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FINANCIAMENTO
E PRESTAÇÃO DE CONTAS
Belo Horizonte
CONHECIMENTO JURÍDICO
2018
É proibida a reprodução total ou parcial desta obra, por qualquer meio eletrônico,
inclusive por processos xerográficos, sem autorização expressa do Editor.
Conselho Editorial
Adilson Abreu Dallari Egon Bockmann Moreira Marcia Carla Pereira Ribeiro
Alécia Paolucci Nogueira Bicalho Emerson Gabardo Márcio Cammarosano
Alexandre Coutinho Pagliarini Fabrício Motta Marcos Ehrhardt Jr.
André Ramos Tavares Fernando Rossi Maria Sylvia Zanella Di Pietro
Carlos Ayres Britto Flávio Henrique Unes Pereira Ney José de Freitas
Carlos Mário da Silva Velloso Floriano de Azevedo Marques Neto Oswaldo Othon de Pontes Saraiva Filho
Cármen Lúcia Antunes Rocha Gustavo Justino de Oliveira Paulo Modesto
Cesar Augusto Guimarães Pereira Inês Virgínia Prado Soares Romeu Felipe Bacellar Filho
Clovis Beznos Jorge Ulisses Jacoby Fernandes Sérgio Guerra
Cristiana Fortini Juarez Freitas Walber de Moura Agra
Dinorá Adelaide Musetti Grotti Luciano Ferraz
Diogo de Figueiredo Moreira Neto Lúcio Delfino
CONHECIMENTO JURÍDICO
F491 Financiamento e prestação de contas / Luiz Fux, Luiz Fernando Casagrande Pereira,
Walber de Moura Agra (Coord.); Luiz Eduardo Peccinin (Org.). – Belo Horizonte
: Fórum, 2018.
361 p.
Tratado de Direito Eleitoral
V. 5
CDD 341.28
CDU 342.8
Informação bibliográfica deste livro, conforme a NBR 6023:2002 da Associação Brasileira de Normas
Técnicas (ABNT):
FUX, Luiz; PEREIRA, Luiz Fernando Casagrande; AGRA, Walber de Moura (Coord.); PECCININ,
Luiz Eduardo (Org.). Financiamento e prestação de contas. Belo Horizonte: Fórum, 2018. 361 p.
(Tratado de Direito Eleitoral, v. 5.) ISBN 978-85-450-0500-1.
PARTE I
OS MODELOS DE FINANCIAMENTO ELEITORAL NO BRASIL
CAPÍTULO 1
FINANCIAMENTO PÚBLICO DE CAMPANHAS ELEITORAIS: INFLUÊNCIA
DO PODER ECONÔMICO, O FUNDO ESPECIAL DE FINANCIAMENTO DE
CAMPANHA (FEPC), INSTITUÍDO PELA LEI Nº 13.487, DE 2017, LIMITES
MÁXIMOS DE GASTOS EM CAMPANHAS ELEITORAIS E OUTROS TEMAS
CORRELATOS
PEDRO ROBERTO DECOMAIN........................................................................................................ 15
1.1 Vedação constitucional da influência do poder econômico
nas eleições................................................................................................................................... 15
1.2 O significado da palavra “influência” no §9º do art. 14 da Constituição: o uso
e o abuso do poder econômico nas eleições............................................................................ 17
1.3 Financiamento privado de campanhas eleitorais.................................................................. 20
1.4 O financiamento público de campanhas eleitorais, como potencial solução para o
problema de afronta ao texto constitucional, antes anunciado........................................... 26
1.5 O uso de recursos do Fundo Partidário para custeio de despesas de campanhas
eleitorais........................................................................................................................................ 27
1.6 O Fundo Especial de Financiamento de Campanha (FEPC), instituído pela Lei nº
13.487/2017.................................................................................................................................... 29
1.7 Os limites máximos de gastos em campanhas eleitorais..................................................... 33
1.8 Breve elenco de conclusões........................................................................................................ 35
Referências................................................................................................................................... 36
CAPÍTULO 2
FINANCIAMENTO ELEITORAL EXCLUSIVAMENTE PÚBLICO? PONDERAÇÕES
ENTRE O FINANCIAMENTO PÚBLICO E O FINANCIAMENTO PRIVADO
MICHEL BERTONI SOARES.............................................................................................................. 39
2.1 Introdução.................................................................................................................................... 39
2.2 Partidos políticos e crise de representatividade..................................................................... 40
2.3 Regulação do financiamento eleitoral e incentivo à transparência .................................... 42
2.4 Igualdade de oportunidades nas competições eleitorais ..................................................... 43
2.5 Entre o financiamento privado e o financiamento público.................................................. 46
2.6 Considerações finais................................................................................................................... 52
Referências................................................................................................................................... 53
CAPÍTULO IV
FINANCIAMENTO DE CAMPANHA E PARTICIPAÇÃO: O FINANCIAMENTO
COLETIVO NA INTERNET
JÚLIA ROCHA DE BARCELOS.......................................................................................................... 77
4.1 Introdução.................................................................................................................................... 77
4.2 Financiamento coletivo na internet e participação cidadã................................................... 77
4.3 A busca por alternativas de financiamento............................................................................ 80
4.4 A alternativa do financiamento coletivo de campanha........................................................ 84
4.5 O financiamento coletivo na reforma eleitoral de 2017......................................................... 86
4.6 Considerações finais................................................................................................................... 89
Referências................................................................................................................................... 90
PARTE II
FINANCIAMENTO COMO PARTICIPAÇÃO DEMOCRÁTICA:
DESAFIOS E PERSPECTIVAS
CAPÍTULO 1
AS VÁRIAS FORMAS DE ABUSO DE PODER COMO ACINTE AO
FINANCIAMENTO ELEITORAL
WALBER DE MOURA AGRA.............................................................................................................. 95
1.1 Introdução ................................................................................................................................... 95
1.2 A Reforma Política de 2017 e as modalidades do financiamento de campanhas
eleitorais........................................................................................................................................ 96
1.3 As distorções do financiamento eleitoral................................................................................ 99
1.4 Abuso de poder......................................................................................................................... 100
1.5 As formas de abuso de poder no Direito Eleitoral................................................................103
1.6 Conclusão....................................................................................................................................108
Referências..................................................................................................................................109
CAPÍTULO 3
A REPRESENTATIVIDADE E O FINANCIAMENTO DE CAMPANHAS
ELEITORAIS: A INTERNET COMO ESPAÇO DE PARTICIPAÇÃO POLÍTICA
TASSIANA BEZERRA DOS SANTOS............................................................................................. 127
3.1 Introdução.................................................................................................................................. 127
3.2 A atualização do tema: as decisões do Supremo Tribunal Federal e as modificações
introduzidas pela Reforma Política de 2017.......................................................................... 129
3.3 O alto custo das campanhas eleitorais e o processo de corrupção no financiamento
eleitoral: um extrato histórico..................................................................................................131
3.4 Há uma tendência inexorável para o incremento dos custos? A participação política
como resposta............................................................................................................................ 135
3.4.1 Representatividade e participação política........................................................................... 135
3.4.2 Novas formas de financiamento eleitoral e participação política..................................... 136
Referências..................................................................................................................................137
CAPÍTULO 4
PODER SOCIAL E PODER POLÍTICO: COMO OCUPAÇÃO, GÊNERO,
PATRIMÔNIO E DINHEIRO SE COMBINAM NAS ELEIÇÕES PARA DEPUTADOS
FEDERAIS
ADRIANO CODATO, MARCIO CARLOMAGNO...................................................................... 139
4.1 Introdução...................................................................................................................................139
4.2 Materiais e métodos...................................................................................................................140
4.2.1 O cálculo sociológico da disposição política.........................................................................141
4.2.2 O cálculo contextualizado das receitas de campanha .........................................................143
PARTE III
TRANSPARÊNCIA DEMOCRÁTICA E A ATUAL PRESTAÇÃO DE CONTAS
ELEITORAIS
CAPÍTULO 1
TRANSPARÊNCIA E O DEVER DE PRESTAR CONTAS
VIVIANE MACEDO GARCIA.......................................................................................................... 159
1.1 Introdução...................................................................................................................................159
1.2 Prestação de contas de campanha...........................................................................................162
1.3 Prestação de contas partidária.................................................................................................168
1.4 Conclusões..................................................................................................................................171
Referências................................................................................................................................. 172
CAPÍTULO 2
O ATUAL MODELO DE FINANCIAMENTO DAS CAMPANHAS E DAS
PRESTAÇÕES DE CONTAS ELEITORAIS NO BRASIL
ELMANA VIANA LUCENA ESMERALDO................................................................................... 175
2.1 Introdução...................................................................................................................................175
2.2 O atual modelo de financiamento das campanhas eleitorais.............................................176
2.3 Principais regras relativas à movimentação de recursos na campanha.......................... 177
2.3.1 Arrecadação de recursos para a campanha.......................................................................... 177
2.3.2 Gastos eleitorais......................................................................................................................... 180
2.4 O atual modelo de prestação de contas eleitorais.................................................................183
2.5 Reforma Eleitoral de 2017..........................................................................................................191
2.6 Conclusão....................................................................................................................................193
Referências..................................................................................................................................194
CAPÍTULO 3
O PROCESSO DE PRESTAÇÃO DE CONTAS E O PODER NORMATIVO DA
JUSTIÇA ELEITORAL: ENTRE A EFETIVIDADE E A SEGURANÇA JURÍDICA
NA ESTABILIZAÇÃO INSTITUCIONAL E DEMOCRÁTICA BRASILEIRA
LUIZ EUGENIO SCARPINO JUNIOR ............................................................................................ 197
3.1 Introdução...................................................................................................................................197
3.2 A que se presta uma prestação de contas...............................................................................198
3.2.1 Procedimentos............................................................................................................................198
PARTE IV
O PROCESSO DE PRESTAÇÃO DE CONTAS ELEITORAIS:
GARANTIAS E EFETIVIDADE
CAPÍTULO 1
PRESTAÇÕES DE CONTAS DE CANDIDATOS E OS PRINCÍPIOS
CONSTITUCIONAIS DA LEGALIDADE, DO DEVIDO PROCESSO LEGAL E DA
ANTERIORIDADE: UMA ANÁLISE CRÍTICA DAS CONDENAÇÕES REALIZADAS
PELAS CORTES ELEITORAIS
ROGER FISCHER................................................................................................................................. 221
1.1 Considerações introdutórias................................................................................................... 221
1.2 O poder normativo da justiça eleitoral. (In)Observância dos princípios da legalidade,
do devido processo legal e da anterioridade........................................................................ 225
1.3 Prestação de contas e sanções. Casuística............................................................................. 229
1.4 Conclusão................................................................................................................................... 237
Referências................................................................................................................................. 239
CAPÍTULO 2
GARANTIAS PROCESSUAIS NA PRESTAÇÃO DE CONTAS ELEITORAIS
DYOGO CROSARA............................................................................................................................. 241
2.1 Considerações iniciais...............................................................................................................241
2.2 A natureza jurídica da prestação de contas eleitorais..........................................................241
2.3 A possibilidade de análise material de provas na prestação de contas........................... 244
2.4 Da possibilidade de juntada de novos documentos em prestações de contas................ 248
2.5 Conclusão................................................................................................................................... 252
Referências................................................................................................................................. 253
CAPÍTULO 3
AS LIMITAÇÕES DO PROCESSO DE PRESTAÇÃO DE CONTAS E O DEVER DE
FISCALIZAÇÃO PELA JUSTIÇA ELEITORAL
CARLA KARPSTEIN........................................................................................................................... 255
3.1 Introdução.................................................................................................................................. 255
CAPÍTULO 4
A PRESTAÇÃO DE CONTAS ELEITORAL COMO CONDIÇÃO DE
“REGISTRABILIDADE”: A QUITAÇÃO ELEITORAL
ALVARO AUGUSTO DE BORBA BARRETO, CAROLINE BIANCA GRAEFF..................... 275
4.1 Introdução.................................................................................................................................. 275
4.2 Prestação de contas de campanha eleitoral............................................................................276
4.3 Inclusão como requisito para a Certidão de Quitação Eleitoral........................................ 279
4.4 A consagração em lei e a retomada da polêmica................................................................. 284
4.5 Considerações finais................................................................................................................. 292
Referências................................................................................................................................. 294
CAPÍTULO 5
PRESTAÇÃO DE CONTAS DE CAMPANHA E SEUS REFLEXOS PARA A
OBTENÇÃO DA CERTIDÃO DE QUITAÇÃO ELEITORAL
TARCÍSIO AUGUSTO SOUSA DE BARROS................................................................................ 299
5.1 Introdução.................................................................................................................................. 299
5.2 Certidão de quitação eleitoral e cidadania (o direito de ser votado e de exercer
outros atos da vida civil).......................................................................................................... 301
5.3 Quitação eleitoral e prestação de contas de campanha....................................................... 305
5.3.1 Arrecadação e gasto de recursos em campanhas eleitorais............................................... 307
5.3.2 A prestação de contas eleitorais.............................................................................................. 308
5.4 Demais desdobramentos processuais da arrecadação e gasto de recursos de
campanha....................................................................................................................................311
5.4.1 Representação (do Art. 30-A da Lei nº 9.504/1977) por Arrecadação e/ou
Gasto Ilícito de Recursos de Campanha.................................................................................311
5.4.2 Ação de Investigação Judicial Eleitoral e Ação de Impugnação de Mandato Eletivo.....313
5.5 Conclusões: Aprovação da prestação de contas de campanha como meio de
obtenção da certidão de quitação eleitoral.............................................................................315
Referências..................................................................................................................................317
CAPÍTULO 6
A PRESTAÇÃO DE CONTAS COMO INIBIÇÃO AO “CAIXA 2” DE CAMPANHA:
A MEDIDA CAUTELAR DA RESOLUÇÃO TSE Nº 23.463/2015
LUIZ FELIPE DA SILVA ANDRADE................................................................................................ 319
6.1 Introdução...................................................................................................................................319
CAPÍTULO 7
RESPONSABILIDADE CRIMINAL DO AGENTE POLÍTICO: PROPOSTA PARA UM
“NOVO” E EFETIVO CONTROLE FINANCEIRO DAS CAMPANHAS ELEITORAIS
ALESSANDRO JOSÉ FERNANDES DE OLIVEIRA.................................................................... 333
7.1 Introdução.................................................................................................................................. 333
7.2 Da Justiça Criminal Eleitoral................................................................................................... 335
7.3 O famigerado caixa 2 de campanha....................................................................................... 336
7.4 A responsabilidade subjetiva do candidato pelas informações constantes na
prestação de contas de campanha.......................................................................................... 339
7.5 Considerações finais................................................................................................................. 343
Referências................................................................................................................................. 344
CAPÍTULO 8
TEMAS IMOBILIÁRIOS NA PERSPECTIVA DA PRÁTICA ELEITORAL
AMANDA LOBÃO TORRES............................................................................................................. 345
8.1 Introdução.................................................................................................................................. 345
8.2 O procedimento de execução fiscal de multas eleitorais e como tornar mais
eficiente a cobrança destas....................................................................................................... 346
8.3 Como não falhar na prestação de contas anual de partido político no tocante aos
aluguéis de bens imóveis e a contradição entre a justiça cível e a eleitoral no que
tange à documentação da locação.......................................................................................... 350
8.4 A omissão de imóveis na declaração de bens apresentada no registro de
candidatura e a proteção da fé pública no âmbito eleitoral................................................ 352
8.5 Como se prevenir da multa ao doador por doação em excesso no caso de cessão
de bem imóvel a campanha eleitoral...................................................................................... 354
8.6 Conclusão................................................................................................................................... 355
Referências................................................................................................................................. 357
OS MODELOS DE FINANCIAMENTO
ELEITORAL NO BRASIL
importa em inelegibilidade dos chefes do Poder Executivo para esse terceiro mandato
imediatamente subsequente.
Por meio do §6º de seu art. 14, a Constituição exige que o Presidente da República,
os Governadores de Estados e do Distrito Federal e os Prefeitos Municipais renunciem
aos seus cargos pelo menos seis meses antes da data prevista para as eleições, caso
desejem concorrer a mandatos eletivos distintos daqueles que ocupam. Vale dizer que,
caso persistam no exercício da chefia do Executivo dentro dos seis meses imediatamente
anteriores à data da eleição, tornam-se inelegíveis para qualquer outro cargo.
Já o §7º considera inelegíveis, para qualquer mandato eletivo da respectiva
circunscrição eleitoral, os cônjuges e parentes – por consanguinidade ou afinidade,
inclusive por adoção, até o segundo grau – dos chefes de Poder Executivo e daqueles
que os hajam substituído nos seis meses imediatamente anteriores à data prevista
para as eleições, salvo se o cônjuge ou parente já for detentor de mandato eletivo e for
candidato à reeleição. Essa inelegibilidade alcança também quem convive com o chefe
do Executivo em união estável, inclusive homoafetiva, segundo decidiu o TSE no REsp
Eleitoral nº 24.564, Rel. Min. Gilmar Mendes, Revista de Jurisprudência do TSE, vol. 17,
nº 1, jan-mar-06, p. 234.
Finalmente, o §8º, ainda uma vez do art. 14 da Constituição, afirma serem elegíveis
os militares alistáveis (o que afasta a elegibilidade somente dos conscritos durante o
tempo em que prestam o serviço militar obrigatório), desde que preencham uma dentre
duas condições, conforme o tempo em que se encontrem em serviço ativo.
De acordo com o inciso I desse parágrafo, tratando-se de militar com menos
de dez anos de serviço ativo, deve deixar definitivamente o serviço (ao menos até a
data do pedido de registro de sua candidatura, segundo nosso entender) e, já agora
conforme o seu inciso II, tratando-se de militar com dez ou mais anos de serviço ativo,
deve agregar-se à autoridade superior, até a data do pedido de registro da candidatura,
assim permanecendo até a data da eleição (o dispositivo refere-se a militar com mais de
dez anos de serviço ativo, mas merece ser interpretado no sentido de referir-se aos que
contêm dez ou mais, sob pena de restar carente de qualquer normatização a situação
do militar que, na data do pedido de registro de sua candidatura, contar exatamente
dez anos de serviço ativo, nem mais, nem menos).
A par da previsão dessas causas de inelegibilidade, a Constituição, todavia, ainda
afirma, no §9º do seu art. 14, que, mediante lei complementar, podem ser previstas outras
causas de inelegibilidade, além daquelas inseridas no próprio texto constitucional.
A lei complementar que dispuser a respeito de outras causas de inelegibilidade
deve prever também o respectivo prazo de cessação, o que exclui a possibilidade da
previsão de causas de inelegibilidade vitalícias. Finalmente, sempre de acordo com o §9º
do art. 14 da Constituição, as causas de inelegibilidade previstas em lei complementar
devem ser hábeis a proteger: 1) a probidade administrativa; ou 2) a moralidade para
o exercício do mandato, considerada a vida pregressa do candidato; ou ainda 3) a
normalidade e a legitimidade das eleições contra a influência do poder econômico ou
o abuso do exercício de função, cargo ou emprego na administração direta ou indireta.
Dessa sorte, causa de inelegibilidade infraconstitucional (porque prevista em lei
complementar, e não no próprio texto constitucional) que não se preste efetivamente a
proteger algum desses valores, padecerá de inconstitucionalidade substancial.
O que releva salientar neste ponto, porque de interesse para o tema discutido,
é a inclusão, pelo texto do parágrafo em apreço, da normalidade e legitimidade das
eleições em face da influência do poder econômico, como valor a ser protegido pela
previsão de novas causas de inelegibilidade mediante lei complementar.
1
FERREIRA FILHO, Manoel Gonçalves. Comentários à Constituição brasileira de 1988. v. 1. Arts. 1º a 43. São Paulo:
Saraiva, 1990. p. 13. [Os negritos constam no original.]
2
CAMPANHOLE, Adriano; CAMPANHOLE, Hilton Lobo. Todas as Constituições do Brasil: compilação dos
textos, notas, revisão e índices. 2. ed. São Paulo: Atlas, 1976. p. 125.
3
A propósito da Emenda Constitucional nº 1/1969, vale lembrar a observação de Paulino Jacques, para quem, por
haver ela introduzido mais de duzentas alterações na Constituição de 1967, que continha apenas 189 artigos:
“importou, pragmaticamente, na outorga de nova Carta Política, denominada ‘Constituição da República
Federativa do Brasil’” (JACQUES, Paulino. Curso de Direito Constitucional. 8. ed. Rio de Janeiro: Forense, 1977.
p. 156).
4
CAMPANHOLE; CAMPANHOLE, op. cit., p. 54.
5
FERREIRA FILHO, Manoel Gonçalves. Comentários à Constituição brasileira. v. 3. Arts. 130 a 210. 2. ed. São Paulo:
Saraiva, 1977. p. 63.
6
Lei Complementar nº 64/1990: “Art. 1º São inelegíveis: (...) II – para Presidente e Vice-Presidente da República:
(...) e) os que, até 6 (seis) meses antes da eleição, tenham exercido cargo ou função de direção, administração ou
representação nas empresas de que tratam os arts. 3º e 5º da Lei nº 4.137, de 10 de setembro de 1962, quando,
pelo âmbito e natureza de suas atividades, possam tais empresas influir na economia nacional; f) os que,
detendo o controle de empresas ou grupos de empresas que atuem no Brasil, nas condições monopolísticas
previstas no parágrafo único do art. 5º da lei citada na alínea anterior, não apresentarem à Justiça Eleitoral, até
6 (seis) meses antes do pleito, a prova de que fizeram cessar o abuso apurado, do poder econômico, ou de que
transferiram, por força regular, o controle de referidas empresas ou grupos de empresas; (...) h) os que, até 6
(seis) meses depois de afastados das funções, tenham exercido cargo de Presidente, Diretor ou Superintendente
de sociedades com objetivos exclusivos de operações financeiras e façam publicamente apelo à poupança e ao
crédito, inclusive através de cooperativas e da empresa ou estabelecimentos que gozem, sob qualquer forma,
de vantagens asseguradas pelo Poder Público, salvo se decorrentes de contratos que obedeçam a cláusulas
uniformes; (...)”. As referências à Lei nº 4.137/1962 devem ser hoje substituídas pela referência aos dispositivos
equivalentes constantes na Lei nº 8.884/1994.
O “uso” do poder é lícito e em nenhum momento é vedado pela legislação. Basta, tão só,
que ele seja exercido com observância da lei e por quem possa exercê-lo, ou seja, o eleitor,
as pessoas jurídicas, os partidos, coligações e os candidatos. O ilegal é o “abuso” de poder
que se caracteriza pelo excesso ou demasia com que esse poder (seja econômico, político ou
de autoridade) é exercido, buscando benefícios eleitorais, deturpando o processo eleitoral
e influindo em seus resultados naturais.9
7
NIESS, Pedro Henrique Távora. Ação de impugnação de mandato eletivo. Bauru, SP: Edipro, 1996. p. 24.
8
DECOMAIN, Pedro Roberto. Elegibilidade e inelegibilidades. 2. ed. São Paulo: Dialética, 2004. p. 163.
9
CÂNDIDO, Joel José. Inelegibilidades no Direito brasileiro. Bauru, SP: Edipro, 1999. p. 337. Ressalva-se apenas
que atualmente as pessoas jurídicas não mais podem realizar doações para campanhas eleitorais, diante da
revogação do art. 81 da Lei nº 9.504/97, que previa tal possibilidade.
O abuso do poder econômico pode ser entendido, e deve ser comprovado, como o excesso
de gastos no processo eleitoral, através do qual o candidato pode conquistar o mandato
eletivo. É evidente que os gastos declarados pelo partido político, controlados e legalmente
admitidos pela Justiça Eleitoral, não constituem abuso. Este se caracteriza pelo mau uso,
ou uso errado, excessivo ou injusto, como na própria definição etimológica do termo.
Para que fique caracterizado o abuso, o candidato fará prevalecer a gastança exorbitante
e descomedida, incidente pela utilização do poder econômico excessivo.10
10
VAZ, Orlando. Impugnação de mandato eletivo. In: VELLOSO, Carlos Mário da Silva; ROCHA, Cármen Lúcia
Antunes. Direito Eleitoral. Belo Horizonte: Del Rey, 1996. p. 349.
11
MENDES, Antônio Carlos. Aspectos da ação de impugnação de mandato eletivo. In: VELLOSO, Carlos Mário
da Silva; ROCHA, Cármen Lúcia Antunes. Direito Eleitoral. Belo Horizonte: Del Rey, 1996. p. 338-339.
um candidato ou mesmo a mais de um partido, a soma das doações que a todos faça
não poderá exceder o aludido limite.
A Lei nº 13.488, de 2017, como aprovada pelo Congresso, propunha alteração
no §1º de seu art. 23. Manteve o limite de 10% dos rendimentos brutos auferidos pela
pessoa física doadora no ano imediatamente anterior ao da eleição, mas acrescentou
também que tal montante ficava ainda “limitado a dez salários mínimos para cada
cargo ou chapa majoritária em disputa, somadas todas as doações”. Essa nova redação
do parágrafo, todavia, foi vetada pela Presidência da República. Em consequência, o
parágrafo manteve a redação original, persistindo vigente, pois, apenas o aludido limite
de 10% dos rendimentos brutos do doador no ano imediatamente anterior ao da eleição,
ainda que seja superior a 10 salários mínimos.
Essa segunda limitação era, todavia, salutar. Resulta isso da circunstância de
que 10% dos rendimentos brutos do doador pessoa física no ano que precede o da
eleição podem significar quantia bastante elevada, quando se trate de rendimentos
que também hajam sido de grande monta. E veja-se que o limite de 10% não abrange
apenas os rendimentos sujeitos à incidência do imposto sobre a renda da pessoa
física, mas todos os rendimentos por ela auferidos, inclusive os eventualmente não
tributáveis. Um segundo limite, representado por uma quantia de salários mínimos por
doador, representaria contribuição significativa justamente para ainda mais afastar a
possibilidade da influência do poder econômico no resultados das eleições.
O que se tem atualmente é um limite máximo implícito, correspondente ao limite
de gastos de campanha que possam ser realizados para cada cargo em disputa, previsto,
especificamente para as eleições de 2018, em disposição transitória, pelo art. 5º da Lei
nº 13.488/2017 e cuja fixação, para as demais eleições subsequentes, ainda haverá de
ocorrer nos termos previstos pelos arts. 5º, 6º e 7º, da Lei nº 13.165/15, que se acham
transcritos mais à frente.
Convém registrar ainda que, de acordo com o §7º do artigo 23 da Lei nº 9.504/97,
com redação nos termos da Lei nº 13.165, de 2015, o limite previsto no §1º do artigo não se
aplica às doações estimáveis em dinheiro feitas por pessoas físicas a partidos, coligações
ou candidatos, relativas à cessão do uso de bens móveis ou imóveis de propriedade do
doador para a campanha eleitoral, desde que o valor estimado desse uso gratuitamente
cedido não ultrapasse a importância de R$ 40.000,00 (quarenta mil reais), nos termos da
redação conferida ao parágrafo pela Lei nº 13.488/17 (o limite anterior, que prevaleceu
nas eleições de 2016, era de 80.000,00 – oitenta mil reais).
Relativamente ao financiamento de campanhas eleitorais mediante doações de
pessoas físicas, a Lei nº 13.488, de 2017, inseriu na Lei das Eleições (Lei nº 9.504/97), o
inciso IV ao §4º de seu artigo 23, permitindo a arrecadação de tais doações mediante
peculiar processo, assim disciplinado:
Art. 23. Pessoas físicas poderão fazer doações em dinheiro ou estimáveis em dinheiro para
campanhas eleitorais, obedecido ao disposto nesta Lei.
(...)
§4º As doações de recursos financeiros somente poderão ser efetuadas na conta mencionada
no art. 22 desta Lei por meio de:
(...)
Nos termos do §3º, do art. 22-A, da Lei nº 9.504/97, também acrescentado pela Lei
nº 13.488/2017, “desde o dia 15 de maio do ano eleitoral, é facultada aos pré-candidatos
a arrecadação prévia de recursos na modalidade prevista no inciso IV do §4º do art.
23 desta Lei, mas a liberação de recursos por parte das entidades arrecadadoras fica
condicionada ao registro da candidatura, e a realização de despesas de campanha deverá
observar o calendário eleitoral”.
A julgar pela redação desse parágrafo, as doações nos termos do inciso IV do §4º
do art. 23 somente haveriam de ter por destinatários os pré-candidatos. Interpretação
literal levaria à conclusão de que essa sistemática de doação não poderia ser utilizada
pelos partidos como um todo, para posterior distribuição dos recursos recebidos entre
seus diversos candidatos.
Sem embargo, importante lembrar que a Emenda Constitucional nº 97, de 2017,
inseriu na Constituição duas modificações bastante significativas, no que tange ao
funcionamento dos partidos políticos.
Inicialmente, alterando o “caput” do art. 17 da Constituição, passou a limitar a
possibilidade da formação de coligações partidárias apenas às eleições majoritárias,
o que excluiu a possibilidade de que restassem celebradas também para coligações
obedientes ao sistema proporcional. O artigo 2º da Emenda definiu que a vedação à
formação de coligações para as eleições proporcionais teria início naquelas a serem
realizadas no ano de 2020.
Noutra perspectiva, a mesma Emenda Constitucional acrescentou o §3º ao artigo
17 da Constituição, estabelecendo limites mínimos de desempenho nas eleições para
a Câmara dos Deputados, para que os partidos tivessem acesso a recursos do Fundo
Partidário e acesso gratuito ao rádio e à televisão. A regra permanente, contida no
aludido parágrafo, a aplicar-se a partir dos resultados das eleições de 2030, é a seguinte:
da referida Lei, acrescentado a ela pela Lei nº 13.165, de 2015, devendo o emprego de
recursos próprios do candidato, todavia, resguardar o limite máximo de gastos para a
campanha, para o cargo que pretenda disputar.
Ainda na versão original da Lei nº 9.504/97, o respectivo artigo 81 permitia que
pessoas jurídicas fizessem doações para campanhas eleitorais. O respectivo §1º limitava-
lhes o valor, considerando o conjunto dos partidos, coligações ou candidatos aos quais
a pessoa jurídica pretendesse doar, a 2% (dois por cento) de seu faturamento bruto no
ano imediatamente anterior ao da eleição.
Na ação direta de inconstitucionalidade nº 4.650-DF, relatada pelo eminente
Ministro Luiz Fux, acórdão publicado no Diário da Justiça Eletrônico de 24-02-16 (data
da publicação), p. 27, o colendo Supremo Tribunal Federal, embora reconhecendo
que a simples previsão da possibilidade de que pessoas jurídicas realizem doações
para campanhas eleitorais não ofende a Constituição, não obstante julgou a ação
“parcialmente procedente para assentar apenas e tão somente a inconstitucionalidade
parcial sem redução de texto do art. 31 da Lei nº 9.096/95, na parte em que autoriza,
a contrario sensu, a realização de doações por pessoas jurídicas a partidos políticos, e
pela declaração de inconstitucionalidade das expressões ‘ou pessoa jurídica’, constante
no art. 38, inciso III, e ‘e jurídicas’, inserta no art. 39, caput e §5º, todos os preceitos da
Lei no 9.096/95” (o grifo consta do original). Os dispositivos da Lei nº 9.096/95 previam
doações de pessoas jurídicas aos partidos, não especificamente para uso em campanhas
eleitorais, mas para o seu funcionamento no dia a dia.
Particularmente a propósito do limite máximo de doações de pessoas jurídicas
para campanhas eleitorais, de toda conveniência que se relembre passagem da ementa
do v. acórdão pelo qual decidida a mencionada ação:
7. Os limites previstos pela legislação de regência para a doação de pessoas jurídicas para
as campanhas eleitorais se afiguram assaz insuficientes a coibir, ou, ao menos, amainar, a
captura do político pelo poder econômico, de maneira a criar indesejada “plutocratização”
do processo político.
(...)
9. A doação por pessoas jurídicas a campanhas eleitorais, antes de refletir eventuais
preferências políticas, denota um agir estratégico destes grandes doadores, no afã de
estreitar suas relações com o poder público, em pactos, muitas vezes, desprovidos de
espírito republicano.
candidato, sem prejuízo das despesas que o próprio eleitor realize, observado o limite
previsto pelo art. 27 da Lei nº 9.504/97, como acima apontado.
Considerado o anterior cenário de financiamento privado das campanhas
eleitorais, compreendendo ainda as doações realizadas por pessoas jurídicas, o que se
tinha, na verdade, era a instalação de um quadro em que a influência do poder econômico
podia acabar sendo decisiva para o sucesso de uma candidatura.
Certamente que esta influência restará diminuída com o afastamento das doações
de campanha realizadas por pessoas jurídicas, como já noticiado. Sem embargo, poderá
vir a ocorrer que os titulares do controle e até mesmo eventuais administradores
melhor aquinhoados de pessoas jurídicas venham a ampliar as doações que façam na
qualidade de pessoas físicas, ainda que limitadas ao teto de 10% (dez por cento) de seus
rendimentos brutos do ano imediatamente anterior ao da eleição.
De resto, a possibilidade de uso de recursos próprios do candidato, limitados,
inclusive, ao máximo de gastos de campanha que venha a ser fixado pelo TSE, observados
parâmetros legalmente estabelecidos, ainda permite o favorecimento, durante a disputa,
daquele candidato que seja ele próprio melhor bafejado pela fortuna.
O que a Constituição pretendeu, ao dizer que a normalidade e a legitimidade das
eleições não deveriam ser maculadas pela influência do poder econômico – entendida a
palavra no sentido já anteriormente apresentado –, está agora talvez mais próximo, mas
ainda longe de ser alcançado, levando em consideração o sistema legal de financiamento
de campanhas eleitorais como permanece hoje em vigor, ainda possibilitando situações
de amplo financiamento de campanhas com recursos privados.
Isso, por evidente, importa também em afronta ao princípio constitucional da
isonomia, no que tange às candidaturas a um mesmo mandato eletivo. Candidato que
dispuser de mais recursos econômicos e deles fizer uso eficiente poderá, em princípio,
ter melhores oportunidades de sensibilizar os eleitores, do que candidato cujo aporte
de recursos for menor.
Em suma, o financiamento privado de campanhas eleitorais, como ainda
disciplinado hoje entre nós, a um tempo permite que se instile – e de modo aberto, sem
que sequer se possa falar em abuso – a influência do poder econômico nas eleições e que,
justamente em virtude disso, se quebre o princípio da igualdade de todos os candidatos
no pleito. Maiores chances, potencialmente, para os que consigam mobilizar maiores
recursos financeiros.
O sistema legal disciplinador das eleições brasileiras coíbe o abuso do poder
econômico, mas não lhe interdita o uso. Abuso é uso para além do permitido, e para
uso ainda há consideráveis possibilidades.
Nas palavras de José Cretella Júnior acerca do §9º do art. 14 da Constituição:
12
CRETELLA JÚNIOR, José. Comentários à Constituição Federal de 1988. v. 2. Arts. 5º (LXVIII a LXXVIII) a 17. Rio
de Janeiro: Forense Universitária, 1989. p. 1108-1109.
A luta contra o abuso é, portanto, menos restrita do que se possa supor, tendo de cobrir
todos os flancos, escudando-se nos mananciais da ordem, seja para impedir as mani
festações opressivas do poder com dano para a liberdade, seja também a não permitir
que esta degenere com exorbitâncias possessivas, articulando situações discriminatórias
que levam ao aniquilamento das reservas essenciais da igualdade, solapando as bases da
justiça na convivência social e da equidade na participação política.13
13
RIBEIRO, Fávila. Abuso de poder no Direito Eleitoral. 3. ed. Rio de Janeiro: Forense, 1998. p. 21-22.
Art. 38. O Fundo Especial de Assistência Financeira aos Partidos Políticos (Fundo
Partidário) é constituído por:
I – multas e penalidades pecuniárias aplicadas nos termos do Código Eleitoral e leis
conexas;
II – recursos financeiros que lhe forem destinados por lei, em caráter permanente ou
eventual;
III – doações de pessoa física ou jurídica, efetuadas por intermédio de depósitos bancários
diretamente na conta do Fundo Partidário;
IV – dotações orçamentárias da União em valor nunca inferior, cada ano, ao número
de eleitores inscritos em 31 de dezembro do ano anterior ao da proposta orçamentária,
multiplicados por trinta e cinco centavos de real, em valores de agosto de 1995.
Os recursos do Fundo Partidário, por elevados que sejam, não se mostram sufi
cientes para o custeio de todas as campanhas eleitorais das quais os partidos participam.
Como já foi observado no item 1.3, supra, a Emenda Constitucional nº 97, de
2017, estabeleceu cláusulas de desempenho dos partidos políticos nas eleições para a
Câmara dos Deputados, para acesso a recursos do Fundo Partidário.
Relembrando, a regra permanente contida no §3º do art. 17 da Constituição,
acrescentado pela referida Emenda, tem o seguinte conteúdo:
O art. 3º da Emenda prevê que essas regras terão aplicação a partir dos resultados
das eleições de 2030, estabelecendo regras de transição, gradativamente mais severas,
para as eleições de 2018, 2022 e 2026.
Nos termos do art. 12, §3º, II, da Lei nº 13.473, de 2017, Lei de Diretrizes
Orçamentárias para o exercício de 2018, o projeto de lei orçamentária deverá conter
reservas específicas para atendimento de “programações decorrentes de emendas
de bancada estadual de execução obrigatória e de despesas necessárias ao custeio
de campanhas eleitorais”. De observar-se, para definição do montante dos recursos
do FEFC, a cada eleição, também o disposto no §4º, do art. 12, da Lei de Diretrizes
Orçamentárias para o exercício de 2018, de acordo com o qual “Os valores das reservas
previstas nos incisos I e II do §3º deste artigo serão equivalentes, respectivamente, ao
montante da execução obrigatória de emendas individuais de 2017, calculado nos termos
do §11 do art. 166 da Constituição, e ao montante de execução obrigatória de emendas
de bancada estadual de 2017, corrigidos de acordo com o inciso II do §1º do art. 107 do
Ato das Disposições Constitucionais Transitórias”. Não há previsão de que essa parcela
de 30% das reservas mencionadas fique sujeita a correção monetária ao longo do tempo.
Ademais, pela referência expressa aos dispositivos da LDO relativa ao orçamento de
2018, tem-se que os valores resultantes deles haverão de ser observados também para
a composição do montante do FEFC para as eleições subsequentes às de 2018.
Já o art. 3º da Lei nº 13.487, que traça os parâmetros para fixação do valor mínimo
do Fundo pelo TSE em cada ano eleitoral, tem a seguinte redação:
Art. 3º O valor a ser definido pelo Tribunal Superior Eleitoral, para os fins do disposto no
inciso I do art. 16-C da Lei nº 9.504, de 30 de setembro de 1997, será equivalente à somatória
da compensação fiscal que as emissoras comerciais de rádio e televisão receberam pela
divulgação da propaganda partidária efetuada no ano da publicação desta Lei e no ano
imediatamente anterior, atualizada monetariamente, a cada eleição, pelo Índice Nacional
de Preços ao Consumidor (INPC), da Fundação Instituto Brasileiro de Geografia e
Estatística (IBGE), ou por índice que o substituir.
Possível concluir, portanto, que a cada ano eleitoral o montante dos recursos do
Fundo Especial de Financiamento de Campanha, instituído pela Lei nº 13.487/2017,
ficará assim constituído:
I – Somatório da compensação fiscal que as emissoras comerciais de rádio e tele
visão houverem recebido pela divulgação de propaganda partidária efetuada
no ano de 2017 (ano de publicação da lei) e no ano imediatamente anterior,
atualizado monetariamente, a cada eleição, pela variação do INPC ou índice
que eventualmente o venha a substituir;
II – 30% (trinta por cento) dos recursos da reserva específica de que trata o inciso
II do §3º do art. 12 da Lei nº 13.473, de 9 de agosto de 2017.
Criar o Fundo e definir o montante dos seus recursos (ou, pelo menos, como se
fez, os critérios para a definição desse montante), era apenas parte do necessário para
a disciplina do financiamento público de campanhas eleitorais.
Daí que os critérios para distribuição dos recursos do FEFC entre os partidos e
também a distribuição do respectivo uso entre as diversas campanhas eleitorais foram
previstos por meio da Lei nº 13.488, também de 2017.
Através da inclusão na Lei nº 9.504/97 de seu artigo 16-D, definiu-se como os
recursos seriam distribuídos entre os partidos.
A redação do dispositivo é a seguinte:
Art. 4º. Em 2018, para fins do disposto nos incisos III e IV do caput do art. 16-D da Lei nº
9.504, de 30 de setembro de 1997, a distribuição dos recursos entre os partidos terá por
base o número de representantes titulares na Câmara dos Deputados e no Senado Federal,
apurado em 28 de agosto de 2017 e, nas eleições subsequentes, apurado no último dia da
sessão legislativa imediatamente anterior ao ano eleitoral.
do veto aposto pela Presidência da República à inclusão do §1º do art. 16-D da Lei
nº 9.504/97, inclusão que havia constado da Lei nº 13.487/2017, que criou o Fundo.
O dispositivo objeto do veto propunha que o número de Deputados Federais a considerar
para distribuição dos recursos do FEFC seria aquele resultante da eleição. Tal traria,
inclusive, dificuldades para cálculo da participação no Fundo, que devesse caber a
partidos criados posteriormente à eleição e que contassem com Deputados Federais,
que optaram por neles ingressar, deixando a legenda pela qual haviam sido eleitos.
Assim, as migrações partidárias de Deputados Federais que possam haver
ocorrido desde a última eleição e que não tenham resultado em perda do mandato,
por estarem compreendidas nas exceções à perda, acarretada pela mudança de partido,
contidas no art. 22-A da Lei nº 9.096/95, acrescido pela lei nº 13.165/2015, contribuirão
para incrementar a participação no Fundo daquele partido para ao qual se hajam filiado
após o pleito no qual hajam sido eleitos, diminuindo também a quota do Fundo destinada
ao partido pelo qual foram eleitos, e que posteriormente deixaram.
As Leis ns. 13.487 e 13.488, de 2017, a primeira responsável pela criação do Fundo
Especial de Financiamento de Campanha (FEFC) e a segunda pela previsão dos critérios
para a distribuição de seu montante total entre os partidos e fixação desses limites
transitórios para as eleições de 2018, não incluem quaisquer dispositivos que definam
como os valores que caibam a cada agremiação devem ser por ela distribuídos entre
os seus diferentes candidatos.
A Lei nº 13.487 apenas estabelece, mediante acréscimo do §7º do art. 16-C à Lei
nº 9.504/97 (que regula as eleições), que os recursos que caibam a cada partido, após
definidos pelo Tribunal Superior Eleitoral, somente serão postos ao dispor da agremiação
depois que esta houver estabelecido, pelo voto da maioria absoluta dos membros de seu
órgão diretivo nacional, os critérios a serem observados para a respectiva distribuição
interna, e depois de haverem tais critérios sido publicamente divulgados. A lei não
informa, todavia, como deverá ocorrer a divulgação. Mas, devendo ser pública, deve
atingir o público em geral, de sorte que a melhor forma para que a divulgação ocorra
será aquela realizada por intermédio da internet.
A rigor, a lei nem poderia dispor acerca da distribuição da quota de cada partido
no FEFC entre os seus diversos candidatos, considerando que a própria Constituição
Federal, através do §1º de seu artigo 17, assegura aos partidos autonomia para
definirem sua estrutura interna, organização e funcionamento. Neste último aspecto, do
funcionamento, situa-se também a distribuição interna dos recursos do Fundo Especial
de Financiamento de Campanha.
A esse respeito, o §2º, do art. 16-D, da Lei nº 9.504/97, acrescido pela Lei
nº 13.488/2017, afirma apenas que “para que o candidato tenha acesso aos recursos
do Fundo a que se refere este artigo, deverá fazer requerimento por escrito ao órgão
partidário respectivo”.
Segundo já se anotou tanto no item 1.3 (financiamento privado de campanhas
eleitorais) quanto no item 1.5 (Fundo Partidário), supra, a Emenda Constitucional nº 97,
de 2017, estabeleceu cláusulas de desempenho dos partidos, em termos de número total
de votos obtidos para a Câmara dos Deputados, e respectiva distribuição em ao menos
um terço das unidades da Federação, ou, alternativamente, número de Deputados Fede
rais eleitos, para que tenham direito a acesso a recursos do Fundo Partidário e acesso
gratuito a rádio e televisão.
Art. 17-A. A cada eleição caberá à lei, observadas as peculiaridades locais, fixar até o dia 10
de junho de cada ano eleitoral o limite dos gastos de campanha para os cargos em disputa;
não sendo editada lei até a data estabelecida, caberá a cada partido político fixar o limite de
gastos, comunicando à Justiça Eleitoral, que dará a essas informações ampla publicidade.
O art. 18 teve sua redação modificada pela Lei nº 13.165/15, passando a ter agora
o seguinte conteúdo: “Art. 18. Os limites de gastos de campanha, em cada eleição, são os
definidos pelo Tribunal Superior Eleitoral com base nos parâmetros definidos em lei”.
Finalmente, o art. 17-A foi revogado expressamente pela Lei nº 13.165/15.
Assim, o contexto que se tem, tocante ao limite máximo de gastos de campanha, é
o de que estes devem ser fixados pelo TSE, atendendo, porém, aos parâmetros definidos
em lei, nos termos da atual redação de seu art. 18.
A definição dos parâmetros a serem utilizados pelo TSE para estabelecimento
dos limites máximos de gastos de campanha para os diferentes cargos constou, a seu
turno, dos arts. 5º, 6º e 7º, da Lei nº 13.165/15, assim redigidos:
Art. 5º O limite de gastos nas campanhas eleitorais dos candidatos às eleições para
Presidente da República, Governador e Prefeito será definido com base nos gastos
declarados, na respectiva circunscrição, na eleição para os mesmos cargos imediatamente
anterior à promulgação desta Lei, observado o seguinte:
I – para o primeiro turno das eleições, o limite será de:
a) 70% (setenta por cento) do maior gasto declarado para o cargo, na circunscrição eleitoral
em que houve apenas um turno;
b) 50% (cinquenta por cento) do maior gasto declarado para o cargo, na circunscrição
eleitoral em que houve dois turnos;
II – para o segundo turno das eleições, onde houver, o limite de gastos será de 30% (trinta
por cento) do valor previsto no inciso I.
Parágrafo único. Nos Municípios de até dez mil eleitores, o limite de gastos será de
R$ 100.000,00 (cem mil reais) para Prefeito e de R$ 10.000,00 (dez mil reais) para Vereador,
ou o estabelecido no caput se for maior.
Art. 6º O limite de gastos nas campanhas eleitorais dos candidatos às eleições para Senador,
Deputado Federal, Deputado Estadual, Deputado Distrital e Vereador será de 70% (setenta
por cento) do maior gasto contratado na circunscrição para o respectivo cargo na eleição
imediatamente anterior à publicação desta Lei.
Art. 7º Na definição dos limites mencionados nos arts. 5º e 6º, serão considerados os
gastos realizados pelos candidatos e por partidos e comitês financeiros nas campanhas
de cada um deles.
Senador
Referências
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textos, notas, revisão e índices. 2. ed. São Paulo: Atlas, 1976.
CÂNDIDO, Joel José. Inelegibilidades no Direito brasileiro. Bauru, SP: Edipro, 1999.
CRETELLA JÚNIOR, José. Comentários à Constituição Federal de 1988. v. 2. Arts. 5º (LXVIII a LXXVIII) a 17.
Rio de Janeiro: Forense Universitária, 1989.
DECOMAIN, Pedro Roberto. Elegibilidade e inelegibilidades. 2. ed. São Paulo: Dialética, 2004.
FERREIRA FILHO, Manoel Gonçalves. Comentários à Constituição brasileira de 1988. v. 1. Arts. 1º a 43. São
Paulo: Saraiva, 1990.
______. Comentários à Constituição brasileira. v. 3. Arts. 130 a 210. 2. ed. São Paulo: Saraiva, 1977.
JACQUES, Paulino. Curso de Direito Constitucional. 8. ed. Rio de Janeiro: Forense, 1977.
MENDES, Antônio Carlos. Aspectos da ação de impugnação de mandato eletivo. In: VELLOSO, Carlos
Mário da Silva; ROCHA, Cármen Lúcia Antunes. Direito Eleitoral. Belo Horizonte: Del Rey, 1996. p. 331-342.
NIESS, Pedro Henrique Távora. Ação de impugnação de mandato eletivo. Bauru, SP: Edipro, 1996.
RIBEIRO, Fávila. Abuso de poder no Direito Eleitoral. 3. ed. Rio de Janeiro: Forense, 1998.
VAZ, Orlando. Impugnação de mandato eletivo. In: VELLOSO, Carlos Mário da Silva; ROCHA, Cármen
Lúcia Antunes. Direito Eleitoral. Belo Horizonte: Del Rey, 1996. p. 343-367.
Informação bibliográfica deste texto, conforme a NBR 6023:2002 da Associação Brasileira de Normas
Técnicas (ABNT):
2.1 Introdução
A relação entre dinheiro, eleições e democracia apresenta-se de maneira ambi
valente: se, por um lado, os recursos financeiros são indispensáveis à realização de
campanhas eleitorais, dado que essenciais à divulgação das candidaturas e de suas
respectivas plataformas políticas, por outro, é inegável que o tema suscita preocupações
e a necessidade de estabelecimento de regulação e fiscalização eficazes para evitar que
o abuso de recursos materiais possa prejudicar a legitimidade das eleições.
Referidas preocupações se proliferam no mundo todo. A relação entre dinheiro
e política sempre provoca debates nas democracias ocidentais, além de ensejar,
constantemente, alterações legislativas nos diversos países. Justamente por isso, a
legislação acerca da matéria é conhecida como “legislação interminável” na Alemanha.1
No caso brasileiro, toda a matéria eleitoral tem provocado debates e sofrido
constantes modificações legislativas, não sendo diferente a questão no que tange ao
tema do financiamento eleitoral.
Foram frequentes as modificações legislativas ocorridas no país nos últimos 15
anos, com o propalado propósito de reduzir os custos das campanhas, conforme se extrai
das minirreformas promovidas pelas Leis nºs 11.300/2006, 12.034/2009 e 12.891/2013.
Porém, as alterações não surtiram o efeito buscado. Ao contrário, as receitas
declaradas por candidatos e partidos políticos aumentaram em todas as eleições
realizadas entre 2002 e 2014.
1
ZOVATTO, Daniel. Financiamento dos Partidos e Campanhas Eleitorais na América Latina: Uma Análise
Comparada. Opinião Pública, Campinas, v. 11, n. 2, p. 287-336, out. 2005. p. 330.
2
Dados disponíveis em: <www.asclaras.org.br>. Acesso: em 10 jan. 2017.
3
Dados disponíveis em: <http://inter01.tse.jus.br/spceweb.consulta.receitasdespesas2014/abrirTelaReceitasCan
didatoaction>. Acesso em: 10 set. 2017.
4
FERREIRA FILHO, Manoel Gonçalves. Democracia, Partidos e Sistema Eleitoral. In: CAGGIANO, Monica
Herman S. (coord). Direito Eleitoral em Debate: Estudos em Homenagem a Cláudio Lembo. São Paulo: Saraiva, 2013.
p. 370.
5
DUVERGER, Maurice. Os Partidos Políticos. 2. ed. Brasília: Universidade de Brasília, 1980. p. 20-21.
6
JEHÁ, Pedro Rubens. Os Partidos Políticos em Cenário Eleitoral. In: CAGGIANO, Monica Herman S. (coord.);
Direito Eleitoral em Debate: Estudos em homenagem a Cláudio Lembo. São Paulo, 2013: Saraiva. p. 88-89.
7
BONAVIDES, Paulo. Ciência Política. 20. ed. São Paulo, 2013: Malheiros. p. 298.
8
TAVARES, André Ramos. A Jurisprudência sobre Partidos Políticos no STF: Entre Eleições, Poder Econômico e
Democracia. In: Sistema Político e Direito Eleitoral Brasileiros: Estudos em Homenagem ao Ministro Dias Toffoli.
São Paulo, 2016: Atlas. p. 43.
9
FERREIRA FILHO, Manoel Gonçalves. Democracia, Partidos e Sistema Eleitoral. In: CAGGIANO, Monica
Herman S (coord). Direito Eleitoral em Debate: Estudos em Homenagem a Cláudio Lembo. São Paulo: Saraiva,
2013. p. 380.
10
TAVARES, André Ramos. A Jurisprudência sobre Partidos Políticos no STF: Entre Eleições, Poder Econômico e
Democracia. In: Sistema Político e Direito Eleitoral Brasileiros: Estudos em Homenagem ao Ministro Dias Toffoli.
São Paulo, 2016: Atlas. p. 43.
11
MIGUEL, Luis Felipe. Representação Política em 3-d. Elementos para uma teoria ampliada da representação
política. Revista Brasileira de Ciências Sociais. v. 18, n. 51. p. 123-193. fev. 2003. Disponível em: <http://www.
scielo.br/pdf/rbcsoc/v18n51/15989.pdf>. Acesso em: 20 dez. 2017. p. 124.
12
Idem.
13
Disponível em: <http://direitosp.fgv.br/sites/direitosp.fgv.br/files/arquivos/relatorio_icj_1sem2017.pdf>. Aces
so em: 21 jan. 2018.
É preciso preservar os partidos e a política, pois tais instrumentos são a única via
possível para a construção de uma sociedade mais democrática e justa.
14
SPECK, Bruno Wilhelm. O Financiamento das Campanhas Eleitorais. In: AVRITZER, Leonardo; ANASTASIA,
Fátima. Reforma Política no Brasil. Belo Horizonte, 2006: UFMG. p. 154.
15
SANTANO, Ana Cláudia. O Financiamento da Política. Teoria geral e experiências no direito comparado. 2. ed.
Curitiba: Íthala, 2016, p. 37-38.
16
SPECK, Bruno Wilhelm. O Financiamento das Campanhas Eleitorais. In: AVRITZER, Leonardo; ANASTASIA,
Fátima. Reforma Política no Brasil. Belo Horizonte, 2006: UFMG. p. 155.
17
RUBIO, Delia Ferreira. Financiamento de Partidos e Campanhas – Fundos Públicos versus Fundos Privados.
Novos Estudos – CEBRAP, São Paulo – SP, n. 73, 2005. p. 7.
18
SARMENTO, Daniel; OSORIO, Aline. Uma Mistura Tóxica: Política, Dinheiro e o Financiamento das Eleições.
In: SARMENTO, Daniel (coord). Jurisdição Constitucional e Política. Rio de Janeiro: Forense, 2015. p. 675.
19
JORGE, André Guilherme Lemos; SOARES, Michel Bertoni. Financiamento eleitoral por pessoas jurídicas: a
influência do poder econômico sobre a democracia. Revista de Informação Legislativa: RIL, v. 54, n. 216, p. 87-104,
out./dez. 2017. Disponível em: <https://www12.senado.leg.br/ril/edicoes/54/216/ril_v54_n216_p87.pdf>. Acesso
em: 12 jan. 2018. p. 99.
20
Idem, p. 99.
21
ZAVASCKI, Teori. Financiamento Eleitoral de Partidos Políticos: A Questão Constitucional. In: NORONHA,
João Otávio de; PAE KIM, Richard (Coord.). Sistema Político e Direito Eleitoral Brasileiros: Estudos em Homenagem
ao Ministro Dias Toffoli. São Paulo: Atlas, 2016. p. 751.
22
RAWLS, John. Uma Concepção Kantiana de Igualdade. Veritas, Porto Alegre, v. 52, n. 1., p. 108-119, mar. 2007.
p. 108.
23
Idem, p. 109.
24
Idem, p. 109.
25
Idem, p. 110.
26
Idem, p. 110.
27
Idem, p. 111.
Os princípios básicos de justiça adotados por John Rawls já haviam sido expostos
em suas obras Uma Teoria da Justiça e Justiça e Democracia. Nesta, o autor descreve os
princípios da seguinte forma:
(1) Cada pessoa tem direito igual a um sistema plenamente adequado de liberdades e
de direitos básicos iguais para todos, compatíveis com um mesmo sistema para todos.
(2) As desigualdades sociais e econômicas devem preencher duas condições: em primeiro
lugar, devem estar ligadas a funções e a posições abertas a todos em condições de justa
(fair) igualdade de oportunidades; e, em segundo lugar, devem proporcionar a maior
vantagem para os membros mais desfavorecidos da sociedade.29
28
Idem, p. 111.
29
RAWLS, John. Justiça e Democracia. São Paulo: Martins Fontes, 2000. p. 207.
30
RAWLS, John. Uma Concepção Kantiana de Igualdade. Veritas, Porto Alegre, v. 52, n. 1, p. 108-119, mar. 2007.
p. 112.
31
Idem, p. 115.
32
Idem, p. 115.
33
Idem, p. 116.
Sem embargo das críticas realizadas à teoria de Jonh Rawls, no sentido de que seja
universalista e que pretenda justificar a submissão racional dos indivíduos à estrutura
social, dentro de um quadro liberal,37 há dois aspectos de sua obra que são importantes
para a abordagem da questão do financiamento das campanhas eleitorais: (a) a justiça
na definição da estrutura básica e a possibilidade de readequação dos princípios que
lhe são correlatos, sob pena de que os fatos ocorridos a partir de uma estrutura inicial
deformada possam ter aparência de equânimes se analisados isoladamente, mas na
realidade produzam distorções; (b) a necessária igualdade de oportunidades entre os
candidatos.
Nesse sentido, a igualdade de oportunidades pode ser violada tanto no finan
ciamento privado, quando se permite, por exemplo, o autofinanciamento das campanhas
eleitorais de maneira ilimitada, quanto no financiamento exclusivamente público,
quando os critérios de distribuição dos recursos públicos privilegiam os partidos que
já estão no poder.
Assim, a estrutura básica da legislação eleitoral deve ser pensada de acordo com
princípios que garantam a igualdade entre os candidatos, sob pena de que, apesar de
as campanhas eleitorais se realizarem dentro das normas preestabelecidas, elas apenas
reproduzam as distorções constantes da estrutura básica.
34
OLIVEIRA, Marcelo Roseno de. A Igualdade de Oportunidades nas Competições Eleitorais: Reflexões a Partir
da Teoria da Justiça como Equidade de John Rawls. Paraná Eleitoral: revista brasileira de direito eleitoral e ciência
política, Curitiba, v. 2, n. 2, p.175-190, ago. 2013. p. 176.
35
MUÑOZ, Óscar Sánches. La Igualdade de Oportunidades en las Competiciones Electorales. Madrid, 2007: Centro de
Estudos Políticos y Constitucionales. p. 61.
36
SALGADO, Eneida Desiree. Princípios Constitucionais Estruturantes do Direito Eleitoral. 2010. 356 f. Tese
(Doutorado) – Curso de Direito do Estado, Direito do Estado, Universidade Federal do Paraná, Curitiba, 2010.
p. 247.
37
SILVEIRA, Denis Coitinho. Teoria da Justiça de John Rawls: Entre o Liberalismo e o Comunitarismo. Trans/
Form/Ação, São Paulo, v.30(1), 2007, p. 171.
38
SANTANO, Ana Cláudia. O Financiamento da Política. Teoria geral e experiências no direito comparado. 2. ed.
Curitiba: Íthala, 2016, p. 49.
39
DUVERGER, Maurice. Os Partidos Políticos. 2. ed. Brasília: Universidade de Brasília, 1980. p. 399.
40
SANTANO, Ana Cláudia. O Financiamento da Política. Teoria geral e experiências no direito comparado. 2. ed.
Curitiba: Íthala, 2016, p. 51.
