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Reitor da Universidade Estadual do Piauí – UESPI

Nouga Cardoso Batista

Vice-reitor da UESPI
Evandro Alberto de Sousa

Pró-reitora de Ensino de Graduação – PREG


Nayana Pinheiro Machado de Freitas

Coordenadora Geral PARFOR/UESPI


Elilian Basílio e Silva

Coordenadora Adjunta PARFOR/UESPI


Ermínia Maria do Nascimento Silva

Coordenador do Curso de Licenciatura Plena em Pedagogia


Profº Me. Cláudio José Araújo
Profª Me.Marilene de Oliveira Araújo

DISCIPLINA

SOCIOLOGIA DA EDUCAÇÃO II

EMENTA
Educação em sua dimensão social. Sociedade, educação e escola
na perspectiva conservadora e na perspectiva crítica. Sociedade,
cultura e educação. A educação e as transformações da sociedade.
O482r Oliveira, Marcia Adriana Lima de.
Reflexões sobre sociologia aplicada à educação / Marcia
Adriana Lima de Oliveira. – Teresina : UAB/FUESPI/
NEAD, 2012.
132 p.

ISBN

1. Sociologia da educação – Teorias clássica e


contemporânea. 2. Pedagogia no Brasil – Teorias crítico-
reprodutivistas. I. Título.

CDD: 370.81
Edição Revisão
UAB - FNDE - CAPES Alvino Rodrigues de Carvalho
UESPI/NEAD Teresinha de Jesus Ferreira

Diretora do NEAD Diagramação


Márcia Percília Moura Parente Pedro Leonardo de Sousa
Magalhães
Diretor Adjunto
Raimundo Isídio de Sousa Capa
Luiz Paulo de Araújo Freitas
Coordenadora do Curso de
Licenciatura Plena em Pedagogia UAB/UESPI/NEAD
Umbelina Saraiva Alves Campus Poeta Torquato Neto (Pirajá),
NEAD, Rua João Cabral, 2231, bairro
Coordenador de Tutoria Pirajá, Teresina (PI). CEP: 64002-150,
Telefones: (86) 3213-5471 / 3213-1182
José da Cruz Bispo de Miranda Web: ead.uespi.br
E-mail: eaduespi@hotmail.com
Coordenadora de Produção de
Material Didático
Cândida Helena de Alencar Andrade

Autora do Livro
Marcia Adriana Lima de Oliveira

MATERIAL PARA FINS EDUCACIONAIS


DISTRIBUIÇÃO GRATUITA AOS CURSISTAS UAB/ FUESPI
SUMÁRIO

CAPÍTULO I - TEORIAS CRÍTICO - REPRODUTIVISTAS NOS


PENSADORES CLÁSSICOS E CONTEMPORÂNEOS NA SOCIOLOGIA
DA EDUCAÇÃO..........................................................................................9
1.1 Clássicos na Sociologia da Educação.............................................11
1.1.1 Durkheim .............................................................................12
1.1.2 Karl Marx .............................................................................16
1.1 Contemporâneos na Sociologia da Educação................................20
1.1.1 Louis Althusser.....................................................................20
1.1.2 Pierre Bourdieu.....................................................................24
1.1.3 Edgar Morin..........................................................................27

CAPÍTULO II- A INFLUÊNCIA DOS TEÓRICOS CRÍTICO -


REPRODUTIVISTAS NA PEDAGOGIA NO BRASIL: UM RESGATE
HISTÓRICO...............................................................................................35

2.1 Teóricos Crítico –reprodutivistas: um resgate histórico ..................37

2.2 A influência dos teóricos críticos- reprodutivistas na Pedagogia


no Brasil..........................................................................................42

2.2.1- Uma conversa entre Moacir Gadotti, Paulo Freire e Sérgio


Guimarães sobre a Pedagogia: diálogo e conflito...........................42

2.2.2 Luiz Antônio Cunha e suas reflexões sobre a Violência


simbólica.........................................................................................46

2.2.3 Reflexões de Dermeval Saviani sobre a Escola e a


Democracia.....................................................................................50

CAPÍTULO III - EDUCAÇÃO E AS TRANSFORMAÇÕES NO MUNDO


CONTEMPORÂNEO.................................................................................55

3.1. Nelson Piletti e a Estrutura e o Funcionamento do Ensino Médio e


do Ensino Fundamental...................................................................58

3.2. Rubem Alves e outras dimensões da Educação...........................62


CAPÍTULO IV: PARTILHAS DO VIVIDO...................................................71

Artigo 1: Separações e Divórcios: Elementos que fazem parte da dinâmica


Familiar ou Elementos de “desestruturação” desta?..................................74

Artigo 2: A Avaliação no universo da relação entre docente e discente: um


eterno aprendizado...................................................................................111

Texto 1: Ensino a Distância: reflexões sobre as Novas Tecnologias no


Processo de Ensino – Aprendizagem........................................................123

Texto 2: Computador: como lidar com esta máquina?............................127


UNIDADE I
Teorias Crítico-Reprodutivistas nos
pensadores clássicos e contemporâneos
na Sociologia da Educação

OBJETIVOS
• Conceituar Educação e Pedagogia segundo Durkheim;
• Identificar as pontes entre Sociologia e Educação na
visão durkheimiana;
• Verificar como a educação é constituída no olhar de Marx;
• Averiguar como a família é vista na visão de Karl Marx;
• Conceituar Aparelhos Ideológicos do Estado segundo
Althusser;
• Identificar as diferenças entre os aparelhos ideológicos e
os repressivos;
• Conceituar Escola e verificar a função do aparelho
ideológico da escola no olhar de Althusser;
• Identificar a visão de Educação conforme Bourdieu;
• Verificar e identificar os saberes necessários à educação
do futuro segundo Edgar Morin
FUESPI/ NEAD Pedagogia

Parece que as escolas são máquinas


de moer carne: numa extremidade
entram as crianças, com suas fantasias
e seus brinquedos. Na outra saem
rolos de carne moída, todos iguais,
prontos para o consumo, ‘formados’
em adultos produtivos (Rubem Alves).

Há escolas que são gaiolas. Há


escolas que são asas. Escolas que
são gaiolas existem para que os
pássaros desaprendam a arte do vôo.
Pássaros engaiolados são pássaros
sob controle. Escolas que são asas
amam pássaros em vôo. Existem para
dar aos pássaros coragem para voar
(Rubem Alves).

Na Sociologia da Educação, têm-se várias teorias, dentre elas, a


crítico-reprodutivista, que aborda posturas que acreditam na Educação
como instrumento de reafirmação da cultura vigente ou de questionamento
a esta. Nesse sentido, veremos aqui autores que tanto estudaram a
Educação como instrumento reafirmador da ordem pré-estabelecida, quanto
como instrumento de ampliação do conhecimento, e, consequentemente,
de mudanças.

Assim, dentre os autores que abordaremos aqui estão: Durkheim,


Marx, Althusser, Bourdieu e Morin, que nos ajudaram a pensar a relação
entre Sociologia e Educação. Comecemos com os clássicos então...

1.1 Clássicos na Sociologia da Educação

O primeiro pensador com quem iremos “dialogar” será Émile


Durkheim, visto em Sociologia da Educação I, retomando alguns aspectos
importantes do seu pensamento. Então, após revisitar o pensamento de
Durkheim no seu livro Educação e Sociologia, e faremos uma retomada
do pensamento de Karl Marx, em sua obra A ideologia Alemã, para
compreendermos como este via a Educação.

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Reflexões sobre Sociologia Aplicada à Educação

1.1.1 Émile Durkheim


O francês Émile Durkheim “nasceu
em Épinal,Departamento de Vosges,
Para Durkheim, era difícil entender que fica exatamente entre a Alsácia
e a Lorena, a 15 de abril de 1858.
como as pessoas questionavam tanto a Morreu em 1917. (...) Sofreu influência
ordem estabelecida e, ao mesmo tempo, dos pensadores Montesquieu,
Fustel de Coulanges, o estudo das
reproduziam essa mesma ordem, dantes instituições da Grécia e Roma, e dos
neokantianosRenouvier , Boutroux,
tanto questionada. Então, ao tentar criar Wundt, Dilthey,Simmel, Tönies.”
uma área do conhecimento que estudasse (RODRIGUES, FERNANDES
(Orgs.), 1993,pp. 7- 8)
esses incômodos, Durkheim criou a
Sociologia, como sendo “o estudo dos
fatos sociais”, ou seja, escolheu para trabalhar, pesquisar o que era invisível,
mas que se tornava visível, através das ações humanas, denominado de
fato social.

O que vem a ser fato social, então? Bem, conforme viram em Sociologia
da Educação I, para Durkheim, fatos sociais são “toda e qualquer maneira de
pensar, sentir e agir de um indivíduo como membro de um dado grupo social”.

Bem, até aqui tudo ainda é muito abstrato, pois o que seria esta
“maneira” que norteia a minha ação, os meus pensamentos e os meus
sentimentos? Podemos dizer que esta “maneira” são as leis, as regras,
enfim, tudo o que está legalmente ou legitimamente dado como sendo o
correto ou o errado, a moral do grupo ao qual o indivíduo está inserido.

Assim, pode-se dizer que os fatos sociais são a mesma coisa que as
Instituições sociais, pois, quando falamos em família. Não estamos falando
da família, enquanto grupo social, organização, mas as leis que regem o
que é chamado ou não de família dentro do grupo ao qual pertenço.

Por exemplo, antes da Constituição de 1988, família era considerada


pai, mãe e filhos, biologicamente falando, e, todos residindo juntos. Contudo,
em decorrência das leis do desquite na década de 60 e do divórcio nº 6.515
de 1977/78, muitos casais se separaram, passaram a residir sozinhos com
seus filhos, instituindo as famílias monoparentais, ou seja, apenas o pai
ou a mãe e seus descendentes. Muitas crianças passaram a morar com

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FUESPI/ NEAD Pedagogia

avó, e as crianças adotadas, como ficavam? E, quem era solteiro, não era
família? Bem, com a constituição de 1988, família passou a ser vista como
“união estável entre um homem e uma mulher, qualquer um dos pares e
seus descendentes”, fazendo com que o casal que estivesse morando
junto, sem ser casado no civil ou religioso, passasse a ser família, ou avó e
o neto, ou apenas o pai e seu filho ou a mãe e seu filho ou sua filha, fossem
reconhecidos legalmente como família.

Atualmente, século XXI, tem-se uma discussão no Superior Tribunal


de Justiça (STJ) para que os casais homoafetivos sejam vistos como família,
fazendo a alteração na lei quanto ao conceito de família para: “união estável
entre duas pessoas”.

Logo, percebe-se que o comportamento das pessoas passa por


alterações conforme as leis que começam a vigorar no grupo, e estas, por
sua vez, são modificadas quando não mais atendem às necessidades dos
indivíduos nesse grupo. Uma lei é a materialização da cultura do grupo em
questão, tornando-se fato social.

O aborto é um fato social? Bem, o fato de a mulher ir ao médico e


decidir ter ou não a criança, é apenas um fato, mas quando se torna social?
Quando, na cabeça da mãe que interrompe a gestação o fato é um crime,
pois, segundo os Direitos Humanos, “todo ser vivo tem o direito à vida”; ou
existem grupos em que o aborto é visto como controle de natalidade. E, se
alguém comete um ato que fira esses princípios, então, a ação será julgada
e sentida conforme a norma abraçada pelo grupo em questão. Assim, o fato
social não é social apenas por acontecer em um grupo, mas pelo sentido
atribuído a ação. Sentido, este, que permeia toda a moral do grupo em
questão, conforme fora dito anteriormente.

Por esse motivo, os fatos sociais são exteriores aos indivíduos,


porque, a moral do grupo já existe, pelos indivíduos que a criou, para
atender a uma necessidade, e que passou a reger o grupo, independente
de quem chegou depois. É coercitiva, pois, todos terão que pensar, sentir e
agir conforme as regras do grupo em questão e é geral, pois a lei, a regra
é para todos.

13
Reflexões sobre Sociologia Aplicada à Educação

Bem, sabendo, então, da importância e repercussão dos fatos


sociais, Durkheim, deteve-se à relevância da Educação neste processo,
escrevendo um livro denominado de Educação e Sociologia.

Neste livro, Durkheim (1973, p.57) no capítulo II intitulado Natureza


da Pedagogia e seu método, tentando esclarecer o que ele denominou de
Confusão entre os termos educação e pedagogia, diz que
a educação é a ação exercida, junto às crianças, pelos pais
e mestres. É permanente, de todos os instantes, geral. Não
há período na vida social, não há mesmo, por assim dizer,
momento no dia em que as novas gerações não estejam em
contato com seus maiores e, em que, por conseguinte, não
recebam deles influência educativa. (...) Há (também-grifo
nosso) uma educação não intencional que jamais cessa. Pelo
nosso exemplo, pelas palavras que pronunciamos, pelos atos
que praticamos – influímos de maneira contínua sobre a alma
de nossos filhos.

Percebe-se que a educação é tratada por Durkheim como um


processo contínuo no encontro com o outro, e na relação entre os pais e
filhos. A educação acontece não apenas através do dito, mas, principalmente,
através das ações, dos modelos que são manifestos, exteriorizados
através das ações de quem educa. E, o mais interessante no pensamento
durkheimiano é que essas reflexões que foram registradas no início da
década de 70, continuam a vigorar no século XXI, nas falas que ganharam
domínio popular, tais como: ”mas que palavras, educa-se pelo exemplo”; “é
necessário que se tenha uma coerência entre o que se pensa, sente-se e o
que se faz”, ressaltando aqui, a atualidade do seu pensamento.

Da maneira com que Durkheim (1973,41) aborda a Educação ele,


então, dá uma ênfase especial à criança, dizendo que dependendo da
maneira como se educa esta criança ela irá reproduzir a moral do grupo, ou
servir para modificá-la a longo prazo. Salientando que neste processo de
socialização, ou seja, tornar ao indivíduo, no caso a criança, membro de um
dado grupo social, ou da própria sociedade, é necessário que se contemple
“as dimensões física, intelectual e moral, exigidas pela sociedade política e
pelo meio moral ao qual ela pertence”.

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FUESPI/ NEAD Pedagogia

Além de compreender a educação como processual, contínua,


Durkheim (1973, p.42) também acredita que
a educação não se limita a desenvolver o organismo , no sentido
indicado pela natureza, ou a tornar tangíveis os elementos ainda
não revelados, embora à procura de oportunidade para isso. Ela
cria no homem um ser novo

Um “homem novo”, que tanto poderá contribuir para reafirmar a


moral do grupo, conforme supracitado quanto contribuirá para modificações
no grupo em questão, embora, no seu livro As formas elementares da
vida religiosa, Durkheim diga que não é da natureza de um conceito que
ele mude, contudo, como o conceito é a expressão da cultura do grupo,
o mesmo só irá se sustentar, enquanto atender às necessidades dos
membros deste. Mas, quando houver necessidade, a mudança do conceito
também se fará presente.

E a Pedagogia neste contexto? Como Durkheim (1973, pp. 57-58) a


conceitua? Bem, ele diz que a Pedagogia
não consiste em ações, mas, em teorias. Essas teorias são
maneiras de conceber a educação, não são maneiras de praticá-
la. (...) A educação não é, portanto, senão matéria da pedagogia;
e esta consiste num certo modo de refletir a respeito das coisas
da educação.

Assim, conforme supracitado, para Durkheim a Educação é o foco


do estudo da Pedagogia, em que além de tentar compreendê-la na sua
dimensão mais ampla, objetiva, analisar as práticas educativas, através das
teorias, construídas para possibilitar esta compreensão no processo ensino
e aprendizagem que permeiam o universo educacional. Enfatizando nesse
universo, o caráter de reafirmação da moral do grupo ou de questionamento
desta, conforme as necessidades dos sujeitos participantes envoltos no
universo educacional, no processo educativo.

LEITURAS SUGERIDAS

• DIAS, Fernando Correia. Durkheim e a Sociologia da Educação no


Brasil In: Em Aberto,Brasília, ano 9, nº 46, pp.32-49, abril/ junho

15
Reflexões sobre Sociologia Aplicada à Educação

1990 disponível no site http://emaberto.inep.gov.br/index.php/


emaberto/article/viewFile/726/649 acessado em 01/03/2012

• LUCENA, Carlos. O pensamento educacional de Émile Durkheim


in: Revista HISTEDBR ON-LINE, Campinas, nº40, pp.295-305,
dez. 2010- ISSN: 1676-2584 disponível no site http://www.histedbr.
fae.unicamp.br/revista/edicoes/40/art18_40.pdfacessado em
01/03/2012,

• RODRIGUES, Alberto Tosi. Sociologia da Educação. 6ª ed. Rio de


Janeiro: Lamparina, 2007

• RODRIGUES, José Albertino; FERNANDES, Florestan (Orgs.)


Durkheim. 6ª ed. São Paulo: Ática, 1993

MOMENTOS DE REFLEXÃO DA APRENDIZAGEM - ATIVIDADES

• Escreva um pequeno texto, de no máximo três laudas, sobre o


pensamento de Durkheim, contendo o seu entendimento sobre fatos
sociais e sua relação com a Educação. Para a elaboração desse
texto utilize as informações contidas acima sobre Émile Durkheim,
e os dois textos contidos nas Leituras Sugeridas. E, ao final, redija
um parágrafo posicionando-se acerca do que leu.

Karl Heinrich Marx “nasceu


1.1.2 Karl Marx em 1818 na cidade de Trier
(Prússia Renana) no seio de
uma família judaica, de linhagem
Para Karl Marx, a educação, constitui- rabínica pelas vertentes paterna
se em parte da superestrutura, como e materna, mas convertida
ao protestantismo. (...) Sofreu
também a ideologia; que é vista como o influências de Hegel, Kant, Fichte,
Schelling, dentre outros” (MARX;
mascaramento da realidade, posto que, ENGELS, 2006, pp.12- 13)
para ele, a realidade ou o real é o modo
de produção, ou a dimensão econômica do
humano. Assim, vamos falar em Marx sobre a Concepção Materialista da
História, a família e a educação nas linhas seguintes.

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FUESPI/ NEAD Pedagogia

Começando a falar sobre a Concepção Materialista da História, tem-


se que o primeiro ato histórico, na visão de Marx, surge quando os primeiros
hominídeos, para suprirem suas necessidades de sobrevivência constroem
o seu instrumento de trabalho; pois, na visão de Marx e Engels (2006, p.53)
Todos os homens devem estar em condições de viver para poder
‘fazer história’. Mas, para viver, é preciso antes de tudo comer,
beber, ter moradia, vestir-se e algumas coisas mais. O primeiro
fato histórico é, portanto, a produção dos meios que permitem
que haja a satisfação destas necessidades, a produção da
própria vida material, e de fato esse é um ato histórico, (...).

A partir desse ato histórico, os indivíduos, vão compartilhando das


descobertas do instrumento de trabalho, uns com os outros, os grupos vão
sendo formados e, juntamente, com estes, surgem a linguagem e a cultura; ou
seja, os primeiros hominídeos, vão se tornando seres humanos, seres culturais.

Conforme Marx e Engels (2006,p.54)


A terceira relação que intervém no desenvolvimento histórico
é que os homens, que cotidianamente renovam suas vidas,
passam a criar outros homens, a se reproduzir: é a relação entre
homem e mulher, entre pais e filhos, a família. Essa família, que
no início é a única relação social, torna-se depois, quando as
necessidades ampliadas geram novas relações sociais, e, o
aumento populacional gera novas necessidades, uma relação
secundária (exceto na Alemanha) e deve, por essa razão, ser
tratada e desenvolvida de acordo com os dados empíricos
existentes, (...). A produção da vida, seja da própria vida pelo
trabalho, seja a de outros, pela procriação, nos aparece a partir
de agora como uma dupla relação: de um lado, como relação
natural, de outro, como relação social – no sentido em que se
compreende por isso a cooperação de vários indivíduos, em
quaisquer condições, modo e finalidade. De onde se segue que
um modo de produção ou uma determinada fase industrial estão
sempre ligados a uma determinada forma de cooperação e a uma
fase social determinada, e que essa forma de cooperação é, em
si própria, uma “força produtiva”; decorre disso que o conjunto
das forças produtivas acessíveis aos homens condiciona o
estado social, e que, assim, a “ história dos homens” deve ser
estudada e elaborada sempre com a conexão com a história da
industria e do intercâmbio.”

Percebe-se que para Marx, a família é vista como a primeira relação


social construída a partir de necessidades, e, na medida em que essas

17
Reflexões sobre Sociologia Aplicada à Educação

necessidades aumentam as relações sociais tornam-se mais e mais


complexas saindo do âmbito da família para o do trabalho. E, este como
fator de construção da sua própria história sempre conectada à história da
“indústria e do intercâmbio”.

Para Marx, o Homem que vai se constituindo através dessas relações


sociais, primeiro família, depois sociedade, produção da vida material é um
sujeito que possui uma consciência, contudo, esta vai sendo adormecida ou
despertada. Consciência esta de que o ser humano é um sujeito da práxis,
que produz uma ação e que esta ação irá gerar um produto, que atenderá,
até certo ponto, às necessidades, e que posteriormente será substituído ou
não por outro, num movimento continuum, conforme as necessidades.

Esse movimento que inclui nestas relações a luta entre homem e


natureza, o que dará origem às forças produtivas, que são as relações
entre os seres humanos e seus instrumentos de trabalho (terras, internet,
fábricas,...) e as relações de produção que são determinadas pela maneira
como as forças produtivas se apresentam, ou seja, se quem trabalha na
terra não é proprietário, e os instrumentos de trabalho também não o são,
as relações serão de escravidão ou vassalagem, então o modo de produção
será o Escravagista ou Feudal, e, assim, sucessivamente.

Nesse contexto, para Marx (2006, p.77) a “História não é outra coisa
senão a sucessão das diferentes gerações, em que cada uma delas explora
os materiais, os capitais e as forças de produção a ela transmitidas pelas
gerações que antecederam”, fazendo com que haja mudança do modo de
produção, também denominado de infraestrutura e, consequentemente, na
superestrutura também.

Por superestrutura, tem-se toda a dimensão invisível, da ordem


do Direito, Comunicação, Religião, Parentesco (Família, Casamentos,...),
Educação, dentre outras.

Não há como haver a reafirmação da ordem pré-estabelecida se todas


as dimensões da sociedade (Igrejas, Escolas, Família,...), enquanto grupos

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FUESPI/ NEAD Pedagogia

sociais, não reafirmarem a ordem estabelecida, através do que foi contido nas
Instituições sociais ou também conhecidos como Aparelhos Ideológicos do
Estado. Assim, quanto a Educação Marx (2006, p.118) diz que:
A doutrina materialista que supõe que os homens são produtos
das circunstâncias e da educação e, em razão disso, os homens
transformados são produtos de outras circunstâncias e de uma
educação modificada, esquece-se de que são justamente os
homens que transformam as circunstâncias e que o próprio
educador precisa ser educado.(...) A coincidência da mudança
das circunstâncias com a atividade humana ou mudança de si
próprio só pode ser vista e considerada racionalmente como
práxis revolucionária.

Percebe-se, então, que para Marx, assim como para Durkheim,


a educação tanto pode aprisionar, com revolucionar, ou seja, tanto pode
servir para reafirmar a ordem estabelecida, como transformá-la, conforme
as mudanças que vão acontecendo no âmbito prático e que vão adquirindo
ressonância no Educador, na Escola através, como supracitado, de uma
educação modificada.

A Educação modificada faz com que haja a consciência de que cada


aluno, não é mais um, mas um sujeito ativo que desenvolvendo a dimensão
crítica e autocrítica vai adquirindo uma consciência maior de si, do outro,
do grupo, podendo contribuir para as mudanças, não apenas campo
educacional, em outras esferas da sociedade da e na qual faz parte.

REFERÊNCIAS DESTA SEÇÃO

• MARX, Karl Heinrich; ENGELS, Friedrich. A Ideologia Alemã.


(Reimpresso). São Paulo: Editora Martin ClaretLtda, 2006

LEITURAS SUGERIDAS

• CASTRO, Celso Antônio Pinheiro de. Sociologia Geral. São


Paulo: Atlas, 2000

• RODRIGUES, Alberto Tosi. Sociologia da Educação. 6ª ed.


Rio de Janeiro: Lamparina, 2007

MOMENTOS DE REFLEXÃO DA APRENDIZAGEM - ATIVIDADE

19
Reflexões sobre Sociologia Aplicada à Educação

• A partir do que leu, discorra em, no mínimo 2 (duas) laudas e


no máximo 3(três), acerca da visão de Marx sobre Concepção
Materialista da História, família e a educação. Pode utilizar outras
fontes. Inclua as leituras sugeridas na produção do seu texto.

1.2 Contemporâneos na Sociologia da Educação

Após termos revisto os clássicos na Sociologia da Educação, enfatizando


não apenas o pensamento de Émile Durkheim e Karl Marx, mas apresentando
a reflexão desses autores acerca da Escola, da Educação, vamos para
os olhares contemporâneos na Sociologia da Educação iniciando com
Louis Althusser, passando por Pierre Bourdieu, chegando ao olhar sobre a
Educação do Futuro com Edgar Morin.

Louis Althusser (1918-1990), sociólogo


francês, nascido na Argélia, rejeitou a
1.2.1 Louis Althusser interpretação hegeliana de Marx e o apelo
à categoria psicológica da alienação,
Louis Althusser (1985, p. 53-54), tentando restabelecer o sentido econômico
do marxismo”(CASTRO, 2000,p.357)
no seu livro Os aparelhos ideológicos
de Estado, afirma que toda “formação
social” para existir necessita reproduzir “as forças produtivas e as relações
de produção existentes”.

Bem, conforme fora visto em Karl Marx, as forças produtivas consistem


na relação entre os sujeitos trabalhadores e os meios de produção. Por
exemplo, caso a terra não seja de quem produz nela, e, o proprietário da
terra, vê os seus trabalhadores como escravos, a relação de produção
entre os mesmos será de escravidão. Agora, caso o proprietário ofereça
uma remuneração para os trabalhadores, na forma de um salário; a relação
de produção será assalariada e assim sucessivamente.

Como se pode perceber, Althusser (1985, p.57) utiliza o pensamento


de Marx acerca das forças produtivas e relações sociais de produção, mas
amplia os conceitos dizendo que “reprodução da qualificação da força de
trabalho, ocorre não mais no espaço de trabalho, mas fora da produção,
através do sistema escolar capitalista e de outras instâncias”.

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FUESPI/ NEAD Pedagogia

Assim sendo, a escola tem uma relevância acerca do que se


precisa aprender no âmbito escolar, para que se obtenha um ‘know-how’
(conhecimento técnico-científico, uma experiência) acerca do que se deve
fazer para qualificar-se para o trabalho. Althusser (1985, p.57-58) diz que
existe “uma instrução para os operários, outra para os técnicos, uma terceira
para os engenheiros, uma última para os quadros superiores, etc”.

Em outras palavras, a escola (mas também outras instituições


do Estado, como a Igreja e outros aparelhos como o Exército)
ensina o ‘know- how’ mas sob formas que asseguram a
submissão à ideologia dominante ou o domínio de sua ‘prática’.
Todos os agentes da produção, da exploração e da repressão,
sem falar dos ‘profissionais da ideologia’ (Marx) devem de
alguma forma ou de outra estar ‘imbuídos’ desta ideologia para
desempenhar ‘conscienciosamente’ suas tarefas, seja a de
explorados (os operários), seja a de exploradores (capitalistas),
seja a de auxiliares na exploração (os quadros), seja a de grandes
sacerdotes da ideologia dominante (seus ‘funcionários’), etc...
(ALTHUSSER, 1985,pp.58-59).

