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Prova 13 Junho 2016, questões e respostas

Direito das Obrigações A/B/C/D (Universidade Catolica Portuguesa)

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UNIVERSIDADE CATÓLICA PORTUGUESA

ESCOLA DE DIREITO DO PORTO


DIREITO DAS OBRIGAÇÕES

ÉPOCA ORDINÁRIA (13.6.2016)

DURAÇÃO DA PROVA: 3 HORAS (SEM TOLERÂNCIA)

ELEMENTOS A UTILIZAR: CÓDIGO CIVIL E ANEXO DE LEGISLAÇÃO

RESPONDA AOS QUATRO GRUPOS EM FOLHAS SEPARADAS E COM LETRA LEGÍVEL

António, que se encontrava internado na unidade de psiquiatria da Clínica de Santa Rita por
ter sido identificado como pirómano, conseguiu sair do hospital enquanto Bernardo,
enfermeiro responsável pela sua ala, dormia em incumprimento das ordens claramente
recebidas do enfermeiro-chefe daquela unidade de saúde. António entrou no supermercado
de Carlos e ateou fogo à banca onde estavam colocadas as frutas e legumes. Duarte, motorista
de profissão, que ia a passar na rua, decidiu entrar no supermercado e tentou apagar o fogo
com os cobertores que transportava no seu camião e pertenciam a Eduardo.
A banca de frutas e legumes de Carlos e os cobertores de Eduardo ficaram destruídos. Duarte
teve de ser hospitalizado em virtude da inalação de fumo.

1. Em que medida é que poderá Carlos responsabilizar António, Bernardo e a Clínica de


Santa Rita pelos danos sofridos na sua banca de frutas e legumes? 2
2. Quem e com que fundamento poderá Eduardo responsabilizar pela perda dos
cobertores? 1,5
3. Duarte poderá exigir a Carlos que o indemnize pelos danos que sofreu na tentativa de
apagar o fogo que eclodiu na loja do segundo? 1,5

II
Artur, colega de escritório de Luís, em passeio por Lisboa, entrou numa loja de
antiguidades e comprou, sem referir o nome de Luís, um certo cavalo de bronze do
século XIX, peça esta que Luís já há muito pretendia adquirir. Para compensar Artur,
Luís deu-lhe 500€, mas ficou admirado quando, alguns dias depois, o dono da loja o
interpelou para pagar os 2.000€ do preço da peça. Este preço fora conseguido à custa
de uma conversa muito demorada, tendo Artur, por esse facto, perdido uma “boleia” e
vendo-se obrigado a regressar de comboio à cidade do Porto.

1. Acha legítima a admiração de Luís? 2


2. Poderia, de alguma forma, Artur, que gostou do cavalo, ficar com ele? 1,5
3. Poderá Artur ser indemnizado do que gastou no bilhete de comboio? Terá
recebido os 500€ em cumprimento de uma obrigação natural? 1+1

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III
Depois de algumas negociações em que estabeleceram formalmente os aspetos
essenciais de um contrato-promessa, Amadeu e Filipe vieram a celebrar um
denominado “contrato-promessa de compra e venda de moradia”. Neste contrato,
cujo reconhecimento das assinaturas só teve lugar 30 dias após a celebração, duas
cláusulas chamavam a atenção: (i) “quem desistir do contrato terá de pagar em
dobro o sinal ou perderá a respetiva importância” e (ii) Eu, Filipe, prometo-vender
a moradia “Bela Cruz”, pertencente à minha mulher Margarida”.

1.Identifique o acordo resultante das negociações. 1


2.Seria legítimo o reconhecimento posterior ou poderia um irmão de Amadeu pôr
em causa o contrato? 1,5
3.Interprete a cláusula (i) e diga se a cláusula (ii) não torna inválido o contrato.
1,5

IV
Maria viu-se envolvida num acidente de viação, tendo ficado bastante danificado o
seu automóvel de gama média e que lhe pertencia há já 12 anos. O outro
interveniente no acidente foi Raul, condutor de um autocarro de passageiros. Após
o acidente, Maria alugou um veículo de luxo, não sem antes ter reclamado, junto
da Seguradora do dono do autocarro, que o seu veículo fosse reparado. A
Seguradora não quer assumir a reparação, dizendo que não foi provada a culpa de
Raul, que não tem que pagar as despesas do aluguer e que, em última análise, só
está obrigada a entregar o valor do veículo à data do acidente, ou seja 1000€.

1. O que dizer do argumento relativo à prova da culpa? 2


2. Concorda com a circunstância de a Seguradora não querer assumir as
despesas do aluguer e só querer pagar 1000€ pelo veículo acidentado? 2
3. Caso Maria tivesse morrido no acidente seria possível distinguirmos
teoricamente três danos diferenciados e relacionados com a morte. Quais
seriam? 1,5

TÓPICOS DE SOLUÇÃO

1. Carlos pode responsabilizar Bernardo com base na presunção de ilicitude e de culpa


prevista no art. 491.º. Solidariamente com Bernardo, responderá a Clínica de Santa
Rita, uma vez que se encontram preenchidos os pressupostos do art. 500.º. O facto de
o comissário não ter acatado as ordens recebidas não é suficiente para afastar a
responsabilidade (objetiva) do comitente (art. 500.º, n.º2). Se António for inimputável
(art. 488.º), só responderá subsidiariamente nos termos do art. 489.º. Se for imputável
responde solidariamente com Bernardo e Carlos, nos termos do art. 483.º.

