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Tema 1 – Comunicação intercultural e sociedade contemporânea

Interculturalidade(s) e mobilidade(s) no espaço europeu: viver e comunicar entre


culturas – Natália Ramos.
O aumento da globalização e da mobilidade ao nível nacional e internacional fez
aumentar os contatos interculturais, a coabitação com a diversidade cultural e os
conflitos, decorrentes de atitudes e comportamentos discriminatórios e racistas,
particularmente no contexto europeu. A promoção de estratégias e de políticas
adequadas e aquisição e o desenvolvimento de competências interculturais são
objetivos fundamentais para viver, comunicar e fazer face à diversidade e
complexidade que caraterizam o tecido social e cultural de hoje, para a educação das
crianças, jovens e adultos, assim como para o desenvolvimento da solidariedade
nacional e internacional e para a formação de cidadãos e profissionais, não só
nacionais, mas também transnacionais. 
Diversidade cultural e globalização
A diversidade intercultural e a gestão da(s) interculturalidade(s) são objeto de
preocupação de vários organismos internacionais, nomeadamente a UNESCO, a OCDE,
o Conselho da Europa e a Comissão Europeia, e nacionais tais como a OCIDI (Alto
Comissário para a Imigração e Diálogo Internacional), os quais têm desenvolvido
projetos e iniciativas variados, tendo em vista a promoção do diálogo intercultural,
constituindo um dos campos mais importantes da contemporaneidade nos diversos
domínios científicos e interventivos. Exemplo destas iniciativas foi a promoção pela
Comissão Europeia e pelo Conselho da Europa, em 1997, do Ano Europeu contra o
Racismo e a Xenofobia e, em 2008, do Ano Europeu do Diálogo Intercultural e do
Projeto Europeu Cidades Interculturais (este projeto tem como objetivo analisar o
impacto da diversidade cultural e das imigrações nas cidades europeias).
Em Portugal, o Alto Comissário Para a Imigração e Diálogo Intercultural
introduziu no Plano para a Integração dos Imigrantes, 2010-2013, várias medidas
tendo em vista o desenvolvimento de políticas e iniciativas incidindo sobre diferentes
áreas de intervenção, nomeadamente sobre as questões da língua, cultura e
comunicação, da educação intercultural, do combate ao racismo e à discriminação, da
promoção da diversidade e da interculturalidade, das quais destacamos algumas: o
Programa Português para Todos, dirigido à população imigrante, que promove o
conhecimento da língua portuguesa como fator de integração; reforço da expressão da
diversidade cultural em todos os domínios e atividades, sobretudo na área  da cultura,
tendo em vista a promoção do diálogo intercultural e a multiculturalidade; reforço da
formação para a interculturalidade na formação contínua dos professores; apoio ao
acolhimento e integração de estudantes estrangeiros e descendentes de imigrantes
em Portugal; medidas legislativas, divulgação e formação no combate à discriminação
racial; promoção da diversidade cultural e religiosa nos média; sensibilização da
opinião pública para a promoção e valorização da diversidade; sensibilização e
capacitação para a interculturalidade e diálogo inter-religioso no acolhimento e apoio
à integração dos imigrantes e no atendimento dos serviços públicos. 
A diversidade cultural é reconhecida pela UNESCO como uma caraterística
inerente à humanidade, um património comum e uma fonte de um mundo mais rico e
diversificado que alarga a possibilidade de escolhas e fortalece as capacidades e os
valores humanos. 
A adoção, em 20 de outubro de 2005, pela UNESCO da Convenção para a
Proteção e promoção da Diversidade das Expressões Culturais representa uma etapa
fundamental para a emergência do direito cultural internacional. Esta convenção
constitui o primeiro documento internacional com valor jurídico e concilia a defesa de
duas visões: do universalismo (com a defesa dos valores universais da paz, da
solidariedade, da justiça e dos direitos do homem) e do particularismo (com a defesa
da liberdade de cada um expressar a sua cultura, decidir as suas escolhas e afirmar a
sua identidade). 
A diversidade cultural integra cada vez mais todos os domínios da esfera
pública no espaço mundial e europeu e esta diversidade deverá ser considerada, como
destaca a UNESCO (2001), na Declaração Universal sobre a Diversidade Cultural, artigo
3: “uma das fontes de desenvolvimento, entendido não só como crescimento
económico, mas, também, como meio de acesso a uma existência intelectual, afetiva,
moral e espiritual satisfatória”. 
Para Tourraine (2004) e Wiewiorka (2007), a cultura está no centro do que une
e divide as sociedades contemporâneas. Wolton (2003) assinala que aprender a gerir a
diversidade cultural constitui a verdadeira riqueza das sociedades futuras. 
O Conselho da Europa (2000) acentua que é necessário prevenir os perigos e
conflitos que podem resultar da marginalização daqueles que não possuem
competências para viverem e comunicarem num mundo multicultural, interativo,
interdependente e global. 
Para Sandercock (2004), o diálogo intercultural tem de estar presente no
quotidiano e assentar em dois tipos de direitos fundamentais: o direito à cidade,
enquanto espaço coletivo, promotor da participação e de integração de todos na
vivência da cidade e o direito à diferença, enquanto promoção e valorização da
diversidade, da comunicação intercultural e da alteridade. 
O encontro intercultural e as relações entre o Eu e o Outro são influenciados
por representações sociais, por estereótipos, preconceitos, projeções culturais,
ideológicas e políticas. Estes elementos vão ter importância quer na
aceitação/inclusão, quer na discriminação/exclusão da diferença, do estrangeiro; quer
na anulação ou valorização da identidade do Outro e da alteridade; quer no
desenvolvimento e bem-estar ou no sofrimento e doença. 
A crise económica e social tem aumentado as situações de discriminação, de
xenofobia e de violência em relação aos migrantes e minorias étnicas, e as medidas
protecionistas dos Estados e dos meios de comunicação social, contribuem para estas
atitudes discriminatórias. Contudo, apesar das dificuldades decorrentes dos contatos
interculturais, as investigações evidenciam as vantagens para todos, nacionais,
migrantes e minorias étnico-culturais, dos contatos interculturais, das vivências entre
culturas, nomeadamente do biculturalismo, ao salientarem que os indivíduos
biculturais possuem uma maior competência e flexibilidade para expressarem
diferentes aptidões em situações e contextos variados.
Contextos da multi/interculturalidade – figuras do outro e da alteridade
A primeira figura do Outro e da diversidade cultural é o Migrante, aquele para
quem a migração poderá aumentar a liberdade, as oportunidades de decisão e o poder
de escolha, melhorar as condições de vida, alargar o acesso aos serviços básicos, à
escolaridade, à saúde e à participação e constituir um fator importante de
desenvolvimento, se lhe for proporcionado acolhimento e contexto social,
educacional, sanitário e político adequados. 
Sobre a aculturação psicológica, Berry (1989), ao estudar as relações entre os
imigrantes e as sociedades de acolhimento, propõe um modelo bidimensional em que
distingue quatro tipos de estratégias de adaptação, de que resultam 4 modos de
aculturação: i) Assimilação – o imigrante adota os traços culturais da sociedade de
acolhimento com prejuízo do abandono da sua identidade de origem; ii) Integração –
manutenção parcial da identidade cultural do grupo etnicocultural de origem com a
participação, mais ou menos ativa, dos indivíduos na nova sociedade, adotando
igualmente comportamentos e valores dessa sociedade; iii) Separação – o indivíduo
tenta preservar a sua identidade cultural, fechando-se na sua cultura de origem; iiii)
Marginalização -  o indivíduo ou grupo minoritário perdeu a sua identidade cultural
devido, geralmente, a políticas assimilacionistas, não tendo, ao mesmo tempo, o
direito de participar no funcionamento das instituições e na vida da sociedade de
acolhimento, encontrando-se excluído de ambas as culturas. 
As investigações realçam que a integração é o modo mais adaptativo de
aculturação, promovendo nos grupos mais sentimentos de satisfação e bem-estar,
sendo os indivíduos que procuram a integração os que têm a taxa de stresse mais
baixa. Contrariamente, a marginalização constitui o modo de aculturação que mais
conduz a situações de stresse, sendo os indivíduos que vivem situações de conflito nas
suas tentativas de separação os que apresentam o nível de stresse mais elevado. 
Para os migrantes, a possibilidade de um nível de stresse elevado é maior nas
sociedades monoculturais e assimilacionistas do que nas sociedades tolerantes e
pluralistas. 
O processo migratório faz-se acompanhar de mudanças diversas: temporais
(antes e depois da emigração); espaciais (lá e cá, o mesmo e o outro); físicas (novo
meio, habitação, hábitos de vida); biológicas (nova alimentação e doenças); sociais
(novas relações interindividuais e intergrupais, novos padrões de atividades e de
relações sociais); culturais (a educação, a religião e a língua são, muitas vezes,
modificadas pelas sociedades de acolhimento); psicológicas (ao nível das motivações,
das aptidões, da identidade individual e cultural); políticas (perda de autonomia). 
Algumas destas mudanças poderão ser bastante positivas, especialmente no
que se refere à melhoria das condições socioeconómicas, à educação e à saúde. Outras
poderão originar dificuldades de adaptação. Entre as comunidades de imigração e de
minorias étnicas, certos traços culturais, tais como o grau de coesão familiar e do
grupo, o suporte social, as redes de solidariedade grupal, o sentimento de pertença
identitária e os valores religiosos e espirituais, são elementos protetores contra a
doença mental e o stresse de aculturação. Muitos migrantes carregam
frequentemente uma dupla vulnerabilidade (psicológica e social) e uma dupla exclusão
(do país/cultura de origem e do país/cultura de acolhimento). 
Uma em cada 33 pessoas é migrante no mundo de hoje. Na Europa, as
mulheres representam 53% dos migrantes. Os que migram devido à insegurança,
catástrofes ou guerra representam 7% dos migrantes no mundo. São os continentes
europeu e asiático os que acolhem no seu território o maior número de migrantes. Dos
27 países da União Europeia, é a Alemanha que reúne o maior número de cidadãos
estrangeiros (7,2 milhões), seguida da Espanha (5,6 milhões) e o Reino Unido (mais de
4 milhões).
Em Portugal, os estrangeiros com situação legalizada representam cerca de 457
mil pessoas, sendo os brasileiros (26%), os ucranianos (12%) e os cabo-verdianos (11%)
os mais representativos dos estrangeiros com situação legal em Portugal. De acordo
com o Observatório Português da Ciência e do Ensino Superior – OCES, em Portugal, o
número de estudantes estrangeiros inscritos no ensino superior tem vindo a aumentar
nos últimos anos, sendo a maioria de Angola, Cabo Verde e Brasil. 