41
ROLLO, Alberto Luiz; SILVA, Raphael José de Oliveira; ALMEIDA, Renato Ribeiro. Financiamento de
Campanhas Eleitorais e dos Partidos Políticos. In: LEMBO, Cláudio (coord.); CAGGIANO, Monica Herman
S. (org.). Reforma Política: Um Mito Inacabado. Barueri, 2017: Manole. p. 28.
42
SPECK, Bruno Wilhelm. Reagir a escândalos ou perseguir ideais? A regulação do financiamento político no
Brasil. Cadernos Adenauer, São Paulo, v. 6, n. 2, p. 123-159, set. 2005. p. 127.
43
Idem, p. 127-128.
44
MUÑOZ, Óscar Sánches. La Igualdade de Oportunidades en las Competiciones Electorales. Madrid, 2007: Centro de
Estudos Políticos y Constitucionales. p. 179.
45
RUBIO, Delia Ferreira. Financiamento de Partidos e Campanhas – Fundos Públicos versus Fundos Privados.
Novos Estudos – CEBRAP, São Paulo – SP, n. 73, 2005. p. 8.
46
SANTANO, Ana Cláudia. O Financiamento da Política. Teoria geral e experiências no direito comparado. 2. ed.
Curitiba: Íthala, 2016, p. 104.
47
SANSEVERINO, Francisco de Assis Vieira. Financiamento de Campanha Eleitoral – Entre o Público e o Privado.
In: RAMOS, André de Carvalho. Temas de Direito Eleitoral no Século XXI. Brasília: ESMPU, 2012. p. 256.
48
ROLLO, Alberto Luiz; SILVA, Raphael José de Oliveira; ALMEIDA, Renato Ribeiro. Financiamento de
Campanhas Eleitorais e dos Partidos Políticos. In: LEMBO, Cláudio (coord.); CAGGIANO, Monica Herman
S. (org.). Reforma Política: Um Mito Inacabado. Barueri, 2017: Manole. p. 22.
Por seu turno, Casseb afirma que o principal argumento favorável ao financia
mento público das campanhas seria a garantia da independência dos candidatos em
face do poder econômico, de modo que evitaria que este influenciasse as eleições,
cumprindo com o disposto no art. 14, §9º, da Constituição Federal.49
Fixados os argumentos favoráveis ao financiamento público exclusivo das
campanhas eleitorais, passa-se à análise de cada um deles.
Inicialmente, cabe ressaltar que a adoção desse modelo de financiamento, por si
só, não é garantia de maior equidade entre os candidatos e partidos políticos, ou seja,
do respeito ao princípio da igualdade de oportunidades nas competições eleitorais, uma
vez que, nesse aspecto, não é a fonte de financiamento, exclusivamente, que determina
ou não uma relação isonômica entre os envolvidos no processo eleitoral.
Ana Cláudia Santano observa que o princípio de igualdade de oportunidades
se refere tanto à igualdade na origem, pela qual o “Estado deve garantir um ponto
de partida igual para todos, de maneira neutra e imparcial” e ainda atuar de maneira
positiva para que a igualdade possa ser verificada.50 Destaca também que
49
CASSEB, Paulo Adib. Vantagens e Desvantagens do Financiamento Público de Campanhas Eleitorais.
CAGGIANO, Monica Herman S. (coord.). Direito Eleitoral em Debate: Estudos em Homenagem a Cláudio Lembo. São
Paulo: Saraiva, 2013. p. 177.
50
SANTANO, Ana Cláudia. O Financiamento da Política. Teoria geral e experiências no direito comparado. 2. ed.
Curitiba: Íthala, 2016, p. 110.
51
Idem, p. 112.
52
Idem, p. 113.
53
RUBIO, Delia Ferreira. Financiamento de Partidos e Campanhas – Fundos Públicos versus Fundos Privados.
Novos Estudos – CEBRAP, São Paulo – SP, n. 73, 2005. p. 9.
54
SANTANO, Ana Cláudia. O Financiamento da Política. Teoria geral e experiências no direito comparado. 2. ed.
Curitiba: Íthala, 2016, p. 125.
55
FERREIRA, Lara Marina. O financiamento de partidos políticos e de campanhas eleitorais no contexto da
reforma política brasileira. Estudos Eleitorais, Brasília, v. 6, n. 1, p. 91-110, jan./abr. 2011. Disponível em: <http://
bibliotecadigital.tse.jus.br/xmlui/handle/bdtse/320>. Acesso em: 10 jan. 2018. p. 97.
56
RUBIO, Delia Ferreira. Financiamento de Partidos e Campanhas – Fundos Públicos versus Fundos Privados.
Novos Estudos – CEBRAP, São Paulo – SP, n. 73, 2005. p. 10.
57
O presente artigo não trata da possibilidade de doações realizadas por pessoas jurídicas. A respeito desse tema,
destacamos: JORGE, André Guilherme Lemos; SOARES, Michel Bertoni. Financiamento eleitoral por pessoas
jurídicas: a influência do poder econômico sobre a democracia. Revista de Informação Legislativa: RIL, v. 54, n. 216,
p. 87-104, out./dez. 2017. Disponível em: <https://www12.senado.leg.br/ril/edicoes/54/216/ril_v54_n216_p87.
pdf>. Acesso em: 12 jan. 2018. Entretanto, destaca-se que, mesmo empresas podem ter interesses legítimos a
proteger e que sejam afinados com uma determinada ideologia partidária, conforme enfatiza André Ramos
Tavares (A Jurisprudência sobre Partidos Políticos no STF: Entre Eleições, Poder Econômico e Democracia. In:
NORONHA, João Otávio de; PAE KIM, Richard (Coord.). Sistema Político e Direito Eleitoral Brasileiros: Estudos
em Homenagem ao Ministro Dias Toffoli. São Paulo: Atlas, 2016. p. 61).
O efeito do financiamento público como antídoto contra a corrupção não tem corroboração
empírica suficiente. De fato, episódios de corrupção associados ao financiamento da política
verificam-se tanto em países que preveem o financiamento público quanto naqueles que
não os contemplam. Casos como o do chanceler alemão Helmut Kohl, o dos “Amigos
de Fox” no México e o dos que redundaram nos processos da operação Mãos Limpas
(Mani Pulite) na Itália se deram em contextos de sistemas com financiamento público de
partidos e campanhas.59
58
SALGADO, Eneida Desiree; GONÇALVES, Luiz Carlos dos Santos. A reforma da vez: PEC 77 e a democracia
intrapartidária. Disponível em: <https://www.jota.info/artigos/a-reforma-da-vez-pec-77-e-a-democracia-
intrapartidaria-29082017>. Acesso em: 30 ago. 2017.
59
RUBIO, Delia Ferreira. Financiamento de Partidos e Campanhas – Fundos Públicos versus Fundos Privados.
Novos Estudos – CEBRAP, São Paulo – SP, n. 73, 2005. p. 10.
60
SANTANO, Ana Cláudia. O Financiamento da Política. Teoria geral e experiências no direito comparado. 2. ed.
Curitiba: Íthala, 2016, p. 125.
61
SPECK, Bruno Wilhelm. Reagir a escândalos ou perseguir ideais? A regulação do financiamento político no
Brasil. Cadernos Adenauer, São Paulo, v. 6, n. 2, p. 123-159, set. 2005. p. 156.
62
Idem, p. 155.
63
ZOVATTO, Daniel. Financiamento dos Partidos e Campanhas Eleitorais na América Latina: Uma Análise
Comparada. Opinião Pública, Campinas, v. 11, n. 2, p.287-336, out. 2005. p. 300.
64
ZOVATTO, Daniel. Financiamento dos Partidos e Campanhas Eleitorais na América Latina: Uma Análise
Comparada. Opinião Pública, Campinas, v. 11, n. 2, p.287-336, out. 2005. p. 300.
65
SPECK, Bruno Wilhelm. Reagir a escândalos ou perseguir ideais? A regulação do financiamento político no
Brasil. Cadernos Adenauer, São Paulo, v. 6, n. 2, p. 123-159, set. 2005. p. 155.
66
RUBIO, Delia Ferreira. Financiamento de Partidos e Campanhas – Fundos Públicos versus Fundos Privados.
Novos Estudos – CEBRAP, São Paulo – SP, n. 73, 2005. p. 9.
Referências
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14, §3º, inciso V, da Constituição Federal. Disponível em: <http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/leis/l9096.
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______. Lei nº 9.504, de 30 de setembro de 1997. Estabelece normas para eleições. Disponível em: <http://
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ZAVASCKI, Teori. Financiamento Eleitoral de Partidos Políticos: A Questão Constitucional. In: In: NORONHA,
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ZOVATTO, Daniel. Financiamento dos Partidos e Campanhas Eleitorais na América Latina: Uma Análise
Comparada. Opinião Pública, Campinas, v. 11, n. 2, p. 287-336, out. 2005.
Informação bibliográfica deste texto, conforme a NBR 6023:2002 da Associação Brasileira de Normas
Técnicas (ABNT):
3.1 Introdução
Este artigo tem por objetivo analisar, ainda que em linhas preliminares, a origem
dos recursos financiadores das campanhas eleitorais antes do julgamento da Ação Direta
de Inconstitucionalidade nº 4.650 pelo Supremo Tribunal Federal, sua composição e
a predominância dos recursos privados no modelo de financiamento de campanha
brasileiro.
Em segundo momento, o estudo volta-se à identificação do impacto imediato
causado pelo julgamento da ADI 4.650 já nas eleições municipais de 2016, à aferição de
como as fontes de financiamento de campanha eleitoral sofreram alteração em relação às
eleições municipais de 2012 e ao exame dos mecanismos regulatórios fixados pela Justiça
Eleitoral para delimitar, com maior rigor, as fontes de financiamento então disponíveis.
Por fim, o estudo busca identificar os sinais que apontam ao futuro do
financiamento das campanhas eleitorais no Brasil após o fim das doações empresariais,
examinando os instrumentos compensatórios criados pela reforma eleitoral de 2017
para suprir a lacuna deixada pelo fim das doações de pessoas jurídicas.
A opção metodológica aplicada no estudo foi a dedutiva. Na pesquisa optar-se-á
pela análise bibliográfica, de dados legais e de coleta de dados junto à Justiça Eleitoral.
Art. 19. (...) Parágrafo único A utilização de recursos próprios dos candidatos é limitada
a 50% do patrimônio informado à Receita Federal do Brasil na Declaração de Imposto de
Renda da Pessoa Física referente ao exercício anterior ao pleito (arts. 548 e 549 do Código
Civil).
1
Números fornecidos pela ASEPA – Assessoria de Exame de Contas Eleitorais e Partidárias.
A ação foi ajuizada pelo Conselho Federal da Ordem dos Advogados do Brasil
(OAB) contra dispositivos da Lei das Eleições (Lei nº 9.504/1997) e da Lei dos Partidos
Políticos (Lei nº 9.096/1995), requerendo, no que importa a este estudo e no mérito,
consoante se extrai da inicial, fosse:
Parágrafo único. Não se consideram doações para os fins deste artigo as transferências ou
repasses de recursos de partidos ou comitês para os candidatos.
Art. 24-B. Doações e contribuições de pessoas jurídicas para campanhas eleitorais poderão
ser feitas para os partidos políticos a partir do registro dos comitês financeiros dos partidos
ou coligações.
§1º As doações e contribuições de que trata este artigo não poderão ultrapassar nenhum
dos seguintes limites:
I – 2% (dois por cento) do faturamento bruto do ano anterior à eleição, somadas todas
as doações feitas pelo mesmo doador, até o máximo de R$20.000.000,00 (vinte milhões
de reais);
II – 0,5% (cinco décimos por cento) do faturamento bruto, somadas todas as doações feitas
para um mesmo partido.
§2º A doação de quantia acima dos limites fixados neste artigo sujeita a pessoa jurídica
ao pagamento de multa no valor de cinco vezes a quantia em excesso
§3º Sem prejuízo do disposto no §2º, a pessoa jurídica que ultrapassar o limite fixado no
§1º estará sujeita à proibição de participar de licitações públicas e de celebrar contratos
com o poder público pelo período de cinco anos por determinação da Justiça Eleitoral,
em processo no qual seja assegurada ampla defesa.
§4º As representações propostas objetivando a aplicação das sanções previstas nos §§2º e
3º observarão o rito previsto no art. 22 da Lei Complementar 64, de 18 de maio de 1990 e
o prazo de recurso contra as decisões proferidas com base neste artigo será de três dias, a
contar da data da publicação do julgamento no Diário Oficial. (grifou-se)
Não há dúvidas de que, para além dos judiciosos argumentos jurídicos aduzidos
no acórdão, o contexto político e, por que não dizer?, derivado da apuração de inúmeros
e fragorosos ilícitos diretamente relacionados ao financiamento de campanhas eleitorais
por empresas no Brasil e sua estreita e espúria relação com o Poder Público, cuja
consequência desbordou em escândalos de corrupção tidos como os maiores da história
política brasileira, influenciou profundamente o decisum superior.
É como se o banimento do mundo jurídico do que se julgou ser a principal causa
de crimes de lavagem de dinheiro e corrupção ativa e passiva fosse determinante para
banir os ilícitos em si.
Mas foi justamente o disciplinamento das doações de pessoas jurídicas, a defi
nição das vedações de fonte e a imposição de limites, insculpida na Lei nº 8.713/1993,
que trouxe tais doações à tona e permitiu que a Justiça Eleitoral e uma verdadeira e
moderna rede de controles – em evolução e eficazes, fruto do compartilhamento de
informações entre os mais diversos órgãos da administração pública – pudesse ser
construída para coibir abusos e responsabilizar aqueles que infringissem as regras de
igualdade que fundamentam a disputa eleitoral. E mais; com a evolução verificada a
partir das eleições de 2010, coibindo-se progressiva e substancialmente o financiamento
por doações ocultas, pôde-se vincular com precisão eventuais origens ilícitas de recursos
e respectivos beneficiários, viabilizando a sanção de condutas indevidas, no intuito de
expurgá-las do processo eleitoral.
O banimento das pessoas jurídicas do processo de financiamento de contas
eleitorais não impõe automaticamente o fim de financiamento dessa natureza, mas o
coloca à margem dos mais modernos mecanismos de fiscalização e controle de que hoje
dispõe a Justiça Eleitoral. Impede, ao fim e ao cabo, que se faça a vinculação entre o
financiador ilícito e indireto das campanhas – que poderá agora estar completamente
relegado às sombras – e seus beneficiários, dificultando em muito a sua eventual res
ponsabilização. Se extrema e negativamente impactantes os processos de apuração de
financiamento ilícito de campanhas eleitorais, a macular os processos eleitorais a que
se vinculam, é por esses mesmos processos que as instituições exercem o poder-dever
daquelas passíveis de utilização. É o que se observa do art. 15, antes citado, no que
concerne aos recursos próprios dos candidatos advindos de empréstimos.
A norma cuidou de delimitar rigidamente essa forma de aplicação de recursos
próprios, com fundamento em duas diretrizes principais: a idoneidade da procedência
do empréstimo e a capacidade econômica para contratação do empréstimo e pagamento.
As diretrizes estabelecidas pela norma inibem a contratação fraudulenta de
empréstimos para ocultar a origem de recursos que possam ter procedência ilícita
quando regulamenta a origem, limitando-a às possibilidades legalmente reconhecidas
pelo sistema financeiro nacional e afere a capacidade econômica do contratante.
Ambas as diretrizes encontram operacionalidade nos comandos que determinam
que os empréstimos sejam contratados em instituições financeiras ou equiparadas, auto
rizadas a funcionar pelo Banco Central do Brasil e, na hipótese de terem sido contratados
por candidatos, que estejam garantidos por caução de bem que integre seu patrimônio
no momento do registro de candidatura e, adicionalmente, que sejam consentâneos com
a capacidade de pagamento decorrente dos rendimentos de sua atividade econômica.
Além disso, nos §§1º e 2º do mesmo art. 15, disciplinou a obrigatoriedade de
que candidato e partido comprovassem à Justiça Eleitoral a realização do empréstimo
por meio de documentação legal e idônea, bem como, os pagamentos realizados para
sua quitação até o momento da entrega da sua prestação de contas, prevendo, ainda, a
possibilidade de que as autoridades judiciais determinassem ao candidato ou ao partido
que comprovassem o pagamento do empréstimo, identificando a origem dos recursos
utilizados para quitação.
Por fim, quanto aos recursos provenientes dos partidos políticos, para além da
questão relativa à impossibilidade de aplicação de recursos por eles recebidos de pessoas
jurídicas, a Resolução TSE 23.463/2015 disciplinou consoante segue:
Art. 16. As doações realizadas por pessoas físicas ou as contribuições de filiados recebidas
pelos partidos políticos em anos anteriores ao da eleição para sua manutenção ordinária,
creditadas na conta bancária destinada à movimentação financeira de “Outros Recursos”,
prevista na resolução que trata das prestações de contas anuais dos partidos políticos,
podem ser aplicadas nas campanhas eleitorais de 2016, desde que observados os seguintes
requisitos cumulativos:
I – identificação da sua origem e escrituração individualizada das doações e contribuições recebidas,
na prestação de contas anual, assim como seu registro financeiro na prestação de contas de campanha
eleitoral do partido;
II – observância das normas estatutárias e dos critérios definidos pelos respectivos órgãos de direção
nacional, os quais devem ser fixados objetivamente e encaminhados ao Tribunal Superior Eleitoral
até 15 de agosto de 2016 (Lei 9.096/1995, art. 39, §5º);
III – transferência para a conta bancária “Doações para Campanha”, antes de sua destinação ou
utilização, respeitados os limites legais impostos a tais doações, calculados com base nos rendimentos
auferidos no ano anterior ao da eleição em que a doação for aplicada, ressalvados os recursos do
Fundo Partidário, cuja utilização deverá observar o disposto no parágrafo único do art. 8º;
IV – identificação, na prestação de contas eleitoral do partido e também nas respectivas contas
anuais, do nome ou razão social e do número do CPF da pessoa física ou do CNPJ do candidato
ou partido doador, bem como a identificação do número do recibo eleitoral ou do recibo de doação
original, emitido na forma do art. 6º.
§1º O encaminhamento de que trata o inc. II deve ser endereçado à Presidência do Tribunal
Superior Eleitoral, que os divulgará na página do Tribunal na internet.
§2º Os recursos auferidos nos anos anteriores devem ser identificados como reserva ou
saldo de caixa nas prestações de contas anuais da agremiação, que devem ser apresentadas
até 30 de abril de 2016.
§3º Somente os recursos provenientes do Fundo Partidário ou de doações de pessoas
físicas que componham a reserva ou o saldo de caixa do partido podem ser utilizados
nas campanhas eleitorais.
§4º No ano da eleição, a parcela do Fundo Partidário prevista no inc. V do art. 44 da
Lei 9.096/1995, relativa à criação e manutenção de programas de promoção e difusão
da participação política das mulheres, pode ser integralmente destinada ao custeio de
campanhas eleitorais de mulheres candidatas (Lei 9.096/1995, art. 44, §7º).
Art. 17. Os partidos políticos podem aplicar nas campanhas eleitorais os recursos do Fundo
Partidário, inclusive aqueles recebidos em exercícios anteriores.
§1º A aplicação dos recursos provenientes do Fundo Partidário, nas campanhas eleitorais,
pode ser realizada mediante:
I – transferência para conta bancária do candidato aberta nos termos do art. 8º;
II – transferência dos recursos de que tratam o §5º-A do art. 44 da Lei 9.096/1995 e o art. 9º
da Lei 13.165/2015 para a conta bancária de campanha de candidata aberta na forma do
art. 8º desta resolução;
III – pagamento dos custos e despesas diretamente relacionados às campanhas eleitorais
dos candidatos e dos partidos políticos, procedendo-se à sua individualização.
§2º Os partidos políticos devem manter as anotações relativas à origem e à transferência
dos recursos na sua prestação de contas anual e devem registrá-las na prestação de contas
de campanha eleitoral de forma a permitir a identificação do destinatário dos recursos
ou o seu beneficiário.
§3º As despesas e custos assumidos pelo partido político em benefício de mais de uma
candidatura devem ser registradas de acordo com o valor individualizado, apurado
mediante o rateio entre todas as candidaturas beneficiadas, na proporção do benefício
auferido.
§4º Os partidos políticos devem destinar no mínimo cinco por cento e no máximo quinze
por cento do montante do Fundo Partidário, destinado ao financiamento das campanhas
eleitorais, para aplicação nas campanhas de suas candidatas, incluídos nesse valor os
recursos a que se refere o inc. V do art. 44 da Lei 9.096/1995 (Lei 13.165/2015, art. 9º).
(grifou-se)
Art. 25. É vedado a partido político e a candidato receber, direta ou indiretamente, doação
em dinheiro ou estimável em dinheiro, inclusive por meio de publicidade de qualquer
espécie, procedente de:
I – pessoas jurídicas;
II – origem estrangeira;
III – pessoa física que exerça atividade comercial decorrente de concessão ou permissão
pública.
§1º O recurso recebido por candidato ou partido oriundo de fontes vedadas deve ser
imediatamente devolvido ao doador, sendo vedada sua utilização ou aplicação financeira.
§2º O comprovante de devolução pode ser apresentado em qualquer fase da prestação
de contas ou até cinco dias após o trânsito em julgado da decisão que julgar as contas.
§3º A transferência de recurso recebido de fonte vedada para outro órgão partidário ou
candidato não isenta o donatário da obrigação prevista no §1º.
§4º O beneficiário de transferência cuja origem seja considerada fonte vedada pela Justiça
Eleitoral responde solidariamente pela irregularidade e as consequências serão aferidas
por ocasião do julgamento das respectivas contas.
§5º A devolução ou a determinação de devolução de recursos recebidos de fonte vedada
não impedem, se for o caso, a reprovação das contas, quando constatado que o candidato
se beneficiou, ainda que temporariamente, dos recursos ilícitos recebidos, assim como a
apuração do fato na forma do art. 30-A da Lei 9.504/1997, do art. 22 da Lei Complementar
64/1990 e do art. 14, §10, da Constituição da República. (grifou-se)
Veja-se que, apesar de o rol de vedações ter restado bastante diminuído, a Lei
das Eleições ainda contempla, de um modo geral, três grandes grupos, passíveis de
consolidação, agora representados, cada um deles, por uma das hipóteses de vedação:
II – concessão de serviço público: a delegação de sua prestação, feita pelo poder concedente,
mediante licitação, na modalidade de concorrência, à pessoa jurídica ou consórcio de
empresas que demonstre capacidade para seu desempenho, por sua conta e risco e por
prazo determinado;
(...)
IV – permissão de serviço público: a delegação, a título precário, mediante licitação, da
prestação de serviços públicos, feita pelo poder concedente à pessoa física ou jurídica que
demonstre capacidade para seu desempenho, por sua conta e risco. (grifou-se)
Art. 12 (...) §3º O Projeto de Lei Orçamentária de 2018 conterá reservas específicas para
atendimento de:
I – programações decorrentes de emendas individuais estabelecidas no §2o do art. 59; e
II – programações decorrentes de emendas de bancada estadual de execução obrigatória
e de despesas necessárias ao custeio de campanhas eleitorais.
Ao mesmo tempo, contudo, que a reforma prevê que o fundo seja constituído
com 30% dos recursos destinados às reservas de bancada, prevê que este percentual
possa ser reduzido se houver dotação orçamentária destinada em excesso ao Poder
Legislativo. Não há qualquer definição dos critérios que estabeleçam referidos excessos.
A reforma eleitoral estabeleceu previsão de que os valores do fundo estejam
disponíveis ao TSE, encarregado da distribuição dos recursos aos partidos políticos, até
o primeiro dia útil do mês de junho de cada ano eleitoral. Sua distribuição, contudo, será
condicionada à definição, pelo próprio partido político – esfera nacional, dos critérios
a serem adotados para a sua distribuição, os quais deverão ser aprovados pela maioria
absoluta dos membros da executiva nacional e divulgados publicamente.
A destinação do fundo especial para as campanhas eleitorais tem por consequência
que o saldo deste fundo não permaneça sob a guarda dos partidos políticos após as
eleições: os valores não utilizados devem ser devolvidos integralmente ao Tesouro
nacional já por ocasião da prestação de contas partidária nas eleições.
No que se refere à distribuição dos recursos do Fundo de Campanha, a norma
estabelece no art. 16-D. 3 (Lei das Eleições) que esta ocorrerá no primeiro turno
2
Art. 16-C. O Fundo Especial de Financiamento de Campanha (FEFC) é constituído por dotações orçamentárias
da União em ano eleitoral, em valor ao menos equivalente:
I – ao definido pelo Tribunal Superior Eleitoral, a cada eleição, com base nos parâmetros definidos em lei;
II – a 30% (trinta por cento) dos recursos da reserva específica de que trata o inciso II do §3º do art. 12 da Lei nº
13.473, de 8 de agosto de 2017. (...)
§2º O Tesouro Nacional depositará os recursos no Banco do Brasil, em conta especial à disposição do Tribunal
Superior Eleitoral, até o primeiro dia útil do mês de junho do ano do pleito.
§3º Nos quinze dias subsequentes ao depósito, o Tribunal Superior Eleitoral:
I – divulgará o montante de recursos disponíveis no Fundo Eleitoral; e (...)
§7º Os recursos de que trata este artigo ficarão à disposição do partido político somente após a definição de
critérios para a sua distribuição, os quais, aprovados pela maioria absoluta dos membros do órgão de direção
executiva nacional do partido, serão divulgados publicamente. (...)
§11. Os recursos provenientes do Fundo Especial de Financiamento de Campanha que não forem utilizados nas
campanhas eleitorais deverão ser devolvidos ao Tesouro Nacional, integralmente, no momento da apresentação
da respectiva prestação de contas. (...)
§15. O percentual dos recursos a que se refere o inciso II do caput deste artigo poderá ser reduzido mediante
compensação decorrente do remanejamento, se existirem, de dotações em excesso destinadas ao Poder
Legislativo.
3
Art. 16-D. Os recursos do Fundo Especial de Financiamento de Campanha (FEFC), para o primeiro turno das
eleições, serão distribuídos entre os partidos políticos, obedecidos aos seguintes critérios:
I – 2% (dois por cento), divididos igualitariamente entre todos os partidos com estatutos registrados no Tribunal
Superior Eleitoral;
II – 35% (trinta e cinco por cento), divididos entre os partidos que tenham pelo menos um representante na
Câmara dos Deputados, na proporção do percentual de votos por eles obtidos na última eleição geral para a
Câmara dos Deputados;
III – 48% (quarenta e oito por cento), divididos entre os partidos, na proporção do número de representantes na
Câmara dos Deputados, consideradas as legendas dos titulares;
IV – 15% (quinze por cento), divididos entre os partidos, na proporção do número de representantes no Senado
Federal, consideradas as legendas dos titulares. (...)
§2º Para que o candidato tenha acesso aos recursos do Fundo a que se refere este artigo, deverá fazer
requerimento por escrito ao órgão partidário respectivo.
4
IV – instituições que promovam técnicas e serviços de financiamento coletivo por meio de sítios na internet,
aplicativos eletrônicos e outros recursos similares, que deverão atender aos seguintes requisitos:
a) cadastro prévio na Justiça Eleitoral, que estabelecerá regulamentação para prestação de contas, fiscalização
instantânea das doações, contas intermediárias, se houver, e repasses aos candidatos;
b) identificação obrigatória, com o nome completo e o número de inscrição no Cadastro de Pessoas Físicas (CPF)
de cada um dos doadores e das quantias doadas;
c) disponibilização em sítio eletrônico de lista com identificação dos doadores e das respectivas quantias doadas,
a ser atualizada instantaneamente a cada nova doação;
d) emissão obrigatória de recibo para o doador, relativo a cada doação realizada, sob a responsabilidade da
entidade arrecadadora, com envio imediato para a Justiça Eleitoral e para o candidato de todas as informações
relativas à doação;
e) ampla ciência a candidatos e eleitores acerca das taxas administrativas a serem cobradas pela realização do
serviço;
f) não incidência em quaisquer das hipóteses listadas no art. 24 desta Lei;
g) observância do calendário eleitoral, especialmente no que diz respeito ao início do período de arrecadação
financeira, nos termos dispostos no §2º do art. 22-A desta Lei;
h) observância dos dispositivos desta Lei relacionados à propaganda na internet;
5
§3º Desde o dia 15 de maio do ano eleitoral, é facultada aos pré-candidatos a arrecadação prévia de recursos
na modalidade prevista no inciso IV do §4º do art. 23 desta Lei, mas a liberação de recursos por parte das
entidades arrecadadoras fica condicionada ao registro da candidatura, e a realização de despesas de campanha
deverá observar o calendário eleitoral.
devolução desses valores aos doadores, o que encontrará solução apenas nos acordos
privados firmados entre referidas entidades, doadores e beneficiários, pois não restará
configurada relação de natureza eleitoral que possa sofrer fiscalização da Justiça
Eleitoral, pois nesse período não se configurará a condição de candidatura.
Do que até aqui foi exposto, constata-se que as principais fontes de financiamento
das campanhas eleitorais, após o julgamento da ADI 4.650 e da aprovação da reforma
eleitoral de 2017, estarão concentradas em recursos próprios, doações de pessoas físicas
(impulsionadas pelo mecanismo do financiamento coletivo) e recursos públicos, agora
provenientes do Fundo Partidário e do Fundo Especial de Financiamento de Campanha
(FEFC).
Referências
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DF, 5 out. 1988. Seção 1, p. 1.
______. Lei nº 8.713, de 30 de setembro de 1993. Estabelece normas para as eleições de 3 de outubro de 1994.
Diário Oficial da República Federativa do Brasil, Brasília, DF, 1 out. 1993. Seção 1, p. 14.685.
______. Lei nº 8.987, de 13 de fevereiro de 1995. Dispõe sobre o regime de concessão e permissão da prestação
de serviços públicos previsto no art. 175 da Constituição Federal, e dá outras providências. Diário Oficial da
República Federativa do Brasil, Brasília, DF, 14 fev. 1995. Seção 1, p. 1.917.
______. Lei nº 9.504, de 30 de setembro de 1997. Estabelece normas para as eleições. Diário Oficial da República
Federativa do Brasil, Brasília, DF, 1 out. 1997. Seção 1, p. 21.801.
_______. Lei nº 9.096, de 19 de setembro de 1995. Dispõe sobre partidos políticos, regulamenta os artigos
17 e 14, §3º, inciso V, da Constituição Federal. Diário Oficial da República Federativa do Brasil, Brasília, DF,
20 set.1995. Seção 1, p. 14.552.
______. Lei nº 9.868, de 10 de novembro de 1999. Dispõe sobre o processo e julgamento da ação direta de
inconstitucionalidade e da ação declaratória de constitucionalidade perante o Supremo Tribunal Federal.
Diário Oficial da República Federativa do Brasil, Brasília, DF, 11 nov.1999. Seção 1, p. 1.
_______. Lei nº 13.165, de 29 de setembro de 2015. Altera as Leis nº 9.504, de 30 de setembro de 1997, 9.096,
de 19 de setembro de 1995, e 4.737, de 15 de julho de 1965 – Código Eleitoral, para reduzir os custos das
campanhas eleitorais, simplificar a administração dos Partidos Políticos e incentivar a participação feminina.
Diário Oficial da República Federativa do Brasil, Brasília, DF, 29 set.2015. Seção 1, p. 1.
_______. Lei nº 13.473, de 8 de agosto de 2017. Dispõe sobre as diretrizes para a elaboração e execução da
Lei Orçamentária de 2018 e dá outras providências. Diário Oficial da República Federativa do Brasil, Brasília,
DF, 9 ago.2017. Seção 1, p. 1.
_______. Lei nº 13.487, de 6 de outubro de 2017. Altera as Leis nºº 9.504, de 30 de setembro de 1997, e 9.096, de
19 de setembro de 1995, para instituir o Fundo Especial de Financiamento de Campanha (FEFC) e extinguir
a propaganda partidária no rádio e na televisão. Diário Oficial da República Federativa do Brasil, Brasília, DF,
6 out.2017. Seção 1, p. 1.
_______. Lei nº 13.488, de 6 de outubro de 2017. Altera as Leis nºs 9.504, de 30 de setembro de 1997 (Lei
das Eleições), 9.096, de 19 de setembro de 1995, e 4.737, de 15 de julho de 1965 (Código Eleitoral), e revoga
dispositivos da Lei nº 13.165, de 29 de setembro de 2015 (Minirreforma Eleitoral de 2015), com o fim de
promover reforma no ordenamento político-eleitoral. Diário Oficial da República Federativa do Brasil, Brasília,
DF, 6 out.2017. Seção 1, p. 1.
_______. Supremo Tribunal Federal. Ação direta de inconstitucionalidade nº 4.650, Brasília, DF, 17 de dezembro
de 2015. Diário de Justiça Eletrônico n. 34, 24 fev.2016.
______. Tribunal Superior Eleitoral. Dispõe sobre a arrecadação e os gastos de recursos por partidos políticos,
candidatos e comitês financeiros e, ainda, sobre a prestação de contas nas Eleições de 2014. Resolução
nº 23.406, de 27 de fevereiro de 2014. Diário da Justiça Eletrônico, Brasília, DF, 5 mar. 2014.
______. Tribunal Superior Eleitoral. Dispõe sobre a arrecadação e os gastos de recursos por partidos políticos,
candidatos e comitês financeiros e, ainda, sobre a prestação de contas nas Eleições de 2014. Resolução
nº 23.463, de 15 de dezembro de 2015. Diário da Justiça Eletrônico, Brasília, DF, 29 dez. 2015. p. 11-35.
RANGEL, Tauã Lima Verdan. O instituto da permissão dos serviços públicos: ponderações singelas sobre o
tema. In: Âmbito Jurídico. Rio Grande, XV, n. 100, maio 2012. Disponível em: <http://www.ambito-juridico.
com.br/site/?n_link=revista_artigos_leitura&artigo_id=11681>. Acesso em: 27 dez. 2017.
Informação bibliográfica deste texto, conforme a NBR 6023:2002 da Associação Brasileira de Normas
Técnicas (ABNT):
SCHLICKMANN, Denise Goulart. O fim das doações empresariais: o impacto do julgamento da ADI
4.650 pelo Supremo Tribunal Federal sobre o financiamento das campanhas eleitorais no Brasil. In:
FUX, Luiz; PEREIRA, Luiz Fernando Casagrande; AGRA, Walber de Moura (Coord.); PECCININ,
Luiz Eduardo (Org.). Propaganda Eleitoral. Belo Horizonte: Fórum, 2018. p. 57-76. (Tratado de Direito
Eleitoral, v. 4.) ISBN 978-85-450-0499-8.
4.1 Introdução
Na esteira da promulgação da Lei nº 13.488/2017, que aprovou e regulou o
financiamento coletivo de campanhas, necessário considerar alguns elementos sociais
e jurídicos em torno desse mecanismo.
Assim, o presente trabalho se propõe a apresentar o financiamento coletivo na
internet como uma forma de participação cidadã, dentro de um contexto de engajamento
popular – limitado pela exclusão digital – nas redes sociais. Em seguida, será apresentado
o cenário de busca por uma alternativa de financiamento, decorrente da vedação de
doação de pessoas jurídicas. Nesse ponto, apresenta-se a alternativa do financiamento
coletivo de campanhas, sob o ponto de vista do Tribunal Superior Eleitoral, no contexto
jurídico então vigente.
Só então se chega a previsão legal do crowdfunding, com pesquisa do processo
legislativo e complementação regulatória por parte do TSE, os quais serão analisados
em sua adequação legal e conveniência social.
1
Este artigo foi baseado em monografia apresentada ao Curso de Pós-Graduação Lato Sensu em Direito Consti
tucional do Programa de Pós-Graduação do IDDE – Instituto para o Desenvolvimento Democrático em parceria
com a Universidade de Coimbra e com a Faculdade Arnaldo, como requisito parcial para a obtenção do título de
Especialista em Direito Constitucional, sob orientação do Professor Rodolfo Viana Pereira, denominada “O fi
nanciamento coletivo de campanhas eleitorais: uma análise da proposta da academia brasileira de direito eleitoral e político”.
2
ADAMS, Carl. Crowdfunding guidance and practice: value added and co-creation, 2014. Disponível em: <http://
ipp.oii.ox.ac.uk/2014/programme-2014/track-a-harnessing-the-crowd/design-iii/carl-adams-crowdfunding-
guidance-and>. IPP Oxford. Acesso em: 10 de julho de 2016. p. 11-12.
3
KHOMA, Natalia. Technologies of political (socio-political) crowdsourcing and crowdfunding: world
experience and steps towards implementation in Ukraine. Torun International Studies, Torun, v. 1, n. 8, p. 49-60.
2015. Disponível em: <http://apcz.pl/czasopisma/index.php/TSM/article/view/TIS.2015.005>. Acesso em: 16 jul.
2016. p. 54.
4
LYNGE-MANGUEIRA, Halfdan. Why “Professionalizing” International Election Observation Might Not be
Enough to Ensure Effective Election Observation. IDEA International, 2012. Disponível em: <http://www.idea.
int/democracydialog/upload/why-professionalizing-international-election-observation-might-not-be-enough-
to-ensure-effective-election-observation.pdf>. Acesso em: 10 jul. 2016. p. 17.
5
CASTELLS, Manuel. Toward a Sociology of the Network Society. Contemporary Sociology, Washington, vol. 29,
n. 5, p. 693-699, setembro 2000. Disponível em: <http://www.jstor.org/stable/2655234>. Acesso em: 15 de julho
de 2016.
6
CASTELLS, Manuel. Comunicación, poder y democracia. Conversa realizada na Acampada Barcelona em 27 de
maio 2011. Disponível em <http://escoladeredes.net/video/manuel-castells-en-acampadabcn-1>. Acesso em:
15 jul. 2016.
7
KHOMA, Natalia. loc. cit.
8
ERANTI, Veiko; LINDMAN, Juho. Crowdsourcing & Crowdfunding a Presidential Election, 2014. Disponível em:
<http://ipp.oii.ox.ac.uk/sites/ipp/files/documents/IPP2014_Eranti.pdf>. Acesso em: 10 jul. 2016.
9
SANTANO, Ana Claudia. Como sobreviver na selva: fontes alternativas de financiamento de campanhas elei
torais. In: SANTANO, Ana Cláudia; PEREIRA, Rodolfo Viana (org) Conexões eleitoralistas. Brasília: ABRADEP,
2016a. p. 54-55.
10
BERNARDELLI, Paula Regina. Financiamento Público Exclusivo de Partidos e Campanhas Eleitorais: uma análise
da (in)adequação ao desenho democrático constitucional. 2013. Trabalho de Conclusão de Curso (Graduação em
Direito). Universidade Federal do Paraná, Curitiba. p. 44.
A autora defende ainda a necessidade de se preservar a doação por parte de pessoas jurídicas: “Se é legítimo
que se exija das empresas um papel atuante na construção do projeto democrático e na defesa de interesses
sociais, é coerente que se aceite a necessária ligação dessas pessoas jurídicas com os interesses políticos que
regulam e definem os rumos do país” (p. 46).
11
SANTANO, Ana Cláudia. La financiación de lós partidos políticos em Espana. Madrid: Centro de Estudios Políticos
y Constitucionales, 2016b. p. 251, tradução nossa.
Há distintas formas de participação política que desde muito não se limitam mais ao
voto. Estas atividades permitem afirmar que, em algumas delas, é necessário tempo; em
outras, habilidades e em outras dinheiro. Em praticamente todas há um alcance coletivo
de seus resultados, sempre baseando-se em uma participação ativa, o que também permite
que o tempo e as habilidades sejam substituídos por recursos econômicos sem que isso
intervenha no funcionamento da democracia. Isto é, dinheiro considerado como um
elemento de participação política, como já afirmado neste trabalho, é tão natural como o
próprio direito de votar, além de ser uma evidência da saúde da conexão entre a sociedade
e a arena política.
12
SANTANO, Ana Cláudia. La financiación de lós partidos políticos em Espana. Madrid: Centro de Estudios
Políticos y Constitucionales, 2016b. p. 33.
13
CORRÊA, Oscar Dias. Direito Eleitoral Contemporâneo. In: Patrícia Henriques Ribeiro; Mônica Aragão Costa;
Arthur Magno e Silva Guerra. (Org.). Direito Eleitoral: leituras complementares. 1ed. Belo Horizonte: D’Plácido,
2014, p 49-50. p.48.
14
PEREIRA, Rodolfo Viana; VIDAL, Luísa Ferreira. Op. cit. p. 392.
15
IBOPE INTELIGÊNCIA. Quando o assunto é política, brasileiros são os mais ativos na web nas Américas. 23 jun
2016. Disponível em: <http://www.ibopeinteligencia.com/noticias-e-pesquisas/quando-o-assunto-e-politica-
brasileiros-sao-os-mais-ativos-na-web-nas-americas/>. Acesso em: 07 jul. 2016.
16
MEZZAROBA, Orides; FERREIRA, Marcelo Peregrino. @ democracia no processo político brasileiro: da
tradição do papel para o desafio da virtualidade. In: MORAES, Filomeno; SALGADO, Eneida Desiree: AIETA,
Vania Siciliano (org). Justiça Eleitoral, Controle das Eleições e Soberania Popular. Curitiba: Íthala, 2016. p. 375-396.
p. 376.
17
Ibid. p. 378.
18
Ibid. p. 375.
19
SOARES, Rafael Morgental. Repensando a democracia: do modelo representativo-competitivo ao modelo
interativo-colaborativo. In: MORAES, Filomeno; SALGADO, Eneida Desiree: AIETA, Vania Siciliano (org).
Justiça Eleitoral, Controle das Eleições e Soberania Popular. Curitiba: Íthala, 2016. p. 397-438. p. 476.
(...), a maior média, R$ 779,5 mil, foi em doações de “outros candidatos/comitês”, seguido
da média de R$ 602 mil para as doações de pessoas jurídicas. Já as doações de partidos
políticos ficaram com a média de R$ 354 mil. Depois há uma queda significativa nos
valores médios, com R$ 41,6 mil de média por operação de pessoas físicas e R$ 4,9 mil
para aplicações financeiras. A média de valor por doação pela internet foi a mais baixa,
com R$ 147,3 de média. Esses valores mostram como as doações pela internet foram a
única modalidade capaz de inserir o eleitor comum no rol de doadores de campanha,
pois mesmo para as pessoas físicas a média de R$ 41,6 mil por doação é inviável para a
maioria dos eleitores brasileiros.
20
ROSSI, Marina. A “vaquinha legal” entra na campanha das eleições municipais 2016. El país Brasil. 2016. Disponível
em: <http://brasil.elpais.com/brasil/2016/07/08/politica/1468011468_841041.html>. Acesso em: 11 jul. 2016.
21
CASTRO, Marinella. Novo jeito de captar recursos. Estado de Minas. Economia. p. 6. 21 de agosto de 2016.
22
CERVI, Emerson Urizzi. op. cit. p. 77.
23
Ibid. p. 77.
24
SANTANO, Ana Claudia. op. cit. 2016a. p. 53.
25
REPERCUSSÃO GERAL. Participação de Fernando Neisser no programa Repercussão Geral, da Rádio Justiça,
tratando de duas consultas analisadas e rejeitadas pelo TSE, uma referente ao crowdfunding para campanhas
eleitorais e outra sobre os limites da pré-campanha. 2016. Disponível em: <https://soundcloud.com/fneisser/
programa-repercussao-geral-radio-justica-fernando-neisser-12072016>. Acesso em: 25 jul. 2016.
26
SANTANO, Ana Claudia, O financiamento coletivo de campanhas eleitorais como medida econômica de
democratização das eleições. Estudos Eleitorais, Brasília, v. 11. n. 2, p. 29-67, maio/agosto 2016c. p. 49-53.
7. Os limites previstos pela legislação de regência para a doação de pessoas jurídicas para
as campanhas eleitorais se afigura assaz insuficiente a coibir, ou, ao menos, amainar, a
captura do político pelo poder econômico, de maneira a criar indesejada “plutocratização”
do processo político.
8. O princípio da liberdade de expressão assume, no aspecto político, uma dimensão
instrumental ou acessória, no sentido de estimular a ampliação do debate público, de sorte a
permitir que os indivíduos tomem contato com diferentes plataformas e projetos políticos.
9. A doação por pessoas jurídicas a campanhas eleitorais, antes de refletir eventuais prefe
rências políticas, denota um agir estratégico destes grandes doadores, no afã de estreitar
suas relações com o poder público, em pactos, muitas vezes, desprovidos de espírito
republicano.
10. O telos subjacente ao art. 24, da Lei das Eleições, que elenca um rol de entidades da
sociedade civil que estão proibidas de financiarem campanhas eleitorais, destina-se a
bloquear a formação de relações e alianças promíscuas e não republicanas entre aludidas
instituições e o Poder Público, de maneira que a não extensão desses mesmos critérios às
demais pessoas jurídicas evidencia desequiparação desprovida de qualquer fundamento
constitucional idôneo.
11. Os critérios normativos vigentes relativos à doação a campanhas eleitorais feitas por
pessoas naturais, bem como o uso próprio de recursos pelos próprios candidatos, não
vulneram os princípios fundamentais democrático, republicano e da igualdade política.
[grifo nosso].
27
CERVI, Emerson Urizzi. Doadores, partidos e estratégias para o financiamento de campanhas eleitorais no
Brasil: uma análise sobre o reduzido número de doadores e os elevados valores doados para os candidatos a
presidente em 2014. Política e Sociedade, Florianópolis, v. 15, n. 32, p. 65-101, jan/abr. de 2016. Disponível em:
<https://periodicos.ufsc.br/index.php/politica/article/view/45414/32074>. Acesso em: 25 jul. 2016. p. 75.
28
Ibid. p. 76.
29
SANTANO, Ana Claudia. Op cit. 2016a. p. 45.
30
BRASIL, Presidência da Republica. Mensagem nº 358, de 29 de setembro de 2015. Disponível em: <http://www2.
camara.leg.br/legin/fed/lei/2015/lei-13165-29-setembro-2015-781615-veto-148261-pl.html>. Acesso em: 12 jul.
2015.
31
Ibid.
32
BRASIL. Supremo Tribunal Federal. ADI 4650. Acórdão de 17.09.2015. Disponível em <http://www.
stf.jus.br/portal/processo/verProcessoAndamento.asp?numero=4650&classe=ADI&codigoClasse=0&
origem=JUR&recurso=0&tipoJulgamento=M> Acesso em: 4 abr. 2017.
33
LIMA, Martonio Mont’Alverne Barreto. O financiamento das campanhas eleitorais em 2016. In: MORAES,
Filomeno; SALGADO, Eneida Desiree: AIETA, Vania Siciliano (org). Justiça Eleitoral, Controle das Eleições e
Soberania Popular. Curitiba: Íthala, 2016. p. 365-374. p. 371.
34
PEREIRA, Rodolfo Viana; VIDAL, Luísa Ferreira. Big donors brasileiros: retrato das 10 (dez) empresas que mais
doaram para as campanhas e para os diretórios nacionais dos partidos políticos dos candidatos à Presidência
da República nas eleições de 2010. RIBEIRO, Patrícia Henriques; COSTA, Mônica Aragão; SILVA E GUERRA,
Arthur. Direito Eleitoral: leituras complementares. 1. ed. Belo Horizonte: D’Plácido, 2014, p. 391-413. p. 411.
35
SANTANO, Ana Claudia. Op. Cit. 2016a. p. 39.
36
BRASIL. Lei das Eleições. Lei 9.504 de 30 de setembro de 1997. Estabelece normas para as eleições. Diário Oficial
da União, Brasília, 30 set. 1997. Disponível em <http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/leis/L9504.htm>. Acesso
em: 12 jul. 2016.
37
PEREIRA, Rodolfo Viana; VIDAL, Luísa Ferreira. Op. cit. p. 392.
38
SANTOS, Bruno. Com restrições de campanha, partidos buscam peixes grandes para disputa. Folhapress UOL. 2016.
Disponível em: <http://www1.folha.uol.com.br/poder/2016/07/1788200-com-restricoes-de-campanha-partidos-
buscam-peixes-grandes-para-disputa.shtml>. Acesso em 06 jul.2016.
39
SANTANO, Ana Claudia. Op. Cit. 2016a. p. 43.
40
VENTURINI, Lilian. O TSE acertou ou errou ao manter o veto ao financiamento coletivo de campanhas. Nexo Jornal.
2016. Disponível em: <https://www.nexojornal.com.br/expresso/2016/07/04/O-TSE-acertou-ou-errou-ao-
manter-o-veto-ao-financiamento-coletivo-de-campanhas>. Acesso em 10 jul. 2016.
41
SCHLICKMANN, Denise Goulart. op. cit. P. 210-211.
Tabela 1 – Origem dos recursos no 1º turno das eleições nos anos de 2012 e 2016
42
BRASIL. Tribunal Superior Eleitoral. Portaria n. 930, de 01.09.2016. Orienta sobre os procedimentos a serem
observados na arrecadação eleitoral de recursos por meio de cartões de crédito. Disponível em: <www.
justicaeleitoral.jus.br/arquivos/portaria-tse-930>. Acesso em 12 jul. 2016.
43
LAGÔA, Tatiana; MARIANO, Raul. À míngua na web: captação de recursos para campanhas pela internet foi
nula ou irrisória. Hoje em Dia. Primeiro Plano, p. 4. 28 de outubro de 2016.
44
BRASIL. Tribunal Superior Eleitoral. Eleições 2016: candidatos receberam mais de R$ 2,5 bilhões em doações.
2016. Disponível em: <http://www.tse.jus.br/imprensa/noticias-tse/2016/Outubro/eleicoes-2016-candidatos-
receberam-mais-de-r-2-5-bilhoes-em-doacoes>. Acesso em: 14 jan. 2018.
Observa-se ainda que o uso de recursos próprios, embora inferior ao das Eleições
de 2012 em valores absolutos, foi proporcionalmente maior (29,5%, contra 15,9%) uma
vez que o volume total de recursos arrecadados em 2016 foi cerca de 50% menor do
que em 2012.
Em comparação com autofinanciamento, contudo, o financiamento coletivo é
mais consentâneo com um ideal de participação, já que tem uma faceta de “mobilização
cívica de pessoas que sentem que sua participação pode ser mais efetiva e mais direta,
criando laços mais profundos entre os componentes da comunidade e fomentando o
sentimento de cidadania”.45
45
SANTANO, Ana Cláudia. O financiamento da política: teoria geral e experiências no direito comparado. 2. ed.
Curitiba: Íthala, 2016d. p.85.
46
O financiamento coletivo consiste na obtenção de capital para iniciativas de interesse coletivo através da
agregação de múltiplas fontes de financiamento, em geral pessoas físicas interessadas na iniciativa. Traduz-
se por ações na Internet (websites) com o objetivo de arrecadar dinheiro para diversos fins. Destarte, indaga:
1- Considerando a jurisprudência deste Tribunal Superior Eleitoral, bem como a legislação eleitoral vigente,
a arrecadação de recursos através de websites de financiamento coletivo mostra-se lícita no que tange às
campanhas eleitorais? 2- Tendo em vista que o financiamento coletivo prevê a figura de um organizador, que
é o responsável pelo repasse dos recursos arrecadados ao destinatário final, como seria operacionalizada a
emissão de recibos eleitorais? É permitida a emissão de somente um único recibo em nome do organizador, ou
são exigidos tantos recibos quantos os participantes do financiamento coletivo e em nome destes? 3- Permite-
se a divulgação do financiamento coletivo? Se sim, por quais meios de comunicação e de que forma? BRASIL.
Tribunal Superior Eleitoral. Consulta nº 20887. Acórdão de 22.05.2014. Disponível em <http://www.tse.jus.br/
jurisprudencia/pesquisa-de-jurisprudencia/jurisprudencia> . Acesso em: 12 jul. 2016. p. 3.
47
PARTIDO SOCIALISMO E LIBERDADE. Estatuto. Estatuto com a redação dada pelas alterações aprovadas
no II Congresso Nacional do Partido Socialismo e Liberdade, realizado em 22 de agosto de 2009, na cidade de
São Paulo-SP. Brasília, 2010.
48
BRASIL. Tribunal Superior Eleitoral. Consulta nº 20887. Acórdão de 22.05.2014. Disponível em <http://www.tse.
jus.br/jurisprudencia/pesquisa-de-jurisprudencia/jurisprudencia>. Acesso em: 12 jul. 2016. p. 5-7.
Nova consulta formulada no ano de 2016 por Alessandro Molon e Daniel Coelho –
já após a proibição de doação por pessoas jurídicas, portanto – não chegou a ser
conhecida pela Corte, ao fundamento que a questão já fora apreciada “ainda que com
outra roupagem”.49
O teor destas decisões foi criticado por seu caráter restritivo. Segundo Ana Claudia
Santano “percebe-se uma posição de cautela por parte do TSE nos dois casos”, bem
como um “apego injustificado à norma”.50 Já para Ivar A. Hartmann51 “a lógica do TSE
foi perigosa (...). Afirmou que era necessária autorização explícita do legislador para
permitir algo que nunca foi proibido. Como se o crowdfunding fosse manifestação de
intervenção estatal, e não expressão da liberdade de organização e participação política”.
Há, contudo, quem considerou acertada a decisão do Tribunal Superior Eleitoral.
É o caso de Fernando Neisser, para quem não poderia a Corte substituir o Poder
Legislativo criando regras a respeito do financiamento coletivo pela internet.52 Neisser
pontua que as empresas que prestam serviço de intermediação técnica de pagamentos na
internet violariam a lei eleitoral ao cobrar uma porcentagem sobre o valor transacionado
depositando para o beneficiário apenas o saldo. Isso porque a legislação eleitoral exige
que todo o recurso financeiro de campanha transite pela conta criada para esta finali
dade, o que não ocorre quando utilizados tais mecanismos.53 Ademais, os sítios de
financiamento existentes têm mecanismos internos de arrecadação e repasse para o bene
ficiário que poderiam, de fato, impedir a individualização e identificação dos doadores.
Com efeito, uma análise das normas que regeram a arrecadação de recursos
de campanha ao longo do tempo demonstra que as mudanças normativas sempre se
deram no sentido de ampliar a possibilidade de ingresso, prevendo modalidades que
viabilizem a identificação do doador.54 Com efeito, não só no país “a transparência tem
sido durante muito tempo uma pedra fundamental do direito relativo ao financiamento
de campanha” uma vez que “a divulgação informa aos eleitores sobre os interesses
aos quais os candidatos podem ser mais suscetíveis”, bem como “garante aos eleitores
localizar cada candidato no espectro político”.55
Deve-se observar, inobstante, que, no julgamento da Consulta n. 27496, o Ministro
Henrique Neves registrou que a questão do webcrowdfunding “é realmente interessante
porque agora, com a proibição das pessoas jurídicas, é necessário que se busquem
novos meios para viabilizar que as pessoas físicas possam contribuir para as campanhas
eleitorais”. Apontou ainda que “o Tribunal está à disposição para essa discussão [com
o Congresso Nacional] para que se possa buscar algum mecanismo que em eleições
futuras, não nessa, isso possa vir a ser implementado”.56
49
BRASIL. Tribunal Superior Eleitoral. CONSULTA Nº 27496. Acórdão de 01º.07.2014. Disponível em <http://
www.tse.jus.br/jurisprudencia/pesquisa-de-jurisprudencia/jurisprudencia> Acesso em: 15 set. 2016. p. 4.
50
SANTANO, Ana Claudia. op. cit. 2016c. p. 46.
51
HARTMANN. Ivar. TSE – Como estragar uma eleição. JOTA. 03.07.2016. Disponível em: <http://jota.uol.com.br/
tse-como-estragar-uma-eleicao>. Acesso em: 15 set. 2016.
52
REPERCUSSÃO GERAL. op.cit.
53
Ibid.
54
SCHLICKMANN, Denise Goulart. Financiamento de campanhas eleitorais. 8. ed. Curitiba: Juruá, 2016. p. 186.
55
TRIBE, Laurence; MATZ, Joshua. Financiamento de campanha: siga o dinheiro. Estudos Eleitorais, Brasília, v. 11.
n. 2. p. 271-325, Maio/agosto 2016. Tradução: Adisson Leal e Cláudio Lucena. p. 313.
56
BRASIL. Tribunal Superior Eleitoral. Íntegra da sessão plenária de 01 de julho de 2016. Canal Justicaeleitoral.
Disponível em: <https://www.youtube.com/watch?v=KJbTq9hzG_s> Acesso em 12 jul. 2016.
Assim, com efeito, foi aprovada em 2017 a Lei que previu a possibilidade de
recolhimento de recursos por meio de sítio ou aplicativo de financiamento coletivo na
internet.
57
BRASIL, Lei nº 13.487 de 06 de outubro de 2017. Brasília. Disponível em: <http://www.planalto.gov.br/
ccivil_03/_ato2015-2018/2017/lei/L13487.htm>. Acesso em: 15 out. 2017.
58
BRASIL, Lei nº 13.488 de 06 de outubro de 2017. Brasília. Disponível em: <http://www2.camara.leg.br/legin/fed/
lei/2017/lei-13488-6-outubro-2017-785551-publicacaooriginal-153918-pl.html>. Acesso em: 15 out. 2017.
§6º Na hipótese de doações realizadas por meio das modalidades previstas nos incisos
III e IV do §4º deste artigo, fraudes ou erros cometidos pelo doador sem conhecimento
dos candidatos, partidos ou coligações não ensejarão a responsabilidade destes nem a
rejeição de suas contas eleitorais (...)
§8º Ficam autorizadas a participar das transações relativas às modalidades de doações
previstas nos incisos III e IV do §4º deste artigo todas as instituições que atendam, nos
termos da lei e da regulamentação expedida pelo Banco Central, aos critérios para operar
arranjos de pagamento.
§9º As instituições financeiras e de pagamento não poderão recusar a utilização de cartões
de débito e de crédito como meio de doações eleitorais de pessoas físicas.
Estima-se (...) que, com o fim das doações de empresas, não haverá recursos suficientes
para a realização de campanhas já nas próximas eleições. Por essa razão, é fundamental
que aprovemos uma alternativa legislativa que viabilize o financiamento misto para as
campanhas eleitorais, combinando doações de pessoas físicas com o financiamento público.
§3º Desde o dia 15 de maio do ano eleitoral, é facultada aos pré-candidatos a arrecadação
prévia de recursos na modalidade prevista no inciso IV do §4º do art. 23 desta Lei, mas a
liberação de recursos por parte das entidades arrecadadoras fica condicionada ao registro
da candidatura, e a realização de despesas de campanha deverá observar o calendário
eleitoral.
§4º Na hipótese prevista no §3º deste artigo, se não for efetivado o registro da candidatura,
as entidades arrecadadoras deverão devolver os valores arrecadados aos doadores (NR)
59
BRASIL. Câmara dos Deputados. Projeto de Lei 8612 de 2017. Brasília. Disponível em: <http://www.camara.
gov.br/proposicoesWeb/fichadetramitacao?idProposicao=2151995>. Acesso em: 10 out. 2017.
60
BRASIL, Câmara dos Deputados, 2017. Relatório Parcial n. 3 da Comissão Especial para análise, estudo e formulação
de proposições relacionadas à Reforma Política. Disponível em: <http http://www.camara.gov.br/proposicoesWeb/
fichadetramitacao?idProposicao=2135165>. Acesso em: 23 abr. 2017.
Deputado Glauber Braga (PSOL-RJ ) – (...) a favor do texto do Relator, porque considerava
esse um ponto positivo de arrecadação prévia, inclusive pelas redes, pela Internet. Seria
fundamental, como uma ação alternativa. (...)