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2. Uma vez que Duarte agiu em estado de necessidade (art. 339.º, n.º1), mas o perigo
não foi provocado por culpa sua, se e na medida em que a equidade o exigir poderá o
tribunal condenar não só o agente (Duarte), como aquele que tirou proveito do acto
(Carlos) ou aqueles que contribuíram para o estado de necessidade (Bernardo, Clínica
de Santa Rita se se entender que o comitente também responde objectivamente nos
termos do art. 500.º quando o comissário responder por factos lícitos, e António) a
indemnizar o lesado (art. 339.º, n.º2). Responsabilidade por factos lícitos ou pelo
sacrifício.
3. Estando preenchidos os requisitos do art. 464.º, deve entender-se que Duarte agiu
como gestor de negócios. Provando-se que o gestor respeitou o interesse e a vontade
presumível do dono do negócio, a gestão pode ser qualificada como regular (art. 465.º,
al.a) e Duarte tem direito a ser indemnizado nos termos dos arts. 468.º, n.º1 e 469.º.

II

1. Tudo indica tratar-se de uma gestão de negócios, dado estarem preenchidos os


requisitos do art. 464º. Não se trata, assim, nem de um contrato para pessoa a
nomear, nem de um contrato a favor de terceiro. Artur, ao comprar o cavalo em seu
nome, levou a cabo uma gestão não representativa, aplicando-se o regime previsto
nos arts 1180º a 1182º, por remissão do art. 471º, parte final. A estranheza de Luís só
se justifica em parte por ter sido interpelado pelo vendedor, pois, ao compensar Artur,
certamente tomou conhecimento do sucedido, aprovando tacitamente a gestão e
tendo agora, nos termos do art. 1182º, que entregar a Artur os 2.000€ ou assumir ele
a dívida por alguma das formas previstas no art. 595º (e daí que nem seja estranha a
interpelação do vendedor).
2. Quanto à hipótese de Artur ficar com o cavalo, seria necessário que Artur não o
entregasse, nem transferisse para Luís o direito que adquiriu em virtude da gestão (art.
1181º), pagando ele o preço. Claro que, nesta hipótese, a gestão perde utilidade final,
verificando-se que, afinal, não houve intenção de atuar para outrem e perdendo causa
a compensação dos 500€. Uma não aprovação não daria possibilidade de reclamar a
despesa do comboio mas não ia interferir propriamente, só por si, na justificação para
Artur ficar com o cavalo. Pode também discutir-se sobre uma eventual
responsabilidade de Artur já que, afinal, a sua gestão não ficaria concluída.
3. Quanto aos gastos no bilhete de comboio Artur poderá ser ressarcido ao abrigo dos
arts. 468º,1 e 469º. O recebimento dos 500€ tem por fundamento uma doação
remuneratória (cfr. o art. 941º).

III

1. Trata-se do chamado acordo de base.


2. A doutrina entende que, tratando-se, quanto às formalidades do art. 410º,3, de uma
nulidade atípica, a falta de reconhecimento presencial é sanável (convalidação). O
irmão de Amadeu é que não poderia, de forma alguma, invocar a nulidade do contrato
pois o AUJ nº 15/94 não o permite na sua qualidade de terceiro.
3. A primeira cláusula é válida pois traduz uma cláusula penitencial em que o sinal é o
montante tido em conta para o preço do arrependimento. Quanto à segunda cláusula,
pressuposta a falta de legitimidade de Filipe, o seu teor não invalida o contrato pois é

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válido um contrato-promessa de compra e venda de bens alheios (art. 410º,1, parte


final). Não podemos pois aplicar o disposto no art. 1687º,4.

IV

1. Estamos perante uma colisão de veículos, um deles conduzido pelo seu proprietário e
o outro por um comissário. Sobre Raul recai a presunção de culpa prevista no nº 3 do
art. 503º, aplicável à colisão for força do Assento de 26 de janeiro de 1994. Deste
modo, terá que ser Raul a provar que não teve culpa, para, dessa forma, não
indemnizar. Mesmo que a presunção seja afastada é possível que haja
responsabilidade pelo risco do detentor do autocarro (eventualmente partilhada com
a quota de risco que cabe ao veículo de Maria), a não ser que naquele afastamento se
tenha concluído pela culpa exclusiva de Maria (art. 505º).
2. É legítima a atitude da Seguradora de não querer pagar as despesas do aluguer pois o
lesado agravou culposamente os seus danos (art. 570º,1) ao não tomar de aluguer um
veículo semelhante ao seu. Quanto à indemnização pela danificação, há que colocar
duas hipóteses: (i) o veículo de Maria foi considerado em situação de perda total – por
ex., constatou-se que o valor da reparação ultrapassa 120% do valor de substituição à
data do acidente ou que a reparação era materialmente impossível – ver o art. 41º,1
do Decreto-Lei nº 291/2007. Nesta primeira hipótese, os 1.000€ só serão um valor
correto, isto é, de substituição (cfr. o art. 41º,2 do diploma), se for possível a Maria
adquirir um veículo semelhante ao seu; (ii) desde que seja possível a reparação, sem
os entraves de (i), a Seguradora não a pode evitar, tendo em conta a primazia da
restauração natural (arts. 562º e 566º,1).
3. A morte pode originar o dano da privação da vida do falecido (quem recebe a
compensação?), o dano não patrimonial sofrido pelo falecido nos momentos que
antecederam a morte e os danos não patrimoniais dos familiares/conviventes do
falecido.

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