Em muitas universidades portuguesas, o número de alunos estrangeiros já
representa cerca de 10%. A grande maioria dos que vêm estudar para Portugal é
brasileira, mas também espanhola e italiana, fortemente representados no programa
Erasmus. Estudantes da Polónia, República Checa, Alemanha e Reino Unido são
também significativos.
O século XXI será o século da cidade e das interculturalidades. Neste sentido, o
Conselho da Europa e a Comissão Europeia insistem na necessidade de promover a
Cidade Aberta e Intercultural e acolher a diversidade cultural nas cidades ditas globais,
de modo a responder às novas dinâmicas e necessidades das sociedades atuais.
Outras figuras de diversidade cultural e do Outro são os cerca de 300 milhões
de indivíduos, distribuídos por mais de 70 países, que pertencem a grupos indígenas,
representando cerca de 4 000 línguas; e os cerca de 11 milhões de ciganos residentes
em diferentes países da Europa, nomeadamente em Portugal, os quais constituem a
maior minoria étnica neste continente e enfrentam em geral condições de vida mais
difíceis, maior mortalidade infantil e esperança de vida inferior ao resto da população.
Paradigma intercultural e competências
O Paradigma Intercultural vem introduzir a pluralidade, a heterogeneidade, a
descontinuidade, a complexidade e a multi/interdisciplinaridade na pesquisa,
formação e intervenção, implicando um novo reposicionamento metodológico,
epistemológico e ético, assente em três vertentes estruturantes: conceptual – as
diferenças culturais são definidas não como elementos objetivos com caráter estático,
mas como entidades dinâmicas e interativas, que se dão sentido mútuo; metodológica
– a abordagem intercultural define-se como global, multidimensional e interdisciplinar,
de modo a dar conta das dinâmicas e da complexidade dos fenómenos sociais e a fim
de evitar os processos de categorização; ética – envolve uma reflexão sobre a forma de
respeitar a diversidade individual, social e cultural, de conciliar o universal e o
particular, o global e o local, de adaptação à complexidade estrutural duma sociedade
e à  sua conflitualidade.
A reflexão sobre a diversidade cultural através do paradigma intercultural
envolve processos dinâmicos e multidimensionais, reenvia aos conceitos de
reciprocidade, de complexidade, de complementaridade e de facto social total e
implica o desenvolvimento de diversas competências: competências individuais que
permitem interações sociais harmoniosas entre os indivíduos e as culturas e que
promovam uma atitude de descentração, a qual permitirá flexibilizar e relativizar
princípios, modelos e competências apresentados como únicos e universais e evitar
muitos comportamentos  de intolerância e discriminação; competências interculturais,
sobretudo linguísticas, comunicacionais e pedagógicas que facilitem a comunicação
intercultural e a consciencialização cultural, e por outro lado, que promovam práticas e
intervenções interculturalmente competentes e inclusivas, bem como profissionais e
cidadãos culturalmente sensíveis e implicados; competências de cidadania, que
tornem possível o funcionamento democrático das sociedades e das instituições. 
Desenvolvimento de competências interculturais
Para desenvolver competências no domínio intercultural, nas relações
interculturais e na comunicação entre indivíduos, grupos e culturas, é importante
nomeadamente: - aprender a conhecer-se a si mesmo e à sua própria cultura; -
aprender a conhecer e a compreender o “sentido” de normas e valores, os quadros de
referência do Outro e os códigos culturais respetivos e tomar consciência das
diferenças e especificidades culturais; - desenvolver certas atitudes e trações de
personalidade, tais como abertura de espírito, empatia, criatividade, flexibilidade,
autoconfiança, curiosidade e interesse pela cultura, costumes e tradições do Outro; -
tomar consciência do grau de determinismo cultural dos comportamentos,
desenvolver a consciencialização cultural; - lutar contra o etnocentrismo, o
etnocentrismo tal como os estereótipos e os preconceitos, constituem barreiras, filtros
culturais à comunicação intercultural que estão na origem de conflitos e
incompreensão entre grupos minoritários e maioritários; - evitar julgamentos rápidos e
superficiais, estereótipos, preconceitos e atitudes etnocêntricas, o que permitirá
colocar-se  no lugar do outro de forma a tentar compreender as coisas do seu ponto de
vista, permitindo assim a descentração; - desenvolvera a empatia, o que implica a
capacidade de se colocar no lugar do Outro; - dispor de tempo para comunicar, para
compreender uma situação, assim como aprender a respeitar os ritmos e os estilos de
comunicação próprios a cada indivíduo e a cada cultura; - desenvolver estratégias e
intervenções psicossociais e educativas interculturais; - implementar uma formação
adequada dos professores; - respeitar a diversidade linguística e as línguas maternas e
promover  aprendizagem de línguas estrangeiras; - trabalhar os currículos e os
materiais de aprendizagem, inclusive os que apresentam mensagens discriminatórias e
“racistas”, utilizando-os como instrumentos de consciencialização intercultural; -
utilizar adequadamente os meios de comunicação social, na sensibilização à
interculturalidade e no combate aos preconceitos, estereótipos e a todas as formas de
discriminação; - aprender a construir projetos e a encontrar soluções em conjunto para
resolução de conflitos; - aprender a dialogar com as outras culturas e aceitar negociar
e propor compromissos de modo a evitar comportamentos de rejeição ou de
assimilação; - desenvolver uma formação que explique e contribua para  a
compreensão da diversidade cultural e dos preconceitos e estereótipos socialmente
construídos em relação às minorias e às diferenças religiosas, sociais, étnico/culturais,
geracionais e de género, assim como dos procedimentos para combatê-los; - fornecer
instrumentos conceptuais para análise dos processos psicossociais, cognitivos, sociais e
políticos relacionados  com a construção das identidades individuais e coletivas e
suscetíveis de originar a intolerância, a discriminação, a exclusão, o etnocentrismo e o
racismo; - promover competência tecnológicas, nomeadamente ao nível do domínio e
utilização das novas tecnologias, viabilizar encontros virtuais que facilitam o contato e
partilha de ideias e recursos de informação e aprendizagem disponíveis em qualquer
parte do mundo; - incrementar informação e formação à negociação dos conflitos à
escala nacional e internacional, de cariz social, económico, político e cultural ou sobre
conflitos entre valores fundamentais; - desenvolver um bom conhecimento dos
contextos físico, ecológico-cultural e sociopolítico, nomeadamente através de
aprendizagens teóricas e empíricas e da observação participante. 
Conclusão
O objetivo da interculturalidade não é a separação do universal e do particular
mas a união. Concordamos com Delors (1996) quando acentua que é necessário
assumir a diversidade e a multipertença como uma riqueza.  A educação à pluralidade
é não só uma proteção contra a violência, mas também um princípio ativo de
enriquecimento cultural e cívico das sociedades contemporâneas. 
É indispensável desenvolver estratégias e intervenções psicossocioeducativas
para que profissionais e cidadãos possam situar-se a fazer face, de forma responsável,
crítica, flexível e refletida, às diversidades individuais e culturais que encontram no
seio da sociedade e das instituições, assim como aos problemas complexos que coloca
a comunicação com indivíduos cujas referências culturais não são as mesmas. 
Tema 2 – Processos, caraterísticas e vertentes da comunicação
Comunicação, cultura e interculturalidade: para uma comunicação intercultural –
Natália Ramos
“Aqueles que pretendem que a experiência de outro indivíduo ou coletivo é por
essência incomunicável e impossível, capaz de elaborar uma linguagem que as
experiências humanas mais distanciadas no tempo e no espaço acontecem, pelo
menos em parte, mutuamente intangíveis, em outra fonte onde se refugiam num novo
obscurismo” (Lévi-Strauss, 1977). 
“Mais que um discurso para com o outro, ele passeia à promoção de um
discurso baseado nas relações recíprocas entre “eu” e o outro discurso que constitui a
essência do discurso intercultural” (Abdallah-Pretceille, 1986).
A problemática intercultural está relacionada com o diálogo e a comunicação,
com a abertura ao outro, às culturas, às línguas, às relações internacionais, implicando
uma abordagem global, multidimensional e multi-interdisciplinar. Como defende
Devereux (1972), é necessário perspetivar os problemas e as relações interculturais,
através de diferentes pontos de vista e através de uma “abordagem
complementarista”, já que: “um fenómeno humano que não se explica de uma só
maneira não é, por assim dizer, explicado de todo”. Para este autor: “O
complementarismo não exclui nenhum método ou teorias válidas, ele coordena-as”. 
Os objetos do domínio intercultural são objetos complexos, plurais,
heterogéneos, pluridimensionais e não podem ser reduzidos a uma única abordagem
disciplinar. 
Variáveis e perspetivas da comunicação 
“Todo o indivíduo não comunica consigo mesmo através do outro, os indivíduos
não comunicam entre si excetuando a meditação em grupo, de instituições, de
sociedades, ou composto de valores, de crenças, de símbolos coletivos” (Levy, 1978).
O conceito de comunicação (do latim “communicare”, que significa partilhar,
colocar em comum), implica, não somente um emissor ativo e recetor passivo, mas
exige igualmente a participação ativa dos interessados no processo de comunicação, o
qual se torna um fluxo pluridimensional de informações e de interações com
retroações múltiplas, um processo bidirecional contínuo influenciando o
comportamento. 
Samovar et al. (1981) distinguem oito elementos que estão presentes em toda
a comunicação: a origem, a codificação, a mensagem, o canal de transmissão, o
recetor, a descodificação, a resposta do recetor e a retroação. 
Toda a comunicação é dinâmica, interativa, irreversível e produz-se num
determinado contexto físico sociocultural. Assim, a comunicação não se limita apenas
às mensagens e às interações, mas inclui também o sistema, o contexto que as torna
possíveis. 
Como salienta Bourdieu (1982): “Todo comportamento comunicativo está
inscrito num jogo social, necessariamente portador de questões”. Mas o “jogo” não é
somente social, mas também psicológico, e os interesses subjacentes à comunicação
são extremamente numerosos, são nomeadamente interesses relacionais, identitários,
territoriais. 