A escola assume a função de co-repetidora da ideologia dominante,


tornando-se um Aparelho Ideológico do Estado. E por Aparelho Ideológico
do Estado (AIE) Althusser (1985, p.68) diz que o mesmo consiste em “certo
número de realidades que se apresentam ao observador imediato sob a
forma de instituições distintas e especializadas”. Dentre elas, podem-se citar
os Aparelhos Ideológicos do Estado religiosos, escolar, familiar que além
de ser AIE também “intervém na reprodução da força de trabalho. Ela é,
dependendo dos modos de produção, unidade de produção e (ou) unidade de
consumo (ALTHUSSER, 1985, p.68)”; jurídico (Direito) que tanto se constitui
em AIE, quanto Aparelho Repressivo do Estado; político (no que se refere às
relações de poder no grupo); sindical; de informação e cultural.

Althusser, também faz uma distinção entre Aparelhos Ideológicos e


Repressivos do Estado, colocando os Ideológicos como as Instituições que
nortearão as relações nos grupos sociais (Família, Igrejas, Escolas,...) aos
quais cada instituição está atrelada. E os Aparelhos repressivos, correspondem
aos instrumentos mantenedores da segurança, através da força.

21
Reflexões sobre Sociologia Aplicada à Educação

Dentre os Aparelhos Ideológicos, o que é mais importante na visão


de Althusser, conforme citado anteriormente, é a Escola, pois, este a
considera como espaço de reprodução das ideologias dominantes, que
ajudam a manter relações de exploradores e explorados. Embora, também
tenha nos grupos sociais (Escola), nos quais a Educação se manifesta,
docentes que contribuem para o desenvolvimento de uma consciência
crítica, reflexiva acerca da ordem estabelecida. Todavia, Althusser (1985)
diz que esses docentes são poucos, e exceções a regra pré-estabelecida. E,
por ideologia, Althusser (1985, p.85) diz que esta “é uma ‘representação’ da
relação imaginária dos indivíduos com suas condições reais de existência”,
ou seja, conforme as crenças que foram internalizadas por cada indivíduo
ao longo de sua existência, ele as tomara como verdadeiras e legítimas, e
irá segui-las sem nenhum questionamento.

Como diz Althusser (1985, p.91)


Em todos os casos, a ideologia da ideologia reconhece, apesar de
sua deformação imaginária, que as ‘ideias’ de um sujeito humano
existem em seus atos, ou devem existir em seus atos, e se isto
não ocorre, ela lhe confere ideias correspondentes aos atos
(mesmo perversos) que ele realiza. Esta ideologia fala de atos:
nós falaremos de atos inscritos em práticas. E observaremos que
estas práticas são reguladas por rituais nos quais estas práticas
se inscrevem, no seio da existência material de um aparelho
ideológico, mesmo que numa pequena igreja, um enterro, um
pequeno jogo num clube esportivo, um dia de aulas numa escola,
uma reunião ou um encontro de um partido político, etc.

Dessa maneira, a Escola, a Igreja, o Judiciário ao disseminar as


regras que deverão ser seguidas, não apenas nesta, mas nos diversos
grupos aos quais os sujeitos pertencem, utilizam práticas, rituais, os
próprios aparelhos ideológicos (Instituição Educação, Religião, Direito,...)
para fazer com que a ideologia seja internalizada, sem questionamento e
reproduzida, conforme citado anteriormente.

E Althusser (1985, p.107) finaliza sua reflexão acerca dos Aparelhos


Ideológicos do Estado, dizendo que as ideologias “não nascem dos AIE,
mas das classes sociais em luta; de suas condições de existência, de suas
práticas, de suas experiências de luta, etc”.

22
FUESPI/ NEAD Pedagogia

Pode-se observar que a ideologia faz parte de um duplo movimento,


em que em primeiro lugar, o grupo absorve as leis, regras contidas na ideologia
repassada aos sujeitos sociais; e que, em um segundo momento, conforme
o interesse da classe dominante e ou dominada, será modificada, sendo
redimensionada, dando lugar à outra ideologia, que será visualizada através
das práticas, dos rituais, das condições de existência de cada grupo social,
seja este uma “pequena igreja, uma escola,...” conforme as necessidades e
interesses dos grupos em questão (ALTHUSSER, 1985, p.91).

REFERÊNCIAS DESTA SEÇÃO

• ALTHUSSER, Louis. Aparelhos Ideológicos de Estado: notas


sobre os Aparelhos Ideológicos de Estado. 2ªed. Rio de Janeiro:
Edições Graal, 1985.

LEITURAS SUGERIDAS

• CASTRO, Celso. Sociologia Geral. São Paulo: Atlas, 2000.

• GUARESCHI, Pedrinho. Sociologia Crítica. Alternativas de


mudança. 43ª ed (revisada e ampliada). Porto Alegre: Mundo Jovem,
1998.

MOMENTOS DE REFLEXÃO DA APRENDIZAGEM

01- Conforme Louis Althusser, o que significa Aparelhos Ideológicos do


Estado?

02- Qual a diferença apontada por Althusser entre Aparelhos Ideológicos


e Repressivos do Estado?

03- Como Althusser concebe a Escola? Qual a função do Aparelho


Ideológico da Escola?

23
Reflexões sobre Sociologia Aplicada à Educação

04- Faça um texto correlacionando os pensamentos de Marx e Althusser,


utilizando neste as leituras sugeridas de ambos os tópicos.

1.2.2 Pierre Bourdieu A obra de Bourdieu tem sido vista como uma
das “mais estimulantes e inovadoras na área
das ciências sociais, influenciando numerosas
Bourdieu (2005, p.8), em pesquisas sociológicas, antropológicas e históricas
seu livro o Poder Simbólico, em todo o mundo. A novidade encontra-se na
escolha dos objectos de análise (sociedades tribais,
utiliza reflexões de Durkheim, sistemas de ensino, processos de reprodução,
critérios de classificação e lógicas de distinção),
dizendo que este lançou os na orientação do olhar (atento aos fenômenos de
“fundamentos de uma sociologia percepção social, da produção simbólica e das
relações informais de poder),na formulação de
das formas simbólicas”; em que noções operatórias (habitus, reprodução, poder
simbólico, capital, distinção, campo, etc.) e no
na visão de Durkheim as “formas constante recurso à sociologia do conhecimento
de classificação deixam de ser (onde a posição do investigador é questionada
como forma de controle do seu trabalho de
universais (...) para se tornarem produção de sentido). Compreender o percurso
científico de Bourdieu implica atender a pelo
formas sociais, quer dizer,
menos duas lógicas de leitura: por um lado, uma
arbitrárias (relativas a um grupo lógica da evolução da obra, por outro, uma lógica
da sua tipologia” (MEMÓRIA E SOCIEDADE- OS
em particular) e socialmente COORDENADORES. Nota de Apresentação IN:
determinadas.” E, continua sua BOURDIEU, Pierre. O Poder Simbólico. 8ª ed. Rio
de Janeiro: Bertrand Brasil, 2005, p.1)
reflexão dizendo que
os sistemas simbólicos, como instrumentos de conhecimento
e de comunicação, só podem exercer um poder estruturante
porque são estruturados. O poder simbólico é um poder de
construção da realidade que tende a estabelecer uma ordem
gnoseológica: o sentido imediato do mundo (e, em particular,
do mundo social) supõe aquilo a que Durkheim chama o
conformismo lógico, quer dizer, ‘uma concepção homogênea do
tempo, do espaço, do número, da causa, que torna possível a
concordância entre as inteligências. (...) A integração ‘lógica’ é a
condição da integração ‘moral’ (BOURDIEU, 2005, p.10)

Enquanto “instrumentos de conhecimento e de comunicação” os


“sistemas simbólicos” possuem a “função política de instrumentos de
imposição ou de legitimação da dominação, que contribui para assegurar
a dominação de uma classe sobre outra (violência simbólica)”, conforme
Bourdieu (2005, p.11).

Bourdieu (2005, p.46) acredita que um dos obstáculos, por exemplo,


para se obter uma sociologia reflexiva, consiste na revisitação do universo

24
FUESPI/ NEAD Pedagogia

clássico, não para seguir em frente e construir algo novo, mas apenas no
intuito de reproduzir e reafirmar saberes, e, nesse momento, ele faz uma
crítica a pedagogia utilizada por alguns docentes, dizendo:
Entre os obstáculos os quais deve contar uma verdadeira
pedagogia da pesquisa, há, antes de mais, a pedagogia corrente
dos professores vulgares, a qual reforça as atitudes conformistas
inscritas na própria lógica da reprodução escolar e também,
como já disse, na impossibilidade de ‘ir às próprias coisas’ sem
qualquer instrumento de percepção (...)

O que Bourdieu chama atenção acima é que, a Escola, a


Universidade, em Homo academicus consiste em um espaço de reprodução
ou de construção de saberes, contudo, no docente, no professor, consistirá
na sua atuação ser instrumento de transformação ou de reafirmação das
“violências simbólicas” supracitadas, principalmente, pelo conteúdo de
observação à distância dos fatos do mundo social. Logo, para Bourdieu é
necessário que se construa as pontes entre o universo teórico e a prática
para que as transformações aconteçam.
Bourdieu (2005,p.61), nos seus estudos, utilizou uma categoria
denominada habitus, e, justificando o conceito que atribuiu a esta categoria,
ele se posiciona explicando que esta é oriunda da

noção aristotélica de hexis, convertida pela escolástica em


habitus, eu (Bourdieu) desejava reagir contra o estruturalismo e
a sua estranha filosofia da acção que (...) se exprimia com toda
a clareza entre os althusserianos, com o seu agente reduzido
ao papel de suporte – Trager– da estrutura. (...) Eu (Bourdieu)
desejava pôr em evidência as capacidades ‘criadoras’, activas,
inventivas, do habitus e do agente (que a palavra hábito não
diz), embora chamando a atenção para a ideia de que este
poder gerador não é o de um espírito universal, de uma natureza
ou de uma razão humana (...) o habitus, como indica a palavra,
é um conhecimento adquirido e também um haver, um capital
(de um sujeito transcedental na tradição idealista) o habitus, a
hexis, indica a disposição incorporada, quase postural -, mas
sim o de um agente em acção (...) retomando ao idealismo,
como Marx sugeria nas Teses sobre Feuerbach, o ‘lado activo’
do conhecimento prático que a tradição materialista, sobretudo
com a teoria do ‘reflexo’, tinha abandonado.

25
Reflexões sobre Sociologia Aplicada à Educação

Pode-se observar a influência do pensamento de Marx na construção


do pensamento de Bourdieu (2005, p.62), posto que, ao utilizar a categoria
habitusBourdieu desejou sair da “filosofia da consciência sem anular o
agente na sua verdade de operador prático de construções de objecto”; ou
seja, a consciência de que o ser humano é um sujeito social ativo, dentro do
processo de construção da história. O humano detém um conhecimento e
não apenas o guarda, mas o aplica nas suas dimensões práticas. Como por
exemplo, todo o arcabouço teórico que cada um de vocês, leitores, possuem
acerca da Sociologia da Educação I, retornam na Sociologia da Educação
II, sendo ampliados, mas não para ficarem guardados, armazenados na
memória, e, sim, para conforme a sua vivência cotidiana ou profissional,
os mesmos possam ir sendo revisitados, utilizados e aplicados segundo
o momento, o tempo, o contexto, contribuindo ora para reafirmações de
valores, crenças, ora como agentes de transformação. Contudo, a utilização
e ação, quem determina é você, enquanto agente, enquanto sujeito social
ativo, e, incluímos crítico e reflexivo; pois como diz Bourdieu (2005, p.63)

a capacidade de reproduzir activamente os melhores produtos


dos pensadores do passado pondo a funcionar os instrumentos
de produção que eles deixaram é a condição do acesso a um
pensamento realmente produtivo.

REFERÊNCIA DESTA UNIDADE


• BOURDIEU, Pierre. O Poder Simbólico. 8ªed. Rio de Janeiro:
Bertrand Brasil, 2005

LEITURAS SUGERIDAS
• RODRIGUES, Alberto Tosi. Sociologia da Educação. 6ª ed. Rio de
Janeiro: Lamparina, 2007

• FERREIRA, Delson. Manual de Sociologia. Dos Clássicos à


Sociedade da Informação. 2ª ed. São Paulo: Atlas, 2003

26
FUESPI/ NEAD Pedagogia

MOMENTOS DE REFLEXÃO DA APRENDIZAGEM - ATIVIDADE


• A partir do que leu, discorra em duas (02) laudas acerca dos conceitos
sobre a Educação no olhar de Bourdieu. Você pode utilizar outras
fontes que complementem o que leu.

1.2.3 Edgar Morin

Para Edgar Morin (2000, p.19), no seu livro Os sete saberes


necessários à Educação do Futuro, a educação do futuro tem o desafio de
trabalhar com o reconhecimento do “erro e da ilusão” e prossegue dizendo
que “Marx e Engels enunciaram justamente em A Ideologia Alemã que
os homens sempre elaboraram falsas concepções de si próprios, do que
fazem, do que devem fazer do mundo onde vivem.”

Morin (2000) acima quer ilustrar o fato de que o conhecimento é


um construto humano, mediado pelas lentes da cultura do grupo ao qual
cada pessoa pertence, ou seja, o nosso olhar é enquadrado em crenças,
valores, normas, enfim, cultura não-material.

Assim, ao olharmos o outro, observamos neste não o que ele,


realmente, é, mas o que gostaríamos que fosse, como gostaríamos
que fosse, o que será, a posteriori, fruto de equívocos. E, um deles, no
universo da Educação, é acreditarmos que os títulos fazem-nos maiores
intelectualmente, quando, na verdade, escolhemos na pós-graduação uma
linha, e nesta, delimitamos um tema, para estudarmos. Logo, mesmo que
estudemos o que nos propusemos, jamais contemplaremos o tema na sua
totalidade, posto que cada “experiência de olhar é um limite” conforme Paulo
César Lopes, no documentário brasileiro Janela da Alma de João Jardim
e Walter Carvalho. Então, não tem porque a arrogância quanto ao saber,
pois, deve-se ser humilde quanto ao conhecimento pela consciência que se
tem de que o conhecimento é infinito, o que fará com que outro pesquisador
estudando o mesmo tema, descubra coisas novas. Na fala de Morin (2000,
p.20), tem-se o exemplo do que fora supracitado, em que para ele

27
Reflexões sobre Sociologia Aplicada à Educação

o conhecimento não é um espelho das coisas ou do mundo


externo. Todas as percepções são, ao mesmo tempo, traduções
e reconstruções cerebrais com base em estímulos ou sinais
captados e decodificados pelos sentidos. Daí resultam, sabemos
bem, os inúmeros erros de percepção (...) Ao erro de percepção
acrescenta-se o erro intelectual. (...) Este conhecimento, ao
mesmo tempo tradução e reconstrução, comporta a interpretação,
o que introduz o risco do erro na subjetividade do conhecedor, de
sua visão de mundo e de seus princípios de conhecimento. Daí
os numerosos erros de concepção e de ideias que sobrevêm a
despeito de nossos medos e as perturbações mentais trazidas
por nossas emoções multiplicam os riscos de erro.

Para trabalhar o erro e as ilusões, Morin (2000, p.21) tenta


identificá-los, narrando a sua origem, desde os erros mentais; passando
aos intelectuais e aos erros da razão. E, em cada uma dessas categorias
construídas para compreender que não há verdades absolutas, Morin (2000,
p.24) diz que existe uma necessidade quando se pensa na Educação do
futuro da consciência de que existe um “princípio de incerteza racional”,
pois, para ele
a racionalidade corre risco constante, caso não mantenha
vigilante autocrítica quanto a cair na ilusão racionalizadora. Isso
significa que a verdadeira racionalidade não é apenas teórica,
apenas crítica, mas também autocrítica.

Resgatando através das citações acima, o princípio de incerteza, de


que o conhecimento é infindo, conforme dito anteriormente, e que a nossa
postura, frente a este reforçará erros e ilusões ou irá dissipá-los.

Assim, Morin (2000, p.29) diz que: “uma ideia ou teoria não deveria
ser simplesmente instrumentalizada, nem impor seu veredicto de modo
autoritário; deveria ser relativizada e domesticada (grifo do autor)”.

Morin (2000) também aponta que a educação do futuro deve explicitar


e esclarecer alguns pontos como a importância da contextualização, ou seja,
cada categoria traz no seu bojo uma infinidade de significados, conforme os
grupos nos quais esta esteja inserida e venha a ser utilizada. Mencionando
por isto que é sempre bom contextualizar a fala, observando os conceitos
que serão dados às categorias, neste e /ou em outro contexto. Outro ponto

28
FUESPI/ NEAD Pedagogia

relevante é a dimensão do global, ou seja, observar que se fala a partir


de um lugar (texto/ contexto), contudo, esse lugar está atrelado a vários
outros lugares e que para entendê-los, deve-se conhecer o todo e suas
respectivas partes ou vice-versa. Trabalha-se, neste sentido, com a ideia
de interdisciplinaridade ou transdiciplinaridade. No campo educacional,
tudo está inter-relacionado, observando o caráter multidimensional do ser.

Dentre os pontos importantes abordados por Morin (2000) acerca


do contexto, do global, do multidimensional, já que o ser humano é político,
econômico, social, cultural, religioso, psíquico, enfim, uma multiplicidade
de facetas em um; Morin (2000,p.38) também menciona para a educação
do futuro a necessidade de se entender o complexo que para ele “é a união
entre a unidade e a multiplicidade”.

Exemplificando tem-se na sala de aula, uma multiplicidade cultural


em cada sujeito participante, incluso o (a) próprio (a) docente. Então,
trabalhar uma única abordagem avaliativa, ou até mesmo, uma única forma
de exposição do conteúdo, sem inter-relacioná-lo aos demais conteúdos
visto, construir uma costura na teia que se está tecendo do conhecimento
partilhado em sala, tanto no universo teórico, quanto o vivido de cada um
dos sujeitos participantes, seria uma fragmentação do conhecimento. Ao
passo que se o conteúdo for partilhado dentro de ligações com os demais
que estão sendo vistos no momento e também com as vivências dos
sujeitos participantes, bem como se as formas de avaliação e exposição
deste for diversificada buscando atender a multiplicidade existente na sala
o conhecimento torna-se útil, posto que o sujeito participante estará vendo
sua aplicabilidade tanto na sala quanto para a sua vida, a partir das conexões
feitas, abordando, então as dimensões de Morin (2000) supracitadas como
a global, o contexto (local), a multidimensional e a complexa.

Morin (2000,p.39) também diz que a educação deve estimular


a “inteligência geral” valorizando o indivíduo na sua totalidade. Assim, a
educação do futuro deverá centrar-se na “condição humana” e, ao mesmo
tempo na pluralidade que o humano é. Como afirma Morin (2000, p.48)

29
Reflexões sobre Sociologia Aplicada à Educação

“devemos reconhecer nosso duplo enraizamento no cosmos físico e na


esfera viva e, ao mesmo tempo, nosso desenraizamento propriamente
humano. Estamos simultaneamente dentro e fora da natureza”.

E, nesse contexto, Morin (2000) menciona que o humano na sua


totalidade possui dimensões: cósmica, terrestre e humana. Partindo do
geral para o específico que é o humano.

Fazendo aqui uma reflexão sobre o pensamento de Morin (2000) e


ampliando-o tem-se que o ser humano constitui-se em humano, a partir do
encontro com outro ser humano. É através do processo de socialização,
que consiste em tornar o ser vivo, um membro de um dado grupo social,
um sujeito social via processo de ensino e aprendizagem, que o ser vivo vai
aprendendo a cultura do grupo, constituindo-se em humano.

Porém, não é apenas a racionalidade que nos torna seres humanos,


somos humanos pela nossa capacidade de escolha. Somos livres, e, tem-
se aqui a liberdade como a consciência plena de que a cada escolha feita,
virão consequências e que ciente destas, toma-se a decisão de fazer algo
ou não. Não há, assim, liberdade sem consciência, pois, como se toma
decisões sem o devido esclarecimento, para que a autonomia do sujeito,
indivíduo possa ser exercida? Logo, uma das principais características do
humano é a capacidade de aprendizagem, de consciência acerca de si, do
mundo, do outro e nesta, a consciência de sua liberdade, de suas escolhas.

Alguém pode até estar se perguntando, mas, se faço parte de um


grupo, e, neste grupo têm-se regras, normas, e, através do processo de
socialização, torno-me membro desse grupo, como vou questioná-lo?
Como vou poder tomar escolhas opostas às decisões do grupo? Assim,
como sou livre para tomar as minhas decisões?

Bem, você é livre sim, porém, a partir do momento em que você


pertence a um grupo, e foi socializado neste, as regras, normas do grupo
que foram repassadas a você, pelo processo ensino e aprendizagem
aparecem como “a verdade”, ou seja, é a cultura do grupo que você faz

30
FUESPI/ NEAD Pedagogia

parte que fará de você o humano que é. E, ninguém jamais questionará


o semelhante. Então, para que haja um questionamento é necessário que
você entre em contato com outro grupo distinto do seu, e, nesse contato,
desenvolva a alteridade, que significa o encontro com o diferente e tudo o
que emerge nesse encontro (medo, raiva, fascinação, entusiasmo,..). Dessa
maneira, ao chegar nesse grupo você precisará obedecer às regras desse
grupo, mas como possui outro parâmetro que possibilita a comparação e o
questionamento, então, ao conhecer o grupo e sua cultura, fará a escolha
de permanecer neste ou não.

Veja bem, ninguém questiona o igual, é o diferente que chama o


grupo a uma reflexão sobre suas práticas. E, a liberdade é exercida, uma
vez que ao conhecer e tomar consciência acerca da cultura do grupo,
quando comparada a sua, vem o desejo ou não em permanecer ou sair,
porque, ao se chegar em um grupo que não o seu, jamais será o grupo
que terá que se modificar para ajustar-se aos seus costumes; pois, é você
quem chega, logo, é você que deverá enquadrar-se ou não.

Bem, ao aceitar o grupo, o que acontece? Como você já possui uma


cultura irá passar por uma aculturação, que significa a aprendizagem de
elementos de outra cultura que não a sua forçadamente ou voluntariamente.
E, nesse caso, surge o que na antropologia é chamado de hibridização
cultural, emergindo uma terceira cultura com elementos das duas anteriores.

Logo, tornar-se humano pressupõe, necessariamente, o encontro


com outro humano, fazendo deste uma pessoa, que é um ser humano
pleno (cultural, social, político, religioso, econômico,...; um sujeito social,
que significa a pertença a um dado grupo social, tornar-se membro do
grupo e também um indivíduo que consiste no reconhecimento que todo
sujeito social possui uma subjetividade que faz com que haja a construção
de uma individualidade, que caracterizará cada pessoa. Esta subjetividade,
significa possuir vivências e experiências, e através dessas ir construindo
uma maneira particular, singular de olhar o mundo, compreender o mundo,
utilizando não apenas os óculos da sua cultura, mas, principalmente, uma

31
Reflexões sobre Sociologia Aplicada à Educação

forma de ressignificar esta cultura, de ampliá-la, modificando alguns valores


e reafirmando outros, nos múltiplos encontros com seres humanos iguais e
ou diferentes de si.

Assim, voltando a Morin (2000) sintetizamos a reflexão supracitada


dizendo que pertencemos, enquanto seres humanos tanto a esfera individual,
com nossas subjetividades, quanto a esfera social, que perpassa por tudo
o que temos que aprender para nos tornarmos membros de um dado grupo
social, para desenvolvermos um sentimento de pertença ao grupo, cientes
de que somos plurais, em decorrência da multiplicidade cultural existente;
o que torna cada um de nós, seres humanos ao mesmo tempo “singulares
e múltiplos, cada vez mais conscientes de nosso enraizamento como
cidadãos da Terra...”(MORIN, 2000, pp.57;61). Assim, Morin (2000, p.64)
diz que
o planeta exige um pensamento policêntrico capaz de apontar
o universalismo, não abstrato, mas consciente da unidade/
diversidade da condição humana; um pensamento policêntrico
nutrido das culturas do mundo. Educar para este pensamento é
a finalidade da educação do futuro.

E, para que a educação comece a ter este perfil de inclusiva, plural,


planetária, humana, é necessário que haja, na visão de Morin (2000, p. 76)
várias consciências como:
a consciência antropológica, que reconhece a unidade na
diversidade; a consciência ecológica, isto é, a consciência
ecológica (...) (valorizando) a convivibilidade sobre a Terra;
a consciência cívica terrena, isto é, da responsabilidade e da
solidariedade para com os filhos da Terra; a consciência espiritual
da condição humana que decorre do exercício complexo do
pensamento e que nos permite, ao mesmo tempo, criticar-nos
mutuamente e autocriticar-nos e compreender-nos mutuamente.

Portanto, Morin (2000) concebe a educação como um instrumento


de grande importância na mudança de olhar acerca de si, do outro, do
mundo, ampliando a ideia de que a educação não perpassa apenas pela
instrução, enquanto, a valorização do saber técnico-científico, mas abrange
também a formação de cidadãos da Terra, conforme visto anteriormente.

32
FUESPI/ NEAD Pedagogia

REFERÊNCIAS DESTA UNIDADE

• MORIN, Edgar. Os sete saberes necessários à Educação do


Futuro. São Paulo: Cortez; Brasília, DF: UNESCO, 2000

LEITURAS SUGERIDAS

• LUSTOSA, Georgina Quaresma. O Educador Biocêntrico. Quem é


este sujeito? Teresina-PI: Georgina Quaresma Lustosa, 2007

• WIEL, Pierre. A arte de viver em paz: por uma nova consciência,


por uma nova educação. São Paulo: Editora Gente, 1993

MOMENTO DE REFLEXÃO DA APRENDIZAGEM - ATIVIDADE

• A partir do que leu, discorra em no mínimo duas (02) e no máximo


quatro (04) laudas acerca dos saberes necessários à Educação do
Futuro, conforme o olhar de Edgar Morin. E, como hoje, século XXI,
podemos vislumbrar alguns dos aspectos dessa Educação citada
no texto acima, sendo colocadas em prática nas Escolas, nas
Universidades? Pode-se visualizar a aplicabilidade do pensamento
de Morin ou não? Pode utilizar outras fontes na produção do seu
texto, que complementem o que leu.

33
UNIDADE II
A influência dos teóricos crítico-
reprodutivistas na pedagogia no
Brasil: um resgate histórico

OBJETIVOS
• Conceituar a teoria crítico- reprodutivista;
• Contextualizar historicamente a teoria crítico-
reprodutivista;
• Verificar a influência da teoria crítica no pensamento
de Gadotti, Freire e Guimarães sobre Educação e
Pedagogia;
• Conceituar violência simbólica, código disciplinar,
cultura arbitrária e força simbólica;
• Conceituar habitus e verificar sua relação com o
trabalho pedagógico;
• Identificar e exemplificar as duas vertentes das
teorias da educação na visão de Saviani.
FUESPI/ NEAD Pedagogia

Veio-me a imagem daquela flor do campo,


Uma bola de sementes brancas,
As sementes saem voando como se fosse paraquedas – para ir nascer lá longe,
Onde o vento as levou...
Assim é o educador – uma bola de sementes –
Palavras onde se encontra o sonho que ele deseja plantar
(Rubem Alves).

No capítulo anterior, fizemos um resgate dos pensamentos de


Durkheim, Marx, e ampliamos os olhares com Althusser, Bourdieu e Morin.
Neste capítulo, faremos um passeio pela História da Educação através
do olhar de Maria Lúcia de Arruda Arranha (1989) que nos conduzirá a
uma visão filosófica e sociológica da influência dos teóricos críticos-
reprodutivistas nos pedagogos brasileiros. Porém, para chegarmos a estes,
vamos primeiro percorrer um pouco da História da Educação. E, quanto ao
ano da edição que utilizo, o livro pode ser encontrado em edições mais
recentes, chegando até 2011 ou 2012, mas o conteúdo histórico narrado
por Aranha (1989) não sofreu alteração, logo, mantivemos o resgate através
da obra editada em 1989 que foi a sua 1ª edição.

2.1 Teóricos Crítico –reprodutivistas: um resgate histórico

Assim, segundo Maria Lúcia de Arruda Aranha (1989, p. 215) acerca


da Pedagogia no século XX, aponta a influência positivista, idealista,
pragmática, contida na teoria reprodutivista mencionando que
as ideias positivistas se desenvolvem no século XIX, com
Auguste Comte. No século XX, devido a alterações na concepção
de ciência, a velha escola segue novos rumos por meio do
neo-positivismo (...) Alguns de seus representantes são Frege,
Bertrand Russell, Whitehead (também pedagogo), Carnap e
Schilck. O positivismo clássico sofre também a influência das
ideias evolucionistas (...), como a psicologia behaviorista e a
sociologia de Durkheim.

