui nos
comentários e ajude a fomentar práticas docentes.

Um grande abraço,
Débora e Raquel

Débora Garofalo. Professora da rede Municipal de Ensino de São Paulo, formada em Letras e Pedagogia,
mestranda em Educação pela PUC-SP e colunista de Tecnologia para o site da NOVA ESCOLA. 
 Raquel Zandonadi. Formada em Letras pela UNESP e pós graduação lato sensu em Educação pela USP.
Atualmente é professora de Língua Portuguesa do município de Praia Grande e mestranda da Universidade
Estadual Paulista "Júlio de Mesquita Filho", no programa PROFLETRAS, desenvolvendo a pesquisa
"Fanfictions: contribuições das novas relações de leitura e escrita da era digital para o letramento em
Língua Portuguesa". Vencedora nacional do 11º Prêmio Professores do Brasil, na categoria de 6º a 9º ano
do Ensino Fundamental, com o projeto "Minhas memórias: o embate de vozes na construção da identidade
de alunos-sujeitos".

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