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ARTIGO et al.
ORIGINAL
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Funções executivas em disléxicos
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Medina GBK et al.
um contexto coerente, que dê sentido ao texto, governam e integram informações para a reso-
precisamos conservar detalhes deste em nossa lução de problemas, inclusive na leitura.
mente5,11,15. Em idiomas diferentes do português, são
O controle inibitório é “a capacidade de res- vários os estudos que têm investigado a rela-
ponder apropriadamente a estímulos, inibindo res- ção entre as funções executivas e dislexia7,24-30.
postas não-adaptadas”18. Na hora da leitura este Em português ainda são poucos os trabalhos
é de suma importância, pois, para compreender publicados sobre este assunto, seja em portu-
o que está sendo lido, necessitamos controlar o guês de Portugal31, e também com participantes
movimento dos olhos da direita para a esquerda, brasileiros32,33.
analisar a estrutura do texto e impedir que outros Sendo assim, este trabalho tem como objetivo
pensamentos e estímulos distratores atrapalhem entender como se processa a leitura de crian-
a nossa concentração, para que, em conjunto ças com dislexia do desenvolvimento e como
com as demais funções cognitivas, possamos as funções executivas estão implicadas, com o
decodificar e interpretar o conteúdo lido19. propósito de contribuir para o desenvolvimento
Outro fator que influencia o desempenho de metodologias de trabalho que se concentrem
da leitura é a flexibilidade cognitiva. Esta diz na remediação dos déficits subjacentes ao pro-
respeito a realizar uma ação diferente da que se cesso da leitura.
fazia anteriormente, procurando novas possibi-
lidades e soluções para os problemas, ou seja, MÉTODO
envolve o pensar de forma flexível. Destaca-se Este trabalho tem como tema a investigação
que para mudar de perspectiva o controle ini- das funções executivas em crianças e adoles-
bitório é acionado inibindo ou desativando a centes com dislexia do desenvolvimento com o
perspectiva inicial para carregar na memória de intuito de verificar relações entre o desempenho
trabalho a nova perspectiva. Sendo assim, estes dos participantes nas avaliações destas funções e
dois componentes estão relacionados à flexibi- o desempenho na leitura. Nesta fase da pesquisa
lidade cognitiva11. participaram 20 alunos de escolas públicas da
É possível afirmar que a flexibilidade cogni cidade de Curitiba, PR, Brasil, com idade entre
9 anos e 9 anos e 11 meses, no período de março
tiva é habilidade de pensar além do óbvio, suge-
a junho de 2017.
rindo novas alternativas e praticando a empatia11,20.
Os participantes foram divididos em dois
Por exemplo, conforme assevera Cartwright21, a
grupos, o GD (Grupo Dislexia) constituído de
flexibilidade cognitiva está atuando quando o
10 alunos com diagnóstico de dislexia; e o
leitor lê cada palavra com uma entonação di-
GC (Grupo Controle) com 10 estudantes sem
ferente devido ao som das letras ou no momento
dificuldade de aprendizagem da leitura, com a
em que lê a palavra ao mesmo tempo em que mesma faixa etária das crianças com dislexia. Os
compreende o seu significado. Em síntese, a participantes são alunos do Ensino Fundamental
flexibilidade implica em conseguir mudar o foco I de escolas municipais de Curitiba.
de uma situação para outra. Os estudantes do GD, ou seja, com dislexia,
Segundo Diamond11, a memória de trabalho, foram devidamente diagnosticados por equipe
a flexibilidade cognitiva e o controle inibitório multiprofissional e recebem atendimento psi-
são funções executivas que dão base às funções copedagógico no Centro Municipal de Atendi-
executivas de alto funcionamento como raciocínio, mento Educacional Especializado (CMAEE).