Deputado Orlando Silva (PCdoB-SP) – Sr. Presidente, o PCdoB vota “sim”. Esta é uma
medida positiva para estimular a cultura de doação das pessoas físicas. Para que haja
doação, deverá haver mudança de cultura. No Brasil, não há essa cultura. Por isso, para
nós é correto o texto proposto pelo Deputado Vicente Candido. Alerto os colegas para
o que estamos votando. Estamos votando um instrumento que permite que as pessoas
possam fazer doação para campanhas eleitorais. Se muitos votaram contra a criação do
fundo público, esta medida vai estimular a sociedade.
Deputado Alessandro Molon (REDE-RJ) – (...) Esta medida é extremamente correta e inteli
gente. S.Exa., ao permitir a arrecadação prévia por crowdfunding a partir de maio, permitirá
que todos nós planejemos com antecedência o quanto poderemos gastar nas campanhas.
Não faz sentido atrasar isso para agosto, quando pode haver uma arrecadação prévia e
com transparência por 5 ou 6 meses. Quer dizer, durante a campanha, fica todo mundo
desesperado, querendo saber quanto vai arrecadar e quanto poderá gastar – uma bagunça!
O Deputado Vicente Candido permite uma arrecadação prévia, transparente e coletiva.
Por que tirar isso do seu parecer? É uma das partes mais positivas do relatório. A REDE
orienta o voto “sim” e faz um apelo para que o Deputado reveja sua posição e mantenha
o texto original. brasileira, para que cada pessoa, cada eleitor possa, de acordo com a
sua consciência, doar para uma campanha política. Portanto, votar “sim” é estimular a
autonomia do eleitor o financiamento de cada eleitor.
Art. 24. Todas as doações recebidas mediante financiamento coletivo deverão ser lançadas
individualmente na prestação de contas de campanha eleitoral de candidatos e partidos
políticos.
Parágrafo único. As taxas cobradas pelas instituições arrecadadoras deverão ser conside
radas despesas de campanha eleitoral e lançadas na prestação de contas de candidatos
e partidos políticos.
Art. 25. Havendo conta intermediária para a captação de doações por financiamento cole
tivo, a instituição arrecadadora deve efetuar o repasse dos respectivos recursos à conta
bancária de campanha eleitoral do candidato ou do partido político (conta “Doações para
Campanha”).
Parágrafo único. No momento do repasse ao candidato ou partido político, que deverá
ser feito obrigatoriamente por transação bancária identificada, a instituição arrecadadora
deverá identificar, individualmente, os doadores relativos ao crédito na conta bancária
do destinatário final.
Inobstante a minuta tenha sido aprovada, esta ainda não foi publicada pelo TSE.
61
BRASIL. Tribunal Superior Eleitoral. Audiências públicas para as Eleições 2018: minutas das instruções. Disponí
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2016. Disponível em: <http://www1.folha.uol.com.br/poder/2016/07/1788200-com-restricoes-de-campanha-
partidos-buscam-peixes-grandes-para-disputa.shtml>. Acesso em: 06 jul. 2016.
SCHLICKMANN, Denise Goulart. Financiamento de campanhas eleitorais. 8. ed. Curitiba: Juruá, 2016.
SEMINÁRIO REFORMA POLÍTICA E ELEITORAL NO BRASIL, 2017, Brasília. Registro em vídeo. Disponível
em: <https://www.youtube.com/watch?v=lVJcPrBoIYI>. Acesso em: 8 abr.2017.
SOARES, Rafael Morgental. Repensando a democracia: do modelo representativo-competitivo ao modelo
interativo-colaborativo. In: MORAES, Filomeno; SALGADO, Eneida Desiree: AIETA, Vania Siciliano (orgs).
Justiça Eleitoral, Controle das Eleições e Soberania Popular. Curitiba: Íthala, 2016. p. 397-438.
TRIBE, Laurence; MATZ, Joshua. Financiamento de campanha: siga o dinheiro. Estudos Eleitorais, Brasília,
v. 11. n. 2. p. 271-325. Maio/agosto 2016. Tradução: Adisson Leal e Cláudio Lucena.
VENTURINI, Lilian. O TSE acertou ou errou ao manter o veto ao financiamento coletivo de campanhas. Nexo Jornal.
2016. Disponível em: <https://www.nexojornal.com.br/expresso/2016/07/04/O-TSE-acertou-ou-errou-ao-
manter-o-veto-ao-financiamento-coletivo-de-campanhas>. Acesso em: 10 jul. 2016.
Informação bibliográfica deste texto, conforme a NBR 6023:2002 da Associação Brasileira de Normas
Técnicas (ABNT):
FINANCIAMENTO COMO
PARTICIPAÇÃO DEMOCRÁTICA:
DESAFIOS E PERSPECTIVAS
1.1 Introdução
O debate sobre financiamento eleitoral, independentemente de conjecturas econô
micas, políticas e sociais, configura-se necessário e inevitável. Os últimos acontecimentos
envolvendo a classe política e a classe empresarial deixam claro que existe uma relação
espúria entre o poder econômico e o poder político, acarretando distorções graves na
auferição democrática. Dessa forma, é imperioso compreender que essa conexão é
evidenciada e distorcida no processo de financiamento de campanhas eleitorais.1
No entanto, é simplório e arriscado reduzir os debates em torno da questão do
financiamento de campanhas à proliferação das várias modalidades de abuso de poder.
O ato de financiar um candidato em determinado pleito eleitoral é bem mais complexo,
estando ligado à própria concretização do regime democrático, uma vez que é notória
a necessidade de recursos materiais para a realização das disputas eleitorais e, por
consequência, da democracia. Nesse sentido, é justamente esse ponto de discussão, a
relação entre a política e o dinheiro, bem como a forma que se debate essa vinculação
que definirá a qualidade de uma democracia.2
Assim, não se pode negar que os procedimentos eleitorais estão ligados ao ideal
democrático e ao próprio funcionamento do Estado de Direito, em que se constitui em
uma ferramenta para a emancipação política.3 Fica evidente, então, por que esses debates
estão tão presentes atualmente, inclusive em esferas da sociedade que não participavam
1
SPECK, Bruno Wilhelm. Reagir a escândalos ou perseguir ideais? A regulação do financiamento político no
Brasil. Cadernos Adenauer, VI, n. 2. Rio de Janeiro: Fundação KAS, 2005, p. 123.
2
ZOVATTO, Daniel. Financiamento de partidos e campanhas eleitorais na América Latina: uma análise comparada,
p. 288.
3
SALGADO. Eneida Desiree. Constituição e Democracia. Tijolo por tijolo em um desenho (quase) lógico: Vinte
anos de construção do projeto democrático brasileiro, p.29.
das discussões políticas. Dessa forma, é imprescindível observar que o papel do Direito
Eleitoral nessa conjuntura é fundamental para acompanhar com seriedade os debates
que vêm ocorrendo.
4
GOMES. Jose Jairo. Direito Eleitoral. São Paulo: Atlas, 2013. p. 336.
5
KANAAN, Alice. Financiamento público, privado e misto frente à reforma política eleitoral que propõe o financiamento
público exclusivo. Temas do Direito Eleitoral no Século XXI. André de Carvalho Ramos (coord.). Brasília: Escola
Superior do Ministério Público da União, 2012. p. 272.
6
VAN BIEZEN, Ingrid. Campaign and party finance. In: LEDUC, Lawrence; NIEMI, Richard; NORRIS, Pippa.
Comparing democracies: elections and voting in global perspective. P. 79 – 80.
constante no art. 38, inciso III, da mesma lei, e “e jurídicas”, inserida no art. 39, caput e
§5º do citado diploma legal.7
A argumentação da ação já trazia os debates políticos em torno do abuso de
poder e suas mais variadas modalidades, fundamentando sua demanda na proteção ao
princípio da isonomia, princípio democrático e princípio republicano. Em linhas gerais,
manifestaram uma preocupação com o trato da coisa pública e com a insidiosa relação
entre políticos e empresários, bem como com a igualdade entre candidatos, uma vez
que alguns traziam muito mais financiadores para as suas campanhas.
Por maioria, a Corte compreendeu que o financiamento por parte de pessoas
jurídicas realmente dificultava a realização de um pleito eleitoral justo. Uma vez que
o voto é ato performático dos direitos políticos e as pessoas jurídicas não exercem tais
direitos, também foi invocada a visão de Dworkin para fundamentar a ideia de que a
essência das pessoas jurídicas não permite o desempenho dos direitos políticos, assim
como não emitem opiniões próprias e não podem, portanto, ter voz na política.8
É interessante notar que a sustentação para que essas modificações tenham
ocorrido em âmbito jurisdicional é a ideia de que, no caso do Brasil, a Constituição
Federal não estipulou um modelo de financiamento específico, porém, criou, no entendi
mento de Daniel Sarmento, uma moldura que deve servir de orientação para essas regras,
baseada no princípio democrático, republicano e no princípio da igualdade política.9
7
Lei nº 9.096/95: “Art. 31. É vedado ao partido receber, direta ou indiretamente, sob qualquer forma ou pretexto,
contribuição ou auxílio pecuniário ou estimável em dinheiro, inclusive através de publicidade de qualquer
espécie, procedente de: I- entidades ou governos estrangeiros; II- autoridades ou órgãos públicos, ressalvadas
as dotações referidas no art. 38; III- autarquias, empresas públicas ou concessionárias de serviços públicos,
sociedades de economia mista e fundações instituídas em virtude de lei e para cujos recursos concorram órgão
ou autoridades governamentais; IV- entidade de classe ou sindical.”
“Art. 38. O Fundo Especial de Assistência Financeira aos Partidos Políticos (Fundo Partidário) é constituído por:
III- doações de pessoa física ou jurídica, efetuadas por intermédio de depósitos bancários diretamente na conta
do Fundo Partidário.”
“Art. 39. Ressalvado o disposto no art. 31, o partido político pode receber doações de pessoas físicas e jurídicas
para constituição de seus fundos. §5º. Em ano eleitoral, os partidos políticos poderão aplicar ou distribuir pelas
diversas eleições os recursos financeiros recebidos de pessoas físicas ou jurídicas, observando-se o disposto no
Parágrafo 1º do art. 23, no art. 24 e no Parágrafo 1º do art. 81 da Lei nº 9.504, de 30 de setembro de 1997, e os
critérios definidos pelos respectivos órgãos de direção e pelas normas estatutárias.”
Lei nº 9.504/97: “Art. 23. As pessoas físicas poderão fazer doações em dinheiro ou estimáveis em dinheiro para
campanhas eleitorais, obedecido ao disposto nesta lei: §1º. As doações e contribuições de que trata este artigo
ficam limitadas: I – no caso de pessoa física, a dez por cento dos rendimentos brutos auferidos no ano anterior
à eleição. II – no caso de candidato que utilize recursos próprios, ao valor máximo de gastos estabelecido pelo
seu partido, na forma da lei.”
“Art. 24. É vedado a partido e candidato, receber direta ou indiretamente doação em dinheiro ou estimável
em dinheiro, inclusive por meio de publicidade de qualquer espécie, de: I – entidade ou governo estrangeiro;
II – órgão da administração pública direta ou indireta ou fundação mantida com recursos provenientes do
Poder Público; III – concessionário ou permissionário de serviço público; IV – entidade de direito privado que
receba, na condição de beneficiária, contribuição compulsória em virtude de disposição legal; V – entidade
de utilidade pública; VI – entidade de classe ou sindical; VII – pessoa jurídica sem fins lucrativos que receba
recursos do exterior; VIII – entidades beneficentes ou religiosas;
IX – entidades esportivas; X – organizações não-governamentais que recebam recursos públicos;
XI – organizações da sociedade civil de interesse público. Parágrafo único. Não se incluem nas vedações de que
trata este artigo as cooperativas cujos cooperados não sejam concessionários ou permissionários de serviços
públicos, desde que não estejam sendo beneficiadas com recursos públicos, observado o disposto no art. 81.”
“Art. 81. As doações e contribuições de pessoas jurídicas para campanhas eleitorais poderão ser feitas a partir
do registro dos comitês financeiros dos partidos ou coligações. §1º. As doações e contribuições de que trata este
artigo ficam limitadas a dois por cento do faturamento bruto do ano anterior à eleição.”
8
DWORKIN. Ronald. The Devastating Decision. In: The New York Tomes Review of Books, 25.02.2010. Disponível
em: <http://www.public.iastate.edu/~jwcwolf/Law/DworkinCitizensUnited.pdf>.
9
SARMENTO. Daniel. Osório. Aline. Uma mistura tóxica: política, dinheiro e o financiamento das eleições. p. 3.
Assim sendo, importa saber que a decisão abriu espaço para novas modalidades
de financiamento de campanhas. A primeira modificação importante, fruto da reforma
política, foi a constituição de um fundo de financiamento Eleitoral, com o objetivo de
auxiliar financeiramente os partidos e candidatos. Dessa forma, a Lei nº 9.504/97 definiu
critérios para o financiamento dos pleitos eleitorais, como a criação do Fundo Especial
de Financiamento de Campanha (FEFC), introduzido pela Lei nº 13.488/2017, no que
determinou a forma de distribuição dos recursos.10
Após a vedação do financiamento de campanhas eleitorais por pessoas jurídicas,
o FECF foi criado com o intuito específico de financiar essas atividades. Assim, será
constituído em ano eleitoral por dotações orçamentárias da União a serem definidas
pelo Tribunal Superior Eleitoral (TSE), a cada eleição, correspondendo à somatória da
compensação fiscal que as emissoras comerciais de rádio e televisão receberam pela
divulgação da propaganda partidária efetuada nos anos de 2016 e 2017 (art. 3º, Lei
nº 13.487/2017), além dos 30% (trinta por cento) dos recursos da reserva específica para
as emendas de bancada de execução obrigatórias.11
Assim, a previsão é que o FEFC receba cerca de R$ 1,7 bilhão no ano de 2018,
que será utilizado nas campanhas eleitorais para as eleições gerais do ano. No entanto,
é importante lembrar que essa nova modalidade não se confunde com o já conhecido
Fundo Partidário, que continua existindo. Saliente-se que subsiste o financiamento
privado de pessoas físicas que seguem podendo doar até 10% do rendimento bruto
alcançado no ano anterior à eleição.12
O processo de financiamento através de fundos públicos é uma tentativa de dar
isonomia às disputas eleitorais e mitigar as mais variadas formas de abuso de poder
econômico.13 Igualmente, é uma tentativa de diminuir o volume de dinheiro envolvido
nas campanhas, pois se estima que o custo das campanhas em 2014 alcançou a cifra de
cerca de R$ 5 bilhões.14 Enquanto que a previsão do FEFC é de apenas 1,7 bilhão para
2018, que será acrescido de recursos do Fundo Partidário, em torno de 900 milhões
em 2018, e das doações de pessoas físicas. O que abre espaço para desconfianças em
torno da possibilidade de doações ilícitas e a continuação de outras distorções no
financiamento eleitoral.
10
Art. 16-C. O Fundo Especial de Financiamento de Campanha (FEFC) é constituído por dotações orçamentárias
da União em ano eleitoral, em valor ao menos equivalente:
I – ao definido pelo Tribunal Superior Eleitoral, a cada eleição, com base nos parâmetros definidos em lei;
II – a 30% (trinta por cento) dos recursos da reserva específica de que trata o inciso II do §3º do art. 12 da Lei
nº 13.473, de 8 de agosto de 2017.
11
Disponível em: <http://www.novoeleitoral.com/index.php/noticias/1047-fecf>. Acesso em: 10 jan. 2018.
12
Art. 16-D. da Lei das Eleições: Os recursos do Fundo Especial de Financiamento de Campanha (FEFC), para o
primeiro turno das eleições, serão distribuídos entre os partidos políticos, obedecidos aos seguintes critérios:
I – 2% (dois por cento), divididos igualitariamente entre todos os partidos com estatutos registrados no Tribunal
Superior Eleitoral; II – 35% (trinta e cinco por cento), divididos entre os partidos que tenham pelo menos um
representante na Câmara dos Deputados, na proporção do percentual de votos por eles obtidos na última
eleição geral para a Câmara dos Deputados; III – 48% (quarenta e oito por cento), divididos entre os partidos,
na proporção do número de representantes na Câmara dos Deputados, consideradas as legendas dos titulares;
IV – 15% (quinze por cento), divididos entre os partidos, na proporção do número de representantes no Senado
Federal, consideradas as legendas dos titulares.
13
ZOVATTO, Daniel. Financiamento de partidos e campanhas eleitorais na América Latina: uma análise comparada,
p. 299-300.
14
Custo de R$ 5 bilhões faz eleições deste ano baterem recorde histórico. Disponível em: <http://www1.folha.uol.
com.br/poder/2014/11/1555475-custo-de-r-5-bilhoes-faz-eleicoes-deste-ano-baterem-recorde-historico.shtml>.
Acesso em: 10 jan. 2018.
15
Empreiteiras da Lava Jato doaram R$ 277 mi para 28 dos 32 partidos. Disponível em: <http://www.
gazetadopovo.com.br/vida-publica/empreiteiras-da-lava-jato-doaram-r-277-mi-para-28-dos-32-partidos-
egpx8vt2orj4e7n1qyu80iw5q>. Acesso em: 10 jan. 2018.
16
CAMPOS, Pedro Henrique Pedreira. A ditadura dos empreiteiros: as empresas nacionais de construção pesada,
suas formas associativas e o estado ditatorial brasileiro, 164-1985. Tese apresentada ao programa de pós-
graduação em História Social da Universidade Federal Fluminense como requisito parcial para obtenção de
grau de Doutor em História, p. 61.
17
Marcelo Odebrecht diz que não conhece político eleito sem caixa 2. Disponível em: <http://g1.globo.com/jornal-
hoje/noticia/2017/04/marcelo-odebrecht-diz-que-nao-conhecepolitico-eleito-sem-caixa-2.html>. Acesso em: 10
jan. 2018.
18
SANTANO. Ana Cláudia. Menos proibições e mais transparência: as (falsas) promessas sobre a vedação de
doações de pessoas jurídicas no financiamento de campanhas eleitorais. Revista Ballot – Rio de Janeiro, v. 1 n. 1,
Maio/Agosto 2015. p. 182-201. Disponível em: <http://www.e-publicacoes.uerj.br/index.php/ballot>. Acesso em:
10 dez. 2017.
O que se quer evidenciar nesse debate é que as distorções nas formas de financiar
pleitos eleitorais não são eliminadas com a proibição. A necessidade de custos para
a realização das eleições é inevitável. Uma das medidas factíveis para um aprimora
mento do sistema eleitoral é densificar sua transparência, permitindo que as doações
de campanha sejam conhecidas, para que o eleitor possa conhecer as vinculações dos
candidatos, e que as punições sejam aplicadas em caso de acinte ao ordenamento. O
que passa a ser decisivo para o bom funcionamento da política é a transparência e a
fiscalização para que o poder político não seja subordinado ao poder econômico.
Então, como é inevitável que haja recursos financeiros nas campanhas, o poder
econômico para desestabilizar a corrida eleitoral se utiliza de várias formas de abuso
de poder para alcançar o seu objetivo, fazendo com que os pleitos eleitorais não possam
auferir a vontade da população em geral, mas sim a vontade dos detentores dos recursos
financeiros.
19
GOMES, José Jairo. Direito Eleitoral. Atlas: São Paulo, 2016. p. 380
20
RIPERT, Georges. A regra moral nas obrigações civis. 2. ed. trad. por Osório de Oliveira. Campinas: Bookseller,
2002. p. 168-17.
21
GOMES, José Jairo. Direito Eleitoral. Atlas: São Paulo, 2016. p. 380
22
KANT apud DANTAS, Ivo. Constituição & Processo – introdução ao direito processual constitucional. v. I.
Curitiba: Juruá, 2003. p. 54.
23
No direito constitucional, o abuso de poder pode configurar causa de pedir das ações constitucionais, tratando-
se, portanto, de fenômeno acintoso à Constituição. No que tange ao direito penal, inconteste a tipificação do
abuso de poder e de autoridade em diversos diplomas legais. No direito privado, abuso é o uso ilícito de
poderes ou faculdades.
24
O recurso de abuso de poder é uma forma de invalidação contenciosa que dá ao Conselho de Estado o poder
de anular uma decisão executória administrativa, se essa contém um excesso formal da autoridade que
adoptou a decisão (incompetência, violação de forma, desvio poder, violação da lei) e, portanto, tende a opor-
se ao procedimento de ofício. Este recurso é controvertido porque ele é levado perante um tribunal público, o
Conselho de Estado, e termina em uma decisão judicial dotada de força de coisa julgada. HAURIOU, Maurice.
Précis de Droit Administratifet de Droit Public. 9. éme. Paris: 1919. p. 471.
25
O art. 27 da Constituição Francesa de 1791, primeiro dispositivo constitucional a positivar a preocupação com o
abuso de poder, previa: “Article 27. – Le ministre de la justice dénoncera au tribunal de cassation, parla voie du
commissaire du roi, et sans préjudice du droit des parties intéressées, les actes par lesquels les juges sauraient
excédé les bornes de leur pouvoir. – Le tribunal les annulera ; et s’ils donnent lieu à la forfaiture, le fait sera
dénoncé au Corps législatif, quirendrale décret d’accusation, s’il y a lieu, et renverra les prévenus devantla
haute Cournationale”.
26
“Para la teoria democrática, el pueblo – como conjunto de cidadanos – ejerce la soberanía que reside en la nación
toda, y desde este punto de vista, es en sus decisiones en las que se encuentra el origen de toda autoridad.
En otras palabras, la capacidad de mando del gobernante y su titularidad, emanan precisamente de que es
el pueblo el que ha determinado que él se encuentre allí”. VIVANCO, Ángela M. Las libertades de opinión y de
información. Santiago de Chile: Andrés Bello, 1992, p. 307.
27
ALVES, Alaôr Caffé. Estado e ideologia: aparência e realidade. São Paulo: Brasiliense. 1987, p. 195-196.
28
CHOMSKY, N. (2006). Failedstates: The abuse ofpower and theassault on democracy. New York, NY: Henry
Holt and Company. Disponível em: <http://www.kropfpolisci.com/foreign.policy.chomsky>. Acesso em: 04
maio 2017.
29
TÁCITO, Caio. O desvio do poder no controle dos atos administrativos, legislativos e jurisdicionais. Revista de
Direito Administrativo, Rio de Janeiro, v. 228, p. 2, abr.-jun. 2002.
30
CRETELLA JÚNIOR, José. Sintomas denunciadores do “desvio de poder”. Revista da Faculdade de Direito da
USP, v. 71, p. 79, 1976.
31
RIVERO, Jean. Droit Administratif. Paris: Dalloz, 2011. p. 247.
32
QUEIRÓ, Afonso Rodrigues. A teoria do desvio de poder em Direito Administrativo. Revista de Direito
Administrativo, Rio de Janeiro, nº 7, p. 62-63, jan./mar. 1947.
manuseia o poder discricionário com o fito de atingir fim diverso do que se estima no
interesse público previsto em lei, autorizando o Poder Judiciário a decretar a nulidade
do ato, já que a Administração fez uso indevido da discricionariedade.33 É limite que
visa a impedir que a prática do ato administrativo dirija-se à consecução de um fim
de interesse privado, ou até mesmo de outro fim público estranho à previsão legal.34
O desvio de poder é fundamento para anulação do ato administrativo, indagando-
se acerca dos motivos que inspiraram o administrador; o sentimento, o desejo que o
inspirou, haja vista que na forma o ato é perfeito.35 Assim, haverá desvio de poder
sempre que o agente atuar com finalidade diversa da perseguida em lei, viciando o ato,
ainda que não seja contrário ao ordenamento de forma direta.36 Esse tipo de abuso de
poder faz emergir ato cujo fim é absolutamente incompatível com o espírito de justiça
e imparcialidade que deve nortear os atos do agente público.37
Em sua forma omissiva, o abuso de poder consubstancia a inércia da autoridade
administrativa, que deixa de executar serviço que por lei está obrigada, lesando o
patrimônio jurídico individual, seja por omissão dolosa ou culposa.38 Suscite-se que
nem toda omissão administrativa é ilegal, excluindo-se as omissões genéricas em que
pertence ao administrador o poder de avaliar a oportunidade para adotar ou não uma
providência positiva.39 Todavia, são ilegais aquelas que suprimem direitos humanos
deferidos por instrumentos normativos.
No âmbito eleitoral, tem-se que o abuso de poder é fenômeno obstrutivo da
plena cidadania, uma vez que vem a macular a liberdade e a consciência do voto.
O voto é o instrumento pelo qual é exercido o direito de sufrágio. Por seu intermédio
o eleitor exprime sua vontade, declarando quais dos seus candidatos devem exercer a
representação popular.40
Classifica-se como apanágio da democracia representativa em que as decisões
políticas não são tomadas diretamente pelo povo, mas por representantes nomeados pelo
voto dos eleitores. É através dele que a cidadania estabelece os Poderes Constituídos,
representando-a no dia a dia das decisões políticas, sem abdicar de sua soberania, esta
sim intransferível, podendo a qualquer momento ser readquirida em sua plenitude
através de um fenômeno denominado transconstitucionalização.
O voto, não viciado por práticas abusivas, é condição indispensável para que o
povo exerça o protagonismo do poder público, na medida em que a escolha livre dos
33
DI PIETRO, Maria Sylvia Zanella. Direito Administrativo. 28. ed. São Paulo: Atlas, 2015. p. 253.
34
TÁCITO, Caio. O desvio de poder no controle dos atos administrativos, legislativos e jurisdicionais. Revista de
Direito Administrativo, Rio de Janeiro, v. 228, p. 2, abr./jun. 2002.
35
CRETELLA JÚNIOR, José. Curso de Direito Administrativo. 18. ed. rev. e atual. Rio de Janeiro: Forense, 2002.
p. 174.
36
GORDILLO, Agustin. Tratado de derecho administrativo. 5. ed. Buenos Aires: Fundación de Derecho
Administrativo, 2000. p. 23-24.
37
CRETELLA JÚNIOR, José. Sintomas denunciadores do “desvio de poder”. Revista da Faculdade de Direito da
USP, v. 71, p. 79, 1976.
38
TÁCITO, Caio. O poder de polícia e seus limites. Revista de Direito Administrativo, Rio de Janeiro, v. 27, p. 1-10,
jan./mar. 1952.
39
CARVALHO FILHO, José dos Santos. Manual de Direito Administrativo. 25. ed. São Paulo: Atlas, 2012. p. 45.
40
“Voto é a manifestação firme de decisão que se impõe e que deve ser respeitada. Voto pressupõe liberdade. Não
há voto livre e soberano onde não há democracia” (VIDIGAL, Edson de Carvalho. Quanto ao voto. In: Direito
eleitoral contemporâneo: doutrina e jurisprudência. Belo Horizonte: Del Rey, 2003, p. 76).
seus representantes está amparada na busca de se auferir a vontade popular até chegar
na essência da demos kratos – a existência de um poder cujo titular tem compromisso
exclusivo com a sua própria consciência.
Depreende-se que o abuso de poder constitui conceito jurídico dotado de textura
aberta, cuja designação e denotação apenas poderão ser aferidas a partir do caso
concreto.41 De modo que, por múltiplas formas, o abuso de poder poderá se manifestar
seja pelo abuso do poder político ou do poder econômico ou através da compra de
votos etc.
Malgrado a abrangência do seu conceito, o abuso de poder, em qualquer uma de
suas modalidades, imprime como linha descritiva geral a representação de condutas
que comprometam a verificação da denominada “verdade eleitoral”. Desse modo, o uso
abusivo do poder deve ser reprimido pela Justiça Eleitoral, desde que criadas condições
factíveis, a partir de comandos deontológicos do plano normativo e implementados
por decisão judicial em caso de descumprimento.42
Nesse contexto, a falta de transparência decorrente da ausência de fiscalização
dos recursos destinados ao pleito eleitoral direciona a configuração de uma conduta
abusiva de poder, constituindo violação patente ao Estado Democrático, na medida em
que possibilita uma relação viciada entre o candidato e o detentor do poder econômico
e/ou político.
41
GOMES, José Jairo. Direito Eleitoral. Atlas: São Paulo, 2016. p. 384.
42
ALVIM, Frederico Franco. O Peso da Imprensa na Balança Eleitoral. Efeitos, Estratégias e Parâmetros para o Exame da
Gravidade das Circunstâncias em Hipóteses de uso Indevido dos Meios de Comunicação Social. Florianópolis: Resenha
Eleitoral, v.20, n.2, maio, 2017. p.38.
43
DECOMAIN, Pedro Roberto. Elegibilidade e inelegibilidade. Florianópolis: Obra Jurídica, 2000. p. 72.
44
Ac. de 02.12.2003 no AgRgREsp nº 21.312, Rel. Min. Carlos Velloso.
45
“Quanto ao abuso de poder, nos termos da nova redação do art. 22, inciso XVI, da Lei Complementar nº 64/1990,
não se analisa mais a potencialidade de a conduta influenciar no pleito (prova indiciária da interferência no
resultado), mas “a gravidade das circunstâncias que o caracterizam”. Todavia, por se referir ao pleito de 2008,
aplica-se ao caso dos autos a jurisprudência da época que ainda condicionava a configuração do abuso de poder
à análise da potencialidade apta a desequilibrar o pleito. [Recurso Especial nº 1627021, Acórdão, Relator(a) Min.
Gilmar Ferreira Mendes, Publicação: DJE – Diário de justiça eletrônico, Tomo 54, Data 20.03.2017, Página 90]
“(...) O abuso de poder (i.e., econômico, político, de autoridade e de mídia) reclama, para a sua configuração,
uma análise pelo critério qualitativo, materializado em evidências e indícios concretos de que se procedera ao
aviltamento da vontade livre, autônoma e independente do cidadão-eleitor de escolher seus representantes. 15.
O critério quantitativo (i.e., potencialidade para influenciar diretamente no resultado das urnas), conquanto
possa ser condição suficiente, não perfaz condição necessária para a caracterização do abuso de poder
econômico. 16. O fato de as condutas supostamente abusivas ostentarem potencial para influir no resultado do
pleito é relevante, mas não essencial. Há um elemento substantivo de análise que não pode ser negligenciado:
o grau de comprometimento aos bens jurídicos tutelados pela norma eleitoral causado por essas ilicitudes,
circunstância revelada, in concrecto, pela magnitude e pela gravidade dos atos praticados (...)” [Recurso Especial
Eleitoral nº 42070, Acórdão, Relator(a) Min. Luiz Fux, Publicação: DJE – Diário de justiça eletrônico, Tomo 153,
Data 08.08.2017, Página 9/11].
46
O fato de os representados não terem sido eleitos não impede que a Justiça Eleitoral examine e julgue ação de
investigação judicial eleitoral na forma do art. 22 da LC 64/90. A aferição do abuso do poder econômico, político
ou do uso indevido dos meios de comunicação social independe do resultado do pleito, devendo ser aferida
de acordo com a gravidade da situação revelada pela prova dos autos. [Recurso Ordinário nº 138069, Acórdão,
Relator(a) Min. Henrique Neves Silva, Publicação: DJE – Diário de justiça eletrônico, Tomo 045, Data 07.03.2017,
Página 36-37].
Ac. de 6.05.2010 no AgR-REspe nº 36.650, Rel. Min. Aldir Passarinho Junior.
47
TSE: “(...) 3. ‘Consoante a jurisprudência deste Tribunal Superior Eleitoral, o abuso do poder político
caracteriza-se quando determinado agente público, valendo-se de sua condição funcional e em manifesto
desvio de finalidade, compromete a igualdade da disputa eleitoral e a legitimidade do pleito em benefício
de sua candidatura ou de terceiros’ (AgR-REspe nº 833-02/SP, rel. Min. João Otávio de Noronha, julgado em
19.8.2014)” (Recurso Ordinário nº 466997, Acórdão, Relator(a) Min. Gilmar Ferreira Mendes, Publicação: DJE –
Diário justiça eletrônico, Data 03.10.2016, Página 37).
48
“Abuso de poder político configura-se quando agente público, valendo-se de condição funcional e em manifesto
desvio de finalidade, desequilibra disputa em benefício de sua candidatura ou de terceiros, ao passo que
abuso de poder econômico caracteriza-se por emprego desproporcional de recursos patrimoniais, públicos ou
privados, de forma a comprometer a legitimidade do pleito e a paridade de armas entre candidatos” (Recurso
Ordinário nº 378375, Acórdão, Relator(a) Min. Antônio Herman Vasconcellos E Benjamin, Publicação: DJE –
Diário justiça eletrônico, Tomo 107, Data 06.06.2016, Página 9-10); Ac. de 21.09.2010 no RCED nº 661, Rel. Min.
Aldir Passarinho Junior.
49
“(...) Consoante a jurisprudência desta Corte Superior, o abuso do poder político caracteriza-se quando
determinado agente público, valendo-se de sua condição funcional e em manifesto desvio de finalidade,
compromete a igualdade da disputa eleitoral e a legitimidade do pleito em benefício de sua candidatura ou
de terceiros. (...)A gravidade da conduta é inequívoca (art. 22, XVI, da LC 64/90). Além das circunstâncias
já referidas – esquema praticado por longo período de tempo, atuação direta por parte dos recorrentes,
distribuição de grande quantidade de medicamentos e receituários e viabilização de cirurgias – é de se
ressaltar também o caos na saúde pública no Município, de modo que a população passou a depender do
assistencialismo dos vereadores para obterem tais serviços, disputa eleitoral e a legitimidade do pleito em
benefício de sua candidatura ou de terceiros” (Recurso Especial Eleitoral nº 33315, Acórdão, Relator(a) Min.
João Otávio Noronha, Publicação: DJE – Diário justiça eletrônico, Tomo 60, Data 31.03.2016, Página 4).
c) Captação ilícita de sufrágio; captação ilícita de arrecadação e gastos de campanha e caixa dois
A captação ilícita de sufrágio encontra-se prevista no artigo 41-A da Lei das
Eleições (nº 9.504/97), o qual configura a conduta conhecida como compra de votos,
consistindo na ação de oferecer vantagem pessoal de qualquer forma, explicita ou
implicitamente, para eleitor em troca de seu voto.53
50
Recurso Ordinário nº 378375, Acórdão, Relator(a) Min. Antonio Herman Vasconcellos E Benjamin, Publicação:
DJE – Diário justiça eletrônico, Tomo 107, Data 06.06.2016, Página 9-10.
Ac. de 27.04.2010 no AgR-REsp nº 36.357, Rel. Min. Aldir Passarinho Junior.
51
PINTO, Djalma. Direito Eleitoral: improbidade administrativa e responsabilidade fiscal. 5. ed. São Paulo: Atlas,
2010, p. 221.
52
“(...) 2. O acórdão regional baseou a procedência da AIME em fatos que constituem abuso do poder político
strictu sensu, consubstanciado na intimidação exercida pelo prefeito, candidato à reeleição à época, contra os
servidores municipais, aos quais dirigia ameaças de perdas de cargos, rompimentos de contratos, redução
e supressão de salários, dentre outras represálias” (RECURSO ESPECIAL ELEITORAL nº 28459, Acórdão,
Relator(a) Min. Marcelo Henriques Ribeiro de Oliveira, Publicação: DJE – Diário de justiça eletrônico, Data
17.09.2008, Página 22
REsp nº 36.737/MG, redator para o acórdão Min. Arnaldo Versiani.
53
Art. 41-A. Ressalvado o disposto no art. 26 e seus incisos, constitui captação de sufrágio, vedada por esta Lei,
o candidato doar, oferecer, prometer, ou entregar, ao eleitor, com o fim de obter-lhe o voto, bem ou vantagem
pessoal de qualquer natureza, inclusive emprego ou função pública, desde o registro da candidatura até o dia
da eleição, inclusive, sob pena de multa de mil a cinqüenta mil Ufir, e cassação do registro ou do diploma,
observado o procedimento previsto no art. 22 da Lei Complementar no 64, de 18 de maio de 1990. (Incluído pela
Lei nº 9.840, de 28.9.1999)
§1º Para a caracterização da conduta ilícita, é desnecessário o pedido explícito de votos, bastando a evidência do
dolo, consistente no especial fim de agir. (Incluído pela Lei nº 12.034, de 2009)
§2º As sanções previstas no caput aplicam-se contra quem praticar atos de violência ou grave ameaça a pessoa,
com o fim de obter-lhe o voto. (Incluído pela Lei nº 12.034, de 2009)
§3º A representação contra as condutas vedadas no caput poderá ser ajuizada até a data da diplomação.
(Incluído pela Lei nº 12.034, de 2009)
§4º O prazo de recurso contra decisões proferidas com base neste artigo será de 3 (três) dias, a contar da data da
publicação do julgamento no Diário Oficial (Incluído pela Lei nº 12.034, de 2009).
54
GOMES, José Jairo. Direito eleitoral. Belo Horizonte: Del Rey, 2008. p. 418.
55
“(...) A caracterização da captação ilícita de sufrágio pressupõe a ocorrência simultânea dos seguintes requisitos:
a) prática de uma das condutas previstas no art. 41-A da Lei 9.504/97; b) fim específico de obter o voto do eleitor;
c) participação ou anuência do candidato beneficiário na prática do ato.” [Agravo Regimental em Recurso
Especial Eleitoral nº 815659, Acórdão de 01/12/2011, Relator(a) Min. Fátima Nancy Andrighi, Publicação: DJE –
Diário da Justiça Eletrônico, Tomo 026, Data 06.02.2012, Página 28]
56
COÊLHO, Marcus Vinicius Furtado. Direito eleitoral e processo eleitoral. Rio de Janeiro: Renovar, 2010. p. 261
campanha (art. 21 da Lei nº 9.504/1997). Nenhuma outra pessoa pode realizar a conduta
tipificada porque carece de previsão legal.
O crime de caixa dois, muito mais frequente nas campanhas eleitorais do que se
imagina, consiste na entrada e saída de recursos financeiros de campanha sem sofrer
contabilização, ou seja, são recursos e gastos que fluem em um caixa paralelo. Atual
mente, não há uma tipificação clara para criminalizar a prática de caixa dois e qualquer
tipo de interpretação extensiva é terminantemente proibida em razão do princípio
da legalidade estrita que vigora no Direito Penal. Enfrentando a celeuma, o Supremo
Tribunal Federal tem se utilizado do art. 350 do Código Eleitoral para punir as condutas
que abstratamente se configuram como esse ilícito, definindo-o como a omissão em
documento público ou particular de declaração que dele deveria constar.57
Existe uma ligação muito forte entre o tipo descrito no art. 30-A e o delito de
caixa dois. Como um tem natureza cível e o outro penal não há o impedimento que
um único fato jurídico possa desencadear as duas subsunções. Na maioria dos casos, o
dinheiro utilizado no art. 30-A provém de caixa dois porque seria uma incúria muito
grande deixar esse numerário registrado, mesmo quando ele proviesse de uma fonte
vedada, por exemplo.
Em arremate, não há que se confundir a conceituação de abuso de poder econômico
com os ilícitos previstos no art. 30-A, art. 41-A, ambos da LE/97 e o ilícito de caixa dois,
por exemplo. Não se pode negar que são fenômenos que guardam similaridade, haja
vista que todas são fenômenos decorrentes da utilização equivocada do abuso de poder.
Contudo, constituem tipos normativos de espécies distintas, com requisitos e campos
de incidência diversos, com autonomia própria, que, inclusive, devem ser perquiridas
por meio de ações distintas, com causa de pedir e pedidos diversos. Apenas seguem o
mesmo rito, que é o descrito no art. 22 da LC nº 64/90.
O abuso de poder econômico apresenta como uma de suas essencialidades
o aspecto quantitativo, ou seja, através da exorbitância de recursos materiais que é
despendido em uma campanha além dos limites estipulados legalmente. Segundo
Adriano Soares, é ação que foge dos parâmetros da razoabilidade e da normalidade
em razão de determinado contexto, no que revela a existência da exorbitância ou
excesso no exercício de direitos permitidos pela legislação eleitoral ou no emprego de
recursos eleitorais.58Já as condutas dos arts. 30-A e 41-A, ambos da LE/97, não exigem
o excesso para sua caracterização. Para as tipificações mencionadas, precisa apenas o
aspecto qualitativo, ou seja, da subsunção do tipo diante da ocorrência do fato jurídico
predeterminado.
1.6 Conclusão
A proibição de financiamento de campanha por parte das pessoas jurídicas
não significa, absolutamente, que todas as práticas ilícitas conexas sejam debeladas.
57
Art. 350 do Código Eleitoral: Omitir, em documento público ou particular, declaração que dele devia constar,
ou nele inserir ou fazer inserir declaração falsa ou diversa da que devia ser escrita, para fins eleitorais: Pena –
reclusão até cinco anos e pagamento de 5 a 15 dias-multa, se o documento é público, e reclusão até três anos e
pagamento de 3 a 10 dias-multa se o documento é particular.
58
COSTA, Adriano Soares. Instituições de Direito Eleitoral. Teoria da Inelegibilidade. Direito Processual Eleitoral. p. 257.
Referências
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PEREIRA, Luiz Fernando Casagrande; AGRA, Walber de Moura (Coord.); PECCININ, Luiz Eduardo
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ISBN 978-85-450-0499-8.
EDUARDO XAVIER
2.1 Introdução
O tema que pretendemos discutir não é original, pois qualquer arranjo democrático-
constitucional deve conjugar liberdade de expressão e financiamento eleitoral. Na
pesquisa que algum tempo vimos fazendo sobre a tensa e necessária relação entre
democracia e constitucionalismo, eis que enfrentamos a liberdade de expressão e sua
relação com as campanhas eleitorais, em particular o seu financiamento. De fato, o direito
à liberdade de expressão e seus desdobramentos também não é assunto novo e desde as
primeiras cartas e declarações modernas de direitos se coloca como fundamental para
o cidadão em sua comunidade. Entretanto, seu vínculo ao financiamento eleitoral traz
algum novo interesse, sobretudo quando o financiamento de campanha assumiu uma
centralidade nas democracias constitucionais, em certa medida, paradoxal.
Assim, partindo das considerações que faz o professor de Yale, Robert Post, e do
caso emblemático por ele discutido, Citizens United v. Federal Election Commission (FEC),
pretendemos expor alguns pontos e questões interessantes sobre a relação entre liber
dade de expressão e financiamento de campanha eleitoral. Para tanto, utilizar-nos-emos
da obra de Post intitulada Citizens Divide. Campaign Finance Reform and the Constitution
(2014)1 que resulta das Tanner Lectures por ele proferidas. Nosso trabalho é precisamente
descritivo ao apresentarmos os argumentos do autor na análise crítica que ele oferece
acerca do caso. É interessante como reaparece com vigor nos argumentos do autor a
1
Post, Robert. Citizens divided. Campaign finance reform and the constitution. Cambridge, Mass: Harvard University
Press 2014.
2
Disponível em: <https://supreme.justia.com/cases/federal/us/558/310/>
The Court has recognized that First Amendment protection extends to corporations. (…)
This protection has been extended by explicit holdings to the context of political speech.
(…) The Court has thus rejected the argument that political speech of corporations or other
associations should be treated differently under the First Amendment simply because
such associations are not “natural persons”.3
3
558 U. S. ____ (2010), p. 26.
4
Disponível em: <https://supreme.justia.com/cases/federal/us/424/1/>.
Neste caso de 1976, a Suprema Corte entendeu que algumas disposições do Federal Election Campaign Act
(FECA), de 1971, eram inconstitucionais ao impor limites aos vários tipos de gastos eleitorais suportados por
candidatos a cargos federais ou em favor destes. Ainda, Buckley v. Valeo introduziu a noção de que financiar um
candidato ou um partido político é uma forma de proteger o discurso, isto é, a liberdade de expressão.
Para a Suprema Corte, tais gastos independentes não criariam nenhum perigo imediato
para a democracia representativa, não cabendo restrições:
(…) this Court now concludes that independent expenditures, including those made by
corporations, do not give rise to corruption or the appearance of corruption. That speakers
may have influence over or access to elected officials does not mean that those officials
are corrupt. And the appearance of influence or access will not cause the electorate to lose
faith in this democracy.5
5
558 U. S. ____ (2010), p. 6.
6
Disponível em: <https://law.justia.com/cases/federal/appellate-courts/cadc/08-5223/08-5223-1236837-2011-03-
24.html>.
7
As consequências da decisão na política americana podem ser conferidas em: LEE, C.; FERGUSON, B.; EARLEY,
D. After Citizens United: the story in the states. New York: Brennan Center, 2014.
em que o povo é a fonte do poder. Para ele, os framers8 buscaram criar um novo tipo de
autogoverno no qual toda autoridade, de todo tipo, é derivada pela representação do
povo, e o princípio democrático permeia, assim, todo governo.
Os estadunidenses acreditavam que a representação necessitava de uma cadeia de
comunicação entre o povo e aqueles que se comprometeram com o exercício do governo.
Ela precisava ser forte e discernível o suficiente para sustentar a convicção popular
que representantes falam pelo povo que procuram representar. Os Pais Fundadores
articularam dois pré-requisitos para uma representação bem-sucedida: consentimento
e comunhão de interesses.
Ainda que os Pais Fundadores e sua geração acreditassem no princípio demo
crático do governo, ela possuía temor da fúria da democracia (POST, 2014, p. 11).9
O desejo era, portanto, formar um governo republicano para fugir tanto do despotismo
quanto dos extremos democráticos. A república seria uma forma de governo controlado,
que canalizaria a força irrefreável do sentimento popular por meio de leis e estruturas
constitucionais, aptas a dividir o poder em uma multiplicidade de centros competitivos.
O próprio princípio da representação presente nas repúblicas seria, em si mesmo, um
antídoto à possibilidade do caos democrático.
Não obstante, resta a questão de como conciliar a tensão entre independência
dos representantes e a necessária cadeia de comunicação apta a conectar representantes
e eleitores? Post (2014, p.13) argumenta que a resposta consiste em dois elementos: o
primeiro, presente na Primeira Emenda10 da Constituição dos Estados Unidos, a qual,
ao proteger a liberdade de expressão daria ao povo o direito de expressar seus desejos.
Da mesma forma, a liberdade de imprensa é expressamente declarada fora do alcance
estatal. O povo pode publicamente fazer referências a seus representantes, privadamente
aconselhá-los ou, ainda, declarar seus sentimentos por meio de petição a todo corpo
representativo. O segundo, diz respeito à frequência das eleições, a qual seria necessária
para preservar o bom comportamento dos representantes, dando força ao povo para
firmar interesses em comum com aqueles que buscavam eleger.
Portanto, para Post, desde o início da história americana, presume-se que um
sistema bem-sucedido de representação depende de uma relação particular entre
representantes e eleitores, e que um governo representativo não pode incorporar o
valor do autogoverno sem confiança entre ambos. Post dá o nome de integridade
representativa a essa relação (2014, p.16).
8
Framers (criadores) são os 55 delegados que elaboraram o texto constitucional norte-estadunidense na
Convenção Constitucional de 1787, dos quais apenas 39 foram signatários. O termo aqui é utilizado com
distinção da expressão Founding Fathers (pais fundadores).
9
Para exemplificar seu ponto, Post cita o Federalista nº 10, no qual Madison chama as democracias de espetáculos
de turbulência.
10
“Congress shall make no law respecting an establishment of religion, or prohibiting the free exercise thereof; or
abridging the freedom of speech, or of the press; or the right of the people peaceably to assemble, and to petition
the Government for a redress of grievances”. http://constitutionus.com
decidir sobre qual ação imediata deve ser tomada, as eleições não seriam nem o começo
nem o fim do autogoverno. Na realidade, essas decisões particulares seriam frágeis: o
poder soberano realmente efetivo estaria na opinião pública em constante construção.
Por força dos avanços nos meios de comunicação, as discussões travadas no
Congresso não mais possuíam a antiga função de criar e guiar a opinião pública, mas
de servir como espelho para ela. As eleições seriam apenas mecanismos intermitentes de
declaração da opinião pública, que é constantemente ativa e exerce crescente influência
a longo prazo.
Segundo o autor (2014, p. 35-36), a opinião pública pode se manifestar direta
mente por meio das instituições de governo, por meio de referendos, recalls e outros
instrumentos de democracia direta. Entretanto, a considerar os limites desta, uma
alternativa é a opinião pública como um processo permanentemente em fluxo, como
o rio de Heráclito, sempre em movimento e nunca o mesmo. Ela seria a voz abafada
que os eleitos se esforçam para ouvir e interpretar, e que dá ao povo estadunidense o
sentimento de autoridade sobre seu governo. Nesse caso, a democracia é qualificada
pelo autor como discursiva.
Portanto, Post acredita que a Suprema Corte estava correta nesse ponto: o
princípio da igualdade de influência não pode ser transposto da lógica da representação
republicana para a lógica da liberdade de expressão da democracia discursiva.
Já o interesse na remoção de distorções defende que o resultado de uma eleição
deve refletir o apoio público verdadeiro, sendo este um interesse fundamental ao
princípio da representação. Uma vez que os gastos de corporações, alheios ao apoio
público verdadeiro, podem afetar o resultado das eleições, seria um interesse consti
tucional eliminar essa possibilidade de distorção. Em síntese, os representantes eleitos
devem depender do povo, não dos financiadores. (POST, 2014, p. 50)
Assim, como o argumento da igualdade, a ideia de distorção segue diretamente
a lógica da representação. Ela assume que o julgamento real do povo pode ser
representado, mas se esquece que, na perspectiva da democracia discursiva, a verdadeira
identidade do povo nunca é revelada e o público não toma decisões. Eleitores e povo
são coisas distintas. O que se privilegia é o processo de formação da opinião pública,
que não tem fim ou conclusão definitiva.
Sob essa ótica, seria impensável impedir alguém de falar sob o argumento que
sua expressão distorceria a opinião pública. Invariavelmente, teremos cidadãos que
se importam intensamente sobre algum assunto particular. O fato de eles devotarem
mais tempo e recursos para defender suas visões não significa uma distorção. Por
fim, o princípio da não distorção também não se traduz ao contexto contemporâneo
da Primeira Emenda por ser incapaz de responder uma pergunta: se na democracia
discursiva nunca se encontra a voz definitiva do povo, por qual ponto de referência
saberemos que a opinião pública foi distorcida?
O terceiro e mais importante argumento discutido pela Suprema Corte é a neces
sidade de prevenir corrupção ou a aparência de corrupção. Mas, para Post, a Corte
nunca foi precisa sobre o significado de nenhum desses termos. Sabe-se que o caso para
digmático de corrupção é o quid pro quo, isto é, a contribuição dada como recompensa
pela ação estatal/oficial. Nas palavras da Corte: dólares em troca de favores políticos.
(POST, 2014, p. 55)
Sublinha o autor que a Corte é incapaz de explicar adequadamente o conceito de
corrupção na qual se baseou: a dificuldade existe porque é esperado que representantes
sejam responsivos ao apoio de seus eleitores, isto é, que favoreçam determinadas
políticas e os eleitores e financiadores que apoiam essas políticas. A contradição aparece
na medida em que, ao mesmo tempo que a Suprema Corte entende que os representantes
devem ser responsivos, ela também concorda que eleitores podem expressar seus
desejos por meios financeiros. Seria necessário, em realidade, determinar quando
comprometimentos feitos em troca de suporte são impróprios.
De qualquer forma, Post defende que pensar em reformas no financiamento de
campanhas eleitorais pelo ponto de vista da prevenção de corrupção leva a um beco
sem saída. No caso Buckley, a Corte declarou que o Estado possui o interesse de prevenir
a corrupção inerente às situações de contribuição direta para campanha. Assim, a
preservação da integridade do governo representativo poderia ser sobreposta aos valores
da Primeira Emenda. Mas, para a Corte, gastos independentes não criariam nenhum
perigo imediato para o governo representativo, não cabendo restrições. Ou seja, em
Citizens United, a Corte se utilizou da mesma base do caso Buckley para decidir que os
11
O financiamento eleitoral e sua regulação aconteceu a partir da Constituição de 1946. Ver ainda o decreto-lei
nº 9.258/1946, decreto-lei nº 1.164/1950 e as leis nº 4.740/1965 e 5.682/1971 foram restritivos em matéria de
doações por meio de instituições privadas. Também as leis nº 9.096/1995 e 9.504/1997.
12
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A REPRESENTATIVIDADE E O FINANCIAMENTO
DE CAMPANHAS ELEITORAIS: A INTERNET COMO
ESPAÇO DE PARTICIPAÇÃO POLÍTICA
3.1 Introdução
Quando Norberto Bobbio indagou sobre a identificação dos financiadores da
política na Itália, precisamente aqueles ligados a Berlusconi, havia um motivo que
ultrapassava os limites da vida política italiana.1 Havia ali uma preocupação sobre
como se estruturavam as relações entre os financiadores e os atores políticos e, por
consequência, como esses relacionamentos atingiam a sociedade.
Ainda que a pergunta estivesse relacionada diretamente a questão do finan
ciamento de partidos, existia uma necessidade de problematizar o conhecimento das
fontes financeiras da política, uma vez que o funcionamento desse fenômeno está de
mãos dadas com a consolidação da democracia.2
A ideia de uma democracia traduz a participação popular, proveniente do próprio
sentido da etimologia da palavra, demos, povo, e cracia, governo, constituindo governo
do povo, em que o poder deste emana. A característica representativa carrega consigo
critérios como participação efetiva do cidadão na política e igualdade de voto, no sentido
1
BOBBIO. Norberto. Contra os novos despotismos: Escritos sobre o Berlusconismo. São Paulo: Editora Unesp. 2016,
p. 35.
2
“Acho que falta, das informações do presidente do Conselho, uma indicação muito importante: como são
financiados os clubes da Força Itália? Dou-me conta perfeitamente de que é uma pergunta muito delicada,
sobretudo depois que, por tanto tempo, fechamos não apenas um olho, mas todos os dois sobre o financiamento
de velhos partidos. Mas não se disse e repetiu que estamos entrando em uma nova fase? Não podemos esquecer
que o problema não esclarecido e nunca resolvido do financiamento dos partidos esteve na origem do final
indecoroso da Primeira República. (...) A democracia é impossível sem partidos, ou seja, sem aquelas associações
que – dizem os especialistas em política – “agregam as perguntas” ou, se preferirem, reúnem grupos de pessoas
em torno de ideias e de interesses para direcionar o voto em uma certa direção.” BOBBIO. Norberto. Contra os
novos despotismos: Escritos sobre o berlusconismo. São Paulo: Editora Unesp. 2016. p. 37.
de que todos precisam ter, igualmente, ingerência sobre o processo decisional, ainda
que de forma indireta.3
Nesse sentido, é indispensável que se fale sobre o processo de concretização
da democracia para que seja possível compreender a preocupação sobre as questões
que envolvem o seu financiamento. Pois, em uma democracia o voto não é somente
procedimento, é a expressão da igualdade e liberdade.4
Diante desse debate é imperioso recordar o conceito de cidadania, também
recorrendo à sua origem etimológica, do latim civitas para designar a relação entre um
cidadão e uma organização política.5 Nesse conceito reside, portanto, o ponto nodal
dessa discussão, pois a cidadania se configura na participação política do cidadão.
Tendo em vista que é na política que se trata o controle do poder social, a influência
do dinheiro nessa área torna-se um tema essencial. Bobbio expõe, assim, uma questão
fundamental sobre as relações políticas na sociedade. Não se pode ignorar o papel e
a importância do dinheiro no debate político, inclusive como forma de possibilitar a
participação política.6
No entanto, o papel do dinheiro é ambíguo e é no processo de financiamento das
campanhas que o poder econômico alcança diretamente a política. Logo, no centro dessa
discussão se encontra a relação entre o poder político e o poder econômico e a questão
da realização da democracia representativa, uma vez que é pelo processo eleitoral que
se consolida a legitimidade que a democracia exige.
É importante, entretanto, que se observe que essa manifestação do poder
econômico não é só uma relação de poder iníqua. Pode se tornar uma forma de realizar
a soberania popular, o povo como titular do poder político, pois os recursos financeiros
possibilitam as discussões e as escolhas dos cidadãos.7
Logo, no núcleo do Direito Eleitoral estão, nesse momento, principalmente no
Brasil, as questões que envolvem o financiamento de campanhas, já que é inerente à
própria estrutura democrática e plural que esse assunto seja levado ao maior número
de pessoas.
Desse modo, esses esclarecimentos despertam para o fato de que o financiamento
de campanhas eleitorais por pessoas jurídicas abre espaço para a estruturação de
uma relação insidiosa entre os representantes da política e aqueles do poder privado,
econômico.
Em meio a essa discussão é importante refletir sobre a efetividade da decisão do
STF e as alterações introduzidas pelas Leis nºs 13.487/2017 e 13.488/2017, assim como,
se é possível falar de um custo da democracia sem falar de preço; desse modo, refletir
sobre o que se compreende por custo e repensar o modo de fazer política.
3
DAHAL. Robert A. Sobre a Democracia. Brasília: Editora Universidade de Brasília. 2016. p. 49.
4
RIBEIRO. Renato Janine. A Democracia. São Paulo: Publifolha. 2001. p. 20.
5
AGRA, Walber de Moura. In: CANOTILHO, J. J. Gomes; MENDES, Gilmar Ferreira; SARLET, Ingo Wolfgang;
STRECK, Lenio Luiz (Org.) Comentários à Constituição do Brasil. São Paulo: Saraiva/Almedina, 2013. p. 118.
6
SANTANO. Ana Cláudia. Menos proibições e mais transparência: as (falsas) promessas sobre a vedação de
doações de pessoas jurídicas no financiamento de campanhas eleitorais. Revista Ballot - Rio de Janeiro, v. 1 n. 1,
maio/agosto 2015. p. 182-201. Disponível em: <http://www.e-publicacoes.uerj.br/index.php/ballot>. Acesso em:
10 dez. 2017.
7
SALGADO. Eneida Desiree. Constituição e Democracia. Tijolo por tijolo em um desenho (quase) lógico: Vinte
anos de construção do projeto democrático brasileiro, 2007. p. 61.
Ainda que cada voto tenha sido pormenorizado e atento a inúmeras questões, a
principal linha argumentativa, inclusive apresentada pelo Relator Ministro Luiz Fux, é
que a doação feita por pessoas jurídicas coloca em risco a própria noção de cidadania.
Além disso, o relator também defendeu que essa modalidade de financiamento
facilitava o encarecimento do processo eleitoral, sem permitir um verdadeiro debate
político e ideológico. O que passa a existir é um desequilíbrio na disputa eleitoral, em
virtude da influência do poder econômico sobre o poder político.8
A conclusão é a de que essas pessoas jurídicas não têm direitos políticos e,
portanto, não devem ter tanto poder de modificar os rumos de uma eleição, como
aconteceu nos últimos pleitos eleitorais. Essas características são intrínsecas à noção
de cidadania. Foram levantados muitos outros argumentos, mas o principal objetivo é
saber os pontos primordiais tratados na decisão com o intuito de ambientar, de maneira
geral, o tema.
Da mesma maneira, outra decisão importante sobre o tema foi tomada na Ação
Direta de Inconstitucionalidade nº 5394, na qual se suspendeu a possibilidade de doações
ocultas por pessoas físicas às campanhas eleitorais.9 Todos os ministros concordaram
em suspender a expressão “sem individualização dos doadores”, que impediria a
identificação, nas prestações de contas, do vínculo entre doadores e candidatos, no
parágrafo 12 no artigo 28 da Lei das Eleições (Lei nº 9.504/1997), fruto da minirreforma
eleitoral de 2015.
A linha argumentativa é de que esse dispositivo dificulta os princípios da publici
dade e da transparência, tão necessários ao processo eleitoral e a configuração de um
governo democrático. É importante pontuar essa discussão pelo objetivo principal do
texto que é visualizar novas formas de participação política que efetivem uma repre
sentatividade.