Decorre do positivismo o “mito do especialista”, em que quem


detivesse o saber deteria o poder. Bem, como começa a valorização do
saber técnico, que irá criar o “mito da tecnocracia”, ou seja, o mito no poder
da técnica, do saber técnico; e, por fim, tem-se o “mito do progresso”, que

37
Reflexões sobre Sociologia Aplicada à Educação

constrói no imaginário do grupo a ideia de que se deve valorizar o novo,


o moderno, o que irá prejudicar a valorização da memória, dos acervos,
do antigo; pois, em nome do progresso o ser humano vai interferindo de
maneira prejudicial no meio ambiente, praticando a destruição deste, e,
consequentemente, iludindo-se acerca do moderno, que nada mais é do
que o que não conheci, ou conheço ainda, posto que após o conhecimento
não é mais novo, não é mais moderno... (ARANHA, 1989, p.216).

Surge então, em meados do século XX, o idealismo, fruto “da


reelaboração do pensamento de Hegel e Kant, para se contrapor ao
positivismo e ao materialismo. Conforme Aranha (1989, p.216), os
seguidores do idealismo acreditavam que “o espírito é diferente da matéria
e irredutível a ela. Ele é criador, pois o conhecimento não pode ser a simples
aceitação passiva de impressões”. Por isso, os representantes dessa
linha de pensamento como Gentile (1875-1944), na Itália, desenvolveu
“a sensibilidade por meio do ensino da religião e da arte”. Seu projeto,
contudo, foi para as “classes dirigentes”.

O pragmatismo surge, por sua vez, para se opor ao idealismo,


“reagindo contra o conhecimento contemplativo, puramente teórico. É anti-
intelectualista e, nesse sentido, privilegia a prática e a experiência.” E, teve
em “William James (1842-1910) o seu principal representante”. Também
possuiu como representante na filosofia “Charles Pierce, em 1878. E um
representante do pragmatismo que contribuiu com a Pedagogia foi Dewey”
(ARANHA, 1989, p.217).

O Marxismo teve como representantes Karl Marx e Friedrich Engels


no século XX, a partir da Revolução Russa de 1917. Nesta Revolução
Lênin (1870-1924) e Leon Trótski (1879-1940) defendem uma “revolução
permanente” e criam o marxismo-leninismo (ARANHA, 1989, p.218).

Além de Marx, Engels , Lênin, Trótski, um representante do marxismo


que contribuiu com a pedagogia, foi Antonio Gramsci (1891-1937) conforme
Aranha (1989,p.219).

38
FUESPI/ NEAD Pedagogia

Aranha (1989), no seu passeio pela História da Educação no século


XX, também menciona a Escola de Frankfurt, que surge na Alemanha
em 1923 tendo como representantes: Theodor Adorno, Max Horkheimer,
Herbert Marcuse, Walter Benjamin, Erich Fromm e Jürgen Habermas. Todos
esses autores irão ser estudados com maior profundidade nos cursos de
Comunicação Social, e, embora tenha seguido o marxismo constrói um
olhar ampliado sobre a realidade, em especial a “indústria cultural”.

Conforme Aranha (1989, p.219)


a Escola de Frankfurt é responsável pela formulação da
chamada ‘teoria crítica da sociedade’, cujos principais temas de
natureza sociológico- filosófica são a autoridade, o autoritarismo,
o totalitarismo, a família, a cultura de massa, o papel da
ciência e da técnica, a liberdade. Como se vê, estes temas tão
candentes interessam diretamente à reflexão pedagógica e
muito contribuem para a discussão do papel da educação na
sociedade contemporânea.

Também foram citados os


“Roger Establet e Christian Baudelot, também
representantes das teorias crítico- franceses, escreveram em 1971 o livro A escola
capitalista na França, onde criticam o fato de
reprodutivistas, como Althusser, a ‘escola única’ ser, na verdade, uma ‘escola
visto no capítulo anterior, e os dualista’. Há para eles, duas grandes redes
de escolaridade chamadas SS (Secundária
“sociólogos franceses Baudelot e Superior) e PP (Primária profissional),
correspondentes à divisão da sociedade em
Establet, cujo marxismo seguiu a burguesia e proletariado. Assim, os burgueses
linha de Mao Tsetung” conforme têm acesso a uma escolarização completa,
incluindo a formação superior, e o proletariado
Aranha (1989, p. 219). Contudo, é encaminhado para a profissionalização
Althusser aborda que a escola precoce. No entanto a principal critica desses
autores reside no fato de que a divisão das
funciona como aparelho ideológico duas redes é determinada deste o início da
escolarização” (ARRUDA, 1989, pp.232- 233).
de Estado, servindo para
reproduzir as ideologias vigentes,
ou seja, reafirmando a moral do grupo conforme o modo de produção,
seja contribuindo para modificar a realidade, segundo o gestor. E, no caso
de Baudelot e Establet a escola apenas reproduziria a moral vigente sem
possibilidades de mudanças, de transformações, posto que, tanto a SS,
quanto a PP já são pré-determinadas. Logo, como ninguém questiona o
igual, não há como alterar este processo via escola, já que a divisão de

39
Reflexões sobre Sociologia Aplicada à Educação

trabalho acontece deste o início da formação das crianças. Assim, percebe-


se uma rigidez e pessimismo quanto a modificações da ordem estabelecida
no pensamento dos dois últimos autores, enquanto, no de Althusser, ele
coloca que há dois lados na escola, tanto pode servir, conforme supracitado,
como instrumento de reafirmação como de mudança.

Depois, Aranha (1989) abordou a Fenomenologia e o Estruturalismo,


que não vamos abordar aqui, porque essas reflexões serão melhores
trabalhadas na disciplina História da Educação. Apenas optamos por
fazer um rápido resumo para podermos compreender melhor a influência
dos autores da teoria crítico-reprodutivista na Pedagogia no Brasil.

Quanto as Teorias crítico- reprodutivistas, conforme Aranha (1989),


tem-se que esta se referiu a “ilusão liberal” da escola nova, que acreditava
que a escola poderia oportunizar as pessoas melhores condições de vida;
porém, essa afirmação tratava-se de uma ideologia, no sentido negativo,
na visão de Karl Marx, uma vez que nem todos teriam acesso à escola,
e, mesmo que tivesse, o ensino era diferenciado para os que detinham o
controle dos meios de produção e para os que não detinham. Assim, essa
proposta não se sustentava.

Contudo, Karl Marx também colocou a escola como instrumento


tanto de reprodução como de mudança. Porém, para Marx a mudança viria
no momento em que os educadores passassem por um treinamento, uma
capacitação, conforme visto no capítulo anterior, para que o olhar sobre a
realidade seja modificada.

Porém, se pensarmos na educação, hoje, 2012, vamos perceber


que a ideologia, começa a ser modificada através dos mecanismos que
foram feitos no campo educacional para que todos possam chegar ao
ensino superior, e, uma vez neste, que os indivíduos possam concluir o seu
curso, como é o caso dos programas governamentais voltados a Educação.
Todavia, também se faz necessária a modificação no Ensino Público Infantil,
Fundamental e Médio para que os alunos das redes públicas de ensino,
tenham condições igualitárias de cursarem o Ensino Superior.

40
FUESPI/ NEAD Pedagogia

Como Durkheim, Althusser, Marx, Bourdieu, tem a consciência de


que a escola pode ser um instrumento de transformação ou de reprodução.
Quando é elemento de transformação, proporciona questionamentos,
críticas, reflexões que podem culminar em mudanças objetivas na qualidade
de vida dos sujeitos participantes, conforme visto no Capítulo I e, quando
servem como instrumentos de reprodução da ordem estabelecida, apenas
irá servir como elemento de reafirmação da cultura vigente, de dominação.

Contudo, é bom lembrar como fora visto em Durkheim, que os


membros do grupo muitas vezes não sentem a dominação, acreditando
que a verdade colocada é A VERDADE, pois, ninguém questiona o igual.
É, exatamente, o diferente que provocará a reflexão no grupo. E, para
que haja esta reflexão é necessário que um membro do grupo encontre
membros de outros grupos que tenham posturas diferentes, que pensem
diferente, para que, a alteridade permita no
Pode ser considerada como
momento em que haja este encontro, possa- diferença, ou como o “encontro
se perceber que existem outras culturas, com o diferente e tudo o que pode
emergir deste encontro” (SANDRA
outras formas de pensar o mundo, outra JOVCHELOVICH)
moral que não apenas a deste, o que levará
a uma reflexão para reafirmar a ordem
existente ou para começar a questioná-la. Todavia, se após o encontro
com o diferente, após o questionamento da ordem estabelecida, o membro
questionador será convidado a sair do grupo ou, caso o grupo já pensasse
em modificar as regras para garantir que a coesão, a ordem fosse mantida,
então, o questionamento não aparecerá como um agravo, mas como algo
necessário, pois como diz Durkheim no seu livro As formas elementares
da vida religiosa, “não é da natureza do conceito mudar, se modifica é
porque havia a necessidade desta mudança”.

Além de Durkheim, Althusser também em suas reflexões sobre


Educação, que ele chama Escola, Althusser diz que esta, como aparelho
ideológico, tanto pode servir para reafirmar, reproduzindo a ordem
estabelecida como pode modificá-la, dependendo de quem estiver
conduzindo o processo educacional.

41
Reflexões sobre Sociologia Aplicada à Educação

Percebe-se que existe nos autores um duplo movimento de


continuidade e de mudança da ordem estabelecida via Escola, Educação,
conforme a necessidade dos grupos em questão. Afinal, toda mudança
está atrelada a necessidade, pois, sem esta não há porque mudar.

2.2 A influência dos teóricos crítico-reprodutivistas na


Pedagogia no Brasil

E no Brasil? Qual a interferência da teoria crítico-reprodutivista na


Pedagogia no Brasil? Bem, no Brasil, conforme Arruda (1989, pp. 266-267)
tem-se em Bárbara Freitag, utiliza Althusser e Gramsci para compreender a
educação no Brasil nas décadas de 60 e 70 (1964 a 1975). Além de Bárbara,
Maria de Lourdes DeiróNosella analisa a ideologia presente nos livros
didáticos e Luiz Antonio Cunha critica a escola liberal, no que se refere a escola
nova, refletindo sobre a política educacional. Outros autores brasileiros que
também sofreram influencia da teoria crítica- reprodutivista são Celso Rui
Beisiegel, Vanilda Pereira Paiva, Carlos Rodrigues Brandão, Paulo Freire,
Florestan Fernandes que lutou pela qualificação das escolas públicas, do
ensino público. Outros pedagogos e filósofos brasileiros voltados a educação
popular são Demerval Saviani, José Carlos Libâneo, Carlos Roberto Jamil
Cury, Guiomar Namo de Mello, Moacir Gadotti dentre outros.

Vamos aqui abordar os pensamentos, dentre os autores citados,


de Paulo Freire, Luiz Antonio Cunha, Moacir Gadotti, Sergio Guimarães,
Demerval Saviani, Nelson Pilettie Rubem Alves.

2.2.1- Uma conversa entre Moacir Gadotti, Paulo Freire e Sérgio


Guimarães sobre a Pedagogia: diálogo e conflito

Neste livro Pedagogia: diálogo e conflito, Paulo Freire, Sérgio e


Gadotti dialogaram sobre a Pedagogia e iniciaram o seu dialogo falando
das suas andanças na construção desse projeto de sentarem e partilhares
suas vivências acerca da Educação, da Pedagogia no Brasil. E, qual minha
surpresa quando li uma fala de Paulo Freire, ainda no exílio em Genebra,
pela impossibilidade de se fazer presente no 1º Seminário de Educação

42
FUESPI/ NEAD Pedagogia

Brasileira realizado por Gadotti, que havia gravado e enviado para ser
ouvida por todos no Seminário, em que Freire dentre outras coisas disse
É uma alegria enorme me servir da possibilidade que a tecnologia
me coloca à disposição, hoje, de gravar, de tão longe de vocês,
essa palavra que não pode ser outra senão uma palavra afetiva,
uma palavra de amor, uma palavra de carinho, uma palavra
de confiança, de esperança e de saudades também, saudade
imensa, grandona saudades do Brasil cheiroso, distante do qual
estamos há quatorze anos, mas, distante do qual nunca estivemos
também... (GADOTTI; FREIRE E GUIMARÃES, 1989, p.20)

Nesse diálogo, que inicia com as andanças de cada um, também


permite o consenso de que nas palestras, nos seminários, nas discussões
as perguntas mais comuns giravam em torno de duas questões na visão
de Gadotti :”Quem é que forma o educador? Quem é educador de quem?”
Ao que Freire complementa dizendo que essas questões também foram
postas por Karl Marx, nas Teses sobre Feuerbach (GADOTTI; FREIRE E
GUIMARÃES, 1989, pp.20- 21) E, concordando com Freire, Gadotti diz que
Exato. Ao mesmo tempo em que ocorria o 1º Seminário de
Educação Brasileira também se formava o Centro de Estudos de
Educação e Sociedade (CEDES), em torno da revista Educação
e Sociedade. Esta nasceu, inclusive, com esse propósito inicial
de discutir a formação do educador, e seu primeiro título foi sobre
esse propósito: ‘quem educa o educador?’ Entre outros, havia
um texto do Paulo e um texto meu em que eu colocava a ideia da
Pedagogia do Conflito justamente a partir dessa terceira tese
de Marx sobre Feuerbach que o Paulo estava lembrando. Ou
seja, a partir dessa referência básica em que o marxismo entra
como horizonte histórico de formação. Com esse referencial
teórico é que fui à luta para aprender a educação no Brasil, e
então é que começaram a surgir essas perguntas (GADOTTI;
FREIRE E GUIMARÃES, 1989, p. 21).

E, a partir dessas questões Gadotti, Freire e Guimarães dizem que a


questão central desse diálogo é saber “qual a resposta que os educadores
já tinham quando formularam suas perguntas? (...) Enfim, quais são as
respostas que os educadores brasileiros querem dar às suas próprias
perguntas?” (GADOTTI; FREIRE E GUIMARÃES, 1989, p. 24).

Para Freire e Gadotti, é importante que seja feito sempre um


trabalho pedagógico- político, pois, a educação que eles propõem é ampla

43
Reflexões sobre Sociologia Aplicada à Educação

em que não apenas pedagogos, mas todos os cidadão “(pais, alunos,


jornalistas, políticos,...), toda a sociedade brasileira “possa repensar a si
própria, reaprendendo o Brasil.” E, para Freire a “vitória política passa pelo
convencimento”(GADOTTI; FREIRE E GUIMARÃES, 1989, p. 28).

Neste livro Gadotti, Freire e Guimarães (1989, p.28) colocam que “o


convencer é caráter específico do pedagógico e o vencer seria o caráter
específico do político” E, nesse contexto eles exemplificam com o Luís
Inácio Lula da Silva.

E, ao exemplificarem com Luís Inácio Lula da Silva, em uma época


em que o país jamais imaginaria que um dia Lula da Silva se tornasse, por
duas vezes consecutivas, presidente do Brasil, a posteriori, Gadotti, Freire
e Guimarães (1989,p. 29) dizem que
É possível um ato pedagógico na luta entre antagônicos, pois
as pessoas podem vir a aprender mais e ensinar também, e
modificarem sua visão de mundo na luta entre os contrários.
Isso não caracteriza em absoluto um plano político onde não
houvesse o pedagógico, como se este implicasse apenas o
convívio amistoso, simpático entre figuras que na realidade não
se opõem. Dentro de uma sala de aula, por exemplo, muitas
vezes há uma ‘luta em classes’ que reflete posições de classe
diferentes, posições profundamente pedagógicas.

Para Sérgio, é importante que no universo tanto pedagógico quanto


político haja o conhecimento, para que haja não o convencimento pela
persuasão, mas o “convencer como a ação de, conhecendo juntos, vencer
com”(GADOTTI; FREIRE E GUIMARÃES, 1989, p. 32).

Para Guimarães, Freire e Gadotti (1989, p.61) dentre as questões


supracitadas os três pensadores ao discutirem o papel do educador hoje
(na época, final da década de 80- grifo nosso) eles iniciam essa reflexão
pelas dificuldades, na época, pelas quais passavam o professor, dentre elas,
“condições de trabalho, remuneração, salas superlotadas, interferência da
política partidária nas escolas, da autoridade, da liberdade, da disciplina,
da avaliação, da nota, da qualificação”.

Enfim, questões e problemas que são enfrentados até os dias atuais


(2012). Como exemplo, a greve nas redes públicas de ensino em Teresina,

44
FUESPI/ NEAD Pedagogia

no Piauí, tanto na rede municipal quanto na rede estadual de Ensino e que


se estende há mais de dois meses, e que, ainda dia 22 de abril de 2012,
não teve solução, mostrando o quanto atual são as reflexões.

A Educação revolucionária na visão de Freire(GADOTTI; FREIRE


E GUIMARÃES, 1989, pp.123-124) é uma
Educação que tem a ver coma palavra escrita e falada, que tem
a ver com o ouvir e com o falar. (...) Trata-se então de recriar,
de ajudar na reinvenção da sociedade. (...) A Pedagogia do
conflito é dialógica entre iguais e diferentes. (...) Na Pedagogia
do Oprimido o diálogo só se dá entre iguais e diferentes, nunca
entre antagônicos. No máximo pode haver um pacto, mas
passada a necessidade do pacto o conflito se reacende. É isso
que a dialética ensina.

E Gadotti (GADOTTI; FREIRE E GUIMARÃES, 1989, p.124) para


finalizar o diálogo, respondendo a Freire diz
Concordo inteiramente com a sua análise. Só gostaria de
acrescentar que a sua Pedagogia do Oprimido, publicada
há catorze anos e já traduzida em dezessete línguas, vem
exercendo, não só no Brasil mas em numerosos países, uma
profunda influência na teoria e na prática educativa. Hoje, a
partir dos caminhos que você abriu e está abrindo com estudo,
pesquisa e ação pedagógica, consolidou-se uma concepção
da educação, que tenho chamado de ‘concepção dialética’ e
que outros chamam de ‘concepção popular’, uma educação
comprometida com a libertação,...

Assim, o diálogo foi concluído, mostrando as influências de Marx,


bem como não foi escrito, mas Freire e Gadotti também sofreram influências
do pensamento de Gramsci, ressaltando que “se a classe trabalhadora não
teoriza a sua prática é porque a burguesia a impede de fazê-lo.” Contudo,
cabe ao “intelectual revolucionário, dialogar com o grupo para depois de
compreender a fala deste, poder ensinar, ou seja, primeiro aprende com o
grupo e depois, segundo as necessidades deste irá ensiná-los ((GADOTTI;
FREIRE E GUIMARÃES, 1989, p. 68). Resgatando o que fora dito no final do
diálogo acima, que é o diálogo, a partir da dimensão dialética da educação.

45
Reflexões sobre Sociologia Aplicada à Educação

2.2.2 Luiz Antônio Cunha e suas reflexões sobre a Violência


simbólica

Cunha (1979, p.79) em Notas para uma leitura da teoria da Violência


Simbólica, diz que “a publicação de A Reprodução em 1970, foi considerada
um marco fundamental na disciplina Sociologia da Educação”, embora o
livro de Durkheim Educação e Sociologia também tenha sido uma obra
relevante na disciplina em questão. Assim, nessas Notas, Cunha (1979) irá
expor os frutos de sua reflexão sobre a obra A Reprodução (Pierre Bourdieu
e Jean-Claude Passeron). Para isso, na primeira parte de sua obra aborda
a dimensão teórica e na segunda parte desta, menciona as críticas feitas a
esta, dentre outros autores, por Chistian Baudelot, Roger Establet, Georges
Snyders (CUNHA, 1979,pp. 79-80).

A obra A Reprodução escrita por Bourdieu e Passeron, foi dividida


em dois livros, contudo, Cunha (1979, p.80) redigiu Notas apenas acerca
do Livro 1
O livro 1 apresenta os ‘fundamentos de uma teoria da violência
simbólica’, tratando mais especialmente de uma ‘teoria dos
sistemas de ensino’. O livro 2, com o título ‘a manutenção da
ordem’, analisa o sistema de ensino concreto na França dos
anos 60.

Na Teoria da Violência Simbólica, são apresentados 83 proposições,


dessas, Cunha (1979, p. 80) aborda quatro grandes conjuntos de
proposições,” tratando (i) da dupla arbitrariedade da ação pedagógica, (ii)
da autoridade pedagógica, (iii) do trabalho pedagógico e (iv) do sistema de
ensino(...)”.

Cunha (1979, p.81) menciona que a teoria se refere à “formações


sociais” nas quais existem “relações de força entre classes sociais ou entre
grupos sociais”. Porém, Bourdieu e Passeron não chegam a conceituar
classe social, que em alguns momentos se aproxima do conceito de Karl
Marx e em outros momentos aproxima-se com a categoria de classe, tanto
“econômicas” quanto “sociais” na visão de Max Weber.

46
FUESPI/ NEAD Pedagogia

Segundo Cunha (1979, pp.81- 82)


Weber diz que toda dominação provém da força do dominador. ‘O
líder carismático ganha e mantém a autoridade exclusivamente
provando sua força na vida’. O profeta precisa ter suas profecias
realizadas e o senhor da guerra precisa realizar feitos heroicos.
Da mesma forma, as camadas privilegiadas precisam usar a força
para usufruírem os benefícios políticos, sociais e econômicos em
detrimento das camadas não privilegiadas (dominadas). Mas, os
heróis e as camadas privilegiadas aspiram não precisar usar a
todo o momento a força: pretendem transformar a dominação
em direito. Isso é conseguido ou, pelo menos, tentado, pela
imposição da disciplina. A disciplina é a execução exata da
ordem recebida, com a eliminação incondicional de toda crítica
pessoal, por um agente preparado exclusivamente para a
realização da ordem.

Assim, tem-se que a criação de um “código disciplinar, que fora


criado e imposto pelos dominadores podem fazer com que os dominados
desejem a dominação, pois, esta não será vista como uma imposição, mas
como parte da ordem “legítima”, o que fará com que a força não precise ser
utilizada (CUNHA, 1979,p.82).

Logo, conforme Bourdieu e Passeron (apud CUNHA, 1979, pp.82- 83)


todo poder de violência simbólica acrescenta sua força simbólica
às relações de força material que estão na base de sua força
simbólica. (...) (Estas) forças simbólicas estão atreladas também
as comunicações culturais como os programas dos meios de
comunicação de massa, a doutrina política, a pregação religiosa,
a educação escolar, a prática desportiva, (...).

Na citação acima, percebe-se que o grupo dominante que tem o


controle dos meios de produção, através da comunicação, enquanto
aparelho ideológico, pode fazer com que a força simbólica permeie os
grupos, de maneira sutil, ao ponto de o próprio grupo respeitar o “código
disciplinar” e a força simbólica seja exercida, sem que necessariamente
essa força, seja percebida enquanto “força”, mas sim, como a satisfação do
desejo coletivo.

Cunha (1979, p.84) aponta que para Bourdieu e Passeron “cada um dos
grupos sociais possui uma cultura, que eles denominaram de “cultura arbitrária”,

47
Reflexões sobre Sociologia Aplicada à Educação

posto que existe para satisfazer as necessidades dos membros de um dado


grupo, mas que também “resulta das condições de produção e reprodução”.

Por exemplo, existem culturas no plural, mas todas elas devem se


submeter a uma cultura que dominará, como por exemplo, no Brasil, cada
Estado, e, neste, cada cidade, e nesta cada bairro, rua, casa, enfim, possui
uma cultura. Contudo, residimos todos em território brasileiro, e, por isso,
deve-se obedecer à Constituição Brasileira que irá fornecer as diretrizes de
conduta, cultura não-material (valores) para todos os que habitam nesse
território. Comodiz Émile Durkheim, é necessário que a coesão do grupo
seja mantida apesar das diversidades por meio das leis.

Cunha (1979, p.85) aponta que “há dois tipos de força simbólica: a
ação pedagógica e a comunicação cultural”. E sobre a ação pedagógica,
Cunha (1979, pp.85-86) diz que consiste em uma autoridade pedagógica,
porque a ação consiste na “imposição de uma cultura (arbitrária) de um
grupo ou classes a outros grupos ou classes”, porém, essa imposição não
é vista como imposição, exceto quando for questionada, então o poder de
aplicar sanções é acionado. E, nesse momento, entram todos os demais
aparelhos ideológicos: comunicação, família, igreja, para reafirmar e
legitimar esta ordem estabelecida.

Porém, a ação pedagógica na visão de Bourdieu e Passeron, citada


por Cunha (1979, 87) jamais ocorre sem o apoio da comunicação, porém,
nem toda comunicação possui uma ação pedagógica. O que implica
dizer que na ação pedagógica tem-se conteúdos que podem transformar,
mas que também podem reafirmar a cultura vigente, através do que é
selecionado ou excluído para constar como conteúdo pedagógico, a partir
das ideologias vigentes.

Cunha (1979, p.88) aborda o fato de que no texto de Bourdieu e


Passeron, A Reprodução, o produto da ação pedagógica serão como os
fatos sociais, na visão durkheimiana, “os modos de pensar, sentir e agir
dos membros de um dado grupo social” E, que esse produto tem um valor,
tornando-se um “capital cultura”, um conceito de Bourdieu, que é

48
FUESPI/ NEAD Pedagogia

definido como o valor (econômico ou simbólico) assumido pelo


produto da primeira ação pedagógica (a familiar) no mercado
de bens econômicos ou simbólicos, numa formação social
determinada. Esse valor é maior ou menor conforme a ‘distância’
entre a cultura (arbitrária) imposta pela ação pedagógica
dominante e a inculcada pelas ações pedagógicas familiares
nos diversos grupos ou classes dessa formação social.

Dessa maneira, quem consegue através do processo de socialização


assimilar a cultura do grupo, o fará com tamanha propriedade que não verá
a cultura como algo exterior a ele, e sim a defenderá como parte dele, o que
no universo antropológico é denominado de naturalização da cultura, o que
produzirá, no olhar de Bourdieu um habitus.

O habitus é o resultado do trabalho pedagógico, que fará perdurar


a ação pedagógica proposta, ou seja, a “interiorização dos princípios de
uma cultura capaz de permanecerem interiorizados nos destinatários
da ação pedagógica após esta ter cessado” (CUNHA, 1979, p.91). Essa
interiorização fará com que haja uma continuidade com relação à cultura
do grupo em questão, contribuindo para a reafirmação e reprodução dos
valores aprendidos, valores estes que servem para diminuir ou enaltecer
grupos.

Cunha (1979), assim, apresentou a obra A Reprodução de Bourdieu


e Passeron. E, a partir desse momento, irá apresentar as críticas que alguns
autores como Baudelot, Establet fizeram a obra em questão.

Baudelot e Establet elaboraram a teoria da escola, colocando nesta,


a obra A Reprodução como pano de fundo, conforme Cunha (1979). Nessa
teoria, Baudelot e Establet dizem que “o ponto de partida implícito da teoria
da violência simbólica é o ensino universitário, particularmente o de Letras
(...)”(CUNHA, 1979,p.102).

Segundo Cunha (1979), o que Baudelot e Establet mostram é que


a escola funciona como co-repetidora do grupo dominante, fazendo com
que a escola possa silenciar a “cultura arbitrária”, que traz no seu bojo a
diversidade, para impor uma cultura una, padrão tomando como referencial

49
Reflexões sobre Sociologia Aplicada à Educação

a construção feita pelas classes dominantes, pois, deixar a diversidade se


manifestar é colocar a posição de controle em questão. E, o que eles, o
grupo dominante não queria era ser questionado.