A escola de Palo Alto, fundada por Bateson nos anos 50, interessou-se
particularmente pela problemática da comunicação, propondo uma teoria da mesma a
qual, através de uma abordagem sistémica, se baseia em alguns princípios
fundamentais: - A comunicação é um fenómeno interativo; - A comunicação não se
reduz às mensagens verbais; - Toda a mensagem comporta dois níveis de significação,
transmite um conteúdo informativo e exprime igualmente algo sobre a relação que
une os interlocutores; - A relação entre interlocutores é estruturada segundo dois
grandes modelos, o modelo simétrico (a relação é definida como igualitária) e o
modelo complementar (os protagonistas adotam comportamentos opostos,
ajustando-se um ao outro); - A comunicação é determinada pelo contexto no qual ela
se inscreve e este contexto envolve as relações que unem as pessoas que comunicam,
o espaço no qual se situa a interação e a situação que coloca em relação os
protagonistas, constitui também um espaço simbólico portador de normas, de regras,
de modelos e de rituais de interação; - Uma parte dos disfuncionamentos, ao nível
psicopatológico, estão relacionados com problemas de comunicação; - Qualquer
elemento temporal, espacial, contextual, presente na nossa vida, no nosso quotidiano,
é suscetível de ser um elemento de comunicação.
Para Hymes (1967), em todas as culturas e comunidades, o comportamento e
os objetos, enquanto produtos do comportamento, são seletivamente organizados,
utilizados e interpretados pelo seu valor comunicativo. Todo o comportamento e todo
o objeto podem ser comunicativos, sendo o inventário das possibilidades
comunicativas bem maior e mais significativo do que a nossa atenção habitual à
palavra no-lo revela.
Os comportamentos, os objetos, os acontecimentos, não podem ser
aprendidos nem compreendidos desinseridos de um contexto social e cultural.
A comunicação processa-se, através de múltiplas e diversas modalidades,
através de interações e formas não verbais e verbais, as quais são objeto de
abordagens específicas: distal, proxémica, cinésica, paralinguística, etc. 
Todos os bebés não comunicam da mesma forma, em cada cultura o adulto que
presta cuidados de maternage desenvolve um “estilo” próprio de comunicação com o
bebé, e numa mesma cultura há diferenças no estilo de interação materno e paterno
com a criança.
No Ocidente, em particular na América do Norte e na Europa, se observa uma
predominância e riqueza das interações pela voz e pelo olhar, num estilo de
maternage de tipo “distal”. Nas culturas africana e asiática, predominam as interações
táteis, cinestésicas, estando o contato corporal e o diálogo tónico-motor, na base da
comunicação entre mãe e bebé, num maternage de tipo “proximal”. No tipo de
maternage português, as interações táteis e cinestésicas, caraterísticas do modelo
“proximal” de interação, conjugam-se com as interações pela voz e pelo olhar,
caraterísticas de um estilo “distal” de interação, num estilo de maternage que
qualificamos de tipo “próximo-distal”.
Os estilos de comunicação dos adultos, os estilos maternos e paternos e das
crianças, são diferentes. Com a criança de tenra idade, os pais têm interações mais
lúdicas, mais estimulantes, mais físicas e menos “convencionais”, que as interações das
mães, que são mais calmas, mais visuais, mais verbais e mais “convencionais”.
“As relações de uma criança com o meio no qual se desenvolve, estabelecem-se
graças a um conjunto de identificações, de normas, de valores, que vão estruturar a
sua personalidade. Neste processo, a criança, adquire os modelos, os elementos
socioculturais do seu meio, integrando-os na estrutura da sua personalidade e
adaptando-se ao ambiente social e cultural ao qual vive” (Ramos, 1993).
A criança é atualmente confrontada muito precocemente, com a diversidade de
referências culturais no tecido social e educativo e a pluralidade inscreve-se hoje na
enculturação, na socialização, na estruturação identitária, na educação. 
“A aprendizagem consiste numa miscigenação. Estranho e original, já com um
misto de genes do seu pai e da sua mãe, a criança não evolui sem estes novos
cruzamentos” (Serres, 1991). 
A nossa cultura é cada vez mais uma cultura “mestiça”, a heterogeneidade, o
outro, o estrangeiro, a diferença, fazem parte do quotidiano, encontrando-nos todos
no mundo atual, face a um vasto processo de “mestiçagem”.
Comunicação, sociedade e cultura
“A cultura tem por função desconectar os espaços e voltar a juntá-los” (Serres,
in Lévi-Strauss, 1977).
A cultura, sendo fonte de conflitos, de incompreensão, é, igualmente, uma das
bases da compreensão, do diálogo e da comunicação entre os indivíduos e os povos.
Como salienta Barthes (1984), “A cultura, sobre todos os seus aspetos, é uma
linguagem”, defendendo M. Serres que “O que as culturas têm em comum, é a
operação de ligar, de desconectar” (In Lévi-Strauss, 1977).
É através da influência da cultura que os indivíduos aprendem a comunicar. A
integração social e cultural do ser humano pode enquadrar-se numa dupla
apropriação: - A apropriação do indivíduo pelo conjunto das estruturas simbólicas de
um contexto social e cultural particular; - A apropriação pelo indivíduo das estruturas
simbólicas, do código cultural do contexto sociocultural no qual se desenvolve.
“A cultura é um fator essencial que forma o espírito dos que vivem no seu seio”
(Bruner, 1991). Se a cultura é um conjunto de sistemas simbólicos, elaborados
coletivamente e transmitidos de geração em geração, ela carateriza-se igualmente
como um conjunto de recursos interpretativos, como “Uma caixa de ferramentas que
compõe as técnicas e os procedimentos que permitem compreender e de gerar o
nosso mundo” (Bruner, 1996).
A influência da cultura sobre o Homem e a importância da aprendizagem
cultural na organização dos comportamentos e dos conhecimentos foram colocadas
em evidência no decurso do século XIX na Grã-Bretanha por Tylor (1871) e Darwin
(1871,1872). E. Tylor foi o primeiro a utilizar e a definir o termo “cultura” como “Tudo
o que é complexo e compreende o saber, as crenças, a arte, a moral, a lei, os costumes
e todas as outras capacidades ou habilidades adquiridas por um indivíduo enquanto
membro de um grupo social”. Esta definição, pode ser completada pela de Linton
(1945), para quem “A cultura é um conjunto de comportamentos aprendidos. É o
resultado de um comportamento cujos elementos que constituem partilhas
transmitem para os membros de um grupo particular” (in Ramos, 1993).
Para Hall (1971), a cultura é um conjunto dos elementos aprendidos em
sociedade pelos membros de uma determinada sociedade, e, estes elementos são
ações, perceções e pensamentos. 
“Em ser atraído a designar simultaneamente a originalidade e  a universalidade
de qualquer sociedade humana, a cultura permite aprender todos os comportamentos
particulares e gerais do espaço de vida do homem a dois níveis: um nível simbólico ou
“subjetivo” (as representações coletivas, os significados aliados ao comportamento
perante certos objetos, etc.) e um nível material (os comportamentos e os produtos da
atividade humana)” (Ramos, 1993).
A cultura, constitui tudo o que se aprende de uma forma consciente e
inconsciente e que se pode transmitir e comunicar.
O estudo das variações culturais dos comportamentos e das práticas
educativas, começou com a escola Antropológica Americana designada por “Cultura e
personalidade”, da qual Mead (1930) e Benedict (1934) foram pioneiras. Mead dedica
uma obra ao estudo da primeira infância e da educação na Nova Guiné, definindo as
experiências formadoras e as modalidades de transmissão cultural, através de um
processo de aprendizagem que ela designou por “enculturação”. “Um processo de
interiorização para o indivíduo das tradições, sistemas, referências e valores do seu
grupo, processo que acontece essencialmente de forma inconsciente. Distingue-se da
socialização que revela as influências exercidas conscientemente pelo sujeito para a
melhoria do ambiente com o qual interage” (Ramos, 1993).
A transmissão de atitudes e gestos corporais, o qual se efetua, diretamente,
através das sensibilidades cinestésicas e cenestésicas e deixa a sua marca étnica até a
idade adulta designa-se por “aprendizagem cinestésica” (Mead e McGregor, 1951).
Mead e Bateson foram os primeiros a utilizar, de uma forma sistematizada e
metódica e, em meio natural, os meios audiovisuais (fotografia e filme). O trabalho
fílmico permite a observação, a comparação e salvaguardar os comportamentos para
as gerações futuras. O filme constitui um método científico para estudar, observar,
analisar, de forma ordenada, rigorosa, repetida, diferida, minuciosa, o Homem, os seus
comportamentos, as suas atividades, as suas formas de comunicar e as relações que
estabelece com o seu meio (Ramos, 1998). O filme permite apreender os diferentes
tipos, modalidades e detalhes da comunicação, apreender a “situação total” de um
universo cultural, permitindo igualmente uma descentração, indispensável em toda a
relação humana e na comunicação intercultural. 
O processo de aculturação acompanha-se de mudanças culturais diversas,
temporais e espaciais, e provoca a perca, a aquisição, a transformação, a substituição e
a reinterpretação de traços culturais dos grupos em presença (Ramos,1993).
Os comportamentos, as socializações, as aprendizagens, a comunicação, não
podem ser apreendidos senão a partir de um modelo cultural dinâmico, interacionista
e plural.
Como salienta Abdallah-Pretceille e Porcher (1996): “A cultura, como a língua, é
um lugar de implementação de si e dos outros. Enraizado na história, na relação, a
cultura joga e joga-se nos confinamentos e nas nominalizações, ela escapa às
definições de encerramento. Hipostatizar uma tradição, um item cultural, uma cultura,
somente para uma forma de dogmatismo cultural, ou mesmo “intriguismo cultural””.
Entre culturas plurais e cultura universal, entre particularidades e universais,
encontra-se o Homem, na sua diversidade e unidade. E, como salienta Devereux
(1980): “Depois de tudo, tanto as pessoas, que as culturas se assemelham mais e não
são diferentes entre eles, pela boa razão que todos os outros humanos são dignos de
ser humanos e não somente Esquimós ou Bantous e que todas as culturas são
autênticas amostras de qua a cultura se define como um produto humano
característico da espécie”.
Comunicação e compreensão intercultural
“Cada um crê ver o mundo como ele é, e deste modo cada um crê que o mundo
é o que vê” (Porcher, 1986).
Como salienta Moscovici (In Herzlich, 1968) “As representações sociais não são
unicamente as opiniões das imagens ou das atitudes, mas das teorias, das ciências sui
generis destinados à descoberta do real e da sua organização. Uma representação é,
tanto quanto possível, uma representação de qualquer coisa. Representa-se, não é
selecionada, completa um ser objetivamente no seu papel subjetivo, cria uma doutrina
que facilita a tarefa de descobrir, de programar ou antecipar atos e conjunturas”.