Além dessas decisões, é necessário lembrar o debate que também já está sendo
travado no Supremo Tribunal Federal sobre a possibilidade de candidaturas avulsas,
ou seja, políticos que possam disputar uma eleição sem vinculação com agremiações
partidárias.10
O principal fundamento utilizado na proposição da ação é de que exigir uma
filiação partidária fere a Convenção Americana de Direitos Humanos, o Pacto de São
José da Costa Rica, que não a coloca como requisito para ser votado. No entanto, essa
questão merece uma atenção especial.
Como se verá adiante não se pode pensar o financiamento político sem uma
contextualização histórica que permita a compreensão da atual conjuntura dos altos
custos financeiros de uma eleição. Desse modo, será necessário revistar os caminhos
de diálogo entre a sociedade e as esferas de poder, vendo os partidos como uma dessas
possibilidades. Logo, a ideia do surgimento de figuras políticas que não tenham com
prometimento ideológico claro pode se constituir como um risco à própria democracia.
8
Supremo Tribunal Federal. Ação Direta de Inconstitucionalidade de número 4.650 do Distrito Federal. Ministro
Relator Luiz Fux. p. 20.
9
STF suspende item de lei que permitia doações ocultas a candidatos. Disponível em: <http://www.tse.jus.br/
imprensa/noticias-tse/2015/Novembro/stf-suspende-item-de-lei-que-permitia-doacoes-ocultas-a-candidatos>.
Acesso em: 20 nov. 2017.
10
Supremo reconhece repercussão geral em recurso sobre candidatura avulsa. Disponível em: <https://www.
conjur.com.br/2017-out-05/stf-reconhece-repercussao-geral-recurso-candidatura-avulsa>. Acesso em: 20 dez.
2017.
Além disso, não se pode esquecer os valores não contabilizados, fruto do caixa
dois, o que permite a conclusão de que vivenciamos um dos processos eleitorais mais
caros do mundo.13 Desse modo, não se pode deixar de observar que a chance de sair
11
“Art. 23 (...) §4º As doações de recursos financeiros somente poderão ser efetuadas (...) por meio de:
(...)
IV – instituições que promovam técnicas e serviços de financiamento coletivo por meio de sítios na internet,
aplicativos eletrônicos e outros recursos similares (...)”.
12
Quadro retirado do site: <http://www.asclaras.org.br/@index.php?ano=2014>. Acesso em: 01 dez. 2017.
13
Marcelo Odebrecht diz que não conhece político eleito sem caixa 2. Disponível em: <http://g1.globo.com/jornal-
hoje/noticia/2017/04/marcelo-odebrecht-diz-que-nao-conhece-politico-eleito-sem-caixa-2.html>. Acesso em: 01
dez. 2017.
14
SARMENTO, Daniel; OSÓRIO, Aline. Uma mistura tóxica: política, dinheiro e o financiamento das eleições.
Migalhas. Ribeirão Preto, 28.01.2014. Disponível em: <http://www.migalhas.com.br/arquivos/2014/1/
art20140130-01.pdf>. Acesso em: 05 nov. 2017.
15
É importante esclarecer que esse trabalho não tem a intenção de debater o fato de que a decisão do STF se estende
às pessoas jurídicas e não somente empresas. Existe, portanto, a finalidade de problematizar o financiamento
feito por uma entidade que visa ao lucro.
16
ZOVATTO, Daniel; FREIDENBERG, Flavia. “Democratización Interna y Financiamiento de los Partidos
Políticos”. In: PAYNE, M.; et al (eds.): La Política Importa: Democracia y Desarrollo en América Latina. BID e Instituto
Internacional para la Democracia y la Asistencia Electoral, Washington D.C., 2006. p. 214-215.
17
BOAS, Taylor C.; HIDALGO, Daniel F.; RICHARDSON, Neal P. Spoils of victory: campaign donations and
government contracts in Brazil. The Helen Kellog Institute for International Studies. Working paper # 329. Ago.,
2011.
18
AGRA, Walber de Moura. Financiamento eleitoral no Brasil. Enciclopédia jurídica da PUC-SP. Celso Fernandes
Campilongo, Alvaro de Azevedo Gonzaga e André Luiz Freire (coord.). Tomo: Direito Administrativo e
Constitucional. Vidal Serrano Nunes Jr., Maurício Zockun, Carolina Zancaner Zockun, André Luiz Freire
(coord. de tomo). 1. ed. São Paulo: Pontifícia Universidade Católica de São Paulo, 2017. Disponível em: <https://
enciclopediajuridica.pucsp.br/verbete/150/edicao-1/financiamento-eleitoral-no-brasil>.
19
Com marqueteiro de Dilma Rousseff (PT), João Santana, foi gasto o valor de R$ 78 milhões, e de Aécio Neves
(PSDB), Paulo Vasconcelos, R$ 60 milhões. Informações disponíveis em: <http://epocanegocios.globo.com/
Informacao/Resultados/noticia/2014/12/campanhas-eleitorais-gastaram-r-5-bilhoes-em-2014.html>. Acesso em:
10 dez. 2017.
20
ALVES. Clara da Mota Santos Pimenta. Demonização da política e suas incoerências. Disponível em: <https://
www.jota.info/artigos/demonizacao-da-politica-e-suas-incoerencias-05042016>. Acesso em: 10 dez. 2017.
21
WEBER. Max. Ciência e Política: duas vocações. São Paulo: Cultrix, 2011, p. 156.
22
ALVIM. Frederico. A evolução histórica dos partidos políticos. Disponível em: <http://www.tse.jus.br/o-tse/
escola-judiciaria-eleitoral/publicacoes/revistas-da-eje/artigos/revista-eletronica-eje-n.-6-ano-3/a-evolucao-
historica-dos-partidos-politicos>. Acesso em: 20 dez. 2017.
23
BONAVIDES, Paulo. Ciência Política. 10. ed. São Paulo: Malheiros, 1994. p. 448.
24
FARIAS NETO, P. S. Ciência política: enfoque integral avançado. São Paulo: Atlas, 2011. p. 178.
25
DUVERGER, Maurice. Os Partidos Políticos. Rio de Janeiro: Zahar, 1970.
26
MAGRANI, Eduardo. Democracia Conectada: a internet como ferramenta de engajamento político-democrático.
Curitiba: Juruá, 2014. p. 19.
27
“Quando a distância entre representantes e representados é ampla e disfuncional, a democracia representativa
dispõe de um mecanismo aparentemente muito eficaz: novas eleições, novos representantes. Mas aqui entra
outro fator: o sistema político e suas mediações institucionais. Entre tais mediações estão os partidos e as
organizações de interesses setoriais. Em tempos normais, mudar de representantes pode significar mudar de
partidos, mas não mudar os partidos e muito menos mudar o sistema de partidos ou o sistema de organização
de interesses. Ou seja, as eleições podem de fato muito pouco as coisas e, na medida em que isso ocorre
reiteradamente, a distância entre representantes e representados (patologia da representação) transforma-se
pouco a pouco na patologia da participação: os cidadãos se convencem de que seu voto não muda as coisas e,
por isso, deixam de fazer o esforço (por vezes considerável) de votar; assim, surge o abstencionismo.” SANTOS,
Boaventura de Souza. A difícil democracia: reinventar as esquerdas. São Paulo, 2016. p. 120.
28
SANTOS, Boaventura de Souza. A difícil democracia: reinventar as esquerdas. São Paulo, 2016. p. 121.
29
COTTA, Murizio et al. Dicionário de política. 11. ed. Brasília: Editora Universidade de Brasília, 1998. p. 1101.
30
SANTOS, Boaventura de Souza. A difícil democracia: reinventar as esquerdas. São Paulo, 2016. p. 121.
31
MANFREDINI, KARLA M. Democracia Representativa Brasileira: O Voto Distrital Puro Em Questão. Florianópolis,
2008. p. 25.
32
SANTANO. Ana Cláudia. Menos proibições e mais transparência: as (falsas) promessas sobre a vedação de
doações de pessoas jurídicas no financiamento de campanhas eleitorais. Revista Ballot, Rio de Janeiro, v. 1 n. 1,
Maio/Agosto 2015, p. 182-201. Disponível em: <http://www.e-publicacoes.uerj.br/index.php/ballot>. Acesso em:
10 dez. 2017.
33
MOJOBI, E. H. África francófona. In: CARRILLO, M. et al. Dinero y contienda político-electoral. México: Fondo de
Cultura Económica, 2003.
34
“As doações empresariais a candidatos estão proibidas, mas a influência de empresas em campanhas continua,
com o mesmo predomínio de empreiteiras que se via nas eleições anteriores. A conclusão é de pesquisa inédita
da Diretoria de Análise de Políticas Públicas da Fundação Getúlio Vargas (FGV-Dapp), que, a pedido do GLOBO,
cruzou CPFs de doadores de candidatos à prefeitura do Rio com CNPJs ativos”. Disponível em: <https://oglobo.
globo.com/brasil/empresas-driblam-lei-para-doar-campanhas-eleitorais-20132632#ixzz4r6pEleTW>. Acesso
em: 28 ago. 2017.
35
MAGRANI, Eduardo. Democracia Conectada: a internet como ferramenta de engajamento político-democrático.
Curitiba: Juruá, 2014. p. 19-20.
36
FARIA, Cristiano Ferri Soares de. O Parlamento aberto na era da internet: pode o povo colaborar com o
legislativo na elaboração das leis? Brasília: Câmara, 2012. p. 96.
Referências
AGRA, Walber de Moura. Financiamento eleitoral no Brasil. Enciclopédia jurídica da PUC-SP. Celso Fernandes
Campilongo, Alvaro de Azevedo Gonzaga e André Luiz Freire (coord.). Tomo: Direito Administrativo e
Constitucional. Vidal Serrano Nunes Jr., Maurício Zockun, Carolina Zancaner Zockun, André Luiz Freire
(coord. de tomo). 1. ed. São Paulo: Pontifícia Universidade Católica de São Paulo, 2017. Disponível em: <https://
enciclopediajuridica.pucsp.br/verbete/150/edicao-1/financiamento-eleitoral-no-brasil>.
AGRA, Walber de Moura. In: CANOTILHO, J.J. Gomes; MENDES, Gilmar Ferreira; SARLET, Ingo Wolfgang;
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www.jota.info/artigos/demonizacao-da-politica-e-suas-incoerencias-05042016>. Acesso em: 10 dez. 2017.
ALVIM. Frederico. A evolução histórica dos partidos políticos. Disponível em: <http://www.tse.jus.br/o-tse/
escola-judiciaria-eleitoral/publicacoes/revistas-da-eje/artigos/revista-eletronica-eje-n.-6-ano-3/a-evolucao-
historica-dos-partidos-politicos>. Acesso em: 20 dez. 2017.
BOAS, Taylor C.; HIDALGO, Daniel F.; RICHARDSON, Neal P. Spoils of victory: campaign donations and
government contracts in Brazil. The Helen Kellog Institute for International Studies. Working paper # 329.
Ago., 2011.
BOBBIO. Norberto. Contra os novos despotismos: Escritos sobre o Berlusconismo. São Paulo: Unesp, 2016.
BONAVIDES, Paulo. Ciência Política. 10. ed. São Paulo: Malheiros, 1994.
COTTA, Murizio et al. Dicionário de política. 11. ed. Brasília: Editora Universidade de Brasília, 1998.
DAHAL, Robert A. Sobre a Democracia. Brasília: Editora Universidade de Brasília. 2016.
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FARIA, Cristiano Ferri Soares de. O Parlamento aberto na era da internet: pode o povo colaborar com o legislativo
na elaboração das leis? Brasília: Câmara, 2012.
FARIAS NETO, P. S. Ciência política: enfoque integral avançado. São Paulo: Atlas, 2011.
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MANFREDINI, Karla M. Democracia Representativa Brasileira: O Voto Distrital Puro Em Questão. Florianópolis,
2008.
MOJOBI, E. H. África francófona. In: CARRILLO, M. et al. Dinero y contienda político-electoral. México: Fondo
de Cultura Económica, 2003.
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SALGADO, Eneida Desiree. Constituição e Democracia. Tijolo por tijolo em um desenho (quase) lógico: Vinte
anos de construção do projeto democrático brasileiro, 2007.
SANTANO, Ana Cláudia. Menos proibições e mais transparência: as (falsas) promessas sobre a vedação de
doações de pessoas jurídicas no financiamento de campanhas eleitorais. Revista Ballot – Rio de Janeiro, V.
1 N. 1, Maio/Agosto 2015, p. 182-201. Disponível em: <http://www.e-publicacoes.uerj.br/index.php/ballot>.
Acesso em: 10 dez. 2017.
SANTOS, Boaventura de Souza. A difícil democracia: reinventar as esquerdas. São Paulo, 2016.
SARMENTO, Daniel; OSÓRIO, Aline. Uma mistura tóxica: política, dinheiro e o financiamento das eleições.
Migalhas. Ribeirão Preto, 28.01.2014. Disponível em: <http://www.migalhas.com.br/arquivos/2014/1/
art20140130-01.pdf>. Acesso em: 05 nov. 2017.
WEBER, Max. Ciência e Política: duas vocações. São Paulo: Cultrix, 2011.
ZOVATTO, Daniel; FREIDENBERG, Flavia. Democratización Interna y Financiamiento de los Partidos
Políticos. In: PAYNE, M.; et al (eds.): La Política Importa: Democracia y Desarrollo en América Latina. BID e Instituto
Internacional para la Democracia y la Asistencia Electoral, Washington D.C., 2006. p. 214-215.
Informação bibliográfica deste texto, conforme a NBR 6023:2002 da Associação Brasileira de Normas
Técnicas (ABNT):
ADRIANO CODATO
MARCIO CARLOMAGNO
4.1 Introdução
Em 1961 Robert Dahl escreveu: “No sistema político da oligarquia aristocrática,
recursos políticos eram marcados por uma acumulação desigual: quando um indivíduo
tinha muito mais um recurso do que outros, tal como patrimônio, ele usualmente
tinha mais em qualquer outro recurso – posição social, legitimidade, controle sobre
instituições religiosas e educacionais, conhecimento, cargos. No sistema político atual
[a democracia dos Estados Unidos em princípios dos anos 1960], desigualdades nos
recursos políticos permanecem, mas elas tendem a ser não-cumulativas” (DAHL, 2005,
p. 89).1 Isso quer dizer: ao contrário da oligarquia aristocrática, num sistema político
poliárquico, se um indivíduo fosse mais rico que a maioria, então provavelmente outro
indivíduo estaria melhor situado em termos de status social, outro teria mais controle
sobre o sistema de educação ou as instituições religiosas, outro seria mais inteligente
e um outro ainda seria aquele eleito ou indicado para um cargo na administração. As
desigualdades seriam dispersas e não cumulativas.
1
No original: “In the political system of the patrician oligarchy, political resources were marked by a cumulative
inequality: when one individual was much better off than another in one resource, such as wealth, he was
usually better off in almost every other resource – social standing, legitimacy, control over religious and
educational institutions, knowledge, office. In the political system of today, inequalities in political resources
remain, but they tend to be non-cumulative” (DAHL, 2005, p. 89). Para uma discussão dessa mesma passagem,
ver Domhoff (1978) e Dogan (2003).
Será mesmo? Sem entrar no mérito do ajuste da afirmação de Dahl para o contexto
por ele analisado, podemos perguntar, em sentido mais amplo: as desigualdades eleitorais
são, na democracia brasileira em princípios do século XXI, cumulativas?
Para responder a essa questão é preciso relacionar empiricamente recursos
políticos a atributos sociais de candidatos a uma posição política eletiva. Receita de
campanha é um dos principais ativos eleitorais no Brasil, possuindo uma altíssima
correlação com os resultados finais e com a capacidade de se eleger ou não (SILVA &
CERVI, 2017; SPECK & MANCUSO, 2014). Atributos sociais, como profissões de origem
dos candidatos (que pode funcionar como um indicador de “classe social”), patrimônio
acumulado (“riqueza”) ou gênero (homem/mulher), são capazes de explicar fenômenos
da dinâmica eleitoral, tal como a capacidade de arrecadação de recursos financeiros e,
com isso, as chances políticas dos competidores?
O objetivo deste capítulo é testar em que medida e de que maneiras esses recur
sos se combinam concretamente tendo como parâmetro as receitas financeiras das
campanhas eleitorais. Analisamos uma série histórica de quatro eleições para deputado
federal no Brasil (2002, 2006, 2010 e 2014) em que concorreram mais de 19 mil candidatos.
Se indivíduos detentores de profissões de elite (empresários, profissionais liberais),
com alto patrimônio e de um determinado gênero forem invariavelmente aqueles que
conseguem mobilizar mais dinheiro para investir em suas campanhas políticas e,
assim, aumentar grandemente a chance de conquistarem uma cadeira legislativa, então
as desigualdades, para retomar o problema de Dahl, são cumulativas e isso seria um
problema (ou “o” problema) da democracia eleitoral brasileira hoje.
Fonte: Os autores; Observatório de elites políticas e sociais do Brasil (UFPR), a partir dos dados do TSE
alta disposição 1 1 1 3
média disposição 0 ou 1 0 ou 1 0 ou 1 2
baixa disposição 0 ou 1 0 ou 1 0 ou 1 1
nenhuma disposição 0 0 0 0
2
Sobre a importância da instituição partidária, Horochovski e seus colaboradores (2015), usando análise de redes,
demonstram a localização do partido como ator central, mediando a alocação de recursos entre candidatos e
doadores.
3
No ano de 2002 as ocupações “senador, deputado e vereador” pertenciam à mesma categoria. Diante disso
haveria duas opções: classificar tal ocupação como “mandatário”, mesmo certamente colocando outros indi
víduos, não mandatários, junto a estes, ou não ter o dado de “mandatário” para 2002, classificado como “alta”
disposição, com os demais políticos profissionais. Optamos pela segunda solução.
partidos (o que indica a importância do porte partidário)” (2014, p. 20).4 Speck &
Mancuso (2013) lançam uma dúvida. Diante do impacto que exercer um cargo político
causa nas chances de eleger-se prefeito, argumentam que “Não está claro ainda, porém,
se esta vantagem competitiva expressa um talento ou uma característica do candidato, ou
se o capital político está vinculado ao cargo, sendo ativado por diferentes mecanismos
durante a disputa eleitoral” (Speck & Mancuso, 2013, p. 124). Esta dúvida, em fato, só
existe se consideramos apenas políticos exercendo mandatos. O modelo de disposição
à política (que inclui todos os políticos profissionais, tanto no cargo ou não) testado
neste artigo dialoga diretamente com tal questionamento, propondo uma resposta.
ISR = Rc * Nc
Rt
4
Cervi, Codato, Costa e Perissinotto chegaram às mesmas conclusões em outro trabalho (2015). Sobre a relação
entre financiamento privado de campanhas eleitorais e tipo de partido político, ver Mancuso, Figueiredo Filho,
Speck, Silva, & Rocha (2016). Heiler, Viana & Santos (2016) incoporaram o cálculo da disposição à política em
seu mapeamento dos gastos eleitorais efetuados na eleição de 2010 por candidatos a deputado federal.
5
Evidentemente, não é a única coisa que importa. Speck e Cervi (2016) combinaram receitas de campanha
juntamente com “memória eleitoral” (votos na eleição anterior) e tempo de televisão e encontraram que, na
eleição de prefeitos em 2012, o peso do dinheiro na explicação do voto caiu substancialmente em municípios
com mais de 200 mil habitantes (embora fosse significativo), ao passo que cresceu a importância do tempo no
horário de propaganda eleitoral.
Neste índice, a média do grupo é sempre igual a 1 e as análise não são sobre os
valores absolutos, mas em termos de distâncias da média. Assim podemos verificar a
posição dos candidatos diante dos seus adversários em termos contextuais.
4.3 Resultados
4.3.1 Diferenças de médias das receitas de campanha
O teste de análise de variância (ANOVA) que mede a associação entre a variável
contínua (índice de sucesso de receitas) e a categórica (disposição à política + mandatário)
é mostrado na Tabela 2.
Fonte: Os autores; Observatório de elites políticas e sociais do Brasil (UFPR), a partir dos dados do TSE
6
Como informação adicional, o teste de Bonferroni para diferenças de médias pode ser encontrado no Anexo 1.
Fonte: Os autores; Observatório de elites políticas e sociais do Brasil (UFPR), a partir dos dados do TSE
Fonte: Os autores; Observatório de elites políticas e sociais do Brasil (UFPR), a partir dos dados do TSE
Disposição à
Q1 Q2 Q3 Q4 Q5
política
Baixa 7,4 3,8 -1,3 -3,5 -6,4
2002 Média -1,3 ,5 -,6 ,9 ,4
Alta -7,7 -5,1 2,1 3,3 7,4
Baixa 9,4 4,2 1,6 -5,7 -9,5
Média -,6 1,4 1,6 ,2 -2,7
2006
Alta -6,8 -2,1 1,0 7,5 ,4
Mandatário -8,3 -7,9 -7,6 ,1 23,7
Baixa 7,5 7,7 1,2 -5,1 -11,3
Média ,3 -,6 1,4 1,3 -2,4
2010
Alta -6,5 -5,6 2,5 8,5 1,0
Mandatário -8,6 -8,7 -8,4 -2,2 28,1
Baixa 9,4 7,3 1,9 -5,5 -13,1
Média -1,6 -,7 1,8 1,8 -1,2
2014
Alta -8,5 -6,2 -,2 9,3 5,7
Mandatário -8,2 -8,3 -8,2 -3,5 28,4
Fonte: Os autores; Observatório de elites políticas e sociais do Brasil (UFPR), a partir dos dados do TSE
Receitas de campanha Q1 Q2 Q3 Q4 Q5
Masculino -,3 -,6 -,5 ,4 ,9
2002
Feminino ,8 1,6 1,4 -1,2 -2,6
Masculino -,7 -,8 -,1 ,5 1,0
2006
Feminino 1,9 2,1 ,2 -1,5 -2,7
Masculino -2,4 -1,6 ,0 1,8 2,3
2010
Feminino 5,6 3,6 ,1 -4,1 -5,2
Masculino -7,6 -2,6 ,3 3,5 6,4
2014
Feminino 12,3 4,2 -,5 -5,7 -10,3
Fonte: Os autores; Observatório de elites políticas e sociais do Brasil (UFPR), a partir dos dados do TSE
Sacchet & Speck (2012, p. 424), comparando as eleições de 2006 e 2010, mostraram
que já então havia ocorrido uma queda no sucesso das mulheres na arrecadação da
primeira para a segunda disputa analisada. A Tabela 4 mostra que até 2006 as dis
tribuições entre homens e mulheres nas categorias são mais próximas, com distâncias
estatisticamente pouco significativas. A partir de 2010, e mais enfaticamente em 2014,
estas desigualdades se acentuam consideravelmente. Homens passam a estar concen
trados nos quintis superiores (resíduos positivos de 6,4 no Q5) e mulheres nos quintis
inferiores (resíduos positivos de 12,3 no Q1 em 2014). Uma possível explicação deste
fenômeno reside no que poderíamos chamar de “efeito perverso” da aplicação das cotas
de gênero para candidatos. A obrigação de alistar um percentual maior de candidatas
forçou os partidos a encontrar meios artificiais de cumprir a legislação, lançando mais
mulheres, mas sem quaisquer chances eleitorais. Há um percentual grande de candidatas
que recebem muito pouco dinheiro das siglas para suas campanhas ou sequer têm
condições de investirem já que, como se verá na seção seguinte, elas estão associadas
aos estratos mais baixos na hierarquia social.
7
Uma explicação bem didática seria a seguinte: “A Análise de Múltipla Correspondência quantifica dados
nominais (categóricos) designando valores numéricos para os casos (objetos) e categorias, de modo que os
objetos dentro da mesma categoria estão próximos e objetos em diferentes categorias estão distantes. Cada
2016, p. 20), não de teste de hipóteses. Portanto, nossa investigação é, antes de tudo,
descritiva. Utilizamos para as receitas de campanha os quintis criados a partir do ISR.
O mesmo procedimento foi realizado para o cálculo do patrimônio e sua categorização.
Para todos os testes de correspondência múltipla foi utilizada a técnica de normalização
simétrica e de exclusão de casos com variáveis ausentes (em vez de imputação de valor
simulado a partir da média). As linhas estão ajustadas no zero. As medidas registradas
indicam o seguinte: o Alfa de Cronbach varia de 0 a 1; quanto mais próximo de 1,
maior o poder explicativo do modelo (isto é, da combinatória entre todas as variáveis
escolhidas). A variância dos eixos 1 e 2 indica o quanto cada dimensão é responsável
pela distribuição dos pontos de categoria no espaço euclidiano. A proximidade entre
os pontos indica que há candidatos que reúnem em si aquelas mesmas características.
Por sua vez, quanto mais próximas as categorias estiverem do ponto centroide, mais
aquelas características são compartilhadas pelo universo.
Fonte: Os autores; Observatório de elites políticas e sociais do Brasil (UFPR), a partir dos dados do TSE
objeto fica tão perto quanto possível dos pontos de categoria das categorias que são aplicados ao objecto. Dessa
forma, as categorias dividem os objetos em subgrupos homogêneos. As variáveis são consideradas homogêneas
quando classificam os objetos nas mesmas categorias para os mesmos subgrupos” (IBM, 2016, p. 35).
Quem possui certo capital financeiro e capital social tende a possuir também uma rede
de contatos que lhe permite angariar recursos de campanha entre doadores potenciais.
Em outras palavras, dinheiro atrai dinheiro e não há, no sistema político, mecanismos
institucionais que compensem essas desigualdades.
A classificação de disposição à política não funcionou perfeitamente no modelo
explicativo, especialmente entre os níveis médio e alto. Isso se deve, provavelmente,
ao fato de a categoria profissional “empresário”, seguindo o modelo proposto, ter sido
classificada como de média propensão à política. Ela, por natureza, tende a possuir
uma rede de contatos ampla, que lhe facilita obter recursos financeiros ou investir os
próprios em suas campanhas. Este é um ponto do modelo que pode ser repensado para
a aplicação em futuras análises, tratando-o como exceção nas pontuações propostas
(Quadro 1).
Estudos de séries históricas são uma das abordagens mais profícuas em Ciência
Política. Elas propiciam uma perspectiva das mudanças ocorridas em um dado período.
Ao longo do tempo, como se viu, as distâncias sociais relativas entre as classes de
políticos de carreira e não políticos estão aumentando. Recursos estão cada vez mais
concentrados nas mãos daqueles que já controlam posições de representação. Este é um
indicador do processo mais amplo de profissionalização da política (dos agentes e do
próprio campo político). Mas é também um indicador do fechamento desse universo
sobre si mesmo e das dificuldades, cada vez maiores, de adventícios conseguirem
superar barreiras sociais para entrar nele.
Nossos dados indicam, então, duas conclusões. Primeira: o Brasil está bem mais
perto de uma oligarquia aristocrática do que de uma poliarquia com poderes dispersos
entre os cidadãos politicamente ativos. Segunda: o uso combinado das três variáveis
– disposição à política medida através da ocupação profissional, sexo do candidato e
receitas de campanha declaradas –, eventualmente acrescidas de outras, pode funcionar
como um forte preditor de candidatos viáveis e não viáveis nos pleitos e, por extensão,
da configuração social da política brasileira contemporânea.
Referências
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38212014000100002
ANEXO 1:
TABELA 5. TESTE DE BONFERRONI PARA DIFERENÇAS DE MÉDIAS: DISPOSIÇÃO À POLÍTICA
APLICADA A RECEITAS (ÍNDICE DE SUCESSO DE RECEITAS)
Informação bibliográfica deste texto, conforme a NBR 6023:2002 da Associação Brasileira de Normas
Técnicas (ABNT):
CODATO, Adriano; CARLOMAGNO, Marcio. Poder social e poder político: como ocupação, gênero,
patrimônio e dinheiro se combinam nas eleições para deputados federais. In: FUX, Luiz; PEREIRA,
Luiz Fernando Casagrande; AGRA, Walber de Moura (Coord.); PECCININ, Luiz Eduardo (Org.).
Propaganda Eleitoral. Belo Horizonte: Fórum, 2018. p. 139-155. (Tratado de Direito Eleitoral, v. 4.) ISBN
978-85-450-0499-8.
1.1 Introdução
O termo “transparência” apareceu em meados da década de 1970, trazido pelas
reformas administrativas que ocorreram à época, para questionar a figura do “secreto”
presente nas administrações públicas tradicionais, buscando-se reformular de forma
profunda a relação entre o governo e a sociedade para melhorar sua eficácia e restaurar
sua legitimidade (CHEVALIER, 1988, p. 239).
O sigilo, como exceção à regra, deverá perdurar por um certo tempo, somente
enquanto for necessário para resguardar um bem jurídico maior (BOBBIO, 2015. p. 138).
Com efeito, nos dizeres de Norberto Bobbio, a democracia exige que os atos
sejam públicos. O termo “público” utilizado em sua dupla acepção, significando “coisa
pública”, de “Estado” e também no sentido de “manifesto”, “evidente”, “visível”:
1
Nos dizeres de Fátima Anastasia e Carlos Ranulfo Melo “espera-se que a democracia seja estável e que a
estabilidade seja democrática” (2002, p. 25)
Eleições, reivindicações sociais que possam ser normalmente proferidas, sem que se
corra o risco de coerção, e cobertura regular pela mídia ao menos das mais visíveis dessas
reivindicações e de atos supostamente ilícitos de autoridades públicas são dimensões do
que chamo de “accountability vertical”.
(...)
Posso, agora, definir o que entendo por accountability horizontal: a existência de agências
estatais que têm o direito e o poder legal e que estão de fato dispostas e capacitadas para
realizar ações, que vão desde a supervisão de rotina a sanções legais ou até o impeachment
contra ações ou emissões de outros agentes ou agências do Estado que possam ser
qualificadas como delituosas (O’DONNEL, 1998)
Assim, não apenas por meio do voto e da escolha livre e consciente dos cidadãos
é realizado o controle político, mas também por meio da accountability horizontal, por
um sistema eficiente de análise e julgamento de prestação de contas por órgão externo
e autônomo em relação ao prestador das contas.
Nesse ponto, necessário distinguir a prestação de contas de campanha, da
prestação de contas anuais dos partidos políticos, tendo em vista que a legislação
apresenta procedimentos e sanções decorrentes de atos ilícitos diferentes para cada
uma delas.
2
STF. Número único: 9953901-24.2011.1.00.0000. ADI 4.650. Autor: Conselho Federal da Ordem dos Advogados
do Brasil. Relator: Ministro Luiz Fux. Decisão: O Tribunal, por maioria e nos termos do voto do Ministro Relator,
julgou procedente em parte o pedido formulado na ação direta para declarar a inconstitucionalidade dos
dispositivos legais que autorizavam as contribuições de pessoas jurídicas às campanhas eleitorais, vencidos,
em menor extensão, os Ministros Teori Zavascki, Celso de Mello e Gilmar Mendes, que davam interpretação
conforme, nos termos do voto ora reajustado do Ministro Teori Zavascki. O Tribunal rejeitou a modulação dos
efeitos da declaração de inconstitucionalidade por não ter alcançado o número de votos exigido pelo art. 27 da
Lei nº 9.868/99, e, consequentemente, a decisão aplica-se às eleições de 2016 e seguintes, a partir da Sessão de
Julgamento, independentemente da publicação do acórdão. Com relação às pessoas físicas, as contribuições
ficam reguladas pela lei em vigor.
3
Disponível em: <http://www.justicaeleitoral.jus.br/arquivos/distribuicao-do-fundo-partidario-2006> Acesso
em: 15 jan. 2018.
4
Disponível em: <http://www.justicaeleitoral.jus.br/arquivos/tse-duodecimo-de-novembro-2017> e <http://
www.justicaeleitoral.jus.br/arquivos/tse-multas-de-outubro-2017> Acesso em: 15 jan. 2018.
5
Disponível em: <http://www2.camara.leg.br/camaranoticias/noticias/POLITICA/545056-CAMARA-APROVA-
CRIACAO-DE-FUNDO-PUBLICO-DE-FINANCIAMENTO-DE-CAMPANHAS.html>.
A Justiça Eleitoral faz um exame técnico sobre as contas apresentadas e prolata um juízo
de mérito sobre a matéria, não se restringindo a uma mera apuração formal. A análise da
Justiça Eleitoral, na prestação de contas, não se resume apenas ao aspecto instrumental e
contábil, sendo necessário perquirir materialmente a origem e o destino dos recursos de
campanha, verificando a idoneidade das fontes e a adequação do candidato e do comitê
financeiro às regras estabelecidas pelo legislador (ZÍLIO, 2012, p. 408).
É oportuno observar, contudo, que reside neste aspecto uma das principais falhas da
legislação eleitoral no que concerne à viabilização dos procedimentos de auditoria nas
campanhas eleitorais: não há instrumentos legais que possibilitem a fiscalização do
financiamento global das campanhas eleitorais, mas somente das despesas realizadas
pelos partidos ou seus candidatos e, ainda, por eles liquidadas.
Inexistem dispositivos que permitam auferir o custo global das campanhas eleitorais,
considerando as despesas realizadas diretamente pelos contribuintes e/ou doadores.
prestação de contas, já que afasta qualquer reflexo negativo nas contas do candidato apenas
com a futura promessa de pagamento do débito pela agremiação, incentivando atitudes
personalistas dos partidos em relação aos seus candidatos (ZÍLIO, 2012, p. 410/411).
Nas eleições de 2008, o Tribunal Superior Eleitoral, por meio da Resolução TSE
nº 22.715/2008, dispôs que a desaprovação de contas impedia a quitação eleitoral, o que
impediria o candidato que teve contas reprovadas de se candidatar durante o curso do
mandato para o qual concorreu.
No entanto, a minirreforma empreendida pela Lei nº 12.034/2009 incluiu o §7º
ao art. 11 da Lei nº 9.504/1997, permitindo que os candidatos que tivessem contas
reprovadas recebessem a quitação eleitoral, in verbis:
A Justiça Eleitoral depara-se ao longo dos anos, com a ausência total de mecanismos
que imponham limites às infrações ao financiamento das campanhas eleitorais. A
descriminalização de condutas que ocorreu ao longo dos últimos anos e o banimento
inclusive das penalidades de multa culminou por retirar a eficácia da desaprovação de
contas, permitindo que se agigantassem as práticas de Caixa 2 ou de “não contabilização de
recursos de campanha eleitoral”. Tal prática, muito além de expressar infrações de natureza
administrativa da campanha, pode revelar a ocorrência de condutas extremamente
gravosas ao processo eleitoral e democrático.
(...)
A norma é, pois, claramente uma reação legislativa à efetividade demonstrada pela Justiça
Eleitoral, que havia interpretado – com acerto inequívoco – que o conceito de quitação
não poderia abranger a mera apresentação de contas, visto que a quitação de natureza
eleitoral, propriamente dita, compreende, necessariamente, o cumprimento das obrigações
de natureza eleitoral.
Ora, se a Lei Eleitoral impõe uma série de regras a serem observadas por aqueles que
ingressam no pleito eleitoral, como se poderia dizer que aquele que, tendo suas contas
examinadas pela Justiça Eleitoral e tendo sobre elas a pecha da desaprovação, o julgamento
específico pela ocorrência de irregularidades graves (e, portanto, do descumprimento das
normas de natureza eleitoral) possa ter uma certidão de que cumpriu com suas obrigações?
(SCHLICKMANN, 2016, p. 645/646)
A rejeição de contas, por si só, não tem qualquer efeito sobre o candidato eleito, sendo
necessário o ajuizamento de uma ação eleitoral específica para o afastamento do mandato
eletivo. (ZILIO, 2012. p. 413)
Dessa forma, somente os candidatos que tiverem as contas julgadas como “não
prestadas”, terão negada a quitação eleitoral, o que os impede de concorrer às eleições
que ocorrerem até o final do mandato, persistindo os efeitos até a efetiva apresentação
das contas. A ausência de quitação eleitoral poderá trazer diversos impedimentos para a
vida civil do candidato como, por exemplo, impossibilidade de prestar concurso público.
Observa-se que o candidato eleito não será diplomado até a entrega da prestação
de contas (Art. 29, §2º da Lei nº 9.504/1997).
Consideram-se não prestadas as contas quando não apresentadas no prazo de
72 (setenta e duas) horas após notificação da Justiça Eleitoral ou quando as justificativas
não forem aceitas, e quando não forem apresentados os documentos e informações
necessários à análise da movimentação declarada na prestação de contas.
Elmana Viana Esmeraldo, ao comentar a Resolução nº 23.376 do Tribunal Superior
Eleitoral que regulamentou a prestação de contas nas Eleições de 2012, afirma:
IMPORTANTE! Veja que a norma considera como não apresentadas também aquelas
contas que não estão acompanhadas dos documentos que possibilitem a análise dos
recursos arrecadados e dos gastos realizados em campanha, visando evitar que sejam
apresentadas de forma “fajuta”, sem juntada dos documentos exigidos pela legislação.
(ESMERALDO, 2013, p.577)
Art. 30-A. Qualquer partido político ou coligação poderá representar à Justiça Eleitoral,
no prazo de 15 (quinze) dias da diplomação, relatando fatos e indicando provas, e pedir a
abertura de investigação judicial para apurar condutas em desacordo com as normas desta
Lei, relativas à arrecadação e gastos de recursos. (Redação dada pela Lei nº 12.034, de 2009)
§1º Na apuração de que trata este artigo, aplicar-se-á o procedimento previsto no art.
22 da Lei Complementar nº 64, de 18 de maio de 1990, no que couber. (Incluído pela Lei
nº 11.300, de 2006)
§2º Comprovados captação ou gastos ilícitos de recursos, para fins eleitorais, será negado
diploma ao candidato, ou cassado, se já houver sido outorgado. (Incluído pela Lei
nº 11.300, de 2006)
§3º O prazo de recurso contra decisões proferidas em representações propostas com base
neste artigo será de 3 (três) dias, a contar da data da publicação do julgamento no Diário
Oficial. (Incluído pela Lei nº 12.034, de 2009)
(...) A tipificação do art. 30-A da Lei nº 9.504/1997, à semelhança do abuso de poder, leva
“em conta elementos e requisitos diferentes daqueles observados no julgamento das
contas” (RO nº 780/SP, rel. Min. Fernando Neves, julgado em 8.6.2004), razão pela qual
a representação fundada nesse dispositivo legal exige não apenas ilegalidade na forma
de arrecadação e gasto de campanha, mas a ilegalidade qualificada, marcada pela má-
fé do candidato, suficiente para macular a necessária lisura do pleito, o que não ficou
demonstrado pelo representante nem pelo Tribunal Regional. Precedentes do TSE. (TSE.
Processo 000001-72.2013.6.21.0151. RESPE – Agravo Regimental em Recurso Especial
Eleitoral nº 172 – BARRA DO RIBEIRO – RS. Acórdão de 17/11/2016. Relator(a) Min.
Gilmar Ferreira Mendes. Publicação: DJE – Diário de justiça eletrônico, Tomo 25, Data
03/02/2017, Página 119/120)
Dessa forma, temos que o controle das contas de campanha é realizado por ampla
divulgação, utilizando-se programa e sítio específico da internet. As contas são objeto
de julgamento pela Justiça Eleitoral e poderão ser impugnadas por qualquer partido
político, no entanto, temos que o controle das contas de campanha é fragilizado pelo
sistema de sanções pelo descumprimento das normas de arrecadação e gastos eleitorais,
que não são suficientes para inibir condutas ilícitas.
Art. 17. É livre a criação, fusão, incorporação e extinção de partidos políticos, resguardados
a soberania nacional, o regime democrático, o pluripartidarismo, os direitos fundamentais
da pessoa humana e observados os seguintes preceitos:
I – caráter nacional;
II – proibição de recebimento de recursos financeiros de entidade ou governo estrangeiros
ou de subordinação a estes;
III – prestação de contas à Justiça Eleitoral;
IV – funcionamento parlamentar de acordo com a lei.
§1º É assegurada aos partidos políticos autonomia para definir sua estrutura interna
e estabelecer regras sobre escolha, formação e duração de seus órgãos permanentes e
provisórios e sobre sua organização e funcionamento e para adotar os critérios de escolha e
o regime de suas coligações nas eleições majoritárias, vedada a sua celebração nas eleições
proporcionais, sem obrigatoriedade de vinculação entre as candidaturas em âmbito
nacional, estadual, distrital ou municipal, devendo seus estatutos estabelecer normas de
disciplina e fidelidade partidária.
§2º Os partidos políticos, após adquirirem personalidade jurídica, na forma da lei civil,
registrarão seus estatutos no Tribunal Superior Eleitoral.
§3º Somente terão direito a recursos do fundo partidário e acesso gratuito ao rádio e à
televisão, na forma da lei, os partidos políticos que alternativamente:
I – obtiverem, nas eleições para a Câmara dos Deputados, no mínimo, 3% (três por cento)
dos votos válidos, distribuídos em pelo menos um terço das unidades da Federação, com
um mínimo de 2% (dois por cento) dos votos válidos em cada uma delas; ou
II – tiverem elegido pelo menos quinze Deputados Federais distribuídos em pelo menos
um terço das unidades da Federação.
§4º É vedada a utilização pelos partidos políticos de organização paramilitar.
§5º Ao eleito por partido que não preencher os requisitos previstos no §3º deste artigo é
assegurado o mandato e facultada a filiação, sem perda do mandato, a outro partido que os
tenha atingido, não sendo essa filiação considerada para fins de distribuição dos recursos
do fundo partidário e de acesso gratuito ao tempo de rádio e de televisão.
A análise da prestação de contas do partido não poderá ser pretexto para ferir a
autonomia partidária. Assim sendo, em caso de violação das normas legais e estatutárias
as sanções se limitam a suspensão das quotas do fundo partidário e devolução da
quantia apontada como irregular, acrescida de multa de até 20% deste valor (arts. 36 e
37 da Lei nº 9.096/1995).
A responsabilidade pela prestação de contas é pessoal dos dirigentes partidários,
que responderão civil e criminalmente por atos ilícitos atribuídos ao partido político, em
caso de irregularidade grave e insanável resultante de conduta dolosa que importe em
enriquecimento ilícito e lesão ao patrimônio do partido (art. 37, §13 da Lei nº 9.096/1995).
A não prestação de contas, no prazo previsto na legislação, implicará a suspensão
de novas cotas do Fundo Partidário, enquanto perdurar a inadimplência e sujeitará os
responsáveis às penas da lei (art. 37-A da Lei nº 9.096/1995).
Por fim, observa-se que os Estatutos dos Partidos Políticos, normalmente, preveem
a existência de um Conselho Fiscal, que deverá analisar internamente a prestação de
contas partidária.
Entendemos que os princípios democráticos da transparência e da accountability
devem ser internalizados pelos partidos em suas relações com os filiados.
Assim, entendemos que a prestação de contas deverá ser divulgada internamente
para que os filiados possam exercer o seu direito fundamental à informação.
Eneida Desiree Salgado ressalta que as democracias contemporâneas confiam
parte de seu funcionamento aos partidos políticos, que não poderão descurar de
práticas democráticas internamente, devendo respeitar os direitos fundamentais nas
suas práticas internas:
O filiado ao partido político deve ter respeitados todos os direitos fundamentais. Deve ser,
como garante a Constituição e a Lei dos Partidos Políticos, tratado com igualdade. Não
pode ter seus direitos relacionados à sua participação na vida partidária restritos sem a
observância de um devido processo, conforme precisão antecipada no Estatuto ao qual o
cidadão aderiu para se filiar à agremiação. (SALGADO, 2013. p. 150)
Em relação à corrupção nos partidos, deve-se gerir o risco integrando os órgãos partidários
no processo de tomada de decisão e promovendo a transparência na condução dos
processos decisórios e nas finanças. Esta gestão de risco deve concentrar-se na prevenção
e no controle, tanto interno como externo, executando planos de prevenção à corrupção,
que poderiam ser premiados com regras benéficas em relação aos recursos públicos e ao
tempo de antena. (CAMPOS NETO, 2017, p. 179)
As contas partidárias anuais dos diretórios nacionais são julgadas pelo Tribunal
Superior Eleitoral que, reconhecidamente, não possui pessoal suficiente para análise.
O Tribunal Superior Eleitoral (TSE) acumula 156 prestações de contas anuais de partidos
políticos sem julgamento. As contas são referentes aos exercícios de 2011 a 2015 e somam
ao menos R$ 2,2 bilhões de recursos públicos repassados às legendas por meio do Fundo
Partidário, mas que ainda não foram fiscalizados. Com o acúmulo, a Corte já anistiou
desde o ano 2000, sem julgamento, ao menos 36 contas partidárias.6
1.4 Conclusões
O Brasil vive uma intensa crise política – permeada por denúncias de corrupção
e de arrecadação de recursos e gastos em campanhas eleitorais sem registro formal nas
prestações de contas. A crise política permite identificar a falta de transparência e de
mecanismos deficientes de accountability do nosso sistema eleitoral.
O princípio da transparência decorre do princípio republicano, e é basilar no
Estado Democrático de Direito. Com efeito, em Estados Democráticos não se admitem
atos do Poder Público ocultos, ou secretos, que impeçam a participação e o controle
popular.
A realização de eleições livres, como mecanismo de accountability vertical, não
é suficiente para garantir a legitimidade do processo eleitoral, sendo necessária a
realização de prestação de contas dos recursos recebidos e gastos, com integridade de
dados, a chamada accountability horizontal.
O controle das contas pressupõe publicação dos dados para que a análise não se
restrinja ao órgão julgador, mas também possa ser realizada pelos demais interessados.
As modificações no sistema de financiamento de campanhas, com aumento
expressivo do financiamento público e proibição do financiamento empresarial, exigem
maior transparência e um sistema eficiente de prestação de contas.
O Tribunal Superior Eleitoral não possui quadro próprio de pessoal suficiente
para análise das prestações de contas anuais dos partidos, o que acaba gerando um
enorme lapso temporal entre as eleições e o julgamento das contas.
A accountability horizontal é prejudicada pelo deficiente sistema de sancionamento
de atos ilícitos, tanto referente à prestação de contas de campanha, quanto à prestação
de contas anuais partidárias.
Por outro lado, observa-se que os partidos políticos não internalizaram princípios
básicos da democracia. As prestações de contas de campanha e partidária não são am
plamente divulgadas internamente, para controle e fiscalização dos próprios filiados, o
que seria importante medida para aumento da credibilidade dos partidos e identificação
dos filiados com as diretrizes partidárias.
6
Disponível em: <http://politica.estadao.com.br/noticias/geral,tse-tem-156-prestacoes-de-contas-de-partidos-
paradas,70001671747> . Acesso em: 18 jan. 2018
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Informação bibliográfica deste texto, conforme a NBR 6023:2002 da Associação Brasileira de Normas
Técnicas (ABNT):
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Fernando Casagrande; AGRA, Walber de Moura (Coord.); PECCININ, Luiz Eduardo (Org.). Propaganda
Eleitoral. Belo Horizonte: Fórum, 2018. p. 159-173. (Tratado de Direito Eleitoral, v. 4.) ISBN 978-85-450-
0499-8.
2.1 Introdução
Diante da histórica e forte correlação entre o dinheiro e o sucesso eleitoral, o
financiamento das campanhas e as correlatas prestações de contas têm sido tema de
destaque nos últimos anos e um dos principais alvos das discussões legislativas dentro
da tão almejada reforma política.
Afere-se que uma das razões mais importantes para regulamentar as contas
eleitorais, mormente no tocante às regras de autonomia e transparência, funda-se no
empoderamento dos eleitores, na necessidade de se colocar à disposição dos cidadãos
as informações necessárias sobre a movimentação financeira dos concorrentes ao prélio
para que tenham subsídios necessários a tomar uma decisão fundamentada no dia das
eleições. Assim, a divulgação de informações e a prestação de contas tornam-se, por
consectário, dois dos recursos mais eficazes para controlar os movimentos financeiros
dos partidos e candidatos e para amainar os excessos no financiamento das campanhas
e a influência do dinheiro no exercício da democracia.
Como observa Ferreira (2004, p. 77-106), o desafio nessa questão é criar os meios
para que a relação entre dinheiro e política seja cada vez mais transparente e possibilite
ao cidadão o exercício do voto informado, ao mesmo tempo em que estimule os partidos
a exercer um controle recíproco para ajustar sua conduta às normas existentes e às
expectativas da cidadania.
O tema ganha maior relevo ante as importantes alterações promovidas pela
reforma eleitoral de 2015, implementada pela Lei nº 13.165/2015, dentre as quais
destacamos a fixação dos limites de gastos em lei, o fim do financiamento das campanhas
por pessoas jurídicas e a redução do período de propaganda eleitoral.
Somam-se a essas mudanças, as novas exigências relacionadas à prestação de
informações relativas à arrecadação de recursos financeiros no prazo de 72 horas da sua
1
Tradicionalmente, o financiamento das campanhas eleitorais no Brasil era predominantemente privado,
pois permitido que os partidos políticos e candidatos, dentro de certos limites, recebessem contribuições de
particulares (de pessoas físicas e de pessoas jurídicas). Existiam limitações de duas ordens: a) objetiva: as
pessoas físicas e jurídicas somente poderiam contribuir até um determinado limite (teto financeiro de doação,
de acordo com a renda auferida no ano anterior à eleição); b) subjetiva: as pessoas jurídicas de direito público,
bem como certas pessoas jurídicas de direito privado, não poderiam financiar campanhas eleitorais.
Com a proibição das doações por pessoas jurídicas que eram as principais
financiadoras das campanhas pretéritas e visando a garantir a existência de recursos
suficientes para o custeio das campanhas vindouras, a Lei nº 13.487/17 criou o Fundo
Especial de Financiamento de Campanhas, fundo constituído de recursos públicos
a serem destinados às campanhas dos candidatos que será mais bem analisado ao
comentarmos as novas regras implementadas pela reforma eleitoral de 2017.
2
Recentemente, em decisão publicada no DJE de 24.2.2017, o TSE considerou lícito a empréstimo obtido junto a
terceiro, desde que observadas as prescrições legais: “Recurso Ordinário nº 2622-47/TO.
Relatora: Ministra Luciana Lóssio. Ementa: ELEIÇÕES 2010. RECURSO ORDINÁRIO. REPRESENTAÇÃO.
ART. 30-A DA LEI No 9.504/97. CAPTAÇÃO OU GASTO ILÍCITO DE RECURSOS FINANCEIROS DE CAM
PANHA. DEPUTADO ESTADUAL. CONTRATAÇÃO DE EMPRÉSTIMO JUNTO A PESSOA FÍSICA. LICITUDE.
AUSÊNCIA DE NORMA PROIBITIVA EXPRESSA. IMPROCEDÊNCIA NO TRE. DESPROVIMENTO.
1. A Res.-TSE nº 23.217/2011, que dispõe sobre a arrecadação e gastos de recursos de campanha, bem como sobre
a respectiva prestação de contas, não veda a possibilidade de a pessoa física do candidato contrair empréstimo
junto a terceiro, objetivando, a título de recursos próprios, promover aporte ao seu caixa de campanha, desde
que observados os demais ditames legais incidentes.
2. A representação do art. 30-A da Lei nº 9.504/97 exige, para a sua procedência, além do juízo de proporcionalidade
na fixação da pena, que os recursos ou gastos de campanha sejam ilícitos. 3. Recurso ordinário ao qual se nega
provimento.”
3
Art. 23, §7º da Lei nº 9.504/97 com a redação dada pela Lei nº 13.488/2017 – O limite previsto no §1º deste
artigo não se aplica a doações estimáveis em dinheiro relativas à utilização de bens móveis ou imóveis de
propriedade do doador ou à prestação de serviços próprios, desde que o valor estimado não ultrapasse
R$ 40.000,00 (quarenta mil reais) por doador.
4
Art. 5º Nas eleições para Presidente da República em 2018, o limite de gastos de campanha de cada candidato
será de R$ 70.000.000,00 (setenta milhões de reais).
Parágrafo único. Na campanha para o segundo turno, se houver, o limite de gastos de cada candidato será de
50% (cinquenta por cento) do valor estabelecido no caput deste artigo.
Art. 6º O limite de gastos nas campanhas dos candidatos às eleições de Governador e Senador em 2018 será
definido de acordo com o número de eleitores de cada unidade da Federação apurado no dia 31 de maio de
2018, nos termos previstos neste artigo.
§1º Nas eleições para Governador, serão os seguintes os limites de gastos de campanha de cada candidato:
I – nas unidades da Federação com até um milhão de eleitores: R$ 2.800.000,00 (dois milhões e oitocentos mil
reais);
II – nas unidades da Federação com mais de um milhão de eleitores e de até dois milhões de eleitores:
R$ 4.900.000,00 (quatro milhões e novecentos mil reais);
III – nas unidades da Federação com mais de dois milhões de eleitores e de até quatro milhões de eleitores:
R$ 5.600.000,00 (cinco milhões e seiscentos mil reais);
IV – nas unidades da Federação com mais de quatro milhões de eleitores e de até dez milhões de eleitores:
R$ 9.100.000,00 (nove milhões e cem mil reais);
V – nas unidades da Federação com mais de dez milhões de eleitores e de até vinte milhões de eleitores:
R$ 14.000.000,00 (catorze milhões de reais);
VI – nas unidades da Federação com mais de vinte milhões de eleitores: R$ 21.000.000,00 (vinte e um milhões
de reais).
§2º Nas eleições para Senador, serão os seguintes os limites de gastos de campanha de cada candidato:
I – nas unidades da Federação com até dois milhões de eleitores: R$ 2.500.000,00 (dois milhões e quinhentos
mil reais);
II – nas unidades da Federação com mais de dois milhões de eleitores e de até quatro milhões de eleitores:
R$ 3.000.000,00 (três milhões de reais);
III – nas unidades da Federação com mais de quatro milhões de eleitores e de até dez milhões de eleitores:
R$ 3.500.000,00 (três milhões e quinhentos mil reais);
IV – nas unidades da Federação com mais de dez milhões de eleitores e de até vinte milhões de eleitores:
R$ 4.200.000,00 (quatro milhões e duzentos mil reais);
V – nas unidades da Federação com mais de vinte milhões de eleitores: R$ 5.600.000,00 (cinco milhões e
seiscentos mil reais).
§3º Nas campanhas para o segundo turno de governador, onde houver, o limite de gastos de cada candidato
será de 50% (cinquenta por cento) dos limites fixados no §1º deste artigo.
Art. 7º Em 2018, o limite de gastos será de:
I – R$ 2.500.000,00 (dois milhões e quinhentos mil reais) para as campanhas dos candidatos às eleições de
Deputado Federal;
II – R$ 1.000.000,00 (um milhão de reais) para as campanhas dos candidatos às eleições de Deputado Estadual
e Deputado Distrital.
5
Art. 100-A. A contratação direta ou terceirizada de pessoal para prestação de serviços referentes a atividades
de militância e mobilização de rua nas campanhas eleitorais observará os seguintes limites, impostos a cada
candidato:
I – em Municípios com até 30.000 (trinta mil) eleitores, não excederá a 1% (um por cento) do eleitorado;
II – nos demais Municípios e no Distrito Federal, corresponderá ao número máximo apurado no inciso I,
acrescido de 1 (uma) contratação para cada 1.000 (mil) eleitores que exceder o número de 30.000 (trinta mil).
§1º As contratações observarão ainda os seguintes limites nas candidaturas aos cargos a:
I – Presidente da República e Senador: em cada Estado, o número estabelecido para o Município com o maior
número de eleitores;
II – Governador de Estado e do Distrito Federal: no Estado, o dobro do limite estabelecido para o Município
com o maior número de eleitores, e, no Distrito Federal, o dobro do número alcançado no inciso II do caput;
III – Deputado Federal: na circunscrição, 70% (setenta por cento) do limite estabelecido para o Município com
o maior número de eleitores, e, no Distrito Federal, esse mesmo percentual aplicado sobre o limite calculado na
forma do inciso II do caput, considerado o eleitorado da maior região administrativa;
IV – Deputado Estadual ou Distrital: na circunscrição, 50% (cinquenta por cento) do limite estabelecido para
Deputados Federais;
V – Prefeito: nos limites previstos nos incisos I e II do caput;
VI – Vereador: 50% (cinquenta por cento) dos limites previstos nos incisos I e II do caput, até o máximo de 80%
(oitenta por cento) do limite estabelecido para Deputados Estaduais.
6
Para efetuar pagamento de gastos de pequeno vulto, o órgão partidário pode constituir reserva em dinheiro
(fundo de caixa) que observe o saldo máximo de R$ 5.000,00 (cinco mil reais), desde que não ultrapassem 2%
(dois por cento) dos gastos contratados pela agremiação.
Já a reserva em dinheiro (fundo de caixa) do candidato deve observar o saldo máximo de R$ 2.000,00 (dois mil
reais), desde que não ultrapasse 2% (dois por cento) do limite de gastos estabelecidos para sua candidatura.
7
Art. 28 (...)
§10. O sistema simplificado referido no §9º deverá conter, pelo menos:
I – identificação das doações recebidas, com os nomes, o CPF ou CNPJ dos doadores e os respectivos valores
recebidos;
II – identificação das despesas realizadas, com os nomes e o CPF ou CNPJ dos fornecedores de material e dos
prestadores dos serviços realizados;
III – registro das eventuais sobras ou dívidas de campanha.
8
10% dos rendimentos brutos auferidos no ano anterior ao pleito.
9
Nos termos da atual redação do §3º do art. 23 da Lei nº 9.504/97, dada pela Lei nº 13.488/2017, essa multa é de
até 100% do valor em excesso, e não mais de 5 a 10 vezes a quantia doada em excesso.
10
A propaganda partidária foi extinta a partir de 2018.
11
O alvo principal do crowfunding são as pequenas doações, que juntas forma um valor compatível para arcar
com um projeto que se apoia. Tratando-se de campanhas eleitorais, a tendência é que os principais beneficiários
sejam candidatos que não dispõem de apoio partidário.
doador que antes era de cinco a dez vezes o valor excedido e agora foi reduzida para
uma vez o excesso (100%).
O limite de doações estimáveis em dinheiro relativas à utilização de bens móveis
ou imóveis de propriedade do doador também foi reduzido de R$ 80.000,00 para R$
40.000,00 e passou a abranger a doação de serviços próprios.
Algumas despesas pessoais dos candidatos foram, taxativamente, excluídas
do rol de gastos eleitorais pela nova lei, dispensando-se a sua comunicação à Justiça
Eleitoral. São elas, em suma, as relacionadas com combustível e manutenção de veículo
automotor usado pelo próprio candidato na campanha, bem como a remuneração, a
alimentação e a hospedagem do condutor do veículo; a alimentação e hospedagem do
próprio candidato e o uso de linhas telefônicas registradas em seu nome como pessoa
física, até o limite de três.
Restaram dispensadas de comprovação na prestação de contas, as despesas
relacionadas às cessões de automóveis de propriedade do candidato, do cônjuge e de
seus parentes até o terceiro grau para seu uso pessoal durante a campanha. Nesses
casos, o valor deve constar na prestação de contas, mas não é necessário apresentar
documentos específicos correlatos.
Manteve-se a regra que permite ao candidato custear 100% (cem por cento) dos
gastos da sua campanha e o limite de doações realizadas por pessoas físicas de até 10%
(dez por cento) dos rendimentos brutos auferidos no ano anterior ao do pleito.
Ainda no que pertine ao financiamento, a reforma definiu de forma mais clara
a proibição constante na Lei dos Partidos Políticos relativa às doações às agremiações
partidárias provenientes de autoridades. Esse dispositivo legal sempre gerou
controvérsias em torno da definição do termo “autoridade”. Nos termos da nova lei, a
limitação passou a atingir apenas as pessoas físicas que exercem função ou cargo público
de livre nomeação e exoneração, ou cargo ou emprego público temporário. Com essa
nova redação, resta claro que um funcionário público concursado ou um parlamentar,
por exemplo, podem realizar uma doação para o partido de sua preferência.