Baudelot e Establet (apud CUNHA, 1979, p.104) veem a escola


como Marx e Althusser, ou seja, como Aparelhos Ideológicos de Estado.
Na visão de Baudelot e Establet a escola irá preparar dois grupos, um que
será voltado aos trabalhos manuais e outro aos trabalhos intelectuais. A
escola permite “constatar que a sociedade é desigual e a escola reproduz,
consagra e legitima estas desigualdades. Mas, esconde o essencial:
que a exploração, a opressão e a dominação de classes engendram,
necessariamente, a luta de classes.”

Assim, conforme Cunha (1979,p.105), no olhar de Baudelot e Establet


a escola favorece os já favorecidos ; exclui, repele, desvaloriza
os outros; é aos herdeiros de situação privilegiados que cabe por
sorte a herança escolar; os sucessos escolares, a possibilidade
de uma escolaridade prolongada, o acesso à Universidade,
portanto aos postos dirigentes, aos quais sob forma direta ou
implícita são atribuídas as quais elevadas classificações, que
vão em massa para aqueles cuja família já está instalada em
posição dominante.

Tanto para Baudelot, quanto Establet, bem como para Bourdieu e


Passeron, a escola funciona como aparelho ideológico, transmissora da cultura
dominante, em detrimento das demais. Contudo, Synders, diz que a escola
não é apenas instrumento de reprodução, mas também pode transformar,
ressaltando a abordagem mais crítica do que reprodutivista, contribuindo para
a reafirmação da violência simbólica ou modificação desta.

2.2.3 Reflexões de Dermeval Saviani sobre a Escola e a Democracia

Para Saviani (1988, p.15) existem duas vertentes no que se refere às


teorias da Educação; uma que compreende a “educação como instrumento
de equalização social, portanto de superação da marginalidade” e a outra
entende a Educação como “instrumento de discriminação social”, ou seja,
uma vertente tende a provocar mudanças no contexto social e a outra
busca reproduzir a ordem vigente.

50
FUESPI/ NEAD Pedagogia

Assim, Saviani (1988, p.17) compreende as teorias como críticas e


não-críticas, dizendo que
Tomando como critério de criticidade a percepção dos
condicionantes objetivos, denominarei (Saviani) as teorias
do primeiro grupo de ‘teorias não-críticas’ já que encaram a
educação como autônoma e buscam compreendê-la a partir
dela mesma. Inversamente, aquelas do segundo grupo são
críticas uma vez que se empenham em compreender a educação
remetendo-a sempre a seus condicionantes objetivos, isto é, aos
determinantes sociais, vale dizer, à estrutura sócio-econômica
que condiciona a forma de manifestação do fenômeno educativo.
Como, porém, entendem que a função básica da educação é a
reprodução da sociedade, serão por mim (Saviani) denominadas
de ‘teorias crítico-reprodutivistas’.

Dessa maneira, Saviani (1988, pp.18-19) concebe as teorias não-


críticas como parte da pedagogia tradicional, que objetivava a reprodução
da ordem vigente, enquanto a Pedagogia Nova, que possuía a crença “no
poder da escola e em sua função de equalização social.” E, nessa forma de
pedagogia o marginal, não é o que não possui conhecimento, mas o que
é rejeitado, pois, segundo Saviani (1988, p.19) alguém “se sente integrado
não quando é ilustrado, mas quando se sente aceito pelo grupo e, através
dele, pela sociedade em seu conjunto”.

Para Saviani (1988), ser “anormal”, ser diferente é um fenômeno


natural, posto que as semelhanças ou dimensão igualitária consistem
apenas no reconhecimento de direitos e deveres iguais, então, o marginal,
no olhar de Saviani é aquele que não se adaptou ou se ajustou a nenhum,
absolutamente, nenhum grupo dentro de uma dada sociedade. Assim, a
educação será, conforme Saviani (1988, p.20)
Um instrumento de correção da marginalidade na medida em que
contribuir para a constituição de uma sociedade cujos membros,
não importam as diferenças de quaisquer tipos, se aceitem
mutuamente e se respeitem na sua individualidade específica.

A fala de Saviani acima lembra o conceito de relativismo cultural,


no universo antropológico, em que, aprende-se que não existe uma única
cultura, mas culturas no plural, e que, mesmo que não as aceite, o respeito
incondicional deve ser praticado.

51
Reflexões sobre Sociologia Aplicada à Educação

Pode-se até perguntar qual a diferença entre respeito e aceitação?


Bem, a diferença consiste no fato de que quando aceito, eu concordo e
comungo com a cultura do grupo com o qual estou entrando em contato.
Não há violência cultural, nem perda de identidades, mas acolhidas, trocas.
E, quanto respeito, nem sempre aceito o diferente, mas entendo que
assim como eu, o outro também tem o direito de manifestar sua cultura. O
respeito pressupõe a tolerância, não como conviver com algo insuportável,
mas conhecendo a cultura diferente da minha, e compreendendo o sentido
e a importância das práticas vistas, aprende-se a se relacionar sem
julgamentos de valor, entendendo o outro como diferente, nem melhor e
nem pior, apenas diferente.

Assim, Saviani (1988, p. 21) dirá que a pedagogia nova, trata-


se de um outro olhar que consiste não no aprendizado em si, mas no
processo continuo que este aprendizado é, ou seja, “trata-se de uma teoria
pedagógica que considera que o importante não é aprender, mas aprender
a aprender”. Para isto, seria modificada a estrutura da escola, que centraria
a aprendizagem no processo dialógico em que o conhecimento seria
partilhado entre docente e discente, podendo tanto vir de um quanto de
outro. O “professor agiria como estimulador e orientador da aprendizagem,
cuja iniciativa principal caberia aos próprios alunos”; fazendo com que a
escola se tornasse “mais alegre, movimentada, barulhenta e multicolorida”.

Trazendo da década de 80 para 2012, tem-se que hoje, as escolas


abraçaram essa proposta da cor, do dar voz aos alunos, enfim, trabalhar ouvindo
a todos, sem depositar todo o conhecimento no professor, no docente, mas
fazendo com que este seja partilhado. Apesar de que, em alguns momentos,
essa teoria pedagógica seja mesclada a pedagogia tradicional, ressaltando
um duplo movimento de continuidade e mudança no processo ensino e
aprendizagem. E, alguns dos precursores da Pedagogia Nova, ampliando-a
para Pedagogia Nova Popular foram Freinet e Paulo Freire.

Saviani (1988, p.28) considera que além dessas teorias, têm-se as


teorias crítico-reprodutivistas, e, neste grupo, as teorias que as compõem

52
FUESPI/ NEAD Pedagogia

de maior impacto foram: “a) Teoria do sistema de ensino enquanto violência


simbólica; b) Teoria da escola enquanto aparelho ideológico do Estado e c)
Teoria da escola dualista”.

E, quanto à Teoria do sistema de ensino enquanto violência simbólica,


esta foi abordada através das notas escritas por Luiz Antônio Cunha, acerca
do livro A Reprodução de Pierre Bourdieu e J. C. Passeron, no item anterior.
O mesmo aconteceu com a Teoria da escola enquanto aparelho ideológico
do Estado que fora abordada no capítulo anterior através da abordagem
do pensamento de Louis Althusser. E, acerca da teoria da escola dualista
vimos a abordagem de Baudelot e Establet, através do olhar de Arruda
(1989). Então, não nos deteremos sobre essas teorias aqui, por já terem
sido apresentadas anteriormente. E, dessa maneira, vamos finalizar o
pensamento de Dermeval Saviani (1988) que apresenta as principais
características acerca das teorias da educação e, em especial da teoria
crítica- reprodutivista, e, vamos iniciar o próximo capítulo, o Capítulo III
intitulado Educação e as transformações no mundo contemporâneo.

REFERÊNCIAS DESTA UNIDADE

ARANHA, Maria Lúcia de Arruda. História da Educação. São Paulo:


Moderna, 1989

CUNHA, Luiz Antônio. Notas para uma leitura da Teoria da Violência


Simbólica In: Revista Educação e Sociedade – Cortez e Moraes / CEDES,
Ano I, nº 4, setembro de 1979,pp.79- 110

GADOTTI, Moacir; FREIRE, Paulo; GUIMARÃES, Sérgio. Pedagogia:


diálogo e conflito. São Paulo: Cortez- Autores Associados, 1985

JOVCHELOVITCH, Sandra. Re(des)cobrindo o outro: um encontro com


a alteridade In: ARRUDA. Representando a alteridade. Rio de Janeiro:
Vozes, 1998. p. 69-82.

SAVIANI, Demerval. Escola e Democracia. Teorias da Educação; Curvatura

53
Reflexões sobre Sociologia Aplicada à Educação

da vara e Onze teses sobre educação e política. 20ª ed. São Paulo: Cortez:
Autores e Associados, 1988

LEITURAS SUGERIDAS

FREIRE, Paulo. Pedagogia da indignação: cartas pedagógicas e outros


escritos. São Paulo, UNESP,2000
LIBÂNEO, José Carlos. Democratização da escola pública. A
pedagogia crítico social dos conteúdos. São Paulo. Loyola. 1989
SAVIANI, Demerval. Pedagogia histórico– crítica primeiras
aproximações. Polêmicas do nosso tempo. 7ª ed. Campinas- SP: Autores
Associados, 2000

MOMENTO DE REFLEXÃO DA APRENDIZAGEM

01- Discorra sobre a teoria crítico- reprodutivista conforme o pensamento


de Aranha (1989).

02- Qual a influência da teoria crítico- reprodutivista na Pedagogia no


Brasil?

03- Elabore um texto sobre a conversa entre Gadotti, Freire e Guimarães,


refletindo neste acerca da influência da teoria crítico- reprodutivista,
ou somente teoria crítica, no pensamento dos referidos autores.

04- O que Bourdieu e Passeron (apud CUNHA, 1979) escreveram


sobre: violência simbólica, código disciplinar, cultura arbitrária e
força simbólica?

05- Por que Bourdieu e Passeron (apud CUNHA, 1979) disseram que
habitus “é o resultado do trabalho pedagógico”?

06- Comente as duas vertentes das teorias da Educação na visão de


Saviani.

54
UNIDADE III
Educação e as transformações
no mundo contemporâneo

OBJETIVOS
• Identificar a relação entre escola e autonomia;
• Verificar a visão de Piletti sobre docentes e discentes;
• Averiguar a relevância da Filosofia, História e
Sociologia da Educação na formação docente;
• Conceituar avaliação segundo Piletti;
• Identificar e exemplificar as modalidades especiais
de educação citadas por Piletti;
• Verificar quais os perigos da leitura na visão de
Rubem Alves;
• Relacionar o ato de educar e o ato de comer na
visão de Rubem Alves;
• Identificar e relacionar a experiência de aprendizagem
com a experiência afetiva, na visão de Rubem Alves.
FUESPI/ NEAD Pedagogia

A democracia só é possível se o povo for educado.


Mas ser educado não significa ter diploma superior.
Significa ter a capacidade de pensar. (Rubem Alves)

A educação se divide em duas


partes: educação das habilidades e
educação da sensibilidade. Sem a
educação da sensibilidade, todas as
habilidades são tolas e sem sentido (Rubem Alves)

Iniciamos este capítulo com as reflexões de Nelson Piletti sobre a


Estrutura e o Funcionamento do Ensino Médio (2000) e a Estrutura
e o Funcionamento do Ensino Fundamental (2001) e nestes foram
abordadas as categorias: Escola, Autonomia, Professores, Alunos,
Avaliação e Modalidades especiais da Educação. Após Piletti (2000; 2001),
apresentamos o pensamento de Rubem Alves acerca da Educação, sobre o
processo ensino e aprendizagem, a partir da pedagogia do afeto, partilhada
também por Paulo Freire, dentre outros pedagogos.

E, no final, no Capítulo IV: Partilhas do Vivido, partilho com vocês


minhas vivências no campo da docência acerca da avaliação, através de uma
atividade prática realizada por mim no Centro de Ensino Unificado de Teresina,
no curso de Administração. Atividade esta, que pode ser transposta para o curso
de Pedagogia, e demais cursos. Apresentarei um artigo intitulado Separações
e Divórcios: elementos de desestruturação da Família, ou elementos que
fazem parte da dinâmica familiar, cujas reflexões ajudam aos pedagogos e
demais docentes a ter outro olhar sobre a família, podendo aplicá-los na sala
de aula, ao trabalharem o conceito de Família com sua turma, de forma mais
abrangente e que mostra que as diversidades de Família que temos, em nada
desestrutura o conceito de Família. Esse artigo foi publicado pela primeira vez,
na Revista CEUT, v.3, nº3, 2003. E, será reimpresso neste livro, pois, acredito,
como disse anteriormente, que o conteúdo pode auxiliar o docente e a escola
repensarem o conceito de família, e trabalhar muito melhor com a diversidade
familiar existente nos dias atuais.

E, como Piletti (2001) aborda a Educação a distância como uma


das modalidades especiais da Educação, apresento dois textos produzidos

57
Reflexões sobre Sociologia Aplicada à Educação

acerca da Educação a Distância. Então, vamos ao pensamento de Piletti


(1988), conforme supracitado e Boa Leitura!

3.1. Nelson Piletti e a Estrutura e o Funcionamento do Ensino


Médio e do Ensino Fundamental.

Na Escola, Piletti (2000) menciona que um dos elementos mais


importantes é a autonomia, e citando Azanha, Piletti (2000, p.109) concorda
com o pensamento de Azanha que diz que
a tarefa educativa tem como pressuposto ético a autonomia de
quem educa. Sonegada esta condição, a escola perde a sua
autêntica feição educativa e transforma-se em instrumento de
doutrinação.

Assim, mesmo que a legislação, a partir da Lei nº 4.024/61 tenha


conferido a autonomia à escola, na visão de Piletti (2000, p.110), é muito raro
que escolas tenham praticado esta “autonomia em seu trabalho docente”,
em decorrência de muitos diretores e professores serem funcionários
públicos e pensem em suas posições como cumpridores de tarefas e não
se vejam como educadores. E, Piletti (2000, p.110) diz que para mudar esta
atitude é necessário que haja o desenvolvimento da
autonomia de decisão no tocante próprio trabalho e, assumir,
por conseguinte, plena responsabilidade pelo mesmo.
Para isso é necessário, por um lado, que se ultrapassem
as discussões meramente verbais, de consequências tão
prejudiciais particularmente por seus efeitos paralisantes em
relação à mudança da escola, e, por outro, que se vincule
concretamente a autonomia à especificidade do trabalho
escolar. (...) Nessa perspectiva exige-se do professor que seja
capaz de compreender sua matéria no conjunto das demais,
e estas no contexto educativo e social, distanciando-se da
visão particularista, de modo especial no tocante a objetivos,
conteúdos, método e avaliação.

Observa-se no olhar de Piletti (2000), no que se refere à autonomia,


que se a escola está subordinada a um grupo, provavelmente, a cultura
organizacional refletirá o pensamento e a cultura (valores, crenças) do
referido grupo, fazendo com que no lugar de funcionar como instrumento

58
FUESPI/ NEAD Pedagogia

de reflexão, de ampliação do olhar sobre si, o outro, o mundo, possa ser,


como disse Bourdieu e Passeron, um aparelho de reprodução, no qual vê-
se embutido um universo simbólico, que culmina na reprodução da violência
simbólica, vista no capítulo anterior.

Porém, se a cultura da autonomia é posta em prática, então,


como diz Althusser, o aparelho ideológico da escola pode ser tanto para
reprodução da ordem estabelecida como para modificação da mesma, e,
tendo autonomia, reafirmando o ser educador, que a educação no sentido
mais amplo do termo terá a sua expressão, como diz Piletti (2000, p.111)
É enquanto educador, no sentido amplo do termo, mais do
que como mero transmissor de conteúdos específicos, que
o professor poderá realizar-se de forma autônoma em seu
trabalho escolar. Não se quer em absoluto afirmar que o ensino
especializado de uma disciplina não constitui tarefa precípua
do professor. Mas não se limita a isso, e, mesmo que assim
fosse, a compreensão de sua disciplina no conjunto das demais
seria fundamental para que se realizasse efetivamente a sua
aprendizagem, para que o novo conhecimento se integrasse
satisfatoriamente à estrutura cognitiva do aluno. Tanto mais tal
compreensão é necessária e, mesmo, indispensável, quando
se vai além dessa estreita perspectiva e se enfatiza o aspecto
educativo do trabalho docente.

A ideia de que o conteúdo fosse integrado à estrutura cognitiva


do aluno, bem como as demais disciplinas, trabalhando relações de
inter-relação entre elas, ou valorizando a interdisciplinaridade, lembra a
pedagogia nova popular cuja fundamentação teórica que a sustenta gira
em torno dos pensamentos de Marx, Althusser, Grasmci dentre outros, ou
seja, os representantes da teoria crítica-reprodutivista.

Quanto aos Professores, Piletti (2000,p.117) diz que


a brutal deteriorização de salários e condições de trabalho
ocorrida nos últimos anos constitui, certamente, um dos fatores
que têm contribuído para retardar o avanço das discussões e das
práticas acerca não só da formação como também da atuação
pedagógica dos professores. Estes, envolvidos de corpo e
alma pela luta salarial, perdem muitas vezes de vista a noção
da relativa independência existente entre os aspectos salarial e
pedagógico de seu exercício profissional.

59
Reflexões sobre Sociologia Aplicada à Educação

É muito interessante a citação acima de Piletti (2000), pois, apesar


de quase doze anos após ter escrito sobre as dificuldades no universo
docente, percebe-se com a greve dos professores da rede Estadual e
Municipal em Teresina-Pi que está em andamento, por mais de dois meses,
fazendo com que o período letivo de 2012 esteja, praticamente, perdido, e
cujas reivindicações estão mais fortes por uma melhoria salarial. Porém,
as discussões acerca do exercício pedagógico, da formação docente,
das melhores condições de trabalho, incluso a autonomia, falada no item
anterior, bem como a qualificação docente, ficam como se fossem outra
discussão, e, não como parte de todo o processo de reivindicação de
melhorias para o Docente, a Escola e os discentes, como um todo.

E, quanto à formação docente, Piletti (2000, p.123) diz que considera


“fundamentais e indispensáveis conhecimentos básicos de filosofia, história
e sociologia da educação”, porque,
sem eles, como poderia o professor ter alguma possibilidade
de exercer suas funções de forma crítica e construtiva? Afinal
de contas, não há como negar que a educação tem finalidades
explícitas e implícitas, possui uma história de múltiplas versões e
responde a exigências sociais determinadas, variáveis no tempo
e no espaço. Finalidades, história e exigências que o professor
precisa estar capacitado a analisar com suas repercussões na
dinâmica cotidiana, sob pena de transformar-se em mera correia
de transmissão de ideias, sentimentos e atitudes que nem ao
menos se coadunam com os objetivos que pretensamente adota
em relação a seu trabalho.

Assim, para Piletti (2000) é relevante o ensino das disciplinas


supracitadas no processo de formação docente porque este trio Filosofia,
História e Sociologia da Educação contribuirão para ampliar o olhar do
futuro docente, não apenas para a docência, mas para a relevância que é
o ser docente e o processo de ensino e aprendizagem, em que o docente
pode tanto contribuir para reafirmar posturas, dentro de uma ordem
estabelecida, como pode auxiliar na reflexão crítica acerca da própria
cidadania, contribuindo para modificações e construções de novas ordens.

Por exemplo, em uma sala de aula o professor pode estimular a


autoestima dos alunos, fazendo com que possam tornar sonhos em

60
FUESPI/ NEAD Pedagogia

realidade, ou com uma palavra destruir sonhos, tolher suas capacidades


e potencialidades. Bem como, podem desenvolver a dimensão crítica-
reflexiva acerca do real, através das relações entre a sua disciplina, com as
demais, mostrando a interdisciplinaridade e aplicações desta no cotidiano
do grupo. Logo, não basta estar docente, deve-se ser docente, pois, para
Piletti (2000, p.129)
...se o professor pensa que sua tarefa é ensinar o ABC e ignora
a pessoa de seus estudantes e as condições em que vivem,
obviamente não vai aprender a pensar politicamente ou talvez
vá agir politicamente em termos conservadores, prendendo a
sociedade aos laços do passado, ao subterrâneo da cultura e
da economia.

Por isso, faz-se necessário que o professor esteja constantemente se


qualificando, ampliando o seu olhar sobre o seu próprio fazer e sobre o seu
saber fazer, contextualizando sempre a sua prática docente, observando
nesta contextualização o cotidiano do aluno.

Conforme Piletti (2001, pp.70 – 71) “em lugar do sentimento de


inferioridade, a escola deve estimular os alunos a desenvolverem a consciência
da própria capacidade de aprender e transformar o mundo”, porque as
finalidades da educação são: “pleno desenvolvimento do educando; preparo
para o exercício da cidadania e qualificação para o trabalho”.

Assim, a escola pode formar, segundo Piletti (2001, p.83)


Para a submissão e a passividade ou para a liberdade e
participação social. É evidente que nenhum professor e nenhum
livro didático dizem claramente: ’Vocês devem ser submissos,
vocês devem ser passivos, não devem participar da vida social’.
Tanto o ensino da submissão e o do individualismo quanto o da
autonomia e da solidariedade ocorrem muito mais através do
que se chama ‘currículo oculto’.

Piletti (2001) esta dizendo que o professor, ao ministrar seu conteúdo,


e fazer as pontes entre sua disciplina e as demais, e entre a sua disciplina
e o cotidiano do aluno, acolhendo o posicionamento do seu aluno, ou
refutando-o, pode, através do exemplo ensinar também o autoritarismo,
a competição, o individualismo ou, ao contrário, o respeito e a valorização

61
Reflexões sobre Sociologia Aplicada à Educação

e a solidariedade, reforçando o que foi dito anteriormente sobre a grande


responsabilidade do ser docente, do ser professor e educador.

Dentre as responsabilidades do docente, tem-se a avaliação.


Segundo Piletti (2001, p.94)
De acordo com o artigo 24, inciso V, da lei 9,394/96, a verificação
do rendimento escolar observará os seguintes critérios: a)
avaliação contínua e cumulativa do desempenho do aluno, com
prevalência dos aspectos qualitativos sobre os quantitativos e
dos resultados ao longo do período sobre os de eventuais provas
finais; b) possibilidade de aceleração de estudos para alunos
com atraso escolar; c) possibilidade de avanço nos cursos e nas
séries mediante verificação do aprendizado; d) aproveitamento
de estudos concluídos com êxito; e)obrigatoriedade de estudos
de recuperação, de preferência paralelos ao período letivo, para
os casos de baixo rendimento escolar, a serem disciplinados
pelas instituições de ensino em seus regimentos.

A avaliação, então, é um instrumento de transformação ou de


conservação, pois, se apesar do Artigo 24, supracitado, muitos docentes,
pela sua formação, enfatizarem a dimensão quantitativa no aluno, ele estará
reafirmando uma postura tradicional de avaliação que enfatiza o erro e não
o acerto, observando apenas o que fora respondido na avaliação escrita ou
nos trabalhos solicitados. Porém, se o professor avalia qualitativamente,
respeitando o processo de aprendizagem, bem como observa a superação
de dificuldades, o empenho, as múltiplas inteligências, respeitando os
ritmos, enfim, o crescimento do aluno então, ele está transformando.

Avaliar não é uma tarefa fácil, mas podem ser utilizados vários
instrumentos, que englobam não apenas a prova, mas pode ser a
construção de textos ao longo da disciplina, ressaltando nesses o que foram
aprendendo em cada aula, vai sendo construído um portfólio, em que ao
término o aluno e o professor tenham uma dimensão do aprendido nesse
processo; seminários, em que antes de materializá-lo, haja encontro com
cada grupo, para que todo o assunto seja previamente discutido e as dúvidas
dissipadas, então, com confiança acerca do que irão falar, o seminário será
maravilhoso, sendo entregue, no momento da apresentação, um resumo do
conteúdo que será abordado e que fora discutido anteriormente, e, também

62
FUESPI/ NEAD Pedagogia

um folder a ser entregue para cada grupo; enfim, os instrumentos são


muitos, mas, o mais importante é o acompanhamento, é o estar presente,
é o saber ouvir e construir o conhecimento com o aluno.

Assim, a avaliação será realizada como processo de aprendizagem


contínua e, não, como em muitos casos, como instrumento de punição.
Afinal, no momento em que o aluno vê a sua nota, ele não entende que
essa não retrata todo o processo e que outras condições psíquicas, sociais,
podem ter interferido; ele irá se vê como incapaz ou capaz; o que aumenta
o que vou avaliar ao longo deste processo.

E, ao mencionarmos a avaliação, também foi falado das múltiplas


inteligências, que aponta para a diversidade que cada ser humano é, posto
que uns são mais visuais, outros auditivos, outros sinestésicos, enfim,
aprende-se com todos os sentidos, fazendo com que sejam observados
outras modalidades especiais de Educação que Piletti (2001, p.106)
chama de Educação especial, para pessoas que possuem algum tipo de
necessidade especial ressaltando os Artigos 58, 59 e 60 que garantem a
todas essas pessoas os direitos necessários para estudarem, fornecendo-
lhe um atendimento diferenciado, pois como diz o Prof. Antônio Francisco
Soares, especialista em Educação Inclusiva:”deve-se tratar o diferente como
diferente para igualar”, ou seja, se em uma turma tem-se um cadeirante,
que nesta sala tenha uma mesa de apoio, diferente das demais, para
que ele possa escrever e acompanhar como os demais. Outra forma de
Educação é a Profissional, ou profissionalizante, em que será ensinado
o que for necessário para a profissionalização dos alunos e o seu bem
sucedido ingresso ao Mercado de trabalho.

A Educação dos povos indígenas também é considerada uma


modalidade especial de Educação, em que conforme os artigos 78 e 79 da
lei nº 9.394/96, tem-se que caberá ao docente, ao programa de educação,
dentre outras questões “proporcionar aos índios, suas comunidades e
povo, a recuperação de suas memórias históricas; a reafirmação de suas
identidades étnicas; a valorização de suas línguas e ciências”; o que ressalta

63
Reflexões sobre Sociologia Aplicada à Educação

que a educação vai sendo construída e aplicada conforme as necessidades


do grupo em questão. Inclusive, muitos membros de várias tribos estão se
formando e retornando para trabalharem pela sua tribo, com a sua tribo.

A Educação a Distância, tornou-se legal com o Artigo 80 da Lei nº


9.324/96, uma modalidade especial de Educação que tem possibilitado
a inúmeras pessoas fazerem um curso superior, apesar das conexões
com a internet no interior de alguns estados ainda ser precária, mas
há um esforço quanto a melhoria de vida, e um estimulo a graduação
e pós-graduação, sejam dentro dos moldes não presenciais ou semi-
presenciais. Aqui também, devem-se levar em consideração os
instrumentos a serem utilizados no processo educacional, bem como
nos de avaliação.

Percebe-se, pois, as continuidades e mudanças enfrentadas no


processo educacional que ora reafirmam a ordem estabelecida, ora
a questiona, conforme o contexto histórico em que se esteja inserido
naquele momento. Como diz Piletti (2001, p.110)
a escola é parte de um todo mais amplo, o sistema social. Ao
mesmo tempo que trabalhamos para melhora a escola, é preciso
que lutemos para modificar as estruturas sociais.

Dessa maneira, vamos finalizando o pensamento de Piletti (2001;


2000) observando neste, que são as continuidades e as mudanças,
conforme citei anteriormente, que irão verificar a aplicabilidade ou não, no
contexto da Educação como um todo, das teorias crítico-reprodutivistas
mencionadas no capítulo anterior.

Contudo, além de todos os questionamentos acerca da escola, da


formação docente, da relação docente e discente, dos modelos especiais
de Educação, tem-se o amor à docência e a possibilidade de transformar o
sistema educacional proporcionando aos educandos uma educação mais
justa, em que “possa haver igualdade de expressão, em que, segundo
Edgar Morin, as diferenças não sejam destruídas, mas integradas” (AS

64
FUESPI/ NEAD Pedagogia

EDITORAS in: ALVES, 2004, p.8); isto é o que veremos com o pensamento
de Rubem Alves no item a seguir.