A cultura tende a traduzir perceções diferentes do mundo exterior. Os nossos
sistemas de valores, as nossas perceções, atitudes, a nossa visão do mundo e dos
outros, a nossa organização social, exercem influência sobre as nossas perceções.
Para Samovar et al. (1981) um princípio fundamental da comunicação
intercultural é a consciencialização de que o mundo, que percecionamos e em relação
ao qual comunicamos, poderá não ser o mesmo mundo, vivenciado por uma pessoa de
outra cultura e que ela procura exprimir. 
As significações são aprendidas e variam em função de fatores como a idade, o
sexo, a classe social, a categoria profissional, o local de residência, mas variam também
segundo as culturas. 
Pessoas de culturas ou subculturas diferentes podem atribuir significações
diferentes às mesmas realidades, podem desenvolver perceções sociais diferentes, o
que poderá originar incompreensão mútua, desentendimentos. 
Em situações de comunicação intercultural, os indivíduos vindos de outras
culturas ou subculturas, são obrigados a efetuar escolhas múltiplas e por vezes difíceis,
tendo de aprender a integrar regras culturais complexas e a serem capazes de
descentrar-se em relação à sua cultura: “As tensões podem aparecer entre o desejo de
integrar os elementos da cultura do país de acolhimento e o desejo de preservar as
tradições, enraizadas já há muito tempo” (Ramos,1993).
Como salienta, igualmente, Cohen-Émérique (1992): “Todo o Homem enraizado
na sua cultura, quando é interpelado pela diferença de outra, vira-se
espontaneamente para o seu mundo que representa para si a verdade, os valores
universais, os comportamentos permitidos (…). Ele recorre à sua própria lista de
referências culturais”.
Uma das maiores dificuldades, no domínio da comunicação e das relações
interculturais, é a dificuldade do cidadão, do investigador, do profissional do terreno,
em descentrar-se, em sair do etnocentrismo, o qual é, como destaca Lévi-Strauss
(1961): “Uma atitude que descansa a sua dúvida, através de fundamentos psicológicos
sólidos, tende a reaparecer de cada vez que nós somos colocados numa situação
inesperada (…). Ela consiste em repudiar pura e simplesmente as formas culturais:
morais, sociais, religiosas, estéticas que são as mais remotas daquelas com as quais
nos identificamos”. 
A dificuldade do homem em descentrar-se é também explicada por Piaget
(1970): “As duas tendências mais naturais do pensamento espontâneo e mesmo da
reflexão nos estados iniciais são de se colocar no outro mundo e de acreditar que as
suas normas e condutas são verdades universais ou os mesmos hábitos da sua
conduta”. Com efeito, o etnocentrismo, ou seja, a tendência a interpretar a
realidade a partir dos nossos próprios critérios e modelos culturais, pode constituir um
obstáculo importante à comunicação intercultural.
“O etnocentrismo, é ao mesmo tempo uma particularidade universal difundida
e um fenómeno psicológico de natureza projetiva e discriminatória que faz com que
toda a perceção seja feita através de uma “grelha de leitura”, elaborada
inconscientemente a partir daquilo que nos é familiar e dos nossos valores próprios.
Esta grelha opera através de uma seleção e traduz o que é diferente na nossa
linguagem habitual em reinterpretar a alteração no registo rejeitado” (Lipiansky,
1989).
E, como salienta Clanet (1985): “Se outro nos ameaça não pelo exterior, de
maneira direta, mas interiormente, e põe em questão os nossos valores e ideias (…). E,
portanto, a nossa identidade”. 
O nosso olhar sobre o outro, sobre uma cultura, não é nunca um olhar neutro e
objetivo, sendo a realidade sempre apreendida e interpretada por uma certa
subjetividade.
“A nossa receção de informação é necessariamente seletiva. A seletividade
psicológica é sistematicamente orientada por um processo de “filtragem” espontâneo
que se desenrola em nós. A nossa recetividade à informação é restringida aos nossos
interesses, dentro dos limites daquilo que julgamos ser aceitável” (Shérif, 1971).
Para o autor (1971), somente “A cooperação entre grupos existe para diminuir
a distância social entre grupos, para modificar as atitudes e os estereótipos, reduzindo
as possibilidades de conflitos futuros entre grupos”.
Para Samovar et al. (1981), existem dois tipos de dimensões culturais que
afetam a comunicação: os modelos culturais que influenciam a nossa maneira de
pensar, de percecionar, de codificar, etc.; os modelos culturais que influenciam a
maneira de comunicar com as pessoas pertencentes a outras culturas.
A comunicação não verbal constitui um elemento fundamental incluído nas
variáveis culturais que influenciam a comunicação, funcionando o comportamento não
verbal como uma “linguagem silenciosa”, na conceção do tempo e na organização do
espaço.
Um aspeto da cultura que desempenha um papel importante na comunicação é
a língua. Como destaca Samovar et al. (1981), a língua constitui não só o primeiro
meio, através do qual uma cultura transmite as suas crenças, os seus valores e as suas
normas, como dá também aos indivíduos um meio para entrar em interação com os
outros membros da sua cultura e um meio para pensar.
Comunicação e educação intercultural
“Toda a aprendizagem exige uma viagem ao outro, visando a alteração” (Serres,
1991).
Para Hopes (1979), para desenvolver a competência da comunicação e nas
relações interculturais, é necessário a tomada de consciência do grau de determinismo
cultural dos nossos comportamentos, é importante desenvolver a “consciencialização
cultural”. Esta constitui um processo de aprendizagem cultural, visando capacidade de
analisar o mundo do ponto de vista de uma outra cultura, visando desenvolver as
competências para conhecer as diferenças e a pluralidade.
Como acentua Linton (1945): “O Homem, ao longo da sua história, tem apenas
uma consciência vaga da existência da cultura e essa consciência ela não a tem com os
contrastes entre os costumes da sua própria sociedade e dos costumes de outras
sociedades que reencontra. Ser capaz de ver a sua própria cultura, de avaliar os
modelos e de perceber as implicações exige um nível de objetividade que raramente
se encontra”. 
Hopes (1979) identifica cinco domínios, onde uma consciência insuficiente das
diferenças culturais pode traduzir bloqueamentos e problemas na comunicação: i) Os
esquemas concetuais. Cada indivíduo interpreta o mundo diferentemente e os
membros de um grupo cultural desenvolvem esquemas de perceção que diferem dos
de outros grupos culturais, diferenças que podem originar dificuldades na
comunicação. É através da confrontação com outras formas de pensamento, com
outros sistemas de valores, que eu posso melhor identificar e relativizar os meus; ii) Os
princípios e valores culturais. Subjacentes aos comportamentos dos membros de um
grupo cultural estão os princípios e valores que são partilhados pelos membros de um
grupo; iii) Os modelos cognitivos. Estes modelos diferem segundo os grupos culturais e
influenciam a comunicação; iv) Os comportamentos rotineiros. A cultura conduz a
rotina, a hábitos comportamentais diferentes e influencia a maneira de nos
comportarmos no espaço e no tempo; v) Os estilos de comunicação. Cada cultura
desenvolve o seu próprio estilo de comunicação, nalgumas culturas predominam as
interações verbais, enquanto que outras privilegiam o contato e as interações
corporais. Também as línguas refletem e/ou se adaptam ao estilo de comunicação e a
o contexto.
A comunicação intercultural é, em primeiro lugar, uma aptidão pessoal que
todo o indivíduo deverá desenvolver na sua própria cultura.
Para desenvolver as aptidões de comunicação intercultural e facilitar a
compreensão recíproca entre indivíduos, grupos e culturas, é necessário: - Desenvolver
a compreensão da cultura; - Aprender a conhecer-se a si mesmo e à sua própria
cultura; - Aprender a descobrir os quadros de referência dos outros; - Evitar
julgamentos rápidos e superficiais, evitar os estereótipos e as atitudes egocêntricas e
etnocêntricas, o que permitirá escutar e colocar-se no lugar do outro; - Desenvolver a
empatia, as capacidades empáticas; - Dispor de tempo para comunicar, para
compreender uma situação, estar atento às mensagens silenciosas da comunicação
não verbal, assim como aprender a respeitar os ritmos e os estilos de comunicação
próprios  a cada pessoa e a cada cultura; - Desenvolver estratégias e intervenções
educativas interculturais, incluindo uma formação centrada sobre a informação,
nomeadamente sobre a História e a cultura dos diferentes grupos ou comunidades
presentes no mesmo espaço social.  O projeto “Educar para a diversidade” constitui
um exemplo deste tipo de formação; - Desenvolver estratégias e intervenções
educativo/pedagógicas desde a infância, que conduzam à descentração, ao respeito e
reconhecimento do outro; - Implementar uma formação adequada dos professores.
Considerações finais
O intercultural implica uma ética da relação humana. A relação intercultural
deriva de uma ética pessoal e de uma ética da alteridade.
É indispensável desenvolver estratégias e intervenções psico-sócio-educativas,
fornecer elementos teórico/concetuais sólidos, para que profissionais e cidadãos
possam situar-se e fazer face, de uma forma responsável e refletida, às diversidades
individuais e culturais que encontram no seio da sociedade, assim como aos problemas
complexos que colocam a comunicação com indivíduos com referências culturais
diferentes, desenvolvendo em todos, uma maior compreensão da sua própria cultura e
das outras culturas, assim como uma maior capacidade de comunicação com os
membros da sua cultura ou pertencentes a outros grupos e culturas.
A educação e a comunicação intercultural não poderão resolver os conflitos
entre culturas e todos os problemas. Contudo, poderão atenuar ou fazer desaparecer
os preconceitos, a intolerância, o racismo, a exclusão, poderão alimentar a
comunicação de alguns valores universais e contribuir para a coesão social e para a
paz, podendo ainda, ajudar a tomar consciência do nosso olhar egocêntrico e
etnocêntrico sobre o outro, sobre uma acultura.
“(…) Reconhecemos hoje que a universalidade e o relativismo cultural, e todos
os seus complementos, traduzem simultaneamente a visão e a diversidade da espécie
humana” (Ramos, 1993).