Por fim, a inclusão do art. 354-A no Código Eleitoral tipificou como crime o ato
de apropriar-se o candidato, o administrador financeiro da campanha, ou quem de fato
exerça essa função, de bens, recursos ou valores destinados ao financiamento eleitoral,
em proveito próprio ou alheio.
2.6 Conclusão
Inobstante as recentes reformas políticas tenham adotado medidas cruciais para
o aperfeiçoamento do atual sistema de financiamento das campanhas e das prestações
de contas eleitorais, tem-se que, ainda há uma forte influência do poder econômico no
resultado das eleições e a prática de ilícitos na movimentação de recursos em campanha
que viciam a vontade popular e maculam o processo eleitoral.
Embora a legislação disponha de forma analítica sobre o tema e adote um regime
de sanções, vivenciamos ainda uma instabilidade do sistema que se mostra inadequado
e insuficiente para garantir uma disputa igualitária e o efetivo e legítimo exercício da
democracia.
Destacam-se como principais problemas para a manutenção desse cenário, a
ausência de políticas institucionais que possibilitem o efetivo controle dos recursos
Referências
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3.1 Introdução
Sabidamente, as campanhas eleitorais demandam a movimentação de recursos
financeiros. As últimas eleições (2016, de cunho municipal) tiveram o custo de
R$ 2,2 bilhões.1 Levantamentos dão conta de que as últimas eleições gerais (de 2014)
custaram aproximadamente R$ 5 bilhões, em valores defasados.2
Logo, dentre os inúmeros custos para o fomento desta etapa democrática essencial
para viabilização e exposição de candidaturas como a contratação de pessoal, material,
produção midiática, por exemplo, precisam ser registrados, contabilizados e, até mesmo
controlados.
Neste sentido, é que se revela imprescindível a prestação de contas de candidaturas
para os postulantes a cargos eletivos.
O presente estudo tratará da prestação de contas em cotejo com as Resoluções do
Tribunal Superior Eleitoral, analisando os fundamentos, limites e cuidados que devem
se cercar para sua aplicação pela Justiça Eleitoral.
1
MOURA, Rafael Moraes. Gasto das campanhas eleitorais cai 71%, aponta TSE, O Estado de S. Paulo, 11.10.2016.
Disponível em: <http://politica.estadao.com.br/noticias/geral,gasto-das-campanhas-eleitorais-cai-71-aponta-
tse,10000081602>. Acesso em: 20 dez. 2017.
2
BURGARELLI, Rodrigo. Campanhas gastaram R$ 5 bilhões em 2014, O Estado de S. Paulo, 1.12.2014. Disponível
em: <http://politica.estadao.com.br/noticias/geral,campanhas-gastaram-r-5-bilhoes-em-2014-imp-,1600362>.
Acesso em: 20. dez. 2017.
(...) vislumbrar a origem dos recursos eleitorais e a forma como foram efetivados seus
gastos, possuindo o fator teleológico de impedir o abuso do poder econômico e assegurar
paridade para que todos os cidadãos tenham condições de disputar os pleitos eleitorais.4
3.2.1 Procedimentos
Prestar contas é uma obrigação dos postulantes a cargos eletivos para funções
no Executivo (Presidente, Governador, Prefeito e seus respectivos vices) e Legislativo
(vereador, deputados estadual, distrital e federal, além de senadores).
O candidato adquirirá vida para fins de campanha eleitoral, tanto que será
acolhido com um Cadastro Nacional de Pessoa Jurídica (CNPJ), com contabilidade
específica e necessidade de abertura de conta bancária.
Os candidatos deverão abrir uma conta bancária na sequência da indicação de
seus nomes na convenção partidária, devendo arrecadar e gastar apenas com recursos
3
“Todos os candidatos, eleitos ou não, são obrigados a prestar contas à Justiça Eleitoral, inclusos também os
comitês financeiros”. DAL POZZO, Antonio Arnaldo Ferraz. Lei Eleitoral: Lei nº 9.504/97: estrutura, análise e
jurisprudência, 4. ed., São Paulo: Saraiva, 2010. p.136.
4
VELLOSO, Carlos Mário da Silva. Elementos de direito eleitoral, São Paulo: Saraiva, 2009. p. 136.
5
FERREIRA, Telson L. Cavalcante, Prestação de contas de candidatos: obrigatoriedade, julgamento e aspectos
importantes, p. In: CARVALHO NETO, Tarcísio Vieira de; FERREIRA, Telson Luís Cavalcante. Direito Eleitoral:
aspectos materiais e processuais, São Paulo, Migalhas, 2016.
transitados na conta oficial (ou nas contas, caso queira abrir mais de uma). A falta de
abertura bancária ou do trânsito de recursos financeiros para pagamento de gastos
eleitorais que não provenham da conta específica implicará a desaprovação de contas
e, se comprovado abuso de poder econômico, levará ao cancelamento de registro ou
cassação do diploma (art. 21, §3º, Lei das Eleições). Excepcionado estão os candidatos
que disputem eleições nos municípios com menos de 20 mil eleitores e onde não haja
agência de banco, sendo dispensada a conta específica.
Conforme determinado (art. 28, §1º, Lei das Eleições) os próprios candidatos são
obrigados a prestar suas contas, “devendo ser acompanhadas dos extratos das contas
bancárias referentes à movimentação dos recursos financeiros usados na campanha e
da relação dos cheques recebidos, com a indicação dos respectivos números, valores
e emitentes”.
Os recursos hábeis ao incremento de campanhas eleitorais são tanto de recursos
financeiros quanto de bens que tenham estimativa em dinheiro, devendo tanto um
quanto o outro serem integralmente acolhidos na contabilidade oficial do candidato.
A prestação de contas englobará todas as despesas e receitas ingressadas para a
campanha eleitoral. Considera-se que o marco temporal será iniciado após o término das
convenções partidárias até o dia da eleição, admitindo-se, eventualmente, a arrecadação
posterior (em período limitado até a data limite da prestação de contas final) para fins
de encerramento das contas e pagamento das despesas contraídas anteriormente (até
as eleições).
Entenda-se que além de cheques, os candidatos poderão receber recursos
advindos de depósitos e transferências bancárias, seja de pessoa física (de forma direta
ou mediante crowdfunding), da agremiação partidária ou sua coligação, sempre de forma
a identificar nominalmente o doador.
Os candidatos declararão todas as despesas incorridas no curso da campanha.
É pacífico que todos os candidatos devam prestar contas, mesmo àqueles falecidos
no curso da eleição, que desistiram da campanha ou nada arrecadaram.
A prestação de contas poderá ser simplificada para candidatos que tenham
movimentação de até R$ 20 mil (art. 28, §9º) ou para eleições municipais com menos
de 50 mil eleitores (art. 28, §11).
Como em toda norma contábil, deverá a prestação de contas demonstrar equilíbrio
entre receitas e despesas de campanha. Os débitos eleitorais deverão ser quitados até a
data da prestação de contas final, salvo se assumidos por partido político (§3º, art. 29).
Eventual sobra de recursos será transferida ao respectivo Diretório partidário.
A Lei das Eleições prevê no artigo 30 os possíveis tipos de julgamentos rela
tivamente à prestação de contas: I – pela aprovação, quando as contas estiverem
regulares; II – pela aprovação com ressalvas, quando as falhas verificadas não lhe com
prometerem a regularidade; III – pela desaprovação quando verificadas falhas que lhes
comprometam a regularidade; IV – pena não prestação, quando as contas não forem
apresentadas após notificação emitida pela Justiça Eleitoral, na qual deve constar a
obrigação expressa de prestar as suas contas, no prazo de setenta e duas horas.
Não é necessário maior esclarecimento quanto ao julgamento de aprovação das
contas. O resultado da aprovação significará que a candidatura conseguiu demonstrar a
higidez na arrecadação, correto desembolso e atendimento das formalidades constantes
da Lei e da Resolução específica.
Essa irregularidade das contas pode estar fora da própria prestação, ou seja, a prestação
de contas pode estar formalmente perfeita, mais indica arrecadação irregular, ou gastos
irregulares. E pode ser que a falha esteja na prestação de contas em si mesma, por não
estar e, forma contábil ou não obedecer aos parâmetros ou modelos fornecidos pelo TSE.
Havendo, pois irregularidade que comprometa a prestação de contas, deve ela ser julgada
irregular.7
6
CONEGLIAN, Olivar. Propaganda eleitoral: de acordo com o Código Eleitoral e com a Lei 9.504/97, modificada
pelas Leis 9.840/99, 10.408/02, 10.740/03, 11.300/06 e 12.034/09, 10. ed., Curitiba, Juruá, 2010. p. 61.
7
Ibidem.
8
Art. 30-A. Qualquer partido político ou coligação poderá representar à Justiça Eleitoral, no prazo de 15 (quinze)
dias da diplomação, relatando fatos e indicando provas, e pedir a abertura de investigação judicial para apurar
condutas em desacordo com as normas desta Lei, relativas à arrecadação e gastos de recursos.
9
GOMES, José Jairo, Direito Eleitoral, 11. ed., Atlas, São Paulo, 2015. p. 363.
10
TRIBUNAL SUPERIOR ELEITORAL:
“Registro. Quitação eleitoral. (...). 2. Conforme jurisprudência desta Corte Superior, não é admitida a juntada
extemporânea de certidão, após a sentença de indeferimento do registro, considerando, ainda, que o juiz
(2017) será abastecido com recursos equivalentes a 30% das emendas parlamentares
que se estima atingir mais R$ 1,7 bilhões.
As campanhas de 2016 e, até mesmo, a de 2014 ainda possuem algumas faturas
em aberto em desfavor das agremiações partidárias. Houve, inclusive, tentativas (via
reforma eleitoral) de resgate de recursos dos Institutos vinculados a partidos para custear
despesas de campanha, o que se mostraria um expediente ilegal, e não tendo prosperado.
As inserções partidárias, por outro lado, foram extirpadas na minirreforma
operada para a alteração nas Eleições 2018 (Lei nº 13.487/17), como mecanismo de
suposta compensação ante a instituição do Fundo para campanhas eleitorais.
Sobre a arrecadação privada, restam os seguintes caminhos:
autofinanciamento: os candidatos até então, podiam autofinanciar-se, por com
pleto, até o limite máximo arrecadatório. Temendo-se o efeito deletério de
privilégio a candidatos afortunados, a última reforma eleitoral de 2017 breca o
autofinanciamento a, no máximo, 10% do teto imposto pela Resolução do TSE. Se
um candidato a deputado federal possa ter gastos de até R$ 2,5 mi, a capacidade
de autodoação seria de R$ 250 mil. Entretanto, houve veto presidencial (ou
seja, retomando-se ao regime de que o candidato poderia se autofinanciar por
completo) que, por seu turno, foi rejeitado às vésperas do fim de 2017.16 Duvidosa
a solução a esta questão – se existe ou não um teto de autofinanciamento – tanto
que o TSE ao aprovar todas as Resoluções para as Eleições de 2018, inclusive a
relativa à arrecadação e gastos, deixou o tema a ser revisitado.
Doações financeiras ou de valores estimáveis em dinheiro por pessoas físicas: quaisquer
pessoas físicas, com exceção daquelas que exerçam cargos/função em comissão
ou cargo/emprego temporário não poderão doar, salvo se forem filiados a partido
político (art. 31, V, Lei nº 9096), de estrangeiro ou pessoa física que exerça atividade
comercial decorrente de permissão pública. Ademais, pessoas físicas poderão doar
até 10% do rendimento bruto auferido no ano anterior (2017), conforme informado
à Receita Federal. Inclui-se em doação de pessoa física a feita por intermédio de
financiamento coletivo. As doações de bens ou serviços estimáveis em dinheiro
deverão pertencer ao patrimônio do doador ou constituir atividade econômica
por ele exercida, limitando-se ao valor de até R$ 40 mil.
Eventos de arrecadação ou comercialização de bens: os candidatos poderão realizar
eventos arrecadatórios, ocasião em que os pagantes ou arrematantes de bens
disponibilizados às campanhas deverão ser custeados por fontes autorizadas pela
lei, obedecido, inclusive, ao limite do doador. Na hipótese de adoção deste meio
arrecadatório, o candidato deverá informar à Justiça Eleitoral e individualizar a
relação dos que participaram com doações, contabilizando-se todas as despesas,
inclusive.
Financiamento tomado pelo próprio candidato à sua campanha: além de poder ser
utilizado o patrimônio existente do candidato ou o mesmo, poderá tomar recursos
junto à instituição financeira para ser transferido para a conta de campanha,
desde que devidamente contabilizado e seja compatível com a capacidade de
pagamento de acordo com os rendimentos de sua atividade econômica.
16
O veto derrubado pelo Congresso (com a sanção de limites ao autofinanciamento) ocorre menos de 1 ano antes
das eleições, a colidir, em tese, com o princípio da anualidade, do artigo 16 da Constituição Federal.
Para definição do alcance da expressão “tida como ilegais”, constante da alínea p do Art.
1º, I, da LC 64/90, é necessário considerar o disposto no art. 14, §9º, da Constituição, pois
não é qualquer ilegalidade que gera a inelegibilidade, mas apenas aquelas que dizem
respeito à normalidade e legitimidade das eleições e visam proteção contra o abuso do
poder econômico ou político. 5. Reconhecido expressamente pelas decisões proferidas na
representação para apuração de excesso de doação que não houve quebra de isonomia
entre as candidaturas, deve ser afastada a hipótese de inelegibilidade por ausência dos
parâmetros constitucionais que a regem. (...). (TSE, Ac. de 16.9.2014 no RO nº 53430, rel.
Min. Henrique Neves da Silva.
Não se aceitarão doações para campanhas das fontes prescritas no art. 24, da
Lei das Eleições.17
Sobre as despesas de campanha, necessário que sejam contabilizadas todas
aquelas incorridas para referida finalidade, sendo o rol do art. 26 da Lei das Eleições
meramente exemplificativo. A Justiça Eleitoral aferirá a pertinência, quantitativo, e
qualitativamente do tipo de gasto, para aferir sua compatibilidade e também analisar
eventual existência de abusos ou desvios – como, por exemplo, ante a apresentação
de uma suposta despesa que seja superfaturada para desvio em proveito próprio de
candidato ou de terceiro.
É consolidada a vedação de candidato prover distribuição de brindes a seus
eleitores, por mais módico que lhe pareça, sob pena de constituir corrupção eleitoral e
gasto ilícito, sujeito às sanções eleitorais das mais drásticas. Permite-se, entretanto, que
candidato doe recursos a outro candidato.
As constantes reformas eleitorais na Lei nº 9.504/97 vieram a afrouxar aquilo que
poderia ser considerado como despesa, inclusive daquelas que pudessem ser conta
bilizadas unicamente como de bens ou serviços estimáveis. Por exemplo, na reforma de
2017 (Lei nº 13.488), gastos do candidato com o veículo próprio e combustível, suas linhas
telefônicas, alimentação e hospedagem não precisarão ser declaradas e contabilizadas.
Também não se declarará a cessão de automóvel conferido por cônjuge ou parente até o
3º grau de parentesco, desde que tal veículo seja utilizado para uso pessoal do candidato.
Restrições das mais distintas, as quais transbordam os limites deste estudo,
operam-se para as despesas de campanha pela internet. Na reforma de 2017, a Lei das
Eleições permite o impulsionamento pago de postagens ou de aplicações de busca na
internet desde que o provedor esteja no país (página ou escritório), desde que feito nas
redes sociais ou na página do próprio candidato, persistindo a vedação de veiculação em
páginas comerciais. Este tema certamente gerará os mais aguerridos debates, haja vista
a difusão das fake news impulsionadas por robots, perfis falsos ou mecanismos artificiais
de disparos, que também são temidos por propiciar difusão de ofensas ou inverdades
de candidatos – com reflexos na questão da propaganda eleitoral.
A Lei Eleitoral prevê mecanismos de contribuição para aferição e análise das
contas, com o contributo de técnicos, se necessário, requisitados dos Tribunais de
Contas (art. 30, §3º).
Não há na lei em si, mecanismos de circularização de informações entre doadores,
fornecedores, e candidatos para aferição dos gastos, embora seja tal um procedimento
17
Lei nº 9504/97, Art. 24. É vedado, a partido e candidato, receber direta ou indiretamente doação em dinheiro ou
estimável em dinheiro, inclusive por meio de publicidade de qualquer espécie, procedente de:
I - entidade ou governo estrangeiro; II - órgão da administração pública direta e indireta ou fundação mantida
com recursos provenientes do Poder Público; III - concessionário ou permissionário de serviço público; IV -
entidade de direito privado que receba, na condição de beneficiária, contribuição compulsória em virtude de
disposição legal; V - entidade de utilidade pública; VI - entidade de classe ou sindical; VII - pessoa jurídica
sem fins lucrativos que receba recursos do exterior; VIII - entidades beneficentes e religiosas; IX - entidades
esportivas que recebam recursos públicos; IX - entidades esportivas; X - organizações não-governamentais que
recebam recursos públicos; XI - organizações da sociedade civil de interesse público.
consolidado na prática e nas Resoluções do Tribunal Superior Eleitoral, que conta com
informações encaminhadas da Receita Federal ao Ministério Público para tanto.
18
COSTA, Adriano Soares da. Instituições de Direito Eleitoral, 7. ed., Lumen Juris, Rio de Janeiro, 2008. p. 247.
19
“O entendimento jurisprudencial segundo o qual a Justiça Eleitoral possui função normativa, também é
histórico, podendo-se referir à Resolução nº 6.390, de 13 de novembro de 1959, em que o TSE, sob a presidência
do Ministro Nelson Hungria, e tendo, como Relator, o Ministro Ildefonso Mascarenhas da Silva, respondeu a
Consulta 1.745/AM, expressando, em sua ementa, que ‘o Tribunal Superior Eleitoral tem poder normativo na
expedição de instruções para fiel execução das leis eleitorais’. (...) Esse também foi o entendimento do Supremo
Tribunal Federal, no julgamento do Mandado de Segurança nº 26.604/DF, em que a Relatora, Ministra Cármen
Lúcia, expressamente, afirmou que o Código Eleitoral na parte em que disciplina a organização e competência
da Justiça Eleitoral, foi recepcionado pela Constituição de 1988 ‘como lei material complementar’”. PAIM,
Gustavo Bohrer. Direito Eleitoral e segurança jurídica. Livraria do Advogado, Porto Alegre, 2016. p. 77-78.
20
FERREIRA FILHO, Manoel Gonçalves. A separação dos poderes: a doutrina e sua concretização constitucional.
Cadernos Jurídicos da Escola Paulista da Magistratura, São Paulo, ano 16, nº 40, p. 67-81, abril-junho/2015.
21
GRAU, Eros Roberto. O direito posto e o direito pressuposto, 8 ed., São Paulo, Malheiros, 2011. p. 240-241
22
GRAU, op. cit., p. 244-245
23
ATALIBA, Geraldo. Decreto Regulamentar no sistema brasileiro. Revista de Direito Administrativo, Rio de Janeiro,
97: 21-33, julho/setembro de 1969.
24
TÁCITO, CAIO. As Delegações Legislativas e o Poder Regulamentar. Revista de Direito Administrativo, v. 34,
471-473, 1953. Disponível em: <http://bibliotecadigital.fgv.br/ojs/index.php/rda/article/viewFile/13397/12306>.
Acesso em: 15 nov. 2017.
25
No Supremo Tribunal Federal no Recurso Extraordinário nº 197.917 em maioria de votos, puxados pelo Relator
Ministro Maurício Côrrea em 24.3.2004 decidiu pela adoção de critérios de proporcionalidade na fixação
do número de vereadores na cidade paulista de Mira Estrela - o qual não se observara no caso em análise.
O Tribunal Superior Eleitoral editou a Resolução nº 21.702/04 para adotar faixas e estabelecer qual seria o
número de vereadores por faixa populacional, a despeito do estabelecido nas Leis Orgânicas dos 5 milhares
de municípios no Brasil. O STF, posteriormente, na Ação Direta de Inconstitucionalidade (ADI) 3345 teve tal
Resolução como constitucional.
26
A Consulta nº 1398/DF que tratava de interpretar a semântica da fidelidade partidária foi convolada na
Resolução nº 22.610/07 que acabou por disciplinar o processo e a decretação de perda de cargo eletivo em
decorrência de desfiliação partidária sem justa causa.
27
Há quem concorde com este superpapel da Justiça Eleitoral, inclusive em assuntos extravagantes, propriamente
usurpados da esfera jurídica adequada – que seria o papel do Legislativo: “Talvez dotar a Justiça Eleitoral de
poderes normativos não seja a solução mais ortodoxa. Mas ao visualizá-la como um órgão eleitoral, percebe-se
que dentre todas as instituições brasileiras, é a que está mais bem posicionada para arbitrar as regras do jogo,
quando absolutamente necessário a seu bom andamento – o que na matéria eleitoral significa primar pela
liberdade do eleitor e pelo equilíbrio das forças em disputa”. MACEDO, Elaine Harzheim; SOARES, Rafael
Morgental. O poder normativo da Justiça Eleitoral e a separação dos poderes: um paradigma democrático?
In: VITA, Jonathan Barros; MALISKA, Marcos Augusto (Org.). Direitos fundamentais e democracia II [Recurso
eletrônico on-line, Florianópolis, CONPEDI, 2014, Disponível em: <http://www.publicadireito.com.br/
artigos/?cod=0bd791e117caac17>. Acesso em: 11 jan. 2015.
Esses dois exemplos são tidos por emblemáticos diante do exasperamento do poder
regulamentar pela Justiça Eleitoral.
28
“Foi ciúme, que não se converteu em maior produtividade legislativa” é o comentário feito por ocasião da
alteração no art. 105 da Lei das eleições segundo GONÇALVES, Luiz Carlos dos Santos. Direito Eleitoral, 2. ed.,
São Paulo, Atlas, 2012.
29
Notável a participação de delegados partidários, advogados militantes, entidades de classe, grupos de pesquisa,
professores e sociedade civil como um todo, enriquecendo o debate, e contribuindo para a tarefa do Tribunal
Superior Eleitoral no aprimoramento das Resoluções.
“no âmbito do juízo delibatório inicial, é aquela veiculada contra o art. 8º da Resolução,
dispositivo esse que, inovando em relação aos atos regulamentares que disciplinaram
os últimos sufrágios, subtraiu do Ministério Público Eleitoral função que lhe é
constitucionalmente própria, de determinar a instauração de inquérito policial. Há, aqui,
portanto, relevantes razões para supor presente vício de inconstitucionalidade formal
(=criação de norma de natureza processual sem observância do princípio da legalidade
estrita) e material (=restrição injustificada das funções constitucionais do Ministério
Público)” (voto do Ministro Teori Zavascki na ADI 5104 MC / DF)
Por outro lado, o STF já reconheceu nas ADI nº 3.999 e nº 4.086, em que se
impugnavam as Resoluções nº 22.610/2007 e nº 22.733/2008 do TSE (que versam sobre
a perda de mandado eletivo por infidelidade partidária) que se o próprio Supremo
decidiu que a fidelidade partidária era um preceito constitucional, seria um contrassenso
não garantir instrumento que pudesse assegurar sua eficácia, ou seja, o TSE teria
prerrogativa de atuar via Resolução para sua plena concreção. Antes, na ADI nº 3.345,
o STF sinalizara a constitucionalidade da Resolução do TSE nº 21.702/2004 por entender
que ali era expressado a força normativa da Constituição em razão do que se decidiu
no Recurso Extraordinário nº 197.917/SP, quanto à faixa adequada de vereadores em
razão da quantidade de eleitores por município.
30
ÁVILA, Humberto (org.). Fundamentos do Estado de Direito. Estudos em homenagem ao professor Almiro do
Couto e Silva. Malheiros: 2005. p. 125.
31
COUTO E SILVA, Almiro do. Princípio da segurança jurídica no direito administrativo brasileiro. In: Tomo
Direito Administrativo e Constitucional, Edição 1, Abril de 2017. Enciclopédia Jurídica da Pontifícia Universidade
Católica de São Paulo. Disponível em: <https://enciclopediajuridica.pucsp.br/verbete/17/edicao-1/principio-da-
seguranca-juridica-no-direito-administrativo-brasileiro>. Acesso em: 25 dez. 2017.
32
CANOTILHO, José Joaquim Gomes. Direito Constitucional e Teoria da Constituição. Coimbra, Almedina: 2009.
p. 252.
33
HORBACH, Carlos B., O Poder Normativo do TSE e a Segurança Jurídica, p. 357 In: CARVALHO NETO;
FERREIRA, op. cit..
O ora recorrente agiu em estrita observância ao que fora decidido pela Justiça Eleitoral,
caracterizando a sua boa-fé, não devendo ser surpreendido com a cassação, no âmbito
de RCED, referente ao mesmo pleito, sob pena de violação aos princípios da proteção à
confiança e da segurança jurídica. (...)
Em razão do princípio da proteção à confiança, também aplicado na atividade jurisdicional,
devem-se proteger situações já consolidadas no tempo, notadamente, se o candidato agiu
com boa-fé, como é o caso, não havendo falar em tentativa de fraudar a lei constitucional no
que tange à transferência do domicílio eleitoral. (TSE, RESPE - Recurso Especial Eleitoral
nº 3111 - SÃO LUÍS DO QUITUNDE – AL, Acórdão de 09.10.2012, Relator(a) designado(a)
Min. Arnaldo Versiani Leite Soares, Publicação: RJTSE - Revista de jurisprudência do TSE,
Volume 25, Tomo 1, Data 09.10.2012, Página 9, DJE - Diário de justiça eletrônico, Tomo
226, Data 26.10.2012, Página 7)
34
Vide principalmente, DWORKIN, Ronald. Império do Direito. São Paulo: Martins Fontes, 2007.
35
Op. cit.
36
SCARPINO JR., Luiz Eugenio. Moralidade Eleitoral e Juristocracia: análise crítica da Lei da Ficha Limpa (Lei
Complementar nº 135/10), Lumen Juris, Rio de Janeiro, 2016.
37
“A estabilidade legislativa ou durabilidade razoável das normas que se repercutam em situações jurídicas
subjetivas decorre do princípio da proteção da confiança, imanente ao Estado democrático de Direito” como
salienta MIRANDA, Jorge. Teoria do Estado e da Constituição, 4. ed., Rio de Janeiro, Forense, 2015. p. 417.
38
Bem pontua PAIM, op. cit., p. 21: “A fluidez das normas eleitorais, extremamente cambiantes, gera uma carência
de uniformidade, de sistematicidade, contribuindo para a dificuldade de cognoscibilidade do Direito Eleitoral.
Como se não bastasse, a edição de resoluções pela Justiça Eleitoral contribui ainda mais para a proliferação
normativa, o que faz com que até mesmo estudiosos da matéria sejam surpreendidos com repentinas mudanças
do arcabouço legislativo.”
As decisões do Tribunal Superior Eleitoral que, no curso do pleito eleitoral (ou logo
após o seu encerramento), impliquem mudança de jurisprudência (e dessa forma
repercutam sobre a segurança jurídica), não têm aplicabilidade imediata ao caso concreto
e somente terão eficácia sobre outros casos no pleito eleitoral posterior. (STF, RECURSO
EXTRAORDINÁRIO 637.485 RIO DE JANEIRO RELATOR: MIN. GILMAR MENDES,
DATA DE PUBLICAÇÃO DJE 21.05.2013 - ATA Nº 72/2013. DJE nº 95, divulgado em
20.05.2013). 39
39
Vide o trecho da ementa: “SEGURANÇA JURÍDICA. ANTERIORIDADE ELEITORAL. NECESSIDADE DE
AJUSTE DOS EFEITOS DA DECISÃO. Mudanças radicais na interpretação da Constituição devem ser acom
panhadas da devida e cuidadosa reflexão sobre suas consequências, tendo em vista o postulado da segurança
jurídica. Não só a Corte Constitucional, mas também o Tribunal que exerce o papel de órgão de cúpula da Justiça
Eleitoral devem adotar tais cautelas por ocasião das chamadas viragens jurisprudenciais na interpretação dos
preceitos constitucionais que dizem respeito aos direitos políticos e ao processo eleitoral. Não se pode deixar
de considerar o peculiar caráter normativo dos atos judiciais emanados do Tribunal Superior Eleitoral, que
regem todo o processo eleitoral. Mudanças na jurisprudência eleitoral, portanto, têm efeitos normativos diretos
sobre os pleitos eleitorais, com sérias repercussões sobre os direitos fundamentais dos cidadãos (eleitores e
candidatos) e partidos políticos. No âmbito eleitoral, a segurança jurídica assume a sua face de princípio da
confiança para proteger a estabilização das expectativas de todos aqueles que de alguma forma participam dos
prélios eleitorais. A importância fundamental do princípio da segurança jurídica para o regular transcurso dos
processos eleitorais está plasmada no princípio da anterioridade eleitoral positivado no art. 16 da Constituição.
O Supremo Tribunal Federal fixou a interpretação desse artigo 16, entendendo-o como uma garantia
constitucional (1) do devido processo legal eleitoral, (2) da igualdade de chances e (3) das minorias (RE 633.703).
Em razão do caráter especialmente peculiar dos atos judiciais emanados do Tribunal Superior Eleitoral, os quais
regem normativamente todo o processo eleitoral, é razoável concluir que a Constituição também alberga uma
norma, ainda que implícita, que traduz o postulado da segurança jurídica como princípio da anterioridade ou
anualidade em relação à alteração da jurisprudência do TSE. Assim, as decisões do Tribunal Superior Eleitoral
que, no curso do pleito eleitoral (ou logo após o seu encerramento), impliquem mudança de jurisprudência
(e dessa forma repercutam sobre a segurança jurídica), não têm aplicabilidade imediata ao caso concreto e
somente terão eficácia sobre outros casos no pleito eleitoral posterior”.
40
Op. cit.
41
PAIM, op. cit., p. 23: “E a instabilidade jurisprudencial é potencializada no Direito Eleitoral, que, além de
conviver com constantes alterações legislativas, é caracterizado pelas mudanças jurisprudenciais, muito em
razão da constante modificação da composição dos Tribunais, tendo em vista que os juízes eleitorais cumprem
mandatos de dois anos, podendo ser reconduzidos apenas para mais um biênio”.
cidadãos. Neste diapasão, a gritante falta de norma autorizativa, permite que Resolução
faça uma violação aos direitos fundamentais, em que, o Ministério Público, sem realizar
qualquer ato adicional, aparelha-o como meio único de perquirir não uma investigação,
mas a busca punitiva. Pior, fundante esta representação em prova ilícita (art. 5º, LVI,
CF), obtida por uma comunicação direta da Receita Federal, que deixa de exercer a
função de administração tributária e passa a enfronhar-se, na fiscalização de doações
eleitorais perante a própria Justiça Eleitoral, na defesa de interesses diversos daqueles
que a lei lhe assegura agir. Porquanto, afigura-se tal expediente de quebra antecipada
de dados inserido em seguidas Resoluções Eleitorais de atuar fora das margens legais
(art. 23, IX, Código Eleitoral; art. 61, Lei nº 9.096/95; art. 105, Lei nº 9.504/97), usurpando
o papel do Legislativo na produção de atos normativos primários.42
A prestação de contas deverá ser apresentada ao final das eleições e também no
seu interregno, com uma parcial. Ora, tanto rigor desmesurado parece incrementar
consideravelmente a burocracia, em vista da redução de campanha um período efetivo
de 45 dias. O motivo da redução seria a redução do custo de campanha. Entretanto,
deixou-se de facilitar a prestação de contas que é um mero instrumento, não devendo ser
burocrático a ponto de tisnar o protagonismo que é a correta exposição dos candidatos.
Parece, todavia, um sofisma a redução do período eleitoral para melhoria do sistema,
pois se reduzem os gastos declarados e sujeitos ao controle jurisdicional, ficando a
descoberto todas as ações perpetradas por pré-candidatos em período pré-eleitoral –
ressalvando-se a possibilidade de ingresso oportuno de ação de investigação eleitoral
por abuso de poder econômico por gastos incorridos antes da candidatura.
Outro aspecto a ser avivado se dá quanto às últimas Resoluções Eleitorais impu
serem a obrigatoriedade de constituição de advogado para a prestação de contas,
embora nada na lei insira tal imposição. Ainda que a prestação de contas tenha ganhado
a natureza jurisdicional (antes recebia tratamento de cunho administrativo), a inter
venção desde o primórdio não parece ser a intenção que o legislador tenha quisto como
impositiva. A efetividade e celeridade buscadas pela Justiça Eleitoral com a conveniência
de intimar o advogado ao invés de fazê-lo de forma direta ao candidato parecem ter
preponderado no momento de regular o assunto. No entanto, nem todo o processo de
prestação de contas terá natureza contenciosa, tal qual não se reveste o processo de
registro de candidatura – o qual sequer as Resoluções exigiram a presença de advogado,
salvo se houver processo de impugnação.
Exemplifica-se também a inadequada previsão de Resolução quanto ao burocra
tismo incrustado na exigência de apresentação obrigatória de comprovação de avaliação
dos preços de bens ou serviços prestados quando ingressarem como receitas estimáveis
em dinheiro. Tais documentos até poderiam ser exigíveis em eventual fase instrutória
caso soasse inconsistente o conjunto declarado, porém sua apresentação desde o início
parece exorbitar o sentido legal, tornando ainda mais penosa e difícil a tarefa de se
candidatar a cargo eletivo. Tem-se como desarrazoada, inclusive, que a prestação de
contas simplificada tenha que apresentar este tipo de documento, de forma imediata
e obrigatória.
42
SCARPINO JR., Luiz Eugenio. Moralidade Eleitoral e Juristocracia: análise crítica da Lei da Ficha Limpa
(Lei Complementar nº 135/10), Lumen Juris, Rio de Janeiro, 2016.
Referências
ATALIBA, Geraldo. Decreto Regulamentar no sistema brasileiro. Revista de Direito Administrativo, Rio de
Janeiro, 97: 21-33, julho/setembro de 1969.
ÁVILA, Humberto (org.). Fundamentos do Estado de Direito: Estudos em homenagem ao professor Almiro do
Couto e Silva. Malheiros: 2005.
BURGARELLI, Rodrigo. Campanhas gastaram R$ 5 bilhões em 2014, O Estado de S. Paulo, 1.12.2014. Disponível
em: <http://politica.estadao.com.br/noticias/geral,campanhas-gastaram-r-5-bilhoes-em-2014-imp-,1600362>.
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CANOTILHO, José Joaquim Gomes. Direito Constitucional e Teoria da Constituição. Coimbra, Almedina: 2009.
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ROGER FISCHER
necessários para que, a final, ocorra o sufrágio, ou seja, engloba desde as normas da
convenção partidária, registro e propaganda até a diplomação dos eleitos. Por outro
lado, o direito processual eleitoral se relaciona às ações eleitorais.
A tal respeito, Rodrigo López Zilio1 conceitua o processo eleitoral como
1
ZILIO, Rodrigo López. Direito Eleitoral. 5. ed. Porto Alegre: Verbo Jurídico Editora, 2016, p.289.
2
RAMAYANA, Marcos. Direito Eleitoral. 11. ed. Rio de Janeiro: Impetus, 2010. p. 22.
3
SALGADO, Eneida Desiree. Princípios Constitucionais Eleitorais. Belo Horizonte: Fórum, p. 177.
4
SALGADO, Eneida Desiree. Op. cit., p. 211.
5
ZILIO, Rodrigo López. Op. cit., p. 469.
6
“A possibilidade de doações e contribuições por pessoas jurídicas a partidos políticos e campanhas eleitorais,
que seriam regulamentadas por esses dispositivos, confrontaria a igualdade política e os princípios republicano
e democrático, como decidiu o Supremo Tribunal Federal”. Disponível em: <http://www.planalto.gov.br/
ccivil_03/_ato2015-2018/2015/Msg/VEP-358.htm>. Acesso em: 23 maio 2016.
7
“DIREITO CONSTITUCIONAL E ELEITORAL. MODELO NORMATIVO VIGENTE DE FINANCIAMENTO
DE CAMPANHAS ELEITORAIS. LEI DAS ELEIÇÕES, ARTS. 23, §1º, INCISOS I e II, 24 E 81, CAPUT E §1º. LEI
ORGÂNICA DOS PARTIDOS POLÍTICOS, ARTS. 31, 38, INCISO III, E 39, CAPUT E §5º. CRITÉRIOS DE DOAÇÕES
PARA PESSOAS JURÍDICAS E NATURAIS E PARA O USO DE RECURSOS PRÓPRIOS PELOS CANDIDATOS.
PRELIMINARES. (...). MÉRITO. OFENSA AOS PRINCÍPIOS FUNDAMENTAIS DEMOCRÁTICOS E
DA IGUALDADE POLÍTICA. CUMULAÇÃO DE PEDIDOS DE ADI E DE ADI POR OMISSÃO EM UMA
ÚNICA DEMANDA DE CONTROLE CONCENTRADO DE CONSTITUCIONALIDADE. VIABILIDADE
PROCESSUAL. PREMISSAS TEÓRICAS. POSTURA PARTICULARISTA E EXPANSIVA DA SUPREMA
CORTE NA SALVAGUARDA DOS PRESSUPOSTOS DEMOCRÁTICOS. SENSIBILIDADE DA MATÉRIA,
AFETA QUE É AO PROCESSO POLÍTICO-ELEITORAL. AUTOINTERESSE DOS AGENTES POLÍTICOS.
AUSÊNCIA DE MODELO CONSTITUCIONAL CERRADO DE FINANCIAMENTO DE CAMPANHAS.
CONSTITUIÇÃO-MOLDURA. NORMAS FUNDAMENTAIS LIMITADORAS DA DISCRICIONARIEDADE
LEGISLATIVA. PRONUNCIAMENTO DO SUPREMO TRIBUNAL FEDERAL QUE NÃO ENCERRA O
DEBATE CONSTITUCIONAL EM SENTIDO AMPLO. DIÁLOGOS INSTITUCIONAIS. ÚLTIMA PALAVRA
PROVISÓRIA. MÉRITO. DOAÇÃO POR PESSOAS JURÍDICAS. INCONSTITUCIONALIDADE DOS LIMITES
PREVISTOS NA LEGISLAÇÃO (2% DO FATURAMENTO BRUTO DO ANO ANTERIOR À ELEIÇÃO).
VIOLAÇÃO AOS PRINCÍPIOS DEMOCRÁTICOS E DA IGUALDADE POLÍTICA. CAPTURA DO PROCESSO
POLÍTICO PELO PODER ECONÔMICO. “PLUTOCRATIZAÇÃO” DO PRÉLIO ELEITORAL. LIMITES
DE DOAÇÃO POR NATURAIS E USO DE RECURSOS PRÓPRIOS PELOS CANDIDATOS. COMPATIBILI
DADE MATERIAL COM OS CÂNONES DEMOCRÁTICO, REPUBLICANO E DA IGUALDADE POLÍ
TICA. AÇÃO DIRETA DE INCONSTITUCIONALIDADE JULGADA PARCIALMENTE PROCEDENTE. (...).
19. Ação direta de inconstitucionalidade julgada parcialmente procedente para assentar apenas e tão somente
a inconstitucionalidade parcial sem redução de texto do art. 31 da Lei nº 9.096/95, na parte em que autoriza,
a contrario sensu, a realização de doações por pessoas jurídicas a partidos políticos, e pela declaração de
inconstitucionalidade das expressões “ou pessoa jurídica”, constante no art. 38, inciso III, e “ e jurídicas”, inserta
no art. 39, caput e §5º, todos os preceitos da Lei nº 9.096/95”. (DISTRITO FEDERAL. Supremo Tribunal Federal.
Ação Direta de Inconstitucionalidade 4.650. Relator Ministro Luiz Fux. Brasília, 17.9.2015).
8
De 2011 a 2014 entre R$ 300.000.000,00 e R$ 400.000.000,00, sendo que em 2015 e em 2016 o valor foi superior
a R$ 800.000.000,00, com redução no ano de 2017, que não atingiu a cifra de R$ 700.000,00, consoante consulta
disponível em: <http://www.tse.jus.br/partidos/fundo-partidario>. Acesso em: 4 jan. 2018.
Art. 30. A Justiça Eleitoral verificará a regularidade das contas de campanha, decidindo:
I – pela aprovação, quando estiverem regulares;
II – pela aprovação com ressalvas, quando verificadas falhas que não lhes comprometam
a regularidade;
III – pela desaprovação, quando verificadas falhas que lhes comprometam a regularidade;
9
§9º A Justiça Eleitoral adotará sistema simplificado de prestação de contas para candidatos que apresentarem
movimentação financeira correspondente a, no máximo, R$ 20.000,00 (vinte mil reais), atualizados
monetariamente, a cada eleição, pelo Índice Nacional de Preços ao Consumidor – INPC da Fundação Instituto
Brasileiro de Geografia e Estatística – IBGE ou por índice que o substituir.
§10. O sistema simplificado referido no §9o deverá conter, pelo menos:
I – identificação das doações recebidas, com os nomes, o CPF ou CNPJ dos doadores e os respectivos valores
recebidos;
II – identificação das despesas realizadas, com os nomes e o CPF ou CNPJ dos fornecedores de material e dos
prestadores dos serviços realizados;
III – registro das eventuais sobras ou dívidas de campanha.
§11. Nas eleições para Prefeito e Vereador de Municípios com menos de cinquenta mil eleitores, a prestação de
contas será feita sempre pelo sistema simplificado a que se referem os §§9º e 10.
IV – pela não prestação, quando não apresentadas as contas após a notificação emitida
pela Justiça Eleitoral, na qual constará a obrigação expressa de prestar as suas contas, no
prazo de setenta e duas horas.
10
ZILIO, Rodrigo López. Op. cit., p. 482.
11
ALMEIDA NETO, Manoel Carlos de. Direito Eleitoral Regulador. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2014. p. 114.
12
MACEDO, Elaine Harzheim; SOARES, Rafael Morgental. A Criação do Direito pela Justiça Eleitoral: um estudo
sobre o seu poder normativo. In: MACEDO, Elaine Harzheim; FREITAS, Juliana Rodrigues. (Org.). Jurisdição
Eleitoral e Direitos Políticos Fundamentais. Rio de Janeiro: Forense; São Paulo: Método; Belém, Cesupa, 2015. p. 61.
até o dia 5 de março do ano da eleição, o Tribunal Superior Eleitoral, atendendo ao caráter
regulamentar e sem restringir direitos ou estabelecer sanções distintas das previstas nesta
Lei, poderá expedir todas as instruções necessárias, para sua fiel execução, ouvidos,
previamente, em audiência pública, os delegados ou representantes dos partidos políticos.
Comentando a limitação imposta pelo legislador, Gustavo Bohrer Paim14 diz que
(...) as Resoluções expedidas pelo TSE ostentam força de lei. Note-se, porém, que ter
força de lei não é o mesmo que ser lei! O ter força, aí, significa gozar do mesmo prestígio,
deter a mesma eficácia geral e abstrata atribuídas às leis. Mas estas são hierarquicamente
superiores às resoluções pretorianas. Impera no sistema pátrio o princípio da legalidade
(CF, art. 5º, II), pelo que ninguém é obrigado a fazer ou deixar de fazer alguma coisa
senão em virtude de lei.
13
“Art. 22. Compete privativamente à União legislar sobre:
I – direito civil, comercial, penal, processual, eleitoral, agrário, marítimo, aeronáutico, espacial e do trabalho;
(...)”.
14
PAIM, Gustavo Bohrer. Direito eleitoral e segurança jurídica. Porto Alegre: Livraria do Advogado, 2016. p. 84.
15
GOMES, José Jairo. Direito Eleitoral. 8. ed. São Paulo: Atlas, 2012. p. 68.
16
SALGADO, Eneida Desiree. Op. cit., p. 222.
17
Art. 5º, II: ninguém será obrigado a fazer ou deixar de fazer alguma coisa senão em virtude de lei.
18
PAIM, Gustavo Bohrer. Op. cit., p. 83.
as resoluções eleitorais são atos normativos dos tribunais que objetivam tornar factível a
aplicação da legislação, interpretar e disciplinar matéria, no âmbito do Direito Eleitoral,
visando ao aprimoramento do processo eletivo (parágrafo único, art. 1º, e art. 23, IX,
CE). Devem manter harmonia com a lei e com a Constituição. Não lhes cabe usurpar a
competência do legislador, a quem compete produzir a lei reguladora do processo eleitoral.
O princípio do devido processo legal entra agora no Direito Constitucional positivo com
um enunciado que vem da Carta Magna inglesa: ninguém será privado da liberdade
ou de seus bens sem o devido processo legal (art. 5º, LIV). Combinado com o direito
de acesso à Justiça (art. 5º XXXV) e o contraditório e a plenitude de defesa (art. 5º, LV),
fecha-se o ciclo das garantias processuais. Garante-se o processo e, “quando se fala em
‘processo’, e não em simples procedimento, alude-se, sem dúvida, a formas instrumentais
adequadas, a fim de que a prestação jurisdicional, quando entregue pelo Estado, dê a cada
19
PINTO, Djalma. Direito Eleitoral: improbidade administrativa e responsabilidade fiscal – noções gerais. 4. ed.
São Paulo: Atlas, 2008. p. 22.
20
MORAES, Alexandre de. Direito Constitucional. 18 ed. São Paulo: Atlas, 2005. p. 36-37.
21
GOMES, José Jairo. Op. cit., p. 465.
22
SILVA, José Afonso da. Curso de Direito Constitucional Positivo. 19. ed. São Paulo: Malheiros, 2001. p. 434-435.
23
A lei que alterar o processo eleitoral entrará em vigor na data de sua publicação, não se aplicando à eleição que
ocorra até um ano da data de sua vigência.
24
ZILIO, Rodrigo López. Op. cit., p.39.
25
COSTA, Tailaine Cristina. Justiça Eleitoral e sua competência normativa. Paraná Eleitoral, n. 1, v. 2, 2013. p. 107.
26
“LEI COMPLEMENTAR Nº 135/2010, DENOMINADA LEI DA FICHA LIMPA. INAPLICABILIDADE ÀS
ELEIÇÕES GERAIS 2010. PRINCÍPIO DA ANTERIORIDADE ELEITORAL (ART. 16 DA CONSTITUIÇÃO DA
REPÚBLICA).
I. O PRINCÍPIO DA ANTERIORIDADE ELEITORAL COMO GARANTIA DO DEVIDO PROCESSO LEGAL
ELEITORAL. O pleno exercício de direitos políticos por seus titulares (eleitores, candidatos e partidos) é
assegurado pela Constituição por meio de um sistema de normas que conformam o que se poderia denominar
de devido processo legal eleitoral. Na medida em que estabelecem as garantias fundamentais para a efetividade
dos direitos políticos, essas regras também compõem o rol das normas denominadas cláusulas pétreas e, por
isso, estão imunes a qualquer reforma que vise a aboli-las. O art. 16 da Constituição, ao submeter a alteração
legal do processo eleitoral à regra da anualidade, constitui uma garantia fundamental para o pleno exercício
de direitos políticos. Precedente: ADI 3.685, Rel. Min. Ellen Gracie, julg. em 22.3.2006. A LC 135/2010 interferiu
numa fase específica do processo eleitoral, qualificada na jurisprudência como a fase pré-eleitoral, que se inicia
com a escolha e a apresentação das candidaturas pelos partidos políticos e vai até o registro das candidaturas
na Justiça Eleitoral. Essa fase não pode ser delimitada temporalmente entre os dias 10 e 30 de junho, no qual
ocorrem as convenções partidárias, pois o processo político de escolha de candidaturas é muito mais complexo
Contudo, é verdade que tanto o TSE como o STF são claudicantes no que diz
com a aplicabilidade do art. 16 da CF, considerando que “o dispositivo constitucional
determina a não aplicação, para a eleição que ocorra a menos de um ano da entrada em
vigor, de lei que altere o processo eleitoral”, sendo que a expressão “processo eleitoral”
acabou sendo analisada de diferentes formas ao longo das últimas alterações legislativas,
o que, ao fim e ao cabo, enseja claramente insegurança jurídica.27
e tem início com a própria filiação partidária do candidato, em outubro do ano anterior. A fase pré-eleitoral
de que trata a jurisprudência desta Corte não coincide com as datas de realização das convenções partidárias.
Ela começa muito antes, com a própria filiação partidária e a fixação de domicílio eleitoral dos candidatos, assim
como o registro dos partidos no Tribunal Superior Eleitoral. A competição eleitoral se inicia exatamente um
ano antes da data das eleições e, nesse interregno, o art. 16 da Constituição exige que qualquer modificação nas
regras do jogo não terá eficácia imediata para o pleito em curso.
II. O PRINCÍPIO DA ANTERIORIDADE ELEITORAL COMO GARANTIA CONSTITUCIONAL DA IGUAL
DADE DE CHANCES. Toda limitação legal ao direito de sufrágio passivo, isto é, qualquer restrição legal à
elegibilidade do cidadão constitui uma limitação da igualdade de oportunidades na competição eleitoral. Não
há como conceber causa de inelegibilidade que não restrinja a liberdade de acesso aos cargos públicos, por
parte dos candidatos, assim como a liberdade para escolher e apresentar candidaturas por parte dos partidos
políticos. E um dos fundamentos teleológicos do art. 16 da Constituição é impedir alterações no sistema eleitoral
que venham a atingir a igualdade de participação no prélio eleitoral.
III. O PRINCÍPIO DA ANTERIORIDADE ELEITORAL COMO GARANTIA CONSTITUCIONAL DAS
MINORIAS E O PAPEL DA JURISDIÇÃO CONSTITUCIONAL NA DEMOCRACIA. O princípio da
anterioridade eleitoral constitui uma garantia fundamental também destinada a assegurar o próprio exercício
do direito de minoria parlamentar em situações nas quais, por razões de conveniência da maioria, o Poder
Legislativo pretenda modificar, a qualquer tempo, as regras e critérios que regerão o processo eleitoral.
A aplicação do princípio da anterioridade não depende de considerações sobre a moralidade da legislação.
O art. 16 é uma barreira objetiva contra abusos e desvios da maioria, e dessa forma deve ser aplicado por
esta Corte. A proteção das minorias parlamentares exige reflexão acerca do papel da Jurisdição Constitucional
nessa tarefa. A Jurisdição Constitucional cumpre a sua função quando aplica rigorosamente, sem subterfúgios
calcados em considerações subjetivas de moralidade, o princípio da anterioridade eleitoral previsto no art. 16
da Constituição, pois essa norma constitui uma garantia da minoria, portanto, uma barreira contra a atuação
sempre ameaçadora da maioria.
IV. RECURSO EXTRAORDINÁRIO CONHECIDO E PROVIDO. Recurso extraordinário conhecido para:
a) reconhecer a repercussão geral da questão constitucional atinente à aplicabilidade da LC 135/2010 às eleições
de 2010, em face do princípio da anterioridade eleitoral (art. 16 da Constituição), de modo a permitir aos
Tribunais e Turmas Recursais do país a adoção dos procedimentos relacionados ao exercício de retratação ou
declaração de inadmissibilidade dos recursos repetitivos, sempre que as decisões recorridas contrariarem ou
se pautarem pela orientação ora firmada. b) dar provimento ao recurso, fixando a não aplicabilidade da Lei
Complementar n° 135/2010 às eleições gerais de 2010”. (DISTRITO FEDERAL. Supremo Tribunal Federal. RE
633.703. Relator Ministro. Gilmar Mendes. Brasília, 23.3.2011).
27
PAIM, Gustavo Bohrer. Op. cit. p.60.
qual concorreu”. Isso, evidentemente, impedia aquele candidato que porventura tivesse
suas contas rejeitadas de novamente concorrer ao pleito seguinte, considerando que
para tanto necessário se faria – e se faz – a comprovação da quitação eleitoral.
Ocorre que o legislador, não satisfeito com a limitação imposta pela Resolução
do TSE, editou a Lei nº 12.034/2009, que incluiu o §7º ao art. 11 da Lei nº 9.504/97, com
a seguinte redação:
Afere-se, portanto, que, para obter a certidão de quitação eleitoral, passou a ser
necessário apenas e tão somente a mera apresentação de contas de campanha, desim
portando o resultado da sua análise – aprovação, aprovação parcial ou desaprovação –
pela Justiça Eleitoral.
Contudo, para as eleições de 2010, novamente o TSE editou Resolução –
23.221/2010 – em que afirmava, em seu art. 26, §4º, que
a quitação eleitoral de que trata o §1º deste artigo abrangerá exclusivamente a plenitude
do gozo dos direitos políticos, o regular exercício do voto, o atendimento a convocações
da Justiça Eleitoral para auxiliar os trabalhos relativos ao pleito, a inexistência de multas
aplicadas, em caráter definitivo, pela Justiça Eleitoral e não remitidas, e a apresentação
regular de contas de campanha eleitoral (Lei nº 9.504/97, art. 11, §7º).(grifou-se).
28
DISTRITO FEDERAL. Tribunal Superior Eleitoral. Processo Administrativo 59.459. Rel. Min. Arnaldo Versiani,
Rel. Designado Min. Ricardo Lewandowski. Brasília, 23.9.2010.
29
DISTRITO FEDERAL. Tribunal Superior Eleitoral. RESpe 82.052 – Porto Velho/RO. Rel. Min. Marco Aurélio
Mello, Rel Designado Min. Aldir Guimarães. Brasília, 14.10.2010.
Art. 27. §1º Os recursos de fontes vedadas deverão ser transferidos ao Tesouro Nacional,
por meio de Guia de Recolhimento da União (GRU), pelo partido político, pelo comitê
financeiro ou pelo candidato até 5 dias após a decisão definitiva que julgar a prestação
de contas de campanha, com a apresentação do respectivo comprovante de recolhimento
dentro desse mesmo prazo.
(...)
Art. 52. A decisão que julgar as contas dos candidatos eleitos será publicada até 8 dias
antes da diplomação (Lei nº 9.504/97, art. 30, §1º). Parágrafo único. Na hipótese de gastos
irregulares de recursos do Fundo Partidário ou da ausência de sua comprovação, a decisão
que julgar as contas determinará a devolução do valor correspondente ao Tesouro Nacional
no prazo de 5 dias após o seu trânsito em julgado.
Art. 29. Os recursos de origem não identificada não poderão ser utilizados pelos candidatos,
partidos políticos e comitês financeiros e deverão ser transferidos ao Tesouro Nacional, por
meio de Guia de Recolhimento da União (GRU), tão logo seja constatada a impossibilidade
de identificação, observando-se o prazo de até 5 dias após o trânsito em julgado da decisão
que julgar as contas de campanha.
Art. 25. É vedado a partido político e a candidato receber, direta ou indiretamente, doação
em dinheiro ou estimável em dinheiro, inclusive por meio de publicidade de qualquer
espécie, procedente de: I – pessoas jurídicas; II – origem estrangeira; III – pessoa física
que exerça atividade comercial decorrente de concessão ou permissão pública. §1º O
recurso recebido por candidato ou partido oriundo de fontes vedadas deve ser imediata
mente devolvido ao doador, sendo vedada sua utilização ou aplicação financeira. §2º
O comprovante de devolução pode ser apresentado em qualquer fase da prestação de
contas ou até cinco dias após o trânsito em julgado da decisão que julgar as contas. §3º A
transferência de recurso recebido de fonte vedada para outro órgão partidário ou candidato
não isenta o donatário da obrigação prevista no §1º. §4º O beneficiário de transferência cuja
origem seja considerada fonte vedada pela Justiça Eleitoral responde solidariamente pela
irregularidade e as consequências serão aferidas por ocasião do julgamento das respectivas
contas. §5º A devolução ou a determinação de devolução de recursos recebidos de fonte
vedada não impedem, se for o caso, a reprovação das contas, quando constatado que
o candidato se beneficiou, ainda que temporariamente, dos recursos ilícitos recebidos,
assim como a apuração do fato na forma do art. 30-A da Lei nº 9.504/1997, do art. 22 da
Lei Complementar nº 64/1990 e do art. 14, §10, da Constituição da República.
(...)
Art. 72. A aprovação com ressalvas da prestação de contas não obsta que seja determinada
a devolução dos recursos recebidos de fonte vedada ou a sua transferência para a conta
única do Tesouro Nacional, assim como dos recursos de origem não identificada, na forma
prevista nos arts. 25 e 26.
Art. 33. É vedado a partido político e a candidato receber, direta ou indiretamente, doação
em dinheiro ou estimável em dinheiro, inclusive por meio de publicidade de qualquer
espécie, procedente de:
I – pessoas jurídicas;
II – origem estrangeira.
III – pessoa física que exerça atividade comercial decorrente de permissão pública.
§1º A vedação prevista no inciso III não alcança a aplicação de recursos próprios do candi
dato em sua campanha.
§2º O recurso recebido por candidato ou partido oriundo de fontes vedadas deve ser
imediatamente devolvido ao doador, sendo vedada sua utilização ou aplicação financeira.
§3º Na impossibilidade de devolução dos recursos ao doador, o prestador de contas deve
providenciar imediatamente a transferência dos recursos recebidos ao Tesouro Nacional,
por meio de Guia de Recolhimento da União (GRU).
§4º Incidirão atualização monetária e juros moratórios, calculados com base na taxa
aplicável aos créditos da Fazenda Pública, sobre os valores a serem recolhidos ao Tesouro
Nacional, desde a data da ocorrência do fato gerador até a do efetivo recolhimento, salvo
se tiver sido determinado de forma diversa na decisão judicial.
§5º O disposto no §4º não se aplica quando o candidato ou o partido promove espontânea e
imediatamente a transferência dos recursos para o Tesouro Nacional, sem deles se utilizar.
§6º A transferência de recurso recebido de fonte vedada para outro órgão partidário ou
candidato não isenta o donatário da obrigação prevista no §2º.
§7º O beneficiário de transferência cuja origem seja considerada fonte vedada pela Justiça
Eleitoral responde solidariamente pela irregularidade, e as consequências serão aferidas
por ocasião do julgamento das respectivas contas.
§8º A devolução ou a determinação de devolução de recursos recebidos de fonte vedada
não impedem, se for o caso, a reprovação das contas, quando constatado que o candidato
se beneficiou, ainda que temporariamente, dos recursos ilícitos recebidos, assim como a
apuração do fato na forma do art. 30-A da Lei nº 9.504/1997, do art. 22 da Lei Complementar
nº 64/1990 e do art. 14, §10, da Constituição da República.
§9º O comprovante de devolução ou de recolhimento, conforme o caso, poderá ser
apresentado em qualquer fase da prestação de contas ou até cinco dias após o trânsito
em julgado da decisão que julgar as contas de campanha, sob pena de encaminhamento
das informações à representação estadual ou municipal da Advocacia-Geral da União
para fins de cobrança.
Art. 34. Os recursos de origem não identificada não podem ser utilizados por partidos
políticos e candidatos e devem ser transferidos ao Tesouro Nacional por meio de Guia
de Recolhimento da União (GRU).
§1º Caracterizam o recurso como de origem não identificada:
I – a falta ou a identificação incorreta do doador; e/ou
II – a falta de identificação do doador originário nas doações financeiras recebidas
de outros candidatos ou partidos políticos; e/ou
III – a informação de número de inscrição inválida no CPF do doador pessoa física ou no
CNPJ quando o doador for candidato ou partido político.
§2º O comprovante de devolução ou de recolhimento, conforme o caso, poderá ser apresen-
tado em qualquer fase da prestação de contas ou até cinco dias após o trânsito em julgado da
decisão que julgar as contas de campanha, sob pena de encaminhamento das informações à
representação estadual ou municipal da Advocacia-Geral da União para fins de cobrança.
§3º Incidirão atualização monetária e juros moratórios, calculados com base na taxa
aplicável aos créditos da Fazenda Pública, sobre os valores a serem recolhidos ao Tesouro
Nacional, desde a data da ocorrência do fato gerador até a do efetivo recolhimento, salvo
se tiver sido determinado de forma diversa na decisão judicial.