3.2. Rubem Alves e outras dimensões da Educação

Rubem Alves no seu


“Rubem Alves é pedagogo, poeta e filósofo de
livro Ao professor, com o todas as horas, cronista do cotidiano, contador de
estórias, ensaísta, teólogo, acadêmico, autor de
meu carinho reflete sobre livros para crianças, psicanalista. Rubem Alves é
questões que permeiam o um dos intelectuais mais famosos e respeitados
do Brasil. Autor de uma vastíssima obra (a sua
sistema educacional, dentre bibliografia já conta com mais de cinquenta títulos),
de forte pendor autobiográfico, Rubem Alves é um
elas tem-se Sobre os perigos dos mais luminosos artífices da língua portuguesa,
da leitura, Alves (2004, p. cuja plasticidade tem atingido nos seus textos
formas cambiantes e expressões de rara e sempre
11) questiona que a ênfase surpreendente singularidade (...)” (ADEMAR
FERREIRA DOS SANTOS IN: ALVES, 2004)
no pensamento a partir das
leituras realizadas, fazem
com que os alunos, no lugar de refletirem sobre o que leram, ampliando o
seu campo de compreensão do mundo, de si e do outro, tornam-se apenas
co-repetidores, repetindo o que leram, da maneira como leram, em que o
pensamento, não vai sendo ampliado, mas tolhido.

Por exemplo, o professor elabora uma atividade que envolve


conceitos, reflexões sobre os tópicos, mas não aceita em nada as respostas
dos alunos, exceto se reproduzirem o pensamento dos autores lidos, sem
emitir nenhum posicionamento próprio sobre. O que fará com que o aluno
preocupe-se tanto em memorizar, que esquecerá que o aprendizado,
pressupõe o entendimento do lido, sua contextualização, sua interpretação,
em que mesmo fazendo citações diretas, também, irá além do que escreveu.
Nesse caso, o professor está apenas reproduzindo a ordem e, em nada,
realizando o seu papel como educador, como facilitador do processo de
formação de cidadãos, mas do que de, apenas, profissionais.

Assim, mais do que ensinar apenas a ler, e serem meros reprodutores


de saberes, Rubem Alves (2004, p.13) diz que ficaria “feliz se as nossas
escolas ensinassem uma única coisa: o prazer de ler!”. E, percebe-se na
citação de Alves (2004), que o prazer, o amar a leitura, permite mais do que

65
Reflexões sobre Sociologia Aplicada à Educação

simplesmente a co-repetição, permite que o leitor viaje no pensamento de


outrem, mas ao mesmo tempo, dialogue com ele, crie, transforme, construa
junto com. E, é isto que as escolas devem aprender a aprender.

Alves (2004, p.16) citando


Nietzsche diz que para se aprender a pensar, é preciso aprender
a dançar. O pensamento são as ideias dançando. (...) a Analogia
, é um passo da dança do pensamento. Pela analogia, o
pensamento pula de uma coisa que ele conhece para uma coisa
que ele não conhece (...) A analogia não dá conhecimento preciso
sobre o desconhecido – mas o torna familiar. Quando se conhece
mesmo, de verdade, não é preciso fazer uso de analogias. (...)
As analogias, assim, não nos dão conhecimento exato. Elas nos
introduzem no campo da familiaridade. Por isso os cientistas que
acham que ciência é conhecimento exato desprezam o uso das
analogias. (...) Mas o fato é que há uma infinidade de experiências
que não podem ser comunicadas de forma cientifica (...) Como
comunicar, por meio de palavras precisas, o cheiro da maçã,
a ternura de um olhar, a tristeza de um crepúsculo, o medo de
morrer, o mistério da floresta, o fascínio do mar?

Por isso é que Alves (2004, p.17) diz que para que se compreenda
o que é muito difícil de ser “comunicado diretamente”, é necessário que se
utilize analogias. “E, é aí que surge a poesia, a linguagem das coisas que
não podem ser ditas diretamente.”

Assim, para Rubem Alves (2004, p.27) o ato de educar significa amar,
semear, porém, existem docentes que, por não estarem comprometidos com
a docência jamais semearão, ou farão brotar, germinar, crescer o potencial
intelectual de seus alunos, por apenas utilizarem seus conhecimentos no
“intuito de humilhar os que ainda não sabem”, enfatizando a reprodução do
sistema educacional e a ordem vigente. Porém, existem os que amam,
semeiam e valorizam o ensino, a partilha de conhecimento, a construção de
um conhecimento coletivo, estimulando seus educandos e fazendo brotar,
germinar em cada um deles olhares magníficos sobre si, o outro e o mundo a
sua volta, ampliando sua visão e conhecimento, e, esses docentes são capazes
de modificar o sistema educacional, modificar a si, ao outro, ao mundo.

Rubem Alves, fazendo uma analogia entre o ato de educar e o de


comer, menciona que somente se come com prazer quando se tem fome,

66
FUESPI/ NEAD Pedagogia

caso contrário tudo o que foi comido será posto para fora. Assim, para ele
a fome é a mola mestra do saborear a comida, do participar do processo
de comunicação através do alimento. E, para isto é necessário o afeto, de
quem prepara o prato e de quem irá partilhá-lo, convidar com afeto o outro
para comer, para partilhar o prato é o que faz o momento de comensalidade,
que significa comer e beber juntos, um momento maravilhoso.

Conforme Rubem Alves (2004,p.52): “toda experiência de


aprendizagem se inicia com uma experiência afetiva. É a fome que põe
em funcionamento o aparelho pensador. Fome é afeto. O pensamento
nasce do afeto. (...) Afeto, do latim Affecare quer dizer ‘ir atrás’. O afeto
é o movimento da alma em busca do objeto da fome. E, para ir atrás do
conhecimento é necessário que além do estimulo, o aluno se sinta motivado
a, que deseje aprender.

Então, com relação ao pensamento de Rubem Alves (2004) percebe-


se que o afeto permeia o ato de educar. Não o afeto como mimo, carinho,
mas o afeto como dar o estimulo para que o educando se sinta convidado
a ir atrás, a conhecer, a interpretar, a construir novas leituras de mundo a
partir do que se está apresentando, aprendendo.

E, assim, este livro não termina aqui, mas prossegue através do


Capítulo IV: Partilhas do Vivido, em que vou partilhar os frutos de minha
vivência acadêmica e como docente através de dois artigos e dois textos
de minha autoria, sobre temas diversos, conforme anunciados no inicio
deste capítulo, acerca da Família, da Avaliação e Educação á Distância
para que sejam lidos, refletidos, comentados e novos saberes sejam
partilhados e divulgados no campo da pluralidade conceitual, a partir dos
conhecimentos filosóficos, pedagógicos, sociológicos, que nortearam as
reflexões propostas sobre Sociologia Aplicada à Educação, que compõe a
disciplina Sociologia da Educação II.

Obrigada pela companhia nesta partilha até aqui e continuem a ter uma
BOA LEITURA!!

67
Reflexões sobre Sociologia Aplicada à Educação

REFERÊNCIAS DESTA UNIDADE

ALVES, Rubem. Ao professor, com o meu carinho. Campinas, SP: Verus


Editora, 2004

PILETTI, Nelson. Estrutura e Funcionamento do Ensino Fundamental.


26ª ed. 2ª reimpressão. São Paulo: Ática, 2001

______________. Estrutura e Funcionamento do Ensino Médio. 5ª ed.


2ª reimpressão. São Paulo: Ática, 2000

LEITURAS SUGERIDAS

ALBOM, Mitch. A última grande lição. O sentido da vida. (tradução de


José J. Veiga).Rio de Janeiro: GMT,1998

ALVES, Rubem. Do universo à jabuticaba. São Paulo: Editora Planeta do


Brasil, 2010

______________. Ensinar, cantar e aprender. (músicas de Marcílio


Menezes). Campinas- SP: Papirus, 2008

MOMENTO DE REFLEXÃO DA APRENDIZAGEM

01- Por que Piletti (2000) diz que “um dos elementos mais importantes
na escola é a autonomia”?

02- O que Piletti (2000) diz acerca dos professores e dos alunos?

03- Por que Piletti (2000) enfatiza a relevância da Filosofia, História e


Sociologia da Educação na formação docente?

04- Como é visto a avaliação, o avaliar no olhar de Piletti?

05- Quais as modalidades especiais de educação citadas por Piletti?


Cite e exemplifique.

06- Comente a fala do Prof. Antônio Francisco Soares: “deve-se tratar o


diferente como diferente para igualar”.

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FUESPI/ NEAD Pedagogia

07- O que Rubem Alves nos fala sobre os perigos da leitura?

08- Comente o “prazer de ler” citado por Rubem Alves.

09- Qual a relação entre o ato de educar e o comer na visão de Rubem


Alves?

10- Comente a fala de Rubem Alves: “toda experiência de aprendizagem


se inicia com uma experiência afetiva”.

69
UNIDADE IV Partilhas do vivido

OBJETIVOS
• Conceituar Família; relacionar e conceituar hierarquia de gênero e
relacionamento puro;
• Identificar a construção do mito da desestruturação da família;
• Identificar uma nova maneira de se trabalhar o conceito de família na
escola, a partir das reflexões pontuadas no Artigo 1;
• Conceituar a relação docente e discente conforme Gardner;
• Identificar o significado do respeito a diversidade no Artigo 2;
• Verificar com quem e como nasceu a “verdadeira” avaliação educativa;
• Conceituar avaliação conforme Parlett e Hamilton;
• Verificar a adaptação e aplicação da vivência da avaliação realizada na
disciplina Sociologia das Organizações ao Curso de Pedagogia;
• Verificar como Santaella abordou o corpo sensório perceptivo do cibernauta;
• Identificar o pensamento de Almeida sobre o Ensino a Distância;
• Verificar como a Educação a Distância promove uma reavaliação do ser docente;
• Citar e comentar as dimensões do uso do computador apontadas por Peluso.
FUESPI/ NEAD Pedagogia

Não basta que o aluno conheça o


mundo. É preciso que ele deguste o
mundo. Não basta que o aluno
tenha ciência. É preciso que tenha
sapiência. Sapiência é arte da
degustação. Sapio= eu degusto (Rubem Alves)

Os saberes – que os professores ensinam –


nos dão meios para viver. Os sabores – que os
educadores despertam- nos dão razões para viver
(Rubem Alves).

Encerro este livro com as minhas reflexões acerca da dinâmica


Familiar e suas alterações, após as separações e divórcios, repensando se
são elementos de desestruturação da família, ou como elementos de alívio
das tensões familiais no artigo 1, o que acredito ser pertinente apresentá-
lo aqui, uma vez que as crianças no âmbito escolar são oriundas de
várias relações familiares e que, no espaço da sala de aula, ao estudarem
sobre família, árvore genealógica, como os docentes estão conceituando
família, até que ponto as crianças se veem representadas nos conceitos
apresentados em sala? Assim, acredito que o meu artigo contribui muito
para a compreensão da família hoje (século XXI), e também, porque
foi fruto de um estudo prazeroso sobre família, separações, divórcios,
relacionamentos, casamentos, enfim, várias dimensões da grande rede
que é o parentesco, e que os convido, com muita alegria, a partilharem
deste estudo comigo.

Depois, no artigo 2, vou refletir sobre a avaliação no universo da


relação entre docente e discente: um eterno aprendizado, mencionando o
que é avaliação, e as mudanças que se podem fazer na prática avaliativa
através de uma vivência no âmbito do curso de Administração, mas que a
ideia pode ser transposta e adaptada ao Curso de Pedagogia e demais
cursos sem problemas, pois o foco é mostrar que existem outras formas de
avaliar que rompem com a dimensão da avaliação pontual, que é o exame,
ressaltando a maravilha, embora exigente, que é a avaliação processual.

73
Reflexões sobre Sociologia Aplicada à Educação

Após degustar os dois pratos saborosos acima, têm-se dois textos, o


primeiro intitulado Ensino a Distância: reflexões sobre as Novas Tecnologias
no Processo de Ensino – Aprendizagem e o outro Computador: como
lidar com está máquina?, Ambos que nos ajudam a refletir acerca das
transformações via inclusão das novas tecnologias, conforme supracitado,
no processo de Ensino-Aprendizagem e que contribuem para que seja
possível o Ensino a Distância, ressaltando as dificuldades de adaptação, e
as maravilhas que envolvem esse processo.
Agora os convido a um momento de comensalidade (comer e beber
juntos) comigo, através da degustação e apreciação de cada artigo e texto
abaixo. A todos Bom Apetite e uma prazerosa LEITURA!!

___________________________

Artigo 1

____________________________________

Separações e Divórcios: Elementos que fazem parte da dinâmica


Familiar ou Elementos de “desestruturação” desta?

Marcia Adriana Lima de Oliveira

Mestre em Antropologia das Sociedades Complexas pela Universidade


Federal de Pernambuco - UFPE. Professora e Educadora na
Universidade Estadual do Piauí- UESPI/ Campus Clóvis Moura em
Teresina-Piauí. Especialista em Docência do Ensino Superior- Faculdade
Integral Diferencial- FACID e Curso Expansão. Especialista em Bioética e
Direitos Humanos – Instituto Camilo Filho- ICF/ ANIS/Sociedade Brasileira
de Bioética – Regional do Piauí- SBB-PI
___________________________

74
FUESPI/ NEAD Pedagogia

Resumo
O presente artigo é oriundo do primeiro capítulo da dissertação de Mestrado
em Antropologia intitulada: E até que a morte nos separe? Repercussão da
separação e do divórcio na concepção de família hoje (década de 90), que
teve como objetivo central a compreensão de como vai sendo constituído
o mito da desestruturação da família, através das diversas representações
de Família, de Casamento, das Separações e do Divórcio em âmbito geral.
Sendo estas últimas categorias consideradas ora como elementos de
desestruturação da família ora como alívio das tensões familiares.
_______________________________

Abstract
This article is part of the first chapter of my Mastersthesis entitle: “And until
then does the death separate us?” The repercussion of the separation
and divorce in the family concepts (90th decade). It had as central aim
the comprehension about how the family rupture myth has gone been
constructed through the Family, Marriage, Separation and Divorce several
representations in general. However, separation and divorce has still
been considered as elements of family rupture or on the other hand as
elements that make part, nowadays, of family dynamic.
____________________________________________________

(..) Eu possa me dizer do amor (que


tive): Que não seja imortal, posto
que é chama Mas que seja infinito
enquanto dure.
(Vinicius de Moraes. Soneto de
FidelidadeIn: Antologia Poética. Rio
de Janeiro, José Olympio, 1976)

O problema da pesquisa foi gerado em torno da “fala” sobre a


desestruturação ou não da família tomando como referência os conceitos
de família, casamento e relacionamento marital no intuito de perceber, a
partir destes, como são concebidos o divórcio e as separações na década
de 90 - se ainda como elementos de desestruturação da família ou se como
partes da dinâmica dessa.

75
Reflexões sobre Sociologia Aplicada à Educação

Esclareço que todas as vezes que me referir a relacionamento


marital não é que só faça parte do casamento oficial, mas também de toda
e qualquer relação que envolva um relacionamento mais íntimo incluso
a relação sexual e a coabitação entre duas pessoas como é o caso das
uniões consensuais, ou não coabitação como é o caso de um tipo de união
consensual em que os companheiros têm cada um a sua própria residência.
Assim sendo, será abordada a construção dos conceitos supracitados
começando pela

“FAMÍLIA, FAMÍLIA, PAPAI, MAMÃE, TITIA, FAMÍLIA....” (Titãs)

Tem-se uma vasta bibliografia sobre família, dentre ela podemos


citar alguns autores como: Velho (1986), Ariés (1981), Durham (1983),
Fox (1986), Freyre (1981), Goldani (1993), Gennep (1978), Salem (1980;
1985), Lévi-Strauss (1982), Corrêa (1984), Abreu (1982) e Murdock( 1965);
dos quais, como aprofundamento, enuncio alguns conceitos.
Murdock (1965) referiu-se à família de uma maneira geral,
caracterizada pela coabitação, cooperação econômica e reprodução,
tendo dentro desta o que podemos chamar de família extensa composta
por “adultos de ambos os sexos, dos quais dois mantêm relações sexuais
socialmente aprovadas e uma ou mais crianças, próprias ou adotadas, dos
adultos que coabitam sexualmente” e família nuclear composta pelo pai, a
mãe e filhos.

Gilberto Freyre (1981) referiu-se à família patriarcal oriunda do


Sistema Colonial no Brasil, constituída pelo poder do pater-familias,
composta pelo pai / o patriarca, a mãe / mulher e os filhos. Como residiam
nos Grandes Engenhos de açúcar, principal fonte econômica juntamente com
o café no período Colonial no Brasil, o senhor de engenho, o Pater Familias,
possuía a obediência da mulher, dos filhos, dos escravos e da mucama.
Obediência esta, oriunda das relações de poder estabelecidas entre o
senhor e todos os outros membros da família caracterizada através de maus
tratos e submissão das vontades dos outros as do senhor, principalmente
com relação a vontade dos escravos, não considerados gente.

76
FUESPI/ NEAD Pedagogia

No tipo de família patriarcal tem-se a presença tanto da família


extensa através dos parentes e afins como, por exemplo: tios (as), primos
(as), cunhados (as) que coabitavam na casa-grande, quanto da família
nuclear composta pelo marido, pela mulher e seus filhos constituindo esta
última família um grupo doméstico. Outro aspecto apontado por Freyre
(1981) é que as mulheres, na sua grande maioria, eram iletradas, não
podiam ir à escola dedicando-se às atividades domésticas como fazer
roupas, bordados, comidas, cuidar dos filhos e do marido. E ao marido cabia
o conhecimento, a formação e o desenvolvimento de atividades externas
tanto políticas e sociais quanto econômicas. A distinção entre a casa e a
rua foi sendo bem marcada no surgimento da família brasileira segundo
Freyre (1981) e retomada por Da Matta (1991) que trabalhou a casa e a rua
enquanto um dos elementos que caracterizam a Identidade Brasileira.

Uma das particularidades da formação da família brasileira para


Freyre (1981) está centrada na sexualidade, no erotismo, na ênfase dada
às relações sexuais entre povos de raças distintas. Na mistura das raças
composta pelo negro, o índio, o branco tem-se mais do que uma mistura
biológica, tem-se uma mistura cultural que deu fundamento ao surgimento
do patriarcado, da dependência e submissão da mulher ao marido, da
“aceitação” da infidelidade na relação conjugal, uma vez que o homem ia
em busca da realização do seu prazer com as escravas.

O prazer encontrava-se fora da relação conjugal e era aceito como


natural do homem, o ter prazer com outras mulheres que não a esposa ou,
pelo menos, aparentemente aceito como “natural”, pois quando a mulher
descobria a suposta traição mandava castigar a escrava impondo o poder
que lhe era conferido no âmbito doméstico. Richard Parker (1991, p.53) em
seu livro Corpos, prazeres e paixões, fez um estudo sobre a cultura sexual
brasileira e, sobre Freyre (1981), Parker diz que:
Casa-Grande e Senzala deu a mais completa e vívida
expressão àquilo que teve uma penetração mais
ampla e, considero, a mais profundamente enraizada
configuração ideológica: o sentido, declarado embora
problemático, do caráter particularmente sensual da vida

77
Reflexões sobre Sociologia Aplicada à Educação

e do povo brasileiros. Esta compreensão, embora mais


elaboradamente articulada na estruturação de alguns
intelectuais, esteve, no entanto presente tanto nas formas
como nas estruturas da cultura popular. Ao passo que na
Europa e nos Estados Unidos a vida sexual tenha sido
tratada como um fenômeno essencialmente individual, no
Brasil ela surgiu também como um tema importante no
nível social e cultural e foi tomada, para o melhor ou o pior,
como uma espécie de chave para a natureza peculiar da
realidade brasileira.

Embora a sexualidade tenha marcado a construção do modelo de


família brasileira, outros elementos como a saída da mulher do âmbito da
casa para o da rua, ainda que não tenha deixado por completo a casa; a
aquisição de conhecimentos através do estudo, da qualificação profissional;
a conquista da mulher no mercado de trabalho; a posição da mulher como
chefe da casa ao optar por morar sozinha ou pela separação; a liberdade
sexual oriunda da década de 60 que possibilitou a mulher a optar ou não
pelo casamento, ocasionando o surgimento de novos status para a mulher
como o de mãe solteira; a legalização das uniões consensuais, do divórcio,
todos esses elementos vão sendo incorporados com o passar do tempo à
família dando a ela uma flexibilidade para adequar-se aos vários contextos
históricos pelos quais passamos após o Sistema Colonial.
Algumas das transformações na família citadas anteriormente
fizeram com que no início da década de 90 as pessoas, tanto na mídia
quanto fora dela, ficassem falando de uma desestruturação enquanto
quebra, rompimento, ruptura da família, associada a crises de valores nesta,
provocadas pelas alterações das relações entre pais e filhos relacionadas
à maior participação dos filhos nos problemas domésticos e a mulher ir
conquistando o seu espaço no âmbito da rua trabalhando fora de casa
(OLIVEIRA, 1995); alterações estas, oriundas das mudanças de ordem
sócio-político-econômico advindas do processo de urbanização.

Não concordando com a ideia de desestruturação da família,


principalmente quando ela aparece relacionada com o divórcio e a
separação, Goldani (1993, pp. 69-70) diz que:

78
FUESPI/ NEAD Pedagogia

(..) tal como outras instituições a família está no limiar de


mudanças importantes. Entretanto, isso não significa que
esteja, necessariamente, desaparecendo. Os argumentos
mais comuns, neste caso, giram em torno das mudanças nos
padrões de comportamento, desde o aumento de novos tipos
de uniões entre os sexos, declínio da fecundidade, aumento
das mães solteiras e de separações e divórcios, novos padrões
de sociabilidade e relações de gênero, até a participação de
mulheres, crianças e adolescentes no mercado de trabalho
formal e informal.

Outros fatores podem ser apontados como elementos para corroborar


o discurso em torno da crise da família, como os “modelos estereotipados”
de família que perpassam pela dicotomia: velho / novo; antigo / moderno;
família tradicional patriarcal e família de classe média urbana vista como
“uma família centrada ao redor das funções reprodutivas, onde a criança
ocupa um lugar destacado. Nesse modelo, o individualismo, a privacidade
e as relações afetivas entre os membros assumem maior relevância, dando
origem a novos padrões de sociabilidade.”; acrescentando elementos novos
à família patriarcal associada “à presença de parentes, há um sistema
hierárquico e de valores, no qual se destacariam a autoridade paterna e do
homem sobre a mulher, a monogamia, a indissolubilidade das uniões e a
legitimidade da prole.”( cf. GOLDANI, 1993, p. 70).

É importante salientar que na concepção de família de Goldani tanto


percebemos a presença hoje da família patriarcal, quanto, pelos elementos
adequados a essa família, da possibilidade de visualizarmos a família de
camada média urbana oriunda das modificações no meio urbano e das
exigências nesse de alterações na divisão sexual do trabalho criando
alternativas para as funções específicas dentro da família do ser pai, mãe,
pai e mãe ou vice-versa ao mesmo tempo no caso dos descasados, do ser
filho (a), do ser esposo (a).

Ao falar do modelo de família e das características básicas deste,


além do pensamento de Goldani,o de Durham (1983, p.33) leva em
consideração a relação família e parentesco, na qual as famílias são

79
Reflexões sobre Sociologia Aplicada à Educação

unidades sociais que “articulam relações de consanguinidade, afinidade e


descendência em núcleos de reprodução social” (DURHAM,1983, p. 27).
Na sociedade ocidental, culturalmente, define-se a família individual
moderna como família conjugal ou nuclear e, nesse sentido, assim como
Goldani (1993), Durham (1983, pp.30-33) aponta para o fato de que as
pessoas ao considerarem a família como “individual moderna” ou “nuclear”
estão se referindo a modelos ou padrões culturais ligados a família como
instituição.
Entrando no campo das representações coletivas percebo que as
representações são aceitas e reproduzidas por um dado grupo de acordo
com as “regras culturalmente elaboradas” pelo grupo em questão. Outra
característica dos modelos é o fato de serem maleáveis possibilitando
a resolução de vários problemas ao adequar-se aos diversos contextos
históricos, reforçando tanto com Durham, quanto com Goldani o fato de
que não há uma desestruturação da família como quer nos fazer crer o
senso comum.
Esclarecendo o termo representações coletivas utilizado por
Durkheim (1989) e mencionado acima por Durham (1983), temos que são
concebidas como crenças e sentimentos de um dado grupo.

Para chegar as representações coletivas e elaborar modelos,


como no caso da família, Durkheim observou que as representações são
construídas a partir de conceitos elaborados pelos indivíduos de um dado
grupo e esses conceitos depois de elaborados ganham autonomia por
retornarem aos indivíduos com características de exterioridade, coerção e
generalidade.

Para Durkheim (1989, p. 511) os conceitos se põem às representações


sensíveis de toda ordem- sensações, percepções ou imagens - pelas
seguintes propriedades:
As representações sensíveis encontram-se em fluxo perpétuo;
empurram-se umas às outras como as ondas de um rio
e, também enquanto duram, não permanecem iguais a si
mesmas. Jamais estamos seguros de fazer a experiência de
uma percepção tal como da primeira vez; porque se a coisa

80
FUESPI/ NEAD Pedagogia

percebida não mudou, nós é que não somos mais o mesmo


homem. O conceito, ao contrário, está como que fora do tempo
e do devir; resiste à mudança. É uma maneira de pensar que
cada momento do tempo é fixado e cristalizado. À medida
que é aquilo que deve ser, é imutável. Se muda, não é porque
faça parte de sua natureza mudar; é porque descobrimos nele
alguma imperfeição; é porque precisa ser retificado. O sistema
de conceitos com o qual pensamos na vida corrente é aquele
expresso pelo vocabulário da nossa língua materna; porque
cada palavra traduz um conceito.

Contudo as representações coletivas não são apenas conceitos


como disse Durkheim (1989), enquanto representações sensíveis também
são imagens, sendo que estas são concebidas conforme Moscovici
(1978, p.48) como uma “reprodução passiva de um dado imediato.” Nós,
sujeitos sociais, estamos o tempo inteiro apreendendo e aprendendo
coisas que acontecem à nossa volta, sempre atentos a tudo, mesmo que
inconscientemente através dos sentidos, em especial da audição, da visão
e do tato, enfim registrando um conjunto de sensações que depois de
apreendidas passam por um processo de maturação, elaboração interior
antes de retornar ao exterior como representações, a partir dos conceitos
utilizados para elaborá-los, levando em consideração a vivência ou não
dessas imagens apreendidas.

Segundo Moscovici (1978, p.48) imagens aqui são uma:


espécie de sensações mentais, de impressões que os objetos
e as pessoas deixam no nosso cérebro. Ao mesmo tempo, elas
mantém vivos os traços do passado, ocupam os espaços de
nossa memória para protegê-los contra a barafunda da mudança
e reforçam o sentimento de continuidade do meio ambiente e
das experiências individuais e coletivas.

Assim sendo, as imagens e os conceitos se inter-relacionam enquanto


elementos que ajudam a apreender e representar o mundo de cada indivíduo
- pessoa. E mais que representação, ajuda-nos a reapresentar esse mundo
de uma maneira diferente. Essa reapresentação está relacionada com a
apreensão das imagens e conceituação destas a partir dos vários olhares

81
Reflexões sobre Sociologia Aplicada à Educação

do mundo, de si e do outro através das lentes do conhecimento, da cultura


a qual cada indivíduo – sujeito social expressa.

Dessa forma, Moscovici (1978, pp. 48-54) chama atenção para o fato
de que toda “representação é uma reapresentação de alguma coisa”, cuja
função é a transformação do estranho em algo familiar, passando por dois
momentos: 1) a objetivação ou materialização, enquanto uma familiarização
com o que foi apreendido, tentando unir palavra à coisa –imagem e 2)
amarração enquanto conceitualização, classificação, denominação da
imagem- objeto. Após a objetivação e a amarração temos, como resultado
desses dois momentos, a estampagem como é chamado o processo final
da representação social.

