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Educação remota na Graduação

(REFERÊNCIA: 1º SEMESTRE 2020)

SEMINÁRIOS DE LETRAS – Teoria Literária I e Teoria Literária II


Um breve passeio teórico pelos bosques da Literatura
Maria Cristina Cardoso Ribas e Paulo Cesar Silva de Oliveira

Textos Literários para as atividades da segunda semana de aula:


Texto 1: Texto 2:

A função da arte Canto I, Ménis, a ira de Aquiles

Diego não conhecia o mar. O pai, Santiago Kovadloff, A ira, Deusa, celebra do Peleio Aquiles,
levou-o para que descobrisse o mar. Viajaram para o Sul.
o irado desvario, que aos Aqueus tantas penas
Ele, o mar, estava do outro lado das dunas altas, esperando.
trouxe, e incontáveis almas arrojou no Hades
  de valentes, de heróis, espólio para os cães,
Quando o menino e o pai enfim alcançaram aquelas alturas
pasto de aves rapaces: fez-se a lei de Zeus;
de areia, depois de muito caminhar, o mar estava na frente de
desde que por primeiro a discórdia apartou
seus olhos. E foi tanta a imensidão do mar, e tanto o seu
o Atreide, chefe de homens, e o divino Aquiles.
fulgor, que o menino ficou mudo de beleza. Que Deus, posto entre ambos, provocou a rixa?
  O filho de Latona e Zeus. Irou-o o rei.
E quando finalmente conseguiu falar, tremendo, gaguejando,
A peste então lavrou no exército: ruína
pediu ao pai: — Me ajuda a olhar! cai sobre o povo! A Crises ultrajara o Atreide,
ao sacerdote, o qual viera até as naus
GALEANO, Eduardo. O livro dos abraços. Porto Alegre: velozes dos Aqueus remir com dons a filha
L&PM, 2002, p.12. nas mãos portando os nastros do certeiro Apolo
presos ao cetro de ouro e a todos implorava,
mormente aos dois Atreides, comandantes de homens:
Atreides e outros mais Aqueus de belas cnêmides,
que a vós os deuses deem, habitantes do Olimpo,
derruída a priâmea urbe, um bom retorno à casa;
mas a filha querida resgatai-me, e os dons
guardai, temendo Apolo, deus flechicerteiro.
Então, uniconcordes, os Aqueus clamaram:
Se atenda o sacerdote e as galas do resgate
se aceitem! Disse não, Agamêmnon, o Atreide.
Brutal, refuga o velho com palavras duras:
Que eu nunca mais te aviste junto às naves côncavas,
agora demorando ou de volta, mais tarde.
Inúteis o teu cetro e esses nastros divinos,
nunca a libertarei, até que fique velha
em Argos, no meu paço, além, longe da pátria,
nos trabalhos do tear, ou servindo-me ao leito.
Foge da minha ira, vai-te, põe-te a salvo.

Homero. Ilíada: volume I. Trad. Haroldo de Campos.


São Paulo: Mandarim, 2001, p. 31-33.
Texto 3: Texto 4:

Não-coisa A serpente

O que o poeta quer dizer PERSONAGENS


no discurso não cabe LÍGIA
e se o diz é pra saber DÉCIO
Educação remota na Graduação
(REFERÊNCIA: 1º SEMESTRE 2020)

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Um breve passeio teórico pelos bosques da Literatura
Maria Cristina Cardoso Ribas e Paulo Cesar Silva de Oliveira

