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Direito das Obrigações I – 1.ª e 2.

ª Turmas
21 de Janeiro de 2019

I (4 valores)
Distinga entre:
a) Contratos mistos e contratos coligados.
Cfr. João de Matos Antunes Varela, Das Obrigações em Geral, 10.ª ed.,
Almedina, Coimbra, 2004, pp. 279 a 285.
b) Enriquecimento real e enriquecimento patrimonial.
Cfr. Antunes Varela, Das Obrigações em Geral, pp. 481 e 482.

II (8 valores)
Alice, proprietária de uma quinta de grande extensão, celebrou dois contratos com
a empresa de jardinagem Bricolagens Botânicas, Lda.: um relativo ao serviço de
jardinagem e outro de aquisição de material de jardim e material agrícola, contratos esses
de teor idêntico aos celebrados por proprietários de quintas na zona e aos propostos a
novos contratantes. Alice obrigou-se a pagar um motocultivador e um cortador de relva
no montante de €10.000 euros em 10 prestações.
Considere autonomamente as seguintes situações:
a) Perante o incumprimento de Alice da sétima prestação, a Bricolagens
Botânicas pretende resolver o contrato, à luz da cláusula 5.ª segundo a
qual “qualquer tipo de incumprimento, total ou parcial, dá origem à
possibilidade de resolver o contrato”, ou invocar, de modo a forçar o
cumprimento, a sanção pecuniária compulsória. Sabendo que houve
reserva de propriedade e entrega dos bens, procederá o pedido de
nulidade da cláusula que, em resposta, Alice pretende apresentar ou
haverá outros argumentos (adicionais ou complementares) que obstem
ao pedido (alternativo) da Bricolagens Botânicas?
b) Carlos, interessado na aquisição da quinta, é informado de que a
cláusula 12.ª daquele contrato que Alice celebrou a obriga, em caso de
venda da quinta, a transmitir a sua posição de devedora das restantes
prestações ao comprador. Ficará Carlos vinculado?

a) Apreciação da nulidade da cláusula:


Possível qualificação como cláusula contratual geral (se dotada das
características das ccg). Controlo do conteúdo e incidental. Fundamentação legal.
Ponderação da nulidade da cláusula por força da natureza imperativa do art.
934.º CC (referência à expressão “sem embargo de convenção em contrário” e à
ratio do preceito: a protecção da parte mais fraca – o comprador no contrato de
compra e venda a prestações).

Consequências do incumprimento da sétima prestação.


Qualificação da prestação como prestação fungível. Inaplicabilidade do
instituto sanção pecuniária compulsória.
Qualificação da prestação como prestação duradoura fraccionada.
Verificação dos requisitos do art. 934.º: Inexistência do direito à resolução.

b) Referência à eficácia relativa dos contratos. Fundamentação legal.

III (8 valores)
Em Julho do ano passado, André e Bernardo vincularam-se a celebrar um contrato
de compra e venda de um precioso quadro que pertencia a Zulmira, avó de André. André
esperava adquiri-lo em breve, já que Zulmira estava gravemente doente e André sabia
que poderia ser contemplado no seu testamento.
O acordo entre André e Bernardo consta de um documento, que aquele assinou,
depois de deste receber €10.000.
Zulmira faleceu em Dezembro último mas, contra a expectativa de André, legou o
dito quadro à sua prima Carolina.
Hoje, data acordada para a venda do quadro, Bernardo consulta-o(a) para saber se
o contrato que celebrou com André é válido e que medidas poderá tomar em defesa dos
seus interesses.
Quid iuris?

André e Bernardo concluíram um contrato-promessa de compra e venda,


que é bilateral. O princípio da equiparação plasmado no n.º 1 do artigo 410.º não é
aplicável porque, apesar de André ter prometido vender uma coisa alheia, não se
justifica a extensão ao contrato-promessa da nulidade consagrada no artigo 892.º,
uma vez que este contrato não transmite o direito de propriedade sobre o quadro.
Como o contrato prometido (venda de coisa móvel) não exigia documento, para a
sua validade formal, nem autêntico, nem particular, o facto de André e Bernardo
terem reduzido o contrato-promessa a escrito é irrelevante. Trata-se de um excesso
de forma, pelo que irrelevante será também o facto de só um ter assinado o
documento escrito. O contrato-promessa é válido.
A promessa de André não foi cumprida. Nos termos do n.º 1 do artigo 830.º,
Bernardo (promitente comprador) não pode recorrer à execução específica porque
esta – ao tomar o lugar da declaração negocial, de André, em falta – implicaria a
transmissão do direito de propriedade sobre uma coisa que não pertence à pessoa a
cuja declaração se substituiria. Ademais, o facto de haver sinal (presumido de
acordo com o artigo 441.º) afasta a faculdade de recurso à execução específica (n.º 2
do artigo 830.º). Não tendo havido tradição do quadro, Bernardo pode exigir apenas
a entrega em dobro do que prestou a título de sinal (isto é, €20.000), nos termos do
n.º 2 do artigo 442.º.

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