No caso do conceito de família, ao ser objetivado e amarrado é


estampado, através da reapresentação, que a pessoa faz dele procurando
na memória, nas vivências conceituar família a partir de elementos que
compõem o modelo de família do grupo no qual a pessoa / sujeito social
está inserido mostrando o quanto de social está presente em algumas
manifestações individuais.

Pelo fato de utilizar o modelo de família elaborado culturalmente


qualquer alteração na formação de famílias concretas remete ao confronto
entre modelo e realidade, entre o que se tem enquanto família e o que se
deveria ter, causando sentimentos de falência, desestruturação da família.
Esses sentimentos são questionados por Durham (1983, p. 33) que coloca
dois pontos básicos para analisar em que medida essas variações da família
se contrapõem ao modelo de família culturalmente elaborado. O primeiro
ponto é a ênfase ao fato de que o conceito de família, mesmo estando
relacionado aos grupos sociais concretos, refere-se ao “modelo cultural e
à sua representação.” ; e o segundo ponto refere-se a conscientização de
que ao analisar o modelo de família devemos distinguir “a estrutura formal (
que define a composição do grupo)” da “organização das relações sociais,
que se dá em função dos padrões de divisão sexual (e etária) do trabalho,
uma vez que existe um certo grau de autonomia entre esses dois níveis.” O

82
FUESPI/ NEAD Pedagogia

conceito de família também é visto como parte de um todo maior chamado


de parentesco.

Os estudos de parentesco foram iniciados com Claude Lévi-Strauss


(1982) cuja principal contribuição foi a lei do incesto que, por sua vez,
instituiu os princípios do parentesco.

Além de Lévi-Strauss (1982) e Eunice Durham (1983), Ovídio de


Abreu Filho (1982) tem dado importantes contribuições aos estudos sobre
parentesco e comenta que depois de Gilberto Freyre poucos estudiosos da
instituição família tem se preocupado em considerar a família como parte
de um sistema mais amplo que é o de parentesco, remetendo os estudos
desta somente as características patriarcais apontadas por Freyre.

Abreu (1982, p. 97) propõe a possibilidade de nos seus estudos ir


construindo o sistema de parentesco a partir da “visão de que o parentesco
deve ser entendido como sistema simbólico não necessariamente
circunscrito ao parentesco biológico, nem a um domínio de parentesco
definido a priori”. Dessa forma, as categorias que Abreu tomou para guiá-lo
nas análises foram: o sangue, o nome de família e a raça.

Essas categorias foram definidas por Abreu (1982, pp. 98-105) como:
a) O sangue é pensado como substância transmissora de
qualidades físicas e morais, formando o corpo e o caráter. (..)
As relações de sangue, que definem quem é parente de quem,
que diferencia famílias, constituem a ‘natureza’ das famílias. (..)
O sangue dá conta de identidades familiares, de tipificações
individuais e da demarcação e diferenciação de famílias. Esta
análise mostra também a possibilidade de se pensar a hierarquia
social através de uma hierarquização via famílias. b) o nome
da família tal como o sangue, funciona como um operador que
correlaciona o indivíduo com a família, como um operador de
comparações entre famílias e como mediador da passagem da
condição de indivíduo à de pessoa. Pois, tal como o sangue,
o nome integra, implicitamente, na caracterização individual e
familiar, avaliações da posição de indivíduos e da família num
conjunto mais amplo de famílias. Deste modo, o nome de família
se constitui em categoria essencial para o estabelecimento de
um mapa sócio-moral. c) Raça é uma categoria polissêmica.
Seus significados articulam-se, no entanto, em torno da ideia
de hereditariedade. (..) As famílias são pensadas enquanto

83
Reflexões sobre Sociologia Aplicada à Educação

raças, isto é, como um todo de ascendentes e descendentes


que se diferencia de outros por qualidades próprias perpetuadas
pela hereditariedade. Raça-família é outra categoria referente
à consanguinidade e é utilizada para demarcar as qualidades
e fronteiras de um universo consangüíneo. Congruentemente
com a lógica da categoria sangue, as características de uma
raça-família podem ser observadas no plano físico, na moral
e nos comportamentos. Um tipo de olho, um andar, uma
disposição de vida - alegre, honesta, brava, descontraída,
desconfiada, sistemática etc.- podem ser elementos utilizados
para a caracterização de uma raça-família.

Com base nas categorias criadas por Abreu (1982), Goldani (1993)
e Durham (1983) sobre família e parentesco foram feitas as análises dos
dados referentes aos conceitos de família obtidos nas entrevistas com
os informantes constituindo a segunda parte da minha dissertação de
Mestrado.

Neste primeiro momento, foi feito um passeio pelos conceitos e


teorias sobre família, passando agora, num segundo momento, aos estudos
sobre o casamento, considerando ambos partes do sistema de parentesco.
E sobre este...

“..PRECISO NÃO DORMIR ATÉ SE CONSUMAR O TEMPO DA


GENTE..PROMETO TE QUERER ATÉ O AMOR CAIR, DOENTE..
DOENTE..” (Chico Buarque)

Retomando Murdock (1965) na distinção que ele faz entre família e


casamento, o casamento consiste em “(..) um complexo de costumes que dizem
respeito às relações do casal de adultos, sexualmente associados no interior da
família(..).” Nesse caso, o casamento enquanto uma relação de afinidade e
aliança, não somente entre o casal mas entre as famílias e grupos de amigos
dos cônjuges, possui algumas regras que vão reger o comportamento dos
indivíduos, oriundas de mais um status assumido por cada um de esposo e de
esposa nesse ritual de passagem da vida de solteiro para a de casado ( Lévi-
Strauss (1982); Fox (1986); Gennep (1977); Velho (1986) ).

84
FUESPI/ NEAD Pedagogia

O casamento favorecendo a aliança entre duas pessoas e suas


respectivas famílias como parte do sistema de parentesco era e ainda é
regido pela lei do incesto e, em caso de violação dessa lei e da impossibilidade
de procriação, dissolvido.

Havendo a separação, cancelava-se o contrato e outro casamento


era providenciado. Por exemplo, antes da intervenção da igreja, um pouco
antes da Idade Média na Europa, os casamentos eram realizados pela
aristocracia, sendo antecedido pela troca de dotes e pacto conjugal. A
virgindade da mulher era um bem precioso incluso no valor dos dotes. As
cerimônias eram de caráter privado e realizavam-se nos Castelos onde
eram registradas pelos escribas. Não possuíam um caráter universal
porque nem todos precisavam se casar e nem indissolúvel, uma vez que a
aliança seria rompida em casos como: impotência sexual- incapacidade de
procriar, incesto, dentre outros (Ariés (1987); Chauí (1991) ).

O casamento passa a ser considerado um sacramento, tornando-


se indissolúvel e universal posterior à intervenção da igreja Católica, em
meados dos séculos IX e XII. A partir desse momento, o casamento passou
a ser realizado dentro da igreja, pelo padre, bispo, e com o consentimento
dos cônjuges, tornando-se agora aliança entre os cônjuges e Deus através
da celebre frase, “o que Deus uniu o homem não separa.” ( Ariés, 1987)

Desde o século XII com o casamento como sacramento, aliança e


contrato em que era dado aos nubentes, conforme dito anteriormente, a
possibilidade de decidirem pelo casamento ou não, o sentimento de amor
torna-se expressivo, antes era permitido apenas o “amor sagrado” deixando a
arserotica fora da relação conjugal. O prazer era visto como algo pecaminoso,
chamavam-no de “amor profano”, e portanto, não poderia fazer parte da
aliança sagrada entre Deus e os cônjuges. Afinal, segundo a igreja católica,
Deus é onipresente, onisciente e onipotente e sempre está vigiando o seu
rebanho. Nesse processo de vigiar e punir a mulher casada não podia sentir
prazer, servindo o sexo exclusivamente para a procriação, fazendo com que
o homem procurasse o prazer com outras mulheres, ou seja, fora da relação
conjugal ( Ariés (1987); Giddens (1993); Foucault (1992)).

85
Reflexões sobre Sociologia Aplicada à Educação

Sabendo como foi pensado o casamento antes da intervenção da


Igreja Católica e depois dessa, entende-se o processo de divisão sexual do
trabalho colocando a mulher no âmbito da casa e o homem no âmbito da
rua, incluso porque até meados da década de 60 no Brasil as mulheres eram
criadas para serem boas mães, donas de casa e boas esposas também,
assim como mulheres conscientes de que ao homem tudo é permitido,
inclusive, no casamento, dar umas “escapadinhas” e ter casos de vez em
quando.

Na década de 30, a mulher começa a se posicionar na esfera política


através da conquista ao direito de voto (apesar do voto ser restrito
as mulheres que não trabalhavam fora do espaço da casa) e nas
décadas de 50-60 algumas começam a trabalhar fora de casa, todavia a
predominância continuava sendo o casamento e a constituição de uma
família no Brasil.
Contudo, na década de 90 tanto a mulher quanto o homem começaram
a se preocupar primeiro em ter uma profissionalização, terminar seus
estudos, conseguir emprego para, somente depois, pensar em casamento
(OLIVEIRA, 1998).

Percebem-se assim mudanças no pensar os relacionamentos


expressas também no modo como os casais compartilham os seus desejos
e anseios, posicionando-se sobre o que querem abertamente um com outro.

Mudanças essas, vislumbradas na importância que era dada ao


casamento oficial e atualmente dada ao relacionamento marital que pode
estar dentro do casamento oficial ou não (OLIVEIRA, 1998).

O termo relacionamento, segundo Giddens (1993, pp. 68-69), passa


a significar:
(..) um vínculo emocional próximo e continuado com
outra pessoa, só chegou ao uso geral em uma época
relativamente recente. Para esclarecer o que está em jogo
aqui, podemos introduzir a expressão relacionamento puro
para nos referirmos a este fenômeno. Um relacionamento
puro não tem nada a ver com pureza sexual, sendo um
conceito mais restritivo do que apenas descritivo. Refere-

86
FUESPI/ NEAD Pedagogia

se a uma situação em que se entra em uma relação social


apenas pela própria relação, pelo que pode ser derivado
por cada pessoa da manutenção de uma associação
com outra, e que só continua enquanto ambas as partes
considerarem que extraem dela satisfações suficientes, para
cada uma individualmente, para nela permanecerem. Para
a maior parte da população sexualmente ‘normal’, o amor
costumava ser vinculado à sexualidade pelo casamento,
mas agora os dois estão cada vez mais vinculados através
do relacionamento puro. (..) O relacionamento puro é parte
de uma reestruturação genérica da intimidade.

Ariés (1987), no Antigo Regime Europeu, nos mostra uma concepção


de casamento, em dois momentos, no primeiro é um contrato; no segundo
momento este vai sendo encoberto pelo amor no casamento, embora o
prazer não esteja incluso, o que foi chamado de amor romântico. A intimidade
que inexistia em decorrência da não distinção entre público e privado passa
a existir no século XVIII na Europa, ou pelo menos começa a dar os seus
primeiros passos através da visão de casa enquanto lar, espaço privado e
que por sua vez é o espaço da mulher e a rua do domínio público, espaço
eminentemente masculino.

Para Freyre (1981), no Sistema Colonial no Brasil as relações entre


o homem e a mulher que Parker (1991) chamou de hierarquia de gênero
continuavam a reproduzir o modelo europeu do período feudal com o apoio
da igreja católica.

Posteriormente, chegando a década de 90 podemos dizer que,


dentre outras interpretações referentes ao casamento, a saída da mulher
do espaço privado, mesmo que não completamente, ocasionou uma
mudança na sua relação marital, oriunda da sua independência financeira,
da conquista de um espaço no âmbito público propiciando uma igualdade
maior entre homem e mulher (OLIVEIRA, 1998).

Portanto, chega-se ao que Giddens (1991), conforme dito


anteriormente, chamou de relacionamento puro em contraposição
a hierarquia de gêneros trabalhada por Parker (1991, p. 58) e, sobre a
hierarquia de gêneros, tem-se que:

87
Reflexões sobre Sociologia Aplicada à Educação

O homem e a mulher e, por extensão, os próprios conceitos


de masculinidade e feminilidade foram assim definidos, em
termos de sua oposição fundamental, como uma espécie de
tese e antítese. Com o poder investido inteiramente em suas
mãos, o homem era caracterizado em termos de superioridade,
força, virilidade, atividade, potencial para violência e o legítimo
uso da força. A mulher, em contraste, em termos de sua
evidente inferioridade, como sendo em todos os sentidos o
mais fraco dos dois sexos - bela e desejável, mas de qualquer
modo sujeita à absoluta dominação do patriarca. Esta extrema
diferenciação carregava consigo um dualismo moral explícito
que contribuiu para legitimar e reforçar a ordem aparentemente
natural da hierarquia de gênero (..).

Embora, ainda se perceba um reforço dado à hierarquia de gênero


apontada por Parker ( 1991), repassada pela mãe, babá ou responsável
pelo processo de socialização da criança, com a saída da mulher para o
âmbito da rua conquistando a sua independência financeira os valores vão
aos poucos sendo alterados, começando a ser prezado no relacionamento,
segundo Giddens (1993) a igualdade de deveres, tarefas que aos poucos
vão modificando o padrão de comportamento e as mútuas obrigações
dentro do relacionamento marital e, consequentemente, com relação aos
filhos vão alterando o seu processo de socialização, a sua “criação”.

Porém, se no relacionamento as duas pessoas envolvidas não


conseguem mais extrair dele “satisfações suficientes” para mantê-lo,
ocasionado por uma ruptura do padrão de conduta e das obrigações
assumidas, enfim ruptura do contrato por um dos cônjuges no caso do
casamento oficial ou companheiros no caso da união consensual ocorre
a separação. Esta passa a ser vista como elemento de desestruturação
por fazer as pessoas repensarem suas vidas, os seus projetos feitos antes
do casamento e durante o casamento tentando contabilizar as perdas
e os ganhos em cada relação onde algumas só veem perdas. Outras
pessoas sentem a separação como um alívio quando sentem que houve
ganhos na relação, aprenderam com ela, mas conseguiram extrair o que
podiam e quando não havia mais satisfação, mas somente dor, cobrança,
desconfiança, acusações então optam pela separação como alívio das

88
FUESPI/ NEAD Pedagogia

tensões e não um mal necessário, relembrando os projetos feitos, alguns


parcialmente realizados outros completamente concretizados, antes e
durante o casamento para as próximas relações ( Velho (1981, 1986),
Giddens (1991)).

Falando em projetos o que se entende como tal? Projeto na


concepção de Gilberto Velho (1981, p. 26) consiste na elaboração de
diretrizes que são traçadas para atingir um determinado fim. Esses projetos
são “elaborados em função de experiências socioculturais, de um código,
de vivências e interações interpretadas.” Portanto, o fim ou objetivo que se
pretende atingir pode ser algo individual, parte das vivências e interações
que foram interpretadas com certa particularidade e peculiaridade que torna
o projeto almejado, algo seu, próprio como é o caso de ter como projeto
individual o desejar ser uma excelente profissional na sua área, para isso
é preciso esforço, dedicação, perseverança antes de pensar em desistir de
tudo e mudar de área, profissão. Outros teriam como projeto individual o
casar, ter filhos ser uma ótima esposa, mãe dedicada e excelente dona de
casa. Outros ainda teriam como projeto individual como na música o “ter
uma casinha branca, um quintal de mato verde pra plantar e pra colher..”.

Observa-se que o que foi exposto como projeto individual não é


de todo tão individual assim, pois quando se diz “outros” significa que no
coletivo o individual está presente e vice-versa. Como assim? É que ao
desejar algo tem-se em mente, via socialização o que dentro da sociedade,
do grupo é valorizado, é visto como sucesso, realização pessoal, felicidade,
amor e todas as conquistas que cada um enquanto indivíduo terá como fim
a atingir.

Por isso, percebe-se nos exemplos acima que, o que está posto
como “individual” é na realidade “coletivo”, tornando-se mais que um projeto
individual um projeto coletivo / social.

O sujeito enquanto membro de um dado grupo absorve os


valores desse grupo e todo o seu comportamento passa pelo padrão
de comportamento estipulado pela sociedade e os vários grupos que

89
Reflexões sobre Sociologia Aplicada à Educação

a constituem o que possibilita uma diversidade, uma pluralidade de


comportamentos. Por exemplo, quantas vezes ao não conseguir realizar a
contento uma tarefa ou atividade fica-se chateado como se fosse a única
pessoa no mundo a ficar assim? Contudo, ao socializar os sentimentos e
fatos com outros se ouve o: “não te preocupa eu já passei por essa mesma
situação”; então, a pessoa percebe que não está tão só quanto pensava.

O fato, nesse exemplo, é que realmente a situação pode ter sido


vivida por várias pessoas que pertencem ao mesmo grupo, mas cada
indivíduo sentiu de uma maneira diferente, agiu e reagiu de uma maneira
que detectou no coletivo um quê de individual no fato. Como diz Geertz
(1989) jamais pode-se ser o outro ou falar por ele, o que se pode fazer é
conhecendo o outro e conversando com ele e com o seu grupo, assim como
observando-os, tentar nas interpretações uma aproximação ao máximo do
significado dado por cada um deles no intuito de compreendê-los para não,
obrigatoriamente, aceitá-los, mas respeitá-los nas suas diferenças.

Resumindo o que foi visto até aqui, tem-se que: em primeiro lugar
foram vistos os estudos sobre família que corroboram com a minha visão de
uma não desestruturação da família em decorrência das separações, dos
divórcios, dos arranjos familiares existentes; em segundo lugar, abordou-se
o casamento observando como é visto enquanto aliança, parte do sistema
de parentesco e suas ressignificações; e enquanto parte de um dos
sacramentos criados pela igreja, controlador da sexualidade e legitimador
da procriação.

Cabe salientar também a importância das representações sociais


de família, casamento, relacionamentos contidos nos projetos individuais
e coletivos, na visão da aliança estabelecida com o casamento que
as pessoas, têm e do que gostariam de ter, seja o casamento oficial ou
não e que ajudam as pessoas a verem a separação como elemento de
desestruturação da família ou como parte da dinâmica desta. No próximo
item será verificado como a separação e o divórcio foram implantados no
Brasil e quais as suas repercussões no contexto da família.

90
FUESPI/ NEAD Pedagogia

“... PREFIRO ENTÃO PARTIR A TEMPO DE PODER DA GENTE SE


DESVENCILHAR DA GENTE..” (Chico Buarque)

Partindo para as separações, estas começam a surgir desde a


primeira República no Brasil, mas ainda não haviam sido legalizadas,
dando origem a mulheres chefes de família e aos arranjos familiares como
o concubinato, hoje chamado união consensual. Nesse ínterim, o Brasil
como um país eminentemente católico se posiciona contra as separações e
dificulta ao máximo a implantação do divórcio no país. Proibições impostas
pela igreja e que corroboram para o não ao divórcio estão ligadas a não
virgindade e a sexualidade. Segundo Parker (1991, p. 15):
Desde o início do período colonial até os nosso dias, um
sistema de proibições religiosas relativamente formal, se bem
que nem sempre inflexível, reforçou as divisões de gênero
e, ao mesmo tempo, ampliou o significado implícito das
próprias práticas sexuais, envolvendo-as numa economia
simbólica diferente, questionando-as em termos não apenas
de seus significados na vida cotidiana normal, mas de suas
repercussões na vida eterna.

Assim, mesmo que houvesse mudanças propiciadas pelas exigências


de um contexto histórico, ainda era percebida a continuidade de valores,
de um padrão de comportamento, como parte das mútuas obrigações
assumidas pelos nubentes ao contraírem casamento efetuando uma aliança
social mais forte que possíveis vontades individuais de mudanças, uma vez
que os nubentes como sujeitos sociais também compactuam e expressam
vontades coletivas sobre o que querem e o que seja o casamento.

Portanto, antes de falarmos sobre as separações e os divórcios no


Brasil, faremos um breve resgate histórico do divórcio começando pelo
significado do termo até a sua implantação na Europa e em outros países,
chegando enfim ao Brasil.

Roderick Phillips (1991) é um estudioso da instituição família, mais


especificamente das separações e do divórcio. Ele escreveu um livro
chamado: Untying the Knot. A short History of Divorce( Desatando os laços.

91
Reflexões sobre Sociologia Aplicada à Educação

Uma breve História do Divórcio). Utilizarei alguns dados registrados por


Phillips no seu livro nesse primeiro momento.

A palavra divórcio pode ser usada de várias formas podendo


significar total dissolução de um contrato validado ou casamento celebrado.
Documentos em latim da Igreja Católica estavam se referindo com
frequência a divortium a vinculo matrimonii (divórcio do laço matrimonial) e é
dessa maneira que o divórcio permitiria que homens e mulheres casassem
novamente se a igreja autorizasse. A confusão encontra-se no fato de que
as palavras divortium e divórcio foram usadas de duas outras maneiras
enquanto anulação e separação do casamento. A anulação é diferente
do divórcio porque enquanto o divórcio dissolve o vínculo matrimonial /
casamento que existia possibilitando aos cônjuges contraírem um novo
casamento, a anulação apenas vai atestar que o casamento não houve, é
como se os ex-cônjuges nunca tivessem se casado (PHILLIPS, 1991, p. 2).

Deve-se dizer que utilizei na minha dissertação divórcio como hoje


é concebido, qual seja como dissolução total do vínculo matrimonial,
permitindo aos ex-cônjuges contraírem novos casamentos.

A Igreja Católica, no Concílio de Trento, considerou o casamento


como sacramento e, portanto indissolúvel, sendo anulado apenas nos
casos de incesto, não capacidade de procriação conforme vimos com Ariés
(1987). A Doutrina Protestante veio combater a indissolubilidade do vínculo
matrimonial e o celibato pregados pela doutrina Católica através de Martin
Luther e Jonh Calvin. Os reformadores diziam que os católicos deveriam
seguir a Bíblia e observar o conjunto de impedimentos que existem e que
podem anular imediatamente o casamento, tais como: em primeiro lugar
a impotência sexual e o casar sem consciência do que se está fazendo e
em segundo o incesto. Martin diz com relação a impotência sexual que a
mulher procure o irmão do marido em segredo e tenha com ele relações
sexuais para que fique tudo em família e a anulação não seja efetuada
(PHILLIPS, 1991, p. 13).

92
FUESPI/ NEAD Pedagogia

Na Europa como um todo e na Inglaterra a implantação do divórcio


não foi tão fácil como podemos presumir. Na Inglaterra enquanto o divórcio
não era permitido foi registrada a primeira venda de esposa em 1533,
relatada esporadicamente no século XVII. Até o século XVIII, foram relatados
mais de 387 casos de esposas que haviam sido vendidas, e outros casos
semelhantes em outros países como a Escócia, Irlanda, França. Phillips
(1991, pp. 85-91) nos diz que havia tantos casos de vendas de esposas
quanto de divórcios em meados dos séculos XVIII e XIX. Além de vendas
de esposas, havia também esposas que matavam os maridos por conta
de abusos e maltratos. Outras se suicidavam. Enfim, petições de divórcio,
assassinatos, suicídios, bigamia, separações, vendas de esposas foram
elementos que levaram a legalização do divórcio na Europa e Inglaterra.

No século XVIII, a economia era basicamente familiar. Todos os


membros de uma família trabalhavam em prol do crescimento da pequena
empresa doméstica. A separação acarretava muitas vezes a morte de um
dos ex-cônjuges que, após ficarem viúvos, tratavam de conseguir outro
casamento, o mais rápido possível, para dar continuidade à empresa e
fortalecer novamente os laços de parentesco existentes (PHILLIPS, 1991,
p. 109-110).

No século XIX, houve a introdução do casamento civil na Europa,


procurado principalmente pelas pessoas que haviam se separado ou
divorciado e queriam casar novamente. Na Inglaterra, o divórcio foi
estabelecido em 1857, provocando alterações nas restrições legislativas
que havia nas colônias. O divórcio não foi tão repugnante para a lei Inglesa,
uma vez que o governo não foi somente capaz de legalizá-lo como também
encorajar as pessoas a realizá-lo. Nos Estados Unidos, por sua vez, após
a legalização em 1860 e após a guerra civil, a América estava sendo
conhecida como uma nação que possuía uma baixa moral e cuja vida
familiar era frágil pelo alto índice de divórcios (PHILLIPS, 1991, p. 137).

Percebe-se que em todos os lugares em que a separação e


o divórcio foram sendo implantados, criando alterações na estrutura

93
Reflexões sobre Sociologia Aplicada à Educação

organizacional da sociedade em questão, algumas pessoas tiveram, no


início, uma rejeição à lei, como se esta lei estivesse provocando um estado
anormal dentro de uma ordem pré-estabelecida; ordem e desordem que
nos lembram os estudos de Durkheim sobre o normal e o patológico dentro
de um dado grupo. Essa aparente ordem estava em conflito uma vez que
as leis não mais serviam as necessidades do grupo. Ao mesmo tempo, a
mudança causa medo, é o novo que surge alterando as leis que, embora
obsoletas, faziam parte da vida das pessoas através da naturalização
destas via processo de socialização. Essa naturalização faz com que,
mesmo que o grupo sinta a necessidade da mudança, esta provoque uma
reflexão no grupo levando-o a alterar a sua ordem interna, mexendo com
tudo o que acreditavam e defendiam como correto como, por exemplo, o
conceito de família, causando então um sentimento de desestruturação.
Sentimento esse que é passado pelos membros de um dado grupo, como
aconteceu nos Estados Unidos e nos outros países e hoje ocorre no Brasil,
onde se encontra dentro de um grau de patologia aceitável pelo grupo em
decorrência da mudança na legislação com a implantação do divórcio para
recuperar a ordem existente no âmbito familiar.

A lei do divórcio com o passar do tempo vai sendo incorporada pelo


grupo e sendo colocada em prática fazendo com que o que antes era estranho
passe a ser familiar e assim ela vai ganhando cada vez mais força, sendo
implantada em quase todo o Ocidente em meados do século XX.

Nesse século, um destaque especial foi dado à década de 60 por ter


sido um período de repensar o casamento e outros valores que não faziam
parte dele, como por exemplo: o amor romântico, a intensidade emocional
e satisfação sexual que antes estavam associados a relações pré-maritais
ou extraconjugais.

A década de 60 foi um período em que as pessoas começam a esperar


mais do relacionamento marital / da relação conjugal. Nessa relação, é dada
uma ênfase maior à necessidade de intimidade, companheirismo e amor. Há
uma exigência maior entre os casais que começam a esperar mais um do outro

94
FUESPI/ NEAD Pedagogia

(PHILLIPS, 1991, p. 246). É o surgimento do relacionamento puro dentro da


transformação da intimidade, também estudado por Giddens ( 1993).

Nas décadas seguintes 70, 80, Phillips (1991, p. 247) diz que a
familiaridade com o divórcio tornou as pessoas mais tolerantes com os
divorciados, passando a incorporá-los ao grupo sem as estigmatizações
que havia anteriormente, principalmente, com relação à mulher. Nos
Estados Unidos, a mídia passou a incorporar o divórcio como parte da
dinâmica familiar tanto através das músicas com “o tema ‘The legal Boys’
( ‘Os garotos legais’) de Elton Jonh, ‘Scenes from an ItalianRestaurant’
(‘Cenas de um Restaurante Italiano’) de Billy Joel”; quanto através da
incorporação do divórcio à subcultura de serviços que incluem: “festas de
divórcios, bolos de divórcio, cartões de divórcio com expressões típicas:
‘Eu ouvi dizer que ... você está livre como um pássaro’”.

Ainda nesse século, temos, tanto na Europa como nos Estados


Unidos, o divórcio sendo aceito e discutido como parte integrante da
dinâmica familiar, conforme visto anteriormente em Roderick. Na França,
Martine Segalen (1986, p.157) manifesta-se sobre o divórcio dizendo que:
O divórcio agora é comum, aceito e normal, e crescentemente
visto como um alívio das tensões familiares. Levando o paradoxo
um pouco mais adiante, alguém pode dizer que é um sinal de
saúde da instituição da família. (Tradução de Márcia Oliveira) 1

Após esse retrospecto da história das separações e divórcios em


alguns países do Ocidente, passa-se à história das separações e do divórcio
no Brasil.
Enquanto em outros países vimos que o divórcio e as separações
datam de mais de cem anos, no Brasil é, relativamente, recente, pois a lei
do divórcio foi implantada neste país no final da década de 70 e início da
década de 80.