Tema 3 – Cultura, diversidade cultural, relações interculturais e comunicação
intercultural
Diversidade cultural, educação e comunicação intercultural – políticas e estratégias
de promoção do diálogo intercultural – Natália Ramos
Na atualidade, segundo dados das Nações Unidas, uma em cada trinta e cinco
pessoas é migrante internacional, constatando-se que, perto de 200 milhões de
pessoas vivem hoje fora dos seus países de origem, migrando essencialmente para as
cidades. A cidade, onde reside atualmente mais de metade da população mundial
(65%), é e será cada vez mais espaço de pluralismo cultural e tem de promover e
respeitar as esperanças e os medos dos seus cidadãos.
A cidade congrega unidade e diversidade; é lugar de convergência e
divergência; é espaço de refúgio, de proteção, de libertação, de bem-estar, de união,
de diálogo sendo, igualmente, espaço de conflito, de ameaça, de violência, de
opressão, de discriminação e de doença. 
Levi-Strauss (1973) afirma que, “a cidade é natureza e cultura, é indivíduo e
grupo, é vivida e sonhada: ela constitui o facto humano por excelência”. 
Na Conferência das Nações Unidas do Cairo sobre População e
Desenvolvimento (1994), estipula no seu artigo 12: “Os países deverão garantir a todos
os migrantes os direitos humanos fundamentais integrados na Declaração Universal
dos Direitos Humanos”.
A diversidade cultural integra e integrará, cada vez mais, todos os contextos da
esfera pública e essa diversidade cultural deverá ser considerada como destaca a
Organização das Nações Unidas para a Educação, a Ciência e a Cultura (UNESCO,
2001), na Declaração Universal sobre a Diversidade Cultural, artigo 3, “uma das fontes
de desenvolvimento, entendido não só como crescimento económico, mas também
como meio de acesso a uma existência intelectual, afetiva, moral e espiritual
satisfatória”. 
A diversidade cultural ao nível mundial e urbano
Os fluxos migratórios têm vindo a aumentar atingindo todos os continentes e
os diferentes setores da vida pública, prevendo-se que, em 2050, as migrações
internacionais atinjam os 230 milhões. O número de migrantes internacionais quase
triplicou desde 1970. Assinala-se que, perto de 9% de migrantes do mundo, são
refugiados 16 milhões de pessoas. Só em 2005, os fluxos migratórios nos países da
OCDE, aumentaram 11% relativamente a 2004. Nesses países, os fluxos de estudantes
estrangeiros também aumentaram mais de 40% desde 2000, assim como os fluxos de
trabalhadores qualificados. 
No que diz respeito a Portugal, país tradicional de emigração, tem vindo,
igualmente, a reforçar o seu caráter de país de imigração, a partir sobretudo dos anos
70. De acordo com o OCES, o número de estudantes estrangeiros inscritos no ensino
superior tem aumentado em Portugal nos últimos anos, registando um crescimento de
65,7%, entre os anos letivos de 1999/2000 e 2004//2005.
No mundo, perto de 300 milhões de pessoas, distribuídas por mais de 70
países, pertencem a grupos indígenas, representando cerca de 4.000 línguas. Na
América Latina os 50 milhões de indígenas constituem 11% da população da região.
Igualmente, 152 países do mundo têm minorias étnicas ou grupos religiosos
significativos. 
Mais de metade da população mundial habita, hoje, em zonas urbanas e
suburbanas. Prevê-se que, em 2030, as cidades do mundo em desenvolvimento
acolham 80% do total da população urbana. 
O Conselho da Europa e a Comissão Europeia insistem em que é necessário
promover a Cidade Aberta e Intercultural. Outros autores insistem na necessidade de
promover a diversidade cultural nas cidades ditas “globais”, de modo a responder às
novas dinâmicas e necessidades das sociedades atuais. 
A migração implica a adaptação e a incorporação pelo indivíduo de uma
cultura, língua, regras culturais e sociais diferentes, tendo o imigrante de desenvolver
estratégias de adaptação que lhe permitem resolver dificuldades relacionadas com a
condição de imigrante e de aculturação, ou seja, com as relações culturais entre a
sociedade de acolhimento e a sua cultura de origem. 
Como destaca Giddens (1991), “a diferença coloca aos indivíduos uma
complexidade de escolhas”.
A aculturação implica a aprendizagem de uma nova cultura, assim como
escolhas por vezes difíceis entre o que o imigrante gostaria de manter e o que tem de
abandonar dos hábitos e da cultura de origem. Este conflito devido à coexistência de
dois códigos culturais, por vezes, contraditórios e incompreensíveis e à impossibilidade
em estabelecer mediações entre dois universos diferentes, assim como, à
incapacidade em lidar com as exigências do ambiente poderão ter efeitos
desorganizadores no comportamento e estarem na origem de distúrbios
psicopatológicos, dificuldades de adaptação e stresse de aculturação.
A crescente multiculturalidade que se verifica nos diferentes países, espaços,
sobretudo urbanos e setores da vida pública tem conduzido a esforços na
reformulação de estratégias e políticas com o objetivo de melhorar a educação, a
integração social, a qualidade de vida, o acesso aos serviços públicos e as relações
interculturais entre os diferentes grupos que coabitam no mesmo espaço.
Perspetivas da diversidade cultural e da interculturalidade
A diversidade cultural é reconhecida pela UNESCO (2001, 2005, 2007) como
uma “caraterística inerente à humanidade”, um “património comum” e uma fonte de
“um mundo mais rico e diversificado que alarga a possibilidade de escolhas e fortalece
as capacidades e os valores humanos”. A adoção pela UNESCO (2005, 2007) da
Convenção para a Proteção e Promoção da Diversidade e das Expressões Culturais
representa uma etapa fundamental, constitui um instrumento jurídico internacional, já
que pela primeira vez na história do direito internacional, a cultura encontra o seu
lugar na agenda política, com o objetivo de humanizar a globalização.
Essa Convenção visa criar condições que permitam às culturas desenvolverem-
se e interagirem abertamente de modo a um enriquecimento mútuo, pertencendo aos
Estados, em colaboração com a sociedade civil, de intervirem através de ações
concretas a diferentes níveis: em nível nacional (através dos governos); em nível
internacional (através do controlo coletivo dos Estados signatários); em nível nacional
e transnacional (através da sociedade civil).
A experiência da diversidade, da alteridade e da complexidade estão no cerne
da interculturalidade, implicando um novo paradigma e abordagem. O paradigma
intercultural no âmbito da diversidade cultural vem desafiar os paradigmas tradicionais
em nível educacional, social e sanitário e colocar novos desafios teóricos
metodológicos em nível da pesquisa, da intervenção e da formação. 
A abordagem intercultural implica várias constatações e perspetivas,
destacamos algumas: - uma constatação de ordem sociológica, tendo em conta que a
maioria das nossas sociedades são e serão cada vez mais multiculturais; - uma opção
de ordem ideológica, já que a multi/interculturalidade é uma riqueza para o conjunto
da sociedade; - uma visão estratégica, para passar do multiculturalismo ao
interculturalismo, torna-se necessário promover a relação entre as culturas, mas sem
anular a identidade de cada uma delas; - uma perspetiva multi/interdisciplinar, os
objetos do domínio intercultural são objetos complexos, plurais, heterogéneos e
pluridimensionais, não podem ser reduzidos a uma única abordagem disciplinar; - uma
perspetiva sistémica e multidimensional, necessária a uma visão global, dinâmica e
interacionista da complexidade e da diversidade e à construção de um pluralismo
comum; - um processo dinâmico e dialético, o intercultural implica a tomada de
consciência da alteridade e da diversidade, do universal e do particular, das
identidades individuais e coletivas, das interações entre  os indivíduos e os grupos e
ainda das relações entre o eu e o outro; - um novo paradigma conceptual e
epistemológico, comum às diferentes áreas disciplinares que tratam a complexidade e
a pluralidade; - uma perspetiva psicossocial e pedagógica, os problemas interculturais
implicam o desenvolvimento de diversas competências que promovam a
consciencialização cultural, a comunicação e o diálogo intercultural e o funcionamento
democrático das sociedades; - uma perspetiva sociopolítica, um instrumento para
promover a coesão social, o exercício da cidadania, a igualdade de oportunidades e
uma integração adequada de todos, grupos minoritários e maioritários. Como salienta
Clanet (1993), “A interculturalidade é o conjunto dos processos psíquicos, relacionais,
grupais, institucionais (…) originados pelas interações das culturas, numa relação de
trocas recíprocas e numa perspetiva de salvaguarda de uma relativa identidade cultura
dos parceiros em relação”. 
A noção de interculturalidade implica conceber a cultura numa perspetiva
antropológica, como universo de significações particulares a um grupo, sendo
importante conceber “a cultura como relação particular ao mundo de um determinado
grupo, o que inclui um conjunto de normas, de valores, de modos de vida, de ritos,
assim como uma língua que o grupo transmite, elementos que são constitutivos da sua
identidade cultural” (Clanet, 1993). 
O relativismo cultural permite reduzir os efeitos do etnocentrismo, ou seja, a
tendência para emitir juízos sobre as outras culturas tendo a nossa cultura como
referência e como superior, o mesmo não poderá ser utilizado como justificação de
todos os comportamentos atribuídos à cultura.
A apreensão da diversidade cultural, a perspetiva intercultural reenviam aos
conceitos de reciprocidade, de complexidade, de complementaridade e de facto social
total.
A abordagem intercultural exige: - Um esforço contra o etnocentrismo, os
estereótipos e os preconceitos; - Um trabalho de descentralização e de meta
conhecimento da sua própria identidade cultural e do papel que ela desempenha na
construção identitária; - A promoção de um novo modelo de comunicação, de
negociação e de gestão da diversidade cultural; - Desenvolver processos reflexivos,
modelos pedagógicos e competências que contribuam na construção de sociedades
democráticas e equitativas e de cidadãos e profissionais implicados e responsáveis; -
Promover a comunicação e a cooperação com os outros nas diferentes atividades
humanas; - Aprender a dialogar com as outras culturas e aprender a conhecer o outro
e as suas tradições e culturas; - Aceitar negociar e propor compromissos de modo a
evitar comportamentos de rejeição ou de assimilação; - Aprender a construir projetos
e a encontrar soluções em conjunto para a resolução de conflitos.
As problemáticas do domínio intercultural exige competências de cariz
psicológico, social, cultural, pedagógico e comunicacional, baseadas na experiência da
alteridade e da diversidade, no equilíbrio entre o universal e o singular, implicando: - O
desenvolvimento de competências individuais que permitam interações sociais
harmoniosas entre indivíduos e as culturas e que promovam uma atitude de
descentração, - O desenvolvimento de competência interculturais, sobretudo
linguísticas, comunicacionais e pedagógicas; - O desenvolvimento de competências de
cidadania.