§4º O disposto no §3º não se aplica quando o candidato ou o partido promove espontânea e
imediatamente a transferência dos recursos para o Tesouro Nacional, sem deles se utilizar.
§5º O candidato ou o partido pode retificar a doação, registrando-a no SPCE, ou devolvê-
la ao doador quando a não identificação deste decorra do erro de identificação de que
trata o inciso III do §1º e haja elementos suficientes para identificar a origem da doação.
§6º Não sendo possível a retificação ou a devolução de que trata o §5º, o valor deverá ser
imediatamente recolhido ao Tesouro Nacional.
(...)
Art. 82. A aprovação com ressalvas da prestação de contas não obsta que seja determinada
a devolução dos recursos recebidos de fonte vedada ou a sua transferência para a conta
única do Tesouro Nacional, assim como dos recursos de origem não identificada, na forma
prevista nos arts. 33 e 34 desta Resolução.
§1º Verificada a ausência de comprovação da utilização dos recursos do Fundo Partidário
e/ou do Fundo Especial de Financiamento de Campanha (FEFC) ou a sua utilização inde
vida, a decisão que julgar as contas determinará a devolução do valor correspondente
ao Tesouro Nacional no prazo de 5 (cinco) dias após o trânsito em julgado, sob pena
de remessa de cópia digitalizada dos autos à representação estadual ou municipal da
Advocacia-Geral da União para fins de cobrança.
§2º Na hipótese do §1º, incidirão juros moratórios e atualização monetária, calculados com
base na taxa aplicável aos créditos da Fazenda Pública, sobre os valores a ser recolhidos ao
Tesouro Nacional, desde a data da ocorrência do fato gerador até a do efetivo recolhimento,
salvo se tiver sido determinado de forma diversa na decisão judicial.
30
O partido ou candidato que receber recursos provenientes de fontes vedadas ou de origem não identificada
deverá proceder à devolução dos valores recebidos ou, não sendo possível a identificação da fonte, transferi-los
para a conta única do Tesouro Nacional.
poderia ser considerado, mormente porque tal disciplina não diz com a prestação de
contas. Diz-se isso porque a prestação de contas prevista pela Lei das Eleições, embora
procedimento cuja natureza jurisdicional é reconhecida, não possui espaço hábil, com
contraditório e ampla defesa, para se estabelecer juízo condenatório, até porque não existe
qualquer previsão legislativa formal em tal sentido. Em verdade a eficácia da prestação
de contas se volta a proclamar julgamentos nos precisos termos do art. 30 e seus incisos
I a IV, da Lei nº 9.504/97. Tal desiderato – condenação a pagar – há de ser apurado, se
for o caso, em processo próprio, nos precisos termos do art. 30-A da Lei nº 9.504/97.
Mesmo que se admita que a redação do art. 24, §4º, da Lei das Eleições, passou a
estabelecer a possibilidade de condenações, inegável que tal disciplina em nada altera
o que se estatui no presente estudo no sentido de que, para tanto, o procedimento da
prestação de contas não se presta. Aquelas condenações provenientes de prestações de
contas anteriores à minirreforma não se sustentavam por ausência de previsão legal
de constituição de título executivo judicial e porque descabido o procedimento eleito;
as impostas em relação às eleições de 2016, base na Lei nº 13.165/2015, que superou
um dos pressupostos negativos – a ausência de previsão legislativa de constituição do
título executivo judicial –, e mesmo as eventualmente decorrentes das eleições de 2018,
se veiculadas em sede de prestação de contas, da mesma forma não poderão subsistir
porque permanecerá a inadequação da via eleita, consoante alhures comentado.
Há falar, outrossim, que nos casos em que ocorrer lacuna da lei – que prevê
procedimento próprio e respectivas sanções para casos em que ocorra irregularidades
detectadas na prestação de contas –, não há como utilizar-se de atos que se limitam a
regulamentar – e não a criar direito com força normativa -, considerando que a hipótese
fática é expressamente tratada na lei de regência. Um exemplo a respeito da possibilidade
do regramento emanado do TSE ser viável é o caso pertinente aos limites de gastos antes
mencionados: a legislação de regência, assim entendida formalmente, conferiu ao TSE
tal poder, e este o exerceu a partir da edição da Resolução nº 23.459 para as Eleições
de 2016 e, agora, com a edição da Resolução que trata dos limites para os respectivos
cargos para as Eleições de 2018.
As Resoluções mencionadas no preâmbulo do presente tópico, portanto,
extrapolam o direito regulamentador conferido à Justiça Eleitoral, em verdadeira
“criação de Direito”, vênia de entendimentos diversos, ofendendo o princípio da
legalidade antes consignado, assim como não observam o princípio do devido processo
legal, tanto no âmbito do Direito Processual Eleitoral, porquanto o procedimento
previsto para a prestação de contas não se traduz em espaço hábil com contraditório
e ampla defesa, como também no próprio Processo Eleitoral, na medida em que não
obedecida à anterioridade exigida pela lei.
A tal respeito importante trazer entendimento sufragado pelo Ministério Público
Eleitoral junto ao egrégio TSE em diversos pareceres exarados por ocasião do exame
de prestações de contas relativas às eleições de 2014. Nesse sentido, por exemplo no
RESpe 149.163 – Porto Alegre/RS, ao analisar a Resolução nº 23.504/2014, afirmou o
então Vice-Procurador-Geral Eleitoral:
(...)
Conclui-se que a Resolução dispõe que o candidato que não identificar a origem de valor
que arrecadou na campanha deve recolher o respectivo montante ao Tesouro Nacional,
sob pena de sofrer execução fiscal.
Trata-se de direito novo ou de mera regra que explicita o modo de se cumprir a obrigação
de prestar contas já fixadas na Lei das Eleições? Como se viu, o que inviabiliza a norma
regulamentar, isso é, o que determina o seu caráter invasivo da reserva legal, é a criação
de direito novo. Se está diante de mera regra que deriva de obrigações já existentes, não
há violação do princípio da legalidade.
Como saber se há direito novo, isto é, se houve ou não inovação da ordem jurídica? Pelo
exame da relação que se estabelece com o regramento regulamentar. No caso concreto,
não fica difícil essa avaliação. A União Federal, antes da Resolução, possuía direito a
essa receita que a Resolução lhe confere? Era sujeito ativo dessa obrigação? O candidato,
antes dessa norma, possuía essa obrigação? Ela implica um liame, um vínculo que pode
repercutir sobre a sua esfera jurídica, inclusive seu patrimônio? O não cumprimento dessa
obrigação confere, ao credor, o direito à execução forçada? Esse direito preexistia à edição
da norma regulamentar ou foi criado por ela?
Não fica difícil responder a esses questionamentos, na medida em que é evidente que a
Resolução TSE nº 23.406/2014, em seu art. 29, caput e §2º, estabelece uma relação jurídica
que não existia antes de sua criação. A União passa a ser sujeito ativo de um crédito
que nunca existiu e o candidato sujeita-se a uma obrigação que a lei não prevê. Trata-se
de uma relação jurídica criada em resolução, com sujeito ativo, sujeito passivo, vínculo
obrigacional de caráter patrimonial com força executiva (schuld e haftung), enfim, todos
os aspectos de uma obrigação nova.
Não obstante o evidente propósito moralizador da regra regulamentar em exame – pois
confere eficácia à norma que proíbe a arrecadação de recursos sem fonte identificada na
campanha eleitoral – parece evidente que o TSE violou a reserva legal no exercício de sua
função normativa, na medida em que criou direito novo, sem autorização prevista em lei.
31
DISTRITO FEDERAL. Supremo Tribunal Federal. AI nº 149.163/RS. Rel. Min. Gilmar Mendes. Brasília,
15.12.2015.
Com a devida vênia aos eminentes Ministros, resta indubitável que a Resolução
por eles utilizada para fundamentar a condenação – sim, porque quando se determina
o “recolhimento de recursos ao Tesouro Nacional” em sede de prestação de contas a
eficácia é condenatória – em nada diz com o simples poder regulamentador da Justiça
Eleitoral. Cuida-se, isso sim, da efetiva criação de direito novo, competência que
sabidamente não é atribuída ao Poder Judiciário, mas, sim e tão somente, ao Poder
Legislativo, salvo exceções pontuais em que se permite ao Poder Executivo a edição de
Medidas Provisórias, cuja manutenção no ordenamento jurídico prescinde de posterior
aprovação pelo Congresso Nacional.
Nesse sentido, repisa-se, por expressa determinação o legislador optou pela não
previsão de sanção ou condenação – ou mesmo de “devolução” como mencionado nas
Resoluções emanadas do colendo TSE – decorrente da não identificação de eventuais
valores em sede de prestação de contas de candidato, e tampouco há previsão na Lei
nº 13.165/2015. Não se pode, pois, admitir-se condenações da espécie, sendo que a
legislação, base no art. 30-A da Lei nº 9.504/97, prevê a possibilidade de discussão
acerca de eventual ilícito eleitoral, que poderá ensejar inclusive a não diplomação do
eleito, sempre se respeitando procedimento com espaço hábil para tanto, ou seja, aquele
previsto pelo art. 22 da LC nº 64/90.
Em suma, considerando que outrora a prestação de contas, base na lei, estabelecia
que a não aprovação conduziria a não concessão da certidão de quitação eleitoral, e
como consequência à inelegibilidade, o que não mais persiste em razão de alterações
realizadas pelo legislador, ao que parece a Justiça Eleitoral pretendeu criar uma nova
espécie de sanção, agora mesmo nos casos de aprovação com ressalvas das contas.32
Aliás, importante lembrar, porque se trata de situações corriqueiras, uma vez
ausente a penalidade tocante à não expedição de certidão de quitação eleitoral, as
Cortes – notadamente os Tribunais Regionais – passaram a ter um maior rigor no que
diz com a aprovação, mesmo com ressalvas, das contas: o que outrora era aprovado
com ressalvas, aplicando-se o princípio da proporcionalidade, agora não mais é
assim, sendo as contas desaprovadas. Assim, mesmo deixando-se de lado a previsão
de condenação erigida pelas Resoluções ora combatidas, as Cortes Eleitorais, com
o seu maior rigor, estabelecem verdadeiras condenações políticas, em que eventual
não conferência de valores equivalentes a percentuais ínfimos são suficientes para
caracterizar a desaprovação das contas.
32
Não raras vezes se aprova com ressalvas contas de candidatos, mas estabelecem-se condenações base nas
Resoluções.
1.4 Conclusão
Não se olvida que se pretende, ao fim e ao cabo, atingirem-se condutas que, em
princípio, não atendem aos princípios que norteiam o processo eleitoral, tal como men
cionado no preâmbulo e que podem, em última análise, configurar práticas delitivas
inclusiva na área penal.
Contudo, também é verdade que um Estado Democrático de Direito é assim
considerado com o respeito da ordem jurídica e legal constituída que, na espécie, não
impossibilita a identificação dos mencionados delitos. O que não pode ocorrer, por
33
RIO GRANDE DO SUL. Tribunal Regional Eleitoral. PC – Prestação de Contas nº 144489. Desembargadora
Relatora Liselena Schifino Robles Ribeiro. Porto Alegre, 16.02.2016.
34
SANTA CATARINA. Tribunal Regional Eleitora. PC – Prestação de Contas nº 1421812. Juíza Relatora Cláudia
Lambert de Faria. Chapecó; 01.12.2010.
35
Disponível em: <http://michaelis.uol.com.br/moderno/portugues/definicao/devolver%20_945286.html>. Acesso
em: 8 mar 2016.
ausência de previsão legal, são condenações com base em regramentos que não possuem
suporte para tanto, pelo menos no que diz com o procedimento utilizado.
A propósito a lição de Elaine Harzheim Macedo e Rafael Morgental36 é elucidativa,
ao asseverar que
A falta de coerência das decisões, sua baixa consistência, a fraca densidade argumentativa,
as decisões criativas, o aspecto fortemente moralista (com desprezo aos princípios mais
elementares do Estado de Direito) tem marcado a atividade jurisdicional da Justiça
Eleitoral brasileira.
Marcada por um senso perfeccionista que não encontra fundamentos jurídicos e pela
construção das regras do jogo a partir de derivações nem sempre demonstradas dos
princípios constitucionais, ao arrepio da lei, a jurisdição eleitoral tem servido como um
filtro à democracia brasileira. Um filtro não democrático.
36
MACEDO, Elaine Harzheim; SOARES, Rafael Morgental. Op. cit., p. 57.
37
SALGADO, Eneida Desiree. Jurisdição Eleitoral e Direitos Políticos Fundamentais. In: DIREITO ELEITORAL.
Debates Ibero-Americanos. Memórias do V Congresso Ibero-americano de Direito Eleitoral e do IV Congresso
de Ciência Política e Direito Eleitoral do Piauí. Curitiba: Íthala, 2014. p. 130.
Referências
ALMEIDA NETO, Manoel Carlos de. Direito Eleitoral Regulador. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2014.
COSTA, Tailaine Cristina. Justiça Eleitoral e sua competência normativa. Paraná Eleitoral, n. 1, v. 2, 2013, p.
99 a 114.
SILVA, José Afonso da. Curso de Direito Constitucional Positivo. 19 ed. São Paulo: Malheiros, 2001.
MORAES, Alexandre de. Direito Constitucional. 18 ed. São Paulo: Atlas, 2005.
GOMES, José Jairo. Direito Eleitoral. 8 ed. São Paulo: Atlas, 2012.
MACEDO, Elaine Harzheim; SOARES, Rafael Morgental. A Criação do Direito pela Justiça Eleitoral: um estudo
sobre o seu poder normativo. In: MACEDO, Elaine Harzheim; FREITAS, Juliana Rodrigues (Orgs.). Jurisdição
Eleitoral e Direitos Políticos Fundamentais. Rio de Janeiro: Forense; São Paulo: Método. Belém: Cesupa, 2015.
PAIM, Gustavo Bohrer. Direito eleitoral e segurança jurídica. Porto Alegre: Livraria do Advogado, 2016.
PINTO, Djalma. Direito Eleitoral: improbidade administrativa e responsabilidade fiscal – noções gerais.4 ed.
São Paulo: Atlas, 2008.
RAMAYANA, Marcos. Direito Eleitoral. 11. ed. Rio de Janeiro: Impetus, 2010.
SALGADO, Eneida Desiree. Jurisdição Eleitoral e Direitos Políticos Fundamentais. In:DIREITO ELEITORAL.
Debates Ibero-Americanos. Memórias do V Congresso Ibero-americano de Direito Eleitoral e do IV Congresso
de Ciência Política e Direito Eleitoral do Piauí. Curitiba: Íthala, 2014.
SALGADO, Eneida Desiree. Princípios Constitucionais Eleitorais. Belo Horizonte: Fórum, 2010.
ZILIO, Rodrigo López. Direito Eleitoral. 5 ed. Porto Alegre: Verbo Jurídico, 2016.
Informação bibliográfica deste texto, conforme a NBR 6023:2002 da Associação Brasileira de Normas
Técnicas (ABNT):
GARANTIAS PROCESSUAIS
NA PRESTAÇÃO DE CONTAS ELEITORAIS
DYOGO CROSARA
1
LIMA, Sídia Maria Porto. Prestação de contas e financiamento de campanhas eleitorais. Curitiba: Juruá, 2005.
2
VELLOSO, Carlos Mário da Silva. Elementos de Direito Eleitoral. Saraiva, 2009, 9. 229
3
“O tema foi tratado pioneiramente na Lei nº 4.740/1965, na qual chama a atenção o fato de não prever a
prestação de contas de candidatos, tão somente de partidos, pois todos os gastos se deviam processar por meio
das legendas. Igualmente, a análise das contas não era de responsabilidade da Justiça Eleitoral, e sim de comitês
interpartidários formados para essa finalidade. O papel dela era o de “assegurar a publicidade das informações
colhidas e analisadas por integrantes dos próprios partidos políticos participantes das eleições” (LIMA, 2005,
p. 93). A Lei nº 8.713/1993 foi a primeira a afirmar, em seu art. 35, que o candidato a cargo eletivo é o responsável
direto, ou por intermédio de pessoa por ele designada, pela administração financeira de sua campanha. Ao
tratar da prestação de contas, ela fixa no art. 37 que: “o candidato é o único responsável pela veracidade das
informações financeiras e contábeis de sua campanha (...)”, o que é reafirmado no art. 54, parágrafo único.
A determinação foi repetida nas leis que se seguiram (nº 9.100/1995, art. 35, §5º; e nº 9.504/1997, art. 21) e nas
resoluções do TSE; mas mereceu uma sutil alteração por meio da Lei nº 11.300/2006, que tornou o candidato
também solidariamente responsável com a pessoa por ele indicada para tal finalidade. A partir das eleições
de 2002, a prestação passou a ser obrigatoriamente elaborada por meio do Sistema de Prestação de Contas
Eleitorais (SPCE), o que simplificou o processo, pois, conforme Schlickmann (2010, p. 269), ele “já contempla
os requisitos de formalidade e organização da apresentação, emitindo todas as peças passíveis de emissão
eletrônica”. (BARRETO, Álvaro Augusto de Borba; GRAEFF, Caroline Bianca. Prestação de contas de campanha
eleitoral como requisito à Certidão de Quitação Eleitoral: polêmicas e desencontros no ordenamento jurídico
brasileiro. Revista de informação legislativa: RIL, v. 53, n. 211, p. 81-104, jul./set. 2016. Disponível em: <https://
www12.senado.leg.br/ril/edicoes/53/211>.)
Tal entendimento levou a vários julgados no sentido de que não seria sequer
possível a interposição de recursos em processo de prestação de contas, algo que
nas Eleições de 2008 era um entendimento pacificado no Tribunal Superior Eleitoral,
conforme se vê no julgado a ser ementado:
Apenas com a edição da Lei nº 12.034 de 2009 tornou-se evidente que as prestações
de contas têm caráter jurisdicional, o que foi expresso na inclusão dos parágrafos 5º a
7º ao art. 30 da lei das eleições4 e ao §6º no artigo 37 da lei dos partidos políticos, que
foi expresso ao prever que “o exame da prestação de contas dos órgãos partidários tem
caráter jurisdicional”.
Essas alterações legislativas, que se seguiram da alteração na jurisprudência
das Cortes eleitorais,5 foram importantes para se evidenciar o caráter jurisdicional
4
§5º Da decisão que julgar as contas prestadas pelos candidatos caberá recurso ao órgão superior da Justiça
Eleitoral, no prazo de 3 (três) dias, a contar da publicação no Diário Oficial.
§6º
No mesmo prazo previsto no §5º, caberá recurso especial para o Tribunal Superior Eleitoral, nas hipóteses
previstas nos incisos I e II do §4º do art. 121 da Constituição Federal.
§7º
O disposto neste artigo aplica-se aos processos judiciais pendentes.
5
EMBARGOS DE DECLARAÇÃO – PRESTAÇÃO DE CONTAS – ELEIÇÕES 2014 – NATUREZA JURISDI
CIONAL DO PROCEDIMENTO DE PRESTAÇÃO DE CONTAS – JULGAMENTO PELA DESAPROVAÇÃO
DAS CONTAS – JUNTADA DE DOCUMENTOS NOVOS APÓS O JULGAMENTO – PRETENSÃO DE
ATRIBUIÇÃO DE EFEITOS INFRINGENTES PARA MODIFICAÇÃO DA DECISÃO QUE DESAPROVOU AS
CONTAS – OMISSÃO E OBSCURIDADE INEXISTENTES – REJEIÇÃO. Na prestação de contas – que passou
a ter caráter jurisdicional com o advento da Lei nº 12.034/2009 -, deixando a parte de sanar as irregularidades
apontadas no prazo concedido para tanto, não é admissível a juntada de novos documentos em âmbito de
embargos de declaração. (TRE-SC – EMBARGOS DE DECLARACAO EM PROCESSO nº 124146, ACÓRDÃO
nº 30724 de 20.05.2015, Relator(a) FERNANDO VIEIRA LUIZ, Publicação: DJE – Diário de JE, Data 28.05.2015).
Art. 66. Emitido parecer técnico conclusivo pela existência de irregularidades e/ou
impropriedades sobre as quais não se tenha dado oportunidade específica de manifestação
ao prestador de contas, a Justiça Eleitoral o notificará para, querendo, manifestar-se no
prazo de setenta e duas horas contadas da notificação, vedada a juntada de documentos
que não se refiram especificamente à irregularidade e/ou impropriedade apontada.
De tal regra, vê-se que quando já existe um parecer do órgão técnico pela
aprovação das contas não se pode permitir a juntada de novos documentos sem nova
oitiva dos interessados, sendo essa uma garantia processual intransponível. Notemos que
após a emissão do parecer conclusivo sequer é possível a juntada de novos documentos,
conforme entendimento de nossas Cortes Eleitorais sobre o tema:
Apesar da suspeita de que não teriam os doadores citados capacidade econômica para
efetuar a doação e que, provavelmente, o recurso financeiro seria de outro doador ou
de uma fonte não identificada, esta não pode servir de justificativa para a desaprovação
das contas do candidato recorrente. Isso porque, como dito alhures, eventual excesso de
doação demanda apuração em ação própria, qual seja representação por doação acima
do limite e, em caso de fraude, restaria ao Ministério Público Eleitoral a deflagração da
competente ação criminal.
Quanto à informação prestada pelo Ministério Público Eleitoral, segundo a qual a Sra.
DIVINA GONÇALVES PEREIRA teria efetuado doação de dinheiro pertencente a
terceiro (seu marido), também não pode ser considerada para comprovar eventual burla
à legislação. Isso porque se trata de dado produzido unilateralmente, e havendo dúvida
quanto à ocorrência de possível irregularidade, essa deve ser resolvida em favor do
prestante, em consonância com o princípio do in dubio pro reo.
Não se está a dizer que a aprovação das contas exime o candidato prestador das respon
sabilidades decorrentes de falsificações, fraudes, “caixa 2” ou qualquer outra irregularidade
verificada e comprovada. Mas no bojo da prestação de contas essa análise não é pertinente.
Diante dessas considerações, para efeito de prestação de contas, afasto as irregularidades
dos itens h, i e j.
(…)
Mesmo entendimento deve ser adotado com relação ao gasto com o contabilista DONIZETE
VIEIRA DE SOUZA, item k, posto que como foi contratado para atuar na prestação de
contas, é desnecessária a contabilização desse gasto na prestação de contas. Quanto à
sua declaração para o órgão do Ministério Público Eleitoral de que não teria recebido
pelo serviço, como se trata de prova produzida unilateralmente, sobre a qual carece o
contraditório e ampla defesa, não tem força para gerar uma anotação de irregularidade na
Veja que nesse precedente a Corte Goiana entendeu que declarações unilaterais
tomadas pelo Ministério Público não podem ser aceitas, visto que tomadas sem o
contraditório. E mais: tais declarações, quando firmadas em sede de PPE – Procedimento
Preparatório Eleitoral, cuja legalidade é altamente discutível, não permite a ampla
defesa, o que também afasta a possibilidade de utilização da mesma durante a análise
das contas.
Tais entendimentos deixam claro que se aplicam todas as garantias processuais na
prestação de contas eleitorais, especialmente o contraditório e a ampla defesa. Todavia,
o rito atual do julgamento de contas não permite que se eternize a discussão, afastando
a possibilidade de réplicas ou tréplicas de alegações, como bem decidiu recentemente
o e. TRE/TO:
Importante anotar que chega a ser absurdo aprovar formalmente uma prestação
de contas quando se sabe que ela não representa a realidade da campanha. Porém, não
há, pelas regras atuais, como se decidir de forma distinta, especialmente porque hoje
temos a obrigação de que as contas sejam julgadas antes da diplomação dos eleitos.
Isso faz com a Justiça Eleitoral atue apenas numa análise formal das contas, o que é
altamente indesejado para a lisura do processo eleitoral. Aqui reside a necessidade de
reforma de tal procedimento, reforma esta que deve se dar na alteração da lei eleitoral
e não apenas através dos regulamentos expedidos pelo Tribunal Superior Eleitoral.
Não há motivo para se exigir o julgamento de contas de campanha antes da
diplomação. Se existem erros na prestação de contas, eles devem ser apurados em tal
seara, ficando a análise das contas suspensa até o julgamento da eventual AIJE que
discutir a matéria ou mesmo de uma melhor apuração da questão na própria prestação
de contas. Não se pode aprovar por aprovar, garantindo o cumprimento de um prazo,
mas deixando de garantir que os valores que norteiam o processo eleitoral, em especial,
da transparência e da legalidade, sejam descumpridos.
É necessário que se permita a protelação da análise das contas em casos onde
forem apresentados elementos que possam interferir no julgamento das mesmas.
Elas devem espelhar a realidade material do pleito e não apenas a análise formal de
relatórios e anexos. Assim, mostra-se razoável que se altere a norma legal para deter
minar a suspensão da análise da prestação de contas quando ocorrer a apresentação
de fatos ou documentos que possam representar ofensa ao art. 30-A da lei das eleições
ou mesmo ao abuso de poder econômico.
A análise de tais fatos poderia se dar tanto em sede de AIJE ou mesmo nos próprios
autos da prestação de contas, com a diferença de que, aqui, a decisão apenas poderia
gerar a sua rejeição, sem qualquer reflexo no diploma ou no mandato do eleito. Esse é
um claro exemplo de como poderíamos modificar o processo eleitoral, criando regras
claras para a prestação de contas e exigindo que de fato elas representem a verdade
material dos atos e não apenas uma mera formalidade sem importância.
anotações claras sobre quais diligências devem ser atendidas, fazendo com que os
interessados passem a buscar a juntada de novas informações que permitam ao Julgador
a compreensão correta da matéria.
Ressalte-se nesse ponto que a Resolução do TSE para as eleições de 2018 sana
tal questão, prevendo que “verificada a existência de falha, impropriedade ou irregu
laridade em relação à qual não se tenha dado ao prestador de contas prévia oportunidade
de manifestação ou complementação, a unidade ou o responsável pela análise técnica
deve notificá-lo” para nova manifestação.
Ao longo dos anos houve grande variação na jurisprudência das Cortes Superiores
sobre a possibilidade e a oportunidade de juntada de novos documentos em prestação
de contas. O c. TSE chegou a admitir para as eleições 2004 a juntada de documentos em
sede de embargos, algo que garantia aos candidatos e partidos uma possibilidade de
sanar equívocos verificados até mesmo no julgamento inicial da prestação de contas.
Nesse sentido:
6
No mesmo sentido: ELEIÇÕES 2014. AGRAVO REGIMENTAL MANEJADO EM 14.11.2016. AGRAVO NO
RECURSO ESPECIAL ELEITORAL. PRESTAÇÃO DE CONTAS DE CANDIDATO. DEPUTADO ESTADUAL.
PARTIDO DA MOBILIZAÇÃO NACIONAL (PMN). DESAPROVAÇÃO. NÃO COMPROVAÇÃO DA ORIGEM
DE RECURSOS FINANCEIROS PRÓPRIOS. IMPOSSIBILIDADE DE JUNTADA DE DOCUMENTOS EM SEDE
DE EMBARGOS DE DECLARAÇÃO. AUSÊNCIA DE COTEJO ANALÍTICO A DEMONSTRAR DISSÍDIO
JURISPRUDENCIAL. 1. Inadmitida, em processo de prestação de contas, a juntada de novos documentos com
os embargos de declaração quando a parte tenha sido anteriormente intimada a suprir a falha. Precedentes.
2. Oportunizado ao agravante se manifestar sobre as irregularidades apontadas pela unidade técnica, e quedando-
se inerte, alcançada pelo manto da preclusão a oportunidade de apresentar prestação de contas retificadora.
3. A mera transcrição de ementas de julgados não implica a demonstração do dissídio jurisprudencial. Agravo
regimental conhecido e não provido. (Agravo de Instrumento nº 162403, Acórdão, Relator(a) Min. ROSA
WEBER, Publicação: DJE – Diário de justiça eletrônico, Tomo 72, Data 11.04.2017, Página 38)
ELEIÇÕES 2014. AGRAVO REGIMENTAL. RECURSO ESPECIAL. AGR MANEJADO EM 13.5.16. PRESTAÇÃO
DE CONTAS. CANDIDATO. DEPUTADO ESTADUAL. PHS. DESAPROVAÇÃO. DOADOR ORIGINÁRIO.
Tal entendimento reforça a celeridade que a Justiça Eleitoral busca dar no jul
gamento das contas, açodada pela necessidade de análise das mesmas até a diplomação
dos eleitos (no caso, por óbvio, das contas de campanha). Como já dito alhures, não
há razão para ser assim. A prestação de contas deve buscar a verdade e, sendo esse o
objetivo não se pode querer apertar um calendário em busca do cumprimento de uma
meta formal. Isso atrapalha tanto a defesa dos candidatos quanto os órgãos de controle,
que não podem demonstrar ou mesmo são tolhidos pela marcha do tempo.
O entendimento adotado atualmente pelas Cortes Eleitorais precisa ser revisto,
especialmente, diante das novas regras do Código de Processo Civil de 2015, aplicadas
supletivas e suplementarmente ao processo eleitoral na forma do art. 15 do citado
diploma legal. O CPC/15 é expresso em seu artigo 435 ao prever que:
Art. 435. É lícito às partes, em qualquer tempo, juntar aos autos documentos novos, quando
destinados a fazer prova de fatos ocorridos depois dos articulados ou para contrapô-los
aos que foram produzidos nos autos.
Parágrafo único. Admite-se também a juntada posterior de documentos formados após
a petição inicial ou a contestação, bem como dos que se tornaram conhecidos, acessíveis
ou disponíveis após esses atos, cabendo à parte que os produzir comprovar o motivo que
a impediu de juntá-los anteriormente e incumbindo ao juiz, em qualquer caso, avaliar a
conduta da parte de acordo com o art. 5o.
Com a devida vênia, não vejo razão para desconsiderar o documento, pois sua juntada
extemporânea não implicou qualquer prejuízo à defesa do apelado. É certo que a sua
juntada se deu nas razões finais, após a realização da prova técnica e da audiência
instrutória. Todavia, em primeiro grau, o pedido foi julgado improcedente em face do
Município, e , nesta instância recursal, o ente público teve a oportunidade de se manifestar
sobre a documentação em contrarrazões, e sequer alegou eventual cerceamento de defesa.
Além disso, a regra do art. 397 do CPC/1973, vigente à época da sentença, vinha sendo
flexibilizada pelo STJ, que tem admitido a juntada de documentos após a contestação,
desde que não haja cerceamento de defesa:
2.5 Conclusão
Evidentemente, a fase de prestação de contas é uma das etapas do processo elei
toral que precisam de maior atenção dos legisladores. Muito se evoluiu com a definição
de que a prestação de contas tem caráter jurisdicional, bem como com a inclusão do
art. 30-A na lei das eleições.
Todavia, questões importantes, como a dispensabilidade de julgamento até a
diplomação e ainda a possibilidade de dilação probatória ou de suspensão da análise
em caso de suspeitas da prática de gastos ilícitos ou de arrecadação irregular, precisam
claramente ser disciplinadas. Na forma atual de nossa legislação não há espaço para
que a prestação de contas analise os aspectos materiais das contas e nem que sirva como
instrumento processual para a apuração de ilícitos eleitorais.
Se a prestação é contas e não de “faz de conta” é preciso abrir espaço para a análise
real dos dados fornecidos, comparando-os com aquilo foi visto nas campanhas, em
especial, doravante com a quantidade de recursos públicos que serão aplicados e com
um limite de despesas e receitas previsto antecipadamente. Está claro que a prestação
de contas é um processo, uma etapa do processo eleitoral, com todas as garantias
processuais aplicáveis aos demais feitos eleitorais. Assim, ela não pode ter atropelos e
nem uma pressa desnecessária, devendo servir como um real instrumento para a lisura
do pleito eleitoral.
7
Nesse sentido: ELEIÇÕES 2016. AGRAVO REGIMENTAL EM RECURSO ESPECIAL. INDEFERIMENTO
DE REGISTRO DE CANDIDATURA AO CARGO DE VEREADOR. AUSÊNCIA DE CONDIÇÃO DE
ELEGIBILIDADE. DESINCOMPATIBILIZAÇÃO. JUNTADA DE DOCUMENTO NOVO EM EMBARGOS
DECLARATÓRIOS. POSSIBILIDADE NAS INSTÂNCIAS ORDINÁRIAS. AGRAVO A QUE SE NEGA
PROVIMENTO.1. Admite-se, nos processos de Registro de Candidatura, a apresentação de documentos novos
em âmbito de Embargos Declaratórios nas vias ordinárias. 2. Na espécie, o TRE de Mato Grosso é o Tribunal
competente para a análise de documentos, pois soberano no exame dos fatos e provas. 3. Merece ser desprovido
o Agravo Interno, tendo em vista a inexistência de argumentos hábeis para modificar o decisum agravado.
4. Retorno dos autos ao Tribunal Regional, a fim de que se manifeste acerca dos documentos novos apresentados.
5. Agravo Regimental a que se nega provimento. (TSE – Recurso Especial Eleitoral nº 20911, Acórdão, Relator(a)
Min. Napoleão Nunes Maia Filho, Publicação: DJE – Diário de justiça eletrônico, Tomo 81, Data 26.04.2017,
Página 76).
Em igual sentido: EMENTA: ELEIÇÕES 2016. REGISTRO DE CANDIDATURA. VEREADOR. INDEFERIMENTO.
AUSÊNCIA DE CERTIDÃO CRIMINAL FORNECIDA PELA JUSTIÇA ESTADUAL DE SEGUNDO GRAU.
APRESENTAÇÃO POSTERIOR. REGULARIDADE. RECURSO PROVIDO. 1. Nos processos de registro de
candidatura admite-se a apresentação de documentos até o esgotamento das instâncias ordinárias, ainda que
previamente oportunizado o suprimento do vício. 2. Recurso provido. (TRE-PR – RECURSO ELEITORAL
n 17912, ACÓRDÃO nº 51865 de 06.10.2016, Relator(a) ADALBERTO JORGE XISTO PEREIRA, Publicação:
PSESS – Publicado em Sessão, Data 06.10.2016)
Referências
BARRETO, Álvaro Augusto de Borba; GRAEFF, Caroline Bianca. Prestação de contas de campanha eleitoral
como requisito à Certidão de Quitação Eleitoral: polêmicas e desencontros no ordenamento jurídico brasileiro.
Revista de informação legislativa: RIL, v. 53, n. 211, p. 81-104, jul./set. 2016. Disponível em: <https://www12.
senado.leg.br/ril/edicoes/53/211>.
BRASIL, Lei 13.105 de 16 de março de 2015.
LIMA, Sídia Maria Porto. Prestação de contas e financiamento de campanhas eleitorais. Curitiba: Juruá, 2005.
RODRIGUES, Marcelo Abelha. A subsidiariedade do CPC no processo eleitoral. Disponível em: <http://www.
marceloabelha.com.br>. Acesso em: 12 dez. 2017.
Theodoro Júnior, Humberto. Curso de Direito Processual Civil – Teoria geral do direito processual civil e
processo de conhecimento – v. I, 55. ed., Forense, 2014.
VELLOSO, Carlos Mário da Silva. Elementos de Direito Eleitoral. Saraiva, 2009, 9. 229.
Informação bibliográfica deste texto, conforme a NBR 6023:2002 da Associação Brasileira de Normas
Técnicas (ABNT):
CROSARA, Dyogo. Garantias processuais na prestação de contas eleitorais. In: FUX, Luiz; PEREIRA,
Luiz Fernando Casagrande; AGRA, Walber de Moura (Coord.); PECCININ, Luiz Eduardo (Org.).
Propaganda Eleitoral. Belo Horizonte: Fórum, 2018. p. 241-253. (Tratado de Direito Eleitoral, v. 4.) ISBN
978-85-450-0499-8.
CARLA KARPSTEIN
3.1 Introdução
O presente artigo tem por objeto destacar as limitações do processo de prestação
de contas partidária e eleitoral para fins de controle da influência do poder econômico
na construção da democracia brasileira e as possíveis evoluções.
A análise histórica brasileira e do direito comparado deixa claro que a relação entre
dinheiro e política nunca foi simples, mas é essencial para a qualidade e estabilização
da democracia.
Nosso ordenamento foi construído, desde a Constituição Federal, priorizando
partidos políticos em detrimento da pessoa do candidato, razão pela qual a igualdade
de condições para disputa, especialmente no que tange aos recursos financeiros, é
fundamental para a solidificação democrática brasileira, atingida por duros golpes de
profunda crise institucional nos últimos anos.
Conforme destaca Zovatto (2005, p. 288):
(...) Como disse César Gaviria “criou-se entre muitas pessoas a falsa idéia de que era
possível fortalecer a democracia nas Américas ignorando ou, pior ainda, atacando os
partidos políticos”. Com efeito, os partidos prestam um serviço público essencial: o de
selecionar, recrutar e capacitar candidatos para que exerçam cargos públicos, mobilizar os
eleitores, participar e depois ganhar ou perder as eleições, assim como formar governos.
Em um modelo ideal, os partidos agregam interesses, desenvolvem alternativas de política
e, em geral, constituem o principal elo entre a cidadania e o governo. O funcionamento dos
partidos – sua organização e profissionalismo, sua base de financiamento e sustentabilidade –
tem um impacto direto na efetividade do resto do sistema político.
1
Matéria completa disponível em: <http://politica.estadao.com.br/noticias/geral,na-camara-14-dos-deputados-
estouraria-limite-de-gasto-em-eleicao,70002013618>.
2
Sobre o assunto, HOLMES, Stephen; SUNSTEIN, Cass R. The Cost of Rights: Why Liberty Depends on Taxes.
New York: Norton & Company, 1999.
3
“Art. 16-C. O Fundo Especial de Financiamento de Campanha (FEFC) é constituído por dotações orçamentárias
da União em ano eleitoral, em valor ao menos equivalente:
I – ao definido pelo Tribunal Superior Eleitoral, a cada eleição, com base nos parâmetros definidos em lei;
II – a 30% (trinta por cento) dos recursos da reserva específica de que trata o inciso II do §3o do art. 12 da Lei
nº 13.473, de 8 de agosto de 2017.
(...)
§11. Os recursos provenientes do Fundo Especial de Financiamento de Campanha que não forem utilizados nas
campanhas eleitorais deverão ser devolvidos ao Tesouro Nacional, integralmente, no momento da apresentação
da respectiva prestação de contas.
§15. O percentual dos recursos a que se refere o inciso II do caput deste artigo poderá ser reduzido mediante
compensação decorrente do remanejamento, se existirem, de dotações em excesso destinadas ao Poder
Legislativo.”
4
“A Lei nº 4740/1965, Estatuto dos Partidos Políticos, já revogada, tinha as seguintes disposições:
Art. 54. Os partidos organizarão as respectivas finanças, com vista às suas finalidades, devendo, em
conseqüência, incluir nos seus estatutos preceitos que:
I – habilitem a fixar e apurar as quantias máximas que poderá despender na propaganda partidária e na de
seus candidatos;
II – fixem os limites das contribuições e auxílios de seus filiados.
§1º Os partidos deverão manter rigorosa escrituração de suas receitas e despesas, indicando-lhes a origem e
aplicação.
§2º Os livros de contabilidade do diretório nacional serão abertos, encerrados e em tôdas as fôlhas rubricadas
no Tribunal Superior Eleitoral.
§3º O Tribunal Regional Eleitoral e o juiz eleitoral exercerão a mesma atribuição quanto aos livros de
contabilidade dos diretórios do respectivo Estado, do Distrito Federal e Territórios, e dos diretórios municipais
das respectivas zonas.
Art. 55. Os partidos serão obrigados a enviar à Justiça Eleitoral, anualmente, o balanço financeiro do exercício
findo. (...)”
O ativismo judicial, por sua vez, vincula-se a uma postura que advoga por uma participação
mais ampla e intensa do Poder Judiciário na concretização dos valores e objetivos
constitucionais. Essa proatividade culminaria de interferência sobre espaços até então
tradicionalmente ocupados pelo Executivo e Legislativo (SALGADO, 2013. p. 21).
5
TRIBUNAL SUPERIOR ELEITORAL. Consulta nº 1.185. Relator: Ministro Caputo Bastos, decidida em 03.03.2006,
publicada no DJe em 28.04.2006.
6
TRIBUNAL SUPERIOR ELEITORAL. Resolução-TSE nº 22.610/2007. Disciplina o processo de perda de cargo
eletivo, bem como de justificação de desfiliação partidária. Relator: Ministro Cezar Peluso, decidida em
25.10.2007, publicada no DJe em 30.10.2007.
7
SUPREMO TRIBUNAL FEDERAL. Recurso Extraordinário nº 197.917-8/SP. Relator: Ministro Maurício Correa,
julgado em 24.03.2004, publicado no DJe em 31.03.2004.
8
A Lei nº 13.165/2015 incluiu o §12 no art. 28 da Lei nº 9504/97, determinando que “os valores transferidos
pelos partidos políticos oriundos de doações serão registrados na prestação de contas dos candidatos como
transferência dos partidos e, na prestação de contas dos partidos, como transferência aos candidatos, sem
individualização dos doadores”. O STF concedeu, então, liminar na ADI 5394 para suspender o citado trecho de
dispositivo da Lei das Eleições, que permitia doações ocultas a candidatos.
9
“(...) Prestação de contas. Campanha. Comitê do candidato. Aprovação. Fonte vedada. Erro material. Dívida de
campanha. Novação (art. 360 do Código Civil). Assunção de dívida. Possibilidade. Precedente. (...) 2. Verificado,
em parecer técnico, erro material, de grande monta, na relação de notas fiscais emitidas por empresas que
forneceram bens a comitê de candidato em campanha eleitoral, não se pode afirmar ter havido falta grave na
prestação de contas. 3. É permitida a novação, com assunção liberatória de dívidas de campanha, por partido
político, desde que a documentação comprobatória de tal dívida seja consistente. 4. Feita a assunção liberatória
de dívida, o partido político, ao prestar suas contas anuais, deverá comprovar a origem dos recursos utilizados
no pagamento da dívida, recursos que estarão sujeitos às mesmas restrições impostas aos recursos de campanha
eleitoral. 5. Contas aprovadas”. TRIBUNAL SUPERIOR ELEITORAL. Resolução-TSE nº 22.500/06. Relator:
Ministro Gerardo Grossi, decidida em 13.12.2006.
10
“Art. 41. A decisão que julgar as contas dos candidatos eleitos será publicada em até 8 dias antes da diplomação.
(…)
§3º Sem prejuízo do disposto no §1º, a decisão que desaprovar as contas de candidato implicará o impedimento
de obter a certidão de quitação eleitoral durante o curso do mandato ao qual concorreu.”
11
“Art. 11. Os partidos e coligações solicitarão à Justiça Eleitoral o registro de seus candidatos até as dezenove
horas do dia 15 de agosto do ano em que se realizarem as eleições.
(…)
§7º A certidão de quitação eleitoral abrangerá exclusivamente a plenitude do gozo dos direitos políticos, o
regular exercício do voto, o atendimento a convocações da Justiça Eleitoral para auxiliar os trabalhos relativos
ao pleito, a inexistência de multas aplicadas, em caráter definitivo, pela Justiça Eleitoral e não remitidas, e a
apresentação de contas de campanha eleitoral.”
12“
Art. 26. A via impressa do formulário Requerimento de Registro de Candidatura (RRC) será apresentada com
os seguintes documentos
(…)
§4º A quitação eleitoral de que trata o §1º deste artigo abrangerá exclusivamente a plenitude do gozo dos
direitos políticos, o regular exercício do voto, o atendimento a convocações da Justiça Eleitoral para auxiliar os
trabalhos relativos ao pleito, a inexistência de multas aplicadas, em caráter definitivo, pela Justiça Eleitoral e
não remitidas, e a apresentação regular de contas de campanha eleitoral.”
13
ELEIÇÕES 2012. REGISTRO DE CANDIDATURA. AGRAVO REGIMENTAL EM RECURSO ESPECIAL
ELEITORAL. DESAPROVAÇÃO DAS CONTAS DE CAMPANHA. QUITAÇÃO ELEITORAL. ENTENDI
MENTO JURISPRUDENCIAL MANTIDO NA RESOLUÇÃO Nº 23.376/2012. OBSERVÂNCIA DO PRINCÍPIO
DA SEGU RANÇA JURÍDICA. DEFERIMENTO DO PEDIDO DE REGISTRO. AGRAVO REGIMENTAL
DESPROVIDO.
1. A apresentação das contas de campanha é suficiente para a obtenção da quitação eleitoral, nos termos do art.
11, §7º, da Lei nº 9.504/1997, alterado pela Lei nº 12.034/2009.
2. Entendimento jurisprudencial acolhido pela retificação da Resolução nº 23.376/2012 do TSE.
TRIBUNAL SUPERIOR ELEITORAL. Agravo Regimental em Recurso Especial Eleitoral nº 232-11/RJ. Relator:
Ministro Dias Tóffoli, julgado em 16.10.2012, publicado em sessão em 16.10.2012.
14
“Art. 11. Os partidos e coligações solicitarão à Justiça Eleitoral o registro de seus candidatos até as dezenove
horas do dia 15 de agosto do ano em que se realizarem as eleições.
§8º Para fins de expedição da certidão de que trata o §7º, considerar-se-ão quites aqueles que:
IV – o parcelamento de multas eleitorais e de outras multas e débitos de natureza não eleitoral imputados pelo
poder público é garantido também aos partidos políticos em até sessenta meses, salvo se o valor da parcela
ultrapassar o limite de 2% (dois por cento) do repasse mensal do Fundo Partidário, hipótese em que poderá
estender-se por prazo superior, de modo que as parcelas não ultrapassem o referido limite.”
15
SUPREMO TRIBUNAL FEDERAL. Ação Direta de Inconstitucionalidade nº 4.650. Relator: Ministro Luiz Fux,
Tribunal Pleno, julgado em 26.03.2013, publicado no DJe em 02.04.2013.
16
“Art. 96 Salvo disposições específicas em contrário desta Lei, as reclamações ou representações relativas ao seu
descumprimento podem ser feitas por qualquer partido político, coligação ou candidato, e devem dirigir-se:
(…)
§11. As sanções aplicadas a candidato em razão do descumprimento de disposições desta Lei não se estendem
ao respectivo partido, mesmo na hipótese de esse ter se beneficiado da conduta, salvo quando comprovada a
sua participação.”
São normas relativas ao processo eleitoral propriamente dito as Resoluções que tratam: do
calendário eleitoral; de pesquisas eleitorais; da arrecadação, aplicação e prestação de contas
de recursos financeiros nas campanhas eleitorais; das convenções partidárias e registro de
candidatura; da propaganda eleitoral e condutas vedadas aos agentes públicos; dos atos
preparatórios; da recepção e fiscalização dos votos e garantias eleitorais; da proclamação
dos resultados e diplomação dos eleitos; das reclamações e representações relativas ao
descumprimento da Lei Eleitoral, dentre outras. (LACERDA & SILVA, 2004, p. 78)
Como se percebe pela doutrina, as instruções do TSE têm por objetivo claro
integrar a legislação eleitoral, ficando limitadas por diversos fatores. Um deles é o
chamado limite material dessas Instruções/Resoluções.
Esse limite está relacionado com o conteúdo das instruções, as quais devem tornar
aplicável o que já está estabelecido na lei. Além disso, já decidiu o STF que, dentro do
limite material, deve-se observar o princípio da razoabilidade,17 o que claramente não
se vislumbra na referida vedação, tema que certamente chegará à discussão do TSE nas
próximas prestações de contas dos diretórios nacionais e estaduais.
Desse aglomerado geral sobre as prestações de contas – eleitoral e partidária –
resta a dúvida quanto ao seu teto máximo de alcance: quantas mudanças ainda são
possíveis no que tange ao processo de prestação de contas para que estas espelhem a
movimentação financeira real de uma campanha eleitoral e como a tecnologia pode
auxiliar nesse processo.
17
SUPREMO TRIBUNAL FEDERAL. Medida Cautelar em Ação Direta de Inconstitucionalidade nº 1.407-2. Relator:
Ministro Celso de Mello, julgada em 07.03.1996, publicada no DJ em 15.03.1996.
na publicização. Interessante notar, ainda, que a mídia possui um papel para além do
auxílio na fiscalização de contas – está por se tornar, gradualmente, em um meio de
obter o financiamento para campanhas.18
Em uma análise de diferentes sistemas de prestação de contas, tomemos os
Estados Unidos, que possuem uma forte tradição midiática e grande controle da política
pela população, como exemplo. Em matéria de prestação de contas, mister ressaltar a
organização da “Justiça Eleitoral” americana, que não se assemelha em nada ao Brasil,
mesmo porque o país norte-americano não possui uma vertente jurisdicional espe
cializada como o vizinho sul-americano. O que há, visando à fiscalização de gastos
de campanha, é a Federal Election Commission (FEC), uma agência reguladora criada
pelo Federal Election Campaign Act, que, dentre diversas provisões, traz as balizas fun
damentais para o financiamento de campanha – e, evidentemente, de prestação de
contas – estadunidense.
A FEC é definida como uma “agência reguladora independente encarregada com
a administração e o fazer cumprir da lei de financiamento de campanha federal que
possui jurisdição sobre o financiamento das campanhas para a Câmara dos Deputados,
o Senado, a Vice-Presidência e a Presidência”.19
Para além da responsabilidade de administração do financiamento eleitoral (o
que não é objeto da presente discussão), de acordo com a legislação vigente, em especial
o Federal Election Campaign Act of 1974 e o Bipartisan Campaign Reform Act, cabe ao FEC
receber as informações relativas às prestações de contas dos gastos realizados (e recursos
recebidos) pelos candidatos ao Congresso e à Presidência. Todas essas prestações
devem ser tornadas públicas por meio de relatórios da FEC em até 48 (quarenta e oito)
horas, se foram protocoladas em papel, ou em até 24 (vinte e quatro) horas se forem
protocoladas eletronicamente, nos termos da section 501 do Bipartisan Campaign Reform
Act,20 que alterou substancialmente as disposições relativas à Comissão.
Ainda, em relação às limitações e deveres impostos, mister ressaltar que existem
dois principais atores políticos que se encontram sujeitos às disposições da FEC: as
pessoas físicas e os comitês políticos federais. Em relação às pessoas físicas, devem
prestar contas quando fazem propaganda para o candidato com dinheiro próprio em
valor acima de US$ 250 por ano; ou, alternativamente, quando desejam contribuir
diretamente com a campanha, também estarão sujeitos a prestar o valor à FEC. (TELLES,
2009)
Em outra vertente, há o dever de registro dos comitês políticos federais de cam
panha quando da sua constituição – período que não é exatamente delimitado pela lei.
18
Sobre o assunto, ver MCELWEE, L.; YASSERI, Taha. Social Media, Money and Politics: Campaign finance
in the 2016 US Congressional Cycle. Oxford: University of Oxford, 2016. Disponível em: <https://arxiv.org/
pdf/1711.10380.pdf>.
19
“The Federal Election Commission (FEC) is the independent regulatory agency charged with administering
and enforcing the federal campaign finance law. The FEC has jurisdiction over the financing of campaigns
for the U.S. House, Senate, Presidency and the Vice Presidency”. Disponível em: <https://www.fec.gov/about/
mission-and-history/>.
20
“The Commission shall make a designation, statement, report, or notification that is filed with the Commission
under this Act available for inspection by the public in the offices of the Commission and accessible to the public
on the Internet not later than 48 hours (or not later than 24 hours in the case of a designation, statement, report,
or notification filed electronically) after receipt by the Commission”. Disponível em: <https://www.gpo.gov/
fdsys/pkg/PLAW-107publ155/html/PLAW-107publ155.htm>.
21
É possível acessar a database em: <http://classic.fec.gov/finance/disclosure/disclosure_data_search.shtml>.
22
O art. 48 da Lei 19.884/03 possui por redação “Las cuentas de los ingresos y gastos electorales presentadas ante
el Director del Servicio Electoral serán públicas y se encontrarán disponibles en el sitio electrónico del Servicio.
Además, cualquier persona podrá obtener, a su costa, copia de ellas. El Director del Servicio Electoral deberá
publicar en Internet las cuentas de las candidaturas a Presidente de la República, senador y diputado y de los
partidos políticos dentro del plazo establecido en el artículo 6º. A medida que el Servicio Electoral proceda a
la revisión de las mismas, deberá actualizar la información difundida en Internet indicando si tales cuentas
son aceptadas, rechazadas u observadas. Durante el examen de las cuentas, el Director del Servicio Electoral
velará porque el ejercicio del derecho establecido en el inciso anterior se compatibilice con sus labores propias”.
Disponível em: <https://www.leychile.cl/Navegar?idNorma=213283>.
23
Sobre tal entendimento “(…) Ademais, a teor da recente jurisprudência do TSE, não cabe recurso especial contra
acórdão de Tribunal Regional Eleitoral, que examina prestação de contas de candidato, por constituir matéria
eminentemente administrativa (Acórdãos 26115/SP, DJ de 8.11.2006, rel. Min. José Delgado; e 25762/PB, julgado
em 28.11.2006, rel. Min. Caputo Bastos” (AgRgAg nº 6565/MG, rel. Min. Gerardo Grossi, DJ, 29.06.07, p. 339).
24
“Art. 16-C. O Fundo Especial de Financiamento de Campanha (FEFC) é constituído por dotações orçamentárias
da União em ano eleitoral, em valor ao menos equivalente.
I – ao definido pelo Tribunal Superior Eleitoral, a cada eleição, com base nos parâmetros definidos em lei;
II – a 30% (trinta por cento) dos recursos da reserva específica de que trata o inciso II do §3o do art. 12 da Lei no
13.473, de 8 de agosto de 2017.
Art. 16-D. Os recursos do Fundo Especial de Financiamento de Campanha (FEFC), para o primeiro turno das
eleições, serão distribuídos entre os partidos políticos, obedecidos os seguintes critérios:
I – 2% (dois por cento), divididos igualitariamente entre todos os partidos com estatutos registrados no Tribunal
Superior Eleitoral;
II – 35% (trinta e cinco por cento), divididos entre os partidos que tenham pelo menos um representante na
Câmara dos Deputados, na proporção do percentual de votos por eles obtidos na última eleição geral para a
Câmara dos Deputados;
III – 48% (quarenta e oito por cento), divididos entre os partidos, na proporção do número de representantes na
Câmara dos Deputados, consideradas as legendas dos titulares;
IV – 15% (quinze por cento), divididos entre os partidos, na proporção do número de representantes no Senado
Federal, consideradas as legendas dos titulares;
§1º (VETADO)
§2º Para que o candidato tenha acesso aos recursos do Fundo a que se refere este artigo, deverá fazer
requerimento por escrito ao órgão partidário respectivo.”
25
Resumidamente, a Lei nº 9.504/97 determina a necessidade dos seguintes documentos para a prestação de
contas:
Recibos eleitorais (emitidos diretamente no sistema próprio do TSE);
Demonstrativo dos recursos arrecadados (conterá todas as doações recebidas, devidamente identificadas,
inclusive os recursos próprios e estimáveis em dinheiro);
Demonstrativo das despesas pagas após a eleição;
Demonstrativo de receitas e despesas;
Demonstrativo do resultado da comercialização de bens e da realização de eventos (deverá discriminar o
período da comercialização/realização do evento, seu valor total, o valor da aquisição dos bens e serviços ou de
seus insumos, ainda que recebidos em doação, a identificação dos doadores, dentre outros);
Conciliação Bancária;
Relatório de despesas efetuadas;
Demonstrativo de doações efetuadas a candidatos ou partidos políticos;
Descrição das receitas estimadas (deverá descrever o bem ou serviço doado, informando quantidade, valor
unitário e avaliação pelos preços praticados no mercado, com indicação da fonte da avaliação, além do
respectivo recibo eleitoral, informando a origem de sua emissão);
Extratos da conta bancária aberta em nome do candidato ou do partido político, conforme o caso, demonstrando
a movimentação ou a ausência de movimentação financeira ocorrida no período de campanha;
Guia de depósito comprovando o recolhimento à respectiva direção partidária das sobras financeiras de
campanha, quando houver;
Declaração da direção partidária comprovando o recebimento das sobras de campanha constituídas por bens e/
ou materiais permanentes, quando houver;
Documentos fiscais que comprovem a regularidade dos gastos eleitorais realizados com recursos do Fundo
Partidário e comercialização de bens/realização de eventos;
Os documentos integrantes da prestação de contas deverão ser obrigatoriamente assinados pelo candidato (ou
tesoureiro do partido, no caso de prestação de contas partidárias, advogado e contador;
26
A proposta encaminhada pela Comissão de Direito Eleitoral da OAB/PR possuía as seguintes provisões:
Art. 1º. O artigo 23 da Lei nº 9.504/97 passa a ter a seguinte redação:
(...)
IV – Sistema eletrônico de doações, através das plataformas de financiamento coletivo, mediante autorização da
justiça eleitoral, que deverá atender aos seguintes requisitos:
a) Identificação do doador;
b) Emissão de recibo eleitoral para cada doação efetuada na plataforma;
c) Discriminação dos percentuais de taxas e impostos cobrados sobre cada doação;
d) Recebimento de doações por transferência eletrônica identificada ou cartões de crédito e débito de titularidade
do doador;
§8º Para utilização de plataformas de financiamento coletivo o candidato deverá obrigatoriamente requerer à
Justiça Eleitoral autorização para contratação, em petição própria, que deverá conter os dados do candidato
contratante e da empresa contratada, os valores, taxas e impostos praticados e o prazo de início e encerramento
da arrecadação, que não poderá ser anterior ao protocolo do registro de candidatura nem ultrapassar a data da
eleição. (grifo meu)
§9º É obrigatório ao candidato, no caso de utilização da plataforma de doações eleitorais de financiamento
coletivo autorizada pela Justiça Eleitoral, a divulgação dos valores recebidos pela empresa administradora em
sítio da Justiça Eleitoral, no prazo de 72 horas de seu recebimento, nos termos do art. 28, §4º desta Lei, sob pena
de desaprovação de contas no caso de descumprimento.
§10 As doações realizadas por meio de plataformas de financiamento coletivo ficarão sujeitas aos limites para doação de
pessoas físicas estabelecidos nesta Lei. (grifo meu)
§11 Os valores recebidos por meio das plataformas de financiamento coletivo deverão estar integralmente
declarados em prestação de contas do candidato, bem como os valores pagos à empresa administradora, que
serão obrigatoriamente registrados como gastos eleitorais do candidato. (grifo meu)
§12 Eventuais valores não utilizados deverão ser entendidos como sobras de campanha e depositados em conta
corrente do partido, nos termos do art. 31 desta lei.
27
É possível acessar a plataforma em: <http://www.vigieaqui.com.br/>.
28
A plataforma está disponível em: <http://votebem.org.br/>.
29
A Cúpula de Québec foi um dos encontros da Cúpula das Américas, uma reunião entre os chefes de Estado dos
países do continente americano para a cooperação entre as nações. O Plano de Ação completo da Cúpula de
(…) ajustes técnicos em leis específicas anticorrupção não são o suficiente. O que é
urgentemente necessário são reformas sistêmicas profundas, que corrijam o desequilíbrio
crescente entre poder e riqueza por meio do empoderamento social para acabar com a
impunidade, responsabilizar os poderosos e garantir que as pessoas tenham voz nas
decisões que afetam suas vidas.
Referências
LACERDA, Paulo José Martins; CARNEIRO, Renato César; SILVA, Valter Félix da. O poder normativo da.
Justiça Eleitoral. João Pessoa: Sal da Terra, 2004.
MANIN, Bernard; PRZEWORSKI, Adam; STOKES, Susan C. Eleições e representação. Lua Nova. 2006, n.67, p.