1
“Divorce is now common, accepted and normal, and increasingly seen as a release from family
tensions. To push the paradox a little further, one could say that it is a sign of the health of the
institution of the family.”( SEGALEN, 1986, p. 157)

95
Reflexões sobre Sociologia Aplicada à Educação

No Período Monárquico, no Brasil, até aproximadamente o ano


de 1889, a Igreja Católica e o Estado andavam juntos possuindo apenas
um tipo de casamento - o religioso. Contudo, após a Monarquia, com a
implantação da República, houve separação do Estado e da Igreja, sendo
instituído pelo Decreto n.º 181, o casamento civil, em 24 de janeiro de 1890.
Posteriormente, em 1937,através da Lei n.º 379, o casamento religioso
passou a ser admitido para efeitos civis (LEVENHAGEN, 1995, p. 18).
Na Primeira República, em São Paulo, com o advento da
industrialização no Brasil, começa a haver modificações no âmbito
doméstico, pois a mulher começa a conquistar seu espaço no âmbito público,
trabalhando dentro e fora de casa. As empresas domésticas faziam parte
da economia brasileira nesse período. Os conflitos entre casais terminavam
dando origem a separações que, em muitos casos, beneficiavam a esposa,
pois a separação era litigiosa, não amigável, fazendo com que ao comprovar
que o seu marido não estava de posse de suas faculdades mentais a mulher
conseguia a separação e assumia a empresa, transformando-se em chefe
da casa (SOUZA, 1992). Cabe salientar que o termo divórcio, utilizado
nesse período, apontado nos estudos de Sousa (1992) foi empregado de
maneira equivocada, porque o que chamavam de divórcio, é o que hoje
chamamos de separação judicial litigiosa, uma vez que a separação não
era consensual, havia disputa pelos bens e não permitia que os ex-cônjuges
contraíssem novo casamento.

Como no Brasil até a década de 70, não havia sido implantado o


divórcio ou a dissolução do vínculo conjugal, a situação é alterada pela
Carta Magna de 1967, que estabelece o Desquite, separação legal de bens
e de corpos, podendo ser este, consensual ou litigioso, permanecendo os
ex-cônjuges “casados - separados”. Com o Desquite, começam a surgir
novas uniões, à margem da lei, denominadas de concubinato que, após
a Emenda Constitucional de 1988, passaram a ser conhecidas como
uniões consensuais, assim como o desquite passou a ser concebido como
separação judicial.

96
FUESPI/ NEAD Pedagogia

A luta pela implantação do divórcio no Brasil segundo Caldas (1984)


começou com o envio de vários projetos de emenda constitucional ao
Congresso Nacional pelo senador Nelson Carneiro em 1976. Esses projetos
não foram aprovados por falta de quorum. Contudo, no ano seguinte, em
28 de junho de 1977, após alguns tumultos a Emenda Constitucional foi
aprovada pelo Congresso Nacional nos seguintes termos:
Emenda Constitucional n.º 9, de 28 de junho de 1977.
As MESAS DA CÂMARADOS DEPUTADOS E DO SENADO
FEDERAL, nos termos do art. 49 da Const. Federal,
promulgam a seguinte Emenda no texto Constitucional:

Art. 175.-

§ 1º O casamento somente poderá ser dissolvido, nos


casos expressos em lei, desde que haja prévia separação
judicial por mais de três anos.

Art. 2º A separação, de que trata o § 1º do art. 175 da


Const. poderá ser de fato, devidamente comprovada em
Juízo, e pelo prazo de cinco anos, se for anterior à data
desta Emenda.

Brasília, 28 de junho de 1977” (CALDAS, 1984, p. 45)

Os senadores Nelson Carneiro e Acciolli Filho apresentaram quase


um mês após a aprovação da emenda um projeto de lei composto de 54
artigos em 24 de agosto de 1977. Segundo Caldas (1984, p. 44), esse projeto
foi aprovado pelo Senado Federal com várias discussões e posteriormente
enviado à Câmara dos Deputados, onde havia vários antidivorcistas, para
revisão. O projeto Carneiro-Acciolli, apesar das dificuldades, foi aprovado
pelo Congresso no dia 3 de dezembro de 1977, com a eliminação da
expressão “doença contagiosa” referindo-se ao divórcio. Os “antidivorcistas”
não se sentindo convencidos da derrota queriam que fosse incluso no
projeto o limite do pedido de divórcio a somente uma vez, o que não foi
aprovado. No dia 5 de dezembro de 1977, a lei foi aprovada e enviada ao
executivo e, no dia 26 de dezembro de 1977, o Presidente da República
sancionou a lei n.º 6.515, publicada no Diário Oficial da União do dia 27 de
dezembro de 1977 constando no Código de Processo Civil (1984, p. 187)
nos seguintes termos:

97
Reflexões sobre Sociologia Aplicada à Educação

LEI N.º 6.515, DE 26 DE DEZEMBRO DE 1977

Regula os casos de dissolução da sociedade conjugal e


do casamento, seus efeitos e respectivos processos, e dá
outras providências.

O Presidente da República,

Faço saber que o Congresso Nacional decreta e eu


sanciono a seguinte lei:

Art. 1º A separação judicial, a dissolução do casamento, ou


a cessação de seus efeitos civis, de que trata a Emenda
Constitucional n.º 9, de 28 de junho de 1977, ocorrerão
nos casos e segundo a forma que esta Lei regula.

Brasília, em 26 de dezembro de 1977; 156.º da


Independência e 89.º da República

ERNESTO GEISEL

Com a aprovação da lei do divórcio no Brasil, a família passou a ser


considerada na Constituição Brasileira (1988, p. 147) como:
Art. 226. A família, base da sociedade, tem especial proteção
do Estado.
§ 1º O casamento é civil e gratuita a celebração.

§ 2º O casamento religioso tem efeito civil, nos termos da


lei.

§ 3º Para efeito da proteção do Estado, é reconhecida a


união estável entre o homem e a mulher como entidade
familiar, devendo a lei facilitar sua conversão em
casamento.

§ 4º Entende-se, também, como entidade familiar a


comunidade formada por qualquer dos pais e seus
descendentes.

§ 5º Os direitos e deveres referentes à sociedade conjugal


são exercidos igualmente pelo homem e pela mulher.

§ 6º O casamento civil pode ser dissolvido pelo divórcio,


após prévia separação de um ano nos casos expressos
em lei, ou comprovada separação de fato por mais de dois
anos.

98
FUESPI/ NEAD Pedagogia

Pode-se perceber, com a implantação da lei do divórcio, que as


relações no âmbito familiar passaram a ser mais flexíveis, priorizando a
igualdade de direitos e deveres entre o homem e a mulher, podendo esta
responder pela casa na ausência do marido ou no caso da separação
ao assumir também a posição de chefe da casa. Legalizando assim, a
situação das mulheres e dos homens que já estavam separados de fato ou
judicialmente.

Quando o art. 226 § 4º reza que é considerado como entidade


familiar qualquer dos pais (ou o homem ou a mulher) e seus descendentes,
entende-se que podem ser enquadrado nesses casos as mães solteiras,
os pais separados e quem ficou responsável pela guarda dos filhos, enfim,
a lei começa a englobar os diversos arranjos familiares vindo a corroborar
com o que antes falávamos sobre não desestruturação da família, mas
adequação do modelo à realidade da sociedade.
Contudo, tem-se que considerar que, após implantada uma lei e
entrando esta em vigor, isso não significa que todo um grupo maior vá
aderir e aceitar passivamente o que está sendo posto, afinal o processo de
normalização e naturalização do divórcio até que venha a ser considerado
normal, juntamente com os arranjos familiares leva um certo tempo como o
foi em outros países. O que vem a explicar a discriminação, o preconceito
pelo qual os descasados, aqui considerados como os separados de fato,
judicialmente e divorciados sentiram e passaram num primeiro momento
com grande intensidade, principalmente no que se refere à discriminação
com relação a mulher descasada, e num segundo momento, não com tanta
intensidade mas de forma mais amena em decorrência da naturalização
com que são vistos o divórcio e as separações.

Quando falo em discriminação e preconceito, estou me referindo ao


que é visto como o diferente do padrão aceito normalmente em um dado
grupo. O diferente faz o grupo refletir sobre suas ações e seus valores,
levando-os a repensar seus comportamentos ora ratificando-os ou, ora
retificando-os, como é o caso de pessoas que são separadas dentro de um
grupo que prioriza a família e tem o casamento como indissolúvel.

99
Reflexões sobre Sociologia Aplicada à Educação

Quando pensamos em discriminação, preconceito e estereótipos


criados por grupos tidos como diferentes, trabalhamos com o que Goffman
(1988) chama estigma. A estigmatização ocorre segundo Goffman (1988, p.
12) quando:
(..) o estranho está à nossa frente, podem surgir evidências de
que ele tem um atributo que o torna diferente de outros que se
encontram numa categoria em que pudesse ser incluído, sendo,
até de uma espécie menos desejável - num caso extremo, uma
pessoa completamente má, perigosa ou fraca. Assim, deixamos
de considerá-lo criatura comum e total, reduzindo-o a uma
pessoa estragada e diminuída. Tal característica é um estigma,
especialmente quando o seu efeito de descrédito é muito grande -
algumas vezes ele também é considerado um defeito, uma fraqueza,
uma desvantagem - e constitui uma discrepância específica entre a
identidade social virtual e a identidade social real.

Assim que o divórcio foi implantado no Brasil, ser divorciado na


década de 80 era um desafio posto aos ex-cônjuges dispostos a enfrentar
o estigma, que viria, de que pessoas separadas não são pessoas
respeitáveis. Por exemplo, com relação à mulher, ela deixa de ser a
Senhora e passa a ser vista como a mulher disponível, vulnerável e com
relação ao homem se é separado então “fez algo de errado”, “não é um
homem sério”. Para a mulher mostrar sua seriedade, algumas privavam-
se de terem outros relacionamentos permanecendo solteiras e dedicada
a sua casa, ao seu trabalho e aos seus filhos. Cabe salientar que não só
os descasados passam por questionamentos nessa década, mas a própria
família, enquanto instituição / modelo também, bem como as relações entre
pais e filhos começam a passar por reflexões dentro desse contexto de
transformação (SALEM, 1980).

No final da década de 80 e início da de 90, as pessoas ainda não


aceitavam de todo a separação e o divórcio, mas a mídia começava a
criar discussões sobre o caso em novelas, programas de televisão que
propiciavam debates sobre as dificuldades pós-separação, mães solteiras,
crises nos valores familiares, relação entre pais e filhos e a sexualidade.
Tania Zagury, em 1993, lançou um livro sobre as dúvidas que são colocadas
pelos pais sobre a melhor maneira de lidar com os filhos, chamado Sem

100
FUESPI/ NEAD Pedagogia

Padecer no Paraíso: Em defesa dos Pais ou sobre a Tirania dos Filhos.


Outros autores começam a se interessar pelas temáticas voltadas cada
vez mais ao indivíduo, a valores como o amor, o ciúme, livros de autoajuda
sobre as artes de amar, conquistas e reconquistas de um relacionamento,
do outro e de si, dentre outras temáticas, como por exemplo: Repressão
Sexual essa nossa (des) conhecida da Marilena Chauí (1991), Casamento
Término e Reconstrução de Maria Tereza Maldonado (1991), O segredo
do amor eterno de John Powell (1992), Mulher Solteira, do estigma a
construção de uma nova identidade de Nádia Amorim (1992), A mulher
emergente, uma experiência de vida de Natalie Rogers (1993), Encontros,
desencontros e reencontros de Maria Helena Matarazzo (1996), Ciúme de
Wimer Botura júnior (1997) dentre outros.

Sobre o amor, Giddens (1993, pp. 72-74) diz que:


Na época atual, os ideais de amor romântico tendem
a fragmentar-se sob a pressão da emancipação e a
autonomia sexual feminina. O amor romântico depende
da identificação projetiva, da identificação projetiva do
amourpassion, como o processo pelo qual os parceiros
potenciais tornam-se atraídos e, então, unem-se. A
identificação projetiva vai contra o desenvolvimento de um
relacionamento cuja continuação depende da intimidade. A
abertura de um em relação ao outro, condição para o que
chamaremos de amor confluente. (..) O amor confluente
é um amor ativo, contingente, e por isso entra em choque
com as categorias ‘para sempre’ e ‘único’ da ideia do
amor romântico. A ‘sociedade separada e divorciada’ de
hoje aparece aqui mais como sua causa. Quanto mais
o amor confluente consolida-se em uma possibilidade
real, mais se afasta da busca da ‘pessoa especial’ e o
que mais conta é o ‘relacionamento especial’. O amor
confluente pela primeira vez introduz a arserotica no cerne
do relacionamento conjugal e transforma a realização
do prazer sexual recíproco em um elemento-chave na
manutenção ou dissolução do relacionamento.

Percebe-se com a citação de Giddens, que a ênfase hoje é dada ao


indivíduo e suas necessidades refletidas nos projetos individuais e sociais
de cada um. Há uma exigência maior do que cada indivíduo quer do outro na

101
Reflexões sobre Sociologia Aplicada à Educação

relação possibilitando o pensar e refazer seus projetos, como por exemplo,


no caso da separação.

Tem-se então que não apenas a concepção de família, do casamento,


das separações e do divórcio são relevantes para que se perceba a não
desestruturação da família, mas os valores contidos nessas concepções
que permearam o pensamento de alguns dos autores citados tais como:
a sexualidade, a intimidade, o aspecto financeiro, o companheirismo,
o amor, a fidelidade, têm contribuído tanto para unir quanto para separar
duas pessoas.

O companheirismo dentro desses valores envolve toda uma rede


de sociabilidade que inclui não apenas os dois cônjuges, mas os amigos,
os parentes, vizinhos, os colegas de trabalho, amigos de um bar. Ao ponto
de, na separação, haver não somente, conforme dito anteriormente, o
rompimento da aliança entre os cônjuges, mas o romper com a aliança,
com os laços criados com todas as pessoas que pertenciam ao mesmo
grupo dos cônjuges, seja este do trabalho, seja do bar, seja da vizinhança.
Enfim, as associações criadas vão sendo rompidas e a rede passa a ser
desamarrada, surgindo a necessidade de criar outras amarras que vão
sendo construídas com os laços que ainda permanecem e novos laços,
novas associações que vão aos poucos sendo estabelecidas. Assim, após
a separação ou o divórcio, novas redes de sociabilidade vão se formando.
O termo sociabilidade está sendo usado segundo foi trabalhado
por Simmel (1983, p. 169) como toda e qualquer forma de associação,
presente na relação conjugal, na família, com os parentes, amigos, colegas
de trabalho, vizinhos, enfim, em toda forma de interação.

A interação ocorre em decorrência de interesses e impulsos que vão


constituir a base da sociedade humana. Para Simmel (1983, p. 166), a
associação “é a forma pela qual os indivíduos se agrupam em unidades que
satisfazem seus interesses.” Interesses que podem convergir ou divergir em
determinados momentos de acordo com os projetos dos membros de um
dado grupo. Logo, a sociabilidade é toda forma de associação que dentro

102
FUESPI/ NEAD Pedagogia

do limite permitido pelo grupo, aguenta algumas divergências e conflitos


que vão suscitar questionamentos e possibilitar mudanças dentro do grupo
em questão, refletindo essas mudanças nos grupos paralelos através das
redes, dos laços criados entre eles.

Os conflitos contribuem então, para fortalecer os laços, as redes de


sociabilidade como também para desatar esses laços, desfazendo as redes
existentes e possibilitando o surgimento de outras redes de sociabilidade,
como no caso das separações conforme dito anteriormente.

O surgimento de outras redes de sociabilidade pós-separação são


necessárias porque ao casar, os cônjuges não o fazem apenas entre um
e outro, mas o casamento implica outro casamento que é o dos cônjuges
com os amigos um do outro e com as suas respectivas famílias, conforme
supracitado.

Contudo, é um processo de construção de novas redes de


sociabilidade e de ver-se sozinho (a) novamente, que pode ser visto como um
alívio das tensões familiares se ambos possuíam concepções semelhantes
sobre relacionamento, este mais próximo da concepção de relacionamento
de Giddens, casamento, família ou, caso contrário, a separação passa a
ser vista como uma desestruturação da família.

Quando a separação é vista como elemento de desestruturação


tudo é muito mais difícil, uma vez que pesa o sentimento de culpa, a visão
do casamento como “eterno- o que Deus uniu o homem não separa”, a
concepção do relacionamento não enquanto “relacionamento puro” mas
enquanto “hierarquia de gêneros” em que pesa a mulher estar agora
“sozinha”, a sua sexualidade relacionada apenas aos genitais, a visão da
mulher como agora a “disponível”, “vulnerável” originando um processo de
estigmatização e auto-estigmatização. Enfim, a representação social ou os
“conceitos” e imagens a eles associadas do relacionamento, do casamento,
da família irão ao reforçar a ideia que tinham de cada uma dessas categorias
e que, após a vivência marital têm e terão pós-separação.

103
Reflexões sobre Sociologia Aplicada à Educação

Quando digo que não há a desestruturação da família, é porque


a estou vendo enquanto unidades sociais que “articulam relações de
consanguinidade, afinidade e descendência em núcleos de reprodução
social”(DURHAM, 1983, p.27), e que não estão –unidades sociais – família-
relacionadas aos seres biologicamente falando, mas a papéis sociais por
esses seres desempenhados ora de pai, ora de mãe, ora de filho (a)....
Existindo a separação e havendo filhos envolvidos nessa relação, a família
não se desestrutura, pois há o desatar os laços do casamento. É o casal
quem se separa. Não é o Pai e a Mãe que se separa, mas o Homem e a
Mulher que eles também são, sendo os papéis de pai e mãe agenciados
com quem ficar com a guarda dos filhos.

Mas, e quanto aos filhos? O querer ver os pais juntos é natural afinal,
na nossa sociedade os pais biológicos são os mesmos que os pais sociais, a
ênfase é dada na família enquanto grupo doméstico (pai, mãe e filhos todos
residindo juntos). Assim sendo, a socialização vai ser dada levando em
consideração a “hierarquia de gêneros” em oposição ao “relacionamento
puro”, a valorização do “eterno” na relação marital e assim, sucessivamente.
As crianças vão aprender a valorizar e considerar normal ou anormal o que
lhes for passado, bem como reproduzirão os conceitos e imagens do grupo
social do qual fazem parte.

Porém, dentro desse quadro, percebo que as mudanças começaram


a surgir na década de 60, através da implantação do “relacionamento puro”,
da transformação do aspecto “eterno” na relação que não é, apenas, o “até
que a morte nos separe”, mas “ eterno enquanto dure”.

Portanto, posso concluir dizendo que atualmente, final do século


XX, percebo um duplo e simultâneo processo que envolve dentro dos
inúmeros arranjos familiares existentes, tanto o “relacionamento puro”
quanto a “hierarquia de gênero”visualizadas nas reações das pessoas ao
considerarem a separação e o divórcio como elemento de desestruturação
da família ou um elemento de alívio das tensões familiares. Não havendo
uma desestruturação da família, mas um sentimento de desestruturação

104
FUESPI/ NEAD Pedagogia

ocasionado pelas concepções que tenham de família, casamento e


relacionamentos refletidos nos anseios e projetos individuais de cada um.

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MOMENTO DE REFLEXÃO DA APRENDIZAGEM

01- Após a leitura do artigo, como você conceitua família?

02- O que é hierarquia de gêneros e relacionamento puro? E em


que momentos da história da família no Brasil essas categorias
aparecem?

03- Pai, mãe e filhos são status, ou posições que as pessoas ocupam
no grupo social família, atrelados aos seres que os ocupam
biologicamente falando, ou qualquer pessoa, homem ou mulher pode
ocupar qualquer uma dessas posições no referido grupo? Explique.

04- Por que a desestruturação da família é um mito, e como ela é


construída?

05- A partir do artigo, quais as mudanças nas relações de gênero e nos


relacionamentos que as separações e o divorcio trouxe?

06- E, em meio as essas modificações na dinâmica familiar como pode-


se trabalhar o conceito de família no âmbito da escola?

110
FUESPI/ NEAD Pedagogia

_____________________________

Artigo 2

_______________________________________

A AVALIAÇÃO NO UNIVERSO DA RELAÇÃO ENTRE DOCENTE E


DISCENTE: UM ETERNO APRENDIZADO.

Márcia Adriana Lima de Oliveira2

Avaliação: uma introdução


Somente podemos falar do que vivenciamos.
A autora

A avaliação da aprendizagem é um tema extremamente relevante


ao docente, pois avaliar, julgar e posicionar-se sobre tarefas ou atividades
realizadas pelos discentes não é algo fácil, afinal, cada pessoa, além de ser
sujeito social, também é indivíduo detentor de uma subjetividade que deve
ser respeitada.

Segundo Gardner (1995 apud SILVA, 2006), cada indivíduo possui


aptidões e inteligências que podem e devem ser estimuladas e respeitadas
pelos docentes, já que o docente não apenas transmite, mas também
educa, e o respeito às diferenças, alteridades, também é educação.
2
Especialista em Docência do Ensino Superior – Faculdade Integral Diferencial / Curso Ex-
pansão - 2006.2. Professora e Educadora na Universidade Estadual do Piauí- UESPI. Mestra em
Antropologia – UFPE e Cientista Social – UFPI.
OBS.: Para a elaboração deste artigo agradeço o estímulo e a orientação da Professora
Ana Paula de Medeiros Ribeiro, Mestre e Doutoranda em Educação Brasileira pela UFC, com área
de concentração em Avaliação Educacional. É professora das Faculdades Cearenses (FaC) e do
curso de Especilização Escola de Gestores ofertado pelo MEC/UFC Virtual. É membro da equipe de
especialistas em avaliação do Programa Alfabetização na Idade Certa(SEDUC-CE).

111
Reflexões sobre Sociologia Aplicada à Educação

Urge explicar que respeitar as diferenças não é deixar os alunos


fazerem o que quiser, pois, a sala tem uma dinâmica dada por todos e
regras que devem ser elaboradas em conjunto, respeitando a diversidade,
e sendo cumpridas por todos.

Assim, a temática da avaliação surge no cenário educacional abrindo


horizontes entre professores que avaliam e alunos que são avaliados. A
verdadeira avaliação educativa nasceu com a grande reforma Tyleriana,
pois, com este pensador houve uma busca pelo aperfeiçoamento da
qualidade da educação (RIBEIRO, 2006).

Tyler (1949) construiu um método que consistia em definir em


que medida os objetivos a que os docentes se propõem e sugerem aos
discentes foram alcançados, provocando uma mudança nos padrões de
comportamento e currículo que deveriam ser constituídos a partir destes
objetivos.

Avaliar para Tyler (1949) também foi uma etapa de comparações, em


que a avaliação passou a ser vista como um instrumento de conscientização
e não de punição. E, quanto às mudanças no currículo ou para estas,
algumas questões foram necessárias como as descritas abaixo:

a) Que objetivos se deseja conseguir?

b) Com que atividades esses objetivos serão alcançados?

c) Como podem ser organizadas as atividades?

d) Como avaliar?

A Docimologia também foi importante nesse processo por ressaltar


que a neutralidade, fruto de uma corrente positivista, não existe, afinal,
o nosso olhar é enquadrado na cultura. Então, ter consciência disto no
momento da avaliação é fundamental, pois traz ao docente a necessidade
de melhorar, cotidianamente, através do conhecimento de cada um dos
membros do grupo, para que, a avaliação seja feita em conjunto e sem
tantos receios de estar sendo justo ou não (avaliação processual).

112
FUESPI/ NEAD Pedagogia

Outro aspecto que é importante na avaliação é o estabelecimento de


critérios em cada atividade solicitada, para que o acadêmico esteja atento
ao seu crescimento a cada etapa.

Além do aspecto acima, também é relevante reforçar que o exame, a


prova no processo avaliativo, não pode ser visto como punição, mas como
um passo para um crescimento.

Autores como Parlett& Hamilton (1972), enfatizaram a avaliação


como mecanismo para que os acadêmicos possam conhecer o mundo, ou
seja, os objetivos destes autores eram: iluminar, fornecer a compreensão
da realidade estudada em sua totalidade; verificar o impacto, a validade e
a eficácia desta.

A avaliação iluminativa proposta por Parlett& Hamilton (1972)


envolve, também, a coleta de dados através de entrevistas, questionários
e análise de documentos.

Além de Tyler (1949), Parlett& Hamilton (1972), um outro olhar sobre


a avaliação veio com Ana Maria Saul (1988), que passou a conceituar a
avaliação ou o processo avaliativo como permeado pela descrição, análise
e crítica, objetivando a sua transformação, extrapolando o âmbito da Escola
e, tendo como foco, também a avaliação de programas educacionais ou
sociais, cujos conceitos básicos são: emancipação, decisão democrática,
transformação e crítica educativa.

Nessas diversas abordagens sobre avaliação é que se fundamentou


o presente trabalho, que traz a aplicação prática de formas dinâmicas de
avaliar a aprendizagem no universo do Ensino Superior.

Construindo caminhos no processo ensino - aprendizagem:


Metodologia

As práticas avaliativas que serão descritas a seguir compreendem


o período de Agosto a Novembro de 2007, tendo como sujeitos os alunos
matriculados na disciplina Sociologia Aplicada ao curso de Administração
do Centro de Ensino Unificado de Teresina – CEUT (Ver anexos de 1 a 5).

113
Reflexões sobre Sociologia Aplicada à Educação

É fato que a prática docente deve estar em sintonia não apenas com o
universo teórico, mas, sobretudo, com o cotidiano, através do encontro entre
teoria e prática para propiciar o conhecimento dos conceitos Sociológicos
voltados ao âmbito Organizacional, Cultura Organizacional. Dessa forma,
a um grupo de estudantes do curso de Administração de Empresas foi
planejada uma atividade que envolveu a criação de empresas voltadas à
alimentação, cuja escolha do cardápio partiu da pergunta: Quais são as
principais lanchonetes, quiosques, restaurantes ou pizzarias, existentes no
bairro de cada um? Por acreditar que criar o cardápio ouvindo um ao outro,
a partir de sua realidade e vivência iria proporcionar novas descobertas ao
grupo, afinal, ninguém melhor do que o participante da Organização para
falar sobre ela; ninguém melhor do que quem mora no bairro para falar
sobre ele, ou seja, só se pode dar valor ao que se conhece. Assim, cada
um começou a valorizar mais os bairros uns dos outros.

Após este primeiro momento, foi pedido que os acadêmicos


materializassem a empresa, trazendo um dos pratos do cardápio para
degustação em sala. As empresas aceitaram e prepararam o melhor, não
apenas para a sala, mas para convidados que souberam das delícias e
vieram participar desse processo de avaliação conjunto, em que seriam
e foram avaliados nesse trabalho, dentre outros critérios: o atendimento,
a organização e o serviço prestado. A posteriori, também apresentaram
relatórios das atividades do grupo e planilhas de custos, com valores para
o produto oferecido.

Depois, foram feitas leituras sobre o significado do alimento e da


comida, para que cada empresa percebesse que pensar global, valorizando
o local é fundamental. Afinal, a comensalidade une, aproxima, ou seja, a
comida marca a identidade do grupo.

Na outra turma de Administração, 2B, também realizamos a mesma


atividade só que no lugar de montarmos empresas de alimentos, montamos
empresas de turismo, em que os pacotes seriam pensados a partir dos
lugares que poderiam se tornar possíveis pontos turísticos no bairro de

114
FUESPI/ NEAD Pedagogia

cada membro do grupo. Então, realizaram a atividade também valorizando


os bairros e redescobrindo suas cidades. Assim, as empresas de turismo
também materializaram a ideia, dando ao trabalho a união concreta entre
teoria e prática, surgindo a Novo Turismo, a Prime Empreendimentos e a
Garra Turismo.