resolução de problemas e planejamento. Sendo Os alunos do GC frequentam as mesmas turmas
estas também apontadas como preditores da dos alunos com dislexia, aleatoriamente indica-
compreensão leitora por Menghini et al.22 e dos pelas professoras dentre os alunos que não
Altemeier et al.23, pois as funções executivas apresentam dificuldade de aprendizagem. Os
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RESULTADOS DISCUSSÃO
Inicialmente, destaca-se que os dados de de- O desempenho das crianças com dislexia
sempenho dos participantes foram submetidos a do desenvolvimento nas tarefas de leitura e
provas estatísticas, porém, como os grupos eram funções executivas mostrou-se semelhante aos
pequenos optou-se pelo uso de testes estatísticos encontrados em estudos realizados em outros
não paramétricos40. Assim, para avaliar a diferen- países28,41-44, como é o caso do déficit na memória
ça entre os grupos no funcionamento executivo de trabalho (MT), que é a função executiva mais
e desempenho na leitura foi usado o teste não estudada no transtorno da leitura, pela forte
paramétrico U de Mann-Whitney (Tabela 2), o correlação com o desempenho em leitura45. Esta
qual mostrou que existe diferença significativa correlação também foi observada nesse estudo,
entre as amostras no desempenho dos testes de conforme verificam-se as quatro medidas utili-
leitura (TDE e TELCS), no teste de consciência zadas (MT geral, MT fonológica, Dígitos e MT
fonológica, e nos testes de Trilhas A-B, Cance- visuoespacial) que mostram esta correlação,
lamento, Memória de Trabalho, Fluência Verbal com o desempenho em leitura tanto dos leitores
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típicos quanto com o desempenho dos disléxicos foi o desempenho em memória de trabalho, em
(embora menos significativa com este último). que ficou evidente a importância desta função
No estudo de Engel de Abreu et al.46, que ava- para o processo de alfabetização, pois “quanto
liou “maus leitores”, o maior preditor em leitura maiores os recursos em memória operacional,
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mais fácil é a manutenção ativa da informação e tância das avaliações usando tarefas de repetição
a sua integração com inputs recentes e conheci- de não palavras e de memória de trabalho, porém
mentos já adquiridos que representam processo reiteram que precisam ser utilizadas também
essencial para a aprendizagem acadêmica” (p. 14), outras tarefas, como aquelas envolvendo as de-
assim como o oposto também é verdadeiro e mais funções executivas, para que se alcance um
contribui para compreender que atividades que perfil mais completo dos avaliados, considerando
sobrecarregam a memória de trabalho, como ins que as crianças com dislexia apresentam maior
truções alongadas e complexas podem ser um dificuldade quando solicitadas a realizar tarefas
obstáculo para aqueles que manifestam um com componente verbal17.
déficit nessa área, intensificando a dificuldade No teste Trilhas A e B, usado para verificar
para a aprendizagem da leitura. o funcionamento da flexibilidade cognitiva, o
Da Rocha e Silva et al.47, que avaliaram crian- grupo controle apresentou melhor desempenho,
ças com dificuldade de leitura, destacam a impor- sendo a maior diferença na segunda fase deste
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teste (parte B), em que precisavam alternar Engel de Abreu et al.46, a flexibilidade cognitiva
entre letras e número, colocando-os nas ordens sozinha gera pouco impacto na aprendizagem da
alfabética e numérica no tempo de um minuto. leitura, se comparada ao impacto que esta função
Ficou caracterizada a maior dificuldade dos possui quando associada à memória de trabalho,
disléxicos para alternar diferentes estímulos em na qual o indivíduo precisa, além de alternar,
um determinado tempo. sustentar na memória a informação necessária
Assim como no estudo de Reiter et al.26, Lima para a realização da tarefa.
et al.32,33,48 e Moura et al.31, os disléxicos também É importante destacar que os disléxicos apre-
cometeram mais erros e tiveram desempenho sentam dificuldade para evocar da memória a
mais lento que os leitores típicos na realização longo prazo as letras em ordem alfabética, e com
do Trilhas, o que demonstra que coordenar a isso podem ter seu desempenho prejudicado em
tarefa com acurácia é mais difícil para disléxicos instrumentos que utilizem esse tipo de estímulo.
do que para leitores típicos. Entretanto, segundo Isso é confirmado pela correlação encontrada
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entre o desempenho em flexibilidade cognitiva Em última análise, destaca-se que, por ser uma
e a avaliação de leitura feita com o teste TDE tarefa complexa que envolve prontidão, memória
também encontrado nesse estudo. Novos estudos de trabalho, flexibilidade cognitiva, planeja
são necessários para avaliar a influência da fle mento e atenção, o teste de Fluência Verbal per-
xibilidade cognitiva no desempenho em leitura, mite captar o potencial executivo geral de um
de forma independente de memorização e evo- indivíduo53. O desempenho dos participantes da
cação de sequências49. pesquisa nesta tarefa só mostrou diferença signi-
O teste Go/No Go mostrou que os disléxicos ficativa entre os grupos na avaliação da Fluência
cometem mais erros e mais omissões, porém Verbal Geral e Ortográfica, na qual o grupo con-
somente a quantidade de erros mostrou-se signi trole teve melhor resultado. A performance no
ficativamente diferente quando comparado o teste de Fluência Verbal Semântica não mostrou
desempenho dos dois grupos. Nos três estudos diferença significativa entre os grupos, embora o
apresentados por Brosnan et al.24 foi apontado grupo controle tenha apresentando desempenho
que a dislexia do desenvolvimento pode envol- superior ao do grupo de disléxicos.
ver um déficit específico no controle da inibição, Resultados semelhantes foram encontrados
como se o disléxico tivesse uma tendência a se nos estudos de Brosnan et al.24, Reiter et al.26 e
distrair, o que talvez justifique o desempenho Lima et al.33. De acordo com Reiter et al.26, a di
destes sujeitos nestas tarefas. ficuldade de fluência verbal pode ser decorrente
O Teste de Cancelamento, que também con da reduzida produtividade e não de deficiência
tribui para a hipótese de déficit no controle ini de processamento cognitivo. Frith et al.54 con
bitório, mostrou que os disléxicos apresentam
sideram que, em decorrência da dificuldade
desempenho inferior ao dos não disléxicos, come-
em consciência fonêmica e correspondência
tendo mais omissões e erros. É importante sa-
letra-som, os disléxicos demoram mais tempo
lientar que os testes de atenção contribuem para
para localizar as palavras corretas no seu léxico
a identificação de déficits no controle inibitório e
mental, o que prejudica seu desempenho geral.