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ser acessado em: <http://www.ftaa-alca.org/summits/quebec/plan_p.asp>.
30
A análise completa sobre o estudo da corrupção está disponível em: <https://www.transparency.org/news/
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Informação bibliográfica deste texto, conforme a NBR 6023:2002 da Associação Brasileira de Normas
Técnicas (ABNT):
4.1 Introdução
O artigo aborda a exigência da prestação de contas da campanha eleitoral1 como
requisito para a obtenção de Certidão de Quitação Eleitoral e tem por objetivo descrever
o modo como esta vem sendo regulamentada no ordenamento jurídico brasileiro. Para
tal, promove a análise comparada das leis e das resoluções do Tribunal Superior Eleitoral
(TSE), as quais compõem a principal fonte da pesquisa. As leis são: nºs 8.713/93, que
regulamentou a eleição de 1994; 9.100/95, alusiva ao pleito de 1996, e 9.504/97, a “lei das
eleições”, pois promulgada como uma norma permanente que substituiu a tradição de
formular uma norma a cada pleito (ou procurou substituir, pois, na prática, ajustes e
mudanças continuam a ocorrer a cada eleição). Além delas, as leis subsequentes e que
promoveram mudanças na Lei nº 9.504/97 nesta questão, como: nºs 11.300/06, 12.034/09,
13.165/15. As Resoluções do TSE, por sua vez, são muitas, pois a cada pleito ele as produz
com vistas a explicar, interpretar, esclarecer determinações constantes na lei vigente e/
ou suprir lacunas nela identificadas. Cabe destacar, ainda, que trabalhos de especialistas
em Direito Eleitoral e debates ocorridos no TSE atuam como fontes secundárias.
Ressalva-se que não serão discutidos os efeitos que a prestação de contas traz
para o candidato na eleição em que acabou de concorrer.2 O objeto de estudo também
* Uma versão deste texto foi publicada na Revista de Informação Legislativa (n. 211, jul.-set. 2016). Este é uma
versão modificada e atualizada daquele artigo.
1
Também são adotadas neste texto e nas normas legais as expressões “apresentação de contas de campanha
eleitoral” e “prestação” ou “apresentação de contas eleitorais”.
2
Embora todos os concorrentes sejam passíveis de punição por causa das contas de campanha, os eleitos são
atingidos imediatamente: conforme a Lei nº 9.504/97, art. 29, §2º, a não prestação impossibilita que sejam
não se confunde com aquela que os partidos devem encaminhar anualmente à Justiça
Eleitoral, determinada pela Lei nº 9.096/95, a “lei dos partidos políticos”, e tampouco
com a rejeição das contas de quem exerce cargo ou função pública. Igualmente, não
discute a questão das formas de financiamento de campanhas eleitorais existentes ou
pretendidas para o país.
O texto está organizado em três seções. A primeira caracteriza sinteticamente
a prestação de contas eleitorais. As duas subsequentes analisam cronologicamente as
decisões que disciplinaram o tema: a seção 2 se centra na delimitação do conceito de
Quitação Eleitoral e na inserção da prestação de contas como um dos elementos que a
constitui; a seção 3 narra o modo como foi regulamentada na Lei nº 12.034/09, aborda o
acirramento da polêmica ocorrido entre 2010-2012 e como ela se encontra desde então.
Deve ser encaminhada à Justiça Eleitoral3 por todo e qualquer candidato,4 bem
como por comitês financeiros e por partidos políticos, ainda que não haja movimentação
de recursos financeiros ou estimáveis em dinheiro. Conforme a redação original da Lei
nº 9.504/97, art. 28, I, II, §1º e 2º, candidatos a cargo proporcional podem optar pela
prestação individual ou via comitê financeiro e quem concorre a posto majoritário o
faz somente por intermédio de comitê financeiro. Contudo, desde as eleições de 2016,
em redação dada pela Lei nº 13.165/15, os parágrafos citados foram modificados, os
diplomados enquanto perdurar, isto é, até que seja entregue; e, desde a Resolução nº 21.609/04, art. 56, é exigido
o julgamento das contas, apesar de a rejeição não impedir a diplomação. O prazo para manifestação da Justiça
Eleitoral era de oito dias antes da diplomação entre 1994 e 2014 (leis nºs 8.713/93, art. 55, §3º; 9.504/97, art. 30,
§ 1º; 11.300/06), com exceção do pleito de 1996, fixado em três dias (Lei 9.100/95, art. 45, § 1º), o mesmo período
hoje vigente (Lei nº 13.165/15). Desde esta determinação da Resolução nº 21.609/04, o tempo para analisar as
contas dos não eleitos é mais dilatado, pois, até então, este prazo valia para o conjunto dos candidatos.
3
Em termos mais específicos: nas eleições municipais, exclusivamente ao juiz eleitoral; nas presidenciais, ao TSE;
nas demais, ao respectivo Tribunal Regional Eleitoral (TRE).
4
A partir da Resolução nº 20.987/02, o TSE detalhou que a exigência abrange os que renunciaram, desistiram
ou foram indeferidos, pelo período que participaram do processo eleitoral, ainda que não tenham realizado
campanha; e os que faleceram, pelo período em que a realizaram, o que foi antecipado pela Resolução
nº 20.775/00. A Resolução nº 22.715/08, art. 26, §1º, acresceu a referência ao candidato substituído. De 1998 a
2010, a de candidatos a vice e suplente era abrangida pela dos respectivos candidatos a titular (Resoluções
nºs 20.102/98, art. 19, §1º; 20.566/00, art. 17, §1º; 20.987/02, art. 25; 21.609/04, art. 37, §3º; 22.160/06, art. 24, § 3º;
e 22.715/08, art. 26, § 3º). A Resolução nº 23.217/10, art. 25, § 9º autorizou que elas pudessem ser apresentadas
separadamente e a de nº 23.406/14, art. 55, parágrafo único, repôs a excepcionalidade, pois só na hipótese de não
prestação do titular no prazo legal é que eles poderão fazê-lo separadamente.
comitês financeiros foram suprimidos e todas as prestações devem ser feitas pelos
próprios candidatos.
Segundo a mesma lei, art. 29, III, IV, §1º, o prazo para a entrega dessa prestação
de contas é até 30 dias após a votação, mas se ocorrer 2º turno, os candidatos que dele
participarem devem submeter uma única prestação. E, nesse caso, o prazo foi reduzido
pela Lei nº 13.165/15 para 20 dias após a votação dela.
Cabe desvelar que a Lei nº 11.300/06, ao incluir o §4º ao art. 28 da Lei nº 9.504/97,
criou as chamadas prestações de contas parciais. Para Carvalho (2010, p. 102), “não se
trata, propriamente, de prestação de contas parcial, mas de simples adiantamento de
informações (...)”. A Lei nº 13.165/15 determinou que ela implica a publicação de:
§1º Nenhum candidato a cargo eletivo, sob pena de cassação do respectivo registro,
poderá efetuar, individualmente, despesas de caráter político ou eleitoral, ou alistamento,
arregimentação, propaganda e demais atividades definidas pela Justiça Eleitoral, devendo
processar todos os gastos através dos partidos ou comitês (BRASIL. Lei 4.740, art. 58).
Foi a Resolução nº 20.987/02, art. 29, que explicitou que há três decisões em
relação às contas recebidas: a) pela aprovação, quando estiverem regulares; b) pela
aprovação com ressalvas, quando constatadas falhas que, examinadas em conjunto,
não lhe comprometem a regularidade; c) pela desaprovação, quando constatadas falhas
que, examinadas em conjunto, comprometem a regularidade. Até então, persistiam
dúvidas se havia alternativa intermediária, propiciadas pelos próprios textos legais, que
não a traziam, mas determinavam que “meros erros formais e materiais que venham
a ser corrigidos”, como a Lei nº 9.100/95, art. 45, §2º, ou que “erros formais e materiais
corrigidos não autorizam a rejeição das contas e a cominação de sanção a candidato ou
partido”, caso da Lei nº 9.504/97, art. 30, §2º.7
Essas alternativas foram mantidas para as Resoluções seguintes (nºs 21.609/04, art.
53; 22.160/06, art. 37; 22.715/08, art. 40) – sendo que, em 2006, o termo “desaprovação” foi
substituído por “rejeição” – e, enfim, incorporadas pela Lei 12.034/09 à nova redação do
art. 30 da Lei nº 9.504/97, ao lado de uma quarta possibilidade, que havia sido introduzida
pela Resolução nº 22.715/08: “contas não prestadas”, o que será discutido na sequência.
Até 2009, o TSE considerava tais decisões como “administrativas” e, por isso,
a elas não cabiam recursos. A flexibilização surgiu, ainda timidamente, na Resolução
nº 20.987/00, art. 35: “das decisões dos Tribunais Regionais Eleitorais que versarem sobre
contas somente caberá recurso para o Tribunal Superior Eleitoral quando proferidas
contra disposição expressa da Constituição Federal ou de lei, ou quando ocorrer
5
Anteriormente, a legislação exigia que ela fosse elaborada de acordo com os princípios fundamentais de
contabilidade aprovados pelo Conselho Federal de Contabilidade e assinada por profissional habilitado, caso
da Lei nº 8.713/93, art. 50.
6
Como o artigo discute amplamente, o modo como devem ser compreendidos os termos grifados motiva larga
discussão no âmbito jurídico-político.
7
O advento da aprovação com ressalvas não implicou a retirada dessas determinações. Ao contrário, a Lei
nº 12.034/09 as ampliou, pois acresceu ao art. 30 da Lei nº 9.504/97, o §2º-A: “erros formais ou materiais irrelevantes
no conjunto da prestação de contas, que não comprometam o seu resultado, não acarretarão a rejeição das
contas”. Schlickmann (2010, p. 344-345) pondera que, anteriormente, erros corrigidos não implicavam rejeição,
agora eles nem precisam ser corrigidos, basta serem considerados “irrelevantes”.
8
Há uma diferença formal: na Lei nº 9.504/97, ela é o requisito “VI” (em número romano).
se é certo que a rejeição das contas não implica sanção imediata, podendo, apenas, servir
de fundamento para ações subsequentes, penso que não é menos certo que o candidato que
não apresentar contas estará em mora e, consequentemente, não poderá obter certidão de
quitação eleitoral no período do mandato para o qual concorreu (BRASIL. TSE. 2004, p. 7).
9
O art. 28 da Lei nº 9.504/97, caput, incisos I e II diz: “a prestação de contas será feita: I, no caso dos candidatos
às eleições majoritárias, na forma disciplinada pela Justiça Eleitoral; II, no caso dos candidatos às eleições
proporcionais, de acordo com os modelos constantes no anexo desta lei”.
ano (2004); ou b) seria requisitada a partir das próximas eleições (no caso, 2006 em
diante). A segunda, de ordem operacional, era a seguinte: na hipótese de a ausência de
prestação de contas impossibilitar ser candidato em 2004, como aferir esse dado, se até
então ele não era exigido e o cadastro eleitoral não o registrava, razão porque, à época,
centenas de certidões já haviam sido emitidas?
De fato, a resposta oferecida pelo TSE procurou solucionar esta segunda pergunta,
que era um desafio mais imediato. Foi aprovada uma nova Resolução, a 21.848/04,
por meio da qual o órgão esclareceu: “a falta de apresentação de contas de campanha
pelo candidato impedirá a obtenção de Certidão de Quitação Eleitoral, com relação
às omissões verificadas a partir das eleições de 2004 (...)”. Paralelamente, a Justiça
Eleitoral providenciaria a adoção dos mecanismos para incluir as informações relativas
à prestação de contas no cadastro eleitoral, de modo a implantar a exigência a partir do
próximo pleito, ou seja, as eleições de 2006.
Quando estas se aproximavam, a Resolução 22.250/06 repetiu ipsis litteris, o art. 42,
§1º, da Resolução nº 21.833/04, tão somente com o acréscimo do §2º: “a partir do dia
imediato ao término do prazo para apresentação das contas, proceder-se-á, no cadastro
eleitoral, ao registro relativo à apresentação ou não, da prestação de contas, com base
nas informações inseridas no SPCE”,10 ou seja, informa que a Justiça Eleitoral já estava
capacitada a implementar a medida. Nessa perspectiva, a Resolução 22.156/06, art. 26,
dispensa o candidato de apresentar a Certidão de Quitação Eleitoral, pois ela seria
aferida pela própria Justiça Eleitoral.
Com vistas ao pleito de 2008, a Resolução nº 22.715/08, em seu art. 27, §5º, repetiu
a exigência da apresentação de contas nos termos fixados pelas que a antecederam.
Contudo, também se preocupou em tornar mais preciso o conceito de “não prestação”.
Ele não correspondia à simples ausência da entrega dos dados, e sim era o produto de
uma decisão da Justiça Eleitoral.11 E, para formar tal juízo, ela devia cumprir alguns
procedimentos, conforme a Resolução nº 22.715/08, art. 27, §4º: a) constatar os candidatos
e os comitês financeiros que não haviam apresentado as contas no prazo previsto pela
lei; b) notificá-los para que, no máximo em 72h, cumprissem essa obrigação, sob pena de
aplicação do disposto no art. 347 do Código Eleitoral12 e de serem as contas julgadas não
prestadas;13 c) verificar que, passado este prazo, elas ainda não haviam sido entregues.
10
Por esta razão, a prestação fora do prazo legal não sustava a impossibilidade de obter a Certidão de Quitação
Eleitoral pelo curso do mandato pretendido. O caso de maior repercussão foi a impugnação da candidatura
a presidente de Rui Pimenta (PCO) porque apresentou as contas da campanha de 2002 somente ao solicitar o
registro em 2006 (TERRA, 14 set. 2006).
11
A medida foi incorporada, pela Lei nº 12.034/09, ao art. 30, IV da Lei 9.504/97. Porém, implicou alterar o caput
do art. 30 que afirmava, na versão original: “examinando a prestação de contas e conhecendo-a, a Justiça
Eleitoral decidirá sobre a sua regularidade”. Como a “não apresentação” era, agora, uma decisão, ele passou a
dizer: “a Justiça Eleitoral verificará a regularidade das contas de campanha, decidindo:”, seguindo-se as quatro
possibilidades.
12
Detenção de três meses a um ano e pagamento de 10 a 20 dias-multas para quem “recusar (...) cumprimento ou
obediência a diligências, ordens ou instruções da Justiça Eleitoral ou opor embaraços à sua execução”.
13
Esses procedimentos têm merecido cada vez mais detalhamento. A Resolução nº 23.217/10, art. 26, §4º, incluiu
os partidos entre aqueles a serem notificados da ausência e fixou um prazo máximo de dez dias para que ela
ocorra, quando então passaria a contar o prazo de 72h. A Resolução nº 23.376/12, art. 38, §4º, reduziu este
período para cinco dias, o que foi seguido pela nº 23.406/14, art. 38, §3º. Já a Resolução nº 23.463/15 destaca:
“Art. 45 (...)
§4º Findos os prazos fixados neste artigo sem que as contas tenham sido prestadas, observar-se-ão os seguintes
procedimentos:
Conforme o art. 40, IV da mesma Resolução, somente após caberia determinar que
houvera a não prestação. Em função dessa inovação, a Resolução 22.715/08 repetiu:
“art. 42. A decisão que julgar as contas eleitorais como não prestadas implicará: I – ao
candidato, o impedimento de obter a Certidão de Quitação Eleitoral durante o curso
do mandato ao qual concorreu”.
A redação final da mesma Resolução – com acréscimo promovido pela Resolução
22.948/08 – também trazia uma novidade na modulação dos efeitos: contas não prestadas
impossibilitam a obtenção da Certidão de Quitação Eleitoral não somente pelo período
do mandato pretendido – como era determinado desde 2004 –, mas, passado esse prazo,
até que sejam apresentadas. Isto é, a punição não mais prescrevia.
Por consenso ou por ausência de atenção, até aquele momento a Corte nunca havia
discutido o fato de a punição ser pelo tempo do mandato a que o candidato concorreu.
A medida havia sido citada pelo Ministro Fernando Neves ao reivindicar a prestação
de contas como um dos requisitos da Quitação Eleitoral, todavia, a Resolução 21.823/04,
resultado da decisão, é omissa em relação a esta modulação, que aparece somente na
21.833/04, é repetida na 22.250/06 e na redação original da 22.715/08.
A mudança foi proposta pelo Ministro Joaquim Barbosa, sob o argumento que
a questão não devia ser examinada apenas à luz da Lei 9.504/97, mas também da
Constituição:
É que, por serem utilizados recursos do Fundo Partidário na campanha eleitoral, incidem
automaticamente sobre essa temática os comandos taxativos do parágrafo único do art. 70
da Constituição Federal, que estabelece: “Prestará contas qualquer pessoa física ou jurídica,
pública ou privada, que utilize, arrecade, guarde, gerencie ou administre dinheiros, bens
e valores públicos ou pelos quais a União responda, ou que, em nome desta, assuma
obrigações de natureza pecuniária. (Redação dada pela Emenda Constitucional nº 19, de
1998)”. Estamos, pois, diante do princípio constitucional da obrigatoriedade da prestação
de contas, uma das facetas da chamada “Accountability”, norma de enorme significado no
direito comparado e largamente observada nas grandes democracias modernas (BRASIL.
TSE. 2008. p. 25-26).
I
– o chefe do Cartório Eleitoral ou a unidade técnica responsável pelo exame das contas, conforme o caso, informará
o fato, no prazo máximo de três dias:
a) ao presidente do Tribunal ou ao relator, caso designado; ou
b) ao Juiz Eleitoral;
II – a autoridade judicial determinará a autuação da informação na classe processual de prestação de contas,
caso ainda não tenha havido a autuação (...);
IV – o omisso será notificado para, querendo, manifestar-se no prazo de setenta e duas horas;
V – o Ministério Público Eleitoral terá vista dos autos da prestação de contas, devendo emitir parecer no prazo
de quarenta e oito horas;
VI – permanecendo a omissão, as contas serão julgadas como não prestadas (Lei nº 9.504/1997, art. 30, inciso IV).
§ 5º A notificação de que trata o inciso IV deve ser pessoal (...)”.
Ainda, um terceiro aspecto, este de ordem prática, foi apresentado pela Correge
doria Eleitoral de Goiás e fez com que o TSE se defrontasse com a impossibilidade de
incluir no cadastro eleitoral a rejeição das contas de pleitos passados, visto que, até então,
ela não era requisito à emissão da Certidão de Quitação Eleitoral. Enfim, repetiam-se
§2º (...) as contas apresentadas [extemporaneamente] serão submetidas a exame técnico tão
somente para verificação de eventual existência de recursos de fontes vedadas, de origem
não identificada e da ausência de comprovação ou irregularidade na aplicação de recursos
oriundos do Fundo Partidário, com posterior encaminhamento ao Ministério Público.
14
A ressalvar que, apesar de a decisão ter sido tomada por unanimidade, a discussão perdurou de 24 de abril a 30
de setembro de 2008 e que, em três de setembro de 2008, ao apreciar o REspe 29.020, relativo ao indeferimento
de uma candidatura a vereador, o TSE já havia chegado a uma decisão idêntica (BRASIL. TSE, jul.-set. 2008,
p. 303-310).
15
Posteriormente, em 2012, ao decidir pela aplicação imediata da exigência da aprovação das contas de pleitos
precedentes, este princípio não foi considerado pelo TSE.
quais são as principais características desse projeto? Em primeiro lugar, detalhar as regras
do processo eleitoral, as regras do jogo. Isso não é algo de menor importância, insignificante,
desprezível. Ao contrário, detalhar as regras do jogo, fazer esse detalhamento diz respeito
ao exercício de uma prerrogativa fundamental nossa, somente nossa, de estabelecer as
regras que presidirão as eleições, com um efeito muito importante: a diminuição da
judicialização da política. Detalhar significa diminuir a margem interpretativa, diminuir
as arbitrariedades, diminuir a subjetividade de cada juiz que trabalha com a matéria
eleitoral no nosso País (BRASIL. CÂMARA DOS DEPUTADOS. 08 jul. 2009, p. 34.059).
Até o dia 5 de março do ano da eleição, o Tribunal Superior Eleitoral, atendendo ao caráter
regulamentar e sem restringir direitos ou estabelecer sanções distintas das previstas nesta Lei,
poderá expedir todas as instruções necessárias para sua fiel execução, ouvidos, previa
mente, em audiência pública, os delegados ou representantes dos partidos políticos (grifo
dos autores).16
16
A substituição do termo “expedirá”, constante na forma original, por “poderá expedir”, visava a eliminar a
obrigatoriedade da emissão das Resoluções.
O interesse também pode ser atestado pelo alto grau de consenso que ela alcançou:
a redação aprovada constava na versão original e recebeu poucas emendas (BRASIL.
CÂMARA DOS DEPUTADOS. 2009). Cabe lembrar que o PL nº 5.498/09 tocava em
questões-chave para todos os parlamentares, motivo porque, apesar de chancelado pelos
líderes de 13 partidos e de conter uma série de acordos, ele mereceu muitas emendas,
implicou ajustes e novas negociações até conseguir os votos para ser aprovado. Tal não
se mostrou necessário na questão em apreço.
O PL recebeu 136 emendas na Câmara dos Deputados, mas somente três abor
daram a prestação de contas. A nº 92, de autoria de Leonardo Villela (PSDB-GO), pro
punha a supressão da “inexistência de multas” e da “prestação de contas” dentre os
elementos exigidos para a Quitação Eleitoral, pois implicavam “ampliação indevida” do
conceito. As outras duas – nº 105, de Odair Cunha (PT-MG) e nº 120, de Vital do Rego
Filho (PMDB-PB) – buscavam incluir a necessidade de aprovação das contas. Todas
foram rejeitadas pelo relator Dep. Flávio Dino (PCdoB-MA) (BRASIL. CÂMARA DOS
DEPUTADOS. 09 jul. 2009, p. 34.526; 34.541-34.542; 34.567). Ao tramitar no Senado, como
PLC nº 141/09, houve apenas uma emenda relativa ao tema, de autoria de Álvaro Dias
(PSDB-PR), que fixava a obrigatoriedade da aprovação das contas. Ela também não foi
acatada (BRASIL. SENADO FEDERAL, 2009a; 2009b; 2009c).
A primeira Resolução do TSE a abordar o tema após a promulgação da Lei
nº 12.034/09, a de nº 23.217/10, seguiu o texto legal e consagrou, no art. 26, §5º: “a não
apresentação de contas impede a obtenção de Certidão de Quitação Eleitoral no curso do
mandato ao qual o interessado concorreu”, e reafirmou:
Art. 41 – a decisão que julgar as contas eleitorais como não prestadas acarretará:
I – ao candidato, o impedimento de obter a Certidão de Quitação Eleitoral durante o curso
do mandato ao qual concorreu, persistindo os efeitos da restrição até a efetiva apresentação
das contas (grifo dos autores).17
17
É o mesmo texto-base utilizado desde a primeira Resolução sobre o tema, a de nº 21.833/04, com o acréscimo
introduzido pela Resolução nº 22.948/08 que tornava imprescritível a não prestação.
18
A partir da promulgação de Lei nº 12.034/09 as Resoluções do TSE relativas à escolha e ao registro dos candidatos
passaram a incorporar um parágrafo em que repetem a definição de Quitação Eleitoral fixada em lei. Contudo,
nem sempre se trata de repetição literal.
ela foi formulada pelo TSE ao redigir esta Resolução. É fato que o termo não está ausente
da norma, mas ele surge somente no art. 30, I, quando esta trata da decisão acerca das
contas prestadas, que são consideradas aprovadas, “quando estiverem regulares”. Ao
investir nessa ambiguidade, a Resolução nº 23.221/10 cimentou o caminho para modificar
a interpretação da lei e exigir que as contas fossem aprovadas.
Em maio de 2010, por meio Processo Administrativo 59459-DF, de iniciativa
da Corregedoria-Geral Eleitoral, o TSE se defrontou com a situação dos candidatos
cuja prestação de contas do pleito de 2008 havia sido rejeitada. Conforme a Resolução
vigente à época (nº 22.715/08), eles figuravam no cadastro eleitoral como impedidos de
receber a Certidão de Quitação Eleitoral e, consequentemente, de concorrer em 2010.
Contudo, a Lei nº 12.034, vigente desde setembro de 2009, definiu que, ressalvado os
demais requisitos exigidos, quem a havia entregado no prazo legal estava em condições
de receber a Certidão. Na prática, como a lei não explicitava a anistia das penalidades
até então aplicadas, o que estava em discussão era se o entendimento fixado por ela
retroagia ou se prevalecia a norma em vigor naquela oportunidade e as punições dela
decorrentes.
A decisão do TSE foi tomada em três de agosto de 2010, em uma votação apertada
(4 a 3). A Corte não se restringiu a apreciar a situação narrada acima, e sim se debruçou
sobre o novo teor do §7º do art. 11 da Lei nº 9.504/97 e entendeu existir margem para
interpretar que as contas de campanha deviam ser aprovadas para a obtenção da
Quitação Eleitoral. Em outros termos, o TSE reafirmou a determinação contida na
Resolução nº 22.715/08 e manteve a impossibilidade de os candidatos cuja prestação de
2008 fora rejeitada alcançarem a condição necessária para concorrer em 2010.
Assim como em 2008, o principal argumento a sustentar esta posição indicava que
a norma legal não podia ser interpretada literalmente, pois, nesse caso, era inegável a
exigência da mera prestação de contas. Ela devia ser analisada em razão de sua finalidade
maior, que era a de garantir a regularidade da arrecadação e dos gastos de recursos nas
campanhas. Em decorrência, era preciso uma interpretação extensiva e teleológica do
texto, a qual revelava como mens legis a necessidade da aprovação das contas prestadas
(BRASIL. TSE. 2010a). A posição contrária afirmava que, no caso em questão, não cabia
a interpretação extensiva, pois o texto era claro e, consequentemente, qualquer avanço
para construir outro sentido era indevido e implicava legislar em lugar do parlamento.
Contudo, o REspe 442.363/10 fez com que, em setembro de 2010, o Tribunal deba
tesse novamente o assunto, agora em sede judicial, ao se defrontar com um caso concreto
decorrente da decisão tomada. Ao longo dessa discussão foi apresentado um argumento
novo: o Ministro-relator Arnaldo Versiani interpretou que o adjetivo “regular” associado
à “apresentação”, presente na Resolução nº 23.221/10, não evocava a necessidade de
as contas serem aprovadas para configurar a Quitação Eleitoral, e sim que a prestação
devia conter todos os elementos necessários ao seu exame (BRASIL. TSE. 2010b). Nessa
perspectiva, as contas não podem ser consideradas prestadas simplesmente pelo fato
de terem sido protocoladas na Justiça Eleitoral, no prazo estabelecido pela legislação.
Para que possam ser assim consideradas, candidato, comitê financeiro ou partido têm
de cumprir determinados procedimentos e anexar uma série de documentos. E, como
estabelecido pela Lei nº 12.034/09, o processo só se completa quando a Justiça Eleitoral
assim se manifesta, ou seja, diz que as contas apresentadas podem ser apreciadas. Agra
(2010, p. 18) concorda com o ponto destacado pelo Ministro Versiani, ou seja, que o
Art. 26 (...)
§6º Também consideram-se não apresentadas as contas quando a respectiva prestação
estiver desacompanhada de documentos que possibilitem a análise dos recursos arreca
dados e dos gastos de campanha e cuja falta não seja suprida após o prazo de 72 horas,
contado da intimação do responsável.
Art. 46. Apresentada a prestação de contas, se o número de controle gerado pelo sistema
no disquete for idêntico ao existente nas peças por este impressas, o cartório emitirá o
correspondente recibo de recebimento da prestação de contas.
Parágrafo único. Se houver divergência entre o número de controle constante das peças
impressas e o constante do disquete; inconsistência, ausência de dados ou falha de leitura
do disquete; ausência do número de controle nas peças impressas; ou, ainda, qualquer
outra falha que impeça a recepção das contas na base de dados da Justiça Eleitoral, essas
deverão ser reapresentadas na forma descrita no artigo anterior.
Art. 51 (...)
IV (...)
a) não apresentados, tempestivamente, as peças e documentos de que trata o art. 40 desta
Resolução;
b) não reapresentadas as peças que as compõem, nos termos previstos no §2º do art. 45
e no art. 47 desta Resolução;
c) apresentadas desacompanhadas de documentos que possibilitem a análise dos recursos
arrecadados e dos gastos realizados na campanha.
§1º Também serão consideradas não prestadas as contas quando elas estiverem
desacompanhadas de documentos que possibilitem a análise dos recursos arrecadados
e dos gastos de campanha e cuja falta não seja suprida no prazo de 72 horas, contado da
intimação do responsável.
Ao apreciar o caso trazido pelo REspe 442.363/10, o TSE modificou outra vez
o seu entendimento, sendo que, novamente, a questão foi decidida por 4 votos a 3.
Desse modo, estabeleceu que, para as eleições de 2010, não seria exigido que as contas
estivessem aprovadas. A decisão não produziu nenhuma normativa específica, tendo
continuado vigente a necessidade da “apresentação regular de contas de campanha
eleitoral”, constante na Resolução nº 23.221/10, agora (ou novamente) compreendida
como ausência da obrigatoriedade de aprovação.
Nessa perspectiva, a Resolução nº 23.373/11 trazia esta determinação no art. 27,
§3º, em texto idêntico ao da nº 23.221/10, apenas com a supressão do termo “regular”,
detalhe não desprezível, tendo em vista as divergentes decisões do TSE do ano anterior.
Todavia, ao contrário do que se possa imaginar, a questão não estava pacificada.
O TSE pôs o assunto em pauta ao discutir as regras para o pleito de 2012, decidindo,
novamente por 4 a 3, que não bastava a apresentação das contas de campanha para
liberação da Certidão de Quitação Eleitoral, sendo necessária que esta fosse aprovada.
Logo, a Resolução nº 23.376/12, art. 52, §2º, fixa: “(...), a decisão que desaprovar as contas
de candidato implicará o impedimento de obter a Certidão de Quitação Eleitoral” (grifo
dos autores).
Conhecedor do histórico das decisões, o TSE atentou para detalhes que, por
não terem sido considerados em 2004 e em 2008, inviabilizaram que a medida fosse
implantada imediatamente naquelas oportunidades. Desse modo, desconsiderou o
princípio da irretroatividade e definiu que a exigência teria efeito imediato, de modo
a excluir da condição de terem a Certidão de Quitação Eleitoral todos os candidatos
cujas contas de campanhas precedentes haviam sido rejeitadas. Com a mesma atenção,
preferiu não incluir a modulação dos efeitos dessa desaprovação.
Com este entendimento o TSE pôs por terra ponderação como a de Silva (2012),
segundo o qual, como a Resolução disciplina a eleição de 2012, as contas desaprovadas
a que faz referência são as relativas a este pleito, o que é corroborado pelo tempo verbal
adotado: “a decisão que desaprovar” “implicará”, ou seja, produzirá efeitos no futuro.
Para o autor,
se a intenção do TSE era de atingir fatos pretéritos, deveria ter incluído no texto comando
expresso neste sentido, utilizando os tempos verbais mais adequados como “os candidatos
que tiveram (passado) contas de quaisquer campanhas desaprovadas pela Justiça Eleitoral
estão (presente) impedidos de obter a Quitação Eleitoral” (SILVA, 2012, p. 4).
Art. 11 (...)
§8º Para fins de expedição da Certidão de que trata o §7º, considerar-se-ão quites aqueles
que:
III – apresentarem à Justiça Eleitoral a prestação de contas de campanha eleitoral nos termos
desta Lei, ainda que as contas sejam desaprovadas. (BRASIL. CÂMARA DOS DEPUTADOS.
2012a) (grifo dos autores).
19
O PL do deputado Balestra não foi o único, e nem o primeiro, a ser apresentado após a decisão do TSE.
O deputado Pauderney Avelino (DEM-AM) encaminhou, em 06 de março de 2012, o PL nº 3.356, que pretendia
consagrar a interpretação da Justiça Eleitoral, ao propor que a Certidão de Quitação Eleitoral abrangerá
exclusivamente “a apresentação e a aprovação de contas de campanha eleitoral”. A tramitação se encerrou na
CCJ, sem que um relatório tenha sido apresentado e ele foi arquivado (BRASIL. CÂMARA DOS DEPUTADOS.
2012b).
Art. 53. A decisão que julgar as contas eleitorais como não prestadas acarretará:
I – ao candidato, o impedimento de obter a Certidão de Quitação Eleitoral até o final da
legislatura, persistindo os efeitos da restrição após esse período até a efetiva apresentação
das contas.
20
No caso, as resoluções nºs 23.405/14 (art. 27, § 6º), 23.406/14 (art. 58, I), 23.455/15 (art. 27, §2º) e 23.463/15
(art. 73, I).
A ADI tem como relator o Ministro Luiz Fux, que não concedeu a medida cautelar
solicitada, de modo que os objetivos do MPF ainda não foram atendidos. Mas a questão
permanece em aberto, pois a ADI ainda não foi apreciada pelo pleno do STF. Quando o
for, há a possibilidade de o pedido ser acolhido pela Corte, o que implicará a reversão da
exigência em vigor de as contas serem tão somente prestadas para a emissão da Certidão
de Quitação Eleitoral e, a depender da decisão, a fixação da necessidade de aprovação.21
Na instrução do processo, ainda em 2013, manifestaram-se Congresso Nacional,
Consultoria-Geral da União e Advocacia-Geral da União (AGU), e todos discordaram da
pretensão do MPF. As alegações foram que o dispositivo legal era claro e que a pretensão
da ADI alargava demasiadamente o espectro de abrangência da norma; revelava mera
discordância com o teor da decisão tomada pelo legislativo e desconsiderava o fato que
este detém a competência constitucional para decidir sobre o assunto e não a utilizara em
contrariedade à Constituição (BRASIL. CONGRESSO NACIONAL, 2013. AGU, 2013).
21
Nessa hipótese, arrisca-se a dizer que muito provavelmente o PL nº 3.839/12, proposto pelo deputado Balestra,
e hoje em stand by no Senado Federal, entrará na pauta de deliberações do Congresso Nacional, de modo a
reverter legalmente a interpretação do STF.
está pacificada na Justiça Eleitoral e vem sendo aplicada em torno da necessidade tão
somente da apresentação das contas no prazo legal, embora ainda padeça de análise
pelo STF uma ADI que deseja que a lei seja interpretada no sentido da exigência da
aprovação das contas. Em outros termos: caso a decisão do STF atenda o pedido, a
polêmica pode ressurgir.
A título de sistematização desse manancial de decisões sobre o tema, o quadro
abaixo resume como a questão figurou nas Resoluções do TSE e na Lei nº 12.034/09,
desde o seu surgimento, em 2004, e até as mais recentes deliberações, relativas ao pleito
de 2016.
(a) Inclui o §7º ao art. 11 da Lei nº 9.504/97; (b) Acrescenta o parágrafo único ao art. 57 da Resolução
nº 21.609/04; (c) Acrescido pela Resolução nº 22.948/08; (d) Excluída pela Resolução nº 23.383/12
Fonte: TSE
Referências
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Acesso em: 08 dez. 2017.
22
Aqui há uma diferença: “legislatura” implica quatro anos e é comum a todos os cargos; “mandato” envolve
punição mais longa para candidatos a senador, posto que dura oito anos.
BRASIL. TSE. Resolução 23.406, de 27 fev. 2014. Disponível em: < http://www.tse.jus.br/eleitor-e-eleicoes/
eleicoes/eleicoes-anteriores/eleicoes-2014/normas-e-decisoes/normas-e-documentacoes/resolucao-no-23.406>.
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AGRA, Walber de Moura (Coord.); PECCININ, Luiz Eduardo (Org.). Propaganda Eleitoral. Belo Horizonte:
Fórum, 2018. p. 275-297. (Tratado de Direito Eleitoral, v. 4.) ISBN 978-85-450-0499-8.
5.1 Introdução
O presente trabalho está diretamente vinculado e é desdobramento de nossa
pesquisa para realização de trabalho de conclusão de graduação realizada no ano de
2012, que foi posteriormente publicada na Revista Brasileira de Direito Eleitoral (RBDE)
sob o título “Apresentação x aprovação de contas de campanha – O Tribunal Superior
Eleitoral e uma análise principiológica da forma de obtenção da certidão de quitação
eleitoral”.1 Ali sustentamos que era necessária a aprovação das contas de campanha
para que fosse possível a posterior emissão da certidão de quitação eleitoral. Passados
cinco anos do trabalho inicial, duas pós-graduações (uma lato e outra stricto sensu), mais
reflexões e estudos acerca de Direito Eleitoral e Constitucional, temos que o trabalho
originário merece ser criticado e algumas ponderações sobre ele serão feitas aqui.2
Embora desde as eleições de 2012 o tema tenha encontrado horizontes mais
pacíficos tanto na jurisprudência quanto na doutrina, até ali as posições eram muito
divergentes e variáveis, levando considerável insegurança jurídica a todos os atores
das disputas eleitorais.
1*
Agradeço às ponderações e revisões de cunho técnico efetuadas pelos Especialistas em Direito Eleitoral
Marcos Marins Guimarães e Pedro Alves Lira Filho, ambos servidores da Justiça Eleitoral (em MG e no PI,
respectivamente). Agradeço também aos ensinamentos do Professor Doutor Rodolfo Viana Pereira, que me
instigaram a continuar refletindo a respeito do tema.
SOUSA
DE BARROS, Tarcísio Augusto. Apresentação x aprovação de contas de campanha: o Tribunal Superior
Eleitoral e uma análise principiológica da forma de obtenção da certidão de quitação eleitoral. Revista Brasileira
de Direito Eleitoral – RBDE, Belo Horizonte, ano 5, n. 8, p. 197-217, jan./jun. 2013.
2
Embora tenha enfrentado temas como a constitucionalidade do poder normativo do Tribunal Superior Eleitoral
no primeiro artigo, não o faremos neste, cujo objetivo é versar única e exclusivamente da apresentação (ou não)
das contas de campanha para fins de obtenção da certidão de quitação eleitoral.
Até o ano de 2004, para a obtenção da certidão de quitação eleitoral apenas era
exigível a regular votação na eleição anterior ou o pagamento da multa pela ausência do
voto.3 Para as eleições de 2004, contudo, o TSE expediu a Resolução/TSE nº 21.609/2004,
segundo a qual “a não-apresentação de contas de campanha impede a obtenção de certidão
de quitação eleitoral no curso do mandato ao qual o interessado concorreu” (no art. 57,
parágrafo único); a partir de então, exigia-se a apresentação das contas de campanha.
Esse entendimento não foi alterado para as eleições de 2006, oportunidade em
que o TSE expediu a Resolução/TSE nº 22.250/2006, que estabelecia (art. 42, §1º) que
“a não-apresentação de contas de campanha impede a obtenção de certidão de quitação
eleitoral no curso do mandato ao qual o interessado concorreu”.
Entre 2004 e 2006, então, o Tribunal Superior Eleitoral apenas tratava sobre a
“não-apresentação”. Em 2008, contudo, o Min. Ari Pargendler militou pelo entendimento
da necessidade de aprovação das contas de campanha, e o TSE definiu, novamente por
resolução, que “a decisão que desaprovar as contas de candidato implicará o impedi
mento de obter a certidão de quitação eleitoral durante o curso do mandato ao qual
concorreu” (art. 41, §3º, Res. 22.715/2008). Mesmo com a previsão em Resolução para as
eleições de 2008, fundamentando na impossibilidade de retroatividade da norma jurídica
para eleições anteriores a 2008, o TSE proferiu entendimento – em decorrência do PA
nº 19.899 (Resolução nº 22.948), de relatoria do próprio Min. Ari Pargendler – segundo
o qual a mudança de orientação jurisprudencial (necessidade de aprovação) apenas
surtiria efeitos na obtenção da certidão de quitação eleitoral para as eleições seguintes,
de 2010 em diante.4
Antes do pleito de 2010, no entanto, a Lei nº 12.034/2009 incluiu no art. 11 da Lei
nº 9.504/1997 o seguinte:
3
BRASIL. Tribunal Superior Eleitoral. Processo Administrativo nº 594-59.2010.6.00.0000. Disponível em: <http://
www.tse.jus.br/jurisprudencia/inteiro-teor>. Acesso em: 11 jul. 2012. p. 23.
4
BRASIL. Tribunal Superior Eleitoral. Processo Administrativo nº 594-59.2010.6.00.0000. Op. Cit. p. 6.
5
BRASIL. Tribunal Superior Eleitoral. Processo Administrativo nº 594-59.2010.6.00.0000. Op. Cit.
Mesmo com toda a divergência citada, tanto em 2010, quanto em 2012, 2014 e
2016 o entendimento que prevaleceu foi o de necessidade de apenas apresentar as contas
de campanha para fins de obter certidão de quitação eleitoral. Ainda vige o §7º do
art. 11 da Lei nº 9.504/1997 tal qual incluído pela Lei nº 12.034/2009 e recentemente7 o
Tribunal Superior Eleitoral sumulou o entendimento: “Súmula nº 57/TSE: A apresentação
das contas de campanha é suficiente para a obtenção da quitação eleitoral, nos termos
da nova redação conferida ao art. 11, §7º, da Lei nº 9.504/97, pela Lei nº 12.034/2009”.8
6
BRASIL. Tribunal Superior Eleitoral. Recurso Especial Eleitoral nº 4423-63.2010.6.21.0000. Disponível em: <http://
www.tse.jus.br/jurisprudencia/inteiro-teor>. Acesso em: 29 nov. 2017.
7
Publicação no DJE de 24, 27 e 28.6.2016.
8
BRASIL. Tribunal Superior Eleitoral. Súmula-TSE nº 57. Disponível em: <http://www.tse.jus.br/legislacao/
codigo-eleitoral/sumulas/sumulas-do-tse/sumula-tse-no-57>. Acesso em: 01 dez. 2017.
9
ARAÚJO, Mayara de Carvalho. DO JUDICIARIO QUE TEMOS AO JUDICIARIO QUE QUEREMOS: o grande
desafio da cidadania no Brasil. In: CONPEDI; UNICURITIBA. (Org.). Acesso à justiça I. 1ed. Florianópolis:
FUNJAB, 2013. p. 7-29. p. 9.
10
ARAÚJO, Mayara de Carvalho. Op. cit. p. 9.
11
ARAÚJO, Mayara de Carvalho. Op. cit. p. 9-10.
12
ARAÚJO, Mayara de Carvalho. Op. cit. p. 10.
13
ARAÚJO, Mayara de Carvalho. Op. cit. p. 10.
14
ARAÚJO, Mayara de Carvalho. Op. cit. 10-12.
15
ARAÚJO, Mayara de Carvalho. Op. cit. p. 10. De forma resumida, assim trata a autora sobre os três elementos:
elemento civil – “o elemento civil corresponde aos direitos relacionados à liberdade individual e ao direito à
justiça. Sua compreensão, por isso, excede a noção tradicional de direitos civis, à medida que não só contempla o
direito à justiça, mas também confere a este direito um patamar diferenciado”; elemento político – “O elemento
político, por sua vez, equivale ao direito de participar das decisões políticas, seja na condição de membro de
alguma instituição dotada deste poder (MARSHALL, 1963, p. 63), seja por intermédio do voto e dos demais
meios de participação democrática semidireta, como plebiscitos, referendos e legislação participativa”; elemento
social – “o elemento social representaria o que concebemos hoje por direitos sociais. Segundo Marshall (1963,
p. 63-64), ‘o elemento social se refere a tudo o que vai desde o direito a um mínimo de bem-estar econômico e
segurança ao direito de participar, por completo, na herança social e levar a vida de um ser civilizado de acordo
com os padrões que prevalecem na sociedade’” (ARAÚJO, Mayara de Carvalho. Op. cit. p. 10-11.).
16
COSTA, Adriano Soares da. Instituições de direito eleitoral. 9. ed. rev. ampl. e atual. Belo Horizonte: Fórum, 2013.
p. 38.
17
COSTA, Adriano Soares da. Op. cit. p. 35.
18
COSTA, Adriano Soares da. Op. cit. p. 36.
19
COSTA, Adriano Soares da. Op. cit. p. 36.
20
COSTA, Adriano Soares da. Op. cit. p. 37. Em respeito às lições do autor, vale frisar a ressalva já feita: Adriano
Soares da Costa identifica dois planos do conceito de cidadania, sendo eles o plano político (ideológico) e
jurídico, enfatizando em seu trabalho a conceituação a partir deste último.
21
SILVA, José Afonso da. Curso de Direito Constitucional Positivo. 37. ed. rev. atual. São Paulo: Malheiros, 2014.
p. 106.
22
SILVA, José Afonso da. Op. cit. p. 106.
23
SILVA, José Afonso da. Op. cit. p. 350.
24
SILVA, José Afonso da. Op. cit. p. 351.
25
GOMES, José Jairo. Direito Eleitoral. 12. ed. São Paulo: Atlas, 2016. p. 58.
26
GOMES, José Jairo. Op. cit. p. 58. Ainda no mesmo sentido ESMERALDO, Elmana Viana Lucena. Manual dos
candidatos e partidos políticos. Leme: J. H. Mizuno, 2013. p. 37.
27
GOMES, José Jairo. Op. cit. p. 162.
28
GOMES, José Jairo. Op. cit. p. 168.
29
GOMES, José Jairo. Op. cit. p. 162.
30
“Galgar” em razão de a candidatura não ser decorrência natural do alistamento, tal qual o é o direito de votar.
31
Dois renomados eleitoralistas brasileiros tratam sobre essas condições de elegibilidade, registrabilidade e
causas de inelegibilidade. São eles: Rodolfo Viana Pereira e Adriano Soares da Costa, nas suas obras citadas
no presente trabalho. Cada um apresenta sua teoria a respeito do tema, Pereira focando da registrabilidade e
Costa nas inelegibilidades. São visões peculiares e bem fundamentadas, pelo que recomendamos fortemente a
leitura. De maneira sucinta, iremos expor aqui dois conceitos básicos trabalhados por Rodolfo que se amoldam
à doutrina eleitoral majoritária: “As condições de elegibilidade estão descritas no artigo 14, §3º da CR/88 e
traduzem os requisitos a serem cumpridos, condições positivas a serem preenchidas”; “as denominadas causas
de inelegibilidade podem ser tanto de matriz constitucional, quanto infraconstitucional. As primeiras estão
previstas no artigo 14, §§4º a 8º, da CR/88 e, as segundas, na Lei Complementar nº 64/90, por autorização do
artigo 14, §9º da CR/88”. PEREIRA, Rodolfo Viana. Condições de registrabilidade e condições implícitas de
elegibilidade: esses obscuros objetos do desejo. In: SANTANO, Ana Cláudia; SALGADO, Eneida Desiree. Direito
eleitoral: debates ibero-americanos / compilação. Curitiba: Íthala, 2014. p. 279-280. As causas de inelegibilidade são os
“requisitos negativos” nos quais os cidadãos não podem incidir para poderem se candidatar.
32
PEREIRA, Rodolfo Viana. Condições de registrabilidade e condições implícitas de elegibilidade: esses obscuros
objetos do desejo. Op. cit. p. 280-281.
33
PEREIRA, Rodolfo Viana. Condições de registrabilidade e condições implícitas de elegibilidade: esses obscuros
objetos do desejo. Op. cit. p. 280.
34
BRASIL. Tribunal Superior Eleitoral. Glossário. Certidão de quitação eleitoral. Disponível em: <http://www.tse.jus.
br/eleitor-e-eleicoes/glossario/termos-iniciados-com-a-letra-c#certidao-de-quitacao-eleitoral>. Acesso em: 04
dez. 2017. Ainda pelas definições do Tribunal Superior Eleitoral: “A Certidão de Quitação Eleitoral destina-se a
atestar, conforme disciplinado pelo §7º do art. 11 da Lei nº 9.504, de 1997, a existência/inexistência de registro
no histórico da inscrição (título) do interessado no cadastro eleitoral de restrição no que se refere à plenitude
do gozo dos direitos políticos, ao regular exercício do voto, ao atendimento a convocações da Justiça Eleitoral
para auxiliar os trabalhos relativos ao pleito, à inexistência de multas aplicadas, em caráter definitivo, pela
Justiça Eleitoral e não remitidas, e à apresentação de contas de campanha eleitoral”. BRASIL. Tribunal Superior
Eleitoral. Certidão de quitação eleitoral. Disponível em: <http://www.tse.jus.br/eleitor-e-eleicoes/certidoes/
certidao-de-quitacao-eleitoral>. Acesso em: 04 de dez. 2017.
35
Cumpre frisar que os termos cidadania ativa e passiva estão sendo utilizados a partir dos conceitos anteriormente
expostos, que podem, e já o são, melhor elaborados.
36
PEREIRA, Rodolfo Viana. Condições de registrabilidade e condições implícitas de elegibilidade: esses obscuros
objetos do desejo. Op. cit. p. 280.
37
A Quinta Turma do Tribunal Regional Federal da 1ª Região já decidiu sobre a matéria (TRF-1 – AMS: 48610
DF 2004.34.00.048610-0, Relator: DESEMBARGADOR FEDERAL FAGUNDES DE DEUS, Data de Julgamento:
06/09/2006, QUINTA TURMA, Data de Publicação: 28.09.2006 DJ p.85), entendendo ser desnecessária a certidão
em específico, bastando o comprovante de votação ou pagamento da multa.
38
A Lei nº 9.504/1997 continua o detalhamento sobre quitação eleitoral no art. 11, §§8º e 9º: “§8º Para fins de
expedição da certidão de que trata o §7º, considerar-se-ão quites aqueles que: I – condenados ao pagamento de
multa, tenham, até a data da formalização do seu pedido de registro de candidatura, comprovado o pagamento
ou o parcelamento da dívida regularmente cumprido; II – pagarem a multa que lhes couber individualmente,
excluindo-se qualquer modalidade de responsabilidade solidária, mesmo quando imposta concomitantemente
com outros candidatos e em razão do mesmo fato. III – o parcelamento das multas eleitorais é direito dos
cidadãos e das pessoas jurídicas e pode ser feito em até sessenta meses, salvo quando o valor da parcela
ultrapassar 5% (cinco por cento) da renda mensal, no caso de cidadão, ou 2% (dois por cento) do faturamento,
no caso de pessoa jurídica, hipótese em que poderá estender-se por prazo superior, de modo que as parcelas
não ultrapassem os referidos limites; IV – o parcelamento de multas eleitorais e de outras multas e débitos de
natureza não eleitoral imputados pelo poder público é garantido também aos partidos políticos em até sessenta
meses, salvo se o valor da parcela ultrapassar o limite de 2% (dois por cento) do repasse mensal do Fundo
Partidário, hipótese em que poderá estender-se por prazo superior, de modo que as parcelas não ultrapassem
o referido limite. §9º A Justiça Eleitoral enviará aos partidos políticos, na respectiva circunscrição, até o dia 5 de
junho do ano da eleição, a relação de todos os devedores de multa eleitoral, a qual embasará a expedição das
certidões de quitação eleitoral”.
Todo candidato e partido político (em todos os níveis, nacional, estadual e municipal)
deve prestar contas de campanha, esclarecendo à Justiça Eleitoral e aos eleitores em geral,
quem foram os seus doadores, a quantidade de recursos arrecadados e os gastos efetuados
durante a campanha e demais dados exigidos pela legislação eleitoral.40
(…) qual a validade constitucional da imposição, por lei ordinária ou por resolução, de
novos requisitos ao registro de candidatura que não derivam do mandamento consti
tucional? Pode o legislador ordinário, com fundamento na autorização legislativa
prevista no art. 14, §3º, da CR/88 expandir as condições de elegibilidade? Ademais, pode
o magistrado pressupor a existência de condições implícitas, extraindo-se indiretamente
da Constituição de 1988?45
39
Aqui é importante destacar a crítica de Margarete de Castro Coelho: a Justiça Eleitoral brasileira “tem adotado
uma postura excessivamente ativista, não só quando decide para muito além (ou aquém) do que dispôs o
legislador”, mas no exercício da sua função regulamentar [normativa], “não se contenta apenas em ditar regras
para a ‘fiel execução’ das lei e, verdadeiramente, inova o ordenamento jurídico, introduzindo novas regras
sobre matérias, cuja competência legislativa a Constituição reserva ao Poder Legislativo” (COELHO, Margarete
de Castro. Sobre o envolvimento de instituições judiciais em disputas políticas: o papel da Justiça Eleitoral
Brasileira. In: SANTANO, Ana Cláudia; SALGADO, Eneida Desiree. Direito eleitoral: debates ibero-americanos
/ compilação. Curitiba: Íthala, 2014. p. 15-24. p. 15. A mesma crítica também pode ser vista em ESPÍNDOLA,
Ruy Samuel. Justiça Eleitoral contramajoritária e soberania popular – a democrática vontade das urnas e a
autocrática vontade judicial que a nulifica. In: Revista Brasileira de Direito Eleitoral. ano 5, n. 8, (jan./jun.2013).
p. 121-144. Belo Horizonte: Fórum, 2009.).
40
ESMERALDO, Elmana Viana Lucena. Manual de contas eleitorais. Belo Horizonte: Fórum, 2016. p. 147.
41
GOMES, José Jairo. Op. cit. p. 411.
42
ESMERALDO, Elmana Viana Lucena. Manual de contas eleitorais. Op. cit. p. 148.
43
PEREIRA, Rodolfo Viana. Condições de registrabilidade e condições implícitas de elegibilidade: esses obscuros
objetos do desejo. Op. cit. p. 281.
44
PEREIRA, Rodolfo Viana. Condições de registrabilidade e condições implícitas de elegibilidade: esses obscuros
objetos do desejo. Op. cit. p. 281.
45
PEREIRA, Rodolfo Viana. Condições de registrabilidade e condições implícitas de elegibilidade: esses obscuros
objetos do desejo. Op. cit. p. 282.
46
Súmula nº 42 do Tribunal Superior Eleitoral: A decisão que julga não prestadas as contas de campanha impede
o candidato de obter a certidão de quitação eleitoral durante o curso do mandato ao qual concorreu, persistindo
esses efeitos, após esse período, até a efetiva apresentação das contas.
47
Nos termos do §3º do art. 26 da Lei nº 9.504/1997, não são consideradas gastos eleitorais nem se sujeitam a
prestação de contas as seguintes despesas de natureza pessoal do candidato: combustível e manutenção de
veículo automotor usado pelo candidato na campanha; remuneração, alimentação e hospedagem do condutor
do veículo usado pelo candidato; alimentação e hospedagem do candidato; uso de linhas telefônicas registradas
em seu nome como pessoa física, até o limite de três linhas.
48
Aqui é importante destacar que se trata de remuneração / gratificação em razão de serviço prestado à candidatura
e/ou à comitê eleitoral, sendo expressamente vedadas doações em dinheiro, bem como de troféus, prêmios,
ajudas de qualquer espécie feitas por candidato, entre o registro e a eleição, a pessoas físicas ou jurídicas (§5º do
art. 23 da Lei nº 9.504/1997).
49
GOMES, José Jairo. Op. cit. p. 433.
50
GOMES, José Jairo. Op. cit. p. 432.
51
Diz-se ordinariamente porque o legislador eleitoral trouxe, a partir da Lei nº 13.165 de 2015, a possibilidade
de Sistema Simplificado de Prestação de Contas (SSPC), para fins de, em casos expressamente previstos na Lei
nº 9.504/1997, conferir celeridade ao processo de prestação de contas. No entanto, mesmo o SSPC observará as
regras gerais que analisaremos neste trabalho.
§2º Erros formais e materiais corrigidos não autorizam a rejeição das contas e a cominação
de sanção a candidato ou partido.
§2º-A Erros formais ou materiais irrelevantes no conjunto da prestação de contas, que não
comprometam o seu resultado, não acarretarão a rejeição das contas.
52
GOMES, José Jairo. Op. cit. p. 447.
Note-se que a só aprovação das contas, com ou sem ressalvas, não afasta a discussão
acerca da ocorrência de abuso de poder, mormente se novos elementos probatórios forem
descortinados, bem como o eventual ajuizamento de ação eleitoral com essa finalidade.53
53
GOMES, José Jairo. Op. cit. p. 447. Assim também, ESMERALDO, Elmana Viana Lucena. Manual de contas
eleitorais. Op. cit. p. 228.
Art. 30-A Qualquer partido político ou coligação poderá representar à Justiça Eleitoral,
no prazo de 15 (quinze) dias da diplomação, relatando fatos e indicando provas, e pedir
a abertura de investigação judicial para apurar condutas em desacordo com as normas
desta Lei, relativas à arrecadação e gastos de recursos.
§1º Na apuração de que trata este artigo, aplicar-se-á o procedimento previsto no art. 22
da Lei Complementar no 64, de 18 de maio de 1990, no que couber.
§2º Comprovados captação ou gastos ilícitos de recursos, para fins eleitorais, será negado
diploma ao candidato, ou cassado, se já houver sido outorgado.
§3º O prazo de recurso contra decisões proferidas em representações propostas com base
neste artigo será de 3 (três) dias, a contar da data da publicação do julgamento no Diário
Oficial.
Desse modo, a representação do art. 30-A pode ser proposta por qualquer partido
político ou coligação, além dos próprios candidatos54 e Ministério Público (legitimidade
ativa), no prazo de até quinze dias da diplomação (termo final), para apurar condutas
que versem sobre arrecadação e/ou gasto ilícito de recursos (hipóteses de cabimento),
sob o procedimento disciplinado no art. 22 da Lei Complementar nº 64/1990 (rito).
Quanto ao termo inicial, o TSE decidiu que a representação prevista no art. 30-A da
Lei nº 9.504/1997 pode ser proposta antes mesmo da diplomação do candidato (RESPE
nº 1348-04, julgado em 15.12.2015), podendo, portanto, sê-lo desde o pedido de o pedido
de registro de candidatura.55 Ora, uma vez podendo ser proposta desde o requerimento
de candidatura, parece claro que a legitimidade passiva será de qualquer candidato
(não apenas eleitos e suplentes).
Entendemos que é a Representação do Art. 30-A da Lei nº 9.504/1977, e não o
processo de prestação de contas, o meio por excelência para apuração e punição das
irregularidades graves praticadas por candidatos e partidos políticos no que se refere
ao financiamento da sua campanha. Ora, “falhas, ainda que insanáveis, não revestidas
de gravidade, que não extrapolem o universo contábil, não são suficientes para atrair
a sua [da Representação] incidência”.56
Enquanto a prestação de contas se volta, prioritariamente, à análise contábil da
arrecadação e gastos de campanha – e sua análise fica, em regra, até aí adstrita -, o bem
jurídico protegido pela Representação do art. 30-A da Lei nº 9.504/997 é a lisura da cam
panha eleitoral,57 salvaguardando a higidez das campanhas e assegurando igualdade
financeira de disputa entre os concorrentes.58
Como consequência do seu julgamento procedente, a decisão condenatória na
Representação por Arrecadação e/ou Gasto Ilícito de Recursos de Campanha pode
negar o diploma, caso tenha sido proferida antes da diplomação, ou, caso o candidato
54
Para Elmana Viana Lucena Esmeraldo, o candidato não possui legitimidade ativa (ESMERALDO, Elmana
Viana Lucena. Manual de contas eleitorais. Op. cit. p. 271). Nosso entendimento diverge do da autora e converge
com o de José Jairo Gomes, para quem “o interesse e a legitimidade de qualquer candidato são intuitivos, pois,
como participante do pleito, deve zelar pela sua lisura. Ademais, o candidato pode ser diretamente prejudicado
pela captação ou gastos ilícitos de recursos levados a efeito por seu concorrente”. GOMES, José Jairo. Op. cit.
p. 717.
55
ESMERALDO, Elmana Viana Lucena. Manual de contas eleitorais. Op. cit. p. 276.