No primeiro momento a Novo Turismo teve como desafio vender


pacotes de turismo para Campo Maior, e levar os seus Novos Turistas a
conhecerem o pacote que fora vendido. E por que Campo Maior? Porque
havia no grupo um Campo Maioense que conquistou a todos apresentando
os atrativos turísticos existentes na sua cidade. Assim, a primeira viagem
realizada foi a Campo Maior.

O desafio da empresa Novo Turismo foi muito maior, que a das


demais, pois tiveram que alugar ônibus, conseguir patrocinadores, vender
os pacotes, entrar em contato com restaurantes, e todos os responsáveis
pelos pontos a serem visitados em menos de um mês. Contudo, os desafios
foram transformados em estímulos e a empresa foi muito bem sucedida,
sendo elogiada e parabenizada pelos seus 38 turistas.

Em Novembro, dias 10 e 11, a segunda empresa – Prime


Empreendimentos, levou os Prime Turistas a uma viagem a Pedro II. E, como
estiveram com a Novo Turismo na viagem a Campo Maior, observando a
boa acolhida e assistência ao turista, prepararam-se muito bem, levando 49
pessoas, dentre estes, idosos, crianças, jovens e adultos nessa viagem, e
no decorrer do trabalho, demonstraram maturidade, determinação, carinho
e acolhida, propiciando a todos bem-estar e conforto. Portanto, durante o
processo, eles vivenciaram, na prática, tanto Novo Turismo quanto Prime
Empreendimentos, todos os conceitos sociológicos e administrativos,
incluindo trabalhar conflitos e superar desafios. Afinal, dificuldades surgiram
nos âmbitos externos e internos das empresas, mas juntos, através da
resolubilidade de alguns componentes os mesmos foram superados,
colocando-os em contato com os conceitos supracitados tais como os
de: cultura organizacional, poder e liderança, metas grupais, gerenciando

115
Reflexões sobre Sociologia Aplicada à Educação

conflitos, o indivíduo trabalha como foi socializado, estrutura social, dentre


outros (BERNARDES, MARCONDES, 2005).

Reflexões sobre o Vivido: discussão dos resultados

Segundo a avaliação do grupo, houve uma união maior da turma


após a atividade realizada. Todos ajudaram a avaliar através de textos-
aulas produzidos após cada encontro pela turma de Administração 2A, nos
quais relataram o que aprenderam através de opiniões e comentários sobre
as aulas e sobre cada grupo–empresa, assim como sugere a avaliação
iluminativa de Parlett& Hamilton (1972), mostrando a riqueza de se vivenciar
uma avaliação processual e dialógica.

No caso da Turma de Administração 2B, a avaliação finaliza com a


apresentação do relatório-dossiê sobre as Empresas de Turismo, fazendo
as relações, conforme, supracitado, entre o vivido e a teoria discutida e
aprendida em sala. Dessa forma, nos aproximamos da Teoria da avaliação
proposta por Tyler, uma vez que tínhamos objetivos pré-definidos e ao final,
os comparamos aos resultados obtidos.

Dentre os resultados obtidos, além do universo teórico, na prática


a empresa Novo Turismo é uma realidade, já registraram firma e estão
planejando outras viagens pelo Piauí (Turismo interiorano). Os acadêmicos
que participaram desta Empresa foram convidados para reavivar a empresa
júnior de Administração do CEUT e o trabalho do grupo estimulou e serviu de
balizador para as outras Empresas, pois, tanto a Prime Empreendimentos,
conforme citada anteriormente, quanto a Garra Turismo que levou os turistas
a um City Tour por Teresina em Dezembro 2007, tiveram na Novo Turismo
referenciais de organização, competência, superação, excelência, vitória,
sem perderem jamais a humildade quanto ao conhecimento aprendido e
ao que teria por vir.

Logo, segundo o depoimento dos acadêmicos a avaliação proposta


por mim, professora Marcia Adriana, despertou em cada um deles o desejo

116
FUESPI/ NEAD Pedagogia

de ir além e de extrapolar, vencer barreiras, principalmente, as internas que


envolvem as relações sociais no âmbito Organizacional, divisão de tarefas,
gerenciamento destas, autonomia, humildade, compreensão, fortaleza.

A atividade proposta pela educadora enfatiza o que deve ser sempre


o dever da escola: permitir que o (a) acadêmico (a) transcenda os limites
dos muros escolares e aprenda a ser e a viver emancipado.

Quanto aos membros da Prime Empreendimentos, estes relataram


que o maior aprendizado foi o lidar com pessoas dentro do próprio grupo.
E, neste, o falar o que cada membro do grupo sentiu e estava sentido, deu
ao grupo e aos demais membros da turma uma maturidade, e a certeza
da importância do diálogo, para transformar conflitos em aprendizado,
aproximando pessoas e servindo como ensinamentos para o próximo grupo
que levou os turistas a um passeio em Teresina – PI.

Ressalta-se que no passeio, os grupos também foram avaliados não


apenas pela docente, mas por todos os demais turistas que acreditaram
nas propostas e compraram os pacotes. Depois, cada grupo entregou um
relatório–dossiê da Empresa, apresentando-a deste a escolha do nome,
da logomarca, do símbolo, da missão, até os conflitos, planejamento,
organização, planilha de custos, gastos, lucros, e, principalmente, a relação
com a disciplina: Sociologia e o universo da Administração.

O conhecimento é infindo: considerações finais

Segundo as teorias recentes, têm-se várias abordagens sobre


avaliação que, enquanto processo, está passando sempre por alterações
oriundas dos desafios que o espaço da sala proporciona a cada encontro
com uma sociodiversidade, uma pluralidade presente nesse espaço, e que
contém e exige múltiplos olhares sobre conteúdo, sociedade, utilidade do
que se está transmitindo, tanto para o estudante profissionalmente, quanto
pessoalmente.

117
Reflexões sobre Sociologia Aplicada à Educação

Contudo, mesmo dentro de um planejamento, faz-se necessário


a abertura, levando em consideração o (in)esperado que surge nessa
relação fantástica, em que ambos estão constantemente se avaliando e
auto-avaliando, que é a relação entre docente e discentes.

Com esta experiência, pode-se dizer que não existe uma única
teoria que norteia a prática avaliativa. As teorias se imbricam cabendo a
nós, docentes, conhecermos o arcabouço teórico que permeia a avaliação
para que possamos dele extrair ideias, instrumentos e procedimentos que
irão nortear adequadamente nossa prática durante o processo avaliativo de
nossos alunos.

A teoria quando unida à prática traz VIDA à relação docente –


discente e à disciplina, pois se percebem, com maior clareza, os conceitos,
agora não mais abstratos, mas paridos do e com o vivido. Por isso, tornam-
se necessárias outras formas de avaliar, nas quais a avaliação não seja
vista como algo estanque e aterrorizador, mas como parte essencial e ativa
do processo ensino-aprendizagem e não o seu fim.

REFERÊNCIAS

BERNARDES, Cyro; MARCONDES, Reynaldo Cavalheiro. Sociologia


Aplicada à Administração. 6ªed. São Paulo: Saraiva, 2005

OLIVEIRA, Márcia Adriana Lima de. Experiências de Processos


Avaliativos nas turmas do Curso de Administração – CEUT (2007).

PARLETT, Malcom; HAMILTON, David: Evaluation as Illumination: a new


approach to the study of Innovatory Programs. Centre for Research in
the Educational Sciences, University of Edinburgh, Occasional Paper - 9,
Edinburgh 1972.

RIBEIRO, Ana Paula de Medeiros. A avaliação da aprendizagem e a


utilização de instrumentos e técnicas alternativas para avaliar a construção
do significado do texto. IN: MCDONALD, Brendan Coleman (Org.)

118
FUESPI/ NEAD Pedagogia

Avaliação: perspectivas em debate. Fortaleza: RDS, 2006, pp. 11- 25

SAUL, Ana Maria A. Avaliação emancipatória: desafio à teoria e à prática


de avaliação e reformulação de currículo. São Paulo: Cortez, 1988.

SILVA, Andréa Soares Rocha da. Utilização intencional de recursos multimídia


como fator motivacional no desenvolvimento de inteligências múltiplas
IN: MCDONALD, Brendan Coleman (Org.) Avaliação: perspectivasem
debate. Fortaleza: RDS, 2006, pp. 27-49
TYLER. Ralph. Basic principles of curriculum and instruction.Chicago:
University Press, 1949.

Para ilustrar a proposta realizada e a junção entre SER – HUMANO


– SOCIEDADE- EDUCAÇÃO –VIDA, um convite, através das fotos do
resultado da atividade descrita acima: BOM APETITE E BOA VIAGEM!!!!

ANEXO 01

Foto da pesquisadora.

Foto 01: Aqui uma delícia do Restaulanche, a terceira empresa a se


apresentar, oferecendo Capote acompanhado com arroz, tendo como
sobremesa, pavê.

119
Reflexões sobre Sociologia Aplicada à Educação

ANEXO 02

Autorizada a publicação da foto pelos acadêmicos que apareceram nesta.

Foto 02: Os acadêmicos do Bloco II de Administração do Centro de Ensino


Unificado de Teresina- CEUT, proprietários do Oca alimentação e primeiro
grupo que se apresentou, oferecendo um magnífico Quarenta com Café com
leite quentinho. E, Eu, Márcia Adriana fazendo a degustação... Hummm!!!
Delicioso!!

ANEXO03

Autorizada a publicação da foto pelos alunos que apareceram na mesma.

120
FUESPI/ NEAD Pedagogia

Foto 03: Empresa Novo Turismo: formada por Jéssica, Rafael, Auricélia e
Jean Charles, em momento de descontração comigo, a Professora Márcia
Adriana, Ronald (meu filho) e todos os participantes desta Maravilhosa
Excursão!! Que teve como Novo Turista a Historiadora Cleide, que escreveu
um artigo sobre o Monumento da Batalha do Jenipapo, explicando que essa
batalha foi a única que aconteceu com derramamento de sangue na história
da Independência do Brasil, e, que desejam que esta história seja inclusa
na do Brasil, e que, proferiu uma fala relevante sobre o seu trabalho no
próprio Monumento da Batalha do Jenipapo para todos nós Novo Turistas.

ANEXO 04

Autorizada a publicação pelas pessoas que apareceram na foto, embora seus


rostos não tivessem aparecido, apenas para ilustrar o momento da Chegada em
Pedro II, na viagem organizada pela equipe empresa Prime Empreendimentos.

Foto 04: Chegada a Pedro II, e Jantar no Opala Hotel, promovido pela Prime
Empreendimentos. E, no dia seguinte, dentre outras atividades fomos a
uma loja que produz e comercializa joias produzidas com Opala. Opala é
uma das uma das maravilhas de Pedro II – Piauí; pois só existem quatro
lugares que possuem Opala no mundo e Pedro II é um deles. Também
fomos ao Museu da Roça, um espaço mágico com fonte dos desejos,
santuário, cascata, Mina de Opala e Museu com objetos de várias décadas
pertencentes à Família Galvão, proprietários do espaço.

121
Reflexões sobre Sociologia Aplicada à Educação

ANEXO 05

Foto tirada por mim

Foto 05: quadros confeccionados com pedras de Pedro II.

E, com esta foto encerramos as viagens a Campo Maior e a Pedro II,


convidando a todos a visitá-las e a viajar com as equipes- empresas: Novo
Turismo e a Prime Empreendimentos.

MOMENTO DE REFLEXÃO DA APRENDIZAGEM


01- Como conceituamos a relação docente e discente conforme Gardner?
02- Comente o significado do respeito à diversidade.
03- Quando e com quem nasceu a “verdadeira” avaliação educativa?
04- Qual o significado de Docimologia?
05- Quais os aspectos importantes a serem vistos na avaliação?
06- Comente avaliação na visão de Parlett e Hamilton.
07- Como a vivência da avaliação na disciplina Sociologia Aplicada à
Administração, pode ser trazida e adaptada ao Curso de Pedagogia?

122
FUESPI/ NEAD Pedagogia

________________________________
Texto 1
_________________________________________

Ensino a Distância: reflexões sobre as Novas Tecnologias no Processo


de Ensino – Aprendizagem

Márcia Adriana Lima de Oliveira3 •

A partir das grandes guerras mundiais, com a necessidade de


aperfeiçoamento na transmissão de informações, decodificação das
mesmas, o universo tecnológico ganhou um enorme impulso, através da
utilização de computadores e aparelhos cada vez mais sofisticados no
campo comunicacional (WINKIN, 1998).

Acomunicação possuía como foco a transmissão, conforme supracitado,


perdendo a essência da palavra que em latim significava comunhão, partilha,
troca, pôr em comum. Este sentido da palavra comunicação, em latim,
foi resgatado pelos pesquisadores de Palo Alto, Colégio Invisível, que se
correspondiam, trocando ideias, e acompanhando, mesmo a distância, as
inovações nas suas respectivas áreas (WINKIN, 1998).

Assim sendo, o retorno do termo comunicação, não apenas como


transmissão, mas troca, partilha, comunhão em que toda a corporalidade
(real ou virtual) faz-se presente, começa a ganhar força.

Santaella (2004) aponta no capítulo: O corpo sensório perceptivo


do cibernauta, que embora estando aparentemente, imóvel na frente do
computador, internamente, todas as emoções estão sendo processadas.
Há uma interação, uma troca, ou seja, o corpo não está tão imóvel quanto
se pensava. E, com relação ao visível, o intuito é ir além deste.

3 •
Professora/ Educadorana Universidade Estadual do Piauí- UESPI/ Campus Clóvis Moura.
Cientista Social - UFPI. Mestra em Antropologia – UFPE. Especialista em Docência do Ensino
Superior- FACID/ EXPANSÃO. Especialista em Bioética e Direitos Humanos- ICF/ANIS/ SBB-PI.

123
Reflexões sobre Sociologia Aplicada à Educação

Dessa maneira, seja apenas para enviar mensagens através do


e-mail, Orkut, blogs, MSN, ou trocar ideias nestes espaços virtuais, através
das comunidades, que vão sendo formadas, havendo a transposição das
relações interpessoais face- a – face, para o universo virtual, cujo pré-
requisito vai além da dimensão física, havendo as escolhas pela dimensão
intelectual, conhecimento, visões de mundo, o pensar a tecnologia a serviço
da Educação começa a se fazer presente.

No que se refira ao uso dessas ferramentas no universo do


processo Ensino-Aprendizagem, tem-se que, atualmente – século XXI –
2010, juntamente com campanhas pela inclusão digital, um maior número
de pessoas tem acesso à internet, propiciando, a chegada de cursos em
lugares jamais imaginados, através do Ensino a Distância.

O Ensino a distância utilizado tanto pela rede pública, quanto pela


privada, tem sido um elemento importante no processo de aprendizagem,
de profissionalização, pois, pessoas que não podiam ter aulas presenciais
por motivos de trabalho, hoje podem fazer o seu horário, entrar em uma
lanhou-se ou acessar o computador de sua residência e estudar.

Alguns incrédulos, acreditavam que com o Ensino a distância a aula


presencial seria comprometida, contudo, no Ensino a distância também, faz-se
necessário a presença do Professor/Educador para orientar, tirar as dúvidas,
ampliar o conhecimento, conforme o interesse do aluno (ALMEIDA, 2003).

Interesse é a palavra que funciona como força motriz para fazer com
que este programa Ensino a Distância dê certo. Almeida (2003), contudo,
alerta para o fato de que se deve propiciar um ambiente favorável ao estudo,
para que este aluno sinta-se convidado a aprender e, assim o faça.

Segundo Almeida (2003)


Ensinar em ambientes digitais e interativos de aprendizagem
significa: organizar situações de aprendizagem, planejar e
propor atividades, disponibilizar materiais de apoio com o uso de
múltiplas mídias e linguagens; ter um professor que atue como
mediador, orientador, equipes interdisciplinares, constituídas
por educadores, profissionais de design, programação e

124
FUESPI/ NEAD Pedagogia

desenvolvimento de ambientes computacionais para a EaD, com


competência na criação, gerenciamento e uso desses ambientes.

Logo, conforme citado acima, o Ensino a Distância (EaD) não é


algo simples, mas envolve uma complexidade qualificada de profissionais
educadores para gerir este empreendimento educacional.

O EaD também promove uma reavaliação do ser docente.


Colocando-o como coparticipante nesta relação ensino-aprendizagem,
como aprendiz, navegando e ampliando o seu conhecimento, pois a troca
e a quantidade de informações circuladas é muito grande, propiciando um
outro olhar sobre o saber, pois, este não é mais visto como instrumento
de poder, mas, este poder é partilhado, comungado com muitos, sendo
aumentado e tornando-se cada vez mais rico, fazendo com que o docente
torne-se humilde quanto a este saber. Como diz Almeida (2003) desenvolve-
se a ideia de que o importante não é a correção, mas o processo de ensino-
aprendizagem que antecede esta correção, e que envolve a partilha do
conhecimento, sentimentos, ideias, conforme supracitado.

Desta maneira, as novas tecnologias utilizadas no processo ensino


– aprendizagem vão sendo aprimoradas, apreendidas, trabalhadas como
instrumentos mediadores de um novo olhar sobre a Educação, em que o
conhecimento é apresentado ao aluno, e, este é convidado a conhecê-
lo, digeri-lo, maturá-lo conforme os seus respectivos interesses e práticas
cotidianas, em uma relação de partilha, troca, com o não mais professor
co-repetidor, mas o professor – educador.

____________________________
BIBLIOGRAFIA
ALMEIDA, Maria ElizabehBianconcini.Educação a distância na Internet:
abordagens e contribuições dos ambientes digitais da aprendizagem IN:
Educação e Pesquisa. São Paulo, v.29, n.2, p. 327- 340, jul/dez, 2003

CARDOSO, A. M. P. Pós-modernidade e informação. Belo Horizonte, v.1,


n1, p.63-79.

125
Reflexões sobre Sociologia Aplicada à Educação

CASTRO FILHO, J.A. Educação e informática: treinamento ou criação?


Revista de Educação, ACC, Brasília, v.25, nº99, p. 19-33 abr/jun/1996.
HOEBEL, A.; FROST, E. Antropologia Cultural e Social. São Paulo:
Culturix, 1976

JOVCHELOVITCH, Sandra. Re(des)cobrindo o outro: um encontro com


a alteridade In: ARRUDA. Representando a alteridade. Rio de Janeiro:
Vozes, 1998. p. 69-82.

PELUSO, A. (Org.) Informática e Afetividade. Bauru- SP: EDUSP, 1998,


pp. 161 - 169
SANTAELLA, Lucia.O corpo e Comunicação. Sintoma da cultura. São
Paulo: Paulus, 2004
WINKIN, Yves. A nova comunicação. Da teoria ao trabalho de campo.
Campinas – SP: Papirus, 1998

MOMENTO DE REFLEXÃO DA APRENDIZAGEM

01- Conceitue comunicação telegráfica e orquestral.

02- Como Santaella trabalha o corpo sensório perceptivo do cibernauta?

03- Qual o pensamento de Almeida sobre o Ensino a distância?

04- De que maneira a Educação a Distância promove uma reavaliação


do ser docente?

126
FUESPI/ NEAD Pedagogia

____________________________________
Texto 2
__________________________________________________

Computador: como lidar com esta máquina?

Márcia Adriana Lima de Oliveira 4 ••

Nos meus quase 22 anos de docência, passando pelos Ensinos


fundamental, médio e Superior (Graduações e Pós-graduações) tenho
visto as modificações no universo da relação Ensino- Aprendizagem, desde
a mudança na relação docente- discente, que no primeiro momento era
unilateral, sendo a voz do docente superior a todas as outras.

Porém, nos segundos, terceiros e demais momentos até hoje,


2012, tenho visto, maravilhadamente, que a importância, atualmente, é o
diálogo, a troca, a descentralização da fala, a partilha de conhecimento,
informações, que aos poucos, conforme o interesse vai se transformando
em conhecimento. Enfim, o docente e o discente estão juntos e trabalham
juntos nesse processo dialógico, aprendendo a aprenderem juntos.
Embora, algumas pessoas ainda acreditem que a dimensão unilateral é
mais confortável, pois não permite questionamentos...

Entendo que a resistência a mudanças é devido ao fato de que o


desconhecido causa medo, receio, angústia, então, nem todos estão
dispostos a sair de sua zona de conforto. Contudo, com o avanço
tecnológico, a necessidade de atualização, ampliação do conhecimento,
tornou-se presente, fazendo com que mesmo a “contra-gosto” as pessoas
passassem por um processo de ressignificação da relação ensino-
aprendizagem, bem como por mudanças nas relações entre docentes e
4
•• Professora/ Educadorana Universidade Estadual do Piauí- UESPI/ Campus Clóvis Moura. Cien-
tista Social - UFPI. Mestra em Antropologia – UFPE. Especialista em Docência do Ensino Superior-
FACID/ EXPANSÃO. Especialista em Bioética e Direitos Humanos-ICF/ ANIS/ SBB-PI.

127
Reflexões sobre Sociologia Aplicada à Educação

discentes também, fazendo com que a sua prática docente passasse por
um processo de autoavaliação.

Mas, como lidar com a máquina, como o computador que se torna


um quase humano, um faz tudo? Será que ele, realmente, faz tudo? Tem-se
que pensar o computador como um instrumento de trabalho, e, como todo
instrumento, precisa de alguém que o guie, dirija, oriente, e crie programas
que satisfaçam as necessidades do (a) seu (sua) condutor (a), ou seja, do
(a) professor (a).

Lembre-se que antes do computador, os primeiros hominídeos


registravam suas experiências nas pedras, depois veio a linguagem escrita,
a grafia, outras formas de eternizar as vivências (HOEBEL; FROST, 1976
). E, no campo da docência, vindo para o século XX, após o quadro de giz,
veio o de acrílico, o álbum seriado, a transparência com o retroprojetor, os
slides com o projetor de slides, e para facilitar o processo de aprendizagem,
os slides foram sendo computadorizados e apresentados através do
projetor chamado de data-show, podendo-se utilizar nos slides, animações,
introduzir nestes filmes, vídeos, chamadas para partes importantes a serem
ressaltadas. Até termos o quadro computadorizado, neste século XXI, já
conectado a internet, em que não há teclado, mas os comandos são via
toque direto nos ícones na própria tela.

Percebe-se que o computador, realmente, é um instrumento, que


deve ser utilizado com cautela, não devendo servir como empecilho para
que na ausência do mesmo, a aula, que é o momento mais sublime na
relação ensino-aprendizagem não aconteça. Afinal, quem faz a aula
acontecer, quem conduz o processo e funciona como mediador na relação
ensino-aprendizado é o professor em conjunto com a sua turma, ou com
os discentes.

A partir dessas reflexões sobre o uso sábio do computador,


AngeloPeluso (1998), coloca outras dimensões neste uso, ressaltando
aspectos positivos e negativos neste. Quanto aos positivos, salienta que
a criança, (mas pode-se ampliar para o jovem, adulto, idoso) aprende que

128
FUESPI/ NEAD Pedagogia

pode errar e deve voltar para observar o percurso feito, refletir sobre o erro
para chegar ao acerto, desenvolvendo uma autocrítica salutar.

Peluso (1998), como pontos positivos prossegue dizendo que existe,


através do uso do computador a percepção do ser protagonista, ou seja, de
poder criar, construir, conduzir o processo, uma vez que a resposta dada
pelo computador, será dentro de um grau de previsibilidade, as mesmas.
E, ao contrário da televisão, a interação é maior, dando a pessoa, seja
ela criança ou não, a capacidade de representar graficamente o que esta
pretender ver realizado.

O computador também, conforme Peluso (1998, p.163) é um


“poderoso meio para desenvolver a lógica e a aprendizagem da criança”,
além de permitir que ocorra um “confronto individualizado com as próprias
estratégias de aprendizagem”, ou seja, permite que cada discente possa
ir aprendendo conforme o seu próprio ritmo, sem sentir-se excluído
ou ridicularizado, ou ainda a margem do processo de aprendizagem
que acontece, dentro de uma pretensa homogeneidade dentro de uma
diversidade sócio-cultural- econômica muito grande, contida na sala de
aula. Por isso, a turma é rica, e a sala de aula, deve trabalhar a tolerância,
o respeito a diversidade, a alteridade.

A alteridade (JOVCHELOVICTH, 1998) é a qualidade do outro,


ou seja, todas as emoções que o outro suscita, seja de medo, alegria,
entusiasmo, repulsa ou empatia. Logo, a alteridade deve ser respeitada.

Voltando a Peluso (1998) além dos pontos positivos, também


existe os negativos, tais como o fato de que o computador, dependendo
do programa, não estimula o trabalho em grupo, a colaboração; existem
alguns perigos como o isolamento, o uso cada vez maior, sem uma medida,
podendo causar relações de dependência, vício, concentração do poder
nas mãos dos que estão imersos no mundo digital, mostrando a relevância
da inclusão digital.

Assim, para Peluso (1998, p.170)

129
Reflexões sobre Sociologia Aplicada à Educação

é preciso, sem falta, de uma política educativo-cultural que


permita ao homem crescer com a informática e não sofrer uma
informática que sugue as ideias. Este é o desafio ao qual a
escola e a família são chamados no vizinho próximo, Dois mil.

Logo, percebe-se que como instrumento, caso não seja bem


utilizado trará malefícios, contudo, se utilizado com cautela, sempre será
de excelente ajuda para ilustrar, ampliar o processo ensino- aprendizagem,
ou seja, deve-se lidar com este instrumento como um recurso a mais para
proporcionar uma aula atrativa, interessante que contribua para que o
conteúdo seja, não apenas, repassado, mas discutido, refletido, debatido,
desconstruído, reconstruído, ampliado, valorizando sempre o diálogo, e
atividades que propiciem uma interação, uma relação de troca, partilha, e,
ao mesmo tempo respeite as singularidades no bojo da diversidade cultural
contida em cada aluno, presente na sala de aula.

BIBLIOGRAFIA REFERÊNCIA

DURKHEIM, Émile. Educação e Sociologia. 9ª ed. São Paulo:


Melhoramentos, 1973
ALMEIDA, Maria Elizabeh Bianconcini. Educação a distância na
Internet: abordagens e contribuições dos amb diversidade sócio-cultural-
econômica ientes digitais da aprendizagem IN: Educação e Pesquisa. São
Paulo, v.29, n.2, p. 327- 340, jul/dez, 2003
CARDOSO, A. M. P. Pós-modernidade e informação. Belo
Horizonte, v.1, n1, p.63-79.
CASTRO FILHO, J.A. Educação e informática: treinamento ou
criação? Revista de Educação, ACC, Brasília, v.25, nº99, p. 19-33 abr/
jun/1996.
HOEBEL, A.; FROST, E. Antropologia Cultural e Social. São Paulo:
Culturix, 1976
JOVCHELOVITCH, Sandra. Re(des)cobrindo o outro: um encontro
com a alteridade In: ARRUDA. Representando a alteridade. Rio de Janeiro:
Vozes, 1998. p. 69-82.

130
FUESPI/ NEAD Pedagogia

LIBEDIDINSKY, M.. A utilização do correio eletrônico na escola. In:


LITWIN, E. (org.). Tecnologia educacional: políticas, histórias e propostas.
Porto Alegre: Artes Médicas, 1997.
PELUSO, A. (Org.) Informática e Afetividade. Bauru- SP: EDUSP,
1998, pp. 161 - 169
SANDHOLTZ, C., RINGSTAFF, C.DWYER, C. (orgs.).Ensinando
com tecnologia: criando sala de aula centradas nos alunos. Porto Alegre:
Artes Médicas, 1997

MOMENTO DE REFLEXÃO DA APRENDIZAGEM

01- Como se deve pensar o computador no universo da docência?


02- Comente as dimensões no uso do computador apontadas por
Peluso (1998).
_____________________________

E, aqui finalizamos mais uma etapa, em que, conforme dito


anteriormente, foi um grande prazer realizar as partilhas do meu vivido no
universo da docência, como docente e discente, com todos vocês. Também
deixo claro que todas as ideias e elaborações são de minha responsabilidade,
e, para contatos, continuando este diálogo, acerca do que acharam sobre
esta obra, podem enviar e-mails para marciaadrioliveira@gmail.com.

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