Políticas e estratégias de promoção da comunicação e diálogo intercultural
É importante um paradigma de abordagem da diversidade cultural e dos grupos
minoritários, não como um problema, mas como um recurso da capacitação e
revalorização de identidades culturais, uma oportunidade de desenvolvimento
individual, social e cultural e um processo de resiliência, fortalecendo as competências
dos indivíduos e dos grupos para se consciencializarem dos seus direitos e deveres e
para enfrentarem a mudança e o seu próprio desenvolvimento, integração e destino
de uma forma positiva e participativa.
É indispensável desenvolver estratégias e intervenções psico-sócio-educativas,
para que os profissionais e os cidadão possam situar-se e enfrentar, de uma forma
competente, responsável e refletida, as diversidades individuais e culturais que
encontram no seio da sociedade e das instituições, assim como os desafios e
problemas que colocam a educação e a comunicação com indivíduos com referências
linguísticas e culturais diferentes, desenvolvendo em todos, grupos maioritários ou
minoritários: uma melhor compreensão da sua própria cultura e das outras culturas;  e
uma maior capacidade de comunicação com os membros da sua cultura ou
pertencentes a outros grupos e culturas.
Para desenvolver a competência na comunicação e nas relações interculturais,
é importante a tomada de consciência do grau de determinismo cultural dos nossos
comportamentos, é necessário desenvolver a “consciencialização cultural”, a qual
constitui um processo de aprendizagem cultural, que visa desenvolver a capacidade de
analisar o mundo do ponto de vista de uma outra cultura e as competências para
reconhecer as diferenças e a pluralidade. Hoopes (1980) identifica cinco domínios, em
que uma consciência insuficiente das diferenças culturais pode introduzir
bloqueamentos e problemas na comunicação: i) Os esquemas percetivos, cada
indivíduo interpreta o mundo diferentemente e os membros de um dado grupo
cultural desenvolvem esquemas de perceção que diferem dos de outros grupos
culturais, diferenças que podem originar dificuldades na comunicação; ii) Os princípios
e valores culturais, temos tendência a introduzir na comunicação os significados e
interpretações que correspondem aos nossos próprios esquemas e valores; iii) Os
modelos cognitivos, esses modelos diferem segundo os grupos culturais e eles
influenciam a comunicação; iv) Os comportamentos rotineiros, a cultura conduz a
rotina, a hábitos comportamentais diferentes e influencia a maneira de nos
comportarmos; v) Os estilos de comunicação, em algumas culturas predominam as
interações verbais, enquanto que outras privilegiam o contato e as interações
corporais.
Para desenvolver as aptidões de comunicação intercultural e facilitar o diálogo
intercultural e a compreensão recíproca entre indivíduos, grupos e culturas, é
necessário: Desenvolver a compreensão da cultuar; Reconhecer a parte de “arbitrário”
e de relatividade de toda a cultura; Aprender a conhecer-se a si mesmo; Aprender a
descobrir e a compreender o “sentido” de normas e valores, os quadros de referência
dos outros; Evitar julgamentos rápidos e superficiais, estereótipos e atitudes
etnocêntricas, o que permitirá escutar e colocar-se no lugar do outro, de forma a
tentar compreender as coisas do seu ponto de vista, o que permitirá a descentração;
Desenvolver a empatia, as capacidades empáticas; Dispor de tempo para comunicar,
para compreender uma situação; Desenvolver estratégias e intervenções educativas
interculturais, incluindo uma formação centrada sobre a informação; Promover
estratégias e intervenções educativo/pedagógicas interculturais, que conduzam à
descentração, ao respeito e ao reconhecimento do Outro, das identidades, das
diversidades; Implementar uma formação adequada dos profissionais; Trabalhar os
curricula  e os materiais de aprendizagem, inclusive os que apresentam mensagens
discriminatórias e “racistas”, utilizando-os como instrumentos de consciencialização
intercultural; Utilizar adequadamente os meios de comunicação social, em particular,
os média audiovisuais; Promover a aprendizagem de línguas estrangeiras, respeitar a
diversidade linguística e as maternas. 
Em nível da formação dos profissionais, o desenvolvimento de certos
conhecimentos e competências poderão contribuir para melhor intervir no âmbito
multi/intercultural e na mediação das relações humanas e interculturais, sendo
importante: O desenvolvimento de competências interculturais adaptadas aos
diferentes contextos de intervenção multicultural e à  variedade de grupos culturais;
Uma formação que explique e contribua na compreensão da diversidade cultural e dos
preconceitos e estereótipos socialmente construídos em relação às minorias e às
diferenças religiosas, geracionais, sociais, étnico/culturais e de género; O
desenvolvimento de competências linguísticas; Um melhor autoconhecimento dos
profissionais; Os conhecimentos psicossociais e culturais sobre os diferentes grupos
culturais e sobre as representações e estilos de aprendizagem e de comunicação; Uma
melhor compreensão dos mecanismos psicossociais e fatores sociopolíticos suscetíveis
de originar a intolerância, a rejeição e racismo.
Considerações finais
A pluralidade e a heterogeneidade dos mundos contemporâneos exigem
aprender a viver a multiplicidade de pertenças e de referências de um modo plural,
contínuo e complementar. 
A educação para formar os cidadãos do século XXI deverá promover o
conhecimento e respeito da diversidade cultural. É indispensável integrar a
problemática intercultural e da interculturalidade nas suas várias vertentes, na
formação dos diversos agentes sociais, sanitários, educativos, judiciários e políticos.
A cultura e a diversidade deverão estar no centro do processo educativo e do
desenvolvimento humano e social, sendo importante que se faça da diversidade, da
cultura e da mobilidade uma oportunidade de enriquecimento e aprendizagem ao
ritmo de um mundo global e de uma sociedade plural, partilhando tradições culturais,
competências e saberes. Como acentua Wolton (2003), “Aprender a gerir a diversidade
cultural constitui a verdadeira riqueza das sociedades futuras”. 
A perspetiva intercultural e a diversidade deverão ser integradas numa
perspetiva mais ampla de construção da sociedade. Esses projetos constituem
prioridades políticas da Comissão Europeia, a qual designou 2007, como o Ano
Europeu da Igualdade de Oportunidades para Todos e 2008 como o Ano Europeu do
Diálogo Intercultural. Esses objetivos constituem, também, preocupação da UNESCO
(2001) quando afirma na Declaração Universal sobre a Diversidade Cultural, art. 2: “Em
sociedades cada vez mais diversificadas, torna-se indispensável garantir uma interação
harmoniosa entre pessoas e grupos com identidades culturais plurais, variadas e
dinâmicas, assim como, a sua vontade de conviver. As políticas que favoreçam a
inclusão e a participação de todos os cidadãos, garantem a coesão social, a vitalidade
da sociedade civil e a paz. 
Educar e formar na sociedade multi/intercultural: contributos para a comunicação
intercultural e cidadania - Natália Ramos
“Entre o universalismo abstrato e redutor e o relativismo para o qual não
existem exigências superiores para além do horizonte de cada cultura particular, é
necessário afirmar o direito, ao mesmo tempo, à diferença e à abertura ao universal”
(Delors, 1996).
A pluralidade e a heterogeneidade dos mundos contemporâneos exigem
aprender a viver a multiplicidade de pertenças e de referências não sobre a forma de
dicotomias, de exclusividade e de exclusão, mas sim, sobre um modo plural, contínuo e
complementar. O pluralismo cultural e as relações interculturais fazem atualmente
parte e integrarão cada vez mais os contextos social, económico, político, religioso,
educativo, mediático e sanitário. 
Na atualidade, segundo dados das Nações Unidas, uma em cada 35 pessoas é
migrante internacional. Perto de 200 milhões de pessoas vivem fora dos seus países de
origem, prevendo-se que em 2050 as migrações internacionais atinjam os 230 milhões.
Em Portugal em 2007, segundo dados do Instituto Nacional de Estatística (INE), o
número de imigrantes constitui perto de 5% da população residente. 
Fontes da UNESCO indicam que 2,5 milhões de estudantes de ensino superior
encontra-se a estudar fora dos seus países de origem. Na União Europeia, no quadro
do programa de mobilidade ERASMUS, a funcionar desde 1987, já são hoje mais de um
milhão e meio de estudantes universitários que durante um ou dois semestres
frequentaram outras instituições de ensino superior de um dos trinta e dois países
europeus participantes neste programa. Dados da Comissão Europeia indicam que só
em 2004/2005, mais de 20.800 docentes trocaram as suas Universidades – por curtos
períodos de tempo – por outras distribuídas pelos países signatários deste acordo.
É de destacar que, no mundo, perto de 300 milhões de pessoas, distribuídas
por mais de 70 países pertencem a grupos indígenas, representando cerca de 4.000
línguas. Também, 152 países do mundo têm minorias étnicas ou grupos religiosos
significativos.
Quanto às migrações para a cidade, mais de metade da população mundial
habita hoje em zonas urbanas e suburbanas (65%), prevendo-se que em 2030, as
cidades do mundo em desenvolvimento acolham 80% do total da população urbana.
Esta mobilidade constitui preocupação do Concelho da Europa e da comissão Europeia
quando insistem em que é necessário promover a “Cidade Aberta Intercultural”. 
A diversidade cultural integra cada vez mais, todos os contextos da esfera
pública e esta diversidade cultural deverá ser considerada como destaca a UNESCO
(2001), na Declaração Universal sobre a Diversidade Cultural, art. 3: “(…) uma das
fontes de desenvolvimento, entendido não só como crescimento económico, mas,
também, como meio de acesso a uma existência intelectual, afetiva, moral e espiritual
satisfatória”. 
O Conselho da Europa (2001) salienta que, é necessário “evitar os perigos que
possam resultar da marginalização daqueles que não possuem capacidades
necessárias para comunicarem numa Europa interativa”. 
Torna-se indispensável desenvolver estratégias e intervenções psico-sócio-
educativas, para que os profissionais e os cidadãos possam situar-se e enfrentar, de
uma forma competente, responsável e refletida, as diversidades individuais e culturais
que encontram no seio da sociedade e das instituições.
A experiência intercultural, o encontro intercultural é influenciado por
representações sociais, preconceitos, estereótipos, projeções culturais, ideológicas e
políticas. Estas representações, estas imagens, deverão ser reconhecidas na sua
subjetividade e objetividade através de uma formação adequada que permita
compreendê-las, situando-as nos contextos psico-sócio-históricos de origem e
analisando as suas funções na dinâmica das relações entre os indivíduos, as culturas e
as nações.