56
ESMERALDO, Elmana Viana Lucena. Manual de contas eleitorais. Op. cit. p. 268.
57
GOMES, José Jairo. Op. cit. p. 714.
58
ESMERALDO, Elmana Viana Lucena. Manual de contas eleitorais. Op. cit. p. 264.
59
GOMES, José Jairo. Op. cit. p. 720.
60
“j) os que forem condenados, em decisão transitada em julgado ou proferida por órgão colegiado da Justiça
Eleitoral, por corrupção eleitoral, por captação ilícita de sufrágio, por doação, captação ou gastos ilícitos de
recursos de campanha ou por conduta vedada aos agentes públicos em campanhas eleitorais que impliquem
cassação do registro ou do diploma, pelo prazo de 8 (oito) anos a contar da eleição;”
61
ESMERALDO, Elmana Viana Lucena. Manual de contas eleitorais. Op. cit. p. 277.
62
COSTA, Adriano Soares da. Op. cit. p. 422.
63
“Art. 22. Qualquer partido político, coligação, candidato ou Ministério Público Eleitoral poderá representar à
Justiça Eleitoral, diretamente ao Corregedor-Geral ou Regional, relatando fatos e indicando provas, indícios e
circunstâncias e pedir abertura de investigação judicial para apurar uso indevido, desvio ou abuso do poder
econômico ou do poder de autoridade, ou utilização indevida de veículos ou meios de comunicação social, em
benefício de candidato ou de partido político, obedecido o seguinte rito”
64
“Art. 14[Omissis]: §10 – O mandato eletivo poderá ser impugnado ante a Justiça Eleitoral no prazo de quinze
dias contados da diplomação, instruída a ação com provas de abuso do poder econômico, corrupção ou fraude”.
65
Adriano Soares da Costa também chama de “rito ordinário eleitoral” o do art. 3º da LC nº 64/1990 (COSTA,
Adriano Soares da. Op. cit. p. 348), muito embora, em outra passagem do seu livro, escreva que: “Não há um rito
ordinário na Lei Complementar, tampouco em nenhuma outra lei extravagante, senão no Código de Processo
Civil” (COSTA, Adriano Soares da. Op. cit. p. 421).
66
GOMES, José Jairo. Op. cit. p. 658.
67
Sobre abuso de poder no Direito Eleitoral, bem como sobre a sua necessidade de controle, indicamos:
SOUSA DE BARROS, Tarcísio Augusto. Poder político na Câmara dos Deputados: sobre distributivismo, seus
reflexos eleitorais e teoria do controle. 126f. Dissertação (Mestrado em Direito) – Programa de Pós-Graduação em
Direito, Universidade Federal de Minas Gerais, Minas Gerais. 2017; RIBEIRO, Fávila. Abuso de poder no direito
eleitoral. Rio de Janeiro: Forense, 1998; PEREIRA, Rodolfo Viana. Direito Constitucional Democrático: controle e
indevido e do (ii) desvio. Tal se dá em razão de que, conforme explica Eneida Desiree
Salgado, as disputas eleitorais, para serem iguais, devem ser protegidas de influências
irrelevantes ao processo, como poder político e/ou econômico,68 fatores indesejáveis69
à disputa eleitoral.
José dos Santos Carvalho Filho leciona que “uso do poder, portanto, é a utilização
normal, pelos agentes públicos, das prerrogativas que a lei lhes confere”,70 enquanto
“abuso de poder é a conduta ilegítima do administrador, quando atua fora dos objetivos
expressa ou implicitamente traçados na lei”.71 O abuso de poder é gênero cujas espécies
são o excesso de poder, quando “o agente atua fora dos limites de sua competência”,72
e desvio de poder, quando “o agente, embora dentro de sua competência, afasta-se do
interesse público que deve nortear todo o desempenho administrativo”.73
Para Fávila Ribeiro, “o abuso de poder, em síntese, consiste na incontinência,
na liberdade, no exercício de direito ou de competência funcional transviando-se em
desmando de uso”.74
A AIJE e a AIME são, portanto, as ações de Direito Eleitoral próprias para a inves
tigação de abuso de poder (dentre eles o econômico) e para, eventualmente, punição
dos envolvidos. No caso da AIJE, o inciso XIV do art. 22 da LC nº 64/1990 estabelece
que o julgamento de procedência da ação importa na declaração de inelegibilidade dos
investigados (o autor da conduta e eventuais partícipes, candidatos ou não) por oito
anos subsequentes à eleição na qual se praticou o ato ilícito, bem como na cassação do
registro ou diploma do candidato diretamente beneficiado. Diferentemente da AIJE e
nos termos da jurisprudência do TSE, na AIME não há a possibilidade de declaração
de inelegibilidade do mandatário e de quem estiver envolvido nas condutas; a AIME
apenas se presta a desconstituir (cassar) o mandato do candidato eleito, ou suplente,
através de condutas ilícitas (abuso de poder, corrupção ou fraude) assim reconhecidas
em decisão judicial.
Ao analisar se a ação prevista no art. 22 da LC nº 64/1990 (Ação de Investigação
Judicial Eleitoral) teria natureza investigativa-administrativa ou processual (ação de
direito material), Adriano Soares da Costa faz uma importante observação que serve
tanto para quem ingressa com a AIJE, quanto com a AIME e/ou a Representação do
Art. 30-A da Lei nº 9.504/1997:
Ora, quem vem a juízo com espeque no art. 22 da LC nº 64/90 não vem pedir que seja
aberto um inquérito de faceta administrativa, mas sim vem deduzir sua pretensão a que
o juiz decrete a inelegibilidade do réu [ou, no caso da AIME e da RP do 30-A, casse seu
participação como elementos fundantes e garantidores da constitucionalidade. 2. ed. Rio de Janeiro: Lumen Júris, 2010;
LOEWENSTEIN, Karl. Teoría de la Constitución. Barcelona: Ariel, 1979; SANTOS, Bruno Carazza dos. Interesses
econômicos, representação política e produção legislativa no Brasil sob a ótica do financiamento de campanhas eleitorais.
Tese (doutorado) – Universidade Federal de Minas Gerais, Faculdade de Direito. 2016.
68
SALGADO, Eneida Desiree. Princípios constitucionais eleitorais. Belo Horizonte: Fórum, 2010. p. 3-4.
69
SOUSA DE BARROS, Tarcísio Augusto. Poder político na Câmara dos Deputados: sobre distributivismo, seus reflexos
eleitorais e teoria do controle. Op. cit. p. 54.
70
CARVALHO FILHO, José dos Santos. Manual de direito administrativo. 23. ed. rev. ampl. e atual. Rio de Janeiro:
Lumen Juris, 2010. p. 48.
71
CARVALHO FILHO, José dos Santos. Op. cit. p. 50.
72
CARVALHO FILHO, José dos Santos. Op. cit. p. 51.
73
CARVALHO FILHO, José dos Santos. Op. cit. p. 51.
74
RIBEIRO, Fávila. Abuso de poder no direito eleitoral. Rio de Janeiro: Forense, 1998. p. 22.
diploma], daquele apontado para figurar no povo passivo da relação processual (…)
Logo, instala-se um contraditório, dando-se oportunidade a que o demandado deduza
sua contestação (defesa), além das dilações probatórias que visam a demonstrar a verdade
dos fatos alegados.75
Como explicado, portanto, nas três ações ora trabalhadas, o principal objetivo
do demandante em face do réu é o reconhecimento, pela Justiça Eleitoral, de um ilícito
eleitoral relevante que importe na negação do diploma ou na sua cassação. Diversamente
o é, entretanto, nos processos de prestação de contas, onde o principal objetivo é
saber se o candidato cumpriu pré-requisitos legais, formais e materiais, para fins de
gerenciamento dos seus recursos de campanha, em prol da lisura na sua administração
financeira durante todo o curso das eleições. Exatamente por isso frisamos que, muito
embora na prestação de contas seja possível evidenciar irregularidades relevantes nas
eleições, os meios processuais mais adequados para tanto são as três ações aqui expostas,
notadamente em razão do rito processual predefinidos para cada uma dessas três ações.
75
COSTA, Adriano Soares da. Op. cit. p. 351.
Referências
ARAÚJO, Mayara de Carvalho. Do Judiciário que temos ao Judiciário que queremos: o grande desafio da
cidadania no Brasil. In: CONPEDI; UNICURITIBA. (Org.). Acesso à justiça I. 1.ed. Florianópolis: FUNJAB, 2013.
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Informação bibliográfica deste texto, conforme a NBR 6023:2002 da Associação Brasileira de Normas
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de Moura (Coord.); PECCININ, Luiz Eduardo (Org.). Propaganda Eleitoral. Belo Horizonte: Fórum, 2018.
p. 299-318. (Tratado de Direito Eleitoral, v. 4.) ISBN 978-85-450-0499-8.
6.1 Introdução
Certo é que as eleições no Brasil passam por constantes mudanças, principalmente
no cenário normativo, havendo, a bem da verdade, um regramento jurídico a cada dois
anos. E, isso não é de hoje, pois a “evolução ou regressão” das normas eleitorais remonta
desde a independência de nosso país.
Dentre as evoluções legislativas, podemos afirmar que um dos principais marcos
normativos atinentes ao processo eleitoral ocorreu em 1932, mediante o Decreto nº
21.076 (Código Eleitoral) que além de regular em todo o país o alistamento eleitoral e
as eleições federais, estaduais e municipais, também instituiu a Justiça Eleitoral.
Inicialmente à Justiça Eleitoral, pelo arcabouço normativo da época, competia a
execução das eleições, bem como zelar pela normalidade destas. Entretanto, ainda que
seja umbilicalmente ligado à questão da normalidade das eleições, o financiamento de
campanha e consequentemente os seus gastos só foram normatizados em 1965, pela Lei
nº 4.740 que instituía a obrigatoriedade das prestações de contas de campanhas eleitorais.
Desde então, pode-se atestar que, pela legislação a época em vigência, pouca –
para não se falar nenhuma – importância era dada a temática prestação de contas, e via
de consequência à questão de financiamento e dos gastos de campanha.
Esse desinteresse durou até 1990, ano em que surgiu o famoso escândalo do
“Esquema PC Farias”, caso que redundou no impeachment do ex-Presidente Fernando
Collor de Mello, representando o início da abertura da “caixa de pandora” dos finan
ciamentos de campanhas eleitorais.
Ante o desconforto gerado pelo primeiro escândalo pós redemocratização, em
1997, é promulgada a Lei nº 9.504 (Lei das Eleições) que, além de estabelecer normas
gerais para as eleições, institui um regular processo de prestação de contas, criando
regras específicas, bem como limites e vedações a gastos e doações eleitorais.
Todavia, ainda que com a melhor delimitação das normas atinentes à prestação
de contas, em 2004 surgiu um novo rebuliço atrelado ao financiamento de campanhas
eleitorais, o “Escândalo dos Bingos” que consistia na extorsão de empresários com a
finalidade de arrecadar fundos para campanha eleitoral, sendo seguido por diversos
outros escândalos, até que em 2014 sobreveio a “Lava Jato” que descortinou um esquema
de lavagem de dinheiro, em que boa parte do dinheiro “lavado” seria aplicado em
campanhas eleitorais, sendo até então o maior caso de corrupção da espécie.
Ante a gravidade dos fatos, mais uma vez um Presidente fora impeachmado.
Desde esse momento, o país tem enfrentado uma crise política sem precedentes, pois,
com a abertura da “caixa de pandora” dos financiamentos eleitorais, ficou evidente o
desalinhamento do centro do nosso sistema jurídico, qual seja o Estado Democrático.
E, isso se deu e se dá pela inércia dos legitimados no que pertine à fiscalização e
controle do sistema de financiamento eleitoral. Para tanto, o que se propõe no presente
trabalho é uma releitura da postura dos legitimados, no sentido de torná-la mais enérgica
frente ao combate do “Caixa 2”.
No ano de 2011 as empresas doaram R$54,6 milhões aos 29 partidos aptos a receber
recursos. O PT ficou com R$50,1 milhões de 75 doadores, o que representa 89,5% do total
doado. O PMDB, segundo colocado, também da base de apoio do governo, recebeu 5,2%
dos recursos doados por empresas para financiar partidos políticos. O principal opositor
ao governo recebeu R$2,3 milhões ou 4,3% do total. Os outros partidos praticamente não
arrecadaram. Nesse ano não houve eleições.
O exame da natureza das atividades empresariais dos doadores mostra que a maior
parte dos recursos do PT veio de empreiteiras de obras públicas. Foi um total de R$48,9
milhões. Também foi o setor com maior número de doadores: 21 empreiteiras. A maior
contribuição foi da empreiteira Andrade Gutierrez, com R$4,6 milhões.
1
RIBAS JUNIOR, Salomão. Corrupção pública e privada. Belo Horizonte: Fórum, 2014. p. 236-237.
É natural que, diante de problemas muito complexos, como costumam ser os vinculados
ao financiamento irregular de partidos e à corrupção, vozes se ergam na direção de uma
solução, geralmente simplista e pouco reflexiva, indicando um “culpado” para a situação.
Neste caso, as doações vindas desde as pessoas jurídicas estão sendo sinalizadas como
uma das principais “culpadas” pela corrupção política em muitos sistemas democráticos.
No entanto, a decisão de proibir – direta e simplesmente – este tipo de doação, vem
acompanhada de muita expectativa e de um discurso que pode não se verificar na prática,
ou, pelo menos, não se percebe da forma como está sendo exposto. (...)
No Brasil, o debate sobre a possibilidade da participação das pessoas jurídicas no processo
eleitoral por meio de recursos econômicos foi fomentado pelo julgamento perante o
Supremo Tribunal Federal da Ação Direita de Inconstitucionalidade 4.650, promovida pelo
Conselho Federal da Ordem dos Advogados do Brasil. O argumento principal é que, do
modo como estava regulado, o financiamento de campanhas eleitorais fazia com que as
empresas tivessem muita influência do poder econômico, o que ofenderia os princípios
democrático, republicano e de igualdade, constantes na Constituição Federal de 1988.
Ou seja, tratava-se de uma ADI fundamentada em princípios (ou, na linguagem utilizada
na petição inicial, em cláusulas pétreas), já que nem mesmo a própria Constituição aborda
um modelo específico de financiamento.
Com o atual discurso público moralizador da política, o resultado já podia ser previsto
com certa antecedência, o do provimento da ação. No entanto, paralelamente a este
julgamento, houve a aprovação da Lei 13.165/15, que alterou em profundidade não só o
sistema de financiamento de partidos e campanhas eleitorais, mas também toda a legislação
eleitoral. A principal modificação foi a proibição absoluta de doações oriundas de pessoas
jurídicas, que embora não tenha sido parte do texto original da Lei, resultou assim por
força do veto presidencial a estas doações, contemplando a decisão do Supremo Tribunal
Federal, proferida logo depois.
Com a proibição de uma de suas principais fontes de arrecadação de recursos de candidatos
e partidos, o sistema brasileiro oferece escassas possibilidades de obtenção de fundos para
as campanhas eleitorais. Atualmente, o sistema arrecadatório de recursos para campanhas
e para partidos conta com as seguintes fontes permitidas: (i) recursos próprios; (ii) doações
de pessoas físicas; (iii) doações de outros candidatos ou partidos políticos; (iv) repasse de
recursos provenientes do Fundo Partidário; (v) receita decorrente da comercialização de
bens ou da realização de eventos. (...)
Diante disso, o modelo se mostra muito restritivo e limitado desde o ponto de vista político
e econômico, tendo em vista a desproporção entre o número de fontes de captação de
recursos permitidas e proibidas. Isso sem mencionar o custo de uma campanha eleitoral
no Brasil, que é alto (...).
2
SANTANO, Ana Claudia. O financiamento da política: teoria geral e experiências no direito comparado. 2. ed. rev.
e ampl. Curitiba: Íthala, 2016. p. 73-75.
Nesse viés, sem que seja realizada a necessária reflexão sobre o tema – restrição
de financiamento de campanhas, de certo não pode haver outro resultando senão
o estímulo as fraudes, comuns no Brasil desde o nosso nascedouro com o “jeitinho
brasileiro” de burlar as normas, principalmente aquelas que visam a lisura do pleito.
E, aqui entra a figura do “Caixa 2”.
O “Caixa 2”, em síntese,3 são recursos, financeiros ou não, empregados nas
campanhas eleitorais, cuja origem real não é declarada à Justiça Eleitoral na forma
como preconizado na legislação, via prestação de contas. Convém chamar atenção
à terminologia “origem real’, haja vista que o “Caixa 2” não se manifesta apenas
na ocultação de recursos, mas também na transversão da sua origem, senão veja os
apontamentos da dissertação de mestrado em ciência política de Carlos Joel Carvalho
de Formiga Xavier:4
(...) o conceito de Caixa 2 de campanha definido como as doações com fins ao financiamento
privado de campanhas eleitorais cuja origem verdadeira não seja declarada à justiça
eleitoral. Mais uma vez, a especificidade de “origem verdadeira” visa classificar de Caixa
2 de campanhas aquelas doações “esquentadas” por doadores “laranjas”, que assumem
a autoria de doações feitas por terceiros que não querem se identificar. Ainda que esse
componente adicione dificuldade a qualquer esforço de mensuração, há indícios de que
deixá-lo de fora dessa classificação seria uma omissão quantitativamente representativa.
Além disso, a informação quanto às fontes verdadeiras das contribuições de uma campanha
é de grande relevância, conforme ressalta Speck ao afirmar que o financiamento é parte
integral e essencial das propostas políticas que estão sendo apresentadas pelos partidos
e candidatos. Para que os cidadãos possam fazer uma escolha baseada em informações,
é necessário que saibam antes das eleições os principais dados sobre o financiamento
(Speck, 2006, p. 158).
Desse modo, pela definição aqui adotada, é a origem das contribuições e não os gastos
que define o financiamento de campanha através de Caixa 2, sempre que sua origem seja
não declarada ou seja declarada de forma fraudulenta.
3
Apesar de ser possível maiores digressões sobre o tema, utilizaremos uma conceituação mais enxuta para fins
de viabilizar o presente trabalho, sem que haja maiores fugas à temática proposta.
4
FORMIGA XAVIER, Carlos Joel Carvalho de. A corrupção política e o caixa 2 de campanha no Brasil. Dissertação
(Mestrado em Ciência Política) – Faculdade de Filosofia, Letras e Ciências Humanas, Universidade de São
Paulo: São Paulo, 2011. p. 76-77.
5
In Consultor Jurídico. Disponível em: <https://www.conjur.com.br/2017-mar-09/leia-voto-celso-mello-denuncia-
valdir-raupp>. Acesso em: 28 dez. 2017.
Inciso XII e §§2º e 3º do art. 24 da Lei nº 9.504, de 30 de setembro de 1997, inserido pelo
art. 2º do projeto de lei
“XII – pessoas jurídicas com os vínculos com a administração pública especificados no §2º.”
“§2º Pessoas jurídicas que mantenham contrato de execução de obras com órgãos ou
entidades da administração pública direta e indireta são proibidas de fazer doações para
campanhas eleitorais na circunscrição do órgão ou entidade com a qual mantêm o contrato.
§3º As pessoas jurídicas que efetuarem doações em desacordo com o disposto neste artigo
estarão sujeitas ao pagamento de multa no valor de 100% (cem por cento) da quantia
doada e à proibição de participar de licitações públicas e de celebrar contratos com o poder
público pelo período de cinco anos, por determinação da Justiça Eleitoral, em processo
no qual seja assegurada ampla defesa.”
Arts. 24-A e 24-B da Lei nº 9.504, de 30 de setembro de 1997, inseridos pelo art. 2º do
projeto de lei
“Art. 24-A. É vedado ao candidato receber doação em dinheiro ou estimável em dinheiro,
inclusive por meio de publicidade de qualquer espécie, procedente de pessoa jurídica.
Parágrafo único. Não se consideram doações para os fins deste artigo as transferências ou
repasses de recursos de partidos ou comitês para os candidatos.”
“Art. 24-B. Doações e contribuições de pessoas jurídicas para campanhas eleitorais
poderão ser feitas para os partidos políticos a partir do registro dos comitês financeiros
dos partidos ou coligações.
§1º As doações e contribuições de que trata este artigo não poderão ultrapassar nenhum
dos seguintes limites:
I – 2% (dois por cento) do faturamento bruto do ano anterior à eleição, somadas todas
as doações feitas pelo mesmo doador, até o máximo de R$ 20.000.000,00 (vinte milhões
de reais);
II – 0,5% (cinco décimos por cento) do faturamento bruto, somadas todas as doações feitas
para um mesmo partido.
§2º A doação de quantia acima dos limites fixados neste artigo sujeita a pessoa jurídica
ao pagamento de multa no valor de cinco vezes a quantia em excesso.
§3º Sem prejuízo do disposto no §2º, a pessoa jurídica que ultrapassar o limite fixado no
§1º estará sujeita à proibição de participar de licitações públicas e de celebrar contratos
com o poder público pelo período de cinco anos por determinação da Justiça Eleitoral,
em processo no qual seja assegurada ampla defesa.
§4º As representações propostas objetivando a aplicação das sanções previstas nos §§2º e
3º observarão o rito previsto no art. 22 da Lei Complementar nº 64, de 18 de maio de 1990,
e o prazo de recurso contra as decisões proferidas com base neste artigo será de três dias,
a contar da data da publicação do julgamento no Diário Oficial.”
Razões dos vetos
“A possibilidade de doações e contribuições por pessoas jurídicas a partidos políticos e
campanhas eleitorais, que seriam regulamentadas por esses dispositivos, confrontaria a
igualdade política e os princípios republicano e democrático, como decidiu o Supremo
Tribunal Federal – STF em sede de Ação Direita de Inconstitucionalidade (ADI 4.650/DF),
proposta pelo Conselho Federal da Ordem dos Advogados do Brasil – CFOAB. O STF deter
minou, inclusive, que a execução dessa decisão ‘aplica-se às eleições de 2016 e seguintes, a
partir da Sessão de Julgamento, independentemente da publicação do acórdão’, conforme
ata da 29ª sessão extraordinária de 17 de setembro de 2015.”
Assim, diante do veto presidencial, houve a limitação das fontes de custeio das
campanhas eleitorais, para as eleições de 2016, a: (I) recursos próprios do candidato;
(II) doações financeiras ou estimáveis em dinheiro de pessoas físicas; (III) doações
de outros partidos políticos e outros candidatos; (IV) comercialização de bens e/
ou serviços ou promoção de eventos de arrecadação realizados diretamente pelo
candidato ou pelo partido político; (V) recursos próprios dos partidos políticos, desde
que identificada a sua origem e que sejam provenientes do fundo partidário (art. 38 da
Lei nº 9.096/95), de contribuições de pessoas físicas efetuadas aos partidos políticos, de
contribuições dos seus filiados, da comercialização de bens, serviços ou promoção de
eventos de arrecadação; (VI) receitas decorrentes da aplicação financeira dos recursos
de campanhas. Sendo que tal limitação ficou a cabo do art. 14 da Resolução do TSE
nº 23.463/2015.
Em tese, acreditou-se que extirpando, mediante a Lei nº 13.165/2015 e a Resolução
do TSE nº 23.463/2015, as doações de pessoa jurídica para as campanhas eleitorais estar-
se-iam resolvendo o problema da corrupção atrelado às eleições (v.g.: crimes de lavagem
de dinheiro e corrupção ativa e passiva). Não obstante a isso, parecem ter esquecido que
foi justamente a maior regulamentação o efetivo controle e a transparência das doações
de pessoas jurídicas que permitiram a descoberta dos grandes escândalos de corrupção.
Nesse norte, convém destacar as lições de Denise Goulart Schickmann:6
6
SCHLICKMANN, Denise Goulart. Financiamento de campanhas eleitorais. Curitiba: Juruá, 2016. p. 283-285.
Com a proibição das pessoas jurídicas de realizar doações para partidos e candidatos,
dois efeitos podem ser causados de imediato (...): um deles é, sem dúvida, a interrupção
abruta dessa transferência de recursos para os partidos, deixando-os em uma situação
bastante delicada para arcar com seus compromissos, seu sustento e suas campanhas, ou
sem alternativas, já que, como demonstrado, (...) contam com muitas poucas opções de
arrecadação de recursos. O outro é que, sem ter como afrontar tais custos, com escassez de
dinheiro e com a ausência de medidas objetivas em prol da diminuição do custo da vida
política, os partidos não titubearão antes de recorrer às vias irregulares de financiamento.
Isso porque a proibição de pessoas jurídicas não está sendo acompanhada por medidas
de fomento de doações de pessoas físicas (...) nem de medidas de fiscalização (...),
comprometendo diretamente a transparência e formando um ambiente muito propício
para o denominado “caixa 2”, ou financiamento não declarado.
Como efeito mediato, aumentará mais a percepção e a ocorrência de corrupção política,
o que agravará, ainda mais, o descrédito e a repulsa pela classe política. Sublinha-se que
o que se está proibindo são as doações lícitas e registradas de pessoas jurídicas, sem
nenhuma providência contras as ilícitas e não declaradas.
7
SANTANO, Ana Claudia. Ibid. p. 73-75.
Assim, de certo que as últimas alterações legislativas, ainda que tenham imple
mentado mecanismos de maior controle e fiscalização de gastos, bem como tenham
buscado vias alternativas a falta de recursos, falha em sua essência. Pois, como visto
acima, quanto maior a restrição ao acesso de recursos, maior é a “tentação” dos partidos
políticos e candidatos na busca de recursos de “Caixa 2”.
8
FUX, Luiz; FRAZÃO, Carlos Eduardo. Novos paradigmas do direito eleitoral. Belo Horizonte: Fórum, 2016. p. 283-
285.
A esse norte, outra não pode ser a conclusão senão de que a prestação de contas
é de extrema relevância para o processo democrático, vez que proporciona maior
segurança aos “players da competição eleitoral”, garantido a lisura e a probidade das
campanhas eleitorais, por meio do controle dos recursos nela utilizados.
Em igual manifestação, encontramos as lições de Elmana Viana Lucena
Esmeraldo,9 in verbis:
9
ESMERALDO, Elmana Viana Lucena. Manual de contas eleitorais: manual prático de arrecadação e gastos de
recursos em campanha e de prestação de contas. Belo Horizonte: Fórum, 2016. p. 148.
Art. 40. O Juiz Eleitoral ou os Tribunais Eleitorais podem, a qualquer tempo, mediante
provocação ou de ofício, determinar a realização de diligências para verificação da regu
laridade e efetiva realização dos gastos informados pelos partidos políticos ou candidatos.
§1º Para apuração da veracidade dos gastos eleitorais, o Juiz, mediante provocação do
Ministério Público Eleitoral ou de qualquer partido político, coligação ou candidato, pode
determinar em decisão fundamentada:
I – que os respectivos fornecedores apresentem provas aptas para demonstrar a prestação
de serviços ou a entrega dos bens contratados;
II – a realização de busca e apreensão, exibição de documentos e demais medidas
antecipatórias de produção de prova admitidas pela legislação;
III – a quebra do sigilo bancário e fiscal do fornecedor e/ou de terceiros envolvidos.
10
MEDINA, José Miguel Garcia; ARAÚJO, Fábio Caldas de; GAJARDONI, Fernando Fonseca. Procedimentos
cautelares e especiais: ações coletivas, ações constitucionais, jurisdição voluntária, antecipação dos efeitos da tutela,
juizados especiais cíveis, federais e da fazenda pública. 2. ed. rev., atual. e ampl. São Paulo: Revista dos Tribunais,
2010. p. 148.
Art. 93. A qualquer tempo, o Ministério Público Eleitoral e os demais partidos políticos
poderão relatar indícios e apresentar provas de irregularidade relativa à movimentação
financeira, recebimento de recursos de fontes vedadas, utilização de recursos provenientes
do Fundo Partidário e realização de gastos que esteja sendo cometida ou esteja prestes
a ser cometida por candidato ou partido político antes da apresentação de suas contas
à Justiça Eleitoral, requerendo à autoridade judicial competente a adoção das medidas
cautelares pertinentes para evitar a irregularidade ou permitir o pronto restabelecimento
da legalidade.
§1º Na hipótese prevista neste artigo, a representação dos partidos políticos e do Ministério
Público Eleitoral deverá ser realizada pelos seus representantes que possuam legitimidade
para atuar perante a instância judicial competente para a análise e julgamento da prestação
de contas do candidato ou do órgão partidário que estiver cometendo a irregularidade.
§2º As ações preparatórias previstas neste artigo serão autuadas na classe Ação Cautelar
e, nos Tribunais, serão distribuídas a um relator.
§3º Recebida a inicial, a autoridade judicial, determinará:
I – as medidas urgentes que considerar adequadas para efetivação da tutela provisória,
quando houver elementos que evidenciem a probabilidade do direito e o perigo de dano
ou o risco ao resultado útil do processo;
II – a citação do candidato ou do órgão partidário, conforme o caso, entregando-lhe cópia
da inicial e dos documentos que a acompanham, a fim de que, no prazo de cinco dias,
ofereça ampla defesa acompanhada dos documentos e provas que pretende produzir.
§4º A ação prevista neste artigo observará, no que couber, o rito das ações cautelares
preparatórias ou antecedentes previstas no Código de Processo Civil.
§5º Definida a tutela provisória, que poderá a qualquer tempo ser revogada ou alterada,
os autos da ação cautelar permanecerão em secretaria para serem apensados à prestação
de contas do respectivo exercício quando esta for apresentada.
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dispositivos da Lei nº 13.165, de 29 de setembro de 2015 (Minirreforma Eleitoral de 2015), com o fim de
promover reforma no ordenamento político-eleitoral. Diário Oficial da União, Brasília, DF, 6 out. 2017.
______. Supremo Tribunal Federal. ADI nº 4.650. Relator Ministro Luiz Fux. Acórdão. Diário da Justiça Eletrônico
do Supremo Tribunal Federal, Brasília, DF, 25 fev. 2016.
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cautelares e especiais: ações coletivas, ações constitucionais, jurisdição voluntária, antecipação dos efeitos da tutela,
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MELLO, Celso de. Voto no Inquérito nº 3.982/DF. In: Consultor Jurídico. Disponível em: <https://www.conjur.
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RIBAS JUNIOR, Salomão. Corrupção pública e privada. Belo Horizonte: Fórum, 2014.
SANTANO, Ana Claudia. O financiamento da política: teoria geral e experiências no direito comparado. 2. ed.
rev. e ampl. Curitiba: Íthala, 2016.
SCHLICKMANN, Denise Goulart. Financiamento de campanhas eleitorais. Curitiba: Juruá, 2016.
Informação bibliográfica deste texto, conforme a NBR 6023:2002 da Associação Brasileira de Normas
Técnicas (ABNT):
ANDRADE, Luiz Felipe da Silva. A prestação de contas como inibição ao “caixa 2” de campanha: a
medida cautelar da Resolução TSE nº 23.463/2015. In: FUX, Luiz; PEREIRA, Luiz Fernando Casagrande;
AGRA, Walber de Moura (Coord.); PECCININ, Luiz Eduardo (Org.). Propaganda Eleitoral. Belo Horizonte:
Fórum, 2018. p. 319-332. (Tratado de Direito Eleitoral, v. 4.) ISBN 978-85-450-0499-8.
7.1 Introdução
Acompanhando a crescente importância jurídica da estrutura Judiciária Eleitoral,
as contas de campanha, em proporção direta, aumentam em complexidade e necessário
acompanhamento.
Os recentes episódios criminais que assolam a realidade nacional, com maior ou
menor proximidade, orbitam nas questões atreladas à arrecadação e gastos de campanha,
o que acarreta o mister de maior acompanhamento e investimento no aprimoramento
dos mecanismos de controle e fiscalização.
A prestação de contas objetiva o controle nas arrecadações e gastos de campanha,
procurando assegurar a regularidade e transparência econômico-financeira do pleito
eleitoral, visando a obstar a utilização de recursos vedados, não identificados, sonegados
ou superfaturados. É por meio dela que se podem verificar eventuais irregularidades,
desde meras inconformidades formais, até condutas criminosas, com especial destaque
ao chamado “caixa 2” de campanha, vale dizer, movimentações paralelas de valores
envolvidos no processo eleitoral, sem considerar delitos conexos como corrução (a de
pender do elemento finalístico), lavagem de dinheiro, etc.
Além da gravidade implícita na conduta criminosa em si, importante consignar
que eventuais fraudes nas contas de campanha, e sua prestação, influenciam diretamente
no pleito eleitoral, causando desequilíbrio entre os candidatos, com prejuízos evidentes
ao sufrágio, um dos pilares democráticos.
Por outro lado, o sistema hoje formatado para a aferição das receitas e despesas
dos candidatos, eleitos ou não, por inúmeros fatores, não propicia um real controle
das contas prestadas.
No procedimento de verificação em vigor, o sistema de fiscalização da Justiça
Eleitoral é chamado a verificar e aprovar não propriamente as contas (entendidas como
receitas e gastos de campanha), mas simplesmente o encontro de informações prestadas
pelos próprios candidatos com outras informações também por ele fornecidas, além de
outras confrontações com bases conveniadas e por meio de circularização.
Tampouco os recibos de contribuição e arrecadação, ou ainda os extratos da conta
bancária jungida aos autos de prestação, são hábeis a atestar a regularidade material
da informação, ou que todos os recursos efetivamente transitaram pela conta especi
ficamente aberta. A prática indica que a existência de uma conta bancária oficial acaba
sendo, para o candidato que pretende movimentações paralelas, apenas um mecanismo
formal de fechamento contábil artificial após o processo eleitoral.
Em outras palavras, não se tem um “verdadeiro exame de contas”, senão tão
somente um mero e formal encontro de informações prestadas por uma mesma pessoa,
no caso, o próprio interessado, sem que se lhe seja exigido, no mais das vezes, qualquer
documento com o qual se pudesse verificar os dados por ele apresentados.
Bem por isso, discursos recorrentes entre suspeitos e acusados de crimes envol
vendo contas de campanha, no sentido de buscarem isenção de responsabilidade a
partir da ideia que “a prestação de contas foi aprovada pela justiça eleitoral”, é um
argumento frágil, deslocado e puramente retórico.
Isso porque não há relação jurídica de dependência entre a aprovação/desapro
vação/aprovação com ressalvas das contas de campanha pela Justiça Eleitoral e a
presença ou ausência de fraude ou conduta criminosa envolvida na omissão de
informações relevantes.
Campanhas viciadas, com movimentações financeiras paralelas, informações
falsas, podem ter sido aprovadas pela justiça eleitoral (que realiza uma análise formal
superficial, como vimos) sem que isso signifique um salvo conduto que indenize eventual
responsável pelas irregularidades verificadas. Assim como contas desaprovadas pela
Justiça Eleitoral não significam necessariamente a existência de conduta criminosa; aliás,
pelo sistema de responsabilidades da legislação eleitoral, a desaprovação de contas,
por si só, não acarreta nenhuma consequência ao candidato, que somente tem uma
situação jurídica mais punitiva se as contas forem consideradas como “não prestadas”,
mesmo assim não significa, automaticamente, a presença de alguma conduta criminosa
envolvida na prestação de contas.
Estabelecidas essas premissas, o presente ensaio visa a questionar a responsabi
lidade jurídica penal do agente político (ou ausência de), pelas informações prestadas
perante a justiça eleitoral, relativas às contas de campanha.
Em outros termos, qual a responsabilidade penal, ou os pressupostos para
esta responsabilidade, para o agente político que concorre a cargo eletivo, em relação
à prestação de contas de campanha perante a Justiça Eleitoral, especialmente as
movimentações paralelas, empiricamente conhecidas como “caixa dois de campanha”,
como proposta possível para um efetivo controle financeiro das campanhas eleitorais.
Art. 350. Omitir, em documento público ou particular, declaração que dêle devia constar,
ou nele inserir ou fazer inserir declaração falsa ou diversa da que devia ser escrita, para
fins eleitorais:
Pena – reclusão até cinco anos e pagamento de 5 a 15 dias-multa, se o documento é público,
e reclusão até três anos e pagamento de 3 a 10 dias-multa se o documento é particular.
O crime de uso de documento falso, por sua vez, vem previsto pelo artigo 353
do Código Eleitoral:
Art. 353. Fazer uso de qualquer dos documentos falsificados ou alterados, a que se referem
os artigos. 348 a 352:
Pena – a cominada à falsificação ou à alteração.
Esse tipo delitivo se perfaz com a efetiva utilização de quaisquer documentos que foram
falsificados – material ou ideologicamente – com finalidade eleitoral. Não basta, pois, o
mero porte do documento falso para a configuração do delito. MARINO PAZZAGLINI
FILHO acentua a necessidade de que “a exibição do documento falso seja espontânea,
por vontade do usuário e não forçada como ocorre em revista policial” (p. 131). O uso
do documento falso, como regra, pela jurisprudência majoritária, absorve as falsidades
havidas na documentação.
Não basta que estejam presentes as elementares do tipo para sua configuração,
a conduta deve ter potencialidade lesiva para ferir o bem jurídico tutelado que é a fé
pública eleitoral e a autenticidade dos documentos. Nesse aspecto também é uníssona
a jurisprudência.
Nas palavras de Suzana de Camargo Gomes (GOMES, 2010, p. 287):
Por outro lado, cumpre consignar que o crime tipificado no art. 353 do Código Eleitoral
exige, para sua configuração, que o documento falso utilizado tenha aptidão para enganar,
para iludir, posto ser indispensável a existência de perigo de dano. Assim, a utilização
de documento, objeto de falsificação grosseira, sem potencialidade lesiva, não caracteriza
o crime em tela, sendo hipótese de reconhecimento de que se trata de crime impossível,
art. 17, CP.
Estando presentes, então, além das elementares do tipo, qual seja usar documento
anteriormente falsificado com finalidade eleitoral, também a potencialidade lesiva,
restará configurado o crime de uso de documento falso.
A utilização de documentos ideologicamente falsos, no processo de prestação de
contas da campanha eleitoral pode caracterizar, indubitavelmente, o crime epigrafado,
mormente no que tange movimentações financeiras paralelas.
Art. 17. As despesas da campanha eleitoral serão realizadas sob a responsabilidade dos
partidos, ou de seus candidatos, e financiadas na forma desta Lei.
Conforme leciona Rodrigo López Zilio (ZILIO, 2014, p. 414), “o legislador parte
da premissa de que, sendo os maiores beneficiários e interessados no sistema de
arrecadação de recursos para campanha eleitoral, os partidos e seus candidatos é que
têm a responsabilidade sobre as despesas realizadas”.
Ou ainda para deixar mais evidente o dever legal, os artigos 20 e 21 da chamada
Lei das eleições:
Art. 20. O candidato a cargo eletivo fará, diretamente ou por intermédio de pessoa por ele
designada, a administração financeira de sua campanha, usando recursos repassados pelo
comitê, inclusive os relativos à cota do Fundo Partidário, recursos próprios ou doações
de pessoas físicas ou jurídicas, na forma estabelecida nesta Lei.
Art. 21. O candidato é solidariamente responsável com a pessoa indicada na forma do art.
20 desta Lei pela veracidade das informações financeiras e contábeis de sua campanha,
devendo ambos assinar a respectiva prestação de contas.
Vale não deslembrar que os tribunais pátrios têm admitido a teoria da cegueira
deliberada a partir da ideia de dolo eventual (categoria do sistema continental), a
partir do qual o agente “assume o risco “ da produção do resultado, ou seja, age com
indiferença tal que o resultado lhe é indiferente.
Por fim, trazemos a colação a ideia dos delitos especiais de infração de dever, no
qual não temos dúvida em enquadrar a ocorrência de falsidade na prestação de contas
de campanha, em relação ao candidato ou agente político que possui um especial dever
quanto a veracidade das informações alhures lançadas.
Pela teoria dos delitos especiais, ou delitos de infração de dever, em alguns
delitos,– como na perspectiva do candidato, os delitos dos arts. 350 e 353 do Código
Eleitoral –, a autoria é estabelecida a partir de um dever específico imposto pelo
legislador, no caso, o dever de prestar informações verídicas à Justiça Eleitoral.
Nesses delitos não interessa a ação realizada pelo agente, mas sim a norma que foi
por ele violada, no caso, o dever de fiscalizar a lisura das próprias contas de companha.
Ocorre, na perspectiva dos delitos especiais de violação de dever, uma equiparação
absoluta entre a ação e omissão, pois o que interessa é a infração do dever, no caso, o
dever de cuidado com as contas prestadas. Na lição de Francisco Muñoz Conde (2001,
p. 57-58):
Por una parte, la equiparación entre acción y omisión es aquí absoluta, pues em estos
delitos lo que interesa es la infracción del deber, siendo indiferente el que esta infracción
se lleve a cabo por acción o por omisión.
(…)
Otra consecuencia importante se extrae en el àmbito de a autoría; mientras que en los
delitos de acción sólo puede ser autor quien tenga el dominio del hecho, em los delitos
consistentes em la infracción de un deber sólo puede ser autor quien lesione el deber
extrapenal, sin que interesse en lo más mínimo el dominio del suceso externo.
Referências
BECK, Francis. A Doutrina da Cegueira Deliberada e sua (In) Aplicabilidade ao Crime de Lavagem de
Dinheiro. Revista de Estudos Criminais, Sapucaia do Sul, n. 41, p. 45-68, set. 2011.
CASTRO, José Resende de. Curso de Direito Eleitoral. 6. ed. Atlas, 2012.
CONDE, Francisco Muñoz. Introdución al derecho penal. Editoral BdeF: Buenos Aires, 2001.
GOMES, Suzana de Camargo. Crimes Eleitorais. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2000. p. 303.
HUNGRIA, Nelson. Comentários ao Código Penal. 2. ed. Rio de Janeiro: Forense, 1959. v. IX p. 277.
MORO, Sergio Fernando. Crime de lavagem de dinheiro. São Paulo: Saraiva, 2010.
MOURA, Bruno. Autoria e participação nos crimes desde a empresa: bases para um modelo de imputação
individual. Revista CEPPG, Catalão/GO, n. 25, 2/2011.
SANTOS, Juarez Cirino dos. A moderna teoria do fato punível. Curitiba: Editora Forum, 2004.
ZILIO, Rodrigo López. Crimes eleitorais. Salvador: Juspodivm, 2014.
ZILIO, Rodrigo López. Direito eleitoral: noções preliminares, elegibilidade e inelegibilidade, processo eleitoral
(da convenção à diplomação), ações eleitorais. Porto Alegre: Verbo Jurídico, 2014.
Informação bibliográfica deste texto, conforme a NBR 6023:2002 da Associação Brasileira de Normas
Técnicas (ABNT):
OLIVEIRA, Alessandro José Fernandes de. Responsabilidade criminal do agente político: proposta para
um “novo” e efetivo controle financeiro das campanhas eleitorais. In: FUX, Luiz; PEREIRA, Luiz Fernando
Casagrande; AGRA, Walber de Moura (Coord.); PECCININ, Luiz Eduardo (Org.). Propaganda Eleitoral.
Belo Horizonte: Fórum, 2018. p. 333-344. (Tratado de Direito Eleitoral, v. 4.) ISBN 978-85-450-0499-8.
8.1 Introdução
O Direito Eleitoral, com exceção de poucas entidades privadas de ensino e raras
instituições governamentais, não consta como disciplina jurídica obrigatória dos cursos
jurídicos do país. Quando a matéria é ensinada em tais carreiras, normalmente consta
como optativa ou em seminários de presença facultativa aos estudantes, de modo
esporádico.
É bem possível que isso ainda ocorra em solo nacional pela trajetória histórico-
brasileira em matéria eleitoral, apesar de longa. A título explicativo, somente a partir da
década de 30 passamos a ter, no âmbito legislativo, um Direito Eleitoral sistematizado,
permanente e próprio com o advento da codificação eleitoral em vista do primeiro
Código Eleitoral editado em 1932, que, aliás, durou pouco já que com a Constituição
de 1934 e a posterior criação da Justiça Eleitoral, deu-se a edição do segundo Código
eleitoral a partir de 1935 para adequar as matérias à segunda Carta Magna republicana.
E em seguida tivemos um período de arrefecimento do desenvolvimento dos institutos
próprios do Direito eleitoral com o Estado Novo e a Carta de 1937, quando se extinguiu
a Justiça Eleitoral, até a Constituição democrática de 1946, quando então ocorreu a
volta da Justiça Eleitoral para o Poder Judiciário e veio o Código eleitoral de 1950,
posteriormente substituído pelo atual Código eleitoral (Lei nº 4.737, de 15.07.65) – o
quarto editado – que, embora sensivelmente derrogado, permanece em vigor até hoje,
paralelamente a leis eleitorais importantes.
Esse conjunto de regulamentações sobre a matéria eleitoral, isto é, o Direito Elei
toral Brasileiro, como disciplina jurídica, pertence ao ramo do Direito Público, mas se
relaciona diretamente com outros ramos jurídicos do Direito, como o Privado. É exata
mente sobre isso que trataremos no presente artigo, especificamente abordando temas
presentes na intersecção com o Direito Imobiliário, um ramo do direito privado que
trata e regulamenta vários aspectos da vida privada, tais quais o aluguel de imóveis,
a compra e venda de imóveis, o condomínio, a usucapião e os financiamentos da casa
própria, entre outros, e o Direito Eleitoral.
Afinal, a separação em tais ramos ocorre para fins didáticos, para facilitar o
ensinamento e compreensão da matéria, vez que o Direito é uno e congrega assuntos de
mais de um grupo específico. Ver-se-á, ao tratar da intersecção entre o Direito Imobiliário
e o Eleitoral, a tangência até mesmo do direito tributário e do direito penal, por exemplo.
Nesse sentido, selecionamos matérias constantemente avaliadas pela Justiça
Eleitoral, além da análise da jurisprudência do Supremo Tribunal Federal e do Superior
Tribunal de Justiça, quais sejam: a multa por doação em excesso no caso de cessão de
bem imóvel a campanha eleitoral, a prestação de contas anual de partido político no
tocante aos aluguéis de bens imóveis e a contradição existente entre a justiça cível e a
eleitoral no que tange a documentação da locação, o procedimento de execução fiscal de
multas eleitorais e como tornar mais eficiente a cobrança destas, e por fim, a omissão de
propriedade de imóveis na declaração de bens apresentada no registro de candidatura
e a proteção da fé pública no âmbito eleitoral.
Fiscal – LEF) que cuida da Execução Fiscal, modalidade de execução por quantia certa
com base em título executivo extrajudicial.
Iniciado o processo de execução, o executado será citado para, no prazo de 5
(cinco) dias, pagar a dívida com os juros e multa de mora e encargos indicados na
Certidão de Dívida Ativa, ou garantir a execução pelo valor da dívida, juros e multa
de mora e encargos indicados na Certidão de Dívida Ativa por meio de: (i) depósito
em dinheiro, à ordem do Juízo em estabelecimento oficial de crédito, que assegure
atualização monetária; (ii) fiança bancária ou seguro garantia; (iii) nomeação de bens
à penhora; ou (iv) indicação à penhora de bens oferecidos por terceiros e aceitos pela
Fazenda Pública.
Concentrando no objetivo do presente artigo, atente-se que entre os bens que
podem ser indicados para penhora estão os bens imóveis, só podendo o executado
indicar e o terceiro oferecer bem imóvel à penhora com o consentimento expresso do
respectivo cônjuge. Por outro lado, não ocorrendo o pagamento nem a garantia da
execução, a penhora poderá recair em qualquer bem do executado, como os imóveis,
exceto os que a lei declare absolutamente impenhoráveis.
O termo ou auto de penhora conterá, também, a avaliação do imóvel penhorado,
bem como demais bens, efetuada por quem o lavrar, a qual poderá ser impugnada.
É importante lembrar que em qualquer fase do processo será deferida pelo Juiz a
substituição da penhora por depósito em dinheiro, fiança bancária ou seguro garantia.
O executado poderá se defender, na forma de embargos, mas não são admissíveis
embargos do executado antes de garantida a execução. Recebidos os embargos, o Juiz
mandará intimar a Fazenda, para impugná-los no prazo de 30 (trinta) dias, designando,
em seguida, audiência de instrução e julgamento. Caso não sejam oferecidos os
embargos, a Fazenda Pública manifestar-se-á sobre a garantia da execução.
De qualquer forma, a alienação de quaisquer bens penhorados será feita em leilão
público, no lugar designado pelo Juiz. Poderá a Fazenda Pública adjudicar os bens
penhorados antes do leilão, pelo preço da avaliação, se a execução não for embargada
ou se rejeitados os embargos. Outra opção é adjudicar após findar o leilão, no caso de
inexistência de licitante, pelo preço da avaliação. Ou, também neste momento posterior,
caso haja licitante, com preferência, em igualdade de condições com a melhor oferta,
é possível adjudicar no prazo de 30 (trinta) dias. Se o preço da avaliação ou o valor da
melhor oferta for superior ao dos créditos da Fazenda Pública, a adjudicação somente
será deferida pelo Juiz se a diferença for depositada, pela exequente, à ordem do Juízo,
no prazo de 30 (trinta) dias.
Vale ressaltar que praça é a hasta pública para a alienação de bens imóveis e leilão
é a hasta pública para a alienação de bens móveis, mas em se tratando de execução
fiscal, ou seja, dos processos de execução regidos pela Lei nº 6.830/80, não existe essa
diferença, e os bens móveis e imóveis são todos alienados em leilão.
Entretanto, o grande problema no caso da execução fiscal de multa eleitoral é
quando ocorre o pedido de realização de uma segunda hasta pública para alienação
judicial dos bens imóveis penhorados. Explica-se: os artigos 22 a 24 da Lei de Execução
Fiscal fazem referência a apenas um leilão dos bens penhorados. Mas diante da lacuna
desses dispositivos em relação à ausência de oferecimento de lance correspondente ao
valor de avaliação na primeira hasta pública, aplicar-se-á de forma subsidiária o Código
de Processo Civil consoante o artigo 1ºda Lei de Execução Fiscal.
1
BUENO, Cassio Scarpinella. Novo Código de Processo Civil anotado. São Paulo: Saraiva, 2015. p. 542.
2
TRF3, 6ª Turma, Rel. Des. Fed. Mairan Maia, AI 0004301-53.2009.4.03.0000/SP-, DJe em 20.04.2012.
3
REsp 752.984/SP, Rel. Ministro Mauro Campbell Marques, Segunda Turma, julgado em 23.09.2008, DJe
23.10.2008.
4
JUNIOR, Vicente de Paula Ataíde. Como tornar mais eficiente a cobrança das multas eleitorais? Revista online
IBRAJUS. Disponível em: <http://www.ibrajus.org.br /revista/artigo.asp?idArtigo=335>.
Sinteticamente, a Teoria do Diálogo das Fontes propõe que a alteração dos conceitos e
princípios de uma norma geral altera os conceitos e princípios das normas especiais com
ela relacionadas, sempre que isso for necessário para permitir a aplicação simultânea,
coerente e coordenada das plúrimas fontes legislativas convergentes, com finalidade de
proteção efetiva de um determinado bem jurídico. Com isso, muda-se um dos paradigmas
da teoria clássica do direito: do conflito para a coordenação de normas; da revogação de
uma das normas em conflito do sistema jurídico ou do “monólogo” de uma só norma, à
convivência dessas normas, ao “diálogo” das normas para alcançar a sua finalidade visada
ou “narrada” em ambas.6
5
Idem.
6
MARQUES, Cláudia Lima. Diálogo das Fontes: do conflito à coordenação de normas do direito brasileiro. 1. ed,
São Paulo: Revista dos Tribunais, 2012.
7
REsp 1272827/PE, Rel. Ministro Mauro Campbell Marques, Primeira Seção, julgado em 22.05.2013, DJe
31.05.2013.
cobrar multas eleitorais, o sistema processual informa que, hoje, títulos judiciais (como
é o caso da sentença que fixa a multa eleitoral) são cobrados sob o comando do juiz que
fixou a multa na fase de cumprimento de sentença (como de ordinário acontece em
todo o sistema processual contemporâneo) sem a necessidade de inscrevê-la em dívida
ativa da União ou da iniciativa das Procuradorias da Fazenda Nacional. A doutrina
e a jurisprudência sobre a fase de cumprimento de sentença fornecerão as respostas
necessárias.
Assim, resta lançada a ideia para que uma série de dificuldades operacionais,
existentes por causa do rito das execuções fiscais, deixará de existir, tornando infinita
mente melhor a prestação jurisdicional eleitoral.
8
Prestação de contas nº 158-43.2011.6.26.0000, Prestação de Contas nº 14544, Prestação de Contas nº 2728 e
Prestação de Contas nº 242-10.2012.6.26.0000.
um contrato ser escrito, a não ser quando exigido por lei. Aliás, a Lei do Inquilinato prevê
a modalidade verbal do ajuste da locação residencial no seu art. 47. Assim, um contrato
verbal (que possua agente capaz; objeto lícito e possível, determinado ou determinável)
é um contrato válido e cujos efeitos são reconhecidos na esfera cível.
Ademais, no tocante à prorrogação da locação residencial, é aceita pela juris
prudência de maneira verbal ou tácita nos moldes previstos no parágrafo 1º do artigo 46
da Lei do Inquilinato, dispondo que findo o prazo ajustado, se o locatário continuar na
posse do imóvel alugado por mais de trinta dias sem oposição do locador, presumir-
se-á prorrogada a locação por prazo indeterminado, mantidas as demais cláusulas e
condições do contrato. Por outro lado, no tocante à locação não residencial, o art. 51
prevê o direito à renovação do contrato por prazo igual, desde que presentes algumas
alguns requisitos.
Claro, entretanto, que um contrato verbal precisa, antes de tudo, ter sua existência
comprovada em caso de litígio, ou seja, ao ingressar no judiciário para pedir a execução
de um contrato verbal, há a necessidade primeira de provar que aquele contrato
realmente foi pactuado. Essa comprovação, no âmbito cível, pode ocorrer através de
testemunhas, documentos, objetos, e-mails e outros meios periciais. Se uma parte, por
exemplo, pagou por serviços prestados pela outra parte, essa é uma prova de existência
de um contrato, ainda que não se consiga provar os termos e cláusulas estipuladas no
acordo, e é assim que a justiça cível tem analisado e aceitado a locação verbal residencial
e não residencial.
Essa modalidade, por outro lado, parece rechaçada pela justiça eleitoral em vista
da Resolução nº 23.464/2015, pois idêntica à compreensão da Secretaria de Controle
Interno do Tribunal Regional Eleitoral, pacificamente entende pela necessidade do
contrato de locação, de sublocação ou termo de cessão do imóvel vigente no exercício
da respectiva prestação de contas, além de eventuais instrumentos de aditamento em
caso de reajuste de valores, prorrogação de vigência ou de rescisão contratual, para
que os gastos com “Locação de bens imóveis” sejam regulares, além do detalhamento
dos valores.
Nesse contexto, prudente é o questionamento a respeito dos limites ao poder
normativo do Tribunal Superior Eleitoral, vez que a Resolução prevê muito mais que
a Lei dos Partidos Políticos, a Lei das Eleições, além de contrariar o Código Civil, a
Lei do Inquilinato e a jurisprudência cível, ao restringir, para efeitos de prestação de
contas, o instituto da locação à escrita, não aceitando os efeitos da locação ou de sua
prorrogação verbal e limitando o instituto, como se vê das interpretações das secretarias
que encampam suas manifestações pela desaprovação das contas. É também uma
questão de preservação da hierarquia de normas.
9
FILHO, Marino Pazzagilini. Crimes Eleitorais. São Paulo: Atlhas, 2012. p. 127.
10
STF, HC 85976, Rel. Min. Ellen Gracie, 2ª Turma, DJ 24.02.2006.
8.6 Conclusão
A intersecção entre o Direito Imobiliário e o Direito Eleitoral revela importantes
conclusões sobre a compreensão de institutos imobiliários no âmbito da prática da
11
Recurso Eleitoral nº 17-59.2015.6.26.0331, Recurso Eleitoral nº 28-26.2015.6.26.0364, Recurso Eleitoral 36-
95, Recurso Eleitoral 2065, Recurso Eleitoral 30-09, Recurso Eleitoral 1977 e Recurso Eleitoral 1625, todos do
Tribunal Regional Eleitoral de São Paulo, por exemplo.
Referências
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online IBRAJUS. Disponível em: <http://www.ibrajus.org.br /revista/artigo.asp?idArtigo=335>.
BUENO, Cassio Scarpinella – Novo Código de Processo Civil anotado. São Paulo: Saraiva, 2015.
FILHO, Marino Pazzagilini. Crimes Eleitorais. São Paulo: Atlhas, 2012.
MARQUES, Cláudia Lima. Diálogo das Fontes: do conflito à coordenação de normas do direito brasileiro. 1.
ed, São Paulo: Revista dos Tribunais, 2012.
Informação bibliográfica deste texto, conforme a NBR 6023:2002 da Associação Brasileira de Normas
Técnicas (ABNT):
TORRES, Amanda Lobão. Temas imobiliários na perspectiva da prática eleitoral. In: FUX, Luiz;
PEREIRA, Luiz Fernando Casagrande; AGRA, Walber de Moura (Coord.); PECCININ, Luiz Eduardo
(Org.). Propaganda Eleitoral. Belo Horizonte: Fórum, 2018. p. 345-357. (Tratado de Direito Eleitoral, v.
4.) ISBN 978-85-450-0499-8.
Adriano Codato
Doutor em Ciência Política pela Universidade Estadual de Campinas (UNICAMP). Professor
associado de Ciência Política na Universidade Federal do Paraná (UFPR), editor da Revista de
Sociologia e Política e pesquisador 1D do Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e
Tecnológico. Atua no Programa de Pós-Graduação em Ciência Política e no Programa de Pós-
Graduação em Políticas Públicas na UFPR. Dedica-se ao estudo dos processos de recrutamento
da classe política brasileira e coordena o Observatory of social and political elites of Brazil (http://
observatory-elites.org/).
Carla Karpstein
Advogada Sócia do CK Advocacia. Especialista em Direito Público, Partidário e Eleitoral. Professora
da ESA/OAB-PR. Presidente da Comissão de Direito Eleitoral da OAB/PR. Diretora do Instituto
Paranaense de Direito Eleitoral (IPRADE). Autora do livro Direito Eleitoral para Concursos (2011) –
Editora Iesde.
Dyogo Crosara
Formado pela Universidade Federal de Goiás, na Cidade de Goiás, pós-graduado em Direito Civil
e Direito Processual Civil pela UNIGRANRIO – 2005/2006. Foi analista judiciário do TRE/GO.
Conselheiro Estadual da OAB-GO na gestão 2013/2015, ocasião em que foi Diretor Adjunto
da Escola Superior da Advocacia da OAB-GO por dois anos. É professor de Direito Eleitoral e
Direito Administrativo.
Eduardo Xavier
Bacharel em Direito pela UFSC e mestrando em direito pelo Programa de Pós-Graduação em
Direito da UFPR. Membro do Núcleo de Pesquisa Constitucionalismo e Democracia do Centro
de Estudos da Constituição (CCONS) do PPPGD/UFPR.
Márcio Carlomagno
Doutorando em Ciência Política pela Universidade Federal do Paraná (UFPR). Mestre em Ciência
Política pela mesma instituição, com período sanduíche na Université de Montréal (Canadá).
Graduado em comunicação institucional pela UTFPR (Universidade Tecnológica Federal do
Paraná) e bacharel em gestão pública pela UFPR (Universidade Federal do Paraná). Seus interesses
de pesquisas incluem estudos legislativos, eleições e métodos quantitativos.
Roger Fischer
Advogado. Especialista em Direito Eleitoral pelo Centro Universitário Leonardo da Vinci.
Membro do Instituto Gaúcho de Direito Eleitoral – IGADE e da Comissão Especial de Direito
Eleitoral da OAB/RS.