na flexibilidade cognitiva e, para alguns autores,
Por último, é importante salientar que, embora
os processos controlados são considerados parte
seja possível verificar defasagens no desempe-
das funções executivas50,51.
nho dos disléxicos em vários componentes das
Neste sentido, destaca-se os estudos de Ber-
funções executivas, o déficit central apresentado
ninger et al.52 que compararam o desempenho
por pessoas com dislexia do desenvolvimento
de disléxicos em provas de atenção e funções
são as dificuldades de processamento fonológico.
executivas, ao de crianças com disgrafia e sem
Assim, identifica-se a necessidade de novos
dificuldades de aprendizagem. Seus resultados47
mostraram que a atenção focada relacionada estudos, particularmente estudos longitudinais,
com o controle inibitório prediz resultados no que possam analisar quanto os prejuízos nas
sistema de linguagem oral em disléxicos. funções executivas são causa ou consequência
Para avaliar a capacidade de planejamento e das dificuldades de leitura dos disléxicos.
resolução de problemas, foi usado o Teste Torre
de Londres, o qual não apresentou diferença sig CONCLUSÃO
nificativa entre os grupos, nem com relação ao Inicialmente, é importante mencionar, mais
tempo de execução. Este resultado corrobora os uma vez, que se procurou entender como se pro
dos estudos de Brosnan et al.24, Reiter et al.26, Lima cessa a leitura de crianças com dislexia do de
et al.32,33,48 e Moura et al.31. O estudo de Reiter et senvolvimento e como as funções executivas
al.26 mostrou que os disléxicos possuem sua ca- estão implicadas neste processamento, com o
pacidade de resolução de problemas preservada, objetivo de contribuir para o desenvolvimento
porém requerem maior tempo de planejamento de metodologias de trabalho que se concentrem
que pessoas sem dificuldade de leitura. na remediação dos déficits subjacentes à leitura.
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Assim, foram avaliadas crianças com diagnós- dificuldade, sugere-se que as atividades escolares
tico de dislexia e crianças com nível de leitura sejam elaboradas com instruções diretas e curtas,
adequado à idade e ao ano escolar, e realizadas evitando a sobrecarga na memória de trabalho.
análises de correlação entre os desempenhos Como limitações deste estudo, pode-se men-
dos participantes. cionar a necessidade de utilização de mais me-
O estudo mostrou correlações significativas didas (instrumentos) para avaliar a flexibilidade
entre o desempenho nas tarefas de leitura, cons cognitiva e o controle inibitório, tendo em vista que
ciência fonológica e vários testes relativos às as análises que englobaram estas variáveis ficaram
funções executivas. No que se refere aos disléxi restritas aos resultados de uma única medida. Ade-
cos do desenvolvimento, verificou-se que eles mais, sugere-se que o Teste de Trilhas tenha todo
o tempo de execução cronometrado para avaliar
apresentaram déficits na memória de trabalho,
a velocidade de processamento em todo o teste
no controle inibitório, na atenção e na flexibili-
e não apenas no primeiro minuto de execução.
dade cognitiva.
Além disso, embora se saiba das dificuldades
Acredita-se que existe considerável suporte
de encontrar participantes com o perfil neces-
teórico e empírico para sugerir que entre os dis-
sário para pesquisas desta natureza, considera-se
léxicos ocorrem déficits que abrangem as funções
importante repetir o estudo aqui apresentado com
executivas de forma integral, porém algumas uma amostra mais numerosa, pois como foi dito
áreas das funções executivas têm mais déficits na Introdução ainda são escassos os estudos que
que outras e mesmo nas áreas com mais compro avaliam as funções executivas em disléxicos, prin-
metimento os desempenhos das crianças são cipalmente no contexto do português do Brasil.
diferentes entre si. Isto explica, pelo menos em Por último, destaca-se que a principal impli-
parte, a variedade de padrão de leitura manifesta cação educacional deste estudo foi que, a partir
pelos disléxicos. da constatação dos déficits apresentados pelos
Considerando o impacto que o déficit em me- participantes com dislexia, elaborou-se um pro-
mória de trabalho ocasiona no desempenho da grama voltado ao desenvolvimento das funções
leitura em disléxicos e, consequentemente, na executivas que será aplicado na segunda etapa
vida escolar dos estudantes acometidos por esta deste estudo.
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SUMMARY
Executive functions and reading in Brazilian children
with developmental dyslexia
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Medina GBK et al.
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