O desenvolvimento da comunicação e educação intercultural é importante já
que pode contribuir para: desenvolver em todos os indivíduos, pertencentes a grupos
minoritários ou não, atitudes e comportamentos adaptados ao contexto da
diversidade individual e grupal; desenvolver um outro olhar sobre nós mesmos e o
Outro; promover aptidões que conduzam a um processo de consciencialização cultural
e a uma melhor capacidade de comunicação e de participação na interação social;
desenvolver uma melhor compreensão dos mecanismos psicossociais e fatores
sociopolíticos suscetíveis de originarem a rejeição, a intolerância, a violência e o
racismo.
Diversidade cultural e intercultural
A diversidade cultural é reconhecida pela UNESCO (2001, 2005, 2007) como
uma “caraterística inerente à humanidade”, um “património comum” e uma fonte de
“um mundo mais rico e diversificado que alarga a possibilidade de escolhas e fortalece
as capacidades e os valores humanos”. 
A adoção pela UNESCO (2005, 2007) da “Convenção para a Proteção e
Promoção da Diversidade das Expressões Culturais” representa uma etapa
fundamental para a emergência do direito cultural internacional e para o
reconhecimento da diversidade cultural como fonte de justiça, de igualdade e de paz.
Esta Convenção visa criar condições que permitam às culturas desenvolverem-se e
integrarem abertamente de modo a um enriquecimento mútuo, pertencendo aos
Estados, em colaboração com a sociedade civil, intervirem através de ações concretas
a diferentes níveis: ao nível nacional (através dos governos); ao nível internacional
(através do controlo coletivo dos Estados signatários); ao nível nacional e transnacional
(através da sociedade civil). 
A experiência da diversidade, da alteridade e da complexidade estão no cerne
da interculturalidade, implicando um novo paradigma e abordagem. O paradigma
intercultural introduz, a heterogeneidade, a complexidade na pesquisa e na
intervenção; implica uma ética da relação humana e da relação pedagógica; implica
um processo de descentração que conduz cada um a melhor delimitar a sua própria
identidade; reconhece que a universalidade e o relativismo cultural, ao mesmo tempo
em que são complementares, traduzem simultaneamente a unidade e a diversidade da
espécie humana.
A interculturalidade é também, um instrumento para promover a coesão social,
o exercício de cidadania, a igualdade de oportunidades e uma integração adequada de
todos os grupos. 
O intercultural implica relação, diálogo e comunicação entre diferentes
culturas, através dos indivíduos e grupos portadores dessas culturas, em situações
interculturais diversas. Implica, igualmente, uma perspetiva de relativismo cultural, no
sentido de que todo o julgamento de valor é relativo ao contexto cultural no seio do
qual é produzido. Contudo, se o relativismo cultural permite reduzir os efeitos do
etnocentrismo, o mesmo não poderá ser utilizado como justificação de todos os
comportamentos atribuídos à cultura.
A reflexão sobre a diversidade cultural através da perspetiva intercultural
reenvia aos conceitos de reciprocidade, de “complexidade” (Morin, 1990), de
“complementaridade” (Devereux, 1992) e de “facto social total” (Mauss, 1950).
As problemáticas do domínio intercultural exigem: o desenvolvimento de
competências individuais que permitam interações sociais harmoniosas entre
indivíduos e a culturas e que promovam uma atitude de descentração; o
desenvolvimento de competências interculturais, sobretudo linguísticas,
comunicacionais e pedagógicas; e o desenvolvimento de competências de cidadania,
que tornem possível o funcionamento democrático das sociedades e das próprias
instituições educativas e sociais.
Políticas e estratégias de promoção da educação e comunicação intercultural
Os estereótipos, os preconceitos e o etnocentrismo constituem barreiras,
“filtros culturais” à comunicação intercultural e estão na origem de conflitos e
incompreensão entre grupos minoritários e maioritários.
Todorov (1988) salienta que a comunicação intercultural poderá ajudar na
consciencialização de que um melhor conhecimento do outro conduz a um melhor
conhecimento de nós mesmos.
Hoopes, (1980) identifica cinco domínios onde uma consciência insuficiente das
diferenças culturais pode introduzir problemas na comunicação: os esquemas
percetivos; os princípios e valores culturais; os modelos cognitivos; os
comportamentos rotineiros; os estilos de comunicação. 
Reboul (1993) destaca três competências necessárias no âmbito da
competência cultural: competência fundamental, aquela que cada um deve adquirir
para tornar-se um adulto crítico; competência especializada, a qual poderá adquirir-se
através de um ofício/profissão, e também por atividades sociais ou integradas nos
tempos livres; competência do “ser”, a qual permite a cada um tornar-se um ser
responsável e autónomo capaz de julgar a realidade com maturidade e discernimento. 
Para desenvolver as aptidões de comunicação intercultural e a compreensão
recíproca entre indivíduos, grupos e culturas, é importante, nomeadamente: aprender
a conhecer-se a si mesmo; aprender a descobrir e a compreender o “sentido” de
normas e valores, os quadros de referência dos outros e os códigos culturais
respetivos; evitar julgamentos rápidos e superficiais, estereótipos e atitudes
etnocêntricas; desenvolver a empatia; dispor de tempo para comunicar; desenvolver
estratégias e intervenções educativas interculturais; respeitar a diversidade linguística
e as  línguas maternas e promover a aprendizagem de línguas estrangeiras e
intervenções educativo/pedagógicas que conduzam à descentração. 
Como refere Giraud (1995), a pedagogia intercultural não deverá ser
considerada uma “educação para imigrantes”, mas, “deverá ser integrada no centro do
sistema escolar, como uma abordagem global que concerne todos os alunos”.
Para Banks (1994) uma escola pluricultural deverá ter em conta alguns
princípios: alteração de atitudes, crenças e práticas dos docentes e não docentes;
currículo e plano de estudos orientados para a diversidade; adaptação dos estilos de
aprendizagem e ensino; revisão dos materiais didáticos introduzindo elementos
multiculturais; respeito pelas diferentes línguas; valorização das diversidades culturais
e do currículo oculto; modificação dos modelos de avaliação dando atenção a outros
elementos para além das competências cognitivas/intelectuais; programas de
orientação e aconselhamento que ajudem os alunos de minorias a fazerem escolhas
quanto à carreira.
Camilleri (1999) apresenta alguns princípios de base de uma pedagogia
intercultural, nomeadamente: Compreender a lógica interna de cada cultura, as
singularidades de cada cultura de acordo com o contexto específico onde são
construídas; Educar para o relativismo, como fator importante para combater as
atitudes etnocêntricas; Não considerar as culturas como estáticas e fechadas, mas
como processos dinâmicos, abertos e em constante mudança; Compreender e refletir
sobre os mecanismos de exclusão e de racismo; Desenvolver um trabalho de
informação e de  formação sobre  a negociação dos conflitos à escala nacional e
internacional.
Lipiansky (1999) salienta algumas das perspetivas e respostas que a escola tem
desenvolvido face à diversidade cultural: Considerar a diversidade cultural como um
obstáculo e uma dificuldade a eliminar; Reconhecer a multiculturalidade, o relativismo
cultural, a coerência, especificidade e igual valor de cada cultuar; Reconhecer e
respeitar a diferença cultural, não devendo esta ser considerada como um problema;
Considerar que a instituição educativa deve constituir um espaço de cidadania, um
lugar de aprendizagem da igualdade de todos os alunos, indiferentemente das suas  da
Para Lipiansky (1999), ao nível pedagógico é necessário uma política e prática
intercultural mais alargadas na escola, não devendo a educação intercultural ser
limitada às crianças migrantes e de minorias e à aprendizagem de línguas.
Considerações finais
Segundo Mayor (1999) “a educação e a cultura são os únicos pilares duráveis da
paz e da segurança humana”. 
Wolton (2003) acentua que, “Aprender a gerir a diversidade cultural constitui a
verdadeira riqueza das sociedades futuras”. 
Tema 4 – Princípios, processos e fatores individuais e coletivos, psicológicos,
pedagógicos, culturais, sociais e tecnológicos, favoráveis ao desenvolvimento de
atitudes, estratégias e competências promotoras da comunicação intercultural
Educar para a interculturalidade e cidadania: princípios e desafios – Natália Ramos
A diversidade intercultural, as relações interculturais e a gestão da
interculturalidade, são objeto de preocupação de vários organismos internacionais,
tais como a UNESCO, a OCDE, o Conselho da Europa e a Comissão Europeia e
constituem um dos campos mais importantes e atuais em diferentes domínios
científicos, tanto ao nível da pesquisa, como ao nível da formação e da intervenção.
Para Tourraine (2004) e Wiewiorka (2007), a cultura está no centro do que une
e divide as sociedades contemporâneas. 
Sandercock (2004) refere que o diálogo intercultural tem de estar presente no
quotidiano e assente em dois tipos de direitos fundamentais: O direito à cidade,
enquanto espaço coletivo, promotor da participação e de integração de todos na
vivência da cidade; O direito à diferença, enquanto promoção e valorização da
diversidade, da comunicação intercultural e da alteridade.
Moscovici (2005) salienta: “Pessoas que pertencem a outras culturas nos
incomodam, pois estas pessoas são como nós e, contudo, não são como nós; assim,
nós podemos dizer que elas são “sem cultura”, “bárbaros”, “irracionais”, etc. O “não
familiar” atrai e intriga as pessoas e comunidades. O medo do que é estranho (ou dos
estranhos) está profundamente arraigado em cada um de nós”
De igual modo, os membros de uma cultura tendem a considerar as suas
práticas e símbolos superiores aos das outras cultuaras, como já referia o filósofo
francês do século XVIII Montesquieu (1748): “Se percorrer todas as nações,
encontrarei por todo o lado hábitos diferentes e cada povo acreditará que os seus
costumes são os melhores”.
Contextos da multi/interculturalidade – Figuras do Outro e da alteridade
Temos o estatuto do Outro no quadro das migrações, da globalização e da
Convenção da UNESCO (2001, 2005, 2007), reconhecendo a igualdade das culturas e
constituindo uma revolução democrática, no plano internacional. A primeira figura do
Outro e da diversidade cultural é o Migrante, aquele para quem a migração poderá
aumentar a liberdade, as oportunidades de decisão e o poder de escolha, melhorar as
condições de vida, alargar o acesso aos serviços básicos, à escolaridade, à saúde e à
participação e constituir um fator importante de desenvolvimento, se lhe for
proporcionado acolhimento e contexto social, educacional e político adequados.          