o que ainda não sabe. CRIOULA


GUIDA
Uma fruta uma flor PAULO
um odor que relume...
Como dizer o sabor, (É a separação. Décio está fechando a mala. Fecha,
seu clarão seu perfume? levanta-se e vira-se para Lígia, a mulher, que olha com
maligna curiosidade).
Como enfim traduzir
na lógica do ouvido DÉCIO – Pronto.
o que na coisa é coisa LÍGIA – Você não vai falar com papai?
e que não tem sentido? DÉCIO – Pra que falar com teu pai? Não falei com a
principal interessada, que é você? Perde as ilusões sobre
A linguagem dispõe teu pai. Teu pai é uma múmia, com todos os achaques
de conceitos, de nomes das múmias.
mas o gosto da fruta LÍGIA – Então por que você não desaparece? Pode
só o sabes se a comes deixar que eu mesma falo. Como é suja a nossa conversa.
DÉCIO – Não me provoque Lígia!
só o sabes no corpo LÍGIA – Acho gozadíssima sua indolência. Não se
o sabor que assimilas esqueça que nós estamos casados há um ano e que você.
e que na boca é festa DÉCIO – Para!
de saliva e papilas LÍGIA – Me procurou só três vezes. Ou não é?
DÉCIO – Continua e espera o resto.
invadindo-te inteiro LÍGIA – Três vezes você tentou o ato, o famoso ato. Sem
tal do mar o marulho conseguir, ou minto?
e que a fala submerge
e reduz a um barulho, (Décio avança para a mulher. Segura Lígia pelo pulso).

um tumulto de vozes DÉCIO – Cala essa boca.


de gozos, de espasmos, LÍGIA (Com esgar de choro) – Não, não!
vertiginoso e pleno DÉCIO – Você não me conhece! Quietinha! Você me
como são os orgasmos viu chorando a minha impotência. Mas eu sou também o
homem que mata. Queres morrer? Agora?
No entanto, o poeta
desafia o impossível (Décio a esbofeteia).
e tenta no poema
dizer o indizível: LÍGIA (Com voz estrangulada) – Não!
DÉCIO – Olha para mim, anda, olha!
subverte a sintaxe
implode a fala, ousa (Pausa. Lígia olha)
incutir na linguagem
densidade de coisa Diz agora que és puta. Diz, que eu quero ouvir.
LÍGIA (Lenta) – Sou uma prostituta.
sem permitir, porém, DÉCIO (Trincando as palavras) – Eu não disse
que perca a transparência prostituta. Eu quero puta.
já que a coisa é fechada LÍGIA (Soluçando) – Vou dizer. Sou uma puta.
à humana consciência.
(Décio a solta).
O que o poeta faz
mais do que mencioná-la DÉCIO – Agora olha para mim e presta atenção. Se você
é torná-la aparência fizer um comentário sobre a nossa intimidade sexual,
Educação remota na Graduação
(REFERÊNCIA: 1º SEMESTRE 2020)

SEMINÁRIOS DE LETRAS – Teoria Literária I e Teoria Literária II


Um breve passeio teórico pelos bosques da Literatura
Maria Cristina Cardoso Ribas e Paulo Cesar Silva de Oliveira

pura — e iluminá-la. seja com quem for: teu pai, essa cretina da Guida, uma
amiga, ou coisa que o valha, venho aqui e te dou seis
Toda coisa tem peso: tiros. E quando estiveres no chão, morta, ainda te piso a
uma noite em seu centro. cara e ninguém reconhecerá a cara que eu pisei.
O poema é uma coisa
que não tem nada dentro, (Décio a esbofeteia. Lígia cai de joelhos com um fundo
soluço. Décio apanha a mala)
a não ser o ressoar
de uma imprecisa voz DÉCIO (Num gesto largo) Vai-te pra puta que te pariu!
que não quer se apagar
— essa voz somos nós. (Décio sai. Logo entra Guida, irmã de Lígia).

GULLAR, Ferreira. Não-coisa. In: ___. Toda poesia (1950- RODRIGUES, Nélson. A serpente. 3. ed. Rio de Janeiro:
1999). 11. ed. Rio de Janeiro: José Olympio, 2001, p. 450- Nova Fronteira, 2012, p. 8-10.
452.
Texto 5:

Luz da inspiração

Sinto-me em delírio
Luz da inspiração
Acordes musicais
Invadiram o meu ser
Sem querer
Me elevam ao infinito da paz

Sinto-me vazio
No ar a flutuar
Eu já nem sei quem sou
A mente se une a alma
A calma reflete o amor

Nos braços da inspiração


A vida transformei
De escravo pra rei
E o samba que criei
Tão divino ficou
Agora sei quem sou

CANDEIA. Luz da inspiração. In: ___. Luz da inspiração.


LP. Gravadora: Atlantic, 1977.

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