Todavia, este Outro é, frequentemente, ignorado e/ou discriminado, sobretudo o
migrante pobre, objeto de medos e exclusão, símbolo de ameaça e da diversidade
cultural recusada na prática, ainda que defendida nos textos. Contudo, no mundo
globalizado de hoje, os indivíduos continuam a migrar, dentro ou para fora dos seus
territórios, em busca de melhores perspetivas e condições de vida. Estas deslocações
deverão ser consideradas como um direito humano, tal como é consagrado no artigo
13º da Declaração Universal dos Direitos Humanos, adotado em 1948 pela Organização
das Nações Unidas (ONU): “Todo o indivíduo tem direito de circular livremente e
escolher a sua residência no interior de um Estado. Todo o indivíduo tem o direito de
abandonar o país em que se encontra, incluindo os seu, e o direito de regressar ao seu
país”.
São os continentes europeu e asiático os que acolhem no seu território o maior
número de migrantes. Os EUA constituem o país que acolhe o maior número de
migrantes. Os que migram devido à insegurança, catástrofes ou guerra representam
7% dos migrantes do mundo. A comunidade brasileira é a maior população estrangeira
residente em Portugal. No ano letivo 2008/2009, estavam inscritos nas escolas
portuguesas do ensino básico e secundário mais de 70 508 alunos de origem
estrangeira, divididos por 90 nacionalidades, sendo as mais representativas, Brasil e
Cabo verde, segundo dados do Ministério da Educação (GEPE).
De acordo com o Observatório Português da Ciência e do Ensino Superior
(OCES), em Portugal, o número de estudantes estrangeiros inscritos no ensino superior
tem vindo a aumentar nos últimos anos, sendo a maioria de Angola, Cabo Verde e
Brasil.
Outra figura do Outro e da diversidade cultural está associada à cidade, à
urbanização, àquele que habita a cidade e os seus arredores. Mais de metade da
população (65%), oriunda de diversos universos culturais e sociais, habita hoje em
zonas urbana e suburbanas, prevendo-se que, em 2030, as cidades do mundo em
desenvolvimento acolham 80% do total da população, contribuindo as migrações para
este aumento populacional. 
Outra figura de diversidade cultural e do Outro são os cerca de 300 milhões de
pessoas, distribuídas por mais de 70 países, que pertencem a grupos indígenas,
representando cerca de 4 000 línguas. Na América Latina, por exemplo,  os 50 milhões
de indígenas constituem 11% da população da região.
Também, a União Europeia, projeto político que envolve 27 países e 500
milhões de habitantes com história e língua diferentes (26 línguas) e com identidades
sociais e culturais fortes, constitui um grande desafio político, cultural, educacional e
comunicacional. Neste sentido, o Conselho da Europa e a Comissão Europeia insistem
em que é necessário promover a “Cidade Aberta e Intercultural” e acolher a
diversidade cultural nas cidades ditas “globais”, de modo a responder às novas
dinâmicas e necessidades das sociedades atuais.
Convenção cultural da UNESCO e paradigma intercultural
A diversidade cultural é reconhecida pela UNESCO (2001, 2005, 2007) como
uma “caraterística inerente à humanidade”, como um “património comum” e como
fonte de “um mundo mais rico e diversificado que alarga a possibilidade de escolhas e
fortalece as capacidades e os valores humanos”.
A adoção, em 20 de outubro de 2005, pela UNESCO, da “Convenção para a
Proteção e Promoção da Diversidade das Expressões Culturais” representa uma etapa
fundamental para a emergência do direito cultural internacional. A convenção da
UNESCO concilia a defesa de duas visões: do universalismo, com a defesa dos valores
universais da paz, da solidariedade, da justiça e dos direitos do homem; do
particularismo, com a liberdade de cada um expressar a sua cultura e decidir as suas
escolhas.
Esta Convenção tem por objetivo criar condições que permitam às culturas
desenvolverem-se e a interagirem abertamente através de ações concretas a
diferentes níveis: ao nível nacional, ao nível internacional e ao nível nacional e
transnacional. A crescente mobilidade populacional e cooperação transnacional
proporcionam o contato de grande diversidade de culturas e identidades. A reflexão
sobre a diversidade cultural, através do Paradigma Intercultural, implica processos
dinâmicos e multidimensionais e reenvia aos conceitos de reciprocidade, de
complexidade, de complementaridade e de facto social total.
O Paradigma Intercultural vem desafiar os paradigmas tradicionais e implica
várias constatações e perspetivas: Uma constatação de ordem sociológica; Uma opção
de ordem ideológica; Uma visão estratégica; Uma perspetiva multi/interdisciplinar;
Uma perspetiva sistémica e multidimensional; Um processo dinâmico e dialético; Uma
perspetiva psicossocial e pedagógica; Uma perspetiva sociopolítica.
O paradigma intercultural vem introduzir a pluralidade, a heterogeneidade, a
complexidade e a multi/interdisciplinaridade na pesquisa, formação e intervenção,
implicando um novo reposicionamento metodológico, epistemológico e ético, assente
em três vertentes estruturantes: concetual, as diferenças culturais são definidas como
entidades dinâmicas e interativas, que se dão sentido mútuo; metodológica, a
abordagem  intercultural define-se como global, multidimensional e interdisciplinar, de
modo a dar conta das dinâmicas e da complexidade dos fenómenos sociais e a fim de
evitar os processos de categorização; ética, envolve uma reflexão sobre a forma de
respeitar a diversidade individual, social e cultural, de conciliar o universal e o
particular, o global e o local, de adaptação à complexidade estrutural duma sociedade
e à sua conflitualidade.
Diversidade cultural e competências interculturais
As competências do domínio intercultural podem agrupar-se deste modo:
competências individuais, que permitem interações sociais harmoniosas entre os
indivíduos e as culturas e que promovam uma atitude de descentração; competências
interculturais, sobretudo linguísticas, comunicacionais e pedagógicas; competências de
cidadania, que tornem possível o funcionamento democrático das sociedades e das
instituições.
Como sugere Vygotsky (2001): “A função primordial da linguagem é a
comunicação”. Existindo no mundo perto de 6.000 línguas e constituindo a língua o
principal meio de comunicação e de acesso a uma cultura, o ensino das línguas
desempenha um papel fundamental na educação e comunicação intercultural e na
educação para a cidadania.
Popovici (2006) acentua a importância do ensino das línguas e da preparação
dos alunos para “viver em conjunto”, com o objetivo da prevenção e resolução de
conflitos e para promover a comunicação intercultural.
Morin (2001) salienta a importância do ensino da compreensão mútua entre os
seres humanos, quer próximos, quer “estranhos”, daí a “necessidade de estudar a
incompreensão a partir das sua raízes, suas modalidades e seus efeitos. Este estudo é
tanto mais necessário porque enfocaria, não os sintomas, mas as causas do racismo,
da xenofobia, do desprezo”.
O etnocentrismo, os estereótipos e os preconceitos constituem barreiras,
filtros culturais à comunicação intercultural e estão na origem de conflitos e
incompreensão entre grupos minoritários e maioritários.
O etnocentrismo origina distância social, ódio, desconfiança, medo e
discriminação do exogrupo, em relação ao endogrupo. A intensidade do etnocentrismo
varia segundo as culturas, o tempo, o espaço e os indivíduos, no seio de uma mesma
cultura, havendo, contudo, um certo nível de etnocentrismo que se apresenta como
universal.
Para desenvolver a competência na comunicação e nas relações interculturais,
é importante a tomada de consciência do grau de determinismo cultural dos nossos
comportamentos, é necessário desenvolver a consciencialização cultural.
Para desenvolver competências no domínio intercultural e a compreensão 
recíproca entre indivíduos, grupos  e culturas, é importante: aprender a conhecer-se a
si mesmo e à sua própria cultura; aprender a descobrir e a compreender o sentido de
normas e valores; evitar julgamentos rápidos e superficiais, estereótipos e
preconceitos e atitudes etnocêntricas; desenvolver a empatia;  dispor de tempo para
comunicar; desenvolver estratégias e intervenções psicossociais e educativas
interculturais; implementar uma formação adequada dos professores e uma revisão
dos programas e dos materiais didáticos; respeitar a diversidade linguística e as línguas
maternas; trabalhar os currículos e os materiais de aprendizagem; utilizar
adequadamente os meios de comunicação social; aprender a construir projetos e a
encontrar soluções em conjunto para a resolução de conflitos; aprender a dialogar
com as outras culturas e aceitar negociar e propor compromissos; desenvolver uma
formação que explique e contribua para a compreensão da diversidade cultural e dos
preconceitos e estereótipos socialmente construídos; fomentar uma melhor
compreensão dos mecanismos psicossociais e dos fatores sociopolíticos suscetíveis de
originar a intolerância, a rejeição e a xenofobia; desenvolver competências
tecnológicas; proporcionar informação e formação, em relação à negociação dos
conflitos à escala nacional e internacional.
Landis e Brislin (1983) e Brislin (1993) consideram que os contatos entre as
culturas e as relações interculturais tenderão a aumentar e que a pesquisa e treino
intercultural poderão dar orientações e contributos positivos, para as relações
interculturais.
  Brislin e Yoshida (1994) destacaram um conjunto de benefícios do treino e
formação intercultural, nomeadamente: maior capacidade para lidar com as diferenças
culturais; mais bem-estar e satisfação nas relações interculturais; diminuição do
stresse e melhoria nas relações interpessoais e no trabalho com grupos heterogéneos;
maior abertura ao mundo e à alteridade; maior capacidade para resolver problemas
que exigem a compreensão cultural, a relação com outras culturas e a adaptação à
mudança. 
Considerações finais
Wolton (2003) assinala que, “Aprender a gerir a diversidade cultural constitui a
verdadeira riqueza das sociedades futuras”.
É necessário solidificar os quatro paradigmas da educação para o século XXI
defendidos por Delors (1996), ou seja: aprender a ser; aprender a conhecer; aprender
a fazer; aprender a viver juntos. O autor salienta ainda que, “é necessário assumir a
diversidade e a multipertença como uma riqueza. A educação à pluralidade é não só
uma proteção contra a violência, mas também um princípio ativo de enriquecimento
cultural e cívico das sociedades contemporâneas. 
Tema 5 – Principais conflitos e dificuldades nas relações e comunicação interculturais
Conflitos interculturais no espaço europeu – perspetivas de prevenção e intervenção
– Natália Ramos

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